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EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA VARA CRIMINAL DA
COMARCA DE ALEGRETE/RS
PROCESSO-CRIME Nº: 002/2.12.0002568-1
PABLO LIMA RIOS, já qualificado nos autos do processo em
epígrafe, vem, por meio da Defensora Pública signatária,
respeitosamente, perante Vossa Excelência, apresentar
CONTRARRAZÕES DE APELAÇÃO
com fundamento no art. 600 do Código de Processo Penal, requerendo
o recebimento e remessa ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do
Rio Grande do Sul.
Nesses termos, pede-se deferimento.
Alegrete (RS), 06 de outubro de 2015.
MÔNICA ZIMMER
Defensora Pública
1/9Av. Tiarajú, nº 1002, 2º andarIbirapuitã, Alegrete-RSBrasil – CEP. 97546550 Telefone: (0xx55) 3421-2521
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
PROCESSO-CRIME Nº: 002/2.12.0002568-1
COMARCA DE ORIGEM: ALEGRETE
APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO
APELADO: PABLO LIMA RIOS
CONTRARRAZÕES DE APELAÇÃO
COLENDA CÂMARA,
EMÉRITOS JULGADORES,
1. RELATÓRIO
O Ministério Público denunciou PABLO LIMA RIOS como incurso
nas sanções do artigo 155, caput, do Código Penal.
A denúncia foi recebida em 10 de abril de 2013 (folha 76).
O acusado foi citado (folha 82) e apresentou resposta à acusação
(folha 83).
Durante a instrução, foram inquiridas três testemunhas (mídias de
folhas 95 e 117) e foi decretada a revelia do acusado (folha 114).
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Encerrada a instrução, o Ministério Público (folhas 120/122) e a
Defesa (folhas 123/127) apresentaram alegações finais.
Sobreveio sentença que julgou improcedente a denúncia para absolver
o acusado com fundamento no artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal (folhas
128/130).
Inconformado, o Ministério Público apelou (folha 131).
Apresentadas as razões de apelação (folhas 133/136), vieram os autos
para contrarrazões.
2. FUNDAMENTAÇÃO
O Ministério Público apresenta a presente apelação buscando a
reforma da sentença sob a alegação de que o processo reuniria provas suficientes para a
condenação do acusado.
Sem razão, contudo, o agente ministerial.
Como bem reconheceu o juiz de primeira instância em sentença, o fato
imputado ao acusado é atípico por nítida incidência do princípio da insignificância ou bagatela.
Irretocável o entendimento do magistrado quando afirma que
“Em primeiro lugar, devo assinalar que a res furtivae fora avaliada em tão somente R$ 35,20 (fl. 09).
Em segundo lugar, devo acrescentar que, às avessas do princípio da economia processual, a despesa já efetivada com o presente feito exacerba, e em muito, o valor da coisa furtada. Observa-se que houve a movimentação de todo o aparato do Poder Judiciário, do Ministério Público, da Defensoria Pública, da Brigada Militar, da Polícia Civil, sem se falar da realização de três audiências, uma delas frustrada, inclusive.
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Em terceiro ponto, não se pode deixar de gizar a curiosidade e dubiedade que se abstrai do contexto probatório existente nos autos, uma vez que a testemunha TIMÓTEO JEREMIAS CAPPA BRAVO, policial militar que estava em horário de folga efetuando compras no local dos fatos, AFIRMOU EXPRESSAMENTE EM JUÍZO QUE NÃO VIU O ACUSADO SAIR DO MERCADO, SEQUER, COM QUALQUER MERCADORIA OU OBJETO NAS MÃOS. Tampouco disse ter visto o acusado executando o crime. Contudo, ainda assim, afirmou ter abordado o acusado a três quadras de distância do mercado, mesmo estando à paisana e de folga, sem quaisquer suspeitas, porquanto era “conhecido” da BM.
E, em que pese o douto entendimento da colega que recebeu a peça acusatória, tenho que sequer era caso de ter sido recebida a denúncia, por flagrante crime bagatelar já à época da denúncia.
Nesse ponto acrescento ainda que sequer a suposta reiteração no delito do art. 155 do CP seria capaz de afastar o delito de bagatela, por vez que o acusado não possui nenhuma condenação anterior (sequer provisória).”
Nesse sentido não merece prosperar a pretensão ministerial, pelos
motivos a seguir:
a) Da incidência do princípio da insignificância
Consta na denúncia que o acusado teria subtraído, para si, quatro
frascos de desodorante, avaliados indiretamente em R$ 35,20 (trinta e cinco reais e vinte
centavos).
Considerando o parco valor do bem, a ausência de lesão ao
patrimônio do estabelecimento comercial e que os bens restaram restituídos, imperativa e
correta a aplicação do princípio da insignificância a afastar a tipicidade objetiva da conduta.
