Intérpretes do Brasil

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DISCIPLINA DE SOCIOLOGIA UFPR Prof. José Ricardo Martins

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Intérpretes do Brasil. Pensamento Social Brasileiro. Pensadores do Brasil.

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DISCIPLINA DE SOCIOLOGIAUFPR

Prof. José Ricardo Martins

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INTÉRPRETES DO BRASILTrata-se de interpretações clássicas da formação da

sociedade brasileira formuladas entre 1920 e 1975. Indagam sobre a própria “natureza” da sociedade que se

veio formando no Brasil desde a Colônia.Autores clássicos: Francisco José Oliveira Vianna: Populações Meridionais do

Brasil: populações rurais do centro-sul (1920) Gilberto Freyre: Casa-Grande e Senzala: formação da família

patriarcal brasileira (1933) Sérgio Buarque de Holanda: Raízes do Brasil (1936) Caio Prado Jr.: Formação do Brasil Contemporâneo: Colônia

(1942) Raymundo Faoro: Os donos do Poder: formação do patronato

político brasileiro (1958) Florestan Fernandes: A Revolução Burguesa no Brasil (1975)

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INTÉRPRETES DO BRASIL Outros autores importantes: Alberto Torres: A organização nacional (1914) Celso Furtado: Formação econômica do Brasil (1958) Paula Beiguelman: Formação política do Brasil (1959) Antônio Cândido: Formação da literatura brasileira (1959) Wanderley Guilherme dos Santos: Paradigma e história: a ordem

burguesa na imaginação social brasileira (1975) Bolívar Lamounier: Formação de um pensamento autoritário na

Primeira República (1977) Roberto Schwarz: As ideias fora do lugar (1973) José Carlos Reis: As identidades do Brasil (1999) Lúcia Lippi Oliveira: Interpretações do Brasil (artigo, 1999) José Murilo de Carvalho: A construção da ordem (1980) Silvano Santiago (org.): Intérpretes do Brasil (2002) Jessé Souza: A construção social da subcidadania (2003) Roberto Da Matta: O que faz o brasil brasil Francisco Weffort: Formação do pensamento político brasileiro

(2006) Bernardo Ricupero: Sete lições sobre as interpretações do Brasil

(2008)

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IDENTIDADE NACIONAL

“A identidade nacional está calcada sobre a ideia de um mito fundador.” (Chauí, 2000, p. 9)

“O mito fundador é uma figura que cria um vínculo com o passado que se prolonga, e por isso impede a crítica sobre a realidade. Encontra novos meios para exprimir-se, novas linguagens, novos valores e ideias. [...] celebrações por sua carga simbólica, não por sua utilidade. [Ex. “Brasil 500”

“Ele se insere no imaginário como algo que suplanta o tempo e o espaço e garante a unidade através de um passado comum e dos mesmos costumes e tradições.”

Fonte: GUIMARÃES, César (org.). Imagens do Brasil: modos de ver, modos de conviver. Capítulo: “Redescobrindo o sertão”, p. 115.

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IDENTIDADE NACIONAL

[...] a procura de uma “identidade brasileira” ou de uma “memória” brasileira que seja sua essência verdadeira é um falso problema. [...] a pergunta fundamental seria: quem é o artífice desta identidade e desta memória que se querem nacionais? A que grupos sociais ela se vinculam e a que interesses elas servem?

Fonte: ORTIZ, Renato. Cultura Brasileira e Identidade Nacional. São Paulo: Brasiliense, 1994, p. 139.

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MATRIZ TEÓRICA NA FORMAÇÃO DO BRASIL Discussão entre as correntes Liberal e Conservadora. Duas correntes de formação nas Américas (Richard Morse,

1988):

Anglo-América: fundada pelas revoluções religiosa e científica. Sociedade baseada no contrato e na livre associação dos indivíduos. John Locke: autor paradigmático.

