IMAGENS DA NOBREZA SERGIPANA: O ALBÚM … · 2 Resistindo à aceleração do tempo, elas...

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¹Graduado em História Licenciatura pela Universidade Tiradentes [email protected] IMAGENS DA NOBREZA SERGIPANA: O ALBÚM FOTOGRÁFICO DO ENGENHO ESCURIAL Gustavo Raimundo Vieira Bonfim¹ Resumo Neste diálogo o estudo da reprodução visual é visto como uma fonte que preserva determinados marcos históricos; cada uma com sua individualidade, mas que, a princípio, não divergem de suas interrogativas tipológicas. Aqui temos um álbum de família os “de Faro Rollemberg” da ramificação familiar do Engenho Escurial , que servira como suporte prático e histórico de que a fotografia, mesmo interligada ao método tradicionalista, é uma fonte inesgotável de história; já que desde seu advento, tem causado impactos nas sociedades e se tornado, juntamente com esses meios sociais, uma forma de guardar e eternizar, das lembranças mais íntimas aos maiores momentos de mudança da humanidade. Com a invenção da fotografia, passou-se a registrar diversos fatos que até então somente eram descritos por fontes orais ou escritas, deixando por conta do leitor, ou ouvinte, a tentativa imaginária de reconstrução daquele momento o qual não fez parte. Denotando à fotografia, por seu riquíssimo detalhamento dos fatos, a mesma conotação de documento, assim como qualquer outro método aceito dentro da historiografia. Palavras-chave: Fotografia; Preservação Histórica; Família; Rollemberg; Engenho Escurial. FOTOGRAFIA: A ARTE DE PRESERVAÇÃO DA HISTÓRIA Partindo do pressuposto de que o estudo do passado da humanidade não pode ser realizado de uma forma linear e definitiva, existe a necessidade de mensurar os fatos históricos, dando a cada um o valor que realmente possuem, permitindo várias possibilidades de encontrar a verdade (mesmo que de forma parcial e temporária), evidenciando assim, a importância e a necessidade de uma amplitude das fontes históricas. Seria impossível para um arqueólogo, por exemplo, compreender como se dava o processo de caça dos homens da pré-história, se não fossem as pinturas encontradas nas cavernas. Ou ainda, como poderia se entender o imaginário desse homem quanto à morte sem antes lançar um olhar sobre os fósseis encontrados, que revelam os procedimentos de enterramento e cuidado com o morto? Sendo assim, é correto afirmar que as fotografias são: “... um recurso eminentemente moderno que possibilita a conservação e a permanência de uma continuidade visual do passado familiar.

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¹Graduado em História Licenciatura pela Universidade Tiradentes

[email protected]

IMAGENS DA NOBREZA SERGIPANA: O ALBÚM FOTOGRÁFICO DO

ENGENHO ESCURIAL

Gustavo Raimundo Vieira Bonfim¹

Resumo

Neste diálogo o estudo da reprodução visual é visto como uma fonte que preserva determinados

marcos históricos; cada uma com sua individualidade, mas que, a princípio, não divergem de

suas interrogativas tipológicas. Aqui temos um álbum de família – os “de Faro Rollemberg” da

ramificação familiar do Engenho Escurial –, que servira como suporte prático e histórico de

que a fotografia, mesmo interligada ao método tradicionalista, é uma fonte inesgotável de

história; já que desde seu advento, tem causado impactos nas sociedades e se tornado,

juntamente com esses meios sociais, uma forma de guardar e eternizar, das lembranças mais

íntimas aos maiores momentos de mudança da humanidade. Com a invenção da fotografia,

passou-se a registrar diversos fatos que até então somente eram descritos por fontes orais ou

escritas, deixando por conta do leitor, ou ouvinte, a tentativa imaginária de reconstrução daquele

momento o qual não fez parte. Denotando à fotografia, por seu riquíssimo detalhamento dos

fatos, a mesma conotação de documento, assim como qualquer outro método aceito dentro da

historiografia.

Palavras-chave: Fotografia; Preservação Histórica; Família; Rollemberg; Engenho Escurial.

FOTOGRAFIA: A ARTE DE PRESERVAÇÃO DA HISTÓRIA

Partindo do pressuposto de que o estudo do passado da humanidade não pode ser

realizado de uma forma linear e definitiva, existe a necessidade de mensurar os fatos históricos,

dando a cada um o valor que realmente possuem, permitindo várias possibilidades de encontrar

a verdade (mesmo que de forma parcial e temporária), evidenciando assim, a importância e a

necessidade de uma amplitude das fontes históricas.

Seria impossível para um arqueólogo, por exemplo, compreender como se dava o

processo de caça dos homens da pré-história, se não fossem as pinturas encontradas nas

cavernas. Ou ainda, como poderia se entender o imaginário desse homem quanto à morte sem

antes lançar um olhar sobre os fósseis encontrados, que revelam os procedimentos de

enterramento e cuidado com o morto? Sendo assim, é correto afirmar que as fotografias são:

“... um recurso eminentemente moderno que possibilita a conservação

e a permanência de uma continuidade visual do passado familiar.

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Resistindo à aceleração do tempo, elas proporcionam uma orientação

para a memória num contexto que tende a ser fragmentário e

dispersivo”. (SCHAPOCHNIK, 1988, p - 457)

A representatividade deste “objeto” chamado fotografia, nada mais é que uma forma de

exposição cultural de uma sociedade em pleno processo de modernização, exteriorizada através

de seus costumes, mitos, religiões, fatos sociais e políticos, e que passou a ser documentada por

uma “caixa reprodutora de realidades”, onde essa ‘realidade’ desaparece juntamente com seus

cenários e protagonistas, e a sua suposta ‘reprodução’ permanece, cada vez mais, enobrecida

pelo infalível tempo.

