62675798 52898777 Dissertacao Ayahuasca Ribeiro UDV UFPA 2009
INTERAÇÕES ENTRE MEDICAMENTOS E O CHÁ DA AYAHUASCA: …
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FACULDADE MARIA MILZA
BACHARELADO EM FARMÁCIA
AISLANE SILVA DOS SANTOS
INTERAÇÕES ENTRE MEDICAMENTOS E O CHÁ DA AYAHUASCA: UMA REVISÃO INTEGRATIVA
GOVERNADOR MANGABEIRA-BA
2021
AISLANE SILVA DOS SANTOS
INTERAÇÕES ENTRE MEDICAMENTOS E O CHÁ DA AYAHUASCA:
UMA REVISÃO INTEGRATIAVA
Trabalho de conclusão de curso apresentado na Faculdade Maria Milza, curso de Bacharelado em Farmácia, como requisito para obtenção do título de graduanda em Farmácia.
Orientadora: Prof.ª M.ª Larissa de Mattos Oliveira
GOVERNADOR MANGABEIRA-BA
2021
Ficha catalográfica elaborada pela Faculdade Maria Milza, com os dados fornecidos pelo(a) autor(a)
Bibliotecárias responsáveis pela estrutura de catalogação na publicação:
Marise Nascimento Flores Moreira - CRB-5/1289 / Priscila dos Santos Dias - CRB-
5/1824
Santos, Aislane Silva dos S237i
Interações entre medicamentos e o chá da ayahuasca: uma revisão integrativa / Aislane Silva dos Santos. - Governador Mangabeira - BA , 2021.
48 f.
Orientadora: Larissa de Mattos Oliveira.
Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Farmácia) - Faculdade
Maria Milza, 2021 .
1. Ayahuasca. 2. Banisteriopsis Caapi. 3. Psychotria Viridis. 4. Interações Medicamentosas. 5. Plantas Medicinais. I. Oliveira, Larissa de Mattos, II. Título.
CDD 633.88
AISLANE SILVA DOS SANTOS
INTERAÇÕES ENTRE MEDICAMENTOS E O CHÁ DA AYAHUASCA:
UMA REVISÃO INTEGRATIVA
Aprovado em 11/01/2021
BANCA DE APRESENTAÇÃO
_________________________________
Prof.ᵃ M.ª Larissa de Mattos Oliveira
Faculdade Maria Milza– FAMAM
_________________________________
Prof.ᵃ M.ª Deyse Brito Barbosa
Faculdade Maria Milza– FAMAM
________________________________
Prof.ᵃ Dr.ª Vania Jesus dos Santos de Oliveira
Faculdade Maria Milza– FAMAM
GOVERNADOR MANGABEIRA- BA
2021
Dedico este trabalho a minha
filha Alice, minha cor, minha
flor, minha cara.
AGRADECIMENTOS
Sou só gratidão! Primeiramente, agradeço a Deus, ao universo, aos meus
irmãos de luz por ter me guiado e por ter me dado forças para encerrar esse ciclo. A
VIDA SEMPRE VENCE!
Aos meus pais Ana e Milton e meu irmão Aislan, por nunca ter soltado a minha
mão, por ter cuidado, pelo amor e carinho que deu a minha filha Alice nos momentos
em que estive ausente. Minha eterna gratidão, eu amo vocês.
A minha filha Alice, a luz da minha vida, minha maior fonte de inspiração, sem
você eu não conseguiria, tudo é por você. Ao pai da minha filha Marcio, obrigada por
todo apoio e amizade.
A minha avó Marina, a matriarca da família, exemplo de mulher forte, guerreira,
você é meu espelho para continuar a lutar, aos meus tios e primos, obrigada pelo
apoio.
Ao meu amor Lukas, por ter entrado na minha vida para somar, por todo
incentivo, companheirismo, carinho e cuidado, por ser meu porto seguro.
As minhas amigas, Alene, Lai, May, Nanda, Dai e Sil, por sempre me lembrar
a força que tenho e serem inspiração na minha vida, somos Girl Power, porra! “com
elas, o meu coração descansa”
Aos amigos da Farmácia da cidade, minha segunda casa, em especial a
Roberto Reis e Marcos Brito, obrigada por acreditarem em mim e me mostrar o quanto
sou capaz me ajudando no meu crescimento profissional e pessoal, minha eterna
gratidão. Aos amigos do marketing da Natulab que abriu as portas e permitiu viver
uma experiência enriquecedora no SAC por dois anos.
Aos meus queridos amigos, que fiz durante a graduação, em especial à Aline,
Lorenna, Luana, Taiane, Elaine, Amanda, Josy, Bianca, obrigada pela força, sem
vocês eu não conseguiria.
Aos professores da FAMAM por toda dedicação, ao professor e coordenador
do curso de farmácia Antônio Anderson, por sempre me ouvir e me ajudar nessa
caminhada.
E para finalizar não poderia deixar de agradecer a minha orientadora Larissa,
pela paciência, amizade, ensinamentos, pelo comprometimento na construção desse
trabalho, pedia tanto a Deus uma orientadora que me ajudasse nesse processo, e Ele
me ouviu. OBRIGADAAA, MEU DEEEEUS!
“Ano passado eu morri, mas esse ano eu não morro”
Belchior
RESUMO
A ayahuasca é uma bebida enteógena, cujo preparo é feito através da infusão do cipó da Banisteriopsis caapi e das folhas da Psychotria viridis, no princípio ativo da Banisteriopsis caapi contém os alcaloides harmina, tetra-hidro-harmina e harmalina e na Psychotria viridis contém N, N-dimetiltriptamina (DMT). Na Amazônia é usado tradicionalmente para fins rituais e terapêutico, no decorrer dos anos, o uso do chá da ayahuasca tem ganhando popularidade e se expandido além da cultura indígena, sendo utilizado em movimentos sincréticos religiosos e fins recreativos. Devido ao aumento da quantidade de pessoas que fazem uso do chá da ayahuasca e a diversidade na composição química do chá, acredita-se que existam interações de significância, devido à inibição da monoaminoxidase (MAO) presentes em grandes quantidades no chá da ayahuasca, apresentando um risco maior de interações medicamentosas e alimentares comparada com outras plantas medicinais. O uso de plantas medicinais concomitantes tratamentos medicamentosos devem ter uma atenção mais crítica voltada para os efeitos adversos e problemas que oferecem ao organismo. Por esse motivo é importante o conhecimento sobre o efeito farmacológico do chá da ayahuasca e quais tipos de medicamentosos consumidores fazem uso, para que sejam evitados ou minimizados os efeitos adversos. Este estudo teve como objetivo, investigar na literatura atual, através de uma revisão integrativa, as possíveis interações entre medicamentos e os compostos presentes no chá da ayahuasca. Foi realizada uma revisão integrativa, a partir da pergunta “Quais as possíveis interações entre medicamentos utilizados pela população e os compostos presentes no chá da ayahuasca?”, foi utilizado a base de dados Pubmed, Scielo, LILACS, Embase, Google Scholar, Science Direct, e as palavras-chave Ayahuasca, Banisteriopsis caapi, Psychotria viridis, drug interactions, pharmacology, side effects. Os estudos mostraram que, com a crescente populariedade da ayahuasca, é necessário estabelecer parâmetros claros para eficácia e seguraça, e investigar os riscos de interações entre medicamentos e os alcaloides presentes no chá e medicamentos. A partir dos estudos analisados, observou-se que as interações com o chá da ayahuasca são mal compreendidas, mas se sabe que o consumo do chá deve ser evitado em associação com medicamentos com potencial serotoninérgico.
