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Disponível em http://www.anpad.org.br/tac TAC, Rio de Janeiro, v. 3, n. 2, art. 1, pp. 79-94, Jul./Dez. 2013 Identificação do Perfil de Competências Docentes em uma Instituição Estadual de Ensino Superior Identification of Teachers’ Skills in a State Institution of Higher Education in the Amazon Márcia Ribeiro Maduro E-mail: [email protected] Universidade do Estado do Amazonas - UEA UEA/Escola Superior de Ciências Sociais, Av. Castelo Branco, 504, 69065-010, Manaus, AM, Brasil. Artigo recebido em 16.05.2013. Aprovado em 07.11.2013.

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pp. 79-94, Jul./Dez. 2013

Identificação do Perfil de Competências Docentes em uma

Instituição Estadual de Ensino Superior

Identification of Teachers’ Skills in a State Institution of Higher Education in the

Amazon

Márcia Ribeiro Maduro

E-mail: [email protected]

Universidade do Estado do Amazonas - UEA

UEA/Escola Superior de Ciências Sociais, Av. Castelo Branco, 504, 69065-010, Manaus, AM, Brasil.

Artigo recebido em 16.05.2013. Aprovado em 07.11.2013.

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Resumo

Este trabalho investiga o curso de graduação em Administração quanto às competências docentes numa

Instituição Estadual de Ensino Superior, localizada no Amazonas, buscando identificar o perfil desses

profissionais no contexto acadêmico, utilizando a base de estudos desenvolvidos por Cheetham e Chivers (1996,

1998, 2000, 2005). O intuito foi o de colaborar para a construção do programa de qualificação, focando a

realidade dos docentes do referido curso, sobretudo pela complexidade e ainda pela pouca difusão de resultados

nessa área. O objetivo do trabalho é verificar como os docentes desenvolvem suas competências, além de

relacionar as competências essenciais e mais importantes para o desempenho das funções acadêmicas. A

metodologia consistiu numa pesquisa quantitativa, de caráter descritivo, utilizando como instrumento o

questionário. Concluiu-se que a contribuição desse estudo foi importante por ter compreendido como as

competências se encontravam configuradas no curso de Administração de uma IES estadual, e como elas se relacionavam para incentivar a necessidade de uma educação continuada, o que pode apontar caminhos para

estudos mais aprofundados sobre o tema para as instituições de ensino superior do Amazonas.

Palavras-chave: competências; ensino; docência.

Abstract

This article investigates teacher competence in an undergraduate management program at a State Institution of

Higher Education, located in the state of Amazonas (Amazon), Brazil, seeking to identify these professionals’

profile within the academic context, using studies developed by Cheetham and Chivers (1996, 1998, 2000, 2005)

as reference. The aim was to contribute to building a training program, focusing on the teachers’ reality,

especially the complexity and lack of results dissemination in this area. We established the following overall

objective: to see how teachers develop their skills and relate which skills are essential and the most important for

performing academic duties. The methodology consisted of a quantitative survey using a questionnaire, with a

descriptive character. This study is important because it contributes to understanding how skills were configured in the management program and how they related to the need to encourage continuing education, which can

guide further studies on the subject in Higher Education Institutions in the Amazonas.

Key words: skills; education; teaching.

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Introdução

No conjunto articulado de ideias referenciais para o ensino de graduação, o Plano Nacional de

Graduação (PNG): um projeto em construção está estruturado em torno de princípios e fundamentos, diretrizes, metas e parâmetros. A concretização das ideias desse Plano requer um novo

perfil docente, ou seja, ter: (a) formação científica na área de conhecimento; (b) pós-graduação Stricto

Sensu, de preferência, no nível de doutorado; (c) domínio do complexo processo histórico de constituição de sua área; (d) ampla e crítica compreensão dos métodos que produziram o

conhecimento acumulado; (e) competência pedagógica (Dias & Ketzer, 2007).

A competência científico-pedagógica, embora deva ter seu início nos programas de pós-graduação, aprimorar-se-á nos processos de formação continuada que ocorrem no âmbito da ação

coletiva de construção, desenvolvimento e avaliação dos projetos pedagógicos de curso. Nesse

sentido,

Dois elementos estão na base desse papel de referência para o ForGRAD: a qualificação dos

docentes no nível da pós-graduação stricto sensu para o conjunto das IES – papel específico, ao lado daquele que visa à formação do pesquisador – e a condição objetiva como referência de

qualidade para as demais universidades e IES. (Dias & Ketzer, 2007, p. 195).

A partir disso, destacam-se as metas para a formação de docentes universitários, indicadas no PNG. Sendo assim, na perspectiva da melhoria da graduação, o Plano elenca metas e parâmetros para

a formação de professores universitários:

. As agências de fomento à pós-graduação stricto sensu, além dos critérios vigentes para a formação do pesquisador, ampliarão os programas para capacitação e formação, igualmente stricto sensu, dos

docentes da graduação.

. Considerando as necessidades relacionadas à expansão da oferta de vagas no horizonte de dez anos,

as instâncias responsáveis pelas IES ampliarão a oferta de programas de pós-graduação ‘stricto sensu’ no país, dentro dos seguintes parâmetros:

. ampliar a oferta de vagas nesse nível, nas IES públicas, de modo que todas se tornem polos de formação ‘stricto sensu’ de docentes, inclusive por meio de criação de novos cursos;

. estimular também a ampliação de vagas na pós-graduação ‘stricto sensu’, nas universidades

privadas e IES de qualidade, inclusive com abertura de novos cursos;

. aumentar o total de docentes titulados no país em taxa superior à obtida na expansão das vagas

de graduação.

