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Informativo 638-STJ (19/12/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 1 Informativo comentado: Informativo 638-STJ Márcio André Lopes Cavalcante ÍNDICE DIREITO ADMINISTRATIVO ANISTIA POLÍTICA Súmula 624-STJ. DIREITO AMBIENTAL OBRIGAÇÕES AMBIENTAIS Súmula 623-STJ RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANO AMBIENTAL Súmula 629-STJ. DIREITO CIVIL RESPONSABILIDADE CIVIL Atraso de voo internacional não gera dano moral in re ipsa. CONTRATO DE SEGURO Súmula 620-STJ. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA O credor fiduciário somente responde pelas dívidas condominiais após a imissão na posse. ALIMENTOS Em ação de alimentos, quando se trata de credor com plena capacidade processual, cabe exclusivamente a ele provocar a integração posterior no polo passivo. Súmula 621-STJ. DIREITO DO CONSUMIDOR PLANO DE SAÚDE É legítima a recusa do plano de saúde em custear medicação importada não nacionalizada, ou seja, sem registro vigente na ANVISA. DIREITO EMPRESARIAL PROTESTO Credor que havia protestado o título tem o dever de fornecer carta de anuência para cancelamento do protesto, mas para isso precisa haver um pedido do devedor. DIREITO PROCESSUAL CIVIL TÉCNICA DE AMPLIAÇÃO DO COLEGIADO Os novos julgadores convocados na forma do art. 942 do CPC/2015 poderão analisar todo o conteúdo das razões recursais, não se limitando à matéria sobre a qual houve divergência.

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Márcio André Lopes Cavalcante

ÍNDICE DIREITO ADMINISTRATIVO

ANISTIA POLÍTICA Súmula 624-STJ. DIREITO AMBIENTAL

OBRIGAÇÕES AMBIENTAIS Súmula 623-STJ RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANO AMBIENTAL Súmula 629-STJ.

DIREITO CIVIL

RESPONSABILIDADE CIVIL Atraso de voo internacional não gera dano moral in re ipsa. CONTRATO DE SEGURO Súmula 620-STJ. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA O credor fiduciário somente responde pelas dívidas condominiais após a imissão na posse. ALIMENTOS Em ação de alimentos, quando se trata de credor com plena capacidade processual, cabe exclusivamente a ele

provocar a integração posterior no polo passivo. Súmula 621-STJ.

DIREITO DO CONSUMIDOR

PLANO DE SAÚDE É legítima a recusa do plano de saúde em custear medicação importada não nacionalizada, ou seja, sem registro

vigente na ANVISA.

DIREITO EMPRESARIAL

PROTESTO Credor que havia protestado o título tem o dever de fornecer carta de anuência para cancelamento do protesto,

mas para isso precisa haver um pedido do devedor.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

TÉCNICA DE AMPLIAÇÃO DO COLEGIADO Os novos julgadores convocados na forma do art. 942 do CPC/2015 poderão analisar todo o conteúdo das razões

recursais, não se limitando à matéria sobre a qual houve divergência.

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RECURSO ESPECIAL Necessidade de impugnação específica de todos os fundamentos da decisão proferida pelo Tribunal de origem que

inadmite o recurso especial. EXECUÇÃO O agravo de instrumento não pode ser utilizado como meio de impugnação de toda e qualquer decisão interlocutória

proferida no processo de execução. MANDADO DE SEGURANÇA Súmula 628-STJ.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

SENTENÇA É nula a sentença proferida de forma oral e degravada parcialmente sem o registro das razões de decidir. TRIBUNAL DO JÚRI É possível a pronúncia do acusado baseada exclusivamente em elementos informativos obtidos na fase inquisitorial?

DIREITO TRIBUTÁRIO

PRESCRIÇÃO Parcelamento de ofício não interfere no curso do prazo prescricional IPTU Termo inicial do prazo prescricional em caso de IPTU CRÉDITO TRIBUTÁRIO Súmula 622-STJ. COMPENSAÇÃO TRIBUTÁRIA Súmula 625-STJ. IMPOSTO DE RENDA Súmula 627-STJ. IPI Não deve incidir IPI sobre a venda de produtos, na hipótese de roubo ou furto da mercadoria antes da sua entrega

ao comprador. ISS Incide ISS sobre serviço de proteção ao crédito oferecido por sindicato ou CDL aos seus associados? IPTU Súmula 626-STJ.

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DIREITO ADMINISTRATIVO

ANISTIA POLÍTICA Súmula 624-STJ

Súmula 624-STJ: É possível cumular a indenização do dano moral com a reparação econômica da Lei nº 10.559/2002 (Lei da Anistia Política).

STJ. 1ª Seção. Aprovada em 12/12/2018, DJe 17/12/2018.

Imagine a seguinte situação hipotética: João foi vítima de intensa perseguição política praticada pelo governo federal durante a época da ditadura militar instalada no Brasil em 1964. O art. 8º do ADCT concede anistia política a pessoas que foram prejudicadas por perseguições decorrentes de motivação política no período de 18/09/1946 até a data de promulgação da CF/88. Há previsão também de que o anistiado receba uma reparação de natureza econômica, a ser paga pela União, em alguns casos nos quais fique demonstrado que ele sofreu prejuízos em sua atividade laboral. A Lei nº 10.559/2002 regulamentou o art. 8º do ADCT e a concessão dessa reparação econômica para os anistiados. Veja:

ADCT Art. 8º. É concedida anistia aos que, no período de 18 de setembro de 1946 até a data da promulgação da Constituição, foram atingidos, em decorrência de motivação exclusivamente política, por atos de exceção, institucionais ou complementares, aos que foram abrangidos pelo Decreto Legislativo nº 18, de 15 de dezembro de 1961, e aos atingidos pelo Decreto-Lei nº 864, de 12 de setembro de 1969, asseguradas as promoções, na inatividade, ao cargo, emprego, posto ou graduação a que teriam direito se estivessem em serviço ativo, obedecidos os prazos de permanência em atividade previstos nas leis e regulamentos vigentes, respeitadas as características e peculiaridades das carreiras dos servidores públicos civis e militares e observados os respectivos regimes jurídicos.

Lei nº 10.559/2002 Art. 1º O Regime do Anistiado Político compreende os seguintes direitos: I - declaração da condição de anistiado político; II - reparação econômica, de caráter indenizatório, em prestação única ou em prestação mensal, permanente e continuada, asseguradas a readmissão ou a promoção na inatividade, nas condições estabelecidas no caput e nos §§ 1º e 5º do art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias; (...) Art. 3º A reparação econômica de que trata o inciso II do art. 1º desta Lei, nas condições estabelecidas no caput do art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, correrá à conta do Tesouro Nacional. (...) Art. 4º A reparação econômica em prestação única consistirá no pagamento de trinta salários mínimos por ano de punição e será devida aos anistiados políticos que não puderem comprovar vínculos com a atividade laboral. (...) Art. 5º A reparação econômica em prestação mensal, permanente e continuada, nos termos do art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, será assegurada aos anistiados políticos que comprovarem vínculos com a atividade laboral, à exceção dos que optarem por receber em prestação única.

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(...) Art. 6º O valor da prestação mensal, permanente e continuada, será igual ao da remuneração que o anistiado político receberia se na ativa estivesse, (...)

João requereu e recebeu, administrativamente, a reparação econômica prevista na Lei nº 10.559/2002 (Lei de Anistia). Ocorre que, depois disso, já em 2014, ele ajuizou ação de compensação por danos morais contra a União pedindo indenização extrapatrimonial pelos sofrimentos que passou neste período. A pretensão em tela está prescrita? NÃO.

As ações de indenização por danos morais decorrentes de perseguição, tortura e prisão, por motivos políticos, durante o regime militar, são imprescritíveis. Para esses casos, não se aplica o prazo prescricional de 5 anos previsto no art. 1º do Decreto 20.910/1932. STJ. 2ª Turma. REsp 1.374.376-CE, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 25/6/2013 (Info 523).

O STJ concluiu que tais demandas são imprescritíveis porque se referem a um período (regime militar) em que a ordem jurídica foi desconsiderada, com legislação de exceção, tendo havido, sem dúvida, incontáveis abusos e violações dos direitos fundamentais, mormente do direito à dignidade da pessoa humana (AgRg no Ag 1391062/RS, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 09/08/2011). É possível que o anistiado político pleiteie judicialmente indenização por danos morais mesmo já tendo recebido administrativamente a reparação econômica da Lei nº 10.559/2002? SIM. É possível cumular a indenização do dano moral com a reparação econômica da Lei nº 10.559/2002 (Lei da Anistia Política). Assim, o anistiado político que obteve, na via administrativa, a reparação econômica prevista na Lei nº 10.559/2002 não está impedido de pleitear, na esfera judicial, indenização por danos morais pelo mesmo episódio político. A Lei nº 10.559/2002, em seu art. 16, prevê o seguinte:

Art. 16. Os direitos expressos nesta Lei não excluem os conferidos por outras normas legais ou constitucionais, vedada a acumulação de quaisquer pagamentos ou benefícios ou indenização com o mesmo fundamento, facultando-se a opção mais favorável.

Esse dispositivo pode dar a impressão de que seria proibida a acumulação da reparação econômica com a indenização por danos morais. Contudo, não foi esta a interpretação dada pelo STJ. Segundo entendeu o Tribunal, o art. 16 é um comando dirigido, antes e unicamente, à Administração Pública, e não à jurisdição. Em outras palavras, esse dispositivo proíbe que o Poder Público pague, administrativamente, a reparação econômica cumulada com outros pagamentos, benefícios ou indenização. Além disso, a reparação econômica prevista na Lei nº 10.559/2002 não tem por objetivo indenizar danos morais. O art. 8º do ADCT determina que seja paga reparação econômica para aquelas pessoas que sofreram prejuízos na sua esfera profissional e, por consequência, patrimonial. A Lei nº 10.559/2002, ao regulamentar o art. 8º do ADCT, restringiu-se a estipular os direitos profissionais do anistiado político e suas repercussões econômicas. Analisando os arts. 4º e 5º da Lei, fica ainda mais claro que essa reparação econômica tem natureza patrimonial e se destina a compensar o anistiado pelo fato de ele não mais ter podido exercer suas atividades laborais. Desse modo, o recebimento da reparação econômica de que trata a Lei nº 10.559/2002 não exclui, por si só, o direito de o anistiado buscar na via judicial, em ação autônoma e distinta, a reparação dos danos

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morais que tenha sofrido em decorrência da mesma perseguição política geradora da anterior reparação administrativa (art. 5º, V e X, da CF/88), pois distintos se revelam os fundamentos que amparam cada uma dessas situações.

DIREITO AMBIENTAL

OBRIGAÇÕES AMBIENTAIS Súmula 623-STJ

Súmula 623-STJ: As obrigações ambientais possuem natureza propter rem, sendo admissível cobrá-las do proprietário ou possuidor atual e/ou dos anteriores, à escolha do credor.

STJ. 1ª Seção. Aprovada em 12/12/2018, DJe 17/12/2018.

Imagine a seguinte situação hipotética: João possuía uma fazenda e parte dela, estava em área de preservação permanente. Em 2015, João fez um desmatamento em sua propriedade e parte das árvores derrubadas estavam na área de preservação permanente. Vale ressaltar que isso foi feito sem qualquer autorização das autoridades ambientais. Em 2016, João vendeu o imóvel a Pedro. Em 2017, foi constado o desmatamento ilegal. Diante disso, o Ministério Público ajuizou ação civil pública pedindo que Pedro seja condenado a fazer a recomposição florestal. Pedro demonstrou, por meio de fotos e perícia que, quando ele comprou a fazenda, a situação já estava daquele jeito e o desmatamento já havia sido realizado. Com isso, ele ficará desobrigado de reparar os danos ambientais? NÃO. As obrigações ambientais (ex: obrigação de reparar os danos ambientais) são propter rem. Isso significa que as obrigações ambientais aderem ao título de domínio ou posse e se transferem ao atual proprietário ou possuidor, ainda que eles não tenham sido os responsáveis pela degradação ambiental. Vale ressaltar também que não interessa discutir a boa ou má-fé do adquirente, considerando que não se está no âmbito da responsabilidade subjetiva, baseada em culpa. Aplica-se também para multas Em 2016, a empresa “X” comprou um hotel da empresa “Y”. Em 2017, houve uma fiscalização do IBAMA no local e se constatou que uma lagoa foi aterrada irregularmente, causando degradação ambiental. A empresa “X” demonstrou que esse aterro foi realizado em 2013, ou seja, antes que ela tivesse adquirido o imóvel. Mesmo assim, a empresa “X” poderá ser autuada e receber uma multa por infração ambiental. Nesse sentido:

(...) Independentemente de não se poder constatar quem foi o autor do dano ambiental, sua reparação adere à propriedade como obrigatio propter rem, o que legitima o IBAMA a responsabilizar o atual proprietário pela conduta dos anteriores, no esteio da jurisprudência desta Corte. (...) STJ. 1ª Turma. AgInt no AREsp 268.217/PE, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 30/11/2017.

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Escolha do credor Vale ressaltar que o mais comum é que a obrigação ambiental seja exigida do possuidor ou proprietário atual em virtude da facilidade de localização e maior efetividade em caso de execução. No entanto, existe uma solidariedade entre o atual e os anteriores, de forma que o credor pode escolher aqueles que serão acionados.

RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANO AMBIENTAL Súmula 629-STJ

Súmula 629-STJ: Quanto ao dano ambiental, é admitida a condenação do réu à obrigação de fazer ou à de não fazer cumulada com a de indenizar.

STJ. 1ª Seção. Aprovada em 12/12/2018, DJe 17/12/2018.

Imagine que determinada empresa causou grave dano ambiental. O Ministério Público (ou outro legitimado) poderá ajuizar ação civil pública pedindo que essa empresa seja condenada a recompor o meio ambiente (obrigação de fazer)? SIM, sem nenhuma dúvida.

Além disso, é possível que, na ACP, seja pedida a condenação da empresa ao pagamento de danos morais em favor da coletividade (obrigação de indenizar)? Em outras palavras, em caso de dano ambiental, é cabível a cumulação da obrigação de fazer (ou não fazer) com a obrigação de indenizar? SIM. É perfeitamente possível que o poluidor seja condenado, cumulativamente, a recompor o meio ambiente e a pagar indenização pelos danos causados. Isso porque vigora, em nosso sistema jurídico, o princípio da reparação integral do dano ambiental, de modo que o infrator deverá ser responsabilizado por todos os efeitos decorrentes da conduta lesiva, permitindo-se que haja a cumulação de obrigações de fazer, de não fazer e de indenizar. Lei nº 7.347/85 (Lei da ACP) O art. 3º da Lei nº 7.347/85 afirma que a ACP “poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer”. Para o STJ, essa conjunção “ou” – contida no citado artigo, tem um sentido de adição (soma), não representando uma alternativa excludente. Em outras palavras, será possível a condenação em dinheiro e também ao cumprimento de obrigação de fazer/não fazer. Veja precedente nesse sentido:

(...) Segundo a jurisprudência do STJ, a logicidade hermenêutica do art. 3º da Lei 7.347/1985 permite a cumulação das condenações em obrigações de fazer ou não fazer e indenização pecuniária em sede de ação civil pública, a fim de possibilitar a concreta e cabal reparação do dano ambiental pretérito, já consumado. Microssistema de tutela coletiva. (...) STJ. 2ª Turma. REsp 1269494/MG, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 24/09/2013.

Importante esclarecer que não há “bis in idem” neste caso, considerando que as condenações possuem finalidades e naturezas diferentes. Vale ressaltar, por fim, que, apesar dessa possibilidade existir em tese, a condenação, no caso concreto, e o seu eventual valor dependerão da situação:

O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento consolidado segundo o qual é possível a cumulação de obrigações de fazer, de não fazer e de indenizar nos casos de lesão ao meio ambiente, contudo, a necessidade do cumprimento de obrigação de pagar quantia deve ser aferida em cada situação analisada. STJ. 1ª Turma. AgInt no REsp 1538727/SC, Rel. Min. Regina Helena Costa, julgado em 07/08/2018.

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DIREITO CIVIL

RESPONSABILIDADE CIVIL Atraso de voo internacional não gera dano moral in re ipsa

Importante!!!

Na hipótese de atraso de voo, não se admite a configuração do dano moral in re ipsa.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.584.465-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/11/2018 (Info 638).

Imagine a seguinte situação hipotética: João tinha um voo de Belo Horizonte (MG) para Paris (França). O voo atrasou três horas, fazendo com que João chegasse na capital francesa após o horário inicialmente previsto. Ele ingressou, então, com ação de indenização por danos morais. O juiz e o TJ negaram o pedido afirmando que houve um simples aborrecimento e que não foi demonstrado qualquer situação que gerasse a indenização extrapatrimonial. João interpôs recurso especial ao STJ sustentado que o atraso de voo configura dano moral in ire ipsa. Logo, ele precisaria provar apenas o ato ilícito praticado. O STJ concordou com a tese de João? NÃO.

Na hipótese de atraso de voo, não se admite a configuração do dano moral in re ipsa. STJ. 3ª Turma. REsp 1.584.465-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/11/2018 (Info 638).

Dano moral in re ipsa Em algumas situações, a doutrina e a jurisprudência afirmam que a demonstração do dano moral não é necessária, bastando se demonstrar que houve a prática do ato. Nesse caso, fala-se em damnun in re ipsa, também conhecido como dano moral in re ipsa. Assim, dano moral in re ipsa, também chamado de dano moral presumido, é aquele que se origina de uma presunção absoluta, dispensando, portanto, prova em contrário. No dano moral in re ipsa, o dano existe no próprio fato violador. Não cabe ao lesado, pois, fazer demonstração de que sofreu, realmente, o dano moral alegado. O exemplo típico é o da mãe que perdeu o filho assassinado. Não se exige que a mãe comprove que sofreu com a morte do filho. É um fato sobre o qual há uma espécie de consenso no sentido de que gera danos de ordem moral. Interpretação não pode ser elastecida A caracterização do dano moral in re ipsa não pode ser elastecida a ponto de afastar a necessidade de sua efetiva demonstração, em qualquer situação. Isso porque ao proceder assim, se estaria a percorrer o caminho diametralmente oposto ao sentido da despatrimonialização do direito civil, transformando em caráter meramente patrimonial os danos extrapatrimoniais e fomentando a já bastante conhecida “indústria do dano moral”. Mero atraso do voo não gera dano moral in re ipsa Considerar que o atraso do voo gera dano moral presumido, seria dizer que, obrigatoriamente, o passageiro sofreu um abalo que maculou a sua honra e dignidade pelo fato de a aeronave não ter partido na exata hora constante do bilhete. Não há, portanto, razoabilidade nesta conclusão.

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Atraso do voo pode ou não gerar dano moral a depender das circunstâncias do caso concreto As circunstâncias que envolvem o caso concreto servirão para que o juiz analise se houve ou não o dano moral. Exemplos de particularidades que devem ser analisadas: a) a real duração do atraso; b) se a companhia aérea ofertou alternativas para melhor atender aos passageiros; c) se foram prestadas a tempo e modo, informações claras e precisas por parte da companhia aérea a fim de amenizar os desconfortos inerentes à ocasião; d) se foi oferecido suporte material (alimentação, hospedagem, etc.) quando o atraso for considerável; e) se o passageiro, devido ao atraso da aeronave, acabou por perder compromisso inadiável no destino.

CONTRATO DE SEGURO Súmula 620-STJ

Súmula 620-STJ: A embriaguez do segurado não exime a seguradora do pagamento da indenização prevista em contrato de seguro de vida.

STJ. 2ª Seção. Aprovada em 12/12/2018, DJe 17/12/2018.

