INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL E FILOSOFIA DA MENTE NA EDUCAÇÃO

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Revista Carioca de Ciência, Tecnologia e Educação (online). Rio de Janeiro: v.6, n.2, 2021. E-ISSN 2596-058X INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL E FILOSOFIA DA MENTE NA EDUCAÇÃO Larissy Santos da Silva Estudante do curso de Tecnologia em Análise e Desenvolvimento de Sistemas do Instituto Federal de São Paulo (IFSP) - Caraguatatuba. http://orcid.org/0000-0002-2590-0449 Ricardo Roberto Plaza Teixeira Docente de Física e Professor Titular do Instituto Federal de São Paulo (IFSP) - Caraguatatuba. Doutor em Física pela USP. http://orcid.org/0000-0001-7124-1774 Data de submissão: 16/09/2021 Data de aprovação: 18/10/2021 RESUMO Este artigo tem como finalidade investigar as possibilidades de inserção de temas relacionados ao estudo da Filosofia da Mente, da Inteligência Artificial e da História da Computação na área da educação. Em particular são analisados os impactos de uma atividade educacional em torno desses temas e que foi realizada junto a alunos de um curso de Tecnologia em Análise e Desenvolvimento de Sistemas do campus de Caraguatatuba do Instituto Federal de São Paulo (IFSP), de modo remoto, em dois momentos distintos, em 2020 e em 2021. As impressões dos alunos participantes sobre esses tópicos foram mensuradas por meio das respostas dadas por eles para um questionário com perguntas fechadas e abertas, elaborado para poder analisar as concepções prévias que eles trazem sobre conceitos dessas áreas. A sistematização dos dados obtidos, a partir das respostas fornecidas a um “Formulário Google”, produziu tabelas e gráficos que permitiram compreender a influência significativa que a cultura popular, particularmente as obras de ficção científica, exercesobre o imaginário das pessoas quando se trata de pensar sobre o futuro da computação e da evolução da relação entre máquinas e humanos. Palavras-chave: pensamento; aprendizagem; história da computação; teste de turing; consciência. ARTIFICIAL INTELLIGENCE AND PHILOSOPHY OF MIND IN EDUCATION ABSTRACT This article aims to investigate the possibilities of inserting themes related to the study of the Philosophy of Mind, Artificial Intelligence and History of Computing in the field of education. In particular, the impacts of an educational activity around these themes and which was carried out with students of a Technology in Analysis and Systems Development course at the Caraguatatuba campus of the Federal Institute of São Paulo (IFSP), remotely, in two different moments, in 2020 and in 2021, are analyzed. The

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INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL E FILOSOFIA DA MENTE NA EDUCAÇÃO

Larissy Santos da Silva

Estudante do curso de Tecnologia em Análise e Desenvolvimento de Sistemas do Instituto Federal de São

Paulo (IFSP) - Caraguatatuba. http://orcid.org/0000-0002-2590-0449

Ricardo Roberto Plaza Teixeira Docente de Física e Professor Titular do Instituto Federal de São Paulo (IFSP) - Caraguatatuba.

Doutor em Física pela USP.

http://orcid.org/0000-0001-7124-1774

Data de submissão: 16/09/2021 Data de aprovação: 18/10/2021

RESUMO

Este artigo tem como finalidade investigar as possibilidades de inserção de temas

relacionados ao estudo da Filosofia da Mente, da Inteligência Artificial e da História da

Computação na área da educação. Em particular são analisados os impactos de uma

atividade educacional em torno desses temas e que foi realizada junto a alunos de um

curso de Tecnologia em Análise e Desenvolvimento de Sistemas do campus de

Caraguatatuba do Instituto Federal de São Paulo (IFSP), de modo remoto, em dois

momentos distintos, em 2020 e em 2021. As impressões dos alunos participantes sobre

esses tópicos foram mensuradas por meio das respostas dadas por eles para um

questionário com perguntas fechadas e abertas, elaborado para poder analisar as

concepções prévias que eles trazem sobre conceitos dessas áreas. A sistematização dos

dados obtidos, a partir das respostas fornecidas a um “Formulário Google”, produziu

tabelas e gráficos que permitiram compreender a influência significativa que a cultura

popular, particularmente as obras de ficção científica, exercesobre o imaginário das

pessoas quando se trata de pensar sobre o futuro da computação e da evolução da

relação entre máquinas e humanos.

Palavras-chave: pensamento; aprendizagem; história da computação; teste de turing;

consciência.

ARTIFICIAL INTELLIGENCE AND PHILOSOPHY OF MIND IN EDUCATION

ABSTRACT

This article aims to investigate the possibilities of inserting themes related to the study of

the Philosophy of Mind, Artificial Intelligence and History of Computing in the field of

education. In particular, the impacts of an educational activity around these themes and

which was carried out with students of a Technology in Analysis and Systems

Development course at the Caraguatatuba campus of the Federal Institute of São Paulo

(IFSP), remotely, in two different moments, in 2020 and in 2021, are analyzed. The

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impressions of the participating students on these topics were measured through the

answers given by them to a questionnaire with closed and open questions, designed to be

able to analyze the previous conceptions they bring on concepts in these areas. The

systematization of the data obtained, through the responses provided to a "Google Form",

produced tables and graphs that allowed us to understand the significant influence that

popular culture, particularly works of science fiction, exerts on people's imagination when

it's about thinking about the future of computing and the evolution of the relationship

between machines and human beings.

Keywords: thought; learning; history of computing; turing test; conscience.

