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14/09/2015 InfoMoney :: Salário gordo e estabilidade vitalícia: o doce serviço público no Brasil http://www.infomoney.com.br/Pages/News/NewsViewPrint.aspx?NewsId=4280698 1/2 Salário gordo e estabilidade vitalícia: o doce serviço público no Brasil Em tempos de crise, conseguir um emprego público é como ganhar na loteria Por Bloomberg |17h10 | 11092015 (SÃO PAULO) – Em julho, o estado de Minas Gerais anunciou 32 vagas para seu Tribunal Regional do Trabalho. E recebeu 134.270 inscrições para o concurso. Não há nada de excepcional em relação a Minas Gerais nem ao seu TRT. No entanto, como o desemprego está aumentando e o Brasil está caminhando para a pior queda desde a Grande Depressão – o Standard and Poor’s acabou de rebaixar sua nota de crédito para o grau especulativo – conseguir um emprego público é como ganhar na loteria. Ele vem com um salário desproporcional, estabilidade vitalícia e benefícios que podem incluir motoristas e voos gratuitos. “O setor público oferece estabilidade: você passa no concurso e tem um emprego para o resto da vida”, disse Guilherme Alves, 21, que estava estudando o entorpecedor juridiquês em Brasília em um das centenas de cursinhos dedicados a preparar alunos para passar em um concurso estatal. “É ótimo”. O salário médio dos secretários no governo central do Brasil é 49 por cento maior, em relação ao PIB per capita, que o do México e quase o dobro que o dos países que pertencem à Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico. O funcionário típico do governo brasileiro ganhou 42 por cento a mais no ano passado do que o trabalhador comum. Fortes distorções Um motivo de os empregos governamentais serem “banhados a ouro” foi um programa criado há cinquenta anos para convencer brasileiros qualificados a abandonarem as praias do Rio de Janeiro e se mudarem para o árido cerrado da nova capital, Brasília. Isso exacerbou fortes distorções na economia: os brasileiros pagam impostos surpreendentemente altos para financiar um setor estatal inchado que oferece serviços públicos deficitários. O setor privado também ficou sufocado. “Nós não conseguimos pagar o aparato estatal que construímos”, disse Gil Castello Branco, secretáriogeral da Associação Contas Abertas, que supervisiona os gastos do governo. Depois que o rebaixamento da nota de crédito do Brasil foi anunciado, noticiouse que o governo está pensando em congelar o salário dos servidores públicos. Por enquanto, juízes e parlamentares podem chegar a ganhar 30 vezes o salário médio do setor privado, além de regalias. O Brasil emprega menos servidores públicos per capita do que os EUA, a França ou a Alemanha. Mas tem muito menos recursos, de maneira que menos dinheiro vai para os serviços públicos, disse David Fleischer, professor emérito de Ciência Política da Universidade de Brasília. Pensão vitalícia No ano passado, o governo federal gastou 20,6 por cento do PIB em salários, benefícios e despesas administrativas, restando apenas 1 por cento para investimentos, de acordo com a Associação Contas Abertas. Atrair os brasileiros capacitados para a nova capital com salários altos também provocou outros

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14/09/2015 InfoMoney :: Salário gordo e estabilidade vitalícia: o doce serviço público no Brasil

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Salário gordo e estabilidade vitalícia: o doceserviço público no BrasilEm tempos de crise, conseguir um emprego público é como ganhar na loteria

Por Bloomberg |17h10 | 11­09­2015

(SÃO PAULO) – Em julho, o estado de Minas Gerais anunciou 32 vagas para seu Tribunal Regionaldo Trabalho. E recebeu 134.270 inscrições para o concurso.

Não há nada de excepcional em relação a Minas Gerais nem ao seu TRT. No entanto, como odesemprego está aumentando e o Brasil está caminhando para a pior queda desde a Grande Depressão– o Standard and Poor’s acabou de rebaixar sua nota de crédito para o grau especulativo – conseguirum emprego público é como ganhar na loteria. Ele vem com um salário desproporcional, estabilidadevitalícia e benefícios que podem incluir motoristas e voos gratuitos.