Com a criação da fotografia, deu-se o início de um novo modelo de perspectiva

conceitual da realidade, porém, de um mundo em partes, contendo em sua estrutura uma

contextualidade, pois é dividida apenas em termos visuais. Intrigante, por assim ser desde

sempre, a fotografia causou, e ainda causa, um ‘fervilhamento’ no ideário lógico e cognitivo do

ser humano a qual se pergunta: quem, onde, quando, e ainda os seus vários porquês. Faz-se

assim necessária a abertura de um diálogo sobre os seus fundamentos físicos e afetivos,

inerentes ao estudo de âmbito histórico:

A fotografia nasceu em um mundo que passava por um momento de grandes

transformações em suas diretrizes econômicas, sociais e culturais, ocasionado pela última

mudança de sistema econômico e social, processo conhecido como Revolução Industrial. De

fundamental importância enquanto meio inovador de informação e conhecimento, sendo

agregado a diferentes campos de pesquisa servindo como um instrumento de apoio, e como

forma de expressão das artes.

A enorme aceitação que a fotografia teve, principalmente a partir da década de 1860,

acarretou no surgimento de verdadeiros impérios, industriais e comerciais. É a partir desse

momento também que o retrato fotográfico sobre o papel se espalha pelo mundo através de

vários formatos-padrão como o carte-de-visite, e suas variações, como o carte-portrait e o

carte-gabinet – processos fotográficos muito encontrados dentro das fontes utilizadas para este

diálogo –, mudando somente o tamanho da fotografia, sendo os últimos de dimensões maiores.

A ideia de oferecer o retrato com dedicatória contribuiu ainda mais para o seu consumo

desenfreado, tornando o carte-de-visite o maior modismo pelo qual a fotografia do século XIX

passou. O hábito de a pessoa oferecer seu retrato, com ou sem dedicatória, era muito comum

àquela época, sendo oferecido por “amizade”, “afeição”, “recordação” etc. Havia nessas

fotografias um processo de construção de ambiente, ao qual iremos chamar aqui de

“manipulação do real”. A impressão das influências e dos padrões comportamentais

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estabelecidos na época, como tipologias e representações contidas nas fotos – padrões esses

seguidos nos primeiros sessenta anos do século passado, no Brasil e em Sergipe – como por

exemplo um livro, muitas vezes era utilizado para representar a intelectualidade do retratado,

ou uma espada, simbolizando o militarismo.

Além disso, é interessante analisar as vestimentas e até mesmo a postura adotada durante

a foto, pré-estabelecida pelo fotógrafo, situação mais comum, ou simplesmente por pura

espontaneidade do fotografado. Surge assim, uma estética de representação multiplicada do

mundo, fazendo com que esse processo fosse ao deleite das classes médias e abastadas das

sociedades seguidoras desse modismo, inclusive a sociedade brasileira.

O que nos remete a pensar e a criar questionamentos se realmente as fotografias, por

vezes, carregam em si o que realmente querem demonstrar, pois os padrões de comportamento

social da época sofriam fortes imposições dos grandes centros em pleno desenvolvimento. Ao

se tratar de fotografias e/ou álbuns de família deve-se ter uma maior cautela, sendo necessário

se utilizar de um olhar mais crítico e atento, e menos censurador, já que algumas dessas famílias

eram tidas justamente como possuidoras dos moldes de comportamento aceitáveis à época.

Nesse aspecto da fotografia podemos vislumbrar comportamentos que não serão lidos

em textos, revelando possivelmente a “verdadeira face” dos acontecimentos que se passaram

simultaneamente ao congelamento daquele pedaço da história. Portanto, se for possível fazer

uma analogia à linha de pensamento de Marcos Napolitado (2006) onde ele diz que a

subjetividade pode estar onde menos se espera, ou seja, mesmo que puramente ficcional, a

imagem tem uma enorme capacidade de construir uma ‘realidade’ em si mesma, ainda que não

saia do seu mundo fictício.

Poder-se-á, então, supor que há uma importância em criar um paralelo entre a linha do

que parece objetivo com a linha do que se mostra subjetivo e vice-e-versa, criando, assim, um

ponto referencial para que o real seja filtrado. Contudo, para que isso seja possível e para que

continuemos a entender sobre fotografia, não devemos nos esquecer do que é necessário para a

sua realização e seus vestígios formadores como documento. Três elementos constitutivos

fazem parte da realização de uma fotografia, e, sem esses três elementos o processo de origem

da mesma não se faz possível. São eles: o assunto, o fotógrafo e a tecnologia.

“A imagem é (...) ao mesmo tempo, transmissora de mensagens

enunciadas claramente, que visam seduzir e convencer; e tradutora, a

despeito de si mesma, de convenções partilhadas que permitem que ela

seja compreendida e decifrável.” (NAPOLITANO, 2006, p - 239)

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O ato registrado pelo processo da fotografia tem em sua representação um pedaço

especifico da história – econômica, social, política, etc. Essa ‘reprodução de realidade’ carrega

em sua estrutura indícios de sua formação material e nos mostra um pedaço fragmentado e

selecionado dessa realidade. Então, a partir do momento em que esse processo se completa, a

fotografia passa a levar consigo esse fragmento congelado da cena retratada enquadrando-se

assim como documento, o qual não apenas conserva a imagem do passado como também mostra

que a realidade pode ser fotografada e eternizada.

A fotografia passa então a ser um duplo testemunho, por aquilo que ela carrega em si, aquela

imagem ali eternizada, dá os testemunhos visual e material dos fatos ocorridos durante sua

realização a quem não estava presente na cena. Ela não é somente um documento pelo o que

mostra, a cena irreversível na imagem (o assunto); ela também diz muito sobre aquele que a

realizou, seu autor (o fotógrafo), como também a tecnologia usada durante o processo.