INTELIGENCIA ARTIFICIAL Y FILOSOFÍA DE LA MENTE EN EDUCACIÓN

RESUMEN

Este artículo tiene como objetivo investigar las posibilidades de insertar temas

relacionados con el estudio de la Filosofía de la Mente, la Inteligencia Artificial y la Historia

de la Computación en el campo de la educación. En particular, se analizan los impactos

de una actividad educativa en torno a los temas mencionados anteriormente, y que se

llevó a cabo con estudiantes de un curso de Tecnología en Análisis y Desarrollo de

Sistemas en el campus Caraguatatuba del Instituto Federal de São Paulo (IFSP), de

manera remota, en dos momentos distintos, en 2020 y en 2021. Las impresiones de los

estudiantes participantes sobre estos temas se midieron a través de las respuestas

(dadas por ellos – TIRAR) a un cuestionario con preguntas cerradas y abiertas, diseñado

para(poder – TIRAR) analizar las concepciones previas que tienen sobre conceptos en

estas áreas y sobre las perspectivas de su desarrollo en el tiempo. La sistematización de

los datos obtenidos, a través de las respuestas ofrecidas a un "Formulario Google",

produjo tablas y gráficos que permitieron comprender la significativa influencia que la

cultura popular, en particular las obras de ciencia ficción, ejerce sobre la imaginación de

las personas a la hora de pensar el futuro de la informática y la evolución de la relación

entre máquinas y humanos.

Palabras clave: pensamiento; aprendizaje; historia de la informática; test de turing;

conciencia.

1 INTRODUÇÃO

Este artigo objetiva analisar as possibilidades de uso de temas relacionados às áreas da filosofia da mente, da Inteligência Artificial (IA) e da história da computação com propósitos pedagógicos e formativos. Em particular são analisados os impactos de atividades educacionais tendo esses temas como foco, bem como as concepções dos participantes dessas atividades. Após a introdução, é realizada uma síntese da revisão bibliográfica realizada para fundamentar teoricamente essa pesquisa, e, em seguida, é feita uma apresentação da metodologia utilizada tanto no planejamento das atividades realizadas, quanto para a coleta de dados a respeito delas. Na sequência, são analisados os dados obtidos por meio de um questionário respondido pelos participantes das ações implementadas. Ao término do artigo são feitas as considerações finais.

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Essa pesquisa, em específico, analisa os resultados de uma experiência didática envolvendo o trabalho com temas da história da computação, da Inteligência Artificial e da filosofia da mente, no contexto da disciplina “História da Ciência e da Tecnologia” que é ministrada no primeiro semestre do curso de Tecnologia em Análise e Desenvolvimento de Sistemas do campus de Caraguatatuba do Instituto Federal de São Paulo (IFSP). Esse estudo foi realizado para investigar os impactos e a importância da inserção de temas relacionados à evolução histórica de conceitos científicos e tecnológicos para estudantes de cursos da área da computação, inclusive analisando como esses tópicos podem fortalecer o exercício da criatividade, algo importante para a formação destes profissionais. As experiências e os conhecimentos propiciados por essa investigação podem auxiliar os professores a escolherem as abordagens mais promissoras em termos educacionais para a inserção desses tópicos em suas aulas, bem como permitem analisara importânciadesses temas para o desenvolvimento profissional.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

O estudo da história da computação, da Inteligência Artificial e da filosofia da mente é fundamental para conhecer os fundamentos da Ciência da Computação, para compreender de modo mais apurado a evolução dos recursos, das técnicas e dos métodos existentes atualmente nessa área e para ampliar o senso crítico com relação ao papel da computação no nosso cotidiano e sobre o seu desenvolvimento futuro (SANTOS; FIGUEIREDO, 2016). Embora existam períodos revolucionários e de mudanças de paradigmas, a ciência normalmente é cumulativa e as pesquisas evoluem geralmente a partir dos resultados do passado, que servem de fundamento para a construção de instrumentos mais poderosos para obter medidas mais precisas (FONSECA, 2007).

A filosofia da mente guarda uma relação próxima com a história da computação: em particular o trabalho “ComputingMachineryandIntelligence” de Alan Turing publicado em 1950 é um divisor de águas. Nesta obra, Turing não procura definir teoricamente o que é inteligência e pensamento, mas sim, propõe testes práticos para decidir se uma máquina é inteligente ou não (CARDOSO FILHO, 2016). Esse tipo de postura se tornou modelo para um tipo de abordagem de caráter mais pragmático acerca do assunto. Entretanto, o desenvolvimento da área de estudo sobre a natureza dos estados mentais recorre com frequência à analogia entre computadores e cérebros, para traçar semelhanças e diferenças e compreender o que é o pensamento (TEIXEIRA, 2016).

Na área da filosofia da mente, um debate relevante que tem sido traçado nas últimas décadas é a respeito da distinção entre Inteligência Artificial no sentido forte e no sentido fraco: em uma IA forte, os computadores adequadamente programados literalmente têm estados cognitivos e, portanto, pensam do mesmo modo como fazemos nós, seres humanos; em uma IA fraca, os computadores apenas simulam o ato de pensar (SEARLE, 1981). O estudo sobre as diferenças existentes entre um cérebro e um computador está na base desse debate. Uma questão chave nesse contexto é a seguinte (COSTA, 2005): são os estados mentais fenômenos estritamente biológicos ou os computadores poderiam em princípio ser capazes de tê-los? Além disso: os processos mentais seriam em última instância de natureza física, como, por exemplo, o processo de fotossíntese realizado pelas plantas ou eles teriam uma natureza imaterial, sem nada em comum com o mundo físico?

