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Cópias dos acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça e da Re- lação de Lisboa e da sentença do 8.°juízo cível da comarca de Lisboa proferidos no processo de registo da marca na- cional n.° 83 392. O Laboratório Farmacológico J. J. Fernandes, L.da, com sede na Rua de Filipe da Mata, 30, desta cidade, ao abrigo do disposto nos artigos 203.° e seguintes do Código da Propriedade Industrial, recorreu perante o tribunal cível do despacho de 3 de Abril de 1957 da Direcção-Geral do Comércio, publicado no Boletim da Propriedade Industrial n.° 4, de 15 de Junho de 1957, que lhe recusou o registo, na classe 5.ª, da marca in- dustrial n.° 83 392, constituída pela denominação de Poliovacina, destinada a preparações e produtos far- macêuticos. Juntou, como é de lei, o exemplar do Boletim em que foi proferido o despacho recorrido e também pú- blica-forma de procuração a advogado com substa- belecimento em solicitador. Cumprido o disposto no artigo 206.° do código re- ferido, foi recebido o ofício que antecede, acompa- nhado do processo instaurado na aludida Direcção- -Geral e que deu lugar ao recurso - o processo apenso. Deste se vê que o ora recorrente apresentou perante a Direcção-Geral referida o pedido, em 19 de Abril de 1955, para que fosse protegida em Portugal a marca Poliovacina, industrial e comercial, destinada a pro- dutos farmacêuticos, produtos químicos e farmacêuti- cos, preparações farmacêuticas e medicamentos para homens e animais, e, nessas condições, requereu que fosse efectuado o respectivo registo. Contra este pedido reclamou American Pharmaceu- tical Manufacturers Association, Inc., domiciliada em 30, Rockfeller Plaza, da cidade e estado de Nova Ior- que, Estados Unidos da América do Norte, ao abrigo do artigo 88.° e dentro do prazo consignado no ar- tigo 99.°, ambos do mencionado código. Começa por expor, nessa reclamação, e salientar que a lei exige, para uma marca merecer o registo, a sua eficácia distintiva, ou seja que a marca deve possuir uma composição que lhe permita satisfazer o fim para que foi criada - a distinção entre os produtos a que se aplica e outros idênticos ou semelhantes -, resul- tando do § 1.° do artigo 79.° do Código da Proprie- dade Industrial que não satisfazem a essas condições as marcas que sejam compostas exclusivamente por sinais e indicações que designem a qualidade, espé- cie, quantidade, destino, valor ou o lugar de origem dos produtos ou do uso generalizado na linguagem corrente, assegurando-se desta forma, com eficácia, o desempenho da função jurídico-económica da marca e impedindo-se que a generalidade dos produtos fique

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Cópias dos acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça e da Re- lação de Lisboa e da sentença do 8.° juízo cível da comarca de Lisboa proferidos no processo de registo da marca na- cional n.° 83 392.

O Laboratório Farmacológico J. J. Fernandes, L.da, com sede na Rua de Filipe da Mata, 30, desta cidade, ao abrigo do disposto nos artigos 203.° e seguintes do Código da Propriedade Industrial, recorreu perante o tribunal cível do despacho de 3 de Abril de 1957 da Direcção-Geral do Comércio, publicado no Boletim da Propriedade Industrial n.° 4, de 15 de Junho de 1957, que lhe recusou o registo, na classe 5.ª, da marca in- dustrial n.° 83 392, constituída pela denominação de Poliovacina, destinada a preparações e produtos far- macêuticos.

Juntou, como é de lei, o exemplar do Boletim em que foi proferido o despacho recorrido e também pú- blica-forma de procuração a advogado com substa- belecimento em solicitador. Cumprido o disposto no artigo 206.° do código re-

ferido, foi recebido o ofício que antecede, acompa- nhado do processo instaurado na aludida Direcção- -Geral e que deu lugar ao recurso - o processo apenso.

