Igor Zanoni - Leone Rigamonti Girardi

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129 Economia & Tecnologia - Ano 06, Vol. 22 - Julho/Setembro de 2010 O pensamento ambiental de Al Gore Igor Zanoni Constant Carneiro Leão Leone Rigamonti Girardi RESUMO - Al Gore (1948) é militante do movimento ecológico desde sua juventude, tendo também estudado questões ligadas à família norte-americana, escrevendo diversos livros im- portantes sobre esses temas. Aqui apresentamos um registro de seu pensamento ambiental em três dos seus textos sobre o assunto, não apenas por sua eminente posição na política norte- americana mas por ligar de modo original a questão ambiental aos problemas políticos vividos recentemente pela sociedade e governo dos Estados Unidos. Palavras-chave: Ecologia. Política internacional. Pensamento ambientalista. Este texto é uma notícia sobre o pensamento ambiental de Albert (Al) Gore, vice-pre- sidente dos Estados Unidos durante a presidência de Bill Clinton, diversas vezes membro da Câmara dos Deputados e senador norte-americano, empresário e autor de diversos livros sobre a cultura americana, destacando-se seu pensamento ambiental. Nesta última linha escreveu os best sellers A Terra em Balanço e Uma Verdade Inconveniente (também transformado em vídeo), além de incluir um importante capítulo sobre meio ambiente em seu último livro, O Ataque à Razão. Seu pensamento nesta área é importante não apenas pela relevância da condição política e em- presarial do autor, ou da relevância do tema, mas especialmente pela lucidez e coragem com que ele é abordado. A ideia de uma ameaça ambiental global foi apresentada a Al Gore quando ele ainda era estudante na década de 60 e, com o passar dos anos, ele passou a estudar seriamente o aquecimento da Terra e várias outras questões ambientais. Percebeu que no final da década de 70 o assunto despertava algum interesse em largo segmento da população, mas poucos estavam dispostos a pensar no caráter abrangente de uma solução necessária. A queima e devastação das florestas tropicais, o acelerado ritmo de extinção de espé- cies, a contaminação do ar, da água e do solo, o aquecimento da Terra e a diminuição da camada de ozônio e outras tragédias ambientais já são amplamente reconhecidos como diferentes con- sequências do choque entre a civilização mundial e o sistema ecológico da Terra. Para Al Gore, que hoje é um ativista ecológico fervoroso, esse choque ocorre como consequência da explosão demográfica, “que hoje acrescenta à população o equivalente a uma China a cada dez anos”, da Doutor em economia pela Universidade Estadual de Campinas. É professor associado do Departamento de Eco- nomia da Universidade Federal do Paraná. Endereço eletrônico: [email protected]. Graduada em economia pela Universidade Federal do Paraná. Endereço eletrônico: [email protected].

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O pensamento ambiental de Al gore

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    Economia & Tecnologia - Ano 06, Vol. 22 - Julho/Setembro de 2010

    O pensamento ambiental de Al Gore

    Igor Zanoni Constant Carneiro Leo

    Leone Rigamonti Girardi

    RESUMO - Al Gore (1948) militante do movimento ecolgico desde sua juventude, tendo tambm estudado questes ligadas famlia norte-americana, escrevendo diversos livros im-portantes sobre esses temas. Aqui apresentamos um registro de seu pensamento ambiental em trs dos seus textos sobre o assunto, no apenas por sua eminente posio na poltica norte-americana mas por ligar de modo original a questo ambiental aos problemas polticos vividos recentemente pela sociedade e governo dos Estados Unidos.

    Palavras-chave: Ecologia. Poltica internacional. Pensamento ambientalista.

    Este texto uma notcia sobre o pensamento ambiental de Albert (Al) Gore, vice-pre-

    sidente dos Estados Unidos durante a presidncia de Bill Clinton, diversas vezes membro da

    Cmara dos Deputados e senador norte-americano, empresrio e autor de diversos livros sobre

    a cultura americana, destacando-se seu pensamento ambiental. Nesta ltima linha escreveu os

    best sellers A Terra em Balano e Uma Verdade Inconveniente (tambm transformado em vdeo), alm

    de incluir um importante captulo sobre meio ambiente em seu ltimo livro, O Ataque Razo.

    Seu pensamento nesta rea importante no apenas pela relevncia da condio poltica e em-

    presarial do autor, ou da relevncia do tema, mas especialmente pela lucidez e coragem com

    que ele abordado.

