Jornal da ABI 365

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Órgão oficial da Associação Brasileira de Imprensa 365 ABRIL 2011 PÁGINA 19 A IMPRENSA DOS DIAS ATUAIS POSTA SOB QUESTIONAMENTO LEITORES QUALIFICADOS, COMO O EX-REITOR CARLOS LESSA, CRITICAM O JORNALISMO PRATICADO ENTRE NÓS. PÁGINAS 20 E 21 OS PRIMEIROS GANHADORES DO PRÊMIO JOÃO SALDANHA PODE ACABAR A FARRA COM CONCESSÕES DE RÁDIO E TV O JORNALISMO PERDE REALI, NOSSO OLHAR SOBRE O MUNDO SÉRIE SOBRE O GOLEIRO BRUNO NUM SITE DE NOTÍCIAS DEU AO REPÓRTER CAHÊ MOTA A PRINCIPAL LÁUREA. PÁGINAS 24 E 25 DIANTE DE DENÚNCIAS, O MINISTÉRIO DAS COMUNICAÇÕES ANUNCIA, FINALMENTE, AÇÃO CONTRA A ORGIA DOS LARANJAS. PÁGINAS 28 E 29 CORRESPONDENTE BASEADO EM PARIS 40 ANOS, ELE MOSTRAVA O MUNDO MUDAR, COM UMA VISÃO BRASILEIRA. PÁGINAS 37 E 38 A BANDEIRA FOI HASTEADA - PÁGINA 3 | O RESGATE DA TRAGÉDIA DE RUBENS PAIVA - PÁGINA 7 | A OAB INSISTE EM PASSAR O PASSADO A LIMPO - PÁGINA 11 URUGUAI ALTERA SUA LEI DE ANISTIA PARA PUNIR OS CRIMES DA DITADURA - PÁGINA 12 | JUSTIÇA DA ARGENTINA CONDENA GENERAL TORTURADOR - PÁGINA 12 UMA MISSA EM MEMÓRIA DE ZUZU ANGEL - PÁGINA 13 | A ABI QUER NOTÍCIAS DOS NOSSOS MORTOS - PÁGINA 13 | UMA REVOLUÇÃO NAS HISTÓRIAS DE AMOR NA TELEVISÃO - PÁGINA 14 EM EXIBIÇÃO NO RIO UM PAINEL DA GUERRA SURDA E SUJA DA DITADURA - PÁGINA 16 | A INQUISIÇÃO, POR RODOLFO KONDER - PÁGINA 18 LYGIA FAGUNDES TELLES faz uma evocação comovida de Paulo Emilio Salles Gomes, o fundador da Cinemateca Brasileira JOÃO FELÍCIO DOS SANTOS festejado como o escritor que devolveu à vida a escrava Xica da Silva REPRODUÇÃO/ILUSTRAÇÃO DE POTY PÁGINAS 22 E 23 Os crimes que impõem a abertura dos arquivos da repressão da ditadura militar, como o assassinato de Rubens Paiva Os crimes que impõem a abertura dos arquivos da repressão da ditadura militar, como o assassinato de Rubens Paiva

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Esta edição muito especial do Jornal da ABI apresenta uma série de matérias que mostram que os crimes da ditadura militar impõem a abertura dos arquivos da repressão e a aprovação, pelo Congresso Nacional, da Comissão da Verdade. Entrevistamos o jornalista Jason Tércio, autor do livro Segredo de Estado, sobre o seqüestroo e assassinato de Rubens Paiva e visitamos a exposição "Não tens Epitáfio Pois és Bandeira – Rubens Paiva, Desaparecido desde 1971", no Memorial da Resistência, em São Paulo. Lembramos de Zuzu Angel e da campanha da OAB. Num artigo emocionante Rodolfo Konder mostra o horror da tortura nos porões da ditadura. E mais: - Evento na ABI lembra o centenário de João Felício dos Santos; - Lygia Fagundes Telles faz uma evocação de Paulo Emilio Salles Gomes, fundador da Cinemateca Brasileira - A festa do Prêmio João Saldanha - O resgate de obras fundamentais para o Brasil pelo Conselho Editorial do Senado - Homenageamos Reali Júnior e José Alencar.

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Órgão oficial da Associação Brasileira de Imprensa

365ABRIL2011

PÁGINA 19

A IMPRENSA DOS DIAS ATUAISPOSTA SOB QUESTIONAMENTO

LEITORES QUALIFICADOS, COMO O EX-REITORCARLOS LESSA, CRITICAM O JORNALISMOPRATICADO ENTRE NÓS. PÁGINAS 20 E 21

OS PRIMEIROS GANHADORESDO PRÊMIO JOÃO SALDANHA

PODE ACABAR A FARRA COMCONCESSÕES DE RÁDIO E TV

O JORNALISMO PERDE REALI,NOSSO OLHAR SOBRE O MUNDO

SÉRIE SOBRE O GOLEIRO BRUNO NUM SITEDE NOTÍCIAS DEU AO REPÓRTER CAHÊ MOTA

A PRINCIPAL LÁUREA. PÁGINAS 24 E 25

DIANTE DE DENÚNCIAS, O MINISTÉRIO DASCOMUNICAÇÕES ANUNCIA, FINALMENTE, AÇÃO

CONTRA A ORGIA DOS LARANJAS. PÁGINAS 28 E 29

CORRESPONDENTE BASEADO EM PARIS HÁ40 ANOS, ELE MOSTRAVA O MUNDO MUDAR,

COM UMA VISÃO BRASILEIRA. PÁGINAS 37 E 38

A BANDEIRA FOI HASTEADA - PÁGINA 3 | O RESGATE DA TRAGÉDIA DE RUBENS PAIVA - PÁGINA 7 | A OAB INSISTE EM PASSAR O PASSADO A LIMPO - PÁGINA 11URUGUAI ALTERA SUA LEI DE ANISTIA PARA PUNIR OS CRIMES DA DITADURA - PÁGINA 12 | JUSTIÇA DA ARGENTINA CONDENA GENERAL TORTURADOR - PÁGINA 12

UMA MISSA EM MEMÓRIA DE ZUZU ANGEL - PÁGINA 13 | A ABI QUER NOTÍCIAS DOS NOSSOS MORTOS - PÁGINA 13 | UMA REVOLUÇÃO NAS HISTÓRIAS DE AMOR NA TELEVISÃO - PÁGINA 14EM EXIBIÇÃO NO RIO UM PAINEL DA GUERRA SURDA E SUJA DA DITADURA - PÁGINA 16 | A INQUISIÇÃO, POR RODOLFO KONDER - PÁGINA 18

LYGIA FAGUNDES TELLES faz uma evocação comovida de PauloEmilio Salles Gomes, o fundador da Cinemateca Brasileira

JOÃO FELÍCIO DOS SANTOS festejado como o escritorque devolveu à vida a escrava Xica da Silva

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PÁGINAS 22 E 23

Os crimes que impõem a aberturados arquivos da repressão da

ditadura militar, como oassassinato de Rubens Paiva

Os crimes que impõem a aberturados arquivos da repressão da

ditadura militar, como oassassinato de Rubens Paiva

2 Jornal da ABI 365 Abril de 2011

EditorialEditorial

AS REVELAÇÕES CONTIDAS em documentosdos arquivos militares dados a público nasúltimas semanas confirmam a existência du-rante a ditadura do quadro de iniqüidadesdenunciados à exaustão pelos setores demo-cráticos do País. Essa confirmação, porém,não deixa de causar estupor e ferir os sen-timentos de humanidade do conjunto da so-ciedade, pelo alto nível de impiedade e debrutalidade que viciou o comportamento dosdonos do poder e de seus agentes de varia-da graduação ou posição funcional. São peçasque demonstram que vivemos durante 21anos sob um regime sem alma, desprovidode ética e do mínimo de respeito à dignida-de da pessoa humana. Um regime que, pas-sadas décadas e décadas, envergonha a cons-ciência cívica nacional.

EMBORA PELA PALAVRA dos seus chefes, men-tores e protetores esses criminosos sejamapresentados até hoje como adstritos ao seudever legal, a documentação que começa aser liberada dá conta de que essa ação deli-tuosa permanente não decorreu de capricho,de erro ou de desvios de conduta de agentesisolados, mas sim de uma orientação supe-rior, concebida, planejada e executada comfrieza pelos mais altos hierarcas do regime.Eram claras as ordens: matar, executar, darsumiço aos corpos, apagar os vestígios dastorpezas cometidas, destruir os registros dequalquer natureza que pudessem atestar aocorrência de celerada ignomínia.

Centro de Informações da Marinha-Cenimaragora divulgados, firmou a decisão de nãodeixar vivos os participantes daquela contes-tação armada à ditadura militar. Tratava-seem verdade de uma meta redundante, de umobjetivo já estabelecido, pois àquela alturao Alto-Comando do Exército, por ordem di-reta do ditador de plantão, já decidira que aque-la resistência seria varrida a ferro e fogo e quede suas vítimas não restaria qualquer elementode identificação e de avaliação da extensãodo total de homens e mulheres sacrificadosà sanha dos seus captores.

NÃO SE ESTAVA, ENTÃO, diante de uma ori-entação que pudesse ser atribuída a esta ouàquela Arma, ao discricionarismo ou into-lerância deste ou daquele chefe militar, massim de uma decisão de governo, de uma de-finição do regime, porquanto também aAeronáutica, como registrado em documen-tos agora recolhidos ao Arquivo Nacional,obedecia à orientação de neutralizar – eufe-mismo que oculta seu verdadeiro fim: ma-tar, exterminar.

VEMO-NOS AGORA COM maior premênciadiante da necessidade de criação da Comis-são da Verdade e de abertura dos arquivosda repressão da ditadura, para que o Paístenha, finalmente, um retrato veraz e tantoquanto possível abrangente dos muitos cri-mes que marcaram este prolongado momen-to trágico da nossa História.

Editores: Maurício Azêdo e Francisco UchaProjeto gráfico e diagramação: Francisco UchaEdição de textos: Maurício Azêdo

Apoio à produção editorial: Alice Barbosa Diniz,Conceição Ferreira, Guilherme Povill Vianna, Maria IlkaAzêdo, Ivan Vinhieri, Mário Luiz de Freitas Borges.

Publicidade e Marketing: Francisco Paula Freitas(Coordenador), Queli Cristina Delgado da Silva,Paulo Roberto de Paula Freitas.

Diretor Responsável: Maurício Azêdo

Associação Brasileira de ImprensaRua Araújo Porto Alegre, 71Rio de Janeiro, RJ - Cep 20.030-012Telefone (21) 2240-8669/2282-1292e-mail: [email protected]

Representação de São PauloDiretor: Rodolfo KonderRua Dr. Franco da Rocha, 137, conjunto 51Perdizes - Cep 05015-040Telefones (11) 3869.2324 e 3675.0960e-mail: [email protected]

Impressão: Taiga Gráfica Editora Ltda.Avenida Dr. Alberto Jackson Byington, 1.808Osasco, SP

DIRETORIA – MANDATO 2010-2013Presidente: Maurício AzêdoVice-Presidente: Tarcísio HolandaDiretor Administrativo: Orpheu Santos SallesDiretor Econômico-Financeiro: Domingos MeirellesDiretor de Cultura e Lazer: Jesus ChediakDiretora de Assistência Social: Ilma Martins da SilvaDiretora de Jornalismo: Sylvia Moretzsohn

CONSELHO CONSULTIVO 2010-2013Ancelmo Goes, Aziz Ahmed, Chico Caruso, Ferreira Gullar, Miro Teixeira, NilsonLage e Teixeira Heizer.

CONSELHO FISCAL 2010-2011Jarbas Domingos Vaz, Presidente; Adail José de Paula, Geraldo Pereira dosSantos, Jorge Saldanha de Araújo, Lóris Baena Cunha, Luiz Carlos Chesther deOliveira e Manolo Epelbaum.

MESA DO CONSELHO DELIBERATIVO 2010-2011Presidente: Pery CottaPrimeiro Secretário: Sérgio CaldieriSegundo Secretário: Arcírio Gouvêa Neto

Conselheiros efetivos 2010-2013André Moreau Louzeiro, Benício Medeiros, Bernardo Cabral, Carlos Alberto MarquesRodrigues, Fernando Foch, Flávio Tavares, Fritz Utzeri, Jesus Chediak, José GomesTalarico (in memoriam), Marcelo Tiognozzi, Maria Ignez Duque Estrada Bastos, MárioAugusto Jakobskind, Orpheu Santos Salles, Paulo Jerônimo de Sousa e Sérgio Cabral.

Conselheiros efetivos 2009-2012Adolfo Martins, Afonso Faria, Aziz Ahmed, Cecília Costa, Domingos Meirelles,Fernando Segismundo, Glória Suely Álvarez Campos, Jorge Miranda Jordão, JoséÂngelo da Silva Fernandes, Lênin Novaes de Araújo, Luís Erlanger, Márcia Guimarães,Nacif Elias Hidd Sobrinho, Pery de Araújo Cotta e Wilson Fadul Filho.

Conselheiros efetivos 2008-2011Alberto Dines, Antônio Carlos Austregesylo de Athayde, Arthur José Poerner, CarlosArthur Pitombeira, Dácio Malta, Ely Moreira, Fernando Barbosa Lima (in memoriam), LedaAcquarone, Maurício Azêdo, Mílton Coelho da Graça, Pinheiro Júnior, Ricardo Kotscho,Rodolfo Konder, Tarcísio Holanda e Villas-Bôas Corrêa.

Conselheiros suplentes 2010-2013Adalberto Diniz, Alfredo Ênio Duarte, Aluízio Maranhão, Arcírio Gouvêa Neto, DanielMazola Froes de Castro, Germando de Oliveira Gonçalves, Ilma Martins da Silva, JoséSilvestre Gorgulho, Luarlindo Ernesto, Marceu Vieira, Maurílio Cândido Ferreira, SérgioCaldieri, Wilson de Carvalho, Yacy Nunes e Zilmar Borges Basílio.

Conselheiros suplentes 2009-2012Antônio Calegari, Antônio Henrique Lago, Argemiro Lopes do Nascimento (MiroLopes), Arnaldo César Ricci Jacob, Ernesto Vianna, Hildeberto Lopes Aleluia, JordanAmora, Jorge Nunes de Freitas (in memoriam), Luiz Carlos Bittencourt, Marcus AntônioMendes de Miranda, Mário Jorge Guimarães, Múcio Aguiar Neto, Raimundo CoelhoNeto (in memoriam) e Rogério Marques Gomes.

Conselheiros suplentes 2008-2011Alcyr Cavalcânti, Edgar Catoira, Francisco Paula Freitas, Francisco Pedro do Coutto,Itamar Guerreiro, Jarbas Domingos Vaz, José Pereira da Silva (Pereirinha), Maria doPerpétuo Socorro Vitarelli, Ponce de Leon, Ruy Bello (in memoriam), Salete Lisboa,Sidney Rezende, Sylvia Moretzsohn, Sílvio Paixão e Wilson S. J. de Magalhães.

COMISSÃO DE SINDICÂNCIAJosé Pereira da Silva (Pereirinha), Presidente; Carlos Di Paola, Marcus Antônio Mendesde Miranda, Maria Ignez Duque Estrada Bastos e Toni Marins (in memoriam).

COMISSÃO DE ÉTICA DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃOAlberto Dines, Arthur José Poerner, Cícero Sandroni, Ivan Alves Filho e Paulo Totti.

COMISSÃO DE DEFESA DA LIBERDADE DE IMPRENSA E DIREITOS HUMANOSLênin Novaes de Araújo, Presidente; Wilson de Carvalho, Secretário; Alcyr Cavalcanti, ArcírioGouvêa Neto, Daniel de Castro, Geraldo Pereira dos Santos, Germando de OliveiraGonçalves, Gilberto Magalhães, José Ângelo da Silva Fernandes, Lucy Mary Carneiro, MariaCecília Ribas Carneiro, Mário Augusto Jakobskind, Martha Arruda de Paiva e Yacy Nunes.

COMISSÃO DIRETORA DA DIRETORIA DE ASSISTÊNCIA SOCIALIlma Martins da Silva, Presidente, Jorge Nunes de Freitas (in memoriam), Manoel Pachecodos Santos, Maria do Perpétuo Socorro Vitarelli, Mirson Murad e Moacyr Lacerda.

REPRESENTAÇÃO DE SÃO PAULOConselho Consultivo: Rodolfo Konder (Diretor), Fausto Camunha, George BenignoJatahy Duque Estrada, James Akel, Luthero Maynard e Reginaldo Dutra.

Jornal da ABINúmero 365 - Abril de 2011

O JORNAL DA ABI NÃO ADOTA AS REGRAS DO ACORDO ORTOGRÁFICO DOS PAÍSES DELÍNGUA PORTUGUESA, COMO ADMITE O DECRETO Nº 6.586, DE 29 DE SETEMBRO DE 2008.

O ESPANTO DIANTE DE TANTA desumanida-de cresce diante da evidência, agora expostaà luz, de que em determinados episódios emomentos havia concorrência entre os órgãosque cometeriam os massacres, como no casoda Guerrilha do Araguaia, em que a Marinhade Guerra, conforme revelam documentos do

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3Jornal da ABI 365 Abril de 2011

POR MARCOS STEFANO

ESPECIAL - DIREITOS HUMANOS

Aquele feriado de São Sebastião parecia ser mais um no Rio deJaneiro, com praias lotadas, calor e religiosidade à flor da pele.Apenas parecia. No fatídico 20 de janeirode 1971, o clima de fé disputava as ruascom o de tensão. Em vários pontos da ci-dade, soldados do Exército com capacetesna cabeça e fuzis pendurados nos ombros,policiais civis e agentes dos órgãos de se-gurança bloqueavam ruas e avenidas, pe-dindo documentos aos motoristas, revis-tando carros com a ajuda de cães farejado-res, entrando nos ônibus em busca de sus-peitos. Em dezembro, o embaixador suí-ço Giovanni Enrico Bucher fora seqüestra-do; após 40 dias de negociações e a liberação de 70 presos políti-cos, finalmente libertado. Era a quarta ação do tipo num períodode pouco mais de um ano e o Governo respondia com fortíssimarepressão, transformando o momento em um dos mais truculen-tos da ditadura militar.

Em uma confortável casa de esquina, na principal avenida doLeblon, ao lado de Ipanema, as aparências também enganavam.A manhã fora de passeios pela praia, compras e visitas. Toda essaagitação tornou despercebida a presença da Veraneio azul-cla-ro, do Opala amarelo com teto de vinil preto e de duas peruasKombi estacionados ao lado da residência. Porém, quando osagentes do Cisa, o Centro de Informações e Segurança da Ae-ronáutica, praticamente invadiram a casa, segurando metralha-doras e apontando armas para os empregados e a família queali morava, foi impossível ignorar. Começava ali o drama dopolítico, engenheiro, jornalista e empresário Rubens BeyrodtPaiva. Um drama que, para a família e o País, já dura 40 anos.

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O desaparecimento político de Ru-bens Paiva é um dos casos mais emblemá-ticos ocorridos durante a ditadura im-plantada em 1964. No mesmo dia de seuseqüestro, ele foi levado ao quartel doComando da III Zona Aérea, onde come-çaram as torturas. Em seguida, foi trans-ferido para o Departamento de OperaçõesInternas-Doi do I Exército, última notí-cia que se tem a seu respeito. Agora, todaessa história está sendo resgatada pela ex-posição Não tens Epitáfio Pois és Bandei-ra – Rubens Paiva, Desaparecido desde1971, aberta até o dia 10 de julho no Me-morial da Resistência, em São Paulo.

Tendo como pano de fundo a conjun-tura política brasileira, a exposição per-corre a formação e trajetória de Paiva, suaatuação parlamentar comprometidacom a soberania nacional, com a demo-cracia e com a justiça social, sua prisão,a farsa da fuga na versão construída pelosmilitares e a luta incansável de EuniceFacciola Paiva, companheira de toda avida, pelo restabelecimento do que defato aconteceu.

A exposição atual, na verdade, é umaversão ampliada da mostra itineranteconcebida no fim de 2010, dentro doPrograma Direito à Memória e à Verda-de, da Secretaria de Direitos Humanos daPresidência da República e que no come-ço do ano passou pela Câmara dos Depu-tados. Além de fotos de jornais, é forma-da por imagens inéditas preservadas pelafamília, documentos originais, um ví-deo com entrevistas e objetos pessoais deRubens Paiva.

“Nosso propósito com esta exposição,ainda mais do que refletir sobre o perí-odo da ditadura, é recuperar a memórianacional, apagada ou distorcida pelos‘anos de chumbo’. Rubens era represen-tante da burguesia, um sujeito de bemcom a vida, mas engajado. Com seudesaparecimento, também tornou-seuma figura emblemática do período. Porisso, procuramos revelar seu lado huma-no com esse trabalho”, explica o jorna-lista e pesquisador Vladimir Sacchetta,curador da exposição.

184 desaparecidosNão tens Epitáfio Pois és Bandeira –

Rubens Paiva, Desaparecido desde 1971foi aberta à visitação no Memorial daResistência em fins de março, mas co-meçou a ser montada muito antes. Naverdade, com outra exposição e depoiscom um livro. Em 2009, Sacchetta jáhavia organizado no local a exposiçãoMarighella, rememorando os 40 anos doassassinato de Carlos Marighella, comcartas e materiais inéditos, textos do pró-prio guerrilheiro, imagens de arquivo,iconografia variada e vídeo com depoi-mentos de pessoas que o conheceram.

No ano seguinte, o jornalista tam-bém coordenou a publicação do livroHabeas Corpus – Que se Apresente o Cor-po, lançado pela Secretaria de DireitosHumanos da Presidência da República.Além de contar o caso dos 184 desapare-cidos durante o regime que ainda nãotiveram suas situações bem esclarecidasou seus corpos encontrados, a obra ain-

da traz um capítulo sobre Rubens Paiva.Por meio deles e com a ajuda de PauloVannuchi, então Ministro dos DireitosHumanos, acabou se aproximando dafamília Paiva, que se interessou em rea-lizar uma exposição sobre Rubens.

“Durante alguns dias, praticamenteacampei no apartamento do Marcelo”,conta Sacchetta, referindo-se ao tempoque passou na casa do escritor e jornalis-ta Marcelo Rubens Paiva, filho de Ru-bens, vasculhando documentos e obje-tos antigos e procurando fotos. O mate-rial fornecido pela família foi essencialpara a montagem da exposição. Assimcomo a consulta aos arquivos de jornaisdo período, especialmente o Correio daManhã e Última Hora.

“Foi nos materiais desta, que estãono Arquivo Público do Estado de SãoPaulo, que consegui informações e fo-tos, como a de Rubens na CPI do Ibad”,lembra o curador.

A lembrança remete à meteórica tra-jetória parlamentar de Rubens Paiva.Eleito deputado federal em outubro de1962, tomou posse em fevereiro do anoseguinte, chegando a liderar a bancadagovernista, e foi um dos primeiros de-putados a ter o mandato cassado, oitodias após o golpe militar, em abril de1964. Em pouco mais de um ano noCongresso Nacional, ele teve participa-ção marcante na CPI sobre o InstitutoBrasileiro de Ação Democrática, quepromovia propaganda anticomunista econspirava pela derrubada do Governode João Goulart.

As investigações descobriram que oGoverno dos Estados Unidos financiavapalestras e autores via Instituto contra oque chamavam de “ameaça vermelha”.Tanto que, em 1962, o Ibad financiou ascampanhas de 250 candidatos a deputa-do federal, 15 a senador e outros 600 can-didatos a deputado estadual. Somentenaquele ano a organização teria movi-mentado cerca de 20 milhões de dólares,financiados com dinheiro de empresascomo Shell, Coca-Cola, Bayer e IBM, emsuas atividades conspirativas. Por contados esforços de Rubens Paiva e de outrosparlamentares, o Ibad e seu braço eleito-ral, a Ação Democrática Popular-Adep,foram dissolvidos pela Justiça em dezem-bro de 1963. Mas o troco não tardou.

Com os passos monitoradosRubens Paiva tinha seus passos moni-

torados muito tempo antes de sua morteou mesmo da época em que foi deputa-do e militante do Partido TrabalhistaBrasileiro (PTB). De 1951 a 1953, ele seengajou na campanha O petróleo é nos-so, pela criação da Petrobrás. Os milita-res sabiam muito bem disso. Em 1954,foi eleito Vice-Presidente da União Esta-dual dos Estudantes de São Paulo-UEE-SP e ingressou no Partido Socialista Bra-sileiro. Também estavam por dentrodessas atividades.

Para surpresa de Sacchetta, quando foiao Arquivo Público do Estado de São Pau-lo pesquisar os documentos do antigoDepartamento Estadual de Ordem Polí-tica e Social-Deops, ele não encontrou

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Ocupando diversos espaços no Memorial da Resistência, a exposição Não tens Epitáfio Poisés Bandeira – Rubens Paiva, Desaparecido desde 1971, apresenta um acervo de fotos e

documentos sobre o empresário e ex-Deputado e um vídeo com depoimentos emocionados.

FOTOS FRANCISCO UCHA

5Jornal da ABI 365 Abril de 2011

nada. “Não há dúvidas de que os docu-mentos existiram. Mas a pasta dele estávazia. Foi tudo tirado de lá”, denuncia.

Durante os meses em que pesquisoupara a montagem da exposição, Sacchettacruzou informações com o também jor-nalista Jason Tércio, autor do recém-lan-çado Segredo de Estado (Editora Objeti-va), que reconstrói de forma literária al-guns momentos da vida e do drama ex-perimentado por Rubens Paiva até seu de-saparecimento. Como o curador, o autortambém teve enormes dificuldades emconseguir a papelada de Paiva. Após pes-quisar mais de quatro anos para colocara obra no papel, Tércio percebeu quemuitos documentos foram removidos edestruídos, mesmo no Rio e em Brasília.O pouco que os dois encontraram, prin-cipalmente na forma de correspondência,fazia citação a muitos outros materiais,que simplesmente desapareceram. A ten-tativa de apagar o passado era nítida.

“Diante desse quadro e de tantas his-tórias desencontradas, a tentação deachar que o seqüestro e assassinato doRubens Paiva não passaram de um atoisolado, de um ato individual ou aleató-rio. praticado por agentes desprepara-dos, é muito grande”, alerta Sacchetta.

Para evitar interpretações equivoca-das, ele montou a exposição de forma adeixar clara a cadeia de comando por trás

das torturas e assassinatos. E contesta atese de que a morte de Paiva tenha sidoum infortúnio ou um acidente.

“No dia em que o pegaram na porta desua casa, o Ministro Márcio de SouzaMelo estava no local para comemorar os30 anos do Ministério da Aeronáutica.Também estava lá o Brigadeiro João PauloMoreira Burnier, que o Tércio identificano livro como Karlos Brenner. Figuras im-portantes e pegar um ‘terrorista’, um ‘co-munista’ importante era o melhor pre-sente que alguém poderia dar ou receber.”

Apaixonado pela História recentedesde que coordenou a publicação dacoleção Nosso Século, pela Abril Cultu-ral, em fins da década de 1970 e começode 80, Vladimir Sacchetta diz que en-controu na imagem gravada a melhormaneira de introduzir o visitante naexposição e quebrar a idéia de que se tratade uma mostra estática. Nele, antigoscompanheiros, amigos e familiares deRubens falam sobre ele, seu trabalho e ofatídico desaparecimento. Curto, mascontundente, o vídeo traz depoimentosde Marco Antônio Tavares Coelho, Plí-nio de Arruda Sampaio, Fernando Hen-rique Cardoso, Almino Affonso e dosfilhos Marcelo e Beatriz. Como tem emmãos horas de entrevistas com esses eoutros personagens, o plano do curadoré produzir em breve um documentário.

Página virada, não“Por causa dos vários debates que já

travei com o Jarbas Passarinho sobre operíodo de ditadura no Brasil, muitagente pensa que aquele período é umapágina virada da História. Não é coisanenhuma. Só pensa assim quem nãoteve um pai desaparecido em circuns-tâncias absurdas e sem qualquer escla-recimento. Virar a página como que-rem alguns não é matar a memória deleou fazer injustiça, mas alienar umanação inteira da possibilidade de ter umfuturo melhor, mais consciente e semtantos erros como no passado”, declaraMarcelo Rubens Paiva em seu depoi-mento. Como já contou em outrasoportunidades, o escritor considera oseqüestro de seu pai um divisor de águasna ditadura:

“Quando levaram meu pai, ficamos 24horas ali presos com os policiais. Todomundo que chegava era preso junto, umex-namorado da minha irmã Veroca, umamigo da Eliana. Cheguei a sair pela ja-nela para avisar a vizinha que o Rubenstinha sido preso e para ninguém ir emcasa. Àquela altura, não pensávamos queele podia estar sendo torturado barbara-mente. Não havia desaparecimentospolíticos naquela época, foi um dos pri-meiros casos. A prática do desapareci-mento político começou ali. E a gente

também não tinha muito medo porquesabia que ele não era terrorista.”

Uma morte, várias mortesEm quatro décadas, Rubens Paiva já

morreu várias vezes. Na verdade, nun-ca ficou comprovado onde, como ouquando aconteceu. Mas não faltaramteorias, versões e explicações. Uma dasmais verossímeis foi publicada em 1986pela revista Veja. Em entrevista à publi-cação, o médico Amílcar Lobo, que tra-balhava no Doi-Codi/RJ e freqüente-mente era chamado às pressas para aten-der presos políticos vítimas de torturas,disse que Paiva teria morrido ali mesmo.

“A primeira vez que o vi, percebi queestava roxo dos pés à cabeça e tinha hemor-ragias internas. Só dizia seu nome: Ru-bens Paiva. Disse aos oficiais que deveri-am levá-lo a um hospital imediatamen-te. Mas quando voltei, no dia seguinte,fui informado de seu falecimento.”

Confrontado com outra versão, se-gundo a qual Paiva tivera um colapsocardíaco após um soco ou golpe com umcano, Lobo surpreendeu-se: “Bofetada?Foi uma surra como nunca vi.”

Em 1986, novas versões. O entãoSuperintendente da Polícia Federal Ro-meu Tuma designou o Delegado CarlosRoberto Cardoso para investigar o caso.A conclusão foi de que Paiva teria sido

Na Embaixada da Iugoslávia vários políticos e jornalistas tiveram asilo. Na foto, da esquerda para a direita, estão D'Alembert Jaccoud, Almino Affonso, não identificado, Lycio Hauer, SalvadorRomano Losacco, a esposa do zelador da embaixada, Beatriz Ryff, Raul Ryff, Fernando Sant'anna, Amaury Silva, Lamartine Távora, Rubens Paiva, Maria da Graça Dutra, Silvio Braga, Benedito

Cerqueira. Agachados, da esquerda para direita, o zelador da embaixada, Deodato Rivera, a filha do casal iugoslavo, Maurílio Ferreira Lima. À direita, Rubens Paiva em sua prancheta.

Benedito Cerqueira entrega documentos a Rubens Paiva durante sessão da CPI do Ibad. À direita, o Presidente João Goulart recebe políticos para um café. Entre eles, Rubens Paiva (primeiro à esquerda).

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FOTOS DA EXPOSIÇÃO NÃO TENS EPITÁFIO POIS ÉS BANDEIRA

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morto nas dependências do Pelotão deInvestigações Criminais, no Rio. Masonde estaria o corpo? Lobo indicou olocal: uma praia do Recreio dos Bandei-rantes. O local foi escavado, vários frag-mentos de ossos encontrados, inclusiveum fêmur, que parecia humano. Mas olaudo do Instituto Médico Legal Afrâ-nio Peixoto e de pesquisadores da Univer-sidade Estadual do Rio de Janeiro ates-tou ser ossos de algum animal, o quegerou suspeitas do Procurador-GeralLeite Chaves, para quem os ossos teriamsido trocados antes dos exames.

Na mesma época, a ex-militante daVanguarda Popular Revolucionária InêsEtienne Romeu, que fora torturada na“Casa da Morte”, em Petrópolis, relatouque um de seus carcereiros, conhecidocomo Dr. Pepe, comentou que a mortede Paiva fora um erro e que ele teriamorrido ali mesmo. Também há rumo-res de que seus restos mortais estariamem algum cemitério, como o do Cajuou o de Inhaúma, ambos no Rio, ouforam jogados de algum avião sobre omar, prática comum com presos políti-cos no Brasil.

A mais recente versão é a do ex-Sar-gento do Exército Marival Dias Chaves,em 1999. Segundo ele, o corpo de Paivateria sido esquartejado, e os pedaços,enterrados ao longo da rodovia Rio-Santos.

Torturadores sem punição“A verdade precisa ser encontrada.

Não se trata de vingança pessoal. Meupai não era um terrorista. Voltava dapraia e foi preso em casa. Ele acreditavaem um conjunto de valores como jus-tiça, cidadania e por isso foi perseguidoe morto. Hoje não só ele não está enter-rado por sua família, como aquilo con-tra o que ele lutava não foi enterrado.É o Estado terrorista que não protege ocidadão. Que transforma o Brasil noúnico país que não puniu seus tortura-dores”, protestou durante o lançamen-to da exposição na Câmara dos Deputa-dos a psicóloga Vera Paiva, a filha maisvelha de Rubens e que atualmente é pro-fessora da Universidade de São Paulo-Usp, onde coordena o Núcleo de Aidsda instituição.

De fato, Rubens Paiva continua semum epitáfio. Mas sua bandeira está has-teada. Encontra-se em tramitação noCongresso Nacional um projeto quecria a Comissão Nacional da Verdade,organismo que deve apurar os crimes etorturas cometidos na ditadura e iden-tificar, de uma vez por todas, quem fo-ram seus praticantes. Um projeto noqual a própria Presidente Dilma Rousse-ff e a Ministra dos Direitos HumanosMaria do Rosário estão particularmen-te empenhadas. Elas sabem que punir osagressores será impossível. Todos foramanistiados. Mas conhecer o que realmen-te aconteceu durante aquele período éessencial para se construir uma novaconsciência nacional. Não à toa, já háquem defenda que a lei que deve insti-tuir a Comissão tenha um nome emble-mático: Lei Rubens Paiva.

Exilados em Santiago, no Chile, Rubens Paiva, Almino Affonso e Raul Ryff posaram para esta foto no final de 1969.

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Durante a reunião do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, que aconteceu em 10 de março de 1971 efoi presidida pelo Ministro da Justiça Alfredo Buzaid (ao centro), o Deputado Oscar Pedroso Horta (primeiro à esquerda)propôs que a discussão fosse pública. Mas o Conselho acabou adiando a decisão para, mais tarde, arquivar o processo.

Num cenário que incluiu um fusca incendiado, os órgãos de repressão tentaram forjar o que teria sido uma fugaespetacular de Rubens Paiva. Tudo isso para encobrir o seu assassinato nos cárceres da ditadura.

FOTOS DA EXPOSIÇÃO NÃO TENS EPITÁFIO POIS ÉS BANDEIRA

7Jornal da ABI 365 Abril de 2011

JORNAL DA ABI – O QUE O MOTIVOU A

ESCREVER E LANÇAR, JUSTAMENTE AGORA, O LI-VRO SEGREDO DE ESTADO? E POR QUE A ES-COLHA DESTE TÍTULO?

Jason Tércio – O tema dos desapareci-dos políticos tem sido cada vez mais dis-cutido há alguns anos, mas pouco se sabeda vida dessas pessoas, qual a sua militân-

cia política, o que fi-zeram, como e porque morreram demaneira tão brutal.No caso de RubensPaiva, mesmo asgrandes reportagenssó enfocavam a his-tória do desapareci-mento e em poucaslinhas se dizia que eletinha sido empresá-rio, deputado federale vice-presidente deuma CPI. Então, eu re-solvi descobrir quemfoi Rubens Paiva ecomo tudo aconte-

ceu. Ele tinha uma trajetória política lon-ga e interessante. Comecei a trabalhar nolivro há quatro anos e meio, sem prazo praterminar. O lançamento agora, nos 40

POR PAULO CHICO

Livro do jornalista Jason Tércio, com baseem ampla pesquisa histórica, recupera dados

e revela fatos da história do ex-Deputado,cujo desaparecimento constitui um dosmaiores exemplos das arbitrariedades

cometidas pelo regime militar no Brasil.

Já se passaram quase três décadas desde o fim da ditadura militar noBrasil. Por isso mesmo, talvez cause tanta surpresa e indignação o fato deque muitas tristes páginas desse sombrio período ainda não foram vira-das. Sequer foram passadas a limpo. Um desses episódios trata da vida deRubens Paiva, que, em um dia de 1971, foi tirado de sua casa para supos-tamente dar um depoimento de rotina. Foi para a delegacia dirigindo opróprio carro. Deixou a esposa e os cinco filhos. Nunca mais voltou.

A trajetória do ex-Deputado – pai do escritor Marcelo Rubens Paiva – é res-gatada por Jason Tércio em Segredo de Estado - O Desaparecimento de RubensPaiva, livro lançado pela Editora Objetiva. A obra, é claro, trata da carreira doengenheiro e político, seu despertar para a militância e suas ações em defesa daliberdade – que resultaram na sua prisão, tortura e desaparecimento.

“Espero com este livro ter dado uma pequena contribuição para osestudos sobre a ditadura, especialmente no capítulo sobre as vítimas fa-tais, que ainda é o mais obscuro”, diz Jason Tércio, jornalista autor de di-versos livros e com passagens por veículos como a BBC de Londres, o Jornaldo Brasil, O Globo e Movimento.

anos de seu desaparecimento e num mo-mento em que cresce de novo o debatesobre a ditadura, é mera coincidência.Aliás, o caso Rubens Paiva é cheio de co-incidências curiosas. O título do livro tema ver com o fato de que o desaparecimen-to não só de Rubens mas de todos os demaisfoi responsabilidade do Estado brasileirodurante a ditadura militar, como ficou ofi-cialmente reconhecido através de lei de1995. Mas a localização das ossadas conti-nua sendo um segredo, que só poderá ser es-clarecido com uma participação mais in-tensa do próprio Estado.

JORNAL DA ABI – COMO A FAMÍLIA DO

DEPUTADO REAGIU QUANDO SOUBE QUE VOCÊ

FARIA ESTE LIVRO, E QUAL A PARTICIPAÇÃO DOS

FAMILIARES, EM ESPECIAL DE MARCELO RUBENS

PAIVA, NA ELUCIDAÇÃO DE FATOS E FORNECIMEN-TO DE MATERIAL DE PESQUISA?

Jason Tércio – Eu não conhecia pessoal-mente ninguém da família, mas fui mui-to bem recebido. Todos foram muitoatenciosos e colaboraram fornecendomaterial de pesquisa e dando depoimen-tos. Ninguém interferiu em nenhumaetapa do trabalho, o que achei muito bom.O Marcelo, ao contrário do que saiu pu-blicado numa matéria sobre o livro, não

8 Jornal da ABI 365 Abril de 2011

fez nenhuma revisão, respeitou o estiloque adotei.

JORNAL DA ABI – VOCÊ USOU UMA LINGUA-GEM LITERÁRIA QUE INCLUI TRECHOS FICTÍCIOS.ISSO NÃO PODE CONFUNDIR O LEITOR QUE ES-PERA UM RELATO DE FATOS?

Jason Tércio – O livro foi escrito comoromance de não-ficção. Fiz pesquisadocumental e oral pra reconstruir umahistória real, mas usando técnicas narra-tivas de romance. Esse gênero foi disse-minado por Truman Capote, Tom Wolfe,Gay Talese, Norman Mailer etc. No Brasilse deu o nome de romance-reportagem,que não me agrada muito. A Lista de Schin-dler, do Thomas Keneally, também se en-caixa nesta categoria. Não foram eles queinventaram esse estilo. Dez Dias que Aba-laram o Mundo, publicado em 1920 pelojornalista John Reed, já misturava lin-guagem de romance e de reportagem pradescrever a Revolução Russa. É um gêne-ro que dispensa notas de rodapé e bibli-ografia. No meu livro, todas as situaçõese circunstâncias relacionadas diretamen-te a Rubens Paiva são absolutamente re-ais, foram baseadas em documentos e de-poimentos. As partes ficcionais são pou-cas, secundárias, e neste caso eu levei emconta a verossimilhança e a congruência.Não inventei situações do nada, ou iló-gicas. Uma coisa que nem todo mundoentende, principalmente quem não escre-ve literatura, é que ficção não é necessa-riamente a narrativa de algo que nuncaexistiu. Mesmo a ficção mais absoluta ousurrealista é quase sempre inspirada emsituações e pessoas reais. O que eu fiz foiuma recriação, a partir de informaçõesconcretas. Por exemplo, há no livro umareunião no apartamento de Violeta Arra-es em Paris, com a presença de CaetanoVeloso, Gilberto Gil, Vera Paiva, filha deRubens, e diversos exilados brasileiros. Éuma situação ficcional, mas verossímil econgruente, porque a Violeta recebiamuito essas pessoas. Por isso eu digo quenada no livro é rigorosamente ficção, esim recriação, reconstituição, o que nãoprejudica o seu valor histórico. Se alguémescrever um livro sobre a história da cri-minalidade nos Estados Unidos, teráobrigatoriamente que pesquisar A San-gue Frio, do Truman Capote, que temmuitas cenas ficcionais.

JORNAL DA ABI – EM SUAS PESQUISAS VOCÊ

LEVANTOU ALGUMA INFORMAÇÃO INÉDITA?HOUVE ALGUM DADO QUE, EM ESPECIAL, TENHA

LHE CHAMADO A ATENÇÃO?Jason Tércio – Eu consegui muitas in-

formações que corrigem erros importan-tes que saíram publicados na imprensa eaté em livros que abordam de passagemo caso. Esses erros não ocorreram porincompetência dos autores. É que naépoca ainda não havia disponibilidadedos documentos que eu obtive. A Histó-ria, de modo geral, está sempre sendoreescrita, na medida em que são encon-trados novos documentos ou novas in-terpretações. Meu livro também não estáisento de futuras reavaliações. Não te-nho a pretensão de ter escrito a obradefinitiva sobre o caso Rubens Paiva,

inclusive porque seus restos mortais nãoforam encontrados ainda. Mas alémdessas correções eu revelo diversos epi-sódios históricos inéditos: os bastidoresdo Congresso Nacional durante o golpede 1964; o asilo de políticos, inclusiveRubens, e jornalistas na Embaixada da Iu-goslávia em Brasília após o golpe; a fugade Darcy Ribeiro e Waldir Pires para nãoserem presos, num esquema rocamboles-co que teve ajuda decisiva de Rubens.Sobre a prisão e tortura de Rubens háinformações inéditas que consegui emum IPM (Inquérito Policial-Militar),com depoimentos detalhados confir-mando que ele começou a ser torturadona III Zona Aérea. Esse dado nunca foidevidamente avaliado. A III Zona Aéreanão era local de detenção e interrogatóriode presos políticos. Todos os presos do Cisa(Centro de Informação e Segurança da Ae-ronáutica) eram levados para a sede doórgão, que ficava no aeroporto do Galeão.Pelo que sei, Rubens foi o único levadopara a III Zona Aé-rea, a pedido do Co-mandante, o Briga-deiro João PauloBurnier. Tambémtive acesso a relató-rios do Dops sobreas atividades políti-cas de Rubens quan-do era deputado e deoutros opositoresdo regime militar. Um dado interessan-te foi a prova de que os órgãos de repres-são política tinham bons informantes nosSindicatos de Jornalistas.

JORNAL DA ABI – COMO FUNCIONAVA ESSE

ESQUEMA?Jason Tércio – Eu tenho dois informes

do Deops de São Paulo, de 1965. Reprodu-zo trechos no livro. É um documentoinédito. Inicialmente o informe dá osnomes de vários jornalistas “que se decla-raram abertamente contrários à Revolu-ção”. Um documento, que é datado de 10de fevereiro de 1965, diz o seguinte: “Ape-sar de não figurar oficialmente como di-retor da Última Hora, informa-se com bas-tante segurança que os dois nomes que nomomento mais influência e poder têmjunto àquela empresa são Rubens Paiva,para São Paulo, e Bocayuva Cunha, para oRio de Janeiro. Os dois elementos man-dam, orientam e são consultados paratodos os casos importantes”.

JORNAL DA ABI – GOSTARIA QUE FALASSE

UM POUCO DA CARREIRA POLÍTICA DE RUBENS

PAIVA. QUANDO ELA SE INICIOU? QUAIS FA-TORES O FIZERAM ENGAJAR-SE NA LUTA POLÍTI-CA? E A PARTIR DE QUAIS ATOS ELE SE TORNOU

UMA FIGURA TÃO PERIGOSA AOS OLHOS DOS

MILITARES?Jason Tércio – Rubens tinha a política

no sangue, desde a adolescência, quandoestudava no Colégio São Bento, em SãoPaulo. Na Universidade Mackenzie,onde estudou Engenharia, ele participouativamente do movimento estudantil,foi presidente do diretório acadêmico,fez parte da diretoria da União Estadualdos Estudantes, participou da campanha

O petróleo é nosso. O nacionalismo era a ide-ologia progressista da época e Rubens eradessa linha, fazia parte de um grupo queincluía Almino Affonso, Fernando Gas-parian, Plínio de Arruda Sampaio. Depois

de formado enge-nheiro ele se filiouao Partido Socialis-ta Brasileiro, ficouoito anos; quandodecidiu se candida-tar a deputado naseleições de 1962, setransferiu para oPartido TrabalhistaBrasileiro, que na

época era de centro-esquerda, com umagrande ala nacionalista liderada por Leo-nel Brizola. Os nacionalistas queriam ocrescimento e o fortalecimento da indús-tria nacional, a reforma agrária, mais in-vestimentos na educação, na saúde, mastudo dentro das regras capitalistas. Ape-sar disso, eram comparados aos comunis-tas pelos conservadores, e por isso Ru-bens também ficou na mira dos golpistasde 1964. Além de ser vice-líder do PTB eum dos deputados mais atuantes na de-fesa das Reformas de Base, ele tambémfoi vice-presidente da famosa CPI do Ibad(Instituto Brasileiro de Ação Democrá-tica), que investigou gastos ilegais doscandidatos de direita na campanha elei-toral de 1962, com dinheiro inclusive doexterior. Mais ou menos um mês antes dogolpe, Rubens protagonizou um episódioque o deixou mais marcado ainda. Ele en-frentou agentes do Dops numa rua emSão Paulo, quando eles tentavam prenderprofessores que participavam de umareunião da Frente de Mobilização Popu-lar. Foi uma cena dramática. Rubenspartiu pra cima deles, aos gritos, até sa-cou um revólver, e conseguiu evitar a pri-são de um casal que já estava dentro da vi-atura. Era comum o porte de armas pelosparlamentares, mesmo dentro do Con-gresso. Eu encontrei informações que sãoespantosas para os dias de hoje, o que mos-tra que em algumas coisas o Legislativomelhorou bastante.