Deste se vê que o ora recorrente apresentou perante a Direcção-Geral referida o pedido, em 19 de Abril de 1955, para que fosse protegida em Portugal a marca Poliovacina, industrial e comercial, destinada a pro- dutos farmacêuticos, produtos químicos e farmacêuti- cos, preparações farmacêuticas e medicamentos para homens e animais, e, nessas condições, requereu que fosse efectuado o respectivo registo. Contra este pedido reclamou American Pharmaceu-

tical Manufacturers Association, Inc., domiciliada em 30, Rockfeller Plaza, da cidade e estado de Nova Ior- que, Estados Unidos da América do Norte, ao abrigo do artigo 88.° e dentro do prazo consignado no ar- tigo 99.°, ambos do mencionado código. Começa por expor, nessa reclamação, e salientar que

a lei exige, para uma marca merecer o registo, a sua eficácia distintiva, ou seja que a marca deve possuir uma composição que lhe permita satisfazer o fim para que foi criada - a distinção entre os produtos a que se aplica e outros idênticos ou semelhantes -, resul- tando do § 1.° do artigo 79.° do Código da Proprie- dade Industrial que não satisfazem a essas condições as marcas que sejam compostas exclusivamente por sinais e indicações que designem a qualidade, espé- cie, quantidade, destino, valor ou o lugar de origem dos produtos ou do uso generalizado na linguagem corrente, assegurando-se desta forma, com eficácia, o desempenho da função jurídico-económica da marca e impedindo-se que a generalidade dos produtos fique

inibida, de um momento para o outro, de utilizar in- dicações necessárias ou correntes. Com base nestas considerações, conclui que a marca

Poliovacina, cujo registo se pretende, não satisfaz ao princípio da eficácia distinta e, por isso, não pode ser admitida a registo, porque as palavras polio e vacina, que entram na composição, são incaracterísticas para registo. E explica esta afirmação porque polio cons- titui a abreviatura corrente de poliomielite, e consta mesmo de dicionários leigos e vulgares, e vacina é palavra vulgarmente conhecida e usada, e, assim, a marca compõe-se unicamente dessas duas expressões necessárias e designativas da espécie ou destino do produto a que se aplica - vacina para a poliomie- lite -, e por isso se vê que ela é inapta e incapaz de satisfazer ao que a lei exige para a poder prote- ger, pois a sua aceitação e registo daria ao Laboratório requerente o privilégio injusto de poder usar exclusi- vamente termos que são usados por todos e assim de- vem continuar a ser, estando portanto em oposição ao que se estabelece nos artigos 79.° e 93.° do Código da Propriedade Industrial. Contestou o requerente do registo, e ora recorrente,

tal reclamação, afirmando que a marca referida não carece de eficácia distintiva e que ela preenche a condição de distinguir os produtos da actividade eco- nómica, porque, se nenhuma das palavras que a cons- tituem possui, isoladamente considerada, característi- cas para registo, a verdade é que não foi pedido o registo isolado quanto à marca composta apenas de uma ou outra daquelas palavras, mas sim o registo, como marca, de uma expressão composta pela união ou composição pelas mesmas duas palavras, e essa expressão assim formada não deixa de possuir ine- gável originalidade, ao mesmo tempo que torna o pro- duto a que se refere distinguível de qualquer outro e com ele inconfundível, sendo de salientar que as marcas, segundo tem sido decidido nos tribunais, de- vem ser apreciadas no seu conjunto (sentença de 11 de Junho de 1946, in Just. Port., XIV, p. 126). E isto porque a lei não consente que a apreciação das marcas seja feita e considerada com separação e isolamento dos seus componentes em particular e individualmente considerados, mas no seu conjunto, porque este é que constitui a marca (sentença de 25 de Maio de 1949, na mesma Just. Port., XVI, p. 159), tanto mais que o artigo 79.° do Código da Propriedade Industrial estabelece como regra «a maior liberdade para as mar- cas se constituírem, embora sujeita às restrições cons- tantes dos diversos números do artigo 93.°, como observa o Doutor Justino Cruz, a p. 56 do seu Código da Propriedade Industrial. E terminou por acrescentar que não existia, no caso

dos autos, nem se verificava qualquer das restrições mencionadas naquele artigo e por isso não há limi- tação para a constituição da marca, antes para ela regula o regime de liberdade. A reclamante ou opoente replicou anotando que da