Faz-se necessário entender que a imagem fotográfica é um método perspectivo

conceitual que nos favorece a visualização do passado, porém, não reúne consigo o

conhecimento efetivo do passado. Então, devemos unir essa fonte de história com informações

de documentos tradicionalistas diferentes (documentos escritos). E graças a esses documentos

escritos, podemos entrar em uma viagem na história e assim entender como se deu o

desenvolvimento do processo fotográfico em nossa sociedade.

Mas, não se pode esquecer que a fotografia também não recebe amplo apoio como

documento, nesse caso o documento é o tradicional, ou seja, o documento escrito. Sofre um

preconceito para ser tratada como fonte histórica, primeiramente, pelo tradicionalismo que lhe

impõe olhares desconfiados e cheios de limites, e ainda, sofre com a inércia dos pesquisadores,

em entender a informação histórica que uma fotografia tem em si. Desde então essas

informações, enquanto conhecimento, não têm tido espaço nos trabalhos de estudo da história.

Contudo, não é negado o direito de a fotografia ainda ser um vestígio da história, por

mais que sua realidade tenha sido manipulada ou não. E ainda assim, ser uma fonte de história

inesgotável enquanto se tem um entendimento intuitivo e valorizado dela. É bom termos

também a plena consciência de que o “objeto” fotografia sempre levará consigo os elementos

constitutivos que lhe deram vida. Além de ser um inventário riquíssimo de informações que

descrevem o momento ali fragmentado e eternizado, chegamos ao ponto, então, de afirmar que

a fotografia é sim, uma fonte histórica por completa. Sendo assim cabe ao historiador a missão

de reclamar o direito de explorar e contar as histórias por detrás das fotografias que,

“enobrecidas pelo infalível tempo”, carregam consigo suas digitais, fazendo com que a busca

por esse êxtase utópico de um conhecimento incensurável seja a verdadeira arte.

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OS ROLLEMBERG DO ESCURIAL

Para que se chegue ao consequente resultado desse diálogo, é necessário que se faça

conhecer também um pouco sobre os marcos históricos da família e do ambiente, os quais

decorrem-se tais fatos utilizados como fontes de afirmação para o mesmo; em destaque aqui, a

família Faro Rollemberg, em sua vertente herdeira do Engenho Escurial, localizado nas

mediações do município de São Cristóvão, que até meados do século XIX era a capital da

Província de Sergipe e palco de todas as decisões político-administrativas do estado.

É justamente em inícios do século XIX, que se tem os primeiros indícios da

descendência da família em questão, aqui em Sergipe, mais precisamente na região do Vale da

Cotinguiba. Mas, para que possamos compreender esse ambiente familiar, é preciso que seja

aberto também um breve entendimento sobre a instituição chamada família, pois em se tratando

de Brasil, há sempre que entender seus significados e suas misturas. A família brasileira nada

mais é que o resultado do deslocamento e da adaptação dos costumes familiares da Metrópole

ao ambiente ainda rústico da colônia, formando-se um pedaço “abrasileirado” da nossa cultura.

Desde o início da dominação da “Terra do Brasil”, a situação econômica era voltada

totalmente à parte agrária e fundamentada na força de trabalho escravo, que, juntamente com

outros fatores como as descentralizações administrativas e uma proporção populacional

bastante dispersa, favoreceram a instauração de uma base social do tipo conservadora e

paternalista, tendo a casa-grande como o símbolo desse tipo de estrutura. Um fato interessante

nestas famílias patriarcais era a anexação de filhos de criação, parentes, afilhados, amigos,

agregados, e até escravos ao seio da família, especificando ainda mais a formação desse tipo de

estrutura familiar, e concedendo-lhe ainda o sinônimo de “família extensa”.

“O chefe da família ou do grupo de parentes cuidava dos negócios e

tinha por princípio, preservar a linhagem e a honra familiar,

procurando exercer sua autoridade sobre a mulher, filhos e demais

dependentes sob sua influência.” (SAMARA, 1998, p. 12)

As instituições econômicas, sociais e religiosas eram influenciadas pelos desejos e

vontades dessas abastadas famílias, em determinadas localidades. E, é claro que não foi muito

diferente em Sergipe, à época e até hoje, em que se estabeleceram os avós, pais, netos e os

demais sucessores de Manoel Rollemberg d’Azevedo. Um dos primeiros Rollemberg de que se

tem notícia em terras sergipanas; era descendente de Senhores de Engenho e também deixou

uma vasta descendência de importantes senhores de engenho, muitos de grande destaque na

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vida política e socioeconômica na região do cotinguiba. Desta vem toda a genealogia paterna

do ramo Escurial, inclusive o sobrenome que era de praxe entre os homens dessa vertente: o

“de Faro Rollemberg”.

Nas primeiras décadas do século XIX, o Engenho Unha de Gato estava sob a posse de

Manoel Rollemberg d’Azevedo, um dos principais alicerces da família Rollemberg, promissora

estrutura familiar que fizera grandes homens, e que firmaram suas figuras no célebre quadro de

personalidades sergipanas. Era filho do capitão-mor Gonçalo Paes d’Azevedo, e casado com

Maria de Faro Rollemberg, integrante da família Faro Leitão, também proprietários de engenho.

Manoel Rollember e Maria de Faro tiveram quatro filhos, três mulheres e um homem. E foi

através do casamento da viúva de Manoel Rollemberg, que o Engenho passa às mãos do Barão

de Maroim – O Sr. João Gomes de Melo, uma grande figura política e atuante da província, e

um dos maiores incentivadores da mudança da capital da província de São Cristóvão para a

crescente cidade de Aracaju.

O único filho homem de Manoel Rollemberg d’Azevedo, Gonçalo de Faro Rollemberg,

viria a ter uma grande influência sobre a sociedade sergipana, principalmente na região da

Cotinguiba. Herdou do pai o Engenho Vitória, após ter se casado com Bernadina de Trindade

Prado, filha do Comandante Superior da Guarda Nacional de Capela, Propriá e Porto da Folha,

José da Trindade Prado. Tiveram também três filhos, José de Faro Rollemberg, Ana de Faro

Rollemberg e Maria de Faro, conhecida como “D. Maria do Topo”, casada com seu primo

Manuel Rollemberg de Menezes e mãe do senador Gonçalo de Faro Rollemberg, neto do Barão

da Japaratuba, e futuro Senador Rollemberg – como ficou conhecido alguns anos depois.

