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Helton Adverse & Carlo Gabriel K. Pancera (orgs.) faces de as Maquiavel história, república, corrupção Helton Adverse & faces Maquiavel

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Helton Adverse & Carlo Gabriel K. Pancera (orgs.)

faces deas

Maquiavelhistória, república, corrupção

Helton Adverse &

Carlo Gabriel K. Pancera

(orgs.)

História1. Imitação e inovação: o proêmio do Livro II, dos DiscorsiDiogo Pires Aurélio

República2. A questão da fundação: uma abor-dagem histórica desde os humanistas cívicos até MaquiavelFabrina Magalhães Pinto

3. Maquiavel: o distanciamento dos paradigmas antigos do ‘Regime Misto’ em seu ‘tratado sobre as repúblicas’Sérgio Cardoso

4. Governo misto ou república popular: a república adaptativa nos Discorsi de MaquiavelLuís Falcão

5. Maquiavel, Tito Lívio e a constituição dos romanosFlávia Benevenuto

6. Maquiavel e o Problema do Bem ComumHelton Adverse

7. Religião e disciplina militar: a força do imaginário religioso na Arte da Guerra de MaquiavelJosé Luiz Ames

Corrupção8. Conflito político e corrupção no livro I dos DiscorsiJosé Antônio Martins

9. “O jugo que por si mesmo é colocado em seu pescoço". Maquiavel e a servidão voluntária da multidãoStefano Visentin

10. República e facções em MaquiavelCarlo Gabriel Kszan Pancera

11. Maquiavel e as conjuraçõesNewton Bignotto

Repercussões12. John Pocock e a liberdade republi-cana em MaquiavelAlberto Ribeiro G. de Barros

13. Poder social e autoridade: sobre o realismo político de Maquiavel e seu legadoMaria Isabel Limongi

14. A noção de povo no quadro da democ-racia moderna: Lefort, leitor de MaquiavelMartha Costa

15. Thoughts on Machiavelli de Leo Strauss. Impacto e Conspiração na AcademiaAntonio Bento

ISBN 978-65-5059-025-3

Esse livro traz os resultados do II Colóquio Internacional Maquiavel, realizado em 2017, na UFMG, e concebido para comemorar os 500 anos dos Discursos sobre a primeira Década de Tito Lívio, de Maquiavel. Foi um evento no qual tivemos a oportunidade de reunir es-tudiosos do pensamento maquiaveliano, bem como de f ilosof ia política, para discutir di-versos aspectos da obra do secretário f lor-entino. Objeto do olhar comum, cada autor abordou diferentes aspectos, segundo difer-entes perspectivas teóricas e interpretativas. O que se produziu, no f inal das contas, foi um livro no qual foram tratados temas cen-trais do pensamento do secretário f lorentino (história, república e corrupção), segundo os quais organizamos os blocos de textos, com-plementados por ref lexões sobre a o impacto do pensamento do f lorentino na posteridade.

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As faces de Maquiavel :His tó r i a , repúb l i ca , co r rupção

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As faces de Maquiavel :His tó r i a , repúb l i ca , co r rupção

He l ton Adver se Ca r lo Gabr ie l K . Pance ra

[Orgs . ]

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Plácido Arraes

Tales Leon de Marco

Bárbara Rodrigues

Letícia Robini Imagem de Santi di Tito [Retrato de Niccolò Machiavelli - Detalhe, modificada], licenciada pelo Wikimedia Commons

Bárbara RodriguesEnzo Zaqueu

Editor Chefe

Editor

Produtora Editorial

Capa, projeto gráfico

Diagramação

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Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida, por quaisquer meios, sem a autorização prévia do Grupo D’Plácido.

Catalogação na Publicação (CIP)Ficha catalográfica

As faces de Maquiavel: História, república, corrupção. ADVERSE, Helton; PANCERA, Carlo Gabriel K. [Orgs.] -- Belo Horizonte: Editora D’Plácido, 2019.292 p.

