HISTÓRIA EM QUADRINHO: ARTE, EDUCAÇÃO ... se justifica por também abarcar sentidos sociais,...

15
1 HISTÓRIA EM QUADRINHO: ARTE, EDUCAÇÃO, SOCIEDADE E CULTURA GOES, Louisa Cristina 1 RIBEIRO, Nicole Kowal 1 HOFFMANN, Dayane Gaio 2 RESUMO: O presente artigo tem o intuito de analisar a História em Quadrinhos, sob a perspectiva multifacetada da abordagem sociológica, bem como analisá-la sob o viés da cultura, do texto, signo e linguagem, pautando-se nos conhecimentos acerca da sintaxe visual. Pretende-se com tal análise desconstruir a visão marginalizada da História em Quadrinhos no contexto social atuantenesse contexto. Com um enfoque social, explicar- se-à como a linguagem visual e escrita interagem no gênero hibrido das HQs. Tais análises serão feitas com base em leituras de textos numa revisão bibliográfica e posteriormente, aplicando os conceitos abordados de forma geral e introdutória, analisando uma página de um mangá e de um HQ americano. PALAVRAS-CHAVE: História em Quadrinho; Linguagem; Sociedade; Arte; Sintaxe Visual 1 INTRODUÇÃO O artigo apresentado refere-se à importância das histórias em quadrinhos na sociedade e a marginalização desse objeto semiótico. Tal tema foi delimitado a partir da constatação de que em nossa sociedade a História em Quadrinho não recebe o reconhecimento devido. A importância desse artigo encontra-se justamente no fato de que, a história em quadrinhos é marginalizada pela academia, porém, as possibilidades de aprendizagem que as HQs proporcionam, em diversos níveis, é grande. Todavia, os que dessa fonte gostam ou gostariam de usufruir, acabam sendo prejudicados, pois não tendo contato e a base necessária para a fruição do gênero gráfico, não conseguem pensar em expressar-sepor esse meio e tampouco contemplá-lo na sua forma mais completa. Seu valor não se encontra apenas no sentido literário e/ou da arte plástica, mas na sua importância abrange um sentido pedagógico uma vez que é interdisciplinar o que 1 Acadêmicas do Curso de Licenciatura em Artes da UNIVEL Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas de Cascavel. 2 Mestre em Metodologia Científica. Professor do Curso de Licenciatura em Artes da UNIVEL Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas de Cascavel.

Transcript of HISTÓRIA EM QUADRINHO: ARTE, EDUCAÇÃO ... se justifica por também abarcar sentidos sociais,...

1

HISTÓRIA EM QUADRINHO: ARTE, EDUCAÇÃO, SOCIEDADE E

CULTURA

GOES, Louisa Cristina1

RIBEIRO, Nicole Kowal1

HOFFMANN, Dayane Gaio 2

RESUMO: O presente artigo tem o intuito de analisar a História em Quadrinhos, sob a

perspectiva multifacetada da abordagem sociológica, bem como analisá-la sob o viés da

cultura, do texto, signo e linguagem, pautando-se nos conhecimentos acerca da sintaxe

visual. Pretende-se com tal análise desconstruir a visão marginalizada da História em

Quadrinhos no contexto social atuantenesse contexto. Com um enfoque social, explicar-

se-à como a linguagem visual e escrita interagem no gênero hibrido das HQs. Tais

análises serão feitas com base em leituras de textos numa revisão bibliográfica e

posteriormente, aplicando os conceitos abordados de forma geral e introdutória,

analisando uma página de um mangá e de um HQ americano.

PALAVRAS-CHAVE: História em Quadrinho; Linguagem; Sociedade; Arte; Sintaxe

Visual

1 INTRODUÇÃO

O artigo apresentado refere-se à importância das histórias em quadrinhos na

sociedade e a marginalização desse objeto semiótico. Tal tema foi delimitado a partir da

constatação de que em nossa sociedade a História em Quadrinho não recebe o

reconhecimento devido. A importância desse artigo encontra-se justamente no fato de

que, a história em quadrinhos é marginalizada pela academia, porém, as possibilidades

de aprendizagem que as HQs proporcionam, em diversos níveis, é grande. Todavia, os

que dessa fonte gostam ou gostariam de usufruir, acabam sendo prejudicados, pois não

tendo contato e a base necessária para a fruição do gênero gráfico, não conseguem

pensar em expressar-sepor esse meio e tampouco contemplá-lo na sua forma mais

completa.

