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Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – São Paulo - SP – 05 a 09/09/2016 1 Baixo Orçamento e Soluções: Relato de Produção Executiva no Filme “O Mistério das Noites Brancas” 1 Lucas Ferreira FERNANDES 2 Valquíria Aparecida Passos KNEIPP 3 Universidade de São Paulo, São Paulo, SP Resumo Este trabalho procurou relatar o processo de produção executiva no filme de longa- metragem potiguar O Mistério das Noites Brancas. Como parte dos objetivos, foi realizado um levantamento conceitual sobre produção no âmbito cinematográfico com base nos autores Giannasi (2007), Kamín (1999) e Johnson (2002), assim como uma delimitação da função do produtor com base nos mesmos autores. Por fim, o presente relatório apresenta soluções criativas para projetos de baixíssimo orçamento, e comprova que existe viabilidade no cinema sem recursos quando o mesmo visa abordar, primordialmente, temáticas de relevância social. Palavras-chave: cinema; ficção de longa-metragem; o mistério das noites brancas; audiovisual potiguar; produção executiva. Introdução Os avanços tecnológicos em conjunto com maiores facilidades existentes para obtenção de equipamentos de audiovisual são - em uma vista superficial - fatores importantes que podem ser observados nas análises referentes ao aumento do número de produções audiovisuais no país. Outros fatores como: maior número de cursos de capacitação (workshops, cursos técnicos e superiores e etc.) relacionados ao audiovisual, Internet como plataforma para socialização de conteúdos, criação da lei 12.485/2011 que, dentre outras coisas, prevê incentivos à produção audiovisual brasileira, são, também, fatores de grande relevância para a ampliação do segmento no Brasil. 1 Trabalho apresentado na Divisão Temática Cinema e Audiovisual, da Intercom Júnior XII Jornada de Iniciação Científica em Comunicação, evento componente do XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação 2 Estudante de Graduação, 9º período, no curso de Comunicação Social Radialismo pela UFRN. Bolsista de iniciação científica pelo DECOM-UFRN, e-mail: [email protected] 3 Orientador do trabalho. Jornalista graduada pela Unesp de Bauru, com mestrado e doutorado pela Eca/USP em Ciências da Comunicação. Professora dos Cursos de Comunicação Social da UFRN e vice-coordenadora do Programa de Pós- graduação em Estudos da Mídia, e-mail: [email protected]

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Baixo Orçamento e Soluções: Relato de Produção Executiva no Filme “O Mistério das

Noites Brancas”1

Lucas Ferreira FERNANDES2

Valquíria Aparecida Passos KNEIPP 3

Universidade de São Paulo, São Paulo, SP

Resumo

Este trabalho procurou relatar o processo de produção executiva no filme de longa-

metragem potiguar “O Mistério das Noites Brancas”. Como parte dos objetivos, foi

realizado um levantamento conceitual sobre produção no âmbito cinematográfico com base

nos autores Giannasi (2007), Kamín (1999) e Johnson (2002), assim como uma delimitação

da função do produtor com base nos mesmos autores. Por fim, o presente relatório

apresenta soluções criativas para projetos de baixíssimo orçamento, e comprova que existe

viabilidade no cinema sem recursos quando o mesmo visa abordar, primordialmente,

temáticas de relevância social.

Palavras-chave: cinema; ficção de longa-metragem; o mistério das noites brancas;

audiovisual potiguar; produção executiva.

Introdução

Os avanços tecnológicos em conjunto com maiores facilidades existentes para

obtenção de equipamentos de audiovisual são - em uma vista superficial - fatores

importantes que podem ser observados nas análises referentes ao aumento do número de

produções audiovisuais no país. Outros fatores como: maior número de cursos de

capacitação (workshops, cursos técnicos e superiores e etc.) relacionados ao audiovisual,

Internet como plataforma para socialização de conteúdos, criação da lei 12.485/2011 que,

dentre outras coisas, prevê incentivos à produção audiovisual brasileira, são, também,

fatores de grande relevância para a ampliação do segmento no Brasil.