ISBN: 978-65-5059-025-3

1. Filosofia. 2. Política I. Título.

CDD100 CDU140

W W W . E D I T O R A D P L A C I D O . C O M . B R

Belo HorizonteAv. Brasil, 1843,

Savassi, Belo Horizonte, MGTel.: 31 3261 2801

CEP 30140-007

São PauloAv. Paulista, 2444, 8º andar, cj 82Bela Vista – São Paulo, SPCEP 01310-933

Copyright © 2019, D’Plácido Editora.Copyright © 2019, Os Autores.

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Sumário

Apresentação 9

História

1. Imitação e inovação: o Proêmio do Livro II dos Discursos 17

Diogo P i res A uré l io

República

2. A questão da fundação da cidade de Florença em Leonardo Bruni e Maquiavel 41

Fa br ina Mag a l hães P in to

3. Maquiavel: o distanciamento dos paradigmas antigos do ‘regime misto’ 61

Sérg io Ca rd o so

4. Governo misto ou república popular: a república adaptativa nos Discorsi de Maquiavel 77

Lu í s F a l cão

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5. Maquiavel, Tito Lívio e a constituição dos romanos 101

F lá v ia Benevenuto

6. Maquiavel e o Problema do Bem Comum 115

He l ton Ad v er se

7. Religião e disciplina militar: a força do imaginário religioso na Arte da Guerra de Maquiavel 129

J osé Lu i z A mes

Corrupção

8. Conflito político e corrupção no livro I dos Discorsi 147

J osé Antôn io Mar t in s

9. “O jugo que por si mesmo é colocado em seu pescoço” Maquiavel e a servidão voluntária da multidão 167

S te fa no V i sen t in

10. República e facções em Maquiavel 179

Car lo Ga b r ie l K szan Pance ra

11. Maquiavel e as conjurações 195

Ne wton B ig no t to

Repercussões

12. John Pocock e a liberdade republicana em Maquiavel 217

Al be r to R ib e i ro G . d e Ba r ro s

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13. Poder social e autoridade: sobre o realismo político de Maquiavel e seu legado 231

Mar ia I sab e l L imo ng i

14. A noção de povo no quadro da democracia moderna: Lefort, leitor de Maquiavel 241

Mar t h a Co s t a

15. Thoughts on Machiavelli de Leo Strauss: Impacto e Conspiração na Academia 255

An tón io Bento

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Apresentação

Sempre que se fala em filosofia política, Maquiavel é parada obri-gatória, pois é autor fundamental para a área. Sua obra foi produzida na primeira metade do século XVI, mas estabeleceu diálogo com a longa tradição que o precedera, retomando muitos dos temas e conferindo-lhes novos e surpreendentes significados. A sua fortuna crítica é testemunha disso: a imagem do florentino variou de inspirador da tirania, de teórico da razão de estado a republicano convicto. Mas os efeitos de seus escritos ainda nos tocam (e para além do registro acadêmico!). A fecundidade de sua obra pode ser aferida pelas interpretações exemplares que foram produzidas ao longo do século XX1 e também pelo debate acadêmico que gira em torno de suas ideias. O livro que agora apresentamos ao leitor é um exemplo da proficuidade desta discussão.

Esse livro traz os resultados do II Colóquio Internacional Maquiavel, realizado em 2017, na UFMG, e concebido para comemorar os 500 anos dos Discursos sobre a primeira Década de Tito Lívio, de Maquiavel. Foi um evento no qual tivemos a oportunidade de reunir estudiosos do pensa-mento maquiaveliano, bem como de filosofia política, para discutir di-versos aspectos da obra do secretário florentino. Objeto do olhar comum, cada autor abordou diferentes aspectos, segundo diferentes perspectivas teóricas e interpretativas. O que se produziu, no final das contas, foi um livro no qual foram tratados temas centrais do pensamento do secretário florentino (história, república e corrupção), segundo os quais organizamos

1 LEFORT, Claude. Le Travail de l´Ouevre Machiavel, Paris: Gallimard, 1972; POCO-CK, J.G.A. The Machiavellian Moment, Princeton University Press, 1975, SKINNER, Quentin. As fundações do pensamento político moderno, SP: Cia. das Letras, 1998 (1978); entre outras.