Seu valor não se encontra apenas no sentido literário e/ou da arte plástica, mas

na sua importância abrange um sentido pedagógico uma vez que é interdisciplinar o que

1Acadêmicas do Curso de Licenciatura em Artes da UNIVEL – Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas

de Cascavel. 2Mestre em Metodologia Científica. Professor do Curso de Licenciatura em Artes da UNIVEL –

Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas de Cascavel.

2

se justifica por também abarcar sentidos sociais, históricos, culturais e

ideológicos.

Delimitamos para os objetivos: desconstruir a visão preconceituosa em relação à

historia em quadrinhos; Relacionar as HQs com as diversas áreas, desde o texto, à

cultura, sociologia e sintaxe visual; Desconstruir a visão elitizada da linguagem escrita,

demonstrando que esta está equiparada à linguagem visual; Demonstrar como

linguagem Visual e Escrita coexistem e se relacionam na Historia em Quadrinhos.

A metodologia utilizada, por sua vez, consiste na revisão bibliográfica e análise

descritiva, com base na teoria mencionada, de um mangá e um HQ americano.

2 DESENVOLVIMENTO

2.1 A história em quadrinhos e a sociedade

A sociedade contemporânea e seus componentes, como o conhecimento, é

organizada de forma fragmentada e dicotomizada em uma estrutura maniqueísta de

juízos de valor que, como diz Ken Robinson, estabelece, ainda no processo educacional,

certa hierarquia, na qual a razão instrumental materializada na matemática e nas línguas,

habilidades estas desenvolvidas no lado esquerdo do cérebro, se destaca, em detrimento

das artes, atendendo assim ao modo de produção capitalista, industrial, imperante desde

o século XIX.

Um exemplo do caráter fragmentado de nossa sociedade, que impregna em sua

divisão hierarquias, é a invenção e aplicação do teste de QI, o qual pretendia por uma

série de aplicações lógicas matemáticas, pelo calculo de um único número expressar a

inteligência do sujeito. Embora o teste seja, nos dias atuais, entendido como insuficiente

e unilateral, admitindo-se novas teorias que quebram paradigmas como a teoria das

Inteligências Múltiplas, de Howard Gardner (1985), que estabelece ao menos sete

diferentes tipos de inteligências, caracterizadas pela “habilidade para resolver problemas

ou criar produtos que sejam significativos em um ou mais ambientes culturais.” (Gama,

2000) ou ainda como o já citado Ken Robinson que afirma que a criatividade é tão

importante para o indivíduo quanto à alfabetização, a fragmentação permanece.

3

As inovações na área e desconstrução de preconceitos estão dando seus

primeiros passos, contudo a grande população mantém os velhos moldes empregados

pela era industrial. Muitos são os exemplos de como essas divisões acontecem, todavia,

há uma em especial, que compartilha dos preconceitos em diversos níveis, ainda que sua

manifestação ocorra tanto no âmbito do fazer artístico (produção semiótica), quanto se

enquadram no estudo das Linguagens, códigos e suas tecnologias.

Os Comics, Mangás, enfim, Histórias em Quadrinhos de todas as espécies, que

compartilham de elementos visuais e escritos, numa linguagem não só complexa, como

completa, segundo Nilson Viana “são consideradas como tema infantil, juvenil, não

muito sério. São menosprezadas por muitos, que as consideram uma espécie de cultura

inferior. Seu "público" é considerado a "massa", que seria amorfa, acrítica, infantil. Sem

dúvida, este preconceito tem razões e também conseqüências sociais. A desvalorização

das HQ é realizada a partir de uma visão elitista e racionalista.”

Ou seja, tida como cultura underground, a historia em quadrinhos é

discriminada, tanto pelos estudiosos da língua, quanto pelas artes, além de não só ser

deixada de lado pela escola, mas também ser estigmatizada e seu público estereotipado.

Por ser, porém, um objeto cultural que permite, assim como todo texto comunicar, e que

„‟tem caráter histórico, não no sentido de que narra fatos históricos, mas no que revela

os idéias as concepções de um grupo social numa determinada época. ”(SAVIOLI,

2006)que nos permite reflexões profundas em relação ao fato de que “Sob as palavras

de um discurso, há outras palavras, outro discurso, outro ponto de vista

social.”(SAVIOLI, 2006).Os HQ‟s dispõem não somente de um caráter extremamente

interdisciplinar e harmonico entre duas linguagens distintas, como também pode

apresentar cunho Histórico, Filosófico e Sociológico, como sugere Viana, quando

menciona uma “ Sociologia das histórias em quadrinhos, considerada uma subdivisão

da Sociologia da comunicação ou da Sociologia da arte (para aqueles que consideram os

quadrinhos como sendo arte)”.