JORNAL DA ABI – EM QUE CONTEXTO RU-BENS PAIVA TEVE SEU MANDATO CASSADO?COMO REAGIU AO FATO?

Jason Tércio – Ele foi um dos 40 depu-tados cassados na primeira lista, justa-

mente por ser do grupo nacionalista maisatuante e por ter tido uma participaçãofirme na CPI. Ele ficou muito frustradoe indignado, claro. Ser cassado no primei-ro mandato e apenas um ano e três me-ses depois de eleito é terrível, ainda maispra um idealista como Rubens. Além dacassação, ele e os outros corriam o risco deser presos. Por isso se asilaram na Embai-xada da Iugoslávia durante três meses e delá partiram para o exílio. Um dos momen-tos mais reveladores do estado de espíri-to do Rubens depois do golpe é uma cartaque ele escreveu aos filhos quando estavana Embaixada. É um documento como-vente do pai que não sabe quando vaipoder voltar pra casa e do político expli-cando o golpe militar para as crianças, quetinham de três a dez anos de idade.

JORNAL DA ABI – COM BASE EM SUA PES-QUISA, COMO DESCREVERIA O EXÍLIO? QUAIS

MARCAS AQUELA EXPERIÊNCIA DEIXOU EM RUBENS

PAIVA? IMAGINO QUE VOCÊ TENHA TIDO ACES-SO A DIVERSAS CARTAS DA ÉPOCA, ESCRITAS POR

ELE. O QUE HAVIA NELAS DE MAIS MARCANTE?Jason Tércio – Ele passou seis meses no

exílio, primeiro em Belgrado, com o gru-po de ex-políticos e jornalistas. Foi umaexperiência interessante, eles eram bemtratados pelas autoridades, moravam to-dos num hotel razoável, a Iugoslávia eraum país socialista democrático, com li-berdade de expressão e propriedade pri-vada, tinha rompido com a União Sovi-ética. Depois de alguns meses o grupo seseparou, Rubens e Bocayuva Cunha fo-ram pra Paris. Ele não escreveu muitascartas pra casa porque sua esposa, a Euni-ce, foi para lá e ficou quase o período tododo exílio com ele. Mas escrevia cartinhaspara as crianças e elas também escreviampara ele. A volta para o Brasil foi umaaventura que mostra bem a criatividadee a coragem de Rubens. Ele nunca foi de-tido no Brasil depois que voltou, mas eraconstantemente monitorado pelo Dops.

JORNAL DA ABI – GOSTARIA QUE FALASSE

UM POUCO DO LADO JORNALÍSTICO DE RUBENS

PAIVA. TAMBÉM NESSA ESFERA ELE ERA UM

COMBATIVO POLÍTICO?Jason Tércio – Na universidade ele re-

lançou um jornalzinho chamado FolhaMackenzista, no qual escrevia editoriaisassinados, como presidente do diretório.Depois de formado, mesmo já dirigindo

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UÇÃO

9Jornal da ABI 365 Abril de 2011

sua empresa de construção civil, Rubense Gasparian relançaram o Jornal de Deba-tes, que tinha sido fundado na década de1940 por Matos Pimenta, mas estava pa-rado. Rubens e Gasparian assumiram adireção do jornal em 1955 e apoiaram acandidatura de Juscelino Kubitschek àPresidência da República. A posição dojornal era bem nacionalista e tinha cola-boradores como Osny Duarte Pereira,Raymundo Magalhães Júnior, Gondin daFonseca, além do próprio Matos Pimen-ta. Outra experiência jornalística deRubens começou em 1965, alguns mesesdepois que ele voltou do exílio. Ele foidiretor da edição paulista da Última Hora.Mas, para evitar se expor, o nome dele nãoaparecia no expediente, só o nome doMúcio Borges da Fonseca, que era o quena época se chamava de Redator-Chefe.Na Chefia de Reportagem estava o Euri-co Andrade. Um dos repórteres era o ex-Deputado Marco Antonio Tavares Coe-lho, também cassado. Ele era do PartidoComunista e estava na clandestinidade,

só ia à Redação para levar suasmatérias. Mas o Dops sabiaque Rubens estava por trás dojornal. Um dia invadiram aRedação e prenderam um dosjornalistas. Depois disso o Sa-muel Wainer, dono do jornal,exilado em Paris, demitiu Ru-bens. Samuel queria manteruma linha de oposição mode-rada, pra evitar que o jornalfosse fechado. Rubens tam-bém tinha muitos amigos jor-nalistas, como Paulo Francis,Hélio Fernandes, CláudioAbramo, Sebastião Nery, RaulRyff e Antônio Callado.

JORNAL DA ABI – ANTES DA

PRISÃO QUE CULMINARIA COM

SUA MORTE, IMAGINO QUE TE-NHAM OCORRIDO DIVERSOS EM-BATES ENTRE RUBENS PAIVA E OS

MILITARES. COMO ELE SE COMPORTAVA DIANTE

DE AMEAÇAS E COERÇÕES?Jason Tércio – Não encontrei registro

nenhum ou informações orais sobre in-cidentes entre Rubens e as autoridades daditadura depois de cassado. A sua ativida-de principal era de empresário. Mas eleabrigava em sua casa perseguidos políti-cos e participava de reuniões com jorna-listas, ex-políticos e intelectuais de opo-sição. Provavelmente seu telefone eragrampeado, mas ele não foi incomoda-do, até porque atuava sempre às claras;essas reuniões não eram clandestinas.Quando foi preso, ele vinha montandoum dossiê com denúncias de corrupçãonas obras da Ponte Rio-Niterói, envol-vendo propinas, licitação fajuta e outrasirregularidades.

JORNAL DA ABI – O EPISÓDIO DA PRISÃO

ARBITRÁRIA DE RUBENS EM SUA PRÓPRIA CASA,EM 20 DE JANEIRO DE 1971, JÁ FOI DEVIDA-MENTE ESCLARECIDO? DE QUEM PARTIU A OR-DEM? HOUVE ALGUM EVENTO QUE TENHA SER-

VIDO DE ESTOPIM PARA AQUELA AÇÃO TÃO RA-DICAL DOS APARELHOS REPRESSORES?

Jason Tércio – Rubens foi preso numcontexto de uma escalada brutal da re-pressão, que começou, sintomaticamen-te, pouco antes das eleições parlamentaresde novembro de 1970, principalmenteno Rio. As Forças Armadas lançaramuma operação-arrastão com todos osórgãos de segurança. Houve centenas deprisões. Foram presos até advogados depresos políticos, como Heleno Fragoso eGeorge Tavares, os jornalistas de O Pas-quim, o cantor e maestro Erlon Chaves;enfim, gente que não tinha militância deesquerda. A ordem de prisão do Rubenspartiu do Cisa, o Centro de Informaçõesde Segurança da Aeronáutica, depois queduas mulheres foram detidas no Galeão,procedentes do Chile, trazendo cartas deexilados brasileiros, duas delas para ele.O que prejudicou muito a situação delefoi uma coincidência grave: quatro diasantes da prisão das duas mulheres, 70presos políticos tinham sido libertadospelo Governo e embarcado para o Chile,em troca da libertação do Embaixadorsuíço Giovanni Bucher, seqüestrado pelaVPR (Vanguarda Popular Revolucioná-ria). As duas mulheres não tinham ne-nhum envolvimento com política. Umatinha ido visitar o filho que estava exiladoem Santiago havia muito tempo, e nemele era da luta armada. A outra mulher eracunhada desse rapaz. Mas os agentesestavam procurando os seqüestradoresdo Embaixador e deduziram que Rubens,como destinatário de duas cartas, teriaconhecimento ou mesmo envolvimentocom eles. Ele ia de vez em quando ao Chile,porque entre os muitos exilados brasilei-ros que estavam lá havia amigos seus,como Almino Affonso e Darcy Ribeiro.

JORNAL DA ABI – ACREDITA QUE ESSA AÇÃO,DESDE O INÍCIO, PREVIA A SUA EXECUÇÃO? OU

SUA MORTE OCORREU DEVIDO A ‘EXCESSOS’ DU-RANTE AS SESSÕES DE TORTURA? ALIÁS, CONSE-GUIU ELUCIDAR AS CIRCUNSTÂNCIAS DA MORTE

DE RUBENS?Jason Tércio – É difícil saber o que se

passa na cabeça de um torturador, masgeralmente ele é uma pessoa de tempera-mento violento que sente algum prazersádico no sofrimento físico dos outros.Não está somente cumprindo um dever.Ele gosta disso. E alguns presos políticoseram odiados porque faziam parte com-provadamente da luta armada, e nessecaso não bastava aos torturadores obte-rem informações; eles queriam destruira pessoa, no sentido psicológico e tam-bém físico, matar mesmo. Foi o que fize-ram com o Mário Alves, que desapareceudepois de morto também no Doi-Codi doRio. A morte do Rubens pode não ter sidouma execução deliberada, mas qualquerum sabe que agressões muito violentasnuma pessoa durante várias horas podemmatar. Então, trata-se de um homicídiodoloso. Ele começou a ser torturado na IIIZona Aérea. As duas mulheres ouviram gri-tos desesperados e viram Rubens com es-coriações e abatido. No Doi-Codi ele foivisto agonizante pelo médico AmílcarLobo poucas horas antes de morrer.

JORNAL DA ABI – HÁ ALGUM NOVO INDÍ-CIO SOBRE O DESFECHO DADO AO CORPO DO

EX-DEPUTADO?Jason Tércio – Depois que descobri sete

versões para o destino do corpo de Ru-bens – todas estão no epílogo do livro –,eu resolvi não investigar nenhuma. Seriaum trabalho à parte, me desviaria do meufoco principal. Buscar a ossada seria umatarefa complexa e demorada, envolveriaMinistério Público, entidades de direitoshumanos, uma logística operacional euma exposição midiática que eu nãoqueria. Mesmo se eu encontrasse um ex-torturador do Doi-Codi que dissesseonde o corpo foi enterrado, eu correria orisco de conseguir apenas mais uma ver-são. Aprendi que não se deve acreditartotalmente nas versões contadas por ex-agentes da repressão. Eu não acredito, porexemplo, na versão de que Rubens foiesquartejado na casa de Petrópolis e osseus membros enterrados em diferenteslugares. Tenho uma hipótese sobre a ver-são mais provável, mas só vou dizerquando este assunto for retomado ofici-almente pelos órgãos competentes oupela Comissão da Verdade.

JORNAL DA ABI – O QUANTO A ESPOSA E AFILHA DE RUBENS, TAMBÉM DETIDAS, SOFRERAM

NA PRISÃO? QUAIS ATROCIDADES PRESENCIARAM

POR LÁ?Jason Tércio – A filha, Eliana, de 15

anos, passou 24 horas presa, não sofreunenhum abuso físico, mas foi interrogadacom a costumeira agressividade verbal eficou muito traumatizada. Eunice ficou12 dias, sofreu tortura psicológica, não adeixavam dormir, era acordada de madru-gada, incomunicável o tempo todo, nempôde trocar de roupa. E ouvia muitos gri-tos de dor o tempo todo. Talvez fossemtambém gravações pra aterrorizar os pre-sos. Os agentes queriam que ela falassequem freqüentava a casa, quem eram osamigos de Rubens, como se ele fosse umperigoso subversivo. Em suma, a morte edesaparecimento de Rubens, mais a pri-são de sua mulher e da filha, são o episó-dio mais simbólico do grau de intolerân-cia e ódio político da ditadura brasileira.

JORNAL DA ABI – COMO A FAMÍLIA, E A

PRÓPRIA IMPRENSA, SE COMPORTOU DIANTE DA

VERSÃO DE QUE RUBENS PAIVA HAVIA ‘DESAPA-RECIDO’ APÓS TER SIDO RESGATADO POR GUER-RILHEIROS, ENQUANTO AINDA ESTAVA NAS MÃOS

DOS MILITARES?Jason Tércio – Eu argumento no livro

que a própria publicação da notícia, ape-nas três dias depois da prisão de Rubens,foi a prova maior de que tudo não passa-va de uma farsa. Toda a imprensa cario-ca publicou com grande destaque nasprimeiras páginas o suposto resgate delepor guerrilheiros que teriam atacado ocarro com agentes que o estariam trans-portando. Os jornais de São Paulo deramsó pequenas notas. Se a fuga tivesse sidoverdadeira, a notícia seria obviamentecensurada. Imagine, um preso político,ex-Deputado, fugir assim, espetacular-mente. O Doi-Codi ficaria desmoraliza-do e a guerrilha se sentiria fortalecida.Houve muitas outras contradições que re-

Avenida Delfim Moreira, 80, noLeblon, Rio de Janeiro. Este era

o endereço onde morava ocasal Rubens Paiva e Eunice

(página ao lado) com seusfilhos. Um deles, Marcelo,

aparece ao lado do pai nestafoto feita em frente à casa.

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10 Jornal da ABI 365 Abril de 2011

velavam a farsa, masmesmo assim o I Exérci-to, o STM (Superior Tri-bunal Militar) e o Mi-nistério da Justiça insis-tiram nessa versão paraimpedir qualquer inves-tigação sobre o caso. Oadvogado contratadopela família, Lino Ma-chado, chegou a impetrardois habeas corpus noSTM pra obter informações e uma justi-ficativa oficial para a prisão. O Conselhode Defesa dos Direitos da Pessoa Huma-na foi acionado por um de seus membros,o Deputado Pedroso Horta, representan-te do partido da oposição, o MDB, mas oConselho era vinculado ao Ministério daJustiça e o Ministro, Alfredo Buzaid, ti-nha o voto de minerva e arquivou o pe-dido de investigação. Tudo isso foi noti-ciado. Mas a partir do momento em queo STM arquivou o segundo pedido de ha-beas corpus, a imprensa foi proibida decontinuar divulgando o assunto. Os dis-cursos dos deputados da oposição noCongresso pedindo esclarecimento tam-bém foram censurados na íntegra. Oúnico artigo publicado sobre o caso naépoca foi do Tristão de Athayde, pseudô-nimo do Alceu Amoroso Lima. Um mêsdepois do desaparecimento, quando o as-sunto ainda não tinha sido vetado pelacensura, ele publicou na sua coluna noJornal do Brasil um texto bem corajosoexigindo explicações ao Governo.

JORNAL DA ABI – EM QUE MEDIDA OS JOR-NAIS DA ÉPOCA CONSEGUIRAM DRIBLAR A CEN-SURA E DENUNCIAR O CASO?

Jason Tércio – Não conseguiram. Nãohavia censura direta nos grandes jornais,com presença de censores nas Redações,mas os editores recebiam telefonemas eordens escritas pra não publicarem deter-minados assuntos ou mencionarem cer-tos nomes. Na época, a imprensa estran-geira foi que publicou as matérias maisextensas e opinativas sobre a morte deRubens. O New York Times, o WashingtonPost, o Times inglês, a Newsweek, a L’Expressfizeram reportagens denunciando o casocomo emblemático da crescente repres-são política no Brasil.

JORNAL DA ABI – EM QUAIS ASPECTOS OASSASSINATO DE RUBENS PAIVA SE ASSEMELHA

OU DIFERENCIA DE OUTRAS EXECUÇÕES DA ÉPO-CA, QUE TAMBÉM TIVERAM GRANDE REPERCUS-SÃO, COMO A DE STUART ANGEL, FILHO DA

ESTILISTA ZUZU ANGEL?Jason Tércio – A principal diferença é

que Stuart Angel e os demais desapareci-dos durante a ditadura eram todos mili-tantes da guerrilha ou do PCB, que nãoaderiu à luta armada. Eu discordo da tesede que foi a luta armada que desencadeoua reação violenta do regime. Mesmo senão tivesse havido guerrilha, os defenso-res da oposição pacífica e institucionalque fossem para as ruas seriam presos eespancados. A violência, de diversos ti-pos, começou logo depois do golpe, enunca parou. Rubens também era um de-fensor da via pacífica, não pertencia a ne-

nhuma organização deextrema-esquerda, nãoera um clandestino. Ti-nha endereço fixo, eradiretor de uma empresa,ia trabalhar todo dia noCentro da Cidade, rece-bia amigos socialmenteem casa. Os seis agentesinvadiram sua casa ale-gando que ele iria prestarum depoimento. Não ha-

via nenhuma acusação específica de “sub-versão”. Tanto que ele foi dirigindo seupróprio carro. Quanto às semelhanças damorte dele com outras de militantes, aprincipal é a fuga forjada. Quando as exe-cuções eram a tiros e o corpo era apresen-tado, os órgãos de segurança alegavamconfronto armado. Havia outras alega-ções – atropelamento, suicídio, ataquecardíaco. Mas quando ocultavam o cadá-ver, eles negavam que tinham prendido apessoa ou diziam que tinha fugido. Menosde um mês antes da falsa fuga de Rubens,um outro preso, Celso Gilberto de Olivei-ra, tinha “fugido” do mesmo Doi-Codi doRio, e desapareceu. Se acontecesse real-mente essa frequência de fugas, então oDoi-Codi seria o órgão de segurança maisincompetente do mundo, e corrupto,porque fuga de preso, ainda mais sob cus-tódia militar, só é possível com a cumpli-cidade e o suborno de agentes.

JORNAL DA ABI – PORQUE O ESTADO BRA-SILEIRO DEMOROU TANTO A RECONHECER SUA

RESPONSABILIDADE NO DESAPARECIMENTO DE

RUBENS? E PORQUE, QUANDO ISSO OCORREU,O FEZ DE MANEIRA TÃO TÍMIDA?

Jason Tércio – Realmente, todos os paí-ses da América do Sul que tiveram dita-duras já criaram Comissões da Verdade hámuito tempo, abriram arquivos, estãoinvestigando os desaparecimentos, jul-gando e punindo os culpados pelas atro-cidades, inclusive ex-Presidentes da Re-pública, sem nenhum terremoto ins-titucional, exceto as reclamações de pra-xe. Aqui no Brasil ainda se cria artifici-almente uma polêmica só com o envio doprojeto da Comissão da Verdade para oCongresso, mais de 25 anos depois do fimda ditadura. Esse cenário faz parte de umquadro mais amplo de atrasos que reve-lam como o Brasil é um país extrema-mente lento e complicado. Em outrasquestões fundamentais também estamosficando pra trás, já nem é em comparaçãocom o Primeiro Mundo, mas em compa-ração com outro países da América do Sul.No Índice de Desenvolvimento Huma-no estamos piores do que a Argentina, oChile e o Uruguai. No saneamento bási-co também. No uso da internet temosum percentual bem abaixo da Argentina.Na educação estamos abaixo da Argenti-na e do Chile. É estranho isso estar acon-tecendo num país com tanto potencialhumano e econômico. Falta ao brasilei-ro um pensamento mais objetivo, prag-mático e até a coragem para encarar osproblemas de frente, não escondê-losdebaixo do tapete. Nélson Rodriguestem uma frase boa sobre isso: “O serhumano só se salvará se reconhecer a sua

própria hediondez”. O Brasil tem maniade grandeza e vergonha ou medo de seolhar no espelho e admitir suas fraque-zas, encarar seus demônios e fantasmas.Dizemos que somos conciliadores, cor-diais, quando na verdade somos um dospaíses com mais homicídios no mundo,afora a violência policial. Já ouvi genteimportante e inteligente dizer que oBrasil vai ter a melhor Copa do Mundode todos os tempos, o que é um delírioufanista, enquanto muitas obras priori-tárias ainda nem começaram. Se os cri-mes da ditadura forem investigados comseriedade e firmeza, é claro que vai sem-pre haver reações de alguns militares, so-bretudo da reserva, e alguns civis. Eles têmtodo o direito democrático de se manifes-tar, mas não representam nenhum riscopara a estabilidade democrática. Talvezeles não saibam, mas a Guerra Fria aca-bou há mais de 20 anos anos, golpes mi-litares estão historicamente superados naAmérica Latina, inclusive porque os Esta-dos Unidos não apóiam mais esse tipo deestratégia, o comunismo já era, não servemais como pretexto pra discursos alarmis-tas, praticamente todos os mandantes dastorturas e mortes já morreram, e os ofici-ais militares que estão aí na ativa não ti-veram nada a ver com a ditadura. Eu atéacredito que a grande maioria deles gosta-ria que houvesse uma solução definitivapara esses esqueletos no armário.

JORNAL DA ABI – CONCORDA EM QUE ALEI DE ANISTIA FOI UM TIRO NO PÉ DA DEMO-CRACIA, QUE SE INSTALAVA DE VOLTA NA DÉCA-DA DE 1980, NA MEDIDA EM QUE IMPEDIU –E IMPEDE ATÉ HOJE – O PAÍS DE PASSAR A LIM-PO UM PASSADO DE ABUSOS,TORTURAS E EXECUÇÕES, E

PUNIR CRIMINOSOS? É NE-CESSÁRIO REVÊ-LA?

Jason Tércio – Qualquerlei pode e deve ser revista,alterada, de acordo com asnecessidades. Sempre foiassim em qualquer país.Até a Constituição brasi-leira de 1988 já teve inú-meras emendas. E a Lei daAnistia, é preciso enfati-zar isso, não foi resultado de um pactosocial amplo, não foi votada por umCongresso Nacional representativo dasociedade, foi imposta pela ditaduraquando ainda vigorava o bipartidarismoe muitas lideranças políticas estavam noexílio. Há quem diga que já se passoumuito tempo, que o questionamento daanistia para os agentes da repressão deve-ria ter sido feito nos primeiros anos devigência da lei. Mas naquela época qual-quer menção ao assunto era repelida comintransigência pelos chefes militares:“revanchismo não!” Hoje é possível sediscutir isso com a cabeça fria. No casodos desaparecimentos, a ocultação decadáver é um crime que não prescreve, deacordo com o Código Penal. Outro argu-mento contrário à revisão da Lei daAnistia é que não se deve ficar remexen-do no passado. Ora, isso é uma demons-tração daquilo que eu falei antes, a maniabrasileira de jogar a sujeira embaixo do

tapete, e também a nossa negligência paracom a memória histórica, o que é típicode país periférico. A não abertura dosarquivos da ditadura é decorrência dissotambém. Há quem diga que o Chile e aArgentina julgaram e condenaram atégenerais porque lá o número de vítimasera muito maior que no Brasil. Isso é umafalácia, porque exatamente quando setem menos vítimas é que deveria ser maisfácil esclarecer os crimes e julgar os cul-pados, com direito a ampla defesa, claro.No fundo, a lentidão nas investigaçõesdos crimes da ditadura tem a ver com acultura de impunidade que existe no Brasilhá muito tempo, desde bem antes da dita-dura. Aliás, os torturadores da ditadura doEstado Novo também não foram punidos.A controvérsia jurídica sobre a Lei daAnistia pode continuar, porque geralmen-te as leis permitem mais de uma interpre-tação, mas a busca dos desaparecidos e oesclarecimento de muitas mortes podeme devem ser acelerados. Só assim teremosum avanço na consolidação da democra-cia. Como disse a Michelle Bachelet, ex-Presidente do Chile, “só as feridas bem la-vadas cicatrizam”.

JORNAL DA ABI – VOCÊ COLABOROU DE

ALGUMA FORMA NA MONTAGEM DA EXPOSIÇÃO

EM CARTAZ NO MEMORIAL DA RESISTÊNCIA, EM

SÃO PAULO?Jason Tércio – O curador é Vladimir

Sacchetta. Ele é que organizou e montoutudo, com uma equipe de colaboradores.Eu apenas forneci alguns documentos einformações sobre fotos e outros mate-riais. A exposição está muito boa, tem umvídeo com imagens de Rubens, inclusive

no Congresso Nacionalquando ele era Deputa-do, depoimentos de fami-liares e amigos, fotos deleem diversos momentos elugares, reproduções dematerial jornalístico e dasua campanha eleitoral de1962, sua atividade parla-mentar e o exílio, docu-mentos dos órgãos de se-gurança falando dele, edocumentos sobre a luta

de Eunice na busca da verdade. A expo-sição vai ficar no Memorial até julho.

JORNAL DA ABI – SOB O PONTO DE VISTA

DA JUSTIÇA E CORREÇÃO HISTÓRICA, QUAL É AMISSÃO DE SEGREDO DE ESTADO?

Jason Tércio – O livro revela pela pri-meira vez a cadeia de comando responsá-vel pela morte e desaparecimento de Ru-bens Paiva, mostra como a cúpula do I Exér-cito, o Ministério da Justiça, o partido go-vernista na época (Arena), o SuperiorTribunal Militar e até o Presidente Médi-ci contribuíram para ocultar as circuns-tâncias da morte e desaparecimento deum cidadão inocente. Isso é um fato his-tórico, não tem nada a ver com essa boba-gem de revanchismo, que é um argumen-to absolutamente caduco. Espero com es-te livro ter dado uma pequena contribui-ção para os estudos sobre a ditadura, es-pecialmente no capítulo sobre as vítimasfatais, que ainda é o mais obscuro.

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OS “NÃO BASTAVA AOS

TORTURADORESOBTEREM

INFORMAÇÕES;ELES QUERIAM

DESTRUIR APESSOA, NO

SENTIDOPSICOLÓGICO ETAMBÉM FÍSICO,MATAR MESMO.”

“O LIVRO REVELAPELA PRIMEIRA VEZ

A CADEIA DECOMANDO

RESPONSÁVELPELA MORTE E

DESAPARECIMENTODE RUBENS PAIVA.”

11Jornal da ABI 365 Abril de 2011

O dia 16 de abril de 2010 marcou olançamento oficial da Campanha pelaMemória e pela Verdade, promovida pelaOrdem dos Advogados do Brasil-Seçãodo Estado do Rio de Janeiro-OAB/RJ,reclamando a abertura de arquivos se-cretos da ditadura militar (1964-1985).O objetivo é mostrar ao público que operíodo de exceção – marcado por cen-sura, prisões arbitrárias, tortura e execu-ções – não é uma página virada da His-tória, uma vez que ainda precisam seresclarecidos os lugares onde estão oscorpos de vítimas do regime. Um anodepois, é hora de fazer um balanço daação, fechar parcerias e conquistar ade-sões. Até o momento, mais de 30 milassinaturas foram recebidas pela Cam-panha, diretamente no site da OAB/RJ.

“O número de adesões correspondeuàs expectativas, pelo menos para a pri-meira etapa. Agora, o projeto, que seviabilizará com a parceria que estamosprestes a fechar, é envidar esforços con-juntos para a aprovação, pelo Congres-so Nacional, da Comissão da Verdade.Para isso, haverá nova Campanha e oaprimoramento das ações iniciadas noano passado”, anunciou o Presidente daOAB-RJU, Wadih Damous.

A parceria em questão será fechadacom a Ministra Maria do Rosário, da Se-cretaria de Direitos Humanos da Presi-dência da República-SDH/PR, e tam-bém com o Presidente da Comissão Es-pecial sobre Mortos e Desaparecidos Po-líticos, Marco Antônio Rodrigues Bar-bosa. Um encontro para a assinatura dotermo da nova Campanha, que inclui amobilização pela abertura dos arquivosda repressão, o apoio à aprovação daComissão da Verdade no Congresso,além do fortalecimento da campanhapromovida pela OAB-RJ, chegou a sermarcado para o dia 20 de abril, mas aca-bou adiado.

Um direito dos cidadãos“O direito dos brasileiros de conhecer

a sua História e saber a verdade está pre-visto no artigo 5º da Constituição. Paí-ses submetidos a ditaduras recentemen-te, na América Latina ou em outras par-tes do mundo, criaram suas comissões daverdade. Isso tem um sentido. O conhe-

forma completa enquanto essa páginanão for virada com dignidade. A atitudedo Procurador Militar conta com oapoio entusiástico da OAB do Rio de Ja-neiro e nos colocamos à disposição paraauxiliar nas investigações.”

Wadih lembra que a não investigaçãodos crimes de tortura no regime militaré uma atitude incompreensível, aindamais se compararmos com os exemplosda própria América Latina.

“Na Argentina essa questão já foienfrentada, no Uruguai e no Chile tam-bém. Em diversos países enfrentou-se apunição aos torturadores, a prisão dosditadores e não aconteceu nada demais.Não houve nenhuma perda institucio-nal ou risco de ruptura da democracia.Não consigo entender por que há tan-ta resistência no Brasil a essas investi-gações, sobretudo nessas novas geraçõesde militares, que não participaram da-queles atos de barbárie. Dar prossegui-mento às investigações seria bom, in-clusive, para a imagem das própriasForças Armadas”, destacou.

Desde seu início, a Campanha daOAB-RJ exibe filmes de 30 segundos,em canais de televisão e cinemas, com aparticipação de diversos artistas, comoFernanda Montenegro, Osmar Prado,José Mayer, Eliane Giardini e MauroMendonça. Os atores, que gravaram gra-tuitamente os depoimentos de apoio àCampanha, revivem histórias de mili-tantes e desaparecidos políticos do regi-me. “Será que essa tortura nunca vaiacabar?” é a frase lançada ao final dosdepoimentos.

Um hábito antigoA prática da tortura por parte de agen-

tes do Estado ainda é comum no Brasil.Casos ocorridos, por exemplo, em dele-gacias e unidades prisionais são denun-ciados com freqüência pela mídia e porgrupos como o Tortura Nunca Mais. Econstituem um outro crime que enver-gonha o País, e precisa ser combatido.

“A tortura em delegacias e presídios é,no Brasil e em países que já passaram porditaduras, quase um velho hábito que sepropaga no rastro da impunidade e dafalta de controle do Estado. Há tambémsilêncio na sociedade quando se fala emdireitos humanos dos presos. Essa reser-va, às vezes explícita, outras camuflada,acaba se refletindo na ineficiência esta-tal em evitar ou coibir as agressões.”

Wadih Damous adianta que o Gover-no Federal trabalha na conclusão do pro-jeto que cria o Mecanismo Nacional deCombate à Tortura. “Ciente das dificul-dades que terá para aprová-lo no Con-gresso rapidamente, a Ministra da Secre-taria Nacional dos Direitos Humanos,Maria do Rosário, anuncia para junho aformação de um grupo com represen-tantes do Conselho Nacional de Justiça,da Câmara dos Deputados, da PastoralCarcerária e do Governo para fiscalizaras denúncias de torturas no sistema pri-sional. Desde já tem todo o nosso apoio.”

Ao completar um ano, a Campanha pela Memória e pela Verdade, promovida pelaOrdem dos Advogados do Brasil-RJ, ganha reforços e amplia seu foco, buscando saldardívidas históricas no campo dos direitos humanos acumuladas durante o regime militar.

POR PAULO CHICO

cimento do que aconteceu cria anticor-pos para evitar a repetição daqueles cri-mes. No Brasil, como a transição da di-tadura para o regime democrático foicontrolada pelo próprio regime autori-tário, muita gente que estava no poderainda ocupa importantes cargos públi-cos no presente. Os responsáveis porcrimes contra os direitos humanos nãoforam julgados. E até hoje não se sabe oque aconteceu com os desaparecidospolíticos”, disse Wadih Damous.

O Presidente da OAB-RJ chama a aten-ção para a importância da condenação doBrasil pela Corte Interamericana de Di-reitos Humanos da OEA (Organizaçãodos Estados Americanos), ocorrida em no-vembro de 2010, justamente pelo fato deo Estado brasileiro não ter investigadocrimes cometidos pelos militares nocombate à Guerrilha do Araguaia.

“Essa decisão da Corte Interamerica-na de Direitos Humanos ratifica tudoaquilo que a OAB do Rio de Janeiro vemdefendendo nos últimos quatro anossobre a anistia, o desrespeito aos direitoshumanos e os desaparecidos políticos. Adecisão deixa claro que a Lei de Anistianão se aplica aos torturadores e assassi-nos do regime militar, como sempre

defendeu a OAB-RJ. A Corte Interame-ricana mostrou, de forma clara e objeti-va, que a decisão do Supremo TribunalFederal, que reconheceu a anistia para ostorturadores, era errada.”

Um crime em andamentoOutro anúncio recente parece forta-

lecer a campanha pela abertura dos ar-quivos militares, a fim de promover ajustiça. Trata-se da decisão do Ministé-rio Público Militar do Rio de abrir inves-tigação sobre desaparecimentos de pes-soas durante a ditadura militar com aparticipação de agentes das Forças Arma-das. A tese defendida é que casos de de-saparecidos devem ser considerados se-qüestro em andamento até à localizaçãode eventuais restos mortais ou de evi-dências verossímeis de que as vítimasforam soltas ou mortas.

“Essa ação merece todo o apoio daOAB do Rio, por ser uma medida cora-josa, que vai no sentido contrário à visãode alguns, de que essas questões que en-volveram a repressão nos anos de chum-bo devem ser circundadas de sigilo. Oproblema dos desaparecidos é uma feri-da aberta na sociedade brasileira. Nossademocracia nunca será aperfeiçoada de

Wadih Damous: Parcerias para conquistar mais adesões para a campanha.

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12 Jornal da ABI 365 Abril de 2011

O Tribunal Federal deSan Martin, em Buenos Ai-res, condenou a pena de pri-são perpétua o ex-Generale ex-Presidente argentinoReynaldo Bignone (foto),acusado por atos de violaçãodos direitos humanos. Oex-ditador, de 85 anos, já ti-nha sido condenado anteri-ormente a 25 anos de prisão“por privação ilegal da li-berdade e torturas de pre-sos políticos”, cometidas durante o pe-ríodo da ditadura militar (1976-1983).

A Justiça condenou também, compenas de prisão perpétua, Luis Abelar-do Patti, ex-Prefeito da cidade de Esco-bar, o General da reserva SantiagoOmar Riveros e o ex-oficial de inteli-gência do Exército Martín Rodríguez.A condenação mais leve até o momen-to foi a de um ex-comissário de Escobar,Juan Fernando Meneghini, que vaicumprir seis anos de prisão. Já foramcondenados mais de 200 ex-dirigentesda ditadura na Argentina.

Bignone foi Presidente da Argentinade 1º de julho de 1982 a 10 de dezembrode 1983, quando foi substituído porRaul Alfonsín, primeiro Presidente elei-to em pleito democrático após o regimeditatorial. A eleição aconteceu depoisque a Argentina foi derrotada pela Grã-Bretanha na Guerra das Malvinas.

Um assassinoLuis Abelardo Patti, duas vezes Prefei-

to de Escobar, chegou a ser impedido detomar posse como deputado, por causadas denúncias de que foi o principal res-ponsável pelo assassinato do militante da

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Senado revoga as disposições que protegemos torturadores e matadores de presos políticos.

O projeto agora depende da Câmara dos Deputados,onde o Presidente José Mujica tem maioria.

Depois de um debate que duroumais de 12 horas, o Senado do Uruguaiaprovou o projeto de lei que revoga dis-posições essenciais da Lei de Anistia,conhecida como Lei da Caducidad. Avotação foi apertada, com 16 votos afavor da revogação e15 contra. Ao notici-ar a decisão, a BBC deLondres informou quea argumentação dossenadores que vota-ram pela alteração dalei é de que esta con-tém artigos que “vio-lam a Constituição ecarecem de valor ju-rídico”.

Especialistas con-sideram que a decisãovai favorecer o julgamento de policiaise militares acusados de cometerem cri-mes durante a ditadura militar no país,no período de 1973 a 1985. O texto ain-da depende de aprovação da Câmara e,depois, da sanção do Presidente José PepeMujica, que foi perseguido pelo regimeditatorial. A previsão é de aprovação doprojeto, já que a base parlamentar doGoverno é maioria na Câmara.

A decisão deverá acirrar a polêmicaem relação à Lei de Anistia, que é defen-dida pelos militares que ainda não res-pondem a processos judiciais, mas que apartir do momento em que a lei for san-cionada poderão ser julgados e punidos.

O ditador Reynaldo Bignone, de 85 anos, já sentenciadoa 25 anos de prisão, é agora condenado a prisão perpétua.

Informou a BBC que o resultado davotação no Senado foi comemoradopelos partidos que formam a FrenteAmpla, que apóiam a revogação da lei.

Quando acabou a votação, o SenadorRafael Michelini (foto) – um dos que apoi-

aram a alteração da lei– comemorou dizendoque esse era “um diahistórico”. Já o oposici-onista Luis Alberto La-calle disse que “vai seraberta uma discussãojurídica sobre essa me-dida a partir de agora”.

A Lei de Anistia, ouLei da Caducidad, quenos últimos anos temsido motivo de discór-dia, vigora no Uru-

guai desde 1986 e foi referendada emdois plebiscitos, o primeiro em 1989, osegundo em 2009.

Um dia antes da votação, 12 de abril,militares da ativa e da reserva distribu-íram um comunicado, com 1.200 assina-turas, informando que entrarão comação contra o Estado nos tribunais inter-nacionais – a Corte Interamericana deDireitos Humanos e a Corte de Haia.

Alegam os militares que os processosde crimes de lesa-humanidade são “arbi-trários e irregulares”. Entre as pessoascondenadas por esse tipo de crime está oex-Presidente Juan Maria Bordaberry,que cumpre prisão domiciliar.

Juventude Peronista Gas-tón Gonçalves. Patti foiacusado também do crimede seqüestro do ex-Deputa-do federal Diego MunizBarreto, morto em um aci-dente simulado.

O Tribunal Federal en-quadrou os delitos como“crimes contra a humani-dade” e pediu para revogaros benefícios existentes deprisão domiciliar para to-

dos os presos, decretando que cumpramsuas penas em prisões comuns.

O veredicto foi lido pela Presidente doTribunal, Lucila Larrandart, que tambématuará como magistrada do Tribunalpenal e é quem vai implementar a sen-tença e a transferência dos condenadospara a prisão. A Juíza ainda terá quedefinir se as prisões serão cumpridasimediatamente ou se vai aguardar quesejam contestadas pela defesa perante aCâmara Nacional de Apelações Penais.

Luis Abelardo Patti permanece inter-nado sob custódia na clínica particularFleni de Escobar, após sofrer um derramecerebral. O seu julgamento teve inícioem setembro de 2010. Além dos crimesjá citados, foi condenado por privação ile-gal da liberdade do ex-Deputado MunizBarreto e pelo desaparecimento de jo-vens estudantes, logo em seguida aogolpe militar de 24 de março de 1976.

Os juízes que condenaram o ex-Prefei-to Luis Abelardo Patti consideraram queele é também responsável por “tormentosagravados a vítima de perseguição políti-ca”, em referência ao seqüestro de MunizBarreto e a outros dois casos de desapare-cimento pelos quais foi condenado.

Rubens Paiva é bandeira dos desaparecidospolíticos brasileiros. Sua história de vida e mor-te resume a história de tantos brasileiros e brasi-leiras que morreram na luta pela liberdade.

Esta exposição lembra sua vida, sua infância,seu sorriso, seus momentos de amor com a fa-mília, suas lutas democráticas, o instante mons-truoso da prisão e assassinato, as farsas do aco-bertamento e da impunidade.

Como bem disse Ulysses Guimarães ao pro-mulgar a Constituição cidadã, em 1988: “O Es-tado autoritário prendeu e exilou. A sociedade,com Teotônio Vilela, pela anistia, libertou e re-patriou. A sociedade foi Rubens Paiva, não os fa-cínoras que o mataram”.

É um direito da sociedade brasileira saber averdade sobre Rubens Paiva e demais mortos edesaparecidos políticos. É imperativo para o Es-

tado resgatar essa dívida para com a sociedade ecompletar a transição à democracia, como pro-põe o Projeto de Lei 7376/2010 que cria a Comis-são Nacional da Verdade, em tramitação na Câ-mara dos Deputados, onde um dia brilhou Ru-bens Paiva, cassado pelo regime militar em 1964.

A Rubens Paiva as nossas homenagens.Maria do RosárioMinistra de Direitos Humanos

TEXTO QUE ABRE A EXPOSIÇÃO NÃO TENS EPITÁFIO POIS ÉS BANDEIRA – RUBENS PAIVA, DESAPARECIDO DESDE 1971.

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13Jornal da ABI 365 Abril de 2011

Em declaração firmada no dia do seu 103º aniversário de funda-ção, 7 de abril, que é também, o Dia do Jornalista, a ABI sustentouque a melhor homenagem que se pode prestar à comunidade jorna-lística nessa data é a adoção da transparência na administração pú-blica e nas relações sociais, que dependem da verdade para avançosno campo material e espiritual. “Um importante progresso na trans-parência imposta pela Constituição Federal – diz a ABI – será a aber-tura dos arquivos da repressão da ditadura militar, como reclama aconsciência cívica nacional.”

A declaração da ABI tem o seguinte teor: “Neste 7 de abril em que se comemoram o Dia do Jornalista e o

103º aniversário de sua fundação, a Associação Brasileira de Imprensadirige uma saudação fraternal à comunidade jornalística do País ereafirma a sua disposição de lutar sem desfalecimentos pela adoçãoda transparência na administração pública e nas relações sociais, quedependem da verdade para avanços no campo material e espiritual.

Fundada em 1908 por Gustavo de Lacerda e um grupo de oito so-nhadores, a ABI afirmou-se ao longo deste século como uma insti-tuição devotada à defesa de valores essenciais para a convivência de-mocrática, como a liberdade de imprensa e de expressão, o respeitoaos direitos humanos e a adoção de princípios e políticas que con-duzam ao crescente bem-estar social. Esse é o legado transmitido àCasa por seus maiores, como o próprio Gustavo de Lacerda, Dun-shee de Abranches, Raul Pederneiras, Herbert Moses, Danton Jo-bim, Prudente de Morais, neto, Barbosa Lima Sobrinho e FernandoSegismundo, que a governaram em diferentes momentos dos 103anos decorridos desde a sua fundação.

Considera a ABI que as reflexões que esta data inspira apontampara a necessidade de adoção da transparência na vida nacional comouma imposição da Constituição da República, que a estabeleceu comoum dos princípios básicos da gestão do Estado e da condução da vidasocial. Um importante progresso na transparência imposta pelaConstituição Federal será a abertura dos arquivos da ditadura mili-tar, como reclama a consciência cívica nacional.

Para a comunidade jornalística, uma das manifestações necessá-rias e eficazes dessa transparência será a revelação da documenta-ção contida nos arquivos da repressão política imposta à Nação peladitadura militar que se abateu sobre o País entre 1964 e 1985 e queroubou a vida de inúmeros jornalistas, como Vladimir Herzog, Jai-me Amorim Miranda, David Capistrano da Costa, Orlando BonfimJúnior, Walter Pontes e muitos outros sobre os quais não há infor-mações sobre as circunstâncias de sua morte e o destino dado aosseus corpos. É com saudade e a lembrança de seu sacrifício que a ABIexalta mais um Dia do Jornalista.

Rio de Janeiro, 7 de abril de 2011Maurício Azêdo, Presidente.”

A declaração firmada pela Casano dia do seu 103º aniversário.

A missa pela passagem dos 35 anos damorte da estilista Zuzu Angel, manda-da celebrar por sua família e amigos, foiapontada por sua filha Hildegarde An-gel como um ato de significação espe-cial: a de manter viva a memória da lutaa que ela se entregou, enfrentando ris-cos, entre eles o de perda da vida, peloestabelecimento do Estado de Direitono Brasil.

Durante a missa, celebrada no dia 14de abril na Igreja de São Paulo Apóstolo,em Copacabana, foi relembrada a como-vente oposição da estilista mineira con-tra a ditadura militar e sua defesa dosdireitos humanos. Além de HildegardeAngel, compareceram ao ato religiosoparentes e amigos, que acompanharamde perto a trajetória da homenageada.

Hildegarde, que é jornalista, destacoua importância do exemplo dado por ZuzuAngel contra o regime ditatorial:

“Todo mundo perde mãe, perde pai, enenhum sentimento é menor do que omeu. No entanto, meu sentimento pelaminha mãe ficou pequeno perto da gran-deza do exemplo dela e da importânciade a gente lembrar a sua luta. Então é porisso que eu insisto em realizar nas dataspontuais cerimônias lembrando minhamãe e meu irmão (Stuart Angel, persegui-do e morto por agentes do regime mili-tar), para que essa história não se repitaem nosso País.”

Presente ao evento, a jornalista LedaNagle sublinhou a necessidade de se va-lorizar a história de Zuzu: “A gente nãopode deixar essa luta se perder. Isso temque ser reafirmado, primeiro para quenunca mais aconteça e também para quea memória dessa mineira guerreira per-maneça viva”, afirmou a apresentadorado programa Sem Censura, da TV Brasil.

Família e amigos evocam o exemplo de luta da estilista mineira, mortahá 35 anos num simulacro de acidente forjado pela ditadura militar.

POR RENAN CASTRO

Renan Castro, estudante de Comunicação, é estagiárioda Diretoria de Jornalismo da ABI.

Coragem e lutaZuzu Angel engajou-se na luta contra

o regime militar no Brasil após o desapa-recimento de seu filho, Stuart Angel, em1971. Ele era militante político de esquer-da do MR-8 e foi preso, torturado emorto nas dependências de uma unida-de da Aeronáutica, no Rio de Janeiro.

Nos anos seguintes, a estilista passoua ser perseguida pelos militares devido àsua luta incansável para reencontrar ocorpo de seu filho. No dia 14 de abril de1976, Zuzu foi vítima fatal de um simu-lacro de acidente de carro na saída doTúnel Dois Irmãos, hoje rebatizado comseu nome. Somente em 1998 o acidentefoi reconhecido pelo Governo brasileirocomo um assassinato político, cometidopor uma articulação do regime militar.

Na missa, o Padre Paulo de Tarso, queconduziu a cerimônia, também falou so-bre a homenageada, exaltando seu papelcomo defensora da democracia e da jus-tiça: “Nós precisamos homenagear essasnossas pessoas, nossos heróis, porque gra-ças aos muitos indivíduos que derrama-ram seu sangue este País tenta construiro caminho da democracia e da liberdade.E Zuzu Angel tem o seu nome escritoentre esses cidadãos que lutaram nãoapenas pelos seus direitos, mas pelo direi-to de lutar pela justiça”.

No fim da cerimônia, em discursoemocionado, Hildegarde Angel falou so-bre sua dor e os momentos difíceis vividosna época da ditadura militar. Ela reafir-mou a importância de eventos deste cará-ter “para que não vejamos nossos filhosamanhã em situação parecida com a detantos jovens brasileiros cheios de sonhos,que se foram de uma maneira tão sórdida,tão bárbara”, disse Hildegarde, aplaudidade pé por todos os presentes à missa.

