INCLUSÃO ESCOLAR: A IMPORTÂNCIA DA MEDIAÇÃO … · PARA O PROCESSO DE APROPRIAÇÃO DO...

20

Transcript of INCLUSÃO ESCOLAR: A IMPORTÂNCIA DA MEDIAÇÃO … · PARA O PROCESSO DE APROPRIAÇÃO DO...

Page 1: INCLUSÃO ESCOLAR: A IMPORTÂNCIA DA MEDIAÇÃO … · PARA O PROCESSO DE APROPRIAÇÃO DO CONHECIMENTO E ... consequentemente da aquisição do conhecimento ... Resultados do IDEB
Page 2: INCLUSÃO ESCOLAR: A IMPORTÂNCIA DA MEDIAÇÃO … · PARA O PROCESSO DE APROPRIAÇÃO DO CONHECIMENTO E ... consequentemente da aquisição do conhecimento ... Resultados do IDEB

INCLUSÃO ESCOLAR: A IMPORTÂNCIA DA MEDIAÇÃO PEDAGÓGICA PARA O PROCESSO DE APROPRIAÇÃO DO CONHECIMENTO E

HUMANIZAÇÃO

Autora: Marcia Dal Santo1 Orientadora: Adriana de Fátima Franco2

RESUMO

Neste artigo, temos como objeto de estudo a inclusão escolar e a importância das mediações pedagógicas para o processo de humanização e apresentamos os resultados do trabalho desenvolvido no Programa de Desenvolvimento Educacional - PDE. Destacamos que a inclusão escolar tem sido a grande preocupação educacional na atualidade, presente nas políticas públicas que direcionam o processo educativo. Entretanto, no contexto escolar percebemos que muitos alunos são excluídos do processo de escolarização e apropriação do conhecimento, adquirido por meio do conhecimento historicamente acumulado. Uma grande parcela de alunos, todos os anos, é reprovada ou então aprovada sem se apropriar de conhecimentos necessários ao seu desenvolvimento. Com base em alguns princípios da psicologia histórico-cultural, neste texto trazemos algumas contribuições dessa teoria para a educação, pois tratamos das dificuldades enfrentadas no cotidiano escolar para uma prática de inclusão. Palavras-Chave: Inclusão escolar; mediações pedagógicas; aprendizagem; formação humana

1 INTRODUÇÃO

No presente texto, apresentamos a sistematização das ações

desenvolvidas no Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE), conforme

previsto no Projeto de Intervenção Pedagógica e em seu desdobramento da

Intervenção Pedagógica direcionada aos professores e equipe pedagógica que

atuam no Ensino Fundamental da Escola Estadual Francisco P. X. Lopes, do

município de Nova Esperança, núcleo de Paranavaí, PR. Nosso objetivo, no

Projeto, foi compartilhar estudos relativos à Inclusão Escolar e à importância da

1 Professora da Rede Estadual de Educação do Paraná.

2 Doutora em Educação: Psicologia da Educação, Professora Adjunta da – Universidade Estadual de Maringá, UEM.

Page 3: INCLUSÃO ESCOLAR: A IMPORTÂNCIA DA MEDIAÇÃO … · PARA O PROCESSO DE APROPRIAÇÃO DO CONHECIMENTO E ... consequentemente da aquisição do conhecimento ... Resultados do IDEB

mediação pedagógica para o processo de humanização, tendo como apoio

teórico a Psicologia Histórico-Cultural.

Entendemos que o estudo da Psicologia Histórico-Cultural e as

mediações pedagógicas que impulsionam a aprendizagem e contribuem para o

desenvolvimento das funções psicológicas superiores influenciam o processo

de superação do fracasso escolar. Assim, afirmamos que nossa análise está

pautada no materialismo histórico-dialético, por considerarmos primordial

compreender essa modalidade de ensino a partir do contexto mais amplo no

qual se insere.

Trabalhamos essa temática com um grupo presencial composto por 16

professores de diversas áreas do Ensino Fundamental; também ofertamos

estudos voltados a esse tema aos profissionais da educação do Estado do

Paraná, no curso a distância GTR, com a participação efetiva de 14

participantes. Durante os cursos, apresentamos os resultados das pesquisas

realizadas tanto na etapa de elaboração do Projeto de Intervenção, assim como

na Produção Didático Pedagógica, promovendo debates e reflexões que

auxiliaram na fundamentação de uma prática pedagógica mais consistente.

Durante a aplicação, coletamos dados que analisamos neste artigo,

apresentado como conclusão do trabalho desenvolvido junto ao programa

PDE.

Ressaltamos que as transformações nas relações sociais de produção

e o processo de inclusão defendido por movimentos internacionais na década

de 1990 desencadearam um processo de democratização quanto ao acesso à

escola. A Educação Inclusiva, através das Diretrizes para a Educação

Especial, garantem a “Educação para Todos” no ensino comum, todavia torna-

se importante discutir se a democratização do acesso no ensino comum

garante a inclusão, ou se temos uma exclusão velada, porque somente a

matrícula por si só não garante, por inúmeros fatores, a escolarização. Temos

uma democratização no acesso à escola, mas não para a permanência, pois os

índices de repetência evidenciam a exclusão de muitos alunos da escola e

consequentemente da aquisição do conhecimento científico (TULESKI e EIDT,

2007).

Resultados do IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica)

dos últimos anos indicam uma pequena melhora nos índices de muitas escolas

Page 4: INCLUSÃO ESCOLAR: A IMPORTÂNCIA DA MEDIAÇÃO … · PARA O PROCESSO DE APROPRIAÇÃO DO CONHECIMENTO E ... consequentemente da aquisição do conhecimento ... Resultados do IDEB

brasileiras, e também na Escola Francisco P. X. Lopes, que apresenta os

seguintes índices: em 2005 = 3.5 / 2007= 3.8 / 2009 = 4.4 e 2011= 4.5.

Entretanto, ao analisarmos o número de reprovações e aprovações em

conselhos de classe nessa escola, verificamos que esses índices eram baixos

e precisavam ser melhorados.

