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    por dinheiro e poder, ento nossa sociedade poder enfim evoluir a um novonvel."

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    VANIA SANTIAGO

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    E-ISBN978-85-8057-786-0

    CRDITOS DAS IMAGENSAberturas do Prefcio, Captulo 1, Captulo 2, Captulo 3, Captulo 5,Captulo 7, Captulo 8, Captulo 9, Captulo 10 e Captulo 11 /SHUTTERSTOCK.COMAbertura da Apresentao / ELENA DIJOUR / SHUTTERSTOCK.COMAbertura do Captulo 6 / THOMAS HOEPKER / MAGNUM PHOTOS /LATINSTOCKAbertura do Captulo 12 / ERICH HARTMANN / MAGNUM /LATINSTOCKAbertura da Concluso / WILLIAM HENRY FOX TALBOT / GETTYMUSEUM

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    Para o Srgio,com quem visito o futuro.

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    Time present and time pastAre both perhaps present in time futureAnd time future contained in time past.If all time is eternally present

    All time is unredeemable.

    O tempo presente e o tempo passadoEsto ambos, talvez, presentes no tempo futuroE o futuro contido no tempo passado.Se a plenitude do tempo eternamente presente,O tempo, como um todo, irredimvel.T.S. ELIOT

    traduo Oswaldino Marques

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    SUMRIO

    PREFCIO O futurono est escritoAPRESENTAOOs avisos do tempo

    Aterra que

    recebemos porherana

    1 A fortuna e o destino

    A nova demografia2 O futuro da gente

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    am n os e ropeosda educao

    3 A maior das tarefas

    Economia em vriasfrentes

    4A agendainterrompida

    Um pas de classemdia

    5Desigual e em

    movimento

    Terra em transe napoltica

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    O desafio da sade7 A receita da cura

    As novas fontes deenergia

    8gua e vento na terrado sol

    O futuro daagricultura

    9 Plantando noscampos do Senhor

    Tecnologia,

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    ,

    10Embarque nasfronteiras doimpossvel

    Cidade, o ponto de

    encontro11

    Terra um planetaurbano

    Mundo, mundo, vastomundo

    12Em turbulncia e emtransio

    CONCLUSO Em

    nome dos filhos

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    AGRADECIMENTOS

    SIGLASREFERNCIASBIBLIOGRFICAS

    SOBRE A AUTORA

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    PREFCIO

    O Brasil est prisioneiro do imediato. O presente virou um redemoinho que suga eimpede o pas de escrever seu futuro. A crise que nos atinge em vrias frentes assusta eparalisa.

    Somos o primeiro pas em biodiversidade do mundo. E daqui em diante o

    planeta precisar mais dela. Somos o segundo maior reservatrio de gua doce. Nofuturo a escassez ser recorrente. Temos o maior potencial de energia renovvel porquilmetro quadrado. A maior floresta tropical do mundo no precisa ser derrubadpara ampliarmos a produo porque as tcnicas de produtividade esto dominadas.Somos e seremos do reduzido grupo de pases fornecedores de alimentos.

    Tempos de crise fazem o pas esquecer suas vantagens e no ver o futuro.Retrocessos nos deixam desolados. urgente olhar para a frente. O nmero debrasileiros no to grande que seja um peso nem to pequeno que seja um limitador. Oenvelhecimento da populao exigir gastos maiores em sade. No mercado de trabalho

    a janela demogrfica est aberta no melhor momento para aproveitarmos a oportunidade.Mas essa janela comea a se fechar. Somos um pas ainda jovem, que amadurece.A populao vai, nas prximas dcadas, aumentar, estabilizar, inverter a curva e

    encolher. Ao longo do sculo, o nmero de brasileiros diminuir pela primeira vez enossa histria. A cada movimento, a demografia impor desafios enormes. Seeliminarmos as barreiras do preconceito, a diversidade humana ser nosso grande ativopara que possamos ter uma classe mdia e uma elite com a cara do pas.

    Nos prximos 30 anos, vamos apressar o passo em educao, no por ulema de governo. As famlias valorizam mais a educao, a sociedade se mobiliza epessoas esto neste momento vivendo histrias emocionantes de superao desse dficique nos apequena.

    O Brasil escolher seus governantes democraticamente. Por mais tumultuadque seja a cena poltica, ser possvel isolar as vozes radicais nas crises institucionais,porque j superamos a sina de repblica interrompida por ciclos autoritrios. O combate corrupo ser feito com a tenacidade com que derrotamos a ditadura, a hiperinflao, eestamos reduzindo a pobreza. No ser fcil, porque nada foi fcil, mas o pas criouinstituies robustas. Dos avanos nessa luta surgiro novos lderes polticos e urenovado ambiente de negcios. A democracia, contudo, tarefa da vida inteira econtinuar sendo aperfeioada nas prximas dcadas.

    A economia sair dessa crise como saiu de outras que ameaaram roubar nossofuturo. Hoje temos um mercado interno mais amplo, estabilidade monetria e muitotalento empreendedor. O governante leniente com a inflao conhecer o mau humordos brasileiros. Nossa saga pela moeda estvel criou valores definitivos. Temos queseguir, no entanto, um roteiro exaustivo de correo e retirada de obstculoscompetitividade e integrao ao mundo. A vantagem que conhecemos a lista detarefas.

    O planeta est em turbulenta transio. A revoluo tecnolgica, a mudanclimtica e a acelerao do tempo mudaro radicalmente a forma como vivemos. No h

    tempo para improvisos e os erros custaro mais caro. O futuro ser implacvel com ospases que no se prepararem para ele.

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    Em cada rea analisada neste livro meio ambiente e clima, demografia,educao, economia, classe mdia, poltica, sade, energia, agricultura, tecnologia,cidades, mundo o exerccio de olhar as prximas dcadas inquieta e estimula. Temostrabalho urgente e possibilidades valiosas na nova era.

    Este livro uma reportagem sobre o horizonte do pas. Por isso ele se chamHistria do futuro. As entrevistas, anlises de dados, viagens e relatos de pessoas meconvenceram de que h tendncias que no podem ser ignoradas. H projetos eandamento que podem dar certo. H riscos aos quais estamos desatentos. H vantagensno exploradas. o momento de fazer o esforo de acertar o telescpio que aponta o queser ou pode ser o Brasil. Com conhecimento maduro dos nossos defeitos e das nossasvirtudes.

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    APRESENTAO

    Na vida dos pases h momentos decisivos. Este o nosso. Pases, como pessoas, viveperodos em que nenhum fato relevante acontece. Como se o tempo parasse. Depoishistria se acelera. Foi assim nos 14 anos entre a chegada da corte portuguesa ao Brasil ea independncia; e no binio que nos trouxe abolio e repblica. Vivemos agora outr

    hora de escolhas decisivas neste que o mais longo perodo democrtico desde a quedda monarquia. Aqueles foram momentos fundadores do pas; agora a chance de lanaras bases para o futuro ou vivermos o risco de perd-lo.

    Quando a crise aguda, nada se v no horizonte. Em uma viagem de trabalhoArgentina, em 2003, fui filmar um panelao que saiu s ruas. Em determinadomomento, perguntei a uma mulher por que ela estava na manifestao e ela respondeuem tom de aflio: No hay futuro, no hay futuro. Entendi ento que isso quederrota uma pessoa, um pas.

    Em poca de transio, com abruptas mudanas de cenrio, previses

    categricas envelhecem. No tenho pretenso de fazer previses e sim de ajudar coaquilo que o meu ofcio me ensinou. Jornalista deve olhar os sinais, entrevistar quesabe, analisar os dados. Neste livro, uso as ferramentas que a profisso me deu para fazera prospeco das sementes do tempo que vir. Algumas delas j esto presentes entrens. Podem frutificar ou no. Tudo depende do mapa que seguirmos para chegar aoobjetivo. O futurlogo australiano Peter Ellyard diz em seu livro Destination 2050quens no podemos criar um futuro que inicialmente no imaginamos.

    Imaginemos o nosso sobre bases slidas, uma vez que tudo depende muito dasdecises que tomarmos. O curto prazo, s vezes, nos faz refns do pensamento negativo,mas possvel supor que o Brasil atingir nveis elevados de desenvolvimento nasprximas dcadas e que a populao, mais rica, menos desigual, ter acesso educaode qualidade. Que a economia ser mais forte, mantendo padres sustentveis decrescimento, e que o pas ser estratgico para o mundo como reserva de biodiversidadee fonte de alimentos.

    Alguns avanos esto em nossas mos. Em dez anos, o Brasil pode dobrar suproduo de gros, continuar elevando o volume das safras nos anos seguintes e, aomesmo tempo, alcanar o desmatamento lquido zero. Esse caminho est mapeado. Jsabemos como fazer. Somos o pas com maior biodiversidade no mundo, temos terra egua em abundncia. Parece uma afirmao alienada para quem tem em mente a crise

    hdrica de 2014-2015. O futuro de escassez, de risco de colapso de abastecimento, deconflitos entre entes federados pelo direito a rios comuns nos visitou. No mapa hdricoglobal, no entanto, aparecemos com a cor dos que tm maior abundncia de gua.Podemos superar o perigo se ouvirmos os avisos do tempo.

    O clima est mudando e isso afetar todas as dimenses da vida, da produono campo ao cotidiano nas cidades; da poltica internacional matriz energtica. Este opano de fundo inevitvel de quem quer se antecipar aos eventos das prximas dcadas.

    Para escrever este livro entrevistei, durante trs anos, profissionais de reasdiversas. Analisei, em duas longas reunies com a direo do IBGE e em conversas co

    outros trs especialistas, as estatsticas de populao. Alm de demgrafos, consulteieconomistas, climatologistas, bilogos, engenheiros florestais, especialistas e

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    agricultura, energia, educao, sade, poltica nacional e internacional, tecnologia. Livrios estudos e conferi dados. Procurei tambm pessoas que com suas histrias de vidilustrassem o que os nmeros mostram. Tive ajuda de uma equipe de jornalistascompetentes: lvaro Gribel, Valria Maniero e Dbora Thom. O futuro feito deincgnitas e surpresas, e de escolhas. A conjuntura muda constantemente, porm htendncias que j esto decididas.

    Na manh de uma semana confusa, eu fui ao 22oandar do prdio da Petrobras, no

    Centro do Rio de Janeiro, conversar com sua ento presidente, Graa Foster. A pautjornalstica estava ocupada por controvrsias sobre a maior empresa do Brasil. Asnotcias eram pssimas e era s o comeo. A crise pioraria muito nos meses seguintes.

    Este livro me ensinou a sobrevoar as emergncias dirias e a olhar alm do fatoimediato. Pedi uma conversa sobre os cenrios da estatal e do petrleo e durante um

    hora, 35 minutos e 32 segundos Graa respondeu s minhas perguntas sobre oplanejamento estratgico para 2030 com uma calma que no denunciava o tamanho dofosso do qual a empresa se aproximava. Eu desligava o gravador quando o presenteinvadiu como um blido a nossa conversa. Plido, um assessor interrompeu o encontroe disse:

    Eduardo Campos acaba de morrer num acidente areo.Era o trgico dia 13 de agosto de 2014, em que o pas perdeu um jove

    poltico com carreira promissora, que concorria Presidncia com a esperana de seruma alternativa polarizao PT PSDB. Um pedao do futuro poltico do pas acabav

    de desaparecer. Corremos, Graa, eu e Mirian Guaraciaba, ento assessora de imprensa,at a sala das secretrias, que, de p, estticas, tinham os olhos grudados na televiso.Assumimos a mesma posio de espanto.

