INTRODUÇÃO A TEOLOGIA

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1. Contexto Atual da Teologia: sinais de esperança e suspeitas

"Todo saber tem seu mistério. E no mistério deve ser iniciado. O saber teológico vê-se envolvido, mais que qualquer outro, por véu misterioso, por tratar-se, em última análise, de conhecimento a respeito do mistério dos mistérios: DEUS",

Fazer teologia é confrontar a vida de fé vivida aqui e agora, com as fontes da fé; em outras palavras: iluminar a realidade com a luz que vem da fé. Tarefa constante e nunca acabada. Nosso estudo tem por finalidade ajudar-nos a introduzir este novo ramo do saber humano e mostrar-nos a importância da teologia para a vivência de uma espiritualidade que perpassa a vida e orienta a convivência humana segundo os valores evangélicos.

Há alguns sinais de esperança que nos permitem constatar que o saber teológico está sendo democratizado e tornado acessível a um maior número de pessoas. São sinais de esperança para a teologia:

Uma teologia de leigos e para leigos : aumento de leigos que estudam e fazem teologia; deslocamento do interesse pela teologia; maioridade intelectual e de fé dos leigos;

Pluralismo religioso : sociedade liberal marcada pela liberdade subjetiva também em relação ao mundo dos valores e verdades; decisão livre no campo religioso; diálogo ecumênico e inter-religioso; posições teóricas e pastorais diversas dentro do próprio catolicismo; possibilidade de verdadeiras teologias não ocidentais; valorização da cultura afro-indígena e oriental; inculturação;

Pastoral mais exigente : exigência de maior preparo intelectual do cristão no âmbito da fé; transposição do horizonte agrário para o industrial (urbano); presença da mídia na evangelização; uso inteligente da informática e da internet na pastoral;

Sede de espiritualidade em partilha : espiritualidade que busca séria fundamentação teológica; autojustificação da fé e partilha em grupos;

Diversidade dos lugares teológicos : descoberta da experiência humana como lugar teológico, lugar do sentido; experiências de densidade existencial (dor, sofrimento, morte ... );

Teologia como companheira do homem moderno : a vida encarada como um dia entre "duas grandes noites"; busca de sentido para a aventura tão breve entre o ontem e o amanhã; resposta à solidão do individualismo consumista; apontar para a proximidade entre Deus e o homem; o encontro do homem com Deus.

Persistem, entretanto, algumas suspeitas em relação à Teologia, sobretudo quanto à sua função, à sua natureza e ao seu método, que geram até mesmo certo medo de estudar teologia. Entre tais suspeitas, assinalamos algumas mais frequentes:

Pastoral imediatista "popular" : submissão ideológica das camadas populares à elite; dependência dos conhecimentos teológicos do clero por parte dos leigos - cria uma suspeita ideológica de dominação e manipulação sobre a teologia; suspeita em relação à teologia contemporânea (doutrina imutável);

Resistência espiritualista : herança de um estranhamento entre a teologia e a espiritualidade; espiritualidade de cunho emocional arredia à teologia - suspeita de a teologia fazer mal à piedade com sua vertente crítica e secularizante;

Controle centralizador : momentos de imposição unilateral e agressividade mútua entre teologia e Magistério da Igreja; reestruturação da teologia sistemática pós Vaticano II; restrições sobre algumas teologias;

Dificuldades do ensino da teologia : o lugar de ensino da teologia (ainda preso aos seminários ou institutos eclesiásticos autônomos, necessária abertura às Universidades);

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o aluno de teologia e suas dificuldades (estudantes tradicionais, estudantes em oscilações afetivas e de valores, estudantes que buscam seriedade científica como respostas para os problemas atuais, estudantes engajados pastoralmente, estudantes com interrogações existenciais, estudantes de feição espiritualista);

Distância entre teologia e pastoral : suspeita de que não serve à pastoral por reflexões abstratas distantes das práticas do homem de hoje; crítica a uma teologia que não prepara "pastores" para a pastoral.

Os pontos acima apresentados revelam que a teologia é uma encruzilhada entre suspeita e busca. Dos dois lados, porém, há estímulos: a suspeita desafia a inteligência, a busca acelera a mesma.

2. Conceito e Natureza da Teologia

O termo Teologia compõe-se etimologicamente de Théos + logia = Deus + ciência (do grego). Deus é, portanto, o objeto principal da teologia; qualquer reflexão teológica refere-se de alguma maneira a Deus. Coloca-se Deus num discurso humano, numa ciência. Logo, teologia é a ciência de ou sobre Deus.