. Instituir em todas as IES programa de formação pedagógica em perspectiva continuada, provendo-

se, inclusive, meios para adoção e absorção de novas tecnologias e metodologias de ensino.

. Os programas de pós-graduação devem oferecer a seus alunos a prática regular de monitoria

supervisionada, disciplinas especiais e outras atividades correlatas, visando à preparação para a docência universitária nas respectivas áreas de conhecimento (PNG, 2004, pp. 82-83).

É importante ressaltar que as metas definidas no PNG (2004) estão direcionadas para a

concepção de formação como processo contínuo, e o papel que as instituições de ensino superior desempenham nesse novo contexto da educação. Esse novo cenário no ensino superior reflete que a

docência requer formação profissional para seu exercício, como: conhecimentos específicos para

exercê-lo adequadamente ou, no mínimo, a aquisição dos conhecimentos e das habilidades vinculadas à atividade docente para melhorar sua qualidade.

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A docência universitária exige a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. Faz parte dessa característica integradora a produção do conhecimento, bem como sua socialização. A

indissociabilidade aponta para a atividade reflexiva e problematizadora do futuro profissional. Articulam componentes curriculares e projetos de pesquisa e de intervenção, levando em conta

que a realidade social não é objetivo de uma disciplina, e isso exige o emprego de uma

pluralidade metodológica (Veiga, 2005).

Em se tratando da formação de profissionais, atualmente se pensa para além de sua formação específica, espera-se que o docente: continue pesquisando, participe de congressos com trabalhos

próprios, esteja atento aos avanços da tecnologia e seus novos instrumentos, desenvolva capacidade de gerência em diversas circunstâncias e diferentes níveis, saiba trabalhar em equipe, inclusive com

colegas de especialidades diferentes da sua e mesmo com profissionais de outras áreas de

conhecimento (Tardif, 2002).

“Acrescenta-se agora novo fato emergente: a revisão das carreiras profissionais e de seus perfis,

as demandas em nossa sociedade por profissionais que se apresentem com um leque de competências

bem mais abrangente do que anteriormente deles se esperava” (Masetto, 2009, p. 14). Atualmente, administrar a trajetória da carreira profissional exige esforço de adaptação dos docentes, assim como a

definição de novas habilidades e competências; e as Diretrizes Curriculares aprovadas pelo MEC para

todos os cursos de graduação do ensino superior indicam abertura nesse sentido.

Considerando ainda as reflexões de Masetto, os currículos mínimos foram substituídos por

explicitação de um conjunto de competências hoje fundamentais para cada perfil profissional. Essas competências procuram abranger aspectos de construção de conhecimento; de pesquisa; de abertura

para outras áreas de conhecimentos para além de sua específica; de abertura para inovações; de

trabalho em equipe multi e interdisciplinar; e outras mais específicas para cada uma das profissões,

conforme as discussões existentes na área.

Surge então nas instituições de ensino a necessidade de uma gestão de competências como

mecanismo para identificar e desenvolver os conhecimentos, habilidades e atitudes necessárias nos docentes para a realização de suas atividades de trabalho. Quando se fala em competências adequadas,

a diretriz curricular passa a ser o modelo de pesquisa, servindo de fonte de inspiração para o

desenvolvimento do objetivo deste trabalho, qual seja, verificar como os docentes desenvolvem suas

competências, além de relacionar as competências essenciais e mais importantes para o

desempenho das funções acadêmicas.

A presente investigação foi direcionada ao curso de Administração de uma Instituição Estadual de Ensino Superior, localizada no Estado do Amazonas, tratando de compreender melhor sobre as

competências docentes no âmbito acadêmico para compor o programa de qualificação profissional que

atenda as necessidades do referido curso. Essa pesquisa foi interessante para reavaliar o perfil do professor, por se tratar de uma IES com apenas 11 (onze) anos de existência e que, a partir de 2008,

passou a compor um quadro de docentes de regime permanente (estatutário) para o curso de

Administração. Assim, fazia-se necessário conhecer melhor o perfil e o desempenho desse profissional, e como essas competências se relacionavam para, posteriormente, investir na qualificação

docente.

Considerando esse cenário exposto, referenciaram-se na pesquisa os estudos desenvolvidos por Cheetham e Chivers (1996, 1998, 2000, 2005), baseado nos tipos de competências definidas por esses

teóricos, a fim de fundamentar a investigação que mostrou a adequação das dimensões propostas

originalmente com aquelas encontradas na presente pesquisa. Assim, as competências encontradas parecem ser significantes ao contexto educacional. A seguir, apresentam-se os referenciais teóricos do

estudo em questão.

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Fundamentos Teóricos

Abordagens e definições sobre competências

Nas últimas décadas no Brasil, presenciou-se um sensível avanço da ideologia neoliberal, e este

fato promoveu alterações profundas em diversas instâncias: dentre elas, ressaltem-se as políticas educativas do país, gerando impactos em todos os níveis de ensino, da pré-escola ao ensino superior, e,

como não poderia deixar de ser, no professor (Hypólito, 2000; Menezes, 2001; Paiva & Melo, 2009;

Ramos, 2001).

