Humor e decepção

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1. INTRODUÇÃO Com o objetivo de persuadir os consumidores, algumas vezes, as peças publicitárias focam o positivo do produto anunciado ou o apresentam de maneira que este se torne perfeito, o que pode causar certa discrepância na percepção do público relativa ao que se é anunciado. Isso remete a um dos principais aspectos da propaganda abordados pelos críticos atualmente: a decepção que algumas podem gerar quando interpretadas erroneamente. Como nossa percepção é baseada em nossas experiências anteriores e é seletiva, acabamos enxergando a propaganda como queremos, conhecemos o produto e absorvemos suas informações conforme nossos desejos. Desse modo, com certa frequência, apresentamos certa propensão a enxergar a propaganda com diferentes olhos, sem uma análise crítica, e criamos expectativas que estão além da realidade do produto. Esse processo de criação de expectativas e posterior conhecimento de que não são reais gera, por fim, decepção. Segundo o texto de Shabbir e Thwaites, a decepção da propaganda se baseia em três principais aspectos que podem ocorrer na mesma: a falta de exatidão e a presença de ambiguidade, a omissão de informações para que se avalie a veracidade do anúncio, e, finalmente, a presença de inverdades. Os mesmos autores nos atentam também para o uso do humor como máscara para a decepção, fazendo desse recurso um método para que as pessoas sejam mais condescendentes com o conteúdo exposto na publicidade e percebam menos suas propensões a

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Trabalho para Prof. Dr. Leandro Leonardo Batista - disciplina de Ética em Publicidade

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1. INTRODUÇÃO

Com o objetivo de persuadir os consumidores, algumas vezes, as peças publicitárias

focam o positivo do produto anunciado ou o apresentam de maneira que este se torne perfeito,

o que pode causar certa discrepância na percepção do público relativa ao que se é anunciado.

Isso remete a um dos principais aspectos da propaganda abordados pelos críticos atualmente:

a decepção que algumas podem gerar quando interpretadas erroneamente.

Como nossa percepção é baseada em nossas experiências anteriores e é seletiva,

acabamos enxergando a propaganda como queremos, conhecemos o produto e absorvemos

suas informações conforme nossos desejos. Desse modo, com certa frequência, apresentamos

certa propensão a enxergar a propaganda com diferentes olhos, sem uma análise crítica, e

criamos expectativas que estão além da realidade do produto. Esse processo de criação de

expectativas e posterior conhecimento de que não são reais gera, por fim, decepção.

Segundo o texto de Shabbir e Thwaites, a decepção da propaganda se baseia em três

principais aspectos que podem ocorrer na mesma: a falta de exatidão e a presença de

ambiguidade, a omissão de informações para que se avalie a veracidade do anúncio, e,

finalmente, a presença de inverdades.

Os mesmos autores nos atentam também para o uso do humor como máscara para a

decepção, fazendo desse recurso um método para que as pessoas sejam mais condescendentes

com o conteúdo exposto na publicidade e percebam menos suas propensões a erros

interpretativos. O efeito de mascarar alguma coisa faz com que um indivíduo deixe de

processar um primeiro estímulo do anúncio (no caso, o lado decepcionante), e acompanha o

segundo (o humor) que é transmitido. Deste modo, distraindo o consumidor e modificando o

modo como a mensagem é percebida pelo mesmo, o humor usado como máscara é

considerado uma forma de manipulação, ao passo que também facilita a criação de

associações ilusórias e diminui a rigidez da decepção que seria causada.

Há diversos tipos de humor utilizados, como o de excitação, o de incongruência e de

depreciação. O primeiro normalmente gera alegria, aumenta algum tipo de emoção dos

consumidores; o segundo requer certo esforço por parte do receptor para entender a

mensagem (para entender o humor) e o último gera alguns riscos por apresentar uma situação

fora do comum, e muitas vezes é visto como uma suspensão da moral, já que mostra

desprendimento da mesma. Por apresentar uma suspensão da moral, o humor depreciativo

foge às normas morais, violando, assim, os princípios necessários para se manter e melhorar a

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vida dos consumidores, principalmente daqueles que, de alguma forma, sentiram-se

desconfortáveis com o tipo de humor. Pode ser considerado, portanto, imoral.