Palavras-chave: Ayahuasca. Banisteriopsis caapi. Psychotria viridis. Interações medicamentosas. Farmacologia. Efeitos colaterais.
ABSTRACT
Ayahuasca is an entheogenous drink, whose preparation is made through the infusion of Banisteriopsis caapi vine and Psychotria viridis leaves, in the active principle of Banisteriopsis caapi it contains the alkaloids harmine, tetrahydro-harmine and harmaline and in Psychotria viridis it contains N , N-dimethyltryptamine (DMT). In the Amazon it is traditionally used for ritual and therapeutic purposes, over the years, the use of ayahuasca tea has gained popularity and expanded beyond the indigenous culture, being used in syncretic religious movements and recreational purposes. Due to the increase in the number of people who use ayahuasca tea and the diversity in the chemical composition of the tea, it is believed that there are significant interactions, due to the inhibition of monoaminoxidase (MAO) present in large quantities in ayahuasca tea, presenting a greater risk of drug and food interactions compared to other medicinal plants. The use of medicinal plants concomitant with drug treatments should pay more critical attention to the adverse effects and problems they offer to the body. For this reason, it is important to know about the pharmacological effect of ayahuasca tea and what types of medicinal products consumers use, so that adverse effects are avoided or minimized. This study aimed to investigate in the current literature, through an integrative review, the possible interactions between drugs and the compounds present in ayahuasca tea. An integrative review was carried out, based on the question “What are the possible interactions between medicines used by the population and the compounds present in ayahuasca tea?”, The Pubmed, Scielo, LILACS, Embase, Google Scholar, Science Direct database was used , and keywords Ayahuasca, Banisteriopsis caapi, Psychotria viridis, drug interactions, pharmacology, side effects. Studies have shown that, with the increasing popularity of ayahuasca, it is necessary to establish clear parameters for efficacy and safety, and to investigate the risks of interactions between medicines and the alkaloids present in tea and medicines. From the studies analyzed, it was observed that interactions with ayahuasca tea are poorly understood, but it is known that tea consumption should be avoided in combination with drugs with serotonergic potential.
Keywords: Ayahuasca. Banisteriopsis caapi. Psychotria viridis. Drug interactions.
Pharmacology. Side effects.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1:Folhas- Psychotria viridis, Cipó- Banisteriopsis caapi ................................ 19
Figura 2: Preparo do chá da ayahuasca................................................................... 19
Figura 3: Estruturas químicas dos compostos ativos encontrados no chá da ayahuasca..................................................................................................................22
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 – Caracterização do PICOT dos estudos incluídos. .................................. 33
LISTA DE ABREVIATURAS
UDV- União do vegetal
THH- Tetra-hidro-harmina
DMT- N, N- dimetiltriptamina
MAO- Monoaminoxidase
SNC- Sistema nervoso central
IMAO- Inibidores da monoaminoxidase
EAM- Eventos adversos a medicamentos
ISRS- Inibidores seletivos da recaptação da serotonina
OMS- Organização mundial da saúde
ECs- Endocanabinoides
14
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO.................................................................................................. 15
2. REFERÊNCIAL TEÓRICO ............................................................................... 18
2.1 HISTÓRIA DO CHÁ DA AYAHUASCA ............................................................... 18
2.2 FARMACOLOGIA DO CHÁ DA AYAHUASCA ................................................... 21
2.3 INTERAÇÕES ENTRE O CHÁ DA AYAHUASCA E MEDICAMENTOS ............. 24
2.3.1 INTERAÇÕES ENTRE O CHÁ DA AYAHUSCA E ALIMENTOS ..................... 26
2.4 POTENCIAL TERAPÊUTICO DO CHÁ DA AYAHUSCA ................................... 27
3. METODOLOGIA ............................................................................................... 30
3.1TIPO DE PESQUISA .......................................................................................... 30
3.2 PERGUNTA DA PESQUISA E TERMOS DE BUSCA ........................................ 30
3.3 CRITÉRIOS DE ELEGIBILIDADE ...................................................................... 31
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO ........................................................................ 32
5. CONCLUSÃO ................................................................................................... 38
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 43
15
1. INTRODUÇÃO
Atualmente, são descritas cerca de meio milhão de espécies vegetais
(CUNNINGHAM, 2008). Dentre estas, destacam-se espécies com propriedades
alucinógenas e potencial psicoativo já caracterizadas, em sua maioria ervas e fungos,
por conta do seu uso secular associado a costumes religiosos e medicinais, e
consequentemente de viés cultural (PIRES et al., 2010). Plantas alucinógenas estão
entre as drogas mais antigas usadas pelos homens e, durante séculos, essas plantas
eram utilizadas somente associadas à religião, magia e medicina.
Em 1815, Jacques Moreau publicou o primeiro texto sobre alucinógenos, e
observou através de relatos, que alguns compostos encontrados em plantas
permitiam a transformação de seus pensamentos em experiências sensoriais
(MERES; CECCHETTO; CAZANAVE, 2005).
A partir dessa publicação, em 1924, o alemão Louis Lewin iniciou estudo sobre
toxicologia e psicofarmacologia, e escreveu a monografia nomeada “Phatastica - um
estudo clássico sobre o uso e abuso de plantas que alteram a consciência”. Em seu
estudo, foram analisadas e catalogadas plantas que alteram a consciência e na sua
obra já se citava o chá da ayahuasca (CUNNINGHAM, 2008).
Historicamente, na Amazônia, o consumo do chá da ayahuasca começa em
1851 quando o botânico inglês Richard Spruce relata que o uso de bebidas
consumidas intoxicava os índios. R. Spruce participou de uma cerimônia que incluía
a infusão que eles chamavam “caapi”. A partir disso, ele coletou espécies da planta e
das flores, realizando analises em qual chamou de Banisteria caapi e, logo após,
alguns estudos levaram a concluir que caapi, yagé e ayahuasca eram nomes
indígenas para a mesma poção feita daquela videira Banisteria caapi de Spruce, em
1931 foi reclassificada como Banisteriopsis caapi pelo taxonomista Morton (BRITO et
al., 2002).
O consumo do chá da ayahuasca nas aldeias indígenas teve início a partir do
século XX, e consequentemente ocorreu a expansão do uso do chá para outros países
como no Chile, Peru, Bolívia e Colômbia. Com o decorrer dos anos, o uso do chá da
ayahuasca tem se expandido além da cultura indígena e vem sendo utilizada em
16
alguns movimentos sincréticos religiosos (LABETE et al., 2002). Dentre esses grupos
religiosos que atuam no Brasil, destacam-se: o Santo Daime, a União do Vegetal
(UDV) e a Barquinha.
O chá da Ayahuasca é uma bebida composta pela associação de duas plantas
primordiais: o cipó Banisteriopsis caapi e as folhas do arbusto Psycotria viridis.
Existem variações nos princípios ativos de ambas: Banisteriopsis caapi que contém
os alcaloides harmina, tetra-hidro-harmina (THH) e em menor quantidade a harmalina.
Já Psycotria. viridis, contém N, N-dimetiltriptamina (DMT), sustância que pertence ao
grupo das triptaminas, que promove a recaptação de serotonina (GUIMARÃES, 2007).