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14 Jornal da ABI 365 Abril de 2011

Beira a grosseira ironia o fato de umatelenovela que se passa durante o regi-me militar no Brasil correr o risco de tersua exibição censurada. A obra em ques-tão é Amor e Revolução, exibida desde odia 5 de abril, na faixa das 22h15min, noSBT, de segunda a sexta-feira. Comonunca antes visto na televisão brasilei-ra, o tradicional folhetim de amor entremocinho e mocinha, tão característicodo gênero, é transmitido em embala-gem de contundente formato histórico.Perseguições ideológicas, guerrilha, pri-sões arbitrárias, tortura e execuções.Tudo isso está lá. Pintado em cores sur-preendentes, de forte realismo.

Justamente por denunciar o regimede exceção promovido pelos militares apartir de 1964, com a derrubada do Pre-sidente João Goulart, Amor e Revoluçãologo atingiu grande repercussão, com apublicação de diversas matérias nosmais variados segmentos da mídia. Areação mais contundente não tardou ase apresentar. Um grupo de militares,provavelmente saudosos da censura re-tratada na novela, tentou proibir naJustiça a veiculação da obra.

Contudo, o Ministério Público Fede-ral arquivou o pedido de censura à nove-la, feito formalmente pela AssociaçãoBeneficente dos Militares Inativos eGraduados da Aeronáutica-Abmigaer,que organizara um abaixo-assinado nainternet, pedindo o veto imediato à his-tória de Tiago Santiago. Pela decisão daProcuradoria, não há elementos quejustifiquem a suspensão da exibição datrama, que segue no ar.

O abaixo-assinado, de autoria de JoséDella Vecchia, membro da Diretoria daAbmigaer, afirmava que o Governo fe-deral fizera um acordo com o SBT paraa exibição da obra. Em troca, o PoderPúblico agilizaria o processo de sanea-mento do Banco Panamericano, doempresário Silvio Santos, envolvido emescândalo no sistema financeiro. “Sen-

do assim, o efetivo das Forças Armadas,tanto da ativa como inativos e pensionis-tas, vem respeitosamente, através desseabaixo-assinado, como instrumentodemocrático, solicitar do MinistérioPúblico Federal providências em defesada normalidade constitucional, vista ocumprimento da lei de anistia existen-te. Nestes termos pede deferimento emcaráter urgentíssimo.”

“A novela é respeitosa”“Achei a iniciativa dessa associação

despropositada. Ela interessa apenas aoscriminosos, torturadores e assassinosque violaram as convenções de Genebranos chamados anos de chumbo. A novelaé respeitosa com as Forças Armadas, mos-trando inclusive oficiais democratas, afavor da legalidade. Em diversos trechos,há menções favoráveis aos militares,

evidenciando que nem todos participa-ram do golpe e da violenta repressão àoposição”, afirmou o autor, que temcomo colaboradores Renata Dias Gomese Miguel Paiva.

Além do realismo das cenas de prisãoe tortura, ao menos três outros aspectoschamam a atenção dos telespectadoresna produção do SBT. O primeiro deles éa cuidadosa reconstituição de época.Também merece destaque a trilha sono-ra, composta por clássicos da mpb, ver-dadeiros hinos de protesto e combate àrepressão. Assim, as cenas são embaladaspor canções como Alegria, Alegria, deCaetano Veloso, Domingo no Parque, deGilberto Gil, e Apesar de Você, de ChicoBuarque. Este último surge ainda na vozde artistas contemporâneos, como nagravação tão inusitada quanto raivosa daroqueira Pitty para Cálice. E na abertu-

ra que, ao som de Roda Viva, mostra jor-nalistas, estudantes e outros persona-gens sumindo em cena, numa alusão aosdesaparecidos durante o regime.

O encerramento de cada capítulotalvez seja o maior destaque da produ-ção. A exemplo do que já foi feito emnovelas de Manoel Carlos, na TV Globo,a ficção abre espaço para a realidade. Emdepoimentos gravados na primeira pes-soa, isto é, sem dramatização, cidadãosdas mais diversas origens contam suasexperiências políticas pessoais nas déca-das de 1960 e 1970. Há, por exemplo,relatos emocionantes de pessoas queforam torturadas ou de pais que aindahoje choram o assassinato de seus filhosnos porões da ditadura. Há também aparticipação de personalidades políticas.No dia 20 de abril foi exibido o depoi-mento gravado por José Dirceu, líder es-tudantil nos primeiros anos do regime.Emocionado, o ex-Deputado fala sobrea cirurgia plástica a que se submeteu paramudar sua fisionomia e poder voltar aoBrasil após um treinamento de guerri-lha em Cuba.

A História esquecida“Vamos contar a História do Brasil

em uma época de muita turbulência,mas que está praticamente esquecidaou é desconhecida pelas novas gerações.Essa é uma novela instigante, que vaidespertar no telespectador a vontade deacompanhar um tema nunca debatidoe exibido nas telenovelas. O espaço dosdepoimentos na novela não é só da es-querda, está aberto a todos os segmen-tos da sociedade. Quem se sentir preju-dicado, pode nos procurar que terá omesmo espaço para responder”, apres-sou-se em esclarecer Reinaldo Boury,diretor da novela.

Ao propor um retrato quase docu-mental de um conturbado período his-tórico, e contar com atuação de atoresexperientes como Jayme Periard, Reinal-do Gonzaga, Gabriela Alves, CláudioLins, Lúcia Veríssimo, Marcos Breda,Licurgo Spinola, Graziela Schmitt, Fá-tima Freire, Antônio Petrin, Nico Puig,Cláudio Cavalcânti, Mário Cardoso eFábio Villa Verde, Amor e Revolução, aomenos em sua fase inicial, despertoumais a atenção da mídia do que dos teles-pectadores – registra índices apenas ra-zoáveis de audiência. Mas a crítica espe-cializada não tem poupado a produção.Para alguns, há pesquisa histórica desobra, mas falta dramaturgia à novela.

‘Rosário de clichês”Há quem identifique no texto um

rosário de clichês e frases de efeito derevolucionários esquerdistas da época, oque, por vezes, dá um ar tanto quantoartificial às interpretações. De qualquerforma, o fato é que Amor e Revoluçãocutuca feridas ainda não cicatrizadas naHistória recente do Brasil, com placidezestética, é bem verdade. Mas com mui-ta ousadia no conteúdo. Instiga os teles-pectadores, provoca o debate. E prova quepara todos os males a democracia há deser sempre o melhor remédio.

Em exibição no SBT, a novela Amor e Revolução, de Tiago Santiago, chama a atenção damídia ao expor as atrocidades da ditadura no Brasil. E provoca a reação imediata de parte demilitares que, descontentes com a forma como são retratados, tentam tirar a produção do ar.

POR PAULO CHICO

Nico Puig e Patricia de Sabrit num galpão de torturas: militares quiseram censurar a novela.

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15Jornal da ABI 365 Abril de 2011

JORNAL DA ABI - VOCÊ É UM AUTOR COM LAR-GA EXPERIÊNCIA EM TELEVISÃO E MUITAS OBRAS-QUE TENDEM MAIS PARA O GÊNERO FICCIONAL NO

CURRÍCULO. O QUE O LEVOU A DESENVOLVER AGORA

UMA TRAMA QUE, APESAR DE FICCIONAL, TRAZ EM-BUTIDA TAMANHA CARGA HISTÓRICA?

Tiago Santiago - Foi a percepção deque o tema rende ótima novela, por cau-sa da radicalização dos conflitos, a par-tir da instauração da ditadura militar.Estou acostumado a fazer pesquisa. Soubacharel em Ciências Sociais e tenhomestrado em Sociologia, pela Universi-dade Federal do Rio de Janeiro.

JORNAL DA ABI - QUAIS SÃO SUAS LEMBRAN-ÇAS DESSA ÉPOCA? SEUS FAMILIARES OU AMIGOS

CHEGARAM A SOFRER ALGUM TIPO DE PERSEGUIÇÃO?Tiago Santiago - Nasci em 1963. Lem-

bro de quando era criança, e o Costa e Sil-va morreu, e senti que meus pais nãogostavam dele. Cresci numa família declasse média, que tinha ojeriza pela di-tadura, apesar de ninguém ter se envol-vido na luta armada. Minha mãe era pro-fessora, e meu pai trabalhava como ge-rente de corretora de valores. Odiava nãopoder votar, enquanto via com inveja aseleições nos Estados Unidos e na Europa.Na época, não podíamos votar sequerpara governador ou prefeito. Fui votarpara Presidente em 1989, com 26 anos deidade. Em 1977, com 14 anos, levado pormeu irmão mais velho, Gerardo Santia-go, cheguei a freqüentar reuniões da Con-vergência Socialista. No teatro, comoator, também a partir desta época, come-cei a trabalhar com artistas como DinaSfat, Marília Pera, Ítala Nandi, Carlos Ve-reza, Domingos de Oliveira e outros, queajudaram a aprofundar minha visão crí-tica sobre temas como a falta de democra-cia, a ausência de garantias constitucio-nais, a censura e a repressão. Na verdade,queria fazer essa trama desde 1995. Es-tava na Globo quando propus a história,mas como não era autor, só colaborador,competia com quem era veterano.

JORNAL DA ABI - COMO FOI A RECEPTIVIDA-DE DO SBT À PROPOSTA DE SINOPSE QUE ABOR-DARIA ESSE PERÍODO TÃO DELICADO DA HISTÓRIA

DO BRASIL?Tiago Santiago - A receptividade foi

muito boa, excelente. Quando propus, che-guei a pensar que talvez não quisessem,por ser este um tema espinhoso e polêmi-co, que aborda feridas abertas, questões nãoresolvidas no Brasil, como a impunidadedos torturadores e assassinos, que violaramno Brasil as Convenções de Genebra; e oproblema dos mortos e desaparecidos.

JORNAL DA ABI - ACREDITA QUE EM OUTRAS

EMISSORAS A PRODUÇÃO TERIA SIDO APROVADA

NOS TERMOS EM QUE FOI APRESENTADA?Tiago Santiago - Sinceramente, não sei.

JORNAL DA ABI - ALÉM DA RECONSTITUIÇÃO

DE ÉPOCA, UM PONTO QUE CHAMA A ATENÇÃO É ATRILHA SONORA. COMO FOI FEITA ESSA SELEÇÃO?A PRODUÇÃO, OU VOCÊ MESMO, CHEGOU A EN-TRAR EM CONTATO COM OS AUTORES DAS MÚSI-CASS? ALGUM DELES JÁ TE DEU RETORNO SOBRE

O QUE ACHOU DA NOVELA?Tiago Santiago - A seleção foi feita pelo

Reynaldo Boury, diretor-geral; pelo Laér-cio Ferreira, diretor musical, e por mim.A produção entrou em contato com to-dos os artistas. Ainda não tive retorno doque estão achando sobre a novela.

JORNAL DA ABI – E COMO TEM SIDO A RES-POSTA DO PÚBLICO, TANTO EM TERMOS CONCRE-TOS, DE NÚMEROS DE AUDIÊNCIA, QUANTO EM MA-NIFESTAÇÕES DE APREÇO OU REPÚDIO À NOVELA?O PÚBLICO TEM ASSIMILADO BEM A VIOLÊNCIA DAS

CENAS DE TORTURA?Tiago Santiago - Fala-se muito sobre a

novela. Tenho tido retorno enorme demídia impressa e eletrônica. A audiênciaestá, por enquanto, com média 6, e picosde 10 pontos. Mas nossa expectativa é deque suba. Eu e o Boury resolvemos dimi-nuir o tempo das cenas de tortura, já quea violência brutal pode afastar os teles-pectadores mais sensíveis.

JORNAL DA ABI - ALGUNS ATORES, COMO

MARCOS BREDA E GABRIELA ALVES, FIZERAM

CENAS DE FORTE CARGA DRAMÁTICA. VOCÊ MAN-TÉM ALGUM CONTATO COM O ELENCO? O QUE OS

ATORES DIZEM SOBRE ESSA EXPERIÊNCIA?Tiago Santiago - Sim, tenho contato

constante com o elenco. Todos ficarammuito sensibilizados, a partir do workshoprealizado no início de janeiro, antes do co-meço das gravações. Na ocasião, os atoresouviram depoimentos de diversas pesso-as que participaram da luta armada.

JORNAL DA ABI - COMO VÊ O SURGIMENTO

DE MANIFESTAÇÕES CONTRÁRIAS À PRODUÇÃO, ATÉ

COM ABAIXO-ASSINADO PROMOVIDO POR MILITA-RES, QUE SE SENTIRAM ‘ATINGIDOS’, ESPECIALMENTE

PELA VIRULÊNCIA DAS CENAS DE PRISÃO E TORTU-RA? ELES, DE FATO, PRESSIONAM PARA QUE A NO-VELA SAIA DO AR?

Tiago Santiago - A censura é incons-titucional. O abaixo-assinado, promo-vido pelo site www.militar.com.br, édesinformado, pois coloca a Comissãoda Verdade como algo já criado. É tam-bém falso, porque vincula a novela coma questão do Banco Panamericano, sen-do que a proposta foi minha e não doSBT – e uma coisa nada tem a ver coma outra. É, portanto, infundada a tese deque a sua exibição faça parte de qualqueracordo da emissora com o Governo,para saldar dívidas da financeira. E tam-bém erra ao acreditar que a novela de-nigre a imagem dos militares, quandotenho um herói militar e vários perso-nagens militares a favor da legalidadee da democracia.

JORNAL DA ABI - O QUE ESSA REAÇÃO DOS

MILITARES REVELA SOBRE A SOCIEDADE BRASILEI-RA – E SOBRE A PERCEPÇÃO DESSE GRUPO SOBRE

OS ANOS DE CHUMBO?Tiago Santiago - Conheço vários mi-

litares que adoram a novela. Este grupodo abaixo-assinado representa uma pe-quena parcela que tem medo da revisãoda Lei da Anistia, com base nas Conven-ções de Genebra, que consideram a tor-tura como crime de lesa-humanidade,imprescritível pelas leis internacionais.

JORNAL DA ABI - TEME QUE ESSAS MANIFES-TAÇÕES COLOQUEM A OBRA EM RISCO, OU O OBRI-GUEM A FAZER ALTERAÇÕES NA TRAMA OU NO TOM

DAS CENAS?Tiago Santiago - Não tenho temor des-

ta espécie. A censura sobreviveu apenascomo classificação indicativa, com po-der de pressão sobre o horário a ser exi-bido, nada além disso.

JORNAL DA ABI - ACREDITA QUE AINDA HÁ

MUITO O QUE SE REVELAR SOBRE AS ATROCIDADES

COMETIDAS NO REGIME MILITAR? NESTE SENTI-DO, COMO VÊ A CAMPANHA PELA MEMÓRIA E PELA

VERDADE, PROMOVIDA PELA OAB?Tiago Santiago - Sim, acredito que há

muito a revelar ainda. Há a questão dosmortos insepultos, a tortura que nãoteve fim de familiares de desaparecidos...Pessoalmente, sou favorável à puniçãode torturadores e assassinos. Acho que acriação da Comissão da Verdade será umbelo passo adiante para cicatrizar essasferidas expostas. Toda iniciativa como ada OAB merece aplausos.

JORNAL DA ABI - DAQUI A ALGUNS ANOS, VOCÊ

GOSTARIA QUE AMOR E REVOLUÇÃO FOSSE LEM-BRADA COMO A NOVELA QUE...

Tiago Santiago - ... fez muito sucessoe emocionou o Brasil, chegando à lide-rança, com uma trama sobre a ditaduramilitar, no SBT, levando esta emissora ainvestir numa nova e brilhante fase denovelas brasileiras. Por enquanto, é so-nho. Mas pode se tornar realidade.

Autor de teatro, roteirista de cinema, ator, romancista e sociólogo.Muitas são as atividades de Tiago Santiago. Foi, porém, no ambiente datelevisão, como autor de novelas e séries, que este carioca de 48 anosconstruiu sua carreira. Fato curioso é que em boa parte de suas obras estáa marca registrada da ficção levada às últimas conseqüências, com tramasconduzidas por personagens que extrapolam o universo dos humanos. Foiassim em Vamp, exibida pela TV Globo em 1991, na qual trabalhou comocolaborador de Antônio Calmon. O mesmo ocorreu recentemente, em2008, na controvertida Os Mutantes, novela de sua autoria, repleta deefeitos especiais e exibida pela Rede Record.

Resgate histórico e perfil documental à parte, Amor e Revolução traz algumineditismo ao universo das telenovelas, mas está longe de significar umarevolução do gênero que fez a fama da televisão brasileira por aqui e pelomundo afora. O que conduz a história é uma releitura do amor impossívelde Romeu e Julieta, de William Shakespeare, na qual o mocinho pertence àsfileiras militares, enquanto a mocinha faz parte do movimento estudantil deesquerda. Será que o amor conseguirá sobreviver às divergências ideológicas?

“Por amor, a partir da metade da novela, ele deserta do Exército e sejunta a ela na luta armada. Assim, o casal passa a ser perseguido. É bomdizer que há violência na trama, mas também muito amor, muito beijo naboca”, conta Tiago Santiago, dando pistas de que, nesse aspecto, Amor eRevolução é um folhetim como outro qualquer. O contexto político, osabusos do regime militar e a luta armada são apenas pano de fundo paracontar uma história de amor. Um cenário que, ao menos neste início datrama, não se contenta em ficar tão na penumbra assim. E, em quase todosos capítulos, chega, despudoradamente, à boca de cena. Rouba a cena.Tiago Santiago falou sobre sua novela ao Jornal da ABI.

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16 Jornal da ABI 365 Abril de 2011

Uma exposição sob o título Registrosde Uma Guerra Surda, com centenas dedocumentos, fotografias e vídeos pro-duzidos durante o período da ditadurano País, entre 1964 e 1985, vai perma-necer aberta à visitação pública no Ar-quivo Nacional do Rio de Janeiro até 26de agosto próximo para oferecer à cida-dania amplo e minucioso painel daopressão que dominou a vida nacionalnaquele período.

A mostra reúne sumários informati-vos, fichas de polícia técnica, relatóriosde atividades dos cidadãos consideradossubversivos, fotos de atividades ditassuspeitas e pareceres da censura, além dedocumentação sobre as ações do Conse-lho de Segurança Nacional e a criação doServiço Nacional de Informações-SNI,da implantação do Doi-Codi (Destaca-mento de Operações de Informações-Centro de Operações de Defesa Interna)e de outros órgãos responsáveis pelacensura à imprensa e às artes.

“A exposição tem como objetivo tra-zer luz para um período conturbado denossa História recente, cujo conheci-mento e reflexão são de fundamentalimportância para o aperfeiçoamento dademocracia no Brasil, uma vez que amemória é um bem público que se en-contra na base do processo de constru-ção da identidade social, política e cul-tural de um país. Ao mesmo tempo,acredito que a exposição sugere e esti-mula o uso diversificado de fontes parareconstituição de fatos, localização deinformações, análise de contextos e deprocessos políticos e sociais”, analisaJaime Antunes, Diretor-Geral do Ar-quivo Nacional e Coordenador do Pro-jeto Memórias Reveladas.

Além da documentação oficial, a expo-sição exibe registros da resistência abran-gendo o que foi produzido pelos órgãos deimprensa e pelas organizações que se de-dicavam a combater o regime, mostrandoa realidade das prisões, as organizações daluta armada, o início do processo de aber-tura política, o retorno dos exilados e acampanha pelas eleições diretas.

“A exposição exibe uma gama varia-da de documentação, grande parte delaproduzida pelos órgãos de repressão;fotos de vigilância do SNI (carros de in-divíduos suspeitos de subversão; passe-

atas e lideranças estudantis); relatóriosde comícios em prol da anistia, deta-lhando palavras de ordem ditas pelopovo e os discursos de palestrantes docomício; jornais estudantis apreendi-dos; fotografias de aparelhos clandesti-nos invadidos pela polícia; panfletos degrevistas apreendidos; fotografias degreves e repressão às greves”, explicaViviane Gouvêa, Curadora da exposição,juntamente com Heliene Nagasava.

Entre os destaques da mostra estão ooriginal do Ato Institucional nº 5, pela

repressão incidiu sobre os movimentossociais:

“Isto pode ser observado através dosjornais estudantis apreendidos e alvo deproibição, como O Movimento; o parecerdo Ministro da Justiça Alfredo Buzaidjustificando a necessidade de censura in-cisiva junto aos meios de comunicação;um abaixo-assinado da Ordem dos Ad-vogados do Brasil exigindo que casos detortura, especificados e descritos nodocumento, sejam averiguados; o pró-prio Ato Institucional nº 5, que limitoubarbaramente as liberdades civis; foto-grafias da invasão do Congresso daUnião Nacional dos Estudantes-Une emIbiúna, em 1968, e da repressão às grevesno ABC em 1979.

A evolução do projetoHeliene Nagasava destaca que para

chegar ao formato em exibição ao públi-co o projeto da mostra foi ampliado:

“A idéia inicial era publicar a docu-mentação que estava sendo trabalhadatanto no Arquivo Nacional, como nasinstituições parceiras. Devido a mudan-ças no projeto, o Arquivo Nacional abra-çou a exposição, que tomou outros con-tornos; a quantidade de documentaçãoaumentou, assim como a temática queseria abordada. Para além da idéia inicialde mostrar a estrutura do SNI e dos ór-gãos que ditavam as diretrizes da seguran-ça nacional, passamos também a mostrara resistência pelos olhos das agências go-vernamentais, a propaganda institucio-nal e a censura aos meios de comunicação,e por fim, a abertura política.”

A documentação exposta ao públicoencontra-se sob a guarda do ArquivoNacional e dos demais parceiros doCentro de Referência das Lutas Políti-cas no Brasil (1964-1985) – MemóriasReveladas, composto por instituiçõespúblicas e privadas, criado pelo Gover-no Federal, sob a coordenação do Arqui-vo Nacional, com o objetivo geral de serum pólo difusor de informações conti-das nos registros documentais sobre aslutas políticas no Brasil nas décadas de1960 a 1980. Fontes primárias e secun-dárias são gerenciadas e colocadas àdisposição do público, incentivando arealização de estudos, pesquisas e refle-xões sobre o período.

Colaboraram para o acervo o Arqui-vo Histórico do Rio Grande do Sul, o

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Uma impressionante massa de documentos, recolhidos em vários Estados, oferece no Arquivo Nacionaluma visão ampla e minuciosa da repressão nos anos de chumbo e da resistência ao seu arbítrio.

POR CLÁUDIA SOUZA

primeira vez exposto ao público, a ata dereunião do Conselho de SegurançaNacional que determinou a aprovaçãodo Ato. As fichas de identificação desuspeitos, mapas e organogramas sobreo funcionamento de organizações clan-destinas, fotografias de “aparelhos” dasorganizações clandestinas invadidaspela Polícia, relatórios e fotos de vigilân-cia dos suspeitos e manuais de instruçãopara agentes da inteligência.

Informa Viviane Gouvêa que algunsdesses documentos mostram como a

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17Jornal da ABI 365 Abril de 2011

Entre 2006 e 2010, o Arquivo Nacio-nal atendeu a 8.508 requerimentos deconsulta ao acervo de documentos daditadura, que resultaram em 176.242cópias de documentos entregues aossolicitantes. Cerca de 400 mil registrosdocumentais já estão disponíveis paraconsulta no Banco de Dados do Memó-rias Reveladas, disponível no Portal doMemórias Reveladas (www.memoriasreveladas.gov.br*), no qual também épossível acessar e baixar conteúdo gra-tuito sobre o período da ditadura militar,como livros, vídeos e multimídias.

“É importante esclarecer, inicialmen-te, que um único registro no Banco deDados pode conduzir o pesquisador aum fundo documental composto porcentenas ou até mesmo milhares dedocumentos. O Banco de Dados Memó-rias Reveladas está sendo alimentadoprogressivamente. Não há como definiro volume de documentos ainda não dis-poníveis à pesquisa, pois o universo dedocumentos não está delimitado – nemsequer é de todo conhecido. Sabemos,contudo, que esse é um trabalho de fô-lego. A Rede Memórias Reveladas, geren-ciada pelo Arquivo Nacional, é compos-ta por mais de 50 parceiros, entre insti-tuições públicas e privadas. Para que setenha uma idéia do volume expressivodesses acervos, apenas o Arquivo Nacio-nal tem sob a sua guarda, tanto na sededa instituição no Rio de Janeiro comoem sua Coordenação Regional no Dis-trito Federal cerca de 17 milhões e 400mil páginas (aproximadamente 8 mi-lhões e 900 mil folhas) de documentostextuais, além de 1.363 mil metros line-ares de outros tipos documentais (como,por exemplo, fotografias e mapas), 220mil microfichas e 110 rolos de microfil-mes. Cabe ressaltar que a documentaçãosob a guarda do Arquivo Nacional estádisponível para consulta presencial ou à

O trabalho de pesquisa e de imagempara a montagem da exposição, que teveinício em meados de fevereiro de 2010,envolveu dezenas de pessoas:

“A curadoria da exposição foi forma-da por um grupo de seis servidores doArquivo Nacional. Por outro lado, asequipes de trabalho do Arquivo fizeramum levantamento do material textual,sonoro, iconográfico e filmográfico. Éimportante ressaltar que o mesmo tra-balho foi feito por cada parceiro quecedeu o acervo para a exposição. Após aconcepção de cada módulo, procuramosmapear que documentos e imagens po-deriam ser mais representativos em re-lação à documentação que estava sendoexposta pela primeira vez. A intenção erabuscar documentos que poderiam tra-zer um novo olhar sobre a História do

Arquivo Público Mineiro, os ArquivosPúblicos do Estado de São Paulo, do Es-tado do Rio do Janeiro, do Estado doCeará, do Estado do Maranhão e do Es-tado do Espírito Santo, o Departamentodo Arquivo Público do Paraná, o Centrode Documentação Arquivística da Uni-versidade de Goiás e o Centro de Docu-mentação e Memória da UniversidadeEstadual de São Paulo.

Informou Viviane que veículos decomunicação também contribuírampara a mostra:

“Recorremos aos acervos do jornalOpinião e do Pasquim, que fazem partedo acervo do Arquivo Nacional; do Jor-nal do Brasil, parceiro do projeto Memó-rias Reveladas; do Correio da Manhã,tanto em fotografias, que se encontramno Arquivo Nacional, como com capasdo jornal do acervo da Associação Brasi-leira de Imprensa. O Arquivo Nacionale a ABI realizaram há alguns anos umaparceria que resultou na digitalização departe do acervo dos jornais Correio daManhã, que se encontram sob formavirtual no Arquivo Nacional.”

período e instigar a população a discutirtemas como propaganda oficial, resis-tência à ditadura, monitoramento demovimentos sociais e violência, indiví-duos considerados suspeitos, e tortura”,assinala Heliene.

Paralela à exposição, está aberta aopúblico a mostra audiovisual com filmes,imagens de arquivo, curta-metragens,produções independentes e registrospessoais sobre temas como repressão,militância, movimentos sindical e estu-dantil, propaganda ideológica, exílio,golpes militares na América Latina.

No material classificado como inédi-to encontram-se depoimentos de sobre-viventes dos conflitos na região do Ara-guaia, produzidos pelo Arquivo Nacio-nal, em 2009, com o apoio do Institutode Ajuda aos Povos do Araguaia, e diver-

sas músicas censuradas, com os respec-tivos pareceres, como a letra de Bolsa deAmores, de Chico Buarque de Holanda.

“A esperança do curador é que a expo-sição contribua para que os pesquisado-res, de uma forma geral, tenham acessoao acervo sobre a ditadura militar que seencontra não só no Arquivo Nacional,mas em instituições Brasil afora. Serápossível, a partir deste acervo, abrirmuitas frentes de estudo e investigação,e esperamos, principalmente, contribuirpara que os brasileiros comecem a enca-rar esse período com maior interesse e,talvez, sob uma nova perspectiva, incen-tivando que as escolas e universidadesintroduzam esse debate de forma maisincisiva nas salas de aula. Pensando nis-so, organizamos também a mostra defilmes”, acentua Viviane.

distância, nos termos da legislação quetrata da matéria”, frisa Jaime Antunes.

Em relação às críticas relacionadas àabertura dos arquivos da ditadura, oDiretor-Geral do Arquivo Nacional eCoordenador do Projeto Memórias Re-veladas lembra que diversas medidasestão sendo tomadas para garantir oacesso à informação pública:

“Uma iniciativa como o ProjetoMemórias Reveladas não poderia vir de-sassociada de uma revisão crítica da le-gislação nacional no tocante ao acesso àinformação, uma vez que o acesso àinformação pública é indispensável aoexercício da cidadania, como demonstraa prática democrática no Brasil e emoutros países. Nesse sentido, o GovernoFederal encaminhou ao Congresso Na-cional o Projeto de Lei nº 5.228/2009(atualmente PLC 41/2010), com o obje-tivo de regular o acesso a informaçõesprevisto no inciso XXXIII do art. 5º daConstituição Federal de 1988. Recente-mente, o Ministro da Justiça, JoséEduardo Cardozo, assinou a Portaria 417,de 5 de abril de 2011, que regulamentouo procedimento de acesso aos documen-tos do período da ditadura militar noArquivo Nacional. A portaria, ainda queobedeça aos limites da atual legislaçãosobre o assunto, foi importante porquepadronizou práticas e esclareceu as pos-sibilidades de atuação do Arquivo Naci-onal. Sobre o assunto, é interessanteapontar que o Ministro Cardozo já de-monstrou publicamente que está com-prometido com o tema e, também, coma elaboração de uma proposta de decre-to que estabeleça regras claras e equili-bradas sobre o assunto, protegendo a in-timidade das pessoas, mas também ga-rantindo o acesso à informação de formamais ampla possível. Decretos similaresjá foram editados nos Estados de SãoPaulo, Paraná e, por sugestão do Conse-

lho Nacional de Arquivos (Conarq),órgão ligado ao Arquivo Nacional, tam-bém nos Estados de Alagoas e Paraíba.”

As próximas ações para o ProjetoMemórias Reveladas e para o ArquivoNacional já estão definidas, ressaltaAntunes:

“A alimentação do Banco de DadosMemórias Reveladas está sendo realiza-da progressivamente. No Brasil inteirohá pessoas trabalhando em atividades dehigienização, organização, descrição,digitalização e difusão desses acervos. Damesma forma, prosseguem no País asbuscas por dados e fontes que projetemluz sobre o período da ditadura militarinstalada em 1º de abril de 1964. Bastalembrar que recebemos no ano passadocerca de 50.000 documentos do Centrode Informações de Segurança da Aero-náutica. Essa documentação estava de-saparecida. O Arquivo Nacional possuio telefone gratuito 0800-7012441, parainformações sobre acervos de interessepara o Memórias Reveladas. O sigilo dafonte é garantido, pois o que nos interes-sa é garantir a preservação e difusão dasinformações contidas nesses acervos.Cabe citar também a criação do Prêmiode Pesquisa Memórias Reveladas, cujaedição 2010 já premiou três trabalhosacadêmicos que utilizaram fontes doperíodo 1964-1985. Esses trabalhos serãopublicados pelo Arquivo Nacional. Umanova edição do Prêmio terá lugar em2012. Essas ações, somadas à revisão crí-tica da legislação nacional sobre o assun-to, são marcos no processo de democra-tização do acesso à informação no Bra-sil e contribuem, também, para a cons-trução de uma política nacional de ar-quivos e de valorização do patrimôniodocumental nacional.”

*Até o fechamento desta edição do Jornal da ABI, oportal do Memórias Reveladas estava fora do ar.

A exposição Registros de umaGuerra Surda se divide em cincomódulos:

INSTITUCIONALIZAÇÃO DE UMREGIME DE EXCEÇÃOA exposição é aberta com o golpede 1964; a emissão dos AtosInstitucionais que pouco a poucocercearam as liberdades políticas;a estruturação do SNI, vigilância eserviço secreto; listas de cassados;o fechamento do CongressoNacional.

DA REPRESSÃO À REAÇÃOAs greves e passeatas e arepressão a elas; prisão demanifestantes e militantes;organizações de luta armada:seqüestros, apreensões, prisões,atentados; guerrilha do Araguaia;censura às artes e à imprensa.

A FACE PÚBLICA DO REGIMEO terceiro módulo mostra apropaganda que os governosmilitares faziam de si mesmos. Omilagre econômico; o patriotismoexacerbado em datas cívicas; oapoio de organizações civis.

O COMEÇO DO FIMO início da abertura; a relutânciado Governo em abrir espaço paraa democracia; o recrudescimentodas greves e passeatas; a imprensaalternativa; a abertura gradual;o movimento pela abertura epela anistia; diretas já.

O PROJETO MEMÓRIAS REVELADASAções regionais patrocinadasatravés do Projeto MemóriasReveladas.

A exposição,passo a passo

18 Jornal da ABI 365 Abril de 2011

MEMÓRIA

POR RODOLFO KONDER

RODOLFO KONDER é jornalista, escritor, Diretor da Representação daABI em São Paulo e membro do Conselho Municipal de Educação dacidade de São Paulo.

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Lembranças dos corredores sombrios dos subterrâneos da repressão

s vultos atravessam os corredo-res sombrios levados pelo braço.Parecem personagens de uma tra-gédia medieval: trazem as cabe-

ças cobertas por capuzes negros. Nas salascontíguas, há gente igualmente encapuzada,que está sendo punida por heresias imperdo-áveis. Seus gritos podem ser ouvidos, nos cor-redores e nas celas – mesmo quando os algo-zes ligam o rádio e aumentam ao máximo seuvolume. O desfile lúgubre, o torvo olhar docarcereiro, as paredes sujas que desaparecemna penumbra – tudo ali relembra o ambienteindecifrável da Inquisição. Apenas o cenário,porém, é medieval: os hereges nasceram to-dos no século 20; os torturadores também: eos instrumentos de tortura pertencem, semdúvida, à era eletrônica.

Ouço gritos de mulher, que vêm do andarde cima. Dias depois, saberei que eram gritosde uma amiga. Ela me contará que cinco tor-turadores a obrigaram a se despir, deram cho-ques elétricos em seus seios e a forçaram a fi-car de quatro, nua no chão de cimento.

Na sala ao lado, um torturador obriga umestudante de Medicina a segurar as pontas de-sencapadas do fio que usa na tortura. “Seguraesse fio, comuna safado! Já disse para segurar

direito. Afinal, quem manda nisso aqui?” Ouçoberro do rapaz; em seguida, o ruído de panca-das. “Não larga o fio! Segura isso direito, se nãovai apanhar muito mais!” Novo berro.

Naquela noite, trarão o estudante para mi-nha cela; ele se deitará ao meu lado. Queriamque revelasse o endereço da namorada, masele não se lembrava. Não tinha boa memóriapara endereços. “No fim, eu até me ofereci paralevar os caras à casa dela – mas isso não adi-antou nada...”

No dia seguinte, serei surpreendido por gri-tos que não tinha ouvido antes, naquele sub-mundo: “Bate mais, fascista! Bate mais! Bate,que você tá batendo num negro comunista!”Horas depois, saberei que o presidente de umsindicato de metalúrgicos havia enfrentadoos torturadores – e todos, na cela, se sentirãoum pouco redimidos pela coragem suicida da-quele operário desconhecido.

De madrugada, um mecânico que dorme naminha cela será levado, uma vez mais, para asala de interrogatórios. Ele tem menos de 30anos, é magro e reservado – quase não fala. “Nãofaça isso comigo não, seu doutor! Pelo amor deDeus, não faça isso comigo. Pelo amor de Je-sus Cristo, seu doutor...”. O torturador mo-dula sua voz, com a máquina de dar choques

elétricos. O mecânico grita, pede, implora,volta a berrar. Um velho farmacêutico de 68anos ronca ao meu lado. Mas os gritos domecânico não me deixam dormir. Quando otrazem de volta, ele se senta perto de mim;vejo que está bem machucado, estendo a mãoe toco seu ombro, num gesto quase instinti-vo de solidariedade. O mecânico já não é o bi-cho acuado que parecia ser, pelos gritos que ouviantes: é um homem de olhar firme, que meagradece com um sorriso e murmura quase comsuperioridade – “A barra hoje estava pesada...”

As cenas de violência se sucedem. A máqui-na de moer gente trabalha sem interrupção. Hásempre um grito no ar, passos ameaçadores nolusco-fusco daquele subterrâneo miserável. Al-guém pode estar sendo assassinado, na sala àminha direita – talvez um amigo, quem sabe?

Daquelas paredes imundas escorre um fiode sangue. O líquido desce vagarosamente,passa entre os corpos adormecidos, contor-na os pés inchados, parece que se orienta, naescuridão. Amanhã terá desaparecido. Depoisde alguns meses, desaparecerá também da me-mória nacional.

ELIAN

E SOA

RES

19Jornal da ABI 365 Abril de 2011

Paulo Emilio Salles Gomes (1916-1977), omais internacional e o mais nacional cineasta doBrasil, foi o fundador da Cinemateca Brasileira,em São Paulo.É preciso repetir: foi ele o funda-dor deste admirável museu vivo do cinema. Di-fícil, sim, a biografia de um ser humano de obratão densa e tão intensa, a vocação. E a paixão.

Era bacharel em Filosofia pela Faculdade deFilosofia da Universidade de São Paulo e dou-tor pela Escola de Comunicações e Artes. Jun-tamente com os amigos Antonio Candido, Dé-cio de Almeida Prado, Lourival Gomes e Macha-do e Ruy Coelgo – a jovem e luminosa elite pau-listana –, foi um dos fundadores da famosa Re-vista Clima, onde escrevia sobre cinema.

Considerado um subversivo pela nova dita-dura militar, Paulo Emilio foi preso porque o des-tino natural de um subversivo numa ditadura émesmo a prisão. Fugiu e essa foi uma fuga espe-tacular através de um túnel cavado nos subter-râneos do presídio.

Tinha chegado a hora de emigrar e o país esco-lhido foi a França. Em Paris, entre os anos 1949 e1952 ele escreveu em francês Jean Vigo, um cine-asta maldito e que a própria França já tinha esque-cido. Jean Vigo morreu jovem no final do séculodezenove mas antes dirigiu filmes ousados, filmespolêmicos e dentre os quais Zero de Conduite.

Pois esse Paulo Emilio, um intelectual do Ter-ceiro Mundo, lá foi pesquisar e escrever em fran-cês esse denso e intenso livro. A crítica foi ex-celente. Pouco depois recebeu o famoso prêmioArmand Tellier, concedido ao melhor livro decinema publicado na França.

Em Paris, Paulo Emilio trabalhou na Cinema-théque Française e lá ficou conhecendo em pro-

LYGIA FAGUNDES TELLES

Paulo Emilio,um socialistaque amava a

música, o vinhotinto e os gatos

fundidade a função e o destino de um museuvivo de cinema.

Estava na hora de voltar ao Brasil e aqui fun-dar com os amigos Francisco de Almeida Sallese Rudá de Andrade (entre outros) esta Cinema-teca Brasileira.

Assim foram plantadas suas sementes. Pau-lo Emilio escreveu: “Este nosso País tem um pas-sado de atraso e miséria que o brasileiro evitalembrar. Contudo, é este o País que o brasilei-ro deve amar com a fé e a esperança porque esteé o seu País tão precisado desse amo”. Sim, PauloEmilio criou clubes de cinema, participou decongressos aqui e no exterior, lecionou em uni-versidades e principalmente – escreveu livrossobre cinema e no fim da vida lançou até um

romance. Cinema e literatura, olha aí, a voca-ção e a paixão.

Sobre Paulo Emilio escreveu Antonio Candido:“A publicação dos seus escritos vai mostrar que Pau-lo Emilio foi um dos nossos ensaístas mais coeren-tes e profundos”. Adiante, Antonio Candido acres-centa: “Porque falando quase sempre de cinema,por meio dele Paulo Emilio fala da arte, da socieda-de e do homem – do homem do Brasil”.

Meu filho, o cineasta Goffredo Telles Neto,escreveu: “Ele nos iluminou nessa sua aventu-ra de resgatar o Sonho”.

Paulo Emilio foi casado com esta autora e jun-tos escrevemos o roteiro para cinema Capitu.

Querem mais? Era um socialista que amavaa música, o vinho tinto e os gatos.

Um perfil sumário e repassado de saudadedo criador da Cinemateca Brasileira.

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IVO PESSO

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20 Jornal da ABI 365 Abril de 2011

Aconteceu na ABIAconteceu na ABI

A ABI celebrou o Dia do Jornalista eo seu 103º aniversário de fundação nanoite de 7 de abril com o debate O papeldo jornalismo no contexto cultural contem-porâneo, promovido pela Diretoria deCultura e Lazer da Casa em parceria como Sindicato dos Jornalistas Profissionaisdo Município do Rio de Janeiro, o Insti-tuto Casa Grande e o Clube de Comuni-cação. Participaram da mesa o economis-ta e Professor Carlos Lessa, o ex-SenadorSaturnino Braga, Presidente do Institu-to Casa Grande, o Professor Leonel Agui-ar, da Pontifícia Universidade Católica doRio de Janeiro, a Professora Sônia Virgí-nia Moreira, da Universidade do Estado doRio de Janeiro, e a jornalista Suzana Blass,Presidente do Sindicao dos Jornalistas doRio, que mediou a discussão.

Associados e Diretores da ABI, pro-fissionais de imprensa, pesquisadores,professores e estudantes prestigiaram oencontro, realizado na Sala Belisário deSouza, no 7º andar do Edifício HerbertMoses, sede da ABI, e participaram dasdiscussões sobre a liberdade de impren-sa e o papel do jornalismo diante do di-reito à formação profissional e à infor-mação da sociedade. Durante mais detrês horas o recinto do encontro ficoulotado; após o encerramento, os parti-cipantes esticaram a conversa por mui-tos minutos.

“A reportagemé algo sagrado”

Na palestra de abertura, o jornalistaJesus Chediak, Diretor de Cultura eLazer da ABI, destacou o papel social dojornalismo:

“A reportagem é algo sagrado porqueo jornalista é a testemunha da história.Se daqui a 100 anos nós quisermos sa-ber o que aconteceu neste momento,vamos consultar os jornais. A liberda-de de imprensa e o direito à informaçãosão fundamentais à democracia, mas,citando Cícero Sandroni, atualmenteno Brasil não existe liberdade de im-prensa, mas sim liberdade de empresa.Estamos assistindo ao processo de edi-torialização da notícia.”

Dando prosseguimento ao debate,Suzana Blass sublinhou as questões quedificultam o pleno exercício da profissão:

“A mídia hoje ocupa um espaço públi-co, e por isso defendemos que o profis-sional desta área tenha uma formaçãosedimentada na ética e na responsabili-dade. Contudo, na prática não é isso quea gente vê. Houve a derrubada do diplo-ma na sociedade, quando na verdade agente tinha que ter revisto a formação

conviver com pelo menos três geraçõesde jornalistas, algumas delas já na épo-ca da ditadura, quando o único espaço derazoável liberdade era na Economia.Então, havia uma animação. Neste sen-tido, acho que o jornalista de hoje preci-sa ser reinventado.”

Lessa salientou ainda a desvalorizaçãoda função jornalística nos aspectos eco-nômico e social:

“Não estou falando das mídias alter-nativas, da imprensa de rua, das funçõesde assessoria de comunicação, mas simda produção que perdeu espaço de sobre-vivência. O jornalista cumpria com in-dependência o seu papel respondendo à

sua razão e ao seu coração e também àbarriga. O jornalista de hoje tem difi-culdade para sobreviver.”

Na opinião de Lessa, as mudanças es-truturais na rotina das Redações tambémcomprometeram o discurso da mídia:

“Fiquei estarrecido ao constatar quea imprensa noticiou o terremoto doHaiti, mas não aprofundou o assunto.Anunciou uma catástrofe, mas não deua matriz histórica explicativa e nemdesdobrou as conseqüências da tragédia.Desta forma, você naturaliza a catástro-fe. Terremoto ficou banal. Tanto que esseagora do Japão só tem algum charmeporque tem um reator atômico sendodifundido, caso contrário seria mais um.Há ainda uma preferência absoluta poreditar patologia. É como se falar bem dealguém ou de alguma coisa em princípiosugerisse que o autor daquela notícia foicomprado. Com tudo isto, o homemcomum que não tem muito tempo pas-sa a ler o jornal na diagonal. A idéia danaturalização, infelizmente, é um sub-produto, um angustiante modo pelo quala mídia trabalha as matérias principais,que chamam a atenção. Na verdade, istosó aumenta o caráter acrítico dos fatos.Não há nenhum convite à reflexão.

“A democracia é umaconstrução da imprensa”

O papel da mídia nas sociedades capi-talistas foi acentuado pelo ex-SenadorSaturnino Braga:

“É preciso lembrar que a democraciaé uma construção da imprensa, e queatualmente a liberdade de imprensa estácompletamente cerceada pelos interes-ses econômicos e empresariais daquelesque empregam jornalistas. A primeiracondição da liberdade de informação é adiversidade de pontos de vista na infor-mação, o que possibilita a meditaçãosobre os fatos e a construção de umaidéia relacionada àquela informação. In-felizmente, o capitalismo se enraizou detal maneira, tornando inviável a diver-sificação dos meios de comunicação.”

“Nossos alunos lêem cada vezmenos e escrevem cada vez pior”A Professora Sônia Virgínia falou

sobre as iniciativas relacionadas à forma-ção do jornalista no Brasil:

“O jornalismo ainda é um dos cursosmais procurados nas universidades,mesmo hoje com esta situação do diplo-ma. No contexto acadêmico-científicoo nosso desafio permanente é o ensinode jornalismo como atividade intelectu-al, não apenas como uma prática de de-corar receitas como, por exemplo, escre-ver um lide. Muitos de nossos professo-

O jornalismo atual sob questionamentoO economista Carlos Lessa, o ex-Senador Saturnino Braga e outros estudiosos discutemem encontro na ABI o papel, as formas e as perspectivas do jornalismo de nossos dias.

POR CLÁUDIA SOUZA*

profissional do jornalista. Nós defende-mos o jornalismo como um serviço deinteresse público, e o que vemos nomercado é um jornalismo que cumpreo interesse privado de alguns, que são osdonos dos veículos. Daí a necessidade deampliarmos o debate sobre a imprensajunto a toda a sociedade.”