1 Trabalho apresentado na Divisão Temática Cinema e Audiovisual, da Intercom Júnior – XII Jornada de Iniciação

Científica em Comunicação, evento componente do XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação

2 Estudante de Graduação, 9º período, no curso de Comunicação Social – Radialismo pela UFRN. Bolsista de iniciação

científica pelo DECOM-UFRN, e-mail: [email protected]

3 Orientador do trabalho. Jornalista graduada pela Unesp de Bauru, com mestrado e doutorado pela Eca/USP em Ciências

da Comunicação. Professora dos Cursos de Comunicação Social da UFRN e vice-coordenadora do Programa de Pós-

graduação em Estudos da Mídia, e-mail: [email protected]

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No estado do Rio Grande do Norte, o cenário audiovisual vem seguindo a tendência

nacional do aprimoramento e do aumento nas realizações. Ainda que sejam escassos os

documentos de referência sobre o crescimento do número das produções audiovisuais no

estado, em seu artigo, Lima (2013) faz uma análise desse segmento no estado no período de

2007 a 2012, mostrando as articulações e conquistas por parte dos realizadores e

veiculadores de audiovisual no estado, revelando, ainda que incipientemente, maior

efervescência no segmento a nível local. Em complemento a essa pesquisa, podemos

destacar a criação do curso de Produção Audiovisual da Universidade Potiguar em Natal,

no ano de 2015, e também a mudança do curso de Radialismo para Audiovisual na

Universidade Federal do Rio Grande do Norte (projeto em andamento) partindo de

demandas locais. Algo também importante a mencionar é a participação do curta-metragem

“Sêo Inácio” (2014) de Hélio Ronyvon na mostra competitiva do Festival de Gramado em

2015, sendo a primeira obra potiguar a competir no festival.

Todavia, algo muito comum entre essas produções locais reside na dupla (ou mais)

funcionalidade que os idealizadores assumem para conseguirem realizar suas obras.

Geralmente o roteirista é o diretor, que acaba por ser produtor e também produtor

executivo, podendo assumir ainda mais funções. Dentre essas funções, a parte de produção

executiva comumente não é priorizada, o que dificulta em demasia a viabilização das ideias.

Como hipótese para essa não priorização da produção executiva no estado, podemos elencar

a ausência de cursos de capacitação na área e até mesmo a incipiência dos cursos superiores

na área, o que supostamente poderia explicar a falta de produtores executivos de

audiovisual no estado.

Apesar do crescimento nas produções potiguares, é possível que a ausência de

produtores executivos combinada a um cenário de poucos incentivos políticos, configure

uma explicação para a não realização de filmes ficcionais de longa-metragem no estado,

sendo o filme “Boi de Prata” (1980), de Augusto Ribeiro Jr, considerado o primeiro filme

de longa-metragem ficcional produzido no Rio Grande do Norte4 e também considerado o

último (não encontramos registros de outras produções do tipo até então).

A partir de tal constatação, os alunos do curso de Radialismo da Universidade

Federal do Rio Grande em Natal, Lucas Fernandes, Rebecca Pelágio e Valentina

Spanemberg organizaram o coletivo audiovisual Drone em Chamas no ano de 2014, que,

4 NATAL, Cineclube. Boi de Prata Genuinamente Potiguar. 2007. Disponível em:

<http://cineclubenatal.blogspot.com.br/2007/10/boi-de-prata-genuinamente-potiguar-por.html> Acesso em 12

de julho de 2016.

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visando o trabalho cooperativo e a junção de esforços, chegaram à ideia da produção do

filme de longa-metragem ficcional “O Mistério das Noites Brancas”, sendo o primeiro filme

dessa modalidade a ser realizado desde 1980 no estado do Rio Grande do Norte, apesar de

estarem inseridos em um contexto político desfavorável à produção de um trabalho

aparentemente caro.

Em linhas gerais, o filme conta a história do problemático aluno Iuri Araújo, que,

por contingências de sua faculdade, acaba sendo condicionado a passar pela orientação do

professor conservador de origem russa Alexander Vladmirovich. A relação entre aluno e

professor se desenvolve de forma conflituosa e é duramente afetada quando a melhor amiga

de Iuri, Suzane, enfrenta uma profunda depressão relacionada à sua sexualidade, fato que

traz à tona segredos do passado de Vladmirovich.