O efeito alucinógeno do chá é promovido pela ação somatória do DMT com as
demais substâncias cujo efeito é bloquear a ação da enzima monoaminoxidase
(MAO), causando mudanças emocionais e cognitivas. Assim, indivíduos que fazem
uso do chá podem vivenciar a ação alucinógena denominada como "miração"
(manifestação específica a cada indivíduo), definida por visões de animais, "seres da
floresta", demônios, divindades, sensação de voar, alteração do corpo pelo de outro
ser (homem ou animal), de acordo com a experiência individual (CAZANAVE, 2000).
Devido a uma crescente expansão no consumo do chá da ayahuasca, a
ingestão da bebida vem ganhando espaço na sociedade brasileira para diversos usos
(COSTA; FIGUEREDO; CAZANAVE, 2005). O Brasil é o único país em que o uso da
ayahuasca é liberado para fins religiosos. O Uso da bebida foi concebida em 2004
pelo Conselho Nacional Anti-drogas (BARKER et al., 2001; MCKENNA, 2004).
Embora vários países da América do Sul tenham como tradição o consumo do
chá por xamã e vegetalistas, somente no Brasil o consumo se desenvolveu através
de religiões de populações não indígenas. Devido ao aumento da quantidade de
pessoas que fazem uso do chá da Ayahuasca e à diversidade da composição química
do chá, acredita-se que existam interações de significância, devido à inibição da MAO
pelas beta-carbonilas harmina, tetra-hidro-harmina (THH) e harmalina presentes em
grandes quantidades no chá, apresentando um risco maior de interações
medicamentosas e alimentares comparada com outras plantas medicinais
(GUIMARÃES, 2007).
Outro efeito colateral do uso do chá da ayahuasca é a inibição da enzima
monoaminoxidase (MAO), cuja atividade é essencial na degradação de monoaminas
17
biogênicas presentes em alguns alimentos, como no queijo, alimentos fermentados,
algumas carnes e vinhos. (CALLAWAY et al., 1999; GUIMARÃES, 2007).
Componentes químicos da ayahuasca interagem com os componentes químicos
naturais de alguns alimentos e podem levar ao aparecimento de efeitos colaterais
indesejáveis.
O uso de plantas medicinais concomitantes tratamentos medicamentosos
devem ter uma atenção mais crítica voltada para os efeitos adversos e problemas que
oferecem ao organismo. Por esse motivo é importante o conhecimento sobre o efeito
farmacológico do chá da ayahuasca e quais tipos de medicamentosos consumidores
fazem uso, para que sejam evitados ou minimizados os efeitos adversos. Neste
contexto, esse estudo tem como problema o seguinte questionamento: “Quais as
possíveis interações entre medicamentos utilizados pela população e os compostos
presentes no chá da ayahuasca?” O objetivo da pesquisa é investigar na literatura
atual, através de uma revisão integrativa, as possíveis interações entre medicamentos
e os compostos presentes no chá da ayahuasca.
18
2. REFERÊNCIAL TEÓRICO
2.1 HISTÓRIA DO CHÁ DA AYAHUASCA
Os primeiros registros históricos da Ayahuasca surgiram entre o século XVII e
XVII (ANTUNES, 2011). No início do século XIX o botânico Richard Spruce que
durante 15 anos explorou a Amazônia, participou de uma cerimônia indígena em que
os participantes faziam uso da bebida da trepadeira dominada Caapi permitindo que
o botânico identificasse o vegetal (ANTUNES, 2011). Um dos seus principais
trabalhos, junto com Alfred Russel Wallace e Henry Walter Bates, reuniu mais de
30.000 espécies vegetais da Amazônia. Entre as espécies novas descritas e
classificadas, estava a Banisteria caapi da família das Malpighiaceae (FERREIRA,
2004).
A palavra Ayahuasca é de origem indígena. Aya significa "pessoa morta, alma
espírito" e waska "corda, liana, cipó ou vinho". Assim, em português a palavra
significaria "corda dos mortos" ou "vinho dos mortos". Encontrou-se outra
denominação no Peru, que significa a seguinte denominação: "soga de los muertos"
Além dessa denominação, na bacia Amazônica, é também conhecido por outros
nomes, como, hoasca, yagé, caapi, mihi, natema, pindé, daime, vegetal, entre outros
(COSTA et al., 2005).
O chá da Ayahuasca constitui-se pela mistura das folhas do arbusto Psychotria
viridis e do cipó Banisteriopsis caapi. (Figura 1), e o seu preparo é feito através de
infusão, iniciando pelo cozimento da folha de do cipó. (Figura 2). O seu uso, a
princípio, foi restringido aos povos indígenas e passou a ser utilizado na cultura e no
povoado da Amazônia Ocidental, surgindo o vegetalismo1 (BENEDITO, 2017).
1 Termo usado para se referir a uma prática de Xamanismo que utiliza a medicina popular de civilizações rurais do Peru e da Colômbia, que mantém tradições antigas sobre plantas, absorvidos das tribos indígenas e influências do esoterismo, conjunto de tradições e interpretações filosóficas das doutrinas e religiões, que busca transmitir informações sobre determinados assuntos de tradições antigas sobre plantas, de uma forma em que seus princípios e conhecimentos não sejam divulgados, sendo restrito aos seus adeptos.
19
Figura 1: Folhas- Psychotria viridis, Cipó- Banisteriopsis caapi.
Fonte: Motta, 2013
Figura 2: Preparo do chá da ayahuasca
Fonte: Motta, 2013
Tribos brasileiras como Ashaninka e diversas tribos que pertencem ao tronco
linguístico Pano (Kaxinawá, Yawanawá, Shawadawã, Shanenawá, Jaminawá,
Marubo, Katukina, entre outros) faziam uso tradicionalmente da ayahuasca em rituais
20
ligados a pajelança, em que o pajé indígena tem como objetivo específico à cura
através da magia. Os índios conheciam a ayahuasca como nixi pae e kawa, que para
nós é o cipó e a folha. A compreensão na cultura indígena sobre a farmacognosia da
ayahuasca foi alcançada através de um ser encantado: Yube (a “jiboia branca”) que
invocava nos rituais, que era altamente respeitada e considerada um ser divino pelos
Kaxinawá aprendendo todos os ensinamentos do canto, do mantra, que a chamava
de “miração da jiboia encantada” quando bebia o chá (OLIVEIRA, 2018).
No Brasil, após o início do ciclo da borracha, em 1930, a ayahuasca começou
a ser utilizada em um contexto diferente daquele usado nas tribos indígenas ligadas
ao xamanismo. Isso porque aconteceu um período de urbanização da região norte
que permitiu a interação entre seringueiros e indígenas de tribos xamânicas
(ALBUQUERQUE, 2011). Em Rio Branco, capital do Acre, Raimundo Irineu Serra, ex-
seringueiro conhecido como “curador”, experimentou a bebida oferecida por pessoas
que tiveram contato com costumes indígenas, após o consumo do chá passou a ter
visões que mudaram seu comportamento e qualidade de vida (OLIVEIRA; AMARAL,
2016). Mais tarde, essa prática deu origem ao Santo Daime, cuja origem da palavra
vem do verbo “dar” junto com o pronome “me”, significando “dai-me força”, “dai-me
luz”, e resultando na criação de religiões que utilizava a bebida em rituais ligados a
catolicismo, espiritismo, tradições afro-brasileiras e esoterismo (LABATE; GOULART,
2005).