Imagine a seguinte situação hipotética: João fez um seguro de vida, por meio do qual paga R$ 50 por mês (prêmio) e, se vier a falecer na vigência do contrato, a seguradora terá que pagar R$ 500 mil reais (indenização) ao seu filho (beneficiário). Determinado dia, João, após sair de uma festa completamente embriagado, perdeu o controle sobre o carro e o colidiu contra um poste, falecendo no local. A seguradora se negou a pagar o valor da apólice, ao argumento de que houve agravamento intencional do risco (embriaguez ao volante). A seguradora afirmou que existe cláusula contratual prevendo a exclusão de cobertura nestes casos. Confira: Cláusula 2.3.1 – Há perda do direito à indenização no caso de morte ocorrida em acidente cuja consequência direta ou indireta tenha sido decorrente de ingestão, por parte do segurado, de álcool, de drogas, entorpecentes ou substâncias tóxicas. O filho de João questionou judicialmente a validade desta cláusula. Esta cláusula presente no seguro de vida é válida? NÃO.

É vedada a exclusão de cobertura do seguro de vida na hipótese de sinistro ou acidente decorrente de atos praticados pelo segurado em estado de embriaguez. Tal cláusula é abusiva, com base nos arts. 3º, § 2º, e 51, IV, do CDC. STJ. 2ª Seção. EREsp 973.725-SP, Rel. Min. Lázaro Guimarães (Desembargador Convocado Do TRF 5ª Região), julgado em 25/04/2018 (Info 625).

Cláusulas limitativas das avenças securitárias Em tese, é possível que existam cláusulas no contrato de seguro que limitem ou restrinjam o pagamento da indenização. Ex: é válida a cláusula que exclua o pagamento da indenização caso a morte tenha ocorrido por conta de uma doença preexistente que foi omitida pelo segurado no momento da contratação. Vale ressaltar, no entanto, que as cláusulas que limitam a cobertura securitária, para serem válidas, não podem contrariar: • as disposições legais; • a finalidade do contrato.

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A jurisprudência do STJ entende que a cláusula presente no contrato de seguro de vida que exclua a cobertura em caso de morte decorrente de embriaguez é uma cláusula muito restritiva que acaba contrariando a própria finalidade do contrato. Essa é também a posição da Superintendência de Seguros Privados, que editou a Carta Circular SUSEP/DETEC/GAB n° 08/2007 orientando que as seguradoras não incluam cláusulas excluindo a cobertura na hipótese de sinistros ou acidentes decorrentes de atos praticados pelo segurado em estado de insanidade mental, de alcoolismo ou sob efeito de substâncias tóxicas. Situação diferente no caso de seguro de veículos No caso de seguro de veículos, o STJ e a SUSEP entendem que é válida a cláusula contratual que preveja a exclusão da indenização caso os danos ao automóvel tenham sido causados pela embriaguez do segurado. Compare:

No SEGURO DE VIDA (seguro de pessoas) é devida a indenização securitária mesmo que o acidente que vitimou o segurado tenha decorrido de seu estado de embriaguez?

No SEGURO DE AUTOMÓVEL (seguro de bens) celebrado por uma empresa com a seguradora, é devida a indenização securitária se o condutor do veículo estava embriagado?

SIM. É vedada a exclusão de cobertura do seguro de vida na hipótese de sinistro ou acidente decorrente de atos praticados pelo segurado em estado de embriaguez. STJ. 3ª Turma. REsp 1.665.701-RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 9/5/2017 (Info 604). STJ. 2ª Seção. EREsp 973.725-SP, Rel. Min. Lázaro Guimarães (Desembargador Convocado Do TRF 5ª Região), julgado em 25/04/2018 (Info 625).

• Em regra: NÃO. • Exceção: será devido o pagamento da indenização se o segurado conseguir provar que o acidente ocorreria mesmo que o condutor não estivesse embriagado. Não é devida a indenização securitária decorrente de contrato de seguro de automóvel quando o causador do sinistro (condutor do veículo segurado) estiver em estado de embriaguez, salvo se o segurado demonstrar que o infortúnio ocorreria independentemente dessa circunstância. STJ. 3ª Turma. REsp 1.485.717-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 22/11/2016 (Info 594).

ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA O credor fiduciário somente responde pelas dívidas condominiais após a imissão na posse

Importante!!!

O credor fiduciário, no contrato de alienação fiduciária de bem imóvel, tem responsabilidade pelo pagamento das despesas condominiais deixadas pelo devedor fiduciante? NÃO.

• A responsabilidade pelo pagamento das despesas condominiais recai sobre o devedor fiduciante enquanto estiver na posse direta do imóvel.

• O credor fiduciário somente responde pelas dívidas condominiais incidentes sobre o imóvel se consolidar a propriedade para si, tornando-se o possuidor direto do bem.

Assim, a responsabilidade do credor fiduciário pelo pagamento das despesas condominiais dá-se quando da consolidação de sua propriedade plena quanto ao bem dado em garantia, ou seja, quando de sua imissão na posse do imóvel.

É o que prevê o § 8º do art. 27 da Lei nº 9.514/97:

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§ 8º Responde o fiduciante pelo pagamento dos impostos, taxas, contribuições condominiais e quaisquer outros encargos que recaiam ou venham a recair sobre o imóvel, cuja posse tenha sido transferida para o fiduciário, nos termos deste artigo, até a data em que o fiduciário vier a ser imitido na posse.

STJ. 3ª Turma. REsp 1696038/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 28/08/2018.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.731.735-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/11/2018 (Info 638).

Em que consiste a alienação fiduciária? “A alienação fiduciária em garantia é um contrato instrumental em que uma das partes, em confiança, aliena a outra a propriedade de um determinado bem, ficando esta parte (uma instituição financeira, em regra) obrigada a devolver àquela o bem que lhe foi alienado quando verificada a ocorrência de determinado fato.” (RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito Empresarial Esquematizado. São Paulo: Método, 2012, p. 565). Regramento O Código Civil de 2002 trata de forma genérica sobre a propriedade fiduciária em seus arts. 1.361 a 1.368-B. Existem, no entanto, leis específicas que também regem o tema: • alienação fiduciária envolvendo bens imóveis: Lei nº 9.514/97; • alienação fiduciária de bens móveis no âmbito do mercado financeiro e de capitais: Lei nº 4.728/65 e Decreto-Lei nº 911/69. É o caso, por exemplo, de um automóvel comprado por meio de financiamento bancário com garantia de alienação fiduciária. Nas hipóteses em que houver legislação específica, as regras do CC-2002 aplicam-se apenas de forma subsidiária:

Art. 1.368-A. As demais espécies de propriedade fiduciária ou de titularidade fiduciária submetem-se à disciplina específica das respectivas leis especiais, somente se aplicando as disposições deste Código naquilo que não for incompatível com a legislação especial.

Resumindo:

Alienação fiduciária de bens MÓVEIS fungíveis e

infungíveis quando o credor fiduciário for

instituição financeira

Alienação fiduciária de bens MÓVEIS infungíveis

quando o credor fiduciário for pessoa natural ou jurídica

(sem ser banco)

Alienação fiduciária de bens IMÓVEIS

Lei nº 4.728/65 Decreto-Lei nº 911/69

Código Civil de 2002 (arts. 1.361 a 1.368-A)

Lei nº 9.514/97

Alienação fiduciária de bem imóvel Na alienação fiduciária de bem imóvel, alguém (fiduciante) toma dinheiro emprestado de outrem (fiduciário) e, como garantia de que irá pagar a dívida, transfere a propriedade resolúvel de um bem imóvel para o credor, ficando este obrigado a devolver ao devedor o bem que lhe foi alienado quando houver o adimplemento integral do débito. Veja agora o conceito dado pela Lei nº 9.514/97:

Art. 22. A alienação fiduciária regulada por esta Lei é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel.

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Desdobramento da posse O art. 23, parágrafo único, da Lei deixou, ainda, expressamente consignado que, com a constituição da propriedade fiduciária, ocorre o desdobramento da posse. O que significa isso: • o fiduciante (devedor da dívida) será o possuidor direto e • o fiduciário (credor) será o possuidor indireto da coisa imóvel. Essa situação de propriedade resolúvel e de desdobramento da posse resolve-se quando ocorrer: • o pagamento integral da dívida garantida por parte do devedor/fiduciante. Neste caso, o fiduciante se torna o proprietário pleno; ou • se houver o inadimplemento contratual do devedor/fiduciante. Nesta hipótese, haverá a consolidação da propriedade plena no patrimônio do credor fiduciário (o “banco” será o único dono do imóvel). Imagine agora a seguinte situação hipotética: João celebrou com o banco um contrato de alienação fiduciária para a compra de seu imóvel residencial. Significa dizer que João tomou dinheiro emprestado do banco (agente financeiro/mutuante) com o objetivo de adquirir a sua moradia, ficando o imóvel em nome da instituição financeira até que ele pague totalmente a dívida. Dessa forma, João permaneceu morando no imóvel adquirido, mas este ficou registrado em nome do banco, como uma forma de garantia de que o devedor irá pagar o débito, sob pena de perder o bem. A alienação fiduciária de bens imóveis é regida precipuamente pela Lei nº 9.514/97. Personagens No exemplo dado acima, podemos assim definir os personagens envolvidos: João Chamado de mutuário/fiduciante. Mutuário é a pessoa beneficiada por um contrato de mútuo, ou seja, quem toma dinheiro emprestado. Fiduciante é a pessoa que, no contrato de alienação fiduciária, transmite a propriedade do bem ao credor como forma de garantia da dívida. Fiduciante é a parte devedora. Fidúcia é uma palavra de origem latina que significa confiança. Assim, fiduciante é a pessoa que dá o bem em confiança. Banco Chamado de mutuante/fiduciário. Mutuante é a pessoa que empresta dinheiro em um contrato de mútuo. Fiduciário é a pessoa que, no contrato de alienação fiduciária, recebe a propriedade do bem do devedor como forma de garantia da dívida. É a parte credora. Inadimplência João comprometeu-se a pagar a dívida em 180 prestações. Ocorre que, por dificuldades financeiras, o mutuário/fiduciante tornou-se inadimplente. Quando o fiduciante não paga a dívida, a lei afirma que ocorre a consolidação da propriedade em nome do fiduciário. Nesse sentido, é o que prevê o art. 26 da Lei nº 9.514/97:

Art. 26 Vencida e não paga, no todo ou em parte, a dívida e constituído em mora o fiduciante, consolidar-se-á, nos termos deste artigo, a propriedade do imóvel em nome do fiduciário.

Notificação do devedor para constituição em mora Vale ressaltar que, em caso de atraso no pagamento, a Lei exige que o credor/fiduciário requeira que o Oficial do Registro de Imóveis faça a notificação extrajudicial do devedor/fiduciante (seu representante

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ou procurador) para pagar a dívida em 15 dias. Trata-se da notificação com a finalidade de fazer a constituição do devedor em mora. Veja:

Art. 26 (...) § 1º Para os fins do disposto neste artigo, o fiduciante, ou seu representante legal ou procurador regularmente constituído, será intimado, a requerimento do fiduciário, pelo oficial do competente Registro de Imóveis, a satisfazer, no prazo de quinze dias, a prestação vencida e as que se vencerem até a data do pagamento, os juros convencionais, as penalidades e os demais encargos contratuais, os encargos legais, inclusive tributos, as contribuições condominiais imputáveis ao imóvel, além das despesas de cobrança e de intimação. (...) § 3º A intimação far-se-á pessoalmente ao fiduciante, ou ao seu representante legal ou ao procurador regularmente constituído, podendo ser promovida, por solicitação do oficial do Registro de Imóveis, por oficial de Registro de Títulos e Documentos da comarca da situação do imóvel ou do domicílio de quem deva recebê-la, ou pelo correio, com aviso de recebimento. § 3º-B. Nos condomínios edilícios ou outras espécies de conjuntos imobiliários com controle de acesso, a intimação de que trata o § 3º-A poderá ser feita ao funcionário da portaria responsável pelo recebimento de correspondência.

Paga a dívida: fica tudo bem Purgada a mora no Registro de Imóveis, convalescerá o contrato de alienação fiduciária (art. 26, § 5º). E se o devedor não purgar a mora? Decorrido o prazo de 15 dias sem que o devedor tenha feito a purgação da mora, o oficial do Registro de Imóveis irá fazer uma certidão disso e, em seguida, averbará, na matrícula do imóvel, que houve a consolidação da propriedade em nome do fiduciário/credor. Vale ressaltar que, antes da averbação, o credor terá que pagar o imposto de transmissão inter vivos e, se for o caso, do laudêmio. Se o imóvel era parte de um condomínio edilício (ex: um apartamento), como o fiduciante estava com dificuldades financeiras, é muito comum que ele também estivesse em atraso com o pagamento das cotas condominiais. Como fica a situação do condomínio neste caso? É possível que o condomínio cobre do fiduciário (“banco”) as despesas condominiais que o fiduciante deixou e que se referem a um período anterior à consolidação da propriedade? NÃO. • Despesas condominiais referentes a período anterior à imissão na posse: devem ser cobradas do devedor fiduciante. O credor fiduciário (“banco”) não pode ser obrigada a pagar. • Despesas condominiais referente a período posterior à imissão na posse: são de responsabilidade do credor fiduciário. O tema é disciplinado expressamente pelo § 8º do art. 27 da Lei nº 9.514/97, que diz o seguinte:

Art. 27 (...) § 8º Responde o fiduciante pelo pagamento dos impostos, taxas, contribuições condominiais e quaisquer outros encargos que recaiam ou venham a recair sobre o imóvel, cuja posse tenha sido transferida para o fiduciário, nos termos deste artigo, até a data em que o fiduciário vier a ser imitido na posse. (Incluído pela Lei nº 10.931/2004)

Cuidado com isso porque, como aprendemos que as contribuições condominiais são obrigações propter rem, a tendência é raciocinar de forma diferente do que foi explicado acima. No entanto, houve uma opção expressa da Lei em proteger o credor fiduciário, livrando-os dos débitos anteriores à imissão na posse. Essa mesma previsão foi inserida no Código Civil em 2014:

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Art. 1.368-B. A alienação fiduciária em garantia de bem móvel ou imóvel confere direito real de aquisição ao fiduciante, seu cessionário ou sucessor. (Incluído pela Lei nº 13.043/2014)

A doutrina reforça a conclusão legal:

(...) A responsabilidade do agente financeiro sobre os ônus que pendem em coisas submetidas a alienação fiduciária em garantia somente passa a existir no momento em que ocorre a retomada definitiva do bem junto ao devedor fiduciante inadimplente, pois então se consolida a propriedade na esfera jurídica de quem a tinha apenas, até então, em caráter resolúvel.” (MATIELLO, Fabrício Zamprogna. Código civil comentado: Lei n. 10.406, de 10.01.2002. 7ª ed. São Paulo: LTR, 2017, p. 714)

O STJ aplicou a lei e assim decidiu:

A responsabilidade do credor fiduciário pelo pagamento das despesas condominiais dá-se quando da consolidação de sua propriedade plena quanto ao bem dado em garantia, ou seja, quando de sua imissão na posse do imóvel. STJ. 3ª Turma. REsp 1.731.735-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/11/2018 (Info 638).

Considerando que os condomínios não podem cobrar do banco, o que eles podem fazer para garantirem seu direito e receberem essas quantias? Uma dica para os condomínios é a de executar o devedor fiduciante e requerer ao juízo a penhora dos direitos que este devedor fiduciante tiver sobre o contrato. Nesse caso, o condomínio exequente irá se sub-rogar nos direitos do devedor fiduciante. Isso significa o que? Quando o banco alienar o imóvel, irá utilizar o produto da venda para satisfazer o seu crédito. O restante teria que devolver ao devedor fiduciante. Ocorre que o condomínio já terá feito a penhora deste eventual crédito e, assim, ele receberá esse valor (que seria do fiduciante) para pagar as dívidas condominiais.

ALIMENTOS Em ação de alimentos, quando se trata de credor com plena capacidade processual, cabe

exclusivamente a ele provocar a integração posterior no polo passivo

O Código Civil prevê o seguinte:

Art. 1.698. Se o parente, que deve alimentos em primeiro lugar, não estiver em condições de suportar totalmente o encargo, serão chamados a concorrer os de grau imediato; sendo várias as pessoas obrigadas a prestar alimentos, todas devem concorrer na proporção dos respectivos recursos, e, intentada ação contra uma delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a lide.

Neste julgado, o STJ entendeu que este artigo possui natureza jurídica de “litisconsórcio facultativo ulterior simples”.

Trata-se, contudo, de litisconsórcio com uma particularidade: em regra, a sua formação pode ocorrer não apenas por iniciativa do autor, mas também por provocação do réu ou do Ministério Público.

Vale ressaltar, contudo, uma exceção: se o credor dos alimentos (autor da ação) for menor emancipado, possuir capacidade processual plena e optar livremente por ajuizar a demanda somente em face do genitor, não pode o réu provocar o chamamento ao processo da genitora do autor (codevedora).

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Em ação de alimentos, quando se trata de credor com plena capacidade processual, cabe exclusivamente a ele provocar a integração posterior no polo passivo.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.715.438-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/11/2018 (Info 638).

Imagine a seguinte situação hipotética: Lucas, 17 anos, é emancipado e mora sozinho em Porto Alegre (RS), onde faz faculdade. Seus pais são divorciados e cada um mora em uma cidade diferente no interior do Estado. Lucas ajuizou ação de alimentos contra o pai. Ao contestar a demanda, o genitor, dentre outras alegações, pediu o chamamento ao processo da mãe de Lucas, argumentando que ela também pode pagar alimentos considerando que é jovem, economicamente ativa e apta a complementar o valor necessário para a subsistência do filho. O pedido do genitor foi fundamentado no art. 1.698 do Código Civil, que assim determina:

Art. 1.698. Se o parente, que deve alimentos em primeiro lugar, não estiver em condições de suportar totalmente o encargo, serão chamados a concorrer os de grau imediato; sendo várias as pessoas obrigadas a prestar alimentos, todas devem concorrer na proporção dos respectivos recursos, e, intentada ação contra uma delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a lide.

O pedido do pai de Lucas deverá ser acolhido? O juiz deverá determinar, a requerimento do réu, o chamamento ao processo da mãe do autor? NÃO. Natureza da obrigação do art. 1.698 A doutrina majoritária, ao interpretar o art. 1.698 do CC/2002, tem se posicionado no sentido de que a obrigação alimentar não é solidaria, mas sim divisível, ao fundamento de que não há disposição legal que autorize a cobrança integral do valor de apenas um dos codevedores, que arcam apenas com a cota que puder prestar, no limite de suas possibilidades. Se todos os devedores previstos no art. 1.698 não estiverem na lide, como é possível “chama-los” para participar do processo? Existem quatro correntes sobre esse dispositivo: 1ª) trata-se de intervenção de terceiro anômala ou atípica, suscetível de instauração por provocação de quaisquer das partes. É a posição defendida por Daniel Amorim Assumpção Neves e por Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald. 2ª) consiste em litisconsórcio facultativo ulterior simples e, como tal, de iniciativa privativa do autor da ação e credor dos alimentos. Nesse sentido, está por exemplo a doutrina de Yussef Said Cahali, de Flávio Tartuce e de Fredie Didier Jr. 3ª) representa hipótese de litisconsórcio necessário. Defendida por Rolf Madaleno. 4ª) cuida-se de uma hipótese adicional de chamamento ao processo. É a tese defendida por Cássio Scarpinella Bueno. Qual foi a corrente adotada pelo STJ? O STJ, neste julgado, manifestou-se no sentido da 2ª corrente e entendeu que se trata de litisconsórcio facultativo ulterior simples. Trata-se, contudo, de litisconsórcio com uma particularidade: a formação dessa singular espécie de litisconsórcio não ocorre somente por iniciativa exclusiva do autor, mas também por provocação do réu ou do Ministério Público, quando o credor dos alimentos for incapaz. Desse modo, o art. 1.698 do CC é um litisconsórcio facultativo ulterior simples que pode ser formado: • por iniciativa do autor; • por provocação do réu;

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• por provocação do MP (quando envolver incapaz). Mas por que não foi admitido, no caso concreto, a provocação do réu (pai de Lucas) para que a genitora também participasse da lide? Porque o se tratava de credor de alimentos com plena capacidade processual. O STJ entendeu que:

Em ação de alimentos, quando se trata de credor com plena capacidade processual, cabe exclusivamente a ele provocar a integração posterior no polo passivo. STJ. 3ª Turma. REsp 1.715.438-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/11/2018 (Info 638).