    A ideia de uma ameaa ambiental global foi apresentada a Al Gore quando ele ainda

    era estudante na dcada de 60 e, com o passar dos anos, ele passou a estudar seriamente o

    aquecimento da Terra e vrias outras questes ambientais. Percebeu que no final da dcada de

    70 o assunto despertava algum interesse em largo segmento da populao, mas poucos estavam

    dispostos a pensar no carter abrangente de uma soluo necessria.

    A queima e devastao das florestas tropicais, o acelerado ritmo de extino de esp-

    cies, a contaminao do ar, da gua e do solo, o aquecimento da Terra e a diminuio da camada

    de oznio e outras tragdias ambientais j so amplamente reconhecidos como diferentes con-

    sequncias do choque entre a civilizao mundial e o sistema ecolgico da Terra. Para Al Gore,

    que hoje um ativista ecolgico fervoroso, esse choque ocorre como consequncia da exploso

    demogrfica, que hoje acrescenta populao o equivalente a uma China a cada dez anos, da Doutor em economia pela Universidade Estadual de Campinas. professor associado do Departamento de Eco-nomia da Universidade Federal do Paran. Endereo eletrnico: [email protected] em economia pela Universidade Federal do Paran. Endereo eletrnico: [email protected].

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    revoluo cientfica e tecnolgica, que aumentou o poder do homem de manipular a natureza e

    sua capacidade de causar impacto sobre o mundo, e do modo de pensar sobre a relao com o

    meio-ambiente, medida que cedemos s fortes presses para recusar a responsabilidade pelas

    consequncias futuras de nossos atos atuais.

    Em sua obra A Terra em Balano, Ecologia e Esprito Humano, 1992, que considerada

    por muitos a declarao mais abrangente sobre o meio ambiente j feita por um poltico im-

    portante, Al Gore faz um apelo pessoal onde todos os aspectos do problema so abordados e

    prope possveis solues. Para isso, ele entrou em contato com muitos especialistas e foi capaz

    de viajar e assistir algumas das maneiras em que as decises pobres por parte do governo e da

    indstria afetam negativamente o meio ambiente. Como afirma o autor:

    Todos j tomamos conhecimento de experincias surpreendentes que nos advertem sobre o perigo que representa nossa agresso ao meio ambiente, seja a nova frequncia de dias em que a temperatura ultrapassa 38 graus cen-tgrados, seja a nova rapidez com que o sol queima nossa pele ou a frequncia atual dos debates pblicos sobre o que fazer com as crescentes montanhas de rejeitos. Por que no empreendemos esforos macios para salvar o meio ambiente? (p. 30)

    E tambm:

    O aquecimento da terra representa uma ameaa. A concentrao de dixido de carbono e de outras molculas que absorvem o calor aumentou em quase 25% desde a Segunda Grande Guerra, representando uma ameaa mundial capacidade da Terra de regular a quantidade de calor solar retida na atmos-fera. Essa elevao da temperatura ameaa seriamente o equilbrio climtico mundial que determina o padro dos ventos e das chuvas, as temperaturas da superfcie, as correntes martimas e o nvel dos mares. Esses elementos, por sua vez, determinam a distribuio da vida vegetal e animal na terra e no mar e tem grande influncia na localizao e nos padres das sociedades humanas. (p. 33)

    Toda a relao entre a humanidade e a Terra vem se transformando, porque a civili-

    zao de repente se tornou capaz de afetar o meio ambiente de todo o globo terrestre e no

    apenas de uma determinada rea. Al Gore tambm trouxe a ideia de que a crise ecolgica a

    manifestao exterior de uma crise interna de esprito, e de acordo com ele, a estrutura da civi-

    lizao est se tornando extremamente complexa, mas, conforme aumenta essa complexidade,

    aumenta tambm a distncia de nossas razes e tornou-se fcil demais encarar a Terra como

    um conjunto de recursos cujo valor intrnseco no maior que sua utilidade no momento.

    Primeiramente, Al Gore tem o objetivo de dissipar a noo de que os problemas am-

    bientais no so suficientemente graves para exigir uma ao imediata, e, tambm deixa claro

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    que quer que os Estados Unidos assumam a liderana nesta questo (criticou o governo Bush

    por no faz-lo).

    Declarou que todas as pesquisas de opinio pblica que abordaram o tema ambiental

    constataram que os norte-americanos rejeitaram o argumento do governo Bush, de que devem

    escolher entre a manuteno de empregos e o meio-ambiente. Acreditam, ao contrrio, que

    podem prosperar liderando a revoluo ambiental e criando para o mercado mundial os novos

    produtos e tecnologias que fomentam o progresso econmico sem a destruio da natureza. De

    fato, muitos especialistas acreditam que podemos criar milhes de novos empregos liderando

    a revoluo ambiental e acelerando nossos esforos para fabricar e vender produtos e tecnolo-

    gias adequados ao meio ambiente.