O presente trabalho tem como objetivo relatar pontos importantes do processo de

produção executiva no filme “O Mistério das Noites Brancas”. Ainda como parte dos

objetivos, pretende-se fazer uma reflexão sobre o conceito de produção executiva e sobre o

papel de um produtor executivo numa obra fílmica com base num levantamento conceitual

baseado em nos autores Giannasi (2007), Kamín (1999) e Johnson (2002), além de

apresentar possibilidades de viabilização.

Produção e Produtores

Ao falarmos em produção, inevitavelmente pensamos em todo o conjunto que

envolve o fazer de um filme. Numa busca por definição do conceito de produção, Giannasi

(2007, p. 13) citando Rodrigues (2002, p. 68) apresenta produção como: “tudo que envolve

fazer um filme, incluindo seu planejamento e capacitação de recursos”. Tal definição ainda

não consegue ser clara, já que a partir da mesma é possível inferir-se que produção é um

termo geral para todas as tarefas dentro e fora do filme.

Uma definição mais específica para produção pode ser abstraída do que coloca

Kamín (1999, p.1):

Producción cinematográfica significa una multiplicidad de tareas y funciones de

distintos niveles. Deberán tomarse resoluciones donde estarán en juego importantes

sumas de dinero pero, también, habrá que proveer los elementos materiales para

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que los técnicos puedan trabajar o contratar servicios que hagan fluido el

funcionamiento del grupo humano involucrado en la película.5

Com base nessa definição, podemos pensar produção como uma forma de gerir as

tarefas e funções numa equipe realizadora. Trata-se da administração dos recursos e da

provisão do que for necessário para que o filme aconteça. Pode ser pensado como a

organização para que tempo e recursos sejam otimizados e para que a equipe evite o maior

número de problemas possíveis.

Segundo Kamín (1999), a produção se divide em três áreas: empresarial, gerencial e

operacional. Em linhas gerais, no nível empresarial, podemos pensar o produtor que se

articular na busca por recursos e que se responsabiliza pelas burocracias relacionadas ao

filme. No nível gerencial, pensamos o produtor que tem experiência com gravações e que

consegue administrar todo o setting de gravações, e em proximidade ao produtor gerencial

está o operacional, que de certa forma auxilia o produtor gerencial em questões

burocráticas. Todavia, existe ainda muita confusão sobre essas funções, e como coloca

Johnson (2002, p. 57) citando Goldman (s.d., p. 60): “producers may be the least

understood figures in the industry”6.

Para Johnson (2002), esses títulos atribuídos à produção e a confusão que muitas

vezes surge em torno dessa função estão ligados ao fato de que uma série de habilidades é

atribuída aos produtores, incluindo habilidades criativas, de negócios, financeiras,

administrativas e interpessoais. Os produtores, nessa perspectiva, são as pessoas que guiam

o processo de realização do filme do começo ao fim. E como coloca Johnson (2002, p. 57):

“The first step in the process is the story, the concept, the idea. It may be the producer‟s

idea or it may come to him or her from a writer or a director or his or her cousin. The

producer is the person who decides to make it a film and begins to try and realize film7.”

Dentro dessa lógica, o produtor é uma peça-chave dentro do processo de realização. Sem

ele, o filme simplesmente não acontece.

Por mais relevante que seja a função do produtor, Johnson (2002, p. 57), se

referindo à capacitação na área destaca:

5 “Produção cinematográfica significa uma multiplicidade de tarefas e funções de níveis distintos. Soluções

deverão ser tomadas onde estarão em jogo importantes somas de dinheiro mas, também, haverá de prover os

elementos materiais para que os técnicos possam trabalhar ou contratar serviços que possibilite o

funcionamento fluido do pessoal envolvido no filme.” (Tradução livre). 6 “Produtores podem ser as figuras menos compreendidas na indústria.” (Tradução livre).

7 “O primeiro passo no processo é a história, o conceito, a ideia. Pode ser a ideia do produtor ou pode vir a ele

por meio do escritor ou diretor ou até do seu primo. O produtor é a pessoa quem decide tornar essa ideia um

filme e começa a tentar e a realizar o filme”. (Tradução livre).

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Fortunately or unfortunately, there is no particular producer school or diploma

course you can or have to take to say “I‟m now a qualified producer”. It‟s a rather

open door but there are numerous difficult often unseen hurdles to navigate to

actually get from “I have a great idea” to “come see my movie, it‟s in a theatre near

you”8.