    Uma nova etapa da eleio comeava a partir daquela tragdia, pensei, enquantome dirigia sede de O Globo. As oscilaes nas pesquisas foram intensas e os partidosque disputavam a Presidncia tiveram de refazer suas estratgias.

    Outras mudanas drsticas aconteceram nos seis meses seguintes. O preo dopetrleo caiu para um nvel que no estava no radar de nenhuma empresa do mundo.diretoria foi trocada e Graa perdeu o cargo. Uma agncia de risco rebaixou a nota destatal, ela perdeu o selo de bom investimento e passou a ser um ativo de risco. Parenfrentar a crise precisou alterar seu planejamento.

    Voc pode pensar que a entrevista foi perda de tempo porque muita coismudou na empresa e no mercado em que ela atua. Aprendi que, mesmo em um temponervoso, quando a terra treme, a utilidade de uma conversa sobre o longo prazopermanece. Baseada no no cargo que exercia, mas em sua experincia de 35 anos nosetor, Graa me disse que o Brasil ser um grande produtor de petrleo, o mundo vaiusar menos combustveis fsseis, haver um imposto mundial sobre emisses. Elpreviu a queda do preo do petrleo, mas pensava que ele cairia menos e mais tarde.

    Especialistas em energia ou em mudanas climticas dizem que o petrleo

    uma grande riqueza, mas temporria, e que o quadro energtico do mundo passar pormuitas transies nas prximas dcadas com a ampliao das fontes que emitem menos

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    gases de efeito estufa, como as que vm do vento e do sol.O presente intenso, a agenda est lotada de emergncias e a realidade

    internacional vive tendo reviravoltas. Ainda assim possvel e necessrio investigarevoluo mais provvel dos acontecimentos. Foi o que achei fascinante ao longo drealizao da pauta que me impus para este livro.

    A minha convico que o Brasil tem projeto, ao contrrio do que tantospensam, e o vem construindo por etapas. E que se tivermos clareza dos desafios, daschances e dos riscos que j esto contratados ser mais fcil nos prepararmos para eles.Cada avano exigiu um esforo enorme de construo de alianas modernizantes. Temosvivido uma histria de superao. A linha do tempo das ltimas dcadas mostra que opas passou bem por uma lista impressionante de desafios: venceu a ditadura,hiperinflao, passou a avaliar a qualidade da educao, rompeu a paralisia diante dexcluso de pobres e negros, reduziu a pobreza. Enfrenta a corrupo de formsurpreendente.

    Naquele 15 de novembro de 2013 em que os condenados do mensalo forapresos, o pas atravessou, meio incrdulo, uma barreira de indiscutvel importncia.

    da impunidade dos poderosos. Um ano depois, tambm em 15 de novembro, houveoutro fato inesperado: executivos de empreiteiras foram para a cadeia em meio aorumoroso caso da Petrobras. Algum pode concluir que o segundo caso mostra quenada se aprendeu com o mensalo. uma viso. A pessimista. Mas, pondere, ninguimaginava que enfrentar a corrupo na poltica fosse simples. Como no foram fceis asvitrias que tivemos sobre a ditadura e a hiperinflao.

    O brasileiro est insatisfeito com a democracia, desconfia dos polticos e achque o governo gasta mal o dinheiro que sai do seu bolso. Esse descontentamentofortalece a democracia e no o contrrio, e ele que far o pas continuar aperfeioando

    as instituies. No haver reforma que, por mgica, corrija todos os defeitos do sistempoltico, mas o pas passar nas prximas dcadas por vrias mudanas na forma devotar e de organizar a relao entre o eleitor e seu representante.

    O que hoje parece definitivo alterado a cada dia. Por isso o socilogoespanhol Manuel Castells, que sempre avisou sobre a formao de alianas digitais parinfluir no mundo poltico real, comea seu livro Redes de indignao e esperanacouma frase curta e sincera: Ningum esperava. Ele se referia s manifestaes queeclodiram em 2011 no mundo rabe. Os movimentos espalharam-se por contgio numundo ligado pela internet sem fio e caracterizado pela difuso rpida, viral de imagens eideias. Os desdobramentos dos fatos continuaram sendo inesperados, para o bem epara o mal. nesse mundo fluido, em que o especialista admite ter sido surpreendido,que temos de olhar para a frente e nos preparar para o novo tempo. Ele ser demudanas constantes. O mais instigante deste momento esta aparente contradio:vivemos o tempo do imprevisvel e nunca foi to importante pensar no futuro.

    A tecnologia est no meio de um processo revolucionrio que afetar todos osaspectos da vida. No livroA nova era digital, os presidentes do Google, Eric Schmidt,e do Google Ideas, Jared Cohen, preveem que, at 2025, a maior parte da populaomundial ter sado, em uma gerao, da quase total falta de acesso a informaes nofiltradas para o domnio de toda a informao do mundo atravs de um aparelho que

    cabe na palma da mo. Se o ritmo atual de inovao tecnolgica for mantido, a maiorida populao da Terra estar on-line. Isso est mudando o modo de vida a um

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    velocidade impressionante e com impactos em todas as reas.A sociedade brasileira foi assentada sobre a tragdia da escravido, que deixou

    sequelas que estamos comeando a enfrentar. Nenhum momento melhor do que agorpara olhar isso de frente, j que estamos melhorando: negros esto em plena ascenso,indgenas buscam protagonismo. A elite e a classe mdia tm que refletir melhordiversidade do pas e as distncias sociais precisam ser superadas. No final de 2014, fuicom meu filho Matheus a dois compromissos no espao de 24 horas. Na primeira noite,um evento no Cemitrio dos Pretos Novos, na Gamboa, Zona Porturia do Rio deaneiro; na segunda, uma festa no Copacabana Palace, na Zona Sul. Ele disse que pareciuma viagem entre dois mundos e no dois pontos da mesma cidade. Essa partio negnossa natureza e conspira contra o futuro.

    A paisagem demogrfica brasileira vai mudar radicalmente nas prximasdcadas. Este o primeiro sculo da nossa histria em que a populao vai diminuir. OBrasil ter ainda um aumento populacional at o fim dos anos 2030 e o comeo ddcada de 2040. Depois, o nmero de brasileiros comear a diminuir. Essas fortesoscilaes demogrficas exigiro muito dos governantes, das empresas, das famlias.

    No se negocia com a demografia. O que se pode fazer entend-la. A cadnova pesquisa do IBGE veremos a face do pas mudando: a populao viver mais,ficar mais velha e haver menos crianas. O setor da sade precisa ficar mais eficienteporque ela ser cada vez mais cara. Temos que nos preparar sabendo o que vaiacontecer. O futuro ser mais exigente e estamos atrasados. O pas pode ser levado aopior dos dilemas: escolher entre seus velhos e suas crianas. Ns nos aproximamos domximo de nmero de brasileiros e a populao est no auge da sua capacidadeprodutiva e de aprendizado. agora o momento das decises. Depois ser tarde.

    Foi extraordinrio o salto econmico e social que o Brasil deu nas primeiras dcadas ddemocracia. No futuro da moeda, que j comeou, as famlias precisam aprenderpoupar; as empresas, a depender menos do Estado; o governo, a tirar menos recursosda sociedade e ser mais eficiente. Quando, no primeiro mandato de Dilma Rousseff, ogoverno deu passos perigosos na economia, vrias pessoas me perguntaram se odescontrole inflacionrio voltaria. Respondi que no. No por otimismo em relao sescolhas das autoridades, mas sim confiana de que a populao brasileira no aceitaria

    volta ao tempo da hiperinflao. A moeda estvel a base de todos os avanoseconmicos e sociais desde 1994.

    H especialistas com os quais mais fcil conversar sobre o longo prazo, comoos climatologistas e os demgrafos. Em certas reas, entre elas a economia, mais difcil,porque o ambiente de crise cria muita nvoa e impede a viso. Um exerccio interessante separar no presente o que pertence ao passado, com o qual j se rompeu, e o que ocomeo do tempo novo, que devemos buscar. O inflacionismo velho. Mas a ideia deque se pode conviver com um pouco mais de inflao reapareceu e, recentemente,contaminou a poltica econmica. Isso provocou retrocessos e exigiu ajustes par

    retomar o caminho de reformas que nos preparem para novos desafios.Para separar o velho do novo pense no mercado de trabalho. Na terceirizao

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    h sinais dos dois elementos. Os flagrantes de trabalho anlogo escravido mostraque no foram suficientes os esforos para enterrar o passado. a terceirizao perversa.Mas existe uma nova e moderna. O tempo atual requer relaes trabalhistas maisflexveis entre empregadores e funcionrios, nas quais se incluem contratos coprestadores de servio. As novas modalidades nascem das mudanas da tecnologia e vomoldar o mundo do trabalho.

    A educao ser tema central em todos os dilogos no interior das casas, nasempresas e nos rgos pblicos em que as projees forem feitas com seriedade. udesafio para todos os pases do mundo, mas nesse setor o Brasil est mais atrasado quemuitos deles. S no final do sculo passado buscou a universalizao do EnsinoFundamental, a mais elementar das tarefas. As misses so mltiplas: melhorarqualidade do ensino, manter os jovens na escola, qualificar os trabalhadores, ampliarhorizontes, treinar as mentes para a era das revolues tecnolgica e cientfica. Oconhecimento no mais uma caixa de saber transferida de uma gerao para outra. Osalunos de hoje vivero em um tempo bastante diferente. A maneira como a mentefunciona est sofrendo uma mutao na passagem do mundo analgico para o digital. Se

    no houver reformas urgentes na educao deixaremos escapar nosso momento. Pasespodem fracassar, como sabemos. Se a economia se desorganizar, podemos voltarestabiliz-la. Se o pas no crescer por alguns anos, vamos procurar o impulso pararecuperao. Se perdermos os crebros de uma gerao, perderemos o futuro.

    E todos os desafios imediatos que esto na agenda brasileira precisam sersuperados em um cenrio internacional inquieto e em transio. O que est em curso no uma mera troca de comando no poder global, como houve no passado, com umpotncia emergente e outra poente. Uma nova ordem est nascendo.

    Os Estados Unidos continuaro sendo a maior potncia militar mundial. Al

    disso, o pas tem vasta dimenso territorial, mais de 300 milhes de habitantes,exuberante diversidade humana, slida capacidade tecnolgica e invejvel naturezinovadora e empreendedora. As grandes invenes que mudaram a nossa vida nasltimas dcadas nasceram, em sua maioria, em empresas americanas.