1.2. REGULAMENTAÇÃO

Nos casos de imoralidades ou qualquer outra falha detectável em uma campanha, o

órgão responsável pela decisão a ser tomada é o Conselho Nacional de Autorregulamentação

Publicitária, mais conhecido por sua sigla CONAR, que se apresenta através de seu Estatuto

Social como possuidor do objetivo de:

II. Funcionar como órgão judicante nos litígios éticos que tenham por objeto a

indústria da propaganda ou questões a ela relativas.

III. Oferecer assessoria técnica sobre ética publicitária aos seus associados, aos

consumidores em geral e às autoridades públicas, sempre que solicitada.

É este, portanto, o responsável pela aplicação da regulamentação às propagandas que

infrinjam, de fato, ou dêem a entender certa infração de algum princípio ético ou moral

exposto em alguma espécie de legislação, como o Código de Defesa do Consumidor, por

exemplo. Percebemos também, que o órgão oferece assessoria sobre ética publicitária tanto

aos funcionários da área e anunciantes, quanto aos consumidores em geral, tornando públicos

o conhecimento a respeito do mesmo e o direito à fazer reclamações, para que sejam

defendidos os diversos pontos de vista, de certa forma.

Com o objetivo de regulamentar a maioria dos tipos de propaganda e as possíveis

reclamações que podem ter, o CONAR possui em seu código diversas divisões, tanto em

relação às categorias de anúncios (bebidas alcoólicas, remédios, etc) quanto aos problemas

que estes podem apresentar (desrespeito à verdade, à decência, etc). A categoria “decepção”,

no entanto, não é constituinte do código; menos ainda o “humor”, supostamente utilizado para

mascará-la.

Temos, assim, que a área estudada no atual trabalho não pode ser abordada de acordo

com os princípios do mesmo código, já que é, de certa forma, tida ali como irrelevante, ou

talvez indiscutível: se se formasse no órgão um grupo para este tipo de análise, o mesmo seria

constituído por experts, de visão provavelmente mais aguçada que a grande maioria da

população, percebendo as campanhas de maneira diferenciada; fato este que expõe a falta de

estudos relativos e a complexidade de realizá-los, já que o fator decepção relaciona-se muito

mais à percepção de cada receptor, ou seja, é algo bastante subjetivo.

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2. ANÁLISE DE CAMPANHAS

Será realizada, portanto, no atual trabalho uma análise pessoal das autoras relativa às

campanhas escolhidas, apresentando seus conteúdos e classificando-as em humorística ou não

e decepcionante ou não, pondo ao mesmo tempo à mostra os porquês das classificações.

2.1 HUMORÍSTICAS E DECEPCIONANTES

2.1.1 Propaganda da Bauducco “Bichinhos dos sonhos” - Agência: AlmapBBDO

A propaganda da empresa Bauducco tem o objetivo de difundir a promoção de vendas

que está realizando, chamada “Bichinhos dos sonhos”. Logo de início podemos perceber que

a propaganda é, portanto, veiculada a crianças, consumidores do prêmio.

A publicidade em si possui é humorística e se mostra muito coerente ao universo

pueril: um menino brinca, em seu quarto, com esses bichinhos, falando-lhes as posições em

que devem ficar (se bichos de pelúcia ou travesseiros). No meio dessa brincadeira, um dos

bichinhos, o elefante, erra a posição e reclama que errou de um modo doce, como uma

criança. Esse é o principal aspecto que traz humor à propaganda, gerando simpatia, por parte

de crianças e adultos.

A situação mostra com clareza o diferencial do prêmio: podem ser tratados como

bichinhos, apenas, ou podem ter uma segunda utilidade, a de travesseiro. Essa última, além de

mostrar certa praticidade no prêmio, também trabalha com o lado sentimental da criança, já

que dormir com bichinhos de pelúcia traz a ideia de companheirismo e proteção.

Percebemos na propaganda que os bichinhos apresentados, por meio de computação,

se mexem (para transformarem-se). Esse é o principal aspecto que pode causar decepção na

propaganda. Uma criança não possui discernimento suficiente para entender com clareza que

os bichinhos dados não se movimentam sozinhos, nem irão falar, como faz o elefante. Assim,

por serem ingênuas e possuírem uma imaginação muito mais desenvolvida que os adultos, é

muito natural que as crianças sintam-se decepcionadas ao adquirir os bichos de pelúcia, que

não são exatamente como os da propaganda. Há, portanto, uma decepção existente, que é

criada através da apresentação de inverdades no anúncio.