Ao levarmos em conta o espaço escolar e suas contradições,

percebemos que, muitas vezes, nesse espaço não se desenvolvem as

condições necessárias à apropriação do conhecimento científico e que este

passa a ser negado a uma grande parcela de indivíduos. Nesse contexto,

focalizamos a Escola Estadual Francisco P. X. Lopes, onde se encontram

profissionais preocupados com o ensino-aprendizagem, mas que, devido a

inúmeros fatores, não conseguem garantir o acesso ao conhecimento a todos.

Acreditamos que esse fato acontece pela defasagem de conteúdos, ou

seja, o aluno que não se apropriou do conhecimento sistematicamente

elaborado, tal como foi previsto para as séries anteriores, apresenta um baixo

desempenho nas séries seguintes. Observamos também que essa defasagem

interfere no aprendizado de todas as disciplinas, porque um aluno que

apresenta atraso na aquisição de conteúdos básicos, como leitura, escrita, e

outros, enfrenta dificuldade na resolução de problemas, na interpretação de

mapas, enfim, em várias áreas do conhecimento.

Na Escola Estadual Francisco P. X. Lopes, onde desenvolvemos nosso

Projeto, não contamos com sala de recursos e há poucos alunos avaliados por

psicólogos ou neurologistas; contudo, é visível que muitos ainda não têm todo

o seu potencial desenvolvido. Também é possível notar no espaço escolar que

muitos alunos que não se apropriaram dos conhecimentos científicos, ou que

não se enquadram nos padrões ditos "normais" são discriminados e muitos

sofrem agressões implícitas ou mesmo explícitas.

2 DESENVOLVIMENTO

Segundo Vigotski (2011a), mediar o conhecimento científico é

compromisso do nosso trabalho de professores, porém essa tarefa não tem

sido fácil. Várias teorias influenciam nosso trabalho e procuram explicar os

altos índices de repetência e evasão escolar. Muitos analisam e buscam na

Page 5: INCLUSÃO ESCOLAR: A IMPORTÂNCIA DA MEDIAÇÃO … · PARA O PROCESSO DE APROPRIAÇÃO DO CONHECIMENTO E ... consequentemente da aquisição do conhecimento ... Resultados do IDEB

Biologia a explicação para o não aprender na escola. O fracasso passa a ser

explicado por fatores como a desnutrição e as disfunções neurológicas.

Crianças recebem rótulos e são medicadas (MEIRA, 2011). Todavia, pouco se

discute sobre os métodos, as teorias adotadas, a sociedade capitalista e

excludente que oferece ensino de qualidade para poucos e para a maioria uma

educação de controle. Para Carvalho e Martins, “[...] a inclusão de uns poucos

a um pouco não prevê a inclusão de todos a tudo!” (2011, p.26).

Patto (1996) afirma que algumas teorias ainda estão presentes nas

queixas de professores e nos encaminhamento de alunos para avaliação.

Seriam a teoria do déficit, que busca a resposta em questões individuais e por

meio de testes psicológicos justificam ações que produzem crianças com

distúrbios, crianças deficientes. E a teoria da carência cultural, que procura

justificar o fracasso das classes populares na pobreza, em problemas

emocionais, na família desestruturada. No entanto, segundo a autora, essas

teorias precisam ser revistas a partir dos mecanismos produtores e geradores

de dificuldades de aprendizagem, o sistema educacional.

Num mundo no qual argumentos racistas explícitos podem causar constrangimento, como explicar a perpetuação de uma parcela da população nesse limbo?Pelo recurso a versões ambientalistas do desenvolvimento humano, reservado ao termo “ambiente” uma concepção acrítica, compatível ao mesmo tempo com uma visão biologizada da vida social e com uma definição etnocêntrica de cultura: de um lado o ambiente é praticamente reduzido a estimulação sensorial proveniente do meio físico; de outro, valores, crenças, normas, hábitos e habilidades tidos com típicos das classes dominantes são considerados como os mais adequados à promoção de um desenvolvimento psicológico sadio.Quando se propõe a explicar o sucesso escolar e profissional desigual entre os integrantes das classes sociais, estas teorias ambientalistas fundamentam-se em preconceitos estereótipos que, com uma fachada científica, passam a orientar a política educacional (PATTO, 1996, p.56).

Ainda segundo Patto (1996), muitos pesquisadores não percebem que a

precariedade dos instrumentos de avaliação, o contexto e o comportamento

das pessoas ao serem avaliadas interferem nos resultados. Algumas acabam

se comportando melhor, pois tiveram mais oportunidade de aprender e por isso

conhecem as regras socialmente impostas, enquanto outras, por as

desconhecerem, acabam se retraindo e levando desvantagem no resultado

Page 6: INCLUSÃO ESCOLAR: A IMPORTÂNCIA DA MEDIAÇÃO … · PARA O PROCESSO DE APROPRIAÇÃO DO CONHECIMENTO E ... consequentemente da aquisição do conhecimento ... Resultados do IDEB

final da avaliação. Muitos pesquisadores não levam em conta as relações de

poder, acreditam que a escola é algo à parte e acabam por não desvendar o

real motivo de muitos fracassarem na escola pública.

[...] Tais pesquisas confirmam aos educadores a propriedade de sua visão preconceituosa das crianças pobres e de suas famílias, impedindo-os, assim, de olhar para a escola com olhos mais críticos. Dizem para o oprimido que a deficiência é dele e lhe prometem uma igualdade de oportunidade impossível através de programas de educação compensatória que já nascem condenados ao fracasso quando partem do pressuposto de que seus destinatários são menos aptos à aprendizagem escolar. Mesmo assim, fazem renascer, com estes programas, a esperança na justiça social, mais uma vez graças ao papel democratizaste atribuído à escola compensatória que supostamente reverterá as diferenças ou deficiências culturais e psicológicas de que as classes menos favorecidas seriam portadoras (PATTO, 1996, p.50).