Gonçalo de Faro Rollemberg, o Barão da Japaratuba, recebeu seu título de barão em

1860, por suas contribuições feitas à província na época, principalmente aquelas para as

festividades decorridas durante o período em que o Imperador D. Pedro II aqui esteve. Seu

título lhe foi referendado por João de Almeida Pereira Filho, que lhe referenciou como o Barão

do Rosário ou da Vitória, mas, ficou conhecido como o Barão da Japaratuba. Foi agraciado

também com a comenda da Imperial Ordem de Cristo e a dignitária da Imperial Ordem da Rosa.

Devido a esse poder hierárquico da família, por fazer parte de um processo econômico

de exportações, e por ser uma família de grandes senhores de engenho pertencentes à

açucarocracia brasileira e sergipana, os Rollemberg possuíam as perfeitas condições de visar e

concretizar o desejo pelos produtos estrangeiros, já que tinham contatos com o mercado

europeu; desta forma, viviam na abastança e agregando-se de vários luxos.

Anna Constança de Faro Rollemberg, segunda filha de Manoel Rollemberg de Azevedo,

casou-se com o Comendador Luiz Barbosa de Madureira, do Engenho Piripiri, herdando o

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Engenho Pedras pelo casamento. As outras filhas de Manuel Rollemberg de Azevedo eram

Antônia de Faro Rollemberg, falecida solteira provavelmente em 1859 e Maria de Faro

Rollemberg, que também não chegou a contrair núpcias. Dona do Engenho São Joaquim e

faleceu repentinamente durante uma visita a sua irmã, Anna de Faro Rollemberg, no Engenho

Pedras, em 1862.

A mando do Barão de Maroim, seu padrasto, o qual dizia ser muito ligado em amizade,

foi feito o exame químico das vísceras da finada “solarenga Sinhá do S. Joaquim” na Faculdade

de Medicina da Bahia, sendo posteriormente constatado resquícios de veneno. Feita a exumação

e constatado tal envenenamento, instaurou-se um processo jurídico muito conhecido à época, o

Processo Rollemberg, a mando do Barão de Maroim. Intimados a prestar contas, os dois irmãos

da finada Maria Rollemberg, Anna de Faro Rollemberg e Gonçalo de Faro Rollemberg (o Barão

de Japaratuba), e o filho da primeira e sobrinho da vítima, Manoel Rollemberg Accioli de

Madureira, foram acusados pelo movedor da ação, o Barão de Maroim, de cobiçarem a herança

de sua enteada, e com tal sentimento se aproveitaram da ideia de envenená-la.

É fato que o acusador sentindo-se no direito de buscar uma satisfação sobre tais atos que

faziam parte de tantas rodas de conversa à época, viu-se no dever de justificar seus

esclarecimentos. Para se defenderem os réus afirmaram ser o Barão de Maroim o interessado

na morte de sua enteada. Por também cobiçar sua herança, foi acusado pelo fato de ser o

inventariante da vítima, bem como o recebedor de parte dessa tão visada herança. Como

resultado, e provavelmente já esperado, apesar dos esforços de ambos os lados, ninguém foi

julgado culpado. Sendo assim o processo foi arquivado e esquecido da mente de muitos.

O início dos “Rollemberg do Escurial” dá-se com a união de duas das maiores famílias

da nobreza sergipana, que carregavam consigo as influências sobre as regiões da Cotinguiba e

do Vaza-barris, os Faro Rollemberg com os Dias Coelho e Melo respectivamente. Sendo feita

essa primeira ligação, e resultando na ramificação Rollemberg do Escurial, com as núpcias

contraídas por José de Faro Rollemberg e Amélia Dias Rollemberg em 1869. O noivo, era filho

do Barão da Japaratuba, nascido em 1845, no engenho de seu pai (Engenho Murta), localizado

na cidade de Capela.

Sempre benquisto por onde passara, pois era muito comunicativo e inteligente, se

entregou à política, fazendo brilhante carreira, sempre muito respeitado por seus adversários.

Foi delegado de polícia em Maruim, cidade onde residiu e morreu em 1889. Ainda na mesma

cidade, foi presidente da Câmara Municipal e Comandante Superior da Guarda Nacional. Desse

matrimônio descenderam oito filhos, dentre eles Adolfo de Faro Rollemberg e Gonçalo de Faro

Rollemberg sucessores proprietários do Engenho Escurial.

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Para que a união fosse firmada de uma vez, o neto do Barão da Japaratuba, também

chamado Gonçalo de Faro Rollemberg, casou-se com Aurélia Dias Rollemberg, a Dona Sinhá,

em 1884. Tiveram dez filhos, dentre eles José de Faro Rollemberg, conhecido como “Zezé do

Topo”, pois sucedeu seu pai como proprietário do Engenho Topo, um dos maiores engenhos

produtores de açúcar na Cotinguiba naquela época. Foi médico, formado pela Faculdade do Rio

de Janeiro em 1881, e eleito, por seu estado, a Senador da República em 1918. Deixou sua

continuidade através das tradicionais famílias sergipanas como a Fonsceca Porto, a Mandarino

e a Rollemberg Leite.

Ambas as senhoras supracitadas, eram parte integrante de uma família com dois títulos

nobiliárquicos em sua linhagem, denotando assim a importância e a influência dessa nobre casa.