“O jornalismo de hojeprecisa ser reinventado”

O economista e Professor Carlos Les-sa ressaltou a mudança de perfil do pro-fissional de imprensa:

“Enquanto economista militante porum Brasil melhor , eu tive a felicidade de

O economista Carlos Lessa abriu o debate lembrando que na imprensa de hoje não hánenhum convite à reflexão. Na mesa, da esquerda para direita, Leonel Aguiar, Saturnino

Braga, Suzana Blass, Sônia Virgínia Moreira e, à direita, Terezinha Santos.

O Senador Saturnino Braga disse que a liberdade de imprensa está completamentecerceada pelos interesses econômicos e empresariais daqueles que empregam jornalistas.

FOTOS: FRANCISCO UCHA

21Jornal da ABI 365 Abril de 2011

res são profissionais que estiveram nasRedações, mas também há muitos delesque são estudantes profissionais, quenunca passaram por uma Redação, nun-ca presenciaram um fechamento, nun-ca precisaram enfrentar situações que sópodem ser vivenciadas dentro da Reda-ção. Este problema resulta na ausênciada contextualização da imprensa atual,na falta de cultura geral do jornalista.Nossos alunos de Jornalismo lêem cadavez menos e escrevem cada vez pior. Elesnão têm a visão de mundo que é funda-mental para a experiência de relatar arealidade. O discurso passa, então, a sermais declaratório, sem a contextualiza-ção do fato.”

Um aspecto positivo diante dessequadro, é, de acordo com Sônia Virgínia,a expansão dos cursos de pós-graduaçãoem Jornalismo:

“Estabeleceram-se há alguns anosvários cursos nos níveis stricto sensu elato sensu, como Jornalismo Científico,Cultural, Digital, ajudando a formarnichos de especialização que hoje sãomuito fortes. O Jornalismo Científico,por exemplo, é fundamental para o de-senvolvimento do Brasil, mas nós forma-mos poucos jovens nesta área.”

“O jornalismo não éaquilo que o STF julgou”

Na visão do Professor Leonel Aguiar,outro ponto positivo é especialmenterepresentado pela relevância histórica daprofissão:

“Apesar da crise, é importante lembrarque a função do jornalismo é impulsio-nar a democracia. Precisamos destacar afunção histórica e ideológica dentro docampo jornalístico. O jornalismo não écomo o Supremo Tribunal de Justiçajulgou; não é um espaço limitado à ex-posição de opiniões. O papel de produçãode informação jornalística é essencial,pois cria as condições para que todos oscidadãos possam ser livres. O discursoem torno do jornalismo deve ser o dootimismo.”

A ABI reafirmou dia 31 de março seu entendimentode que “o movimento militar que derrubou o Presiden-te constitucional João Goulart em 31 de março de 1964não foi uma ‘revolução democrática’, como assoalhamainda agora seus defensores, que se excedem em impro-priedades de caráter político e até cronológico: a suble-vação vitoriosa não passou de um golpe de Estado, paracuja deflagração se associaram civis e militares, e nãoocorreu em 31 de março, e sim em 1º de abril, o Dia daMentira”, assinala declaração divulgada pela Casa.

A ABI afirma também que em torno desse movimen-to se criou “desde as primeiras horas de sua eclosão umcortejo de falsificação histórica, para o qual contribu-íram tanto os militares rebelados, com suas declara-ções hipócritas de respeito à ordem constitucional,como os líderes civis que os insuflaram, os quais pre-tendiam ocultar e dissimular a verdadeira natureza dogolpe”, diz a declaração, cujo teor é o seguinte:

“A Associação Brasileira de Imprensa não pode exi-mir-se do dever cívico e ético de contestar a atoarda feitapor setores saudosos da ditadura em torno do movimen-to militar que derrubou o Presidente constitucional JoãoGoulart em 31 de março de 1964, que não foi uma ‘re-volução democrática’, como assinalam ainda agora seusdefensores. Estes se excedem em impropriedades decaráter político e até cronológico: a sublevação vitorio-sa não passou de um golpe de Estado, para cuja defla-gração se associaram civis e militares, e não ocorreu em31 de março, e sim em 1º de abril, o Dia da Mentira.

É necessário sublinhar que se criou desde as primei-ras horas de sua eclosão um cortejo de falsificação his-tórica, para o qual contribuíram tanto os militares re-

O jornalista Luiz Carlos de Souza re-lançou no dia 12 de abril a edição revisa-da do livro Maralto, Relato de uma PescaPerigosa (Booklink Publicações). A noitede autógrafos foi realizada no Salão deEstar da ABI, no 11º andar do EdifícioHerbert Moses, sede da Casa, com a pre-sença de parentes, amigos e jornalistasque trabalharam com o autor.

A obra é fruto de uma grande repor-tagem escrita por Luiz Carlos quandoera repórter do Jornal do Brasil, na sucur-sal de Niterói. Durante 30 dias de viagema 800 quilômetros da costa, ao lado dofotógrafo Almir Veiga, Luiz Carlosacompanhou de perto as dificuldadesdos pescadores em alto-mar:

“O que mais me impressionou foi oquanto os pescadores vão longe, e nãopercebemos o risco que eles correm, otempo que passam longe da família e o

*Colaborou Renan Castro, estudante de Comunicação,estagiário da Diretoria de Jornalismo da ABI.

belados, com suas declarações hipócritas de respeitoà ordem constitucional, como os líderes civis que osinsuflaram, os quais pretendiam ocultar e dissimulara verdadeira natureza do golpe.

Esses defensores da ilegalidade então cometida pa-garam caro por seu desapreço às instituições democrá-ticas, já que seus cúmplices militares tomaram o gostodo poder e o tornaram privativo dos detentores de far-das e alamares durante longo período, entre 1964 e 1985.

O que se viu nas duas décadas que se seguiram foi oarbítrio institucionalizado, com as cassações de man-datos e de direitos políticos de parlamentares, líderessindicais e de lideranças intelectuais; a suspensão deeleições e sua substituição por formas viciadas e anti-democráticas de provimento de cargos eletivos; a ge-neralização das prisões sem mandado judicial nem notade culpa; a imposição do exílio, da demissão imotiva-da e do desemprego a milhares de brasileiros que atéagora esperam por reparação e desculpas por parte doEstado nacional; a transformação da tortura e do as-sassinato em práticas de governo; o desaparecimentoe ocultação de cadáveres de vítimas da ditadura; a cen-sura à imprensa e aos meios de comunicação em geral;a proibição de livros, filmes e peças teatrais.

Para coroar esse conjunto de indignidades, o regi-me militar ocultou ou destruiu os registros das torpe-zas praticadas pelos agentes do Estado, civis e milita-res, cuja revelação se impõe como requisito essencialpara a construção de uma sociedade efetivamente de-mocrática no País.

Rio de Janeiro, 31 de março de 2011.(a) Maurício Azêdo, Presidente.”

trabalho que dá até o peixe chegar aonosso prato”, diz Luiz Carlos.

Durante o evento foram exibidas emum telão as fotos do repórter-fotográficoAlmir Veiga que ilustram a publicação.A primeira edição do livro, lançada em1976, teve os 3 mil exemplares de suatiragem esgotados, feito que, segundo oautor, é digno de um best seller, conside-rando as vendas de livros no Brasil.

A jornalista e cantora Tânia Malhei-ros, amiga de longa data do autor, falousobre o livro e também sobre sua admi-ração por Luiz Carlos: “O livro é umbelo retrato de reportagem vigorosa,feita nos tempos em que se ficava dias afio apurando um fato, uma situação, umcaso. E o Luiz Carlos é um ótimo repór-ter contador de histórias, sabe onde estáa essência da narração, e uma pessoa degrande caráter, amigo sincero e profissio-nal de imprensa, poeta, escritor e compo-sitor exemplar.”

Repórter desde 1966, com passagenspor grandes jornais do Rio e de São Pau-lo em sua carreira, Luiz comenta tam-bém sobre a ausência de grandes repor-tagens, como Maralto, no jornalismoatual: “Naquela época o jornalismo per-mitia este tipo de mergulho, uma via-gem de 30 dias. A grande reportagemnão acabou, mas diminuiu. Hoje ela fi-cou restrita à tv, em séries de reportagense em parte aos livros.”

Apesar da redução no número de gran-des reportagens, para Luiz Carlos o jor-nalismo não vive um momento de cri-se. Em sua opinião, os profissionais dehoje são melhores e mais bem prepara-dos, mas precisam ver a realidade maisde perto: “Há uma facilidade maiorpara pesquisar, mas a internet não con-versa. A grande missão dos jornalistasé sair às ruas, ir ao mar, navegar, e asemoções não estão propriamente nainternet”.

O Professor Leonel Aguiar, da Puc do Rio, eJesus Chediak, Diretor de Cultura e Lazer da

ABI, conversam antes do início do debate.

No aniversário do golpe militar de 1964, a ABI relembra que não por acaso ele ocorreu em 1º de abril, o Dia da Mentira.

31 de março,uma falsificação histórica

Luiz Carlos de Souza relança seurelato sobre a pesca em mar alto

Ele e o repórter-fotográfico Almir Veiga passaram 30 dias acompanhando pescadores a 800 quilômetros da costa.

POR RENAN CASTRO

22 Jornal da ABI 365 Abril de 2011

Para o pesquisador Ricardo Cravo Al-bin, a trajetória do João Felício dos San-tos como escritor é muito mais fecunda doque se pode imaginar. Por isso, ele achoujusta a homenagem póstuma que lhe foiprestada na ABI, onde foi evocada a suaobra fecunda, na qual figura com grandeapelo popular a história de Xica da Silva,que foi enredo de importante escola desamba, a Acadêmicos do Salgueiro, e temade um filme de Cacá Diegues que alcan-çou grande êxito de crítica e de bilheteria.Felício, que foi membro do Conselho De-liberativo da ABI, teria completado cemanos em 14 de março.

Ao ato em homenagem a João Felíciodos Santos, realizado no Auditório OscarGuanabarino da ABI no dia 29 de março,compareceram parentes, amigos, escrito-res, jornalistas e personalidades do mun-do artístico, como Elke Maravilha. “OJoão Felício é uma figura inesquecível.Tenho 66 anos de idade e posso afirmarque nesse período conheci pessoas detodos os tipos, mas com a sua energia elefoi o único”, disse a atriz, que conheceuJoão Felício durante as filmagens de Xicada Silva, obra baseada no livro dele.

Elke Maravilha considera que João Fe-lício dos Santos é um autor que deve serlembrado com muita alegria: ‘Tenho deleuma lembrança fantástica, que vai ficar naminha vida para sempre. Era uma pessoacom a qual eu tive o prazer de fazer mui-tas artimanhas. Ele nos deu sabedoria, ale-gria, alimentou nossos espíritos sem a pre-tensão de curar ninguém”, disse a atriz.

Um dos destaques da programação foia apresentação de uma exposição sobre asobras de João Felício, organizada por suafilha Cristina, juntamente com um estan-de com alguns dos seus livros mais popu-lares, editados pela editora José Olympio,entre os quais Ganga-Zumba, o citado Xicada Silva, Carlota Joaquina, A Rainha Devas-sa, Anita Garibaldi e Major Calabar.

seguida convocou a Mesa que coorde-nou a cerimônia.

Uma janela para conhecer FelícioO primeiro orador da noite foi Ricar-

do Cravo Albin. Amigo e profundo co-nhecedor da obra do escritor, ele saudouCristina Felício dos Santos, filha de Fe-lício, pela iniciativa: “A ela se deve estemomento, que nos junta para saudar umcompanheiro cuja trajetória era maisimportante do que podemos imaginar”.

Albin contou que ficou impressiona-do com a figura humana constituída porJoão Felício desde que foi apresentado aele por Carlinhos Sideral, compositor daescola de samba Imperatriz Leopoldinen-se, nos anos 60. Esta foi a sua “primeira

janela” para o bom entendimento dolado menos reconhecido da diversidadeintelectual de João Felício: o de autor deenredos para o Carnaval carioca:

“Para a escola de samba Imperatriz Le-opoldinense ele fez em 1985 o enredo Ado-lá, Cidade Mágica, exatamente com sam-ba-enredo de Carlinhos Sideral. E para oClube Carnavalesco Canários das Laran-jeiras foi autor de quatro enredos: GangaZumba, em 1970; O Negro na História doBrasil, de 1973; A Lenda de Acaiaca, de1975, e A Cidade Verde, de 1978”, contouCravo Albin.

Foi João Felício, contou o pesquisa-dor, quem inspirou Carlinhos Sideral

no samba Oropa, França e Bahia,para o desenvolvimento de umenredo sobre a Semana de ArteModerna de 1922.

Albin citou outras incursõesdo escritor pela mpb, como ochoro Pranto, gravado por Rosi-

ta Gonzáles, e o samba-exaltação OÍndio, em parceria com Gadé, da du-pla Gadé e Valfrido Silva, autores doclássico Estão Batendo (Estão baten-do/Se for pra mim/Diga que eu nãoestou/É a mulata/Que há muito tem-

po me abandonou ...) .

Uma vida como a de ViníciusEm um trecho da palestra, Albin disse

que João Felício foi uma das melhores emais abertas mentes humanas que ele co-nheceu, comparando-o inclusive ao poetaVinicius de Morais:

“João Felício era um artista singular,porque ele, como Vinícius, levava uma

vida de poeta, nunca de intelectualde redoma como seu amigo e

admirador Carlos Drum-mond de Andrade. Aliás,

como Vinícius, dele sepode dizer que era “obranco mais preto do

Brasil, saravá”, pela comovedora solida-riedade à cultura negra brasileira.”

João Felício dos Santos era um visio-nário da essência da face criativa queemana do segmento popular e acabou co-laborando com Ricardo Cravo Albin nasua compreensão sobre a riqueza da nossadiversidade cultural: “Ele muito me aju-dou na compreensão exata do processocultural brasileiro, quando eu estrutura-va tanto a dinâmica do Museu da Ima-gem e do Som, quanto o processo dos de-poimentos para a posteridade do Mu-seu, base do seu reconhecimento públi-co a partir de 1966”.

“Esses negros maravilhosos”Albin fez questão de mencionar o en-

tusiasmo de João Felício em relação à suaopção pelos pioneiros do samba: “Ricar-do” – ele me dizia em visitas que me faziadepois de cada depoimento famoso –,“você está fazendo História, a certa e a ge-nerosa, em começar o seu Museu colocan-do no pódio da posteridade esses negrosmaravilhosos que fizeram o melhor nes-ta terra, de tanta gente pretensiosa, semsangue, sem graça, uns quase paspalhos”.

Um dos aspectos realçados por todosos oradores da noite foi o dinamismo e ocomprometimento que João Felício dosSantos empregava para construir os seus

Aconteceu na ABIAconteceu na ABI

POR JOSÉ REINALDO MARQUES

A trajetória do escritor é relembrada por Ricardo Cravo Albinna homenagem a ele prestada pela ABI por seus 100 anos.

O visionário João Felício dos Santos,que deu nova vida a Xica da Silva

CENTENÁRIO

Antes de apreciar a exposição, os con-vidados reuniram-se no Auditório parao lançamento da página de João Felíciona internet, que pode ser acessada peloendereço joaofeliciodossantos.com.br.Em seguida, foi realizada a palestra so-bre a trajetória de João Felício, com aparticipação especial do pesquisadorRicardo Cravo Albin; do Vice-Presi-dente do Sindicato dos Escritores doRio de Janeiro, Dartagnan de Holanda;e da atriz Elke Maravilha.

Para a ABI, uma honraCoube ao Presidente da ABI, Maurício

Azêdo, fazer a abertura do evento. Eledisse que a Casa ficou muito honradaem ter sido escolhida para sediar oato de celebração do centenário deJoão Felício dos Santos:

“A ABI se sente muito honradaem poder sediar esta manifesta-ção de apreço e de saudade porJoão Felício dos Santos, que foi,além de grande escritor, poetae roteirista cinematográfico,membro do Conselho Deli-berativo da Casa em ummomento muito difícil danossa existência nacional,em que a ABI constituía um dos alvos da re-pressão política”, afirmou Maurício.

Maurício lembrou que nesse períodoum dos problemas que a ABI enfrentoucom a ditadura foi uma bomba de alto po-der explosivo colocada no sétimo andardo prédio, onde ficam sediadas a Direto-ria e o Conselho Deliberativo da Casa.

“Foi nessa quadra tormentosa que JoãoFelício dos Santos, com a sua envergadurade intelectual e de criador, se uniu aosmembros do Conselho Deliberativo, quedesempenhavam um papel destemido deenfrentamento da ditadura militar. Poresse motivo e pela saudade que nos moveé com um sentimento de grande apreçoa esse companheiro que a ABI sedia esteato”, disse o Presidente da ABI, que em

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23Jornal da ABI 365 Abril de 2011

romances históricos. Nesse contexto, fo-ram lembradas as aventuras do autor paraescrever A Guerrilheira – O Romance daVida de Anita Garibaldi, lançado em 1979.

Albin reproduziu um depoimento deJoão Felício sobre o livro, no qual ele cri-tica a falta de precisão dos historiadoressobre dados da personagem, e reclama que“escrever romance histórico no Brasil éuma dificuldade”. Vejam o que disse JoãoFelício sobre os textos historiográficos:“Tem historiadores que afirmam que elanasceu em São Paulo, outros que em San-ta Catarina. Então eu crio a minha pró-pria verdade. Mas a verdade não tem mui-ta força. Nunca dei muita atenção a ela.Procuro ser verdadeiro nos nomes das pes-soas, nas datas, nos números. Mas o res-to é fantasia. Afinal, quem sabe o quepensaram Getúlio ou Tiradentes na horasuprema da morte?”

Pelas palavras de Ricardo Cravo Albin,o público ficou sabendo que João Felíciodos Santos dizia que falta criatividade aostextos historiográficos. Ele confidenciouao amigo que achava o historiador “umromancista fracassado”, que se prende àhistória factual, concreta, sem graça algu-ma, mas não tem a força da imaginação. “Eaí é o meu terreno, a minha praia, o meugozo e prazer”, afirmava o escritor.

No fim da sua exposição, Ricardo Cra-vo Albin disse que não poderia deixar dereiterar que a obra de João Felício dosSantos ainda não foi devidamente ava-liada: “Em um país que confere poucoapreço às memórias, o constrangimentode termos por levantar uma obra de ta-manho porte quanto a do nosso homena-geado fica claro, necessário e urgente”.

Riqueza poéticaO Vice-Presidente do Sindicato dos

Escritores do Rio de Janeiro, Dartagnande Holanda não quis falar de improviso– “a memória e a emoção me trairiamcom certeza” – e leu um texto que prepa-rou especialmente para as homenagens aJoão Felício dos Santos.

Para Dartagnan o escritor João Felíciodos Santos era um incansável pesquisa-dor da História e dos costumes brasilei-ros, que deixou nos anais da literaturanacional “um rio de conhecimento”, ondenavegam nomes como Ganga Zumba,Carlota Joaquina, Calabar, Antônio Con-selheiro, Xica da Silva, Aleijadinho, JoãoAbade e muitos outros encontrados emsua narrativa:

“Durante toda a sua vida embrenhan-do-se pelo Brasil, como topógrafo que erade profissão, foi garimpar personagensque hoje estão marcadas a tinta e dedica-ção nas páginas de seus livros”.

Ele se referiu também aos romancesescritos pelo autor, muitos deles baseadosem fatos de nossa História oficial, e as obrasdedicadas ao público infantil, além dos“belíssimos sonetos e trovas”:

“Memorável no seu estilo, sua manei-ra gostosa de escrever se aproximava dopovo com um belo gingado, uma fala bre-jeira, um cheiro envolvente dos perfumesdo mato, um sabor diferente das frutasdos trópicos. Jogava com as palavras comoum malabarista faz com os seus objetos,numa precisão única sem nunca deixar cairuma peça”, afirmou Dartagnan provocan-do aplausos da platéia.

Dartagnan de Holanda contou que co-nhecia João Felício desde a adolescência.Já adultos os dois vieram a se reencontrarna Associação do antigo Banco do Estadodo Rio de Janeiro-Beg.

Foi nesse período que Dartagnan, quetambém já se lançava como escritor, passoua ler e apreciar os contos de João Felício:

“O João Felício para mim era um dosmais ricos escritores brasileiros, por sualinguagem, pelo seu estilo e por sua técni-ca em amalgamar tipos que existiram emverdade, e outros por ele criados fazendopassearem no tempo e no espaço de modoa cumprirem seu destino”, disse o Vice-Pre-sidente do Sindicato dos Escritores do Rio.

Ele falou também sobre o hábito deescrever que João Felício dos Santos tan-to apreciava, e do carinho com a sua es-posa Carmem:

“Ele sempre dedicava o primeiro exem-plar de seu livro a Dona Carmem. Outrodetalhe é que suas obras estão aí e figuramcomo estrelas de primeira grandeza nouniverso literário brasileiro”, afirmouDartagnan de Holanda.

BrindeNo site de João Felício, o internauta

vai encontrar uma série de poesias inédi-tas do autor, poesias essas que ele escre-veu entre as décadas de 1940 e 1950, antesde ele criar os seus romances históricos.

“Como eu gostava muito dessas poe-sias eu acabei fazendo este resgate e co-loquei no site uma seleção de dez poe-mas para que eles se tornem de conhe-cimento público”, explicou Cristina Fe-lício dos Santos.

Cristina Felício contou que para enri-quecer o projeto foram selecionados tex-tos de cada romance histórico, para queo público tome conhecimento da diver-sidade da linguagem de João Felício:

“Pretendemos mostrar como que emcada livro, praticamente desde o primeirocapítulo, ele já penetra no universo damaneira de falar do povo daquela regiãoque ele está retratando”, afirmou a orga-nizadora do trabalho.

Além de todas as histórias interessan-tes contadas sobre a grandiosa obra deJoão Felício dos Santos, o público quecompareceu à ABI foi agraciado com umcd comemorativo que dá uma idéia da vi-agem que ele faz pelo Brasil, através dalinguagem do povo que ele está represen-tando.

Entusiasmada, Cristina Felício dos San-tos falou sobre a importância do ato:

“Para mim foi muito emocionante fa-zer esse resgate e poder compartilhar issocom vocês.”

PerfilJoão Felício dos Santos nasceu no Mu-

nicípio de Mendes, no Rio de Janeiro, em14 de março de 1911. Era membro de umafamília de escritores. Iniciou a sua carreiraliterária pelo caminho da poesia, com olivro Palmeira Real, lançado em 1934.

É autor de uma obra vasta, na qual sedestacam romances, contos, poesias, lite-ratura infantil, livros técnicos, argumen-tos e roteiros cinematográficos e o desen-volvimento de enredos carnavalescos.

Exerceu o jornalismo por mais de 40anos e foi membro do Conselho Delibe-rativo da ABI. Trabalhou no Ministériodos Transportes, onde ocupou inclusiveo cargo de Diretor de comunicação.

É autor de 14 romances, sendo que oprimeiro foi O Pântano Também Reflete asEstrelas, sobre a política do café no iníciodo século XIX, publicado em 1949. Es-creveu sobre a saga de Canudos e a histó-ria do Major Calabar, que retrata o perí-odo da invasão holandesa no Brasil. Temainda dois textos inéditos: A Força Verme-lha e Rotas do Mar.

A sua obra mais conhecida é GangaZumba (1962), que lhe rendeu um prêmiopela Academia Brasileira de Letras-ABL.O livro foi adaptado para o cinema soba direção de Cacá Diegues. É autor dosargumentos dos filmes Cristo de Lama, deWilson Silva, e Parceiros da Aventura, deJosé Medeiros.

O historiador Lincoln de Abreu Pennaassumiu em 4 de abril a Presidência doMovimento em Defesa da EconomiaNacional-Modecon, fundado pelojornalista Barbosa Lima Sobrinho em1989, com a missão de promover debatese campanhas em defesa dos interessesdo Brasil. Ele substitui a economista emédica Maria Augusta Tibiriçá, que foidécadas militante da campanha Opetróleo é nosso, nos anos 1940-1950.

Tão logo assumiu o posto dePresidente, Lincoln Penna liderou aprimeira sessão do Modecon sob a suadireção, realizada, como de hábito, nasnoites de segunda-feira, na Sala Belisáriode Souza, localizada no 7º andar doedifício-sede da ABI.

Sobre o convite para presidir oModecon — que considera uma iniciativada “genialidade” sempre criativa deBarbosa Lima Sobrinho —, considera umato de “generosidade” dos amigos: “emum gesto de camaradagem e confiançaos membros da antiga diretoria meconduziram a esse cargo (de Presidente)importante. Isso me dá enorme satisfaçãoporque dois grandes nomes meantecederam: o fundador Barbosa LimaSobrinho e a Doutora Maria AugustaTibiriçá, que continua conosco comoPresidente de Honra”.

Lincoln de Abreu Penna disse que foibem recebido no Modecon, apesar de nãoter feito parte da primeira leva doscombatentes em defesa da economianacional. Ele se sente à vontade, devido àsua total identificação com os pontos devista do Movimento sobre questõesrelativas à problemática brasileira.

O novo Presidente do Modeconlembrou que Maria Augusta Tibiriçá seprojetou na campanha “O petróleo énosso” e continua nacionalista edefensora da soberania nacional: —“Trata-se de uma mulher de luta. Porsinal, este é o título que vou dar a umabiografia que estou escrevendo sobre ela,não somente para homenageá-la, mastambém para registrar essa trajetóriabrilhante que ela tem na vida pública doPaís. O Modecon é uma parte importante,mas pequena em relação à trajetóriadela, que vem conduzindo essa luta,desde os anos 50, de forma exemplar”.

Graduado em História pelaUniversidade do Estado do Rio de Janeiro(Uerj,1968), especialista em EuropaMeridional pela Universidade deToulouse-França (1970), mestre emHistória pela Universidade de Toulouse-França (1970), doutor em História Socialpela Universidade de São Paulo(USP,1994), Penna atualmente é professortitular da Universidade Salgado deOliveira. Tem experiência na área deHistória, com ênfase em História do BrasilRepública e atua principalmente nosseguintes temas: República erepublicanismo, florianismo e movimentosmilitares no Brasil, nacionalismo,comunismo, estudos sobre imprensa epolítica, biografias e gêneros biográficos.Desenvolve também pesquisas sobreintelectuais orgânicos e inorgânicos doBrasil contemporâneo. Atualmente dedica-se também à consultoria política.(José Reinaldo Marques)

Maria Augusta Tibiriçá passaa ser Presidente de Honra

Lincoln Pennaassume o Modecon

J.EGB

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ÃO

Cristina Felícioorganizou aexposição ecoordenou oprojeto doCentenário deJoão Felício dosSantos, queincluiu um sitena internet.Presente aodebate, ElkeMaravilhaaponta a fotoonde elaaparece ao ladodo escritor nofilme Xica daSilva, de CacáDiegues.

24 Jornal da ABI 365 Abril de 2011

Em noite repleta de homenagens, aprimeira edição do Prêmio João Saldanhade Jornalismo Esportivo reuniu em 28 demarço jovens talentos e profissionais con-sagrados da crônica esportiva. A premia-ção é uma iniciativa da Associação dosCronistas Esportivos do Rio de Janeiro-Acerj em parceria com a ABI. Antes doanúncio dos vencedores em cada uma dasseis categorias, os apresentadores José Ilan(Globoesporte.com) e Evelyn Moraes (R7)lembraram a importância de João Salda-nha para o futebol brasileiro, para o jor-nalismo esportivo e também sua militân-cia política. Foi exibido então um brevefilme sobre a vida do cronista.

O Presidente da Acerj, Eraldo Leite,falou sobre o objetivo e importância doPrêmio: “Havia uma lacuna que estamostentando preencher. Reverenciar o jorna-lista que trabalha o ano inteiro, que tra-balha muito, e não há um reconhecimen-to. Claro que cada um tem seu valor pro-fissional reconhecido mais ou menos pelasua empresa, mas faltava aquele reconhe-cimento público de uma grande festa. Aidéia do Prêmio é exatamente essa, reco-nhecer o valor do trabalho realizado aolongo de um ano pelos jornalistas”.

O Presidente da ABI, Maurício Azêdo,presente no evento, destacou a impor-tância da homenagem a João Saldanha:“O Prêmio João Saldanha de Jornalis-mo Esportivo é, antes de tudo, umagrande homenagem a esse extraordiná-rio profissional e militante social quefoi João Saldanha. Em boa hora, a Asso-

A bela festa doPrêmio João Saldanha

EVENTO

Concurso instituído pela Associação dos Cronistas Esportivos, com o apoioda ABI, reuniu na sede do Botafogo os bambas do jornalismo esportivo.

POR RENAN CASTRO ciação dos Cronistas Esportivos do Riode Janeiro propôs à ABI que se organi-zasse esse concurso como homenagemao João Saldanha e também como umaforma de elevar a qualidade já em simuito alta do jornalismo esportivo nacidade do Rio de Janeiro, e a ABI rece-beu essa proposta com o maior entusi-asmo e quer felicitar a Acerj pelo resul-tado visível aqui nesta bela festa”.

Ainda sobre a escolha do nome da pre-miação, Maurício acrescentou: “Na ver-dade não foi uma escolha minha, foi umaconvergência de idéias, quando se discu-tiu a instituição de um prêmio de Jorna-lismo esportivo, e nós chegamos por con-senso à idéia de que a melhor forma de daruma denominação ao Prêmio seria home-nageando João Saldanha, pelo que elerepresentou no jornalismo esportivo, navida cultural e na vida social do País”.

QualificaçãoUm dos apresentadores do evento,

José Ilan, jornalista do Globoesporte. com,ressaltou as virtudes que um bom jorna-lista esportivo hoje deve ter para ser umbom profissional:

“Acho que esse caminho de volta dasegmentação é uma obrigatoriedade, ouseja, cada vez mais todos têm que saberfalar sobre tudo, e isso enriquece o con-teúdo de qualquer profissional. Quemfica restrito apenas ao Jornalismo Espor-tivo, a saber falar apenas de um jogo defutebol, por exemplo, na minha opiniãoestá com os dias contados”.

Eraldo Leite salientou a capacidademultimídia que os jornalistas de hojeprecisam ter, e a necessidade constantede renovação:

“O jornalista tem que se prepararmuito mais hoje, tem que estar muitomais antenado com a realidade, além deter que ser multimídia. Quem trabalhaem rádio hoje não faz simplesmenteuma entrevista com microfone de rádio,com um gravador, ele tem que sabermanusear o computador, os programasde computação, saber fotografar, temque ser um pouco de tudo”.

PremiadosO jornalista e radialista Fábio Azeve-

do, um dos jurados na categoria Rádio,falou sobre a dificuldade de selecionar osmelhores trabalhos:

“Difícil é julgar porque foram traba-lhos muito legais, e todos são muitobons, muita gente boa mandou trabalho.Senti falta de outros, porque eu acho quea gente tinha que abraçar um pouco

A cordialidade e o companheirismo marcaram o encontro dos ganhadores do Prêmio JoãoSaldanha nas diversas categorias. Acima, Rafael Marques recebe seu prêmio na categoria

Rádio; abaixo, Pedro Motta Gueiros curte a vitória na categoria Jornal e Revista.

Coube a Aluyisio Abreu Barbosa, de Campos (acima),o primeiro lugar na categoria Interior.com sua reportagem “Galo que canta a arte do futebol”. Cahê Mota (abaixo) arrebatou o

prêmio na categoria Site, além de ter faturado o Grande Prêmio João Saldanha.

Carlos Ferreira teve um rival da pesadana categoria Televisão, na qual enfrentou

Tino Marcos, o vencedor do Prêmio.Ferreira, da TV Record, concorreu com duas

reportagens de forte conotação social.

FOTOS DIVULGAÇÃO

25Jornal da ABI 365 Abril de 2011

Aconteceu na ABIAconteceu na ABIMensagensMensagens

"Muito caro Maurício Azêdo,Sou uma fiel leitora do seu belo

jornal e nele li a matéria sobre ojornalista Ruy Pereira da Silva. Achoentão oportuno esta matéria que aívai e que lembra o fundador daCinemateca de São Paulo, PauloEmilio Salles Gomes. Residiumuitos anos em Paris e foifuncionário da CinemathéqueFrançaise, de onde trouxe oconhecimento que aproveitou paraesse seu importante trabalho aquiem São Paulo.

Aceite, caro amigo, o abraço defraterno afeto

(a) Lygia Fagundes Telles."

Do Senador Cristovam Buarque“Prezado Maurício Azêdo,Muito obrigado pelo Jornal da ABI

com cronologia dos quadrinhos.Além de muito instrutivo, li commuita emoção e nostalgia, lembrandomeus tempos de criança. Gosteimuito do merecido apoio ao trabalhodo Maurício de Sousa, meu amigo, doqual sou um admirador. Abraço

(a) Cristovam Buarque.”

Da Senadora Ana Amélia Lemos“Caro colega Presidente

Maurício Azêdo,Fiquei sensibilizada com as

generosas referências. Penso que acomunicação, sempre que possível,deve ser humanizada! A tecnologia nos auxilia na agilidade, na eficiência ena manifestação das informações. Sou adepta ao Twitter. Tenho mais de 7mil seguidores! Nada substitui a palavra manuscrita! Ela expressa melhornossos sentimentos e também nossas convicções e crenças!

Agradeço-lhe o envio do exemplar do Volume 1, dedicado às hq (348/11 de2009) e as edições 360-361 do Jornal da ABI dedicada à denúncia feita nofilme Perdão, Mister Fiel, de Jorge Oliveira; a segunda aos 60 anos daimplantação da tv no nosso País!

Estou comprometida bem com um mandato produtivo, austero etransparente! Cordialmente (a) Amélia.”Renan Castro, estudante de Comunicação é

estagiário da Diretoria de Jornalismo da ABI.

“Gostaria de dar uma saudação espe-cial ao nosso companheiro Carlos Ferrei-ra pelo seu desempenho profissional, seuengajamento com forte teor social nasquestões do esporte, que é raro e nãofreqüente na cobertura esportiva, e diri-gir uma saudação especial ao Presiden-te da Associação dos Cronistas Esporti-vos do Estado do Rio de Janeiro, nossocompanheiro Eraldo Leite.”

Maurício reafirmou a importância doPrêmio como valorização da crônica es-portiva e elogiou mais uma vez a inicia-tiva do Presidente da Acerj, Eraldo Leite:

“Quero dizer que realmente essa fes-ta é um momento muito forte de valo-rização da crônica esportiva, da cobertu-ra esportiva, das entidades representati-vas dos profissionais como a Acerj e a ABI,e isto se deve ao despojamento e ao ide-alismo e à capacidade de trabalho deEraldo Leite. E o nosso dever é fazer esseregistro de uma forma muito enfática,porque a ABI foi homenageada por ele aoser convidada para co-patrocinar estegrande Prêmio do jornalismo esportivo.Parabéns, Eraldo.”

EmoçãoO evento seguiu com momentos

marcantes, como o discurso emociona-do do repórter Rafael Marques, da RádioGlobo, após vencer o prêmio na catego-ria “Rádio”. Posteriormente, o Presidenteda Acerj, Eraldo Leite, recebeu um ines-perado Prêmio por todo o seu trabalho ededicação ao jornalismo esportivo.

O momento mais esperado da noitefoi a entrega do Grande Prêmio João Sal-danha de Jornalismo Esportivo, no qualconcorreram os vencedores de cada ca-tegoria. O premiado foi Cahê Mota,jornalista do site Globoesporte.com, autorda série de reportagens Goleiro Bruno. Ojovem jornalista contou sobre a emoçãode concorrer ao lado de grandes nomesdo Jornalismo:

“É complicado falar, porque na mi-nha categoria eu até esperava, agora esseprêmio geral jamais ia imaginar. Quan-do que eu, há 4 anos lá em Campos, meiodesiludido da carreira imaginaria partici-par de um Prêmio com Tino Marcos,Pedro Mota Gueiros, Rafael Marques,pessoas que, além de grandes referênci-as, são amigas que me receberam muitobem aqui. Só posso agradecer e ter a cer-teza que estou no caminho certo.

Cahê falou também sobre como foi otrabalho de apuração da série de reporta-gens vencedora do concurso:

“Eu já tinha ido em 2008 no mesmolugar, na mesma favela, com as mesmaspessoas para falar sobre o Bruno ídolo, oBruno herói. E voltar lá diante de tudoaquilo que aconteceu foi complicadopsicologicamente. Eu não fiz pensandoem prêmio, fiz pensando em dar o máxi-mo por que sabia que era um caso quemarcou história, como o Dr. Horta falou.Daqui a 50 anos vão buscar no Google ahistória do Bruno, e eu contei. E eu achoque isso vale tanto quanto um prêmio.”

Lygia Fagundes Telles, uma fiel leitora

Os Senadores agradecem

Cristovam Buarque leu com muita emoção e nostalgia a edição especial sobre a Cronologiados Quadrinhos: “Gostei muito do merecido apoio ao trabalho do Maurício de Sousa”.

CRISTIN

A GALLO

/AGÊN

CIA SEN

ADO

mais, a imprensa mesmo tinha que abra-çar um pouquinho mais esse prêmio,que é bacana, é um reconhecimento donosso trabalho, é o trabalho diário e ár-duo do jornalista.”

Para cada uma das seis categorias foinomeado um padrinho para entregar oprêmio nas mãos do vencedor. Na catego-ria “Site”, o Secretário de Comunicaçãodo Estado do Rio de Janeiro Ricardo Cota,lembrou da importância da ABI, e exaltouo “grande democrata Maurício Azêdo”.

Nomeado padrinho na categoria tv,Maurício falou em seu discurso sobre aimportância da questão social, abordadapor um dos candidatos da categoria, e aparceria com a Acerj:

INTERIOR1º lugar - Aluyisio Abreu BarbosaFolha da Manhã, de CamposAutor da reportagem “Galo que canta aarte do futebol”2º lugar – Leonardo Borges Neves SoaresJornal Na Jogada, Região dos LagosAutor da reportagem “Um sonho dosesportistas”3º lugar - Zé Roberto - Três RiosAutor do livro Crônicas de um (Ex) Jogador

SITE1º lugar - Cahê Mota -Globoesporte.ComAutor da série de reportagens “Goleiro Bruno”2º lugar - Eduardo PeixotoGloboesporte.ComAutor da reportagem “Emerson semcensura”3º lugar - Vinícius Castro - UolAutor da reportagem “Patrícia Amorim:existe um terrorismo contra o Zico dentrodo Flamengo”

LITERATURA1º lugar - Péris RibeiroDidi, o Gênio da Folha Seca2º lugar - Carlos Ferreira VilarinhoQuem Derrubou João Saldanha3º lugar - Alexandre Mesquita eJefferson Almeida - Um ExpressoChamado Vitória

RÁDIO1º lugar - Rafael Marques - Rádio GloboAutor da reportagem “Jogo às 8h”2º lugar - Thayssa Bravo e Roberto LioiRádio CBNAutores da reportagem “Pelé 70 anos”3º lugar - Marcelo FigueiredoRádio Brasil/LBVAutor da reportagem “Jóbson”

TELEVISÃO1º lugar - Tino Marcos - TV GloboAutor da série de reportagens “Osconvocados da Copa 2010”2º lugar - Carlos Ferreira - TV RecordAutor da reportagem “Ferramenta deinclusão na nova realidade do carioca”3º lugar – Carlos Ferreira - TV RecordAutor da reportagem “Brasil e Haiti:nações unidas por uma paixão”

JORNAL E REVISTA1º lugar - Pedro Motta Gueiros - O GloboAutor da reportagem “No coração doBrasil”2º lugar - Michel Castelar - Lance!Autor da reportagem “Lucros da Copa2014 nas mãos de Ricardo Teixeira”3º lugar - Ary Cunha - O GloboAutor da reportagem “Mafalala, a terra docarrasco de 66”

A LISTA DOSVENCEDORES

28 Jornal da ABI 365 Abril de 2011

Liberdade de imprensaLiberdade de imprensa

O Ministro das Comunicações, PauloBernardo, anunciou em 28 de março quevai combater todo tipo de irregularidadesno processo de outorga de concessão decanais de radiodifusão. “As irregularida-des detectadas nos processos de outorgasno setor de radiodifusão serão combati-das e as responsabilidades encaminhadaspara apuração do Ministério Público e daPolícia Federal”, disse Paulo Bernardo emnota de seu Ministério, na qual informouque a Secretaria de Comunicação Eletrô-nica, responsável pelas outorgas de radi-odifusão, está sendo reformulada para ga-rantir que “os novos processos sejammais transparentes e ágeis, evitando ouso indevido e brechas na lei”.

O pronunciamento foi provocado porreportagem publicada pela Folha de S. Pau-lo em sua edição de 27 de março, a qualdenunciava um esquema de empresasque usam laranjas para comprar conces-sões de emissoras de rádio e televisão emlicitações do Governo Federal. O levan-tamento do jornal constatou que quemmais se beneficia são políticos, igrejas eespeculadores.

Apurou a Folha que há licitações queforam arrematadas por valores de atéR$24 milhões. Por isso, chama a atençãona reportagem da jornalista Elvira Loba-to, da Sucursal Rio, o fato de que na listados falsos proprietários há funcionáriospúblicos, donas de casa, enfermeiro e atécostureira. Ou seja, pessoas cuja renda nãoé compatível com o vulto desse negócio.

Entre os políticos supostamente liga-dos a empresas envolvidas ilegalmentenas licitações de concessões estaria o Se-nador Romero Jucá, líder do Governono Senado. Ele seria o verdadeiro donoe não sócio da empresa Paraviana Comu-nicações, que adquiriu duas rádios FMe uma emissora de televisão em licita-ção pública.

Outro caso que desperta atenção é ode uma rádio do Município de Bilac, nointerior paulista, que está no nome deuma cabeleireira que mora em Itapece-rica da Serra, São Paulo. A emissora foivendida por R$ 1,89 milhão, “com1.119% de ágio sobre o preço mínimodo edital”, conforme apurou a jornalis-ta Elvira Lobato.

Dados fornecidos pelo Ministério dasComunicações mostram que de 1997 a2010 foram oferecidas 1.872 concessõesde rádio e 109 de televisão. Durante trêsmeses, a reportagem da Folha analisou as91 empresas que conquistaram o maiornúmero de concessões. O jornal consta-

POR JOSÉ REINALDO MARQUES

Ministro Bernardo quer acabar coma farra das concessões de rádio e televisão

Denúncia da Folha de S. Paulo sacode o Ministério e o faz tomar posição diante de irregularidades:donas de casa, costureira e cabeleireira são utilizadas como laranjas de políticos, empresários e seitas religiosas.

“As irregularidadesdetectadas nos processos deoutorgas no setor deradiodifusão serão combatidase as responsabilidadesencaminhadas para apuraçãodo Ministério Público e daPolícia Federal, as instânciascompetentes para conduzirquestões criminais.

A Secretaria deComunicação Eletrônica, setorresponsável pelas outorgas naradiodifusão, vem investindona gestão e controle deprocessos para evitar fraudese considera que o melhorcaminho é informatizar e darmaior transparência e acessoà sociedade. Entretanto, damesma maneira que outroscrimes contra a administraçãopública, sua apuração cabeao Ministério Público e àPolícia Federal.

As medidas ao alcance doMinistério estão sendoadotadas. Toda a Secretaria jáestá sendo reformulada erepensada para garantir queos novos processos sejammais transparentes e ágeis,evitando o uso indevido debrechas na lei.

Para estimular açõesfuturas, o Ministério está

tou que 44 delas não funcionam nos en-dereços fornecidos.

ProibiçãoPela legislação brasileira de outorga de

concessões de rádio e tv igrejas não po-dem ser proprietárias diretas de emisso-ras, a não ser por meio de fundações. Jáos parlamentares estão impedidos pelaConstituição Federal de ocupar cargos dedireção nas empresas de comunicação.

Em 2007, a Comissão de Ciência e Tec-nologia, Comunicação e Informáticacriou a Subcomissão Especial, para ana-lisar mudanças nas normas de apreciaçãodos atos e outorgas e renovação de con-cessão de serviços de radiodifusão.

Presidida pela Deputada Luiza Erun-dina (PSB-SP), a Subcomissão Especialapresentou, em 2009, um relatório noqual propõe uma emenda no art. 222 daConstituição Federal, determinando queseja proibido “de ser proprietário, con-trolador, gerente ou diretor de empresade radiodifusão quem esteja investidoem cargo público ou em gozo de imuni-dade parlamentar ou de foro especial”.

O Secretário de Serviços de Comuni-cação Eletrônica do Ministério das Comu-nicações, Genildo Lins de Albuquerque,disse à Folha que não há como o órgão iden-tificar se os nomes que constam dos con-tratos sociais das empresas são de laranjasou dos verdadeiros proprietários.

Veja o que ele disse à reportagem daFolha: “Seria preciso quebrar o sigilo fiscalda empresa e dos sócios e fazer escutatelefônica para saber se há um sócio ocultopor trás dos proprietários declarados”.

Genildo Albuquerque disse tambémque a tarefa de investigar atos ilícitos naslicitações de concessões públicas de rádioe tv é da Polícia Federal.

consolidando todos os dadosde outorgas para divulgaçãona internet, o que possibilitaráà população em geral exercero controle social e ajudar oMinistério das Comunicações,o Ministério Público e aspolícias no exercício das suasrespectivas competências.

Vale salientar que alegislação atual não permite atransferência de outorga nosprimeiros cinco anos após aemissão da licença defuncionamento, razão pelaqual nenhum licitante pode“vender” regularmentenenhuma outorga sem que aestação emissora estejafuncionando há pelo menoscinco anos. Qualquer infraçãoa esta regra acarreta cassaçãoda outorga.

Entretanto, como jáesclarecido, a administraçãopública tem dificuldade paraverificar se os sócios de umaempresa têm condiçõeseconômicas de figurar nasociedade ou se são os sóciosde fato, e também de verificara existência de “contratos degaveta”, pois, como o próprionome diz, são contratosocultos, de conhecimentoapenas das partes.

No que se refere àslicitações não concluídas, oMinistério já vem tomandomedidas para eliminar estepassivo do Poder Público.Dentro do prazo já divulgado(um ano e meio) osprocedimentos licitatórios nãoconcluídos serão tratados,podendo acarretar tanto aconcessão da outorga e aconseqüente assinatura docontrato (após a aprovação doCongresso Nacional), quantoa revogação daqueles em quese constate a impossibilidadede conclusão.

Aliado a isso, oaperfeiçoamento dosprocedimentos burocráticos (jáem curso desde janeiro) tornaráo trâmite muito mais rápido, oque também exigirá capacidadede resposta dos licitantes eoutorgados, o que acarretará ofato de que somentepermanecerão nas licitações enas outorgas aquelasempresas que realmente têmmeios para isso.