Por trás dessas questões está, fundamentalmente, o conhecido problema mente-corpo (MASLIN, 2009): qual é a relação, em geral, existente entre fenômenos mentais e fenômenos físicos. Nós sabemos que está no cérebro a base causal da consciência, mas nós não compreendemos como isso acontece (MCGINN, 1989). No âmbito filosófico, essa

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é, portanto, uma questão ontológica, termo usado para a investigação das coisas que realmente existem e sobre qual a sua natureza essencial (CHURCHLAND, 1998): assim, ao perguntar sobre a ontologia dos estados mentais, o objetivo é compreender do que eles realmente consistem. Tradicionalmente, os filósofos da mente se dividem em dualistas e materialistas: os dualistas entendem que a mente tem uma substância não-física, o que implica na separação entre mente e corpo como proposta por Descartes (ALMOG, 2002), enquanto os materialistas entendem que os processos mentais estão calcados em uma materialidade física (FODOR, 1981).

A filosofia da mente é com certeza uma das subáreas mais ativas da Filosofia contemporânea, dentre outros motivos pela diversidade de tópicos abrangidos, pela diversidade de metodologias que podem ser usadas na investigação acerca do conceito de mente e pelo fato de que os fenômenos mentais são de vital importância para quase todas as atividades humanas (STICH, 2003). Muito provavelmente são as características da mente humana que distinguem os seres humanos dos outros animais. Especialmente as intersecções da filosofia da mente com a neurociência e a Inteligência Artificial são de grande interesse contemporâneo, especialmente pelo potencial de produzir avanços nos conhecimentos científicos envolvidos. Algo que é central nessa área do conhecimento é a característica denominada de intencionalidade que associamos aos seres humanos, por exemplo, mas não a computadores, pelo menos até o momento (BAILEY et al., 2010).

O uso da filosofia da mente na educação pode ser bastante beneficiado por estratégias de ensino interdisciplinares que abarquem aárea da ciência cognitiva e o estudo da linguagem, dentre outros campos de conhecimento. O estudo da mente é uma das áreas mais excitantes e importantes sob investigação intensa na atualidade, em uma empreitada que é realizada por pesquisadores das mais diversas áreas, tais como filosofia, psicologia, neurociência, computação e etologia, dentre outras (CUNNJINGHAM, 2000). O trabalho educacional com temas que estão situados na fronteira da ciência atual pode ser algo motivador para os alunos pelo fato de eles perceberem que há problemas vivos e ainda não resolvidos na ciência, e que, portanto, valem a pena ser investigados sobretudo – mas não somente – pelo desafio envolvido.

A mente humana está relacionada à criatividade e, portanto, à ideia de criar algo que seja novo (FAZI, 2019): desse modo a pergunta fundamental a se fazer a respeito de uma Inteligência Artificial, pode ser “Pode uma máquina pensar algo novo?” Uma pergunta como essa foge ao paradigma de uma máquina simulando o pensamento humano e provoca uma inquirição, em certo sentido, de ordem superior a pergunta feita por Turing, e que está relacionada à possibilidade de um novo comportamento em computação poder ser derivado não da quebra de regras, mas sim de segui-las.Essa é uma área de estudo denominada de “criatividade computacional” e que se encontra em franco desenvolvimento, inclusive no que diz respeito ao aprendizado de máquina, um tipo de Inteligência Artificial que confere aos computadores a capacidade de aprender a partir de um grande conjunto de dados e de adquirir conhecimento de forma automática (MONARD; BARANAUSKAS, 2003). Essa possibilidade implicaria que o processamento computacional poderia engendrar modos autônomos de produção de novos conhecimentos de maneira automatizada.

3 METODOLOGIA

Inicialmente, de modo a fundamentar teoricamente esse trabalho, foi realizada uma revisão bibliográfica, a partir de diferentes fontes como o “Google Scholar” e a Biblioteca Científica Eletrônica Online “Scielo”, acerca dos temas centrais em foco. Nessas buscas foram usados termos como “Filosofia da Mente”, “História da Computação”, “Inteligência

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Artificial” e “Teste de Turing”; além disso,priorizaram-se artigos de revistas eletrônicas e trabalhos apresentados em Congressos Acadêmicos, sem restrições quanto ao período de tempo das publicações. Por esses mecanismos, foram, em um primeiro momento, selecionados diversos trabalhos acadêmicos, que mais tarde foram lidos e seus conteúdos sistematizados na forma de fichamentos e resenhas que serviram para fornecer conhecimentos para as atividades.

Deste modo, foi planejada uma atividade com cerca de 1 hora e 20 minutos de duração, abordando a história da computação, a filosofia da mente e áreas afins do conhecimento. Foi estruturada uma apresentação por meio do programa PowerPoint com textos, informações e imagens acerca dos temas abordados. Também foram exibidos alguns vídeos de curta duraçãosobre alguns dos tópicos abordados. Dentre os assuntos em foco estiveram: a história da computação ao longo dos séculos; a obra do matemático Alan Turing; o Teste de Turing; o experimento mental da Sala Chinesa de Searle; o tema da Inteligência Artificial (IA) sob a perspectiva da Ficção Científica (FC); as leis da robótica propostas pelo escritor Isaac Asimov; o debate envolvendo os conceitos de IA Forte e IA Fraca; a natureza da consciência humana; a noção de algoritmo; as diferenças do modo de funcionamento entre um cérebro humano e um computador.