É empírico que se desconstrua a o “esoterismo” que envolve a História em

Quadrinhos para que o conhecimento que essas carregam em seu bojo seja

democratizado.

2.2 A questão cultural

4

Um dos argumentos mais utilizados em senso comum, para marginalizar e abolir

dos espaços acadêmicos a expressão por meio das HQs, ou que faz com que esse rico

gênero seja utilizado apenas como pretexto dentro dos templos do saber, é que estas por

não obedecerem a “cânones elevados” não seriam ditos como Cultas.

A afirmação dita anteriormente carrega uma série de incoerências,

primeiramente, pela dicotomia “culta” versus “inculto”, revelando novamente o

discurso valorativo dessas afirmações. Outra incoerência é a de que, as HQs não

obedecem a cânones elevados. De fato, sendo uma obra hibrida as histórias em

quadrinhos não tem a possibilidade de enquadrar-se nos grandes movimentos da história

da literatura e da arte. Sendo assim, ainda que possa se aproximar por traços estilísticos

de composição visual e/ou escrita de um ou outro movimento, a HQ não se limita a eles

e tem ainda suas próprias formas de diálogo visual/escrito com o receptor, como quando

assumem o traço do mangá, do carton, impregnam a escrita com efeitos visuais,

transformando-a também em elemento visual, e/ou associam linguagem visual e escrita

de tal maneira que, caso dissociadas, torna-se impossível recuperar seu sentido.

Finalmente, a afirmação de que as histórias em quadrinho são “incultas” nos

possibilita recuperar que, elas estão desprovidas de cultura. Isso mostra quão superficial

e unilateral são as análises sob a questão cultural das obras. Para melhor compreender a

superficialidade dessas ultima colocação e para firmar os conceitos sobre os quais nos

referiremos à cultura quando falarmos sobre as HQs, tomaremos por base o texto

“Micropolíticas, Cartografias do Desejo”, no qual Felix (1996) apresenta três fases

consecutivas do entendimento de cultura na história e portanto três ângulos sobre os

quais podemos entender as historias em quadrinho:

Primeiramente o autor refere-se aA cultura-valor, ou seja, aquela Cultura que

produz julgamentos de valor, onde a antítese se dá pelo que é culto (tem cultura,

portanto é bom) e pelo que é inculto (não tem cultura, logo é mau) e advem do conceito

de trabalho intelectual. Pressupõe um modelo social de segmentação e diz respeito à

época em que a nobreza ainda era a classe dominante. Sendo assim, a visão colocada

anteriormente, encarna essa ideologia de cultura, que, como visto, não é a única, mas

sim a mais antiga. Nesse sentido a História em Quadrinho, enquanto fruto de um

elaborado trabalho intelectual, só não é aceito, primeiro, pois não é bem aceito dentre a

parcela mais rica da sociedade, que dita os valores e principalmente, porque sua

bagagem intelectual ainda não foi explorada.

5

Em seguida, Felix (1996) se refere acultura-alma, que transmite um valor mais

democrático, uma vez que associa-se à idéia de civilização, sendo assim, cada

civilização tem sua cultura e portanto tudo que é produzido dentro de uma civilização

(grupo) é cultura, ou seja, todos possuem cultura, basta pertencer a um grupo. Bem

como a primeira, a segmentação e a nobreza são características dessa fase.Logo

entendemos que, sendo produzida em uma civilização e dizendo respeito à ela, trazendo

costumes, valores e crenças do contexto social no qual foi elaborada, a historia em

quadrinho é sim culta, e pode ainda representar e disseminar a cultura de tal civilização,

como ocorre nos Mangás, de origem japonesa.

Por ultimo a Cultura-mercadoria é explicada. Nesta não há nem julgamento de

valor nem o conceito de civilização, a cultura seria todos os bens produzidos pelo

homem e bastaria trocá-la como se fosse uma mercadoria, para tomar posse dela. Nesta

visão, mais recente, onde a burguesia é a classe dominante diz-se supostamente mais

democrática, ou ao menos sem o antigo juízo de valor, muito embora ainda se baseie em

processos etnocêntricos, mascarados por um policentrismo, porém características dos

outros dois níveis continuam a influenciar este ultimo nível. Podem-se produzir e

comprar os HQs eles são mercadoria, logo, na lógica da ultima conceituação de Felix

quanto a Cultura, os HQs, enquanto objetos semióticos, carregam sim valor cultural.