As três principais vertentes (Santo Daime, UDV e Barquinha) têm em comum o
fato de pertencerem a uma mesma tradição de religiosidade não indígena de consumo
da ayahuasca no Brasil. Iguala-se em relação ao preparo do chá, à cerimônia e às
regras para a participação dos membros nos rituais. Todavia, cada uma delas possui
diferenças de contexto religioso e social significativas entre si, o que veio a originar
discussões em relação aos grupos originais (REHEN, 2013).
Os inúmeros grupos religiosos que se iniciaram têm influência de religiões
africanas, catolicismo e espiritismo, ligado ao conhecimento botânico de pajés e de
tribos indígenas formando o sincretismo religioso (LABATE; ARAUJO, 2004).
O Santo Daime preserva o catolicismo popular, originário do caráter sagrado
da festa e danças, suas divindades são Deus, Jesus e Virgem Maria, santos católicos
e entidades afro-brasileiras. O núcleo canta coletivamente seus hinos e dançam
21
alternado com períodos de silêncio e meditação. As cerimônias ocorrem em datas pré-
determinadas para cada grupo, geralmente duas vezes no mês ou nos dias de santos
diferentes conforme a seita (LABATE; ARAUJO, 2004). No ritual os presentes se
assim desejarem podem manifestarem suas experiências daquele dia referente ao
trabalho e junto orar “Pai Nosso” e “Ave Maria” (FRANCO; CONCEICAO, 2004).
A barquinha é a mais diversificada possui influência da umbanda, após a
ingestão do chá em cerimônias ocorre incorporações de entidade espirituais que
expressão os três planos cósmicos: a terra o mar e o astral. A barquinha representa a
viagem de cada indivíduo dentro da trajetória de vida de cada um (LABATE; ARAUJO,
2004).
A união do vegetal possui (UDV) uma relação forte com o espiritismo
Kadescista, seus princípios são através da evolução espiritual e da reencarnação. As
figuras de Jesus Cristo e Nossa Senhora possuem um lugar em destaque através da
sua influência cristã (LABATE; ARAUJO, 2004).
2.2 FARMACOLOGIA DO CHÁ DA AYAHUASCA
A ayahuasca é uma bebida enteógena, usada como um medicamento
tradicional em várias regiões da Amazônia, que altera o estado de consciência
induzindo o estado xamânico ou de êxtase, constituída através do cozimento de duas
plantas, o cipó da família Malpighiaceae, Banisteriopsis caapi, e caules da família
Rubiaceae Psychotria viridis. A Banisteriopsis caapi possui em sua composição
alcaloides betas-carbolinas inibidoras da MAO, os de maiores concentrações são:
harmina, harmalina, tetra-hidro-harmalina. As concentrações desses alcaloides
variam de 0,05% a 1,95% (MCKENNA, 2004).
A Psychotria viridis, na sua composição possui o alcaloide derivado indólico
N, N-dimetiltriptamina (DMT) em concentração de 0,1% a 0,66% que atua sobre os
receptores da serotonina (ALMEIDA, et al., 2018).
22
Figura 3: Estruturas químicas dos compostos ativos encontrados no chá da ayahuasca.
Fonte: Dominguéz-Clavé et al., 2018
O DMT é uma substância presente em diversas partes das plantas, nas raízes,
caules e folhas, presente em tecidos de mamíferos, animais marinhos e anfíbios, é
conhecido como a “molécula do espirito” devido à intensa experiência psicodélica
gerada pela sua ação. É um neurotransmissor endógeno, encontrado em humanos e
está presente no fluido cérebro-espinhal, sangue e urina. O DMT é considerado um
agonista dos receptores de serotonina, ou seja, uma substância que apresenta
afinidade pelos receptores serotoninérgicos, especialmente 5HT-2A, receptores que
estão envolvidos em diferentes funções como no sono, humor, regulação da
temperatura, assimilação à dor, regulação da pressão arterial e tem a capacidade de
estimular a atividade fisiológica nos receptores celulares, simulando o efeito desse
neurotransmissor (SMITH et al., 1998; KATZUNG, 1998; STRASSMAN, 2001).
23
O efeito dessa interação é o aumento das vias serotoninérgicas, levando a
grande potencial terapêutico, mas também a graves interações com outros fármacos
que atuem no sistema nervoso central (DOMÍNGUEZ-CLAVÉ et al., 2016).
O DMT é eficaz somente quando é administrado por via endovenosa,
intramuscular, subcutânea e por vias aéreas. (GARRIDO et al., 2009). Por se tratar de
um psicoativo altamente potente, quando a DMT é ingerida separadamente por via
oral, mesmo em doses altas, não produz tais efeitos, certamente pela metabolização
feita pela enzima MAO (monoaminoxidase) que se associa a essas moléculas
evitando que alcance a circulação sanguínea evitando que atinja o sistema nervoso
central (SNC). No entanto as beta-carbonilas encontradas no cipó Banisteriopsis caapi
apresentam uma especificidade em inibir a MAO, assim, a ingestão da bebida
proporciona aumento das concentrações dos neurotransmissores como a dopamina,
noradrenalina e da serotonina, tornando biodisponível o DMT por via oral, provocando
ação alucinógena, compreendida com a experiência individual de cada indivíduo e
levando a alterações sensoriais, mudanças emocionais e cognitivas (MCKENNA et
al., 1998; YRITIA et al., 2002).
A ação inibidora da monoaminoxidase (IMAO) na ayahuasca parece ser
mediada principalmente pela harmina, beta-carbolina produzida em maiores
quantidades no cipó da Banisteriopsis caapi. A harmalina é encontrada em menores
quantidades, já a tetra-hidro-harmalina (THH) é entre as três beta-carbolinas, que
possui menor atividade como IMAO, sobretudo elas atuam na MAO-A se ligando
preferencialmente aos neurotransmissores agonistas serotoninérgicos (MCKENNA et
al., 1998).
24
2.3 INTERAÇÕES ENTRE O CHÁ DA AYAHUASCA E MEDICAMENTOS
A interação medicamentosa é descrita pela resposta farmacológica ou clínica,
causada pela combinação de medicamentos, diferente dos efeitos de dois
medicamentos ingeridos individualmente (FELTEN et al., 2015).
As interações medicamentosas podem acontecer durante o preparo do
medicamento, na absorção, na distribuição, na metabolização, na eliminação ou na
ligação ao receptor. Assim, os mecanismos envolvidos no procedimento interativo são
classificados de acordo com o tipo predominante de fase farmacológica em que
ocorrem os processos farmacocinéticos e farmacodinâmicos (SECOLI, 2001).
Os medicamentos estabelecem uma grande importância na estratégia
terapêutica atualmente e são utilizados em grande proporção. Ainda assim, existem
riscos específicos diante a sua ação farmacológica, podendo agir de uma forma
independente ou interagir entre si, diminuindo seu efeito terapêutico ou aumentar seu
efeito tóxico, desenvolvendo eventos adversos a medicamentos (EAM) (ELOISA et
al., 2017).
