Historiografia da Antiguidade Clássica

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Historiografia da Antiguidade Clássica Concepção de História no Século XIX

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Historiografia da Antiguidade Clássica

Concepção de História no Século XIX

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Conhecimento histórico eAntiguidade Clássica

“a habilidade do historiador consiste em retirar dos documentos o que convém e nada a acrescentar... A leitura dos documentos de nada serviria se fosse feita com idéias pré-concebidas” (Fustel de Coulanges apud LEGOFF, 1992: 96)

“aquilo que realmente aconteceu” (Leopold von Ranke apud FINLEY, 1994: 64)

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Antigüidade

Theodor Mommsen História de Roma (Römische Geschichte)

Fustel de Coulanges A Cidade Antiga (La Cité antique)

Edward Gibbon A História do Declínio e Queda do Império

Romano (The History of the Decline and the Fall of Roman Empire)

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Historiografia da Antiguidade Clássica

Concepção de História no Século XX

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Marxismo – materialismo histórico

Mikhail Rostovtzeff (História Social e Econômica do Império Romano, História Social e Econômica do Mundo Helenístico, História de Roma)

Abundante uso de fontes literárias e arqueológicas

Vere Gordon Childe Historiador e arqueólogo pré-histórico

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Século XX – Annales – abrangência de fontes Fernand Braudel (Memórias do Mediterrâneo) Roger Colingwood (Roman Britain,, Roman

Inscriptions of Britain) Jean Pierre Vernant Pierre Vidal-Naquet François Hartog Moses Isaac Finley

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Concepção de Fonte

Século XIX e Século XX

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Etimologia Fons (latim) – fonte de alguma coisa, origem. Metáfora para fazer alusão à capacidade de

“jorrar” informações históricas do documento a ser estudado pelo historiador (FUNARI,2005)

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Século XIX

Documentos escritos - sinônimos de História O historiador é o cientista que extrairá a

história condensada, escondida, nos documentos.

Erudição Conhecimento aprofundado da linguagem

utilizada nos documentos permite a execução de uma sólida crítica interna.

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Século XX

Hermenêutica contemporânea Não se deve confundir o PASSADO

(acontecimentos ou fatos intangíveis) com o RELATO DO PASSADO (representação ou narrativa do fato ou acontecimento)

As raízes da explicação histórica encontram-se, sempre, no presente, nas sociedades e culturas de determinados períodos, nas quais se insere o HISTORIADOR.

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A história faz-se com documentos escritos, sem dúvida. Quando estes existem. Mas pode fazer-se, deve fazer-se sem documentos escritos, quando não existem. Com tudo o que a habilidade do historiador lhe permite utilizar para fabricar o seu mel, na falta das flores habituais. (...) Numa palavra, com tudo o que, pertencendo ao homem, depende do homem, serve o homem, exprime o homem, demonstra a presença, apresença, a actividade, os gostos e as maneiras de ser do homem.”

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Tipologia de fontes para aHistória Antiga

Fontes escritas Leis e registros de instituições políticas Narrativas Biografias Poesias Peças teatrais Romances e fábulas Memórias Epístolas Enciclopédias Textos filosóficos e morais Manuais e tratados

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Possibilidades de acesso

Edições bilíngües – Belles Lettres e Loeb Classical

Análise com crítica textual (estabelecimento dos textos a partir dos manuscritos originais)

Localização de erros dos copistas, interpolações posteriores, estabelecimento de genealogias das cópias disponíveis, crítica de proveniência, fixação de datas, identificação de origem, busca de fontes (externa)

Identifica e apresenta a linguagem empregada, costumes sociais citados, sinceridade, exatidão e determinação dos

fatos específicos citados no documento Crítica filológica: morfologia, sintaxe, diacronia e sincronia

estudadas

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Internet

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Tipologia de fontes para aHistória Antiga

Fontes arqueológicas Epigrafia Inscrições monumentárias Cerâmicas Fundações ou ruínas arquitetônicas Artefatos de várias origens e composições Objetos funerários Moedas Pinturas parietais Esculturas

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Possibilidades de acesso

Inscrições – Corpus Inscriptionum Graecorum, Corpus Inscriptionum Latinorum e Inscriptiones Graecae

Cultura material – revistas e relatórios de escavações

Revue Arquéologique, Antike Kunst e American Journal of Archaeology Relatórios de escavações e catálogo de peças

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(FUNARI, 2002:216)

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IMP· NERO· CAESAR· AVGVSTVSDIVICLAVDIF GERMANICI CAESARiS

Ñ·TIB·CAESARIS·AVG·PROÑ·DIVI·AVG·ABÑPONTIF·MAX·TRIB·POTEST·XII·IMP·XCOS·IIII·P·PP·SVLPICIO·SCRIBONIO·RVFO·LEG·AVG·PRoPR

LEG·XV PRIMIG

IMP NERO CÉSAR AUGUSTOFILHO DO DIVINO CLAUDIO . NETO DE GERMANICUS CÉSAR . NETO

[POR ADOÇÃO] DE TIBÉRIO CÉSAR AUGUSTO . ÚLTIMO BISNETO DO DIVINO AUGUSTO. PONTIFEX MÁXIMO. TITULAR DO PODER

TRIBUNÍCIO PELA DÉCIMA SEGUNDA VEZ. ACLAMADO CHEFE VITORIOSO DEZ VEZES . CONSUL QUATRO VEZES . PAI DA PÁTRIA.