Partindo da análise do texto entendemos também que não podemos refutar nenhuma das

conceituações de cultura e suas conseqüências sobre a visão nas HQs, ainda que neste

artigo haja ênfase nas duas ultimas definições.

2.3 A linguagem, o signo e o texto

Como diz Santaella (2000) é visto que “Somos humanos porque somos

simbólicos”. Dessa forma, a história em quadrinhos, enquanto signo e, portanto

carregada de significados, humaniza o homem modificando-o, num processo dialético,

no qual ao criar a História em Quadrinhos o homem reflete sobre si mesmo e a sua

sociedade, levando-se em consideração de que esse é um processo artístico e que “a arte

exprime sempre o imaginário de sua época” (LEMOS, 2004). A HQ ao ser transportado

à sociedade e consumida é resignificada interferindo assim na sociedade e por

conseguinte, no homem, pois é objeto, ou seja, signo,uma vez que “A ação do signo,

que é a ação de ser interpretado, apresenta com perfeição o movimento autogerativo,

6

pois ser interpretado é gerar um outro signo que gerará outro signo, e assim

infinitamente.”

Sendo uma obra hibrida a história em quadrinhos configura-se como linguagem

única, levando em consideração que “As linguagens – cada qual com sua materialidade

e suporte próprios” segundo Santaella (2000) compõe uma diversidade semióticae com

isso afirma que é tempo de desfazer a visão preconceituosa, pobre e estreita de que

signo é equivalente a signo lingüístico. Sendo que para conceituar a linguagem,

podemos nos referir ao texto de Fiorin onde afirma que:

“Saussure considerou a linguagem "heteroclita e multifacetada", pois abrange

vários domínios, é ao mesmo tempo física, fisiológica e psíquica, pertence ao domínio

individual e social; "Não se deixa classificar em nenhuma categoria de fatos humanos,

pois não se sabe como inferir sua unidade" (1969, p. 17)”(FIORIN, 2010, p. 14)

Nesse sentido Saussure aponta que a língua é apenas uma parte do todo, assim

como na própria historia em quadrinho. Também é importante ressaltar o que o lingüista

diz a respeito do domínio individual e social da linguagem. Sendo linguagem a história

em quadrinho influencia tanto no indivíduo, produtor e consumidor, quanto na

sociedade, sendo então ativo e importante fator dentro dela.

Enquanto o signo lingüístico caracteriza-se por uma unidade composta de

conteúdo, juntamente com uma expressão, dada por sons, que o veicula, o Signo

propriamente dito, em sua forma mais geral seria, segundo Lucia Santaella a própria

vida, “afinal, não há, de modo algum, comunicação, interação, projeção, previsão,

compreensão etc. sem signos” (SANTAELLA, 2000) Com isso, os signos lingüísticos e

visuais expressos na história em quadrinho unem-se e complementam-se, não podem

existir individualmente, formam um único texto, um único signo e dialeticamente

fundem-se tomando o mesmo valor.

Partindo desse pressupostos, podemos afirmar que a historia em quadrinhos

caracteriza-se em especial, como texto, uma vez que este é um todo organizado de

sentido,em uma determinada situação. As partes desse todo, seriam contudo outros

textos, que se contextualizariam, suprindo as lacunas deixadas um pelo outro. Seriam

essas partes a linguagem verbal, ou seja, a unidade lingüística concreta, reconhecida

como língua, no caso escrita, lançando mão da palavra. Nesse caso o seu contexto será

implícito, expresso pelo que não está verbalizado, ou seja, pela segunda parte do todo,

ao qual serve de contexto: a linguagem não-verbal. Esta, que pode ser entendida como

toda linguagem que não utiliza-se da palavra, mas sim de simbologias, mais

7

especificamente, na história em quadrinhos, representada nos aspectos visuais, tanto de

cor, luz, sombra, e outros elementos da sintaxe visual que serão registradas a seguir,

como na representação, nos personagens, de gestos, expressões faciais, postura do

corpo, etc.