O número de adeptos ao ritual da ayahuasca aumentou e chamou a atenção
para seu potencial farmacoterapeutico, principalmente no tratamento de doenças
mentais, transtornos depressivos, ansiedade, alcoolismo, etc. Devido à diversidade
na sua composição química, existem sérias interações medicamentosas que podem
ser motivo de preocupação entre as pessoas que consomem o chá da ayahuasca. A
inibição da MAO pelas betas-carbonilas presentes no chá apresenta o maior risco em
relação às interações medicamentosas, a ayahuasca já foi reconhecida pelo seu
potencial de interação com a classe de medicamento (ISRS) Inibidores Seletivos da
Recaptação da Serotonina (CALLAWAY et al., 1998).
Na literatura tem poucas pesquisas sobre as interações psicofarmacológicas
na ayahuasca, o foco das pesquisas é sobre a interação da DMT e IMAO,
impossibilitando descobertas sobre as interações farmacológicas e como elas
contribuem para o efeito ou para os efeitos colaterais experimentados pelos
consumidores do chá (RUFFELL et al., 2020).
25
A ayahuasca deve ser evitada com outros agentes serotoninérgicos, por
exemplo, antidepressivos tricíclicos, inibidores da recaptação da serotonina e
noradrenalina, trazodona e erva de são joão.
Antidepressivos, como lítio, indicado para transtornos bipolares, triptanos,
usado para enxaquecas, metoclopramida, levodopa, fentermina, pseudoefedrina,
linezolida, metadona e dextrometorfano, podem aumentar efeitos serotoninérgicos
que agem potencializando niveis de serotonina, norepinedrina e dopamina
(CALLAWAY et al., 1998; MCKENNA, 2004; PIRES, 2009). Além disso, sabe-se que
a classe de medicamentos Inibidores da monoaminooxidase (IMAO) pode aumentar
os efeitos depressivos e analgésicos da morfina (KITANAKA, et al., 2006;
STOCKLEY, 2007).
A utilização desses medicamentos associado ao chá da ayahuasca podem
estimular de forma excessiva de receptores serotoninérgicos em nível central e
periférico que estão normalmente envolvidos no mecanismo de diversos fármacos,
podendo levar a síndrome serotoninérgica, que é descrita por uma série de efeitos
adversos como mudanças no estado mental, hiperatividade autonômica, agitação,
insônia, alucinações e anormalidades neuromusculares (BOYER, SHANNON, 2005).
As propriedades ansiolíticas da ayahuasca são descritas em estudos pré-
clínicos e clínicos e podem estar correrelacionadas à sua atividade serotoninérgica.
Foi evidenciado que os componentes da ayahuasca interferem nos níveis cerebrais
dos neurotransmissores monoaminérgicos e aminoacidérgicos, incluindo o GABA
(CASTRO-NETO et al., 2013).
Como alguns inibidores seletivos da recaptação de serotonina, antipsicóticos
e psicotrópicos são metabolizados pelo CYP2D6, que também metaboliza harmina e
harmalina, o uso simultaneo dessas substâncias podem causar graves problemas e
devem ser evitado (CALLAWAY, GROB, 1998; CALLAWAY, 2003).
Além disso, sabe-se que inibidores de monoaminoxidase (IMAO) podem
aumentar os efeitos depressivos e analgésicos da morfina (KITANAKA, et al., 2006;
STOCKLEY, 2007).
26
2.3.1 INTERAÇÕES ENTRE O CHÁ DA AYAHUASCA E ALIMENTOS
A ayahuasca atua na inibição da enzima monoaminoxidase (MAO), existem
interações conhecidas entre as IMAOS e alguns alimentos, como no queijo, alimentos
fermentandos, carnes e vinhos (RUFFEL, 2020).
A tiramina presente nesses alimentos é um dos grandes problemas em
indivíduos que consomem o chá da ayahuasca, pois ocorre a interação da MAO
presente no chá da ayahuasca e aminas simpatomiméticas presentes em alguns
alimentos (YOUDIM et al., 2006; WIMBISCUS et al., 2010).
A interação dessas aminas biogênicas com a MAO libera altas concentrações
de serotonina, noradrenalina e dopamina em seus neurotransmissores, causando
efeitos indesejáveis como aparecimento de crises hipertensivas, aumento da pressão
arterial, náuseas, vômitos, entre outros (YOUDIM et al., 2006; WIMBISCUS et al.,
2010). Dietas devem ser feitas para o uso ritual da ayahuasca, evitando efeitos
adversos e efeitos indesejáveis decorrentes de interações.
A tiramina ingerida por via oral é metabolizada na maior parte da MAO presente
no figado e intestino. Cerca e 1% acaba entrando na circulação sistêmica pois não
consegue ser metabolizada pelo figado e intestino sendo captado pelos neurônios
noradrenérgicos onde possui maior afinidade.
Por possuir maior afinidade pela noradrenalina o neurotransmissor é deslocado
liberado, a inibição não seletiva da MAO leva a dimunuição da desaminação da
tiramina e o aumento da absorção no instestino consequentemnte o aumento da
tiramina na corrente sanguinea. A consequência é um aumento da liberação de
noradrenalina de seus estoques neuronais, que é responsável por alguns sintomas,
características como hipertensão, dor de cabeça, palpitações, anormalidades
eletrocardiográficas e arritmias) (BERLIM, 1996).
27
2.4 POTENCIAL TERAPÊUTICO DO CHÁ DA AYAHUASCA
Em 1993, na Amazônia, ocorreram os primeiros estudos biomédicos que
analisaram o potencial terapêutico da ayahuasca em relação ao alcoolismo, onde
individuos alcançaram abstinência completa do alcool e mudanças comportamentais
significativas (GROB et. al., 1996).
Comunidades indígenas e adeptos usam com frequencia o chá da ayahuasca
para tratar um conjunto de condições médicas, incluindo saúde mental. Além disso, é
usado pela comunidade para lidar com seus problemas sociais e na cura espiritual
(ALMEIDA, 2019).
Vários estudos descrevem o abandono do vício alcoólico dos usuários da
ayahuasca (LABIGALINI, 1998; MCKENNA, 2004; SANTOS et al., 2006).
Existem centros de tratamentos para dependentes químicos que utilizam o chá
da ayahuasca como alternativa terapêutica. Também é observado que norte
americanos e europeus migram para Amazônia com intenção de participar de
cerimônias para se libertar de dependências químicas, e esse tipo de tratamento foi
abordado e discutido e colocado em pauta na BBC, onde indivíduos demostraram
sucesso com o uso da ayahuasca em tratamento de dependência de cocaína em uma
clínica peruana (MCKENNA, 2004).Outros dados satisfatórios encontrados são o
abandono do uso de nicotina, cocaína, anfetamina e outros entorpecentes (SANTOS
et. al., 2006).
Atualmente centros de recuperação de indivíduos com toxicomania, ou seja,
hábito patológico de ingerir doses crescentes de substâncias tóxicas ou entorpecentes
veem na ayahuasca uma nova alternativa de tratamento. Representantes de centros
de recuperação do Peru, Argentina e Uruguai se fizeram presentes no I Encontro
Ayahuasca e o Tratamento da Dependência ocorrido no Brasil nos dias 12 e 14 de
setembro de 2011. O evento juntou psiquiatras, pacientes e familiares, terapeutas,
pesquisadores, antropólogos e representantes dos diversos centros à luz de uma nova
esperança de tratamento para a dependência (VOLKOV, 2011).
Sabe-se que a depressão vem aumentando significativamente nos últimos
anos. Segundo a OMS, a depressão atinge mais de 300 milhões de pessoas em todo
o mundo (OPAS/OMS BRASIL, 2018).