Se o autor (credor) não quis fazer isso, essa sua inércia deve ser interpretada como concordância tácita com os alimentos que puderem ser prestados pelo réu por ele indicado na petição inicial, sem prejuízo de eventual e futuro ajuizamento de ação autônoma de alimentos em face dos demais coobrigados. O credor dos alimentos é menor emancipado, possui capacidade processual plena e optou livremente por ajuizar a ação somente em face do genitor, cabendo a ele, com exclusividade, provocar a integração posterior do polo passivo, devendo a sua inércia em fazê-lo ser interpretada como a abdicação, ao menos neste momento, da quota-parte que lhe seria devida pela genitora coobrigada, sem prejuízo de eventualmente ajuizar, no futuro, ação de alimentos autônoma em face da genitora. Em síntese, em relação aos legitimados para provocar a integração do polo passivo, é possível concluir que: a) Nas hipóteses em que o credor de alimentos reúna plena capacidade processual, cabe a ele, exclusivamente, provocar a integração posterior do polo passivo, devendo a sua inércia ser interpretada como concordância tácita com os alimentos que puderem ser prestados pelo demandado; b) Se o autor ajuizou a ação por meio de representante processual, ou seja, o credor de alimentos é incapaz, a integração posterior do polo passivo pode ser promovida pelo réu (devedor) ou pelo MP. Qual é o momento processual adequado para a integração do polo passivo? • Autor: deverá requerer em sua réplica à contestação; • Réu: deverá requerer na contestação; • MP: após a prática dos referidos atos processuais pelas partes. Não é possível a ampliação objetiva ou subjetiva da lide após o saneamento e organização do processo, em homenagem ao contraditório, à ampla defesa e à razoável duração do processo.

ALIMENTOS Súmula 621-STJ

Súmula 621-STJ: Os efeitos da sentença que reduz, majora ou exonera o alimentante do pagamento retroagem à data da citação, vedadas a compensação e a repetibilidade.

STJ. 2ª Seção. Aprovada em 12/12/2018, DJe 17/12/2018.

Imagine o seguinte exemplo hipotético: Gabriel ingressou com ação de alimentos contra Rui, seu pai. O juiz, na sentença, fixou os alimentos em R$ 4 mil. Após pagar alguns meses, Rui mostrou-se inadimplente, razão pela qual Gabriel iniciou a execução dos alimentos. Rui, por sua vez, propôs ação de redução de alimentos.

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Gabriel foi citado na ação de revisão no dia 01/07 e, no dia 31/12, o juiz prolatou a sentença, reduzindo a obrigação alimentícia para R$ 1 mil mensais. Rui estava atrasado em 4 meses (setembro a dezembro), ou seja, deixou de pagar 4 meses de pensão (equivalente a um total de R$ 16 mil). Recapitulando: • Antes da execução, Rui estava pagando 4 mil por mês. • 01/09 a 31/12: Rui não pagou nada (ficou devendo 4 meses = 16 mil). • Gabriel ajuizou execução de alimentos. • Rui ajuizou ação de revisão de alimentos. • 01/07: Gabriel foi citado para a ação de redução de alimentos. • 31/12: transitou em julgado a sentença do juiz reduzindo os alimentos para 1 mil mensais. Tese do alimentante Enquanto era julgada a revisional, a execução proposta por Gabriel continuava tramitando. O valor cobrado na execução era de R$ 16 mil (4 meses de 4 mil cada). Depois do trânsito em julgado da revisional, o advogado de Rui apresentou uma petição no processo executivo afirmando que seu cliente não precisa mais pagar os R$ 16 mil que estavam sendo cobrados porque foi proferida uma sentença de redução de alimentos. Alegou que a sentença na ação de revisão retroage à data da citação, conforme prevê o § 2º do art. 13 da Lei nº 5.478/68 (Lei de Alimentos):

Art. 13 (...) § 2º Em qualquer caso, os alimentos fixados retroagem à data da citação.

Logo, o valor que estava sendo cobrado (16 mil) foi reduzido para 4 mil. Isso porque o valor da prestação mensal deixou de ser 4 mil e passou a ser 1 mil. A tese alegada pelo advogado de Rui está correta? A decisão que revisa a obrigação alimentícia possui efeito retroativo? SIM. Os efeitos da sentença proferida em ação de revisão de alimentos (seja em caso de REDUÇÃO, MAJORAÇÃO ou EXONERAÇÃO) retroagem à data da citação, conforme prevê o art. 13, § 2º, da Lei nº 5.478/68. Essa solução tem por objetivo evitar o enriquecimento sem causa do credor dos alimentos, porque o entendimento contrário – sentença de redução ou exoneração dos alimentos produzindo efeitos somente após o seu trânsito em julgado – ensejaria a inusitada consequência de submeter o alimentante à execução das parcelas pretéritas não adimplidas (por qualquer razão), mesmo estando ele amparado por decisão judicial transitada em julgado que diminuiu ou até mesmo eliminou o encargo. Em julho e agosto, Rui pagou R$ 4 mil em cada mês e, posteriormente, esse valor foi reduzido para R$ 1 mil mensais. Ele poderá pedir de volta esses R$ 6 mil que pagou a mais para Gabriel (seu filho) (3 mil a mais em cada mês)? NÃO. A decisão na revisão de alimentos é RETROATIVA, no entanto, os valores adimplidos são irrepetíveis, ou seja, as parcelas que já foram pagas não podem ser pedidas de volta. É vedada (proibida) a repetibilidade. Isso porque o direito presume, de forma absoluta (presunção jure et jure), que as quantias recebidas a título de alimentos foram utilizadas para o sustento da pessoa, isto é, foram efetivamente consumidas, não sendo, portanto, legítimo que o beneficiário seja obrigado a devolver por conta de uma decisão posterior.

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Rui poderá utilizar esse valor pago a mais (R$ 6 mil) como crédito e compensá-lo (abatê-lo) das prestações futuras? NÃO. A decisão na revisão de alimentos é RETROATIVA, no entanto, mesmo que isso gere um “crédito” em favor do alimentante, ele não poderá utilizar esse saldo positivo para abater (fazer a compensação) dos valores que ele ainda tem que pagar. Em outras palavras, ele não pode compensar o excesso do que foi pago com prestações vincendas. É vedada a compensação. OUTRAS PERGUNTAS RELACIONADAS COM O TEMA: Se existe uma decisão determinando que o pai/devedor pague pensão alimentícia para o seu filho e este pai ajuíza uma ação de exoneração ou redução dos alimentos, o simples fato de ter sido proposta a demanda já faz com que fique suspensa a sua obrigação? NÃO. O ajuizamento de ação pleiteando exoneração/revisão de alimentos não exime o devedor de continuar a prestá-los até o trânsito em julgado da decisão que modifica o valor da prestação alimentar ou exonerá-lo do encargo alimentar (art. 13, § 3º, da Lei b, 5.478/68). Se o juiz profere sentença exonerando o pai/devedor de pagar alimentos ou reduzindo o valor fixado, mas o alimentando (filho) apresenta apelação, a obrigação alimentícia é suspensa? NÃO. Da sentença revisional/exoneratória caberá apelação com efeito suspensivo e, ainda que a referida decisão seja confirmada em segundo grau (pelo Tribunal), não haverá liberação da prestação alimentar se for interposto recurso especial ou recurso extraordinário. Em suma, somente com o trânsito em julgado é que haverá a retroação da decisão que reduz ou exonera. Durante todo o período de tramitação da ação revisional/exoneratória, salvo se concedida antecipação de tutela suspendendo o pagamento, o devedor deverá adimplir a obrigação, sob pena de prisão (art. 733 do CPC). Desse modo, pretendeu a lei conferir ao alimentado (credor) o benefício da dúvida, dando-lhe a segurança de que, enquanto não assentada, definitivamente, a impossibilidade do cumprimento da obrigação alimentar nos termos anteriormente firmados, as alegadas necessidades do credor não deixarão de ser providas. Agora, transitada em julgado a sentença revisional/exoneratória, se, por qualquer motivo, não tiverem sido pagos os alimentos, a exoneração ou a redução terá efeito retroativo à citação (art. 13, § 2º, da Lei nº 5.478/68), não sendo cabível a execução de verba já afirmada indevida por decisão transitada em julgado.

DIREITO DO CONSUMIDOR

PLANO DE SAÚDE É legítima a recusa do plano de saúde em custear medicação importada não nacionalizada,

ou seja, sem registro vigente na ANVISA

Importante!!!

As operadoras de plano de saúde não estão obrigadas a fornecer medicamento não registrado pela ANVISA.

STJ. 2ª Seção. REsp 1.712.163-SP, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em 08/11/2018 (recurso repetitivo) (Info 638).

Imagine a seguinte situação hipotética: João, cliente do plano de saúde ACEM, sofre de cirrose hepática causada pelo vírus da hepatite C. O médico de João prescreveu a ele tratamento com o medicamento importado Harvoni (Sofosbuvir 400 mg e Ledispavir 90 mg).

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Ocorre que o plano de saúde se recusou a autorizar o custeio argumentando que se trata de medicamento não registrado pela ANVISA. Diante disso, João ajuizou ação contra o plano de saúde pedindo que fosse condenado a custear todas as despesas que se fizessem necessárias para a importação do referido fármaco. A questão jurídica é, portanto, a seguinte: as operadoras de plano de saúde estão obrigadas a fornecer medicamento não registrado pela ANVISA? A resposta é NÃO. Não são obrigados a fornecer medicamentos não nacionalizados A Lei nº 9.656/98 (lei que rege os planos de saúde) prevê, em seu art. 10, V, que os planos de saúde estão dispensados de fornecer “medicamentos importados não nacionalizados”. Segundo a Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, “medicamento importado não nacionalizado” é aquele produzido fora do território nacional e sem registro vigente na ANVISA (RN nº 428/2017 da ANS). Papel da ANVISA A ANVISA é uma autarquia sob regime especial, vinculada ao Ministério da Saúde, tendo sido criada pela Lei nº 9.782/99 com o objetivo de promover a proteção da saúde da população, por intermédio do controle sanitário da produção e da comercialização de produtos e serviços submetidos à vigilância sanitária (art. 6º). O processo de aprovação e registro de medicamentos pela ANVISA é de fundamental importância para a garantia do direito à saúde e para o próprio sistema de saúde. Assim, não faz sentido obrigar os planos de saúde a fornecerem medicamentos que ainda não foram aprovados pela ANVISA. Lei nº 6.360/76 (vigilância sanitária) A Lei nº 6.360/76 dispõe sobre a Vigilância Sanitária a que ficam sujeitos os medicamentos, as drogas, os insumos farmacêuticos e outros correlatos. O art. 12 desta Lei estabelece que nenhum desses produtos (ou seja, inclusive os medicamentos) podem ser industrializados, expostos à venda ou entregues ao consumo antes de registrado no Ministério da Saúde. O art. 16 da mesma Lei prevê os requisitos específicos que devem ser efetivamente atendidos para o registro de drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos, dentre eles, que o produto, através de comprovação científica e de análise, seja reconhecido como seguro e eficaz para o uso a que se propõe. Sem o registro do medicamento pela ANVISA, não se sabe se o medicamento é seguro e realmente eficaz. Recomendação CNJ Foram realizadas diversas audiências públicas sobre o tema no STF e o CNJ expediu a Recomendação nº 31/2010, na qual resolve:

I. Recomendar aos Tribunais de Justiça dos Estados e aos Tribunais Regionais Federais que: (...) b.2) evitem autorizar o fornecimento de medicamentos ainda não registrados pela ANVISA, ou em fase experimental, ressalvadas as exceções expressamente previstas em lei.

Jornada de Direito à Saúde Alguns anos depois, o CNJ promoveu a I Jornada do Direito à Saúde, em que foram aprovados os seguintes enunciados relacionados com o tema:

Enunciado nº 6: A determinação judicial de fornecimento de fármacos deve evitar os medicamentos ainda não registrados na Anvisa, ou em fase experimental, ressalvadas as exceções expressamente previstas em lei.

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Enunciado nº 26: É lícita a exclusão de cobertura de produto, tecnologia e medicamento importado não nacionalizado, bem como tratamento clínico ou cirúrgico experimental.

Precedente do STF Nessa mesma linha, o STF possui um julgado no qual se manifestou pela indispensabilidade do registro pela ANVISA: STA 175/CE AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes (Presidente), Tribunal Pleno, julgado em 17/3/2010. Infração sanitária e, até, crime Além do mais, a importação de medicamentos, sem prévio registro, constitui infração de natureza sanitária, nos termos dos arts. 10, IV, da Lei nº 6.437/77, e 12 e 66, ambos da Lei nº 6.360/76. Logo, não é possível o Judiciário impor às operadoras de plano de saúde que realizem ato tipificado como infração de natureza sanitária, pois isso implicaria manifesta vulneração do princípio da legalidade. Vale ressaltar, ainda, que a importação de medicamento sem registro na ANVISA configura, inclusive, crime previsto no art. 273 do Código Penal:

(...) Consoante o disposto nos arts. 1º e 12, ambos da Lei nº 6.360/1976, só é admissível a venda de medicamento no território nacional, inclusive importado, após registro no órgão público competente. 2. Se o registro figura como condição para a difusão de medicamento, nos termos da lei, afigura-se desnecessário que o laudo pericial ateste a sua exigibilidade, sendo suficiente - para fins de caracterização do crime tipificado no art. 273, § 1º-B, I, do Código Penal -, evidência de que o medicamento, objeto de difusão, não tem registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA. (...) STJ. 6ª Turma. REsp 1.755.862/RJ, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 18/09/2018.

Tese fixada pelo STJ:

As operadoras de plano de saúde não estão obrigadas a fornecer medicamento não registrado pela ANVISA. STJ. 2ª Seção. REsp 1.712.163-SP, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em 08/11/2018 (recurso repetitivo) (Info 638).

Obs: durante a tramitação do processo, o medicamento “Harvoni” obteve registro na ANVISA. Não confundir com este outro tema: Plano de saúde não pode negar tratamento prescrito por médico sob o fundamento de que sua utilização está fora das indicações descritas na bula (uso off-label)

A operadora de plano de saúde não pode negar o fornecimento de tratamento prescrito pelo médico sob o pretexto de que a sua utilização em favor do paciente está fora das indicações descritas na bula/manual registrado na ANVISA (uso off-label). STJ. 3ª Turma. REsp 1.721.705-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 28/08/2018 (Info 632).

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DIREITO EMPRESARIAL

PROTESTO Credor que havia protestado o título tem o dever de fornecer carta de anuência para

cancelamento do protesto, mas para isso precisa haver um pedido do devedor

Não há como impor tacitamente ao credor o dever de enviar, sem provocação, o documento hábil ao cancelamento do legítimo protesto.

O credor tem o inequívoco dever de fornecer o documento hábil ao cancelamento do protesto, mas para isso precisa ser previamente provocado.

Assim, se o devedor paga ao banco um título de crédito que estava protestado, o banco deverá fornecer uma carta de anuência com a qual o devedor poderá cancelar o protesto. No entanto, o credor não tem o dever de fornecer este documento automaticamente. É necessário que haja um requerimento (um pedido) daquele que pagou.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.346.584-PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 09/10/2018 (Info 638).

NOÇÕES GERAIS SOBRE O PROTESTO O que é um protesto de título? Protesto de títulos é o ato público, formal e solene, realizado pelo tabelião, com a finalidade de provar a inadimplência e o descumprimento de obrigação constante de título de crédito ou de outros documentos de dívida. Regulamentação O protesto é regulado pela Lei nº 9.492/97. Quem é o responsável pelo protesto? O tabelião de protesto.

"O particular não pratica o protesto, mas solicita ao Tabelião que o pratique. Este pode, depois de analisar os requisitos formais do documento, negar-se a tal lavratura, caso encontre vício que justifique a negativa. (...) O protesto é, pois, ato do tabelião de Protesto, que o pratica por provocação do interessado, depois de respeitado o procedimento legal." (BUENO, Sérgio Luiz. O protesto de títulos e outros documentos de dívida. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2011, p. 20 e 21)

Quais são as vantagens de o credor realizar o protesto? Existem inúmeros efeitos que decorrem do protesto; no entanto, as duas principais vantagens para o credor são as seguintes: a) serve como meio de provar que o devedor está inadimplente; b) funciona como uma forma de coerção para que o devedor cumpra sua obrigação sem que seja necessária uma ação judicial (como o protesto lavrado gera um abalo no crédito do devedor, que é inscrito nos cadastros de inadimplentes, a doutrina afirma que o receio de ter um título protestado serve como um meio de cobrança extrajudicial do débito; ao ser intimado do protesto, o devedor encontra uma forma de quitar seu débito). Qual é o objeto do protesto? O que pode ser protestado? Segundo o art. 1º da Lei nº 9.492/97:

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Art. 1º Protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida.

Assim, conclui-se que podem ser levados a protesto: a) títulos de crédito e b) outros documentos de dívida. O que é um documento de dívida? Documento de dívida é todo e qualquer meio de prova escrita que comprove a existência de uma obrigação líquida, certa e exigível. RESPONSABILIDADE PELA BAIXA DO PROTESTO APÓS O PAGAMENTO

Procedimento até ser registrado o protesto do título: 1) o credor leva o título até o tabelionato de protesto e faz a apresentação, pedindo que se proceda ao protesto e informando os dados e endereço do devedor; 2) o tabelião de protesto examina os caracteres formais do título; 3) se o título não apresentar vícios formais, o tabelião realiza a intimação do suposto devedor no endereço apresentado pelo credor (art. 14); 4) a intimação é realizada para que o apontado devedor, no prazo de 3 dias, pague ou providencie a sustação do protesto antes de ele ser lavrado; Após a intimação, poderão ocorrer quatro situações: 4.1) o devedor pagar (art. 19); 4.2) o apresentante desistir do protesto e retirar o título (art. 16); 4.3) o protesto ser sustado judicialmente (art. 17); 4.4) o devedor ficar inerte ou não conseguir sustar o protesto.

5) se ocorrer as situações 4.1, 4.2 ou 4.3: o título não será protestado; 6) se ocorrer a situação 4.4: o título será protestado (será lavrado e registrado o protesto). Imaginemos que o devedor foi intimado (etapa 4), mas não pagou nem conseguiu sustar o protesto. O que aconteceu então? O título foi protestado. Após um tempo, esse devedor quis comprar um carro financiado, no entanto, não conseguiu porque o banco constatou a existência desse título protestado e, por essa razão, não liberou o crédito. O devedor decidiu, então, pagar o título protestado. Com o pagamento do débito, será possível retirar a anotação desse título protestado? SIM. Após o pagamento do título protestado, o credor que foi pago tem a responsabilidade de retirar o protesto lavrado? NÃO. Após a quitação da dívida, incumbe ao DEVEDOR providenciar o cancelamento do protesto, salvo se foi combinado o contrário entre ele e o credor. Segundo o STJ, a Lei nº 9.492/97 não impõe ao credor o dever de retirar o protesto. Veja:

Art. 26. O cancelamento do registro do protesto será solicitado diretamente no Tabelionato de Protesto de Títulos, por qualquer interessado, mediante apresentação do documento protestado, cuja cópia ficará arquivada.