Deste modo, apesar de possuir uma observação, ao final da peça publicitária, de que os

bichinhos não movem-se sozinhos, não se trata de uma frase que chama a atenção do público

infantil, e não muda, portanto, o nível de decepção causado.

O uso do humor nessa propaganda com certeza faz com que o público se torne mais

condescendente. Utilizando um humor de excitação, a propaganda se mostra doce e pueril,

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ligando-se a um público mais familiar. Por apresentar essas características, a publicidade gera

um sentimento de simpatia nas pessoas. E é esse sentimento de simpatia que faz com que não

pensemos na decepção que o anúncio pode causar às crianças, sendo considerado o humor,

portanto, uma máscara.

Outro aspecto relevante para ser citado é o fato de que a relação Humor x Decepção

está posicionada de modo subconsciente na mente dos consumidores. Conscientemente eles

não são afetados pela mensagem da propaganda, porém, no campo do subconsciente a

decepção se mostra presente. Na propaganda em questão, o público que sofre a decepção

(crianças), porém, por não possuírem experiência ou conhecimento em relação às

propagandas em geral, não possuem também essa diferenciação apresentada. No público

infantil, a decepção se mostra presente também no consciente, já que as crianças não possuem

discernimento para separar com clareza a realidade da fantasia.

O comercial é, baseado em nossa análise, HUMORÍSTICO e DECEPCIONANTE.

2.1.2 Propaganda da Skol: “Litrão” - Agência: F/Nazca

A propaganda apresenta uma sugestão da cerveja Skol para se “queimar o filme” em

um churrasco: aparecer vestido com uma sunga de crochê, pochete, blazer de ombreira,

óculos new way, ensaiando passos de lambada, em companhia de Beto Barbosa cantando

Adocica. Porém, para desfazer a impressão causada pelo restante, basta apenas que se leve

uma Skol Litrão.

Trata-se de uma campanha de cunho explicitamente humorístico, demonstrada pela

ridicularidade imposta ao sujeito, com a imagem deteriorada a cada modificação sofrida. Ao

final, no entanto, propõe-se que se na mesma situação o sujeito trouxer consigo uma garrafa

de Skol Litrão, fará não apenas sucesso entre os amigos mas até mesmo entre as mulheres.

Esse suposto sucesso pode gerar a imagem ilusória de que, independente do sujeito,

como ele se veste, age, ou de sua popularidade, a Skol Litrão pode melhorar suas relações

com os demais indivíduos; o que pode decepcionar alguém que realize uma compra do item

demonstrado com o mesmo intuito. Isso caracteriza a propaganda como HUMORÍSTICA e

DECEPCIONANTE.

2.1.3 Análise Conjugada

As duas propagandas humorísticas que possuem decepção possuem diferenças entre si.

Enquanto a propaganda da Bauducco é voltada para o público infantil e trabalha com o desejo

de consumo de uma criança, a da Skol é para o público adulto e trabalha com o desejo de um

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indivíduo de obter status. As duas, porém, apresentam inverdades e por isso podem ser

consideradas decepcionantes.

2.2 HUMORÍSTICAS E NÃO-DECEPCIONANTES

2.2.1 Propaganda da Tigre: “Dança da Faísca” - Agência: Talent

A propaganda em questão faz parte de uma campanha comunicacional da empresa

Tigre. Todas as peças publicitárias da campanha mostram situações que ocorrem quando

usam-se materiais de baixa qualidade em obras e consertos nas casas. Todas elas apresentam

esse problema através do humor, criando-se músicas e danças específicas para cada

comercial.

O anúncio em questão mostra um produto mais seguro e durável para a organização de

fios e cabos existentes em uma casa. Sem isso, podem ocorrer acidentes envolvendo choques

e incêndios. E a publicidade atenta para essa qualidade do produto.

Por meio da “Dança da Faísca” e uma música animada, que faz analogia ao estilo

Michael Jackson inclusive, apresentam-se integrantes de uma família que ainda não possui o

produto em questão. Essa dança faz com que a propaganda torne-se humorística (com um

humor de excitação), não apresenta, porém, qualquer tipo de decepção.