O conceito de Teologia está numa sequência de movimentos que terminam em Deus. É uma operação intelectual humana. O ser humano quer compreender a sua fé. Logo, a teologia define-se como reflexão crítica e sistemática sobre o entendimento da fé. A teologia trata de Deus, mas mediado pela fé. A teologia eleva o nível de conhecimento, que se tem da fé, conforme as exigências e demandas da inteligência, da experiência e da vida.

A Teologia deve ser entendida também como um diálogo entre o homem e Deus que se dá na comunidade eclesial. A Igreja é sempre intermediária no processo relacional entre Deus e o teólogo. O primeiro encontro do nascer da teologia realiza-se entre o teólogo e a sua fé vivida numa comunidade. A Igreja está na origem e no lugar de sua reflexão. Assim, a Teologia é atividade da fé (implica em vivência da fé), é ciência da fé (segue as exigências da racionalidade científica) e tem função eclesial (é feita em comunidade).

Essa reflexão sobre a fé acontece em três níveis diferentes: popular, pastoral e profissional. Na verdade, a teologia não nasce acadêmica, mas sim popular, para tornar-se mais orgânica e metódica nos níveis pastoral e acadêmico.

A teologia popular: É a reflexão espontânea que todo cristão que tem uma fé viva faz ocasionalmente, a sós ou em grupo, para responder às perguntas existenciais de aspecto religioso: Como entender esse fato? Será mesmo verdade? O que será que Deus está querendo de mim? Essa teologia é também chamada "teologia pé-no-chão" porque é uma reflexão unida ao real da vida. O método usado é o do confronto entre a fé vivida e a Palavra de Deus. O ato primeiro é a fé vivida. A teologia é ato segundo. A teologia popular acontece em grupos de jovens, círculos bíblicos, novenas de Natal, Cebs, movimentos eclesiais, etc. O produto dessa teologia toma forma de comentários, partilhas, celebrações e dramatizações.

A teologia pastoral: É o meio termo entre teologia popular e teologia acadêmica. Aqui a reflexão segue a lógica da razão. É uma reflexão em função da evangelização. Na América Latina, adotou o método VER-JULGAR-AGIR.

A teologia acadêmica: Aqui a reflexão segue a lógica científica. É a teologia-ciência trabalhando de maneira metódica e sistemática. É a teologia praticada nos seminários, institutos teológicos, faculdades e escolas de formação. Compreende os graus de bacharelado, especialização, mestrado e doutorado.

3. Finalidade do estudo da Teologia

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Podemos sistematizar a finalidade do estudo da teologia nas quatro funções do mesmo: aprender teologia, aprender a fazer teologia, fazer teologia e celebrar e rezar a teologia. Essas quatro funções do estudo da teologia nos fazem perceber que há uma distinção fundamental da teologia como conteúdo e da teologia como atividade. O conteúdo teológico deve levar ao agir teológico a partir dessas quatro funções.

Em primeiro lugar, é preciso aprender teologia, isto é, fazer contato com as reflexões teológicas elaboradas pelas gerações anteriores: Santos Padres, Doutores, Magistério da Igreja, teólogos de ontem e de hoje. Mas é preciso não absolutizar as expressões da teologia do passado, mesmo as do Magistério, e fechá-las a uma evolução posterior. O passado só é interessante se for inteligível e fizer sentido para o presente.

Em seguida, é preciso aprender a fazer teologia. Isso significa, antes de tudo, entrar na mecânica interna, familiarizar-se com as regras internas da teologia, conhecer as fontes para produzir um discurso pertinente, com valor científico e que possa ser entendido e comunicado como ciência.

A terceira função é partir do estudo para a elaboração da teologia. Fazer teologia para tornar a fé inteligível e assimilável pela razão, integrá-la na vida para que ela produza frutos. Éiluminar a vida própria e a dos outros com a luz que vem da Palavra de Deus.

A teologia elaborada deve ser teologia c e lebrada . No centro da teologia está o mistério de Deus. E o acesso verdadeiro e mais bem sucedido a ele se faz não tanto pelo intelecto, mas pelo coração, pela conversão, pela vida. A teologia deve estimular e facilitar esse acesso.

