Iakuruarú na trilha da terra fértil

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IAKURUARÚ NA TRILHA DA TERRA FÉRTIL Prof. Dr. Daniel dos Santos Fernandes 1 Prof. Me. Jorge Alex de Almeida Souza 2 Profª Esp. Márcia Bittencourt Brito 3 Raianne dos Santos Fleck 4 Gerlei Agrassar Menezes 5 Shirlene Machado Santos 6 RESUMO Este artigo é resultado do Projeto de Pesquisa “Entre Trapiches, Trilhas e Vilas: Organização Comunitária e Práticas Sustentáveis no Distrito de Mosqueiro, PA/Brasil”, relata as experiências interdisciplinares de docentes e discentes das Faculdades Integradas Ipiranga na Comunidade de Caruaru, localizada na Ilha do Mosqueiro, distrito de Belém do Pará. Adotando procedimentos de pesquisa participante, anotações de trabalho de campo, aplicação de questionários, filmagens e oficinas junto aos ilhéus, foram possíveis identificar perfil socioambiental com destaque para o saber local, as relações de gênero e parentesco, atividades de subsistência, o papel relevante da escola e propostas de roteirização turística de base comunitária para Caruaru. Tendo como ênfase a pesquisa ação que resultou em uma interação maior com a comunidade, centrada 1 Doutor em Antropologia, professor das Faculdades Integradas Ipiranga, Coordenador do Projeto de Pesquisa. Interesse em Antropologia, Cultura, Literatura e Turismo de Base de comunitária. Email: [email protected] – Faculdades Integradas Ipiranga 2 Mestre em geografia. Professor e Coordenador do Curso de Bacharelado em Turismo, pesquisador do projeto de pesquisa. Interesse em Planejamento Urbano e Regional, Geografia do Turismo e Turismo de Base Comunitária. Email: [email protected] – Faculdades Integradas Ipiranga 3 Discente do Programa de Pós Graduação em Educação, mestrado, da UFPA. Especialista em Educação, Assessora da Direção de Ensino das Faculdades Integradas Ipiranga. Email: [email protected] – Faculdades Integradas Ipiranga 4 Discente e Bolsista do Curso de Bacharelado em Turismo das Faculdades Integradas Ipiranga. Email: [email protected] 5 Bacharel em Turismo pelas Faculdades Integradas Ipiranga e voluntária do Projeto de Pesquisa. Email: [email protected] 6 Discente e pesquisadora voluntária do Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia das Faculdades Integradas Ipiranga. Email: [email protected]

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IAKURUARÚ NA TRILHA DA TERRA FÉRTIL

Prof. Dr. Daniel dos Santos Fernandes1

Prof. Me. Jorge Alex de Almeida Souza2

Profª Esp. Márcia Bittencourt Brito3

Raianne dos Santos Fleck4

Gerlei Agrassar Menezes5

Shirlene Machado Santos6

RESUMO

Este artigo é resultado do Projeto de Pesquisa “Entre Trapiches, Trilhas e Vilas: Organização Comunitária e Práticas Sustentáveis no Distrito de Mosqueiro, PA/Brasil”, relata as experiências interdisciplinares de docentes e discentes das Faculdades Integradas Ipiranga na Comunidade de Caruaru, localizada na Ilha do Mosqueiro, distrito de Belém do Pará. Adotando procedimentos de pesquisa participante, anotações de trabalho de campo, aplicação de questionários, filmagens e oficinas junto aos ilhéus, foram possíveis identificar perfil socioambiental com destaque para o saber local, as relações de gênero e parentesco, atividades de subsistência, o papel relevante da escola e propostas de roteirização turística de base comunitária para Caruaru. Tendo como ênfase a pesquisa ação que resultou em uma interação maior com a comunidade, centrada na mediação entre Escola, Associação de Moradores do Caruaru (ASMOCA) e moradores não-associados.