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Desse modo, quando o art. 26 da Lei nº 9.492/1997 fala que o cancelamento do registro de protesto pode ser solicitado por qualquer interessado, a melhor interpretação é a de que o principal interessado é o devedor, de forma que a ele cabe, em regra, o ônus do cancelamento. O tema foi pacificado em recurso especial repetitivo:

Após a quitação da dívida, incumbe ao DEVEDOR, providenciar o cancelamento do protesto, salvo se foi combinado o contrário entre ele e o credor. No regime próprio da Lei nº 9.492/97, legitimamente protestado o título de crédito ou outro documento de dívida, salvo inequívoca pactuação em sentido contrário, incumbe ao devedor, após a quitação da dívida, providenciar o cancelamento do protesto. STJ. 2ª Seção. REsp 1339436-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 10/9/2014 (recurso repetitivo) (Info 549).

Esse entendimento vale mesmo que se trate de uma relação de consumo, ou seja, que o devedor seja um consumidor e o credor um fornecedor? SIM. Cabe ao devedor que paga posteriormente a dívida o ônus de providenciar a baixa do protesto em cartório, sendo irrelevante se a relação era de consumo (STJ. 4ª Turma. REsp 1.195.668/RS, Rel. p/ Acórdão Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 11/9/2012). A solução jurídica acima aplica-se também no caso de inscrição em cadastros de inadimplentes (exs: SERASA/SPC)? NÃO. A posição acima explicada vale apenas para os casos de cancelamento de título protestado. Na hipótese de devedor inserido em cadastro de inadimplentes (ex: SERASA, SPC), a solução é diferente. Veja:

CADASTRO DE INADIMPLENTES REGISTRO DE PROTESTO

Se a dívida é paga, quem tem o dever de retirar o nome do devedor do cadastro (ex: SERASA)? O CREDOR (no prazo máximo de 5 dias). Fundamento: art. 43, § 3º do CDC (por analogia).

Se o título é pago, quem tem o dever de retirar o protesto que foi lavrado? O próprio DEVEDOR. Fundamento: art. 26 da Lei nº 9.492/1997.

CREDOR TEM O DEVER DE ENVIAR AUTOMATICAMENTE O DOCUMENTO NECESSÁRIO PARA QUE CREDOR POSSA DAR BAIXA NO PROTESTO?

Imagine a seguinte situação hipotética: Cláudia tinha uma dívida com o banco, materializada em uma nota promissória, cujo vencimento era janeiro de 2016. Como ela não pagou, o banco apresentou o título a protesto, o que foi efetivado em março de 2016. Em abril de 2016, Cláudia conseguiu receber uma rescisão trabalhista e, aproveitando o dinheiro, imprimiu novo boleto do banco na internet e pagou a dívida principal, com juros e multa (quitação integral). Em agosto de 2016, Cláudia tentou comprar uma televisão a prazo, mas não conseguiu crédito porque foi informada pela loja, que seu nome constava no SERASA em razão de um protesto do banco. Chateada, Cláudia procurou um advogado querendo processar o banco por não ter feito o cancelamento do protesto depois de ela ter pagado. O advogado que atendeu Cláudia sempre acompanhava a jurisprudência e explicou para a cliente que, infelizmente, ela, enquanto devedora, é quem tinha o ônus de providenciar o cancelamento do protesto, conforme decidiu o STJ no REsp 1339436-SP. Cláudia perguntou do advogado como ela poderia fazer esse cancelamento e o profissional explicou que ela deve levar até o cartório a “carta de anuência” do banco. Carta de anuência é um documento no qual o credor declara que o título de crédito que havia sido protestado já foi pago e que, portanto, ele não se opõe ao cancelamento do protesto.

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Cláudia, então, disse: quando eu paguei o débito, o banco deveria ter me enviado por correio essa carta de anuência. Eles falharam comigo. Quero processar. Diante disso, Cláudia ajuizou ação de indenização por danos morais contra o banco argumentando que houve negligência do banco em não lhe enviar automaticamente o documento que ela necessitava (“carta de anuência”) para dar baixa no protesto. O STJ concordou com o pedido de Cláudia? NÃO.

Não há como impor tacitamente ao credor o dever de enviar, sem provocação, o documento hábil ao cancelamento do legítimo protesto. O credor tem o inequívoco dever de fornecer o documento hábil ao cancelamento do protesto, mas para isso precisa ser previamente provocado. STJ. 4ª Turma. REsp 1.346.584-PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 09/10/2018 (Info 638).

Situação diferente seria se o banco, mesmo após o pagamento, recusasse ou dificultasse o fornecimento da declaração. Aí haveria ato ilícito passível de indenização.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

TÉCNICA DE AMPLIAÇÃO DO COLEGIADO Os novos julgadores convocados na forma do art. 942 do CPC/2015 poderão analisar todo o conteúdo das razões recursais, não se limitando à matéria sobre a qual houve divergência

Importante!!!

Como ocorre a continuidade do julgamento na hipótese em que houve uma parte unânime e outra não unânime? Ex: no julgamento de uma apelação contra sentença que havia negado integralmente a indenização, a Câmara Cível entendeu de forma unânime (3x0) que houve danos materiais e por maioria (2x1) que não ocorreram danos morais. Foram então

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convocados dois Desembargadores para a continuidade do julgamento ampliado (art. 742). Esses dois novos Desembargadores que chegam poderão votar também sobre a parte unânime (danos materiais) ou ficarão restritos ao capítulo não unânime (danos morais)?

O colegiado formado com a convocação dos novos julgadores (art. 942 do CPC/2015) poderá analisar de forma ampla todo o conteúdo das razões recursais, não se limitando à matéria sobre a qual houve originalmente divergência.

Constatada a ausência de unanimidade no resultado da apelação, é obrigatória a aplicação do art. 942 do CPC/2015, sendo que o julgamento não se encerra até o pronunciamento pelo colegiado estendido, ou seja, inexiste a lavratura de acórdão parcial de mérito.

Os novos julgadores convocados não ficam restritos aos capítulos ou pontos sobre os quais houve inicialmente divergência, cabendo-lhes a apreciação da integralidade do recurso.

O prosseguimento do julgamento com quórum ampliado em caso de divergência tem por objetivo a qualificação do debate, assegurando-se a oportunidade para a análise aprofundada das teses jurídicas contrapostas e das questões fáticas controvertidas, com vistas a criar e manter uma jurisprudência uniforme, estável, íntegra e coerente.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.771.815-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 13/11/2018 (Info 638).

Técnica de julgamento do art. 942 do CPC/2015 O resultado do julgamento da apelação pode ser unânime (quando todos os Desembargadores concordam) ou por maioria (quando no mínimo um Desembargador discorda dos demais). Se o resultado se der por maioria, o CPC prevê uma nova “chance” de a parte que “perdeu” a apelação reverter o resultado. Como assim? Se o resultado da apelação for não unânime, o julgamento terá prosseguimento em uma nova sessão, que será marcada e que contará com a presença de novos Desembargadores que serão convocados, em número suficiente para garantir a possibilidade de inversão do resultado inicial. Ex: o resultado da apelação foi 2x1; 2 Desembargadores votaram pelo provimento da apelação (em favor de João) e um Desembargador votou pela manutenção da sentença (em favor de Pedro); significa dizer que deverá ser designada uma nova sessão e para essa nova sessão serão convocados dois novos Desembargadores que também irão emitir votos; neste nosso exemplo, foram convocados 2 porque a convocação dos novos julgadores deverá ser em número suficiente para garantir a possibilidade de inversão do resultado inicial (se os dois novos Desembargadores votarem com a minoria, o placar se inverte para 3x2). Veja a previsão legal:

Art. 942. Quando o resultado da apelação for não unânime, o julgamento terá prosseguimento em sessão a ser designada com a presença de outros julgadores, que serão convocados nos termos previamente definidos no regimento interno, em número suficiente para garantir a possibilidade de inversão do resultado inicial, assegurado às partes e a eventuais terceiros o direito de sustentar oralmente suas razões perante os novos julgadores.

A previsão deste art. 942 é chamada de “técnica de complementação de julgamento não unânime” ou “técnica de ampliação do colegiado”. Vamos verificar outras informações sobre esta técnica. Prosseguimento na mesma sessão Sendo possível, o prosseguimento do julgamento pode ocorrer na mesma sessão, colhendo-se os votos de outros julgadores que porventura componham o órgão colegiado (§ 1º do art. 942).

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Juízo de retratação Os julgadores que já tiverem votado poderão rever seus votos por ocasião do prosseguimento do julgamento (§ 2º do art. 942). Ex: o resultado da apelação foi 2x1; dois Desembargadores votaram pelo provimento da apelação (em favor de João); por outro lado, um Desembargador (Des. Raimundo) votou pelo improvimento da apelação (contra João); designou-se, então, um novo dia para prosseguimento do julgamento ampliado, tendo sido convocados dois Desembargadores de uma outra Câmara Cível do Tribunal (Desembargadores Cláudio e Paulo); logo no início, antes que Cláudio e Paulo votassem, o Des. Raimundo pediu a palavra e disse: olha, melhor refletindo nesses dias, eu gostaria de evoluir meu entendimento e irei acompanhar a maioria votando pelo provimento da apelação. Mesmo que isso ocorra, ou seja, que alguém mude de opinião, ainda assim deverão ser colhidos os votos dos Desembargadores convocados. Nesse sentido:

Enunciado 599-FFPC: A revisão do voto, após a ampliação do colegiado, não afasta a aplicação da técnica de julgamento do art. 942.

Esse art. 942 é uma espécie de recurso? NÃO. Trata-se de uma “técnica de complementação de julgamento nas decisões colegiadas não unânimes de segunda instância”. A parte que “perdeu” a apelação precisa pedir a aplicação do art. 942? NÃO. Essa técnica de julgamento é obrigatória e aplicável de ofício, automaticamente, pelo Tribunal. A parte não precisa requerer a sua aplicação. A técnica é aplicada antes da conclusão do julgamento Como não se trata de recurso, a aplicação da técnica ocorre em momento anterior à conclusão do julgamento, ou seja, não há proclamação do resultado, nem lavratura de acórdão parcial, antes de a causa ser devidamente apreciada pelo colegiado ampliado. Tanto isso é verdade que, conforme já explicado, sendo possível, o prosseguimento do julgamento pode ocorrer na mesma sessão, colhendo-se os votos de outros julgadores que porventura componham o órgão colegiado (§ 1º do art. 942). No entanto, mesmo que ocorra em outro dia, considera-se que houve um só julgamento. Não se encerrou um para começar o outro ampliado. Como ocorre a continuidade do julgamento na hipótese em que houve uma parte unânime e outra não unânime? Ex: no julgamento de uma apelação contra sentença que havia negado integralmente a indenização, a Câmara Cível entendeu de forma unânime (3x0) que houve danos materiais e por maioria (2x1) que não ocorreram danos morais. Foram então convocados dois Desembargadores para a continuidade do julgamento ampliado (art. 742). Esses dois novos Desembargadores que chegaram poderão votar também sobre a parte unânime (danos materiais) ou ficarão restritos ao capítulo não unânime (danos morais)? Poderão analisar de forma ampla, ou seja, tanto a parte unânime como não unânime. Foi o que decidiu o STJ:

O colegiado formado com a convocação dos novos julgadores (art. 942 do CPC/2015) poderá analisar de forma ampla todo o conteúdo das razões recursais, não se limitando à matéria sobre a qual houve originalmente divergência. STJ. 3ª Turma. REsp 1.771.815-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 13/11/2018 (Info 638).

Esse é também o entendimento de Alexandre de Freitas Câmara:

“(...) Uma vez ampliado o colegiado, todos os cinco magistrados que o integram votam em todas as questões a serem conhecidas no julgamento da apelação. A atuação dos dois novos integrantes da turma julgadora não é limitada à matéria objeto da divergência (afinal, não se está aqui diante

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dos velhos embargos infringentes, estes sim limitados à matéria objeto da divergência). Devem eles, inclusive, pronunciar-se sobre matérias que já estavam votadas de forma unânime. Assim, por exemplo, se o colegiado (formado por três juízes havia, por unanimidade, conhecido da apelação, e por maioria lhe dava provimento, os dois novos integrantes do colegiado devem se manifestar também sobre a admissibilidade do recurso. E nem se diga que essa questão já estaria superada, preclusa, pois a lei é expressa em estabelecer que os votos podem ser modificados até a proclamação do resultado (CPC, art. 941, § 1º), o que permite afirmar, com absoluta segurança, que o julgamento ainda não se havia encerrado. E pode acontecer de os magistrados que compunham a turma julgadora original, depois da manifestação dos novos integrantes do colegiado, convencerem-se de que seus votos originariamente apresentados estavam equivocados, sendo-lhes expressamente autorizado que modifiquem seus votos (art. 942, § 2º).” (A ampliação do colegiado em julgamentos não unânimes. Revista de Processo. vol. 282. ano 43. p. 251-266. São Paulo: RT, agosto 2018)

A técnica do art. 942 do CPC vale apenas para a apelação? NÃO. Além da apelação, a técnica de julgamento prevista no art. 942 aplica-se também para o julgamento não unânime proferido em: a) ação rescisória, quando o resultado for a rescisão da sentença, devendo, nesse caso, seu prosseguimento ocorrer em órgão de maior composição previsto no regimento interno; b) agravo de instrumento, quando houver reforma da decisão que julgar parcialmente o mérito. Embargos infringentes Os embargos infringentes eram uma espécie de recurso previsto no CPC/1973. Os embargos infringentes só cabiam para questionar acórdão. Não bastava, contudo, que fosse acórdão. Era necessário que ele fosse NÃO UNÂNIME, ou seja, acórdão em que houve voto vencido. A finalidade dos embargos infringentes era a de renovar a discussão para fazer prevalecer as razões do voto vencido. Segundo o art. 530 do CPC/1973, cabiam embargos infringentes em duas hipóteses: 1) contra acórdão não unânime (por maioria) que reformasse, em grau de apelação, a sentença de mérito. 2) contra acórdão não unânime (por maioria) que julgasse procedente a ação rescisória. O CPC/2015 acabou com a existência dos embargos infringentes, mas criou essa “técnica de julgamento” do art. 942, que possui algumas semelhanças com os embargos infringentes, mas que não se trata de recurso. Nesse sentido:

“(...) Esse mecanismo, conquanto não tenha natureza recursal, faz lembrar os embargos infringentes. Por não ser recurso, no entanto, não depende de interposição, constituindo apenas uma fase do julgamento da apelação, do agravo de instrumento contra decisão de mérito e da ação rescisória, não unânime.” (GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito Processual Civil Esquematizado. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 885).

IMPORTANTE. Situações nas quais não se aplicará a técnica de julgamento do art. 942 Não se aplica a técnica de julgamento do art. 942 do CPC ao julgamento: I - do incidente de assunção de competência e ao de resolução de demandas repetitivas; II - da remessa necessária; III - não unânime proferido, nos tribunais, pelo plenário ou pela corte especial. A técnica de julgamento do art. 942 é aplicada no caso de rescisão apenas parcial do julgado rescindendo? SIM. Enunciado 63 – Jornada CJF: A técnica de que trata o art. 942, § 3º, I, do CPC aplica-se à hipótese de rescisão parcial do julgado.

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A técnica de julgamento do art. 942 é aplicada no julgamento de apelação em processo de mandado de segurança? SIM. Enunciado 62 – Jornada CJF: Aplica-se a técnica prevista no art. 942 do CPC no julgamento de recurso de apelação interposto em mandado de segurança. A técnica de julgamento do art. 942 é aplicada nos Juizados Especiais? NÃO. É a posição da doutrina majoritária:

Enunciado 552-FPPC: Não se aplica a técnica de ampliação do colegiado em caso de julgamento não unânime no âmbito dos Juizados Especiais.

RECURSO ESPECIAL Necessidade de impugnação específica de todos os fundamentos da decisão proferida

pelo Tribunal de origem que inadmite o recurso especial

A decisão de inadmissibilidade do recurso especial não é formada por capítulos autônomos, mas por um único dispositivo, o que exige sua impugnação total.

Em outras palavras, o agravante deve atacar, de forma específica, TODOS os fundamentos da decisão que, na origem, inadmitiu o recurso especial.

STJ. Corte Especial. EAREsp 831.326-SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Rel. Acd. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 19/09/2018 (Info 638).

Interposição de REsp e juízo de admissibilidade A parte que deseja interpor um Recurso Especial (REsp) deve protocolizar este recurso no juízo a quo (recorrido) e não diretamente no juízo ad quem (STJ). Ex: TRF1 profere acórdão, por unanimidade, em apelação, afirmando que Gilson, servidor público federal, não possui determinado direito previsto na Lei nº 8.112/90. Nessa hipótese, ele poderá interpor recurso especial contra essa decisão, a ser julgado pelo STJ, com base no art. 105, III, “a”, da CF/88. O REsp deverá ser protocolizado no próprio TRF1. A recorrida (no caso, a União) será intimada para apresentar suas contrarrazões. Após, o Presidente do Tribunal (ou Vice-Presidente, a depender do regimento interno), em decisão monocrática, irá fazer um juízo de admissibilidade do recurso.

Se o juízo de admissibilidade for POSITIVO Se o juízo de admissibilidade for NEGATIVO

Significa que o Presidente (ou Vice) do Tribunal entendeu que os pressupostos do REsp estavam preenchidos e, então, remeterá o recurso para o STJ.

Significa que o Presidente (ou Vice) do Tribunal entendeu que algum pressuposto do REsp não estava presente e, então, não admitirá o recurso.

Contra esta decisão, não cabe recurso, considerando que o STJ ainda irá reexaminar novamente esta admissibilidade.

Contra esta decisão, a parte prejudicada poderá interpor recurso.

O que a parte pode fazer caso o Presidente (ou Vice) do Tribunal não admita o REsp? Qual é o recurso cabível contra essa decisão?

CPC/1973 CPC/2015

Agravo nos próprios autos, previsto no art. 544. Também chamado de “agravo em recurso especial” (no caso do REsp) ou “agravo em recurso extraordinário” (no caso do RE).

1) Se a inadmissão do Presidente do Tribunal de origem foi com base no inciso I do art. 1.030 do CPC/2015: cabe agravo interno, que será julgado pelo próprio Tribunal de origem.

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2) Se a inadmissão foi com fundamento no inciso V do art. 1.030: cabe “agravo em recurso especial e extraordinário”, recurso previsto no art. 1.042 do CPC/2015.

O que o STJ decidiu sobre esse agravo do art. 544 do CPC/1973: O recorrente, que interpuser “agravo em recurso especial” (art. 544 do CPC/1973), deverá impugnar especificamente TODOS os fundamentos constantes da decisão de inadmissibilidade do recurso especial: Na vigência do CPC/1973, era possível afirmar o seguinte: • Em regra, o recorrente podia escolher quais os fundamentos da decisão recorrida que pretendia que fosse reformada, de acordo com o princípio da dialeticidade. Assim, em regra, era possível eleger os fundamentos que serão objeto do recurso. Isso estava previsto no art. 514, II c/c art. 505 do CPC/1973. • Exceção: no caso do agravo interposto contra decisão denegatória de admissibilidade do recurso especial, era necessário que o recorrente atacasse todos os fundamentos da decisão agravada. Essa exceção estava prevista no art. 544, § 4º, I, do CPC/1973:

Art. 544 (...) § 4º No Supremo Tribunal Federal e no Superior Tribunal de Justiça, o julgamento do agravo obedecerá ao disposto no respectivo regimento interno, podendo o relator: I - não conhecer do agravo manifestamente inadmissível ou que não tenha atacado especificamente os fundamentos da decisão agravada;

Para o STJ, essa expressão “especificamente” significa TODOS os fundamentos da decisão agravada. O regimento interno do STJ tem disposição que confirma essa ideia:

Art. 253. O agravo interposto de decisão que não admitiu o recurso especial obedecerá, no Tribunal de origem, às normas da legislação processual vigente. Parágrafo único. Distribuído o agravo e ouvido, se necessário, o Ministério Público no prazo de cinco dias, o relator poderá: I - não conhecer do agravo inadmissível, prejudicado ou daquele que não tenha impugnado especificamente todos os fundamentos da decisão recorrida;

A interpretação literal e pragmática da norma regimental permite afirmar que todos os fundamentos utilizados pelo Tribunal de origem para inadmitir o recurso especial, independentemente de eventual caráter autônomo, deverão ser impugnados, sob pena de não conhecimento do agravo em recurso especial. A decisão que não admite o recurso especial não é formada por capítulos autônomos. Nela existe um único dispositivo (ela é incindível). Logo, todos os fundamentos que a embasam devem ser atacados. Aplica-se aqui, por analogia, a Súmula 182 do STJ:

Súmula 182-STJ: É inviável o agravo do art. 545 do CPC (1973) que deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisão agravada.