Mas onde estará a verdade em meio a tantas filosofias, ideologias, religiões e mesmo teologias? O fato é que a dúvida se torna a companheira irrequieta e intrigante do homem de fé que, mais do que nunca, precisa de razões para crer e sustentar a sua opção pessoal, também porque a fé não goza mais de consenso social. A religião católica não é mais uma referência incontestável para valores e integração social como em décadas passadas. Hoje vale o que disse o escritor eclesiástico Tertuliano: "Fiunt, non nascuntur duistiant": os cristãos não nascem, se fazem.

Uma fé não esclarecida descamba facilmente para o fideísmo popular: é a atitude da pessoa que não quer pensar. Podemos, assim, encontrar facilmente na boca expressões como: "de religião não se discute", "cada um tem a sua crença", "isto é mistério, não adianta explicar". A teologia, pelo contrário, é uma fé de olhos abertos, lúcida, inteligente e crítica. Para muitos modernos a religião é tida como inútil ou alienante e Deus como opressor da liberdade humana. Cabe ao teólogo mostrar que a religião liberta e ajuda a administrar a liberdade.

4. Fé e Razão em Teologia

“A fé e a razão constituem como que as duas asas pelas quais o espírito humano se eleva para a contemplação da verdade. Foi Deus quem colocou no coração do homem o desejo de conhecer a verdade e, em última análise, de conhecer a ele, para que, conhecendo-o e amando-o, possa chegar também à verdade plena sobre si próprio” (Fides et Ratio).

4.1. A importância da fé

A fé é o fundamento da teologia. Poderíamos até dizer que ela é a origem, o objeto e o objetivo da teologia. A fé é a condição de possibilidade da teologia. É a atmosfera dentro da qual se move a teologia. A fé é uma realidade que está na ordem do ser . Não é algo que se tem, mas que se é. É uma maneira de ser-no-mundo. A fé cria em nós certa conaturalidade com Deus e assim nos torna capazes de captar melhor as coisas de Deus. No dizer de São

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Tomás de Aquino, a fé é uma luz interior. A fé está para a teologia como a seiva para a árvore, como a alma para o corpo.

4.2. A razão a serviço da fé

Antes de tudo, é preciso tecer algumas considerações sobre a noção de razão no pensamento moderno. O racionalismo prestou um péssimo serviço à humanidade ao reduzir a razão a duas de suas funções: a função d e monstrativa, que é a razão que opera na matemática (2+2=4) e na lógica (silogismos) e que estava na base do antigo conceito de ciência (epistéme); e a função científica, que combina experimentos e cálculos, expressos em proposições quer descritivas, quer lógicas. É científico, racional, isto é, afinal de contas, verdadeiro, o que ainda não foi refutado.

Esse conceito de "razão" é tido hoje em dia como sendo muito estreito porque, numa perspectiva mais ampla, razão não é só formal (lógica) ou empírico-formal (científica), mas também discursiva. Esta última exibe várias razões para se explicar: argumentos, raciocínios, provas de diversos tipos. É a chamada "razão crítica" porque passa em revista tudo, tentando encontrar razões e sentido nas coisas.

Intellectus fidei

É justamente o intellectus, enquanto função originária e originante do pensar, que está em operação no campo da fé. A fé como intellectus possui sua evidência, sua luz e inteligência específicas. É a fé como intuição, experiência, gnose (atitude de busca do mistério de Deus), sabedoria, amor. É abertura infinita à realidade, amor irrestrito ao Ser. É abertura à revelação, é acolhimento do Logos divino, sentido fundamental de tudo. É onde o ser humano aparece como "ouvinte da palavra" (Karl Rahner).

Ratio fidei

A Teologia é precisamente a fé feita razões. Ela nasce do intellectus fidei, para tornar-se, em seguida, ratio fidei. Assim como se distinguem inteligência e razão, assim também importa distinguir fé e teologia, fé e razão, mais precisamente, inteligência da fé e razão da teologia. Momentos diferentes de um mesmo processo.

Quando falamos da relação entre fé e razão, devemos entender fé como iluminação supraconceitual e como formulação dogmática. Por sua parte, razão deve ser entendida como o discurso da fé, seja ele sapiencial, como nos Santos Padres, seja científico, como em São Tomás de Aquino. Nessa linha, fé e razão se colocam em dois planos distintos.

A tese fundamental da relação entre fé e razão é: a razão está a serviço da fé. E é lógico, pois a fé, que de certo modo representa a "razão divina", não pode estar submetida à razão humana. Uma realidade inferior não pode ter a pretensão de dar cabalmente conta de uma realidade de ordem superior. A demasiada luz divina ofusca a pobre retina humana.