Íbero-América: ignorou essas revoluções. Postura organicista: cada grupo social desempenharia uma função. São Tomás de Aquino: autor paradigmático.

Resultado: Incompatibilidade e incompreensão mútua entre as duas partes do continente americano. Protestante e católica.

Depois da Independência: liberalismo = ideia dominante no Brasil; porém, prática conservadora.

Raiz portuguesa: burguesia mercantil muito ligada à aristocracia fundiária, ambas dependente do Estado absolutista português. Portanto, a burguesia era incapaz de impulsionar mudanças no país.

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Pensamento nacional autoritárioOliveira VianaAlberto TorresOliveira do AmaralFrancisco Campos

Alberto Torres discute a desorganização e a identidade nacional.

Caráter nacional formado por sua colonização, a escravidão e a indolência (vícios, corrupção...)

Defende o Estado em vista da organização nacional, em função das mazelas do regime político da República Velha: oligarquias, coronelismo, subdesenvolvimentismo, atraso....

Defende reorganizar a Sociedade via intervenção do Estado, pois só este tinha condições de conduzir programas nacionais.

Ausência da temática democrática. Sérgio Buarque de Holanda era uma voz dissidente.

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Pensamento nacional autoritárioNo pensamento autoritário, o Estado via a Sociedade como

amorfa, incapaz de se organizar. Foi assim que pensou Getúlio Vargas.

Pensa o Estado nacional como espaço forte, sem cidadania, sem educação para as massas. Estado excludente, mas protetor (Vargas), com concentração de renda e exclusão social.

Na era Vargas havia preocupação de construção da Nação: forte e unificada. Projeto de unificação da Nação fragmentada, sendo a escola o grande vetor de propagação da cultura nacional e o civismo, principalmente com o uso da língua portuguesa.

Tenta-se, então, por decreto, extinguir os guetos de imigrantes e trazê-los à integração.

O discurso sobre os imigrantes exalta o espírito empreendedor dos imigrantes alemães (discurso que exclui outras etnias e os negros).

A elite política brasileira queria o imigrante para povoar, embranquecer a população e produzir.

Os imigrantes queriam reproduzir um pedaço de seu país de origem.

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OLIVEIRA VIANNA (1883-1951)Populações meridionais do brasil

Autor racista e autoritário, refletindo o reacionarismo da classe dominante brasileira, o pensamento autoritário da Velha República e conservador do Império.

Influenciado pela Escola de Sociologia de Fréderic Le Play: a construção de tipos regionais com base em fatos sociais (“populações rurais do centro-sul”).

Influenciado pela Psicologia Social de Gustave Le Bom: ideia da existência de alma da raça ou caráter nacional – as raças não se distinguem tanto pelas características físicas, mas pelos traços psicológicos, havendo uma hierarquia, havendo uma hierarquia entre elas (por isso era possível 60 mil ingleses dominar 250 milhões de indianos).

Em Evolução do povo brasileiro, Oliveira Vianna aceita a crença no protagonismo da raça ariana (ideias da Antropologia Física de Vacher de Lapouge).

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OLIVEIRA VIANNA (1883-1951)Populações meridionais do brasil

Oliveira Vianna critica a constituição da Velha República (de 1891): “idealismo utópico ou constitucional” pelo fato dos liberais desejarem adotar instituições estrangeiras sem mostrarem preocupação em adequar às condições brasileiras.

Medidas como a descentralização, ao invés de gerarem o self-government à americana, favoreceriam o poder dos caudilhos.

Objetivo de sua obra, segundo o autor: “ressaltar o quanto somos distintos dos outros povos”.

Critica a elite intelectual por absorver as ideias norte-americanas e europeias.

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Gilberto Freyre (1900-1987)CASA-GRANDE E SENZALA

Florestan Fernandes e Roger Bastide trabalham para desmentir a ideologia da democracia racial contida na obra de Freyre: convívio pretensamente harmonioso entre brancos, negros e índios.