Ex: a decisão do Presidente do TJ não admitiu o Resp com base em dois fundamentos: • violação do art. 535 do CPC/1973; e • incidência da Súmula nº 7-STJ. Se a parte agravante impugnar apenas um desses fundamentos, o agravo não será conhecido.

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Em suma:

A decisão de inadmissibilidade do recurso especial não é formada por capítulos autônomos, mas por um único dispositivo, o que exige sua impugnação total. STJ. Corte Especial. EAREsp 831.326-SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Rel. Acd. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 19/09/2018 (Info 638).

O julgado acima foi baseado no CPC/1973. O entendimento exposto permanece com o CPC/2015? SIM. Existem vários precedentes já na vigência do CPC/2015 aplicando o mesmo entendimento, com base no art. 933, do CPC vigente e também no Regimento Interno do STJ. Nesse sentido:

Incumbe ao agravante infirmar, especificamente, todos os fundamentos da decisão que inadmitiu o Recurso Especial, demonstrando o seu desacerto, de modo a justificar o processamento do apelo nobre, sob pena de não ser conhecido o Agravo (art. 932, III, do CPC vigente). STJ. 2ª Turma. AgInt no AREsp 1122084/RS, Rel. Min. Assusete Magalhães, julgado em 05/12/2017.

Nos termos da 182 da Súmula desta Corte, é manifestamente inadmissível o agravo em recurso especial que não impugna, especificamente, todos os fundamentos da decisão confrontada. STJ. 6ª Turma. AgRg no AREsp 915.415/ES, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 05/09/2017.

Cuidado com a parte final do art. 1.042 do CPC/2015 O art. 1.042 do CPC/2015 veda o cabimento do agravo contra decisão do Tribunal a quo que inadmitir o recurso especial, com base na aplicação do entendimento consagrado no julgamento de recurso repetitivo:

Art. 1.042. Cabe agravo contra decisão do presidente ou do vice-presidente do tribunal recorrido que inadmitir recurso extraordinário ou recurso especial, salvo quando fundada na aplicação de entendimento firmado em regime de repercussão geral ou em julgamento de recursos repetitivos.

Neste caso, conforme expus no quadro comparativo no início da explicação, será cabível apenas agravo interno para o Tribunal de origem, nos termos do art. 1.030, § 2º, do CPC/2015:

Art. 1.030. Recebida a petição do recurso pela secretaria do tribunal, o recorrido será intimado para apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias, findo o qual os autos serão conclusos ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal recorrido, que deverá: I – negar seguimento: a) a recurso extraordinário que discuta questão constitucional à qual o Supremo Tribunal Federal não tenha reconhecido a existência de repercussão geral ou a recurso extraordinário interposto contra acórdão que esteja em conformidade com entendimento do Supremo Tribunal Federal exarado no regime de repercussão geral; b) a recurso extraordinário ou a recurso especial interposto contra acórdão que esteja em conformidade com entendimento do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça, respectivamente, exarado no regime de julgamento de recursos repetitivos; (...) III – sobrestar o recurso que versar sobre controvérsia de caráter repetitivo ainda não decidida pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme se trate de matéria constitucional ou infraconstitucional; (...) § 2º Da decisão proferida com fundamento nos incisos I e III caberá agravo interno, nos termos do art. 1.021.

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EXECUÇÃO O agravo de instrumento não pode ser utilizado como meio de impugnação de

toda e qualquer decisão interlocutória proferida no processo de execução

Não cabe agravo de instrumento contra decisão do juiz que determina a elaboração dos cálculos judiciais e estabelece os parâmetros de sua realização.

STJ. 2ª Turma. REsp 1.700.305-PB, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 25/09/2018 (Info 638).

Imagine a seguinte situação hipotética: No curso do processo de execução movido por João contra a União, o juiz federal proferiu decisão na qual determinou o envio dos autos ao contador judicial para elaboração de cálculos. Nesta decisão, o magistrado determinou que o contador utilizasse os índices de juros e correção monetária previstos no “Manual de Cálculos da Justiça Federal” para fins de atualização do valor devido. A União entende que os índices estabelecidos no Manual de Cálculos lhe são desfavoráveis e, por isso, interpôs agravo de instrumento contra a decisão. A recorrente fundamentou o cabimento do agravo de instrumento no parágrafo único do art. 1.015 do CPC/2015:

Art. 1.015 (...) Parágrafo único. Também caberá agravo de instrumento contra decisões interlocutórias proferidas na fase de liquidação de sentença ou de cumprimento de sentença, no processo de execução e no processo de inventário.

Houve discussão sobre o cabimento ou não do agravo de instrumento nesta hipótese e a questão chegou até o STJ. Cabe agravo de instrumento neste caso? NÃO. A fim de otimizar o Código de Processo Civil, o parágrafo único do art. 1.015 deve ser interpretado restritivamente. Assim, não se deve admitir o agravo de instrumento como meio de impugnação de toda e qualquer decisão interlocutória proferida no processo de execução. Se isso for admitido irá prejudicar a celeridade que se espera do trâmite processual. Se a cada decisão proferida pelo juiz na execução for possível um agravo de instrumento para o Tribunal de 2ª instância, haverá uma drástica diminuição na efetividade do processo. Segundo entendeu o Min. Herman Benjamin, não há motivo para se admitir o agravo de instrumento contra esta decisão considerando que, como consignado na Exposição de Motivos do CPC, “todas as decisões anteriores à sentença podem ser impugnadas na Apelação”. Assim sendo, para o Ministro, o novo diploma processual postergou o momento de sua impugnação. Em suma:

Não cabe agravo de instrumento contra decisão do juiz que determina a elaboração dos cálculos judiciais e estabelece os parâmetros de sua realização. STJ. 2ª Turma. REsp 1.700.305-PB, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 25/09/2018 (Info 638).

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MANDADO DE SEGURANÇA Súmula 628-STJ

Súmula 628-STJ: A teoria da encampação é aplicada no mandado de segurança quando presentes, cumulativamente, os seguintes requisitos:

a) existência de vínculo hierárquico entre a autoridade que prestou informações e a que ordenou a prática do ato impugnado;

b) manifestação a respeito do mérito nas informações prestadas; e

c) ausência de modificação de competência estabelecida na Constituição Federal.

STJ. 1ª Seção. Aprovada em 12/12/2018, DJe 17/12/2018.

Autoridade coatora O mandado de segurança é impetrado contra o ato de uma autoridade coatora. Nesse sentido, veja o que diz o art. 5º, LXIX, da CF/88:

LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público;

No mesmo sentido é a redação da Lei do Mandado de Segurança (Lei nº 12.016/2009):

Art. 1º Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça. § 1º Equiparam-se às autoridades, para os efeitos desta Lei, os representantes ou órgãos de partidos políticos e os administradores de entidades autárquicas, bem como os dirigentes de pessoas jurídicas ou as pessoas naturais no exercício de atribuições do poder público, somente no que disser respeito a essas atribuições.

E quem é a autoridade coatora, no caso concreto? Considera-se autoridade coatora: • a pessoa que praticou o ato impugnado; ou • a pessoa da qual emanou a ordem para a sua prática (pessoa que mandou o ato ser praticado).

Petição inicial Na petição inicial do MS deverá ser expressamente indicada quem é a autoridade coatora:

Art. 6º A petição inicial, que deverá preencher os requisitos estabelecidos pela lei processual, será apresentada em 2 (duas) vias com os documentos que instruírem a primeira reproduzidos na segunda e indicará, além da autoridade coatora, a pessoa jurídica que esta integra, à qual se acha vinculada ou da qual exerce atribuições.

Indicação errada da autoridade coatora A Administração Pública é cheia de meandros, setores, gerências, departamentos e outros subdivisões, de forma que nem sempre é uma tarefa fácil identificar, com exatidão, quem foi o responsável pela ordem. Diante disso, na prática, verificava-se que o indivíduo impetrava o mandado de segurança indicando, por exemplo, como autoridade coatora, o diretor de determinado departamento da Secretaria de Estado. Nas informações do mandado de segurança, este diretor vinha dizendo que a indicação da autoridade foi errada, considerando que o responsável pelo ato seria o subdiretor. Ao final, a autoridade pedia que o mandado de segurança fosse extinto sem resolução do mérito por ilegitimidade passiva.

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Teoria da encampação Situações como a acima expostas, não se revelam razoáveis, tendo em vista que o mandado de segurança é um remédio constitucional idealizado para a garantia de direitos, não podendo seu acesso ser inviabilizado por dificuldades burocráticas de se identificar o verdadeiro autor do ato impugnado na Administração Pública. Diante desse cenário, há muitos anos, a doutrina e a jurisprudência idealizaram a chamada “teoria da encampação”, por meio da qual se busca relativizar esse “erro” na indicação da autoridade coatora, desde que cumpridos determinados requisitos. Primeiros precedentes Essa teoria da encampação não se encontra expressamente regulamentada em lei. Dessa forma, o STJ construiu três requisitos para que ela seja aceita. Um dos primeiros precedentes do STJ a discorrer, de forma sistematizada, sobre tais requisitos foi em 2008, no RMS 12.779/DF (o STJ já havia tratado sobre a teoria, mas sem organizá-la em requisitos no MS 10.484/DF, do ano 2005). No RMS 12.779/DF, a situação concreta foi a seguinte: Determinada Fundação Educacional e Cultural impetrou mandado de segurança indicando como autoridade coatora o Ministro de Estado da Previdência Social. Como o MS era contra Ministro de Estado, ele foi ajuizado no STJ (art. 105, I, “b”, da CF/88). A impetrante alegou que seu “Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social” (CEBAS) foi indevidamente cancelado e, com isso, a Fundação ficou sem poder gozar dos benefícios da imunidade tributária. O Ministro da Previdência Social apresentou as informações no mandado de segurança dizendo que: • o documento cancelando o CEBAS foi assinado pelo Chefe da Seção de Orientação da Arrecadação Previdenciária (e não por ele, Ministro). Logo, a impetrante teria indicado a autoridade errada. • caso não se concorde com isso, a segurança não deve ser concedida porque esse cancelamento observou a lei e a impetrante não tem direito realmente ao CEBAS. Requisitos O STJ, ao apreciar este caso acima relatado (RMS 12.779/DF), afirmou que são três os requisitos para aplicação da teoria da encampação no mandado de segurança: a) existência de vínculo hierárquico entre a autoridade que prestou informações e a que ordenou a prática do ato impugnado; b) manifestação a respeito do mérito nas informações prestadas; e c) ausência de modificação de competência estabelecida na Constituição Federal. a) vínculo hierárquico entre as autoridades No caso concreto, o Ministro da Previdência alegou que quem praticou o ato foi o Chefe de Arrecadação Previdenciária. Está certo. No entanto, esse Chefe de Arrecadação está subordinado hierarquicamente ao Ministro, de forma que o primeiro requisito da teoria da encampação está preenchido. b) defesa do mérito do ato O segundo requisito para a aplicação da teoria é que a autoridade que foi indicada no MS e que apresentou as informações tenha se manifestado a respeito do mérito do ato impugnado. Esse requisito também foi preenchido, considerando que o Ministro afirmou, expressamente, que o ato praticado foi legal e que a impetrante não teria direito. c) ausência de modificação de competência Esse terceiro requisito significa o seguinte: A autoridade indicada no MS foi “A”. No entanto, a autoridade que praticou o ato realmente foi “B”.

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Se o mandado de segurança tivesse sido impetrado contra a autoridade correta (ou seja, contra “B”), esta ação estaria tramitando perante o mesmo juiz ou Tribunal que está agora? O mandado de segurança proposto contra “A” é julgado pelo mesmo juízo que julgaria o mandado de segurança impetrado contra “B”? Se a resposta for sim para essas perguntas, o terceiro requisito está preenchido. Por outro lado, se a Constituição Federal prever que o mandado de segurança impetrado contra a autoridade “A” é julgado pelo Tribunal e que o mandado de segurança contra a autoridade “B” é de competência da 1ª instância, neste caso, não será possível aplicar a teoria da encampação. Isso porque, na prática, estaria havendo uma burla às regras de competência. A parte autora poderia, de forma maliciosa, indicar autoridade errada para escolher outro juízo que não fosse o natural. No caso concreto acima explicado (RMS 12.779/DF), este terceiro requisito não foi preenchido e, por isso, a teoria da encampação não pode ser aplicada. O mandado de segurança contra o Ministro da Previdência era de competência do STJ. Por outro lado, o mandado de segurança contra o Chefe de Arrecadação Previdenciária deveria ter sido impetrado perante um juiz federal de 1ª instância (art. 109, VIII, da CF/88). Logo, se fosse admitida a teoria da encampação, teríamos uma modificação da competência que é prevista na Constituição Federal. Veja trecho da ementa:

(...) 1. São três os requisitos para aplicação da teoria da encampação no mandado de segurança: existência de vínculo hierárquico entre a autoridade que prestou informações e a que ordenou a prática do ato impugnado; ausência de modificação de competência estabelecida na Constituição Federal; e manifestação a respeito do mérito nas informações prestadas. Precedente da Primeira Seção: MS 10.484/DF, Rel. Min. José Delgado. 2. O ato coator apontado foi exarado pelo Chefe da Seção de Orientação da Arrecadação Previdenciária, da Delegacia da Receita Previdenciária de Niterói/RJ, vinculada à Secretaria da Receita Previdenciária do Ministério da Previdência Social. 3. O conhecimento do writ esbarra na alteração de competência estabelecida pela Carta da República. (...) STJ. 1ª Seção. MS 12.779/DF, Rel. Min. Castro Meira, julgado em 13/02/2008.

E se houver modificação de competência prevista na Constituição Estadual? As Constituições Estaduais também trazem regras de competência para mandado de segurança. Como exemplo, em geral, as Cartas estaduais preveem que os mandados de segurança impetrados contra Governador e Secretários de Estado são de competência do Tribunal de Justiça. É possível adotar a teoria da encampação mesmo que haja uma modificação de competência estabelecida em Constituição Estadual? Não. Apesar de a letra “c” da Súmula falar apenas em Constituição Federal, podemos encontrar inúmeros julgados do STJ afirmando que a teoria da encampação também não se aplica se isso implicar em mudança das regras de competência definidas na Constituição Estadual. Ex: o autor impetrou, no TJ, mandado de segurança contra o Secretário de Estado de Educação; ocorre que o ato foi praticado por um diretor de departamento pedagógico (que é julgado em 1ª instância); logo, mesmo que o Secretário defenda o ato nas informações do MS, ainda assim o processo deverá ser extinto sem resolução do mérito. Nesse sentido:

(...) Revela-se incabível falar em aplicação da teoria da encampação, uma vez que a indevida presença do Secretário da Fazenda no polo passivo do Mandado de Segurança modificaria a regra de competência jurisdicional disciplinada pela Constituição do Estado. (...) STJ. 1ª Turma. AgInt no RMS 56.103/MG, Rel. Min. Regina Helena Costa, julgado em 23/08/2018.

Emenda da inicial ou correção de ofício Outra situação importante e que deve ser destacada aqui é que, algumas vezes, o órgão julgador já percebe, no momento da propositura, que a indicação da autoridade coatora foi incorreta.

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Nestes casos, o órgão julgador (juiz ou Relator) deverá determinar a emenda da inicial ou, se o erro for escusável, fazer a correção de ofício, desde que isso não implique modificação de competência. Ex: candidato aprovado dentro do número de vagas para o concurso de professor estadual impetra mandado de segurança contra o Secretário de Educação pedindo a nomeação. Ocorre que não é o Secretário quem nomeia, mas sim o Governador do Estado. O Relator deverá determinar que o autor emende a Inicial para corrigir a autoridade coatora. Vale ressaltar que isso é possível porque, em regra, o MS impetrado tanto contra o Governador como contra o Secretário é julgado pelo TJ. Veja precedente do STJ nesse sentido:

(...) O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento de que "considerando a finalidade precípua do mandado de segurança que é a proteção de direito líquido e certo, que se mostre configurado de plano, bem como da garantia individual perante o Estado, sua finalidade assume vital importância, o que significa dizer que as questões de forma não devem, em princípio, inviabilizar a questão de fundo gravitante sobre ato abusivo da autoridade. Consequentemente, o Juiz, ao deparar-se, em sede de mandado de segurança, com a errônea indicação da autoridade coatora, deve determinar a emenda da inicial ou, na hipótese de erro escusável, corrigi-lo de ofício, e não extinguir o processo sem julgamento do mérito" (REsp 865.391/BA, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 7/8/2008. 2. Recurso Ordinário provido. STJ. 2ª Turma. RMS 55.062/MG, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 03/04/2018.

Veja o que estabelecem os arts. 338 e 339 do CPC/2015:

Art. 338. Alegando o réu, na contestação, ser parte ilegítima ou não ser o responsável pelo prejuízo invocado, o juiz facultará ao autor, em 15 (quinze) dias, a alteração da petição inicial para substituição do réu. Parágrafo único. Realizada a substituição, o autor reembolsará as despesas e pagará os honorários ao procurador do réu excluído, que serão fixados entre três e cinco por cento do valor da causa ou, sendo este irrisório, nos termos do art. 85, § 8º.

Art. 339. Quando alegar sua ilegitimidade, incumbe ao réu indicar o sujeito passivo da relação jurídica discutida sempre que tiver conhecimento, sob pena de arcar com as despesas processuais e de indenizar o autor pelos prejuízos decorrentes da falta de indicação. § 1º O autor, ao aceitar a indicação, procederá, no prazo de 15 (quinze) dias, à alteração da petição inicial para a substituição do réu, observando-se, ainda, o parágrafo único do art. 338. § 2º No prazo de 15 (quinze) dias, o autor pode optar por alterar a petição inicial para incluir, como litisconsorte passivo, o sujeito indicado pelo réu.

Leonardo da Cunha defende que esses dispositivos também devem ser aplicados para o processo de mandado de segurança, “permitindo que se corrija a autoridade coatora ou, até mesmo, a pessoa jurídica da qual ela faz parte. Assim, se a parte impetrou mandado de segurança, por exemplo, contra o Governador do Estado, mas a autoridade impetrada seria o Secretário de Estado, é possível corrigir. De igual modo, se impetrou contra o Governador do Estado, mas deveria ter indicado, como autoridade, o diretor de determinada autarquia, poderá haver a correção tanto da autoridade como da pessoa jurídica de cujos quadros faça parte.” (CUNHA, Leonardo Carneiro da. A Fazenda Pública em juízo. São Paulo: Forense, 2016, p. 534). Com a mesma conclusão:

Enunciado 511-FPPC: A técnica processual prevista nos arts. 338 e 339 pode ser usada, no que couber, para possibilitar a correção da autoridade coatora, bem como da pessoa jurídica, no processo de mandado de segurança.

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DIREITO PROCESSUAL PENAL

SENTENÇA É nula a sentença proferida de forma oral e degravada

parcialmente sem o registro das razões de decidir

Importante!!!

É nula a sentença proferida de forma oral e degravada parcialmente sem o registro das razões de decidir.

Nas alterações promovidas pela Lei nº 11.719/2008 no art. 405 do CPP, não se estabeleceu a possibilidade de se dispensar a transcrição de sentença penal registrada por meio audiovisual.

Ao contrário, manteve-se o art. 388 do CPP, que prevê a possibilidade da sentença “ser datilografada”, admitindo-se, na atualidade, a utilização de outros meios tecnológicos similares, como por exemplo o computador, para o seu registro escrito.