28
Diversas pesquisas feitas no Brasil sobre o uso da ayahuasca alcançaram
respostas significativas sobre a melhora da dependência química e depressão,
gerando efeitos benéficos no humor e ansiedade (ALMEIDA, 2010; DOS SANTOS et
al., 2011). A possiblidade terapêutica é de grande escala, no artigo de Domínguez e
colaboradores (2016), observaram que o consumo da ayahuasca ajuda o indivíduo a
superar doenças relacionadas à sua auto-aceitação, aumentando a capacidade de
pensamentos e emoções de uma forma positiva.
Foram feitas investigações a curto prazo sobre os sintomas psicológicos e
psiquiátricos em consumidores novatos da ayahuasca. Após uma semana de
experiências com o uso da ayahuasca, foi relatado uma redução considerável na
intensidade dos sintomas psiquiátricos (BARBOSA et al., 2005).
Também foi encontrado na literatura que o uso da ayahuasca melhorou a
autoaceitação de lésbicas e gays: aprofundou seus relacionamentos e ajudou a se
redefinir de forma positiva, incluindo a aceitação de sua orientação sexual (CAVNAR,
2011).
Sabe-se que a inibição da MAO pelas betas-carbonilas presentes no chá da
ayahuasca, possibilita proteção da neurodegeneração, perda continua dos neurônios,
sendo um grande aliado para ação terapêutica contra o Parkinson e doença de
Alzheimer (SERRANO-DUENAS et. al., 2001, BARNHAM et al., 2004). Através
desses resultados, cientistas apoiam uso tradicional de extrato de Banisteriopsis.
caapi para o tratamento da depressão, e doenças neurodegenerativas, presentes na
atualidade (SERRANO-DUEÑAS et al., 2001; SCHWARZ et al., 2003, HOU et al.,
2005).
No Brasil foi realizada uma pesquisa através de entrevistas, que obteve
resultados satisfatórios em relação ao consumo de álcool aos adolescentes usuários
da ayahuasca do grupo União do Vegetal (UDV). Após o consumo do chá
adolescentes passaram a consumir menos álcool (32,5%) do que os adolescentes não
usuários da ayahuasca (65,1%), assim como outras drogas psicoativas como
cannabis, anfetaminas, cocaína, sedativos, tranquilizantes, tabaco, entre outros
(DOERING et al., 2005).
Consta que a Harmina presente no chá da ayahuasca é apontado como um
novo ativador de p53, gene supressor tumoral que desempenha uma função
29
importante no controle do ciclo celular, agindo no reparo do DNA e na indução do
apoptose (DAI et al., 2012).
30
3. METODOLOGIA
3.1TIPO DE PESQUISA
O presente trabalho trata-se de uma revisão integrativa, com elaboração da
pergunta norteadora, busca ou amostragem na literatura, coleta de dados, análise
crítica dos estudos incluídos, discussão dos resultados e apresentação, que consiste
em sintetizar evidências científicas disponíveis em diferentes estudos realizados
anteriormente sobre o mesmo tema (ROEVER, 2017).
3.2 PERGUNTA DA PESQUISA E TERMOS DE BUSCA
A pergunta da pesquisa foi construída a partir do acrônimo PICOT -
Participantes, Intervenção, Comparador, Outcome/Desfecho e Tipo de estudo
(KLODA et al., 2014; MUELLER et al., 2018).
P (Participantes): Consumidores do chá da ayahuasca e animais de
experimentação.
I (Intervenção): Intervenção terapêutica do chá da ayahuasca associado
ao uso de outros medicamentos
C (Comparador): Sem comparador.
O (Outcome/Desfecho): Foram estabelecidas como desfechos quaisquer
medidas de qualidade de vida desses consumidores, efeitos colaterais ao uso dos
medicamentos ou do chá quando associados e interações medicamentosas.
T (Tipo de estudo): Estudos observacionais, estudos experimentais in
vivo, revisão sistemática e revisões de literatura.
A partir da pergunta “Quais as possíveis interações entre medicamentos
utilizados pela população e os compostos presentes no chá da ayahuasca? ”, foram
realizadas pesquisas individualizadas em bases de dados (Pubmed, Scielo, LILACS
e Embase) através de combinações das seguintes palavras-chaves: ayahuasca,
Banisteriopsis caapi, Psychotria viridis, drug interactions, pharmacology, side effects
sem restrição de idioma ou restrição de período. As buscas foram realizadas no
período compreendido entre 3 de outubro a 25 de outubro de 2020. Outras fontes de
31
dados foram consultadas também como Google Scholar e Science Direct para a
adição manual de estudos não identificados nas buscas nas bases selecionadas.
3.3 CRITÉRIOS DE ELEGIBILIDADE
Para a realização desta revisão foram incluídos os estudos transversais e
estudos in vivo que associaram as interações entre medicamentos e o chá da
ayahuasca. Por outro lado, foram excluídos estudos nos quais não foi possível extrair
dados relevantes como características da população descrita, além de estudos onde
não eram disponibilizados o texto completo.
32
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Foram selecionados 31 artigos compatíveis com o tema do estudo, os quais
estavam disponíveis 28 na base de dados Pubmed e 3 artigos no Scielo. Destes
artigos, 21 foram excluídos após a leitura de título e resumo, 10 foram selecionados
para leitura completa e 7 estudos incluídos. Dos artigos remanescentes, 2 foram
revisão de literatura, 1 revisão sistemática, 1 revisão transversal, 2 estudos in vivo
e 1 estudo de caso (Figura 4). Nesses estudos, pôde-se observar as possíveis
interações entre medicamentos utilizados pela população e os compostos
presentes no chá da ayahuasca.
Figura 4: Fluxograma de seleção dos estudos
Referências identificadas em bases
bibliográficas: 31
Pubmed (28)
Scielo (3)
Embase (0)
Lilacs (0)
Publicações excluídas pela leitura de título e
resumo:
21
Publicações selecionadas para leitura
completa:
10
Estudos incluídos:
7
Iden
tificaçã
o
Sele
çã
o
Ele
gib
ilida
de
In
cluíd
os
Referências identificadas em outras fontes
(Listas de referências):
Google Scholar (0)
Science Direct (0)
Publicações excluídas pela leitura do texto completo: 3
Razões: 2 - Desfecho não aplicável 1 - Não foi possível obter o texto completo
33
Os dados obtidos com o levantamento dos estudos são mostrados no quadro 1. Quadro 1 – Caracterização do PICOT dos estudos incluídos.
1º autor (ano)
População
Exposição Comparação Desfechos avaliados Desenho do estudo
Malcolm et
al. (2017)
Foi realizada uma busca no Pubmed usando o termo “ayahuasca” desde o início do banco de dados até 6 de setembro de 2016, foi conduzida para estudos que investigam os efeitos da ayahuasca para tratamento de doenças psiquiátricas
Relatórios clínicos anedóticos e estudos naturalísticos
N. A A ayahuasca tem um mecanismo farmacológico complexo, as interações medicamentosas são mal compreendidas e a ayahuasca deve ser evitada com medicamentos com potencial serotoninérgico. Abordagens para minimizar os danos, maximizar os benefícios são necessárias a fim de reduzir barreiras para pesquisas médicas legítimas e proteger os pacientes que podem estar desesperados e procurando alternativas para o tratamento de doenças psiquiátricas
Revisão de literatura
34
Ruffell et al.