Uma das discussões teóricas sobre competências em universidades reforçam a percepção de

Zabalza (2004), em que a formação acadêmica precisa ser discutida sobre aspectos como: seu sentido e sua relevância, a pertinência e a contextualização de seus conteúdos, as características e as

necessidades de seus destinatários, a formação de seus agentes, e os aspectos processuais e

metodológicos que compõem a organização desse tipo específico de formação.

O corpo docente das Instituições de Ensino Superior (IES) públicas está sendo pressionado para se adequar a um novo perfil acerca do ensino universitário. Essa pressão decorre, como destaca

Morosini (2000), proveniente do governo, cujo objetivo é avaliar a qualidade do ensino superior, foi imposta pela instituição, para obter credenciamento junto ao MEC e para captar alunos, e foi buscada

pelo professor para a manutenção do seu emprego e aumento de remuneração, entre outros requisitos.

A partir dessas pressões, o cenário atual está exigindo que seja reavaliado o perfil dos docentes nas IES e a formação profissional, a noção de competências, de acordo com Albuquerque (2002),

passa a nortear a definição desses perfis, promovendo transformações e construções importantes na

configuração dos atores: aluno e professor.

Esse processo de mudança na vida do professor tem mostrado que as atividades acadêmicas

passam pelas discussões a respeito da compreensão sobre competências. Percebe-se pela literatura que competência é: “aplicação prática de conhecimentos, aptidões, habilidades, valores, interesse – no todo

ou em parte – com obtenção de resultados” (Resende, 2003, p. 38). Rabaglio (2001, p. 3) define

competência como sendo “um conjunto de conhecimentos, habilidades, atitudes e comportamentos que permitem ao indivíduo desempenhar com eficácia determinadas tarefas, em qualquer situação”.

Fleury e Fleury (2004, p. 21) definiram “competência como um saber agir responsável e reconhecido,

que implica mobilizar, integrar, transferir conhecimentos, recursos e habilidades, que agreguem valor

econômico à organização e valor social ao indivíduo”.

Fazendo uma análise da evolução das definições de competência, verifica-se que o conceito de

competência utilizado por Resende, Rabaglio, Fleury e Fleury está mais próximo do utilizado pelos precursores americanos do tema, como McClelland (1993). A justificativa da visão americana é que

aqueles consideram mais os aspectos voltados para a capacitação e as habilidades, não fazendo

associação como a visão francesa que enfatiza o meio social e a rede de relações entre os indivíduos e destes com a instituição e a comunidade em geral. Essas duas correntes de pensamentos são as que

servem de base para a visão dos autores brasileiros.

Para o desenvolvimento desta pesquisa, levaram-se em conta, inicialmente, os trabalhos de Cheetham e Chivers (1996, 1998, 2000, 2005), cujo estudo serviu de base para identificar as

competências docentes e como se relacionam no desempenho das funções acadêmicas. Acredita-se

que os resultados aqui apresentados constituem rica fonte de informações acerca da visão de um determinado grupo de professores sobre as competências essenciais para desenvolver o curso de

Administração da IES em estudo. Esses teóricos desenvolveram um modelo holístico de competência

profissional que considera aspectos variados e que resultam em habilidades interconectadas, conforme serão destacados a seguir.

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A gestão baseada em competências

A arte de ensinar pessoas é sistêmica convivendo, a todo o momento, com situações peculiares e

ambíguas. A realidade dos docentes é o convívio com contradições entre os modelos pregados como

ideais, contrapondo-se às suas práticas cotidianas e provocando concepções contraditórias nesses atores sociais. Para Helal, Garcia e Honório (2009), as instituições de ensino superior poderiam

intensificar os programas de qualificação de seus profissionais, quando na realidade a maior parte não

oferece treinamentos ou condições para se desenvolverem novas competências.

Nota-se uma grande distância entre o que é proposto para a prática docente eficiente e as reais condições de trabalho, o que acaba por provocar a insegurança e o estresse, prejudicando a

produtividade e, consequentemente, a qualidade dos serviços.

Helal et al. (2009) ainda afirma que algumas das principais insatisfações apontadas pelos

docentes são as contradições entre a teoria e a prática, os paradoxos entre o planejamento, a iniciativa e a criatividade e, finalmente a falta de autonomia, persistindo com ela os mecanismos de controle.

Quando a prática é diversa do discurso, percebem-se com maior clareza as contradições geradas por

essa dicotomia.

Na visão de Demo (2008), para minimizar as insatisfações, as organizações vêm utilizando em suas gestões a temática sobre competências para desenvolver todos os níveis da organização. Ainda

segundo Gramigna (2002), para que a gestão tenha visão baseada em competências, é importante o envolvimento e a adesão das pessoas-chave da administração e das outras funções, desde a fase inicial

do processo, sendo denominado por ela de sensibilização. Esse trabalho de sensibilização, quando bem

feito, facilita a venda da ideia.

Para compreender de forma mais ampla a conceituação da competência profissional e elaborar

um modelo de gestão que considere todos os conhecimentos, habilidades e atitudes necessárias do

profissional, identificou-se o estudo desenvolvido por Cheetham e Chivers (1996, 1998, 2000, 2005).