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Problemas e Abordagens

A Antigüidade e a História Cultural Avanços significativos na produção

historiográfica a partir da década de 70 (interdisciplinaridade e subjetividade)

Abordagens com múltiplas fundamentações teóricas (psicologia, lingüística, numismática, artes, religião, sociologia, antropologia, etc)

Utilização ilimitada de fontes históricas Possibilidade de ampla revisão e

(re)construção historiográfica

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Teorias, métodos e técnicas?

“O método não pode se limitar à indagação da autenticidade das fontes e, no máximo, à descoberta da ordem dos eventos que se dão à primeira vista de forma confusa. É preciso que ele também componha seqüências de ordem possíveis na realidade, conduza a hipóteses prováveis e as vá reformulando no decorrer do processo inteiro. Por meio dele, o sujeito organiza ativamente a sua experiência intelectual, em constante intercâmbio entre o propriamente empírico e o teorizador” (GRESPAN in PINSKY, 2005:295)

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Métodos e técnicas de análise

Todos os documentos (escritos ou não) são discursos Possuem a necessidade de atribuição definição de autoria (individual ou coletiva, material ou

intelectual) de público a que se destina (individual ou coletivo, homogêneo ou

heterogêneo) Apresentam estruturas superficiais e profundas Superfície – seqüência explícita de elementos constitutivos

(aspectos visíveis – organização da linguagem) Profundidade – mediado pelo raciocínio do observador,

identificação dos interesses e dos objetivos do autor e do público. A reconstituição destes interesses é subjetiva, varia segundo os pontos de vista, interesses e conhecimento do analista.

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Abordagem de documentostextuais ou não textuais

Buscar ferramentas interpretativas de acordo com a origem da documentação

Estudar informações já registradas sobre a sociedade analisada

Estudar indícios materiais e os textos em conjunto Atentar para as diferenças e contradições entre as várias

fontes Atentar para os indícios de conflitos e tensões sociais

presentes nas fontes Autor deve ser estudado em suas características individuais

e coletivas Público pode ser determinado pela forma e pelo conteúdo

do texto

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Objeto arqueológico

Estudo pormenorizado da constituição material: composição física (cerâmica, vidro, madeira, pedra,

etc) Estrutura superficial do objeto: funcionalidade (encobrem uma estrutura profunda de

intencionalidade) Público (consumidor ou usuário) deve ser estudado Fichamento do conteúdo e da forma do objeto de

maneira detalhada

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Conclusão

“a crítica a partir das mudanças que ocorreram, e que ainda ocorrem, na posição da História sobre o documento se dá por tarefa primeira, nem tanto interpretá-lo, nem tanto determinar se ele diz a verdade e qual é o seu valor expressivo, mas sim trabalhá-lo no interior e elaborá-lo: ela o organiza, recorta-o, distribui-o, ordena-o, reparte-o em níveis, estabelece séries, distingue o que é pertinente do que não é, delimita elementos, define unidades, descreve relações” (Foucault, 1972, p. 13).

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Conclusão

“Uma interpretação histórica é um complexo de respostas a perguntas. Os indícios não propõem qualquer pergunta. É o próprio historiador que o faz, e ele hoje possui um arsenal adequado de conceitos para o estabelecimento de hipóteses e modelos explicativos” (FINLEY, 1994:10)

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Caracterísitcas específicas da Antigüidade “Cada época constrói, mentalmente, sua própria representação

do passado, sua própria Roma e sua própria Atenas” (Duby, 1980) Apenas a leitura de primeira mão fundamenta a visão

crítica. Alargamento do universo de temas e abordagens sobre a

Antigüidade O leitor-historiador deve ser incentivado a tratar tanto de

assuntos comuns como de questões pouco usuais, a confrontar opiniões divergentes sobre o mesmo documento e formar sua própria interpretação.

Não se deve reforçar os modelos e os paradigmas vigentes mas encorajar a proliferação crítica de interpretações.

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Concepção de discurso

O discurso não é a língua, nem texto, nem a fala, mas que necessita de elementos lingüísticos para ter uma existência material.

O discurso implica uma exterioridade à língua, encontra-se no social e envolve questões de natureza não estritamente lingüística. Aspectos sociais e ideológicos impregnados nas

palavras quando elas são pronunciadas. O discurso foi conceituado como a língua posta

em funcionamento por sujeitos a que produzem sentidos numa dada sociedade

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Contextetualização histórica

Contexto situação histórico-social de um texto,

envolvendo não somente as instituições humanas, como ainda outros textos que sejam produzidos em volta e com ele se relacionem

moldura de um texto elementos tanto da realidade do autor quanto

do receptor — e a análise destes elementos ajuda a determinar o sentido

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Interpretação de texto

Processo de Interpretação do texto

Saber que há um autor, um sujeito com determinada identidade social e histórica

Situar o discurso como compartilhando desta identidade.