Palavras-chave: Saber Local – Escola – Base Comunitária – Desenvolvimento Sustentável

ABSTRACTThis article is the result of the research project called " Entre Trapiches, Trilhas e Vilas: Organização Comunitária e Práticas Sustentáveis no Distrito de Mosqueiro, PA/Brasil," reports the interdisciplinary experiences of teachers and learners of the Faculdades Integradas Ipiranga in the community of Caruaru, located on the island of Mosqueiro, District of Belém of Pará. Adopting procedures for participant research, notes of field work, the application of questionnaires, filming and workshops along the islanders which were possible identify environmental profile focusing on, local knowledge, gender relations and kinship, life subsistence activities, the important role of the schoolarship and proposals for community-based tourism routing to Caruaru. Tends as emphasis the research action that resulted in a larger interaction with the community, centered in the mediation among School, Association of Residents of Caruaru (ASMOCA) and no-associated residents.

Keywords: Local knowledge - School - Community Base - Maintainable Development

1 Doutor em Antropologia, professor das Faculdades Integradas Ipiranga, Coordenador do Projeto de Pesquisa. Interesse em Antropologia, Cultura, Literatura e Turismo de Base de comunitária. Email: [email protected] – Faculdades Integradas Ipiranga2 Mestre em geografia. Professor e Coordenador do Curso de Bacharelado em Turismo, pesquisador do projeto de pesquisa. Interesse em Planejamento Urbano e Regional, Geografia do Turismo e Turismo de Base Comunitária. Email: [email protected] – Faculdades Integradas Ipiranga3 Discente do Programa de Pós Graduação em Educação, mestrado, da UFPA. Especialista em Educação, Assessora da Direção de Ensino das Faculdades Integradas Ipiranga. Email: [email protected] – Faculdades Integradas Ipiranga4 Discente e Bolsista do Curso de Bacharelado em Turismo das Faculdades Integradas Ipiranga. Email: [email protected] 5 Bacharel em Turismo pelas Faculdades Integradas Ipiranga e voluntária do Projeto de Pesquisa. Email: [email protected] 6 Discente e pesquisadora voluntária do Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia das Faculdades Integradas Ipiranga. Email: [email protected]

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1. INTRODUÇÃO

O projeto “Entre Trapiches, Trilhas e Vilas: Organização Comunitária e Práticas

Sustentáveis no Distrito de Mosqueiro, PA/Brasil” que deu origem a este trabalho tinha

como objetivo alcançar interação dos saberes acadêmico e tradicional, a fim de estudar

e analisar a organização social e práticas sustentáveis no distrito de Mosqueiro, nas

comunidades de Caruaru e Castanhal do Mari-mari. Devido necessidade de readequar as

novas contingências como o tempo e orçamento disponibilizado, bem como, as

singularidades encontradas em Caruaru e Castanhal do Mari-mari, que impossibilitariam

ações junto às duas comunidades ao mesmo tempo, levaram-nos a optarmos por

trabalhar apenas com Caruaru. Desta forma, o lócus da pesquisa passou a ser Caruaru

para que pudéssemos dar conta dos objetivos da pesquisa, agora redimensionada, e

contribuirmos com o entendimento dos processos culturais e políticos da referida

comunidade em direção as possibilidades de construção de práticas sustentáveis.

2. APRESENTAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO

Figura 1. Distrito administrativo de Mosqueiro - DAMOS Fonte: Adaptado do Plano Diretor de Belém (2006)

Situada no Distrito de Mosqueiro (FIG.1), ilha fluvial localizada na costa

oriental do rio Pará, no braço sul do rio Amazonas, em frente à baía do Guajará,

localizado a 70 km de distância do centro de Belém do Pará, localiza-se a comunidade

de Caruaru, termo de origem indígena com significado incerto, que teria vindo de

iakuruarú (jacuraru: variedade de lagarto) ou do dialeto dos índios cariris: caru (coisa

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boa) + aru aru (abundância), que pode ser entendido como “terra da fartura” ou “terra

fértil”; designa importante povoação no interior do distrito.

Para chegar a Caruaru, já na Vila de Mosqueiro, é necessário irmos até o Porto

Pelé, que fica no final da Trav. Siqueira Mendes de onde saem todos os barcos para as

comunidades ribeirinhas do Distrito de Mosqueiro. Leva-se quarenta minutos de barco

seguindo o igarapé Tamanduaquara, um trecho do rio Murubira e, depois, subindo os

rios Pratiquara e Caruaru, onde se atraca no trapiche da comunidade de Caruaru.

