Indicação geográfica e cafeicultura

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AGRO PECUÁRIO ESTADO DE MINAS S E G U N D A - F E I R A , 2 8 D E J U N H O D E 2 0 0 4 2 ARTIGO Indicação geográfica e a agroindústria VINÍCIUS CUNHA/EM palmente, industrializados que o Estado possui. No âmbito agroindustrial, esta valorização parte do princípio da coordena- ção das cadeias produtivas, via arranjos produtivos, que favore- çam a conversação entre os par- ticipantes de cada segmento da cadeia, bem como a participação do Estado, via instrumentaliza- ção legal e fomento econômico para o nivelamento da base tec- nológica mineira (através de in- vestimentos em extensão rural, programas de boas práticas de produção e industrialização, fi- nanciamento de plantas indus- triais mais modernas, difusão da cultura exportadora). Se hoje a agricultura nacio- nal, já é responsável por cerca de 42% da pauta de exportações brasileiras, através da agregação de valor, via industrialização e indicação geográfica, podere- mos mais. Minas Gerais tem de cumprir o seu papel na dinâmi- ca do desenvolvimento nacional, sendo capaz de transicionar en- tre o estigma de mero produtor de commodities agrícolas para o de grande exportador de produ- tos de primeira qualidade com alto valor agregado, garantindo aos seus setores produtivos, maior rentabilidade e por conse- guinte, mais oportunidades de oferta de trabalho no mercado nacional. Parafraseando Milton Nascimento, que nossos produ- tos sejam do mundo, mas de Mi- nas Gerais. MARA LUIZA GONÇALVES FREITAS Mestranda em administração/UFLA e especialista em cafeicultura empresarial [email protected] O modelo de gestão na atua- lidade passou a ser regido por princípios e diretrizes socioam- bientais, os quais são perceptí- veis não apenas no modus viven- di do cidadão local, cada vez mais global, mas também no comportamento estatal e orga- nizacional. O Estado, assim co- mo as empresas, dadas as neces- sidades urgentes de se adapta- rem às exigências de mercado e suprirem carências profundas como por exemplo o aumento de vagas no mercado de traba- lho, buscam alternativas que en- volvem a intensificação da co- nectividade setorial como meio de redução dos custos de transa- ção e aumento da competitivi- dade. Uma dessas alternativas consiste na valorização dos pro- dutos nacionais, através do que a legislação brasileira (Lei 9.279, de 14/05/96) convenciona como indicação geográfica, a qual en- volve a indicação de procedência e a denominação de origem. Importante instrumento de agregação de valor, as indicações geográficas têm como principal objetivo a preservação da identi- dade dos produtos ou serviços, características e formas de pro- dução ou até mesmo a fama de uma área geográfica pela comer- cialização ou obtenção de um determinado produto, a qual po- de contribuir para a elevação do valor do produto no mercado e respectivamente do lucro. Al- guns exemplos desta natureza são: o Champagne – vinho espu- mante proveniente daquela re- gião francesa; os vinhos tintos da região de Bordeaux; o presun- to de Parma; os charutos cuba- nos, os queijos Roquefort e Gra- na Padano, e mais recentemen- te, os vinhos do Vale dos Vinhe- dos e os Cafés do Cerrado (Brasil). Além disso, seu outro objetivo é garantir a fidelização do consu- midor, em função de inserir no processo de consumo o conceito de rastreabilidade, intimamente relacionado com a questão da se- gurança alimentar, partindo da padronização dos procedimen- tos de produção e qualidade, bem como da valorização da sua raridade. Dada a relevância do tema, os países que compõem a Organi- zação Internacional do Comércio (OMC), desde a Rodada de Doha (Qatar), vêm discutindo a criação de um registro multilateral que envolva todos os produtos co- mercializados no mercado inter- nacional, visando a proteção dos consumidores em relação ao er- ro no momento de aquisição de algum produto, bem como im- pedir a concorrência desleal en- tre os países. Este registro que inicialmen- te envolverá os vinhos e modali- dades de bebidas espirituosas, acena para uma discussão im- portante: se a indicação geográ- fica cria um fator de diferencia- ção de determinados produtos em relação a outros comerciali- zados no mercado, tornando-os mais atrativos e confiáveis, per- cebe-se, num ambiente que tem impulsionado maior participa- ção brasileira no mercado inter- nacional, que a questão deman- da maior atenção tanto da inicia- tiva privada quanto do Estado, por se tratar de importante ele- mento de competitividade. Regionalizando a questão, se- ria de bom tom criar e efetivar as condições para se valorizar a appellation Minas Gerais, em função de todo um conjunto de características que remete às tra- dições, qualidades, aromas e sa- bores aqui produzidos e princi- O Café do Cerrado é um dos exemplos da importância da indicação geográfica na agregação de valor

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Artigo publicado no Jornal O Estado de Minas em 28 de junho de 2004.