combinação dos dois termos polio e vacina, que de- signam a espécie, a qualidade ou o destino dos pro- dutos assinalados, não resulta uma expressão inteira- mente característica ou peculiar e que ainda não tivesse caído também no domínio público, pois tanto a palavra polio como a palavra vacina, consideradas isoladamente e em separado, não exprimem caracte- rística, e o mesmo sucede com a palavra poliovacina, resultante do conjunto e combinação das duas, pois poliovacina equivale e significa vacina da poliomielite, e tanto se emprega aquela palavra, sintética ou iso- ladamente, como esta expressão ou locução composta, visto traduzirem a mesma i d e i a .

Por fim, ainda o ora recorrente e requerente do re- gisto treplicou, salientando a existência e registo de diversas marcas com o início da designação com a palavra poli, mencionando algumas delas, mostrando a ligação desta palavra com outra um simples sinal nominativo e característico de uma marca, e que, de todos os laboratórios e farmacêuticos do nosso país, sòmente a reclamante é que se sentiu prejudicada com o possível registo dela. Finalmente, no primitivo requerimento inicial foi

exarado o parecer no sentido da procedência da re- clamação por parte de American Pharmaceutical Ma- nufacturers Association, Inc., com fundamento em ser a marca composta pela associação vulgar de dois ter- mos genéricos, indicativos, respectivamente, da doença e da preventória qualidade ou natureza do produto - polio (abreviatura corrente de poliomielite) e va- cina -, e de tal conjunto não oferecer bastante ou suficiente poder distintivo capaz de individualizar os produtos, o que não admira, dado que da fusão da- quelas palavras não resultou um vocábulo de fantasia mas descrição do produto, entendendo-se, por isso, que o pedido devia ser indeferido, com base no artigo 79.°, 1.°, do Código da Propriedade Industrial. Este parecer mereceu a concordância do chefe da

Repartição da Propriedade Industrial e obteve des- pacho de concordância da Direcção-Geral do Comér- cio, no mesmo requerimento exarado, e foi desse des- pacho que foi interposto o presente recurso para o tribunal da comarca de Lisboa, tendo o recorrente apresentado as suas alegações de fls. 2 e seguintes e não tendo a reclamante apresentado procuração ou alegações, talvez por causa do que o ora recorrente começou por alegar no princípio da sua tréplica. Nessas alegações de recurso sustentou o recorrente

que a marca Poliovacina é constituída por uma ex- pressão que se decompõe em dois termos - polio e vacina -, representando aquele um elemento compo- nente do medicamento, mostrando tratar-se de um me- dicamento que é destinado ao tratamento da doença poliomielite e individualizando, assim, um produto farmacêutico cujo nome ou designação logo faz lem- brar aquela doença e sua terapêutica. Essa expressão mostra ainda, conforme alega, que há nela origina- lidade que concorre para fazer distinguir o produto a que respeita de qualquer outro, sendo ao seu conjunto de elementos específicos e designativos a formar um todo, e é a este que deve atender-se ao apreciar a marca proposta e a sua admissibilidade a registo, e não a cada um dos seus elementos formativos considerado isoladamente e em separado dos outros. Citou decisões em que assim se tem julgado e nomes ou designações de marcas com expressão semelhante à da Poliovacina em discussão, como as de Poliobiótico e Poliéster, e conclui no sentido de a marca referida satisfazer aos requisitos exigidos para ela poder ser registada e pe- dindo por isso a revogação do despacho recorrido e que fosse ordenado o seu registo. Apreciando: O que mais importa conhecer e verificar quanto à

marca e seu registo é o elemento de garantia que a caracteriza, não só para o público consumidor - quanto à qualidade ou excelência de produto -, como para o comerciante, pelo que respeita à recomendação ou apreciação dos seus produtos e sua aceitação pelo pú- blico. Daí pode considerar-se como resultante o ca- rácter que a marca deve ter de ser distinta de qualquer outra já existente ou adoptada; a marca deve ser es- pecial, a marca será o sinal ou distintivo destinado a individualizar e caracterizar o produto a que res- peita. Este carácter ou requisito da especialidade não