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os blocos de textos, complementados por reflexões sobre a o impacto do pensamento do florentino na posteridade.

O texto de abertura é também um texto no qual o autor, Diogo Pires Aurélio, toca numa dos temas centrais para o Renascimento que é o tema da imitação dos antigos, e, como se verá, fundamental para o próprio Maquiavel, que a recomenda em seus Discursos. A temática se constitui, assim, numa espécie de propedêutica à obra do secretário florentino e, por isso, serve de maneira excelente como abertura para o livro que ora apresentamos. Nesse texto, o intérprete se ocupa em desfazer o aparente paradoxo que se forma quando se depara com as dúvidas que são lança-das pelo florentino sobre as narrativas dos historiadores, em especial no proêmio do segundo livro dos Discursos. Cabe indagar: como imitar algo que não é certo ou verossímil? A fim de dirimir a ilusória contradição, Aurélio lança a tese de que há uma verdadeira epistemologia acerca desse passado que se quer imitar. É o que ele vai explicitar de maneira exemplar, acabando por mostrar que a imitação do passado é imitação do gesto fundador e, por isso, é também inovação.

Na sequência, estão uma série de textos que formam quase um bloco temático. É o legado humanista sobre o passado romano de Florença e a sua recepção no pensamento republicano de Maquiavel que está em questão. Fabrina Magalhães Pinto abre este bloco com uma reflexão sobre o tema da fundação que, para alcançar o secretário florentino, delineia o modo e o papel que dois dos mais importantes humanistas cívicos, a saber, Coluccio Salutati e Leonardo Bruni, conferiram à fundação romana de sua cidade. Dirá a intérprete que esses humanistas recorrem à problemática da fundação para retoricamente conferir legitimação à condição livre de sua cidade e também dar suporte político ao autogo-verno almejado por ela. O contraponto com Maquiavel será evidente, pois esse autor dará à questão uma finalidade eminentemente política, fundada numa teoria substantiva.

Sérgio Cardoso, em continuidade não combinada com o que fora dito por Fabrina Magalhães, mostra o distanciamento que Maquiavel toma em relação à ideologia florentina (Lefort) – encarnada no pensamento de Salutati e Bruni. O intérprete pretende demonstrar de que maneira o secretário florentino põe abaixo os alicerces que a sustentavam, não só no que se refere ao paradigma do fundador clássico, mas principalmente em relação ao paradigma da forma mista de governo. Evocando aquilo que noutra ocasião ele próprio chamara de núcleo da obra maquiaveliana, Cardoso mobiliza a oposição constitutiva do fenômeno político entre

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grandes e povo para esclarecer a posição de Maquiavel de que o que fez Roma livre e poderosa foi justamente a referida oposição: teria sido ela a elevar a cidade à condição que então alcançara e não a forma de governo que assumiu (e que, a seus olhos, é um efeito desta desunião).

Luís Falcão volta à questão do governo misto, mas numa abordagem distinta da de Cardoso. Sua ênfase recai nos aspectos político-institucionais. O intérprete discute a aparente contradição, existente no “tratado sobre as repúblicas” (os 18 primeiros capítulos do livro I dos Discursos), entre a sustentação de um alinhamento do florentino à teoria do governo misto e a sua adesão a uma república popular. Sem negar um e outro, Falcão procura desfazer a aparente aporia, demonstrando, ainda, ser legítimo supor que a república bem-ordenada seja ou mista ou popular, sem exclusão mútua.

Flávia Benevenuto, por sua vez, é atraída pela obra que é objeto dos comentários nos Discursos. Ela vê no retorno a alguns dos trechos da his-tória de Tito Lívio e na sua respectiva análise a possibilidade de elucidar alguns aspectos do texto maquiaveliano. Debruçando-se sobre a narrativa dos eventos que levaram à criação dos Tribunos da Plebe em Roma, a intérprete pensa poder lançar luzes sobre a teoria dos humores que ocupa um lugar nuclear na obra do florentino. Parece-lhe especialmente significativo no historiador a relação que se forma entre os tumultos e instituição da constituição mista, relação esta que será retomada e explo-rada por Maquiavel no início do século XVI.