Carlos Guilherme Mota: a obra de Freyre representa uma verdadeira cristalização da ideologia da cultura brasileira; sugere a existência de um caráter brasileiro que eclipsaria “as contradições de classe, e mesmo de raça.” (Ideologia da Cultura Brasileira, p. 47)

Visão otimista do Brasil.Primazia da família na colonização: patriarcalismo.Latifúndio e patriarcalismo é o que dá unidade ao Brasil: a

casa grande seria um pequeno mundo auto-suficiente.Miscigenação já vinha de Portugal: mouros e judeus.

Adaptação luso-tropical.

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Sérgio Buarque de Holanda (1902-1982)Raízes do Brasil

Visão otimista e weberiana.Ressalta o tradicional personalismo, de que provem a

frouxidão das instituições e a falta de coesão social; ausência do princípio de hierarquia e a exaltação do prestígio pessoal com relação ao privilégio.

Família patriarcal: a família, único setor da vida brasileira cuja autoridade não era questionada – “uma invasão do público pelo privado” (p. 89).

Tal comportamento dificultaria o estabelecimento do Estado democrático e mesmo de qualquer Estado no Brasil.

Princípio básico da democracia liberal: “a maior felicidade para o maior número” (Jeremy Benthan).

Família: princípio do amor – “amar alguém é amá-lo mais do que aos outros” (p. 156). Esta parcialidade que o meio doméstico oferece, seria incompatível com a atitude neutra diante dos cidadãos, implícita na democracia liberal. Há oposição entre privilégios pessoais e exigências abstratas (funcionário patrimonial x puro burocrata).

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Sérgio Buarque de Holanda (1902-1982)Raízes do Brasil

Homem cordial (o que vem do coração) – amor e ódio: homens que obedecem aos imperativos do coração e não as normas impessoais e abstratas, sendo, assim, muito difícil de estabelecer ordem pública e democracia. (Ricupero, p. 115)

“Formado nos quadros da estrutura familiar, o brasileiro recebeu o peso das ´relações de simpatia´, que dificultam a incorporação normal de outros agrupamentos. Por isso, não acha agradáveis as relações impessoais, características do Estado, procurando reduzi-las ao padrão pessoal e afetivo. Onde pese a família, sobretudo em seu molde tradicional, dificilmente se forma a sociedade urbana de tipo moderno.

[...] O ´homem cordial´ não pressupõe bondade, mas somente o predomínio dos comportamentos de aparência

afetiva, inclusive suas manifestações externas, não necessariamente sinceras nem profundas, que se opõem aos ritualismos da polidez.” (Antônio Candido, O significado de

´Raízes do Brasil´)

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Sérgio Buarque de Holanda (1902-1982)Raízes do Brasil

“Um traço definido do caráter brasileiro, no qual permanece ativa e fecunda a influência ancestral dos padrões de convívio humano, informados no meio rural e patriarcal.” (p. 146-7)

 O homem cordial tem dificuldade para compreender a

distinção fundamental entre os domínios do privado e do público (patrimonialismo).

Tem dificuldade de viver só. A convívio social o liberta.

No domínio linguístico, forte presença do diminutivo (-inho).

Omissão do nome de família no trato. p. 148.

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Sérgio Buarque de Holanda (1902-1982)Raízes do Brasil

Jessé Souza: o livro sugere uma espécie de “sociologia da inautenticidade”, na qual formas estrangeiras como democracia se ajustariam mal às condições brasileiras, correspondendo mesmo a “mal-entendidos”.

“Sérgio Buarque de Holanda considera que as relações pessoa a pessoa, primárias, criam empecilhos para se ter uma ordem social mais impessoal e racional e, ainda mais sério, para a constituição de uma democracia no país.” (Ricupero, p. 122)

A partir do fato da Abolição Sérgio Buarque vê uma certa compatibilidade entre a democracia e a formação social brasileira, incluindo a hierarquia racional.