(2020)
N. A Foi realizada uma busca nos bancos de dados PubMed, PsycINFO e Web of Science até setembro de 2019 para os seguintes termos: (ayahuasca OU DMT OU dimetiltriptamina) E (B- carbonila OU constituentes OU quimica OU harmina OU harmalina OU alcalóides harmala OU tetrahidroarmina OU hrmalol OU IMAO inibidor da monoaminaoxidase OU farmacologia OU farmacocinética OU farmacodinâmica OU psicofarmacologia OU sinergia)
N. A Esta revisão demostra claramente que a pesquisa publicada é insuficiente para determinar as potencias interações sinérgicas entre os compostos conhecidos da ayahuasca
Revisão sistemática
Durante et al. (2020)
614 integrantes da UDV
Foi desenvolvido um questionário
sobre uso e IMAOs e psicodélicos,
alucinógenos em um contexto
religioso. O questionário foi
elaborado para reunir dados
sociodemográficos básicos e
decrever aspectos relevantes do
uso da ayahuasca , especiamente
a segurança geral dos IMAOs,
caracteristicas sugestivas de um
risco aumentado de reações grave
e efeitos adversos comuns a
toxidade serotoninérgica. As
questões foram elaboradas para
explorar a frequencia de uso da
ayahuasca e uso de
medicamentos (principalmente
psiquiátricos e efeito adversos )
N. A Os dados mostram efeitos adversos mais frequentes entre os 614 participantes foram efeitos gastrointestinais transitórios (náuseas e vômitos). Cinquenta participantes relataram um diagnóstico psiquiátrico (depressão e ansiedade foram os mais prevalentes), e esses participantes experimentaram efeitos adversos com mais frequência. O uso de medicamentos psiquiátricos foi relatado por 31 participantes. Nenhuma indicação de aumento de efeito adversos devido a interações medicamentosas foi encontrada
Estudo transversal
35
Pires et al. (2018)
Camundongos Swiss machos, de 3-4 meses de idade, pesando 30-50 g.
Camundongos foram pré-tratados com ayahuasca e, em seguida tratados com morfina ou propofol para verificar uma possivél interação farmácologica entre esses agentes
N. A O estudo mostra que o liofilizado da ayahuasca modificou efeitos analgésicos da morfina em comundongos. Além disso, o efeito relaxante muscular do propofol foi prolongado, enquanto seu efeito sedativo parecia reduzido. Esses dados sugerem que os anestesistas devem tomar alguns cuidados ao usar morfina ou propofol em seguidores de cultos do chá da ayahuasca submetidos a procedimentos cirúgicos. Mais estudos são necessários para investigar melhor interações entre ayahuasca e morfina/propofol, e estudos farmacocinéticos são sugeridos para abordar essa questão
Estudos in vivo
36
Callaway. et al. (1998)
1 voluntário Administração de 100 ml do chá da ayahuasca concomitante ao uso de fluoxetina de 20 mg
N. A O voluntário uma hora depois de ingerir aproximadamente 100 ml do chá da ayahuasca, começou a sentir tremores, suores, calafrios e confusão. Rapidamente seus sintomas se intensicaram nas 3 horas seguintes, além de estar desorientado, relatou profundo desespero e angústia. Após 4 horas de ingestão se tornou assintomático, não havia sequelas adversas aparentemente
Estudo de caso
Brierley et al. (2012)
N. A Foi realizada uma busca na literatura em pesquisas recentes sobre harmine, um dos principais compostos ativos no chá da ayahuasca onde tem sido o assunto da maioria das investigações médicas
N. A
Esta revisão se concentrou em harmine, um dos compostos presente no chá, pois tem uma diversidade e intrigante sobre o perfil farmacológico que poderia mediar a terapêutica efeitos na dependência de drogas e outras condições do SNC. A harmine é um composto que pode provocar um gama de efeitos além da inibição periférica de MAO
Revisão de literatura
37
Dos santos et al. (2018)
1 voluntário Foi administrado dose de ayahuasca 1 mL /kg por via oral
N. A Considerando que o receptor 5-HT2A e o endocanabinoides são co-expressos nas regiões do cérebro e está associado aos receptores de serotonina, é plausível especular que a interação entre esses sistemas pode estar relacionada ao antidepressivo e ansiolítico presente nos compostos da ayahuasca
Estudos in vivo
38
Malcolm e colaboradores (2017) realizou uma busca no banco de dados
Pubmed usando o termo “ayahuasca”, no qual foi direcionado estudos que investigam
o uso dos efeitos da ayahuasca para tratamento de doenças psiquiátricas. Nos
estudos avaliados na revisão, observou-se que a ayahuasca apresenta um risco maior
em relação a interações com medicamentos devido à inibição da MAO pelos
alcaloides harmalina, harmina e tetra-hidroarmina, extraídos da Banisteriopsis caapi,
que pertencem a um grupo de β-carbolinas conhecidas como alcaloides da harmala
(MALCOLM et al., 2017). Callaway e Grob (1998) realizaram um estudo de caso e
concluíram que a ayahuasca possui um risco de interações medicamentosas maior
referente a outros psicodélicos devido a inibição da MAO. A ayahuasca primeiramente
foi reconhecida pelo potencial de interações com inibidores seletivos da recaptação
de serotonina, que geralmente é utilizada em doenças psiquiátricas e devem ser
evitadas com outros agentes serotoninérgicos. Drogas psicodélicas utilizadas para
fins recreativos que, em combinação com o composto harmala, também apresentam
alto risco de interação.
Malcolm et al. (2017), em seu estudo concluiu que a ayahuasca apresenta um
mecanismo farmacológico que ainda não está totalmente esclarecido, embora sabe-
se que a inibição da MAO acontece por causa dos compostos presentes no cipó da
Banisteriopsis caapi, o DMT presente nas folhas da Psychotria viridis é um forte
agonista do receptor de serotonina e tem um grande potencial de interagir com outros
alvos moleculares (DOMÍNGUEZ-CLAVÉ et al., 2016).
A revisão de Ruffel et al. (2020) demostra que a pesquisa realizada em bancos
de dados até setembro de 2019 é insuficiente para determinar potenciais interações
sinérgicas entre os compostos da ayahuasca. A maioria dos estudos avaliados na
revisão de Ruffel e colaboradores, destacou que a harmina e o DMT, os dois
compostos, quando utilizados juntamente inibem a desaminação do DMT no fígado e
intestino. É importante destacar que a maioria dos dados obtidos de estudos são in
vitro, amostras humanas são limitadas.
Callaway e Grob (1998) relataram um caso de síndrome da serotonina em um
paciente que usou fluoxetina, um inibidor seletivo de recaptação de serotonina em
conjunto com a ayahuasca, através de alguns estudos, descobriram que a harmina,
um dos compostos presentes no chá da ayahuasca é um inibidor seletivo da isoenzima
CYP2D6 do citocromo P450 humano. O CYP2D6 é responsável também por
39
metabolizar alguns inibidores seletivos da recaptação da serotonina, antipsicóticos e
outros psicotrópicos (CALLAWAY et al., 1998; CALLAWAY, 2005).