Ainda neste ponto, oMinistério vem estudandomedidas para impedir queempresas sem capacidadefinanceira participem delicitações de radiodifusão (por

exemplo, a exigência decaução para participar docertame). Os próximos editais,que somente serãopublicados após a conclusãodos procedimentos nãoconcluídos, conterão cláusulascom tal finalidade.

No que se refere aretransmissoras deradiodifusão e a outorga derádios e tvs educativas erádios comunitárias, oMinistério das Comunicaçõesesclarece que esses sãoserviços públicos, por isso,não há que se falar emlicitação, inclusive porque asentidades outorgadas nãopodem auferir lucro emdecorrência de tal atividade.No entanto, para tornar maistransparentes as concessõesde radiodifusão educativa,ainda nesta semana seráposta em consulta pública (nosite do Ministério dasComunicações) uma propostade norma com a finalidade deestabelecer critérios eprocedimentos céleres paratais outorgas.

Medida semelhante estásendo tomada no que serefere às retransmissorascomerciais, cuja norma aindaestá em fase de elaboraçãono Ministério, mas que seráposta em consulta pública nospróximos vinte dias. Valesalientar, no entanto, que nãohá previsão legal paracobrança por tais serviços,questão que deverá serresolvida no médio prazo como envio de projeto de lei aoCongresso Nacional prevendoque os serviços deretransmissão, quando para aexploração econômica, serãoobjeto de licitação e cobrançapor parte do Estado.

De qualquer forma, asoutorgas de radiodifusãoeducativa e de estaçãoretransmissora estãosuspensas até a publicaçãodas novas normas relativas atais serviços.

O Ministério dasComunicações acredita que,com as medidas aquimencionadas, em conjuntocom todas as outras jáanunciadas, tornarão o setorde radiodifusão maistransparente e organizado,possibilitando que ele exerçaregularmente a sua funçãode pública de informar,educar e entreter apopulação brasileira.”

A definição,após a

denúncia

O Ministro Paulo Bernardoinformou que a Secretaria

de Comunicação Eletrônicaestá sendo reformulada

para que as novas outorgasde radiodifusão sejam mais

transparentes e ágeis.

ELZA FIÚZA/AB

R

29Jornal da ABI 365 Abril de 2011

A Polícia Civil de Pernambuco conse-guiu montar no dia 14 de abril o retrato-falado de um homem suspeito de atirarcontra o apresentador de televisão e radi-alista Luciano Pedrosa, de 46 anos, assas-sinado no dia 9 em um restaurante nobairro Bela Vista, em Vitória de SantoAntão, na Zona da Mata do Estado.

Luciano apresentava o programa Açãoe Cidadania na TV Vitória, com pautaspoliciais, e trabalhava na Rádio Metro-politana FM. Seus colegas revelaramque ele fazia oposição ao Governo domunicípio e já havia sido ameaçado demorte diversas vezes por causa das de-núncias feitas em seus programas.

Na terça-feira, 12, a Polícia prendeuoutro suspeito, o mototaxista CláudioPereira da Silva, de 31 anos, que teriadirigido a motocicleta utilizada peladupla de criminosos. Cláudio negouenvolvimento no crime, mas segundo osDelegados Maria Betânia Tavares, titu-lar da Delegacia de Vitória de SantoAntão, e Alfredo Jorge, do Departamen-to de Homicídio e Proteção à Pessoa-DHPP, ele foi reconhecido por uma dastestemunhas:

“Cláudio forneceu alguns álibis quelogo foram derrubados. Pessoas que eleapontou prestaram depoimento e des-mentiram as alegações. As diligênciasestão em curso e praticamente já sabe-mos quem atirou”, disse Alfredo Jorge.

Testemunhas que estavam no local docrime contaram que o assassino anun-ciou um assalto antes de atirar quatrovezes contra o radialista: “O criminosofez três disparos, mas a munição falhou,e ele, então, fez outro disparo, que atin-giu o rosto de Luciano. O radialista nãofez registro policial das ameaças demorte, mas trabalhamos com a hipóte-se de represália em função das denúnciasfeitas por ele em seu programa”, infor-mou a Delegada Maria Betânia.

“Você vai virar notícia”O radialista Jota Santos, vizinho de

Luciano, confirmou as ameaças contrao colega: “Trabalhamos juntos e sabe-mos o que acontece porque a gente cri-tica, porque a gente investiga as situa-ções. Ele vivia sendo ameaçado. Eramdenúncias anônimas. Eram pessoas queligavam para o telefone da televisãomandando avisar que ele viraria notícia,que estava falando muita bobagem, queparasse com isso. Quando ele tocava emalgum tipo de ‘ferida’ sempre aconteciaalguma coisa.”

A Delegada Maria Betânia informouque a Polícia recolheu impressões digi-

O Sindicato dos Jornalistas do Paráemitiu nota condenando a prisão daequipe de jornalismo da TV Liberal, afi-liada da Rede Globo, composta pelo re-pórter Guilherme Mendes, o cinegrafis-ta Carlos Batista e o auxiliar EdmilsonLuz. Eles foram detidos por três polici-ais militares no Município de Acará, apedido da Diretora da Unidade Mista deSaúde local, Simone Almeida, quando osintegrantes da emissora estavam produ-zindo uma reportagem sobre denúnci-as de falta de estrutura, medicamentose médicos na região.

A equipe de jornalismo ficou detidapor meia hora, acusada de estar fazendogravações sem autorização prévia. A or-dem de soltura dos profissionais foi dadadepois pela Diretora Simone, que caiu emsi e desistiu de registrar a ocorrência.

Para a direção da TV Liberal, a prisão

gação policial, uma vez que o crime emquestão é uma violência ao pleno direitodemocrático e fere toda a sociedadebrasileira.”

Protesto no exteriorO Comitê para a Proteção dos Jorna-

listas-CPJ, com sede em Nova York, co-brou “uma rápida e completa investiga-ção” sobre o assassinato de Luciano. Emnota, o CPJ afirmou que a Polícia deveconsiderar o trabalho do jornalista como“possível motivo do crime”: “As autori-dades devem garantir que os jornalistascríticos possam trabalhar sem temer porsuas vidas”, disse Carlos Lauría, Coorde-nador do CPJ.

A Diretora-geral da Unesco, IrinaBokova, também condenou o assassina-

to do radialista e jornalista. Ela pediu queas autoridades brasileiras tomem provi-dências contra a onda de violência quetem atingido jornalistas no País, afir-mando que o jornalismo é uma atividadeque deve ser exercida com liberdade:

“Os jornalistas devem ser livres paratrabalhar sem medo. O debate públicopara o qual eles contribuem está no cerneda governança democrática. O assassina-to de Luciano Leitão Pedrosa é um ata-que direto contra esse debate, e contra odireito humano fundamental da liberda-de de expressão. Eu condeno este e outrosassassinatos, que não devem ficar impu-nes”, disse a Diretora-Geral da Unesco.

Irina Bukova lamentou que ataquesa jornalistas sejam crimes que vêmacontecendo com freqüência no Brasil.Ela lembrou também o atentado contraa vida do blogueiro Ricardo Gama, nodia 22 de março, em Copacabana, no Riode Janeiro.

A Associação Nacional de Jornais-ANJ também divulgou comunicado re-pudiando o assassinato de Pedrosa e co-brando a investigação do crime.

ComoçãoEm clima de comoção, mais de 2 mil

pessoas acompanharam no dia 10 o ve-lório do apresentador; o enterro realiza-do às 9h do dia 11, no Cemitério SãoSebastião, em Vitória de Santo Antão.

Luciano Pedrosa era casado e deixauma filha e dois enteados.

tais para ajudar na identificação do autordos disparos, mas não conseguiu imagensda cena do crime porque a câmera insta-lada na porta do estabelecimento nãotinha filme. Disse ainda a Delegada queLuciano teria sido seguido antes de che-gar ao restaurante e que as imagens cap-tadas por outras câmeras nas ruas po-dem ajudar a identificar criminoso.

O Presidente da Associação da Im-prensa de Pernambuco-AIP, MúcioAguiar Neto, que é Conselheiro da ABI,manifestou preocupação com o au-mento de crimes contra jornalistas:“Novamente, o interior pernambucanoé alvo da violência contra profissionaisde imprensa que no exercício da funçãosão calados pela agressão e morte. A AIPentende que é necessária ativa investi-

POR CLÁUDIA SOUZA

Polícia de Pernambuco no encalçodos matadores de radialista

Luciano Pedrosa fazia oposição ao prefeito e fora ameaçado de morte várias vezes.

No interior do Pará PMs prendem três jornalistasdos seus profissionais foi uma retaliação,porque a reportagem comprova as de-núncias de condições precárias de aten-dimento, falta de médico e medicamen-tos, além do péssimo estado de higienedo hospital público de Acará.

O Sindicato protesta“O Sindicato dos Jornalistas do Pará

(Sinjor-PA) repudia os fatos ocorridos coma equipe de jornalismo da TV Liberal,composta pelo repórter Guilherme Men-des, o repórter-cinematográfico CarlosBatista e o auxiliar Edmílson Luz , que foidetida por três policiais militares, noMunicípio do Acará, a pedido da diretorada unidade de saúde daquela localidade,no momento em que fazia uma reporta-gem sobre as más condições de saúde, comatendimento precário e falta de estrutura,medicamentos e médicos.

O Sinjor entende que a população doMunicípio do Acará e de todo o Pará temo direito de saber o que ocorre naquelaunidade de saúde e as dificuldades en-frentadas pelos cidadãos que buscamatendimento. O papel de levar informa-ção à sociedade tem contribuído para queprovidências sejam tomadas em todas asáreas deficientes em nosso Estado.

A Presidente do Sinjor, Sheila Faro, eos diretores da entidade ressaltam que aatitude tomada é inaceitável, pois cons-titui-se em agressão a toda a sociedade,já que viola a liberdade de imprensa e odireito à informação. É princípio basilarde toda democracia que o livre exercícioda profissão de jornalismo seja preserva-do. O Sinjor já acionou a sua assessoriajurídica, para entrar com a ação judici-al cabível contra os responsáveis por esselamentável fato.”

O assassinato doapresentador detv e radialistaLuciano Pedrosano interior dePernambucoganhourepercussãointernacional.

REPROD

UÇÃO

30 Jornal da ABI 365 Abril de 2011

Direitos humanosDireitos humanos

“Todo o processo foi marcado pela re-pressão e por graves arbitrariedades.Quase no final do ato ocorrido na sexta-feira, dia 18/03, em frente ao Consuladodos Estados Unidos, a Polícia Militar co-meçou a lançar bombas de gás lacrimogê-nio e balas de borracha. O cenário era deguerra. Nós corríamos desesperados emmeio às balas e bombas que explodiam donosso lado. Nós conseguimos reunir umgrupo na Avenida Beira-Mar e depois de20 a 30 minutos do fim do ato nos enca-minhamos em direção à Cinelândia,portando as faixas e bandeiras da manifes-tação. De repente, fomos cercados pelaPolícia Militar. Eles nos mandaram sen-tar no chão olhando para baixo. Apreen-deram as faixas e as bandeiras que esta-vam conosco e nos disseram que alguémdo ato havia lançado um coquetel molo-tov no Consulado e que este teria atingi-do um vigilante (foi só nesse momento,através da Polícia, que soubemos do co-quetel molotov; até então, tudo o que sa-bíamos, era que a Polícia havia encerradoa manifestação com bombas). As nossasmochilas foram revistadas na mesmahora. Os policiais não encontraram nada.

Depois disso, fomos colocados dentrodo camburão. Os policiais resolveram nãonos algemar. Eles desrespeitaram, noentanto, um companheiro que é advoga-do (o Dr. José Eduardo) e que disse a elesque estava ali para assistir-nos. Mesmoassim, foi preso junto conosco, assimcomo um menor de idade, uma senhorade 69 anos, que havia se incorporado àmanifestação por concordar com a defe-sa da soberania nacional e da luta contraa agressão imperialista a todos os povos domundo, e um ativista que tinha levadoum jato de spray de pimenta no olho.

Chegamos à 5ª DP e ficamos numasala separada. Não existiam quaisquerprovas contra nós. Fomos novamente re-vistados, todas as bolsas e mochilas, etudo o que o delegado da Polícia Civil en-controu foram panfletos. Mesmo dian-te das evidências, fomos todos manda-dos para os presídios de Bangu 8 e ÁguaSanta. Para Água Santa foram 8 homens.Nós fizemos uma discussão de abrir mãode prisão especial quem tinha esse direi-to para ficarmos todos juntos, pois seriamais seguro e manteria o moral numasituação tão difícil.

Já no presídio de Água Santa, nossascoisas foram separadas e fomos revista-dos. É importante registrar o espanto dopolicial civil que nos transportou para opresídio e dos próprios carcereiros, quediziam não estar acostumados com pre-sos como nós, pois estavam acostuma-dos com bandidos. Ainda assim, tivemosque seguir a disciplina do presídio. Logodepois da revista, tivemos as nossas ca-beças raspadas. Embora a administração

veram encarcerados para dar uma satis-fação ao imperialismo. Afinal, depois detodo o circo montado para a vinda deObama, não era possível tolerar queninguém jogasse água no chope da fes-ta de comemoração da entrega do nossopré-sal aos Estados Unidos.

“LAVAMOS UMA PARTE DACELA PARA QUE OS RATOS

NÃO ENTRASSEM”Na cadeia, tivemos que nos organizar

até mesmo para garantir a higiene. Im-provisei um detergente com água e sabãopara os nossos pratos, que eram aquelespratos de alumínio de quentinha. Nóscolocávamos todo o lixo num saco e de-pois amarrávamos. No domingo, lava-mos uma parte da cela para que os ratosque andavam pelos corredores do presídionão entrassem, ou pelo menos não ficas-sem na nossa cela, e não nos mordessem.E isso porque a cela havia sido limpa an-tes de nós chegarmos. Naquelas circuns-tâncias, devíamos ser vistos como vip, oque só mostra a gravidade da situação nosistema carcerário brasileiro.

Nós não pudemos levar nada nosso paraa cela. Só pudemos entrar com o unifor-me da prisão, com o sabonete, o papelhigiênico, a escova e a pasta de dentefornecidas pela prisão. Não pudemosentrar com as nossas toalhas de banhopara a cela. Os nossos livros também nãopuderam entrar. Eles seriam uma valiosacompanhia para fazer passar o tempo,mas aí como pensaríamos no castigo que

Em depoimento exclusivo para o Jornal da ABI, o jovem ProfessorRafael Rossi narra os sofrimentos que lhes foram impostos

pela Polícia do Rio após o ato no Consulado dos Estados Unidos.

O calvário dos 13 do protestocontra a visita de Obama

afirme ser uma norma do lugar e porquestões de higiene, não pudemos dei-xar de encarar como uma violência, pois,naquele momento, já éramos tratadospublicamente com o status de presospolíticos, mas estivemos submetidos atodo o regime disciplinar ao qual estãosubmetidos os presos comuns. Aliás,essa experiência na prisão deu-me acerteza de que esta é uma instituiçãofalida, que não recupera ninguém.

“O COTIDIANO NA PRISÃOÉ TERRÍVEL. FICAMOS

COMPLETAMENTEINCOMUNICÁVEIS”

O cotidiano na prisão é terrível. Per-díamos a noção do tempo por váriasvezes. No domingo, ficamos completa-mente incomunicáveis. A nossa afliçãosó aumentava. A situação só não foi piorporque tivemos a capacidade de nos or-ganizar, de ficar sempre conversando, àsvezes até cantando e fazendo brincadei-ras para que ninguém se deprimisse.Conversávamos o tempo todo. O nossoconfinamento foi absoluto. Ficamosnuma cela e numa ala separadas dosdemais presos, para a nossa segurança, oque só reforça o fato de sermos presospolíticos. Os agentes e os presos que tra-balhavam para reduzir a pena nos dizi-am que quando Obama fosse emboraestaríamos soltos, o que nós tambémpensamos, pelo menos como a hipótesemais provável, pois sabíamos que osGovernos Dilma e Cabral só nos manti-

estávamos levando? E o pior é que tantoa Polícia quanto o Governo sabiam queo coquetel molotov não havia partido denenhum dos presos, sendo, provavel-mente, alguém infiltrado para acabarcom o ato e justificar a repressão o ver-dadeiro responsável. Desse modo, está-vamos sendo punidos simplesmente porexercermos a nossa liberdade de expres-são e de manifestação. Parece que oGoverno americano, que prende, matae tortura no mundo todo, cobrou deseus anfitriões uma postura mais firmequanto aos protestos que fossem con-trários aos interesses estadunidenses.

“NO INÍCIO, NÃOTÍNHAMOS ÁGUA POTÁVEL,

SÓ ÁGUA DA BICA”Na segunda-feira, conseguimos entrar

com nossos livros e toalhas. Eu fiqueiuma noite sem tomar um remédio queera um antiepilético, correndo o risco deter uma convulsão dentro da cela. Depoisde muitos protestos de familiares e ami-gos de fora do presídio e nossos pedidosdentro, eu recebi o meu remédio. A pres-são também ajudou a aliviar em outrosaspectos. No início, não tínhamos águapotável, só água da bica. Com a pressão deamigos e familiares, conseguimos umaconta na cantina do presídio, pedindo prin-cipalmente água mineral e cigarros. A co-mida que comemos foi a do presídio mes-mo, pois não queríamos abusar do esfor-ço dos nossos companheiros do lado defora e nem gozar de privilégios excessivosem relação a outros presos. Na segunda,conseguimos ter acesso aos jornais e tive-mos visita. Antes disso, tivemos a visita doadvogado Dr. Aderson, da Comissão de Di-reitos Humanos da OAB-RJ, no sábado.

A disciplina era rigorosa. Duas vezespor dia tinha o confere. Nós ficávamosagachados, de cabeça baixa, em sinalmais de submissão do que de respeito, eéramos contados. Quando saíamos dacela, o fazíamos em fila, com as mãospara trás e de cabeça baixa. Tínhamosque chamar os funcionários do presídiode chefe ou senhor. Apesar disso, conse-guimos ter uma boa relação com algunsagentes e com outros presos, que chamá-vamos de irmãos, pois é assim na prisão.Privacidade inexiste numa penitenciá-ria como essa. O vaso sanitário, que é,praticamente, um buraco no chão, ficavaexposto e não podíamos usar nada decortina. Pelo menos, tínhamos chuvei-ro na cela. A luz ficava acesa a noiteinteira. Foi bastante difícil dormir naprimeira noite. Na noite seguinte, jápude perceber uma preocupante adapta-ção à situação, conseguindo dormir maisfacilmente. Eu me cobria mais commedo de levar uma mordida de rato doque pelo frio. Mas sobrevivemos.

MU

NIR

AH

MED

31Jornal da ABI 365 Abril de 2011

“CONSEGUIMOS NOSMANTER FIRMES O TEMPOTODO, APESAR DE TODA

HUMILHAÇÃO”A lição que podemos tirar é que

quando o Estado pratica uma violênciadessas é para quebrar o espírito de luta,para desmoralizar, para amedrontar. OsGovernos Cabral e Dilma já perderamessa, pois saímos mais fortes. Conse-guimos nos manter firmes o tempotodo, apesar de toda humilhação. Nãodescansaremos até que a verdade apa-reça e que o Estado seja responsabiliza-do por essa agressão. Fomos vítimas deuma prisão ilegal e arbitrária e sofre-mos com a prisão pela audácia de falarcontra a política do imperialismo es-tadunidense e a política do Governobrasileiro, que ocupa militarmente oHaiti e entrega o pré-sal. É uma gran-de surpresa que a Presidente Dilma,que foi presa política na ditadura mi-litar, tenha feito os seus primeirospresos políticos no terceiro mês de seumandato, para agradar o imperialismo,o mesmo imperialismo que apoiava aditadura. Saímos vivos do inferno. E sópodemos agradecer ao amplo movi-mento que se mobilizou pela nossa li-bertação: os partidos políticos, comoo PSTU e o Psol, e alguns militantes doPT; os sindicatos, como o Sepe-RJ, oSindipetro-RJ, o Sindjustiça e a CSP-Consultas; as entidades estudantis,como a Anel, o DCE-UFRJ e o DCE-UFF; os parlamentares, como o Sena-dor Lindberg Farias, do PT, os Deputa-dos federais do Psol, Chico Alencar eJean Wylis, os Deputados estaduais doPsol, Marcelo Freixo e Janira Rocha, oex-Deputado federal e Presidente doPSTU-RJ, Cyro Garcia, e o DeputadoStephan Nercessian, do PPS; a OAB, aABI, os nossos advogados, os nossosfamiliares e amigos. Foram muitas vo-zes juntas ecoando pela liberdade enem os governos nem a mídia pude-ram ignorar. Estamos livres no mo-mento, mas o processo segue e preci-samos arquivá-lo para que as liberda-des democráticas sejam restabelecidas.Até o momento, vivemos um proces-so que segue a dinâmica de um Estadode exceção. O direito foi ignorado, aConstituição foi ignorada e as liberda-des conquistadas com o fim da ditaduraforam ignoradas. A democracia noBrasil está em jogo. A criminalizaçãodos movimentos sociais deve ser com-batida, sob pena de rumarmos a passoslargos para uma ditadura, já não tão dis-farçada, que garantirá toda a tranqui-lidade para os negócios que serão feitosna Copa do Mundo e nas Olimpíadase garantirá os lucros dos banqueiros edos empresários durante essa crise eco-nômica, penalizando a classe trabalha-dora, que pagará a conta da crise se nãolutar contra essa situação. É o nossodireito de lutar por uma vida melhor,por liberdade e justiça que foi posto emxeque com essas prisões políticas.”

mpressionou-me vivamente a obraJesus - Causa Mortis (Belo Horizon-te: Papi, 2010) de Manoel Hygino dos

Santos, sobre o qual escrevi breve estu-do. Mas não me limitei àquele trabalhoquando me propus a refletir sobre a lei-tura, sobre o mito e sobre as forças queoperam na mente humana para construira opinião. Discorri acerca dos vários cris-tos modelados ao longo dos sucessivoshorizontes de expectativa, tentando re-lativizar certos estudos diacrônicos econclusões históricas baseados tão so-mente na interpretação dos historiado-res, ou dos religiosos, mesmo calcados emvasta documentação.

Fiz igualmente incursão demorada nasfigurações de Machado de Assis e de suaobra, após o convívio com os traba-lhos de extremo valor espitemoló-gico: O Altar e o Trono - Dinâmica doPoder em O Alienista (S. Paulo: Ateliê,2010), de Ivan Teixeira, e O Dom doCrime - romance (Rio: Record, 2010),de Marco Lucchesi. Ambos, o ensaís-ta e o novel romancista, deslocam osestudos de crítica genética e de avali-ação historiográfica ou textual paranível mais elevado, apontando em di-reção de novo modo de inclusão deMachado de Assis na arena político-ideológica do Brasil. Do mesmo modosaneador do meio congestionado pe-los estudos repetitivos e escassamentecriativos, vale apontar a coleção orga-nizada por Gustavo Bernardo, Joa-chim Michael e Markus Schäffauer, areunir as Conferências do Colóquiode Hamburgo (2008), com o títuloMachado de Assis e a Escravidão (S.Paulo:Annablume, 2010). Inúmeros cristos, vá-rios machados, incontáveis interpretações.

Pois bem: permito-me reproduzir aapresentação a que procedi, em dadomomento da ditadura brasileira, de umaexposição de esculturas de Guido Rocha(não há muito falecido), com o título ACrucificação do Homem. Também ele,no dia13 de abril de 1973, expôs seus trabalhosao público numa era de extrema vigilân-cia e censura. Sofrera torturas no Brasile no Chile, para onde fugira. Regressoucom o corpo dilacerado e o espírito alti-vo. Também ele figurou seus vários cris-tos, conforme testemunhei naquela data.

Eis o meu escrito:Guido Rocha é mineiro do Serro, onde

nasceu em 1933. Cedo começou sua liga-ção com as artes plásticas, iniciando osestudos, em 1951, com Guignard, que, àépoca, ensinava na escola do ParqueMunicipal. Guido era dos mais jovens deum grupo de alunos em que estavam Cha-nina, Wilde Lacerda, Vicente Abreu, Petrô-nio Bax, Holmes Neves e outros. Estudouem seguida com Haroldo Mattos na ex-Escola de Belas-Artes de Minas Gerais.

Em 1960, ingressou no curso de Socio-

logia e Política da Faculdade de CiênciasEconômicas da UFMG, que terminou em1963, tendo abandonado provisoriamen-te as artes para trabalhar como sociólogo.Enquanto estudante, foi também jornalis-ta, militando na imprensa como repórterda Tribuna de Minas, Diário da Tarde eeditor de Última Hora. Antes, em 1958,fundou e dirigiu com outros companhei-ros a revista TV Semanal, onde fez cartuns.

Voltou a dedicar-se às artes, semipro-fissionalmente, em 1967, realizandouma experiência inovadora com a pintu-ra de cartões de Natal. Começava entãouma “pesquisa sobre a textura”, utilizan-do materiais novos, o que o levou nova-mente a pintar quadros. Em 1968, parti-cipou da I Feira de Arte Popular, realiza-da por uma extinta galeria da cidade, edo salão da Prefeitura, onde ganhou prê-

mio de aquisição. É dessa época tambémsua primeira exposição individual, reali-zada no Chez Bastião, mostrando quadrosdas séries Dom Quixote e A Guerra do Povo.

Seus trabalhos causaram forte impac-to na crítica e no público, esgotando-serapidamente.

Mudando-se para o Rio, dedicou-se aoartesanato, confeccionando objetos debijuteria com o emprego de aço inoxidá-vel, cimento e resinas. Nessa ocasião,parte para modelar pequenos cristoscom o material que vinha utilizandopara fazer bijuterias. Empolgado com atemática e descobrindo um novo cami-nho na técnica da escultura, foi abando-nando pouco a pouco a pintura e o arte-sanato para dedicar-se exclusivamente àfeitura de cristos. Estes, na sua formaatual, isto é, após três anos de demoradaspesquisas formais, resumem todas asinquietações humanas do artista.

Por baixo da forte expressão visual,repousa um apelo pragmático no estudode Guido Rocha: a nova cruzada de liber-tação do Cristo. O artista parte do prin-cípio de recondução da vítima ao seuquadro original, circundado de opressãoe miséria humana. Esteticamente, poucos

escultores terão chegado tão próximos davisão trágica da flagelação.

Durante séculos, os que se apoderaramda imagem de Cristo, para fins de conso-lidação de um domínio temporal, deslo-caram a tragédia do Calvário para umcenário ambíguo de paródia e falsidade.Compôs-se, inicialmente, o Cristo-ador-no, modelado em ouro ou em prata, apresidir a opulência dos abastados; emseguida, em nosso tempo, executou-se amais perfeita banalização do Cristo, emespetáculos, em canções populares, emcamisas-esporte, em enfeites massifica-dos. A sociedade de consumo tornou-ouma peça a mais da imensa rede de rela-ções mercantis. Já se falou que no Brasilcolonial era costume conceber um Cris-to que deslizava na cruz para uma posi-ção mais confortável. Cheguei a ver um

antropólogo americano repetir estecomentário: “In Brazil, even Christhangs comfortably on the cross.”

O Cristo de Guido Rocha, contra-riamente, procura romper com a pu-nição, saltar da cruz, formar com elauma relação de antagonismo. Qual-quer observador notará uma oposi-ção Cristo (ruptura) X Cruz (regra),um jogo de violento contraste.

O realismo dramático de GuidoRocha sacraliza a força humana in-justamente punida, dessacralizandoa imagem piedosa envolta na dor-en-feite do sadismo e da hipocrisia. Nes-sa perspectiva, o escultor hostil pos-to que artisticamente calculado.Aparecem, então, o Cristo-lanhado,o Cristo-protesto, o Cristo impoten-te na sua revolta. A cena é patética eo artista não foge dessa tonalidade.

Dentro do conjunto de espantosaunidade criadora podemos surpreender-nos com o Cristo-negro, o Cristo-índio,o Cristo-heróico, e o Cristo-épico, o Cris-to leproso, o Cristo arruinado pela dor.Nova relação se estabelece ao nível deespectador/obra. Esta o agride e o leva atomar partido, a comprometer-se comela. Deriva da tortura e da mutilação umestado de pânico ou de revolta, de com-promisso ou de cumplicidade de que oobservador dificilmente se vê livre.

O material de Guido Rocha é elemen-tar (barro, em vez de ouro), a concepçãoé realista, a relação entre Cristo e Cruz,bem como entre Crucificado e Especta-dor, é dialética. Por isso a indiferençaperante a obra é impensável.

Cada Cristo é uma existência artísti-ca de rápida polarização crítica. Tem umaautonomia proveniente da originalida-de, da força da paixão dominada pelaexpressividade artística. Fala e diz mui-to, do homem de todos os tempos.

POR FÁBIO LUCAS

ENSAIO

A crucificação de Cristo

Fábio Lucas é ensaísta, crítico de Literatura,ficcionista, autor de O Núcleo e a Periferia deMachado de Assis (S. Paulo: Amarilys, 2009), Ficçõesde Guimarães Rosa:Perspectivas (S.Paulo, Amarilys,2011) e Grandezas e Misérias da Amazônia (a sair).

I

Rafael Rossi é professor de História, diretor do Sepe-RJ e militante do PSTU.

REPROD

UÇÃO

CRISTO TORTURADO, DE GUIDO ROCHA.

32 Jornal da ABI 365 Abril de 2011

Reynaldo Jardim era terreno fértil deidéias. De sua mente criativa brotarame floresceram algumas das mais ricas pá-ginas da imprensa escrita brasileira. Nas-cido em São Paulo em 1926, ele faleceuem Brasília, no dia 1º de fevereiro desteano, vítima de um aneurisma na artériaaorta. Sua morte, é claro, ocupou a ses-são de obituário de praticamente todosos jornais do País. Mas, por mais referên-cias que sejam feitas, parece estar semprefaltando algo a ser dito ou escrito sobreReynaldo. Há muito o que se admirar emseu cultivo. Isso fica evidente na fala deamigos e colegas que, ouvidos pelo Jor-nal da ABI, destacam seu rigoroso talen-to profissional e sua personalidade úni-ca. Uma questão de justiça.

“Conheci Reynaldo Jardim quando eleera Diretor da Rádio JB, e eu era diretora darevista do Instituto de Educação, O Tanga-rá. Eu devia ter uns 16 ou 17 anos, estavano 2º ano do curso Normal. Tudo ocorreuatravés de um professor nosso de Filoso-fia, Dymas Joseph Pellegrin, que trabalha-va também na Rádio. Eu e o agitado gru-po de colegas que fazíamos a revista docolégio fomos conhecer o Reynaldo, quenos deu uma ‘assessoria’ pra fazer a ‘refor-ma gráfica’ da revista, que era bem ‘fei-nha’. Ficamos amigos e passamos a fre-qüentar a sala do Diretor da Rádio JB, quenos recebia em sua prancheta para discu-tir os mais variados temas e diagramar onosso jornal”, lembra Tetê Moraes.

“Reynaldo é insubstituível. Nomescomo ele fazem muita falta no cenárioatual da imprensa brasileira. Suas princi-pais características eram a generosidadee a abertura intelectual e afetiva, além dainventividade e criatividade. Isso faziadele não só alguém criativo e inteligen-te, mas uma pessoa muito amável e ama-da. Uma personalidade gostosa e queri-da”, afirmou a cineasta, que em 2006 re-viveu parte dessa história ao dirigir ofilme O Sol – Caminhando Contra o Ven-to. “Aquela foi uma experiência maravi-lhosa, indescritível e marcante na vida detodos os que participaram dela. E Reynal-do foi o líder daquela maravilhosa malu-quice chamada O Sol. Ele e Ana Arruda.”.

As transformações no JBAlém da Direção da Rádio JB, Reynal-

do Jardim deu outras valiosas contribui-ções para esse grupo de comunicação,um dos mais importantes do Brasil naépoca. Nos anos 1950, ele participou ati-vamente da reforma do Jornal do Brasil– onde criou e editou o Suplemento Do-minical do JB, o Caderno de Domingo e oCaderno B. O Suplemento Dominical logopassou de páginas de receitas de bolo aomais respeitado suplemento literário depoesia concreta do Brasil, por onde passa-ram críticos e escritores de renome.

“A reforma do JB começou justamen-te com o Suplemento Dominical. Era umcaderno de vanguarda inserido num mar

de anúncios classificados. Com o sucessodo SDJB, no qual colaboravam AntônioHouaiss, Ferreira Gullar, Mário Pedrosa,Mário Faustino e outros, a CondessaPereira Carneiro resolveu dar uma carae um conteúdo novo ao jornal. Chamouuma equipe de jornalistas, a maioriavinda do Diário Carioca.

“A cabeça da reforma do JB foi o Jâniode Freitas. Depois, criei o Caderno B. Atéentão, o JB era editado em dois cadernos.O segundo era apenas o prosseguimen-to do primeiro e nele saíam os classifica-dos. Eu achei que esses anúncios deveri-am sair em caderno separado. Assim,ficamos com o caderno A, de atualidades;o C, de classificados; e o do meio, o B,com os assuntos culturais. O B, assim ba-tizado pelo Jânio, era editado por mim”,contou o próprio Reynaldo em entrevis-ta a Daniela Frauches e Jéssica Lima, pu-blicada no Blog B em junho de 2009.

O Caderno B logo tornou-se referên-cia de formato e conteúdo na cobertu-ra de cultura – marcado pela prática dainovação e do bom jornalismo. O su-cesso e o reconhecimento, no entanto,não impediram que Reynaldo Jardimpedisse demissão do Jornal do Brasil,fato que ocorreu em 1964, em meio apressões do regime militar sobre a im-prensa. O episódio foi recordado por elena mesma entrevista.

“Um dia eu cheguei na rádio e a equi-pe de programação da música não esta-

Muitas foram as sementes lançadas por ele em suafecunda trajetória profissional. Da histórica reforma doJornal do Brasil ao vanguardista O Sol, a criatividadedele ajudou a mudar o rumo da imprensa brasileira.

BALANÇO

POR PAULO CHICO

Cineasta, produtora e jornalista, Tetêlogo estreitaria os laços profissionaiscom Reynaldo.

“Trabalhamos primeiro no jornal al-ternativo O Sol. Tive a sorte de fazerparte da equipe de diagramação do jor-nal, que atuava diretamente com o Rey-naldo. Éramos as ‘meninas do Reynaldo’.Seis mulheres que tinham um statusespecial na Redação. Podíamos determi-nar o tamanho das matérias, quantas‘batidas’ e quantas linhas teria que tercada título, o tamanho da ‘chamada’, etudo o mais. Na equipe do Reynaldo sóeram aceitas meninas bonitas, brincavaele. O Daniel Azulay, por exemplo, feztudo pra entrar, mas não conseguiu (ri-sos)”, conta Tetê, que ainda trabalhariacom o mestre no Correio da Manhã.

“Quando fui presa pelos militares, emjaneiro de 1970, fui dispensada do jornal.Quando fui solta, três meses depois, oReynaldo fez um barulho danado parame readmitirem. Pouco depois tive aprisão preventiva decretada e tive quesair do Brasil, fugir mesmo. Então elemandou me despedirem, para eu recebero que tinha direito. Só voltamos a nosencontrar anos depois, em 1987, quan-do, já de volta ao Brasil, fazendo cinemadocumentário, encontrei-o quando eleera Presidente da Fundação Cultural edo Festival de Cinema de Brasília.”

Tetê Moraes é taxativa ao descrevero amigo:

ELIAN

E SOA

RES

33Jornal da ABI 365 Abril de 2011

todos os sentidos, criado e sempre edita-do por Reynaldo, em associação comFerreira Gullar, mas só nos últimos tem-pos retirado, por uma ou outra pesqui-sa, de falsos criadores. Muitas das cria-ções de Reynaldo nem são citadas, comoa revolução que fez no rádio de estúdio,quando dirigiu a Rádio JB, e hoje temtraços marcantes em toda a radiofoniabrasileira. Poeta original, fez há pouco,como se pressentindo a urgência, umaespécie de vasta antologia de sua obrapoética, sob o título característico deSangradas Escrituras. Escultor, cronista,gráfico, Reynaldo foi amigo generoso eafetuoso. Talento mais do que ilumina-do”, escreveu Jânio em artigo publicadono dia 3 de fevereiro de 2011.

O Sol ilumina a imprensaProfessor da Faculdade de Educação

da Baixada Fluminense da Universida-de do Estado do Rio de Janeiro-Uerj eCoordenador da Oficina Híbridos –Mídia e Arte Contemporânea, MauroJosé Sá Rego Costa divulgou texto so-bre a experiência de Reynaldo no jornalalternativo.

“Reynaldo Jardim esteve à frente de OSol, o primeiro jornal jovem e implicita-mente contra a ditadura... Quando O Solacabou, surgiu o Poder Jovem, com a mes-ma turma... E dessa, eu, dinossauro, par-ticipei... Vendíamos nós mesmos o jornalnas ruas, de dentro de um caminhão.”

Citado por Tetê Moraes em depoi-mento, Daniel Azulay também falou aoJornal da ABI:

“Na Redação de O Sol, dentro do Jor-nal dos Sports, tivemos uma experiênciajornalística pioneira capitaneada por Rey-naldo Jardim e Ana Arruda. Só pelos doisjá era uma energia produtiva fantástica.Eles ainda convocaram jornalistas, artis-tas, escritores, poetas e personalidadesformadoras de opinião. Estavam lá, entreoutros, Nélson Rodrigues, Sérgio Augus-to, Ruy Castro, Henfil, Caetano Veloso eDedé, Carlos Heitor Cony, Ziraldo, Zue-nir e Mary Ventura, Gilberto Gil, Galeno

va lá. Me informaram que o Dr. Britohavia convocado o pessoal para orientá-los. Entrei na sala de reunião e lá estavao meu pessoal recebendo instruções. Fi-quei furioso com a quebra de hierarquia.Só porque ele era o dono da empresapensava que podia passar por cima. Eu mesentia o ‘dono’ da rádio. Saí da sala e batia minha carta de demissão. Naqueletempo, com mais de dez anos de serviço,a não ser por justa causa, ninguém podiaser demitido, sem receber uma alta inde-nização. Abri mão de tudo.”

Reformador de jornaisReynaldo, que já havia passado por

revistas como O Cruzeiro e Manchete,além das Rádios Clube do Brasil, Mauá,Globo e Nacional, todas no Rio de Janei-ro, e pela Rádio Excelsior, de São Paulo,continuou a exercer atividades de desta-que na imprensa do Rio: foi Diretor darevista Senhor e Diretor de telejornalis-mo da recém-inaugurada TV Globo. Jáem 1967, criou o jornal-escola O Sol,sem dúvida um marco na história da im-prensa brasileira, com textos criativos eprojeto gráfico inovador. Dirigiu o Cor-reio da Manhã no período de 1967 a 1972.Realizou reformas gráficas em jornaiscomo A Crítica,de Manaus, AM; O Libe-ral, de Belém,PA; Gazeta do Povo, deCuritiba,PR; Jornal de Brasília, deBrasília,DF, e Diário da Manhã, de Goi-ânia, GO. Trabalhou em diversas capitaisbrasileiras até chegar a Brasília, no finaldos anos 1980.

“Um injustiçado”Membro do Conselho Editorial da

Folha de S.Paulo, Jânio de Freitas lamen-tou a morte do colega de jornadas no JB.

“Reynaldo Jardim foi um dos jorna-listas mais injustiçados do Brasil. Suacriatividade sem limite e incessante dei-xou legados que não lhe foram reconhe-cidos na medida própria, quando o fo-ram em alguma medida. Caso do Suple-mento Dominical do Jornal do Brasil, océlebre e celebrado SDJB, vanguarda em

de Freitas, Marta Alencar eTetê Moraes. Essas duas úl-timas produziram o belofilme-documentário sobretudo e sobre todos que fi-zeram parte de O Sol.”

O início profissional deAzulay, pelas mãos de Rey-naldo, não poderia ter sidomais inusitado:

“Comecei como estagi-ário na Redação. Eu faleipara o Reynaldo que que-ria desenhar, fazer cartum,mas ele tinha uma capaci-dade única de discordar,alegando uma necessida-de. No caso, precisavam deum repórter para cobrir oenterro do Presidente Cas-telo Branco. Eu não era apessoa para fazer aqueletrabalho. Era, na verdade, omenos indicado. Botei um terno e fui provelório. Quando me falaram que esta-vam ‘esperando alguém para encomen-dar o corpo’. Era o padre para a extrema-unção, mas achei que era Deus ou umespírito, sei lá! Voltei para o jornal deso-rientado por ter visto um defunto pelaprimeira vez... Minha reportagem foium fiasco e Reynaldo me botou unica-mente para fazer o que eu mais queria:desenhar!”, conta.

As bem-humoradas situações de confli-tos entre os dois não terminaram por aí.

“Ilustrei crônicas do Carlos HeitorCony e do Nélson Rodrigues mas paratirar meu sossego Reynaldo exigia queeu montasse em letraset, então umanovidade, as manchetes do jornal queeram aplicadas com folha-transfer àmão. Eu já ia perdendo a paciência, eraum trabalho de chinês. Nem tinha salá-rio, era estágio para pegar experiência eficar perto das cabeças- coroadas. Só issojá valia à pena... Enfim, as letrinhas co-meçaram a aumentar com novas pági-nas e, sobrecarregado, comecei a fazer asmanchetes tortas meio de propósito...

Quando o Reynaldo viu,bateu com a régua de açona mesa com força e gri-tou: ‘Isso é trabalho deaçougueiro!’. Nunca meesqueci disso!”, ri DanielAzulay, que anos mais tar-de se tornaria estrela deprograma infantis educa-tivos na televisão com aTurma do Lambe-Lambe.

“Acho que o primeirotraço da personalidade doReynaldo era seu sensocrítico. Ele era rabugentoa seu modo, exigente e di-fícil. Pelo menos para mim,era difícil argumentar comele, pela mistura de umateimosia irônica com sar-casmo, que me confundiaum bocado. Por trás da-quela rabugice, havia o

homem doce e poeta amável com as le-tras, a música, as cores e as formas. Erauma pessoa sensível a tudo e a todos. Esou grato, por ter observado suas atitu-des e modo de pensar. Com ele aprendique ‘não basta fazer o necessário’. É pre-ciso ter sempre a inquietação e a vonta-de de se ir além. Buscar o impossível sefor preciso. Assim me tornei um obsti-nado, com experiência em áreas diver-sas da cultura de massas, passando pelamúsica, artes visuais, literatura infan-til, televisão, teatro e como arte-educa-dor com minhas Oficinas de Desenho”,revela Azulay.

Azulay considera que a imprensa e ojornal impresso enfrentam o desafio desobreviver competindo com o adventode novas tecnologias como a internet;isso ocorre, em parte, diz, pelo atropeloda grande quantidade de informação:

“Hoje, a qualidade da informação écoisa rara. Sobra mediocridade, todomundo virou celebridade. Desaparece-ram as crônicas assinadas por nomescomo Rubem Braga e Carlos Drum-mond de Andrade. Paulo Francis, Carlos

“Reynaldo Jardimfoi um dos

jornalistas maisinjustiçados do

Brasil. Suacriatividade sem

limite e incessantedeixou legados que

não lhe foramreconhecidos na

medida própria.”

O revolucionário Suplemento Dominical do Jornal do Brasil, que Reynaldo criou e editou: Um visual ousado, modernista, que usa e abusa dos espaços em branco e elementos gráficos.

34 Jornal da ABI 365 Abril de 2011

O jovem Joaquim Nabuco tinha 19anos e era ainda estudante de Direitoquando tomou a defesa do escravo TomásFogueteiro, acusado do assassinato doSubdelegado Braz Pimentel, de Olinda,Pernambuco. Festejado pelos senhores daépoca porque era ele quem abria as procis-sões com fogos de animação e show reli-gioso, Tomás caiu de repente na real desua situação quando cometeu um desli-ze qualquer sequer mencionado numprocesso agora revelado pelo pesquisadore historiador Humberto França, coorde-nador do Centro Cultural Mauro Motada Fundação Joaquim Nabuco-Fundaj.

França conta como Tomás foipreso e supliciado por umsubdelegado, amarradoàs grades da cadeia deOlinda e chicoteadoem público – paraescarmento dosdemais escravos– até ter as náde-gas, pernas e cos-tas dilaceradas.Por fim, a man-do do mesmosubdelegado,teve as feridas la-vadas com umaaguada de suco depimenta. E assimcurtiu a mais cruel einimaginável tortura.

“Para ele teria sido me-lhor a morte”, acentua França.

Tomás, porém, haveria de fugir daprisão, mal cicatrizadas as suas carnes. Earmou-se de um bacamarte para voltarà cadeia e fulminar o subdelegado comum tiro de grosso calibre.

Facínora à solta! – berrou a impren-sa de Recife.

Preso de novo, Tomás foi julgado, por-que mesmo os escravos precisavam pas-sar pela formalidade de um julgamento.E acabou condenado à morte. Na forca,como era de praxe na época. Na primei-ra oportunidade, porém, Tomás haveriade novamente fugir. Mas outra vez a fa-talidade e a indução social o levariam aohomicídio. Armado desta vez com umafaca, Tomás atingiu na carótida o solda-

O jovem Nabuco,defensor de Tomás,

um escravo homicidaO centenário da morte do líder abolicionista motiva

revelações sobre sua primeira defesa, ainda estudante de Direito,aos 19 anos, de um cativo que nem sobrenome tinha,

como conta o pesquisador Humberto França.

POR PINHEIRO JÚNIOR

do Afonso Honorato Bastos, que lhe ten-tou barrar a liberdade, e feriu mais duaspessoas que encontrou no caminho.

A defesa legal do escravo Tomás sur-ge assim como o primeiro desafio histó-rico de Nabuco aos escravocratas e àprópria aristocracia imperial.

Foi em 6 de dezembro passado que opesquisador e historiador HumbertoFrança trouxe as minúcias desse fato aoconhecimento público. A revelação, bemalém das referências feitas pelo próprioNabuco, aconteceu como ponto alto doSimpósio de Recife, promovido pelo Ins-tituto Antares com apoio da Eletrobrás e

do Governo Federal. O documentoprincipal que narra o aconte-

cimento policial e suasconseqüências jurídi-

cas até então inéditassão a base do livroJoaquim Nabuco eo Escravo Tomásque o historiadoranuncia para oprimeiro semes-tre de 2011.