se encontra expressamente declarado na lei, mas fà- cilmente se deduz, por via indirecta, de algumas das suas disposições (artigos 74.° e § 1.°, 79.°, 93.°, 95.°, 94.° e § único do Código da Propriedade Industrial, etc.) . A doutrina tem estabelecido, e a jurisprudência nesse sentido se tem pronunciado, que a marca deve conter em si eficácia distinta, não resultando esta da simples denominação ou designação necessária ou usual do produto a que ela respeita, porque o sinal adoptado como marca deve ser escolhido de tal forma que a faça distinguir de outras destinadas a produtos idênticos. Quanto à composição da marca, vê-se que ela tem de ser de molde a respeitar e a obedecer ao referido prin- cípio da especialidade ou da eficácia distintiva, e den- tro deste objectivo ou limite concede a lei ampla li- berdade ao interessado para formar a sua marca. É o que resulta do artigo 79.° e § 1.° do Código da Pro- priedade Industrial. Ora, verifica-se que a marca a que os autos se re-

ferem é composta das palavras polio, que se refere à doença a cujo tratamento ou terapêutica se destina, e vacina, que respeita à forma desse tratamento. Terá essa expressão assim formada e constituída a eficácia distintiva atrás aludida e que a lei exige? Conterá ela, por essa forma, o sinal distintivo destinado a individualizar o produto a que se refere? Evitará ela a possibilidade da confusão? Ou estará ela nas con- dições estabelecidas no artigo 79.° do Código da Pro- priedade Industrial, constituindo um sinal ou con- junto de sinais nominativos que façam distinguir o produto a que respeita de outros idênticos, ou essa marca de outras destinadas a produtos idênticos ou semelhantes àquele? Ou estarão as suas característi- cas, pelo contrário, abrangidas pelo disposto no § 1.° daquele artigo, sendo por tal motivo inaceitáveis e inadmissíveis, devido ao facto de a composição dessa marca ser exclusivamente formada por sinais ou in- dicações que possam servir no comércio para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o va- lor, o lugar de origem dos produtos ou a época da produção, ou que se tenham tornado usuais na lin- guagem corrente ou nos hábitos leais e constantes do comércio ? A verdade é que estão as partes de acordo quanto

ao significado e interpretação a dar aos elementos componentes da marca Poliovacina: polio, indicativo da doença a que o medicamento é destinado - polio- mielite - e vacina, a terapêutica. Indica-se assim de uma forma genérica e ampla esse tratamento, a es- pécie e qualidade dele e o destino do produto, sem se individualizar ou particularizar qual é o produto empregado na vacina, ou componente do medicamento nela empregado e utilizado. Vacina é o termo vago e genérico que se aplica ao tratamento preventivo de qualquer doença, mais usualmente para a evitar como preventivo, antes de ela se manifestar, mas também, embora menos frequentemente, como eliminatório ou abortivo, no caso de ela já estar diagnosticada e ve- rificado o seu aparecimento no organismo. Os elemen- tos de constituição da vacina, os reagentes ou produtos que nela entram ou que por meio dela são empregados para aquele fim é que podem ser os mais diversos e variados. E assim, segundo essa marca com a expressão Po-

liovacina, abrange-se toda e qualquer vacina, seja de que natureza for e sejam quais forem os produtos que se usem ou empreguem para o fim ou objectivo a conseguir. Pelo registo da marca em tais condições ficará vedado o registo da marca de uma vacina contra a poliomielite com qualquer produto, ainda que tenha o carácter de novidade a que se refere o § 1.° do ar-