    A China continuar crescendo, em ritmo menor, e aumentar seu poder nomundo. Mas o pas tem enormes desafios pela frente para se manter no caminho doprogresso. Um deles atualizar seu sistema poltico para permitir maior participao doscidados nas decises. O sistema est obsoleto por qualquer parmetro contemporneo,ocidental ou oriental.

    At as democracias consolidadas esto sendo desafiadas pelo novo momento domundo digital. A internet permitiu a um simples funcionrio de uma empresterceirizada expor as fragilidades e os sigilos do mais poderoso sistema de espionagem.A divulgao dos arquivos secretos da NSA, dos Estados Unidos, confirmou a ficopoltica de George Orwell, em 1984, de um superpoder que tudo bisbilhota.conectividade, porm, tambm a arma do cidado contra ordens tirnicas e desmandos.Ela ser usada de forma cada vez mais intensa em todas as reas da atividade humana eter esta ambivalncia: de um lado cria o risco de governos e grandes corporaescontrolarem cidados e consumidores; de outro, arma as pessoas para que se protejam eencontrem as vulnerabilidades desses poderes.

    No sculo passado, o mundo viu o confronto de duas propostas de poder.Unio Sovitica perdeu. As duas grandes potncias atuais tm uma relao diferente d

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    que imperou na Guerra Fria. Estados Unidos e China so quase irmos siameses neconomia, j na poltica internacional, vivem em constante tenso. Esse conflitointerdependente atravessar o sculo XXI. Mas os dois pases no sero os nicosjogadores do poder global.

    O poder ser dividido, compartilhado, multipolar, com alianas estratgicas, eno ser apenas governamental. Na nova ordem, potncias mdias tero protagonismo.O Brasil ser determinante em vrios aspectos se souber entender a natureza da sufora. Podemos ser relevantes. preciso conhecer nossos atributos com objetividade esem ufanismos. Somos uma nao que, por natureza e dimenso, tem a chance de exercerinfluncia nos novos tempos. Vivemos a era das mudanas climticas e ela impordesafios extremos humanidade. O Brasil tem algumas das respostas por susuperioridade na rea florestal, na produo de alimentos e como fonte debiodiversidade. O nosso patrimnio ambiental ser aliado da mitigao do clima eceleiro das solues biotecnolgicas.

    O mundo completar nas prximas dcadas a maior onda de urbanizao dhistria. Em 2050, o planeta ter oito vezes mais pessoas nas cidades do que tinha n

    metade do sculo passado. O Brasil j fez grande parte da sua transferncia de populaoda rea rural para as cidades. Mas isso no reduz nosso desafio. S a RegioMetropolitana de So Paulo ter um acrscimo de populao equivalente a quase uUruguai at 2025. nas cidades que estaremos, e elas precisam ser mais amigveis.

    Quem escreve sobre o futuro marca um tempo de chegada. Essa a tendncidos estudos dos especialistas em qualquer rea. Aqui no haver data nica. Cada tempermite um horizonte: ora mais amplo, ora mais curto. Um economista, consultado pareste livro, me mandou, durante o tempo em que eu o escrevia, uma mensageperguntando se eu persistia no projeto de avaliar o mlp do Brasil. Economistas

    adoram siglas, e o que ele queria dizer era mdio e longo prazo. Sim, o esforo este,de tentar ver o mdio e o longo prazo do Brasil, sem qualquer ano mgico nem data dechegada, sem bola de cristal nem profecias.

    Este no um livro de futurologia. O que me motivou foi a pergunta: qual ocaminho que o Brasil tem de percorrer para ser o pas que quer ser? O exerccio aqui ode olhar o tempo. Em um pequeno artigo para a McKinsey, com o ttulo Shaping thefuture, o cientista poltico Joseph Nye usou uma frase que ele atribuiu ao jogador debeisebol Yogi Berra: Nunca faa previses particularmente sobre o futuro. O erromais comum nas projees considerar que a evoluo ser linear.

    Minha me trouxe da sua infncia rural uma capacidade misteriosa de investigaro clima. Nas grandes tempestades, ela conseguia dizer quando o sol chegaria; no culimpo de nuvens, ela lia o prenncio das chuvas. A vida urbana reduz a sensibilidade aossinais da natureza, mas o paralelo a ser feito que, se olharmos atentamente a cena atualdo pas, veremos no presente os vestgios do passado e os sinais antecipados do futuro.Isso permite aprender com o que foi vivido e interferir no que est por vir. Mesmonuma era de transies e de grandes rupturas.

    O convite que fao aos leitores o de seguir comigo a linha nada lineardo tempo que nos trouxe do passado ao presente e nos levar ao futuro. No porpredestinao, mas por escolha.

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    Na Amaznia, foi desmatada uma rea equivalente aos estados de Rio deJaneiro, So Paulo e Esprito Santo nos 20 anos entre as duas grandesCpulas da Terra do Rio, em 1992 e 2012. Neste captulo, conto como seforma o conluio do crime que desmata e como se organiza a coalizo daproteo. Entendi as duas lgicas em viagens Amaznia. Relato ahistria de um projeto plantado em 1944 que d frutos hoje e se projetapara os prximos 30 anos na Mata Atlntica. No meio ambiente do pas,passado e futuro convivem. Assumimos compromissos internacionaisde, at 2020, limitar o desmatamento mdio anual a 3.300 quilmetrosquadrados. Isso equivale a duas vezes a cidade de So Paulo. Podemosser mais ousados, sonhar mais alto e buscar, a curto prazo, odesmatamento lquido zero. H 18 pases que tm 70% da biodiversidadedo planeta. O Brasil o maior de todos. O clima da Terra depende muitode ns.

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    O Brasil assumiu em Copenhague, em 2009, na reunio global do clima, ocompromisso de, entre 2016 e 2020, reduzir para 3.300 quilmetros quadrados a mdianual do desmatamento na Amaznia. No difcil, mas insuficiente. J derrubamostaxa de 27 mil quilmetros quadrados, em 2004, para 5 mil quilmetros quadrados, dez

    anos depois. Se chegarmos mdia de 3.300 estar bom? No. Seria considerar umvitria destruir uma regio equivalente a duas cidades de So Paulo por ano.

    A grande meta que o pas precisa ter com seu prprio povo o desmatamentolquido zero, que na prtica significa o seguinte: reduzir a uma taxa bem pequena e fazero replantio para que, no final, tudo fique na mesma proporo. O zero uma conta entrecorte cada vez menor e replantio. A meta alcanvel. E no preciso esperar 2030. Eume convenci disso conversando com especialistas, procuradores, autoridades locais,ambientalistas, climatologistas, produtores rurais e viajando pelo Brasil parcompreender como aconteceram alguns casos antigos e recentes de conservao e

    destruio. Essa luta entre proteo e desmatamento o que contarei neste captulo parque se entenda a sua lgica. Ningum quer paralisar o desenvolvimento, mas encontraruma nova ordem para o progresso. A sustentvel. A que proteja a terra que recebemospor herana.

    Depois de oito anos de queda sistemtica do ndice de destruio da florestamaznica, ele voltou a crescer. Entre agosto de 2012 e julho de 2013, aumentou 29%.Entre agosto de 2013 e julho de 2014 caiu um pouco. Nos meses de agosto a outubrode 2014, subiu 117% em relao a igual perodo do ano anterior. Em novembro edezembro caiu, mas em janeiro de 2015 subiu forte. Esse sobe e desce mostra o risco deretrocesso, porque o problema vinha diminuindo sistematicamente desde 2004. Ogoverno, disputando as eleies presidenciais, passou a esconder os dados de alerta e2014. Existem dois sistemas que processam os dados de satlites: o Prodes d o nmeroanual; o Deter d os alertas mensais. No adiantou esconder porque o Imazon, umorganizao cientfica no governamental, processa os mesmos dados num sistemprprio. Ele avisou os jornalistas sobre os nmeros sonegados. Tem feito isso h muitotempo.

    Quando saram os dados do alerta em 2012, houve um esforo para conter oestrago. Eu fui Amaznia para entender como, na prtica, funciona o mecanismo dealerta e preveno. Aprendi muito. Contarei aqui, mas antes quero explicar por que tod

    essa luta entre passado e presente definir o futuro. Somos ricos em biodiversidade. No sensato destruir a riqueza herdada quando mais se precisa dela. O tempo est virando ens e o planeta precisamos da floresta em p. Os nmeros que Beto Verssimo, doImazon, informa so impressionantes:

    H na Amaznia 16 mil espcies de rvores. Desse total, 5,8 mil soconsideradas raras e endmicas, ou seja, altamente vulnerveis extino com o avanodo desmatamento. Esto em p 400 bilhes de rvores e at agora 70 bilhes j foraderrubados me disse ele em maro de 2015.

    Fiz, certa vez, uma trilha de 11 quilmetros no Canad. Bonita e tediosa. Todas

    as rvores pareciam ser conferas ou maple trees. O caminho era largo, previsvel. Nasmatas e florestas do Brasil anda-se extasiado e alerta. Tudo pode acontecer a qualquer

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    momento. Os olhos tm que estar atentos ao cho para no pisar em perigo, aos lados,para o necessrio desvio, e aos riscos que podem vir de cima. H vida por toda parte.Imprevisibilidades e bloqueios. A natureza nos coloca no nosso devido lugar. Somospequenos.

    A Amaznia ainda resiste em sua imensido, mas ns sabemos do que somoscapazes porque hoje, da Mata Atlntica, s restam fragmentos. Somos perigosos. Muitosbrasileiros, contudo, durante a trajetria de destruio do patrimnio natural, tm refeitoo desfeito por paixo ou teimosia. As histrias virtuosas ensinam. Comearei por elas.

    Para que se plantam rvores? Na esperana de que elas vejam um futuro quens no poderemos ver e que sejam vistas pelos que ainda no nasceram. Llia Salgado eo marido, Sebastio, plantaram 2 milhes de mudas de espcies nativas da Mata Atlnticna Fazenda Bulco, em Aymors, Minas Gerais. O casal mora em Paris desde 1968. Los dois trabalham, vivem perto dos filhos, Juliano e Rodrigo, e ele virou o maisimportante fotgrafo da atualidade.

    Por que Sebastio e Llia, moradores de Paris e cidados do mundo, plantarvores numa cidade pequena em Minas Gerais, prxima do Esprito Santo? Ele nasceu

    l. Naquela fazenda passou sua infncia e viu que ela foi perdendo rvores, vida, gua aolongo do tempo, pela imposio da produo. Quando comprou a parte das irms noesplio, Sebastio no sabia o que fazer diante de uma terra seca, devastada. Foi de Llia ideia de repor o que havia sido tirado e plantar uma floresta.

    Quinze anos depois de iniciado o plantio, os dois falaram, entusiasmados, dofeito de que se orgulham numa entrevista gravada no Jardim Botnico do Rio de Janeiro,cercados de rvores de vrias partes do mundo e que comearam a ser plantadas notempo de dom Joo VI.

    Hoje somos donos de uma floresta-criana disse Sebastio.

    Eles criaram o Instituto Terra, que, entre outros trabalhos, est agorrecuperando as matas ciliares de toda a bacia do rio Doce, para lutar contra a ameaa de orio deixar de ser perene em 20 anos, ou seja, secar em partes do leito e em perodos doano. Eles tm esperana de que suas mudas ajudem a proteg-lo e evitem esse destino.