Daí a inaplicabilidade do disposto no art. 405, §§ 1º e 2º, do CPP - que permite a dispensa de transcrição de depoimentos - à sentença penal.

STJ. 5ª Turma. HC 336.112/SC, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 24/10/2017.

STJ. 6ª Turma. HC 470.034-SC, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 09/10/2018 (Info 638).

Imagine a seguinte situação hipotética: João foi denunciado pela prática de furto. Foi realizada audiência de instrução e julgamento na qual foram ouvidas as testemunhas e realizado o interrogatório. Depois das oitivas, o Promotor de Justiça e o advogado ofereceram alegações finais orais. Vale ressaltar que todos os atos da audiência foram gravados em meio audiovisual. Em seguida, o juiz proferiu a sentença, na própria audiência. Até aí, tudo bem. O CPP, inclusive, prefere que seja assim:

Art. 403. Não havendo requerimento de diligências, ou sendo indeferido, serão oferecidas alegações finais orais por 20 (vinte) minutos, respectivamente, pela acusação e pela defesa, prorrogáveis por mais 10 (dez), proferindo o juiz, a seguir, sentença. (...) § 3º O juiz poderá, considerada a complexidade do caso ou o número de acusados, conceder às partes o prazo de 5 (cinco) dias sucessivamente para a apresentação de memoriais. Nesse caso, terá o prazo de 10 (dez) dias para proferir a sentença.

Art. 405. Do ocorrido em audiência será lavrado termo em livro próprio, assinado pelo juiz e pelas partes, contendo breve resumo dos fatos relevantes nela ocorridos. § 1º Sempre que possível, o registro dos depoimentos do investigado, indiciado, ofendido e testemunhas será feito pelos meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica similar, inclusive audiovisual, destinada a obter maior fidelidade das informações. § 2º No caso de registro por meio audiovisual, será encaminhado às partes cópia do registro original, sem necessidade de transcrição.

O “problema” foi que o magistrado resolveu também proferir a sentença oralmente. Assim, o juiz, falando ao microfone e sendo filmado, analisou as provas produzidas e concluiu pela condenação do réu.

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Na ata da audiência, o juiz transcreveu apenas a dosimetria da pena e o dispositivo. Essa sentença é válida? NÃO.

É nula a sentença proferida de forma oral e degravada parcialmente sem o registro das razões de decidir. STJ. 6ª Turma. HC 470.034-SC, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 09/10/2018 (Info 638).

O art. 405 do Código de Processo Penal possibilita o registro dos termos da audiência de instrução em meio audiovisual. Tal regra, que foi inserida no CPP pela Lei nº 11.719/2008, tem dois objetivos: 1) abreviar o tempo de realização do ato, considerando que não será necessário reduzir a termo todos os depoimentos (o que consumia MUITO tempo); 2) possibilitar o registro fiel da íntegra do ato, com imagem e som, em vez da simples escrita, permitindo ver as expressões não verbais das testemunhas, vítima e réu. O art. 405 do CPP não autoriza, contudo, que a sentença seja proferida oralmente, sem ser escrita. Assim, ainda persiste a exigência de que a sentença seja reduzida a termo (assuma forma escrita), nos termos do art. 388 do CPP:

Art. 388. A sentença poderá ser datilografada e neste caso o juiz a rubricará em todas as folhas.

A busca da celeridade na prestação jurisdicional não dispensa a forma escrita da sentença. No caso concreto, ainda que parte da sentença tenha sido escrita (dosimetria e dispositivo), houve nulidade porque não foram transcritas as razões de decidir. Nesse sentido:

Nas alterações promovidas pela Lei n. 11.719/2008, não se estabeleceu a possibilidade de se dispensar a transcrição de sentença penal registrada por meio audiovisual (ex vi, do título XII do CPP). Ao contrário, manteve-se o art. 388 do CPP, que prevê a possibilidade da sentença “ser datilografada”, admitindo-se, na atualidade, a utilização de outros meios tecnológicos similares, como por exemplo o computador, para o seu registro escrito. Daí a inaplicabilidade do disposto no art. 405, §§ 1º e 2º, do CPP - que permite a dispensa de transcrição de depoimentos - à sentença penal. STJ. 5ª Turma. HC 336.112/SC, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 24/10/2017.

Uma pergunta correlata: as oitivas das testemunhas, vítima e réu e as alegações finais do MP e da defesa, se forem feitas oralmente, precisam ser transcritas? Há necessidade de degravação? NÃO.

Não há necessidade de degravação no caso de depoimentos colhidos por gravação audiovisual, cabendo ao interessado promovê-la, a suas expensas e com sua estrutura, se assim o desejar, ficando vedado requerer ou determinar tal providência ao Juízo de primeiro grau. STJ. 5ª Turma. HC 339.357/RS, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 08/03/2016.

O registro audiovisual de depoimentos colhidos em audiência dispensa sua degravação, salvo comprovada demonstração de sua necessidade. STJ. 6ª Turma. RMS 36.625/MT, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 30/06/2016.

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TRIBUNAL DO JÚRI É possível a pronúncia do acusado baseada exclusivamente em elementos informativos obtidos na fase inquisitorial?

Importante!!!

É possível a pronúncia do acusado baseada exclusivamente em elementos informativos obtidos na fase inquisitorial?

• NÃO. Haverá violação ao art. 155 do CPP. Além disso, muito embora a análise aprofundada seja feita somente pelo Júri, não se pode admitir, em um Estado Democrático de Direito, a pronúncia sem qualquer lastro probatório colhido sob o contraditório judicial, fundada exclusivamente em elementos informativos obtidos na fase inquisitorial.

STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1.740.921-GO, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 06/11/2018 (Info 638).

STJ. 6ª Turma. HC 341.072/RS, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 19/4/2016.

• SIM. É possível admitir a pronúncia do acusado com base em indícios derivados do inquérito policial, sem que isso represente afronta ao art. 155. Embora a vedação imposta no art. 155 se aplique a qualquer procedimento penal, inclusive dos do Júri, não se pode perder de vista o objetivo da decisão de pronúncia não é o de condenar, mas apenas o de encerrar o juízo de admissibilidade da acusação (iudicium accusationis). Na pronúncia opera o princípio in dubio pro societate, porque é a favor da sociedade que se resolvem as dúvidas quanto à prova, pelo Juízo natural da causa. Constitui a pronúncia, portanto, juízo fundado de suspeita, que apenas e tão somente admite a acusação. Não profere juízo de certeza, necessário para a condenação, motivo pelo qual a vedação expressa do art. 155 do CPP não se aplica à referida decisão.

STJ. 5ª Turma. HC 435.977/RS, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 15/05/2018.

STJ. 6ª Turma. REsp 1458386/PA, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 04/10/2018.

Obs: prevalece, no STJ, a segunda posição, ou seja, de que é possível a pronúncia.

Procedimento do Tribunal do Júri Quando a pessoa pratica um crime doloso contra a vida, ela responde a um processo penal que é regido por um procedimento especial próprio do Tribunal do Júri (arts. 406 a 497 do CPP). Procedimento bifásico do Tribunal do Júri O procedimento do Tribunal do Júri é chamado de bifásico (ou escalonado) porque se divide em duas etapas: 1) Fase do sumário da culpa (iudicium accusationis): é a fase de acusação e instrução preliminar (formação da culpa). Inicia-se com o oferecimento da denúncia (ou queixa) e termina com a preclusão da sentença de pronúncia. 2) Fase de julgamento (iudicium causae). Sentença que encerra o sumário da culpa Ao final da 1ª fase do procedimento do júri (sumário da culpa), o juiz irá proferir uma sentença, que poderá ser de quatro modos:

PRONÚNCIA IMPRONÚNCIA ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA DESCLASSIFICAÇÃO O réu será pronunciado quando o juiz se convencer de que existem prova da materialidade do fato e indícios suficientes de autoria ou de participação.

O réu será impronunciado quando o juiz não se convencer: • da materialidade do fato;

O réu será absolvido, desde logo, quando estiver provado (a): • a inexistência do fato; • que o réu não é autor ou partícipe do fato;

Ocorre quando o juiz se convencer de que o fato narrado não é um crime doloso contra a vida, mas sim um outro delito, devendo,

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• da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação. Ex.: a única testemunha que havia reconhecido o réu no IP não foi ouvida em juízo.

• que o fato não constitui crime; • que existe uma causa de isenção de pena ou de exclusão do crime. Ex.: todas as testemunhas ouvidas afirmaram que o réu não foi o autor dos disparos.

então, remeter o processo para o juízo competente. Ex.: juiz entende que não houve homicídio doloso, mas sim latrocínio.

Recurso cabível: RESE. Recurso cabível: APELAÇÃO. Recurso cabível: APELAÇÃO. Recurso cabível: RESE.

Pronúncia A pronúncia é prevista no art. 413 do CPP. Veja o que dizem o caput e o § 1º:

Art. 413. O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação. § 1º A fundamentação da pronúncia limitar-se-á à indicação da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, devendo o juiz declarar o dispositivo legal em que julgar incurso o acusado e especificar as circunstâncias qualificadoras e as causas de aumento de pena. (...)

Indaga-se: é possível a pronúncia do acusado baseada apenas em elementos informativos obtidos na fase inquisitorial? O tema é polêmico e há decisões em ambos os sentidos:

É possível a pronúncia do acusado baseada exclusivamente em elementos informativos obtidos na fase inquisitorial?

NÃO SIM

O principal fundamento seria o art. 155 do CPP: Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. A decisão de pronúncia é um mero juízo de admissibilidade da acusação, não sendo exigido, neste momento processual, prova incontroversa (bastam indícios suficientes de autoria e certeza da materialidade). Muito embora a análise aprofundada seja feita somente pelo Júri, não se pode admitir, em um Estado Democrático de Direito, a pronúncia sem qualquer lastro probatório colhido sob o contraditório judicial, fundada exclusivamente em

É possível admitir a pronúncia do acusado com base em indícios derivados do inquérito policial, sem que isso represente afronta ao art. 155. Embora a vedação imposta no art. 155 (decisão fundada exclusivamente em elementos informativos colhidos na investigação) se aplique a qualquer procedimento penal, inclusive dos do Júri, não se pode perder de vista que o objetivo da decisão de pronúncia não é o de condenar, mas apenas o de encerrar o juízo de admissibilidade da acusação (iudicium accusationis). Na pronúncia opera o princípio in dubio pro societate, porque é a favor da sociedade que se resolvem as dúvidas quanto à prova, pelo Juízo natural da causa. Constitui a pronúncia, portanto, juízo fundado de suspeita, que apenas e tão somente admite a acusação. Não profere juízo de certeza, necessário para a condenação, motivo

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elementos informativos obtidos na fase inquisitorial.

pelo qual a vedação expressa do art. 155 do CPP não se aplica à referida decisão.

STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1.740.921-GO, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 06/11/2018. STJ. 6ª Turma. HC 341.072/RS, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 19/4/2016.

STJ. 5ª Turma. HC 435.977/RS, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 15/05/2018. STJ. 6ª Turma. REsp 1458386/PA, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 04/10/2018.

No STJ, prevalece a segunda posição, ou seja, é possível admitir a pronúncia do acusado com base em indícios derivados do inquérito policial, sem que isso represente afronta ao art. 155 do CPP.

DIREITO TRIBUTÁRIO

PRESCRIÇÃO Parcelamento de ofício não interfere no curso do prazo prescricional

IPTU

Termo inicial do prazo prescricional em caso de IPTU

Parcelamento de ofício não interfere no curso do prazo prescricional

O parcelamento de ofício da dívida tributária não configura causa interruptiva da contagem da prescrição, uma vez que o contribuinte não anuiu.

STJ. 1ª Seção. REsp 1.658.517-PA, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 14/11/2018 (recurso repetitivo) (Info 638).

Termo inicial do prazo prescricional em caso de IPTU

O termo inicial do prazo prescricional da cobrança judicial do Imposto Predial e Territorial Urbano - IPTU - inicia-se no dia seguinte à data estipulada para o vencimento da exação.

STJ. 1ª Seção. REsp 1.658.517-PA, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 14/11/2018 (recurso repetitivo) (Info 638).

Imagine a seguinte situação hipotética: João é proprietário de um imóvel urbano (uma casa). Logo, ele é contribuinte de IPTU. O IPTU é um imposto sujeito a lançamento de ofício. O lançamento de ofício (ou direto) é aquele no qual o Fisco, sem a ajuda do contribuinte, calcula o valor do imposto devido e cobra do sujeito passivo. A Administração tributária já possui, de antemão, os elementos informativos para realizar a constituição do crédito tributário, não dependendo de nenhuma providência do contribuinte para isso. Em outras palavras, o próprio Fisco, sozinho, já calcula quanto o contribuinte deverá pagar e apenas o avisa: pague este valor de imposto até o dia XX. Notificação do lançamento Após o Fisco realizar o lançamento, ele precisa comunicar que fez isso ao sujeito passivo para que este possa pagar o tributo ou impugná-lo, caso não concorde com o que está sendo cobrado.

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"É a notificação que confere efeitos ao lançamento realizado, pois antes daquela não se conta prazo para pagamento ou impugnação." (ALEXANDRE, Ricardo. Direito tributário esquematizado. 10ª ed., São Paulo: Método, 2016, p. 377). Forma de notificação do contribuinte O CTN não prevê a forma como o contribuinte deverá ser notificado de que houve o lançamento de ofício e de que ele deverá pagar o tributo. Diante dessa lacuna, a jurisprudência entende que a legislação que rege cada tributo poderá disciplinar o meio idôneo para essa notificação. No caso do IPTU, por exemplo, a maioria das leis municipais prevê que a notificação ocorre mediante o envio de uma correspondência ao sujeito passivo. Esse procedimento é considerado legítimo:

Súmula 397-STJ: O contribuinte do IPTU é notificado do lançamento pelo envio do carnê ao seu endereço.

Alguns Municípios, no início do ano, divulgam um calendário informando os proprietários dos imóveis urbanos que deverão efetuar o pagamento do IPTU em determinada data. Este modo de notificação é válido? SIM. O envio do carnê é apenas uma modalidade, que não exclui outras eventualmente mais convenientes para a Administração, como é o caso da divulgação de um calendário de pagamento, com instruções para os contribuintes fazerem o pagamento. Qual é a principal função da notificação do contribuinte do IPTU? A notificação do contribuinte para o recolhimento do IPTU perfectibiliza a constituição definitiva do crédito tributário. Em outras palavras, com a notificação do contribuinte para o recolhimento da exação (pagamento do tributo) ocorre a constituição definitiva do crédito tributário. João recebeu o carnê de pagamento Em 10/01/2012, João recebeu, por correio, o carnê do IPTU relativo a este imóvel. Neste momento, João foi notificado de que o Fisco municipal fez o lançamento do imposto. Dia de vencimento No carnê do IPTU, havia duas opções de pagamento para o contribuinte: • à vista (com desconto de 15%), que deveria ser pago até 05/02/2012; ou • parceladamente, em 10 parcelas, sendo que a última era para o dia 05/11/2012. Vale ressaltar que esse parcelamento é oferecido ao contribuinte sem que ele tenha pedido. Não houve requerimento. Já chegou no carnê essa possibilidade para todos. Por essa razão, é chamado pela jurisprudência de “parcelamento de ofício”, ou seja, por iniciativa da própria Administração Tributária. Se o contribuinte não pagar, o que o Fisco deverá fazer? Deverá ajuizar uma execução fiscal cobrando o crédito tributário. Existe um prazo para que o Fisco ajuíze essa execução fiscal? SIM. Ele possui o prazo prescricional de 5 anos. Passado esse prazo, ocorre a prescrição, nos termos do art. 174 do CTN:

Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva.

Consideremos que João não pagou o IPTU.

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Quando iniciou a contagem do prazo prescricional para que o Fisco ajuíze a execução cobrando o imposto não pago? Esse prazo se iniciou em 06/02/2012 (um dia após a data estipulada para pagamento da cota única). O STJ definiu a seguinte tese:

O termo inicial do prazo prescricional da cobrança judicial do Imposto Predial e Territorial Urbano - IPTU - inicia-se no dia seguinte à data estipulada para o vencimento da exação. STJ. 1ª Seção. REsp 1.658.517-PA, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 14/11/2018 (recurso repetitivo) (Info 638).

No caso, por se tratar de lançamento de ofício, o prazo prescricional de cinco anos para que a Fazenda Pública realize a cobrança judicial de seu crédito tributário começa a fluir somente após o vencimento do prazo estabelecido pela lei local para o vencimento da exação (pagamento voluntário pelo contribuinte). Isso porque, embora o crédito já esteja constituído com o recebimento do carnê pelo contribuinte, a Fazenda ainda não pode executar considerando que a lei deu ao contribuinte um prazo para pagamento voluntário. Ex: João recebeu o carnê dia 10/01/2012; já está constituído o crédito tributário; ocorre que o Fisco ainda não pode executar o crédito; isso porque a data de vencimento do IPTU (conforme legislação local) é dia 05/02/2012; logo, antes de esgotado esse prazo para pagamento voluntário, não começou a ser contado o prazo prescricional. A pretensão executória surge, portanto, somente a partir do dia seguinte ao vencimento estabelecido no carnê encaminhado ao endereço do contribuinte ou da data de vencimento fixada em lei local e amplamente divulgada através de calendário de pagamento. Releitura do art. 174 do CTN pelo STJ O art. 174 do CTN estabelece o seguinte:

Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva.

Para o STJ, a constituição definitiva do IPTU ocorre com a notificação do contribuinte para pagamento. Desse modo, se fossemos utilizar a redação literal do art. 174, o prazo prescricional teria início na data da notificação do sujeito passivo (constituição definitiva). Ex: no dia em que ele recebeu o carnê de pagamento ou na data em que foi divulgado o calendário de pagamentos. Ocorre que o STJ fez uma releitura dessa parte final do dispositivo e decidiu que o prazo prescricional deverá ser contado a partir do dia seguinte à data estipulada como vencimento do imposto. O STJ decidiu assim porque, antes de passar a data do vencimento do tributo, o Fisco ainda não poderá executar o contribuinte, que ainda nem pode ser considerado devedor. Até o último dia estabelecido para o vencimento, é assegurado ao contribuinte realizar o recolhimento voluntário, sem qualquer outro ônus, por meio das agências bancárias autorizadas ou até mesmo pela internet, ficando em mora tão somente a partir do dia seguinte. Desse modo, tem-se que a pretensão executória da Fazenda Pública (actio nata) somente surge no dia seguinte à data estipulada para o vencimento do tributo. Assim, o STJ “corrige” a parte final do art. 174, que deve ser lido da seguinte forma: a ação para a cobrança do crédito tributário decorrente de IPTU prescreve em cinco anos, contados do dia seguinte à data estipulada para o vencimento da exação. Alerta. Em concursos, se for cobrada a redação literal do art. 174 em provas objetivas, essa alternativa está correta. No entanto, se for falado em “entendimento do STJ”, deve-se adotar a redação da tese acima exposta.

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Como os Municípios geralmente oferecem esse parcelamento, no caso do IPTU teremos duas datas de vencimento: a do pagamento à vista e a do pagamento parcelado. Qual delas deverá ser considerada? Quando se inicia a contagem do prazo prescricional para que o Fisco ajuíze a execução cobrando o imposto não pago? Em nosso exemplo, esse prazo se iniciou em 06/02/2012 (um dia após a data estipulada para pagamento da cota única) ou o se iniciou em 06/11/2012 (um dia depois de terminado o prazo para pagamento parcelado)? O Fisco defendeu a tese de que, durante o prazo oferecido para parcelamento, não estaria correndo a prescrição. Segundo argumentou o Fisco, o parcelamento é uma forma de suspensão do crédito tributário, ou seja, enquanto o parcelamento estiver ativo (vigente), o Fisco não poderá dar início à execução fiscal contra o devedor. Logo, não pode estar sendo contado o prazo prescricional. O Município disse que deveria ser aplicado o inciso I ou o inciso VI do art. 151 do CTN:

Art. 151. Suspendem a exigibilidade do crédito tributário: I - moratória; (...) VI - o parcelamento.