A comunidade de Caruaru já existe há mais de cem anos, criada pelo Sr. Manoel

Bartolomeu Fróes, a partir do termo de posse datado de 1894 (FIG. 2), tendo como

famílias tradicionais os Fróes e os Araújos, que iniciam uma relação de parentesco por

afinidade.

Figura 2. Título de Posse da Terra de Caruaru para a família Froes Fonte: SOUZA, 2011.

Possui como centro um campo de futebol, em cujas cercanias existem uma

Escola de Ensino fundamental (E. M. Profª Maria Clemildes), um salão de festas e uma

capela dedicada à Santa Rosa de Lima, padroeira do lugar, festejada em agosto,

inclusive com procissão fluvial.

3. QUESTÕES ANTROPOLOGICAS EM CARUARU

Em Caruaru a construção das relações sociais inicia-se a partir da família Froés

em um processo de parentesco por afinidade em uma longa relação com a família

Araújo, iniciando uma descendência única que reflete ainda hoje nas construções sociais

da comunidade, ratificando AUGÉ (1978, p.19).

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...a filiação é o principio de constituição e de organização interna de cada grupo de parentesco, enquanto as alianças (o parentesco por alianças matrimoniais) são o princípio da organização das relações externas entre os diferentes grupos, constrangidos a estabelecer relações necessárias de troca matrimonial por força da exogamia.

A construção social em Caruaru apresenta-se desta forma como a afirmação de

descendência legitima a partir das relações de parentesco, por afinidade, surgida entre os

Fróes e Araújos em um processo, hoje, mais estendido, prioritariamente, de afinidade

com outras famílias, fruto da relação de casamentos com membros de outras famílias

vindas de outras localidades. Porém ainda é muito forte em toda comunidade repetir-se

a mesma afirmação: “aqui dentro todo mundo é parente”.

Alguns depoimentos caracterizando da seguinte forma: “aqui é como uma

família, todo mundo é parente”, a partir da existência, principalmente entre os

moradores mais antigos, de casamentos entre primos diretos e indiretos, o que

demonstra a ratificação, pelos moradores, das relações de parentesco como principal

lógica de organização local.

A comunidade nunca viveu isolada, portanto, já trazia laços com moradores de

outras comunidades e das cidades próximas. No entanto, a “teia’ de parentesco cuja

origem está num passado e na relação de apropriação do espaço é o lhes oferece a

legitimação de sua identidade. Porém, a forma de continuidade de relação de

parentesco, por afinidade, com outras famílias além da Fróes e Araújo inicia

divergências pela questão do poder local. Situação já observada por Quaresma (2008)

ao trabalhar o Parque Ambiental do Mosqueiro, do qual a comunidade de Caruaru é

entorno.

O predomínio de laços familiares, intensificando a familiaridade como elemento central das comunidades, agrega um complicador que pode ser compreendido deste modo: as novas comunidades, no entorno do Parque vão surgindo continuamente e resultam, quase sempre, de dissidências entre membros da mesma família, ou de casamentos em que pessoas do lugar casam-se com estranhos, que passa a ser aceito na comunidade original do cônjuge, fazendo parte da mesma, ou seguindo o casal para nova comunidade. A facilidade de ocupar um terreno à beiro do rio permite esse rearranjo que desagrega aqui para reagregar lá adiante. (QUARESMA, 2008, p.13)

Assim, algumas lideranças, na atualidade, surgem de cônjuges em relação de

parentesco por afinidade, que começam a destacarem-se nas ações para atenderem a

demanda comunitária local provocando algum desconforto nas relações comunitárias

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em Caruaru, refletindo na relação comunidade e organizações representativas locais,

prejudicando a construção de práticas sustentáveis na comunidade.

4. ALGUNS ASPECTOS EDUCACIONAIS EM CARUARU

A escola da comunidade, por estar localizada em uma zona rural para a área da

educação é caracterizada como uma escola do campo. Em Caruaru observou-se a

presença de uma única escola denominada Unidade Pedagógica Maria Clemildes dos

Santos (FIG. 3), que está sob a jurisdição da Secretaria Municipal de Educação -

SEMEC, ligada a prefeitura de Belém.