Essa é uma propaganda que absorve o verdadeiro sentido do humor no gênero. Sem o

objetivo de mascarar uma decepção, apresenta-se uma situação engraçada, que faz com que o

público se identifique e sinta que o produto lhe é útil de fato. Não criam-se, com esse anúncio,

grandes e falsas expectativas sobre esse produto ou desejos inconscientes que podem levar à

decepção. A propaganda é, portanto, HUMORÍSTICA e NÃO-DECEPCIONANTE.

2.2.2 Propaganda da Brahma: “Paixão de Brahmeiro” - Agência: África

Ao sintonizarem a televisão no jogo de futebol, um grupo de amigas vê seus parceiros

com letras estampadas em seus abdomens em uma sequência formadora da palavra “amar” e,

felizes, comentam entre si que é uma homenagem para todas. Então outro dois amigos deles

aproximam-se com as letras b e h também estampadas em si e todos reorganizam-se formando

a palavra Brahma, o que provoca um índice de decepção no grupo de amigas logo substituído

por risos quando as mesmas se dirigem à geladeira para pegarem suas latas de cerveja para

poderem acompanhar à partida.

Assim como a maioria das propagandas de cerveja, esta atual da cerveja Brahma,

intitulada “Paixão de Brahmeiro” visa o riso do telespectador. Há na propaganda a decepção

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das amigas baseada em seu engano ao interpretarem o ato de seus companheiros, engano este

em que se encontra o humor da propaganda, e o consecutivo riso gerado pela confusão, que

exclui a possibilidade de qualquer interpretação machista, até mesmo porque as próprias

mulheres vão à geladeira para pegarem suas latas de cerveja após o ocorrido.

Sem demais ambiguidades para margem de erros interpretativos, a não ser as

provocadoras do próprio humor na propaganda, podemos classificá-la como HUMORÍSTICA

e NÃO-DECEPCIONANTE.

2.2.3 Análise Conjugada

Tanto a propaganda da empresa Tigre, como a da Brahma são consideradas, nesse

trabalho, humorísticas (por excitação) e não decepcionantes. Isso se deve à presença do humor

em ambos comerciais, este, porém, não pretende mascarar nenhum tipo de decepção. As

empresas visaram apenas o riso dos telespectadores e um posicionamento positivo da marca.

2.3 NÃO-HUMORÍSTICAS E DECEPCIONANTES

2.3.1 Propaganda do Eqlibri: “Pausa Natural” - Agência: BBDO Argentina

Uma mulher é perseguida durante todo seu dia por um picapau e picada pelo mesmo

na cabeça freneticamente enquanto o animal repete diversas vezes seus afazeres, como

“trabalhar mais” ou “buscar o filho na escola”; então, ela tira um pacote de biscoitos Eqlibri

de sua gaveta e leva um deles à boca, saboreando-o, o que ocasiona a ida do animal, dando

fim também à lembrança de suas obrigações; é então, de acordo com a propaganda,

estabelecida uma pausa natural.

Não há na propaganda, de fato, humor; algo que provoque risos. O ato de utilizarem-se

da figura de um animal, que por sua atitude frenética e repetitiva remete ao “irritante”

satirizando a preocupação constante e o fluxo incessante de pensamento, apresenta indícios

pendentes a uma mera metáfora. Essa metáfora na propaganda, no entanto, nos tira a atenção

quanto ao detalhe de, segundo a mesma, estabelecer-se uma “pausa nos pensamentos” quando

se come aquele biscoito, o que não é um fato.

Outro porém da propaganda é relativo ao fato de, devido à grande importância dada à

nutrição no cenário atual, ao utilizarmos a palavra “natural”, estabelecermos muitas vezes

inconscientemente uma conexão com “saudável”, o que biscoitos não são devido à grande

presença de gorduras em sua composição; caso que poderia mesmo chamar a atenção do

CONAR para o enganoso, não porque eles afirmem algo, mas porque dão margem à

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ambigüidade. O comercial é considerado então, neste caso, NÂO-HUMORÍSTICO e

DECEPCIONANTE.

2.3.2 Propaganda da Mitsubishi: “Lama faz bem” - Agência: África

A propaganda da Mitsubishi, que ainda está sendo veiculada, tem o objetivo de

apresentar o novo carro Mitsubishi Pajero TR4 Flex. O início do filme mostra algumas

pessoas, todas elas jovens, com lama em seus rostos e cantando uma música (“Forever

Young” – conhecida pela interpretação de Emmerson Nogueira). A letra da música já mostra

qual o conceito seguido pelo anúncio. Essas pessoas gostariam de ser, para sempre, jovens, ou

se tornarem rejuvenescidas, por isso também possuem uma máscara de lama (conhecido

tratamento facial para se ter uma pele mais jovem).Após a apresentação dessas pessoas

cantando, entra em cena o carro anunciado. Ele está sendo dirigido em alta velocidade por

caminhos cheios de lama, já que é um 4x4.