    Ele tambm descreve algumas das maneiras pelas quais a economia clssica no con-

    ta para os custos reais de produtividade. Por exemplo, o desgaste de motosserras e tratores

    um custo aceitvel de fazer negcios, mas o desgaste das florestas ignorado. Ele atribui essa

    situao insistncia em nos perceber como algo separado da natureza e imune aos seus pro-

    blemas:

    Ao distinguirmos entre o que ainda incerto e o que certo sobre a crise am-biental, importante deixar claro que a natureza revela um padro repetitivo de interdependncia das vrias partes do sistema ecolgico. Podemos afirmar com grande segurana, que, se de alguma forma perturbarmos o equilbrio ecolgico da Terra, os reflexos se faro sentir em todo o sistema. Assim, em-bora uma determinada conduta possa parecer inofensiva na parte do meio ambiente que podemos observar, provavelmente no temos conhecimento suficiente dos efeitos do que estamos fazendo, para prever as consequncias nas outras partes do sistema exatamente porque todas as partes funcionam dentro de um delicado equilbrio de interdependncia. (p.56)

    Nessa obra em especial, Al Gore sugere algumas aes principais como estabilizar

    a populao mundial atravs de um programa de trs pontos para aumentar a alfabetizao,

    reduzir a mortalidade infantil e promover mtodos de controle de natalidade; desenvolver tec-

    nologias adequadas atravs de um ambiente estratgico (iniciativa que aborda os problemas da

    agricultura, florestal, energia, tecnologia de construo, reduo e reciclagem de resduos etc.);

    estabelecimento de novas regras da economia global; negociar novos acordos internacionais

    que so sensveis s diferenas entre pases desenvolvidos e subdesenvolvidos; e, educar os cida-

    dos do mundo para uma nova maneira de pensar sobre a relao da humanidade com a terra.

    No documentrio ambientalista Uma Verdade Inconveniente, 2006, vencedor do Oscar de

    melhor documentrio em 2007, Al Gore mais uma vez salienta que o aquecimento global alm

    de ser uma questo poltica e econmica, uma vez que est intrinsecamente ligada ao desenvol-

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    vimento industrial, o maior desafio global que teremos de enfrentar.

    O filme mostra uma sria advertncia para a humanidade sobre suas responsabilidades

    com as mudanas climticas. As imagens, com intuito de impressionar e incomodar mostram

    as atuais alteraes que o planeta Terra est experimentando, a evidncia da irresponsabilidade

    dos polticos que se negam a reconhecer a urgncia de tocar no assunto, e, o pouco tempo que

    resta para se evitar uma catstrofe.

    No filme e nas suas palestras, Al Gore derruba com dados concretos grandes mitos

    existentes sobre o aquecimento global, como realidade do efeito estufa, se as polticas ambien-

    tais afetam a economia dos pases, e, que o aquecimento global faz parte de um ciclo natural da

    Terra. Ele confirma que muitos estudos cientficos provam que o efeito estufa, e consequente-

    mente o aquecimento global, real e constitui uma sria ameaa para a vida na Terra; demonstra

    com modelos econmicos de autorizadas personalidades do mundo que as polticas pblicas

    baseadas num planejamento ambiental estimulam as economias dos pases ao invs de afet-

    las; e ainda, que o aquecimento global no somente um ciclo natural da Terra, mas tambm o

    resultado de atividades humanas no campo e na indstria.

    Al Gore apresenta que concreto que quase todas as atividades industriais dependem

    do desmatamento e da desidratao do planeta. Alm do corte das rvores para produzir madei-

    ra industrializada e carvo vegetal, a construo de hidroeltricas para gerar energia eltrica com

    as suas indispensveis barragens responsvel pela inundao de enormes reas emissoras de

    gases de efeito estufa, reduzindo a camada atmosfrica e aumentando o nvel trmico mundial.

    Tambm concreto que algumas das consequncias do desmatamento so a desertificao, as

    secas, as inundaes e o incremento do nmero de furaces, tufes e outros tipos de tempes-

    tades de grande dimenso, e, o aquecimento atmosfrico que derrete as calotas polares leva

    dessalinizao das guas ocenicas e a mudanas radicais nos ecossistemas e na capacidade

    imunolgica de todos os seres vivos.

    Em virtude deste cenrio, Al Gore insiste em que a soluo para a crise climtica

    global exige uma ao rpida, sbia e grande de nossa parte. Na mensagem aos empresrios,

    ele lembra que se destruirmos o planeta no haver economia que sobreviva, e, ataca a causa

    principal, que a cultura dos pases industrializados concentrada no consumo, na ganncia, e

    na expanso dos negcios em nveis insustentveis.

