Imaginação
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RUBEM ALVES
Vamos construir uma casa?1
É sempre o sofrimento que acorda o
pensamento. Sem sofrimento o
pensamento dorme, preguiçoso...
CRIANÇAS: quando eu era menino, um dos meus brinquedos favoritos se chamava "o
pequeno construtor". Era uma caixa cheia de blocos de madeira com que se podia
construir casas, igrejas, castelos, tudo dependendo do que se imaginava: porque a
imaginação, aquilo que não existe, é o princípio de tudo o que existe.
Pois eu inventei um brinquedo parecido que se chama "Vamos construir uma casa..." E
até escrevi um livro sobre ele. Claro que não se trata de construir uma casa de tijolos e
cimento. Mas podemos construí-la na imaginação. A importância desse brinquedo está
no fato de que é na terra do que não existe, chamada imaginação, que a inteligência bate
asas.
Então, o brinquedo "Vamos construir uma casa" é um exercício da inteligência. Sendo
que o despertar da inteligência é o objetivo da educação.
Tudo começou com o Amyr Klink.
O Amyr Klink é um navegador. Navega num barco a vela. Vela é uma armadilha para
pegar o vento. O vento tem força. O vento vem, enche as velas e empurra o barco.
Antes das velas era preciso remar para fazer o barco navegar. Mas remar dava muita
canseira e dor nos músculos. Aí um remador, sofrendo de tanto remar, pensou... (É
sempre o sofrimento que acorda o pensamento. Sem sofrimento o pensamento dorme,
preguiçoso...) ... pensou se não haveria um jeito de por o vento a seu serviço. Aí ele
imaginou a vela.
O vento, empurrando o barco, o deixaria livre para fazer outras coisas. Poderia ficar
deitado, contemplando as nuvens, ou pescando, enquanto a vento fazia o seu trabalho ou
simplesmente amando...
Toda a nossa história passada é a história dos homens pondo a natureza para trabalhar
para eles.
Os moinhos de vento, os moinhos de água, o arco e a flecha, as alavancas, os monjolos,
o fogo...
Pois o Amyr Klink, navegador que faz o vento empurrar o seu barco, já fez as viagens
mais incríveis pelo mundo todo. Chegou até a Antártida navegando sem combustível...
Na Antártida tudo é gelo. Lá não há árvores. Tudo é branco. Nus, na Antártida,
morreríamos em poucos minutos. E o mais incrível das navegações do Amyr Klink é
que ele navega sozinho. Já imaginaram? Sozinho, no meio daquele mar sem fim... Eu
não teria coragem. Teria medo. Mas a solidão faz o pensamento imaginar.
O Amyr Klink não é só navegador. Ele pensa sobre as escolas. As escolas são
importantes porque nelas aprendemos a usar as forças da natureza.
As ciências chamadas Física e Química nos ajudam a entender a natureza para poder
usá-la para dar descanso ao corpo. E até um joguinho aparentemente sem força chamado
Matemática tem tanto poder que levou os astronautas numa viagem até lua.
1 Acessado em 11 de maio de 2010: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff1105201005.htm
Perguntaram ao Amyr Klink: "Qual é a escola que você desejaria para os seus filhos?"
Sem citar nenhuma de nossas escolas, ele respondeu: "A que eu desejaria para os meus
filhos é uma escola que há na Ilha Faroe. (Procure essa ilha no Google).
Essa ilha era ponto de parada dos Vikings em suas incursões guerreiras e de pilhagem.
Lá, nessa ilha, as crianças aprendem tudo o que precisam aprender para viver
construindo uma casa Viking..."
Aí eu pensei: se isso é possível na Ilha Faroe, por que não seria possível também para as
nossas crianças? Então escrevi o livro, ensinando as regras do jogo prá quem quiser
jogar. As crianças acham esse jogo a maior diversão! Vocês também vão achar. Depois
eu ensino...