    Tudo isso lindo, mesmo assim fica a dvida. Por que gastar dinheiro, tempo,energia plantando rvores que no veremos em sua maturidade num pas onde sodirias as notcias de desmatamento?

    Ns no temos a menor importncia. Ns passaremos e seremosesquecidos, mas elas continuaro aqui explicou Llia.

    No Brasil, h casos emocionantes de conservao e trgicos enredos dedestruio. impossvel ficar indiferente a essa luta. Neste livro no cabero todos,apenas alguns, emblemticos e surpreendentes. E veja, leitor, que falarei do passado nulivro que se dispe para o futuro. que l atrs foi plantada a semente da rvorefrondosa de hoje. Esse entendimento nos ajuda a escolher as sementes do nosso futuro.

    A histria que vou contar agora comeou h muito tempo e se projeta para ofuturo. Era o remoto ano de 1944. O jovem Feliciano Miguel Abdala, de 36 anos, filhode um libans, negociava com um senhor de apelido Benzinho a compra de uma fazendem Caratinga, Minas Gerais, quando ouviu um pedido inusitado: que ele no permitissea derrubada de uma grande rea de floresta. Naquela poca, terras eram compradas e

    vendidas intensamente na Zona da Mata, uma das fronteiras agropecurias, e ningupedia uma coisa daquelas. Afinal, Feliciano estava deixando a vida de tropeiro, mercador

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    viajante, para ser proprietrio de terras, produtor de caf, leite e carne da pecuria.Em 1944, ningum considerava a hiptese de preservar matas. Era comprar

    para fazer pasto, plantar, ganhar dinheiro. Era a escalada da destruio da Mata Atlntica.Este o primeiro espanto de um caso cheio de surpresas: Benzinho e Feliciano fizeram opacto da venda com a condio verbal de preservao. O motivo? que na mata havimacacos muriqui e eles estavam desaparecendo pela ao dos caadores.

    Tinha uns oito ou dez, e a pessoa que me vendeu falou comigo: Veja se vocconserva esses animais. Isso est desaparecendo e daqui a pouco ningum conhece isso.Eu disse: Se o senhor est recomendando se o senhor conservador eu sou maisconservador, sou por natureza, porque eu admiro demais principalmente a fauna. Semfauna, a mata no fica completa. Vou defender os bichos com toda a energia minha, cotodo o esforo, lembrou Feliciano numa entrevista em 1992 ao Globo Ruralquase 50anos depois da compra.

    Homem de palavra, Feliciano cumpriu a promessa feita ao senhor Benzinho atmorrer, em 2000, com a idade de 92 anos. E ela foi mantida por seus descendentes, quetransformaram os quase mil hectares de mata nativa em Reserva Particular do Patrimnio

    Natural. O local virou santurio de vrios animais, principalmente dos muriquis donorte, espcie em risco de extino, e se transformou em centro de pesquisa que, hdcadas, treina bilogos.

    No fim de 2013, eu estava na Pinacoteca de So Paulo ouvindo uma palestra dodiretor da Global Environment Facility, o fundo do Banco Mundial para a conservao,Gustavo Fonseca, e ele comeou assim a sua fala:

    Eu fiz minha tese de doutorado na RPPN Feliciano Miguel Abdala.Mas at isso pouco para dar a dimenso dos galhos nascidos dessa rvore

    plantada por aquele raro pacto de preservao. Por dcadas, Feliciano Miguel Abdal

    lutou sozinho contra os caadores e as poderosas razes da economia com toda a energidele. Madeireiras se instalaram por l. Nos anos 1970, chegaram as siderrgicas, copilhas de dinheiro pblico e a lgica da propaganda oficial que as sustentava: Poluio progresso, diziam os anncios governamentais. Seus fornos queimaram boa parte dosremanescentes de mata daquela regio. Eu resisti a ofertas muito importantes dassiderrgicas a respeito do carvo. Tentaram me comprar a fazenda ou o carvo. Nada meinteressou. Consegui resistir a essas ofertas tentadoras. E a mata est a. Espero que eltenha continuidade.

    Dez anos antes daquele Globo Rural, no comeo da dcada de 1980, FelicianoAbdala andava pela mata da sua Fazenda Montes Claros. Atrs dele vinha uma cmerregistrando. Junto com ele estava um jovem primatlogo americano, RussellMittermeier. A cmera filmava a caminhada de Feliciano at um enorme jequitib-rosa, el Feliciano encostava a mo na rvore e falava: Esta uma rvore milenria das matasdo Brasil. Seria um crime essa rvore ser cortada em troca de poucos cruzeiros.

    Nada, aparentemente, ligaria Feliciano ao jovem primatlogo que oacompanhava naquela filmagem. Feliciano viveu a vida inteira no interior do Brasil.Mittermeier nasceu em Nova York e tudo o que ele conhecia de vida silvestre at a idadeadulta era o zoolgico da cidade, aonde sua me costumava lev-lo. Mittermeier fez domundo inteiro a sua casa, aprendeu seis idiomas, tornou-se um dos maiores

    conservacionistas do mundo, tendo fundado as ONGs WWF e ConservationInternational. A revistaTimedeu a ele o ttulo de Heri para o Planeta. Quem fez a unio

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    dos dois seres humanos, diferentes em tudo, foi o macaco. Feliciano enfrentou bala oscaadores para evitar sua extino. No ano daquela filmagem, a populao j havicrescido para 40, 50 indivduos. O nmero de macacos havia aumentado sob a proteodo fazendeiro.

    A notcia de que havia uma fazenda onde espcies do primata em extinosobreviviam foi ouvida pelos cientistas. Os brasileiros Clio Valle e Adhemar Coimbra eat um pesquisador japons fizeram os primeiros estudos l. Naquele momento dcaminhada do fazendeiro at a sua rvore favorita estava sendo filmado o Cry of the

    Muriqui. Esse documentrio, de 25 minutos, narrado por um professor de Mittermeier,Andrew Young, de Harvard, foi fundamental para unir cincia e proteo. Young tinhuma aluna de doutorado procura de um objeto de estudo: Karen Strier. Seu mestradohavia sido sobre os babunos na frica. Ela viu o filme e veio conhecer os muriquis e1982. Voltou para fazer a pesquisa de sua tese em 1983.

    de Karen Strier a autoria dos estudos que revelaram o comportamento dessemacaco, em tudo singular. Em tamanho, o maior das Amricas. Um adulto podechegar a 1,3 metro. Ele no agressivo, nos seus grupos no h macho dominante,

    animais dos dois sexos tm o mesmo tamanho. Nessa sociedade igualitria so as fmeasque tomam a iniciativa de deixar o bando para procriar em outra comunidade. Omuriqui o mais eficiente dispersor de sementes da Mata Atlntica.

    A sabedoria de Feliciano foi que, ao proteger o macaco, estava tambpreservando um dos maiores fragmentos privados da cobertura vegetal dominante etodo o litoral brasileiro na poca em que chegaram os portugueses. Em 1992, nentrevista ao Globo Rural, ele demonstrou que tinha noo do tempo antes dele e doque viria aps a sua morte. Estou com 84 anos, e o que eu desejo e tenho todointeresse que essa mata seja preservada porque aqui est a imagem do que era

    poderosa Mata Atlntica, destruda criminosamente pelo machado e pelo fogo. O maisimportante livro sobre a devastao da Mata Atlntica chama-seA ferro e fogo. Foiescrito pelo historiador americano Warren Dean. leitura que ilustra como o pasdestruiu, na maioria das vezes por escolhas econmicas insensatas, um patrimnio quenos faz falta.

    Um dos artigos cientficos de Karen, hoje integrante da seleta AcademiNacional de Cincias dos Estados Unidos, teve o ttulo de O mito do primata tpico.Nele, ela provou que o padro de comportamento dos primatas conhecidos do VelhoMundo no era, necessariamente, o mesmo das espcies de outras partes do planeta. Omuriqui, por exemplo, contrariava todo o esteretipo com aquela igualdade de gnero.Seu artigo quebrou um paradigma e marcou o estudo dos primatas.

    Hoje os muriquis de Caratinga so notcia internacional. J fiz reportagens porl. Indefinvel o prazer de levantar s quatro s para esperar o sol nascer e o lentoacordar dos muriquis. O macaco carismtico. Vale a pena andar durante horas apenaspara receber de volta seu olhar curioso, admirar seu bal entre as rvores e ver asdiferenas de suas faces, pois cada indivduo tem uma despigmentao na face que odiferencia. O reforo da cincia foi poderoso nesse caso. Eles j chegam a 350indivduos e fortaleceram a mata por seus hbitos de andar muito, comer muito e assidisseminar as sementes. Vrias outras espcies de animais e vegetais aumentaram ness

    mata que , em tudo, exemplar.Em 2013, Karen completou 30 anos liderando pesquisas e treinamento de

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    estudantes brasileiros na Estao Biolgica Feliciano Miguel Abdala. A cidadecomemorou com uma reunio de autoridades e cientistas beira da mata para pensar ofuturo: foi o Caratinga+30. L estava Mittermeier, mais de trs dcadas aps a filmagecom Feliciano, encantado com a multiplicao do macaco ameaado.

    incrvel o que aconteceu aqui me disse ele.No comum no Brasil a pesquisa de longa durao, ainda mais num

    propriedade privada. Naqueles 30 anos, mais de 24 dissertaes de mestrado, seis tesesde doutorado e trs de ps-doutorado, alm de uma centena de artigos cientficos,tiveram aqueles macacos e a terra protegida por Feliciano como base de dados. Foi ocasamento perfeito entre cincia e conservao, levando para o futuro o improvvelacordo feito em 1944 entre dois fazendeiros. menos comum ainda uma cidade usar uprojeto de conservao para refletir sobre seus sonhos.

    Crianas da cidade entregaram um plano para que o prefeito se comprometessecom o meio ambiente nos 30 anos seguintes. Se for cumprido pelas futurasadministraes, algo que comeou em 1944 se prolongar at 2044. Entre as vriaslies que podem ser tiradas desse caso que as escolhas mantidas com persistncia t

    efeitos que se prolongam e alcanam o futuro. Isso me ajudou aqui neste livro, que querolhar para as prximas dcadas. O que fizermos agora estar contido no tempo que estpor vir.

    Eu sei, no por ouvir dizer, mas por ver. Nasci em Caratinga, visitei esseparaso na infncia e voltei como jornalista para registrar a evoluo desse incrvelenredo. O desafio agora construir corredores ecolgicos que liguem aquele fragmentoa parques nacionais e reservas particulares da regio. O que antes protegia os muriquis,hoje os confina. Para garantir que sobrevivam e que nossos descendentes possam v-losser preciso ampliar seu territrio. Ao fazer isso, o ser humano estar ajudando a si

    mesmo. Existem somente 8% da cobertura original da Mata Atlntica, e o muriquiajudar no esforo de mant-la. Em tempos de mudana climtica o bioma no qual oBrasil instalou a maioria das suas cidades precisa ser recuperado para atenuar os efeitosextremos do clima, fortalecer os rios, proteger a vida urbana.

