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INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM AO DOENTE COMTRAUMATISMO CRÂNIO-ENCEFÁLICO: CONSTRUÇÃOE VALIDAÇÃO DE UM PROTOCOLO
Inês de Oliveira Pereira1
José Carlos Quaresma Coelho2
1 Pós graduada em Emergência- Trauma e Apoio Humanitário; Mestre em Enfermagem à pessoa em
situação critica; Enfermeira Especialista em Médico-cirúrgica. Centro Hospitalar de Leiria.
[email protected] Doutorado em enfermagem pela Universidade Católica Portuguesa, Professor Adjunto, Escola
Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Leiria (jose.quaresma @ipleiria.pt)
RESUMOO traumatismo crânio-encefálico é reconhecido como um sério problema de saúde pú-
blica com importante impacto económico e social. Pela nossa experiencia e pela análise
de bibliografia disponível surgiu a necessidade de se uniformizar um conjunto de in-
tervenções de enfermagem para uma atuação rápida e eficaz ao doente com
traumatismo crânio-encefálico em sala de emergência
A presente publicação apresenta um protocolo de intervenção de enfermagem ao
doente com traumatismo crânio-encefálico, baseado nas recomendações do Advanced
Trauma Life Support do American College of Surgeons e do Trauma Nursing Core Courseda
Emergency Nurses Association.
A técnica Delphi, através de aplicação de questionários, por rondas, a um grupo de
peritos, foi a metodologia utilizada para atingir o consenso desejado relativo à per-
tinência e compreensibilidade das intervenções de enfermagem elaboradas. O painel
foi constituído por 13 peritos e foram efetuadas duas rondas. Foi definido como critério
que para obtenção de consenso, as intervenções tinham que obter pelo menos 80 % de
concordância dos peritos em cada uma das intervenções. O protocolo final apresenta as
intervenções de enfermagem válidas e consensuais entre peritos, para uma abordagem
adequada ao doente com traumatismo crânio-encefálico em sala de emergência.
Palavras- chave: Traumatismo crãnio-encefálico; protocolo; cuidados de enfermagem;
técnica Delphi.
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CONSTRUINDO CONHECIMENTO EM ENFERMAGEM À PESSOA EM SITUAÇÃO CRÍTICA
INTRODUÇÃO
O traumatismo crânio-encefálico (TCE) é reconhecido como um sério pro-blema de saúde pública com importante impacto económico e social (Oliveira, La-vrador, Santos e Antunes, 2012). É definido como qualquer agressão que conduz auma lesão anatómica, compromisso funcional do couro cabeludo, crânio, meningesou encéfalo, podendo ser classificado de acordo com a sua intensidade em leve,moderado ou grave (Pereira, Valle, Fernandes, Moura, Brito & Mesquita, 2011).
Os acidentes de viação e as quedas são as principais causas de TCE, para alémdas agressões físicas, derrocadas de edifícios, lesões por armas de fogo e explosões(Ali et al., 2013).
O TCE é considerado umas das principais causas de mortalidade emorbilidade de jovens adultos (Department of Surgery, 2011; Maas e Bullock,2008). Embora a incidência ainda seja elevada, tem-se observado uma diminuiçãoda mortalidade associada, com a melhoria da segurança rodoviária, sistemas deemergência médica e implementação de guidelines para o tratamento de doentescom TCE (Oliveira et al., 2012).
Estes doentes exigem intervenções de enfermagem adequadas à gravidadeda sua situação, pelo que, o enfermeiro deve estar atualizado no conhecimentocientífico, apresentar capacidade técnica e experiência profissional, capacidade emlidar com stress e tomar decisões imediatas, definindo prioridades de atuação a estesdoentes. Na sala de emergência, o enfermeiro deve aliar os conhecimentos teóricosà capacidade de liderança, iniciativa e habilidade na prestação de cuidados. A açãocorreta e em tempo adequado podem melhorar significativamente o estadoneurológico do doente, enquanto a falha na instituição dessas medidas pode levara lesões cerebrais secundárias com consequências na recuperação das funçõesneurológicas (Pereira et al. 2011).
Esta publicação apresenta o resultado de um estudo que teve por objetivouniformizar e sistematizar os cuidados prestados aos doentes com TCE em sala deemergência, através da construção de um protocolo de intervenções de enfermagem,para uma atuação rápida e eficaz em doentes com TCE grave, no Serviço de Urgência(SU). Visa também oferecer uma orientação à equipa de enfermagem para os cuidadosa serem prestados ao doente com TCE em sala de emergência.
De acordo com Silva, Roseni, Leite, Seixas e Gonçalves, (2005) os protocolosassumem-se como uma ferramenta que sistematiza as tecnologias disponíveis,conhecimentos e processos operacionais, de forma a orientar a qualidade doscuidados. O protocolo elaborado teve como referência a revisão bibliográficaefetuada, respeitando a metodologia ATLS® (Advanced Trauma Life Support) doAmerican College of Surgeons e do TNCC® (Trauma Nursing Core Course) daEmergency Nurse Association.