No livro “ Ida ao Teatro” de Ingridi Koudela (2011), a autora aponta para uma

visão mais distinta, porem também válida sobre a Linguagem verbal e visual. Segundo

essa visão, existiriam um método discursivo, que se pautaria na mediação da informação

por meio da linguagem verbal, valorizando o cognitivo racional e, portanto o mais

presente em nossa sociedade e, por outro lado, o Método apresentativo, mais lúdico e

criativo, visando uma aprendizagem associativa e emocinal. Koudela menciona ainda

que, enquanto o primeiro método seria exterior ao sujeito o segundo seria mais direto,

lançando Mao da função simbólica, que não é pré-racionla, mas sim pré-racioncinativa,

e portanto, anterior a generalizações ou silogismos, mas elaboração de símbolos, num

processo natural, “A combinação das duas abordagens metodológicas permite que o

aluno espectador se ocupe intensivamente e com todos os sentidos na sua relação com o

evento espetacular, tornando-se capaz de refletir sobre a experiência sensível”.o que

facilita a apredizagem, em especial da criança e que, no que se refere à história em

quadrinhos, se dá pela presença da imagem, que não é pura ilustração, mas da apoio ao

que esta escrito e, facilitando dessa forma o acesso cognitivo, faz com que a criança

tenha preferência por esta à outros tipos de texto, culminando, infelizmente na

banalização da linguagem dos quadrinhos, uma vez que esse segundo método conforme

se avança na idade, e em detrimento do método discursivo, é deixado de lado e não mais

se desenvolve. Muito embora , como cita Koudera “Langer estabelece uma diferença

entre o símbolo discursivo e o símbolo apresentativo. Segundo ela, onde quer que um

símbolo opere existe significado e o reconhecimento do apresentativoamplia a

concepção de racionalidade para além das fronteiras comumente aceitas (Langer,

1971)” (KOUDELA).

2.4 Sintaxe visual

O enfoque agora é na Linguagem Visual propriamente dita, que, como já foi

dita, é deixada de lado pela academia e pouco desenvolvia, a não ser por meios

alternativos. Para isso, utilizaremos como base o livro “Sintaxe da Linguagem Visual”

8

de Donis A. Dondis, porém, tratando os conceitos de forma introdutória, para que o

leitor tome conhecimento da existência de tal material.

Primeiramente, devemos ressaltar que, como diz Dondis, não existe uma

solução, que engesse essa linguagem, porém, ela pode sim ser entendida como meio de

comunicação, e assim, bem como a linguagem verbal, ela deve ser desenvolvida, ou

seja, da mesma forma como um alfabestimos verbal é ensinado, dever-se-ia implantar

nas escolas um alfabestismo visual, para que todos pudessem fruir dos seus sentidos.

“a expressão visual significa muitas coisas, em muitas circunstâncias para muitas

pessoas. É produto de uma inteligência humana de enorme complexidade, da qual temos

infelizmente uma compreensão muito rudimentar.”(DONDIS, 2007)

Dessa forma, Dondis aponta para a existência de uma linguagem visual, o que se

relaciona com a já mencionada teoria das varias inteligências de Gardner. Nesse

sentido, a história em quadrinhos, é um veiculo de comunicação, bem como estimula

em seu leitor, tanto a inteligência verbal, quando visual. Por sua marginalização, porém,

o sujeito ao deparar-se com esse tipo de linguagem pode encontrar dificuldade em

interpretá-la e não conseguindo extrair seus significados, acaba por ignorá-los,

reforçando o preconceito sobre esse meio de comunicação. Isso porque “aceitamos a

capacidade de ver da mesma maneira como a vivenciamos – sem esforço” (DONDIS,

2007)

Dessa forma sabemos que ao ver, “(...)vivenciamos o que esta acontecendo de

maniera direta, descobrimos algo que nunca havíamos percebido, talvez nem mesmo

visto, conscietiza-mo-nos, atraves de uma serie de experienciasviausi, de algo que

acabamoos por reconhecer e saber, e percebemos o desenvolvimento de transformações

travas da observação paciente.(...) Ver passou a significar compreender.” (DONDIS,

2007) Ou seja, quanto mais vemos e interpretamos o que vemos, mais aprendemos e até

mesmo criamos imagens visuais. Logo quanto mais abrangentes forem nossos

conhecimentos, maiores serão nossas interpretações e aprendizagem e logo mais

poderemos criar. Da mesma forma, ao vermos e interpretarmos e lermos a realidade que

se apresenta para nós em forma de Historia em Quadrinho aprendemos com o que está

sendo exposto, tanto no que diz respeito a conteúdos acadêmicos, se o quadrinho em

especial tratar desses assuntos, quanto em relação a conhecimentos sociais, de valores e

comportamento. Assim o HQ se aproxima do real em sua própria maneira de ser, ou

pode, para expressar tal realidade, lançar mão do abstracionismo puro.