A descobertaaconteceu em2005, quando

França vasculha-va o acervo do Ins-

tituto Arqueológi-co, Histórico e Geo-

gráfico de Pernambuco.Para escrever o livro sobre

a tragédia do escravo Tomás,França teve de ampliar as buscas aos re-gistros da Casa de Detenção e da Che-fatura de Polícia de Pernambuco, alémde jornais da época quase perdidos nosquais Nabuco também colaborava, ini-ciando atividades jornalísticas que eleampliaria na virada do século XIX ao de-siludir-se da política com a proclama-ção da República.

Afinal, Nabuco desafiou o Império noque ele tinha de mais retrógrado, sendoele, no entanto, um monarquista deberço, filho do Senador José Nabuco deAraújo criado no feudo aristocrático doEngenho Massangana. Conhecido comoQuincas, O Belo, era ainda um dandy demarcante modelo imperial.

HISTÓRIA

Castelo Branco e o jornalismo de opi-nião. E Reynaldo Jardim, com justiça,faz muita falta nestes tempos de gran-de transformação que estamos viven-do”, lamentou.

Tema de mestrado na UspA real dimensão do trabalho gráfico

de Reynaldo Jardim pode ser medidapelo depoimento de Daniel Trench, de-signer e professor da Escola Superior dePropaganda e Marketing-ESPM:

“Defendi em 2008 uma dissertaçãona Escola de Comunicação da Usp, emque tratava da reforma gráfica do Jor-nal do Brasil. E, como todos devem eprecisam saber, o Reynaldo foi umapeça-chave nessa história – e sua im-portância nunca foi devidamente cre-ditada. Obviamente, ele foi uma figuraimportantíssima para a minha pesqui-sa. Encontrei-o em dois momentos dis-tintos. Na primeira vez, logo no iníciode meus trabalhos. Confesso, não tinhaa dimensão da importância que elehavia tido em todo o processo de refor-ma. Nossa conversa, que começou logodepois do almoço, se alongou por todaa tarde. Ele era um sujeito incrivelmen-te generoso e um grande contador dehistórias. No segundo momento, qua-se um ano depois, já com outra percep-ção sobre todo o processo, a conversa sedeteve nos detalhes do projeto.”

“No campo gráfico, Reynaldo traba-lhava de maneira econômica. É curio-so constatar visualmente, por exem-plo, a breve passagem que teve pelarevista Senhor. Lá, assim como no JB, elelançou mão de famílias tipográficassem serifa, longas colunas de texto eum equilibrado uso do branco. “Essaeconomia formal conversava direta-mente com as experiências poéticasque dividia com Gullar e companhia.E, claro, havia ali também algo muitocompassado com a sintaxe extrema-mente enxuta da arte concreta. Enfim,é possível dizer que Reynaldo apreen-deu, de maneira orgânica, um certo

‘espírito da época’ nos projetos gráficosque conduziu. E chega a ser estranhochamar aquilo que fazia de projeto,uma vez que as soluções gráficas sedavam caso-a-caso, no calor do mo-mento. Não havia na produção do JBuma consciência projetual, como já de-fendiam alguns designers contempo-râneos a ele”, avalia Daniel Trench.

Um capítulo especial da tese defen-dida trata do famoso SDJB. Neste caso,o que realmente chama a atenção é aafinidade entre forma e conteúdo.

“Os textos eram interpretados visu-almente. Informação textual e imagé-tica travavam uma relação simbiótica– algo que só poderia acontecer pelasmãos de alguém que conhecesse mui-to bem esses dois registros de lingua-gem. Pena que houve, sim, um empo-brecimento da linguagem visual dosjornais, e não apenas os brasileiros. Osperiódicos assumiram, nos últimostempos, uma linguagem visual padrão,um standard universal. Me parece quenão há mais terreno para a experimen-tação nas publicações brasileiras.”

Por fim, Alberto Dines, outro mes-tre da imprensa que desempenhoupapel revolucionário no Jornal do Bra-sil, descreve a arte e o jeito de Reynal-do Jardim:

“Ele era um inventor – como poeta,artista, jornalista, radialista, agitadorcultural e designer. Um grande criador,mas não um formalista. A preocupaçãocom o conteúdo nunca ficou em se-gundo plano. Sua incrível capacidadede inovar esteve sempre a serviço deidéias muito claras e profundas. OSJDB deu realmente um safanão noscadernos literários e culturais. Mas asnovidades que implantou na RádioJornal do Brasil, como o Serviço deUtilidade Pública, revelam um intelec-tual engajado na realidade. E assimmanteve-se até o fim da vida. Não che-guei a trabalhar diretamente ao seulado, mas jamais o perdi de vista comoexemplo de inconformismo.”

BALANÇO OS FRUTOS DE REYNALDO JARDIM

O Sol nas bancas de revista: Reynaldo Jardim posa para a lente de Zeka Araújo, que fez asfotos de divulgação do filme O Sol – Caminhando Contra o Vento, de Tetê Moraes.

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35Jornal da ABI 365 Abril de 2011

reito do Recife o curso iniciado em 1866em São Paulo. Então funcionava comouma espécie de “trabalho de campo” osfuturos bacharéis assumirem um casono júri da cidade.

“Um detalhe importante a ser desta-cado – diz ainda França – é que apesarde toda a iniqüidade da sociedade escra-vocrata havia um rito jurídico a ser res-peitado e seguido mesmo em se tratan-do de acusação contra um escravo semdireitos.”

O escravo Tomás era propriedade deDona Ana Barbosa da Silva. Ela ganhavadinheiro alugando-o para outros mora-dores de Olinda e Recife. No decorrer doprocesso, temerosa de vir a ser tambémacusada de algo ligado ao assassinato,Dona Ana fez chegar petição ao juiz deOlinda renunciando aos direitos (e de-veres) que tinha sobre o escravo.

Com 25 anos de idade, Tomás eradescrito como forte, bem apessoado e do-tado de estranhas marcas no rosto quetanto podia ter trazido da África, comocaracterística tribal, como podiam te-rem resultado de ferimentos duranteuma briga. O historiador não encontrouregistro de seu sobrenome. No final dascontas, “era nada mais que um escravo”.Constatou apenas que Tomás era fogue-teiro de profissão. E o dinheiro que ga-

al exercido por esse monarquista tradi-cional, que, mesmo assim, se engajou nacausa abolicionista e ligou-se tanto àPrincesa Isabel “que pode ter sido elequem mais induziu a Regente do Impé-rio a proclamar a Lei Áurea” em 13 demaio de 1888. E cujo “preço político foio 15 de novembro de 1889, que selou ofim da Monarquia:

“A Princesa Imperial, já a caminho doexílio, afirmava: ...se houvesse aindaescravos no Brasil, nós voltaríamos paralibertá-los”, lembrou o conferencistaSílvio Massa de Campos, economista,matemático, escritor e descendente di-reto (sobrinho) de José Lins do Rêgo.

O “nós” referido por Sílvio Massapoderia significar, mesmo inconsciente-mente, que a Princesa estava a dizer “eu-Isabel e ele-Nabuco”.

A proximidade de Nabuco com aPrincesa – “que gostava muito dele,podendo-se tirar daí a conclusão que sedesejar” – foi enfatizada durante oSimpósio de Recife por um dos confe-rencistas, o jornalista Arnaldo Niskier,da Academia Brasileira de Letras, em in-tervenção após as palestras. Ao seu ladona mesa diretora estava o editor e jorna-lista Alexandre Sávio, produtor do even-to juntamente com o jornalista JorgeSávio. Participaram também como con-ferencistas o diplomata e escritor JoãoAlmino, o professor da Universidade Fe-deral da Bahia Edivaldo Machado Boa-ventura, da Academia de Letras daBahia, e a Presidente da Comissão doAno Nacional Joaquim Nabuco, Luci-la Bezerra, que fez um balanço das co-memorações, as quais incluíram o semi-nário Congresso Nabuco e o Novo Brasil,realizado em Nova York, em outubro,com participação da Americas Society,da West Point Military Academy e daColumbia University.

Razão maior para o seminário nosEstados Unidos, lembrando os 100 anosda morte de Nabuco, foi o fato históri-co de ter sido ele o primeiro Embaixa-dor do Brasil nos Estados Unidos. Tãoadmirado se fez que ao morrer em Wa-shington, aos 60 anos de idade, vítimade uma septcemia em 17 de janeiro de1910, o Presidente William HowardTaft determinou que seu corpo fossetrasladado ao Rio de Janeiro no cruza-dor North Caroline, o que se fez comhonras e pompas. Do Rio Nabuco se-guiu para o Recife, onde finalmenteganhou chão definitivo.

Cem anos depois ainda se discute seNabuco foi um monarquista de esquer-da ou um esquerdista deslocado na mo-narquia. Sobre essa dúvida-debate, quepairou no Simpósio de Recife, vale re-produzir um trecho da fala do econo-mista Sílvio Massa:

“O humanismo de Joaquim Nabucotem seu centro de gravidade na liberda-de do indivíduo e na prevalência da leisobre todos, atingindo-se a igualdade,idealizada pela Revolução Francesa, “paratolerar a diversidade da espécie humana”

nhava soltando fogos nas festas religio-sas ou para pagar promessas de fiéis eletinha que entregar à sua dona.

França descreve o que apurou em suaspesquisas sobre a personalidade, a condi-ção social e a repentina desventura do“privilegiado” escravo:

“Tomás gozava de algumas regalias,apesar de ser um escravo típico. Quasetodos em Olinda o tratavam por senhor,Seu Tomás, considerando-o um cidadãocomo outro qualquer. Mas por motivonão identificado em nenhum documen-to ele foi detido pela Polícia em Olindae arrastado ao açoite em presença detodos os que o tinham em consideraçãoaté ali. Era a suprema humilhação. De-pois, porque matou a autoridade que su-postamente ordenara seu açoitamento,foi condenado à morte. Mesmo assimconseguiu escapar pela segunda vez dacadeia em Olinda.

Preso novamente, foi encarcerado naCasa de Detenção no Recife, mas esca-pou também dali, matando um soldado.Tornou a ser preso após uma grandeperseguição pelas ruas da capital. Foi tala agitação, que se chegou a temer umarevolta de escravos no Recife.

Sobre a última fuga de seu cliente e aresistência que opôs à captura, disse Jo-aquim Nabuco:

“Não era mais um homem, era umtigre”.

Com admiração pelo réu, que poderiaaté ser apenas profissional, Nabuco lu-taria como o melhor dos advogados econseguiria o máximo possível numaépoca de absurdas injustiças e intolerân-cias: reduzir a pena de morte para galésperpétuas ou prisão perpétua. Mas oimportante é que o jovem acadêmico deDireito conseguiu, pela primeira vez noPaís, “salvar da morte não um escravoapenas, mas colocar toda a escravidão nobanco de réus”.

Sobre sua jovem experiência especi-ficamente como defensor e a tese por elelevantada para reduzir a pena de um réuque parecia irremediavelmente perdido,Nabuco esboçou em seu primeiro livro– A Escravidão, de 1869 – uma análise doescravo levado ao assassinato:

“De humilde, tornou-se altivo; erabom, fez-se uma fera. Na origem desseprocesso dois crimes havia. Havia a es-cravidão, havia a pena de morte. Fora aescravidão que levara Tomás a praticar oprimeiro crime, a pena de morte que olevara a perpetrar o segundo.”

A Princesa e NabucoO Simpósio de Recife encerrou a série

de eventos Joaquim Nabuco e a Moderni-dade, realizada em vários pontos do Paíssobre a atualidade do pensamento doestadista. Foi a culminância do Ano Na-cional Joaquim Nabuco, instituído porlei federal para comemorar em 2010 ocentenário da morte de quem – além dediplomata, político, humanista, advoga-do e cultor da literatura ao fundar comMachado de Assis a Academia Brasileirade Letras – foi o Jornalista da Abolição.

As homenagens foram prestadas tam-bém como resultado do fascínio pesso-

Possivelmente encontra-se aí, nesteparadoxo ideológico e social, o grandemérito e o diferencial desse estadista,diplomata, advogado, escritor e jornalis-ta que abjurou a República, mas acaboupor dobrar-se às necessidades – e moder-nidades – da civilização que avançava nocaminho da igualdade “ainda que mes-mo tarde”. Por insistência do Presiden-te Campos Sales, eis que Nabuco foi re-presentar a novel República brasileira,primeiro em Londres como diplomatajunto à Rainha: nada mais lógico e apro-priado – um monarquista ainda que aserviço da República junto à monarquiabritânica; depois como primeiro Embai-xador do Brasil nos Estados Unidos daAmérica, onde se fez pan-americanista.

Humberto França considera que “oprocesso da Justiça pernambucana daépoca seria insuficiente para reconstituiro caso do escravo Tomás em suas facetashistóricas com implicações notadamen-te psicológicas na luta pela abolição daescravatura”. “Nele (no processo) não hádetalhes importantes, como a transcri-ção das falas das testemunhas”, explicaFrança, lembrando também o papel de-sempenhado por Nabuco como inician-te advogado de defesa.

Nabuco, embora muito jovem, jáestava concluindo na Faculdade de Di-

O jornalista José Alves Pinheiro Júnior, membro doConselho Deliberativo da ABI, participou do Simpósiode Recife como editor da Auracom.

Estadista, diplomata, advogado, escritor e jornalista, o abolicionista Joaquim Nabucoe a Princesa Isabel (na página ao lado) nutriram tão forte amizade que pode

ter sido ele quem mais induziu a Regente do Império a proclamar a Lei Áurea.

36 Jornal da ABI 365 Abril de 2011

VidasVidas

“Eu não estou me entregando, estouentregue a quem sempre estive: às mãosde Deus”. Esta foi uma das muitas ma-nifestações de otimismo em sua lutacontra o câncer do ex-Vice-Presidente daRepública José Alencar, que morreu aos79 anos no dia 29 de março na Unidadede Terapia Intensiva do Hospital Sírio eLibanês, em São Paulo. A morte foi cau-sada pelo câncer e falência múltipla dosórgãos, de acordo com informações doHospital, onde José Alencar fôra inter-nado na véspera, com um quadro desuboclusão intestinal.

Pouco mais de uma hora após o desen-lace, em sua reunião mensal de março, oConselho Deliberativo da ABI aprovoupor unanimidade moção de pesar pelamorte do ex-Vice-Presidente da Repúbli-ca. Durante a sessão, por proposta doConselheiro José Pereira da Silva Filho, oPereirinha, o Conselho fez um minuto desilêncio em memória de José Alencar.

O ex-Vice-Presidente José Alencardeixa viúva Mariza Campos Gomes Fi-lho, com quem teve os filhos Josué Chris-tiano, Maria da Graça e Patrícia. Em Co-imbra, onde se encontrava em viagemoficial, a Presidente Dilma Rousseff de-cidiu que o corpo do ex-Vice-PresidenteJosé Alencar seria velado no Palácio doPlanalto. Aos jornalistas que acompanha-vam a viagem, ela mencionou que obte-ve a concordância da família. “Falei como filho dele Josué e ele aceitou”, disse aPresidente, que estava em Portugal comoconvidada especial da cerimônia em quea Universidade de Coimbra concedeu otítulo de doutor honoris causa ao ex-Pre-sidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A Presidente Dilma Rousseff lamentoua morte de José Alencar afirmando que “foiuma grande honra ter convivido com ele,que vai deixar uma marca”: “Estamosmuito emocionados”, disse. Ela antecipouseu retorno ao Brasil para o dia 30 de marçoe cancelou o encontro que teria com oPresidente de Portugal, Cavaco Silva, e oPrimeiro-Ministro José Sócrates.

“Relação de companheiro”Sob forte emoção o ex-Presidente Lula

também comentou a morte do Vice-Pre-sidente. “Conheço poucos seres huma-nos que tenham a alma de José Alencar,a bondade dele. O Brasil perde um ho-mem de dimensão excepcional”, decla-rou, chorando.

Ainda sob forte emoção, Lula destacoutambém para os jornalistas o otimismodo seu Vice-Presidente:

“Vocês acompanharam o nosso man-dato, da Dilma como Ministra, do JoséAlencar como Vice. Vocês sabem que a

nhia de Tecidos Norte Minas-Cotemi-nas, que nos anos 70 se transformou namais moderna empresa de fabricação detecidos do Brasil.

Na seqüência da sua carreira empre-sarial, José Alencar foi Presidente do Sesi,do Senai, da Federação das Indústrias doEstado de Minas Gerais-Fiemig. Foi tam-bém Vice-Presidente da ConfederaçãoNacional da Indústria-CNI.

Alencar iniciou a carreira política em1993, filiando-se ao PMDB. Em 1994,concorreu ao cargo de Governador deMinas e ficou em terceiro lugar na dis-puta. Quatro anos depois (1998), ele-geu-se Senador com cerca de 3 milhõesde votos.

Durante a sua passagem pelo Senado,Alencar presidiu a Comissão Permanen-te de Serviço e Infra-estrutura e inte-grou a Comissão Permanente de Assun-tos Econômicos e a Comissão Perma-nente de Assuntos Sociais.

Em 2002, no final do mandato comosenador, trocou o PMDB pelo PL. Já era umempresário de sucesso que resolveu se unirao ex-operário Luiz Inácio Lula da Silva,então candidato à Presidência da Repúbli-ca, com a proposta de ajudar a construir umBrasil mais justo e igualitário.

Com o apoio do empresariado foi elei-to Vice-Presidente na chapa de Lula, comquem exerceu dois mandatos. Apesar deter sido sempre fiel ao Presidente Lula, foium crítico da política econômica doGoverno, principalmente por causa dataxa de juros aplicada pelo Banco Central.

O Presidente interino do PT, Rui Fal-cão, falou sobre a união de José Alencarcom Lula. “Nos oito anos em que eles(Lula e Alencar) estiveram juntos, JoséAlencar demonstrou lealdade e compa-nheirismo, dando tranqüilidade ao Lulainclusive durante suas viagens ao exte-rior. Esse entendimento favoreceu aaproximação do Presidente com o em-presariado”, disse Falcão à Rádio Band-News, em entrevista sobre a morte do ex-Vice-Presidente.

POR JOSÉ REINALDO MARQUES

O Conselho da ABIreverencia José Alencar

Por proposta do Conselheiro José Pereira da Silva (Pereirinha),a Casa prestou comovida homenagem ao ex-Vice-Presidente.

José Alencar foi a principal persona-lidade presente à sessão solene de aber-tura das comemorações do centenárioda ABI, realizada no dia 7 de abril de2008 no Teatro Municipal do Rio deJaneiro, na qual representou o PresidenteLuiz Inácio Lula da Silva.

Ao lado do Governador Sérgio Cabral,no Teatro superlotado, Alencar iniciouo discurso de encerramento da solenida-de com a irreverência que marcava seuspronunciamentos. “Se vocês pensamque eu vou fazer crítica à atual políticade juros, acertaram: vou mesmo”, disse,provocando risos e aplausos da platéia.Ele levou um discurso escrito, mas ointercalou com improvisos, semprecom humor. Na essência, fez a defesa daliberdade de imprensa e da liberdade deexpressão como essenciais ao regimedemocrático.

“Vocês pensamque eu vou falarde juros? Vou.”

relação nossa era mais que a relação de umVice com um Presidente. Era uma relaçãode companheiros”, disse o ex-Presidente,que afirmou que vai dedicar a José Alen-car o título de doutor honoris causa.

Uma longa batalhaA batalha de José Alencar contra o cân-

cer teve início há 13 anos, quando ele fezum chek-up em Belo Horizonte, que di-agnosticou “uma pequena imagem tu-moral no rim direito”. O exame só foifeito depois de muita insistência de umsobrinho médico. Na época, o ex-Vice-Presidente tinha 66 anos.

Até então José Alencar nunca tinhasentido nada e nem havia se submetido anenhum exame mais profundo: “Eu nun-ca tive nada, não tinha dor nenhuma,nunca tinha feito um chek-up na vida.Descobri por acaso. Foi Deus”, disse ele àcolunista da Folha de S.Paulo Eliane Can-tanhêde, que escreveu sua biografia.

Após a descoberta do câncer, em 1997,José Alencar foi submetido a 17 cirurgiaspara a retirada de 20 tumores e a sessõesde quimioterapia. Em 2006, ano da cam-panha para a reeleição, Alencar fez umacirurgia para a retirada de um tumor dequatro centímetros no abdômen. Emnovembro do mesmo ano, em NovaYork, deu entrada novamente em umcentro cirúrgico, por causa de outronódulo no abdômen.

Em janeiro de 2009, José Alencar foiinternado no Hospital Sírio e Libanês, emSão Paulo, onde passou por uma interven-

ção cirúrgica, na porção posterior do ab-dômen, avaliada pelos médicos comocomplexa. Nessa operação os médicos re-tiraram um tumor com 12 centímetrosde diâmetro, próximo ao qual estavam lo-calizados dez outros tumores que a me-dicina classifica como satélites.

Desde o dia 4 de janeiro deste ano Alen-car vinha apresentando sangramentos naregião abdominal e teve que ser interna-do várias vezes para que os médicos pu-dessem controlar a hemorragia. Em 9 defevereiro, voltou a ser internado no Hos-pital Sírio e Libanês, para tratar uma per-furação intestinal que provocou umainflamação grave na região, conformeboletim médico divulgado na ocasião.

No dia 28 de março, Alencar voltouao Sírio e Libanês, com um quadro deobstrução intestinal grave. Os médicosque o atenderam disseram que seu estadoera crítico.

O empresário, o políticoJosé Alencar Gomes da Silva nasceu

no Município de Muriaé, na Zona daMata de Minas Gerais, em 17 de outubrode 1931. Em 1967, inaugurou a Compa-

Alencar mostrou seu apreço à ABItambém na missa comemorativa dos119 anos do Jornal do Brasil, oficiadapelo Arcebispo Orani Tempesta na Igre-ja da Candelária em abril do ano passa-do. Sempre cordial, ele posou para fotosao lado dos que o cumprimentavam. O

fotógrafo da Vice-Presidência da Repú-blica registrava o flagrante, anotavanome e endereço da pessoa e informa-va que mandaria a fotografia pelo Cor-reio. Mandava mesmo, com um cartãode cumprimentos assinado por Alencar.(Maurício Azêdo)

ALCYR C

AVALCAN

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37Jornal da ABI 365 Abril de 2011

Guerra Irã-Iraque, Revolução dos Cra-vos, em Portugal, fim do franquismo, naEspanha, crises do petróleo, queda do Murode Berlim, assassinato do Presidente Sadat,do Egito, ascensão de Lech Walesa, na Po-lônia, morte de Lady Diana. Ele foi teste-munha de alguns dos principais aconte-cimentos do fim do século passado e iní-cio deste e se tornou a principal voz aanalisar o mundo sob a ótica da imprensabrasileira. Mais do que um destacado pro-fissional, o País perdeu no dia 9 de abril umde seus mais importantes corresponden-tes estrangeiros. O jornalista Reali Júnior,que durante quase quatro décadas traba-lhou para a Rádio Jovem Pan e o jornal OEstado de S. Paulo, em Paris, faleceu em suacasa, na cidade de São Paulo, aos 71 anos deidade, vítima de enfarte.

Nascido em Bauru, interior paulista,em 1939, filho de descendentes italia-nos e baianos, Elpídio Reali Júnior in-gressou no jornalismo devido à paixão.Não pela escrita, pela leitura ou mesmopela profissão, mas por Amélia, a mulherde toda a vida. Aos 14 anos e morando nacapital paulista, começou a namorar amenina, um ano mais nova e que estuda-va no mesmo bairro que ele, Higienópo-lis. Quando estava com 16, quis se casar,mas para isso precisava de um emprego.Recorreu a um velho amigo, CesemiroPinto Netto, então Diretor da Rádio Pan-Americana, mais tarde, Jovem Pan.

“Sempre escrevi sobre qualquer assun-to. Minha formação de jornalista autodi-data, construída pedrinha sobre pedri-nha, praticada no cotidiano e buscandoexemplo nos mais velhos me deu condi-ções para isso”, disse ele em entrevista aGianni Carta para o livro de memórias ÀsMargens do Sena (Ediouro, 2007). Nocomeço, ainda na adolescência, Reali pen-sava em política, mas não tinha idade paracobrir a área. Foi para os campos de fute-bol. Entrava nos gramados para entrevis-tar os jogadores, sempre munido de umenorme gravador. Assim, ganhou o ape-lido Repórter Canarinho e projeção.

Seguindo a orientação de colegas comoFernando Vieira de Mello, Mauro Guima-rães, Cláudio Abramo e Mino Carta, Re-alinho, como era conhecido pelos maisíntimos, atuou nos Esportes, na Política eem Geral. Foi, sobretudo, homem de rádioe televisão, com passagens pela TV Record,TV Tupi, Rádio Jornal do Brasil, além daJovem Pan, mas também atuou em jor-nais. Primeiro na sucursal paulista do

colegas não foram impedimentos para astantas coberturas marcantes que faria, acomeçar pela queda de um Boeing daVarig nas imediações do aeroporto pari-siense de Orly, em 1973. Já ali Reali davaao acidente que matou o Senador Filin-to Müller, a atriz Leila Diniz e o cantorAgostinho dos Santos um enfoque bembrasileiro. Descartava a versão corrente,divulgada por publicações como o diárioargentino Clarín, de um atentado terro-rista. Para ele, a causa do desastre teriasido um cigarro aceso jogado no vasosanitário da aeronave. A fumaça haviaasfixiado os passageiros. O tempo mos-trou que a versão de Reali estava corre-

ta e ele foi convidado a também traba-lhar para o Estadão.

Apesar do prestígio do jornal e da rá-dio, a vida de correspondente continu-ava difícil. Por mais importantes quefossem os veículos, não tinham a mes-ma força de um norte-americano, TheWashington Post, ou de um britânico, TheGuardian. “A luta é desigual. Os interes-ses, também. É preciso ser criativo e aten-to, para aproveitar as chances”, destacouReali ao Jornal da ABI. Assim, para con-seguir uma entrevista, ele ficava atentoa viagens de autoridades brasileiras à Fran-ça e também das francesas ao Brasil. Sem-pre trabalhando para conseguir uma

Nas margens do Sena,as saudades dobom jornalismo

POR MARCOS STEFANO

Um dos mais importantes correspondentes brasileiros noexterior, Reali Júnior morre em São Paulo, aos 71 anos.

Correio da Manhã, do Rio. Depois nosDiários Associados e noutra sucursal, des-ta vez de O Globo, onde foi repórter polí-tico e Chefe de Reportagem. Sempre con-ciliando com a rádio e a televisão. Bem ar-ticulado, na madrugada de 1º de abril de1964, esteve ao lado do Governador Ade-mar de Barros, no Palácio dos Campos Elí-sios. Um dos poucos repórteres que con-seguiram entrar.

Sob censura, nãoPara Reali Júnior, ser repórter políti-

co sob censura não dava. Em 1972, acu-sado de ser comunista e na mira da re-pressão, a ponto de ter a credencial paracobrir a Presidência da República sus-pensa, ele decidiu aproveitar o plano daJovem Pan de expandir seus serviços paraos Estados Unidos e para a Europa parapleitear um cargo lá fora. Viajou paraParis em setembro daquele ano.

“No começo, o trabalho foi quase ar-tesanal pela falta de recursos de umcorrespondente brasileiro. As primeirasemissões foram feitas de uma agênciados correios. Meu escritório funcionavaem casa mesmo, perto da Torre Eiffel”,contou ele ao Jornal da ABI, em entre-vista concedida em 2007.

Em tempos precários, transmitir ma-térias por cabines públicas de telefoneou disputar um terminal de telex com

O jovem Reali Júnior, à esquerda, participa de uma coletiva com um prefeito de São Paulo, Prestes Maia.

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LivrosLivros

Clássicos da literatura nacional, mui-tos dos quais fora do catálogo das gran-des editoras e das estantes das livrarias hávários anos, estão ressurgindo na Praçados Três Poderes, o coração da Repúblicabrasileira, em Brasília. Em uma das uni-dades de apoio, no Congresso Nacional,funciona o Conselho Editorial do Sena-do Federal-Cedit, órgão responsável pelapublicação, nos últimos anos, de mais de150 títulos sobre História, política, eco-nomia, ensaios, biografias, dicionáriosbiobibliográficos, catálogos sobre artes emanifestações culturais regionais, rela-tos, diários de viagens e memórias de per-sonagens que marcaram a vida nacional.Graças a esse trabalho, obras como os qua-tro volumes da coleção História da Lite-ratura Ocidental, do jornalista, crítico ehistoriador austro-brasileiro Oto MariaCarpeaux, esgotados no mercado, ga-nham novas edições e preços que podemchegar a um terço dos praticados normal-mente por outras editoras.

O Conselho Editorial foi criado em ja-neiro de 1997 pela Mesa Diretora do Se-nado para publicar livros de valor histó-rico e cultural que fossem relevantes paraa compreensão da trajetória política, eco-nômica e social do Brasil. O Conselhocomeçou lançando obras que estão em do-mínio público e, aos poucos, foi enrique-cendo seu catálogo com títulos mais aca-dêmicos ou, quando se trata de um volu-me esgotado, negociando diretamentecom herdeiros e familiares. Hoje, além deCarpeaux, fazem parte do catálogo doCedit nomes como Hipólito da Costa,Joaquim Manuel de Macedo, Carlos Cas-telo Branco, Capistrano de Abreu, Joa-quim Nabuco e Silvio Romero.

Apesar da pujança demonstrada na lis-ta dos autores publicados, o Cedit estálonge de ser uma editora convencional.Suas obras não costumam ser encontradasnas livrarias. Para adquiri-las, o interessadodeve ir diretamente à livraria do Senadoou consultar o catálogo na página de pu-blicações do Senado na internet. Depois,enviar um e-mail com seus interesses eaguardar a resposta com a conta e o valora ser depositado. Os livros seguem semnota fiscal, mas também não são cobradastaxas de correio.

Um cuidado: a memória“O Senado possui duas linhas de publi-

cações. A legislação e as decisões da Casaficam a cargo das Edições técnicas. E esse“resgate da memória”, se bem que essa éuma expressão que perdeu muito de seusentido, fica sob nosso cuidado. Mas nãoconcorremos no mercado. Editamos li-vros que a maioria das editorias despre-za por não terem grande apelo comerci-al. São mais baratos porque praticamosum preço quase de custo. E costumamosenviar exemplares a instituições, univer-sidades e escolas de todo o País”, explicao Vice-Presidente do Conselho Editorial,Joaquim Campelo Marques.

O Conselho conta com apenas cincointegrantes: um Presidente, um Vice-Pre-sidente e três conselheiros. O cargo dePresidente, sempre um Senador, é ocupa-do atualmente pelo também Presidentedo Senado, José Sarney, mas quem acabarespondendo no dia-a-dia pelas obras pu-blicadas é Campelo, um jornalista vetera-no, que trabalhou por mais de duas déca-das no Jornal do Brasil e por outra na revistaO Cruzeiro. Ele conta que a decisão de lan-çar apenas 20 novos livros a cada ano emanter uma tiragem pequena – cerca de

agenda de bons contatos. Dessa manei-ra, fez entrevistas exclusivas com osPresidentes Giscard d’Estaing, FrançoisMiterrand e Jacques Chirac, tratandoprincipalmente das relações bilateraisentre os dois países. Esse também era ointeresse nas conversas com candidatosou Presidentes brasileiros como Fernan-do Collor, Fernando Henrique Cardosoe Luiz Inácio Lula da Silva, em suas vi-agens à Europa.

“Embaixada informal”Para facilitar tantos contatos, Reali

optou por uma residência junto à Mai-son de la Radio, onde estão diversasemissoras francesas, às margens do RioSena. Desde 1976, quando se mudoupara o novo apartamento, o local tor-nou-se uma espécie de embaixada in-formal do Brasil. Exilados, artistas epolíticos de várias tendências eram fi-guras presentes entre seus hóspedes ecomensais ilustres. Passaram por lá oeconomista Celso Furtado, os ex-Presi-dentes Jânio Quadros, João Goulart,José Sarney, FHC e Lula, o ex-Governa-dor pernambucano Miguel Arraes, osex-Governadores paulistas Lucas No-gueira Garcez e Abreu Sodré, o cineas-ta Gláuber Rocha e a cantora Elis Regi-na. Leonel Brizola era uma boa fonte egrande amigo no exílio. Já o escritorLuiz Fernando Verissimo e o tambémcorrespondente William Waack, alémde companheiros de letras, também oeram dos prazeres da culinária local.

“Foi um grande correspondente. EmParis, sua ‘embaixada informal’ acolheumuitos de nós, exilados. Acima de ideo-logias e divergências”, contou o ex-Go-vernador José Serra, após a morte de Reali.

Pinga FogoDiante de uma carreira tão intensa,

surpreende que para o próprio Reali

Júnior, sua reportagem mais marcantetenha sido feita aqui, em terras brasilei-ras. Na mesma entrevista ao Jornal daABI, ele contou como entrevistou omédium Chico Xavier, para o progra-ma Pinga Fogo, da TV Tupi. “Na época,não existia ainda a transmissão nacio-nal. O programa foi ao ar em São Pau-lo e passou a rodar o País em videotei-pe. Durante dois anos, a entrevista cor-reu a nação. Foi a matéria de maior re-percussão”, disse Reali. O líder espíritarecebeu, no próprio estúdio, o supostoespírito do escritor Camilo CasteloBranco e impressionou os espectadores.Mas o programa também ficou marca-do pelo reconhecimento do então Mi-nistro da Educação Jarbas Passarinho, deque havia tortura no Brasil, fato que nãopodia ser mais escondido. “Estava navéspera da minha partida para a Françae a notícia ganhou destaque em veícu-los de lá, como o Le Monde. Era a primeiravez que uma autoridade graduada reco-nhecia a tortura na ditadura.”

Na verdade, mesmo vivendo 38 anoslonge do Brasil, Reali Júnior nunca dei-xou de acompanhar de perto os aconte-cimentos e o cotidiano do Brasil. Quan-do escrevia lá fora, ainda que sobre a vidadiária francesa, não esquecia de contex-tualizar e trazer preciosas lições para osbrasileiros. Passou dificuldades. Chegoua estar debaixo de fogo cruzado na fron-teira do rio Chat el Arab, em Korranchar,durante a Guerra Irã-Iraque. Mais recen-temente, quando foi cobrir a entrega doPrêmio das Astúrias ao então Presiden-te Lula, na Galícia, o hotel que estava,na cidade de Oviedo, pegou fogo. Teveque ser salvo pelos bombeiros, em umaescada Magirus, mas não sem o compu-tador, com o qual saiu abraçado. Masdeu exemplo, fez escola e tornou-se re-ferência, não somente para todos quedesejam ser correspondentes estrangei-ros, mas para quem gosta do bom jor-nalismo, seja ele praticado às margensdo Sena ou nos rincões da Amazônia.

Em 2009, já aposentado do Estadão,mas ainda trabalhando para a JovemPan, veio de férias para São Paulo. Deve-ria ficar dois meses, mas não pode maisviajar. Doente, precisou fazer um trans-plante de fígado. A cirurgia foi bem,mas outros problemas de saúde se segui-ram. Desde então, passou entre seu apar-tamento na Alameda Rocha de Azeve-do e o Hospital Oswaldo Cruz. Mesmosob os cuidados de Amélia e das quatrofilhas, Adriana, Luciana, Cristiana eMariana, não desgrudava do noticiárioe da chance de novamente voltar aobatente. O sonho acabou interrompidoàs 8 horas da manhã do sábado, 9 deabril, com o fatídico enfarte. Porém, suaanálise precisa, inclusive quando o temaera o trabalho como correspondente,permanecerão durante muito tempo:“Hoje, as coisas estão mais difíceis, emrazão das crises econômicas e cortes decustos, que reduziram os profissionaisda imprensa. Principalmente, corres-pondentes. Ironia da história. Na era daglobalização, quando os jornais maisimportantes espalham seus correspon-dentes mundo afora, os brasileiros re-duzem sua representação no exterior.E tendem a perder força e importância”.

Há grandes obras nocoração da República, masseu público ainda as ignora

POR MARCOS STEFANO

Criado em 1997, o Conselho Editorial do Senado vemrelançando obras fundamentais para o conhecimento daHistória, da política, da economia e da cultura do País.

MEMÓRIAS D’O TICO-TICO

Em Paris, Reali Júnior, na foto ao lado deLuis Fernando Verissimo, sempre recebeu a

visita de intelectuais e políticos brasileiros.

ACERVO

ABI

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mil exemplares para cada um – não se deveà falta de recursos ou à equipe reduzida,mas ao esmero de fazer um trabalho dequalidade.

As publicações do Cedit são bem tra-balhadas, depois de selecionadas a partirde antigos catálogos, como a Coleção Bra-siliana, da Editora Nacional. A impressãofica toda por conta da Gráfica do Sena-do. Usando selos como Edições do Sena-do Federal, Biblioteca Básica Brasileiraou o Brasil Visto por Estrangeiros, algunsdos títulos são instigantes.

Um dos últimos lançamentos, Memóri-as Secretas de Carlota Joaquina, por exem-plo, pode provocar frisson à primeira vis-ta, mas não traz segredos de alcova, casosamorosos ou revelações pessoais. Escritopelo espanhol José Presas, secretário parti-cular da mulher de Dom João VI, até expõesua vida privada em alguns momentos, masse debruça mais em seus pensamentos, vi-são de mundo e ambições políticas, comoa trama para se apossar da Coroa do Prataou a aspiração de chegar ao trono espanhol.Joaquina é uma das figuras mais contro-vertidas na História luso-brasileira e o quea maioria conhece dela vem de livros, fil-

CANUDOS E OUTROS TEMASEuclides da Cunha261 páginas - 2003Coletânea de artigos,reportagens, relatórios, ensaios,correspondência e o discurso deposse de Euclides no InstitutoHistórico e Geográfico Brasileiro.As reportagens de guerra foramretiradas de seu caderno debolso; alguns artigos sãoanteriores à sua atividade derepórter. A correspondência édirigida a Joaquim Nabuco e aOliveira Lima.

UM PARAÍSO PERDIDO -ENSAIOS AMAZÔNICOSEuclides da Cunha393 páginas - 2000Reunião de ensaios amazônicosem que o autor trata da geografiada região, seu relevo, seus rios,o clima, os povoamentos, asfronteiras, com uma penetrantevisão de conjunto.

NARRATIVA DA PERSEGUIÇÃOHipólito José da Costa133 páginas - 2009Relato da prisão de HipólitoJosé da Costa, precursor dojornalismo brasileiro, peloTribunal da Inquisição. O autornarra o momento de sua prisãoe todas as vicissitudes a eleimpostas pelos seus algozes.O crime, não tipificado emnenhuma diplomacia legal, erao de ser pedreiro-livre, oumaçom, filiado em uma lojasituada no estrangeiro. Além deser um dramático relato deuma injustiça em nome dareligião, é também umacontundente defesa dasliberdades públicas e daliberdade de consciência.

O VELHO SENADOMachado de Assis86 páginas - 2004O autor de Dom Casmurro éconhecido pela sua prosa deficção. Poeta, dramaturgo ecronista, a face do jornalistaparlamentar é pouco divulgada.Com a mesma mestria queutiliza em sua obra ficcional,Machado traça em trêscrônicas um panorama vivo epersonalíssimo daspersonagens que povoaram oSenado Federal no tempo doImpério e da Velha República.

O ABOLICIONISMOJoaquim Nabuco214 páginas - 2003Uma das obras fundamentaisde Joaquim Nabuco, é umlibelo humanista e uma análiseainda atual. O autor estuda ascausas, o caráter jurídico e oaspecto humanista, osfundamentos econômicos quesustentaram a escravidão e anecessidade de aboli-la eapresenta as consequênciasde seu término.

TEXTOS POLÍTICOS DAHISTÓRIA DO BRASILPaulo Bonavides e Roberto Amaral9 volumes, aproximadamente 9 milpáginas - 2002Os nove volumes reúnem osmais importantes textos deteor político da História doBrasil, desde os primórdios àatualidade.

RECORDAÇÕES DEGUERRA E DE VIAGEMVisconde de Taunay174 páginas - 2008Autor de Inocência, um dosmais importantes romances daliteratura brasileira, o Viscondede Taunay (1843-1899) recolheimpressões da Guerra doParaguai e das viagens que fezmundo afora. As reminiscênciasda campanha da Cordilheira(1869-1870) representam umaparte pequena na composição

AS AVENTURAS DENHÔ-QUIM E ZÉ CAIPORAÂngelo Agostini208 páginas - 2005Os quadrinhos de Agostinireunidos neste álbum de luxoforam publicados nas revistasVida Fluminense, Don Quixotee O Malho e são os primeirosdo Brasil. Zé Caipora é, também,o primeiro personagem deaventura realista em quadrinhosdo mundo.

MEMÓRIAS D’O TICO-TICO -JUQUINHA, GIBY E MISSSCHOCKING, DE J. CARLOSPesquisa e texto deAthos Eichler Cardoso208 páginas - 2009O álbum de luxo reúne deforma antológica e inédita asprimeiras experiências gráficasde J. Carlos (1884-1950) nasrevistas O Malho e O Tico-Tico.Destaque para os personagensJuquinha, o garoto branco, filhoda burguesia carioca, e Giby, omenino negro.

geral do livro. Predominam asimpressões de viagens a Paris,Estrasburgo, Veneza eFlorença. Parte do material foipublicada na imprensa daépoca; parte é inédita.

MEMÓRIAS DARUA DO OUVIDORJoaquim Manoel de Macedo218 páginas - 2005O romancista de A Moreninha(1844) é também mestre dachamada “crônica decostumes”. Macedo realiza seupapel de historiador da maisfamosa rua carioca da segundametade do século XIX. Ovolume registra desde suacriação, quando era apenas um“Desvio”; passa por descriçõesno tempo de Dom. João VI;comenta sobre lojas, jornais,hotéis, fatos da História doBrasil que têm conexão com arua, até chegar à Rua doOuvidor de seu século.

COLEÇÃO HISTÓRIA DALITERATURA OCIDENTALOtto Maria Carpeaux4 volumes, aproximadamente6.500 páginas - 2008Composta por quatro volumes,é uma das mais importantesobras publicadas no Brasil noséculo XX. Não apenas ajuda aconhecer a fundo o percursode homens, livros, movimentosliterários, mas tambémcompreender a História dasidéias no mundo ocidental. Sócomo compêndio da literaturauniversal já justificaria suaterceira edição, com acréscimose dados informativos que nãocompunham as ediçõesanteriores.

O BRASIL HOLANDÊSSOB O CONDE JOÃOMAURÍCIO DE NASSAUGaspar Barléu429 páginas - 2009História dos oito anos decolonização holandesa sob ogoverno do Conde João

Para conhecer o catálogo do Ceditou comprar seus livros ointeressado deve dirigir-se àLivraria do Senado, acessar o sitewww.senado.gov.br/publicacoes/conselho ou enviar e-mail [email protected].

mes e trabalhos de historiadores. Mas to-dos bebem da mesma fonte primária, as me-mórias escritas originalmente em 1830.Esse é o perfil de publicação em que o Con-selho Editorial investe.

Outro destaque fica para relatos de via-gens de naturalistas europeus que visitaramo Brasil no século XIX. Os textos de Luiz eElizabeth Agassiz, Auguste de Saint-Hilai-re e Daniel Kidder são fundamentais paraentender a formação do País, sua gente, co-nhecer a vida nas grandes cidades e percebercomo eram vistos os rincões mais distantesda Capital Federal, do Rio Grande do Sul aointerior de Pernambuco e à Amazônia.

Um filão: a imprensaA imprensa também merece a atenção

do Cedit. Primeiro, com a publicação deMemórias d’O Tico-Tico, álbum que reúnede forma inédita os primeiros trabalhos deJ. Carlos nas revistas O Malho e Tico-Tico,revivendo em forma de antologia perso-nagens históricos dos quadrinhos nacio-nais, como Juquinha, Chiquinho, Giby eMiss Shocking. Depois, com a edição doDiário da Minha Viagem para Filadélfia(1798-1799), obra que já revelava algumas

das idéias depois popularizadas por Hipó-lito da Costa em seu Correio Braziliense.

Imprensa da qual Joaquim CampeloMarques reclama. Ele reconhece que umdos maiores problemas enfrentados peloCedit é a falta de divulgação de suas edi-ções, mas também reclama da falta deatenção por parte da mídia, já que elemesmo costuma enviar seus lançamen-tos para revistas e jornais e dificilmentelê sequer uma linha sobre eles:

“Quem fala mais sobre nossas publica-ções é o Elio Gaspari, em sua coluna. Elejá se mostrou um parceiro em suas críti-

Maurício de Nassau, contadapor Gaspar Barléu. É a Históriado Brasil holandês, na épocaem que a Holanda e aEspanha disputavam odomínio de novas colônias eos embates realizavam-se emterra e no mar, de seuprogresso econômico,científico e artístico. Havialiberdade religiosa e um climade grande tolerância.

MISSÃO RONDONCândido Mariano da Silva Rondon282 páginas - 2003A obra compila artigospublicados no Jornal doCommercio em 1915. Estãodescritas as expedições parao reconhecimento do traçadoe a construção de linhastelegráficas, as exploraçõesgeográficas e as riquezas dossertões do noroeste mato-grossense, populaçõesindígenas e seus contatos erelações entre estas e aComissão Rondon e aExpedição Roosevelt paradeterminação do curso do Rioda Dúvida.

NAS SELVAS DO BRASILTheodore Roosevelt363 páginas - 2010A obra traz um apanhado dasobservações do estadistaTheodore Roosevelt,realizadas no curso de umaviagem pelo interior do Brasil.O interesse científico e osabor pela aventura em terraestranha transformaram-noem uma espécie desertanista, à cata deexemplares zoológicos,explorando a geografia dezonas ainda não conquistadaspela civilização e observandocom atenção a terra e ohomem.

MEMÓRIAS SECRETAS DECARLOTA JOAQUINAD. José Presas220 páginas - 2010

Algunsdestaquesda Editorado Senado

Escrito pelo secretário particularde Carlota Joaquina, oespanhol José Presas, o livroexpõe a correspondência daesposa de Dom João VI, suavida privada, suas ambiçõespolíticas e outras de caráteríntimo. Faz parte da obra acorrespondência de CarlotaJoaquina, mulher de João VI,com as autoridadesespanholas e a trama para seapossar da coroa do Prata, emdetrimento dos interesses doirmão, o Rei Fernando VII, daEspanha, e , mais tarde, aintenção de Carlota de tomar otrono espanhol.

