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In Memoriam IN MEMORIAM

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Nho Quim Drummond - In Memoriam

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In Memoriam

IN MEMORIAM

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Numa época em que as memórias se perdem com facilidade, esquecidas em depósitos empoeirados, transformadas em lixos ou materiais descartáveis, este livro serve de alerta, para que cuidemos melhor de nosso passado. É nele que se encontram muitas das respostas sobre este futuro incerto e desconhecido, para onde inadvertidamente caminhamos, e que com certeza teremos de dar conta um dia às futuras gerações.

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Prefácio Quando remoemos o passado de nossa infância, buscando a lembrança de fatos que pareciam perdidos no tempo, somos levados a reinterpretar estes fatos à luz de novos parâmetros e de uma nova realidade. O primeiro sentimento que me acolhia, quando me lembrava de meu avô Nhô Quim, era um misto de respeito e medo. A impressão de meu avô como uma pessoa muito séria e sisuda, ficara gravada de uma forma tão consistente em minhas memórias, que só este mergulho no passado, que antes não se fizera necessário, permitiu-me reconstruir uma nova visão sobre sua imagem. Lembrei-me de meu avô e meu pai conversando, o primeiro de forma ponderada e o segundo bem a seu feitio, afoito, expansivo. Algumas vezes capturei uma cena rara, o meu avô falando de forma séria e firme, enquanto meu pai, respeitosamente se inclinava à sua autoridade. Ocorreu-me, após estas reflexões, que meu avô não abusava de sua autoridade, porque ela lhe era tão natural quanto os ternos que ele raramente dispensava. Uma das palavras para descrevê-lo sucintamente seria “sistemático”. Lembrei-me das perguntas desconcertantes que Nhô Quim lançava assim do nada, como que para testar nossa perspicácia e atenção:

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- Qual é a diferença entre o universo e o infinito? E eu ficava, em minha mente de criança, a matutar a difícil questão, enquanto acentuava-me aquele sentimento de fragilidade e incapacidade diante de sua enorme sabedoria e inteligência. - Uma se refere às coisas materiais e a outra as coisas subjetivas. Ele mesmo respondia, após um tempo que considerasse suficiente para que eu resolvesse a questão. Quando alguém tomava conhecimento de que eu era seu neto a reação da pessoa era tal, que me causava ao mesmo tempo, sentimentos conflitantes de orgulho e menos valia. Meu avô era tão considerado e admirado, que fazia com que eu me sentisse inibido diante da sua gigantesca figura. De certa feita, conversava com o inesquecível e polêmico Alfredo Valadares, conhecido pela forma às vezes, mordaz e irônica de se expressar, quando lhe disse que era neto de Nhô Quim. O Alfredo olhou para mim diretamente e confirmou: - Você é neto de Nhô Quim? - Sou. (respondi orgulhoso). E o Alfredo retrucou: - Você nunca vai chegar a uma unha do pé do seu avô. Tomei um susto porque senti naquelas palavras um prognostico preconceituoso e ofensivo. Respondi apenas que provavelmente não, mas que tentaria.

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Só mais tarde, conhecendo a biografia do meu avô, entendi que era a forma de Alfredo Valadares prestigiá-lo e homenageá-lo. Hoje sei que continuarei na tentativa, não de competir com ele ou querer ser mais, nunca tive esta pretensão, mas de continuar tanto quanto possível sua obra em favor da grandeza e da dignidade do ser humano. Ainda no grupo escolar eu era encarregado pelas professoras, de cumprir o intermédio entre meus colegas e meu avô em pesquisas sobre a história da cidade. Ele sempre nos recebia de forma gentil e atenciosa, respondendo as questões oferecidas e ampliando-as de acordo com seu espírito educador e idealista. Olhando hoje seu retrato na parede do Casarão ou do Clube de Letras, não me sinto mais acuado em minhas expectativas pessoais, e nem sinto no seu olhar aquela reprimenda que me assombrou, em meus percalços e tropeços pela vida. Sinto que Nhô Quim sorri para mim e sopra através das dimensões seu doce alento e aprovação. Concede-me ainda, por uma talvez ironia do destino seu sodalício patronal, nesta cadeira de numero nove da Academia de Letras de Sete Lagoas, em defesa dos valores mais nobres e humanos que as letras podem nos oferecer. João Drummond

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Joaquim Dias Drummond Nhô Quim IN MEMORIAM João Antonio Drummond Amaziles Rosalina Viana Drummond

Nhô Quim Drummond e Família

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Sete Lagoas, 24 de Dezembro de 1966 Aos meus filhos, Roberto – Marcos – Magda – Maria Auxiliadora – Silvia – Marcelo – Maria José e Maria Lúcia. Comemorando hoje, o 23º aniversário do passamento de minha estremecida mãe, entrego-lhes este modesto trabalho de reconstituição de vida de meus pais, da qual participei em quase todos os seus lances. Não se trata de uma produção literária, pois para tanto seria preciso que me sobrassem conhecimentos mais amplos da língua nacional, o que infelizmente não me permitiu Deus que os alcançasse. Considero o meu trabalho como um simples relato da existência daqueles que me deram o ser, cuja memória, procuro honrar na prática de todos os atos de minha vida. Nele extravasei toda a sensibilidade de minha alma. Para outros, acredito, não terá nenhum valor. Mas, para vocês, em cujas veias corre o mesmo sangue dos que me precederam em sua jornada por este mundo, existirá sempre algo para despertar as suas reflexões e os conduzir por caminho mais seguro. Para tanto, basta que saibam amar e perdoar.

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Abraçando afetuosamente a todos vocês, creiam que me envaideço dos filhos que Deus se dignou premiar a minha vida de lutas e de sacrifícios. Cordialmente, Joaquim Dias Drummond

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Capitulo I O hotel de Sá Ninha da Lapa constituía a única hospedaria de Sete Lagoas no fim do século passado. Em 1887, sem que um soubesse dos objetivos dos outros, reuniram-se em torno de uma mesa, à hora do café matinal, os viajantes João Antonio Drummond, Fernando Olímpio Drummond e Hermelindo Pinto. Conversavam banalidades; muito natural entre jovens mais ou menos da mesma idade e, sobretudo, quando exercem atividades similares. À porta do hotel, cabrestos presos as estacas, três animais de sela, cujos donos, após o café, cavalgariam e tomariam destinos diferentes. Isto, pelo menos, era o que deveria estar passando pelo pensamento de cada um deles. Concluída a ligeira refeição da manhã, troca de cordiais despedidas e os clássicos votos de bons negócios, com pequeno intervalo, cada qual tomou a sua montaria e saíram da cidade. Aconteceu porem, que o objetivo de um era o de todos, embora o ignorassem: - rumo a Fazenda da Pontinha. Para despistar, cavalgaram em direções diversas. O acaso, entretanto, os surpreendeu na encosta do “Rola Pedras”. Detida a marcha, durante o bate-papo que se seguiu, chegaram à conclusão de que o mesmo intento os animava – pedir casamento a uma das netas do Cel. Joaquim Gomes de Freitas Drummond.

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Uma dúvida pairava no espírito de cada um: - quais seriam as respectivas candidatas? Quando descobriram que a preferida era uma só, deram boas gargalhadas e, como bons camaradas que eram, aceleraram a marcha de suas cavalgaduras. Até gozavam o desfecho do caso que os reunira, assumindo o compromisso de que, qualquer que ele fosse jamais se alteraria suas relações de colegas, de bons amigos, enfim. Na varanda da fazenda, de pé, o Cel. Joaquim Gomes saboreava seu clássico cigarro de palha, soltando baforadas que embaçavam as lentes dos seus óculos. Os três cavaleiros que se aproximavam, agora em marcha lenta, o surpreenderam com aquela visita matinal. Recebidos com a cortesia tradicional da casa, foram introduzidos no salão principal, de cujas paredes pendiam velhos retratos de família, testemunhas mudas de vários acontecimentos. Para inicio de conversa, trocaram banalidades sobre o estado de saúde das respectivas famílias, previsões do tempo para a lavoura, intensificação do comercio de tropas, etc. Um silêncio um tanto prolongado seguiu-se a conversação preliminar. Ao Cel. Drummond coube rompê-lo, perguntando-lhes de chofre: - Afinal, a que devo a honra dessa visita coletiva?

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Não tiveram outro remédio, senão “por cartas na mesa”, para dizerem quase ao mesmo tempo: - Cel. Nós temos a honra de pedir em casamento sua neta Amaziles! O Cel. Joaquim Gomes sorriu, discretamente, pelo inédito daquela cena e, logo depois, assumindo atitude muito séria, disse-lhes: - A honra é toda nossa e como se trata de três pretendentes para uma só candidata, reunirei imediatamente o conselho de família. O que for decidido terá o meu apoio, uma vez que entre os senhores eu não faço distinção. São todos dignos de nossa amizade e merecedores do meu particular apreço. Com um pedido de licença, retirou-se para o interior do sobrado. À sós na austera sala de recepções do velho solar, os três pretendentes divagavam, percorrendo com as vistas os velhos retratos de família, detendo-se em observações mais demoradas, no do Cel. Joaquim Gomes, de barbas brancas, bem cuidadas. Austero como chefe respeitável de numerosa família, ele sabia aliar a severidade do seu perfil a amenidade de um trato cavalheiresco e inata fidalguia. A ele caberia a ultima palavra sobre o assunto. O tempo passava e o silencio era perturbado apenas pelas conjecturas trocadas em surdina, entre os candidatos impacientes. Foi neste momento que o Antero, jovem escravo, da confiança do coronel, entrou na sala com grande bandeja, servindo-lhes um cafezinho reanimador.

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A rubiácea deu-lhes novo alento e a conversa se generalizou. Notava-se, entretanto, certo nervosismo, por que não dizer impaciência. Ouviam-se vozes conciliatórias no interior da casa grande e de passos que se aproximavam. A porta do corredor abriu-se de par a par e o coronel, a frente das figuras mais velhas da família, entrou solenemente na sala. Os jovens pretendentes a um noivado que só decidiria a sorte de um, levantaram-se cortesmente, curvando-se respeitosamente, em retribuição aos cumprimentos dos que acompanhavam o coronel. Composto o grupo portador da mensagem, o coronel falou pausadamente e com certa gravidade: - João Drummond, seu pedido foi o aceito; considere-se noivo de minha neta Amaziles. Meu pai quebrou a circunspecção do cerimonial, dando um pulo insopitado de alegria. Abraços cordiais, apertos de mãos, os cumprimentos dos preteridos, selaram definitivamente o noivado de meu pai e de Amaziles. Meu pai, ansioso por beijar a mão de sua jovem noiva, com a devida licença do coronel, transpôs a porta do corredor e foi recebido por minha mãe, num transporte de júbilo irreprimível. Hermelindo Pinto e Fernando Olímpio, (irmão de meu pai), portaram-se, ante o desfecho, como autênticos cavalheiros.

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Não obstante, fizeram menção de se retirar, ao que se opôs o coronel, insistindo para que participassem do almoço que dentro em pouco seria servido. E foi nesse ambiente de confraternização, entre familiares e amigos, que se marcou o destino de dois jovens da mesma estirpe, para os quais o futuro reservaria muitas vicissitudes e poucos momentos de satisfação, durante a sua trajetória de lutas e de supremos sacrifícios.