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A Ordem de Discursos Ordem de discursos é um conjunto ou série de tipos de

discursos, definido social ou temporalmente, a partir de uma origem comum.

Discursos produzidos num mesmo contexto de uma instituição ou comunidade, para circulação interna ou externa e que interagem não apenas entre eles, mas também com textos de outras ordens discursivas, (intertextualidade).

IMPORTANTE:

contextualizar os discursos como elementos relacionados em redes sociais e determinados socialmente por regras e rituais, bem como modificáveis na medida em que lidam permanentemente com outros textos que chegam ao emissor e o influenciam na produção de seus próprios discursos.

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Concorrências Discursivas

Espaço de interação discursiva no qual discursos de diferentes emissores se dirigem ao mesmo público receptor: diferentes marcas de cerveja apelando ao mesmo

segmento de mercado (homens entre 20-45 anos, classes A/B, solteiros).

Ocorre quando cada um destes discursos tenta "ganhar" o receptor, "anulando" os demais ou desarticulando seus argumentos ou credibilidade em seu próprio favor.

O modo de interpelar o receptor definirá as características do seu discurso (posicionamento competitivo) e determinará seu êxito ou insucesso.

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Dificuldades da Contextualização

A relação de causalidade entre características de um texto e a sociedade não é entre dois elementos distintos A - B, um causa e outro conseqüência, mas é dialética, ou seja, a continência de um pelo outro é uma relação contraditória.

Os discursos (esfera da superestrutura) não sofrem apenas os determinantes econômicos (esfera da infraestrutura), mas também culturais, sexuais, etários etc.

Não basta demarcar e classificar as palavras para imediatamente interpretar seus significados. É preciso considerar o máximo possível de variáveis presentes no contexto.

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Os sujeitos falam de um lugar social

Este lugar no discurso é governado por regras anônimas que definem o que pode e deve ser dito.

Somente nesse lugar constituinte o discurso vai ter um dado efeito de sentido.

Os discursos se movem em direção a outros. Nunca está só, sempre está atravessado por vozes que o antecederam e que mantêm com ele constante duelo, ora o legitimando, ora o confrontando.

A formação de um discurso está baseada nesse princípio constitutivo – o dialogismo.

Os discursos vêm ao mundo povoado por outros discursos, com os quais dialogam. Esses discursos podem estar dispersos pelo tempo e pelo espaço, mas se unem por que são atravessadas por uma mesma regra de aparição:

uma mesma escolha temática, mesmos conceitos, objetos, modalidades ou um acontecimento. Por isso que o discurso é uma unidade na dispersão.

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A linguagem e o Sentido

A linguagem é o lugar de conflitos e confrontos, pois ela só pode ser apanhada no processo de interação social. Não há nela um repouso confortante do

sentido estabilizado.

Não se pode dizer o que quer quando se ocupa um determinado lugar social, pois este exige o emprego de certas representações e a exclusão de outras.

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Bibliografia BEARD, Mary e HENDERSON, John. Antigüidade Clássica. Uma brevíssima introdução. trad.

Marcus Penchel. Rio: Jorge Zahar, 1998. BRANDÃO, Maria Helena Nagamine. Introdução a análise do discurso. ed. 2ª. Campinas, SP:

Editora da Unicamp, 1993. ECO, Umberto. Interpretação e Superinterpretação. São Paulo, Martins Fontes, 1998. FINLEY, Moses I. História Antiga: testemunhos e modelos. trad. Valter L. Siqueira. São Paulo:

Martins Fontes, 1994. FOUCAULT, Michel. A Ordem do Discurso. São Paulo: Loyola, 1998. FUNARI, Pedro Paulo Abreu. Arqueologia. São Paulo: Ática, 1988. (“Princípios”, 145). _________________________. Análise documental e o estudo da Antiguidade Clássica.

Campinas, UNICAMP, 1995. Primeira Versão, 58. _________________________. Letras e coisas: ensaios sobre a cultura romana. Campinas:

Editora da UNICAMP, 2002. LE GOFF, Jaques. Antigo/Moderno. Trad. Irene Ferreira. In: História e Memória. 2. ed. Campinas:

Editora da Unicamp, 1992. p. 167-202. _______________. Documento/Monumento. Trad. Irene Ferreira. In: História e Memória. 2a. Ed.

Campinas: Editora da UNICAMP, 1992. PINSKY, Carla (org.) Fontes Históricas. Campinas: Contexto, 2005. VIDAL-NAQUET, P. Os gregos, os historiadores, a democracia. O grande desvio. São Paulo:

Cia das Letras, 2002.