Esta apresentação foi realizada durante uma aula da disciplina “História da Ciência e da Tecnologia” (HCT) do curso de Tecnologia em Análise e Desenvolvimento de Sistemas do campus de Caraguatatuba do Instituto Federal de São Paulo (IFSP). Isso ocorreu em dois momentosdistintos: no mês de outubro de 2020 e no mês de agosto de 2021, para as turmas de alunos ingressantes respectivamente em 2020 e 2021, no período noturno, no horário regular de funcionamento desse curso. Essas aulas, devido à pandemia de COVID-19 foram ministradas remotamente de modo síncrono pela plataforma Teams da Microsoft, a qual os alunos do IFSP podem acessar gratuitamente. Em cada um dos dois casos, cerca de 30 alunos participaram da aula de modo remoto. Como a história da computação era um dos assuntos planejados para ser abordado pela disciplina de HCT, essa unidade temática tinha sido planejada desde o início do semestre para fazer parte de uma aula dupla com duração total de 100 minutos.

Para mensurar os impactos da atividade, bem como investigar as concepções dos alunos acerca dos temas abordados, foi elaborado um questionário com questões consideradas importantes para essa pesquisa. Esse questionário foi disponibilizado aos alunos que assistiram a aula, por meio do chat da plataforma Teams, no formato de um “Formulário Google”. Os alunos foram convidados para que o respondessem, mas foi deixado claro que isso não era obrigatório e que não seria considerado para efeito de avaliação dos alunos no que diz respeito à obtenção de “nota” para aprovação na disciplina. Nas duas ocasiões, uma parte dos alunos que assistiam à aula de modo remoto, aceitou o convite para responder o questionário: 10 alunos na atividade realizada em 2020 e 14 alunos na atividade realizada em 2021, somando um total de N=24 alunos que responderam ao questionário. Os dados obtidos foram sistematizados em planilhas eletrônicas e interpretados tendo como base os eixos temáticos dessa investigação (filosofia da mente, história da computação e Inteligência Artificial), a partir das porcentagens calculadas e de tabelas e gráficos construídos para permitir uma melhor compreensão acerca das visões e concepções dos alunos.

Quanto ao questionário, ele foi elaborado com questões fechadas (com alternativas) e abertas (dissertativas) e foi disponibilizado aos participantes na parte final da aula. Na sequência, serão analisados as tabelas e os gráficos gerados com as porcentagens das respostas dadas pelos alunos, assim como as respostas escritas pelos alunos para as questões abertas que foram dispostas em quadros.

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4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Como citado anteriormente, N=24 alunos do curso de Tecnologia em Análise e Desenvolvimento de Sistemas do IFSP-Caraguatatuba responderam as questões que serão discutidas abaixo, versando basicamente sobre temas relacionados ao estudo da filosofia da mente e de áreas afins. Os estudantes foram convidados a responder essas questões que foram disponibilizadas a eles pelo link de um “Formulário Google”.

As duas primeiras questões perguntaram acerca do perfil dos alunos, quanto ao gênero e quanto à idade. O Quadro 1 mostra a distribuição percentual dos alunos que responderam ao questionário, de acordo com o gênero: nota-se uma presença consideravelmente maior (79%) de pessoas do gênero masculino na amostra de respondentes, algo que é uma característica do corpo discente do curso de Tecnologia em Análise e Desenvolvimento de Sistemas. Desde a inauguração do curso em 2011, até a turma que se iniciou em 2021, todas as turmas de ingressantes apresentavam uma presença significativamente maior de alunos do sexo masculino do que feminino. Em ambas as turmas ingressantes de 2020 e de 2021, a porcentagem de alunas foi de cerca de 19%.

Quadro 1 - Distribuição das porcentagens das pessoas que responderam ao questionário por gênero.

GÊNERO PORCENTAGENS

Masculino 79%

Feminino 21%

Fonte: Elaborada pelos autores (2021).

Conforme o Quadro 2, na questão da idade, mais que três quartos dos alunos (76%) tem entre 17 e 19 anos de idade. É geralmente essa a idade de uma parcela considerável dos ingressantes de cursos universitários, em geral.

Quadro 2 - Distribuição das porcentagens das pessoas que responderam ao questionário por faixa de idade (em anos).

IDADE EM ANOS PORCENTAGENS

17 13%

18 42%

19 21%

21 4%

22 8%

23 4%

39 4%

49 4%

Fonte: Elaborada pelos autores (2021).

A primeira pergunta do questionário (aberta) procurou identificar as referências culturais, especialmente aquelas relacionadas à ficção científica que as pessoas têm quando pensam em conceitos relacionados à área da Inteligência Artificial. A pergunta foi “Quando você escuta a expressão "Inteligência Artificial" qual filme ou série de TV/Streaming vem imediatamente a sua mente?”. De todas as respostas, as que apareceram com maior frequência foram: a série “Black Mirror"; a obra (filme e livro) “Eu, Robô” e o filme “A.I - Inteligência Artificial” (Quadro 3). Diversos alunos citaram mais de uma obra, evidenciando a popularidade da ficção científica na cultura popular.

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Quadro 3 - Respostas mais significativas dadas à questão aberta: “Quando você escuta a expressão "Inteligência Artificial" qual filme ou série de TV/Streaming vem imediatamente a sua mente?”

Black Mirror

Eu, Robô

A.I. - Inteligência Artificial

Vingadores - Era de Ultron

Westworld

ExMachina

Transformers

Exterminador do futuro

O Jogo da Imitação

Matrix

LegendsofTomorrow

Tau

Mundo Mistério

Fonte: Elaborada pelos autores (2021).