tigo 74.° do Código da Propriedade Industrial, porque qualquer vacina contra a poliomielite ficaria abran- gida pelo registo da marca referida nos autos, que não especifica ou individualiza, não distingue a forma do seu emprego, os produtos que entram na sua apli- cação. Indica-se tão-sòmente o acto geral, a operação da vacina em si, a forma prática ou modo de tratar a doença, de a combater ou afastar; e nisto podem caber e ser incluídas todas as formas práticas de actua- ção e todos os mais diversos produtos com que ela pode ou possa vir a ser exercida e todos os processos e meios com que haja de ser usada. A generalidade do termo a tanto se presta e aplica, pois indica-se sòmente o conceito genérico e teórico de vacina e não se especifica ou individualiza a sua forma prática de aplicação ou os produtos que entram na sua aplicação. Donde se conclui que a marca ficaria a ter carácter de puro exclusivismo, por ela se açambarcando e do- minando toda a espécie e qualidade de vacina tendente ao tratamento da poliomielite. Tudo estaria bem se, de harmonia com o disposto

no artigo 85.° do código, se usasse a marca sem re- gisto, mas o artigo 74.° determina que aquele que adopta certa marca para distinguir os produtos da sua actividade económica gozará da propriedade e do exclusivo dela, desde que satisfaça às prescrições le- gais, designadamente a relativa ao registo. Por efeito do registo da marca, o registante adqui-

ria a propriedade e exclusivo dela, desde que ela sa- tisfizesse às prescrições legais. Mas verifica-se que ela não goza da eficácia distintiva, não é especial, mas genérica e ampla; e o § 1.° do artigo 74.° determina que o registo da marca implica presunção jurídica de novidade ou distinção de outra anteriormente re- gistada e o artigo 79.° indica que a aplicação do sinal ou sinais distintivos da marca de um produto deve ser feita de forma que o faça distinguir de outros idên- ticos ou semelhantes ou de outras marcas de produtos nessas condições. A marca que se propõe não satisfaz às condições

legais quanto ao elemento vacina que entra na sua composição; esse elemento não é especial, não indivi- dualiza ou especifica a forma ou maneira de empregar a vacina, não indica ou particulariza esse processo de tratamento. A vacina pode ser usada de várias formas e com diversos produtos ; não se indica qual a forma nem qual o produto empregado. Não satisfaz, por isso, às prescrições legais quanto à composição dos sinais que a lei exige para a constituição de marca. Não satisfaz aos requisitos legais para ser consi-

derada como marca comercial ou industrial a desig- nação de Poliovacina que se apresenta para como marca ser registada. Falta-lhe o seu elemento ou re- quisito essencial - da especialidade ou eficácia dis- tintiva - nem dos seus elementos e essa falta compro- mete e afecta o seu todo ou significado em conjunto, dada a importância e relevo que nele desempenha esse elemento, que é o principal e o que maior carácter im- prime e maior influência desempenha. Poliomielite é uma doença apenas ; vacina é uma

forma de tratamento comum a muitas doenças, apli- cada por diferentes formas e com diversos modos ; tem carácter geral e genérico, amplo e vasto e não restrito ou específico ; não é adequado apenas àquela doença, nem é o único ou pode ser aplicado por uma única forma ou com um só produto ou medicamento. E um processo de tratamento, por prevenção ou cura. E m tais condições, nega-se, pelos fundamentos ex-

postos, provimento ao recurso e confirma-se o despa- cho recorrido, condenando-se o recorrente nas custas . e imposto de justiça devidos, que, de harmonia com

o disposto no artigo 17.° e § 2.° do Código das Custas, fixo em metade. Notifique e registe.

Lisboa, 27 de Janeiro de 1958. - António Augusto de Oliveira Pinto.

Para os devidos efeitos se declara que a sentença transcrita foi confirmada pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de Março de 1959, que transitou em julgado.

Está conforme.

Lisboa, 14 de Maio de 1959. - O Chefe da 2.ª Secção, Jaime Pablo Pereira.