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Capitulo II Oficializado o noivado de meu pai, ele refletiu que não poderia continuar a exercer a sua profissão de caixeiro viajante. Seria sacrificar a mocidade de dois jovens que se amavam, privando-os de uma convivência intima tão ardentemente sonhada. Uma resolução se impunha imediatamente, uma vez que não lhes faltavam recursos para tentar novo meio de vida. Daí, o fazer-se comerciante, foi decisão de poucos momentos. Estabeleceu-se com casa de comercio generalizado, a Praça Tiradentes, tendo como auxiliares os jovens Armando Belizário Filho e Tito Vaz de Melo. De gênio expansivo, o novo comerciante assimilou-se tão rapidamente ao meio que a sua casa popularizou-se, tornando-se a preferida da cidade. Os batuques ainda constituíam complementos indispensáveis mesmo nos bailes familiares e o sucesso do novo estabelecimento era glosado em trovas espirituosas. João Drummond participava da euforia do povo e recebia bem humorado os improvisos com que eram decantados os seus sucessos. Transmitidas pela tradição, ainda conservo de memória as seguintes trovas:

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“João Drummond Abriu fartura Cachaça barata E rapadura.” “João Drummond Está no quente Caçamba de prata E selim patente.” Observa-se que pela predominância do nome de meu pai a sua popularidade advinha mais da influência de sua atuação nos meios sociais. Espírito comunicativo, verve esfuziante, mão aberta, sempre pronto a servir aos amigos, sua roda era uma constante de bom humor. A tristeza não morava em sua companhia. Esse sistema de vida, fruto de sua própria formação, acabaria certamente prejudicando seus negócios comerciais, a essa altura pouco assistido por seu zelo. Os empregados tinham carta branca, investidos da mais absoluta confiança. Contudo, parecia que as coisas corriam bem. Foi aureolado por esse ambiente de festas que, em primeiro de outubro de 1887, recebia em casamento sua prima Amaziles, no mesmo salão que servira de cenário ao seu pedido matrimonial. Todo o cerimonial decorreu em meio de expansão comedida, respeitando a tradição com que a família Drummond marcava esses acontecimentos.

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O sacramento do matrimonio era ato de sublimação e como tal fora praticado. Retornando à cidade, o jovem casal integrava-se na sociedade sete-lagoana para inicio de uma vida, que todos prognosticavam de plena felicidade. Tudo fazia crer que nenhum imprevisto viesse perturbar a serenidade de um lar, formado sob as bênçãos de Deus e os melhores augúrios de toda a família. Mas, há sempre um mas no final de toda a história. A vida de João Drummond não poderia fugir a essa regra. Ele pagaria pelo seu pecado de omissão, relativamente a sua casa comercial. Os recém-casados viveram em plena lua de mel durante os sete anos que decorreram após o casamento. Fernando, João, Joaquim e José foram os filhos que vieram coroar a sua missão de procriar. Contemplavam embevecidos os frutos do seu grande amor, alheios a borrasca que se aproximava. A sabedoria popular ensina que “o olho do dono é que engorda o porco”. Meu pai não soube engordar o seu... Acabou quebrando! Naquela época não, era conhecida ainda a formalidade de uma concordata e mesmo o processo de falência. Tratou de fechar as portas, vender o estoque que restava e até a própria casa que construíra, esta para o Cel. Teófilo Marques que, anos depois, comprava também a Fazenda da Pontinha. Era a derrocada do valioso patrimônio de uma família que não sabia lesar o próximo.

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Capitulo III Liquidados todos os compromissos da firma, desarvorado pelo insucesso de sua tentativa, meu pai recolhe-se com a família na Fazenda da Pontinha, até que baixasse a maré montante. Foi ali que a “mosca azul” veio zumbir em seus ouvidos e os animou a recorrer ao Espírito Santo. Sim, ao Estado do Espírito Santo. O sucesso alcançado por João Antonio de Freitas Carvalho Drummond – tio de minha mãe, no Estado capixaba, constituía num argumento convincente. Para la seguira bem novo ainda, e conquistara posição destacada, no comercio de café, praticado em alta escala. Era senhor de grandes recursos, proprietário de dois engenhos para o beneficiamento do produto, luxuosa casa residencial, vários prédios, boas pastagens, numerosos lotes de burros de carga, indispensáveis ao seu comercio, e de um grande armazém de artigos generalizados. Com tanto cabedal, fácil lhe fora conquistar o predomínio político do município de Rio Novo. Os grandes do Estado hospedavam-se em sua residência, quando então se abriam seus luxuosos salões de festas, ricamente mobiliados. Ao fundo do principal, artístico painel da proclamação da Republica, e nas paredes laterais, grandes retratos dos fundadores do novo regime.

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Três conjuntos de cadeiras austríacas, compostos de um sofá, duas poltronas, doze cadeiras, dispostas simetricamente; piano de alta classe, harmônio, consolos com tampos de mármore, encimados por conchas e caramujos de variada coloração, tapetes enormes, cortinas rendadas, lampiões belgas em finas arandelas de cristal, completava a harmonia das instalações exigidas para as grandes mansões daquela época. O tio João Antonio não tinha filhos e a mulher, dos Alves de Souza, de tradicional família mineira, dispunha de uma invulgar capacidade de ação. O cérebro pensante do velho Drummond tinha na mulher, na tia Sinhá, como era conhecida, a executora fiel de seus planos. Dona Maria Drummond era uma mulher forte, e marcante personalidade. Resolvia, sem o concurso material do marido, os mais intrincados problemas que surgissem na sua afanosa lida comercial. Coisa singular: - em suas andanças, a cavalo, supervisionando os negócios do casal, não prescindia de um bom revolver. Sabia atirar bem, sem, contudo, ter sido preciso usá-lo contra um seu semelhante. Tinha em José Belizário, irmão de minha mãe, e em Lincoln Drummond, ambos sobrinhos do velho João Antonio, seus mais dedicados auxiliares. O tio Juca, dirigindo os grandes armazéns da firma, e Lincoln, ocupado exclusivamente com o intenso comércio de café.

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Foi conhecendo a prosperidade dos Drummond, no Estado capixaba, através das correspondências recebidas pelo velho da Pontinha, o que levou meu pai a resolução de também ir tentar a vida fora de Minas Gerais. Estava lançada a sorte.

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Capitulo IV Data de 1894 a saída da família de meu pai da velha Fazenda da Pontinha, com destino a Rio Novo, no Estado do Espírito Santo. No dia da partida os moradores da casa grande despertaram mais cedo, fora do horário habitual. No pátio fronteiriço cruzavam-se os serviçais no apresto da liteira, velho sistema de transporte ainda em uso, e dos animais de sela que nos transportariam até a estação de Rio das Velhas, na histórica Santa Luzia, ponto final da nossa primeira jornada. A estrada de Ferro Central do Brasil paralisara ali a sua avançada para os sertões de Minas Gerais. Todos se ocupavam com os arranjos finais, de modo que nada faltasse aos que iam empreender a grande viagem. Meu bisavô, o Cel. Joaquim Gomes de Freitas Drummond, com seu espírito bem formado, a tudo assistia e orientava, com natural serenidade. Sua fisionomia não demonstrava seu doloroso estado d’alma. A partida da neta que embalara desde seu nascimento e que, com poucos meses, ficara órfã de pai não podia deixar de magoá-lo profundamente, embora a visse ligada pelo matrimônio, a um primo em que depositava toda confiança. Afinal, nas veias de ambos corria o mesmo sangue e ele sabia do quanto eram capazes os homens da sua estirpe. Tudo pronto, os viajantes desceram ao pátio, acompanhados por todos da casa grande.

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Os escravos, sempre tratados com dignidade cristã, alinharam-se, respeitosamente, para o ultimo adeus à Sinhazinha. Sucederam-se os abraços prolongados; era o momento da despedida. Lágrimas silenciosas rolaram pelo rosto de muitos, estancadas a custo por lenços umedecidos que se puseram a acenar até que os viajores se perdessem na curva do caminho. Na liteira, minha mãe aconchegava ao colo o caçula da família – o Juquita, enquanto, com os olhos marejados, observava a acomodação dos outros filhos, assentados em travesseiros, a frente das montarias. Traziam as cabeças protegidas por toucas de abas largas, distendidas na frente por barbatanas. Na liteira, ao lado de minha mãe, vovó Lilia animava com a sua presença a filha que empreendia uma viagem, em busca do desconhecido. Nenhuma palavra, nenhum gesto traia seus pensamentos. Conformada com o destino que a separava de seu velho pai, tão carinhoso, tão amigo, limitava-se a sorrir discretamente para a filha que desejava ver plenamente feliz. A viagem decorria normalmente e, ao termino do segundo dia éramos acolhidos bondosamente, na hospedaria do velho Adão, a primeira casa instalada nas proximidades da estação de Rio das Velhas. Tudo muito discreto, muito simples, mas de apurado asseio. No dia seguinte, enquanto embarcávamos pela primeira vez em um vagão de estrada de ferro, retornava

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à Fazenda da Pontinha, a caravana que nos conduzira até ali. Agora, tínhamos como meta o Rio de Janeiro, capital de uma Republica ainda criança, em reiteradas tentativas de consolidação. Só se falava no novo regime, decantado em prosa e versos pelos jovens republicanos que o fundaram. No hotel em que nos hospedamos no Rio de Janeiro, meu pai mantinha-se discreto, como convinha aos que pisam pela vez primeira em terra alheia. Em palestra com o hoteleiro sobre a viagem marítima que íamos empreender, foi informado de que o vapor Santa Madilde, navio costeiro que nos levaria até a barra do Itapemirim, saíra na véspera do estaleiro em que fora submetido a consertos de relativa importância. Um tanto preocupado com esta noticia, meu pai mesmo assim, não desistiu da viagem, e embarcamos no dia seguinte. O navio de pequeno porte estaria sujeito a fúria das ondas, o que realmente se verificou. O mar brincava com o barco balouçando-o na superfície de suas ondas. O enjôo generalizou-se e quase todos chegaram aos vômitos convulsivos. Um mal estar indefinido. Contudo, chegamos são e salvos ao pequeno porto capixaba. Nota curiosa: no seu regresso, o Santa Matilde naufragava nas costas de Cabo Frio, atirado contra os rochedos pela impetuosidade das vagas. Barra do Itapemirim, localidade na zona sul do Estado do Espírito Santo, era porto de mar para barcos de

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pequena cabotagem, para os costeiros que serviam as localidades litorâneas. Estávamos em terra firme e isso nos deu novo alento. Estremunhados, despertamos no dia seguinte, dispostos a reiniciar a jornada, agora demandando o seu ponto final; O Rio Novo! A nossa chegada nesse município, em que o cel. João Antonio Carvalho de Freitas Drummond dava cartas, foi um acontecimento. Festivamente recebidas pela já numerosa colônia mineira e, sobretudo sete-lagoana, fomos hospedados em casa do tio João Drummond que nos oferecia o máximo de conforto. A recuperação da estafa a que fomos submetidos, foi obra de poucos dias. A casa que no fora reservada, era um velho sobradinho, estilo colonial, na saída do povoado, a beira de estrada que seguia para a fazenda de Ritinha Nogueira, outra mineira ali radicada, atraída talvez pela conquista de fortuna fácil. Ali passamos os primeiros meses de nossa vida, no pequeno Estado do Espírito Santo que surgia para os mineiros como uma nova Canaã. Meu pai auxiliava o tio Juca no escritório da firma do Cel. João Drummond e, na proporção que o tempo passava, adquiria maiores conhecimentos do comercio do café, revelando-se um perfeito conhecedor de suas novas funções. Minha mãe que partira de Minas nos primeiros meses de gravidez de seu quinto filho vira-o nascer nas plagas