Embora o projeto Entre Trapiches, Trilhas e Vilas – ENTRATRIVI, não

contemple em seus objetivos iniciais a pesquisa voltada para a escola, houve em um

momento preliminar, uma forte inquietação dos pesquisadores em relação às questões

educativas na comunidade, como elemento importante para o desenvolvimento do

turismo de base comunitária. Uma vez que, nas comunidades ribeirinhas geralmente são

encontrados altos índices de analfabetismo.

A Unidade Pedagógica oferta o ensino fundamental organizada de forma

multisseriada, termo que adotaremos por ser o mais utilizado. Esse tipo de organização

escolar está previsto pelo art. 23, do capítulo II, da Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9.394/96

A educação básica poderá organizar-se em séries anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de estudos, grupos não seriados, com base na idade, na competência e em outros critérios, ou por forma diversa de organização, sempre que o interesse do processo de aprendizagem assim o recomendar

Figura 3. Unidade Pedagógica Maria Clenilde dos Santos Fonte: BRITO, 2011.

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É uma solução adotada em diferentes países para permitir que a população das

áreas rurais tenha acesso à educação, já que a baixa densidade demográfica nessas áreas

e consequente o baixo número de alunos inviabiliza a criação de turmas voltadas ao

atendimento das séries ou anos específicas.

A pesquisa realizada pelo ENTRATRIVI apontou que na comunidade de

Caruaru a faixa etária é um dado relevante, uma vez que na comunidade 5% da

população entrevistada encontra-se da faixa etária de 7 a 14 anos, considerada a faixa

etária ideal para a formação dentro do ensino fundamental.

Neste sentido, para as crianças da comunidade de Caruaru, não se apresentam

opções de espaço escolar, sendo a Unidade Pedagógica o lugar que congrega tanto as

práticas educativas como também as atividades culturais que culminam com as

atividades da comunidade. Essa relação está presente na fala de um líder ribeirinho

comunitário das adjacências.

A escola é importante porque tem o trabalho de resgatar a nossa cultura, a nossa história, a coordenação da escola mostra o trabalho das crianças para a comunidade e isso é importante para divulgar a nossa cultura. Isso é importante, não é pra gente, mas pra eles, ter as crianças conhecendo e divulgando o que é nosso. (Fala de um líder comunitário)

O líder comunitário reflete sobre a importância da participação das crianças na

principal festa religiosa que a comunidade promove, é o momento de culminância dos

projetos desenvolvidos na escola. O líder comunitário reforça que as práticas educativas

devem ser reflexas da cultura ribeirinha.

Para Arroyo (2009) o direito à educação foi usurpado da população brasileira

durante décadas, muitos saíram dos campos em busca de uma “vida melhor” na cidade,

ou saíram do campo para estudar, uma vez que, a zona rural do país nunca recebeu

atenção. .

O que percebemos é uma relação de interesse muito grande da comunidade em

relação à escola, os professores que tivemos contato moram na comunidade o que nos

ajuda a refletir um fator positivo de conhecimento da realidade. O contato com a

associação dos moradores de Caruaru, nos fez refletir sobre a importância da

organização comunitária e da efetiva participação da comunidade, além do

envolvimento que deve passar desde a preocupação com a educação dos filhos até as

formas de sobrevivência sustentável. Essa dinâmica é favorável na constituição escolas

afinal,

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Uma escola do campo não é, afinal, um tipo diferente de escola, mas sim a escola reconhecendo e ajudando a fortalecer os povos do campo como sujeitos sociais que também podem ajudar no processo de humanização do conjunto da sociedade, com suas lutas, suas histórias, seus trabalhos, seus saberes, sua cultura, seu jeito (ARRYO, 2009, p.110).

Essa afirmação reforça que as escolas do campo e as comunidades não podem

caminhar separadas, elas são constituídas políticas e pedagogicamente pelos sujeitos do

campo devem ser incorporadas pela organização e trabalho desses sujeitos. Dentro dessa

perspectiva podemos perceber na comunidade de Caruaru esta dinâmica, não

aprofundada na vivência de práticas pedagógicas, no currículo implantado, na vivência

com os professores. Uma vez que não vivenciamos o espaço escolar. Mas

experimentadas nas conversas e reuniões que participamos nos finais de semana na

comunidade, com professores, líderes comunitários e pais e mães dos educandos, que se

referem à escola como um lugar importante na comunidade.