Libâneo (2012) ressalta que nos últimos vinte anos a escola pública

brasileira sofreu grande declínio devido às políticas neoliberais, que produziram

reformas educacionais. É importante destacar que movimentos internacionais

como a “Declaração de Jomtien”, na Tailândia, em 1990, a “Declaração

Mundial sobre a Educação para Todos” (1990), e a “Conferência Mundial de

Educação Especial”, em 1994, em Salamanca, na Espanha, entre outros

movimentos patrocinados pelo Banco Mundial defendem a inclusão de todos

no ensino comum; todavia, como bem afirma Libâneo, defendem uma

educação reduzida às necessidades mínimas para atender às diferenças e

ritmos de aprendizagem, flexibilizando a avaliação e conteúdos ligados ao

cotidiano dos alunos.

Salientamos que os conhecimentos ligados ao cotidiano dos alunos

pouco interferem no desenvolvimento cognitivo, apenas garantem o acesso ao

mínimo da educação para a sobrevivência; a escola passa a ser um espaço de

acolhimento, de convivência, e não de desenvolvimento intelectual. Há uma

inversão no papel da escola, esta deixa de ser um espaço de aquisição do

conhecimento científico e passa a ser o espaço de convivência, da

aprendizagem mínima. E as políticas públicas que tinham a função de diminuir

as desigualdades acabam ampliando-as. É importante destacar que os

aspectos relativos à educação inclusiva são relevantes e devem ser

considerados; pois para Libâneo (2012) o problema se encontra na distorção

Page 7: INCLUSÃO ESCOLAR: A IMPORTÂNCIA DA MEDIAÇÃO … · PARA O PROCESSO DE APROPRIAÇÃO DO CONHECIMENTO E ... consequentemente da aquisição do conhecimento ... Resultados do IDEB

dos objetivos da escola.

Eis que as vítimas dessas políticas, aparentemente humanistas, são os alunos, os pobres, as famílias marginalizadas, os professores. O que lhes é oferecido foi uma escola sem conteúdo e com um arremedo de acolhimento social e socialização, inclusive na escola de tempo integral. O que se anunciou como um novo padrão de qualidade transformou-se num arremedo de qualidade, pois esconde mecanismos internos de exclusão ao longo do processo de escolarização, antecipadores da exclusão na vida social (LIBÂNEO, 2012, p.23).

Assim, ao pensarmos em inclusão escolar, não podemos deixar de

analisar o contexto em que a escola está inserida. Se o modelo de sociedade

que temos é o capitalismo e se os ideais desse modelo são liberdade e

igualdade, devemos refletir se esses ideais de fato são verdadeiros ou são, na

realidade, ilusórios, à medida que o capitalismo tem como base a exploração

do trabalho humano por meio do trabalho assalariado. Ou seja, aquele que não

consegue produzir não tem o mesmo direito aos bens de consumo. Logo, sua

liberdade é negada ou é parcial. Nas palavras de Martins e Carvalho (2011,

p.20), “Para o capitalismo, a liberdade e a igualdade se expressam pela

capacidade que os indivíduos têm de participar do mercado”.

O espaço escolar é reflexo dessa sociedade, e “qualquer tentativa de

inclusão no sistema capitalista, seja por meio de uma educação inclusiva, seja

por meio de leis que obriguem a inclusão ao mercado de trabalho, está fadada

ao fracasso” (MARTINS e CARVALHO, 2011, p.24), pois esse sistema atribui

ao indivíduo a responsabilidade pelo seu sucesso ou fracasso, mas lhe oferece

condições desiguais. Para alguns, uma escola preocupada com o

conhecimento científico; para muitos, a educação para o acolhimento. Logo,

temos uma educação excludente, isto é, que exclui grande parte da população

do direito ao conhecimento historicamente acumulado. E para aquele que não

recebe educação de qualidade, em grande parte das vezes, sobra somente

diagnóstico e rótulos. Pouco se discute a escola que foi oferecida a esse

indivíduo; é mais fácil diagnosticá-lo e colocar em sua família, em sua escola e

em seus professores a culpa pelo seu insucesso escolar.

É necessário tratarmos de inclusão escolar porque, de alguma

maneira, pessoas foram excluídas da sociedade e precisamos acolhê-las. É

preciso, entretanto, discutir quais fatores a excluíram e a qualidade de serviços

Page 8: INCLUSÃO ESCOLAR: A IMPORTÂNCIA DA MEDIAÇÃO … · PARA O PROCESSO DE APROPRIAÇÃO DO CONHECIMENTO E ... consequentemente da aquisição do conhecimento ... Resultados do IDEB

oferecida à classe trabalhadora, tanto com relação à educação, quanto com

relação à saúde e também refletir que acolher não é o suficiente, mas que

precisamos oferecer uma educação transformadora, de qualidade, que garanta

a pobres e ricos a mesma liberdade em suas escolhas.

[...] em que todo e qualquer laço ou proposta de coletividade encontram-se dissolvidos, expondo os indivíduos a um drama diário de sobreviverem sob intensa exploração, e, ao mesmo tempo, encaminhando-os a um espaço de alienação que os leva a divorciarem esse modo de vida com aquilo que a ‘compor” suas mentes. As dificuldades resultantes desse quadro refletem-se em todas as instituições, relacionando-se a todos e não apenas a uma escola ou a uma determinada família, acusada de não educar bem os seus filhos (BARROCO,2009, p.108).

De acordo com Martins e Carvalho (2011a), o termo exclusão não

existe, pois não existe ninguém excluído, fora da sociedade. Para as autoras, o

que chamamos de exclusão nada mais é que um dos reflexos da alienação. E

para a superação dessa alienação, necessitamos que o ensino valorize o

conhecimento científico, o desenvolvimento das funções psicológicas

superiores.

Ao nascermos, temos um equipamento biológico, mas para

desenvolvê-lo precisamos de mediações, de instrumentos que nos levam a

pensar o mundo, pois segundo Vigostki (2011a), nos instrumentalizamos por

meio da observação e imitação. Por esse motivo, quanto maiores forem os

estímulos, maior será nossa capacidade de desenvolvimento.