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capixabas e dera-lhe o nome de Otávio. Viveu poucos meses. Era o tributo pago a terra que nos acolhera. Rodeio, vila nas proximidades de Rio Novo prosperava. À frente do seu alto comercio pontificava outro mineiro de fibra, o outro irmão de minha mãe, ainda solteiro. Não tardou que a ajuda de meu pai fosse reclamada para a direção do seu escritório, o que não foi difícil, dadas as boas relações mantidas pela firma, com a do cel. Drummond. Carlos Gentil Homem era de Matozinhos e já se considerava um autentico capixaba. Para lá se transportou minha família e fomos alojados em casa alegre, edificada em terreno plano, com boa visão sobre o conjunto de moradas que formavam o povoado. Vivemos ali muitos meses, morando o tio Quincas em nossa companhia. Aí nasceu o sexto filho de minha mãe, como conseqüência de uma queda que ela levara ao lavar roupas as margens do ribeirão, A criança nasceu morta, e as conseqüências de um parto prematuro preocuparam toda a família. Vovó Lilia, de uma dedicação sem limites, desde que deixamos o território mineiro, se deslocou imediatamente do Rio Novo onde se achava par assumir o controle da casa. De um acontecimento singular, registrado no rodeio, guardo ainda bem nítida recordação. Em um dia claro, uma nuvem negra e muito baixa, toldou por momentos a luz do sol. O fenômeno foi notado quando se verificaram correrias pelas ruas e os gritos angustiosos das primeiras vítimas.

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Era um enxame de maribondos de desproporcional extensão. Uma colona italiana, já bem velhinha, não teve pernas para fugir e caiu em plena rua, aos gritos alucinantes de “traditore”, “traditore”. Quando as portas e janelas se abriram, os mais corajosos procuraram socorrê-la. Estava morta!

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Capitulo V Iconha, vilarejo de aparência pouco agradável, jogava as cristas com as localidades circunvizinhas, disputando a supremacia no comercio de café, na zona sul, a essa altura pontilhada de colonização estrangeira, bem mais numerosa, em que predominavam os alemães e os italianos. A cultura do café absorvia todas as atividades dessa gente laboriosa, infiltrada no meio brasileiro, a cujos costumes se adaptavam facilmente, sem o mínimo preconceito racial. Eram comuns os casamentos de caboclos brasileiros com as mais belas filhas da Itália ou mesmo com algumas louras tedescas, estas menos impetuosas que aquelas. A latina neste mister ocupa lugar destacado no concerto universal. A firma Duarte Beiritz & Cia liderava todo o comércio de Iconha, estendendo seus tentáculos por outras praças que se lhe afigurassem promissoras. Uma proposta vantajosa de seus chefes, fez com que meu pai se desligasse da firma Carlos Gentil Homem e se transferisse com a família para nova localidade, seu terceiro pouso em terras capixabas. Iconha era um lugar de poucas atrações paisagísticas. A casa que nos fora destinada, localizada a margem do ribeirão que dava nome ao vilarejo, não impressionava bem.

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Pouco arejada e constantemente ameaçada pelas enchentes no inverno. O ribeirão de águas turvas corria preguiçosamente em seu leito sem declive, quase oculto pelos ramos de mangue ou das mutambas. Era em resumo, um foco de endemias que sacrificava muitos dos que dele se aproximavam. Não poderíamos fugir a regra. Também pagamos o nosso tributo, com a invasão da terrível malaria que não poupou ninguém. Sem medico, sem uma farmácia sequer, naturalmente pereceríamos, se não viesse nos assistir, o tio Juca que de Rio Novo, acorreu pressuroso, com os medicamentos adequados. Singular criatura esse irmão de minha mãe. Para todos os problemas da família, ele procurava e encontrava solução. Parecia um predestinado. Impaludados, gradativamente fomos recuperando a saúde, graças em grande parte a dedicação dessa alma. Meu pai fazia carreira progressiva e dia a dia, mais se impunha a confiança de seus chefes. Após este acontecimento que acabaria por marcar a nossa passagem por Iconha, vivíamos relativamente felizes, apesar de minha mãe sentir-se esgotada com esses contratempos e com as nossas sucessivas mudanças. Mas não tínhamos chegado ao fim ainda. Interesses da firma Duarte Beiriz&Cia reclamavam a presença de um dos seus chefes, ou de outra pessoa de sua absoluta confiança a frente dos grandes armazéns da empresa, na localidade de Piuma, porto de mar para a navegação de pequena cabotagem.

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Era por ele que se escoava toda a safra acumulada nos trapiches. Meu pai foi designado para essa missão e para lá seguimos incontinentes. Seria o nosso quarto posto de parada, mas não seria o ultimo. O destino tem desses caprichos e não adianta enfrentá-los com espírito de revolta. Estávamos finalmente instalados em Piuma, comendo peixes quase todos os dias, em sua maior parte gentilmente oferecidos pelos pescadores que afrontavam os mistérios do Oceano, sem temer as suas emboscadas. Habituamo-nos aos banhos de mar, o que fazíamos sempre pela manhã, de mãos dadas com os nossos pais para que não surpreendessem as ondas traiçoeiras.

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Capitulo VI Foi nessa época que fomos surpreendidos com a visita inesperada de Napoleão Bonaparte, cunhado de meu pai que saíra de Itabira do Mato Dentro, para enfrentar a sorte, como nós outros, nas plagas capixabas. Algo de anormal preocupava o seu espírito, o que foi notado por meu pai, sem, contudo ousar perguntar-lhe o motivo. A delicadeza de sentimentos que uniam um ao outro, impedia que se desvendasse o mistério, que fazia de Napoleão um homem taciturno. Raramente esboçava um sorriso e quando o fazia, seu rosto se contraia como à querer censurar uma expansão incompatível com sua própria dor. Depois de vários dias em nossa companhia, insistiu com meu pai para que o acompanhasse em um passeio a Vitoria, a pequenina e graciosa capital do Espírito Santo. Desejava distrair o espírito e trocar idéias sobre o plano que tinha em mente. Pretendia radicar-se no Estado e contava com o concurso do cunhado, do amigo. Meu pai anuiu em fazer-lhe a vontade, contanto que minha mãe o acompanhasse, pois não desejava separar-se da esposa, mesmo por poucos dias. A observação, Napoleão acrescentou: - Levemos também o Joaquim. Sobrinho que lhe merecia particular simpatia. Tudo combinado tomamos fora da barra um luxuoso navio de

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passageiros, para o qual fomos transportados em pequeno bote a remos. De passagem, divisamos de bordo as pitorescas localidades de Guarapari e Beneventes, esta hoje rebatizada com o nome de Anchieta, por ter sido o cenário da atuação do notável jesuíta, tão estreitamente ligado a nossa história. Vitoria com seu casario branco subindo morros, deu-nos a impressão de um grande presépio, encimado pelo velho convento de São Francisco, que era motivo de uma de nossas visitas. Um acidente com meu pai, ao galgar sua balaustrada, privou-nos dos passeios projetados, inclusive ao célebre convento da Penha, em Vila Velha. O Hotel em que nos hospedamos, distava poucos metros do porto, o que nos permitia boa distração, acompanhando a entrada e saída de vapores, sem sair de casa. Os hospedes superlotavam quase todas as suas dependências, e os grupos se formavam a cada passo discutindo assuntos vários. O tio Napoleão e meu pai integravam um desses. Discutiam as possibilidades econômicas da capital e de outros centros de produção, em franco desenvolvimento. Colatina, pequeno núcleo que surgira às margens do Rio Doce, apresentava-se como o de maior possibilidade para a inversão de capitais. Ao tio Napoleão que fizera aquele passeio com um plano preconcebido, tais conclusões foram suficientes para que se firmasse o seu intento.

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Recolhido ao seu aposento particular trancou-se com meu pai, para uma dolorosa confidência que ainda não fizera. Entre ele e a sua esposa, a tia Fernandina, surgira um incidente inesperado, que o compelira envergonhado, a abandonar a família, a sair de Itabira. E a narrativa dos acontecimentos foi feita com minúcias, entre lágrimas silenciosas de ambos, que se estreitaram em comovido abraço. A esse encontro confidencial seguiu-se prolongado silencio, interrompido por meu pai apenas com uma palavra: - lamentável! Contudo restava-lhe o consolo intimo – não fora por deslize de sua irmã que semelhante desinteligência se consumasse Apenas seu excessivo ciúme, por julgar-se preterida por outra mulher que, segundo supunha, conquistara o seu marido. Estava desfeita uma prolongada união conjugal e com os filhos do casal, em plena juventude, sem a assistência do pai que os idolatrava. Napoleão tinha decidido: - De Vitória seguiria para Colatina, estabelecendo-se naquela praça com uma casa comercial. Antes, porem, conseguiu a anuência de meu pai, de acompanhá-lo nesta aventura, em que se jogava seu próprio destino. Seu estado de espírito inspirava cuidados e daí a resolução de meu pai de assisti-lo como amigo certo, na expectativa de que tudo corresse bem e novamente

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unido o casal, fora do cenário dos acontecimentos que motivaram a separação. Regressando a Piuma, meu pai deu ciência a seus chefes da sua resolução, comprometendo-se a desligar-se da firma, depois do balanço que ainda demoraria alguns meses. Consumado este, voltamos a Rodeio, de onde iniciaríamos, a cavalo, a nossa grande viagem pelo interior do Estado, rumo a Colatina. Carlos Gentil Homem, de quem meu pai fora auxiliar e amigo desde então, aprestou-se no sentido de organizar a cavalhada que nos transportasse, através de estradas batidas apenas pelas tropas cargueiras. O percurso seria longo e as localidades de pouso distanciavam muito umas das outras. De Minas meu pai havia levado dois camaradas de absoluta confiança que continuavam em nossa companhia: Américo, filho de Maria Geralda, jovem de compleição robusta, e Raimundo, filho da velha escrava Tatá, tratado intimamente por Negro. Eram paus para toda obra. Organizada a caravana, iniciamos a penosa viagem, atravessando vales e florestas, viagem por vezes interrompida pelas quedas de arvores sobre o caminho, obrigando os camaradas a empregarem a foice ou o facão para que pudéssemos prosseguir. Com pernoite nas localidades de Santa Isabel, Santa Tereza, Cachoeiro de Santa Leopoldina, Braço do Sul (hoje Ciqueira Campos), chegamos ao penúltimo pouso da nossa jornada. Daí até Colatina seria a nossa ultima arrancada.