    Tudo isso ensina que atos de um passado distante influenciam a vida hoje. agora que se faz o futuro. Uma parte dele j est determinada pelas escolhas que fizemosno passado. A diversidade uma fortuna do Brasil. Fortuna riqueza e sorte. RussellMittermeier desenvolveu o conceito de pases megadiversos. A tese a seguinte: entreos quase 200 pases do mundo h apenas 18 nessa categoria. E eles tm 70% dbiodiversidade do planeta Terra.

    Nessa lista pequena de pases, o Brasil disputa o primeiro lugar comIndonsia. O Brasil tem mais diversidade terrestre e de gua doce, a Indonsia tem upouco mais de diversidade marinha me disse Mittermeier.

    Ele, que viaja pelo mundo, est convencido de que ns protegemos nossopatrimnio de forma mais eficiente e sria do que a maioria dos pases. Quem vaiAmaznia tende a ficar com sentimentos mistos. O Brasil conservou uma enormeriqueza, mas a tem destrudo num ritmo inaceitvel. H casos que encorajam; em vriosoutros momentos, porm, parece que o pas est escolhendo repetir na sua maior floresto que fez com a mata do litoral.

    Fica-se com a impresso, ao atravessar as pginas do livro de Warren Deansobre a Mata Atlntica, que retomamos a mesma marcha da insensatez, agora n

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    Amaznia. Se era para abrir espao para a urbanizao, a supresso de parte da vegetaonativa poderia ter sido realizada de outra forma, alavancando a produo de riquezas. Ecertamente foi insensato pr a mata abaixo, fazendo terra arrasada e espalhandovoorocas, reas degradadas, e instalando cidades sem as reas verdes necessrias para oequilbrio do clima e a qualidade de vida. Fizemos cidades impermeabilizando o solo esoterrando os rios e, assim, aumentamos os riscos de alagamento nas chuvas fortes e deescassez de gua nas secas. As mortes se repetem a cada estao de chuvas; as secas nosameaam. A insensatez tem um alto preo.

    Foi com o sonho de evitar a repetio da tragdia ambiental da Mata Atlntica que oagrnomo nascido na Paraba Beto Verssimo desembarcou com sua juventude e seuentusiasmo em Belm do Par, em 1985. Hoje um dos mais respeitados especialistasem Amaznia. cofundador e pesquisador snior do Imazon. A organizao cientfic

    monitora a floresta com preciso e uma assombrosa base de dados. Ele capaz de dizercada dois dias o que foi desmatado na Amaznia brasileira. Os computadores do seuinstituto baixam as imagens captadas pelos satlites da Nasa que circulam em torno dTerra. Ao final de um ms, eles compilam imagens de 16 passagens da Nasa sobreAmaznia. Isso resumido no dado mensal de aumento ou queda.

    O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, o Inpe, faz o mesmomonitoramento, usando essa base de dados para produzir o nmero oficial dedesmatamento. No h redundncia entre Inpe e Imazon. Eles se complementam. OImazon tem tambm longa tradio de orientar polticas pblicas. Se algum fato graveacontece, ele informa aos rgos que lutam contra a destruio da floresta. Numa dasentrevistas que fiz para este livro com Beto Verssimo, no Imazon, perguntei, para ternoo da dimenso da nossa riqueza:

    Qual pas no mundo tem tanta floresta tropical quanto o Brasil? Ningum tem. O Brasil , disparado, o pas que tem mais floresta tropical

    afirmou, taxativo, e despejou sobre mim um volume amaznico de dados.O mundo tem 1 bilho de hectares de florestas tropicais, metade a Amaznia.

    Do total das florestas tropicais do mundo, 35% esto no Brasil. Bolvia, Colmbia,Venezuela, Peru, Equador, Suriname e Guianas dividem outros 15%. No Brasil, algunsestados tm dimenso de pas. O estado do Par, sozinho, maior do que a Bolvia ou

    Colmbia. Se compararmos com a Europa, o Par do tamanho de Espanha, Frana eItlia, somadas. A Venezuela do tamanho de Mato Grosso. O Amazonas equivaleIndonsia, que o segundo pas com mais floresta tropical algo como 13% do total.Uma diferena gritante entre o pas asitico e o estado brasileiro: em 1,7 milho dequilmetros quadrados do territrio da Indonsia vivem 220 milhes de habitantes; oAmazonas tem 3 milhes de habitantes. Beto gosta de repetir uma frase perfeita:

    Os brasileiros no conhecem a Amaznia, mas ela o passaporte para onosso futuro.

    Maior, mais preservada, mais bem-monitorada, com forte diversidade tnica,

    Amaznia brasileira o palco da grande luta para civilizar o desenvolvimento do Brasil.No rastro do desmatamento da floresta caminha o crime. Vrios crimes. Grilagem,

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    destruio do patrimnio natural, trabalho escravo, assassinatos em disputas de terresto sempre juntos. uma espcie de consrcio de crimes.

    H tambm histrias animadoras de formao de alianas modernizantes, cujtrilha venho seguindo. O futuro chega assim. Ele d sinais antecipados de que tententrar em cena por meio dessas coalizes entre a informao cientfica, rgos derepresso e lideranas polticas e empresariais modernas. No Par, uma aliana comeouna cidade de Paragominas, que depois virou um movimento, o dos municpios verdes.

    Numa das viagens que fiz Amaznia para colher subsdios para este livro, vio primeiro sinal de um fato que seria confirmado pelo governo 15 meses depois. Ele revelador das duas lgicas: a do desmatamento e a da luta pela preservao.

    Nos dez primeiros dias de agosto de 2012, os computadores do Imazonmostraram novos focos de desmatamento em alguns pontos da regio, principalmente nFloresta Nacional de Jamanxin, no sul do Par. O Imazon imediatamente informou aoIbama local, ao Ministrio Pblico do Par e ao governo do estado. Eles se organizarae foram para a rea que as imagens mostravam. Chegaram a tempo de ver o estrago. Eamanxin, naquele ano, foram derrubados 43 quilmetros quadrados de mata. Para se ter

    uma ideia, o municpio de Paragominas do tamanho de Alagoas e desmatara uquilmetro quadrado naquele ano.

    Nas estatsticas de desmatamento, o ano se calcula de agosto a julho. Em 2013,veio a conta daquele movimento visto desde o incio pelo Imazon: ele crescera em 2013,depois de uma dcada de queda. O principal culpado fora o governo federal, embora osagentes do Estado tenham lutado contra a destruio. interessante entender essa lgicpara ver a complexidade do assunto. Nada simples na Amaznia, nada fcil no Brasil.

    O erro foi que em 2011 o governo comeara a admitir a reviso dos limites deamanxin. Diante da reclamao de alguns ocupantes ilegais, concordara em reduzi-los

    em 90 mil hectares; eles queriam diminuir em 400 mil, de um total de 1,1 milho.Depois, por Medida Provisria, o governo Dilma Rousseff diminuiu o tamanho dasunidades de conservao prximas ao rio Tapajs para construir hidreltricas. Asunidades de conservao so reas pblicas legalmente protegidas como os parquesnacionais, florestas nacionais, terras indgenas e reservas.

    Na Amaznia acontece como nos filmes de faroeste: quem pisca primeiro,morre. Toda vez que o governo aceita rever os limites de um territrio preservado, osocupantes ilegais invadem novas reas para for-lo a aceitar mais fato consumado. Npoca, o Congresso estava no meio da discusso sobre o Cdigo Florestal, que dividiambientalistas e ruralistas e acabou sendo aprovado com muitas concesses, inclusiveuma anistia de grande parte do desmatamento j feito. Isso animou novos desmatadores.

    As hidreltricas do rio Madeira estavam sendo construdas. Mas eram feitascom muito dinheiro pblico, com custos crescentes, e foi preciso pr a Fora Nacionalno canteiro de obras da usina de Jirau para controlar os trabalhadores. E a de BeloMonte, que era ainda mais polmica, s teve sua licena ambiental expedida pelo Ibamaps a demisso de dois presidentes do rgo. Os sinais que saam de Braslia eratodos no sentido de construir as barragens a qualquer custo financeiro e ambiental.

    A floresta ardeu durante todo o vero amaznico de 2012 em duas reas: nosudoeste do Par e no sudeste do Amazonas. Os seguidos alertas do Imazon fora

    negados em Braslia. O corao do crime estava em Novo Progresso, no Par, e Apu,no Amazonas. Em Apu foi resultado da presso de madeireiros e pecuaristas. Em Novo

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    Progresso, onde fica Jamanxin, a oportunidade foi criada por obras e piscadas oficiais: oasfaltamento da BR-163, que liga Cuiab (MT) a Santarm (PA) e a deciso do governode reduzir as reas protegidas para tornar viveis os projetos das hidreltricas. Postoassim parece que a nica forma de impedir a destruio o governo no fazer qualquerobra. No isso. Novos empreendimentos sero feitos no futuro, mas necessrioprevenir a repetio da dinmica j conhecida de que, atrs das obras, avanadestruio.

    Foi pensando nisso que, no comeo do governo Lula, a ministra Marina Silvfoi ao gabinete do presidente para conversar sobre o asfaltamento da BR-163. O projetoia comear. Marina convenceu Lula de que era necessrio criar unidades de conservaoao longo de toda a rodovia, para impor um freio dinmica que leva ao desmatamentodas margens de qualquer estrada na Amaznia. Era uma tentativa de evitar o que sempreocorrera em todas as rodovias abertas na regio.

    Olhando por cima, em sobrevoos, a gente pode ver o efeito das estradas. Elasdesenham no solo uma espinha de peixe. Cada costela que sai do osso central umestrada ilegal que vai para alguma rea grilada. O projeto naquela poca foi criar

    unidades de conservao e fortalecer as reas protegidas. Jamanxin, por exemplo, foicriada em 2006.

    O governo deu um passo sbio e no deu o seguinte. Colocou no papel enunca implementou. No perodo Dilma, passou-se a desfazer o que havia sido feito nosgovernos anteriores, de Lula e Fernando Henrique. Medidas Provisrias para a reduode algumas reas protegidas foram enviadas ao Congresso. Isso que, no jargo do setor, conhecido pelo feioso nome de desafetao produziu uma corrida ao ouro. Nosgovernos Fernando Henrique foram criadas 81 unidades de conservao, ou 20,8milhes de hectares; nos governos Lula, 77 reas protegendo 26,8 milhes de hectares.

    No primeiro mandato de Dilma, foram anunciadas apenas seis unidades no total, trs nAmaznia. Ao todo, 102 mil hectares. S no foi pior que o general Ernesto Geisel, queno criou unidade alguma. Dilma anunciou suas trs unidades na Amaznia apenas ncampanha para o segundo mandato.

    Os sinais dados pelo governo alimentaram a ganncia do crime. O grileiro,sabendo que uma parte ser desafetada, ocupa uma rea ainda maior e vai tomandopropriedade pblica. Normalmente, a grilagem trabalha na expectativa de que o crimeno ser punido ou de que ele pode ir construindo devagar a impresso de legalidade. Ogrileiro invade uma rea, desmata uma parte, em geral perto de uma estrada, e instala nolocal algum como laranja. Explora diretamente com gado. No incio, pe algumascabeas s para fazer de conta que rea produtiva. Depois comea a pedir documentosestaduais.