Com base nessa colocação, é possível inferir que a capacitação na área de produção

se faz necessária, ainda que a mesma em si não seja suficientemente uma garantia de que

um profissional de produção com diploma esteja apto para encarar os desafios que

permeiam uma articulação cinematográfica, que não se resumem apenas ao contexto de

como organizar um setting de filmagem ou garantir que tudo saia como planejado pelo

diretor, a produção, à luz do pensamento de Johnson (2002) seria uma espécie de negócio

ou empreendimento, e a parte mais difícil nesse processo, principalmente nos primeiros

anos de experiência no cenário independente, seria como se manter financeiramente por

meio da produção (JOHNSON, 2002), e é nessa barreira onde muitos decidem parar.

Relato de Produção

Fugindo de uma lógica meramente mercadológica, os alunos de Radialismo da

UFRN que se propuseram a organizar o coletivo audiovisual Drone em Chamas, pensaram,

a princípio, a elaboração de um filme de longa-metragem de ficção como uma ideia de

alavancar o cenário cinematográfico potiguar. Como parte do projeto, os três alunos

idealizadores do coletivo utilizaram a proposta de atividade como trabalho de conclusão de

curso, e em socialização da ideia, outro alunos (e também professores) do curso de

Radialismo, assim como de Jornalismo, Publicidade, Design, Psicologia e Música também

se uniram ao projeto de forma voluntária, contribuindo de acordo com suas habilidades

profissionais.

Na formação do grupo, a função do filme enquanto dispositivo para discussões de

temas pertinentes à sociedade foi discutida. A ideia trabalhada em torno do cinema não foi a

de produção para mercado ou de entretenimento meramente, mas a ideia de que conteúdos

cinematográficos podem e devem carregar em si elementos reflexivos e que propiciem mais

8 “Felizmente ou infelizmente, não existe uma escola específica ou especialização em produção que você

possa cursar para dizer „Eu agora sou um produtor qualificado‟. Isso é uma porta aberta, mas existem

inúmeros obstáculos invisíveis para se navegar do „eu tenho uma ideia‟ até o „venha ver meu filme, ele está no

cinema mais próximo de você‟.”. (Tradução livre).

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do que uma experiência rasa de distração na audiência, por exemplo, mas que colaborem

com denúncias sociais e com a fomentação de debates. Esse ideal por parte do coletivo foi

uma peça-chave para atrair voluntários e colaboradores em todo o processo de produção do

filme.

Em seu argumento, o roteiro do filme “O Mistério das Noites Brancas” – escrito

pelo produtor Lucas Fernandes - se propõe, a partir de um recorte ficcional, debater,

segundo Fernandes (2016, p. 5):

[...] a lei antipropaganda gay da Rússia (assinada em junho de 2013 pelo presidente

Putin com a finalidade de punir disseminações de informações sobre

homoafetividade no país)9 com suas imposições que chegam até mesmo a ferir a

própria constituição local, solapando direitos humanos básicos como: liberdade de

expressão, liberdade de discurso e liberdade de informação.

O filme pretende também, a partir de sua trama, debater a questão do suicídio e das

tentativas de suicídio entre a população LGBT a nível global e em relação com o contexto

do Rio Grande do Norte, especificamente, já que segundo Fernandes (2016, p. 5) citando

Remafedi (1998):

[...] um estudo apresentado no periódico “Health and Human Rights Journal”

aponta que entre rapazes gays e bissexuais na faixa etária de 12 a 18 anos, o índice

de tentativa de suicídio (de pelo menos uma vez na vida) chega a 28%, e entre

rapazes heterossexuais da mesma faixa etária, esse índice cai para 4%10

.

Esses dados representam uma constatação importante sobre a violação dos direitos

humanos contra minorias sexuais não somente no Brasil ou na Rússia, mas a nível global. E

o dispositivo fílmico serve como ferramenta de exploração da temática e para fomentação

de debates sociais, além de servir como um grande atrativo para que voluntários se juntem à

produção. E foi com base na conversa e na apresentação da relevância do conteúdo que

tudo começou.