Modelo Cheetham e Chivers

O modelo proposto por Cheetham e Chivers (2000) objetiva unificar as diversas abordagens e

visões existentes sobre competências em um só modelo, mais holístico, conforme demonstrado na

Figura 1 (Cheetham & Chivers, 2000 como citado em Godoy, Antonello, Bido, & Silva, 2009, p. 273).

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Figura 1. Modelo de Competência Profissional de Cheetham e Chivers. Nota. Fonte: Adaptado por Godoy, A. S., Antonello, C. S., Bido, D. S., & Silva, D. da (2009). O desenvolvimento das competências de alunos formandos do curso de administração: um estudo de modelagem de equações estruturais. Revista de Administração, 44(3), 265-278.

Com base nesse modelo e através da interpretação do modelo realizado por Godoy, Antonello, Bido e Silva (2009), foram agrupadas cinco blocos de competências: Competências Básicas,

Competências Sociais, Competências de Soluções de Problemas, Competências Técnico-Profissionais,

Competências de Valores e Éticas.

Godoy et al. (2009) definem as questões competências básicas como algumas metacompetências-transcompetências (que, no modelo Cheetham e Chivers, são: comunicação,

criatividade, solução de problemas, aprendizagem, autodesenvolvimento, agilidade mental, análise e reflexão), e também fatores relacionados à competência funcional, uma vez que dizem respeito ao

desenvolvimento de habilidades essenciais e específicas da função.

Considerando a dimensão competência pessoal ou comportamental, verifica-se que os aspectos presentes estão associados ao que Zarifian (2003) denominou de competências relacionais, ao que

Fleury e Fleury (2001) chamaram de competências sociais e Cheetham e Chivers (2005) de competência pessoal ou comportamental. Enfim, a capacidade para adotar comportamentos

apropriados, que é observável em situações relacionadas ao trabalho.

Esse tipo de resultado também tem sido encontrado na literatura internacional, como mostram os trabalhos de Kuh et al. (1991) e de Kuh (1993), que alertam para o fato de que a aquisição desse

tipo de competência não deve ser entendida como uma consequência direta do currículo vivenciado,

mas deve-se, fundamentalmente, às experiências que ultrapassam a sala de aula e que, de certa forma, promovem aprendizados informais (Godoy et al., 2009). Já a competência para solução de problemas,

embora não conste das propostas de Fleury e Fleury (2001), e de Zarifian (2003), aparece em outros

quadros organizativos, como o de Fandt (1994) e o de Nordhaug (1993). É importante relembrar que em Cheetham e Chivers (2005), ela aparece como uma metacompetência. No campo da educação, essa

competência é bastante valorizada entre autores preocupados com a aprendizagem escolar (Ausubel,

Novak, & Hanesian, 1978; Perrenoud, 1999), com o ensino superior (Lowman, 2004) e, mais,

especificamente, com o ensino de Administração (Carneiro, 2004 como citado por Godoy et al., 2009).

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Relaciona-se com a competência de conhecimento/cognitiva, que é a posse de conhecimento apropriado relacionado ao trabalho e à capacidade para seu uso efetivo. O acoplamento de

competência cognitiva com conhecimento enfatiza a capacidade para aplicar conhecimento de diferentes formas e em diferentes situações, conforme o modelo proposto por Cheetham e Chivers

(2005).

Em relação às competências técnico-profissionais – também presentes na proposta de Fleury e Fleury (2001) e de Zarifian (2003) –, é importante notar que em sua caracterização se encontram

elementos da competência denominada por Zarifian (2003) de inovação. No modelo de Cheetham e

Chivers (2005), estão relacionadas com competência funcional, definida como a capacidade para executar uma gama de tarefas baseada no trabalho para produzir resultados específicos efetivamente.

Já a competência de valores e ética, considerada fundamental para o desempenho profissional por alguns autores e definida por Cheetham e Chivers (2005) como a posse de valores pessoais e

profissionais apropriados e a capacidade para fazer julgamentos que estão baseados nas situações

relacionadas ao trabalho, não foi identificada como um construto no modelo original. O acoplamento

da competência ética com valores enfatiza o ponto que avalia como o conhecimento é efetivamente aplicado. Assim, competência ética recorre à aplicação efetiva e apropriada de valores no contexto

profissional.

Ressalte-se que, para a presente pesquisa, foi acrescentada à dimensão competência política, com vistas a considerar as relações de poder inerentes a qualquer estrutura organizacional. De acordo

com a pesquisa de Paiva (2007), essa dimensão é importante por retratar o ambiente em que o professor atua.

A seguir apresentam-se resumidamente os tipos de competências e seus conceitos definidos por

Cheetham e Chivers (1996, 1998, 2000, 2005) e adaptados por Paiva (2007, p. 43):

1. Competência cognitiva/conhecimento: competência técnica/teórica/especialista (conhecimento

formal base de profissão); conhecimento tácito/prático (dificuldade de articular ou passar, sempre ligado com a performance de funções particulares); conhecimento procedural (rotinas básicas –

como, o quê, quem, quando, etc.); conhecimento contextual (organização, setor, geografia, base de

clientes, etc.); e aplicação de conhecimento (habilidades de síntese, transferência e conceitualização).

2. Competência funcional: específica da ocupação (conjunto de funções específicas da profissão); processual/organizacional/administrativa (planejamento, monitoramento, implementação,

delegação, evolução, administração do próprio tempo etc.); mental (capacidade de ler/escrever, de

operar com números, de diagnosticar, habilidades em tecnologia de informação etc.); e física

(coordenação, destreza manual, habilidades de digitação etc.).