ENSAIOS E ESTUDOSCapistrano de Abreu252 páginas - 2003Reunião de artigos escritos entre1903 e 1927, publicados emrevistas, jornais ou prefácios delivros. Publicados pela primeiravez em 1932, os ensaiosreúnem diversos temas: oDuque de Caxias; Frei Vicentede Salvador; Claude Abbeville;Antônio José, o Judeu, e, entreoutros temas, os atos do SantoOfício no Brasil.

O BRASIL SOCIAL E OUTROSESTUDOS SOCIOLÓGICOSSilvio Romero279 páginas - 2001Sílvio Romero exerceu grandeinfluência na vida intelectual deseu tempo, inclusive emautores do primeiro pós-guerra.Expoente da chamada Escolado Recife, ele foi um dosprincipais teóricos doCulturalismo Sociológico. Acoletânea de ensaios reunidosnesta obra dá uma amostra deseu método e das teses quedefendeu.

cas. Mas é uma exceção. A maioria, quan-do vê que a Presidência do Conselho é doSarney, já nos julga como chapa-branca.Infelizmente, a publicidade tem um cus-to que não podemos pagar.

Diz Campelo que Cedit é daquelesórgãos que só não são clandestinos por-que pertencem ao Poder Público. Talvezpor causa dessa informalidade foi possí-vel descobrir coleções de revistas Tico-Tico e Malho com um botânico carioca oureceber, durante uma feira de livros em Pal-mas, no Tocantins, um boneco de Cultu-ra Quilombola na Lagoa da Pedra Arrais –TO, uma das melhores pesquisas já feitassobre as raízes das manifestações cultu-rais brasileiras e que se tornou uma obraminuciosa sobre a interação entre os qui-lombolas e seu ambiente, documentadain loco e ricamente ilustrada com umextenso registro fotográfico.

Continuar, porém, com a divulgaçãodesse trabalho feita apenas de boca emboca por professores e estudantes univer-sitários é deixar que um notável exemploe notáveis obras da literatura nacionalcontinuem relegadas apenas aos corredo-res e aos estoques do Senado Federal.

Campelo: Editamos livros que as editorasdesprezam por não terem apelo comercial.

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AS AVENTURASDE NHÔ-QUIME ZÉ CAIPORA

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RELATÓRIO DA DIRETORIAEXERCÍCIO SOCIAL 2010-2011

CONTAS DE GESTÃO | ANO CIVIL DE 2010

A ABI PRESENTE NA EXIGÊNCIA DE ABERTURADOS ARQUIVOS DA REPRESSÃO

Caros companheiros do ConselhoDeliberativo da ABI,

1. UMA LUTA EM QUENÃO SE PODE PARAR

1.1. Em cumprimento aos artigos 19e 21 do Estatuto Social, submeto à apre-ciação desse nobre colegiado o Relatórioda Diretoria da ABI relativo ao exercíciosocial 2010-2011, iniciado em 13 demaio passado e que expirará em 12 demaio próximo, e as Contas de Gestão re-lativas ao ano civil 2010, em comparati-vo com o ano civil 2009.

1.2. A Diretoria da ABI considera ne-cessário assinalar desde logo a militânciaindormida que a Casa teve ao longo des-se exercício social na defesa de princípi-os e de causas que constituem a razão desua existência e motivam a sua atuação:a liberdade de imprensa e expressão, a in-tegridade dos direitos humanos e, aindapor conquistar, a abertura dos arquivos darepressão da ditadura militar, para quefiquem claras as circunstâncias em queforam torturados e assassinados milharesde brasileiros e sejam identificados e res-ponsabilizados os autores desses crimeshediondos, contra os quais clama a cons-ciência cívica nacional.

1.3. Através da participação direta ematos e eventos e de declarações divulga-das através do ABI Online e do Jornal daABI, a Casa teve uma ação permanenteno apoio à postulação de abertura dos ar-quivos da repressão, integrando-se naCampanha Nacional pela Memória epela Verdade, lançada em 16 de abril de2010 pelo Presidente da Ordem dos Ad-vogados do Brasil-Seção do Estado do Riode Janeiro, Wadih Damous, em ato quecontou com a participação do MinistroPaulo Vanucchi, Chefe da Secretaria deDireitos Humanos da Presidência da Re-pública. A ABI manifestou sua adesão aCampanha em pronunciamento feitono ato por seu Presidente e em textosdesde então publicados no Jornal da ABIe no ABI Online.

1.4. Naquele mesmo mês de abril, aABI divulgou vigorosa declaração de re-púdio à decisão do Supremo TribunalFederal que, em sessão realizada no dia 29,resolveu declarar como alcançados pelaLei da Anistia (Lei nº 6.683/79) os agen-tes do Estado que praticaram crimes du-rante a ditadura militar. A ABI lamentouque o voto do relator, Ministro Eros Grau,que foi preso e torturado durante os cha-mados anos de chumbo, tivesse sustenta-do que a anistia alcança também os tor-

turadores e assassinos. A declaração da ABI,divulgada no dia seguinte, apesar de a Casaestar concentrada no processo da eleiçãoda Diretoria, do Conselho Consultivo, doterço do Conselho Deliberativo e dos setemembros do Conselho Fiscal, exaltou opronunciamento dos Ministros RicardoLewandovsky e Ayres Britto, os únicosque votaram contra a impunidade dessescriminosos.

1.5. A ABI também deu ênfase à infor-

mação de que a Corte Interamericana deDireitos Humanos, órgão da Organiza-ção dos Estados Americanos-OEA, em ses-sões realizadas em 20 e 21 de maio, deci-dira levar a julgamento o processo em queo Estado nacional do Brasil foi denunci-ado pela prática de crimes contra os par-ticipantes da Guerrilha do Araguaia. Pos-teriormente, a ABI destacou o pronunci-amento da Corte de condenação do Bra-sil pela prática desses crimes.

1.6. Igual relevo foi dado pela Casa aoato promovido pela Secretaria de Assis-tência Social e Direitos Humanos doEstado do Rio de Janeiro em comemora-ção, em 30 de maio, do Dia Mundial deCombate à Tortura. Na sessão, sob a pre-sidência do Governador Sérgio Cabral ecom a presença do Ministro Paulo Va-nucchi e da Ministra em exercício TeresaSouza, então à frente da Secretaria dePolíticas para Mulheres, o Governo doEstado anunciou o pagamento da repa-ração simbólica instituída pela Lei Esta-dual nº 3.744/2001 a 150 vítimas de pri-são durante a ditadura militar. O ato de-finia seu grande objetivo na sua própriadenominação: Direitos Humanos no Riode Janeiro – Construir a memória pararesguardar o futuro.

1.7. Com justificada indignação a ABIcontestou as declarações prestadas ao jor-nalista Geneton Morais Neto pelo Gene-ral Leônidas Pires Gonçalves, ex-Coman-dante do Doi-Codi (Departamento deOperações de Informações-Centro deOperações de Defesa Interna), de que naépoca em que dirigiu esse órgão de repres-são, durante a ditadura, não houve tortu-ras e, também, que o jornalista VladimirHerzog, morto em 25 de outubro de 1975no Doi-Codi de São Paulo, teria se suici-dado. A contestação da Casa foi feita noJornal da ABI em texto sob o título O Ge-neral brigou com a verdade, com chama-da na primeira página do Jornal sob o tí-tulo O General sofismou.

1.8. Outra ação destacada da ABI nocampo da defesa dos direitos humanos

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foi a inauguração no saguão do Audi-tório Oscar Guanabarino, no nono an-dar do Edifício Herbert Moses, em 5 dejulho, do Memorial Mário Alves, ins-tituído pela Secretaria de Direitos Hu-manos da Presidência da República emhomenagem a esse jornalista, assassi-nado após brutais torturas pela repres-são da ditadura militar. No ato, sob apresidência do Ministro Paulo Vanucchie em que a mesa contou com a presen-ça de outras personalidades, como o Pre-sidente da OAB-RJ, Wadih Damous, a fi-lha de Mário Alves, Lúcia Caldas, fez co-movente depoimento sobre ele. Inte-grante da mesa, a Desembargadora Tâ-nia Heine, atualmente aposentada, rela-tou os momentos de tensão que viveuantes de proferir uma sentença históri-ca como magistrada da Justiça Federal:a de condenação da União como respon-sável pelo assassinato de Mário Alves.

1.9. Assim como está fazendo agorana edição de março do Jornal da ABI, aCasa redobrou sua exigência de apura-ção das circunstâncias da morte do ex-Deputado Rubens Paiva, que já em janei-ro de 2010 fora o tema da reportagem AABI exige apuração: quem matou e esquar-tejou Rubens Paiva, a qual dava conta dapetição encaminhada pela Casa ao Mi-nistério Público da União reclamando aapuração dos crimes de que foi vítima oex-parlamentar, preso em sua casa no Riode Janeiro, em 20 de janeiro de 1971, etorturado, cujo corpo jamais foi encon-trado. Na edição lançada agora, o Jornal

da ABI estampa como título principal dasua primeira página a manchete Há pis-tas para chegar aos matadores de RubensPaiva, a qual é objeto de minuciosa re-portagem no interior da publicação.

1.10. A preocupação permanente coma denúncia dos crimes da ditadura mili-tar levou a Diretoria a propor a esse Con-selho Deliberativo que fosse exibido paraos seus membros e convidados o filmePerdão, Míster Fiel, do jornalista e cine-asta Jorge Oliveira, que narra a prisão eassassinato do operário Manoel Fiel Fi-lho em janeiro de 1976, no Doi-Codi deSão Paulo. Após a projeção, em que o Pre-sidente do Conselho, companheiro PeryCotta, confessou que ficou chocadocom o que vira no filme, a Diretoria pro-

mentação em apoio a esse entendimentofoi oferecida num estudo pelo jurista Lê-nio Streck, professor da Universidade Fe-deral do Vale dos Sinos, Santa Catarina,cuja íntegra foi divulgada na edição defevereiro de 2010 do Jornal da ABI sob otítulo Tortura não é crime político.

1.13. A ABI manteve-se alerta dian-te das tentativas de obstrução do pro-cesso de concessão de anistia às vítimasda ditadura, como a perpetrada no Tri-bunal de Contas da União pelo Procu-rador Marinus Marsico, que propôs aessa Corte de Contas a revisão dos pro-cessos de anistia aprovados pelo Minis-tério da Justiça através da Comissão deAnistia. A iniciativa do Procurador en-sejou fundamentada contestação doPresidente da Comissão de Anistia, Pau-lo Abrão, em declaração que mereceu oaplauso da ABI.

1.14. A Casa marcou presença tam-bém no ato, realizado em 13 de outubro,em que a Ordem dos Advogados do Bra-sil/Seção do Estado do Rio prestou home-nagem ao Juiz espanhol Baltazar Garzónpor sua corajosa decisão de mandar pren-der o ditador chileno General AugustoPinochet pelos crimes que seu regimecometeu contra os direitos humanos.Diante de uma assistência numerosa demembros do Conselho da OAB-RJ, advo-gados e representantes da sociedade civile de uma mesa integrada pelo MinistroPaulo Vannuchi, Chefe da Secretaria deDireitos Humanos da Presidência da

República, pelo ex-Ministro Tarso Dutra,que acabara de se eleger no primeiro turnoda eleição para o Governo do Estado doRio Grande do Sul, pelo Presidente da ABIe outros convidados, Garzón defendeu aabertura dos arquivos da repressão da di-tadura militar no Brasil, como sustenta-ra ao abrir a manifestação o Presidente daOAB-RJ, Wadih Damous.

1.15. Em novembro, a ABI partici-pou em Brasília de uma reunião convo-cada pelo Presidente da Comissão deAnistia, Paulo Abrão, com a presença derepresentantes de instituições de defesados direitos humanos de inúmeros Es-tados, para discutir a implantação e ocaráter do Memorial da Anistia que aComissão começou a construir em

RELATÓRIO DA DIRETORIA

moveu a produção de cópias da obra, paradistribuição aos membros do Conselho.Em sua edição de novembro, o Jornal daABI publicou o depoimento prestado parao filme pelo antigo agente da repressãoMarival da Silva Chaves, que reconsti-tui em detalhes as torturas e assassina-tos cometidos durante a ditadura e men-ciona os nomes de vítimas desses crimes,como o jornalista Orlando Bonfim Júni-or, que dirigiu o semanário comunistaNovos Rumos, fechado em abril de 1964,e que era destacado sócio da ABI.

1.11. Empenhada em manter viva eforte a lembrança dos crimes da ditadura,a Casa publicou no Jornal da ABI, sob otítulo Estilhaços do terror no Brasil, umlevantamento sobre o terrorismo desen-

cadeado pelo regime durante os anos 80,o qual provocou morte e destruição,como a de Dona Lyda Monteiro da Silva,Secretária do Conselho Federal da Or-dem dos Advogados do Brasil, morta naexplosão de uma carta-bomba dirigida aoentão Presidente da OAB, Eduardo Sea-bra Fagundes. A rememoração dessesfatos foi oportuna: a OAB prestava ho-menagens a Dona Lyda no 30º aniversá-rio de sua morte.

1.12. Em editoriais e outros textos deseu jornal, a ABI sustentou e continuaa sustentar o entendimento de que, aocontrário do que decidiu o Supremo Tri-bunal Federal, os torturadores têm de serresponsabilizados pelos crimes que co-meteram. Uma fundamentada argu-

A filha de Mário Alves, Lúcia Caldas, deu um depoimento comovente durante a inauguração doMemorial em homenagem ao jornalista e ativista político. Ao seu lado, Ricardo Henriques,

Secretário de Direitos Humanos do Estado do Rio, e Maurício Azêdo, Presidente da ABI.

Em evento na OAB-RJ, o Juiz espanhol Baltazar Garzón defendeu aabertura dos arquivos da repressão da ditadura militar no Brasil.

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Belo Horizonte em colaboração com aUniversidade Federal de Minas Gerais.Dissentindo de opiniões que sugeriamque o Memorial deveria recuar fundo naHistória do Brasil e reunir documenta-ção desde a resistência do quilombo deZumbi dos Palmares, no século XVII, aABI sustentou que o Memorial deveabarcar o período da ditadura militar1964-1985, o que não será pouco em do-cumentação a classificar e pesquisar: sóà Comissão de Anistia foram encami-nhados 60 mil processos de vítimas daditadura, o que significa milhões de peçaspara arquivar e tratar.

1.16. A ABI acompanhou as Carava-nas da Anistia organizadas pelo Minis-tério da Justiça, a primeira das quais foirealizada em sua sede, em 2 de abril de2008, no âmbito das comemorações deseu centenário, e interveio em favor dadecisão de processos apresentados porjornalistas, alguns dos quais pendenteshá anos de definição, como os dos jor-nalistas Antônio Idaló Neto, do Rio, eAchylles Armando Jalul Peret, de Nite-rói, ambos associados da Casa. Regis-trou a ABI que entre os anistiados em2010 se encontravam o jornalista IvanCavalcânti Proença, ex-Presidente doConselho Deliberativo da Casa, e suaesposa, Ísis Proença, que aguardaramanos por essa decisão. Também foramanistiados Mário Alves e a jornalistaAna Montenegro, ambos postumamen-te. Ana viveu um exílio prolongado; aoretornar ao Brasil, integrou-se às ativi-dades da ABI.

1.17. Membro do Conselho de Defe-sa dos Direitos Humanos desde a im-plantação em 1964, a ABI participou dassessões realizadas em Brasília pelo órgão,seja através de seu representante perma-nente, jornalista Marcelo Tognozzi, sejaatravés do Presidente da Casa. Tognoz-zi, que é radicado em Brasília, propôs queo Conselho promovesse a divulgação daidéia e da importância dos direitos hu-manos, para familiarizar as pessoas co-muns com o tema. A proposição foi apro-vada e aplicada pelo Conselho, que fezampla divulgação dos direitos huma-nos em cartazes e em materiais audio-visuais destinados a emissoras de rádioe de televisão.

1.17.1. Outro colegiado em que a ABIse fez presente foi o Conselho Curadorda Empresa Brasileira de Comunicação-EBC (TV Brasil), para o qual foi nome-ado pelo Presidente Luiz Inácio Lula daSilva nosso associado Mário AugustoJakobskind, indicado pela ABI. MárioAugusto teve atuação destacada noConselho, sobretudo na discussão, ain-da em curso, da observância do caráterlaico da programação da emissora.

1.18. Ainda no campo dos direitos hu-manos, foi recebida com indignação pelaABI a prisão de 13 participantes de umamanifestação realizada diante do Con-sulado-Geral dos Estados Unidos, em 18de março, contra a visita do PresidenteBarack Obama ao Brasil. Repetindo prá-ticas da ditadura, o titular da 5ª Delega-

Acre. No Estado do Tocantins, durantea campanha eleitoral, o Juiz LiberatoPóvoa impôs a censura prévia a 84 ve-ículos de comunicação da capital e deoutras cidades, numa decisão tão absur-da que no dia seguinte o plenário do Tri-bunal Regional Eleitoral do Estado anu-lou seu despacho. Em Maceió, Alagoas,

também na campanha eleitoral, oJuiz Pedro Ives proibiu a circulaçãodo semanário Extra, atendendo aum candidato ao Governo do Esta-

do, Ronaldo Lessa.

1.20. Na série de agravos à li-berdade de imprensa, a ABI ar-rolou, entre outras, a prisão dajornalista Juliana Martins emRondônia, em 23 de janeiro; aviolência contra a repórter Po-llyana Sorentino, da Rádio 98FM, de João Pessoa, Paraíba, em11 de março; a censura préviaimposta ao Diário do GrandeABC, de Santo André, na pri-meira quinzena de maio, a pe-dido do Prefeito Luiz Mari-nho, que se considerou ofen-dido por reportagens publica-das pelo jornal acerca de suaadministração; as agressões

cometidas em 21 de maio em Florianó-polis aos jornalistas Felipe Pereira e Flá-vio Neves, do Diário Catarinense, e Ra-fael Faraco, da RBS, quando cobriam umprotesto contra o aumento das tarifas deônibus; as praticadas contra o jornalis-ta Danilo Gentili, da equipe do progra-ma CQC, da Rede Bandeirantes; MárciaPecha, da TV Centro-Oeste, e Marco An-tônio dos Santos, repórter da Gazeta deBebedouro, São Paulo, todas em junho; oatentado, em 11 de novembro, contra oCorreio Mariliense, de Marília, SP, comtentativa de destruição de sua sede e deseu parque gráfico. A ABI manifestou-se contra as violências em mensagem aoGovernador Geraldo Alckmin, ao qualpediu a apuração do episódio e a respon-sabilização penal dos criminosos.

1.20.1. A violência impôs sacrifício devidas: o assassinato, em Caicó, RN, do jor-nalista Francisco Gomes Medeiros, que seassinava F. Gomes, da Tribuna do Norte edo blog F. Gomes, em 18 de outubro; doisdias antes fôra morto o jornalista Wan-derlei dos Reis, do jornal Popular News,de Ibitinga, São Paulo; a morte do jorna-lista José Rubem Pontes de Souza, Pre-sidente do Entre-Rios Jornal, assassinadoa tiros no dia 31 desse mesmo mês, noMunicípio de Sapucaia, interior do Esta-do do Rio de Janeiro. Neste caso foi pre-so o acusado, o ex-PM Renato Demétriode Souza, que José Rubem denunciaracomo explorador de caça-níqueis clan-destinos na cidade.

1.21. A tudo isto juntou-se a manu-tenção da censura prévia ao jornal OEstado de S. Paulo, por decisão judicialque favoreceu o empresário FernandoSarney e que é mantida pelo Poder Judi-ciário, apesar de este ter solicitado o ar-quivamento da ação, com o que o Esta-dão não concorda: o jornal quer o julga-mento do processo para reafirmação daliberdade de imprensa assegurada pelaConstituição.

1.22. A hostilidade à imprensa reves-tiu-se também de manifestações de im-posição de ônus econômico, como se deuno Município de João Monlevade, Mi-nas Gerais, cujo Prefeito, Gustavo Pran-dini, suspendeu a divulgação de publici-dade oficial no jornal A Notícia, de queé proprietário Márcio Passos e editor, Bre-no Eustáquio, em represália ao trata-mento dado à sua administração pelojornal. No Município de Duque de Ca-xias, RJ, o jornalista Alberto MarquesDias sofreu represálias do casal ClaiseMaria e Zito (José Camilo Zito), ex-Pre-feito da cidade, por críticas que ele fize-ra a ambos em seu blog.

1.23. A adversidade da comunidadejornalística foi amenizada por algumasvitórias, como:

1.23.1. A condenação dos matadoresdo jornalista Luiz Carlos Barbon, mor-to em 2005 no Município de Porto Fer-reira, interior de São Paulo;

1.23.2. A condenação a 43 anos de re-clusão do assassino do jornalista Ivandel

cia de Polícia do Rio de Janeiro, AlcidesAlves, não só prendeu como indiciou os13 por delitos inexistentes, como o detentativa de incêndio, que só ele teriavisto. O Delegado promoveu a transfe-rência dos presos para dois presídios dacapital, num dos quais sete deles tive-ram a cabeça raspada. A ABI divulgou de-claração de protesto contra esse conjun-to de ilegalidades e participou no dia 1 deabril, na Faculdade de Direito da Univer-sidade Federal do Rio de Janeiro, de atode protesto contra as violências e de so-lidariedade às suas vítimas.

1.18.1. Para deixar bem caracteriza-da a gravidade das violências praticadaspelo delegado Alcides Alves, a ABI pu-blicou em seu site, no dia 4 de abril, mi-nucioso depoimento redigido por umadas 13 vítimas do conjunto de ilegali-dades, o jovem professor de HistóriaRafael Rossi, o qual denunciou o elen-co de ilegalidades comandadas pelo De-legado Alcides, a começar pela prisãoem si, seguida de um indiciamento pordelitos que não ocorreram e do recolhi-mento dos presos a presídios do Estado,onde eles foram submetidos a humilha-ções. No ato realizado na Faculdade Na-cional de Direito no dia 1, o advogadoMarcelo Cerqueira informou que o De-legado será processado criminale civilmente, para responder pe-las violências que cometeu.

1.19. A defesa da liberdadede imprensa foi promo-vida pela ABI atravésde pronunciamentosaos meios de comu-nicação e poruma série de de-clarações de de-núncia das violações daliberdade de expressão edos direitos dos jornalistas,que foram freqüentes emdiferentes pontos do País.No mês de agosto, comoregistrou o Jornal da ABI,ensejaram manifesta-ções da Casa violênciasnos Estados da Bahia,Paraíba, Mato Grosso e

Juliana Martins, do site Rondôniaagora: presasob a alegação de desacato à autoridade.

O jornal Extra, de Alagoas, foi proibido decircular atendendo a um pedido de Ronaldo

Lessa, candidato ao Governo do Estado. Acensura também foi imposta ao Diário do

Grande ABC, a pedido do Prefeito Luiz Marinho.Danilo Gentili, do CQC (abaixo), também sofreu

agressões em São Bernardo do Campo.

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RELATÓRIO DA DIRETORIA

Godinho Júnior, Fabiano Pavan do Pra-do, que o seqüestrou e matou em 2003,mesmo após o pagamento de resgate;

1.23.3. A absolvição dos jornalistas Ri-cardo Boechat e Fernanda Job, da RedeBandeirantes e do JB pelo Tribunal deJustiça do Estado, em decisão relatadapelo Desembargador Raul Celso Lins eSilva, num processo iniciado em 2005por um oficial da Polícia Militar que seconsiderou ofendido pela reação da jor-nalista Fernanda num incidente de trân-sito e pela forma como o episódio forarelatado na Band e no JB;

1.23.4. A revogação pelo Tribunal Su-perior Eleitoral de disposição da legisla-ção que proibia charges durante a cam-panha eleitoral.

1.24. Para exercício dessa militância ecumprimento de outros encargos, a Pre-sidência da ABI manteve intenso proces-so de comunicação, expresso na expedi-ção de 1.883 ofícios, 496 cartas, 323 e-mails e 59 telegramas, afora 225 memo-randos de circulação interna na Casa. AAssessoria da Presidência, formada pelosfuncionários Guilherme Povill Viannae Mário Luis de Freitas Borges fez a clas-sificação e o acompanhamento dos do-cumentos relacionados com a impren-sa, os quais ocupam 78 pastas com títu-los relacionados a assuntos e/ou depar-tamentos da Casa e 279 pastas com 537entradas de assunto.

2. UM JORNALISMO DEPRIMEIRA LINHA

2.1. Com o empenho da Coordena-ção de Publicidade e Marketing, dirigi-da pelo consócio Francisco Paula Freitas,a Casa pôde manter a regularidade da pu-blicação do Jornal da ABI, que é atual-mente um instrumento eficaz de expo-sição das idéias e propostas da instituiçãoe de contato com o corpo social e setoresda vida nacional a que é enviado. O ca-dastro da publicação contém milharesde destinatários, da administração pú-blica, de entidades da sociedade civil e deorganizações culturais.

2.2. É com especial satisfação que a Di-retoria registra que o Jornal da ABI temmerecido elogios de quantos o recebem,muitos dos quais revelam que colecio-nam a publicação, pelo seu valor edito-

rial e pela sua forte inserção nas questõesde interesse público.

2.2.1. Entre os que exaltaram a quali-dade do Jornal da ABI figuraram o Mi-nistro Valmir Campelo, do Tribunal deContas da União; o Conselheiro ThiersMontebello, Presidente do Tribunal deContas do Município do Rio de Janeiro;o Conselheiro Roberto Braguim, Corre-gedor do Tribunal de Contas do Muni-cípio de São Paulo; o Prefeito de Floria-nópolis, Santa Catarina, Dário Elias Ber-ger; para honra da equipe de jornalismoda ABI, a escritora Lygia Fagundes Tellese o escritor Fábio Lucas.

2.3. A despeito das restrições impostaspela legislação eleitoral, que proíbe a di-vulgação de publicidade de órgãos públi-cos nos meses que precedem e se seguemao pleito, o Jornal da ABI pôde apresen-tar em 2010 um desempenho que teveimportante papel não apenas na cober-tura das despesas de produção da publi-cação, mas também na receita da Casa.Descontadas as comissões de agência,os valores líquidos efetivamente per-cebidos pela Casa alcançaram o total deR$ 830.685,27. Colaboram com a gestãode Francisco Paula Freitas o associado Pau-lo Roberto de Souza Freitas e a funcioná-ria Queli Cristina Delgado da Silva.

2.4. Ao longo de 2010 o Jornal da ABIproduziu 12 edições, que destacaram te-mas do maior interesse para a comunida-de jornalística e o quadro social, como adecisão do Supremo Tribunal Federal desuprimir a exigência de conclusão docurso de Jornalismo ou ComunicaçãoSocial para o exercício da profissão,matéria principal da capa da edição nú-mero 351, de fevereiro de 2010. Igualênfase mereceu a defesa dos direitos hu-manos, que ganhou destaque nas edi-ções de número 353, de abril de 2010,cuja capa estampava três manchetesvigorosas: OAB busca a verdade, STFperdoa criminosos e O General sofismou;na de número 354, de maio, que estam-pou a manchete Brasil réu na OEA; na denúmero 358, de setembro, que relem-brou O início explosivo da década de 80,principal título da primeira página; e nade número 360, de novembro, cuja pri-meira página chamou a atenção para Ohorror da tortura num relato chocante.

2.5. Ocupou-se também o Jornal daABI de outros temas relevantes, como o

terremoto no Haiti e a cobertura da re-pórter da TV Globo Lília Telles, que en-sejou a produção na edição de número350, de janeiro, de uma bela matéria decapa sob o título Lília salvou esta mulher;a mobilização do Governo do Estado doRio de Janeiro e o povo fluminense con-tra a proposta do Deputado Ibsen Pinhei-ro (PMDB-RS) de redução do valor dosroyalties atribuídos ao Estado na explo-ração de petróleo em seu litoral, tema daedição de número 352, de março, expres-so na manchete O Rio unido contra a ex-torsão; a produção do artista gráfico Ru-bem Grilo, exposta na edição de núme-ro 359, de outubro, em que foi apresen-tada A arte reflexiva de Rubem Grilo. OJornal da ABI produziu também duasedições especiais: a de número 355, dejunho, intitulada Especial de Fotojorna-lismo, e a de número 361, de dezembro,dedicada aos 60 anos da implantação datelevisão no Brasil.

2.6. Tendo como editores o Presiden-te da Casa e o associado Francisco Ucha,que atua profissionalmente na progra-mação visual, na diagramação e na edi-toração eletrônica da publicação, o Jor-nal da ABI ocupa-se tanto das questõesvinculadas à destinação institucional daCasa como aos diferentes aspectos do ricoe complexo processo da comunicação so-cial e de seus produtores, os jornalistas.Todas as suas edições procuram retratara fecunda trajetória dos profissionais dediferentes áreas, mostrando o que fize-ram e como, buscando transmitir, sobre-tudo aos jovens que se iniciam na profis-são, as experiências e os conhecimentosde que eles são portadores. Há outraspublicações que têm a mesma preocupa-ção, o que é altamente positivo.

2.6.1. Entre os depoimentos e relatosdessa natureza publicados destacaram-se nesse ano de 2010 os de Adolfo Mar-tins, na edição de outubro; Anna Khou-ry, pioneira da transmissão de rádio emfreqüência modulada, na edição de ju-lho; Carlos Alberto Luppi, na de feverei-ro; Edouard Bailby, na de março; FerreiraGullar e Geneton Moraes Neto, ambosna edição de agosto; Juca Kfoury, este jána edição de março de 2011, a última doperíodo ora relatado; José Gonçalves Fon-tes, na de abril; Ledy Gonzáles, na de mar-ço; Lemyr Martins, na de julho; Oswal-do Miranda, também na de julho; PedroMacário, na de maio; Rico Lins, na de se-tembro; Roque Araújo, fotógrafo e dire-tor de fotografia de Gláuber Rocha, na deoutubro; o já citado Rubem Grilo, na deoutubro; Ruth Lima, bailarina e escrito-ra, na de novembro; Sidney Rezende, nade setembro. O Jornal da ABI registrouque 2010 foi o ano da graça de FerreiraGullar, que ganhou nesses 12 meses oPrêmio Camões de Literatura, foi a gran-de estrela da Festa Literária Internacionalde Paraty-Flip e publicou um livro depoemas, muitos anos após o lançamentoda obra anterior.

2.7. Atento ao que acontece de signi-ficativo na área do jornalismo e da vidasocial em geral, o Jornal da ABI regis-trou momentos importantes da evolu-ção da imprensa, como os 40 anos da re-vista Placar, os 25 anos da Folha Dirigi-da e os 90 anos da Folha de S. Paulo; ainauguração do Centro de Cultura eMemória do Jornalismo, criado pelo Sin-dicato dos Jornalistas Profissionais doMunicípio do Rio de Janeiro com o

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municação Renan Castro Aguiar, esta-giário da Diretoria de Jornalismo da ABI,os quais participam também da produ-ção do jornal, a equipe do Jornal da ABIcontou com colaboradores permanen-tes, como Paulo Chico, Marcos Stefanoe Celso Sabadin, que produzem entrevis-tas e reportagens no Rio e em São Paulo,e Conceição Maria Ferreira Ucha, res-ponsável pela revisão final dos diagra-mas da publicação, além de colaborado-res eventuais, como o editor ArcírioGouvêa Neto, a redatora Rita Braga e osdesenhistas Aliedo, André Gil (trata-mento de fotos), Diego Novaes,ElianeSoares, Francisco Ucha, J. Bosco, MariaHelena Bastos Soares, Nei Lima, Rogé-rio Soud e Thais Lorenzini.

2.9.2. Com trabalho voluntário e gra-tuito, como serviço à Casa, participamtambém da produção do jornal os asso-ciados Rodolfo Konder e Paulo RamosDerengoski .

3. O TRAUMA: O FIMDO JB IMPRESSO

3.1. A comunidade jornalís-tica e o mercado de publicaçõesdiárias sofreram um grande trau-ma no fim de agosto, quando oJornal do Brasil soçobrou, afinal, diantedas dificuldades em que se debatia hádécadas e que se agravaram depois que osherdeiros da família Nascimento Brito,genro e sucessor da Condessa MaurinaDunshee de Abranches Pereira Carnei-ro, entregaram o jornal e a empresa a umempresário aventureiro, Nélson Tanure,que acrescentou ao seu currículo decoveiro de jornais mais um feito impor-tante e negativo: antes de extinguir o JBimpresso ele fechara também o jornalGazeta Mercantil, de São Paulo, que che-gara a ser um dos mais importantes di-ários de economia do País.

3.2. Acompanhado com preocupaçãopor centenas de jornalistas não só do Riode Janeiro mas de todo o Brasil, já que oveículo da Condessa, desde a reformapromovida na segunda metade dos anos1950 sob a liderança de Odylo Costa,filho, Jânio de Freitas, Reynaldo Jardime Amílcar de Castro, era o paradigmanacional de jornal diário, admirado e

imitado em todo o País, o colapso do JBlevou à depressão e mesmo

às lágrimas numerosocontingente de jornalis-tas, em atividade ou não,que passaram dias glorio-sos das suas carreiras naRedação da Avenida RioBranco e, mais recente-mente, da Avenida Brasil.

A ABI anteviu esse desfe-cho, como deixou claro no

principal título da primeira página desua edição de julho: O JB no clímax daagonia, na qual se chamava para matéri-as das páginas internas. A reportagemera encimada por um título questiona-dor ainda que cauteloso: O JB sai dasbancas. Ou de cena?

3.3. Em edições sucessivas, o Jornal daABI apresentava depoimentos acerca datragédia do jornal prestados por destaca-dos jornalistas que nele trabalharam,como Sérgio Fleury, que apontou o mo-mento em que o JB começou a definhar.“O colapso do JB começou quando o jor-nal malufou”, disse ele. Outro destaca-do integrante de antigas equipes do jor-nal, o fotógrafo Rogério Reis, que che-fiou o Departamento de Fotografia noauge do JB no campo da imagem, narrouseus últimos tempos na empresa e nojornal: “Saí antes que o cheiro do cadá-ver ficasse insuportável”.

3.4. Foi esse dramático acidente davida do jornalismo no País que levou aDiretora de Jornalismo da ABI, Professo-ra Sylvia Moretzsohn, a conceber e or-ganizar o mais importante evento daCasa no campo profissional nesse ano de2010: o Seminário O JB Que Nós TantoAmávamos, em 20 e 21 de outubro, quan-do ainda não tinham secado as lágrimasdos admiradores do jornal, o qual reuniudiferentes gerações de profissionais quetrabalharam no JB, a começar pelo maisantigo desses sobreviventes, Wilson Fi-gueiredo, que trabalhou no jornal desdeos primórdios da reforma de Odylo. Estafoi devassada e relatada em pormenores,com exibição de imagens de diferentesprimeiras páginas e páginas internas doJB, pelo Professor Ildo Nascimento, daUniversidade Federal Fluminense, cujoalunado compareceu em massa às ses-

sões do Seminário: a cada dia eram maisde 200 os estudantes presentes.

3.4.1. Além de Figueiredo e Ildo Nas-cimento, participaram das exposições edebates José Silveira; Ana Arruda Calla-do; João Batista de Abreu; Alberto Dines,este via online, pois adoeceu e não pôdeviajar de São Paulo, onde mora, para oRio; Sandra Chaves; Alfredo Herkenho-ff; Agnaldo Ramos; Flávio Pontes; Ro-mildo Guerrante e Evandro Teixeira, ogrande fotógrafo, que tinha 50 anos deJB. Também via online participaram osjornalistas Carlos Eduardo Lins e Silva,da Folha de S. Paulo, e Rosental CalmonAlves. atualmente professor na Univer-sidade do Texas;

4. UMA DOAÇÃOPRECIOSA À BIBLIOTECA

4.1. No período relatado, a BibliotecaBastos Tigre atendeu a um total de 1.195leitores, sendo 885 do sexo masculino e310 do sexo feminino. Por problemas deordem técnica, não houve consultas pore-mail. Houve, porém, o atendimento de84 consultas por telefone. O interessedos usuários concentrou-se em periódi-cos, a principal especialização da Bibli-oteca, que reúne em seu acervo livros,folhetos, monografias, teses e periódicosconcentrados nas áreas de comunicação,imprensa, jornalismo, rádio, cinema, te-levisão, relações públicas, publicidade epropaganda. Daí a preferência dos con-sulentes, que se debruçaram sobre jor-nais (460 dos usuários) e revistas (375).

4.2. A equipe da Biblioteca, constitu-ída pela Bibliotecária Chefe Vilma Oli-veira, pelas auxiliares de biblioteca Ali-ce Diniz Barbosa e Ivaldeci de Souza epelo servente Annagê Frazão Filho, pros-seguiu o trabalho de recuperação perma-nente do acervo. A encadernação regu-lar de livros e periódicos alcançou 153 li-vros e 140 conjuntos de periódicos, per-fazendo o total de 293 volumes. Os pe-riódicos encadernados foram Auxiliar;O Bembém; Brasileiros; O Cruzeiro; Di-gesto Econômico; Eu Sei Tudo; Época; Fatos& Fotos; Fhox; Ficção; O Globo: Digital;O Globo: Revista; Galileu; IstoÉ Dinhei-ro; Imprensa; JB; Jornal Primeiro; Man-

apoio da Petrobras; a campanha nacionale internacional de apoio à candidaturado teatrólogo, poeta, escritor e ex-Sena-dor Abdias do Nascimento ao PrêmioNobel da Paz de 2010; o lançamento denova edição completa, fac-similada, dosnúmeros publicados pelo Ex-, jornal deresistência editado em São Paulo durantea ditadura por combativo grupo de jor-nalistas, evento que trouxe à Casa jorna-listas que participaram dessa grande aven-tura jornalística em diferentes momen-tos; Mylton Severiano da Silva, o Myl-tainho, Fernando Morais e Dácio Nitri-ni, além de Ivo Herzog, Diretor do Ins-tituto Vladimir Herzog, seu pai.

2.8. Na medida em que teve ou pôdelevantar informações a respeito, o Jornalda ABI não deixou de prestar homena-gens, relembrando sua contribuição àimprensa ou à comunicação em geral –caso do multifacético Armando Noguei-ra –, aos companheiros que se foramnum ano que nos impôs perdas doloro-sas: Adriano Barbosa; Amaury Fonsecade Almeida, que foi Editor do Jornal daABI; Antônio Castigliola; Antônio Do-mingues Calvo; Aristélio Andrade; As-cendino Leite; Glauco, o cartunista as-sassinado com o filho; Hermano Alves;Luiz Lombardi, o Lombardi de SílvioSantos; Márcio Alexandre de Souza;Mário de Moraes; Murilo Antunes Al-ves; Paulo Caringi; Pedro França Pinto;Ubiratan Solino.

2.8.1. Embora festejado especialmen-te pela sua extraordinária produção lite-rária, o escritor português José Sarama-go foi celebrado após sua morte em duasedições do Jornal da ABI, uma das quaiscomo matéria principal da primeira pá-gina. Não foi para menos: antes de al-cançar renome literário, Saramago foijornalista de banca na imprensa diária;um jornalista brigão, combativo.

2.9. A mesma linha editorial do Jornalda ABI foi observada pelo ABI Online, queproduziu no exercício social um total de935 textos, entre reportagens, entrevistase noticiário, que totalizaram 676 maté-rias, notícias curtas e objetivas, os Desta-ques, que chegaram a 259 no período.

2.9.1.Constituída pelos repórteres eeditores José Reinaldo Belisário Marquese Claudia Souza e pelo estudante de Co-

DÁCIO

MALTA

A Geral do Jornal do Brasil em pleno fechamento.

46 Jornal da ABI 365 Abril de 2011

RELATÓRIO DA DIRETORIA

chete; Noite Ilustrada; Planeta; ProblemasBrasileiros; Revista ABA; Revista de Cul-tura Vozes; Revista de Domingo; SP Cul-tura; Status: Contos Eróticos: EspecialLiteratura; Super Calandrino; Veja; VejaRio; Veja Especial Brasília 50 anos; Veja:O Melhor do Brasil; Veja: Mulher Espe-cial; Voto: Política e Negócios.

4.3. Entre os periódicos encadernadosencontram-se edições extremamentevaliosas, como várias de O Cruzeiro dosanos 1925, 1927, 1932, 1933, 1947, 1961,1973 e 1974; de Eu Sei Tudo, importan-te publicação da primeira metade doséculo XIX, dos anos 1931, 1932, 1933,1934, 1940, 1942 e 1943; de Manchete,1955, 1958 e 1973; de Noite Ilustrada,1933 e 1934.

4.4. Atenção es-pecial foi dada pelaBiblioteca a umaimportante doaçãofeita pelo jornalistaBarcímio Amaral: acoleção praticamen-te completa do peri-ódico Pasquim 21,criado no começode 2002 pelo jorna-lista, cartunista eescritor Ziraldo Al-ves Pinto, com ofim de reviver a tra-jetória de outra pu-

blicação de que ele participou, o Pasquimdos anos 1960-1980. À coleção doada porBarcímio falta apenas a edição de núme-ro 104, que a ABI espera conseguir dealgum doador ou no comércio de publi-cações antigas. Essa foi uma das váriasdoações feitas à Biblioteca da ABI porBarcímio, que em anos anteriores a con-templou com outros periódicos destaca-dos. Anote-se a respeito de Pasquim 21que Ziraldo conseguiu editar 119 núme-ros da publicação, mas teve de interrom-pê-la em agosto de 2004.

4.5. Contou a Biblioteca com a cola-boração e a generosidade de inúmeros só-cios e amigos da ABI, entre os quais sedestacou a viúva do nosso saudoso asso-ciado Antônio Roberto Salgado da Cu-nha, Sandra Cunha, que cedeu à Casacerca de 3 mil volumes da biblioteca queele deixou. Antônio Roberto, conhecidocomo Cunhão no meio profissional, co-meçou como repórter da Sucursal Riodo Jornal da Tarde e trabalhou em dife-rentes veículos. Afastou-se da imprensadiária para assumir, a convite, o cargo deAssessor de Comunicação Social do Go-vernador Marcelo Alencar.

4.6. Além de Sandra Cunha, foramgrandes colaboradores da Biblioteca Bas-tos Tigre a editora Maquinária, que con-tinuou também neste exercício social adoar à ABI seus lançamentos de livrossobre futebol; os associados AdalbertoDiniz e Ronaldo de Souza Reis; o carica-turista Cássio Loredano. A Maquináriadoou sete obras; Adalberto, oito; Ronal-do, 42; Loredano, seis, entre as quais umálbum editado em 2010 em Lisboa porLuis Camilo Osório sob o título Loreda-

no Cássio: caricaturas. Ao todo, as doa-ções enriqueceram a Biblioteca com 953títulos, considerando-se que parte dadoação de Sandra Cunha continha du-plicatas de obras já existentes no acervoda BBT, as quais foram doadas pela ABIa outras bibliotecas.

4.7. A listagem completa das doações re-cebidas consta de anexo a este Relatório.

5. UM ESPAÇO ABERTOÀ PLURALIDADE

5.1. Como na tradição da Casa, os es-paços da ABI mantiveram-se abertos noexercício social à diversidade e plurali-dade das manifestações da sociedadecivil no Rio de Janeiro, seja através delocação de seus auditórios, sem discri-minação de qualquer natureza, sejaatravés do patrocínio de diferentes ini-ciativas, especialmente as de caráter cul-tural. A estas somaram-se as organiza-das pela Casa, entre as quais inúmerascom forte significação afetiva, como aencenação do musical A Revolta daChibata – João Cândido do Brasil peloGrupo Teatro União e Olho Vivo, queveio de São Paulo para uma apresenta-ção especial no Auditório Oscar Guana-barino no dia 20 de novembro.

5.1.1. O espetáculo revestiu-se deinestimável valor: pela homenagem emsi ao marinheiro que liderou a luta pelaabolição dos castigos físicos na Marinhade Guerra no princípio do século passa-do (1910); pela vinculação da ABI comJoão Cândido, que foi retirado da pe-numbra do esquecimento por eminen-te sócio da Casa, o jornalista e escritorEdmar Morel, autor de sua celebrada bi-ografia; pela presença no quadro de fun-cionários da ABI de seu filho Adalbertodo Nascimento Cândido, o mais antigoservidor da Casa; pela qualidade da peçaconcebida e dirigida pelo teatrólogoCezar Vieita, que produziu com mestriaum trabalho em que se mesclam comharmonia declamação de textos, músi-ca e gestual.

5.2. Além de sediar eventos de caráterpolítico-partidário num ano marcadopelas eleições gerais, em que candidatosde diferentes partidos expuseram suasanálises e propostas aos seus correligio-

5.2.4. a apresentação de números mu-sicais e a montagem, no saguão do Au-ditório, de uma exposição da Academiade Tango do Brasil, instituição culturalsem finalidades lucrativas empenhadaem divulgar a música e a dança do ritmonacional argentino.

5.3. Um dos espaços nobres do EdifícioHerbert Moses, o Salão de Estar do 11ºandar, o festejado Onze onde o MaestroVila-Lobos, nosso sócio por mais de 40anos, desafiava e derrotava praticantes dochamado bilhar-francês, foi cenário delançamento de obras de jornalistas e pes-quisadores, como o livro Cuba, Apesar doBloqueio, de Mário Augusto Jakobskind,Conselheiro da Casa. (Ver a respeito o

capítulo Salão do Onze,Leitura e Lazer.) No Audi-tório Oscar Guanabarinofoi lançado o livro A Im-prensa Nacionalista noBrasil – O Periódico OSemanário, de autoriado Professor LeonardoBrito.

5.4. Foi no AuditórioOscar Guanabarino quese deu um dos mais co-moventes momentosda ABI neste exercíciosocial: a inauguração,em 5 de julho, do Me-morial Mário Alves,

instalado no saguão do Auditório emhomenagem a esse jornalista e militan-te político, assassinado no Doi-Codi doI Exército do Rio de Janeiro e cujo cor-po jamais foi encontrado. Presididopelo então Ministro Paulo Vanucchi,Chefe da Secretaria de Direitos Huma-nos da Presidência da República, o atocontou com a emocionada participaçãoda filha de Mário Alves e da juíza que,sem temor à ditadura militar, declaroua responsabilidade da União na mortedele, em processo ajuizado pela viúvaDilma Vieira. Estavam presentes deze-nas de vítimas da ditadura.