A principío com seu patriarca o Barão da Itaporanga, o Sr. Domingos Dias Coelho e Melo e

depois com seu filho Antônio Dias Coelho e Melo, o Barão da Estância, também pai de Amélia

e Aurélia Dias Rollemberg. A primeira, resultante de seu primeiro matrimônio com Lourença

Dantas de Mello, tendo também com esta, seu único filho homem, Pedro Dantas de Mello, que

se casou com sua prima Anna Luiza Botto Dias, filha do Comendador Sebastião Gaspar de

Almeida Botto e de Anna Dias de Mello Botto. A segunda, filha das segundas núpcias com

Lourença de Almeida Dias Mello e irmã da filha mais nova do barão, Anna Dias Bittencourt,

que era conhecida por Annita, casou-se com o médico José Corrêa Bittencourt, inclusive este

era amigo e havia estudado junto ao Senador Rollemberg no Rio de Janeiro.

Antônio Dias Coelho e Melo, nasceu no ano de 1822 em Itaporanga, Filho do Barão da

Itaporanga com D. Maria Michaela Coelho Dantas e Melo. Teve grande carreira política no

Sergipe Imperial, chegando inclusive aos cargos de chefe do Partido Liberal e Senador do

Império, período em que residiu algumas temporadas no Rio de Janeiro, capital do Império,

para cumprir com seus papéis políticos. Foi também comendador das Ordens de Cristo e da

Rosa, e por um decreto em Janeiro de 1860 é agraciado com o título de Barão da Estância.

Ao contrário do que se pensa, o título de barão da Estância, não era referenciado à cidade

de Estância, pois como já dito antes, Antônio Dias era natural de Itaporanga. O título referencia-

se ao seu engenho, o Escurial, localizado aos arredores do município de São Cristóvão, pois

durante o período em que aqui esteve o Imperador Pedro II em visita, foi ponto de parada de

sua comitiva. Quando o Imperador lhe conferiu seu baronato, lhe foi referenciado como

proprietário daquela bela estância. Toda essa situação também permitiu ao Imperador afirmar

que nenhuma decisão política na região poderia ser tomada sem o conhecimento da família. Em

Itaporanga ninguém poderia se fazer eleito sem o consentimento desta.

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A vida política do Barão da Estância chegou ao fim juntamente com o fim do Império,

quando perde seu cargo vitalício de Senador do Império, assim como também os demais títulos

imperiais. E mesmo longe dos holofotes da vida pública, continuou sendo uma influente

personalidade do meio social sergipense. Apesar de ter sempre as ocupações de sua vida

política, o Barão da Estância, era um marido e pai de família muito presentes, sempre prestativo

e partilhando das preocupações de sua família.

Quando morre em 1904, na cidade de São Cristóvão, seus bens já estavam partilhados

entre seus herdeiros, sendo os maiores beneficiados os sucessores de sua primeira filha, Amélia

Dias Rollemberg casada com José de Faro Rollemberg – filho do Barão da Japaratuba. Seu bem

mais precioso e cultuado, o Engenho Escurial, ficou para seu neto Adolfo de Faro Rollemberg.

Algumas vezes foi referido como sendo digno de receber homenagens e de ser sempre lembrado

pela sua enorme contribuição visando o benefício de Sergipe.

Foi também Adolfo Rollemberg que, em 1917, deu início aos trâmites legais para que

se pudesse construir a casa da família em Aracaju, localizada na Av. Ivo do Prado, 1072, cujo

o projeto foi assinado pelo italiano Antônio Frederico Gentile. Foi tombada como patrimônio

histórico em 1989 através do decreto 11.118/1989/Gov. de Sergipe, assinado pelo então

Governador do estado na época, Antônio Carlos Valadares. Hoje, chamada de “Palácio da

cidadania”, foi restaurada, e é a atual sede da Seccional de Sergipe da Ordem dos Advogados

do Brasil (OAB/SE). Em 1919, alguns meses antes do término das obras do imóvel, morreu

Adolfo de Faro Rollemberg tendo como causa-morte um infarto fulminante. Sendo assim, suas

três irmãs Anna, Eliza e Amélia instalaram-se na casa, e por esse motivo ficou conhecida como

o “Casarão das Rollemberg”.

Com a morte de Adolfo, assume os negócios da família, seu irmão mais novo, o Coronel

Gonçalo de Faro Rollemberg nascido em 1875, passando a ter em sua posse grande parte do

patrimônio da família, inclusive a propriedade do Escurial. O Coronel Gonçalo foi casado com

Ana Sampaio Rollemberg, vindo a ter três filhos, todos homens, e ela, a falecer após o parto do

último. São eles: José de Faro Rollemberg (1902-1973), Raul de Faro Rollemberg (1903-1982)

e Edgar de Faro Rollemberg (1904-1943).

Contando com o apoio dos documentos (certidões de casamento, contrato de

arrendamento e cartas recebidas por Natalia Barreto Rollemberg) e do depoimento, guardados

e cedidos pela Sra. Ana Amélia Barreto Rollemberg no mês de Outubro do ano de 2010, em

visita à Fazenda Escurial, em São Cristóvão/SE, podemos, a partir daqui, ter maior precisão

acerca dos fatos que se sucederam e marcaram a história dos Rollemberg do Escurial, desde o

ano de 1930. Deste mesmo ano tem-se a certidão de casamento do filho mais novo do Cel.

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Gonçalo Rollemberg, Edgar de Faro Rollemberg com Natalia Sobral Barreto, nascida em 10 de

Maio de 1911, filha do Cel. José Francisco de Menezes Barretto e D. Roza Amélia Sobral

Barreto. Ocorrido no dia 15 de Julho, na freguesia de N. S. da Saúde de Japaratuba, foram

testemunhas José Dias Sobral e José de Faro Rollemberg, irmão mais velho do noivo.