3. Competências comportamental ou pessoal: social/vocacional (autoconfiança, persistência, controle

emocional e de estresse, habilidades de escuta e interpessoais, empatia, foco em tarefa etc.); e intraprofissional (coletividade, conformidade com normas de comportamento profissional etc.).

4. Competência ética/valores: pessoal (aderência à lei e aos códigos morais ou religiosos, sensibilidade para necessidades e valores de terceiros etc.); e profissional (adoção de atitudes

apropriadas, adesão a códigos profissionais de conduta, autorregulação, sensibilidade ambiental,

foco em cliente, julgamento ético, reconhecimento dos limites da própria competência, dever em

manter-se atualizado e em ajudar no desenvolvimento de neófitos na profissão, julgamentos sobre os colegas etc.).

5. Competência política: pessoal (percepção acerca dos jogos políticos inerentes às organizações, daqueles relacionados às pessoas individualmente e dos derivados dos interesses particulares do

profissional etc.); profissional (adoção de comportamentos apropriados à manutenção do

profissionalismo etc.); organizacional (ações voltadas para o domínio ou fluência nas fontes estruturais e normativas de poder na organização onde desenvolve suas atividades produtivas etc.);

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e social (ações voltadas para o domínio ou fluência nas fontes pessoais, relacionais e afetivas de

poder etc.).

Assim, baseado nesse referencial teórico, percebe-se a importância desse estudo de Cheetham e Chivers para a gestão institucional pautada em competências que concilie, de maneira estratégica,

projetos individuais, institucionais e sociais. A seguir, apresenta-se a metodologia com o resultado da

pesquisa baseada nesse referencial.

Metodologia e Análise dos Resultados

O objetivo da presente investigação foi verificar como os docentes desenvolviam suas

competências, além de relacionar as competências essenciais e mais importantes para o desempenho

das funções acadêmicas. O universo da pesquisa compreendeu os docentes do curso de Administração

de uma Instituição Estadual de Ensino Superior, localizada no Amazonas. A amostra foi definida pelo

critério de tipicidade (Vergara, 2003), pela existência de elementos representativos na população-alvo relacionados à temática sobre competências tratadas no referencial teórico.

O critério de inclusão envolveu os docentes do quadro efetivo aprovados no concurso público de 2008 e contratados em regime estatutário, eles contribuíram com suas experiências e

conhecimentos para um maior alinhamento das respostas. Levando em conta fatores como a

disponibilidade, o acesso e a facilidade de localização dos professores que responderam ao questionário, tal pesquisa foi enviada para o e-mail de vinte docentes, mas obteve dezenove respostas.

Mesmo assim, isso confere validade à pesquisa, tendo em vista ser 95% do universo, que é o intervalo

de confiança, e possuindo erro padrão de 5%.

Vale ressaltar que os dados foram obtidos junto a fontes primárias, isto é, foram coletados através de Curriculum Lattes e questionário contendo 14 questões, ocorrido no período de 2011 a

2012. O uso desses dados, como forma básica de levantamento, justificou-se pela ausência, na instituição investigada, de informações levantadas sobre os fatores selecionados para este estudo.

O instrumento utilizado foi um questionário, contendo perguntas fechadas e padronizadas, oferecendo à pesquisa a vantagem de realizar a codificação e a tabulação das respostas e possibilitando

fazer comparações com outros dados referentes ao tema estudado (Lakatos & Marconi, 1994, p. 201).

Para tratar e analisar os dados, primeiramente, utilizou a base teórica dos estudos de Cheetham e

Chivers (1996, 1998, 2000) e adaptou-os para a realidade acadêmica; quanto ao tratamento dos dados, utilizou-se a análise estatística. Além disso, a pesquisa foi quantitativa e usou o método descritivo que

apresentou conhecimento suficiente para desenvolver um conjunto de dados.

Corroborando para obter o acesso eficaz a esses dados, dividiu-se a organização dos procedimentos para a coleta dos dados da forma detalhada, como se apresenta a seguir:

1. Foram extraídas informações na plataforma Lattes do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), criado para atender pesquisadores, estudantes, consultores. É

uma base Lattes de repositório de dados em que praticamente todos os tipos de informação curricular podem ser cadastrados dentro da base. Através desse repositório, foi possível levantar o

percurso acadêmico e profissional dos professores do curso de Administração e suas áreas de

concentração em pesquisa no período de 2011 a 2012. A busca dos dados da plataforma Lattes

permitiu acesso pelo nome do professor, confrontando os dados com as percepções apresentadas nas respostas das questões elaboradas no questionário.

2. Aplicação do instrumento de pesquisa apresentou questionário com o propósito de verificar como os docentes desenvolveram suas competências, das quais a pesquisa destacou os seguintes

instrumentos de desenvolvimento das competências: leitura; cursos; ensinando; participação em

projetos; seminários; consultoria e outras atuações profissionais não acadêmicas. Ainda na primeira

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parte do questionário, solicitou-se relacionar, por ordem de prioridades, de 1 (menor grau) a 5

(maior grau), as competências essenciais e mais importantes para o desempenho de suas funções

acadêmicas, sendo elas: competência ética/valores; competência cognitiva/conhecimento; competência funcional; competência comportamental ou pessoal; e competência política.