    Alguns pagam impostos e taxas. Com um documento aqui, uma guia ali,impostos comeando a ser pagos, escrituras frias obtidas em cartrio, ele vai jogandocom o tempo. Tudo comea a dar ares de legalidade ao que fruto de crime. Quem forao local encontrar um laranja, dificilmente o dono. Um dia a rea vendida paralgum que dir s autoridades que o empreendimento estava ali h muito tempo e queele comprou de boa-f. Entidades de agricultores os defendero, deputados e senadoresruralistas se mobilizaro para brigar por seus interesses. E assim o grileiro privatiza o

    que de todos e avana na destruio do patrimnio ambiental.Antes de prosseguir, quero contar o que houve com aquelas informaes

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    captadas pelos computadores do Imazon, em agosto de 2012. A sensao que se tinha erde retrocesso e de se estar diante de uma nova corrida ao ouro na Amaznia. Os dadosconfirmaram depois que no era s sensao.

    Nas proximidades da hidreltrica de Belo Monte em construo, uma emprescanadense se instalara para explorar ouro de fcil acesso. Na Floresta Nacional deamanxin, os pecuaristas invadiam a terra pblica, o crime se instalava em vrios pontosseguindo quatro incentivos: o governo reduzia reas protegidas para viabilizarhidreltricas; o Cdigo Florestal facilitava legalizar o que havia sido feito de forma ilegal;uma grande seca nos Estados Unidos elevara o preo da soja; os produtores, codinheiro na mo, queriam mais terra.

    A lgica econmica implacvel. Num ambiente assim aumenta a especulao.O grileiro corre risco quando invade terra pblica, desmata, queima e coloca o gado.Custa caro. Ele precisa das chances de sucesso para arriscar. Se tudo der certo, ele vendepara produtores de gros ou de gado como terra j usada. Em seguida, procura novasreas. Em alguns lugares circulavam rumores de descoberta de ouro e at diamantes.Isso atrai novos invasores. As hidreltricas tambm atraem brasileiros de vrias partes

    do pas. Ao fim da obra, eles ficam por l. Quem conseguiu poupar vai ficar, ocupandoalgum pedao de terra.

    Tudo isso estava invertendo a curva de desmatamento, que vinha caindo desde2004. Os primeiros sinais da inverso foram repassados pelo Imazon ao Ibama do Parnaquele agosto.

    No adianta sair assim ao lu procurando desmatamento. preciso usartecnologia me explicou Paulo Maus, do Ibama de Belm; ele faz parte de um novogrupo de funcionrios do rgo, determinados a mudar a realidade.

    O nome da cidade onde as imagens de satlite apontaram um foco era Novo

    Progresso, no sudoeste do Par. Uma equipe do governo, Ibama, Polcia Federal,Secretaria de Fazenda, Secretaria do Meio Ambiente e do Ministrio do Trabalho foi paro local, numa operao com o sugestivo nome de Labaredas. Quando Paulo Maus,funcionrio do Ibama desde 2007, desembarcou em Novo Progresso, no dia 13 deagosto de 2012, o fogo ainda queimava as rvores da Floresta Nacional de Jamanxin. Seuma rea declarada Floresta Nacional significa que protegida. No pode sercomprada, vendida, ocupada nem desmatada. terra de todos, mas nela os criminososentram como se fosse terra de ningum.

    Achamos tambm os documentos mostrando que eles tinham programadoderrubar 4.500 hectares dentro da Floresta Nacional de Jamanxin. Como possvel umcoisa dessas? propriedade do povo brasileiro, como que algum acha que podeentrar, derrubar tudo e tocar fogo? espanta-se ainda Paulo Maus.

    Nessa viagem, houve momentos de tenso, principalmente numa noite em quefuncionrios pblicos desarmados aguardavam no meio do mato a chegada da polcia,correndo risco de emboscada. Enquanto isso, em Braslia, o governo admitia negociarcom os ocupantes ilegais a reviso das fronteiras das unidades de conservao. Essdualidade, do prprio governo, existe em toda a Amaznia. A parte do Estado que tentchegar ao criminoso se depara com dificuldades.

    Quem desmata o trabalhador de algum que s vezes foi contratado por

    uma terceira pessoa. Eles so to vtimas quanto o pas, que perde uma riqueza coletivapropriada por uma pessoa disse Maus.

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    Em um dos flagrantes em Jamanxin, foram localizados 800 hectares que tinhaacabado de ser desmatados. No local, foram encontradas 47 pessoas trabalhando serespeito aos mais elementares direitos trabalhistas. O quadro tinha todas as caractersticasde trabalho anlogo ao escravo. Pessoas trazidas de longe, mantidas em local do qual nose consegue sair e exploradas pelo sistema de dvida contrada com o empregador.

    O paraense Paulo Maus comandou a operao em que tambm atuaram fiscaisda Delegacia Regional do Ministrio do Trabalho. Foi quando o Ibama invejou a fordas leis trabalhistas.

    Eu fiquei sonhando com o dia em que a lei ambiental seja to forte quantoustia do Trabalho. Eles simplesmente agem ali na hora. Abriram uma pasta cheia decarteiras de trabalho. No incio, os trabalhadores ficaram desconfiados, mas os fiscaisforam explicando: Rapaz, voc no pode beber essa gua nem dormir nessas condies,voc pode contrair doenas. No tem que pagar pelos instrumentos de trabalho. Tedinheiro a receber. Essa dvida no existe. Aos poucos, os homens vo confiando econtam tudo. Normalmente aquelas pessoas no iriam se indispor com os patres indoao Ministrio do Trabalho, mas diferente quando a autoridade est na frente deles.

    Vimos a lista de registro dos salrios. Eles pagavam por um sabonete R$ 7,00. Pagavapela motosserra e pela gasolina da motosserra. Um salrio que comeava em R$ 500,00terminava o ms em menos R$ 35,00. O trabalhador ficava devendo esses R$ 35,00.

    Esse truque velho, velho. Adolescente, lia horrorizada a descrio dessmesma artimanha de aprisionamento nos armazns das fazendas de cacau nos livros deorge Amado. Como o escravagismo pde resistir tanto? Os fiscais foram calculando oque cada um tinha a receber, obrigavam a assinar as carteiras com datas retroativas emandavam pagar ali na hora. Depois, os trabalhadores foram retirados do local. Comosempre, h risco de que caiam numa outra cadeia da ilegalidade mais adiante.

    Em geral, quando acontecem esses flagrantes, o Ibama denuncia ao MinistrioPblico, que, s vezes, demora a tomar conhecimento e pedir a priso do responsvel.Daquela vez, Maus fez o relatrio, redigiu uma denncia-crime, digitalizou e envioupara o Ministrio Pblico em tempo real. Ele sabia onde cairia o documento. Na mesdo procurador Daniel Azeredo, que imediatamente pediu a priso preventiva doprodutor que invadira a rea pblica e protegida. Mas o juiz de Santarm, no Par,negou.

    Nem tudo funcionara como planejado numa reunio que os agentes do Estadohaviam feito no incio daquela temporada. J se sabe como o crime avana, por isso ocombate a ele tambm pode ter sua estratgia. A coordenao que eles demonstraradissuadiu muitos criminosos. Tudo foi rpido porque eles agiram em rede.informao do foco de desmatamento foi captada pelos computadores do Imazonrepassada aos rgos pblicos de represso, que organizaram a operao imediatamente.No Ministrio Pblico, a informao encontrou a equipe de Azeredo disposta a agirrpido.

    No fim de 2013, saiu a estatstica daquele ano. E foi desanimador. O aumentofora de 29%. Naqueles 12 meses que representaram o ano de 2013, as mquinas nopararam de destruir nem nas chuvas de dezembro a maro. Segundo Beto Verssimo, era tentativa de enganar o satlite, porque na poca chuvosa a grande quantidade de nuvens

    impede a visibilidade. Assim, h menos chance de se dar o alerta. mais caro desmatar na chuva, mas eles estavam se apressando porque

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    sabiam que a situao estava favorvel a eles.Foi triste. No entanto, quem acompanhou a luta e conversou com quem tentav

    coibir o crime sabe que poderia ter sido pior. O governo de Braslia dava sinaiscontraditrios, mas vrios funcionrios de rgos pblicos e o Ministrio Pblicoestavam sinceramente envolvidos na luta para deter o crime. O que se aprende com essecaso que h como vencer a guerra. preciso combater a ambiguidade dentro dogoverno, fortalecer a rede que se forma na luta para preservar e abrir espao para ofuturo.

    Nada funciona se no h lideranas locais, polticas e empresariais dispostas a mudarlgica da destruio. Vi o incio de uma dessas alianas em Paragominas, em 2008. Hojeo caso citado como emblemtico pelo avano na luta contra o desmatamento.Paragominas inspirou outras cidades, como Alta Floresta, no Mato Grosso, onde fui

    conferir esse avano em 2012. L constatei a importncia da Embrapa nessa coalizopara a introduo de novas prticas de produo mais eficientes. Agora Alta Florestcomea a ser procurada por municpios prximos. As duas cidades viraram exemplos depreservao depois de terem chegado ao extremo oposto, de smbolos de destruio.

    O que vi em Paragominas era o meio do caminho entre a Amaznia da velhordem e a que quer o progresso em novas bases. A cidade fica s margens da Belm-Braslia e a 300 quilmetros da capital do Par. Chegou a fornecer, nos anos 1980, 15%de toda a madeira consumida no pas, num ritmo frentico que derrubava mais de 1milho de rvores por ano. Desmatou-se 45% do municpio.

    Em maio de 2008, quando fui a Paragominas, vi o comeo da transio queacabou sendo bem-sucedida, embora o cenrio naquele momento fosse desordenado ecatico. A cidade ainda desmatava muito, no entanto o ento prefeito, Adnan Demacki,garantia ser possvel o que parecia improvvel: transformar o municpio num modelo depreservao. Duvidei. Ele havia iniciado a costura da aliana que derrubou odesmatamento, mas a cena, para um visitante, era ainda de uma terra sem lei. Madeireirasilegais acumulavam madeiras nobres em seus ptios. Andei sobre aquelas enormes torascom a sensao de caminhar sobre corpos. O bilogo Paulo Amaral, do Imazon, foiidentificando:

    Esse um ip. Aquele um jatob. Essa aqui uma maaranduba.

    Troncos enormes de espcies raras estavam empilhados no ptio da MadeireirSemadal. A Polcia Federal estava em uma operao qual deu o nome de Arco de Fogo.Ela havia comeado na cidade vizinha de Tailndia e se estenderia a outros municpios.Os agentes, desconfiados, no queriam a imprensa por perto, ainda mais uma jornalistda rea econmica que, na viso deles, s poderia ter ido l para defender o lucro dosprodutores.