5.5. A utilização desses espaços, emmais de 130 eventos de variada origem,foi relatada com pormenores pelo fun-cionário Neílson Lopes Paes, que coor-dena o uso dos auditórios da Casa eopera os equipamentos de som, estesem rodízio com o funcionário Robsonde Almeida Ramos:

nários e aos cidadãos co-muns, como fizeramFernando Leite Siqueira(PDT), Marcelo Freixo(Psol), Fernando Peregri-no (PR) e Marcelo Sere-no (PT), o AuditórioOscar Guanabarino abri-gou eventos como:

5.2.1. a homenagemao cantor Carlos Galhar-do por motivo de seuaniversário, organizadapor Norma Hauer, suabiógrafa;

5.2.2. a exibição do filme O Ferroviá-rio, do diretor italiano Pietro Germi, cominauguração, por proposta do associadoDejean Magno Pellegrin, da fotografiada platéia presente à sua projeção naABI numa das primeiras sessões da nas-cente Cinemateca do Museu de ArteModerna do Rio de Janeiro, em 1958;

5.2.3. as sessões, às quintas-feiras, docineclube da Casa da América Latina, queexibiu obras marcantes da cinematogra-fia mundial, como Que Viva México, deSerguei Eisenstein;

AOG - Auditório Oscar Guanabarino; SBS - SalaBelisário de Souza; SHB - Sala Heitor Beltrão

20102010201020102010

Março 5 6 1 12Abril 3 10 1 14Maio 7 8 1 16Junho 7 6 1 14Julho 9 7 2 18Agosto 6 7 1 14Setembro 6 3 - 9Outubro 6 5 2 13Novembro 6 6 1 1Dezembro 3 6 1 11

20112011201120112011

Janeiro 2 - 1 3Fevereiro 3 4 - 7TOTAIS 63 68 12 132

MÊS AOG SBS SHB TOTAL

O Grupo Teatro União e Olho Vivo, de São Paulo, encenou o musical A Revolta da Chibata –João Cândido do Brasil numa apresentação especial no Auditório Oscar Guanabarino.

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ÃO

47Jornal da ABI 365 Abril de 2011

to de obrigações fiscais e trabalhistas e deencargos sociais, no que concerne a pra-zos e valores. Os salários foram reajus-tados em maio de 2010 com o percentu-al de 5,5%, conforme o acordo coletivofirmado com o Sindicato dos Emprega-dos em Atividades Culturais-Senalba.Salvo por algum imprevisto que afete aprogramação, os salários dos funcioná-rios são depositados no último dia útil domês em curso.

7.2. Conta atualmente a ABI com 46funcionários e um estagiário de Jorna-lismo. No exercício relatado houve duascontratações, uma logo seguida de res-cisão, a pedido, e três rescisões de contra-tos de trabalho. Por merecimento ou poralteração de função, seis funcionáriostiveram reajuste de salário. Há três fun-cionários licenciados pelo InstitutoNacional do Seguro Social-INSS, umcom retorno próximo e outro sem pre-visão de retorno. Um funcionário en-contra-se afastado por motivo de doen-ça, sem sacrifício da remuneração, por jáser aposentado e não mais contar com acobertura do INSS.

7.3. Na administração de pessoal atu-am, em cooperação, a Encarregada deRH, Silvana Dias Velloso, e Simone Ro-meu Pinto da Silva, Encarregada da Te-souraria, responsáveis pelas informa-ções desses dois setores alinhadas nes-te Relatório. Com ambas colaboram asfuncionárias Marina Novaes e RenataNatal de Oliveira.

8. NO SALÃO DO ONZE,LEITURA E LAZER

8.1. O Salão Gastão Pereira da Silva,mais conhecido como Salão do 11º andarda ABI, continua abrindo às 10 horas efechando às 19 horas e desde o início desetembro é comandado pelo funcionárioArlindo Medeiros de Souza, que substituio funcionário Marcelo Farias Cardoso deMoura, que voltou para a Secretaria.

8.1.1. Os trabalhos de recuperação doSalão terminaram e quando necessárioé realizada a manutenção. Em meados de2010, uma bela mesa e oito cadeiras fo-ram recuperadas sendo usadas folhas desucupira em seu acabamento e já estápronta para uso na Sala das Reuniões porDiretores, Conselheiros e sócios da Casa.A barbearia funciona diariamente aten-dendo os sócios da Casa e pessoas de foraatravés de marcação de horário.

8.2. No dia 31 de maio de 2010, os jor-nalistas Alexandre Mesquita e JeffersonAlmeida lançaram no Salão do 11º andar,o livro Um Expresso da Vitória, que nar-ra a trajetória do Clube de Regatas Vas-co da Gama, entre as décadas de 1940 e1950, período em que o time alcançougrandes vitórias importantes, como oCampeonato Sul-Americano de fute-bol, em 1948, no Chile.

8.2.1. A noite de autógrafos reuniudezenas de pessoas no Salão Gastão Pe-reira da Silva, entre elas Ivan Soter, au-

6. UMA GESTÃOFINANCEIRA PRUDENTE

6.1. A gestão financeira da ABI no exer-cício social em relato foi marcada pelaprudência, o que assegurou estabilidadeà Casa nesse importante setor. Isto se deue se mantém através de controles rígidosdas despesas mensais permanentes e daredução de gastos, o que assegurou que operíodo mais pesado de encargos e desem-bolsos, entre a segunda quinzena de no-vembro e o fim de dezembro, quando seacumulam as obrigações de três folhas depagamento de salários, fosse atravessadosem sobressaltos, ainda que com preocu-pações. Não se registrou neste exercícioa necessidade de contratação de emprés-timo bancário para pagamento do 13ºsalário, como sucedera em anos prece-dentes, e se manteve o costume, institu-ído pela gestão da Chapa Prudente deMorais, neto, de fornecer uma cesta deNatal aos funcionários.

6.2. Tivemos, ao contrário, uma reali-zação alvissareira, com a liquidação em 19de janeiro passado da última prestaçãomensal, no montante de R$ 15.828,41,com o resgate do empréstimo de R$150.000,00 que a Casa teve de contratarno final do exercício de 2009 para paga-mento do 13º salário e de outros encargose obrigações. Em dezembro de 2010, to-das as contas bancárias da Casa apresen-tavam-se com saldo credor, sem a utiliza-ção dos limites.

6.2.1. É certo que no campo financei-ro fantasmas do passado continuam a as-sombrar a gestão da ABI, que se vê comoalvo de erros cometidos por gestões ante-riores a 2004, quando a Chapa Prudenteassumiu a administração da ABI. Foi esteo caso, agora em fevereiro de 2011, dobloqueio inesperado das contas da ABI noBanco do Brasil, no Banco Itaú e no Ban-co Real pelos advogados de um ex-conta-dor da Casa, Senhor Luiz Antônio Santosde Freitas, para execução de uma decisãoproferida num processo trabalhista peloTribunal Regional do Trabalho. Às véspe-ras do pagamento da folha de salários dosfuncionários, a ABI viu-se privada de nadamenos de R$ 90.000,00 em valor bruto,levantados pelos patronos do SenhorFreitas com autorização judicial. Paraagravar o choque causado pelo inopina-do bloqueio, o cartório judicial errou noscálculos e subtraiu na verdade mais de R$103.000,00, o que obrigou a Casa a reque-rer a devolução daquilo que fora cobradoindevideamente.

6.2.2. Esse hábito de bloqueio de con-tas parece uma maldição a perseguir aABI, pois não foi este o primeiro episódioem que a Casa viu valores de suas contassubitamente apropriados por terceiros.Em janeiro de 2010 as contas da ABI noBanco do Brasil e no antigo Unibancosofreram um seqüestro no valor de R$37.984,57 motivado por uma ação civilmovida pela empresa Motta Lima Produ-ções e Comunicações, que utilizava de-pendências da Casa praticamente a leitede pato, teve bens afetados por uma chu-va mais forte e acionou a ABI para obter

ressarcimento de prejuízo que alegou tersofrido. O titular da empresa, AndréAbreu da Motta Lima, é sócio da Casa –aliás inadimplente há alguns anos.

6.3. O grande percalço vivido atual-mente pela ABI no campo financeiro écausado por um dos seus locatários, oCurso Fraga, que ocupa um pavimentoe parte de outro no Edifício Herbert Mo-ses com um curso destinado à prepara-ção de candidatos ao concurso do examede Ordem da Ordem dos Advogados doBrasil-RJ. Seu titular, José Carlos Fraga,não paga aluguéis e encargos desde abrilde 2010, privando a Casa de um montan-te que agora em fevereiro alcançava ovalor de R$ 154.050,05, sem os juros de-vidos, que são diários. É ele também o res-ponsável pelo aluguel da parte ocupadapor seu curso em outro pavimento e alu-gada em nome de sua ex-mulher, Mary-se Horta. Também neste caso há inadim-plência e um débito acumulado de R$85.662,09, afora os juros. Em ambos oscasos a ABI ajuizou ações de despejo, parase livrar do mau pagador e dar outradestinação às áreas locadas.

6.3.1. Outra dificuldade dessa nature-za com que se defronta a ABI é geradapelo atraso no pagamento de aluguel eencargos por outro locatário, a ClínicaRadiológica Ruy Rodrigues, que se en-contra inadimplente desde janeiro pas-sado. Neste caso o montante a haver é deR$ 11.469,67, sem os juros.

6.4. Um oneroso passivo deixado poradministrações anteriores é o relativo àapropriação indébita de valores do Im-posto de Renda descontados de funcio-nários da ABI e não recolhidos aos cofrespúblicos. O montante primitivo dessedébito era de R$ 143.757,2l e em marçodeste ano se situava em R$ 482.473,62,em decorrência de acréscimos morató-rios – juros, multa, honorários — lança-dos pela Procuradoria-Geral da FazendaNacional. A ABI esteve impossibilitada deliquidar o débito original, por seu vulto,mas agora pôde pleitear o parcelamento dadívida, com redução desses encargos extor-sivos, com fundamento na Lei nº 11.941/2009. Com isto, a ABI poderá obter a Cer-tidão Negativa de Débito essencial paratransações com o Poder Público.

6.5. Por fim, cabe relatar que a ABI seencontra com o cumprimento em dia detodas as obrigações fiscais e trabalhistase observa os prazos de validade de algunsbens, como o dos extintores de incêndio,que foram recarregados dentro do prazoe terão nova recarga neste mês de abril. Oseguro do Edifício Herbert Moses foi reno-vado com a Porto Seguro Cia. de SegurosGerais, ao custo de R$ 6.629,20, com pa-gamento em quatro prestações mensaisde R$ 1.657,30, enquanto o seguro Em-presarial para os funcionários foi renova-do automaticamente com o Bradesco,que debita em conta-corrente mensal-mente o valor de R$ 439,64.

6.6. Ao expor o desempenho financei-ro da Casa, a Diretoria considera neces-sário assinalar que é imperiosa a neces-

sidade de mudanças e ajustes nessa áreade gestão, sobretudo para modernizar etornar mais eficientes os procedimentosde cobrança da contribuição dos sócios,os quais apresentam insuficiências one-rosas. Este é um dos muitos desafios a seenfrentar no exercício social 2011-2012.

6.6.1. A ABI tem desenvolvido em ca-ráter permanente um esforço de reinte-gração plena de associados que por dife-rentes motivos estiveram afastados daCasa. Mediante a concessão de anistia dedébitos acaso existentes, esses consóci-os voltaram a pagar contribuições e aacompanhar as atividades da Casa. Esseesforço prosseguirá, dado o elevado con-tingente de sócios inadimplentes. Noquadro ativo de associados, contava aABI em fevereiro passado com 809 sóciosem dia, 364 remidos, 123 isentos e umbenemérito. Ao todo, 1.297 associados.

6.6.2. Igual esforço é feito com o ob-jetivo de ampliar o quadro social, paraassegurar à ABI crescente representati-vidade. No exercício social relatado, aComissão de Sindicância da ABI, integra-da pelos associados José Pereira da Silva(Pereirinha), que a preside, Carlos DiPaola, Marcus Miranda e Maria IgnezDuque Estrada Bastos, apreciou 79 pro-postas de admissão ou transferência decategoria, sendo 41 para sócio Efetivo, 28para sócio Colaborador e dez para trans-ferência de categoria.

6.6.2.1. Relatório encaminhado à Di-retoria pelo Presidente Pereirinha dá contade que foi este o movimento de propos-tas na Comissão de Sindicância ao longodo exercício: março, dez propostas paraEfetivo, seis para Colaborador e uma paratransferência de categoria; maio, 11 paraEfetivo, dez para Colaborador e duastransferências; julho, duas para Colabo-rador; agosto, três para Efetivo e umatransferência; outubro, oito para Efeti-vo e duas transferências; novembro, trêspara Efetivo, três para Colaborador eduas transferências; em janeiro de 2011,duas para Efetivo, quatro para Colabora-dor e uma transferência; em fevereiro,quatro para Efetivo, três para Colabora-dor e uma transferência.

6.6.2.2. Da Comissão fez parte nossoassociado Toni Marins (Antônio MartinsLopes Filho), que infelizmente faleceuem 29 de setembro passado, após prestardesprendida colaboração a esse órgão daCasa: até dias antes de seu passamentoparticipou das reuniões da Comissão.

6.6.2.3. A Comissão de Sindicância,que se reúne mensalmente, conta coma colaboração da funcionária Eliana Ma-riano do Amaral, incumbida dos serviçosburocráticos e administrativos do pro-cesso de admissão de associados.

7. A ADMINISTRAÇÃODE PESSOAL EM DIA

7.1. Assim como na gestão financei-ra, também na administração de pesso-al a ABI mantém em dia o cumprimen-

48 Jornal da ABI 365 Abril de 2011

RELATÓRIO DA DIRETORIA

tor de Quando a Bola Era Redonda(2008) e da Enciclopédia da Seleção –1914-2002, considerado pela Fifa umdos mais importantes trabalhos de pes-quisa sobre o tema, e o melhor sobre aSeleção Brasileira –, e o escritor ClóvisMartins, outro grande especialista emfutebol, representante no Brasil da In-ternational Federation of Football His-tory & Statistics (IFFHS), um dos auto-res de Flamengo X Vasco – Clássico dasMultidões e Campeonato Carioca – 96Anos de História.

8.3. No dia 14 de junho de 2010 acon-teceu o lançamento do livro Lacerda naEra da Insanidade, do jornalista per-nambucano Francisco José GuimarãesPadilha, de 76 anos, que relata episódi-os sobre o período da ditadura militarantes do golpe de 1964. Entre as revela-ções, destaque para o atentado quequase explodiu um túnel ferroviário daCentral do Brasil, cujo alvo era CarlosLacerda, que, em campanha presidenci-al, estava acompanhado de uma comi-tiva de mais de 200 pessoas.

8.3.1. Além das experiências pessoaisde Padilha, Lacerda na Era da Insanida-de reúne depoimentos dos jornalistasMaurício Azêdo, Alberto Dines, CiceroSandroni, Murilo Mello Filho, MiltonCoelho da Graça, Ayrton Baffa, Ely Aze-redo, Nélson Lemos, Dílson Ribeiro eNilo Dante.

8.4. No dia 18 de dezembro de 2010,o jornalista, Conselheiro da ABI e corres-pondente do jornal uruguaio BrechaMário Augusto Jakobskind lançou a se-gunda edição do livro-reportagem Cuba,Apesar do Bloqueio.

8.4.1. Na obra, o autor descreve fatose cenas pouco divulgados sobre a reali-dade sociopolítica cubana ao longo dasduas últimas décadas. A primeira partedo livro abrange o período entre 1959 e1984. Na segunda, o autor apresenta osacontecimentos a partir de 1984 até osdias de hoje.

8.5. A Sala de Reuniões foi utiliza-da no mês de dezembro para a distri-buição dos kits da Perdigão de Natalpara sócios, funcionários e colaborado-res. Cada kit possuía 1 bonita bolsaalaranjada, 1 peru, 1 pacote de lingüi-ça e 1 queijo parmesão que ficaramacondicionados em quatro freezersalugados pela Casa.

8.6. O serviço de limpeza e manu-tenção dos móveis, mesas, poltronas,tv, mesas de sinuca e de bilhar-francês,das janelas, dos ventiladores, da varan-da, dos ralos da mesma varanda, dospisos de azulejo, mármore e da tábuacorrida, dos banheiros, da recepção eseu balcão, do salão da barbearia, da salado Conselho Fiscal, da sala de Redação,da Copa e do Refeitório é realizado di-ariamente pelos funcionários da lim-peza. A tv continua com o pacote daSky Directv com uma programaçãocom vários canais interessantes nasáreas de reportagens, filmes, música eesportes. A manutenção dos tacos con-tinua sendo feita pelo prestador deserviços. As plantas continuam sendotratadas, ajudando a decorar o Salão.Os sócios servem-se de café, jogamsinuca, bilhar-francês, dama, xadrez etêm acesso diariamente aos jornais OGlobo, O Dia, Jornal do Commercio,Monitor Mercantil e Lance!.

9. RELATÓRIOS SETORIAIS

9.1. Diretoria de Assistência SocialTitular: Ilma Martins da Silva

9.1.1. Apresentação - A Diretoria deAssistência Social apresenta o seu Rela-tório Anual das atividades entre marçode 2010 a fevereiro de 2011, de acordocom os artigos 54, 55 e 56 do Estatuto daABI. Nesse espaço de tempo, a realizaçãode maior relevância da Diretoria de As-sistência Social foi a continuidade daparceria com o Sesi/Senai e a reabertu-ra do nosso Posto de Enfermagem Dr.Paulo Roberto, no 6º andar, em benefí-cio de nossos associados, funcionáriose familiares. A ABI, desse modo, conti-nua a prestar ao quadro associativo e de-mais pessoas serviços nas áreas de saú-de, educação e outras.

9.1.1.1 A DAS prossegue na tarefade apoiar as diretrizes da Presidência.A ong Médicos Solidários, sediada naSala 603, no 6º andar, e secretariadapelo médico Henrique Peixoto, reto-mou o seu trabalho nas comunidadescarentes intermediadas pela ABI,como na Associação de MoradoresPró-Melhoramentos da Vila Parque daCidade, Gávea, onde prestou atendi-mento a 527 moradores. A atuação daong Médicos Solidários estende-se tam-bém à Creche Monsenhor Franca, si-tuada na comunidade da Ladeira Tava-res Bastos, no Catete.

9.1.1.2. A DAS está empenhada naexecução do Plano de Atividades pro-gramado para o exercício, contandocom a rede do sexto andar da sede e oapoio dos segmentos privado e público

de assistência médico-hospitalar. So-bressaíram-se, mais uma vez, nesteapoiamento, o Hospital Geral da SantaCasa da Misericórdia do Rio de Janeiro,o Instituto Nacional de Cardiologia deLaranjeiras e o Instituto Nacional doCâncer-Inca.

9.1.1.3. Foram realizados no exercício771 procedimentos gerais, incluindoexpedição de guias para consultas médi-co-odontológicas, exames de laboratóri-os e atendimentos de enfermagem nasede e em conveniados.

9.1.1.4. Além deste resultado, a DAStambém prestou atendimento aos pro-cedimentos médico-cirúrgicos e hospi-talares das redes privada e pública, querealizaram exames e diagnósticos maiselaborados.

9.1.1.5. Com base em comunicaçõesde familiares e pessoas próximas sobreocorrências de falecimentos, missas, in-ternações hospitalares de associadosdurante o exercício, registramos e afi-xamos nos quadros correspondentes ototal de 22 comunicados.

9.1.1.6. Inúmeras ações foram desen-volvidas em suporte às outras Diretori-as e à Administração Central no aten-dimento a associados, familiares, can-didatos a filiação, estudantes de Comu-nicação Social (em razão da criação dolink Associe-se no ABI Online), profis-sionais e empreendedores do setor embusca de informações sobre legislaçãode imprensa, mecanismos e meios deobtenção do registro profissional e or-ganização/legalização de empresas.

9.1.2. Assistência médico-odontoló-gica - No período março/2010 e feve-reiro/2011 as atividades de assistênciamédico-odontológica da DAS foramdistribuídas em três frentes de atuação,através da expedição de 603 guias paraatendimentos pelos profissionais dosexto andar e conveniados de fora dasede. A segunda frente envolveu asações de atendimento apoiado e maisos encaminhamentos para exames la-boratoriais, clínicos e Policlínica Geraldo Rio de Janeiro. Outra frente auxi-liar de assistência foi coberta pelo Postode Enfermagem Dr. Paulo Roberto, nosexto andar, que realizou 168 atendi-mentos, incluída a distribuição gratui-ta de medicamentos, mediante apre-sentação de receituário médico.

9.1.2.1. É a seguinte a relação, mês amês, das atividades de assistência médi-ca/odontológica da DAS:

6º andarPoliclínica do RJClínicas IntegradasLaboratório Sabin & GoloniRichet LaboratórioCardiocenterLaboratório BronsteinDra. Marília Gutierrez FreireLaboratório MaiolinoDra. Áurea L.C.F. Brito

MARÇO6741–2–––––

ABRIL351–21–––––

MAIO505–321––––

JUNHO48113––2–––

JULHO50–113–––––

AGOSTO525–2–––1––

SETEMBRO431–12–––––

OUTUBRO303–21––––1

NOVEMBRO2461–1–––1–

DEZEMBRO244111–––––

JANEIRO523111–––1–

FEVEREIRO461–13–2–––

Lançamentosna ABI: emjunho, FranciscoJosé GuimarãesPadilhaautografouLacerda na Erada Insanidade;em dezembrofoi a vez deMário AugustoJakobskindlançar o livro-reportagemCuba, Apesardo Bloqueio.

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49Jornal da ABI 365 Abril de 2011

9.1.5.1 Enviamos para o contador daABI as planilhas mensais geradoras dedados sobre nossa ação assistencial, quepermitem estimar valores da cessão deuso do imóvel – sexto andar – e das con-sultas médico-odontológicas gratuitas,a fim de atender aos requisitos da filan-tropia, com apuração de valores gastoscom a gratuidade nas atividades de saú-de. Este procedimento foi buscado paracompatibilizar exigências da fiscaliza-ção do INSS e do Conselho Nacional deAssistência Social (CNAS). Mantive-mos contato com o Conselho Munici-pal de Assistência Social, a fim de iniciarentendimentos para inscrição da ABInaquela entidade. O objetivo é criarcondições para, entre outras providên-cias, solicitar a volta do instituto da fi-lantropia junto ao Conselho Nacional.

9.1.5.2. Em termos de manutenção,continuamos prestando assistência mé-dico-odontológica aos associados de en-tidades co-irmãs conveniadas. São maisfreqüentes as consultas solicitadas pelosSindicatos dos Publicitários, dos Jornalis-tas Profissionais do Município do Rio deJaneiro, dos Jornalistas Liberais e da As-sociação dos Cronistas Esportivos do Es-tado do Rio de Janeiro-Acerj.

9.1.6. Apoio jurídico e informações -A Consultoria Jurídica, conveniada coma ABI, vem dando atendimento aos pe-didos de informação de associados, de-pendentes, profissionais de imprensanão associados, empreendedores e outraspessoas físicas e jurídicas da área de co-municação social interessadas na legis-lação do setor. As solicitações são feitaspessoalmente, por telefone e por e-mails.As consultas e pedidos de apoio são de

vários Estados, da capital e de Municípi-os do Estado do Rio de Janeiro.

9.1.6.1. Coube-nos, como sempre, amissão de dar suporte às necessidades daPresidência e das Diretorias, em especi-al a Econômico-Financeira e a Adminis-trativa, além do Conselho Deliberativo.Casos fora da área de comunicação soci-al, com associados ou não, foram enca-minhados aos escritórios dos advogadosconveniados.

9.1.6.2. O voluntariado do engenhei-ro Roberto A. Motta, conforme carta-pessoal em nosso poder, continua sen-do uma nova frente de apoio aos pedi-dos de informações sobre busca e loca-lização de documentação perdida pelosassociados. Além disso, ele se dispõe adar orientação e tirar dúvidas em casosrelacionados à Previdência Social, in-cluídas as questões de aposentadorias epensões do INSS.

9.1.7. Conclusões - Em razão do que re-alizamos e relatamos, concluímos que:

9.1.7.1. cumprimos, na medida do pos-sível, a execução do Plano de Atividades;

9.1.7.2.entregamos no prazo legal oPlano de Atividades previstas para 2010,cumprindo exigência do Conselho Na-cional de Assistência Social;

9.1.7.3. reiteramos que a nossa pre-sença no site está carecendo de nova edestacada configuração, a fim de ofere-cer mais facilidade e clareza para os as-sociados nas consultas de informaçõessobre o serviço médico, convênios e par-cerias;

9.1.7.4. damos prosseguimento ao le-vantamento e atualização de todo o ca-dastro dos convênios firmados com aDAS, para posterior divulgação pelonosso site e pelo Jornal da ABI;

9.1.7.5. continuamos a receber pro-postas diversas de empresas de seguro desaúde de menor porte, cujos preços sãomais compatíveis com a renda média dosassociados da ABI. Infelizmente, aindanão conseguimos compatibilizar preçoscom qualidade dos serviços.

9.2. Diretoria de Cultura e Lazer Titular: Jesus Chediak

9.2.1. Cine ABI/Casa da América Latina

9.2.1.1 O Cine ABI, em parceria coma Casa da América Latina, realizou demarço a dezembro de 2010 sessões quin-zenais sempre às 18h30min das quin-tas-feiras, na Sala Belisário de Souza,com filmes preteridos pelos distribui-dores do mercado exibidor tradicionale que, conseqüentemente, não foramvistos pelo público. Esses filmes, produ-zidos por diversos países da AméricaLatina, estão abaixo identificados portítulos e país de origem, com as respec-tivas datas de apresentação:

9.2.1.2. Que viva México (México) dia11 de março / Pão e Rosas (México) 25 demarço / Vozes Inocentes (El Salvador) 8 deabril / Vida e Dívida (Jamaica) 22 de abril/ Fábrica Brukman sob Controle Operário(Argentina) 6 de maio / Memórias doSaque (Argentina) 20 de maio / Fernan-do Lugo: de Bispo a Presidente do Paraguai(Paraguai) 03 de junho / Bolívia: A Guer-ra da Água (Bolívia) 1 de julho / Bolívia:

9.1.3. Convênios e parcerias - De acor-do com a parceria feita com a Legião daBoa Vontade-LBV encaminhamos regu-larmente associados aposentados comrenda modesta, pessoas carentes e fun-cionários da Casa, segundo nosso Esta-tuto, para recebimento de cestas-básicase atendimento odontológico pelo Cen-tro Educacional e Comunitário José dePaiva Netto, localizado na Avenida DomHélder Câmara, 3.059, Del Castilho. Oencaminhamento dos candidatos para otratamento dentário, após avaliação soci-al, é feito por meio de guias de atendimen-to expedidas pela Diretoria de AssistênciaSocial. No decorrer de 2010, através doconvênio ABI/LBV., 510 (quinhentas edez) cestas-básicas foram fornecidas ajornalistas, funcionários e outras pesso-as em estado de necessidade.

9.1.3.1. Foi renovado automatica-mente o convênio firmado pela ABI como Sesi/Senai do Rio de Janeiro, benefici-ando os associados, dependentes e fun-cionários com a prestação de numerososserviços nas áreas médico-odontológica,educacional, cultural e artística, espor-te e lazer. Durante o exercício, o Sesi/Se-nai prestou 10 atendimentos médicosaos nossos funcionários e associados. Naárea educacional, entre maio/julho, ainstituição ofereceu gratuitamente aosassociados cursos básicos de Informáti-ca, Espanhol e Inglês. Para utilizar essesserviços basta a pessoa ter o cartão dematrícula, que poderá ser obtido gratui-tamente em qualquer dos centros deatividades Sesi/Senai espalhados pelo Es-tado do Rio ou na Unidade da AvenidaCalógeras nº 15, 5º andar, no Centro. Oconvênio prevê a utilização de serviçosmédico-odontológicos, exames labora-toriais, cursos educacionais e até o uso decasas de veraneio das citadas instituiçõespor preços módicos e com desconto deaté 30%. O convênio firmado com aReitoria Universidade Santa Úrsula(USU) continua em vigor.

9.1.4. Procedimentos de enfermagem -O Posto de Enfermagem Dr. Paulo Ro-berto realizou 168 atendimentos geraisem área de sua atuação. Além da rotinade avaliação dos níveis tensionais, cura-tivos, emergências e outros procedi-mentos, como acompanhamento de pa-cientes a hospitais e pronto-socorro,houve a distribuição gratuita de medi-camentos, mediante a apresentação dereceita médica. Demos continuidade aosistema de listagem de remédios e pes-quisa de preços para baixar o custo deaquisição desses produtos.

9.1.5. Assistência social e filantropia- A DAS continua empenhada na execu-ção do Plano de Atividades na área de as-sistência social. Foram expedidas corres-pondências aos familiares e os membrosda Comissão Diretora não se descuida-ram de fazer visitas aos doentes nas re-sidências e nos locais de internações. Oapoio que a ABI recebeu temporariamen-te, através das Secretarias Estadual eMunicipal de Ação Social, do Idoso e daTerceira Idade, deixou de ser prestado poressas entidades.

Uma foto histórica: na ABI, uma das primeiras sessões da nascente Cinemateca do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, em 1958.

ACERVO

ABI

50 Jornal da ABI 365 Abril de 2011

RELATÓRIO DA DIRETORIA

NOTAS EXPLICATIVASÀS DEMONSTRAÇÕES CONTÁBEIS

EM 31 DE DEZEMBRO DE 2010 (Em Reais)

1. CONTEXTO OPERACIONAL

A ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DEIMPRENSA – ABI, sediada na RuaAraújo Porto Alegre, 71 – Castelo – Riode Janeiro – RJ, CEP: 20.030-12,legalmente constituída e registradacom situação ativa no cadastro daSecretaria da Receita Federal do Brasil,CNPJ nº 34.058.917/0001-69, é umaentidade sem fins lucrativos.Reconhecida como de utilidadepública no Governo de Wenceslau BrazP. Gomes em 14 de julho de 1917,

contábeis adotadas no Brasil e aosPrincípios de Contabilidade emanadapelo Conselho Federal deContabilidade.

3. SUMÁRIO DAS PRINCIPAISPRÁTICAS CONTÁBEIS

As principais práticas adotadas pela ABIna elaboração das demonstraçõescontábeis são as seguintes:

a) Determinação do resultado

O resultado é apurado em obediência aoregime de competência de exercícios.

b) Ativo Imobilizado

Está registrado ao custo de aquisição. Adepreciação é calculada pelo métodolinear, com base em taxasdeterminadas em função do prazo devida útil estimada dos bens.

c) Isenção dos impostos

A ABI tem isenção dos seguintesimpostos conforme legislação em vigor:• Imposto de Renda da Pessoa Jurídica– IRPJ• Contribuição Social sobre o Lucro –CSL• Contribuição da Seguridade Social –Cofins• Imposto sobre Serviço - ISS

d) Pis s/folha de Pagamento

Há incidência de 1% sobre a folha depagamento salarial, sendo que a ABIefetua o pagamento mensal dentro dovencimento.

e) Contribuições Previdenciárias –Cota patronal

Guerra do Gás (Bolívia) 15 de julho / ABatalha do Chile I: A Insurreição da Bur-guesia (Chile) 29 de julho / A Batalhado Chile II: Golpe de Estado (Chile)12de agosto / A Batalha do Chile III: OPoder Popular (Chile) 26 de agosto / An-tenco: Romper o Cerco (México) 9 de se-tembro / “Papeleras, Go Home!”: A Lutado Povo Gualeguaychú (Argentina) 23 desetembro / Viagem à Venezuela (Vene-zuela) 7 de outubro / “No Volverán”: ARevolução da Venezuela Agora (Vene-zuela) 21 de outubro / Razões para aGuerra (USA) 4 de novembro / Zei-tgeist: Addendum (América Latina) 18 denovembro / Carabina M2, Uma ArmaAmericana: O Che na Bolívia (Bolívia)2 de dezembro / Ernesto Che Guevara:Homem, companheiro, Amigo (AméricaLatina) 16 de dezembro.

9.2.2. Projetos de revitalização cultural

9.2.2.1. Estão sendo desenvolvidosdesde 2010 dois projetos que conjugamcultura e lazer, de forma interativa ecomplementar, concebidos como basepara viabilizar as atividades de revitali-zação cultural da ABI. O primeiro é aoperação da reforma do Auditório OscarGuanabarino, no 9° andar do EdifícioHerbert Moses, adequando-o a apresen-tações profissionais de cinema, teatro,música e dança. Lembramos que esse éum espaço nobre, de excelente localiza-ção e de grande tradição cultural referen-ciada em sua contribuição histórica paraa identidade artística da cidade. Na ABIfoi fundado o Conservatório Nacionalde Teatro, segundo Luiza Barreto Leitee Fernanda Montenegro; o pianista ecompositor Antônio Adolfo apresen-tou-se pela primeira vez no Oscar Gua-nabarino; ali aconteceram concertos deGuiomar Novaes, Artur Moreira Lima edo próprio maestro Heitor Vila-Lobos.Nos anos 1970-1980 o Auditório aco-lheu o Cineclube Macunaíma, conside-rado o mais importante do País. O pro-jeto de reforma do Auditório está sendodesenvolvido por José Dias, responsávelpela reforma dos mais tradicionais tea-tros brasileiros e que recentemente pro-jetou o teatro Oi Casa Grande. Os estu-dos para o projeto de acústica estarão soba competência de Fernando Pamplona.

9.2.2.2. O segundo projeto é a cons-trução e inauguração de um bar, comoespaço de lazer e cultura. A idéia do Bar-Bossa Lima é um verdadeiro achado nocenário de cultura e lazer da cidade, pararevitalizar o conhecido e respeitado en-dereço da ABI, a Casa do Jornalista. Alémde dar suporte gastronômico à progra-mação artística do auditório reformado,pode realizar atividades semanais pró-prias – com eventos artísticos e culturais– que darão ao empreendimento o statusde um bar cult e garantirá espaço na di-vulgação de boca-a-boca e na mídia emgeral. Como apoio logístico à mobiliza-ção para a frequência, sugerimos a inte-gração do BarBossa Lima com o salão dejogos já existente, separado do salão desinuca por um biombo, transformandoo 11º andar em área de lazer cultural e noponto de encontro dos associados e visi-

tantes, principalmente dos jovens estu-dantes de Jornalismo e os coleguinhasde Redação.

9.2.3. Publicação de livro sobre cinema

9.2.3.1. Estão em curso desde 2010 osprocedimentos para viabilizar a publica-ção de um livro englobando os depoi-mentos colhidos no projeto ABI pensa ocinema, com a proposta de apresentar umpanorama do cinema brasileiro contem-porâneo refletido na visão de alguns deseus mais expressivos diretores, incluindoentre eles o produtor Luiz Carlos Barreto.

9.2.3.2. Os depoimentos que consta-rão do livro são de Ana Maria Magalhães,Cacá Diegues, Luiz Carlos Barreto, Nél-son Pereira dos Santos, Neville de Almei-da, Paulo César Sarraceni, Rosane Svart-man, Sílvio Tendler e Zelito Viana.

9.2.4. Publicação de livro sobre humor

9.2.4.1. Da mesma forma, em 2010,começamos a desenvolver as atividadesnecessárias à publicação, em livro, dosdepoimentos de alguns dos principaiscartunistas brasileiros, colhidos em

2010

208.532,011.475.289,961.085.055,15

78.580,502.847.457,62

(2.720.897,25)(1.236.048,74)(986.662,22)(250.735,11)(75.960,14)(9.496,44)

0,000,00

(169.903,95)7.909,35

126.560,37250.735,11148.860,00

(148.860,00)377.295,48

EM R$

DEMONSTRAÇÃO DE RESULTADO SIMPLIFICADOASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE IMPRENSA - ABI

EM 31 DE DEZEMBRO DE 2010 E 2009

ITENS

RECEITA ASSOCIATIVARECEITA PATRIMONIALRECEITA DE PUBLICIDADERECEITA DE PATROCÍNIORECEITA BRUTA - ATIVIDADE PRINCIPALDESPESAS OPERACIONAISGERAISPESSOALINSSFGTSPIS SOBRE FOLHA DE PAGAMENTOATIVIDADE SAÚDEATIVIDADE CULTURADESPESAS FINANCEIRASRECEITAS FINANCEIRASSUPERÁVIT / DÉFICIT OPERACIONALBENEFÍCIOS OBTIDOS RENÚNCIA FISCALOTENÇÃO SERVIÇOS - GRATUIDADE ATV. SAÚDEBENEFÍCIOS CONCEDIDOS - GRATUIDADE ATV. SAÚDESUPERÁVIT / DÉFICIT DO EXERCÍCIO

2009

164.116,611.391.330,72795.440,62124.015,27

2.474.903,22(3.099.264,31)(1.383.601,17)(1.216.087,44)(288.755,52)(103.795,72)(10.356,49)

0,00(500,00)

(101.924,96)5.756,99

(624.361,09)288.755,52214.360,00

(214.360,00)(335.605,57)

2008 e 2009, pelo pro-jeto ABI pensa o humor.São eles Adail, Allan Si-eber, Amorim, Aroeira,Chico Caruso, Goot,Guidacci, Ique, Lan,Nani e Ziraldo.

9.2.5. O Acordo Or-tográfico em discussão

9.2.5.1. Através doVice-Presidente Tarcí-sio Holanda, a ABI par-ticipou no Palácio Ita-maraty, em março, daConferência Internacional sobre o Fu-turo da Língua Portuguesa no SistemaMundial. Como convidado do Itamara-ty, Tarcísio fez uma conferência sobre otema Difusão Pública da Língua Portu-guesa, na qual expôs uma série de idéi-as acerca da divulgação do idioma portu-guês no Brasil e no exterior, sobretudoatravés dos meios de comunicação.

9.2.5.2. A reunião dos países lusófo-nos se situou no marco das iniciativasadotadas pelo Itamaraty para consolidara aplicação do Acordo Ortográfico dos

Países de Língua Portu-guesa, o qual tem sidoobjeto de restrições daABI. Além de se ter ne-gado a cumprir o Acor-do em sua correspon-dência e nas publica-ções da Casa, como fazconstar no expedientede todas as edi-ções deseu jornal, a ABI temaberto espaço para dis-cussão das modifica-ções introduzidas naortografia por esse tra-tado, que não está sen-

do aplicado em Portugal. Dentre os espe-cialistas que a ABI tem consultado des-taca-se o Professor Ernani Pimentel, deBrasília, que defende a revisão de nume-rosos itens da ortografia adotada noAcordo. Suas idéias têm sido divulgadasno ABI Online e no Jornal da ABI.

Rio de Janeiro, 12 de abril de 2011

Maurício AzêdoPresidente

através do Decreto nº 3297. A ABI vematuando a um século na assistênciasocial dos jornalistas e suas famílias, napromoção cultural de seus associadose na defesa dos interesses do País edo povo brasileiro promovendo,inclusive, a filantropia conforme oestabelecido em seu estatuto.

2. A APRESENTAÇÃO DASDEMONSTRAÇÕES CONTÁBEIS

As demonstrações financeiras foramelaboradas em obediência as práticas

Professor Ernani Pimentel defendemudanças no Acordo Ortográfico.

FOLH

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51Jornal da ABI 365 Abril de 2011

PAULO ROBERTO DAYUBE CRUZCONTADOR – CRC RJ 072164/O-0

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE IMPRENSA

OSCAR MAURÍCIO DE LIMA AZÊDOPRESIDENTE

11. EMPRÉSTIMO

A ABI captou recursos de curto prazono ano de 2009 junto ao Banco Itaúpara reforço do Capital de Giro, sendoo término no mês de Janeiro/2011.

12. PASSIVO NÃO CIRCULANTE –JUROS E MULTAS A PAGAR

O valor representa a multa e os juroscom o passivo do INSS, não atualizadopor estar aguardando orientaçãojurídica quanto a Ação de ExecuçãoFiscal 2006.51.01.526985-1, emcurso na 5ª Vara Federal de ExecuçãoFiscal do Rio de Janeiro conforme ditona nota explicativa 3e. A ABI esperaobter sucesso com a Ação OrdináriaTributária movida contra a União paraanular os débitos fiscais.

13. PASSIVO NÃO CIRCULANTE –CEDAE

A ABI renegociou a dívida junto àCEDAE em 80 (oitenta) parcelas deR$ 2.901,85 (dois mil, novecentos eum reais e oitenta e cinco centavos). Omontante a divída de R$ 144.649,5751UFIR, em outubro de 2005, totalizavaR$ 232.148,00 (duzentos e trinta edois mil, cento e quarenta e oito reais).A ABI está efetuando os pagamentosem dia e o término previsto no contratoé de Junho/2012.

A isenção previdenciária da cotapatronal é a permissão de nãorecolher ao Instituto Nacional deSeguro Social (INSS) contribuição de20% sobre a folha de salários daentidade sem fins lucrativos. A ABIpossuía essa isenção que foicancelada em 18/08/2003. Tramitano Congresso o Projeto de Lei nº191/2006 na Comissão de AssuntosEconômicos em Brasília que concedea isenção tributária à AcademiaBrasileira de Imprensa e cancela osdébitos fiscais dessa instituição.

f) Demas Ativos e Passivos

Os demais ativos e passivos,classificados no circulante e nãocirculante estão apresentados pelovalor de custo ou realização.

g) Apuração do Resultado

O resultado apurado foi de umsuperávit de R$ 377.295,48 (trezentose setenta e sete mil, duzentos enoventa e cinco reais e quarenta e oitocentavos). Neste exercício houve umaumento de cerca de 15% no total dareceita e uma redução de 12% nasdespesas. Houve uma melhorasignificativa no ano de 2010 naarrecadação da receita de publicidadede 36% a mais em relação ao ano de2009, reflexo do crescimentoeconômico do Brasil em 2010.

4. DISPONIBILIDADES

Representa os valores das contas Caixae Bancos as quais foram analisadas econciliadas.

5. ATIVO NÃO CIRCULANTE –CRÉDITOS A RECEBER

O valor de R$ 125.665,45 (cento evinte e cinco mil, seiscentos e sessentae cinco reais e quarenta e cincocentavos) s.m.j., resulta de váriosdireitos que continuam merecendoprovidências jurídicas para o seurecebimento.

6. ATIVO NÃO CIRCULANTE –DEPÓSITOS JUDICIAIS

A ABI tem por decisão judicial desde2006, o bloqueio de R$ 130.213,31nos Bancos:• Bradesco conta nº 1010266-9 valorR$ 34.591,45• Bradesco conta nº 1011882-4 valorR$ 57.637,29• Itaú conta nº 207525-1 valorR$ 37.143,01• Banco do Brasil valor R$ 841,56

7. IMOBILIZADO

Os valores do balanço patrimonial nãoretratam o preço real dos bensmóveis e imóveis. Quanto aos valoresdos imóveis, torna-se necessário umareavaliação por perito ou empresaespecializada para ajuste de seu valorcontábil.

8. OBRIGAÇÕES TRIBUTÁRIAS

• IRF

Os valores já lançados na dívida ativaforam objeto de notificação ecobrança através de Termo deConstatação Fiscal demonstrando umvalor de R$ 38.998,67 (principal +multa). Foi deferido o parcelamentoem 60 (sessenta) meses no exercíciode 2006 no valor de R$ 633,99(seiscentos e trinta e três reais enoventa e nove centavos). A ABIefetua dentro do vencimento odevido pagamento mensalmente.

9. CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS

a) INSS Empregador a Recolher

Os valores apurados até abril de 2004e atualizados até dezembro de 2007são de R$ 3.460.100,64 (trêsmilhões, quatrocentos e sessenta mil,cem reais e sessenta e quatrocentavos), não foram reconhecidos nopassivo em função das informaçõesconstantes da Nota 3e. Mesmo assim,o INSS está dando andamento ao

processo de cobrança com aconsequente execução do débito. OProjeto de Lei do Senado nº 194/2006 visa anular os débitos fiscais.

b) INSS Empregado e Autônomo arecolher

Os valores históricos de retenção dacontribuição social do empregado edo autônomo pela ABI e nãorecolhido ao INSS, praticada porgestões anteriores, está em processode execução. Cabe ressaltar que aadministração atual, a partir de maiode 2004 passou a adotar oprocedimento de efetuar a retençãoe o pagamento mensalmente novencimento. O valor retido atualizadoaté dezembro de 2007 totalizaR$ 375.785,61 (trezentos e setentae cinco mil, setecentos e oitenta ecinco reais e sessenta e umcentavos). A atual administraçãorequereu junto a Receita Federal oparcelamento do débito conformeLei nº 11.941/09 e pagamensalmente o valor de adesão deR$ 100,00 até a sua consolidaçãofinal em 31/03/2011.

10. FORNECEDORES

Os valores desta conta representam asobrigações de curto prazo dosfornecedores de materiais e serviços.

2010

443.881,758.374,38

435.507,37

260.378,76130.165,45130.213,31

0,00995.514,16305.042,17690.471,99

586,23586,23

1.700.360,90

EM R$

BALANÇO PATRIMONIAL SIMPLIFICADOASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE IMPRENSA - ABI

EM 31 DE DEZEMBRO DE 2010 E 2009

ATIVO

CIRCULANTE- DISPONIBILIDADES- CRÉDITOS A RECEBER

NÃO CIRCULANTEREALIZÁVEL A LONGO PRAZO- CRÉDITOS A RECEBER- DEPÓSITOS JUDICIAIS• INVESTIMENTOS• IMOBILIZADO- BENS MÓVEIS- BENS IMÓVEIS• INTANGÍVEL- MARCAS, DIREITOS E PATENTESTOTAL

2009

469.684,6024.369,36445.315,24

222.394,19130.165,4592.228,74

0,001.017.055,69334.049,36683.006,33

586,23586,23

1.709.720,71

C O N S O L I D A D O

NOTA EXPLICATIVA 2010

315.480,719.398,04

132.330,304.027,62

23.991,9123.613,31122.119,53

184.912,77160.056,4124.856,36

1.199.967,42301.357,78513.791,88384.817,76

1.700.360,90

PASSIVO

CIRCULANTE- OBRIGAÇÕES TRIBUTÁRIAS- CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS- FORNECEDORES- EMPRÉSTIMOS- OBRIGAÇÕES COM EMPREGADOS- OUTRAS OBRIGAÇÕESNÃO CIRCULANTEEXÍGIVEL A LONGO PRAZO- JUROS E MULTAS A PAGAR- CEDAEPATRIMÔNIO SOCIAL- FUNDO PATRIMONIAL- FUNDOS ESTATUTÁRIOS- SUPERÁVIT/DÉFICIT ACUMULADOS

TOTAL

2009

673.311,728.937,99

138.317,756.661,80

282.901,6343.350,87193.141,68

221.259,33160.056,4161.202,92815.149,66301.357,78513.791,88

0,00

1.709.720,71

NOTA EXPLICATIVA