Em 1932, dá-se o arrendamento da Usina Escurial por Edgar Rollemberg, a qual lhe é

passada às mãos por seu pai. No contrato é firmado um prazo de arrendamento de cinco anos,

mediante o pagamento de trinta contos de réis, tendo de ser pagos a cada dia 1º de Maio, a partir

do ano de 1933. A propriedade foi arrendada juntamente com cento e setenta bois e dezesseis

carroças, cabendo ao arrendatário a conservação da propriedade e tudo mais que dela fazia

parte. As testemunhas foram Sr. José Francisco de Menezes Barreto e o Sr. João Sobral Garcez.

Com a morte do Cel. Gonçalo de Faro Rollemberg também acometido por um infarto,

em 1937, o Escurial passa para a posse de seu filho mais novo e, à época, atual arrendatário,

Edgar Rollemberg. Entretanto, em Dezembro de 1942, Edgar morre após um incêndio na

garagem do casarão causado pela explosão em um dos barris de gasolina ali armazenados,

enquanto ele abastecia seu carro. Deixando todos os seus bens para sua única herdeira e esposa,

D. Natalia Sobral Barreto Rollemberg, já que não havia deixado descendentes.

É nítido o abalo que o acidente causou à família, pegos de surpresa pelo acontecimento

a poucos dias do natal, fazendo com que as festividades natalinas ficassem estigmatizadas na

memória da família. Pois, segundo a filha de D. Natalia, Ana Amélia Rollemberg, era uma data

sempre de muito pesar e lágrimas, para sua mãe e os demais familiares. Uma carta do dia 7 de

janeiro de 1943, escrita à D. Natalia, por seu tio Dom Adalberto Accioli Sobral, Bispo de

Pesqueira/PE, mostra nitidamente a dor pela qual passaram D. Natalia e os Rollemberg à época,

na qual ele diz: “Minha boníssima sobrinha-Natália: (...) nessa hora em que sofre tanto, a

minha palavra de pêsames (...) Já celebrei missa pela alma do nosso morto e continuo a pedir

a Deus pelo seu eterno repouso.” (SOBRAL, A. [Carta], Pesqueira/PE, 07 de Jan. de 1943).

Surge assim um impasse diante dos Rollemberg, pois os bens de Edgar, inclusive o bem

mais precioso da família, o Escurial, naquele momento passara às mãos de sua viúva, D. Natalia.

Sendo assim, para que a posse do patrimônio não fugisse do controle da família, foi feito algo

muito comum à época, e também de costume naquela sociedade conservadora e patriarcalista

brasileira: foi arranjado o casamento de Natalia com seu cunhado, e irmão do falecido Edgar, o

Sr. Raul de Faro Rollemberg, mais velho pouco mais de um ano.

Passados dois anos, D. Natalia, após ter feito um pedido de prazo para que pudesse

refletir sobre seu futuro e suas demais consciências, aceita casar-se com seu cunhado e futuro

marido, Raul Rollemberg. Outra carta, destinada à D. Natalia, do dia 27 de Janeiro de 1945, e

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também escrita por seu tio Dom Adalberto Accioli Sobral, o qual a parabeniza, e os abençoa

pelo compromisso firmado, se mostra clara a satisfação das famílias com o casamento: “Muito

bôa sobrinha Natália: (...) novamente vai receber de Deus N. Senhor as bênçãos do grande

sacramento do matrimônio. E por sorte acresce ainda que o escolhido foi um irmão do seu

saudoso esposo, o que tanto agradou aos seus queridos pais. (...) vão casar-se ainda no ano do

Centenário do Sagrado Coração de Jesús, peço a êsse mesmo Coração divino que lhes dê uma

particularíssima bênção”. (SOBRAL, A. [Carta], Pesqueira/PE, 27 de Jan. de 1945).

Então no dia 12 de Abril de 1945, na cidade de Maruim, é concretizado o casamento de

Raul de Faro Rollemberg e Natalia Sobral Barreto Rollemberg, sob regime de comunhão de

bens, tendo como suas testemunhas, duas figuras ilustres da sociedade sergipana, o ex-

Governador do Estado Leandro Maynard Maciel e o ex-Senador da República Walter do Prado

Franco. Dessa união nasceram três filhos, Raul Fernando Barreto Rollemberg, Antônio Gonçalo

Barreto Rollemberg e Ana Amélia Barreto Rollemberg. Assim estava assegurada a continuação

da descendência dos Rollemberg do Escurial. Com a morte de seus pais, Ana Amélia

Rollemberg, filha mais nova e dona de um terço de seus bens, passa a ser a única (e atual)

proprietária do valioso bem Rollemberg, o Escurial.

Ana Amélia Rollemberg, se confessa apaixonada por toda essa história. Preserva com

muito carinho e nostalgia todo o seu patrimônio, sempre cercada de muitos cuidados, pois ali

passou quase toda sua infância e leva consigo o apego por aquelas paredes grossas da grande

casa que sustentou, e ainda trás muita simbologia, ao nome de sua família. Torna-se visível o

seu imensurável amor por esse pequeno pedaço da história sergipana, mas gigante pedaço do

seu simplíssimo coração, quando de seus olhos caem sinceras lágrimas buscando enxergar, no

futuro os seus maiores desejos, de que seus filhos continuem a preservar toda essa riqueza

histórica, que seu bem mais precioso continue imponentemente erguido, e que ainda seja tido

como um dos ícones que sempre representará essa linhagem nobiliárquica tão importante e

benquista de Sergipe.

O ALBÚM DE FAMÍLIA DOS ROLLEMBERG DO ESCURIAL (1890-1960)

No início desse diálogo vê-se a reprodução visual como uma fonte que preserva

determinados marcos temporais da história, seja uma pintura rupestre, ou uma fotografia. Cada

uma com sua individualidade, mas que, a princípio, não divergem em suas interrogativas

tipológicas; assim como também não divergem dessas mesmas interrogativas, também

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empregadas às fontes tradicionais. Deve-se atentar para a origem do documento, assim como

para o gênero, a data, a autoria, o assunto e até mesmo o local em que está arquivado.