5. Divisão da Teologia

São três os momentos básicos do trabalho teológico: o momento positivo (teologia positiva), o momento especulativo (teologia especulativa) e o momento pastoral (teologia prática ou pastoral).

Teologia positiva

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É o momento da escuta dos testemunhos que nos falam do Mistério divino. É a escuta da fé. É um momento muito importante e indispensável. Antes de procurar compreender (2º momento) e tomar decisões para a prática (3º momento), é preciso escutar atentamente o que dizem as fontes da fé. Entre os testemunhos que o teólogo deve ouvir há os "testemunhos primários", que são as Sagradas Escrituras e a Tradição; os "testemunhos secundários", que são os outros testemunhos eclesiais; e, por fim, há os "testemunhos alheios", que assim mesmo podem ser apropriados pela teologia.

5.2. Teologia especulativa O segundo momento da prática teológica trata-se do momento construtivo, especulativo e

teórico. Consta de três passos: a análise do conteúdo interno da fé; a sistematização desse conteúdo numa síntese orgânica; e a criação, em que se desenvolvem novas perspectivas da fé.

A análise teológica, primeiro passo da chamada "teologia especulativa", busca explicar, ou melhor, explicitar a lógica da fé, suas raízes ou suas razões próprias. Trata-se de mostrar o porquê e o como dos mistérios que se creem.

A sistematização teológica é o passo mais importante da teorização da fé. Trata-se de articular os dados da fé num todo orgânico a partir do "nexo entre os mistérios" e em tomo de uma "ideia arquitetônica". Contudo, toda síntese teológica será uma síntese aberta, por causa do Mistério "sempre maior".

5.3 Teologia Prática ou Pastoral

Enfim, o terceiro momento da prática teológica é o confronto com a fé. O método teológico termina na atualização da fé. É uma exigência da própria fé cristã, que é "por causa de nós homens e para nossa salvação". Além disso, é uma exigência do momento histórico, marcado pela práxis. A práxis, ou melhor e mais largamente, a vida é uma realidade rica de múltiplas dimensões. A teologia não pode excluir nenhuma dessas dimensões.

6. Linguagem Teológica

O pensamento e a experiência da fé buscam sempre sua linguagem. Embora permanecendo inadequada, a linguagem é sempre necessária para a fé a fim de completá-la dentro de nós, exprimi-la e comunicá-la aos outros.

Para falar de Deus como Mistério inefável, é impossível fazê-lo de modo absolutamente adequado (linguagem unívoca). Mas também nem toda fala sobre Deus é totalmente inadequada (linguagem equívoca). O caminho certo passa entre esses dois extremos e se chama linguagem analógica.

7. Áreas de estudo e disciplinas teológicas

A teologia acadêmica organiza-se em grandes núcleos básicos, compreendidos por diferentes disciplinas. Podemos dizer que o núcleo do estudo teológico está em torno da Teologia Sistemática ou Dogmática, apoiada pela Teologia Bíblica (dado da fé) e pela Teologia Moral (dado da prática). Há, entretanto, outros núcleos importantes como a Teologia Fundamental, a História da Igreja, o Direito Canônico, a Liturgia e a Espiritualidade e ainda outras disciplinas teológicas. Vejamos cada uma dessas áreas de estudo e suas disciplinas:

Teologia Fundamental 6

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É o primeiro momento do estudo acadêmico da teologia. A Teologia Fundamental lança as bases do conhecimento teológico e reflete o fato constituinte da realidade cristã - a plenitude do projeto salvífico de Deus em Cristo. Explicita o ato de crer em suas diversas dimensões: de razoabilidade e mistério, de liberdade e necessidade, de conhecimento e compromisso.

Teologia Bíblica

A teologia Bíblica exerce grande fascínio sobre o estudante de teologia, quer por seu valor pastoral, quer pelas diversas traduções de estudos exegéticos que temos hoje. No curso acadêmico, a Teologia Bíblica apresenta três grandes blocos: Introdução Geral à Bíblia (história do povo de Israel no Antigo Testamento, tradições orais e escritas, gêneros literários, elementos conceituais); o Antigo Testamento (Pentateuco, Livros Históricos, Profetas, Salmos e Sapienciais) e o Novo Testamento (Evangelhos, Escritos Paulinos, Atos dos Apóstolos, Cartas Católicas e Apocalipse). Faz parte ainda da Teologia Bíblica o estudo das línguas bíblicas, o hebraico e o grego, e ainda o estudo do latim, visando à capacitação para a leitura dos textos da Tradição. A Teologia Bíblica pressupõe o uso da exegese (momento pré-teológico) que busca o significado da letra da Escritura; serve-se das pesquisas arqueológicas e literaturas extra-bíblicas. O itinerário da exegese é: crítica textual, análise literária e crítica histórica.