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Em Braço do Sul, lugar onde nos detivemos por mais tempo, a fim de que os animais se refizessem, o Américo, até então insensível aos apelos da mocidade, toma-se de amores por uma jovem e bela alemã, filha do estalajadeiro que nos hospedara. Não houve santo que o desalojasse dali. Despediu-se de nós chorando como uma criança, e acabou casando-se com a linda loura tedesca. Até hoje deve estar lá. A última carta que dele recebemos, datada de muitos anos, nos dá a noticia de sua prosperidade, da sua felicidade conjugal. Pesarosos, por nos separamos de um bom amigo, de um fiel companheiro, iniciamos a ultima etapa da nossa arrancada para as barrancas do Rio Doce, deixando nas terras férteis do Espírito Santo um exemplar sadio da estirpe cabocla de Minas Gerais. Vovó Lilia, levando em sua companhia o Fernando, meu irmão mais velho, de Rodeio, onde nos separamos, regressou a Rio Novo e daí ao Estado de Minas Gerais, acompanhada pelo tio Quincas que vinha a Sete Lagoas, a fim de realizar o seu casamento. Ao fim do quinto dia de uma viagem estafante e cheia de peripécias, chegamos finalmente a Colatina, recebidos com manifestações de alegria por parte do tio Napoleão e de seus amigos. Estávamos por fim em casa e dispostos a participar da aventura em que se metera o cunhado de meu pai.

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Capitulo VII Colatina era um povoado que nascia à margem direita do caudaloso Rio doce e se resumia a um aglomerado de pouco mais de cinqüenta casas, em sua maioria dando fundos para a ribanceira. As poucas que ficavam do lado oposto tinham seus quintais embargados pela densidade da mata virgem que projetava sobre o povoado, sombras sinistras. A noite era comum ouvirem-se os rugidos das feras que a infestavam, não raro invadindo chiqueiros e galinheiros para devastarem as criações. À margem esquerda do rio, localizavam-se as tribos dos Puris, em suas malocas características. Quase todos já domesticados, vinham sempre ao arraial em suas ligeiras pirogas, para a troca do que já produziam, por fumo de rolo, sal e cachaça. Traziam chapéus de palha, esteiras, peneiras e até mesmo arcos e flechas e outros utensílios da tribo. Viviam em constante preocupação com os índios Tapuios, tribo aguerrida que vivia bem distante do seu aldeamento, mas afeita aos ataques de surpresa. Temiam a possibilidade de suas investidas. Colatina não dispunha de uma capela para o culto, não tinha medico e nem mesmo uma farmácia. O curandeirismo é que resolvia os problemas de saúde publica. De escola nem se fala, A população crescia à lei da natureza, diferindo pouco dos hábitos nativos. Ali

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venceria o que fosse mais forte, ou o que pudesse realizar alguma coisa na base da persuasão, com o sentimento de amor ao próximo. Napoleão estabelecera-se na localidade com essa intenção. Sua casa comercial, localizada eqüidistante dos dois únicos concorrentes ali existentes, atraia gente de todas as classes. Ribeirinhos, indígenas, colonos e fazendeiros, em pouco tempo dela se aproximaram e se fizeram bons fregueses. Com o senhor Pena; português de nascimento há muito ali estabelecido, foi fácil manter boas relações. Tornaram-se bons amigos. O mesmo, entretanto, não se verificou com relação ao senhor Nogueira, o comerciante mais antigo da praça e, sobretudo, o chefe político local. O Nogueira, por ter uma das mãos atrofiadas, era mais conhecido pela alcunha de Munheca, o que não lhe agradava e, por isso mesmo, revelada aos forasteiros com severas reservas. A rivalidade entre o pequeno régulo e meu tio esboçou-se desde logo, com a iniciativa de Napoleão de mandar construir à custa própria, o cemitério da localidade. Até então, os mortos eram sepultados no sopé das matas, em terreno aberto, como seres irracionais. Não raro os corpos eram profanados por animais carnívoros que os desenterravam, deixando expostos sobre a terra os restos de seus macabros banquetes. Foi contra esse estado de degradação social que se insurgiu meu tio, levando-o aquele gesto de

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benemerência. O cemitério estava pronto e os mortos seriam respeitados. O Nogueira irritou-se com tais providências, irritação que se agravava dia a dia, à medida que se estreitavam os laços de amizade entre o senhor Pena e Napoleão. Truculento por natureza, não compreendia o exercício do seu domínio senão por emprego da força bruta. Para tanto mantinha à seu mando, aguerrido magote de pistoleiros, pronto para cumprir-lhe as ordens, ainda mesmo as mais absurdas. Estabeleceu um regime de intimidação, com sucessivas ameaças a meu tio, através de seus sequazes. Nada, porem alterava os planos de Napoleão que continuava impávido na execução de seus projetos. Em Colatina havia escassez de casas e Napoleão resolveu iniciar a construção de algumas para o desafogo da população menos beneficiada. Em terreno próprio, começou a construir três chalés do mesmo tipo, dando serviço a muitos homens que vivam marginalizados. As obras prosseguiam e os trabalhadores recebiam semanalmente seus salários. Havia animação e a ascendência de meu tio sobre aquele povo ensombrava o prestigio do soba prepotente. Os chalés eqüidistantes e rigorosamente alinhados já começavam a receber cobertura. O povo exultava com a vinda de um homem que se propunha a melhorar suas condições de vida.

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Colatina progredia. Ao Nogueira, entretanto, isso o angustiava; não podia continuar impassível ante o seu adversário. Certa manhã, ao chegarem às obras, os trabalhadores constataram que em cada chalé dois esteios haviam sido cortados, em sentido diagonal, sem, contudo desequilibrar as construções que viriam abaixo, apenas se iniciasse a cobertura. Napoleão revoltou-se contra aquele atentado que bem caracterizava a índole de seu autor. Era obra do Nogueira, às caladas da noite. Imediatamente escreveu uma carta enérgica ao truculento régulo, tratando-o por Munheca, protestando contra sua prepotência, exigindo-lhe reparação urgente. Antes não o tivesse feito. Napoleão lavrara com aquela atitude sua própria sentença de morte! A resposta do senhor Nogueira veio dura e seca: - estipulou o prazo para sua saída do povoado, sob pena de fuzilamento por seus homens de confiança, (os pistoleiros), se sua intimação não fosse cumprida à risca. Meus pais ficaram estarrecidos ante aquela ameaça que fatalmente seria cumprida. Napoleão conservou-se calmo, inalterado, não parecia ser um homem que acabava de ser ameaçado de morte. A notícia correu célere pelo povoado e só um amigo, o mais corajoso, acercou-se de meu tio. Pena prontificou-se a prestar-lhe colaboração decidida, no sentido de facilitar sua fuga, embrenhando-se na

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mata com seus homens de confiança, ou descendo rio abaixo, em demanda de povoação de Linhares. As cenas que se seguiram ao impacto que abalou toda a resistência de minha família, foram simplesmente dolorosas. Minha mãe soluçava convulsivamente, abraçada aos três filhos que não sabiam avaliar a gravidade do momento. Meu pai, transfigurado, lívido, vagava atordoado por toda a casa, sem saber ao certo o que fazer. Napoleão fechara-se num mutismo indecifrável, por vezes interrompido para um dialogo surdo com os retratos de suas filhas, Maria de Lourdes e Maidê, já mocinhas, alheias aos acontecimentos que dramatizavam a vida de seu pai. Em tais momentos, lágrimas silenciosas turvavam-lhe a vista, sem que se abatesse o seu perfil de homem obstinado, resoluto. A uma das reiteradas tentativas de meu pai para que ele anuísse aos anseios de seu amigo Pena, - fugir, enquanto havia tempo, ele respondia com firmeza: - Jamais fugirei a luta. Lembre-se que me chamo Napoleão e não posso legar a meus filhos o nome de covarde! A incursão de pistoleiros amiudava-se, aumentando gradativamente o nosso terror. Bem montados e fortemente armados, ostentavam publicamente seu aparato bélico, em correrias desbragadas, levantando nuvens de pó. Meu pai conseguiu de Napoleão que por prudência se fechassem as portas do estabelecimento. Passamos o resto do dia em verdadeiro estado de angustia, buscando

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uma solução, antes que se esgotasse o prazo fatal. Tudo debalde. Napoleão mantinha-se na mesma atitude, não fugiria. A luta que travava no espírito de meu pai era dramática, ou ficava com o cunhado até a hora extrema, ou salvaria a sua família de um trucidamento em massa. Opinou por esta ultima. Estava certo. Antes de nos recolhermos, expôs ao cunhado que não poderia sacrificar sua esposa e filhos; estava decidido a fugir com os seus, antes que o dia amanhecesse. Os dois se defrontaram serenamente. Napoleão compreendera que não podia exigir de meu pai mais do que já lhe tinha dado. Providências imediatas foram tomadas, aprestando apenas o necessário para que nada nos faltasse, até que conseguíssemos nos alojar em pouso seguro, na fazenda do senhor Artur Coutinho em Alvarenga.

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Capitulo VIII Só Deus sabe os momentos que vivemos, após os acontecimentos precedentes, meus pais e Napoleão adentraram-se pela noite em confidências recíprocas, por vezes interrompidas pelas lagrimas que lhes sulcavam as faces. Os menores dormiam, recostados nas trouxas improvisadas para a viagem. Alta madrugada foram despertados. Era a hora da partida. Um silêncio de morte dominava a gravidade do momento. Napoleão, sem dizer uma palavra abraçou, um por um de seus sobrinhos, minha mãe e, finalmente, meu pai, estreitando-o de encontro ao peito, demoradamente, como se preparasse para enfrentar o pelotão de fuzilamento. Era o ultimo abraço! Em plena escuridão, iniciamos a pé a nossa marcha para o desconhecido. Abatidos, aniquilados sob o peso da dor de uma separação, talvez para sempre, caminhávamos em silêncio, temendo um ataque de surpresa, a cada momento, pela horda de cangaceiros às ordens do famigerado déspota Nogueira. À frente seguia meu pai sustendo pela mão o filho mais novo, o Juquita. Eu e o João ladeávamos nossa mãe que, em adiantado estado de gravidez, caminhava com certa dificuldade.

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Por ultimo, Raimundo, o negro de nossa confiança, trazido de Minas, carregando os poucos pertences que não podíamos dispensar. Nota curiosa, o Negro como carinhosamente o tratávamos era bom sanfonista e como tal relacionara-se com facilidade como os colonos da redondeza. Era figura imprescindível nas festas familiares. Depois de caminharmos mais de três quilômetros, dia já amanhecendo, fomos bater à porta de um velho casal de italianos que considerava e acolhia o Negro, sem nenhum preconceito racial. Diziam até que o nosso serviçal entretinha um romance com Assunta, bela filha do simples casal. Foi uma parada providencial. Conhecedores da longa distância que ainda nos separava da fazenda do senhor Arthur Coutinho, os bons italianos aprestaram o único animal de sela que possuíam para a montaria de minha mãe. Reanimados com o ligeiro descanso a que nos submetemos, reiniciamos a nossa dolorosa caminhada, esperançosos de chegarmos ao fim da nossa arrancada, sem maiores contratempos. Acomodada na montaria rústica, com o caçula da família, minha mãe olhava resignada para o marido e os filhos que continuavam a grande jornada. Havia qualquer coisa de bíblico naquele grupo de caminhantes que fugia da morte. Repetia-se, respeitada a irreverência símile, a fuga da Sagrada Família para o Egito.