Nesse processo de intervenção, optamos por uma fundamentação

teórica que supera as teorias que procuram no indivíduo a resposta para as

questões sociais. Buscamos na psicologia histórico-cultural a compreensão do

papel da aprendizagem escolar no desenvolvimento das funções psicológicas

superiores bem como a superação do fracasso escolar. Referindo-se a essa

fundamentação teórica, Possidônio e Facci, (2011, p.61) assinalam que:

Os pressupostos dessa teoria, formulada por Vigotski (1995), que utilizou o método dialético de Marx, enaltecem e solidificam o papel da educação, posto que ela é insubstituível na apropriação, pelo sujeito, do conhecimento cultural e historicamente acumulado. Sob essa perspectiva, dada sociedade deve ser compreendida como determinante na

Page 9: INCLUSÃO ESCOLAR: A IMPORTÂNCIA DA MEDIAÇÃO … · PARA O PROCESSO DE APROPRIAÇÃO DO CONHECIMENTO E ... consequentemente da aquisição do conhecimento ... Resultados do IDEB

formação da personalidade e da estrutura da atividade humana. A constituição psicológica dos indivíduos depende diretamente do grau de desenvolvimento das forças produtivas do grupo social a que pertence.

De acordo com Vigotski, (2011a), a escolarização tem papel crucial no

desenvolvimento das funções psicológica superiores, como a atenção

voluntária, a memória, a percepção, a abstração. À medida que o aluno vai se

apropriando de conceitos já adquiridos pela humanidade por meio da

experiência, também desenvolve as funções complexas. Por exemplo, o aluno

não nasce com a atenção, desenvolve-a através de mediações. Para Vigotski

(2011a), o processo de humanização não ocorre de forma linear, mas por meio

de avanços e retrocessos na realização de atividades mediadas.

O desenvolvimento da criança acontece, por meio de mudanças, em

forma de espiral, devido a um longo processo que no início é social

(interpsicológica), e em que ela usa a linguagem egocêntrica para organizar e

controlar o próprio pensamento para a prática, até que é capaz de dispensar

certos estímulos externos e aplicá-los em forma de conceitos abstratos e se

torna individual (intrapsicológica).

Acreditamos que o desenvolvimento da criança é um processo dialético complexo caracterizado pela periodicidade, desigualdade no desenvolvimento de diferentes funções, metamorfose ou transformação qualitativa de uma forma em outra, embricamento de fatores internos e externos e processos adaptativos que superam os impedimentos que a criança encontra (VIGOTSKI, 2011, p. 80).

Na acepção de Vigotski, (2011a), aprendizado e desenvolvimento

estão presentes desde o nascimento da criança, os conhecimentos prévios são

importantes e devem ser levados em consideração quando o aluno começa a

frequentar a escola. Entretanto, o conhecimento espontâneo e o escolar são

distintos. Primeiro, no dia-a-dia, de forma espontânea e nas relações com o

meio a criança desenvolve seu pensamento verbal e pré-intelectual. Já na

escola, o aprendizado é sistematizado e produz o desenvolvimento das

funções psicológicas superiores por meio das abstrações, por isso é de

extrema importância para o processo de humanização.

O processo de humanização não ocorre naturalmente, mas pela

assimilação de conhecimentos que outros homens já adquiriram no decorrer da

Page 10: INCLUSÃO ESCOLAR: A IMPORTÂNCIA DA MEDIAÇÃO … · PARA O PROCESSO DE APROPRIAÇÃO DO CONHECIMENTO E ... consequentemente da aquisição do conhecimento ... Resultados do IDEB

história. Todos têm direito ao conhecimento histórico-cultural. Quando alguém

é privado desse direito, por condições sociais ou por outros fatores, o direito de

desenvolvimento e liberdade do ser humano é tolhido; por conseguinte, se

exclui alguém de seu direito de escolha. Vigotski (2011a) assevera que

liberdade é ter elementos para pensar e escolher.

É necessário que a escolarização contribua para que os alunos que por

ela passam tenham condições para desenvolver as funções mentais. É preciso,

assim, que o professor mediador para a formação do homem oportunize

práticas objetivas mediante o conhecimento das ciências, da arte e da

linguagem, oportunizando o desenvolvimento do humano no homem.

Uma questão relevante que a escola deve estar atenta é com relação

ao material concreto, tanto para alunos especiais quanto para os demais.

Quando a escola só trabalha no concreto, não desenvolve as abstrações

necessárias para o desenvolvimento das funções psicológicas superiores. Vale

então usar o concreto como um meio para atingir um objetivo, mas não como

um fim. A finalidade deve estar sempre na abstração. Em consonância com

Vigotski (2011a, p.101), “[...] o sistema de ensino baseado somente no

concreto - um sistema de ensino que elimina tudo aquilo que está associado ao

pensamento abstrato - falha em ajudar crianças retardadas a superar as suas

deficiências inatas [...]”.

Aprender é um processo que faz parte da história humana; desde a

origem da humanidade, como condição de sobrevivência o homem se apropria

de conhecimentos necessários para dominar a natureza. A vida humana funda-

se no trabalho como atividade social, o qual dá origem à consciência,

transformando e desenvolvendo o psiquismo de maneira qualitativa por meio

de um movimento histórico e social.

Em cada época, determinado por fatores culturais e sociais e da

relação estabelecida com outros homens, o desenvolvimento das funções

psicológicas superiores acontece e o homem se torna humano.

A verdadeira essência da memória humana está no fato de os seres humanos serem capazes de lembrar ativamente com a ajuda de signos. Poder-se-ia dizer que a característicabásica do comportamento humano em geral é que os próprios homens influenciam sua relação com o ambiente e, através desse

Page 11: INCLUSÃO ESCOLAR: A IMPORTÂNCIA DA MEDIAÇÃO … · PARA O PROCESSO DE APROPRIAÇÃO DO CONHECIMENTO E ... consequentemente da aquisição do conhecimento ... Resultados do IDEB

ambiente, pessoalmente modificam seu comportamento, colocando-o sob seu controle (VIGOTSKI, 2011b, p.50).