Têm-se para esse diálogo um álbum de família, tido como suporte prático e histórico de

que a fotografia, mesmo interligada ao método tradicionalista, é uma fonte inesgotável de

história. Já que, desde seu advento, tem causado impacto na sociedade e se tornando, juntamente

com esses meios sociais, uma forma de guardar e eternizar, das lembranças mais íntimas aos

maiores momentos de mudança da humanidade. Chegando inclusive a ser a força de impulsão

de grandes impérios, à época da industrialização, por exemplo, foi tida como forma de

expressão no campo das artes. Com a invenção da fotografia, passou-se a registrar diversos

fatos que até então somente eram descritos por fontes escritas ou orais, deixando por conta do

leitor, ou ouvinte, a tentativa imaginária de reconstrução daquele momento o qual não fez parte.

Denotando à fotografia, por seu riquíssimo detalhamento do fato, através de uma imagem

estática e eternizada no tempo, a mesma conotação de documento, como qualquer outro método

aceito dentro da historiografia, supondo-se que, por vezes, até mais.

Infelizmente, algumas vezes a fotografia é considerada sinônimo de testemunho direto

e objetivo da história, principalmente quando passa a assumir caráter documental, sendo

compartilhada entre os pesquisadores que se interessam por esse âmbito de estudo. E, sendo

assim, cria-se restrições à fonte que, algumas vezes, são “empurradas para debaixo do tapete”,

já que ela não é vista como meio confiável para se pressupor uma hipótese que, possivelmente,

leve a uma comprovação, ao menos concreta, dos fatos que se encontram enquadrados dentro

do processo fotográfico.

Entre os implicativos, os modismos e os padrões, aos quais vários desses processos

foram submetidos durante os rápidos anos em que se deu o seu advento e a sua popularização.

Na fotografia, além de toda a sua carga histórica, existe ainda as marcas culturais empregadas

em seu processo; tendo assim como grande desculpa a pronta disposição a não se esforçar a

entender estes padrões agregados a ela, por parte da historiografia tradicionalista. As inegáveis

armadilhas contidas nesse tipo de testemunho, fazem com que seja necessária uma ligação entre

os processos técnicos e estéticos, e a representação do fato histórico que dele faz parte. Tendo

no primeiro, a necessidade da identificação dos mecanismos formais utilizados para que fosse

possível a sua produção; e no segundo, a de buscar conhecer os eventos, os personagens e tudo

mais que poderia ter se passado simultaneamente a esse corte temporal.

Adquire-se assim o cuidado, ao se fazer a análise acerca de tais documentos,

estabelecendo uma sistemática para identificar essas supostas manipulações, fazendo-se

possível a compreensão de tudo que forma a fonte fotográfica. Certo que para aqueles que não

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tem o conhecimento sobre esses “labirintos”, seja possível a perda da noção sobre o fato

representado ali naquela reprodução do real. Por exemplo, temos as obras de arte mais abstratas

em que se precisa, ao menos, um mínimo entendimento para que seja possível a visualização

de tais disfarces. Para evitar as dúvidas desses leigos, e já prevendo tal circunstância, faz-se o

uso de indicações – no suporte desse diálogo, vê-se essas indicações na forma de fichas e

legendas; as quais a leitura foi feita no sentido da direita para a esquerda da fotografia; tendo o

álbum sido dividido em grupos e subgrupos, para uma melhor distribuição destas. Sendo feito

isso, para que não se tenha o choque de contextos temporais adversos, fazendo com que as

dicotomias não sejam simples ilustrações para seus leitores desavisados.

“A evidência de fotografias é de grande utilidade se você souber como interrogar”

(BURKE 2004, p. 30). É nessa afirmação que percebemos que as imagens necessitam ser bem

lidas, para não cairmos no equívoco de simplesmente narrar o que possíveis condicionamentos

de uma época queiram nos mostrar. E, sucessivamente esquecendo que estas fotografias, não

raramente, possam ter caído nessa dicotomia, se levarmos em consideração que essas imagens

podem estar representando o que realmente ocorreu em um determinado momento histórico, ou

ainda podem estar somente transmitindo o que os padrões da época queriam salientar.

Para trabalharmos tais imagens, Peter Burke (2004) nos dá o fundamento necessário

para não cairmos em erros básicos quanto à análise das fotografias, nos advertindo quanto às

convenções existentes em determinados períodos e que precisam ser entendidas, pois, estas

podem estar sendo representadas na imagem, fazendo com que a “verdade” dessa imagem seja

uma mera construção e não tenha retratado o que ocorreu de fato. Contudo, essas construções

também precisam ser explicadas, evidenciando desta forma o que se tentou disfarçar e o porquê

do uso da subjetividade. Para Burke essas imagens evidenciam detalhes da cultura material de

uma época, a qual as pessoas deixaram de revelar em textos, permitindo-nos reinventar fatos

do contexto social do período em questão.

É justamente por esse aspecto que o autor aponta a necessidade de também conhecer as

pessoas submetidas nestas fotografias. Pois, no presente suporte temos um álbum de família

como demonstrativo, contendo setenta e duas amostras de fonte, cedidas pela Sra. Ana Amélia

Barreto Rollemberg, atual proprietária do Escurial, e ferrenha entusiasta da história sobre seus

antepassados. Sendo seus descendentes, integrantes de duas das maiores casas da nobreza

açucareira sergipense, os Rollemberg do Escurial – resultado da junção entre os Faro

Rollemberg e os Dias Coelho e Melo. Família descendente de grandes senhores de engenho,

barões e outras figuras ilustres do cenário político e social de Sergipe, carregam em seu sangue

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e em sua história uma herança nobre e de importante valor à historiografia sergipana, além dos

traços e as marcas deixadas por aqueles que lhes antecederam.

Portanto, diante de tal acervo histórico, de imenso valor à sociedade sergipana, não há

o porquê de não se afirmar que a fotografia é um documento que realmente comprova a história

em seus mirabolantes cercos e enganosos labirintos, já que a imagem fotográfica também possui

em si suas coordenadas de situação, ou, o espaço e o tempo específico em que ela foi registrada.