Acordam, em conferência, na Relação de Lisboa: O Laboratório Farmacológico J. J. Fernandes, L.da,

domiciliado nesta cidade, recorreu, tempestivamente, para o tribunal cível desta comarca do despacho de 3 de Abril de 1957 da Ex.ma Direcção-Geral do Comér- cio, publicado onde de direito, que lhe recusou o re- gisto, na classe 5.ª, da marca industrial n.° 83 392, ùnicamente constituída pelo vocábulo Poliovacina e destinada a assinalar preparações e produtos farma- cêuticos, a cujo deferimento se havia oposto American Pharmaceutical Manufacturers Association, Inc. Avocado o respectivo processo, que consta do apenso,

seguiu o recurso seus legais termos, mas sem que a referida firma opositora se haja interessado pela de- cisão dele. Não obstante, concluso o feito para julga- mento, no 8.° juízo cível, a quem coubera em dis- tribuição, proferiu o M. mo Juiz a douta sentença de fls. 12 e seguintes, negando provimento ao recurso e, consequentemente, confirmando o despacho recorrido da referida Direcção-Geral do Comércio, com custas pelo recorrente, fixando o respectivo imposto de jus- tiça em metade. Inconformado, ainda, com esta sentença, dela traz

o Laboratório Farmacológico J. J. Fernandes, L.da, a presente apelação, que se mostra alegada, a fls. 46 e seguintes, com estas conclusões, em resumo: A designação Poliovacina, composta pelos elementos

polio (indicativo da doença) e vacina (indicativo do medicamento), tem originalidade e eficácia para dis- tinguir o produto entre os seus congéneres; a desinên- cia (?) vacina é insusceptível de apropriação exclu- siva, visto não constituir fantasia, mas traduzir a acção terapêutica do produto, pelo que qualquer industrial pode usar essa desinência num produto que fabrique, desde que a integre num conjunto que tenha origina- lidade; o mesmo já tem sido decidido quanto a de- signações em que um dos elementos é uma desinência semelhante, tais como Poliobiótico e Poliéster - pelo que solicita a revogação da sentença apelada e se or- dene o registo recusado. A sociedade estrangeira acima referida também se

absteve de acompanhar aqui o recurso. Conhecendo: Todos estamos de acordo, e assim tinha de ser, visto

se tratar de claros conceitos gerais, que compete aos industriais ou fabricantes o direito de usar marcas comerciais ou industriais para distinguirem os pro- dutos da sua actividade económica, gozando da pro- priedade e do exclusivo delas, desde que as mesmas satisfaçam as prescrições legais, designadamente a re- lativa ao seu registo (artigos 74.° e 76.° do Código

da Propriedade Industrial). E é mais de lei que a marca pode ser constituída por um sinal ou conjunto de sinais nominativos, figurativos ou emblemáticos que, aplicados por qualquer forma num produto ou no seu invólucro, o façam distinguir de outros idênticos ou semelhantes (artigo 79.° do citado código). E dada a forma tão ampla como os respectivos pre-

ceitos se acham redigidos na nossa e nas legislações alheias, necessário se tornava que o legislador indi- casse os casos em que o registo das marcas deve ser recusado, por não satisfazerem aos escopos visados na lei.

E por isso que no § 1.° daquele artigo 79.° expres- samente se estabeleceu que não satisfazem às condi- ções deste artigo as marcas exclusivamente compostas de sinais ou indicações que possam servir no comércio para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, o lugar de origem dos produtos ou a época da produção, ou que se tiverem tornado usuais na linguagem corrente ou nos hábitos leais e cons- tantes do comércio.

E, pela mesma razão, no § 2.° foi estatuído que «as cores, por si sós, não podem constituir marca, salvo se forem unidas e combinadas entre si ou com grá- ficos, dizeres impressos e outros elementos, por forma peculiar e distintiva». Tira-se, pois, dos citados pre- ceitos, no que também concorda o apelante, que é condição sine qua non para se obter o registo de al- guma marca que ela satisfaça a sua função específica de distinção em relação a qualquer outro produto idên- tico ou semelhante, isto é, congénere. Ora, no caso em exame, o Laboratório Farmacoló-

gico J. J. Fernandes, L.da, pretendia registar a sua marca Poliovacina para distinguir «os seus produtos farmacêuticos, produtos químicos e farmacêuticos, pre- parações farmacêuticas e medicamentos para homens e animais (sic). Simplesmente, conforme ele confessa e reconhece, serviu-se do radical polilo, abreviatura de poliomielite, e da palavra vacina, os quais, mesmo juntos, nada acrescentam ao poder de tratamento, de cura ou de prevenção, omitindo inteiramente os prin- cipais sais ou agentes actuantes. Ora é sabido, como factos notórios, que para tratar preventivamente ou já depois de declarada qualquer doença, assim nos ho- mens como nos restantes animais, podem ser usados os mais diversos agentes físicos e químicos, salinos ou alcalinos, tanto já inventados como ainda por des- cobrir, meios que poderão ser porventura absoluta- mente diferentes uns dos outros, mesmo com vista à doença para cujo tratamento o apelante pretende re- gistar a sua marca industrial e comercial em causa.