Teologia Moral

Apesar de compreendida como parte "prática" da teologia, a Teologia Moral necessita de consistente sustentação teórica por tocar aspectos práticos e significativos não somente pastoral, mas também existencial. A Teologia Moral quer refletir sobre a resposta concreta que o cristão dá a Deus nos diversos âmbitos de sua existência. Portanto, a Teologia Moral é o saber crítico sobre o compromisso ético vivido e interpretado à luz da fé.

Teologia Sistemática ou Dogmática

Aqui está propriamente o núcleo do estudo acadêmico de teologia. A teologia Sistemática ou Dogmática compreende uma série de disciplinas resultantes da elaboração teórica milenar da Igreja, os chamados Tratados Teológicos. Sua matéria-prima é o dado revelado (Escritura), aprofundado, reinterpretado e enriquecido pela Tradição. Há disciplinas centrais, como a Trindade (que estuda o ser de Deus e a sua condição trina), a Cristologia (que estuda a pessoa de Jesus Cristo, Deus e homem), a Pneumatologia (que estuda a pessoa do Espírito Santo), a Eclesiologia (que estuda o mistério da Igreja e sua missão), a Sacramentologia (que estuda os sacramentos da Igreja como sinais de salvação), a Antropologia Teológica (que estuda a realidade humana na sua relação com Deus nas experiências da criação, do pecado, da infusão da graça e da salvação). Existem também outros pequenos tratados ligados aos primeiros, como a Escatologia (que estuda o mistério salvífico na perspectiva do fim da realidade criada) e a Mariologia (que estuda o lugar privilegiado de Maria, mãe de Deus, na história da salvação e como ícone para a Igreja).

Direito Canônico

Esse núcleo teológico consiste numa série de leis e regulamentações elaboradas pela estrutura organizada, de teor jurídico. Segue o modelo do direito romano, tendo a versão

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atual promulgada em 1983. O Código de Direito Canônico estrutura-se assim: normas gerais, direito constitucional, magistério, ministério de santificação, direito sobre bens, direito penal e direito processual.

História da Igreja

A História da Igreja entende a Igreja como instituição humana que caminha para a plenitude escatológica. Ajuda a teologia a compreender como e porque a Igreja faz opções pastorais e assume distintas configurações ao longo dos tempos. Fornece uma visão panorâmica das grandes fases da história universal, inserindo os papéis assumidos pela comunidade eclesial em cada contexto sociocultural. Ajuda ainda a compreender a correta relação entre Igreja e Mundo.

Liturgia e Espiritualidade

Essas duas disciplinas não consistem especificamente áreas teológicas, mas dimensões da vida cristã. A liturgia é a expressão da adesão ao projeto de Jesus por meio de louvor, súplica e ação de graças. A Teologia Espiritual, por sua vez, quer compreender a dimensão místico-celebrativa da fé; está envolvida num clima de abertura ao mistério, privilegiando imagens, analogia, beleza, envolvimento afetivo. Reflete sobre o processo da fé, descrevendo-lhe a estrutura e as leis do seu desenvolvimento, a ressonância do relacionamento com Deus na consciência.

Outras Disciplinas Teológicas

O curso acadêmico de Teologia abarca ainda outras disciplinas também importantes para o entendimento da fé. São elas: a Patrologia (que estuda o ensinamento dos Santos Padres a partir de seu testemunho de vida e suas obras), a Teologia Pastoral (que estuda a prática pastoral da Igreja à luz da teologia), a Teologia das Religiões (que estuda as diferentes religiões e um possível diálogo cristão com as mesmas), o Ecumenismo (que estuda as diferentes comunidades eclesiais cristãs, suas tradições e o diálogo entre as Igrejas), a Homilética (que estuda a forma da pregação da fé cristã), a Missiologia (que estuda a missão da Igreja e de seus membros e suas implicações), a Teologia do laicato (que estuda o papel dos cristãos leigos na vida da Igreja).

8. Teologia e Magistério da Igreja O primeiro e máximo magistério é o da Palavra de Deus. Depois, vem o magistério do Povo

de Deus como um todo e por fim vem o magistério dos Pastores, no qual está incluído o do Sumo Pontífice. A Igreja-toda-magisterial exerce seu magistério comum pelo testemunho que ela dá da verdade do Evangelho através do conjunto de sua vida, seja face ao mundo, seja dentro da própria Igreja. É, portanto todo o Povo de Deus que ensina a Verdade salvadora, ou, em outras palavras, que evangeliza.