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A fazenda do senhor Coutinho seria para nós o porto de salvação. Ao cair da tarde, transpúnhamos exaustos, a grande porteira do curral fronteiriço, e éramos humanitariamente acolhidos por seus proprietários. Arthur Coutinho foi para nós o bom samaritano. Nenhum outro adjetivo poderia identificá-lo melhor. Fidalgo no trato, compreensível e amável, revelava nos seus menores gestos, na suavidade de suas palavras, a grandeza de seu coração. Estávamos em casa. Não demoramos a nos recolher ao amplo quarto que nos fora destinado. O cansaço que nos dominava pôs fim à conversação que se generalizava. Meu pai, entretanto, demorou-se em colóquio com o senhor Arthur Coutinho que ficou amplamente informado sobre a nossa situação. O bom fazendeiro colocou-se desde logo à disposição do meu pai, auxiliando-o como verdadeiro amigo, orientando-o em todas as deliberações que a gravidade do momento exigia. Na primeira noite, meus pais não conseguiram conciliar o sono. Dialogavam baixinho e por vezes soluçavam. Nesses momentos, suas preces se dirigiam a Nossa Senhora da Penha, a virgem do Penhasco, a soberana espiritual do Estado do Espírito Santo. Contemplavam os filhos que dormiam, estirados em suas camas improvisadas e confiavam em Deus que jamais lhes faltou nos momentos mais críticos da vida.

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Capitulo IX Na noite imediata, porem, despertamos sobressaltados com os latidos de cães que guardavam a casa. Ouviram o tropel de um cavaleiro que se aproximava da fazenda e ficaram de ouvidos atentos. Ao estacar da marcha do animal, pancadas vigorosas foram vibradas na porta principal, acordando quase todos os moradores. O cavaleiro nem chegou a apear, talvez com medo dos cães que continuavam a ladrar. Foi o senhor Arthur Coutinho que o atendeu. Era um emissário do senhor Pena. Trazia uma carta para meu pai. Não foi preciso que o fazendeiro o chamasse; já tinha aberto a porta do quarto, prevendo o que a mensagem do amigo lhe trazia, O texto era lacônico; dizia simplesmente: - “João Drummond, Napoleão foi fuzilado. Venha com urgência, providenciar o enterro, a fim de evitar mais grave conseqüência. Pena”. Lívido, transfigurado, passou silenciosamente a carta ao senhor Coutinho. Igualmente emocionado, o fazendeiro abraçou-se com meu pai e foi logo dizendo de chofre: -Você não irá sozinho, pois que disponho de homens de confiança para essas delicadas missões, Sairão pela madrugada. Retornando ao quarto, meu pai abraçou-se com minha mãe, apenas articulando convulsivamente estas palavras:

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- Napoleão foi assassinado, eu irei providenciar seu sepultamento. Acordados com a cena que se desdobrava ante nossos olhos, eu e meus irmãos, ainda sem conhecermos o motivo daquela explosão de sentimentos, fizemos causa comum com a dor que oprimia os corações de nossos pais e acabamos por chorar com eles. O quadro era realmente comovedor. O resto da noite foi absorvido pela luta travada entre meu pai e minha mãe. Esta tentando dissuadi-lo do cumprimento de sua missão, por julgar temerária. Seria expor sua vida inutilmente. Aquele inflexível no seu dever de solidariedade humana. Ao corpo do cunhado seria dada sepultura condigna, para que não viesse a ser profanado pelos abutres que lhe tiraram a vida. Acompanhados por dois guarda-costas de confiança, pela madrugada, meu pai se pôs a caminho de Colatina, apesar das ponderações de minha mãe. Na nossa ausência, o bom amigo Pena levou o tio Napoleão para sua companhia, supondo erradamente que sua casa seria respeitada pelos cangaceiros. Pois foi na contra-loja desse comerciante que o tio Napoleão fora fuzilado. Seu corpo estava estendido em decúbito dorsal, no piso do estabelecimento, varado por balas de fuzil. Duas velas alumiavam o cadáver que tinha as roupas coladas pelo excesso de sangue coagulado. Não foi possível mudá-las, apenas um lençol vedava-o à

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curiosidade publica. Na porta da venda, humildes carpinteiros ultimavam o caixão. Meu pai velava o corpo do cunhado, trocando ligeiras palavras com o senhor Pena, sobre as providências que iria tomar, logo que se refizesse do abalo sofrido. Ao bom amigo português confiava a guarda dos bens de Napoleão, até que se resolvessem todos os problemas ligados à firma que se extinguia, em conseqüência do bárbaro trucidamento do seu chefe. Durante o curto velório que precedeu ao sepultamento, pistoleiros, ostensivamente armados, penetraram na contra-loja. Meu pai pôs-se de pé, sem esboçar o menor gesto de repulsa. Não podia atinar o que pretendiam eles. A gravidade do momento aconselhava-o a manter-se com prudência. O chefe do bando aproximou-se do cadáver e o descobriu acintosamente, ultrajando a memória de sua própria vitima com as mais insultuosas expressões. Meu pai não articulou uma só palavra de reprovação. Se o fizesse, fatalmente seria eliminado pela horda assassina, a essa altura disposta aos maiores desatinos pela força do álcool que já a dominava. Finalmente, um deles aproximou-se mais e de chofre perguntou a meu pai: - O senhor consente que acompanhemos o corpo de seu cunhado? Era a gota de fel com que fariam transbordar a taça da amargura.

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Meu pai o encarou serenamente, dando-lhe a seguinte resposta: - Perfeitamente. Seria um ato de caridade. Após estes lamentáveis acontecimentos, os pistoleiros se retiraram, dando expansão ao seu regozijo de feras saciadas. Momentos depois saia o enterro, carregado somente por meu pai, o senhor Pena e dois homens de confiança do senhor Arthur Coutinho. No cemitério construído por Napoleão, ao ser baixado o corpo à sepultura, atenção dos acompanhantes foi despertada por uma cavalgada desenfreada que se estacou em frente a sua entrada. Eram os pistoleiros que se puseram em linha de combate, empunhado suas armas assassinas. Meu pai sentiu que a vista lhe fugia e cambaleou não caindo por ter sido sustido a tempo pelo bom senhor Pena. Imaginou ter chegado sua ultima hora. Refeitos do choque, desceram o corpo à sepultura. Nesse momento, ouviram um alto grito de guerra, seguido pela descarga simultânea das armas dos cangaceiros. Era a ultima homenagem dos facínoras. O abalo sofrido por meu pai foi superior a sua capacidade de emulação. Com o espírito conturbado regressou à fazenda que nos acolhera. Traumatizado pela brutalidade da tragédia, nos primeiros dias vagava a esmo pelos campos, falando sozinho, dialogando com o cunhado morto.

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Minha mãe o acompanhava em tais momentos, carinhosa, compreensiva, temendo que a sua depressão nervosa o levasse a um ato de desatino. E assim decorreram algumas semanas, nessa luta de recuperação de uma consciência, da qual dependíamos nós, esposa e filhos, perdidos em zona malsinada, sem policiamento, ignorada pela justiça dos homens, mas confiantes na de Deus, que jamais nos faltou. Com a ajuda dos senhores, Arthur Coutinho e Pena, meu pai pode, afinal, liquidar de qualquer forma, os negócios da firma de seu cunhado. Quase dois meses decorridos, depois dos trágicos acontecimentos de Colatina, meu pai pode tomar as primeiras providências para o nosso regresso a Rio Novo e daí ao Estado de Minas, mais precisamente, Sete Lagoas. Minha mãe, cada dia mais pesada, em conseqüência de uma gravidez atribulada, temia pela sorte do embrião que se desenvolvia em suas entranhas. Contudo, estava resignada e disposta a enfrentar os contratempos de uma viagem penosa e cheia de imprevistos. Confiava em Deus que fora testemunha de seus sofrimentos, de sua grande provação.

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Capitulo X Ao deixarmos a fazenda do senhor Arthur Coutinho, meu pai externou ao bom fazendeiro, seu profundo reconhecimento por tudo quanto fizera por nós. Despedimo-nos de todos, comovidamente, sem poder conter as lagrimas que sulcavam nossas faces abatidas. A fim de nos acompanhar na viagem de retorno a Rio Novo, foram escalados os mesmos serviçais que acompanharam meu pai e o assistiram, durante o velório do tio Napoleão. Aprestados os animais de sela, em um dia ensolarado, prenunciando tempo estável, deixamos definitivamente o vale do Rio Doce, de tão amargas recordações. Sabíamos que a jornada seria difícil, perigosa mesmo, enquanto não alcançássemos o sul do Estado. Nosso primeiro pouso, já bem afastado do teatro dos acontecimentos, foi o sitio denominado Bertolino Casoti. O colono que o habitava cedeu-nos, desconfiado, uma área do seu pátio para o nosso abarracamento. Passaríamos aquela primeira noite de certo modo expostos aos imprevistos. A barraca não acomodava a todos. Os empregados dormiriam ao relento. Contudo, estreitamente unidos pelo instinto de defesa. Alta noite fomos despertados por tropel de animais que se aproximavam. Ouvimos uma ordem de comando que determinava o cerco, seguida de outra imperativa: - Não se mexam.

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Ao que meu pai respondeu: -somos de paz. À luz de um candeeiro, ambos se entenderam e os do bando se afastaram. Era uma escolta militar do Estado. Ia dar combate aos cangaceiros que fuzilaram Napoleão, homiziados em Baunilha, bem próximo daquele local. Eficiência de policiamento... Enfim, antes tarde do que nunca. No dia imediato prosseguimos pelo mesmo roteiro que nos servira quando da nossa viagem de penetração. Daí, até a meta desejada, o Rio Novo, nenhum sobressalto perturbou a nossa marcha. O nosso reencontro com a família do tio Juca foi algo surpreendente. Não imaginavam que pudéssemos ter escapado com vida, ao cerco dos cangaceiros. A alegria foi geral. O riso se confundia com as lagrimas, numa explosão inesquecível de fraternidade. Comemorava-se a nossa ressurreição! Após uma semana de descanso reparador, meu pai seguia para o Rio de Janeiro, levando cartas de apresentação firmadas pelo tio Juca e pelo velho João Drummond. Tentaria restabelecer a sua vida de caixeiro-viajante, de “cometa”, como era conhecido aquele que exercia tal profissão. Foi feliz no seu intento. Colocou-se como representante comercial das firmas, Barros dos Santos & Cia, à Rua Primeiro de Março, tendo como um dos seus chefes o senhor Afonso Vizeu, que se projetou como líder em sua classe.

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Alem desta, obteve a representação da casa de Paulino Dias Machado, Abílio & Gomes e A. Lameirão & Cia. Viajaria pelo interior de Minas. Não havia tempo a perder. Veio para Sete Lagoas e organizou a sua tropa de viagem, dez animais, entre os de sela e os que conduziriam as canastrinhas de amostras. Como arrieiro e homem de confiança, engajou Lourenço Gomes Drummond, filho natural do velho da Pontinha com a escrava, tia Eva, que ainda vivia como preta de estimação da família Chassim. De Sete Lagoas mesmo iniciou a sua primeira viagem pelo centro de Minas, explicando a minha mãe, por carta, os motivos que o levaram a assim proceder. Durante sua longa ausência de mais de oito meses, minha mãe deu a luz – Maria da Penha, modesta homenagem de reconhecimento à Virgem que se venera em Vila Velha, no histórico convento, do qual domina toda a enseada da Bahia de Vitória. Eu e meus irmãos fomos matriculados na escola primaria regida pelo professor Ozório Viana, outro mineiro, de Cordisburgo, há muito radicado no Rio Novo. Continuávamos morando com o tio Juca, e a tia Quita. Sua mulher, era extremamente dedicada à minha mãe que assim, via o tempo passar suavemente. Nessa ocasião sobreveio-lhe uma inflamação no seio e os sofrimentos físicos só foram debelados com a intervenção cirúrgica, habilmente praticada pelo Dr. Pinheiro.