Com efeito, o Direito Penal não pode incidir em qualquer espécie de
lesão aos bens jurídicos. Pelo contrário, esta lesão deve ser de tal magnitude que justifique a
incidência deste ramo do direito, pois como é a ultima ratio, sua intervenção somente está
justificada diante de lesões graves ao bem jurídico tutelado pela norma.
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Zaffaroni, nesta direção, assevera que “as afetações de bens jurídicos
exigidas pela tipicidade penal requeriam sempre alguma entidade,
isto é, alguma gravidade, posto que nem toda afetação mínima do bem
jurídico era capaz de configurar a afetação requerida pela tipicidade
penal”1.
No mesmo sentido, Nilo Batista, citando Muñoz Conde, afirma que o
Direito Penal somente “deve intervir nos casos de ataques muito graves aos bens jurídicos mais
importantes, e as perturbações mais leves da ordem jurídica são objetos de outros ramos do
direito”2.
Definitiva, também, a lição do Des. Amilton Bueno de Carvalho, aqui
novamente invocado, em diversos julgados (v.g., apelação-crime n.º 70046394631, j.
19/01/2012):
Não há justificativa para a movimentação de uma máquina cara, cansativa, abarrotada e cruel, como o Judiciário. A banalização do litígio – leia-se, atuação sem maior interesse social – o torna moroso e desacreditado, pois situações que realmente interessam ficam em segundo plano ou concorrem com as inúteis, o que inviabiliza a realização do papel transformador atribuído ao Poder Judiciário no Estado Democrático de Direito.
Por outro lado, à aplicação do princípio da insignificância só interessam o desvalor do resultado e o desvalor da conduta (ver: GOMES, Luiz Flávio. Critérios determinantes do princípio da insignificância. In: www.ultimainstancia.com.br).
Portanto, ausente lesividade, resta afastada a tipicidade objetiva da conduta.
Em suma, a ausência de lesão ao bem jurídico tutelado (no caso, ao
1 ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Manual de Direito Penal Brasileiro. São Paulo: RT, 2004, p. 534.
2 BATISTA, Nilo. Introdução Crítica ao Direito Penal Brasileiro. Rio de Janeiro: Revan, 2007, p. 85.5/9Av. Tiarajú, nº 1002, 2º andarIbirapuitã, Alegrete-RSBrasil – CEP. 97546550 Telefone: (0xx55) 3421-2521
patrimônio), tendo em vista que o objeto foi devidamente restituído conduz inevitavelmente a
um decreto absolutório.
Nesse sentido:
HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSUAL PENAL. TENTATIVA DE FURTO. CRIME IMPOSSÍVEL, FACE AO SISTEMA DE VIGILÂNCIA DO ESTABELECIMENTO COMERCIAL. INOCORRÊNCIA. MERCADORIAS DE VALOR INEXPRESSIVO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICABILIDADE. 1. O pleito de absolvição fundado em que o sistema de vigilância do estabelecimento comercial tornou impossível a subtração da coisa não pode vingar. As pacientes poderiam, em tese, lograr êxito no intento delituoso. Daí que o meio para a consecução do crime não era absolutamente ineficaz. 2. A aplicação do princípio da insignificância há de ser criteriosa e casuística, tendo-se em conta critérios objetivos. 3. A tentativa de subtração de mercadorias cujos valores são inexpressivos não justifica a persecução penal. O Direito Penal, considerada a intervenção mínima do Estado, não deve ser acionado para reprimir condutas que não causem lesões significativas aos bens juridicamente tutelados. 4. Aplicação do princípio da insignificância justificada no caso. Ordem deferida a fim de declarar a atipicidade da conduta imputada às pacientes, por aplicação do princípio da insignificância”.(STF HC 97129, Relator(a): Min. EROS GRAU, Segunda Turma, julgado em 11/05/2010, DJe-100 DIVULG 02-06-2010 PUBLIC 04-06-2010 EMENT VOL-02404-02 PP-00300)
Sendo assim, deve ser completamente rechaçada a pretensão
ministerial, mantendo-se intacta a sentença absolutória ora recorrida, por força do princípio da
insignificância, com base no art. 386, inciso III, do Código de Processo Penal.
b) Da insuficiência probatória
Trata-se de ação penal movida pelo Ministério Público em face de
Pablo Lima Rios em que é imputada a este a prática de delito de furto simples.
Narra a denúncia que o acusado, teria, subtraído, para si, quatro
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frascos de desodorantes da vítima estabelecimento comercial Supermercado Nacional.
Inicialmente, faz-se imperativo recordar que, na esteira do art. 155 do
Código de Processo Penal - O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova
produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos
elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não
repetíveis e antecipadas -, somente a prova oral judicial pode dar azo a uma condenação.