A tese do Fisco foi acolhida pelo STJ? NÃO. O STJ definiu a tese de que o parcelamento de ofício da dívida tributária não configura causa interruptiva da contagem da prescrição. O “parcelamento de ofício” não tem o condão de suspender o prazo prescricional para a cobrança do IPTU, estendendo-o por mais dez meses além do vencimento da parcela única ou da primeira cota. A moratória é a dilação do prazo para pagamento por convenção das partes. Dessa forma, a moratória pressupõe um acordo entre credor e devedor, estabelecendo datas diferentes das previstas originalmente em lei para pagamento do tributo. Além disso, pressupõe a edição de uma lei para tratar da situação. O parcelamento é uma hipótese de moratória e, por isso, também está submetida à reserva legal (art. 97, VI do CTN). A liberalidade do Fisco em conceder ao contribuinte a opção de pagamento à vista (cota única) ou parcelado (10 cotas), independente de sua anuência prévia, não configura as hipóteses de suspensão do crédito tributário previstas no art. 151, I e VI do CTN (moratória ou parcelamento), tampouco causa de interrupção da prescrição, a qual exige o reconhecimento da dívida por parte do contribuinte (art. 174, parágrafo único, IV do CTN). Com efeito, não houve adesão a qualquer hipótese de parcelamento por parte do contribuinte ou reconhecimento de débito. Na verdade, o contribuinte do IPTU manteve-se inerte e sua inércia não pode ser interpretada como adesão automática à moratória ou parcelamento, passível de suspender a exigibilidade do crédito tributário. O contribuinte não pode ser despido da autonomia de sua vontade, em decorrência de uma opção unilateral do Estado, que resolve lhe conceder a opção de efetuar o pagamento em cotas parceladas. Se a Fazenda Pública municipal entende que é mais conveniente oferecer opções parceladas para pagamento do IPTU, ao tempo em que oferta ao contribuinte a possibilidade de quitação em cota única, com descontos que variam de 10 a 15% do crédito tributário constituído, o faz dentro de uma política fiscal, por mera liberalidade, o que não induz a conclusão de que houve moratória ou parcelamento. Em suma:

O parcelamento de ofício da dívida tributária não configura causa interruptiva da contagem da prescrição, uma vez que o contribuinte não anuiu. STJ. 1ª Seção. REsp 1.658.517-PA, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 14/11/2018 (recurso repetitivo) (Info 638).

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CRÉDITO TRIBUTÁRIO Súmula 622-STJ

Súmula 622-STJ: A notificação do auto de infração faz cessar a contagem da decadência para a constituição do crédito tributário; exaurida a instância administrativa com o decurso do prazo para a impugnação ou com a notificação de seu julgamento definitivo e esgotado o prazo concedido pela Administração para o pagamento voluntário, inicia-se o prazo prescricional para a cobrança judicial.

STJ. 1ª Seção. Aprovada em 12/12/2018, DJe 17/12/2018.

Fato gerador e obrigação tributária O contribuinte realiza o fato gerador do tributo (exs.: adquire renda, faz uma doação, chega no dia 01/01 sendo proprietário de um bem imóvel etc.). Quando o contribuinte realiza o fato gerador, torna-se sujeito passivo de uma obrigação tributária principal, ou seja, passa a ter a obrigação de pagar o tributo. Constituição do crédito tributário Diante dessa situação, o Fisco irá praticar um ato chamado de “lançamento tributário”. O lançamento é, portanto, o ato por meio do qual o Auditor Fiscal constata que ocorreu um fato gerador de tributo. Ele, então, identifica quem é o sujeito passivo (contribuinte), calcula o quanto do tributo é devido (aplicando a alíquota sobre a base de cálculo) e inclui também a multa (se for o caso). O crédito tributário é constituído (nasce) com um ato do Fisco chamado de “lançamento”. O lançamento confere exigibilidade à obrigação tributária. Com o lançamento, a obrigação tributária transforma-se em crédito tributário. Só depois que a obrigação tributária se transforme em crédito tributário é que ela se torna líquida e exigível e poderá ser executada. O Fisco possui, no entanto, um prazo para efetuar o lançamento. Se não fizer no prazo, haverá decadência. Decadência A decadência é, portanto, a perda do direito que o Fisco possui de fazer o lançamento em virtude de essa providência não ter sido feita no prazo de 5 anos. A decadência está prevista no art. 173 do CTN:

Art. 173. O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos, contados: I - do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado; II - da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado. Parágrafo único. O direito a que se refere este artigo extingue-se definitivamente com o decurso do prazo nele previsto, contado da data em que tenha sido iniciada a constituição do crédito tributário pela notificação, ao sujeito passivo, de qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento.

Auto de infração Auto de infração, normalmente conhecido pela sigla “AI”, é um procedimento administrativo realizado pelo Fisco caso constate alguma infração à legislação tributária. Trata-se de uma forma de lançamento de ofício.

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Notificação do auto de infração Imagine que a empresa “X” deixou de pagar um tributo federal, que venceu em setembro/2000. Vale ressaltar que esse tributo era sujeito a lançamento de ofício. Isso significa que a Receita Federal tinha 5 anos para fazer esse lançamento, iniciando-se o prazo em 1º de janeiro de 2001, conforme prevê o art. 173 do CTN:

Art. 173. O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos, contados: I – do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado;

Em outras palavras, em 01/01/2001 iniciou o prazo decadencial para que a Fazenda Pública fizesse o lançamento do tributo. Esse prazo se encerraria em 01/01/2006. Assim, se o Fisco não fizesse o lançamento até essa data (01/01/2006), haveria a decadência, que é uma causa de extinção do crédito tributário (art. 156, V, do CTN). Suponhamos, contudo, que o Fisco lavrou o auto de infração em 05/12/2005. No entanto, o Fisco terá ainda que notificar a empresa contribuinte sobre esse auto de infração. Notificação do lançamento Após o Fisco realizar o lançamento, ele precisa comunicar que fez isso ao sujeito passivo para que este possa pagar o tributo ou impugná-lo, caso não concorde com o que está sendo cobrado. “É a notificação que confere efeitos ao lançamento realizado, pois antes daquela não se conta prazo para pagamento ou impugnação.” (ALEXANDRE, Ricardo. Direito tributário esquematizado. 10ª ed., São Paulo: Método, 2016, p. 377). Voltando ao nosso exemplo Imaginemos que a notificação do auto de infração ocorreu em 10/12/2005. Repare que, por pouco, o Fisco não ultrapassa o prazo de 5 anos para lançar. Se ele tivesse ultrapassado, teria havido a decadência. A notificação do contribuinte perfectibiliza a constituição definitiva do crédito tributário. Com a notificação da empresa contribuinte sobre o auto de infração, termina a contagem da decadência, ou seja, o Fisco cumpriu o seu poder-dever de lançar. Essa é a primeira parte da Súmula 622: “A notificação do auto de infração faz cessar a contagem da decadência para a constituição do crédito tributário; (...)” Possibilidade de impugnação administrativa O sujeito passivo, depois de receber a notificação do auto de infração, terá um prazo (normalmente de 30 dias), ao final do qual poderá adotar uma de três opções: a) pagar; b) fazer a impugnação administrativa; c) ficar inerte. Assim, o contribuinte receberá a notificação do auto de infração, que terá um texto mais ou menos assim: “Fica o autuado intimado do conteúdo deste auto de infração para efetuar o pagamento ou apresentar impugnação, no prazo de 30 dias, na forma da Lei XXX”. Pagamento Se o contribuinte pagou, fica extinto o crédito tributário (art. 156, I, do CTN). Impugnação Se o contribuinte impugnou, esta impugnação será julgada em âmbito administrativo.

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• Se a impugnação for julgada procedente (contribuinte tem razão): o lançamento que foi realizado será desconstituído (ex: contribuinte não praticou o fato gerador) ou alterado (ex: Fisco calculou o valor errado). • Se a impugnação for julgada improcedente (contribuinte não tem razão) e não couber mais recurso (houve o julgamento definitivo na esfera administrativa): neste caso, a Administração Tributária deverá notificar o contribuinte sobre a decisão. No âmbito federal, depois que o contribuinte é notificado de que “perdeu” por decisão definitiva, ele ainda terá um prazo de 30 dias concedido pela Administração para pagamento voluntário. Isso está previsto no art. 43 c/c art. 21 do Decreto 70.235/72:

Art. 43. A decisão definitiva contrária ao sujeito passivo será cumprida no prazo para cobrança amigável fixado no artigo 21, aplicando-se, no caso de descumprimento, o disposto no § 3º do mesmo artigo.

Art. 21. Não sendo cumprida nem impugnada a exigência, a autoridade preparadora declarará a revelia, permanecendo o processo no órgão preparador, pelo prazo de trinta dias, para cobrança amigável. (...) § 3º Esgotado o prazo de cobrança amigável sem que tenha sido pago o crédito tributário, o órgão preparador declarará o sujeito passivo devedor remisso e encaminhará o processo à autoridade competente para promover a cobrança executiva.

Assim, com a notificação do contribuinte de que houve o julgamento definitivo e esgotado o prazo concedido pela Administração para o pagamento voluntário (30 dias), só resta agora ao Fisco executar judicialmente o crédito. Começa, então, o prazo prescricional para a Fazenda ajuizar a execução fiscal. Inércia Passado o prazo de 30 dias sem que o contribuinte tenha pagado nem impugnado: começa o prazo prescricional para o Fisco ajuizar a execução fiscal. Assim, esgotado o prazo para impugnar ou pagar, inicia-se o prazo prescricional para a cobrança judicial do crédito tributário. Segunda parte da súmula A segunda parte da súmula trata, portanto, do caso em que a impugnação é julgada improcedente ou da hipótese na qual o contribuinte fica inerte. Veja: (...) exaurida a instância administrativa com o decurso do prazo para a impugnação ou com a notificação de seu julgamento definitivo e esgotado o prazo concedido pela Administração para o pagamento voluntário, inicia-se o prazo prescricional para a cobrança judicial.

COMPENSAÇÃO TRIBUTÁRIA Súmula 625-STJ

Súmula 625-STJ: O pedido administrativo de compensação ou de restituição não interrompe o prazo prescricional para a ação de repetição de indébito tributário de que trata o art. 168 do CTN nem o da execução de título judicial contra a Fazenda Pública.

STJ. 1ª Seção. Aprovada em 12/12/2018, DJe 17/12/2018.

Repetição de indébito

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Ação de repetição de indébito (ou ação de restituição de indébito) é a ação na qual o requerente pleiteia a devolução de determinada quantia que pagou indevidamente. A ação de repetição de indébito, ao contrário do que muitos pensam, não é restrita ao direito tributário. Assim, por exemplo, se um consumidor é cobrado pelo fornecedor e paga um valor que não era devido, poderá ingressar com ação de repetição de indébito para pleitear valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável (art. 42, parágrafo único do CDC). No âmbito tributário, o contribuinte que pagar tributo indevido (exs: pagou duas vezes, pagou imposto que era inconstitucional, houve erro na alíquota etc.) terá direito à repetição de indébito, ou seja, poderá ajuizar ação cobrando a devolução daquilo que foi pago. As hipóteses em que o contribuinte terá direito à repetição de indébito, no âmbito tributário, estão previstas no art. 165 do CTN:

Art. 165. O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento, ressalvado o disposto no § 4º do artigo 162, nos seguintes casos: I - cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior que o devido em face da legislação tributária aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido; II - erro na edificação do sujeito passivo, na determinação da alíquota aplicável, no cálculo do montante do débito ou na elaboração ou conferência de qualquer documento relativo ao pagamento; III - reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória.

O mencionado art. 165 afirma que o sujeito passivo tem direito à restituição, independentemente de prévio protesto (isto é, mesmo que na hora de pagar não tenha “reclamado” do tributo indevido ou tenha feito qualquer ressalva; não interessa o estado de espírito do sujeito passivo no momento do pagamento, ou seja, se sabia ou não que o pagamento era indevido). Pagou indevidamente, tem direito de receber de volta a fim de evitar o enriquecimento sem causa da outra parte (no caso, o Fisco). Qual é o prazo prescricional para a ação de repetição de indébito tributário? 5 anos. O CTN prevê o prazo prescricional de 5 anos para que o contribuinte ajuíze a ação de repetição de indébito tributário pedindo a restituição das quantias que pagou indevidamente:

Art. 168. O direito de pleitear a restituição extingue-se com o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contados: I - nas hipótese dos incisos I e II do artigo 165, da data da extinção do crédito tributário; II - na hipótese do inciso III do artigo 165, da data em que se tornar definitiva a decisão administrativa ou passar em julgado a decisão judicial que tenha reformado, anulado, revogado ou rescindido a decisão condenatória.

Pedido administrativo de compensação não interrompe o prazo Imagine a seguinte situação: Em 2010, João pagou R$ 900,00 a título de IPTU de sua casa. Ocorre que, logo depois, ficou reconhecido que João pagou um valor maior do que era o devido segundo a legislação tributária. Em outras palavras, João pagou R$ 900,00, no entanto, o correto seria ele pagar apenas R$ 400,00. Isso significa que João (sujeito passivo) tem direito à repetição de indébito, ou seja, tem direito à restituição parcial do tributo pago. O art. 168 do CTN afirma que João tem um prazo de 5 anos para ingressar com ação exigindo isso. João estava cheio de problemas e esqueceu de fazer o pedido.

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Em 2015, pouco antes de completar 5 anos, João descobre que está devendo R$ 450,00 de taxa de lixo (tributo municipal). Ele lembra, então, que tem aquele “crédito” de R$ 500,00 do IPTU de 2010 que pagou a mais. Diante disso, ele requer, ao Fisco municipal, a compensação do crédito com o débito.

Vou abrir um parêntese para relembrar o que é a compensação no direito tributário: ocorre quando o contribuinte possui um crédito a receber do Fisco, podendo ser feito o encontro de contas do valor que o sujeito passivo tem que pagar com a quantia que tem a receber da Administração. Trata-se de causa de extinção da obrigação tributária (art. 156, II do CTN).

O Fisco, contudo, em 2016, dá a resposta, negando o pedido do contribuinte. O que isso significa? Que houve a prescrição da pretensão para o ajuizamento da ação de repetição de indébito tributário de que trata o art. 168 do CTN. Isso porque o STJ entende que o “pedido administrativo de compensação” não interrompe o prazo prescricional de 5 anos que o contribuinte tem para ajuizar a ação de repetição de indébito tributário. Pedido administrativo de restituição também não interrompe o prazo A mesma situação ocorre nos casos de pedido administrativo de restituição. No exemplo acima, suponhamos que João não tivesse esse débito de taxa de lixo. Assim, em 2015, pouco antes de completar 5 anos, ele lembra que tinha esse “crédito” do IPTU de 2010 pago a mais. Diante disso, formula um pedido administrativo de restituição. Em 2015, o Fisco nega a restituição pleiteada. Isso significa que o prazo prescricional continuou correndo e que não foi interrompido com o requerimento administrativo. João não poderá mais entrar com a ação de repetição de indébito de que trata o art. 168 do CTN. Por que não há a interrupção? O STJ entende que, em se tratando de créditos e débitos tributários, as hipóteses de interrupção de prescrição são apenas aquelas listadas no parágrafo único do art. 174 do CTN. O pedido administrativo de compensação e o pedido administrativo de restituição não foram previstos neste rol. Logo, não têm o condão de interromper a prescrição. Veja a redação legal:

Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva. Parágrafo único. A prescrição se interrompe: I - pelo despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal; II - pelo protesto judicial; III - por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor; IV - por qualquer ato inequívoco ainda que extrajudicial, que importe em reconhecimento do débito pelo devedor.

Logo, por ausência de previsão legal, não se pode admitir que a formalização de pedido de restituição/compensação interrompa o prazo prescricional. João ainda tem alguma possibilidade de resguardar seu direito? SIM. Em tese, ele poderá, ainda, ajuizar ação anulatória buscando desconstituir a decisão administrativa que negou o seu pedido. Esta ação é disciplinada pelo art. 169 do CTN:

Art. 169. Prescreve em dois anos a ação anulatória da decisão administrativa que denegar a restituição.

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Parágrafo único. O prazo de prescrição é interrompido pelo início da ação judicial, recomeçando o seu curso, por metade, a partir da data da intimação validamente feita ao representante judicial da Fazenda Pública interessada.

Nesse sentido:

O contribuinte que formula pleito de compensação na via administrativa dispõe de dois anos, a contar da ciência da resposta que o denega, para ingressar em juízo com a respectiva pretensão anulatória, nos termos do art. 169 do CTN. STJ. 1ª Turma. REsp 1180878/RS, Rel. Min. Sérgio Kukina, julgado em 06/02/2018.

Assim, não se deve confundir o prazo prescricional do art. 168 do CTN, que versa sobre o direito que o contribuinte possui de pleitear a restituição (repetição/compensação) diretamente na via judicial, daquela contemplada no art. 169, que cuida do prazo extintivo de ação anulatória, na qual o contribuinte se insurge contra decisão administrativa do Fisco. A Súmula 625 versa apenas do prazo prescricional do art. 168 do CTN, não tratando sobre a ação anulatória do art. 169. O que quer dizer a parte final da súmula: “nem o da execução de título judicial contra a Fazenda Pública”? É o caso, por exemplo, em que o contribuinte teve reconhecido seu direito à restituição tributária por meio de decisão judicial transitada em julgado. Ex: a empresa “X” pagou determinado tributo; posteriormente ingressou com ação judicial pedindo o reconhecimento de que ela não estava obrigada a pagar e que a exigência do Fisco foi indevida; o juízo acolhe o pedido da contribuinte e há o trânsito em julgado; com o trânsito em julgado tem início o prazo para a ação de repetição do indébito; se a empresa optar por pedir a restituição na via administrativa ou formular pedido administrativo de compensação, deverá estar ciente de que esses pedidos não irão interromper o prazo que ela possui para executar o título judicial contra a Fazenda Pública. É sobre isso que fala a parte final da súmula. Veja precedente do STJ no mesmo sentido:

(...) a ação de repetição do indébito tributário foi ajuizada após o transcurso do prazo de cinco anos, cujo termo inicial coincide com a data do trânsito em julgado da ação mandamental que reconheceu a inexigibilidade do imposto cobrado, de modo que configurada a prescrição. II - O pedido administrativo de compensação constitui meio inidôneo para interromper a fluência da prescrição para ajuizamento da respectiva ação de repetição. (...) STJ. 1ª Turma. AgRg no REsp 1.276.022/RS, Rel. Min. Regina Helena Costa, julgado em 19/5/2015.

IMPOSTO DE RENDA Súmula 627-STJ

Súmula 627-STJ: O contribuinte faz jus à concessão ou à manutenção da isenção do imposto de renda, não se lhe exigindo a demonstração da contemporaneidade dos sintomas da doença nem da recidiva da enfermidade.

STJ. 1ª Seção. Aprovada em 12/12/2018, DJe 17/12/2018.