Ainda neste bloco, temos o texto de Helton Adverse, que faz do bem comum seu tema de reflexão. Segundo o intérprete, encontramos a noção na obra de Maquiavel, mas ela não tem em absoluto a centralidade que ocupa no pensamento republicano da tradição anterior e tampouco naquela que o sucedeu. Diferentemente destas tradições, o secretário florentino a utiliza para nos colocar no horizonte das leis da cidade, mas não para fazer dela o fundamento da república. Ao contrário, diz Adverse, o comprometimento do republicanismo maquiaveliano com a noção de que o político é constitutivamente cindido e que é justamente dessa cisão que nasce a república o afasta daqueles republicanismos eminentemente normativos. Nesse sentido, o bem comum pode ser compreendido como, sobretudo uma, “experiência política”, inscrita na história dos conflitos internos e externos que marcam a vida da república.

Fechando este primeiro bloco está o texto de José Luiz Ames que coloca em destaque o papel da religião na disciplina militar, im-prescindível para qualquer comunidade política e, em especial, para a liberdade republicana. De acordo com Ames, a religião apenas pode

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cumprir seu papel político (essencialmente, produzir a coesão e asse-gurar a obediência no interior da instituição militar) se for capaz de mobilizar a fede dos cidadãos-soldados, vale dizer, operando no registro imaginário. Seu texto explicita os meios como esse imaginário pode ser instituído e assinala, ainda, os diferentes efeitos militares e políticos entre o paganismo e o cristianismo.

Um segundo bloco se forma com textos que tratam dos limites da política. Eles estão voltados para o problema da corrupção, do jogo de facções e das conjurações. Quem abre esta parte é José Antônio Martins que se pergunta sobre como seria possível compreender a corrupção à luz dos conflitos constitutivos do político. Seguindo uma abordagem que busca a ordem das razões mais do que a letra do texto, o intérprete passa em rápida revista a teoria do conflito de Maquiavel para afirmar sua tese, segundo a qual a corrupção deve ser entendida como ausência de conflito. Tal ausência seria derivada do esmorecimento da oposição fundante do corpo político, o que levaria os cidadãos à falta de engajamento político, causa última da corrupção da república.

Ainda nos quadros do problema da corrupção que afeta todo e qualquer estado, Stefano Visentin busca solucionar a aparente contradição maquiaveliana entre o desejo fundamental do povo de resistir à servidão e o fato de que, por vezes, ele não apenas aceita tal servidão como também contribui para tanto. A hipótese do intérprete consiste em afirmar que isso se deve ao processo de corrupção que corrói o ímpeto do humor popular, levando-o, com o passar do tempo, a uma perda da memória da liberdade e ao hábito da servidão. A causa dessa corrupção, conforme nos mostra, é justamente a dissolução dos vínculos legais e institucionais que dão unidade à multidão. Dissolvendo-se tais vínculos, emerge uma multiplicidade de indivíduos que agem de acordo com paixões particulares e não mais como um povo que luta contra a opressão. Por fim, Visentin nos alerta que a corrosão do desejo de liberdade nunca é completa o bastante para levar a uma completa subjugação, mostrando que sempre resta uma saída para a tirania.

O texto de Carlo Gabriel K. Pancera visa examinar um problema estreitamente vinculado àquele da corrupção, a saber, o das facções. Interessa a Pancera mostrar como elas emergem em um corpo político que conhece a decadência, acelerando o processo de degradação que a conduzirá à destruição de sua forma política. A hipótese do intérprete é que o aparecimento das facções apenas é compreendido quando colo-camos em primeiro plano a vida institucional de uma república, isto é,

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as causas de sua liberdade, assim como aquelas de sua perda, o que não pode deixar de evocar o conflito entre Grandes e povos.