No que se refere à coleta de dados por meio de consulta ao Curriculum Lattes da Plataforma

Lattes do CNPq, a pesquisa centrou-se em analisar as questões apresentadas a seguir, mostrando os resultados gerais acerca do Currículo Lattes dos docentes.

Primeiramente, para que se tenha uma síntese do perfil dos professores participantes deste estudo, algumas características se fazem importante ressaltar: a maioria deles possui mais de um

vínculo de trabalho, geralmente em outras instituições de ensino privadas e empresas privadas, sendo

que, dos 19 (dezenove) respondentes, 16 (dezesseis) professores responderam que atuam concomitantemente no setor público (atual Instituição de Ensino Estadual a qual pertence) quanto

privado (outras Instituições de Ensino e empresas), correspondendo a 96,21%; os outros 3,79% são

docentes que pertencem à instituição estadual de ensino e possuem somente esse vínculo de trabalho.

Tabela 1

Vínculo de Trabalho

Perfil Total respondido Percentual (%)

Instituição Estadual de Ensino Superior 4 3,79%

Empresa Privada e/ou Mista 6 9,12%

Instituição de Ensino Privado 10 87,09%

Total 19 100%

Nota. Fonte: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico. (n.d.). Curriculum Lattes. Recuperado de

http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/busca.do?metodo=apresentar

Outros fatores que foram analisados e definem o perfil dos professores dessa IES estadual são: titulação, capacitação, regime de trabalho, tempo de docência e produção técnico-científica,

demonstrado na Tabela 2.

Tabela 2

Perfil dos Professores

Titulação Capacitação Regime de

trabalho

Tempo de

docência

Produção técnico-

científica

Opções% Opções% Opções% Opções% Opções%

Especialista – 3,2% Sim – 36,84% 20 H – 1% 10 a 15 – 45,7% Nenhum – 0

Mestre – 95,8% Não – 63,16 40 H – 99% 15 a 20 – 49,3% 1 a 5 -87%

Doutor – 1% DE – 0 20 a 30 – 5% 6 a 10 – 10%

>30 – 0 11 a 20 – 3%

Nota. Fonte: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico. (n.d.). Curriculum Lattes. Recuperado de http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/busca.do?metodo=apresentar

Conforme a Tabela 2, a titulação dos professores se concentra em nível de especialização e mestrado, tendo apenas 1% de professor com doutorado, entretanto o resultado demonstra a

necessidade de investir mais em programas stricto sensu para o curso de administração nessa IES.

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De acordo com o resultado da Tabela 2, foi possível considerar relevante a grande quantidade de docentes que não estão participando de programas de capacitação (63,16%), seja de caráter formal ou

informal. A formação dos professores está intimamente associada a uma formação contínua que vise ao desenvolvimento pessoal e técnico-profissional. Para que o professor responda às novas demandas

e aos desafios relacionados ao processo centrado no aluno e na aprendizagem, aprender a aprender

também passa a ser uma competência necessária a este.

Ainda pode-se destacar o regime de trabalho dos professores do curso de administração em que a grande maioria possui vínculo de 40 horas semanais e apenas 1% possui 20 horas, entretanto

nenhum professor encontra-se no regime de trabalho de Dedicação Exclusiva (DE). A ausência de professores com DE contradiz o que determina o inciso III do art. 52 da Lei 9.394/1996, que define

que uma universidade caracteriza-se pela existência da terça parte do seu corpo docente em regime de

tempo integral.

Outro dado é que a maioria dos professores tem um tempo de experiência docente entre 10 a 20

anos (55%). Isso demonstra que o grupo está em fase de crescimento profissional. A minoria do grupo

encontra-se com mais experiência entre 20 a 30 anos (5%). Além disso, o grupo de professores apresentou um percentual incipiente de produção técnico-científica (referente a artigos, livros,

capítulos de livros, trabalhos em anais de congresso, trabalhos técnicos), no período de 2009 a 2012.

Num total de 87% dos professores, registraram ter entre 1 a 5 produções técnico-científicas, demonstrando que a produção científica nessa IES encontra problemas na formação desses recursos

humanos, e isso afeta a capacidade acadêmica instalada na instituição. Para promover melhorias, é

preciso formar recursos humanos para o ensino e a pesquisa, transferir tecnologia para os seus laboratórios de pesquisa, e avançar o conhecimento científico na área.

No que diz respeito a como os docentes desenvolvem suas competências, foi utilizado

questionário que fornecia as seguintes maneiras de desenvolvimento de competências: leitura; cursos; ensinando; participação em projetos; seminários; consultoria e outras atuações profissionais não

acadêmicas.

Tabela 3

Instrumentos de Desenvolvimento da Ideia de Competência Associada ao Exercício da Função

INSTRUMENTOS DE DESENVOLVIMENTO TOTAL

RESPONDIDO

PERCENTUAL

%

Leitura 17 89,47%

Cursos 17 89,47%

Ensinando 17 89,47%

Participação em projetos 12 63,16%

Seminários 8 42,11%

Consultorias 15 78,95%

Outras atuações profissionais não acadêmicas 11 57,89%

Nota. Fonte: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico. (n.d.). Curriculum Lattes. Recuperado de http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/busca.do?metodo=apresentar

Conforme apresentado na Tabela 3, os instrumentos de desenvolvimento de competências que mais se destacam são leitura, cursos e ensinando, com 89,47% cada. Pode-se perceber que esses três

instrumentos estão muito relacionados à competência cognitiva, que, na Tabela 4, com 23,86%, apresenta-se como a competência prioritária dos docentes para o exercício de sua função acadêmica.