Estes elementos contribuem para a leitura da imagem e sua interpretação, sendo somente

revelada, essa existência documental, mediante o interesse do pesquisador, quando este procura

tomar frente ao problema. Dessa forma, ele não vê empecilhos em medir esforços para que

essas fontes fotográficas sejam tidas como um meio de reprodução de informações, às quais

oferecem relatos acerca dos eventos que ocorriam ao mesmo tempo em que se deu a formação

desta representatividade, a quem não pertenceu a cena pretérita representada.

Sendo assim, temos a fotografia como um instrumento de descoberta do passado, e

mesmo que não leve em si todo o conhecimento definitivo deste, pode e deve ser usada como

fonte de história. Entretanto, é necessário que se tenha a consciência de que o fato representado

demonstra apenas uma parte da realidade passada, ou seja, um aspecto já estabelecido. Cabendo

ao interessado, quase que por obrigação, o dever de compreender a fotografia como uma

informação descontínua do passado, fazendo-se necessário o envolvimento dele com o

momento histórico em que se deu a tomada do registro, procurando perceber das menores às

maiores generalidades implicadas na fonte.

A fotografia, por si mesma, tem o valor filosófico e expressivo contido em qualquer

obra de arte. E, mesmo que por vezes seja ignorada por possuir disfarces e duplas intenções, há

que ter seu valor histórico reconhecido, e ver que em suas imagens descoloridas e manchadas

pelos acasos do tempo, existem formas de se contar a história. Por fim, deixo-lhes à vontade

para que apreciem e que se sintam encantados com a riqueza histórica tão espetacular,

desfrutando livremente desse incontestável instrumento de conservação da nossa história.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALBUQUERQUE, Samuel Barros de Medeiros. Cem anos da morte do barão da Estância.

Jornal Cinform, Aracaju, 5 a 11 abr. 2004. Caderno dos municípios, p. 03.

ALBUQUERQUE, Samuel Barros de Medeiros. Memórias de Dona Sinhá. Aracaju: Typografia

Editorial / Scorteci Editora, 2005.

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ALBUQUERQUE, Samuel Barros de Medeiros. “Ao amigo Rivas: (Nota prévia sobre a história

do Palácio da Cidadania)”. 11/08/2010. <http://www.jornaldacidade.net/2008/noticia.php?id=73661>

(03/09/2010)

ALMEIDA, Maria da Gloria Santana de. O Engenho Pedras: uma unidade em Sergipe. VIII

Simpósio da ANPHU. Aracaju, 1975

ANDRADE, Jairo de Araújo. Fotografia: aspecto da evolução em Sergipe. Sergipe: Ótica

Santana, 1989.

BURKE, Peter. Testemunha ocular: história e imagens. Tradução Vera Maria Xavier dos

Santos; revisão técnica Daniel Aarão Reis Filho. Bauru, SP: EDUSC, 2004. (Coleção Histórica).

DANTAS, Orlando Vieira. Vida Patriarcal de Sergipe. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980.

GUARANÁ, Manuel Armindo C. Dicionário bio-bibliográfico sergipano. Rio de Janeiro:

Pongetti & C., 1925.

MOURA, Carlos Eugenio Marcondes de (Org.). Retratos quase inocentes. Nobel/SP, 1983.

NAPOLIANO, Marcos. “A História depois do papel”. In: PINSKY, Carla B. Fontes Históricas.

2ª ed. São Paulo: Contexto, 2006, p. 235 – 277.

SAMARA, Eni de Mesquita. A família brasileira. São Paulo: Brasiliense, 1998.

SCHAPOCHNIK, Nelson. Cartões-postais, álbuns de família e ícones da intimidade. IN:

Sevcenko, Nicolau (Org.). História da vida privada no Brasil 3. Comp. das letras/SP, 1988, p. 423-512.

KOSSOY, Boris. Fotografia & história. São Paulo: Editora Ática S.A. 1989.

FONTES MANUSCRITAS

CERTIDÃO de casamento. Aracaju/SE, 15 de Julho de 1930. Casamento entre Edgar de Faro

Rollemberg e Natalia Sobral Barretto. 2f. Acervo particular da Fazenda Escurial.

CERTIDÃO de casamento. Japaratuba/SE, 26 de Abril de 1966. Casamento entre Raul de Faro

Rollemberg e Natalia Sobral Barreto Rollemberg, acontecido em 12 de abril de 1945. 1f. Acervo

particular da Fazenda Escurial.

CONTRATO de arrendamento. Aracaju/SE, 01 de Maio de 1932. Contrato de arrendamento da

Usina Escurial por Edgar de Faro Rollemberg. 1f. Acervo particular da Fazenda Escurial.

SOBRAL, Adalberto. [Carta], Pesqueira/PE, 27 de Jan. de 1943 [para] ROLLEMBERG,

Natalia, São Cristovão/SE. 1f. Envia suas palavras de pêsames, pela morte do marido da sobrinha.

Acervo particular da Fazenda Escurial.

SOBRAL, Adalberto. [Carta], Pesqueira/PE, 07 de Jan. de 1945 [para] ROLLEMBERG,

Natalia, São Cristovão/SE. 1f. Remete suas felicitações pelo pedido de casamento aceito pela sobrinha.

Acervo particular da Fazenda Escurial.

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FONTE ORAL

ROLLEMBERG, Ana Amélia B. Entrevista cedida ao autor. Fazenda Escurial, São

Cristovão/SE em Outubro de 2010.

FONTES VISUAIS

BONFIM, Gustavo. Álbum fotográfico da Família Rollemberg in: TCC – “Imagens da nobreza

sergipana: o álbum fotográfico do engenho Escurial”. Universidade Tiradentes/SE: 2010. p. 35-72.