9

Na aplicação das idéias de Savioli as interpretações que a leitura do HQ vão

produzir, são, porém delimitadas, como no pelo estudo que o sujeito tem nas linguagens

verbal e visual, bem como o significado dado dependerá de critérios subjetivos do

sujeito, sendo que “O texto pode ter várias leituras, bem, como pode jogar com leituras

distintas para criar efeitos humorísticos. Entretanto, o leitor não pode atribuir-lhe o

sentido que bem entender.”(SAVIOLI, 2006.)

Dessa forma, apesar da sintaxe visual existir, ela não é rígida como a sintaxe

gramatical, mas apenas estabelece linhas gerais que nortearão a intrepretação, que ficará

ao encargo do indivído. Tal interpretação pode ser ampliada pelo estudo, prática de

leitura visual e contato com obras que requisitem tal leitura, o que, no caso das historias

em quadrinhos, é cortado pela academia assim que a criança adquire certa fluência na

leitura.

As linhas gerais propostas por essa sintaxe visual, dizem respeito ao: ponto,

linha, forma, direção, tom, cor, textura, proporç]ao, dimensão, movimento, ousadia,

simetria, reiteração e ênfase. Estes são elementos visuais básicos, que propiciam

estratégias e opções de técnicas visuais, que acarretam implicações psicológicas e

fisiológicas da composição criativa.

2.5 Algumas análises

Com o embasamento teórico passado anteriormente, podemos agora fazer com

que tenhamos uma compreensão mais aprofundada sobre tal. Para que isso ocorra,

vamos usar análises das obras “Sin City” de Frank Miller e “Naruto” de Masashi

Kishimoto. Essas obras possuem temáticas diferentes e traços/estilos distintos, porem

mesmo com toda essa diferença, elas apresentam características iguais, e técnicas de

abordagem semelhantes.

Como é de conhecimento popular, as Histórias em Quadrinhos tendem a ser de

cunho fantasioso, passado em forma de narrativa. Os gibis, “[...], que significa

"moleque", e foi o nome da primeira Revista em Quadrinhos lançada no Brasil.”(Viana,

2010), tem como principal característica a sequência de quadrados ilustrando diversas

cenas, esses quadrados podem ou não possuir falas ou narrações, pois as próprias

imagens podem transmitir uma idéia, desde que, aseja elaborada de forma com que o

leitor possa ter um entendimento. “Nas histórias em quadrinhos, encontramos com

10

freqüência exemplos de narrativas exclusivamente visuais, construídas por meio de

imagens sucessivas de uma ação das personagens.”(Savioli &Fiorin, 2006)

2.5.1 Análise de Naruto

Na página anexada do mangá Naruto, feito por MasashiKishimoto mostra o

encontro do personagem principal da trama (Naruto Uzumaki) com sua mãe

(KushinaUzumaki) pela primeira vez. No primeiro quadrinho é apresentada a fala, “há,

há... já comecei dando cascudos... desculpa...” a personagem se refere ao ato de ter

batido na cabeça de Naruto, e é possível ver que a mesma se arrepende de ter feito isso,

assim ficando sem jeito. Assim, como parte de nosso conhecimento de mundo, podemos

assimilar isso como uma demonstração de um típico comportamento humano, ainda

mais comum por parte das mães, que se arrependem rapidamente após fazer algo que

julgam ter sido equivocado. No mesmo quadrinho é visível a incompreensão do

protagonista por parte da situação quando em seu balão está somente apresentado uma

sequência de pontos finais na horizontal, usado neste formato por influencia da escrita

japonesa; que ocorre horizontalmente de cima para baixo; e por conta de espaço. Assim

podendo se ter a leitura de que ele estava confuso e sem um tipo de pensamento lógico.