A segunda pergunta (fechada) foi: “Você acha o Teste de Turing suficiente para identificar a inteligência de uma máquina?” Seu objetivo era avaliar a concepção dos alunos sobre o conceito de inteligência, ou seja, sobre se somente a imitação de um determinado comportamento humano pode ser suficiente para considerar uma máquina como sendo inteligente.

Basicamente, o teste de Turing testa a capacidade que uma máquina tem de exibir um comportamento inteligente que seja indistinguível de um ser humano, ao responder questões que são feitas a ela por interfaces (sistemas de comunicação) escritas e verbais (TURING, 1950).

Durante a aula ministrada sobre a história da computação, foi discutido o teste de Turing, na forma conceitual proposta originalmente pelo matemático Alan M. Turing, como um tipo de Jogo da Imitação, no qual uma máquina tenta imitar o comportamento e as respostas dadas por seres humanos para uma gama de diferentes tipos de perguntas.

A maior parte dos alunos (46%) considera que o teste de Turing não seria um bom parâmetro para identificação de inteligência em uma máquina; ainda assim 33% responderam que não sabem se o teste de Turing é ou não suficiente para identificar a inteligência de uma máquina e 21% responderam que pensam que o teste de Turing é suficiente para identificar a inteligência de uma máquina (Figura 1).

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Figura 1 - Gráfico com a distribuição das porcentagens das respostas para a questão: “Você acha o Teste de Turing suficiente para identificar a inteligência de uma máquina?”

Fonte: Elaborada pelos autores (2021).

A terceira questão (aberta) foi “Que pergunta você faria para identificar se você está conversando com uma máquina ou um ser humano?” Essa questão está intimamente relacionada com o Teste de Turing e o jogo da imitação que na sua essência é um jogo de simulação de comportamentos humanos (SILVA; ARRUDA, 2019) em diálogos com perguntas e respostas. Grande parte das respostas baseou-se no conceito de “sentimento”, indicando que os alunos consideram não somente que o sentimento é algo inerentemente humano, mas que envolve também muita complexidade quando se trata de tentar defini-lo ou identificá-lo. Além disso, outras respostas sugeriram perguntas eticamente complexas (sobre uma opinião política, por exemplo) ou perguntas sem nexo, para causar confusão. Ocorreram também perguntas relacionadas a decisões familiares e de carreira e alguns alunos, inclusive, não souberam responder a essa questão.

Quadro 4 - Respostas mais significativas dadas à questão aberta: “Que pergunta você faria para identificar se você está conversando com uma máquina ou um ser humano?”

Você tem sentimentos? / O que significa amar para você? /Descreva o que você sente quando toma um sorvete / O que você está sentindo agora? / Alguma pergunta que envolvesse sentimentos, já que as máquinas não têm a capacidade de sentir sensações humanas / O que é o amor? / Descreva o que você está sentindo. / O que você sente quando escuta música? / Você tem sentimentos? Se sim, descreva-os / O que te traz felicidade? / O que te faz rir? / Quem você ama? / Algo relacionado a sentimentos e emoções humanas / Se ela tem sentimentos /

Alguma pergunta sem sentido exato, por exemplo "Quantos olhos possui uma mesa?"

Algo que envolvesse um assunto complexo, que divide opiniões das pessoas, como opinião política, uma máquina tentaria dar uma opinião de forma mais isenta e clara possível (se não estamos pensando numa distopia cyberpunk), algo para um ser humano, seria incomum.

Qual número representa o tamanho do universo? Responda em uma semana. / Qual o 40º número primo.

Qual seu objetivo para o futuro?

Quem você chama quando acaba o papel higiênico?

Perguntar se ela é humana / Você é um robô?

Fonte: Elaborada pelos autores (2021).

21%

46%

33%

0%

5%

10%

15%

20%

25%

30%

35%

40%

45%

50%

Sim Não Não sei

Distribuição das porcentagens das repostas para a questão: “Você acha o Teste de Turing suficiente para identificar a inteligência de

uma máquina?”

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Uma quarta pergunta (aberta) indagou: “Você conseguiria propor um teste diferente do teste de Turing para identificar se uma máquina é inteligente ou não? Se sim, qual?” Neste caso, somente 21% dos alunos responderam afirmativamente, com sugestões como: focar no teor sentimental do aspecto humano; enfatizar um dos sentidos básicos do ser humano, como o olfato; realizar um teste artístico (Quadro 5).

Quadro 5 - Respostas mais significativas dadas por aqueles que responderam de forma afirmativa a questão aberta: “Você conseguiria propor um teste diferente do teste de Turing para identificar se uma máquina é inteligente ou não? Se sim, qual?”

Sim, acho que eu pediria para o computador definir o conceito de algum sentimento como amor, medo etc.

Daria instruções vagas sobre uma ação para ver se a máquina consegue executar.

Sim, a arte. Já que ela é o resultado da subjetividade e aleatoriedade humana.

Ia pedir para identificar o cheiro de amostras de fragrâncias.

Sim, pergunta se é humano.

Fonte: Elaborada pelos autores (2021).

A quinta pergunta (fechada) foi: “Você confiaria na Inteligência Artificial para tomar decisões morais?” A grande maioria dos alunos (75%) respondeu que não confiaria em uma Inteligência Artificial para tomar decisões morais. A moralidade e a ética humana são aspectos que envolvem um determinado nível de subjetividade que implica que cada situação seja avaliada especificamente; talvez, por conta deste fator, seja difícil estabelecer confiança numa IA para a tomada de decisões morais (Figura 2).