“O setor público oferece estabilidade: você passa no concurso e tem um emprego para o resto davida”, disse Guilherme Alves, 21, que estava estudando o entorpecedor juridiquês em Brasília em umdas centenas de cursinhos dedicados a preparar alunos para passar em um concurso estatal. “É ótimo”.

O salário médio dos secretários no governo central do Brasil é 49 por cento maior, em relação ao PIBper capita, que o do México e quase o dobro que o dos países que pertencem à Organização para aCooperação e o Desenvolvimento Econômico. O funcionário típico do governo brasileiro ganhou 42por cento a mais no ano passado do que o trabalhador comum.

Fortes distorções

Um motivo de os empregos governamentais serem “banhados a ouro” foi um programa criado hácinquenta anos para convencer brasileiros qualificados a abandonarem as praias do Rio de Janeiro e semudarem para o árido cerrado da nova capital, Brasília. Isso exacerbou fortes distorções na economia:os brasileiros pagam impostos surpreendentemente altos para financiar um setor estatal inchado queoferece serviços públicos deficitários. O setor privado também ficou sufocado.

“Nós não conseguimos pagar o aparato estatal que construímos”, disse Gil Castello Branco,secretário­geral da Associação Contas Abertas, que supervisiona os gastos do governo. Depois que orebaixamento da nota de crédito do Brasil foi anunciado, noticiou­se que o governo está pensando emcongelar o salário dos servidores públicos.

Por enquanto, juízes e parlamentares podem chegar a ganhar 30 vezes o salário médio do setorprivado, além de regalias.

O Brasil emprega menos servidores públicos per capita do que os EUA, a França ou a Alemanha. Mastem muito menos recursos, de maneira que menos dinheiro vai para os serviços públicos, disse DavidFleischer, professor emérito de Ciência Política da Universidade de Brasília.

Pensão vitalícia

No ano passado, o governo federal gastou 20,6 por cento do PIB em salários, benefícios e despesasadministrativas, restando apenas 1 por cento para investimentos, de acordo com a Associação ContasAbertas.

Atrair os brasileiros capacitados para a nova capital com salários altos também provocou outros

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desequilíbrios. Uma pensão para agricultores, que contribuem minimamente à previdência social, foiinstaurada em meados dos anos 1980. As filhas solteiras de militares falecidos recebem uma pensãovitalícia, então muitas convivem com seus parceiros sem se casar, disse Fleischer.

Tudo isso distorceu fortemente as condições do setor privado, de acordo com José Pastore, ex­professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo eex­membro do Conselho de Administração da Organização Internacional do Trabalho.

“As prioridades estão desequilibradas”, disse Pastore em uma entrevista por telefone. “O setor privadoemprega o grosso da força de trabalho e não tem os cursos nem os incentivos oferecidos aosfuncionários públicos”.

Direito indiscutível

Na tentativa de reduzir o déficit orçamentário, de mais de 8 por cento do PIB, no início deste ano ogoverno cortou alguns benefícios de trabalhadores e pensionistas. Em agosto, a presidente DilmaRousseff prometeu acabar com 10 dos 39 ministérios existentes.

Mas essas medidas provavelmente não farão muita diferença. “O impacto fiscal não é muito grande, émais simbólico”, disse Raul Velloso, da ARD Consultores Associados, uma firma de consultoriaempresarial com sede em Brasília.

Embora o governo tenha conseguido estipular um teto para o total de gastos da folha de pagamentodos servidores públicos, muitos dos benefícios trabalhistas e despesas obrigatórias fazem parte da lei,o que deixa pouco espaço de manobra, disse Dyogo Oliveira, secretário executivo do Ministério doPlanejamento, Orçamento e Gestão, em uma entrevista. Implementar padrões para medir odesempenho também é difícil, disse ele.

“O direito à estabilidade no trabalho está na Constituição, é indiscutível”, disse ele.

Por Raymond Colitt