    Quando chegamos madeireira, os agentes estavam em cima de um morro queficava ao lado das mquinas da serraria. Subimos, eu e a equipe de TV, para convenc-los a gravar uma entrevista. Enquanto subia o morro, fui sentindo uma sensao

    estranha sob meus ps. O solo era mole. Perguntei o que era aquilo e descobri quepisava no sobre um morro qualquer, mas em um monte de cinco metros de altura e 20

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    de largura de p de serra acumulada. Aquilo era a prova de que a madeireira serrarrvores da Amaznia em ritmo intenso.

    Como nada tirava a Polcia Federal de sua desconfiana em relao a ns, nicequipe de imprensa ali naquele momento, fizemos campana perto do local onde ospoliciais tinham montado sua tenda. s duas da tarde daquele dia, as blazers e as picapespretas da PF saram em disparada para outro flagrante. Corremos atrs da comitiva. Elespararam em uma carvoaria ilegal. Fornos clandestinos queimavam madeira nobreusando trabalhadores trazidos de outros lugares do Brasil. Quando o Ibama e a Polciinvadiram o local, na periferia de Paragominas, labaredas e fumaa saam dos fornos. Odescampado tinha um ar de inferno. No meio da fumaa, respirada pelos trabalhadores,era possvel ver a fronteira entre a carvoaria e uma enorme plantao de soja.

    A W.M. Carvoaria existia legalmente. Tinha notas fiscais. Mas era tudo umcapa fina. A autorizao era para dez fornos. Havia 180 queimando madeira. Os troncosque queimavam eram finos, de rvores jovens. Queimava-se o futuro da floresta.autorizao e as notas fiscais eram a forma de esquentar madeira ilegal e dar umaparncia de normalidade ao crime ambiental. Na Amaznia, muito crime tem a capa de

    legalidade.Ao ser perguntado, um dos trabalhadores disse se chamar Jos Joo, assi

    mesmo, sem sobrenome. Tinha visveis sinais de pobreza extrema, era negro, informouser do Maranho, olhava para o cho enquanto falava baixo. Garantia nada saber, nemesmo quem era o empresrio para o qual trabalhava. No entregaria nenhum nome, oupor no saber ou por ter noo de que a imprensa e a polcia estavam de passagem. Sabique, do flagrante, sairia com compensaes trabalhistas. Agora vou pra casa,murmurou. O dono e o gerente no estavam presentes. Havia apenas uma pessoa que sedizia amigo do gerente.

    Alguns empresrios apoiavam o prefeito de Paragominas na ideia de costurar opacto pela modernizao da cidade. Eles estavam no meio da travessia de suasconvices. Comearam suas atividades empresariais desmatando, fizeram riqueza eagora estavam ouvindo que precisavam se unir para deter o desmatamento.

    A gravao das entrevistas com as principais lideranas de Paragominas nessreportagem de 2008 foi num parque central, para aproveitar a luz natural. Nasgravaes, eles repetiram vrias vezes a palavra mgica sustentabilidade e juraram queno eram mais o que haviam sido. Na longa conversa que se estendeu at o anoitecer, ascontradies foram se revelando e eu fui confirmando minhas dvidas.

    Entre eles, dois mostraram conceitos mais atualizados. O pecuarista MauroLcio tinha sempre na cabea um enorme chapu moda texana e em seu cinto reluziuma gigante fivela prateada. Parece fantasiado. O outro, mais jovem, Justiniano Neto,herdeiro de propriedades na regio e disposto a inovar na forma de tocar o negcio,tinha o rosto e as atitudes de um moderno executivo. Hoje Mauro Lcio citado comoexemplo por ter uma alta produtividade na sua atividade pecuria e por respeitar oslimites de 80% de floresta como reserva legal, fato raro na Amaznia. Justiniano assumiuem 2011 a recm-criada Secretaria de Municpios Verdes do Par com a misso dereplicar aquela experincia. Naquela conversa, no entardecer no Parque de Paragominas,o que se via era uma elite empresarial cheia de ambiguidades.

    Reencontrei Adnan Demacki, o prefeito de Paragominas, em 2012. Ele estavterminando seu segundo mandato. J tinha se transformado num smbolo de lideran

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    modernizante do interior da Amaznia. Disse que eu ter duvidado tanto das suaspalavras no primeiro encontro ofendera-lhe os brios, todavia admitiu que havia razespara dvidas. A luta entre desmatadores e os que queriam preservar ficara mais violentnos meses seguintes. Um dia a sede do Ibama amanheceu pegando fogo. Fora uincndio criminoso. Era um recado para que se abandonasse aquela conversa sobrecidade verde. Mas ela prosperou.

    Paragominas um caso no qual se pde ver a atuao dessa aliana queempurra para o lado luminoso. Chegou a ser includa na lista dos municpios que maisdesmatavam, perdeu o financiamento dos bancos pblicos dos quais dependia. Elexporta pisos de madeira e passou a ter problemas com os clientes na Europa. A PolciFederal chegou com suas aes de represso quando estava comeando o pacto pelodesmatamento zero. Lutou para sair da lista, porque estar nela era um obstculo ao seucrescimento econmico.

    Hoje Paragominas diminuiu drasticamente a destruio florestal, tedesenvolvido projetos que conciliam produo e preservao, virou marca e smbolo.Tudo parece fcil depois de feito, mas a transio foi uma briga complexa e difcil. E est

    uma luta que no acaba.Alta Floresta, ao norte de Mato Grosso, seguiu os passos de Paragominas. Foi

    onde desembarquei em 2012. L constatei que estava sendo travada a mesma luta entreforas contrrias. Uma aliana modernizante se formou e o grupo adversrio tambm seuniu. Para entender o motivo pelo qual vale a pena conservar preciso deixar a florestcapturar seus sentidos. Por isso quero fazer aqui um pequeno intervalo.

    O que se sente dentro de uma rvore que pode ter 500 anos? Entrei nsumama que fica perto de Alta Floresta, no portal da Amaznia, com respeito e emoo.A sumama, para quem nunca viu, tem na base do seu tronco umas cavidades formadas

    pela maneira como ela cresce: se afastando e se reencontrando consigo mesma. Lembra oBrasil, que ora se distancia, ora se aproxima do seu destino de pas afortunado. Noardim Botnico do Rio de Janeiro h uma, onde Tom Jobim gostava de ficar. A que euvi em Alta Floresta tem uma circunferncia vrias vezes maior. Suas cavidades no troncoeram verdadeiros cmodos.

    Entrei na rvore para gravar uma passagem e a chamada para uma reportagedo Bom Dia Brasil. Gustavo, que era editor executivo do telejornal, me ajudouentrar, me segurando com as duas mos para evitar que eu casse. Eu fui at o fundo dcavidade para ficar fora do alcance da cmera.

    Quando eu disser vai voc comea a falar a dentro e vem caminhando ataparecer. A cmera vai estar em voc.

    Eles demoraram a acertar o equipamento e o ngulo de gravao e eu fiquei ldentro s sentindo a rvore. Foram minutos emocionantes aqueles em que eu esperava epassava a mo nas paredes internas da rvore, que poderia ser velha como o Brasil, epensava na brevidade da minha vida. No vai do Gustavo, eu andei e contei, epoucos segundos, que estava dentro de uma sumama no meio da floresta amaznica eque aquela rvore tem a propriedade de conservar gua nas cheias e liber-las na seca,fundamental, portanto, nesses tempos de mudana climtica em que a gua ser urecurso escasso.

    Ao sair, no precisei da mo estendida do colega. Lpida, subi na borda dcavidade e pulei no solo da Amaznia, como se a rvore tivesse passado para mim

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    energia da juventude. Aquela sumama uma sobrevivente. Ela est a poucosquilmetros da rea urbana. Poderia ter sido derrubada na devastao que avana sobreregio. Em 20 anos, entre a Rio-92 e a Rio+20, o Brasil desmatou 326 mil quilmetrosquadrados de floresta amaznica. Isso equivale ao territrio dos estados de So Paulo,Rio de Janeiro e Esprito Santo, somados. Tombaram, aproximadamente, 5 bilhes dervores adultas. As contas foram feitas pelo engenheiro florestal Tasso Azevedo.

    Alta Floresta, terra daquela centenria sumama, tem boas e tristes histriaspara contar. Assim como o Brasil. Passou por vrios ciclos econmicos destruindomata a ferro e fogo. Primeiro, o garimpo, depois a madeira, por fim o gado e a soja. Nosanos 1970, quando o governo militar entregou para grupos privados extensas reaspara a colonizao, nasceram vrios municpios na regio. Entre eles, Alta Floresta.

    De terra com gua abundante jorrando em suas mais de 6 mil nascentes,cidade ficou sem gua em 2010. A seca daquele ano exibiu o estrago feito nodesmatamento em torno das fontes. De municpio que achava que fazia jus ao nome, AltFloresta entrou na lista vermelha dos que mais desmatavam. Financiadores comearamse retrair, parcerias internacionais com empresas locais foram desfeitas, mas foi a escassez

    da gua, antes abundante, que acordou a populao.Em movimento coordenado por uma ONG, a Centro de Vida, uniram-se

    prefeitura, os empresrios, os moradores, o Ibama e a Embrapa, num reencontro de AltFloresta com sua natureza. As nascentes foram identificadas, isoladas e protegidas.Produtores comearam a fazer o lento e burocrtico trabalho de regularizao fundiria eambiental de suas terras. Novas tcnicas de produo foram estimuladas pela prefeitura,por ONGs e pela Embrapa, para aumentar a produtividade unindo lavoura, pecuria efloresta. reas de vegetao natural passaram a ser recuperadas. Em junho de 2012,durante a Rio+20, saiu uma notcia no Dirio Oficial: Alta Floresta estava oficialmente

    fora da lista dos municpios que mais desmatam na Amaznia.Entender as lgicas do desmatamento e da modernizao importante para seantever vitria ou derrota. A histria do futuro da biodiversidade brasileira uma colchde retalhos de sagas particulares e pblicas. feita por um casal globalizado que volta srazes para plantar uma floresta, um pioneiro que entra no mato para defender criaturasameaadas e encontra a cincia mundial, funcionrios pblicos dedicados, militantesambientalistas, autoridades dispostas a impor a fora da lei, uma cidade que se mobilizpor uma causa.

    Na Amaznia, o futuro surge no meio dessas lutas tpicas das reas de fronteira.Pela terra se mata e se morre. Consrcios se formam em torno para espalhar o crime.Novas alianas tentam atualizar o modelo de crescimento. A luta entre passado e futurose trava agora. E ela de enorme complexidade. A melhor maneira de chegarAmaznia consciente da prpria ignorncia. Arquive suas certezas, abra bem os olhos,aguce os sentidos e duvide ao pisar. A informao est presente em cada passo. O solopode ser terra firme ou p de serra; pode-se encontrar progresso ou atraso. H umsobreposio do legal com o ilegal. H empresas bem constitudas, mas que tm parte dsua atividade na clandestinidade. No est demarcada com clareza a linha que separa ofuturo do passado.