Figura 2 - Gráfico com a distribuição das porcentagens das respostas para a questão: “Você confiaria na Inteligência Artificial para tomar decisões morais?”

Fonte: Elaborada pelos autores (2021).

A sexta pergunta (fechada) foi: “O avanço na área de Inteligência Artificial irá produzir desemprego em massa?” Os alunos se dividiram quanto a essa questão, 29% responderam que sim, enquanto 33% responderam que não e 8% disseram que não sabem. Além disso, 29% dos alunos assinalaram como resposta o item “outra opção”; boa parte das respostas escritas neste caso deu a entender que a ocorrência ou não de desemprego em massa depende de alguns fatores: “Em massa acredito ser exagero, mas caso o desempregado não seja qualificado para uma nova área”; “Apesar do potencial chance de acabar com diversos empregos atuais, ao mesmo tempo terão novos empregos para lidar com novas necessidades geradas por esse avanço.”; “Talvez, vai

25%

75%

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

Sim Não

Distribuição das porcentagens das respostas para a questão: “Você confiaria na Inteligência Artificial para tomar decisões morais?”

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depender muito da forma como os governos irão lidar com o avanço tecnológico.”; “Não acho que ameaça, mas trabalhos braçais serão facilmente substituídos”; “Depende da forma que é aplicado. Qualquer tipo de tecnologia pode produzir desemprego, logo, se houvesse mais iniciativas para redução da desigualdade, os avanços na área de IA seriam muito mais viáveis para a população em geral.”; “Ocorrerá uma mudança de necessidades de trabalho, como o plantador de milho que agora tem que programar a colheitadeira.” (Figura 3).

Figura 3 - Gráfico com a distribuição das porcentagens das respostas para a questão: “O avanço na área de Inteligência Artificial irá produzir desemprego em massa?”

Fonte: Elaborada pelos autores (2021).

A sétima pergunta (fechada) foi: “Você acha que uma Inteligência Artificial poderia se tornar parte da sociedade no mesmo nível que os seres humanos?” Neste caso, houve também uma divisão aproximadamente pela metade na distribuição das respostas dos alunos: 54% dos alunos consideram que uma IA poderá em algum momento se tornar parte da sociedade no mesmo nível que os seres humanos, enquanto 46% dos alunos consideraram que isso não deverá ocorrer (Figura 4). Essa questão evidencia o quanto o estudo de áreas de filosofia da mente e da Inteligência Artificial lida não somente com a fronteira do conhecimento científico, mas também com reflexões éticas e morais.

Figura 4 - Gráfico com a distribuição das porcentagens das respostas para a questão: “Você acha que uma Inteligência Artificial poderia se tornar parte da sociedade no mesmo nível que os seres humanos?”

Fonte: Elaborada pelos autores (2021).

29%

33%

8%

29%

0%

5%

10%

15%

20%

25%

30%

35%

Sim Não Não sei Outra opção

Distribuição das porcentagens das respostas para a questão: “O avanço na área de Inteligência Artificial irá produzir desemprego em massa?”

54%

46%

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

Sim Não

Distribuição das porcentagens das respostas para a questão: “Você acha que uma Inteligência Artificial poderia se tornar parte da sociedade no mesmo

nível que os seres humanos?”

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A oitava pergunta (fechada) foi: “Quais das tarefas abaixo você acha que seria aceitável para que uma Inteligência Artificial executasse?” Era possível assinalar mais de um item, portanto as porcentagens somam mais de 100%. As opções mais selecionadas foram sobre tarefas em áreas como construção civil, segurança de residências e condução de carros, que tratam de atividades objetivas em que há necessidade de precisão para realizá-las. A opção menos escolhida foi “Ensinar / lecionar”, de caráter mais subjetivo e que exige raciocínio humano para abordar todas as perspectivas necessárias, em termos pedagógicos (Figura 5).

Figura 5 - Gráfico com a distribuição das porcentagens das respostas para a questão: “Quais das tarefas abaixo você acha que seria aceitável para que uma Inteligência Artificial executasse? (você pode assinalar mais de um item)”.

Fonte: Elaborada pelos autores (2021).

A nona pergunta (fechada) indagou: “Quando você acha que robôs e computadores irão adquirir algum tipo de consciência?" Em geral, as respostas se distribuíram sobre as várias opções disponíveis (Figura 6). Essa pergunta envolveu também a opinião acerca do desenvolvimento da computação no futuro, portanto, não há, estritamente falando, uma resposta certa para ela. Mas as respostas revelam a visão dos alunos acerca do futuro da computação e dos computadores. Com certeza esse é um tópico controverso e sujeito a muita especulação, mas, apenas como referência, segundo Ray Kurzweil, um especialista estadunidense em IA, a chamada singularidade tecnológica deverá ocorrer por volta do ano de 2045: singularidade tecnológica é o momento em que as máquinas se tornariam tão mais inteligentes que elas mesmas criariam máquinas ainda mais sofisticadas dispensando a necessidade da existência de programadores humanos (ROHRSETZER et al., 2017).

79%

71%

75%

71%

71%

83%

50%

0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90%

Dirigir carros

Atendimento ao consumidor

Segurança de residências

Serviços finaceiros

Cirurgias

Construção civil

Ensinar / lecionar

Distribuição das porcentagens das respostas para a questão: “Quais das tarefas abaixo você acha que seria aceitável para que uma Inteligência

Artificial executasse? (você pode assinalar mais de um item)”

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Figura 6 - Gráfico com a distribuição das porcentagens das respostas para a questão: “Quando você acha que robôs e computadores irão adquirir algum tipo de consciência?”