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A G R O P E C U Á R I O

E S T A D O D E M I N A S ● S E G U N D A - F E I R A , 2 8 D E J U N H O D E 2 0 0 4

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AARRTTIIGGOO

Indicação geográfica e a agroindústriaVINÍCIUS CUNHA/EM

palmente, industrializados queo Estado possui. No âmbitoagroindustrial, esta valorizaçãoparte do princípio da coordena-ção das cadeias produtivas, viaarranjos produtivos, que favore-çam a conversação entre os par-ticipantes de cada segmento dacadeia, bem como a participaçãodo Estado, via instrumentaliza-ção legal e fomento econômicopara o nivelamento da base tec-nológica mineira (através de in-vestimentos em extensão rural,programas de boas práticas deprodução e industrialização, fi-nanciamento de plantas indus-triais mais modernas, difusão dacultura exportadora).

Se hoje a agricultura nacio-nal, já é responsável por cerca de42% da pauta de exportaçõesbrasileiras, através da agregaçãode valor, via industrialização eindicação geográfica, podere-mos mais. Minas Gerais tem decumprir o seu papel na dinâmi-ca do desenvolvimento nacional,sendo capaz de transicionar en-tre o estigma de mero produtorde commodities agrícolas para ode grande exportador de produ-tos de primeira qualidade comalto valor agregado, garantindoaos seus setores produtivos,maior rentabilidade e por conse-guinte, mais oportunidades deoferta de trabalho no mercadonacional. Parafraseando MiltonNascimento, que nossos produ-tos sejam do mundo, mas de Mi-nas Gerais.

MARA LUIZA GONÇALVES FREITAS

Mestranda em administração/UFLA e

especialista em cafeicultura empresarial

[email protected]

O modelo de gestão na atua-lidade passou a ser regido porprincípios e diretrizes socioam-bientais, os quais são perceptí-veis não apenas no modus viven-di do cidadão local, cada vezmais global, mas também nocomportamento estatal e orga-nizacional. O Estado, assim co-mo as empresas, dadas as neces-sidades urgentes de se adapta-rem às exigências de mercado esuprirem carências profundascomo por exemplo o aumentode vagas no mercado de traba-lho, buscam alternativas que en-volvem a intensificação da co-nectividade setorial como meiode redução dos custos de transa-ção e aumento da competitivi-dade. Uma dessas alternativasconsiste na valorização dos pro-dutos nacionais, através do quea legislação brasileira (Lei 9.279,de 14/05/96) convenciona comoindicação geográfica, a qual en-volve a indicação de procedênciae a denominação de origem.

Importante instrumento deagregação de valor, as indicaçõesgeográficas têm como principalobjetivo a preservação da identi-dade dos produtos ou serviços,características e formas de pro-dução ou até mesmo a fama deuma área geográfica pela comer-cialização ou obtenção de umdeterminado produto, a qual po-de contribuir para a elevação dovalor do produto no mercado erespectivamente do lucro. Al-guns exemplos desta naturezasão: o Champagne – vinho espu-mante proveniente daquela re-gião francesa; os vinhos tintos

da região de Bordeaux; o presun-to de Parma; os charutos cuba-nos, os queijos Roquefort e Gra-na Padano, e mais recentemen-te, os vinhos do Vale dos Vinhe-dos e os Cafés do Cerrado (Brasil).Além disso, seu outro objetivo égarantir a fidelização do consu-midor, em função de inserir noprocesso de consumo o conceitode rastreabilidade, intimamenterelacionado com a questão da se-gurança alimentar, partindo dapadronização dos procedimen-tos de produção e qualidade,bem como da valorização da suararidade.

Dada a relevância do tema, ospaíses que compõem a Organi-

zação Internacional do Comércio(OMC), desde a Rodada de Doha(Qatar), vêm discutindo a criaçãode um registro multilateral queenvolva todos os produtos co-mercializados no mercado inter-nacional, visando a proteção dosconsumidores em relação ao er-ro no momento de aquisição dealgum produto, bem como im-pedir a concorrência desleal en-tre os países.

Este registro que inicialmen-te envolverá os vinhos e modali-dades de bebidas espirituosas,acena para uma discussão im-portante: se a indicação geográ-fica cria um fator de diferencia-ção de determinados produtos

em relação a outros comerciali-zados no mercado, tornando-osmais atrativos e confiáveis, per-cebe-se, num ambiente que temimpulsionado maior participa-ção brasileira no mercado inter-nacional, que a questão deman-da maior atenção tanto da inicia-tiva privada quanto do Estado,por se tratar de importante ele-mento de competitividade.

Regionalizando a questão, se-ria de bom tom criar e efetivar ascondições para se valorizar aappellation Minas Gerais, emfunção de todo um conjunto decaracterísticas que remete às tra-dições, qualidades, aromas e sa-bores aqui produzidos e princi-

O Café do Cerrado é um dos exemplos da importância da indicação geográfica na agregação de valor