A fé, além de ser vivida na realidade, deve ser conservada em sua verdade, como testemunha o Novo Testamento e as lutas da Igreja na história contra as heresias. Porém, o cuidado pela verdade da fé é responsabilidade do Povo de Deus como um todo. a magistério comum se funda no sensus fidelium, pelo qual a Igreja como um todo adere infalivelmente à Verdade da fé. Todavia, para ser autêntico, o "sentido de fé" deve ser testemunhado pela universalidade dos fiéis, incluindo os pastores (consensus fidelium), representado pelas

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Comunidades mais vivas e participantes e vivido durante um tempo longo, para poder aparecer como tal.

9- Tarefas Gerais da Teologia.

T a r e f a h ermenêutica

A teologia é hermenêutica da fé, uma vez que reinterpreta e organiza os dados revelados e compreendidos na/pela comunidade eclesial, em diferentes contextos socioculturais e históricos (o que impede o anacronismo). Entretanto, nem sempre houve consciência dessa tarefa hermenêutica da teologia. Quando se acentua uma visão a- histórica, as verdades abstratas possuem formulações definitivas; a teologia perene responde às questões fundamentais da fé sem considerar as coordenadas culturais de tempo e espaço em suas formulações dos dados da fé.

Tarefa Crítico-Construtiva A tarefa crítico-construtiva reúne duas características: é crítica (questiona, desinstala,

purifica) e é construtiva (justifica, harmoniza, integra).

Tarefa Dialogal

A teologia assume, com o Vaticano II, o diálogo explícito e aberto da Igreja com o mundo, em toda a sua amplitude. Esse diálogo pressupõe condições epistemológicas, linguísticas, psicológicas, sócio-históricas, espirituais e teológicas. A teologia dialoga.

10- . Tarefas Específicas

T a refa da Práx i s

A teologia, hermenêutica da fé a serviço da evangelização, deve confrontar-se com a práxis edesial e social. A práxis é um "laboratório" para testar as novas formulações da fé elaboradas pela teologia: toda reflexão teológica pertinente, articulada com a Escritura e a Tradição, deve ser também relevante aos grupos cristãos, oferecendo utilidade à prática pastoral, à espiritualidade e ao diálogo com o mundo secular. Se a teologia não assume a tarefa da práxis, torna-se saber estéril.

Ta r e f a da unidade interna na diversidade

Há uma crescente produção do saber teológico sistematizado. É tarefa da teologia criar e desenvolver eixos temáticos que articulem as diferentes áreas da teologia, promovendo uma unidade interna na diversidade.

Apr i moramento dos instrumentais pré - teológicos e relação com as ciênc i as

A teologia, consciente de que a mediação hermenêutica pré-teológica lhe é importante, serve-se de instrumentais como a antropologia social e cultural, a psicologia, a história e outras formas que vão além da ciência. A escolha dessas mediações, entretanto, deve ser cautelosa, visto que as ciências humanas apresentam resultados parciais e reversíveis. A teologia é chamada à articulação com as ciências humanas.

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T e ol ogia e ecologia

O movimento ecológico é atualmente um autêntico potencial extra-eclesial de solidariedade. A reelaboração da teologia da criação e o diálogo com a ciência e as cosmologias procedentes da física moderna constituem hoje algumas tarefas urgentes. É tarefa da teologia não somente assimilar os temas ecológicos, mas adotar novos paradigmas ou matrizes que integrem a perspectiva da ecologia profunda; diálogo com a holística.

Arti cu l ação com a pastoral e a espiritualidade

A tarefa de maior articulação da teologia com a pastoral exige uma maior produção teológica em nível pastoral, com proximidade às questões existenciais, religiosas e prático- transformadoras. A aproximação da teologia com a espiritualidade aponta para a necessidade de a teologia conferir lucidez à espiritualidade, dando-lhe parâmetros de compreensão e interpretação da experiência religiosa.

Bibliografia

LIBÁNIO, João Batista; MURAD, Afonso. Introdução à Teologia - perfil, enfoques, tarefas. São Paulo: loyola, 1995.

JOÃO PAULO II. Carta Encíclica "Fides et Ratio" do Sumo Pontífice João Paulo II aos Bispos da Igreja Católica sobre as Relações entre Fé e Razão. São Paulo: Paulinas, 1998.

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