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Regressando de sua viagem inaugural, meu pai foi a Rio Novo e providenciou a nossa mudança da casa do tio Juca. Fomos morar em uma pequena casa, nas proximidades da residência da Ritinha Nogueira, em plena fazenda, distante mais de um quilometro do povoado. Somente depois da sua segunda viagem, aos sertões de Minas, providenciaria o nosso regresso a Sete Lagoas. Minha mãe conformou-se com a situação. No isolamento a que fôramos confinados pelo vaivém da sorte, minha mãe desdobrava-se em desvelo na criação de Maria da Penha, menina pálida e tristonha, como que marcada pela angustia de sua concepção. Não parecia ser uma menina sadia e isso veio a positivar o nosso pressentimento. Acometida por sucessivos acessos, ficava desmaiada horas a fio, em convulsões prolongadas. Os médicos que a examinaram atribuíam em parte, tais convulsões à existência de vermes intestinais. Outros, porem, acrescentavam que o coração da menina não funcionava regularmente. Contudo sobrevivia e isso consolava o coração de minha mãe. Eu e o João supríamos a casa da lenha necessária, indo buscá-la nas matas da vizinhança, em feixes que excediam a nossa capacidade de resistência. Convivendo com os filhos de Ritinha Nogueira, que se entregavam aos trabalhos árduos da fazenda, nos dispusemos a arrendar uma área de terreno para o cultivo de milho, feijão e mandioca, obtendo resultados compensadores.

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Pela primeira vez empunhávamos uma enxada, para tirarmos da terra um pouco do que precisamos para a nossa alimentação. Apesar da ausência do chefe da família, vivíamos relativamente felizes. E minha mãe controlava as nossas despesas, cozinhando, lavando as nossas roupas e cuidando da casa. Dentro de poucos dias deixaríamos para sempre o Estado do Espírito Santo. A experiência fora difícil, dolorosa mesmo, mas a expectativa de revermos a terra natal, de pisar novamente o solo abençoado de Minas Gerais, compensava tudo quanto havíamos sofrido. Transpúnhamos um capitulo tétrico do livro da vida, sem aniquilar as forças morais que nos compeliam para novos destinos.

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Capitulo XI A mensagem de meu pai abria novas perspectivas para a nossa vida, até então marcada por uma serie de acontecimentos dolorosos. Urgia esquecê-los. Para tanto muito contribuiria o espírito forte de minha mãe. Como esposa, ela compreendia o drama a que fora arrastado o marido e o cumulava de carinhos, sempre dócil, extremamente paciente. Como mãe, ninguém a excedia em zelo pela sorte dos filhos que Deus lhe dera. Ultimadas as providências indispensáveis, a seis de abril de 1902 deixávamos para sempre o Estado do Espírito Santo. Lá, entretanto, permaneceriam as famílias dos irmãos de minha mãe e a do tio João Drummond, todas muito dedicadas e excessivamente boas para conosco. A nossa separação foi realmente emocional. A viagem se processaria a cavalo até São João do Muquy e daí em diante por estrada de ferro. No primeiro dia pernoitamos em Cachoeiro de Itapemirim, no Hotel Toledo, e no dia chegávamos a São João do Muquy, dispensando então a comitiva que até ali nos acompanhara. Na madrugada do terceiro dia embarcamos finalmente em um comboio da estrada de ferro Leopoldina, pernoitando sucessivamente em Murundu, Muriaé e Juiz de Fora, esta já pela Central do Brasil.

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Essa viagem de certo modo nos distraia pela sucessão de quadros diferentes, pela diversidade das paisagens. O sentido, porem, estava preso a Sete Lagoas, a meta ardentemente sonhada. Quando o comboio partiu de Prudente de Morais e o chefe de trem passou por nós gritando: - Sete lagoas! Sete Lagoas! Sentimos que um sangue novo percorria as nossas veias, restituindo-nos a vitalidade amortecida nos ásperos entreveros da vida. A nossa recepção à porta do velho sobradinho da Praça de Santo Antonio, ao espocar dos fogos, em meio às vibrantes manifestações de alegria, foi algo superior as nossas resistências emocionais. As lagrimas se confundiam com as risadas francas, ruidosas, que marcaram o acontecimento. Os menores eram abraçados efusivamente, beijados e transportados de um lugar para outro, como partículas que eram de um todo indivisível, unidas tanto na dor como nos momentos de euforia: a Família Drummond. O espírito do velho da Pontinha, do Cel. Joaquim Gomes de Freitas Drummond, pairava certamente sobre as frontes daquelas criaturas, sangue de seu sangue, fibra da sua própria alma. A alegria fora realmente grande, grande demais para aqueles que viveram tantos anos afastados da civilização, confinados pela força do destino. Mas seria o ponto final dos sofrimentos predestinados à nossa família? O futuro responderia a semelhante interrogação.

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Com a saúde bastante abalada por sucessivos embates, contudo, animado para o prosseguimento de suas lutas, meu pai reiniciou o seu giro comercial. Jequitibá, Pau Grosso, Traíras, Conceição do Serro, marcavam as primeiras etapas de sua viagem de penetração pelos misteriosos sertões de Minas. Alegre, comunicativo, ele sabia fazer amigos por onde passasse. Daí, a conformação da minha mãe. Seria o que Deus quisesse. Decorridos quase dois meses, já em Diamantina, quando atendia a firma Antonio Eulálio, uma das maiores da praça, meu pai, acometido por súbito mal-estar, recolheu-se ao leito e submeteu-se ao tratamento que o seu estado de saúde reclamava. Os médicos que o assistiam julgavam mais prudente que ele não prosseguisse em suas viagens. Usaram-lhe franqueza. O retorno ao seio da sua família deveria processar-se imediatamente. Abatido, ante a revelação da verdade sobre a precariedade de sua resistência física, regressou a Sete Lagoas. Minha mãe notou à primeira vista que seu marido já não era o mesmo. Emagrecera consideravelmente. Pálido, transfigurado, errava pela casa como um autômato, indiferente as preocupações que lhe cercavam. Insone, levantava-se por varias vezes durante a noite para dialogar com o retrato de Napoleão. A fraqueza perturbara-lhe o espírito, reavivando em sua imaginação os episódios do drama vivido em Colatina.

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Durante o seu tratamento, em casa, minha mãe desdobrava-se em atividade, transformada em enfermeira solicita, dedicada e, sobretudo carinhosa. Com pouco mais de um mês, achava-se restabelecido, não para o prosseguimento de suas viagens a cavalo. Escreveu então à firma Barros dos Santos & Cia, expondo a sua situação, pedindo-lhe a vinda de um seu representante para o acerto de contas. Naquela época não existia ainda o regime de contas assinadas, não se emitiam duplicatas. O viajante exercia simultaneamente as funções de vendedor e cobrador. Com a doença gastara bem mais do que já havia ganhado. Amantino Maciel, o enviado da firma que viera para o acerto de contas, era desprovido de qualquer noção de cavalheirismo. Não tomou conhecimento do estado de saúde de meu pai. Foi mesmo grosseiro, irritante. Em pagamento do que ficara devendo à firma, meu pai sacrificou quase toda a sua tropa, então entregue a seu indelicado colega. Livre de qualquer outra responsabilidade que pudesse vir agravar a sensibilidade de seus nervos, meu pai pensava em fugir da cidade, do reboliço das ruas, dos amigos que se escasseavam... Foi quando lhe surgiu a idéia de mudar-se para o Funil, lugarejo atrasado, desprovido de quaisquer recursos. Comprou da firma Simões Viana & Cia, uma pequena casa no referido povoado, com boa área de terras e para lá mudamos.

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Abriu uma bitácula que serviria de motivo para sua distração. Eu e o João cultivamos o terreno, cujos fechos recompusemos, com esmerado capricho. Minha mãe e Maria da Penha, a menina triste, teriam em Maria Negrinha a companheira dedicada para os serviços caseiros. Tudo corria mansamente. Habituamos-nos rapidamente com os usos e costumes da roça, chegando mesmo a usar alpargatas de sola, para não fugirmos à regra. A enxada não nos surpreendeu, uma vez que já a experimentara no Estado do Espírito Santo. Para meu pai, entretanto, ela fora inclemente. Suas mãos expostas ao frio e ao sol, no amanho e cultivo da terra, abriram-se nas costas, em feridas que por vezes sangravam. Meu pai reunira em torno de si alguns de seus amigos, para os bate-papos nas horas de lazer. João Anastácio, Antonio Claudino, Evaristo Fernandes, João de Abreu, Jorge Guiscem e João André, formavam esse grupo de “bem-aventurados” que o ajudavam a espantar o seu tédio. E com isso, empurrava a vida. Lentamente, como quem não tivesse pressa de chegar ao fim. Apesar de sentir a debilidade do seu estado de saúde, mantinha-se ainda bem humorado. Era o pivô das tertúlias semanais. À sua roda não vingava os germes da tristeza. Em julho de 1904, um inverno inclemente crestava as folhas da vegetação que despontava para a vida.

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O vale em que terminava a nossa lavoura incipiente estava coberto por denso nevoeiro. Um frio úmido cortava a nossa epiderme, não acostumada com os rigores dessa estação. Nada, entretanto, arrefecia a nossa disposição para a luta. Caminhávamos para o eito com a alma em festa. A terra nos daria um pouco do que precisávamos. Prelibávamos o prazer de saborear os frutos do nosso trabalho. A colheita seria farta. Minha mãe animava com sua presença, como seu espírito de renuncia, o fogo sagrado que aquecia a nossa casa. Sempre agarrada as suas saias, Maria da Penha, a irmãzinha triste, não a deixava um só momento. Era o resumo das emoções que marcaram a sua concepção. Meu pai contemplava aquelas cenas que se desenvolviam, ante seus olhos atentos, com profunda amargura. Via em tudo aquilo, a marcha inexorável do destino, encarado com estoicismo, resignadamente. Nos seus diálogos com minha mãe, tinha sempre uma expressão de reconhecimento, pela dedicação com que ela se imolara em holocausto à felicidade da família. Em uma sexta-feira, eu e o João tomávamos café matinal que nos preparara a Maria Negrinha e nos dispúnhamos a prosseguir na capina iniciada. Tínhamos os pés metidos em alpercatas. Não devíamos nos diferenciar dos demais que cultivavam a terra. Foi nesse momento que minha mãe apareceu para nos avisar:

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- Seu pai não os acompanhará hoje; passou muito mal à noite. Descemos silenciosos para o quintal e no mesmo estado de espírito ali permanecemos, até que nos chamassem para o almoço. Não voltamos ao trabalho, naquele dia. Meu pai piorava progressivamente. Aflita, minha mãe, sem saber o que fazer em uma terra desprovida de qualquer recurso, sem medico, e muito menos de uma farmácia, lançava mão dos remédios caseiros para suavizar as aflições em que se debatia meu pai. Tudo inutilmente. No domingo imediato, pela manhã, de regresso da fazenda do senhor João Anastácio, onde fora a serviço de sua profissão, passava em nossa casa o Dr. Avelar, medico de Sete Lagoas, amigo de meu pai. Do exame a que procedeu, nada revelou à minha mãe. Como medico nada poderia fazer. O seu silencio, após a visita, demonstrou claramente a sua desilusão. Aconselhou-a, contudo, a continuar ministrando ao enfermo os calmantes que lhe vinha dando. A crise certamente seria vencida. Teria assim procedido por caridade? Para poupar à minha mãe da certeza antecipada do irremediável? É o que veremos, a seguir.