A escola deve ter conhecimento do nível de desenvolvimento de seus

alunos para poder intervir e provocar o aprendizado de conceitos abstratos

mediante a combinação entre o que ele sabe (conhecimento real) e o que está

próximo de saber (conhecimento proximal). Todavia, o professor deve atentar-

se que o mais importante não é o quanto o aluno sabe, e sim o que ele é capaz

de saber com auxílio. Testes que medem quanto o aluno sabe não são

suficientes para medir o grau de desenvolvimento mental. Para Vigotski

(2011a, p.96), "[...] o que a criança consegue fazer com ajuda dos outros

poderia ser, de alguma maneira, muito mais indicativo de seu grau de

desenvolvimento mental do que o que consegue fazer sozinha".

Para que essa questão ficasse mais clara, é oportuno citar o que

Vigotski (2011a, p.97) nos traz com relação à zona de desenvolvimento real e à

zona de desenvolvimento proximal. O autor assinala que a aprendizagem não

acontece apenas a partir do desenvolvimento da criança, daquilo que ela faz

sozinha, mas principalmente do que ela pode fazer se estimulada ou com

auxílio de uma pessoa com maior experiência. O que a criança faz sozinha,

sem auxílio, é o conhecimento já interiorizado e determina a zona de

desenvolvimento real (ZDR); a zona de desenvolvimento proximal é

determinada pela distância entre o que ela faz sozinha e aquilo que está

próximo, mas que necessita da mediação de um adulto. O conceito de zona de

desenvolvimento proximal (ZDP) pode explicar a defasagem existente na

resolução de tarefas cognitivas relacionadas entre o plano individual e social.

A zona de desenvolvimento proximal define aquelas funções que ainda não amadureceram, mas estão em processo de maturação, funções que amadurecerão, mas que estão presentemente em estado embrionário. Essas funções poderiam ser chamadas de brotos ou flores do desenvolvimento ao invés de frutos do desenvolvimento. O nível de desenvolvimento real caracteriza o desenvolvimento mental retrospectivamente, enquanto a zona de desenvolvimento proximal caracteriza o desenvolvimento mental prospectivo (VIGOTSKI, 2011a, p. 98).

Para que aconteça a aprendizagem, é necessário que o professor

tenha conhecimento do nível de desenvolvimento real do aluno, e por meio de

Page 12: INCLUSÃO ESCOLAR: A IMPORTÂNCIA DA MEDIAÇÃO … · PARA O PROCESSO DE APROPRIAÇÃO DO CONHECIMENTO E ... consequentemente da aquisição do conhecimento ... Resultados do IDEB

atividades pedagógicas variadas estimule o desenvolvimento proximal. Dessa

forma, cabe à escola mediar o conhecimento daquele conteúdo que o aluno

ainda não se apropriou, mas que está próximo. Esse processo é de grande

relevância para o trabalho do professor e para o desenvolvimento do aluno.

Deve haver uma relação com o conhecimento verdadeiro,

sistematizado através da mediação no espaço escolar, o aluno continuamente

se apropria do conhecimento científico e estabelece generalizações mais

intelectuais, com base em conhecimentos já interiorizados, e sem a

necessidade de retomá-los. Nessa constante evolução, ocorre a transição do

pensamento conceitual, por meio da linguagem presente em todas as

disciplinas.

A esse respeito, Possidônio e Facci, (2011, p.261) alegam que “[...] a

mediação conduz o homem à aprendizagem e ao desenvolvimento das

características essencialmente humanas, tais como o uso da linguagem, dos

instrumentos, dos signos”.

Barroco (2011) sublinha que o professor deve estabelecer vínculos

com os alunos, e ao estimulá-los com atividades, deve fornecer instrumentos

para a resolução da questão mediante relações que o ajudem a relembrar e

analisar antes de responder. Cabe à escola mediar o conhecimento daquele

conteúdo que o aluno ainda não se apropriou tendo como base o que ele já

sabe. Por exemplo, analisar as leituras que o aluno consegue realizar sozinho

e aumentar a complexidade de relações textuais para provocar avanços em

seu desenvolvimento.

Outro ponto relevante para o trabalho do professor é apontado por

Vigotski (2011b) sobre a importância da intervenção pedagógica e de outras

pessoas no desenvolvimento do aluno. Por meio dessa intervenção, o

professor deve organizar ações que possibilitam ao aluno entrar em contato

com o conhecimento historicamente acumulado. Nesse processo, o aluno não

é visto como um sujeito passivo; ele se relaciona, dialoga e age sobre o

ambiente que está estruturado de acordo com sua cultura. Desta forma, se

apropria do conhecimento e se instrumentaliza para pensar e agir no mundo.

Vigotski (2011b) também mostra que a língua é a principal ferramenta do

homem, por meio dela ele se integra, se conecta, se apropria do que os outros

homens produziram e se torna humano. Nas palavras do autor, "na ausência

Page 13: INCLUSÃO ESCOLAR: A IMPORTÂNCIA DA MEDIAÇÃO … · PARA O PROCESSO DE APROPRIAÇÃO DO CONHECIMENTO E ... consequentemente da aquisição do conhecimento ... Resultados do IDEB

do outro, o homem não se constrói homem” (VIGOTSKI, 2001a, p.58).

Vigotski (2011b), em seus experimentos, demonstra que os conceitos

científicos, por meio de mediações, gradualmente fazem com que as formas

primitivas de pensamento desapareçam e sejam substituídas por conceitos

verdadeiros. A aprendizagem escolar, através do conhecimento sistematizado,

ensina muitas coisas que seriam difíceis de aprender no cotidiano. Um exemplo

seria o ensino da gramática, que auxilia no desenvolvimento mental da criança,

pois “ajuda a criança a passar para um nível mais elevado do desenvolvimento

da fala” (VIGOTSKI, 2011b, p.136).