Fechando este segundo momento, encontramos o texto de New-ton Bignotto que se ocupa do tema das conspirações, o qual aparece, sobretudo, no sexto capítulo do terceiro livro dos Discursos. Ao tratar da questão das conjurações, Maquiavel coloca-nos diante de uma região que, naquela altura da obra, ainda não havia sido contemplada. Com a análise da questão, nos diz o intérprete, nos situamos numa posição que nos permite compreender a complexidade do problema da ação, a qual extrapola os limites da fórmula que associa como fatores fundamentais para o sucesso das conspirações, quais sejam, o número de conspiradores, o segredo e a fortuna. E é justamente o que não é tão facilmente entrevisto que o intérprete nos faz ver.

O livro é fechado por um conjunto de textos dedicados ao exame das repercussões do pensamento de Maquiavel. Alberto de Barros faz um exercício crítico voltado para uma das interpretações responsáveis pelo revigoramento do republicanismo de Maquiavel no século XX. Ele coloca sub júdice a noção de liberdade que J.G.A Pocock pensa ter encontrado na obra de Maquiavel. Segundo o intérprete, Pocock acaba cometendo o mesmo deslize que Skinner já cometera, a saber, utilizar um vocabulário normativo contemporâneo, aquele que opõe liberdade positiva a liberdade negativa, para caracterizar a noção maquiaveliana de liberdade. O resultado é introduzir um vocabulário estranho a Maquiavel ao mesmo tempo em que é restringida a sua rica e variada concepção de liberdade.

Maria Isabel Limongi faz de seu objeto de reflexão um certo realismo político que penetrou na tradição liberal. É um realismo que pode ser re-montado de Tocqueville (mas também de Hobbes e Hume) a Maquiavel. O fio condutor que entretece estes autores e torna possível situá-los numa mesma linguagem é o que a intérprete denomina de balança do poder, noção que nos remete mais propriamente ao tipo de relações sociais existentes numa determinada sociedade, as quais, segundo os autores referidos, se projetam numa forma de governo, dando-lhe os contornos essenciais. É isso que, no final das contas, a intérprete chamará de realismo político.

Já Martha Costa dirige sua atenção para a noção de povo. Seu esfor-ço consiste em mostrar como Claude Lefort estrutura a reflexão sobre a democracia moderna a partir da noção de povo presente na obra de Maquiavel. Recuperando do florentino o núcleo estruturante de sua obra, que se refere à cisão de humores constitutiva de todo e qualquer corpo político, Lefort se afasta de seus referenciais teóricos anteriores,

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para, então, apostar numa releitura da democracia. Mas é uma releitura que ultrapassa os limites de uma mera associação da democracia com o estado de direito para ser pensada como uma forma política na qual há ou pode haver uma ampla participação social, vale dizer, uma ampla atuação do povo.

Por fim, encerrando este volume encontramos a reflexão de An-tónio Bento sobre Leo Strauss. Focando no diálogo entre um discípulo do filósofo alemão, Harvey Mansfield, e um importante intérprete de Maquiavel, J.G.A. Pocock, que critica enfaticamente os métodos e in-tenções utilizados na escritura de Thoughts on Machiavelli, o intérprete, no texto que nos oferece neste livro, estabelece sua própria leitura de Strauss, aplicando ao autor um de expedientes hermenêuticos straussianos típicos: aquele que, para se proteger, faz ouvir a sua voz por meio das palavras ou discursos de outrem. Assim, o que se tem, na interpretação que faz da obra do secretário florentino é, na realidade, a voz do próprio Strauss que, por trás do discurso maquiaveliano, apresenta sua própria crítica à modernidade.

Os organizadores.

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Helton Adverse & Carlo Gabriel K. Pancera (orgs.)

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Maquiavelhistória, república, corrupção

Helton Adverse &

Carlo Gabriel K. Pancera

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República2. A questão da fundação: uma abor-dagem histórica desde os humanistas cívicos até MaquiavelFabrina Magalhães Pinto

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blica, corru

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