Ainda nesse sentido de relacionar instrumentos e prioridades entre competências, a participação em

projetos se faz presente em 63,16% dos casos em que os docentes deles se utilizaram para desenvolver suas competências. Tal resultado expõe a competência cognitiva, no sentido de aplicação de

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conhecimento, que se consubstancia nas habilidades de síntese, transferência e conceitualização do

conhecimento, abordados nos estudos de Cheetham e Chivers (1996, 1998, 2000); associada à questão

técnica do mesmo, que estaria mais relacionado à competência funcional. O instrumento seminários se apresenta com 42,11% dos casos registrados; e consultorias e outras atividades profissionais não

acadêmicas, com 78,95 e 57,89% respectivamente.

Ainda nessa parte do questionário, solicitava-se relacionar, por ordem de prioridades, de 1 (menor grau) a 5 (maior grau), as competências essenciais e mais importantes para o desempenho de

suas funções acadêmicas, sendo elas: competência ética/valores; competência cognitiva/conhecimento;

competência funcional; competência comportamental ou pessoal; e competência política.

Tabela 4

Tipos de Competências

TIPOS TOTAL RESPOSTA PERCENTUAL (%)

Ética/valores 57 20,00%

Cognitiva/conhecimento 68 23,86%

Funcional 44 15,44%

Comportamental ou Pessoal 58 20,35%

Política 58 20,35%

Nota. Fonte: Questionário respondido.

Pela Tabela 4, percebeu-se certo equilíbrio entre as competências apresentadas. A competência

apontada como a que se mostra preponderante para o desempenho das funções acadêmicas em que foi

realizada a pesquisa é a que se relaciona ao conhecimento, com 23,86% de escolha entre os respondentes com prioridade 5. A competência cognitiva relaciona-se à visão holística da área

administrativa, que busca a generalização. A diversidade de disciplinas do curso para capacitar uma

atuação em áreas públicas e/ou privadas, exige, também, uma boa amplitude de conhecimentos e condiz com os 96,21% (Tabela 1) dos respondentes trabalhar ou trabalharem em ambas as esferas,

como apresentado. Devido à abrangência da administração, é necessário um amplo conhecimento, o

que sintoniza com a formação do profissional desta área e ratifica a predominância da competência do conhecimento frente às outras.

Decrescendo-se na escala de prioridade, têm-se as competências comportamental ou pessoal e a

competência política empatadas, com 20,35%. Refletindo-se epistemologicamente sobre ambas, percebe-se que elas se relacionam e embasam-se em questões comuns como os valores e a moral. Os

valores são individuais ou de determinado grupo e a moral, por sua vez, é um conjunto de normas,

regras que regem determinado espaço, sendo concomitantemente relevantes para o contexto acadêmico.

Quando se discorreu sobre as competências comportamental e política, fez-se uso de “valores”, o que evidencia, também, sua relação com a competência ética/valores. No campo pessoal, a

competência ética seria a aderência à lei e aos códigos morais e valores, enquanto no campo

profissional, estaria relacionada a adoção de atitudes apropriadas, condutas e julgamentos. A pequena

diferença entre essas três competências – comportamental, política e ética – justifica-se por elas estarem associadas, sobressaindo-se uma ou outra em cada situação específica.

Em escala de prioridade, os respondentes do questionário tomaram como menos prioritária a competência funcional, com 15,44%. Tal competência possui relação mais íntima com a

especialização, num contexto de enfoque aos aspectos técnicos da profissão, em contraposição à visão

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generalista sobre a qual se discorreu na compreensão da competência cognitiva, justamente a

prioritária dentre as cinco apresentadas.

Baseado no modelo de competências adotado pelos teóricos Cheetham e Chivers (1996,1998, 2000, 2005) e analisado os dados coletados, tanto pelas informações contidas no Curriculum Lattes

quanto pelo questionário aplicado; concluiu-se que as principais competências dos docentes do curso

de Administração estão associadas aos estudos desses teóricos, salientando que há aquelas competências que se destacam muito mais. A competência prioritária para o exercício das funções

acadêmicas da população estudada é a competência cognitiva. Em seguida, vêm as competências

comportamental ou pessoal e a política. Com uma pequena diferença em relação às competências citadas, a competência ética/valores. E, por último, a competência funcional, por estar mais

relacionada à especialização, enquanto o enfoque do curso é a amplitude.

No que concerne à pesquisa ao banco de dados do Curriculum Lattes, pode-se destacar que poucos docentes tinham qualificação para o exercício da profissão. Ainda é pouco desenvolvida a

questão da capacitação, podendo influenciar também no pouco desenvolvimento das

metacompetências que influenciam e refletem no perfil dos docentes, tendo em vista que a reunião de mais competências habilitam os professores a lidar com as demandas do ambiente universitário.

Outro aspecto relevante é que 96,21% do universo amostral atuam concomitantemente tanto no setor público quanto privado, permitindo-lhes maior segurança quando da interação com seus alunos

dentro das salas de aula, visto que a prática confere e valida a teoria, permitindo aos alunos o

compartilhamento de experiências que são resultados das teorias aplicadas, ou mesmo, serão a base para a mutação delas e a formulação de outras.