O anúncio também traz algumas frases, como “Lama rejuvenesce”, mostrando o

sentido das máscaras de lama e entrando em sintonia com a música cantada. Após a

apresentação do carro, em meio à lama, apresenta-se outra frase: “Mas assim rejuvenesce

mais.”, querendo-se dizer que dirigir uma Pajero pode trazer uma imagem mais jovem,

aventureira, ao consumidor.

Como podemos ver, no comercial não há viés cômico algum, pode observar-se, porém,

a presença de decepção. Por meio da utilização de pessoas jovens apenas e da presença das

frases, acima citadas, a mensagem de que ao comprarmos o carro em questão nos

tornamos/parecemos mais jovens é claramente passada. Analisamos, portanto, que a decepção

é causada pela apresentação de inverdades no anúncio.

No caso dessa propaganda, apesar de não haver o humor para se mascarar a decepção,

também há a influência do lado consciente e inconsciente da mente dos consumidores.

Diferentemente de um público infantil, o da propaganda em questão tem plena consciência de

que não se tornará mais jovem por comprar o carro anunciado. No campo do inconsciente,

porém, o desejo de ser jovem (altamente difundido em nossa sociedade hoje) é grande. O

carro em si já se mostra esportivo e aventureiro, tem, portanto, um aspecto mais jovem

mesmo. A propaganda reforça essa ideia. Inconscientemente, então, o público se mostra

propenso a relacionar a ideia de juventude ao carro, e a satisfazer esse seu desejo de ser jovem

adquirindo-o. Obviamente o indivíduo não se tornará/parecerá concretamente mais jovem

com o carro, e pode sentir-se insatisfeito com a aquisição.

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O comercial é, como podemos observar, NÃO-HUMORÍSTICO e

DECEPCIONANTE.

Essa propaganda não utiliza o humor como máscara de decepção. Porém, se o usasse,

ela poderia ser facilmente “escondida” e passada despercebida.

2.3.3 Análise Conjugada

O comercial do biscoito Eqlibri apresenta-se não humorístico, porém decepcionante,

assim como a propaganda apresentada pela Mitsubishi. O primeiro possui uma decepção

baseada na ambigüidade, presente no anúncio, em relação ao termo “natural”, que nos leva a

pensar no termo “saudável”. Além disso, também mostra-se uma decepção causada pela

apresentação de inverdades (de que a pessoa parará de pensar em seus problemas ao comer o

produto). O segundo comercial, apresenta-se uma decepção baseada em inverdades também,

relacionada ao fato de que, segundo a propaganda, ao usar o produto apresentado as pessoas

possuem uma imagem mais jovem.

2.4 NÃO HUMORÍSTICOS E NÃO DECEPCIONANTES

2.4.1. Propaganda do Banco Itaú “1+1” - Agência: África

Através da propaganda analisada, a agência Itaú visa expor o sucesso da junção entre

os bancos Itaú e Unibanco, pondo à mostra o fato de que todas as agências de ambas as

instituições bancárias já foram integradas, podendo atender os já clientes em qualquer uma

das agências, e relevando a importância dos mesmos, deixando claro que para a instituição a

junção representa muito mais que dois bancos tornando-se apenas um, mas são todos os

clientes de um tornando-se também clientes do outro; por isso 1+1 para o Itaú é mais que 2.

De acordo com uma análise geral devemos já lembrar que propagandas ou

publicidades relativas a instituições bancárias, por serem em sua maioria de cunho

institucional, costumam ser mais sérias, objetivas: sua principal função é esclarecer a função

do banco para que o indivíduo escolha aquele que melhor atenda suas necessidades. Age

assim, deixando de lado tanto o humor quanto, principalmente, a decepção; excluindo uma

margem de erro e evitando desavenças com seus agenciados. A propaganda analisada é,

portanto, NÃO-HUMORÍSTICA e NÃO-DECEPCIONANTE.