    Al Gore prope como soluo para a crise climtica um amplo programa conjunto

    liderado pelos Estados Unidos que denomina um novo Plano Marshall global, semelhana do

    implantado na Europa no ps-Segunda Guerra. Este plano interviria fortemente sobre a tecno-

    logia, as formas de produo industrial e agrcola em todo o mundo, combatendo ainda fen-

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    menos como a desertificao, o uso abusivo da gua e o desmatamento das florestas tropicais,

    entre outros itens relevantes.

    Todavia, em seu ltimo livro, O Ataque Razo, 2008, destinado a uma crtica do

    sistema poltico norte-americano durante o governo George Walker Bush, o tom do discurso

    ambiental se politiza tambm com muita fora. O livro procura mostrar que a democracia

    norte-americana corre perigo por diversas razes, como a preeminncia do Executivo sobre os

    outros poderes, a importncia da mdia no processo de formao de opinio poltica, a mentira

    sistemtica, o ataque ao indivduo, a poltica blica no Iraque e outros temas ligados a um des-

    virtuamento dos marcos fundamentais nos quais foi criada a repblica norte-americana, pelos

    chamados pais fundadores da nao, como Thomas Jefferson e James Madison, entre outros.

    Isto tem uma ligao profunda com a crise ambiental.

    Para o autor, a razo deveria guiar o sistema poltico, mas tem sido substituda pela

    influncia da riqueza e do poder, criando patologias como a dissimulao, o sigilo, a poltica do

    medo, a substituio do conhecimento e da lgica por poder bruto, o apelo a uma cruzada,

    o que pode ser atestado em todo vigor nas polticas energticas e ambientais. Ele pensa que os

    Estados Unidos deveriam empreender uma iniciativa estratgica de grande porte para solucio-

    nar a crise, que tem duas faces, do clima e da dependncia de combustveis fsseis.

    Em primeiro lugar, o consumo americano mantm os preos mundiais do petrleo al-

    tos, assegurando um fluxo contnuo de petrodlares aos cofres de estados como o Ir, que tem

    demonstrado hostilidade aos interesses americanos, e a Arbia Saudita, onde somas vultosas

    aparentemente foram desviadas para treinar e dar apoio a terroristas.

    As grandes naes produtoras buscam maximizar seus lucros com a exportao do

    leo, mas tambm tentam manipular a vontade poltica norte-americana. Isto pode ser visto no

    fato de nos ltimos trinta anos reduzirem preos sempre que o Ocidente chega perto de reco-

    nhecer a prudncia do desenvolvimento de energia renovvel prpria.

    Por outro lado, a dependncia do leo criou duas guerras no Golfo Prsico, exigindo

    hoje substitutos sustentveis do ponto de vista ambiental para os combustveis fsseis e uma

    iniciativa de fato internacionalizada para estabilizar o Golfo Prsico e reconstruir o Iraque.

    Este dado se liga a crticas ao governo Bush:

    Em 2007, enquanto o Iraque se desintegrava em meio violncia sectarista, o governo Bush redigia, com muito cuidado, documentos legais enquanto os EUA ainda eram o poder de ocupao que garantiam acesso preferencial aos enormes lucros esperados da produo das enormes reservas de petrleo do Iraque para a ExxonMobil, a Chevron, a BP e a Shell. (p. 176)

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    Isto significa um terrvel acordo para os iraquianos e os cidados da regio, que foram

    totalmente excludos do processo. Alm disso, o comrcio de mo nica destrutivo para o fu-

    turo econmico, o que exige inveno e produo de novas solues para deter o aquecimento

    global dentro dos EUA e tornar mais recprocas as vias do comrcio internacional com o Golfo

    Prsico e outros produtores de leo.

    Al Gore chama a ateno para o fato de que a maior parte das questes ambientais

    que as pessoas enfrentam tem natureza essencialmente local: poluio da gua, poluio do ar e

    depsitos de lixo txico. Nas ltimas dcadas a conscincia ambiental comeou a se concentrar

    em uma nova classe de ameaas ambientais regionais, como a chuva cida, especialmente no

    meio oeste e no noroeste americanos, e o esgotamento de depsitos subterrneos de gua doce

    em oito estados nas plancies centrais entre a bacia do rio Mississipi e as Montanhas Rochosas.