Fonte: Elaborada pelos autores (2021).

A décima pergunta (fechada) foi elaborada para avaliar se os alunos acreditavam que a IA no futuro será algo benéfico ou um perigo para a humanidade. Basicamente eram fornecidas duas opções para que os alunos manifestassem o que achavam: se eles consideravam que a Inteligência Artificial no futuro será cada vez mais benéfica para o bem-estar das pessoas ou se eles consideravam que a Inteligência Artificial no futuro será um perigo cada vez maior para a humanidade; havia também o item “Outra opção” em que o aluno poderia escrever um texto argumentativo próprio contendo a opinião dele. A maioria dos alunos (63%) afirmou acreditar que a IA será cada vez mais benéfica para o bem-estar das pessoas, enquanto 17% afirmaram que a IA será no futuro um perigo cada vez maior para a humanidade. Aproximadamente 21% dos alunos assinalaram a alternativa “Outra opção” e argumentaram escrevendo textos em que o futuro da IA para os seres humanos dependerá de alguns fatores: “Pode ser tanto um quanto o outro, depende de quem estaria no comando dessas tecnologias e para quais situações elas seriam usadas”; “Depende da forma e da segurança que ela é aplicada”; “A curto prazo mais benéfica e a longo prazo pode ser que traga algum perigo.”; “Acho que o jogo „Detroit: BecomeHuman‟ retrata bem como acontecerá. Tudo dependerá da interação entre máquina-humano.” (Figura 7).

13%

17%

8%

4%

17%

13%

8%

21%

0% 5% 10% 15% 20% 25%

Nos próximos 10 anos

Nos próximos 20 anos

Nos próximos 30 anos

Nos próximos 40 anos

Nos próximos 50 anos

Nos próximos 100 anos

Nunca

Não sei

Distribuição das porcentagens das respostas para a questão: “Quando você acha que robôs e computadores irão adquirir algum tipo de consciência?”

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Figura 7 - Gráfico com a distribuição das porcentagens das respostas para a questão sobre se o aluno achava que a IA no futuro será cada vez mais benéfica para o bem-estar das pessoas ou será um perigo cada vez maior para a humanidade.

Fonte: Elaborada pelos autores (2021).

A décima primeira pergunta (fechada) foi: “Você acha que será possível um dia dar „upload‟ da mente de uma pessoa, transferindo essa mente para um computador?” Muitas obras de ficção científica contemporâneas tratam dessa possibilidade. A maioria dos alunos (46%) afirmou que, na opinião deles, será possível um dia no futuro dar upload da mente de uma pessoa, transferindo essa mente para um computador, o que, em certo sentido, seria uma forma de transcender a morte biológica, enquanto 17% dos alunos afirmaram que acham que isso não será possível no futuro e 38% afirmaram que não sabem como responder essa questão (Figura 8). A complexidade da situação especulada por essa questão envolve a definição do conceito de “mente”, com a indagação implícita sobre se ela seria ou não algo computável, ou seja, sobre se a mente poderia ser considerada um computador feito de carne (DENNING, 1990). A teoria computacional da mente é um possível caminho para compreender melhor sobre isso (PINKER, 1998).

Figura 8 - Gráfico com a distribuição das porcentagens das respostas para a questão: “Você acha que será possível um dia dar „upload‟ da mente de uma pessoa, transferindo essa mente para um computador?”

Fonte: Elaborada pelos autores (2021).

63%

17%21%

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

Benéfica Um perigo Outra opção

Distribuição das porcentagens das respostas para a questão sobre se o aluno achava que a IA no futuro será cada vez mais benéfica para o bem-estar das pessoas ou será um perigo cada vez maior

para a humanidade

46%

17%

38%

0%

5%

10%

15%

20%

25%

30%

35%

40%

45%

50%

Sim Não Não sei

Distribuição das porcentagens das respostas para a questão: “Você acha que será possível um dia dar 'upload' da mente de uma

pessoa, transferindo essa mente para um computador?”

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A décima segunda, e última, pergunta (aberta) solicitou que o aluno explicasse, em suas próprias palavras, a diferença entre os conceitos de IA forte e IA fraca. Alguns alunos responderam fornecendo exemplos, outros descrevendo de forma objetiva esses conceitos ou utilizando as noções de aprendizado de máquina, consciência, raciocínio humano e teste de Turing (Quadro 6). A apresentação que foi realizada procurou explicar que o conceito de Inteligência Artificial Fraca está associado a uma máquina que não é capaz de raciocinar, mas que consegue simular a inteligência humana tão bem quanto se queira, sem possuir autoconsciência; por sua vez, a Inteligência Artificial Forte ocorreria em uma máquina se ela fosse dotada de autoconsciência e pudesse realmente pensar e não somente simular a execução de raciocínios (PEREIRA, 2006).

Quadro 6 - Respostas mais significativas dadas à questão aberta: “Por favor, tente explicar com as suas palavras a diferença entre os conceitos de Inteligência Artificial Forte e Inteligência Artificial Fraca.”

A efetividade da Inteligência Artificial e sua utilidade em nosso cotidiano, como também a sua evolução são fatores que definem forte e fraca.

A Inteligência Artificial fraca é feita para parecer pensar independentemente, porém não é realmente capaz disso. Já a Inteligência Artificial forte é o sim capaz de pensar por si própria.

A Inteligência Artificial fraca é focada em apenas uma tarefa ou atividade e a Inteligência Artificial forte pode aprender a executar tarefas dos mais variados tipos e dificuldades.