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Capitulo XII A discrição do medico não escapou à observação de minha mãe. Viu desde logo, que ele agira no caso, mais como amigo da família, cujas aflições não desejava aumentar. Daí em diante redobrou seus cuidados, na certeza de que a viuvez lhe batia à porta, com todo o seu cortejo de sofrimentos. Lembrara-se dos lances angustiantes que marcaram a sua vida de esposa e de mãe, analisando a dedicação daquele que Deus lhe dera por esposo, sempre fiel e companheiro. A sua resignação era surpreendente. Sublimava-se pela ternura com que afagava os filhos, vendo-os, dentro em pouco, privados da assistência de seu pai que por eles tudo sacrificara. No seu leito de dor, meu pai compreendia e avaliava o drama então vivido por sua família. Sabia que o seu fim estava próximo e que ele nada mais poderia fazer. Não perdera o sentido até na hora extrema. Fazia recomendações, como se fora o timoneiro de um barco prestes a soçobrar e com ele ir ao fundo, Distribuiu com os filhos os objetos preciosos de seu uso particular. Para cada caso apontava uma providência. Seu senso de humor se fez sentir quando lembrou à minha mãe que, naquela terra, nenhum velório se fazia sem cachaça e carne frita.

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Que da vendinha fosse retirada toda a carne salgada para isso, e que o João não se esquecesse do garrafão de pinga... Segunda feira, pela manhã, minha mãe nos acordou soluçando: - Seu pai está morrendo, Venham tomar-lhe a benção, pela ultima vez. Em decúbito dorsal, seu corpo estava inerte; os olhos, entretanto, brilhavam com intensidade, pousando demoradamente em cada um de nós. Enquanto minha mãe sustinha-lhe o crucifixo na mão direita, na esquerda eu mantinha acesa a vela benta. Chorávamos copiosamente. Ele fitou-nos demoradamente, balbuciando sua ultima frase: - Vocês vão chorando e eu vou morrendo! E duas lagrimas silenciosas rolaram de suas pálpebras semicerradas. Estava morto! Cruzamos-lhe as mãos sobre o peito, velando-lhe o corpo com um lençol. A notícia correu logo e a nossa casa se encheu de amigos e de pessoas da vizinhança. Pensamos em remover o corpo para Sete Lagoas. Idéia logo afastada, por impossível. Dificilmente romperíamos, em carro puxado a boi a distancia que nos separava da nossa cidade. O enterro seria lá mesmo, no dia seguinte. Evaristo Fernandes e Jorge Guiscem, bons amigos nossos, tomariam as providencias.

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Mandaram buscar em Jequitibá, o Padre José Gonçalves para a encomendação. O caixão foi feito em banco tosco, à nossa porta. Noite adentro, o martelo batia, fazendo aumentar a nossa angustia. Uma fogueira foi improvisada no terreiro. Em torno dela comia e bebia a gente simples do povoado. O fumo de rolo, em densas espirais, completava o quadro tétrico daquela noite de velório. Conversavam animadamente, falavam de tudo e de todos. Só nós permanecíamos junto do cadáver, em orações continuas, ao crepitar dos círios que ardiam lentamente. O funeral de meu pai realizou-se na manhã seguinte, acompanhando pelo Padre José Gonçalves. Para o mesmo fim vieram de Sete Lagoas, Domitila Drummond, Manuel de Assis Gonçalves, Amador Luiz Moreira e João Chassim, este residente também no Funil, mas ausente por ocasião do desenlace. Satila, como era conhecida aquela prima, desvelou-se em prestar a minha mãe carinhosa assistência. Cinco dias depois deixamos o povoado de tão tristes recordações. Em Sete Lagoas, no sobradinho, velha residência dos meus avós aguardavam a nossa chegada, vovó Lilia, Fernando, Juquita e tia Babita com esposo e filho. Inúmeras foram as visitas então recebidas. Uma, entretanto, muito nos sensibilizou pelo seu ineditismo. Tratava-se do senhor Hermelindo Pinto, um dos três pretendentes à mão da minha mãe.

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De Curvelo, onde residia e constituíra família, veio solidarizar-se com ela na sua dor. Era uma pessoa bem instalada na vida e de fartos recursos. Dirigindo-se a minha mãe disse-lhe, por fim. - Dona Amaziles; minha visita é de enternecida solidariedade com seus sofrimentos. Estou em plenas condições de servi-la e ponho a sua disposição os meus préstimos, em qualquer sentido. Sensibilizada com a delicadeza do gesto, minha mãe não pode conter as lagrimas. Intimamente reconheceu a nobreza de sentimentos daquele que soubera conservar tão pura uma velha amizade. Estendeu-lhe a mão num gesto de profundo agradecimento, declinando de qualquer outro apoio além daquele que o levara a sua presença, o da solidariedade moral. A nossa situação era de serias dificuldades. Meu pai nada deixara, alem da casinha que tínhamos no Funil, vendida logo depois para o senhor José Martins de Abreu, por dois contos de réis. Fernando, já era empregado no comercio do Rio das Velhas, ganhando por mês, dez mil réis. O tio Juca, bom e prestimoso com sempre, anuíra em aumentar a cota de fornecimento mantida na casa comercial do senhor Manuel Chassim Drummond. Com essa providência, nós tínhamos garantido o necessário para a subsistência. Outras providências se impunham para fazer face as demais despesas. Minha mãe se dispôs a luta. Ora na costura, fazendo camisas para homens, a mil e quinhentos reis; ora no

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formo, fabricando bolachas, biscoitos e pães de queijo que eu e o João vendíamos pelas ruas, em grandes tabuleiros. As laranjas da chácara, plantada por meu pai, constituíam outra fonte de renda, vendidas em carrocinhas de mão, a mil réis o cento. E assim fomos vivendo até que se definisse a situação de cada um de nós, de menor idade. Fernando veio do Rio das Velhas para trabalhar no comercio local. João também se empregou como caixeiro em uma casa de gêneros como meu pai. Eu declinei-me para o oficio de alfaiate e em pouco tempo já ajudava em alguma coisa. A essa altura não pesávamos mais ao tio Juca. O falecimento de Maria da Penha, poucos meses após a de meu pai, veio encher de tristeza a nossa casa. Tão meiga, tão pura, com seus cabelos longos e pretos, parecia-nos uma mocinha. O coração traiu-a, antes que pudesse sorrir para a vida.

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Capitulo XIII Refeita em parte do abatimento que lhe causara o falecimento de Maria da Penha, (a Bioca, como a chamavam no Rio Novo, talvez porque suas brincadeiras não tivessem a vivacidade própria a sua idade), minha mãe passou a concentrar suas atenções nos filhos que iam se fazendo homens, alguns já ensaiando suas conquistas amorosas. Cuidava dos seus arranjos, não lhes permitindo que se apresentassem em reuniões sociais, sem que estivessem decentemente trajados. Até Juquita, o mais moço da turma e que fizera curso pratico de guarda-livros, do qual auferia boa renda, já entretinha seu romance com uma pequena da Rua Silva Jardim. Um só objetivo o dominava: o casamento. Como conseqüência, embora dissuadidos por minha mãe a não realizarem tais intentos, por serem muitos jovens ainda, no período de 1910 a 1922 os quatro herdeiros do nome de João Drummond contraíram matrimonio. Como aves implumes bateram asas, ainda meio deficientes para aqueles vôos. Deixaram a casa materna. Minha mãe ficara no velho sobradinho, com vovó Lilia e a tia Babita, todas viúvas, alimentando o fogo sagrado que as unia e ainda aqueceria os novos lares em formação. Não foram esquecidas. Continuavam a ser assistidas pelos filhos que se casaram.

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A convivência que se estabeleceu entre elas – símbolo de um passado digno de respeito e de veneração, e os que se separaram para uma nova vida, foi exemplo edificante e consolador. Não tardou que os netos viessem a suavizar sua vida, enchendo a casa com a alacridade de seus brinquedos infantis, com a graça natural dos que ensaiavam os primeiros passos. O desaparecimento um pouco mais tarde de Juquita, vovó Lilia, João, tio Juca e tio Quincas foram golpes profundos vibrados na sua sensibilidade tão atormentada. Daí por diante, minha mãe se repartia morando ora com um, ora com outro filho, cabendo-me a ventura de ter sido o meu lar no que mais tempo se deteve, o que atribuo a nossa afinidade espiritual. Eu era impetuoso na minha mocidade e a tudo me atirava sem temer conseqüências. Acredito que ela tenha chegado à conclusão de que, por isto mesmo, era o que mais precisava da sua assistência. À minha mãe eu devo o que tenho procurado ser na vida. Confesso, com vaidade. Quando me retirei para Paraopeba, o inicio do ano de 1943, minha mãe voltou para o sobradinho, passando a viver em comum com a tia Babita e sua cunhada Sabita. Entendiam-se muito bem. O estado de minha mãe, entretanto, inspirava cuidados. Não era mais a mulher forte que vencera heroicamente tantos obstáculos. Seu corpo franzino ia cedendo lentamente aos impactos de longa enfermidade, própria do sexo.

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Não resistindo às crises sucessivas que tanto a abatiam, em fevereiro do mesmo ano caiu de cama para não mais se levantar. Embora ausente eu tive no Dr. Avelar Campos e no farmacêutico Deusdedit Correa, autênticos abnegados no exercício das suas profissões. A dedicação que tiveram com minha mãe foi algo superior ao simples cumprimento do dever profissional. Como enfermeiras, revezavam-se em um trabalho extenuante, a tia Babita, Sabita, e Sacalina, sempre auxiliadas por minha mulher que tinha o pensamento voltado para o marido ausente. Assistida espiritualmente pelo Padre Flavio D’Amato, com os sacramentos e as orações da Igreja, pela manhã de 24 de dezembro de 1943, entregava sua alma ao Criador. E assim terminava a sua vida, purificada pelos sofrimentos e abençoada pelas gerações que lhe sucederam! Quer como esposa ou mãe, sua vida constitui um exemplo edificante para as gerações que surgem, tão eivadas de um preconceito social que desvirtuam a função precípua da mulher. Eu que assisti ao passamento de meu pai e de meus irmãos, não pude prestar a minha mãe a assistência que lhe era devida em sua hora extrema. Confinado em Jaboticatubas, onde a correspondência postal chegava apenas duas vezes por semana, foi por

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um cartão de pêsames que tomei conhecimento da sua morte. Caprichos do destino! Logo que regressei a Sete Lagoas, fiz erigir sobre os seus restos mortais e os de vovó Lilia, modesto túmulo encimado pela imagem do Crucificado. Símbolo da verdade eterna. Meus filhos – este é o relato fiel da vida daqueles que me sucederam o ser. Saibam como eu, honrar-lhes a memória, porque souberam edificar com seu exemplo. Joaquim Dias Drummond João Antonio Drummond Nascido em 14 d março de 1862 Falecido em 11 de julho de 1904 Amaziles Rosalina Viana Drummond Nascida em 5 de dezembro de 1869 Falecida em 24 de dezembro de 1943 Napoleão Teixeira de Novais (Napoleão Bonaparte) Era filho de Inácio Teixeira de Novais, de nacionalidade portuguesa, e de Maria Madalena Guedes Torres.