    O governo Bush deixou de proteger o meio ambiente nessas trs categorias e entregou

    o controle das polticas ambientais nas mos de empresas que mais poluem e de outras com

    interesses particulares que vm enfraquecendo ou dilacerando os padres ambientais, isto pode

    ser visto na maneira como o governo Bush lida com o mercrio, com a limpeza dos depsitos

    de lixo txico e com a mudana no gerenciamento dos parques nacionais americanos. Por outro

    lado, as pessoas so alvo de uma campanha enorme e muito bem organizada de desinformao,

    impulsionada pelo governo e fartamente financiada por empresas poluidoras. Essas empresas

    se juntam a idelogos de direita fingindo que existe discordncia significativa entre os cientistas

    em reas nas quais h um amplo consenso bsico. Todos esses exemplos fazem crer que o go-

    verno Bush-Cheney de total propriedade das empresas de carvo, petrleo, fornecimento de

    servios pblicos e minerao.

    A relao fundamental entre a espcie humana e o planeta no se mede apenas pelo di-

    xido de carbono lanado na atmosfera, mas na destruio de florestas na superfcie do planeta,

    na destruio de reas de pesca ocenica e pela ameaa iminente da extino de praticamente

    todas as espcies ocenicas importantes em menos de meio sculo, se as taxas de explorao

    forem mantidas. Tambm se mede pela destruio da camada de oznio estratosfrica, que h

    uma ligao entre o esgotamento do oznio estratosfrico e o aquecimento global, pois em am-

    bos os casos a substncia qumica que causa o problema invisvel e produz suas consequncias

    ameaadoras em dimenso global.

    Para o autor, as ameaas ambientais estratgicas so similares aos conflitos mundiais,

    globais ou militares, no sentido de necessitarem de uma mobilizao global completa como a

    nica maneira de garantir que o resultado ser o futuro positivo para a civilizao humana.

    Essas ameaas vo desde o aumento do poder de destruio dos furaces aos incndios

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    florestais em veres com temperaturas recordes em vrias regies do globo. O acontecimento

    mais notvel recente foi o furaco Katrina, mas tambm precisamos olhar para fenmenos

    como a liberao de emisses de metano e carbono da tundra na Sibria que est comeando

    a descongelar.

    Al Gore mostra que fenmenos como o Katrina ou o ataque iminente da Al-Qaeda

    em 11 de setembro foram previstos sem reao do governo Bush. Houve uma imobilidade do

    governo norte-americano inexplicvel, colocando em risco cidados americanos.

    O texto de Al Gore interessante porque as naes desenvolvidas sempre trataram a

    natureza e o ser humano dentro da base cultural do liberalismo econmico como um fator de

    produo e bens fundamentais como a terra, o ar, a gua, as florestas e a vida nunca tiveram

    valor ecolgico. O capitalismo se expandiu exportando um desenvolvimento que degradou e

    esgotou recursos naturais, destruiu relaes sociais sem levar em conta a cultura e a dinmica

    local dos pases subdesenvolvidos. Como resultado, aumentaram as desigualdades sociais, a

    pobreza, as diferenas de renda entre os pases, a degradao dos ecossistemas rurais e urbanos,

    caracterizando um fracasso das polticas desenvolvimentistas sem preocupao com a susten-

    tabilidade ambiental.

    Na atualidade, percebe-se claramente que o planeta est enfermo e que rgos como

    as Naes Unidas se movem no s para assegurar a paz mundial e a cooperao internacional,

    mas tambm para resolver de forma pacfica problemas de ordem econmica, social, cultural

    e humanitria, chegando hoje a procurar uma forma de sustentabilidade do desenvolvimento

    cercada de boa vontade poltica. Entretanto, as grandes potncias pouco fizeram para sair do

    campo puramente econmico do desenvolvimento, no levando em conta a dvida ecolgica

    que este trouxe para todos os pases.

    O interesse dos textos de Al Gore retomar fortemente essas preocupaes, dando

    um lugar ativo aos Estados Unidos para enfrentar as ameaas climticas globais. Alm disso,

    apesar de ser figura de proa no estabilishment norte-americano, liga essas ameaas a uma inrcia

    poltica do governo Bush que atinge tambm todo o arcabouo fundamental da democracia

    naquele pas. Nesse sentido s se pode esperar que o governo Barak Obama possa se mover

    de forma coerente com os fundamentos da constituio norte-americana, e com o sentido de

    empreender no mundo aes de paz, de proteo humana e ajuda efetiva aos povos no interior

    do complexo tecido poltico e econmico do planeta.

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    REFERNCIASGORE, A. Terra em Balano. So Paulo: Editora Augustus, 1993.______. Uma Verdade Inconveniente: o que Devemos Saber e Fazer Sobre o Aquecimento Global. So Paulo: Manole, 2007.

    ______. O Ataque Razo. So Paulo: Manole, 2008.