METODOLOGIA

O Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE – nos

proporcionou estudos e pesquisas na área da Educação. Nos dois anos

reservados para estudo e aplicação do Projeto, buscamos, por meio de

pesquisas e de subsídios teóricos na Psicologia Histórico-Cultural, discutir

sobre a relevância da mediação pedagógica para a formação humana.

Com base em nossos estudos, elaboramos o Projeto de Intervenção e

a Produção Didático-Pedagógica, que foi suporte para a atividade de

implementação pedagógica realizada por meio de um curso de extensão, com

16 professores da Escola Estadual Francisco P. X. Lopes – Cônego – Ensino

Fundamental, no Município de Nova Esperança, PR. Também ofertamos aos

profissionais da educação do Estado do Paraná o curso a distância GTR, com

a participação efetiva de 14 professores. Nesses dois momentos, abordamos o

tema estudado e algumas possibilidades de mediações pedagógicas.

Para a implementação, em um primeiro momento tratamos da exclusão

e a inclusão escolar, em uma reflexão dos fatores que contribuem para o

fracasso na escola e na sociedade, para, em segundo momento,

apresentarmos aos professores a formação humana com base na Psicologia

Histórico-Cultural. No terceiro momento, analisamos as concepções e os

conceitos sobre a aprendizagem e o desenvolvimento, e no quarto e último

momento propomos reflexões sobre a mediação do conhecimento científico.

Page 14: INCLUSÃO ESCOLAR: A IMPORTÂNCIA DA MEDIAÇÃO … · PARA O PROCESSO DE APROPRIAÇÃO DO CONHECIMENTO E ... consequentemente da aquisição do conhecimento ... Resultados do IDEB

RESULTADOS

Na análise de resultados, utilizamos os textos produzidos pelos

professores durante o curso de extensão que ocorreu na Escola Estadual

Francisco P. X. Lopes – Cônego, no período de 06/03/2013 a 04/04/2013. Esse

curso totalizou 32 horas, divididas em oito encontros. Salientamos que em

cada encontro de oito horas, quatro horas foram reservadas para leitura de

artigos relacionados ao tema abordado e nas outras quatro horas

subsequentes houve aprofundamento, por meio de slides, vídeos, exposição

oral, debates e produção textual.

Os resultados são apresentados por temáticas e foram construídas nas

discussões realizadas durante os encontros. Essas temáticas, por sua vez,

compreendem três que permearam o trabalho desenvolvido: primeira, o

“sentimento de desvalorização da escola e do professor”; segunda, o “sentido

da escola para o aluno”; e terceira, as “questões relativas às políticas públicas

e ao processo de inclusão”.

Na primeira temática, tratamos de questões referentes ao sentimento

de desvalorização da escola e do trabalho do professor. Corroborando Facci

(2004, p.33), “É patente em nossa sociedade a desvalorização da escola e

consequentemente do trabalho do professor.”

Percebemos que esse sentimento de desvalorização foi constante nos

depoimentos dos professores; estes revelam o sentimento de frustração no

tocante à educação. Vejamos alguns exemplos, destacando que para preservar

sua identidade, os docentes foram nominados com as letras do alfabeto,

Professora A, B, C, e assim sucessivamente:

Professora A:

"Quando ouço falar em “Educação” me sinto frustrada, desmotivada e de

mãos atadas. A nossa realidade está cada dia pior, estamos caminhando

para o “Caos”, alunos desmotivados que conhecem apenas seus direitos

e são alheios aos seus deveres, famílias desestruturadas, professores

cansados".

Professora C:

Page 15: INCLUSÃO ESCOLAR: A IMPORTÂNCIA DA MEDIAÇÃO … · PARA O PROCESSO DE APROPRIAÇÃO DO CONHECIMENTO E ... consequentemente da aquisição do conhecimento ... Resultados do IDEB

"Os professores se desgastam demais com a falta de respeito e a falta de

educação dos alunos e também vamos desanimando com as aulas, pois

não há interesse e nem vontade em aprender. professores desmotivados

com alunos desinteressados".

Na concepção de Facci (2010), a queixa dos professores se deve ao fato

de que as pedagogias que orientam o trabalho pedagógico, adotadas nas

últimas décadas, contribuíram para o esvaziamento do conteúdo científico ao

valorizarem o desenvolvimento de competências e a experiência; como

consequência, houve desvalorização do trabalho do professor.

Na segunda temática, contemplamos questões relativas ao sentido da

escola para o aluno e professores.

Os professores, no geral, citaram a inversão de valores com relação

ao que é “Direito” e “Dever”. Afirmaram que muitos alunos entendem como

sendo seu direito e sinônimo de liberdade não terem responsabilidades, não

fazerem nada e não serem responsabilizados por seus atos, quando na

realidade o que nos dá liberdade é o conhecimento que adquirimos, o qual nos

possibilita fazer escolhas.

Professora B:

“A Escola em qual trabalho apresenta a seguinte realidade: a grande

maioria dos alunos não tem interesse e compromisso com os estudos,

participam pouco das aulas, não fazem tarefa e não possuem hábito de

estudo em casa, não gostam de aulas que exigem leitura, reflexão e

raciocínio lógico, querem tudo muito mecânico, muito fácil e repetitivo, s

indisciplinados arrumam muitas brigas entre eles por causa de fofocas,

namoros e outros problemas, falam muito sobre sexo, drogas e problemas

familiares. Como professora estou sempre estudando, preparando aula

que realmente leve o aluno a ter acesso a cultura, mas muitas vezes

tenho me sentido frustrada por querer o melhor para meus alunos e eles

não quererem nada, muita preguiça, muita apatia e desrespeito”.