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Notas complementares Em 1911 estiveram em Sete Lagoas vovó Maria Raimunda, mãe de meus pais, e a tia Ferdinanda, sua irmã, viúva do desventurado Napoleão Bonaparte, barbaramente trucidado em Colatina – Estado do Espírito Santo, em 1900. De um caderno de produções literárias, escritas por tia Fernandina e deixado sobre a mesa de meu quarto, retirei a sextilha que abaixo transcrevo que foi publicada no Correio de Itabira e no Serro Azul de Ponte Nova, no ano de 1899. O poema retrata seu arrependimento de um gesto irrefletido, ante uma simples suspeita, gesto, que levou a separação um casal cheio de filhos que vivia até então plenamente feliz. Os julgamentos precipitados acarretam quase sempre grandes tragédias.

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Partida Partiste, que triste desalento, Depois de tantas horas inefáveis De amor no doce laço. Dorida, contemplo muda, o firmamento. Baixam a Terra nevoas insondáveis, Frias como aço! Escute quando despontar a aurora, Bordando o céu com flocos luminosos, Tu seguirás alem. Talvez tua alma nessa triste hora, Sinta saudades daquela que em silêncio Por ti sofrido tem. Pensaras nesta terra estremecida, Onde de novo tu virás viver Em doces afeições, Lembrando-se sempre que és amado, Nessas felizes horas de prazer, Horas de emoções. Terás o talismã abençoado A que recorras se tu sentires Da saudade a dor. Permita Deus que possas brevemente, De novo a terra estremecida ver, Com acrisolado amor. Fernandina Drummond Itabira 05/06/1899

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Ancestrais de Joaquim Dias Drummond Tetravós Antonio João de Freitas Carvalho Drummond Engracia Michaela de Freitas Henriques Trisavós João Antonio de Freitas Carvalho Drummond Anna Luiza Emiliana Bisavós - Paternos Fernando Antonio de Freitas Drummond Thereza Miquelina da Silveira Bicalho - Maternos Joaquim Gomes de Freitas Drummond Balbina Julieta de Freitas Bicalho Avós - Paternos Fernando Antonio Drummond Junior Maria Raimunda dos Santos Drummond - Maternos Joaquim Dias Bicalho Neto Maria Claudina Vianna Drummond Pais João Antonio Drummond Amaziles Rosalina Vianna Drummond

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Notas – Meus Bisavós Fernando Antonio de Freitas Drummond e Joaquim Gomes de Freitas Drummond eram irmãos, filhos do primeiro matrimônio do Guarda Mor João Antonio De Freitas Carvalho Drummond. Minha bisavó materna – Balbina Julieta de Freitas Bicalho era descendente de tradicional família de Santa Luzia do Rio das Velhas. Joaquim Dias Drummond, autor destas notas, nasceu em Sete Lagoas no dia 22 de janeiro de 1891.e faleceu no ano de 1975, Em 27 de outubro de 1915, uniu-se pelo matrimonio com a senhorita Aida Raposo, filha do senhor José Estevam Raposo e da senhora Antonia de Melo Raposo, todos da cidade de Prados, oeste de Minas. Ainda nasceu em 13 de setembro de 1897. São filhos deste casal: Roberto Rômulo, Marcos Vinício, Magda, Maria Auxiliadora, Silvia Marina, Marcelo Arinos, Maria José e Maria Lucia.

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Biografia Pesquisa baseada no livro de Márcio Vicente da Silveira Santos – Apontamentos Para a Biografia de Joaquim Dias Drummond Joaquim dias Drummond - Nhô Quim Nasceu em Sete Lagoas no dia 22 de janeiro de 1891 Filho de João Antonio Drummond e Amaziles Rosalina Vianna Drummond. Seu bisavô materno foi o coronel Joaquim Gomes de Freitas Drummond, o primeiro membro da família Drummond a se estabelecer na região pelos idos de 1833. Em 1894 a sua família mudou-se para o Espírito Santo residindo em seqüência nas cidades de Rio Novo, Iconha, Piuma e Colatina. Em 1902 a família voltou a residir em Sete lagoas. Nhô Quim casou-se em 27 de outubro de 1915 com Aida Raposo, filha de José Estevan Raposo e Antonia de Melo Raposo, família originaria de Prados – MG. Deste casamento nasceram dez filhos, sendo que sete ainda estão entre nós e cinco vivem em Sete lagoas. Nhô Quim iniciou-se nas primeiras letras na escola do professor Osório Vianna e fez o curso primário na

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escola do professor Cândido Maria de Azeredo Coutinho ambos na cidade de Rio Novo - ES. Diplomou-se com distinção no ano de 1904 e neste mesmo ano foi colhido por fato triste e marcante: a morte prematura do pai aos 42 anos de idade. Aos 14 anos começou a trabalhar como balconista e em poucos meses aprendeu com o Sr. Antonio Gregório de Freitas a profissão de alfaiate. Em 1909 conseguiu emprego na grande alfaiataria de Pedro Paulo Galoti, o mais conceituado da capital. Um ano depois regressou a Sete Lagoas para montar seu próprio ateliê, a Alfaiataria Central, situada na Rua Silva Jardim (hoje Monsenhor Messias). Em 1920 foi nomeado Coletor de Rendas Municipais em ato assinado pelo então secretario das finanças, João Luiz Alves. Em 1922 Nhô Quim arrematou em leilão público, a tipografia do Jornal O Reflexo e inaugurou a seguir a Papelaria e Tipografia Kosmos. A sua antiga sede, situada na esquina entre a Rua Teófilo Otoni e a atual Avenida Lassance Cunha cedeu lugar ao Ed. Vera Cruz, o primeiro “arranha céu” de Sete lagoas.

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Em 1942 iniciou sua carreira bancária ingressando na Casa Bancária Wanderley Azeredo & Cia, como gerente da agência de Paraopeba. Após um ano foi transferido para Jaboticatubas, na mesma função. Em 1944 a Casa Bancária foi encampada pelo Banco Industrial de Minas Gerais S.A., e Nhô Quim foi designado para a agência de Belo Horizonte no cargo de inspetor. No ano de 1945 transferiu-se para o Banco da Lavoura de Minas Gerais, instalando como gerente, a agência de Sete Lagoas. Em 1951 ingressou nos quadros do Banco Agrícola de Sete Lagoas, mais tarde Banco Agrícola de Minas Gerais, do qual se aposentou em 1964. Joaquim Dias Drummond era dotado de natureza despojada e cooperativa tendo participado ativamente da vida da cidade em vários setores. Foi vereador, secretario do legislativo municipal, presidido à época pelo Dr. Zoroastro Passos. Nomeado em 1920, coletor de rendas do município pelo então secretário de finanças do Estado. Era secretario da câmara municipal que foi destituída pela revolução constitucionalista de 1930 quando

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também acumulava a função de tesoureiro. Respondeu pela direção do município entregando-o ao prefeito nomeado para Sete Lagoas Dr. João Batista Proença Sigaud, que o manteve como colaborador. Em 1926 foi nomeado pelo juiz de direito, Senhor Amarilio Moreira Pena, promotor de justiça pelo prazo de trinta dias. Em dezembro daquele ano foi nomeado pelo governador do Estado, Doutor Antonio Carlos Ribeiro de Andrade, adjunto promotor de justiça da comarca, cargo que deixou ao ser eleito pela câmara municipal secretario do poder executivo. Nhô Quim foi ainda arbitrador judicial. Como colaborador da Igreja e suas instituições Nhô Quim exerceu os cargos a seguir: Vicentino da Conferência de Nossa Senhora das Graças Provedor da Irmandade do Santíssimo Sacramento da Matriz de Santo Antonio, em apoio ao Padre Sanson. Primeiro Presidente do Conselho Paroquial de Santo Antonio, em apoio ao Padre Flávio D’Amato. Provedor do Hospital Nossa Senhora das Graças por dois anos. Secretário da Comissão Pró Construção do novo prédio para o Hospital Nossa Senhora das Graças. Um dos fundadores da Sociedade de Proteção à Infância e Adolescência (SPIA), da Paróquia de Santana. Diretor Administrativo do Ginásio Dom Silvério.

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Editor do Jornal Católico Alvorada. Fundador e primeiro Presidente da Associação Comercial de Barão de Cocais. Participou da fundação da Associação Comercial de Sete lagoas como primeiro secretário, e foi seu terceiro presidente. Fundou o Avante Futebol Clube, surgido no mesmo ano que nascia o Democrata. Foi vice-presidente do Ideal e alguns anos mais tarde presidente do Democrata por dois períodos e orador oficial do Bela Vista. Em sua trajetória participativa e abnegada Nhô Quim exerceu ainda os seguintes cargos: Primeiro secretário da Liga Operária Secretario do S.A. Cine Trianon Diretor do Automóvel Clube de Sete Lagoas Tesoureiro da Caixa Escolar Cândido Azeredo Secretario do Diretório Municipal do Partido Republicano Mineiro Correspondente do Banco Mineiro da Produção S.A. Entusiasta das artes cênicas ingressou no quadro de amadores do Grupo Dramático Melanciense e após sua extinção passou a pertencer ao Grupo Dramático João Caetano, o primeiro de Sete lagoas.

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Fundou com amigos e dirigiu o Grupo Dramático Carlos Goes e o Grupo Dramático Dr. João Avellar, de efêmera existência. Mais tarde exerceu o cargo de diretor do Grupo Dramático Guerra Junqueiro, formado por operários da Estrada de Ferro Central do Brasil. Foi presidente do Centro Cívico Dr. Melo Viana e diretor do Rose Clube de Sete lagoas. Foi ainda diretor da corporação musical Nossa Senhora das Dores quando regida pelo maestro Orozimbo de Macedo. Joaquim Dias Drummond exerceu no jornalismo atividades como fundador, redator e/ou editor nos seguintes jornais: Alvorada Nossa Terra Sete Lagoas Mensagem Folha Cacoense Foi ainda colaborador das seguintes publicações: Acaiaca A Ronda Correio de Sete Lagoas Ceres (jornal dos funcionários do Banco Agrícola) O Jornal do Centro de Minas Publicou ainda: História do Centenário da Paróquia de Santo Antonio

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História do Teatro de Sete lagoas In Memoriam (inédito) Piquetes Passado Compassado Joaquim Dias Drummond conquistou o Diploma de Mérito Cultural concedido pela Câmara Municipal de Sete Lagoas. E para finalizar a sua brilhante biografia, foi sócio honorário das seguintes associações culturais: Clube de Letras de Sete lagoas Academia de Letras de Sete lagoas UBT – União Brasileira de Trovadores. FIM

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