Diante disso podemos inferir que há uma esperança da comunidade de Caruaru

que e a educação formal possa contribuir para a melhoria de vida dos seus filhos, bem

como há uma necessidade de implantação de outros níveis de ensino, como por

exemplo, a modalidade da Educação de Jovens e Adultos – EJA, que é necessária para

atender os 24% da população, que segundo os dados da pesquisa, nunca foram à escola.

Em contato com a comunidade podemos perceber que esse dado pode ser explicado por,

pelo menos, dois motivos: O primeiro pela dificuldade de acesso na idade própria e o

segundo pela distância física da comunidade de Caruaru às escolas que ofertam outros

níveis de ensino. Sendo necessário que os moradores saiam de seus lugares e tenha que

viajar de barco até a vila do Mosqueiro, o que dificulta a continuidade de estudos.

5. GERAÇÃO DE EMPREGO E RENDA A PARTIR DE PROPOSTAS

SUSTENTÁVEIS

Os resultados da pesquisa socioambiental da comunidade de Caruaru foram

auferidos da aplicação de questionários e vídeos coletados no período de 15 de janeiro a

17 de abril de 2011. A definição do perfil da comunidade foi o objetivo inicial das

pesquisas em campo para que identificássemos as práticas econômicas, as necessidades

principais, às relações de gênero e a relação dos moradores com o turismo.

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GRÁFICO 01 - GÊNERO DOS ENTREVISTADOSFONTE: Trabalho de campo, 2011.

Assim, coletados e analisados as informações percebemos que a maioria dos

entrevistados pertence ao sexo masculino exatamente 52% e 48% são do sexo feminino,

nesse sentido é possível constatar que essa maioria masculina favorece o fortalecimento

do trabalho encontrado na comunidade do Caruaru como: agricultura pesca aluguel de

embarcação e o comércio local (GRAF. 01). Os dados de campo também indicam que o

artesanato compõe as atividades econômicas e quem está à frente desse trabalho são as

mulheres. As práticas de trabalho em Caraparu mantêm relação de proximidade da

moradia, ocupam pequena extensão territorial e apresentam forte dependência de laços

familiares.

Gráfico 02 - FONTE DE RENDA DA COMUNIDADE DE CARUARUFonte: Trabalho de campo, 2011.

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A maioria dos entrevistados, 64%, obtém o sustento familiar através do

extrativismo, isso se deve pela influência dos cursos d’águas, da herança indígena e da

tradição nordestina no trabalho da agricultura. São práticas que atendem às necessidades

internas das famílias sem grandes produções externas, isto é, escoamento a mercados

externos (GRAF. 02).

Os moradores relatam que incrementam a renda com a contribuição do governo

federal por meio da bolsa família. Que se mostrou presente na renda de quase todos os

entrevistados. Os outros resultados se dividem em 11% do comércio, 7% da

aposentadoria, 6% do artesanato, 6% da merenda escolar e 6% da carpintaria. Esses

dados apontam a importância da proposição do turismo de base comunitária como um

elemento que auxiliará na composição da renda dos moradores de Caruaru.

GRÁFICO 03 - RELAÇÃO DOS MORADORES COM O TURISMOFONTE: Trabalho de campo, 2011

Apenas 9% das pessoas na comunidade trabalharam de forma direta ou indireta

com atividades ligadas ao turismo, existe percentual considerável de 29% que trabalha

com o turismo, e uma grande parcela de comunidade 62% não trabalha com turismo

(GRAF. 03). Pode-se inferir que os locais poucos participaram de propostas vinculadas

ao turismo e tampouco se beneficiaram dos efeitos do turismo à época do Programa de

Ecoturismo para Amazônia Legal (âmbito federal) e das políticas executadas pela

Prefeitura de Belém tendo em vista a Trilha Olhos d’ Água. Há também expectativas de

melhorias de vida, por parte dos moradores, em curto período, o que nos remete que

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falta esclarecimento sobre a importância de trabalhar para a sustentabilidade em médio e

longo prazo.