Mas não pode deixar de se concluir que, concedido tal registo para assinalar os produtos acima aludidos, como bem observa a decisão recorrida, nenhum outro industrial ou farmacêutico poderia amanhã vir a re- gistar outro produto congénere, pois não haveria ma- neira de o destrinçar e distinguir devidamente - já que Poliovacina abrangeria necessàriamente todo e qualquer outro meio preventivo para a gravíssima doença em referência. Não pode ser. E não será, porque ao vocábulo a que

o recorrente quer atribuir eficácia distintiva de todo falta tal qualidade. Com efeito, como bem pondera o M.mo Juiz a quo,

pelo «registo da marca em tais condições ficará ve- dado o registo da marca de uma vacina contra a po- liomielite com qualquer produto, ainda que tenha o carácter de novidade, a que se refere o § 1.° do citado artigo 74.°, porque qualquer vacina contra a polio- mielite ficaria abrangida pelo registo da marca refe- rida nos autos, que não especifica ou individualiza,

não distingue a forma do seu emprego, os produtos que entram na sua aplicação». De sorte que, concedendo-se o registo solicitado, «a

marca ficaria a ter carácter de puro exclusivismo, por ela se açambarcando e dominando toda a espécie e qualidade de vacina tendente ao tratamento da polio- mielite». Ou, o que vale o mesmo, a proceder a tese do apelante, fechada ficaria inteiramente a todos os fabricantes de produtos farmacêuticos a porta para obterem, de futuro, o registo de qualquer outra marca, com qualquer outra fórmula, para tratamento da re- ferida doença. Quer dizer: ninguém mais no nosso país poderia vir

a assinalar, com nova marca, os seus produtos para a prevenção de tão traiçoeira moléstia ... por mais gri- tante que fosse a sua novidade. Assim, longe de estar errado o raciocínio da sen-

tença sub judice, também o temos por certo e seguro, erróneo sendo o dizer-se ex adverso que a palavra vacina possa indicar o medicamento usado, pois não contém a mais mínima alusão ou referência aos prin- cípios, elementos ou agentes operantes, o que já não acontece com os vocábulos Polibiótico e Poliéster.

E se, contra os argumentos acima referidos, outros registos de marcas foram concedidos em condições aná- logas às do apelante, isso não é razão para se acom- panhar aqui tal prática, porquanto a única indicação que da palavra Poliovacina pode tirar-se é que se trata de uma vacina contra a dita doença, ou seja ape- nas o destino do produto, mas isso não satisfaz ao objectivo legal do registo citado (§ 1.° do artigo 79.° do Código da Propriedade Industrial). Pelos fundamentos expostos, improcedentes as con-

clusões do recurso, nega-se-lhe provimento, confir- mando-se a douta sentença recorrida. Custas pelo apelante. Transitando, cumpra-se o artigo 210.° do Código da

Propriedade Industrial.

Lisboa, 25 de Junho de 1958. - Amorim Girão Amílcar Ribeiro - Alberto Toscano.

Está conforme.

Lisboa, 30 de Junho de 1958. -Francisco José Pe- reira de Medeiros Galvão.