2.4.2 Propaganda da Brastemp: “Inspiração muda tudo” - Agência: Talent

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A propaganda da Brastemp nos passa a mensagem de que a inspiração muda tudo. O

comercial começa com imagens do dia a dia do centro de São Paulo. Um local que perdeu seu

encanto, de certa forma, já que não é tão bem conservado como deveria e as pessoas, sempre

com pressa, não prestam mais atenção ou cuidam do lugar. A inspiração apresentada no

comercial é a de trocar o céu com o chão do centro. Muitas pessoas que possuíam espelhos os

posicionavam acima de suas cabeças, fazendo com que o céu fosse refletido no chão do

centro. Mudou-se, assim, a rotina do lugar, trouxe-lhe, de certa forma, beleza, através da

inspiração.

Como observamos com a descrição da propaganda, esta não possui nem a presença de

humor, nem a de decepção. Os criadores preferiram mexer com o emocional e rotina das

pessoas, dos paulistanos mais especificamente.

Passando uma mensagem de que a inspiração pode mudar tudo, o comercial faz com

que a marca se posicione na mente das pessoas como inovadora (que mudou por causa de

certa inspiração). Além disso, como já fora mencionado, emocionalmente, as pessoas

sentiram-se tocadas, por perceber, talvez pela primeira vez, a beleza que o centro da cidade

pode nos apresentar, e como diferentes ações podem mudar as coisas.

Percebemos, portanto, que o comercial em questão não precisou se utilizar do humor

ou da criação de máscaras para a manipulação de decepções, para ter um posicionamento na

mente das pessoas e ser bem visto. Trata-se, assim, de um comercial NÃO HUMORÍSTICO e

NÃO DECEPCIONANTE.

2.4.3 Análise Conjugada

Os comerciais que não apresentam decepção ou humor são os da empresa Brastemp

(Whirpool) e do banco Itaú. Ambos se mostram muito sérios e pretendem influenciar seu

público tanto de modo racional quanto emocional. Nenhum deles apresenta alguma promessa

definida e, principalmente por isso, não há a presença de decepção.

3. CONCLUSÃO

O trabalho teve como objetivo estudar o papel do humor nas propagandas, seja

mascarando a decepção presente nessas, seja causando certa emoção nos receptores para que

estes tenham uma visão mais positiva da marca.

Por meio da análise de duas propagandas de cada tipo (humorística - com decepção e

sem decepção ou não humorística - com decepção e sem decepção também), observamos

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como o humor modifica a percepção dos receptores e sua opinião sobre a propaganda e a

decepção contida nela, que raramente é percebida.

Se fizermos uma analogia à ideia de disfunção narcotizante presente nos estudos de

teoria da comunicação, podemos dizer também que o humor pode causar tal efeito.

Primeiramente é importante explicar do que se trata a disfunção narcotizante.

Simplificadamente, trata- se do efeito que o excesso de informações apresentadas causa nas

pessoas. Cria-se certa insensibilidade e falta de ação e os indivíduos se acostumam com tanta

informação. Deste modo, podemos dizer que o humor, presente na propaganda, também gera

certa insensibilidade e essa falta de ação, por parte das pessoas, em relação à decepção. O

público se acostuma com a presença de decepção nos comerciais e, como são mascaradas pelo

humor, também fica sem ação, insensível.

Apesar de a utilização do humor modificar, de fato, a percepção dos consumidores e

manipulá-los (de certa forma), notamos que, conscientemente, eles não são tão suscetíveis a

tal manipulação. Na teoria da comunicação, a maioria dos estudiosos sempre trabalhou com a

ideia de que o processo comunicacional é unilateral, ou seja, a mensagem só é passada de

emissor para receptor, e este último, como participante de uma sociedade massificada, apenas

a absorve, sem ao menos reinterpretá-la. Com o desenvolvimento do campo comunicacional,

porém, as teorias demonstraram que essa relação se modificou, os então receptores deixaram

de apenas receber mensagens, e passaram, com maior freqüência, a também produzi-las e

analisá-las, reinterpretá-las.

Após esse estudo, podemos entender que os consumidores, ao ver uma propaganda

com decepção, conscientemente são capazes de perceber o motivo da decepção, não a

absorvem apenas. O humor mascarando tal decepção, porém, acaba fazendo com que isso não

seja tão verdadeiro. Conscientemente o consumidor não se mostra tão suscetível ao apelo da

propaganda, porém, inconscientemente está muito ligado ao humor e ao apelo que se mostra

mascarado.