O princípio de abordagem do ATLS é a correção das condições que maisameaçam a vida do doente:
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Intervenções de enfermagem ao doente com Traumatismo crânio-encefálico: construção e validação de um protocolo
A. Vias aéreas com controle da coluna cervical;
B. Respiração e ventilação;
C. Circulação com controle da hemorragia;
D. Estado neurológico;
E. Exposição e controle do ambiente (ACS, 2012).
O Trauma Nursing Core Course (TNCC) da Emergency Nurses Association (ENA)
procura capacitar enfermeiros com o conhecimento, as habilidades de
pensamento crítico e o treino prático para um atendimento especializado aos
doentes vítimas de trauma. Ensina a abordar de forma padronizada a vítima de
trauma e a gerir os cuidados prestados ao politraumatizado, promovendo a
colaboração e comunicação entre todos os membros da equipa de saúde.
A elaboração deste protocolo teve também por referência duas fases de
abordagem; a avaliação inicial e a avaliação secundária ao doente com TCE grave.
A avaliação inicial é uma avaliação rápida e criteriosa do doente, que visa à
estabilização hemodinâmica, através da metodologia ABCDE. A avaliação
secundária é realizada após reanimação adequada e estabilização das funções
vitais do doente.
METODOLOGIA
Para atingir os objetivos foi desenvolvido um estudo descritivo, transversal e
quantitativo. Foi utilizada a técnica Delphi como forma de obter-se o consenso
nas intervenções propostas para protocolo de atuação ao doente com TCE. Esta é
uma técnica que envolve o envio sistemático e intercalado de questionários a in-
divíduos considerados peritos numa determinada área de conhecimento,
promovendo um feedback controlado acerca das opiniões expostas e a colheita
de novas opiniões (Hsu & Sandford, 2007).
O consenso de opiniões dos especialistas sobre uma temática, baseia-se em
quatro características fundamentais deste método: o anonimato dos participantes
da pesquisa; o recurso a especialistas para a colheita de dados; a aplicação de fases
interativas, com o feedback dos participantes e a procura do consenso, proveniente
da avaliação das opiniões do grupo (Munaretto et al., 2013).
Ao longo deste estudo, a construção e validação do protocolo de
enfermagem ao doente com TCE, passou por várias fases:
Numa primeira fase foi realizada uma revisão da literatura sobre o tema, em
bases de dados como a Pubmed, CHINAL, LILACS, RCAAP.
Na segunda fase, foi aplicado um questionário a um grupo de especialistas
em médico- cirúrgica na área do ensino em enfermagem, para pré-seleção das in-
tervenções de enfermagem a utilizar.
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CONSTRUINDO CONHECIMENTO EM ENFERMAGEM À PESSOA EM SITUAÇÃO CRÍTICA
Numa terceira fase foram selecionados os peritos para compor o painelDelphi através de critérios de inclusão da amostra e foi preparado o instrumentode investigação no Google docs.
A última fase correspondeu à operacionalização do método Delphi atravésda aplicação de questionários em duas rondas. A primeira ronda incluiu o enviodo questionário online aos peritos que aceitaram participar no estudo etratamento estatístico em SPSS® dos resultados. A segunda ronda incluiu aapresentação dos resultados da primeira ronda e do novo questionário aapresentar aos peritos.
A técnica Delphi requer peritos com conhecimentos sobre as questões emanálise, que sejam selecionados através de critérios de inclusão (Valdés e Marín,2013). Neste estudo foram definidos os seguintes critérios:
• Ser enfermeiro especialista em enfermagem médico-cirúrgica;• Prestar cuidados de enfermagem ao doente com TCE;• Ter experiência profissional mínima de 5 anos;• Aceitar participar no estudo.No início do estudo foram selecionados 47 enfermeiros considerados
especialistas nessa área mas apenas 20 aceitaram participar no estudo. Apósaplicação dos critérios de inclusão, a amostra ficou com 17 peritos a quem foienviado o link de acesso ao questionário. Houve 4 peritos que não responderamao questionário e a amostra final ficou constituída por 13 peritos.
Não existe um número concreto de elementos que devem compor o painelDelphi. Assegurámos que o número de peritos respeitasse as recomendações dosautores, nomeadamente Okoli e Pawlowsky (2004) e Munarreto et al. (2013) quedefendem um mínimo de 10 peritos.
Figura 1- Sequência de avaliação do processo de inv
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CONCLUSÃO
Grande parte dos politraumatizados apresenta um TCE associado, re-presentando a maioria dos doentes de trauma do SU. A prática profissional fez-nossentir necessidade de realizar um estudo que permitisse melhorar e uniformizara resposta dos enfermeiros na abordagem a estes doentes.
Este estudo permitiu que se construísse e validasse um protocolo de atuaçãode enfermagem, com intervenções de enfermagem válidas e consensuais entreperitos, para uma abordagem adequada ao doente com TCE em sala deemergência.
Foi preocupação dos autores, a fundamentação das intervenções deenfermagem a incluir no protocolo de atuação, assim como a sequência dasmesmas. Intervenções de enfermagem baseadas na evidência científica garantema eficácia e a qualidade dos cuidados prestados.
Foi obtido o consenso dos peritos sobre as intervenções de enfermagemapresentadas dado que foram avaliadas como pertinentes e compreensíveis, pormais de 80 % dos peritos.
As dificuldades sentidas ao longo do estudo foram relacionadas com agestão da participação dos peritos nas várias rondas. A falta de adesão dos peritos
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e aumento dos tempos de resposta aos questionários prolongaram o tempo
previsto para a elaboração deste estudo.
A falta de trabalhos que revertem para a construção de um protocolo de
atuação nos doentes com TCE, foi uma realidade, tornando única a identidade
deste estudo.
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