    O dilema com o qual o pas tem se defrontado e que continuar a enfrentar nos

    prximos anos e dcadas mais complicado do que o conflito entre os grupos quedesmatam e os que defendem a preservao. A linha divisria mais tnue. A teia de

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    interesses confusa. Nem tudo o que parece. As cidades em que lei e ordem seengalfinham lembram os filmes de faroeste, mas a realidade mais ambgua do quefico de Hollywood.

    Para entender melhor a cena atual e pensar no futuro preciso voltar ainda mais notempo. Quando os portugueses chegaram, a Amaznia tinha 5 milhes de habitantes,mas era intocada. Houve momentos, como o ciclo da borracha. Houve projetos comofbrica de automveis imaginada por Henry Ford, em 1920. Os ciclos passaram eprojetos fracassaram. At o fim dos anos 1950, a floresta tinha perdido apenas 0,5% dsua cobertura original. Em 60 anos foram destrudos 19% da floresta, segundo dadosdo Imazon.

    A presso comeou com a Belm-Braslia, no governo Juscelino Kubitschek,mas o governo militar estimulou ainda mais. Foram oferecidos gordos incentivos par

    quem derrubasse floresta. Financiamentos internacionais do Banco Mundial reforaraessa guerra sem trgua mata. Uma propaganda da poca dizia que era preciso vencero inferno verde. Em geral, os idelogos do regime achavam que a Amaznia sericivilizada pela pata do boi e que alguns grandes projetos seriam a redeno da regio.

    A Zona Franca, em Manaus, atraiu indstrias, mas que ficaram localizadascomo um enclave. Houve tambm tentativas de transplante de projetos como o Jari, quebuscou implantar um polo industrial na regio e fracassou. Enormes glebas eradistribudas para quem desmatasse e levasse colonos para a ocupao da terra. Algumashoje so cidades, outras so apenas terra degradada. O pas nunca soube o que exatamente progresso na Amaznia. A ocupao da terra na ditadura era guiada pela ideide que a prpria presena tinha valor estratgico. Os militares tinham dois medos. Dcobia estrangeira e dos inimigos do regime. O segundo medo se acentuou comGuerrilha do Araguaia. A comeou a escalada de incentivo para a derrubada da mata.

    Beto Verssimo chama de Amaznia 1.0 a fase que vai de tempos imemoriais atK, que manteve a floresta quase integralmente preservada. A fase 2.0 a da ocupaodesordenada, que comea no governo militar e perde fora com o esforo recente dederrubar a taxa de desmatamento anual. Agora comea uma nova fase, a Amaznia 3.0,que tenta transformar a regio em grande fornecedora de energia. Pode no ser melhor,mas tem uma lgica diferente.

    Verssimo criou a noo de boom-colapso para explicar o que acontecia nasreas de crescimento da fase dois. Uma frente de obra, a abertura de um garimpo, ufator econmico abriam uma fronteira nova. Isso atraa populao e produzia riquezmomentnea, que vinha com alto grau de violncia. Rpido como surgia, o crescimentose esvaa. Vinha ento o colapso. Ficavam trgicos indicadores sociais, a terra degradade a violncia. A Amaznia nada ganhava com isso e o pas perdia patrimnio de formcatica. Mesmo assim o modelo sobreviveu mudana poltica dos anos 1980. Oregime militar acabou em crise econmica. A inflao estava em pleno salto. Seridomada pela persistncia de uma dcada de luta. O Tesouro estava exaurido, as contas

    pblicas em desordem e o pas no conseguia pagar a dvida externa. Nessa penria,convico geral era de que no haveria mais dinheiro para financiar e o desmatamento

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    cairia naturalmente. E ele aumentou. Quando cheguei aqui ningum escutava argumento contou Beto

    Verssimo. A Amaznia estava polarizada, com todos gritando uns com os outros.Criamos o Imazon para documentar, pesquisar, oferecer argumentos racionais ealternativas. Nunca acreditei que o desmatamento cairia por si, e, de fato, ele continuouaumentando mesmo na crise do governo Sarney. Os crditos foram cortados, sim, noporque o Brasil se convenceu de que aquele modelo estava errado, mas porque nohavia dinheiro mesmo. As pesquisas mostraram que o modelo de financiamento tinhmudado. A prpria madeira passou a ser a fonte do dinheiro. O grileiro ocupava umrea, vendia a madeira, formava o pasto, colocava o boi e vendia terra que no era dele.Em seguida mudava para recomear o ciclo em outra parte da floresta. Uma estupidezdestruio do patrimnio natural com explorao ilegal de madeira e a violnciassociada a isso.

    E a escalada da devastao continuou. O crescimento econmico aps o PlanoReal produziu o maior ndice de destruio num nico ano: 29 mil quilmetrosquadrados. Esse hiperdesmatamento assustou o governo, que decidiu contra-atacar. Foi

    elevada para 80% a rea de cada propriedade na regio que tem de ser mantidpreservada. Alm disso, o governo criou novas unidades de conservao. Era umforma de evitar que o bem pblico fosse privatizado pelo poder de armas e do dinheiroilegal. O desmatamento caiu, mas voltou a subir e teve o segundo pior ano em 2004,com 27 mil quilmetros quadrados.

    O governo Lula contra-atacou da mesma forma que o anterior, e com maisfora. Aprofundou a deciso de criar reas protegidas. Isso ocorreu no perodo deMarina Silva como ministra do Meio Ambiente. Florestas nacionais, parques, reservasextrativistas foram sendo criados por toda a regio. Terras indgenas, demarcadas.

    Assim o governo foi vacinando as reas crticas. Funcionou: o desmatamento caiunovamente. Iniciou programas que continuaram dando fruto at depois que Marindeixou o governo.

    Depois veio o retrocesso. Os projetos deixados por Marina Silva foraengavetados pela ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff. A deciso do presidente Lulde entregar a Amaznia a Mangabeira Unger, que ocupava a Secretaria de AssuntosEstratgicos, deixou o meio ambiente deriva. No entanto, as alianas que haviam seformado em torno de alguns projetos da ex-ministra do Meio Ambiente eram to fortesque continuaram.

    Aquele alerta de que tudo poderia voltar a piorar, em agosto de 2012,movimentou funcionrios locais do Ibama, como Paulo Maus, e o Ministrio Pblicoestadual, mas foi ignorado, desmentido e menosprezado em Braslia. Resultado: enovembro de 2013 o governo teve que admitir que o desmatamento naquele ano haviaumentado. Se tivesse agido ao primeiro sinal, isso no teria ocorrido. Foi o preo dnegligncia.

    Depois do susto, houve queda nos primeiros meses, mas, em seguida,destruio voltou a acelerar nos meses perto da campanha eleitoral de 2014. Em 2015 oscomputadores do Imazon continuavam detectando aumento da derrubada da floresta. Ogoverno escondeu os dados de alerta, captados pelo sistema Deter, at o fim das eleies.

    Em nenhum tema o governo o nico condutor da mudana de atitude. Aocontrrio, na maioria das vezes ele empurrado. Algumas alianas contra o

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    desmatamento surgiram no combate a males especficos, como o carvo ilegal, o trabalhoescravo, a pecuria ilegal. A soja em rea desmatada. Alguns movimentos resultaram epactos modernizantes, apesar de nem todos terem contado com a participao dogoverno. Uma das mais notrias alianas a que tem lutado pela carne legal,denunciando os frigorficos cuja cadeia produtiva inclui fornecedores que usam trabalhoescravo, ocupam terra indgena ou grilam terra pblica. O cruzamento de dados,flagrantes dos rgos pblicos e denncias do Ministrio Pblico permitiram comporlista dos infratores e seguir seu rastro pela cadeia produtiva.

    Quando o Greenpeace fez a primeira denncia com abundantes provas de queos grandes frigorficos compravam bois produzidos pela cadeia do crime, as maiorescadeias de supermercado ameaaram boicotar os frigorficos denunciados. Osimportadores da carne brasileira comearam a escolher fornecedor. Os frigorficostiveram que assinar um pacto contra a ilegalidade. O Ministrio Pblico, por sua vez,havia lanado um programa pela Carne Legal, fazendo investigaes e denunciando oselos dessa cadeia. Mesmo assim, algumas empresas no cumpriram o que haviaassinado. Perguntei ao presidente da lder do setor, que fora notificado pelo Ministrio

    Pblico por comprar produto ilegal, por que motivo ele corria o risco de perderreputao e clientes insistindo em comprar boi de fazendas embargadas pelo Ibama e atcom denncia de trabalho escravo. Ele respondeu:

    Se a minha empresa no comprar o bicho, algum compra.Publiquei esta e outras declaraes em 2012, com o nome do empresrio,

    oesley Batista, presidente do JBS, o maior produtor de protena animal do mundo escio do BNDES. Ele acabou mudando de ideia quando a presso dos compradores edo Ministrio Pblico aumentou. Seu grupo tinha muito a perder. J era o maiorfrigorfico do mundo. O banco no tinha na poca maiores preocupaes com o tema,

    mas, como gestor do Fundo Amaznia, formado com doao do governo noruegus,no podia ser to descuidado. O JBS assinou um Termo de Ajustamento de Condutcom o Ministrio Pblico da Amaznia e comeou a atualizar sua prtica. Depois passoua fazer disso um marketing, apresentando-se como sustentvel. O Brasil tem mudadodessa forma. Sob presso.

    trabalhoso proteger a biodiversidade. caro preservar. Para avanar foipreciso usar tecnologia de monitoramento, mobilizar foras policiais de represso, criarreas de preservao, usar toda a fora do Estado, publicar reportagens, convencer osetor privado, formar lideranas polticas, ameaar, constranger, punir. Pessoasmorreram por isso: Chico Mendes, irm Dorothy Stang. Tantos outros, conhecidos eannimos, caram em defesa da floresta. Para que o pas faz tanto esforo?

    H vrias respostas. A mais abrangente que o Brasil quer se organizar. Issofaz parte do projeto do que queremos ser. Existem respostas objetivas e setoriais.floresta um banco gentico que pode ser, no futuro, uma riqueza inestimvel, quandoprecisarmos de princpios ativos que ainda desconhecemos mas que vo se transformarem remdios, cosmticos, solues qumicas para produtos a serem oferecidos aomercado ou para problemas que surgirem para a humanidade.

    H os que dizem que a floresta tropical deve continuar em p porque ela prestservios ambientais para todo o planeta. na Amaznia que nascem as nuvens que faro

    chover no Sudeste e no Centro-Oeste. So os rios voadores: as nuvens se movem ndireo das reas onde precisam se precipitar para florescer. Tem sido seriamente

  • 7/25/2019 Historia do Futuro - Mirian Leitao.pdf

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    estudado esse fenmeno da umidade da floresta que se transforma em vapor, viaja ealimenta a precipitao de chuvas no Sudeste. Pode-se argumentar, com razo, que se el assim to valiosa para o Brasil e o mundo por que ningum paga pelos serviosambientais?

    exatamente esse debate que marcar as prximas dcadas e, em algumomento, a regio receber pelos servios ambientais que a floresta presta ao pas comoum todo. Mas o ganho futuro parece abstrato. A lei econmica prefere o lucro imediatoda derrubada da mata.

    Do ponto onde estamos, os especialistas olham para a frente e veem alguns