A linguagem visual materializada na representação da expressão confusa do

personagem reforça essa idéia, já que seu corpo está ligeiramente

No segundo quadro vemos uma explicação por meio de breves comentários

quanto à razão de ela ter dado o “cascudo” no jovem, assim falando um pouco de seu

passado, “Eu sou assim, meio agitada, desde que nasci. Por isso, acabei pegando umas

manias ruins... Eu tento não falar gíria, mas, quando fico nervosa, sai sem querer...”. É

observado pela arte do autor, que a mulher está sem jeito com a situação em que se

encontra. Ao falar como se portava quando ainda estava viva. Podemos fazer a leitura

de que, como uma mãe, ela tem vergonha por admitir ao seu filho que se portava de

maneira que não é adequada por parte de uma responsável por um bebê.

Em seguida no terceiro quadro, percebemos uma preocupação quanto ao

comportamento que poderia ter sido herdado por seu filho. “E você? Tomara que não

tenha puxado esse lado meu...”. Essa questão quanto hereditariedade é muito usada em

casos familiares, como meios fáceis de explicar certos comportamentospor parte dos

mais novos, assim temos aquela isão de que o filho ira continuar com uma parcela da

personalidade de seus pais.

11

No quarto quadrinho é visto o novamente que Naruto está confuso. Porém dessa

vez, não temos somente a visão de sua incompreensão por meio dos pontos finais

sequencias, como também temos acesso a ao desenho. A expressão dele é de espanto,

porema partir desse ponto, é visível que o protagonista começa a ter entendimento

quanto a sua situação.

No quinto quadro finalmente ocorre a fala de Naruto, ao indagar o que realmente

ela estava falando, como se estivesse faltando uma peça importante para a solução desse

quebra cabeça. “Como assim?”. Kushina responde, e já ciente de que anteriormente o

pai de Naruto não havia contado toda a verdade, ela reclama dos homens em geral. “O

Minato não te avisou de nada, né? Esses homens viu...”. Podemos associar isso com um

julgamento feito por parte da mulher quanto ao homem. É visto que ela fica chateada

por causa do descaso em explicar o julgado importante por ela.

O sexto quadrinho é apenas representado com a imagem da metade do rosto do

protagonista, o qual esta com o queixo franzido e os lábios comprimidos. Isso indica o

movimento anterior ao inicio do choro, aonde com toda a descarga de sentimentos o

personagem demonstra fisicamente a sua emoção quanto aquele momento.

No ultimo quadro desenhado nesta página temos a mãe e uma fala incompleta.

Ela aparenta estar extremamente contente quanto à situação, já que Naruto pode

finalmente ter entendido e conhecido aquela pessoa estranha que apareceu em seu

subconsciente. “Isso mesmo, eu sou a sua...” (Naruto, 2012). Mesmo com a frase

inacabada de Kushina, podemos fazer a leitura de que ela se referia a ser a mãe do

protagonista.

2.5.2 Análise de Sin City

Sin City é um HQ criado por Frank Miller, que possui como temática: o

erotismo e a violência. No anexo apresentado a baixo, a pagina selecionada possui

apenas dois quadros e é narrado em primeira pessoa pelo próprio personagem principal

(Marv). Marv é um típico anti-heroi. Sofre de um distúrbio mental, fazendo-o sofrer

alucinações. É um homem violento que trabalha prestando serviços sujos.

No primeiro quadro, é apresentado, somente a sombra do corpo de Marv, que em

primeira pessoa narra, “A noite é quente como o inferno. Gruda no corpo. Um quarto

nojento na parte nojenta da cidade nojenta. O ar condicionado, uma tralha barulhenta.

Não consegue gelar um drinque colocado sobre ele.” (Sin City, 1996). Percebemos que

12

ele se encontra no verão, isso se da por meio a descrição da sensação e a indignação que

o ar-condicionado não funcionar como deveria.

Já no segundo quadro temos a imagem real da situação, onde o personagem

principal está acompanhado de uma mulher seminua. E logo o foco da narração dele

muda. “Tô contemplando uma deusa. Ela ta dizendo que me deseja. E parece que ta

falando sério mesmo. Não vou gastar mais um segundo sequer me perguntando como

dei tanta sorte.”(Sin City, 1996). A narração tomou um rumo diferente quando ele viu a

sua acompanhante, assim mostrando um ponto fraco por parte do sexo masculino, que

como conhecimento popular, alguns homens podem ser facilmente influenciados

quando se trata de uma mulher com aparência física atraente. Com isso, nosso anti-

herouesquece do calor, posto por ele “infernal” e se concentra na jovem a sua frente.