Em relação a esse aspecto, Facci; Leonardo; Silva (2010, p.232)

destacam que:

Page 16: INCLUSÃO ESCOLAR: A IMPORTÂNCIA DA MEDIAÇÃO … · PARA O PROCESSO DE APROPRIAÇÃO DO CONHECIMENTO E ... consequentemente da aquisição do conhecimento ... Resultados do IDEB

De nossa parte, defendemos uma escola que realmente venha contribuir para o processo de humanização dos indivíduos, por meio da apropriação que fazem da cultura. Para que isso se concretize, é preciso valorizar os conteúdos científicos e não permitir que a escola se esvazie deles. Tal esvaziamento certamente levaria à desvalorização do trabalho do professor e à secundarização do ensino. Vale destacar que o trabalho do professor aqui é compreendido como fundamental, sendo ele o mediador entre o conhecimento e o aluno, levando este a superar os conhecimentos da vida cotidiana em direção a um conhecimento sistematizado que permita uma reflexão mais ampla da realidade. Consideramos que esse conhecimento levará o aluno a tomar consciência da realidade histórica e, coletivamente, a ter uma posição ativa na transformação da realidade social calcada na divisão de classes.

Observamos que muitos professores buscam no senso comum

explicações para o fracasso e desmotivação do aluno, apresentando um

sentimento de impotência. Sabemos que essa realidade somente será mudada

por meio de estudo sobre teorias e políticas que direcionem nosso trabalho,

procurando fazer da educação uma luta contra a alienação. Ressaltamos que

os significados e sentidos são construídos historicamente; nessa direção,

precisamos questionar: "como nossa sociedade está contribuindo para a

construção de uma significação sobre a escola?".

Na terceira temática, trabalhamos questões ligadas às políticas públicas

e suas relações com o processo de inclusão.

A Professora C revela em seu depoimento que alguns aspectos da

situação precária em que se encontra a educação são gerados no âmbito da

política educacional:

“Em minha opinião temos sido muito pacíficos, como professores

aceitamos o que é imposto, não questionamos, nem cobramos que todos

os direitos adquiridos sejam realmente obedecidos, como sociedade

muitas vezes nem sabemos quais são esses direitos, elegemos sempre

os mesmos políticos que não tem compromisso com os votos que

receberam e nós prosseguimos achando que um dia vai melhorar, e não

fazemos “nada” pra mudar nossa realidade”.

Na fala da Professora C, acima, percebemos a necessidade de maior

envolvimento e conscientização dos professores acerca das questões macro

Page 17: INCLUSÃO ESCOLAR: A IMPORTÂNCIA DA MEDIAÇÃO … · PARA O PROCESSO DE APROPRIAÇÃO DO CONHECIMENTO E ... consequentemente da aquisição do conhecimento ... Resultados do IDEB

que determinam e orientam as políticas educacionais.

No tangente às questões internas à sala de aula, na fala da Professora

D observamos que há uma tensão interna entre alunos e professores, ambos

constituídos em um mesmo sistema excludente, cuja saída não se enxerga:

“Os alunos vem prá escola apenas para encontrar amigos, e muitas vezes

para afrontar professores e funcionários, não veem nenhum objetivo em

estudar, afinal de contas, basta frequentar a escola e terão a aprovação

automática, hoje a escola é para “todos” e acaba sendo para ninguém,

não existem provas, tarefa é coisa do passado, não há punições, os pais

se igualam aos filhos, perderam a autoridade. O professor que devia

transmitir o conhecimento, gasta todo tempo separando brigas, chamando

atenção, fazendo malabarismos e “fabricando” notas porque o sistema

exige que não haja reprovas, é obrigado a passar alunos e em contra

partida somos tachados de despreparados pelos resultados que nossos

alunos apresentam na Prova Brasil, Enem, Saep e por aí a fora. Tá tudo

errado, a escola virou apenas “depósito” de crianças, fala-se em inclusão,

onde predomina uma exclusão velada”.

Nessa direção, a professora E trata de exclusão. Verificamos que grande

parte dos professores, participantes desse curso, é ciente que apenas a

matrícula não garante a inclusão, todavia, mesmo percebendo o problema, não

encontram alternativas para resolvê-lo dentro da escola, nem em Políticas

Educacionais claras e eficazes.

“A escola é uma instituição marcada pela diversidade, e durante anos um

de seus principais objetivos era selecionar aqueles considerados

melhores, decidindo quem teria condições de prosseguir nos estudos e

quem deveria ser excluído. Hoje vivemos outro extremo, hoje a escola é

para “todos”, no entanto existe um grupo de pessoas que mesmo tendo

acesso à escola, incluídos no sistema, permanecem excluídos”.

Na superação dessas questões, a Professora F acredita que mudanças

são possíveis por meio da união de professores e aponta para a necessidade

de um trabalho coletivo: “...mas é preciso que cada um faça a sua parte, nós

Page 18: INCLUSÃO ESCOLAR: A IMPORTÂNCIA DA MEDIAÇÃO … · PARA O PROCESSO DE APROPRIAÇÃO DO CONHECIMENTO E ... consequentemente da aquisição do conhecimento ... Resultados do IDEB

professores temos que ter mais firmeza, usando de uma mesma linguagem e

postura para podermos reverter está situação”.

Somente matrículas não garantem a inclusão, é preciso que o professor

seja preparado e autorizado a mediar o conhecimento científico sem

empobrecê-lo, para que o desenvolvimento das funções complexas do

pensamento e possiblidades de superação do fracasso escolar aconteçam.

Entretanto, na visão de Facci (2004, p.33):

A sociedade capitalista não tem interesse em possibilitar a socialização do saber, que desvende suas contradições, não tem interesse que os homens tenham consciência de sua condição de exclusão dessa sociedade e dos bens culturais.