GRÁFICO 04 - INTERESSE DOS MORADORES EM OFICINASFONTE: Trabalho de campo, 2011.

Para aumentar possibilidades de ocupação e renda percebe-se o grande interesse

da comunidade em participar de oficinas, representando 90% dos interessados (GRAF.

04). Os resultados demonstram os moradores preferem cursos ligados a agricultura

(33%), uma vez que esta atividade compõe as práticas de subsistência abrangendo as

famílias de Caruaru. Os dados relevam interesses diversos como cursos de pintura,

informática e guia de turismo, carpintaria, pesca, leitura e escrita, inglês, mecânica,

trabalhos manuais, costura, doces e bolos (GRAF. 05).

GRÁFICO 05 - INTERESSE DOS MORADORES EM OFICINAS FONTE: Trabalho de campo, 2011.

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Após a aceitação de nossa pesquisa local, a equipe promoveu a oficina de

elaboração de roteiros momento no qual se adotou a estratégia de Grupo de Discussão,

objetivando o diálogo, troca de idéias, a valorização da memória local no que se refere à

história dos primeiros moradores, da religiosidade, da cultura, da economia e do lazer,

permitindo o máximo de interação e integração dos moradores quanto aos eventos e

fatos da ilha.

Houve a montagem de painel com as proposições dos ilhéus e a indicação dos

atrativos culturais e naturais que eles gostariam que fossem desenvolvidos pelo poder

público, Instituições de Ensino Superior, Organização Não Governamental, demais

parceiros. A cada evento e fato apontado pelos moradores como de valor cultural e

turístico há relato relembrado passado recente e o presente. Este exercício democrático

no turismo objetiva registrar as transformações por que passa a comunidade, como

também mostrar aos visitantes os costumes e modo de vida local a partir das decisões

dos ilhéus. As conversas foram gravadas e transcritas para subsidiar o roteiro abaixo

sugerido após a oficina.

QUADRO 1 - ELEMENTOS PARA ROTEIRIZAÇÃO FONTE: Pesquisa de campo, janeiro e março de 2011.

Propostas Iniciais de Roteirização Ecoturística em Caruaru

A Romaria Fluvial

As preparações começam em julho, inicialmente com as peregrinações e as novenas. Estas

romarias acontecem nas casas dos ilhéus. A festividade religiosa culmina com a romaria fluvial em

homenagem Santa Rosa de Lima realizada em agosto, na última sexta-feira desse mês, parando

em cada porto e/ou trapiche, até chegar à igreja para realização da missa com soltura de fogos. No

sábado há o levantamento dos mastros, no domingo continuam os festejos e na segunda-feira

derruba-se o mastro.

A pesca do Camarão

Prática extrativista permanente dos ilhéus que capturam o camarão para subsistência, utilizando

matapi nas margens dos rios. As famílias colocam as armadilhas, geralmente no período da tarde,

e na manhã seguinte retiram o camarão. Segundo os locais, o camarão que se vende na ponte

que dá acesso a Mosqueiro não vem da ilha. A verdadeira cultura do camarão está nas

comunidades.

O grupo de Carimbó

Ressurgimento do grupo de Carimbó Raízes do Caruaipim. Este grupo não se apresenta há seis

anos. Antes era convidado a participar de festivais e concursos em Belém e outros municiípios. O

grupo, menbros próprios da comunidade, era formado por doze casais.

As plantas Medicinais

Várias espécies encontradas nas áreas de terra firme e várzea servem para atender à saúde dos

ilhéus quando acometidos por doenças. Dores de cabeça, febre, crises renais, contusões, dores

estomacais, gastrite, etc são males citados. Para combatê-los há na comunidade plantas que

ajudam.

A cultura da Farinha Cada família tem seu centro (local de plantar e fazer a farinha). É necessária mais informação

técnica que não agridem o ambiente, segundo os próprios moradores. O ilhéus vem ao longo dos

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anos mantendo as mesmas técnicas (derrubada e queima) e hoje esperam mudanças para

mostrar a cultura da farinha e sua influência nos hábitos alimentares locais.