9 De acordo com o portal de notícias The Guardian: “The law in effect makes it illegal to equate straight and

gay relationships, as well as the distribution of material on gay rights. It introduces fines for individuals and

media groups found guilty of breaking the law, as well as special fines for foreigners”. Acesso em 05 de maio

de 2016. 10

Cost of indulgence: Rise in violence and suicides among LGBT youth in Russia. Disponível em:

<http://www.hhrjournal.org/2013/12/18/cost-of-indulgence-rise-in-violence-and-suicides-among-lgbt-youth-

in-russia/>

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A primeira reunião de equipe para início da produção aconteceu no dia 22 de

dezembro de 2014. Na reunião que contou com a presença do diretor de fotografia, diretora

de arte, figurinista, demais produtores e editor, o roteiro foi discutido e também o

cronograma de articulações.

Em janeiro de 2015 começamos nossa busca por atores voluntários que se

encaixariam dentro dos perfis das personagens da trama: Alexander, um homem com traços

europeus e entre 45 e 60 anos de idade (Figura 1), Suzane, uma menina entre 18 e 25 anos

de idade (Figura 2), Valéria, uma menina com estilo despojado entre 18 e 25 anos de idade

(Figura 3), Elza, uma menina entre 18 e 25 anos com trejeitos masculinos (Figura 4),

Professora Tavares, uma mulher entre 45 e 60 anos de idade (Figura 5), e a personagem

Iuri, que por uma questão de logística e praticidade acabou sendo assumido pelo próprio

produtor Lucas Fernandes. O elenco foi selecionado através de uma pesquisa entre não

atores que potencialmente se encaixariam no perfil das personagens.

Figura 1 - Still Alexander

Fonte: TRINDADE (2015)

Figura 2 - Still Suzane

Fonte: TRINDADE (2015)

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Figura 3- Still Valéria

Fonte: TRINDADE (2015)

Figura 4 - Still Elza

Fonte: TRINDADE (2015)

Figura 5 - Professora Tavares

Fonte: TRINDADE (2015)

Entre as parcerias que fizemos no processo de gravação, conseguimos, por meio do

diálogo e da ideia de promoção dos estabelecimentos como apoiadores do filme, locações

importantes na cidade de Natal, RN que serviram como composição visual para cenas

importantes da trama, como: A boate, CasaNova Eco bar (Figura 6) e o café, Cafè Trieste

(Figura 7).

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Figura 6 - Still Boate

Fonte: TRINDADE (2015)

Figura 7 - Still Café

Fonte: TRINDADE (2015)

Ainda sobre as parcerias, conseguimos, para a composição dos objetos de cena na

locação que representava a casa da personagem Alexander, diversos artigos num antiquário

da cidade, como: quadros, tapetes, vasos, louça e etc. (Figura 8).

Figura 8 - Still Objetos de Alexander

Fonte: TRINDADE (2015)

No processo de filmagem do filme, organizamos a ordem dos dias de acordo com as

locações onde as cenas seriam gravadas, por uma questão de logística. Em um único dia,

muitas vezes, foi possível gravar todas as cenas que aconteciam em uma determinada

locação, como no apartamento de Alexander, onde das 8h às 20h de uma sábado

conseguimos gravar todas as 14 cenas que se passavam naquela locação. Como contávamos

com uma equipe de voluntários, os dias de gravação eram agendados de acordo com a

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disponibilidade da equipe, a Tabela 1 mostra o primeiro cronograma elaborado para os

primeiros dias de filmagem. Sobre a alimentação da equipe nos dias de filmagem mais

longas, o que prevaleceu foi o senso de compartilhamento. Geralmente realizávamos

lanches coletivos onde cada membro do grupo contribuía financeiramente ou com alimentos

previamente preparados.

Para o figurino dos atores, a equipe de arte e figurino realizou uma busca nos

guarda-roupas dos próprios membros da equipe e de pessoas conhecidas. Todo o figurino

do filme foi composto por peças emprestadas. Assim como o figurino emprestado, muitos

outros objetos também foram gentilmente cedidos para as gravações por meio de

voluntários que compacturam com a ideia do projeto, como a Kombi utilizada em algumas

das cenas da personagem Suzane (Figura 9).

Tabela 1 - Cronograma das primeiras filmagens

Elaborado pelo autor.