Isenção de imposto de renda sobre os proventos da aposentadoria para doentes graves

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O imposto de renda é regido pela Lei nº 7.713/88. Esta Lei prevê que as pessoas portadoras de neoplasia maligna ou outras doenças graves e, que estejam na inatividade, não pagarão imposto de renda sobre os rendimentos recebidos a título de aposentadoria, pensão ou reforma (art. 6º, XIV). Em palavras mais simples: pessoas portadoras de doenças elencadas pela legislação não pagarão imposto de renda sobre os rendimentos que receberem a título de aposentadoria, pensão ou reforma. Para ter direito à isenção do imposto de renda é necessária a cumulação de dois requisitos pelo contribuinte: a) receber proventos de aposentadoria, pensão ou reforma; e b) estar acometido de uma das doenças arroladas no dispositivo legal. Veja a previsão legal:

Art. 6º Ficam isentos do imposto de renda os seguintes rendimentos percebidos por pessoas físicas: XIV – os proventos de aposentadoria ou reforma motivada por acidente em serviço e os percebidos pelos portadores de moléstia profissional, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira, hanseníase, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, hepatopatia grave, estados avançados da doença de Paget (osteíte deformante), contaminação por radiação, síndrome da imunodeficiência adquirida, com base em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenha sido contraída depois da aposentadoria ou reforma;

Imagine agora a seguinte situação hipotética: João, aposentado, estava apresentando problemas de saúde e foi internado em um hospital particular. Fez diversos exames nos quais ficou constatado que ele está com neoplasia maligna (câncer). Diante disso, ele requereu isenção do imposto de renda sobre os valores que ele recebe a título de aposentadoria. Para tanto, ele juntou todos os laudos dos exames que realizou, assim como uma declaração do médico do hospital. A Receita Federal, contudo, indeferiu o pedido alegando que, para ter direito à isenção, seria indispensável a apresentação de um laudo médico oficial. Inconformado, João ingressou com ação judicial pedindo o reconhecimento de seu direito à isenção com base nos inúmeros laudos médicos particulares que examinaram a sua situação e que atestaram a existência da moléstia. O juiz poderá acolher o pedido de João? O magistrado pode reconhecer o direito à isenção do Imposto de Renda de que trata o art. 6º, XIV, da Lei nº 7.713/88 apenas com base em documentos médicos particulares (sem um laudo médico oficial)? SIM. A comprovação da moléstia grave para fins de isenção de imposto de renda não precisa ser comprovada mediante laudo médico OFICIAL podendo o magistrado valer-se de outras provas produzidas.

Súmula 598-STJ: É desnecessária a apresentação de laudo médico oficial para o reconhecimento judicial da isenção do Imposto de Renda, desde que o magistrado entenda suficientemente demonstrada a doença grave por outros meios de prova.

Voltando ao exemplo de João: suponhamos que ele fez quimioterapia e outros tratamentos e ficou aparentemente curado, não apresentando mais qualquer sintoma do câncer. Também não há qualquer sinal de recidiva, ou seja, de reaparecimento da doença. Mesmo assim, João terá direito à isenção do imposto? SIM. Mesmo que a lesão tenha sido aparentemente curada e que o paciente não apresente sinais de recidiva, o STJ entende que é devida a isenção do imposto de renda em favor dos inativos portadores de moléstia grave. Isso porque o objetivo da isenção é diminuir o sacrifício do aposentado, aliviando os encargos financeiros que ele ainda terá para fazer acompanhamento médico e continuar tomando as medicações ministradas.

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Informativo 638-STJ (19/12/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 50

O portador de uma doença grave, como aquelas listadas no art. 6º, XIV, da Lei nº 7.713/88, mesmo aparentemente curado e assintomático, nunca mais poderá deixar de fazer acompanhamento médico periódico, tendo, muitas vezes, que tomar medicações para o resto da vida. Além disso, há cuidados adicionais com a saúde. Desse modo, as razões protetivas que justificaram a edição da norma ainda permanecem. Em suma: O contribuinte tem direito à concessão ou direito de manter (se já havia sido concedido) a isenção do imposto de renda de que trata o art. 6º, XIV, da Lei nº 7.713/88 mesmo que atualmente (contemporaneamente) ele não esteja mais apresentando sintomas da doença nem sinais de recidiva (volta da enfermidade).

IPI Não deve incidir IPI sobre a venda de produtos, na hipótese de roubo ou furto

da mercadoria antes da sua entrega ao comprador

Na hipótese em que ocorrer roubo/furto da mercadoria após a sua saída do estabelecimento do fabricante não se configura o evento ensejador de incidência do IPI.

Não deve incidir IPI sobre a venda de produtos, na hipótese de roubo ou furto da mercadoria, antes da sua entrega ao comprador. Isso porque, neste caso, como não foi concluída a operação mercantil, não ficou configurado o fato gerador.

STJ. 1ª Seção. EREsp 734.403-RS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 14/11/2018 (Info 638).

IPI IPI é a sigla para Imposto sobre Produtos Industrializados. Trata-se de um tributo federal e que incide sobre a produção e a circulação de produtos industrializados. O IPI foi instituído por meio da Lei nº 4.502/64.

Fato gerador do IPI Segundo o art. 46 do CTN, o IPI possui três fatos geradores: I - o desembaraço aduaneiro do produto industrializado, quando de procedência estrangeira; II - a saída do produto industrializado do estabelecimento industrial ou equiparado a industrial; III - a arrematação do produto industrializado, quando apreendido ou abandonado e levado a leilão.

Imagine agora a seguinte situação hipotética: A “Souza Cruz”, indústria de tabaco, produziu 2 mil cigarros e os vendeu para o distribuidor “BB”. O caminhão saiu da fábrica levando os cigarros que seriam entregues na distribuidora. Ocorre que o veículo foi abordado por assaltantes armados que roubaram toda a carga. Apesar disso, a Receita Federal fez o lançamento tributário cobrando o IPI referente aos 2 mil cigarros produzidos. A empresa ingressou, então, com ação ordinária pedindo a anulação do lançamento e, consequentemente, do crédito tributário ao argumento de que não houve o fato gerador.

O pedido da indústria é acolhido pela jurisprudência do STJ? SIM.

Na hipótese em que ocorrer roubo/furto da mercadoria após a sua saída do estabelecimento do fabricante não se configura o evento ensejador de incidência do IPI. Não deve incidir IPI sobre a venda de produtos, na hipótese de roubo ou furto da mercadoria, antes da entrega ao comprador. Isso porque, neste caso, como não foi concluída a operação mercantil, não ficou configurado o fato gerador. STJ. 1ª Seção. EREsp 734.403-RS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 14/11/2018 (Info 638).

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Se ocorre o roubo ou furto da mercadoria após a sua saída do estabelecimento do fabricante, a operação mercantil não se concretiza, não havendo proveito econômico para o fabricante sobre o qual deve incidir o tributo. Logo, não se configura o fato gerador do IPI. Assim, só cabe o IPI se o produto industrializado sai do estabelecimento do fabricante e se há a sua entrega ao adquirente, com a transferência da propriedade do bem. Nesse momento, a operação passa a ser dotada de relevância econômica capaz de merecer tributação.

(...) 4. O fato gerador do IPI não é a saída do produto do estabelecimento industrial ou a ele equiparado. Esse é apenas o momento temporal da hipótese de incidência, cujo aspecto material consiste na realização de operações que transfiram a propriedade ou posse de produtos industrializados. 5. Não se pode confundir o momento temporal do fato gerador com o próprio fato gerador, que consiste na realização de operações que transfiram a propriedade ou posse de produtos industrializados. 6. A antecipação do elemento temporal criada por ficção legal não torna definitiva a ocorrência do fato gerador, que é presumida e pode ser contraposta em caso de furto, roubo, perecimento da coisa ou desistência do comprador. 7. A obrigação tributária nascida com a saída do produto do estabelecimento industrial para entrega futura ao comprador, portanto, com tradição diferida no tempo, está sujeita a condição resolutória, não sendo definitiva nos termos dos arts. 116, II, e 117 do CTN. Não há razão para tratar, de forma diferenciada, a desistência do comprador e o furto ou o roubo da mercadoria, dado que em todos eles a realização do negócio jurídico base foi frustrada. (...) 10. O furto de mercadorias antes da entrega ao comprador faz desaparecer a grandeza econômica sobre a qual deve incidir o tributo. Em outras palavras, não se concretizando o negócio jurídico, por furto ou roubo da mercadoria negociada, já não se avista o elemento signo de capacidade contributiva, de modo que o ônus tributário será absorvido não pela riqueza advinda da própria operação tributada, mas pelo patrimônio e por rendas outras do contribuinte que não se relacionam especificamente com o negócio jurídico que deu causa à tributação, em clara ofensa ao princípio do não confisco. (...) STJ. 2ª Turma. REsp 1203236/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 21/06/2012.

ISS Incide ISS sobre serviço de proteção ao crédito

oferecido por sindicato ou CDL aos seus associados?

Se uma entidade sem fins lucrativos, como é o caso do sindicato ou da câmara de dirigentes lojistas, oferece serviço de consulta a cadastros de proteção ao crédito em favor de seus associados, deverá pagar ISS?

1ª Turma: SIM

O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza - ISSQN - incide sobre os serviços de proteção ao crédito, ainda que prestados por entidade sindical a seus associados.

STJ. 1ª Turma. AREsp 654.401-SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 04/10/2018 (Info 638).

2ª Turma: NÃO

A Câmara de Dirigentes Lojistas é uma associação cujos serviços destinam-se a atender seus próprios sócios, os diretores de lojas, sem objetivo de lucro, mas visando a realização de seus objetivos, tal como previsto em seu estatuto.

Assim, como o CDL realiza suas atividades sem fins lucrativos não está sujeito à incidência do ISS.

STJ. 2ª Turma. REsp 1338554/RS, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 07/05/2015.

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Informativo 638-STJ (19/12/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 52

ISSQN O ISSQN significa Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza. Algumas vezes, você encontrará apenas a sigla ISS. É a mesma coisa. Trata-se de um tributo de competência dos Municípios. Em âmbito nacional, o ISSQN é disciplinado pela LC 116/2003, que estabelece suas normas gerais. Vale ressaltar, no entanto, que cada Município, para cobrar este imposto, precisa editar uma lei ordinária municipal tratando sobre o assunto. Esta lei local, obviamente, não pode contrariar a LC 116/2003 e nem prever serviços que não estejam expressos na lei federal. Fato gerador O ISSQN incide sobre a prestação dos serviços listados no anexo da LC 116/2003. Confira o texto constitucional:

Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar. (...) § 3º Em relação ao imposto previsto no inciso III do caput deste artigo, cabe à lei complementar: I - fixar as suas alíquotas máximas e mínimas; II - excluir da sua incidência exportações de serviços para o exterior; III - regular a forma e as condições como isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados.

Veja agora o que diz o art. 1º da LC 116/2003:

Art. 1º O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador.

Exemplos: quando o médico atende o paciente em uma consulta, ele presta um serviço, sendo isso fato gerador do ISSQN; quando o cabeleireiro faz uma escova progressiva na cliente, ele também presta um serviço e deverá pagar ISSQN. Todos os serviços que estão sujeitos ao pagamento de ISSQN encontram-se previstos na lista anexa à LC 116/2003. Se não estiver nesta lista, não é fato gerador deste imposto. Vale ressaltar que esta lista é taxativa (exaustiva). Imagine agora a seguinte situação hipotética: O Sindicato dos Comerciantes de Santos oferece aos lojistas da cidade, mediante pagamento, serviços de proteção ao crédito. Funciona assim: o comerciante/lojista pode pedir à entidade sindical informações sobre a situação creditícia dos clientes que tenham anteriormente comprado mercadorias de seus associados. Além disso, o sindicato faz também a cobrança dos consumidores que estão devendo os lojistas, enviando cartas, telefonando etc. Em contrapartida, os associados pagam um valor para o sindicato. O Município entendeu que esse serviço é fato gerador de ISS e exigiu da entidade sindical o pagamento do imposto. O sindicato questionou a cobrança alegando que não tem objetivo de lucro e que os valores recebidos são apenas para ressarcir as despesas. Incide ou não ISS neste caso? Incide ISS sobre serviço de consulta a cadastros de proteção ao crédito prestado por sindicato ou por câmara de dirigentes lojistas, entidades sem fins lucrativos, em favor de seus associados?

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O STJ está dividido: 1ª Turma: SIM

O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza - ISSQN - incide sobre os serviços de proteção ao crédito, ainda que prestados por entidade sindical a seus associados. STJ. 1ª Turma. AREsp 654.401-SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 04/10/2018 (Info 638).

2ª Turma: NÃO

A Câmara de Dirigentes Lojistas é uma associação cujos serviços destinam-se a atender seus próprios sócios, os diretores de lojas, sem objetivo de lucro, mas visando a realização de seus objetivos, tal como previsto em seu estatuto. Assim, como o CDL realiza suas atividades sem fins lucrativos não está sujeito à incidência do ISS. STJ. 2ª Turma. REsp 1338554/RS, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 07/05/2015.

IPTU Súmula 626-STJ

Súmula 626-STJ: A incidência do IPTU sobre imóvel situado em área considerada pela lei local como urbanizável ou de expansão urbana não está condicionada à existência dos melhoramentos elencados no art. 32, § 1º, do CTN.

STJ. 1ª Seção. Aprovada em 12/12/2018, DJe 17/12/2018.

IPTU IPTU significa imposto sobre propriedade territorial urbana de bens imóveis, sendo tributo de competência dos Municípios. O IPTU está previsto no art. 156, I, da CF/88:

Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: I - propriedade predial e territorial urbana;

Normas que regem o IPTU • CF/88 (arts. 156, I, e § 1º; art. 182, § 4º, II); • CTN (arts. 32 a 34); • Estatuto da Cidade - Lei federal nº 10.257/2001 (art. 7º); • Lei municipal que institua o imposto (verificar a lei local). Características Trata-se de um imposto: • Real: incide sobre uma coisa (propriedade imobiliária urbana); • Direto: o próprio contribuinte é quem suporta o encargo financeiro da tributação (não há repercussão econômica); • Fiscal: a função precípua deste imposto é a arrecadação (imposto fiscal). Vale ressaltar, no entanto, que, em alguns casos, ele poderá assumir também um caráter extrafiscal (forma de estimular o cumprimento da função social da propriedade); • Progressivo: pode ser progressivo no tempo caso a propriedade não esteja cumprindo sua função social (art. 182, § 4º), além de poder ser progressivo em razão do valor do imóvel (art. 156, § 1º, I);

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Fato gerador

O fato gerador do IPTU é a...

• propriedade • domínio útil • posse

- de bem imóvel - por natureza ou - por acessão física - localizado na zona urbana.

IPTU x ITR O IPTU incide sobre imóveis urbanos. O ITR recai sobre imóveis rurais. Assim, em regra, o ITR incide apenas sobre imóveis rurais. Se o imóvel for urbano, o imposto devido é o IPTU. O conceito de imóvel rural é dado por exclusão. O CTN, em seu art. 32, §§ 1º e 2º, explica em que consiste o imóvel urbano para fins de incidência do IPTU. Se o imóvel não se enquadrar em tais critérios, será considerado rural. Por que se falou “em regra”? Existe alguma exceção? Existe hipótese em que o ITR incidirá sobre imóvel localizado em zona urbana? SIM. Segundo o STJ, incide o ITR (e não o IPTU) sobre imóveis comprovadamente utilizados para exploração extrativa, vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial, ainda que localizados em áreas consideradas urbanas pela legislação municipal. Nesse sentido:

Não incide IPTU, mas ITR, sobre imóvel localizado na área urbana do Município, desde que comprovadamente utilizado em exploração extrativa, vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial. STJ. 1ª Seção. REsp 1112646/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 26/08/2009.

O fundamento para essa decisão do STJ está no art. 15 do DL 57/66:

Art. 15. O disposto no art. 32 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966(artigo do CTN que fala sobre o fato gerador do IPTU), não abrange o imóvel de que, comprovadamente, seja utilizado em exploração extrativa vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial, incidindo assim, sobre o mesmo, o ITR e demais tributos com o mesmo cobrados.

O que é um imóvel urbano, para fins de incidência do IPTU? Imóvel urbano, para fins de incidência de IPTU, é aquele localizado na zona urbana. O CTN, nos §§ 1º e 2º do art. 32, traz os critérios para essa definição. Ele diz, basicamente, o seguinte: • A Lei municipal irá definir o que é a zona urbana daquele respectivo Município. • No entanto, a lei municipal só poderá incluir, como sendo zona urbana, as áreas da cidade que tiverem, no mínimo, dois dos seguintes “melhoramentos” construídos ou mantidos pelo Poder Público: a) meio-fio ou calçamento, com canalização de águas pluviais; b) abastecimento de água; c) sistema de esgotos sanitários; d) rede de iluminação pública, com ou sem posteamento para distribuição domiciliar; e) escola primária ou posto de saúde a uma distância máxima de 3 (três) quilômetros do imóvel considerado. • Repetindo: para que o Município preveja, na lei, que determinado bairro, comunidade, loteamento etc., está incluído na “zona urbana”, é necessário que nesse local existam dois ou mais dos melhoramentos acima listados e que estão exigidos no § 1º do art. 32 do CTN. • A lei municipal poderá prever, no entanto, um outro conceito, qual seja, o de área “urbanizável ou de expansão urbana”. • Segundo o § 2º do art. 32 do CTN, áreas urbanizáveis (ou de expansão urbana) são aquelas que abrangem loteamentos aprovados pelos órgãos competentes e que são destinados à habitação, à indústria ou ao

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Informativo comentado

Informativo 638-STJ (19/12/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 55

comércio, mas que não se enquadram na definição do § 1º do art. 32. Para você entender melhor, é como se fossem áreas para onde a “cidade” está crescendo (expandindo) e que, por estar no início da expansão, ainda não há tantos melhoramentos feitos pelo Poder Público. Apesar disso, já pode cobrar IPTU, até para ter recursos para conseguir fazer os referidos melhoramentos.

IPTU Recai sobre imóveis localizados na:

ZONA URBANA A zona urbana é definida por lei municipal.

Para ser zona urbana, a região da cidade deve ter, no mínimo, 2 dos melhoramentos previstos no § 1º do art. 32 do CTN.

Área urbanizável ou de expansão urbana: é uma área que, mesmo sem ter os 2 melhoramentos, pode ser incluída na esfera de tributação do IPTU.

Área urbanizável ou de expansão urbana: loteamentos aprovados pelos órgãos competentes e que são destinados à habitação, à indústria ou ao comércio.

Desse modo, o IPTU incide sobre:

1) Imóveis localizados na zona urbana

2) Imóveis localizados na área urbanizável ou de expansão urbana

Locais onde possuem, no mínimo, 2 dos melhoramentos do § 1º do art. 32 do CTN. Art. 32 (...) § 1º Para os efeitos deste imposto, entende-se como zona urbana a definida em lei municipal; observado o requisito mínimo da existência de melhoramentos indicados em pelo menos 2 (dois) dos incisos seguintes, construídos ou mantidos pelo Poder Público: I - meio-fio ou calçamento, com canalização de águas pluviais; II - abastecimento de água; III - sistema de esgotos sanitários; IV - rede de iluminação pública, com ou sem posteamento para distribuição domiciliar; V - escola primária ou posto de saúde a uma distância máxima de 3 (três) quilômetros do imóvel considerado.

São loteamentos aprovados pelos órgãos competentes e destinados à habitação, à indústria ou ao comércio. Não possuem os 2 dos melhoramentos do § 1º, mas mesmo assim irão ser objeto de IPTU, desde que previstas na lei municipal. Isso porque são áreas que o CTN autorizou que a lei municipal considerasse como urbanas, apesar de não terem os melhoramentos. Art. 32 (...) § 2º A lei municipal pode considerar urbanas as áreas urbanizáveis, ou de expansão urbana, constantes de loteamentos aprovados pelos órgãos competentes, destinados à habitação, à indústria ou ao comércio, mesmo que localizados fora das zonas definidas nos termos do parágrafo anterior.

Assim, o que diz a súmula: Pode incidir IPTU sobre imóvel situado em área urbanizável ou de expansão urbana mesmo que ainda não existam os melhoramentos previstos no art. 32, § 1º do CTN. O exemplo típico são os sítios de recreio:

É legal a cobrança do IPTU dos sítios de recreio, localizados em zona de expansão urbana definida por legislação municipal, mesmo que não contenha os melhoramentos previstos no art. 31, § 1º, do CTN. STJ. 2ª Turma. AgRg no REsp 783.794/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 15/12/2009.