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: O Laboratório Farmacológico J. J. Fernandes, L.da,

desta cidade, requereu o registo da marca industrial e comercial Poliovacina, destinada a proteger produtos químicos e farmacêuticos. Opôs-se a associação norte-americana American Phar-

maceutical Manufacturers Association, Inc., sendo a pretensão da requerente indeferida por despacho da Direcção-Geral do Comércio, por a marca não ter efi- cácia distintiva. O despacho foi confirmado por sentença de fl. 12

e esta pelo acórdão de fl. 56, de que o requerente in- terpôs a presente revista, concluindo na sua douta ale- gação:

a) A marca Poliovacina tem originalidade e efi- cácia distintiva;

b) Individualiza o produto e sugere a acção te- rapêutica do medicamento;

c) As palavras polio e vacina indicam, respecti- vamente, a doença e o medicamento;

d) Outras designações podem indicar vacinas con- tra a poliomielite;

e) A originalidade da palavra Poliovacina é se- melhante à das palavras Polibiótico, Poliés- ter e Finameia, já reconhecidas pelos tri- bunais.

No seu douto parecer sustenta o Sr. Procurador- -Geral da República que a marca não tem eficácia distintiva, como se exige no artigo 79.° do Código da Propriedade Industrial. Cumpre decidir. Dois são os processos fundamentais da formação de

palavras: a derivação, feita por meio de sufixos, e a composição, realizada por meio de prefixos ou ligando as palavras umas às outras em ordem a formarem uma só palavra. O vocábulo Poliovacina é uma palavra composta de

duas simples: polio, abreviatura de poliomielite - a pa- ralisia infantil epidémica -, e vacina, que nos nossos dias corresponde a um grande número de substâncias capazes de produzir a imunidade específica a muitas doenças. A ideia da palavra poliovacina corresponde às ideias

singulares dos seus componentes, o que, aliás, muitas vezes não sucede. Simplesmente, a palavra vacina foi restringida pelo termo polio, significando Poliovacina: «vacina contra a poliomielite».

Esclarecida a origem e o significado daquele termo, pergunta-se agora: poderá registar-se, como o recor- rente pretende, a marca Poliovacina? Vejamos: U m dos requisitos essenciais da marca é, como se

sabe, o da sua especialidade, isto é, a marca deve ser distinta de qualquer outra já existente. O princípio da especialidade não se acha explicita-

mente enunciado na nossa lei, como sucede, de resto, na generalidade das legislações estrangeiras. Mas resulta de diversas disposições da lei, como,

por exemplo, dos artigos 74.°, § 1.°, 79.°, 93.°, n.° 12.°, 94.°, § único, 95.° e 122.°, n.° 4.°, do Código da Pro- priedade Industrial. Ninguém contesta, em face destes preceitos legais,

que a marca deve ter eficácia distintiva. Ora a primeira consequência deste princípio fun-

damental é a de que, quanto às marcas nominativas, não pode admitir-se a simples denominação ou desig- nação necessária ou usual do produto, nem tão-pouco a simples indicação das suas qualidades dominantes ou da sua composição. Como bem frisa o Sr. Prof. Pinto Coelho, reconhe-

cer a alguém o direito exclusivo, no campo da marca nominativa, de designar um produto pelo seu nome usual ou vulgar seria, além de tudo, conferir-lhe um privilégio inadmissível (Lições de Direito Comercial, I, 363). Das considerações feitas parece decorrer, por forma

irrecusável, que a palavra Poliovacina é uma expressão correspondente e abreviada de «vacina contra a po- liomielite ».

E, sendo assim, aquela palavra é desprovida da efi- cácia distintiva exigida à marca, não passa da desig- nação usual de um produto, não satisfaz ao requisito da especialidade exigido por lei. É certo ter havido hesitações na jurisprudência, o

que bem se compreende em assunto não isento de difi- culdades, mas a orientação adoptada é, sem dúvida, a que mais se harmoniza com os textos legais citados.

Pelo exposto, nega-se a revista, confirma-se o acór- dão recorrido e condena-se o recorrente nas custas.

Lisboa, 17 de Março de 1959. - Campos de Carva- lho - S. Figueirinhas - Lencastre da Veiga - Agos- tinho Fontes - A. Sampaio Duarte.

O acórdão transcrito foi devidamente notificado, tendo transitado em julgado.

Está conforme.

Secretaria do Supremo Tribunal de Justiça, 20 de Março de 1959.-O Chefe de Secção, João Alves de Nóbrega.