Todavia, apenas 42,11% dos docentes apresentaram trabalhar ou terem trabalhado com projetos

de pesquisa – o que carece de maior atenção, haja vista que uma universidade que se baseia em ensino, pesquisa e extensão não pode prescindir de nenhum destes pilares.

As competências, como apregoa a gestão de pessoas, não é algo inato, mas que pode ser desenvolvido (Gil, 2001). Assim, nesta pesquisa, foram definidos alguns instrumentos de

desenvolvimento de competências, quais sejam: leitura, cursos, ensinando, participação em projetos,

seminários, consultorias e outras atividades profissionais não acadêmicas. Os instrumentos com maior participação no que tange ao desenvolvimento de competências foram leitura, cursos e ensinando –

com 89,47% cada. Tal resultado evidencia que a competência cognitiva é a prioritária frente às outras,

sob a perspectiva dos docentes. Isso se dá em virtude da competência cognitiva ser composta por

conhecimentos formais, tácitos, processuais e contextuais, tais como suas aplicações, conforme defendem Cheetham e Chivers (1996, 1998, 2000).

Relativo às prioridades docentes, do ponto de vista dos próprios, a configuração delas ficou da seguinte maneira, em ordem de prioridade: competência cognitiva/conhecimento (23,86%);

comportamental ou pessoal (20,35%); política (20,35%); ética/valores (20,00%); e, por fim,

competência funcional (15,44%). Há certo equilíbrio entre os resultados coletados, como se pode perceber pela porcentagem que cada competência alcançou. Pode-se depreender desses resultados que,

de fato, o conhecimento, alinhado com uma perspectiva do curso de administração de formar

profissionais multicompetentes por meio de uma formação generalista e holística manifesta como

prioridade para os docentes de administração nos quais foi realizada a pesquisa. Seguinte à competência cognitiva, na escala de prioridade, estão as competências comportamentais e política.

Deliberando-se epistemologicamente sobre ambas, nota-se que elas se relacionam e que têm como

bases discussões comuns como os valores e a moral, daí terem obtido resultados equivalentes percentualmente como prioridade. Por fim, tem-se a competência funcional; essa, em contraposição à

competência cognitiva, está mais alinhada com preceitos voltados para a especialização, enfocando os

aspectos teóricos (cognitivo) do que prático/empírico.

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Considerações Finais

Considerando os resultados apresentados, percebe-se que a pesquisa é um recorte de uma

realidade institucional, realizada no período de 2009 a 2012, representaram dados significativos para a elaboração do programa de qualificação docente, em especial para o curso de Administração, pois, até

então, não existiam indicadores que demonstrassem a trajetória acadêmica do quadro de pessoal dessa

instituição estadual com 11 (onze) anos de existência.

Assim, destacam-se da investigação algumas questões relevantes para avaliação:

. Análise do Currículo Lattes apresentou que a grande maioria docente do curso: não está envolvido com capacitações formais e/ou informais, refletindo na titulação; baixo envolvimento com a

produção técnico-científica; nenhum docente em regime de dedicação exclusiva e,

consequentemente, outros vínculos de trabalho. Os dados refletem a necessidade de rever as políticas de gestão de pessoas, buscando investir em: programas de qualificação, valorização

profissional, carreira e remuneração. Esse conjunto de indicadores dificulta o surgimento de outras

metacompetências que habilitem os docentes a lidar com as demandas universitárias;

. Questionário aplicado demonstrou que o estudo sobre competências é preponderante para o

exercício da docência e para reavaliar o perfil do professor diante das demandas do contexto acadêmico;

. Prioridade entre as competências, ressaltando a competência cognitiva como valorizada na percepção dos docentes, seguida das competências comportamentais e política;

. Valorização da formação teórica (cognitiva) muito mais do que a prática/empírica. Isso reflete que

a profissão docente busca os conhecimentos teóricos e especializados sobre determinada matéria adquiridos pela educação formal;

. Relação teórica dos estudos de Cheetham e Chivers (1996, 1998, 2000, 2005) com as competências docentes, pois o mapa conceitual desses teóricos mostrou a adequação das dimensões propostas

originalmente com aquelas encontradas na presente pesquisa.

Para tanto, é importante observar que as conclusões aqui apresentadas são específicas para o universo da pesquisa: docentes do curso de Administração de uma IES estadual da região norte,

levando-se em conta que trata de uma região em expansão na formação de recursos humanos

qualificados para as atividades docentes, de pesquisa e técnica que atendam os diversos níveis da administração no âmbito público e privado.

É relevante que a IES pesquisada defina suas políticas de desenvolvimento de recursos humanos e propostas compatíveis de intervenção no que diz respeito à capacitação docente para o ensino de

Administração, considerando as dimensões das competências, as atitudes, os valores, a predisposição e

os aspectos específicos relativos à filosofia e à estrutura do ensino nessa IES.

Mesmo diante dessa especificidade, a pesquisa pode contribuir no sentido de que todas as

competências são importantes para os docentes universitários e que a avaliação no ensino aumenta a percepção dos docentes em relação ao tema competências, o que pode apontar caminhos para estudos

mais aprofundados sobre o tema para as instituições de ensino superior do Amazonas.

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