Podemos afirmar que a escola é uma das instâncias de inclusão escolar,

desde que seu objeto principal de trabalho seja o ensino-aprendizagem e o

processo de humanização pela apropriação dos conhecimentos elaborados.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nos estudos realizados durante a implementação, foi possível perceber

que continuamos buscando no senso comum a explicação para o não aprender

na escola. Nos depoimentos dos professores para este Projeto observamos

que muitos procuravam aliviar a angústia do fracasso escolar em desculpas

como: "os alunos não aprendem porque a família não se preocupa", ou ainda

acreditavam na necessidade de avaliar, diagnosticar e encaminhar para o

atendimento especial, e se possível medicá-los para que se mantivessem

calmos. Todavia, identificamos que os professores apresentavam esse

discurso, assim como nós, anteriormente a este estudo, por falta de subsídios

teóricos, aliado ao fato de que a cobrança, por meio de avaliações externas, é

grande, pressionando o professor a buscar soluções individuais, que muitas

vezes fogem ao controle. Em uma sociedade capitalista, dividida em classes,

não se oferecem as mesmas condições a todos, e a inclusão não elimina as

desigualdades e torna-se paradoxal, uma inclusão excludente.

Nesse âmbito, Carvalho e Martins (2011, p.33) asseveram que:

Page 19: INCLUSÃO ESCOLAR: A IMPORTÂNCIA DA MEDIAÇÃO … · PARA O PROCESSO DE APROPRIAÇÃO DO CONHECIMENTO E ... consequentemente da aquisição do conhecimento ... Resultados do IDEB

[...] as dificuldades em relação à inclusão ultrapassam a esfera da deficiência para encontrar respostas no próprio modelo de sociedade em que se estabelecem. Ainda que se busque a inclusão por meio de leis e mecanismos que insiram o deficiente no livre mercado e na escola, sua condição de desigualdade o acompanhará dentro desses sistemas, uma vez que, real e concretamente, inexistem as condições objetivas para a almejada inclusão social.

Devemos compreender que a aprendizagem ocorre e é influenciada

pelo contexto social e não por uma visão individualizada do sujeito, que a

escola deve priorizar práticas pedagógicas que visem ao máximo

desenvolvimento dos alunos, com a preocupação de não excluí-los do

processo de humanização, que acontece pela aquisição do conhecimento

científico daqueles que se encontram matriculados no ensino comum.

Muitos professores, contudo, angustiados com os resultados das

avaliações externas e internas, procuram explicações individuais ou biológicas

para o fracasso escolar. Entretanto, lembramos que o fracasso escolar da

maioria dos alunos não pode ser justificado por sua história individual, já que

segundo Patto (1996, p.86):

A crença na incompetência das pessoas pobres é generalizada em nossa sociedade. Às vezes, nem mesmo os pesquisadores munidos de um referencial teórico-crítico estão livres dela. Como veremos, mesmo quando voltam os olhos para a escola e o ensino numa sociedade de classes e neles identificam inúmeras condições que podem por si só explicar as altas taxas de reprovação e evasão, continuam a defender as teses da teoria da carência cultural. O resultado é um discurso incoerente que, em última instância, acaba reafirmando as deficiências da clientela como a principal causa do fracasso escolar.

Diante do entendimento dos desafios aqui elencados e que motivaram

nossa pesquisa, salientamos que é preciso a clareza de que nós, professores,

os alunos e os pais não podemos tomar para nós as responsabilidades pelo

fracasso escolar. Necessitamos de políticas educacionais eficientes, que

garantam ao professor condições de ensinar e ao aluno de aprender.

Page 20: INCLUSÃO ESCOLAR: A IMPORTÂNCIA DA MEDIAÇÃO … · PARA O PROCESSO DE APROPRIAÇÃO DO CONHECIMENTO E ... consequentemente da aquisição do conhecimento ... Resultados do IDEB

REFERÊNCIAS

BARROCO, Sonia Mari Shima. Sala de Recursos e Linguagem Verbal: em defesa do desenvolvimento do humano no aluno. In: A exclusão dos incluídos. 21.ed. Maringá, Eduem, UEM, 2011, cap. 9. BARROCO, Sonia Mari Shima. Vigotski, arte e psiquismo humano: considerações para a psicologia educacional. In: Escola de Vigotski: contribuições para a psicologia e a educação. Maringá, Eduem, UEM, cap.v, 2009. CARVALHO, Saulo Rodrigues de; MARTINS, Lígia Márcia. A Sociedade Capitalista e a Inclusão/Exclusão. In: A exclusão dos incluídos. 21. ed. Maringá, Eduem, UEM, 2011, cap. 1. FACCI, M. G. D; POSSIDÔNIO, S. K. A Influência da Classe Especial na Constituição da Subjetividade dos Alunos: Uma Análise a partir da Psicologia Histórico-Cultural. In: A exclusão dos incluídos. 21. ed. Maringá, Eduem, UEM, 2011, cap.8. FACCI, Marilda Gonçalves Dias. Valorização ou esvaziamento do trabalho do professor. Autores Associados, 2004. LIBÂNEO, José Carlos. O dualismo perverso da escola pública brasileira: escola do conhecimento para os ricos, escola do acolhimento social para os pobres. Educação e Pesquisa. São Paulo, v. 38, n1, 2012, p.13-28. Disponível em www.scielo.pr.com. Acesso em 15/05/2012. MEIRA, Marisa Eugênia Melillo. Incluir para continuar excluindo: A produção da exclusão na educação brasileira à luz da psicologia histórico-cultural. In: A exclusão dos incluídos. 21.ed. Maringá, Eduem, UEM, 2011, cap. 4. PATTO, Helena de Souza. A produção do fracasso escolar: histórias de submissão e rebeldia. São Paulo: T. A. Queiroz, 1996. TULESKI, S; EIDT, N. Repensando os distúrbios de aprendizagem a partir da psicologia histórico-cultural. Psicologia em estudo. Maringá, v. 12, n. 3, set/dez, 2007. Disponível em: www.scielo.br.com. Acesso em 20/04/2012. VIGOTSKI, L. S. A formação social da mente. Martins Fontes. São Paulo. 2011a. ______. Pensamento e linguagem. Martins Fontes. São Paulo. 2011b. FACCI, M,G, D; LEONARDO, N. T. S.; SILVA, D. G. R. O trabalho e a formação do professor nos anais da NA PED: uma análise a partir da psicologia histórico-cultural. InterMeio: Revista do Programa de Pós-Graduação em Educação, Campo Grande, MS, v.16, n.31, p.216-237, jan./jul. 2010.