Creio que a IA fraca seja uma Inteligência Artificial que não possua raciocínio próprio e que é apenas programada. Já a IA forte seria uma Inteligência Artificial que já possui um raciocínio próprio e que consiga funcionar sem muito auxílio externo.

Artificial Forte é mais avançada e a Inteligência Artificial Fraca é menos avançada.

Forte: Consegue Pensar. Fraca: Consegue agir sob determinadas regras.

Fracas: são máquinas que desempenham alguma função inteligente, mas que não têm raciocínio próprio. Fortes: são máquinas que podem desenvolver raciocínio.

Uma Inteligência Artificial Fraca é uma Inteligência Artificial focada em resolver uma tarefa ou problema com um contexto específico, e quanto mais restrito esse contexto é, mais "fraca" ela é, enquanto uma Inteligência Artificial Forte é uma Inteligência Artificial feita para resolver tarefas e problemas num contexto geral, e quanto mais similar à inteligência do ser humano, mais "forte" ela é.

IA Fraca seria uma que necessita de comandos para executar uma certa tarefa e IA Forte seria uma que consegue tomar decisões por conta própria em uma certa situação.

Fraca: um sistema que tem um propósito específico. Forte: um robô consciente.

Inteligência Artificial forte seria capaz de simular uma consciência (faria escolhas próprias), já a fraca só seguiria ordens já escritas previamente.

Respondendo como leigo, a Forte deve ser uma IA mais robusta que vai aprendendo consigo mesma, a Fraca tem que ser ensinada por um humano por inputs.

Uma Inteligência Artificial forte seria uma máquina pensante, consciente. Uma Inteligência Artificial fraca seria uma máquina que só executa tarefas automáticas, sem consciência.

Forte: cria a partir de si mesma novas informações. Fraca: necessita de informações externas.

Uma IA forte teria a capacidade de se autoaprimorar e uma fraca não. Um exemplo de IA fraca são as máquinas de limpeza que se movimentam pela casa e detectam relevos, paredes etc.

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IA Forte seria um computador que consiga raciocinar, enquanto IA Fraca é um computador que não raciocina.

Inteligência Artificial Forte ocorre quando ela aprende e toma decisões em qualquer situação. IA fraca é quando ela aprende e toma decisões só em situações específicas.

IA forte: tem a capacidade de ser indistinguível a um ser humano. IA Fraca: serve apenas para realização de tarefas específicas e como mão de obra.

A IA forte é aquela que seria capaz de agir muito próxima a um ser humano, podendo ter consciência. A IA fraca é aquela que faz trabalhos específicos, uma máquina que não vai além das suas instruções.

A fraca seria um motor de busca como o Google, já a forte seria capaz de ter uma inteligência igual a de um ser humano ou maior.

Fonte: Elaborada pelos autores (2021).

O envolvimento dos alunos na tarefa de tentar explicar com as palavras deles as

diferenças existentes entre IA Forte e IA Fraca, associado à participação deles na

discussão que ocorreu sobre esta questão, revelam em certa medida, a receptividade

despertada pelo tema.

5 CONSIDERAÇOES FINAIS

A análise das respostas dadas pelos alunos do curso de Tecnologia em Análise e Desenvolvimento de Sistemas do IFSP-Caraguatatuba às questões do formulário apresentado, juntamente com a participação dos alunos nas discussões que ocorreram durante as ações didáticas analisadas nesse trabalho, mostraram que existe entre eles um real interesse pelos temas da filosofia da mente, da Inteligência Artificial e da história da computação, além de uma grande diversidade de opiniões referentes às questões éticas e filosóficas envolvidas. Pelas manifestações ocorridas durante as aulas, ficou bastante visível que os assuntos abordados atraem consideravelmente a atenção deste tipo de estudante; além do fato de esses serem alunos de um curso da área da computação, esses assuntos são cada vez mais importantes na contemporaneidade e como são, muitas vezes, abordados em obras de Ficção Científica, eles estão associados ao exercício da criatividade, algo importante para a formação profissional desses universitários.

A Inteligência Artificial está cada vez mais presente em nosso mundo, relacionando-se com quase tudo o que fazemos, o que a torna de crescente importância em nosso cotidiano, seja em casa, no trabalho ou em espaços de lazer. Desse modo, é fundamental envidar todos os esforços para que ela seja mais bem conhecida por estudantes universitários que trabalharão em profissões ligadas à Inteligência Artificial. Adicionalmente, um conhecimento maior acerca de questões relacionadas à noção de pensamento computacional pode colaborar também para a implementação de trabalhos interdisciplinares sobre ciência da computação na educação (VALENTE et al., 2017).

Verificou-se também que o uso de referências relacionadas à cultura pop – em particular, à ficção científica – pode ajudar a despertar um interesse mais acentuado acerca da ciência envolvida e colaborar para que ocorram discussões construtivas para uma melhor compreensão dos conceitos complexos em foco.

Uma questão importante foi perceber a importância de que os alunos de um curso da área de computação conheçam da melhor forma a história do desenvolvimento da ciência da computação ao longo dos tempos, bem como as questões filosóficas associadas a esses avanços, como é o caso da filosofia da mente e da Inteligência

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Artificial.Para que o processo de aprendizagem neste caso ocorra de modo pleno é importante usar abordagens interdisciplinares que incorporem conhecimentos históricos, matemáticos, computacionais, físicos, neurológicos, psicológicos e linguísticos.

AGRADECIMENTO

Agradecemos ao do Instituto Federal de São Paulo IFSP pelo fomento concedido para a realização deste trabalho.

REFERÊNCIAS

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