Sérgio Buarque critica o pensamento autoritário de Alberto Torres e Oliveira Vianna:“O despotismo condiz mal com a doçura de nosso gênio.” (p. 142)

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Caio Prado Jr. (1907-1990)Formação do Brasil Contemporâneo

De importante família de exportadores de café, estuda Direito e entra para a política.

Logo decepciona-se ao verificar que o novo governo que substitui o da Velha República não aplica as devidas punições, perpetuando a impunidade e o arbítrio no país.

A decepção radicaliza-se ao desconfiar das possibilidades de transformação efetiva dentro do capitalismo. Adere ao socialismo.

Em 1933 publica Evolução Política do Brasil, no qual aplica o método marxista do materialismo histórico na interpretação da experiência brasileira (luta de classes).

Formação do Brasil Contemporâneo: colônia (1942) escreve no exílio.

Início do séc. XIX: cruzamento histórico – o passado colonial encontra-se com o início da história do Brasil contemporâneo.

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Caio Prado Jr. (1907-1990)Formação do Brasil Contemporâneo

Verifica que na formação social brasileira nunca houve ruptura significativa com o passado.

A experiência da colônia brasileira é entendida a partir da expansão ultramarinha europeia.

Colônias de povoamento (nas zonas temperadas das Américas) e colônias de exploração (nas zonas tropicais e semi-tropicais do continente). Objetivo mercantil.

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JESSÉ SOUZA A Construção Social da Subcidadania

Estudo sobre as sociedades periféricas e a exclusão social.De Bourdieu, Souza busca resgatar principalmente a crítica à

"naturalização" das relações sociais de dominação contida na teoria do habitus e sua ênfase no aspecto "automático" – caráter irrefletido – dos diferentes comportamentos sociais classificatórios:

“É esse aparato também que permite a Bourdieu perceber dominação e desigualdade onde outros percebem harmonia e pacificação social. É isso que o faz fundamental para qualquer análise, seja das sociedades centrais ou periféricas, interessada em desvelar e reconstruir realidades petrificadas e naturalizadas.” (p. 47)

Tal aspecto revela-se ainda mais decisivo quando pensamos no caráter central atribuído por Bourdieu ao mascaramento das precondições econômicas inerente ao exercício da dominação classista. Ou seja, da dominação simbólica – e, nesse particular, da própria ideologia da igualdade que serve de base ao consenso social e político ocidental – obscurecendo as relações de desigualdade. (Ruy Braga, Decifrando o enigma brasileiro: novas pistas)

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Marilena Chauí Brasil: mito fundador

A relação de dependência pode ser observada em todos os aspectos da sociedade brasileira:

“Conservando as marcas da sociedade colonial escravista, ou aquilo que alguns estudiosos designam como ‘cultura colonial’, a sociedade brasileira é marcada pela estrutura hierárquica do espaço social que determina a forma de uma sociedade fortemente verticalizada em todos os seus aspectos: nela as relações sociais e intersubjetivas são sempre realizadas como relação entre um superior, que manda, e um inferior, que obedece. As diferenças e assimetrias são sempre transformadas em desigualdades que reforçam a relação mando-obediência. O outro jamais é reconhecido como subjetividade nem como alteridade.”

Fonte: CHAUÍ, Marilena. Brasil: o mito fundador e sociedade autoritária. São Paulo: Fund. Perseu Abramo, 2000, p. 89.

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VIDEOS Intérpretes do Brasil – Roberto Da Matta – Parte 1:

http://www.youtube.com/watch?v=fKhQNNSrGvk&feature=relmfu

Intérpretes do Brasil – Roberto Da Matta – Parte 2: http://www.youtube.com/watch?v=DU6hW8XiaV0&feature=relmfu

Cientistas do Brasil – Roberto Da Matta: http://www.youtube.com/watch?v=-t7tynCToiw&feature=related

A Cabeça do Brasileiro – Carlos Alberto Almeida: http://www.youtube.com/watch?v=yejieZR_eWY&feature=fvsr