O artesanato

Aprimoramento e escoação da produção local. Alguns moradores utilizam sementes e outros

materiais da floresta para confecção de biojóias. Colares, pulseiras, anéis, brincos, são feitos em

Caruaru. Há a vontade de valorizar o artesanato usado na pesca e no âmbito doméstico como

cestas, peneiras, tipiti.

Time de futebol

Criado por volta das décadas de 1940 a 1950 por três moradores de Caruaru recebeu o nome de

Três Corações, onde hoje existe uma localidade com o mesmo nome. As competições e demais

jogos na ilha reúnem várias pessoas vindas de localidades próximas, constituindo um aspecto

cultural e de lazer muito forte na Comunidade. As competições abrangem as modalidades de

futebol masculino e feminino.

Na localidade de três corações fica localizada a Associação dos Moradores da Comunidade de

Caruaru - ASMOCA.

O Açaí

Cultivado e extraído pelas famílias da Comunidade compõe o sistema de saberes que se estende

desde o plantio, a retirada dos cachos (subida do ilhéu no açaizeiro coma peconha), o processo de

debulhar, deixar de molho em água e produção do vinho (peneira ou máquina) e seu modo de

consumir. Segundo os moradores todo dia há famílias que consomem o açaí, não importando se

está na safra ou não. Outro aspecto importante, que existe na localidade de três corações, uma

máquina de açaí particular, porém pode ser usada por um membro da comunidade quando solicitar

e/ou precisar.

Outra técnica de pesquisa desenvolvida para entender a relação antrópica local

com seu meio foi entregar papel vegetal, lápis e caneta para que os ilhéus pudessem

desenhar os aspectos mais representativos da cultura e para os quais atribuem forte

simbolismo e práticas cotidianas, capaz de indicar o legado econômico, religioso, do

lazer, entre outros. Para Tuan (1980), essa relação homem e ambiente se dá tanto pelos

sentidos (tato, audição, paladar, olfato e visão) aos estímulos externos, como pela

atitude proposital influenciada pela estrutura cultural formada por uma longa sucessão

de experiência, construindo assim, técnicas, modos, costumes e hábitos.

Neste contexto, socioambiental o turismo de base comunitária através de seus

facilitadores e demais profissionais tem que ser direcionado como elo estruturante, ou

seja, ele agregará, somará valor às práticas existentes, propiciando melhorias,

valorizando a cultura local ou ser um fator de ressurgimento de algum aspecto cultural,

como é o caso do grupo de carimbó Raízes do Caruaipim.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Acreditamos que as organizações comunitárias no Caruaru estão em processo de

construção de relações democráticas, tensas, natural pelo espaço comunitário ser um

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espaço de poder, onde as questões de relações de parentesco deverão ser trabalhadas

visando o bem comum, até para possibilitar a chegada mais próxima de um

desenvolvimento sustentável para a comunidade. Neste processo a construção de

estratégias que não excluam nenhum segmento, formal ou informal, de liderança é

muito importante.

Durante seis meses deste projeto de pesquisa observamos a vontade de

moradores de Caruaru em ampliar as suas fontes de econômicas, principalmente o

anseio de inserção de novas tecnologias no plantio de mandioca de outras culturas

agrícolas. Aliado a isto, a aceitação de uma proposta de turismo sendo construída com

a participação dos ilhéus valorizando seus olhares, opiniões e visões do futuro

mostraram-se exitosa, prova disso foi a permissão desta pesquisa a qual aponta para

elaboração de um roteiro inicial, priorizando o ecoturismo e a gestão democrática.

Outro dado importante foi analisar as relações das vivências ribeirinhas e suas

temporalidades sociais como condição da prática turística adequada com a tradição,

costumes, saberes locais, para respeitar ilhéus e turistas quando do planejamento e

execução da atividade turística, tentando evitar cenários construídos para visitante vê e

evasão de divisas de Caruaru ou concentração das benesses do turismo em pequenos

grupos locais. Vale ressaltar que a este passo inicial do projeto objetiva empoderar os

moradores com propostas de turismo feitas por eles próprios de acordo com as idéias

do turismo de Base Comunitária, resultando no Guia Caruaru.

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BIBLIOGRAFIA

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