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Figura 9 – Still da cena na Kombi

Fonte: TRINDADE (2015)

Como suporte técnico, os equipamentos utilizados foram cedidos pela microempresa

local Jubarte Filmes, que se uniu ao coletivo Drone em Chamas para a articulação do filme.

A câmera utilizada majoritariamente foi uma Nikon D610 com lentes 50mm, 85mm e 24-

70mm. Para a captação de áudio utilizamos o gravador Tascam R-05 com microfone boom

direcional. Em algumas cenas forma utilizados tripé e equipamento de traveling. No

momento atual o material captado das gravações está sendo editado nas ilhas de edição do

Laboratório de Comunicação Social da UFRN, com disponibilidade de projeção e com

computadores da Apple.

Para a composição da trilha sonora do filme, buscamos nos compositores locais

independentes as canções que ajudam a construir a atmosfera do filme com todos os direitos

cedidos gratuitamente. Compondo a trilha contamos com bandas e artistas como: Plutão Já

Foi Planeta, Igapó de Almas, Lili Bélica e Mc Priguissa.

Considerações finais

O presente trabalho teve como objetivo relatar pontos importantes dentro do

processo de produção executiva no filme “O Mistério das Noites Brancas”. A partir desse

relato, possíveis soluções para filmes de baixo orçamento podem ser pensadas, mostrando

que existem possibilidades alternativas para se gravar um filme ainda que o mesmo não seja

contemplado por um edital ou lei de incentivo. Foi observado também, que as histórias

pensadas para cinema que abordam temáticas de relevância social podem, mais facilmente,

serem viabilizadas.

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Ainda como parte dos objetivos, foi possível debater o conceito de produção e suas

múltiplas características, além de pensar o papel do produtor (e especialmente o executivo)

como peça-chave na articulação e viabilização de filmes, e como essa função merece

destaque e incentivos de capacitação.

O trabalho da produção executiva no filme “O Mistério das Noites Brancas” teve

início em meados de junho de 2014 quando o roteiro do filme começou a ser redigido e as

primeiras filmagens foram realizadas em uma viagem do roteirista e produtor à Rússia. As

gravações oficiais em Natal, RN tiveram início no mês de fevereiro de 2015 e se

estenderam até setembro do mesmo ano.

Atualmente o filme se encontra na fase de montagem. A edição de áudio

especializada para cinema e o efeito de cor da finalização, ainda estão em negociação com o

Núcleo de Cultura e Arte da UFRN, que abraçou o projeto como tarefa de grande

contribuição para o curso de Radialismo, que em 2017 passará a se chamar Audiovisual.

Referências

FERNANDES, Lucas Ferreira: O Processo Criativo de Roteiro no Filme “O Mistério das

Noites Brancas”. Trabalho apresentado no IJ 04 – Comunicação Audiovisual do XVIII

Congresso de Ciências da Comunicação na Região Nordeste realizado de 07 a 09 de julho

de 2016.

GIANNASI, Ana Maria. O produtor e o processo de produção dos filmes de longa

metragem brasileiros. São Paulo, 2007. Dissertação (Mestrado em Ciências da

Comunicação) – Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação – ECA,

Universidade de São Paulo, 2007.

JOHNSON, Kathy Avrich. Development and other challenges: a producer‟s handbook.

2002. Disponível em: <https://www.telefilm.ca/files/fonds_prog/producer-

handbook_0.pdf> Acesso em 12 de julho de 2016.

KAMÍN, Bebe. Introducción a la producción cinematográfica. Presupuesto – Plan

financiero: Bs.As., Centro de Investigación Cinematográfica, Cap. 3, pp. 20 – 29. Escuela

Regional Cuyo de Cine y Video Cátedra de Producción I, 1999.

LIMA, Érica Conceição Silva. Audiovisual Potiguar: Uma análise do cenário no período

de 2007 a 2012. Trabalho apresentado no DT04 – Comunicação Audiovisual do XV

Congresso de Ciências da Comunicação na Região Nordeste, realizado de 12 a 14 de junho

de 2013.

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NATAL, Cineclube. Boi de Prata Genuinamente Potiguar. 2007. Disponível em:

<http://cineclubenatal.blogspot.com.br/2007/10/boi-de-prata-genuinamente-potiguar-

por.html> Acesso em 12 de julho de 2016.