3 METODOLOGIA

Este artigo trata-se de uma pesquisa bibliográfica de natureza Básica, e de cunho

interpretativista. A abordagem do problema foi de ordem qualitativa. Utilizamos, como

principais fontes teóricas, livros e a artigos impressos e digitais. E nos respaldando dos

conceitos teóricos acima expostos realizamos as análises aqui apresentadas

4 CONCLUSÃO

Assim, principalmente pela evidenciação de que, a linguagem visual é tão

significativa, se não mais, pois abre um leque maior de possíveis interpretações, quanto

a linguagem escrita, que como já sabemos, tem uma posição privilegiada em nossa

sociedade, afirmamos que sim, a história em quadrinho tem um valor intelectual

relevante, uma vez que carrega não só uma das linguagens, mas ambas, produzindo

significados visuais e verbais, com maior ênfase em um ou outro dependendo da

situcionalidade, bem como integrantes um do outro, não podendo desvencilhar-se uma

vez juntos na página do HQ, visto que a linguagem escrita não comporta apenas uma

descrição e tampouco a visual, apenas uma ilustração. Nesse valor intelectual o

quadrinho inclui ainda, o que é deixado de lado na academia e desenvolve inteligências

que são comumente deixadas de lado, ainda que sejam tão importantes quanto às outras.

Logo, como diz a Sociologia do Quadrinho, este possui também valor e

significado social, interferindo na sociedade através das suas diversas leituras. Essa

visão, da produção e da mensagem que os quadrinhos trazem em suas produções, bem

13

como a análise dos leitores, que se inter relacionam criando, reforçando e destruindo

valores, concepções e sentimentos, que dizem respeito aos seus contextos sociais,

produtores, portanto de cultura em seus mais diversos níveis.

Sendo assim, é necessário que o leitor, para que consiga apreender de forma

adequada todo o sentido do texto, da historia em quadrinhos, deve apoderar-se não

somente da sintaxe gramatical, desenvolvidas nas escolas, mas de uma sintaxe visual,

pouco desenvolvida, porem essencial. Quanto maior o nível de conhecimento a respeito

dessa segunda sintaxe proposta, ele poderá não só resignificar a hsitoria em quadrinhos

mais abrangentemente e entendendo-a passar a dar-lhe mais valor, como também pode

criar tal objeto semiótico, produzindo assim cultura. Porém é necessário ressaltar que, o

quadrinho tem sua própria linguagem visual, carregada de significados, que irão variar

em decorrência do contexto histórico e social.

5 BIBLIOGRAFIA

GUATARRI, Felix; ROLNIK, Suely. Michopolitica: Cartografias do Desejo. 4ª Ed.

Petrópolis: Vozes, 1996.

LEMOS, André. Cibercultura. Porto Alegre : Sulina, 2004.

DONDIS, Donis A. Sintaxe da Linguagem Visual. 3ª Ed. São Paulo: Martin Fontes,

2007.

SANTAELLA, Lucia. A Teoria Geral dos Signos: como as linguagens significam as

coisas. São Paulo: Cengage Learning, 2008

SAVIOLI, Francisco Platão & FIORIN, José Luiz.PLATÃO & FIORIN: Lições de

Texto, leitura e redação. São Paulo: Ática, 2006.

VIANA, Nildo. O que os quadrinhos dizem?Sociologia ( cidade) nº 46, mês, ano.

Disponível em: <http://portalcienciaevida.uol.com.br/ESSO/edicoes/18/artigo98209-

1.asp> . Acesso em: 14 jun. 2013

GAMA, Maria Clara S. Salgado. A teoria das inteligências múltiplas e suas

implicações para educação.Disponível

em:http://www.psicopedagogia.com.br/artigos/artigo.asp?entrID=18. Acesso em: 14

jun. 2013.

ROBINSON, Ken. As escolas matam a criatividade .Disponível em:

https://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=icfOU4VF0aQ. Acesso

em: 12 jun. 2013.

KOUDELA, Ingrid Dormien. A Ida ao Teatro. Perspectiva, 2011.

FIORIN, José Luiz (org.). Introdução à Lingutística Vol. I. Objetos teóricos. São

Paulo: Contexto, 2010

MILLER, Frank. SIN CITY. São Paulo, 1996

KISHIMOTO, Masashi. Naruto. São Paulo, 2012

14

ANEXO 1

Naruto – MasashiKishimoto

15

ANEXO 2

Sin City – Frank Miller