Sobre este aspecto, Nucci (NUCCI, Guilherme de Souza. Código de
Processo Penal Comentado. São Paulo: RT, 2009, p. 346) afirma que cabe ao magistrado
formarsua convicção livremente, analisando o conjunto probatório, desde que o faça
motivadamente e calcado nos parâmetros constitucionais acerca dos limites ideais para a
produção da prova. Esses limites são traçados pelo princípio do contraditório e da ampla
defesa, num primeiro momento, vale dizer, as partes têm o direito de participar da colheita da
prova, influindo na sua formação, dentro de critérios regrados, e o réu tem o direito de se
defender da maneira mais ampla possível, tomando ciência, por seu advogado, das provas
coletadas e podendo influir para a produção de outras em seu benefício. (…) Por isso,
estabelece-se, como regra, dever o julgador basear a formação de sua convicção
apreciando livremente a prova produzida em juízo, sob o crivo do contraditório.
Não é diferente o pensamento de Pacelli, ao sustentar que
“atualmente, com a exigência do contraditório e da ampla defesa, as provas produzidas na fase
pré-processual destinam-se ao convencimento do Ministério Público, e não do juiz”
(OLIVEIRA, Eugenio Pacelli. Curso de Processo Penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2012, p.
415).
Destarte, apenas a prova oral coletada em juízo pode ser, no bojo de
um processo penal que se pretenda democrático, valorada, sob pena de dar valia aos elementos
coletados sem as garantias constitucionais. É em juízo, perante autoridade equidistante, no
espaço público e com a observância de todos os princípios constitucionais, em especial o
contraditório e a ampla defesa, que se tem a formação de uma prova testemunhal válida à luz 7/9Av. Tiarajú, nº 1002, 2º andarIbirapuitã, Alegrete-RSBrasil – CEP. 97546550 Telefone: (0xx55) 3421-2521
dos ditames da Constituição Federal.
O caderno probatório mostra-se insuficiente, limitado
exclusivamente às declarações do policial militar Timóteo Jeremias Cappa Bravo,
inexistindo testemunhas presenciais acerca do delito.
A testemunha Timóteo Jeremias Cappa Bravo, policial militar,
declarou que no dia do fato descrito na denúncia, estava fora do horário de trabalho e se
encontrava no interior do Supermercado Nacional fazendo compras, quando percebeu que
o acusado entrou no estabelecimento. Disse que o acusado saiu do mercado ao mesmo
tempo que a testemunha, que aparentemente não estava com nada em mãos. Contou que o
acusado já é conhecido dos policiais, e que três quadras do mercado o policial realizou a
abordagem e encontrou junto com Pablo quatro frascos de desodorante, os quais o acusado
disse ter furtado do mercado. Aduziu que chamou uma viatura e o acusado foi levado até a
delegacia. Disse que acusado é usuário de crack.
A testemunha Carmen Cristiane Oliveira Jaques, funcionária do
Supermercado Nacional, declarou que o Sargento Bravo teria abordado Pablo três quadras
do estabelecimento, e logo após teria levado os produtos apreendidos com o acusado para
verificar se tais produtos pertenciam ao mercado. Disse que os produtos constavam como
cadastrados do estabelecimento. Contou que não viu o acusado no Supermercado e que
também não o viu de posse dos produtos furtados.
A testemunha Cleber Roberto Veiga Machado, policial militar
declarou que não se recorda deste fato especificamente, pois esse tipo de situação ocorre
com frequência no Supermercado Nacional. Disse que conhece o acusado, devido a outras
ocorrências.
Certo que a palavra do policial não pode ser tida como absoluta –
desde muito superado o sistema de provas tarifadas – na medida em que tende a justificar toda
sua atuação – ou seja, procura legitimar sua atuação.
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Ademais, cabe ressaltar que a única testemunha que veio aos
autos apontar o acusado como autor do delito, Timoteo Jeremias Cappa Bravo, policial
militar, não presenciou o momento da subtração dos objetos, apenas acompanhou a
entrada e saída do acusado do estabelecimento comercial.
Imprestável, portanto, a prova oral produzida no feito, na medida em
que as palavras do policial não revela a consistência necessária para embasar um decreto
condenatório. Não é demais lembrar, nesse sentido, que a dúvida acerca da materialidade
ou da autoria delitiva milita em favor do acusado, resultando em sua absolvição.
Então, não havendo qualquer outro elemento probatório, nem mesmo
justificativa para dar mais valia à versão do miliciano, é que a dúvida se faz presente. E como
condenação não pode estar alicerçada na dúvida, a absolvição impõe-se.
Sendo assim, deve ser completamente rechaçada a pretensão
ministerial, mantendo-se intacta a sentença absolutória ora recorrida.
3. PEDIDO
Diante do exposto, requer a Defesa o conhecimento e o improvimento
do recurso ministerial, mantendo-se intacta a decisão recorrida.
Alegrete (RS), 07 de outubro de 2015.
MÔNICA ZIMMER
Defensora Pública
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