Sabe-se que a junção de medicamentos que inibem isoforma CYP2D6 e o chá
da ayahuasca gera uma síndrome serotoninérgica, estimulando de forma excessiva
os receptores serotoninérgicos periféricos e centrais causando alguns sintomas,
como por exemplo, anormalidades neuromusculares, hiperatividade autonômica e
alteração do estado mental.
Durante e colaboradores (2020) realizou um estudo transversal com
integrantes do núcleo UDV nos estados do Paraná, Rio Grande do Sul e Santa
Catarina, no qual foi aplicado um questionário explorando a frequência do uso da
ayahuasca e medicamentos (principalmente psiquiátricos). O questionário reuniu
dados sociodemográficos que descreveu aspectos importantes sobre o uso da
ayahuasca, principalmente com relação à segurança geral dos IMAOs.
Os efeitos adversos mais frequentes relatados entre os 614 participantes
foram efeitos gastrointestinais transitórios (náuseas e vômitos). Cinquenta
participantes relataram um diagnóstico psiquiátrico (depressão e ansiedade foram os
mais prevalentes), e esses participantes relataram efeitos adversos com mais
frequência. O uso de medicamentos psiquiátricos foi relatado por 31 participantes.
Sendo assim, não foi relatado nenhum aumento de efeitos adversos devido a
interações medicamentosas.
Os dados obtidos no estudo transversal de Durante et al., (2020) mostraram
que 48% dos participantes usa medicamentos psiquiátricos. Trinta e um participantes
relataram fazer uso de algum medicamento psiquiátrico, dos quais, 87,1% relataram
ter sido informados sobre possíveis interações com a ayahuasca. Vinte e cinco
participantes (4,07% da amostra) relataram que faziam uso de antidepressivos,
sendo que os mais utilizados foram bupropiona, citalopram, venlafaxina, citalopram,
fluoxetina, mirtazapina, sertralina. Usuários de medicamentos psiquiátricos devem
informar ao profissional responsável sobre a intenção de usar a ayahuasca, para que
ocorra monitoração de possíveis interações medicamentosas.
Efeitos físicos mais comuns relatados no estudo foram vômitos e náuseas,
entre 96,74% e 91,53% dos participantes. Diarreia, calafrios, taquicardia, tremor e
zumbido foram outros efeitos frequentes, com 5 a 10% dos
40
participantes. Participantes com um diagnóstico psiquiátrico relatado
experimentaram efeitos adversos mais frequentemente (DURANTE et al., 2020).
Pires (2019) realizou um estudo in vivo com camundongos Swiss, no qual
liofilizou amostra da ayahuasca e administrou concomitante, por via intraperitoneal,
amostras de propofol e sulfato de morfina. Foi possível avaliar interação entre
ayahuasca e propofol em dois testes comportamentais: coordenação motora; e hora
de dormir - efeito sedativo / hipnótico. O estudo piloto mostrou que ayahuasca a 120
e 1200 mg / kg ou propofol a 25 e 50 mg / kg não interferiu na coordenação motora
de camundongos, mas o propofol na dose de 100 mg / kg reduziu o tempo no rota
rod, teste que mede parâmetros como tempo de pilotagem ou resistência,
apresentando incoordenação motora, reduzindo o desempenho dos animais na barra
giratória.
Entre ayahuasca e a morfina, foram realizados quatro testes para avaliar uma
possível redução na capacidade de perceber a dor, um quarto teste avaliou os efeitos
da morfina, ayahuasca e sua interação no trânsito intestinal, no qual as dosagens da
ayahuasca não foram capazes de alterar significativamente o trânsito intestinal ou
interferir no efeito da mofina.
Grella et al., (1998) e Glennon et al., (2000) detectaram que a harmina tem
afinidade moderada no receptor 5-HT2A, a ligação das β-carbolinas (incluindo
harmina) nos receptores 5-HT2A tem sido revisado costantemente.
Dos Santos et al., (2018) realizou o primeiro estudo in vivo, no qual avaliou
as possiveis interações entre o receptor 5-HT2A e o sistema endocanabinoides (Ecs). Para Dos santos e colaboradores (2018) a ativação do receptor 5-HT2A
desencadeia a liberação de endocanabinoides (ECs), se ligando ao 2-
araquidonoilglicerol (2-AG), agonista endogéno do receptor CB2 que está presente
nas celulas imunes e no sangue, e o receptor 5-HT2A e o sistema endocanabinoide
(ECS) são co-expressos em regiões do cérebro no qual estão relacionados ao
processo emocional.
Para testar a possível interação, foi administrado por via oral uma unica dose
de 1mL / kg de ayahuasca em um voluntário do sexo masculino saudavél. O voluntário
não estava tomando nenhum medicamento, foi pedido para não ingerir alcool, tabaco
e cafeína, evitando que ocorra um possível interação.
41
Após a ingestão do chá da ayahuasca ocorreu uma diminuição dos niveis
plasmáticos, seguido de aumento no plasma 2-araquidonoilglicerol (2-AG). Estudos
anteriores mostraram que 5-HT2A agonistas do receptor aumentam a formação e
liberação de ECs (PARRISH, et al., 2006; BEST et al., 2008).
Sabe-se que o receptor 5-HT2A e o endocanabinoides (ECs) são co-
expressos nas regiões do cérebro (SANCHES et al., 2016; LISBOA, et al., 2017), é
viável investigar possiveis interações entre esses sistemas, associado com
medicamentos com potencial serotoninérgicos.
Interações entre harmina ou harmalina e enzimas metabólicas dentro do
superfamília do citocromo P450 humano foram descobertas (YU et al., 2003). Essas
interações têm várias consequências, como por exemplo, diminuir o efeito
terapêutico, potencializar o efeito ou até anular o efeito do medicamento. Para o
potencial de interações medicamentosas entre os consumidores do chá da
ayahuasca e dado que essas isoformas estão envolvidas no metabolismo de 80%
dos medicamentos em uso atual (ZHAO et al., 2011).
A área com maior preocupação em relação às interações medicamentosas
adversas envolvendo ayahuasca é o tratamento do câncer. O uso da ayahuasca para
autotratamento por pacientes com câncer foi descrito por (TOPPING, 1998; SCHMID
et al., 2010).
Brierley e colaboradores (2012) tem como conclusão que o consumo do chá
da ayahuasca de forma não tradicional está crescendo a cada dia, antigamente
ligado ao contexto religioso, no entanto consumidores estão utilizando para fins
recreativos ou como uma forma de terapia alternativa. Porém estas pessoas podem
estar fazendo algum tratamento crônico ou utilizando algum medicamento que tenha
interações medicamentosas com os compostos químicos presentes na ayahuasca.
42
5. CONCLUSÃO
Com base nos 7 estudos selecionados, pode-se observar que a ayahuasca tem o
mecanismo farmacológico complexo e que, com a crescente popularidade do
consumo do chá ayahuasca, é necessário investigar os riscos de interações
medicamentosas. As interações medicamentosas com a ayahuasca são poucas
compreendidas, mas a literatura atual deixa claro que o consumo da bebida deve ser
evitado em associação a medicamentos com potencial serotoninérgico devido à
inibição da MAO para evitar crises serotoninérgicas. Como a temática é pouco
discutida no meio científico e há uma escassez de estudos que associem o uso da
ayahuasca com medicamentos amplamente utilizados pela população, são
necessárias mais pesquisas com propósito de investigar as potenciais interações
entre esses medicamentos e os alcaloides presentes no chá da ayahuasca.
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