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Como escrever sobre ciência, medicina e alta tecnologia para os meios de comunicação >2 Fu FORENSE UNIVERSITÁRIA

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C o m o escrever sobre ciência, medic ina e alta tecnolog ia para os meios de comunicação

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Fu FORENSE UNIVERSITÁRIA

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Estamos ingressando num período de profundas mudanças e acirrados debates em que se tem reexaminado o papel das ciências em nossa sociedade e, em particular, os aspectos sociais e econômicos da ciência, da engenharia, da própria medicina e da tecnologia. Os grandes jornais e periódicos de ampla circulação (especializados ou não) vêm reservando um espaço con-siderável às controvérsias cientificas atuais e à divulgação dos novos co-nhecimentos que se produzem num ritmo surpreendente. O jornalismo científico tem alcançado tal importân-cia na sociedade moderna que se for-mam, em um sem-número de países, inclusive no Brasil, associações de jornalistas científicos, que se empe-nham cada vez mais em defender os seus interesses e definir — conferin-do-lhe especial dignidade — o status desse tipo de profissional.

Este livro do Prof. WARREN BURKETT da Universidade do Texas (Austin) — por enquanto, o mais com-pleto sobre o assunto já publicado em língua portuguesa — comprova essa atualidade do desempenho profissio-nal de tal classe de escritores e o seu alcance social. Acima de tudo, este trabalho original propõe um desafio ao leitor: entrar no mundo do escritor de ciência, independentemente da formação técnica ou acadêmica que ele traga para esse campo.

Sabe-se que a redação científica constitui um entre muitos novos tipos de comunicação especializada que têm evoluído no século XX. Esta obra,

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Como escrever sobre ciência, medic ina e alta tecnologia para os meios de comunicação

WARREN BURKETT

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Fu FORENSE UNIVERSITÁRIA

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Fu FORENSE UNIVERSITÁRIA

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T í t u l o do original norte-americano:

News reporting

© Copyright 1986 6 / The lowa State University Press

CIP-Brasil. Catalogação-na-fonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ.

Burket t , Warren, 1929-B973j Jornal ismo c ient í f ico : como escrever sobre ciência,

medicina e alta tecnologia para os meios de comunicação / Warren Burket t ; t radução, A n t ô n i o Trânsito. — Rio de Janeiro : Forense Universitária, 1990.

Tradução de: News report ing: science, medicine and high technology.

1. Jornal ismo c ient í f ico. 1. T í t u l o . I I . T í t u l o : Como escrever sobre ciência, medicina e alta tecnologia para os meios de comunicação.

CD D - 0 7 0 . 4 4 9 5 90-0226 CD U - 0 7 0 . 4 4 3

ISBN-85-218.0044-4

Proibida a reprodução total ou parcial, bem como a reprodução de apostilas a partir deste l ivro, de qualquer fo rma ou por qualquer meio eletrônico ou mecânico, inclusive através de processos xerográficos, de fo tocópia e de gravação, sem permissão expressa do Edi tor . (Lei n9 5.988, de 14.12.73.)

Reservados os direitos de propriedade desta tradução pela E D I T O R A FORENSE U N I V E R S I T Á R I A L T D A .

Rua Visconde Silva, 32 - 22271 - Rio de Janeiro - RJ Largo de São Francisco, 20 — 01005 — São Paulo — SP

Impresso no Brasil Printed in Brazi!

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Dedicado â adorável e amorosa Gay, cujo carinho e paciência para com um marido f reqüentemente ausente tornaram este l ivro possível, e à minha famí l ia , Martha Burke t t , Karl e Re-becca Burke t t , e Patrícia e T o m Bishop e Chester V . Bishop.

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Sumário

Introdução 1

Capí tu lo 1: O que é redigir ciência? 5

Capí tu lo 2: Evolução da redação c ient í f ica 27

Capí tu lo 3: Escolhendo notícias de ciência 49

Capí tu lo 4: Como reunir notícias de ciência 71

Capí tu lo 5: Distorção e como evitá-la 95

Capí tu lo 6: Contando a sua história de ciência 117

Capí tu lo 7: A redação cient í f ica e o interesse públ ico 133

Capí tu lo 8: Notícias de ciência,, de medicina e saúde 1 55

Capí tu lo 9 : Controles sobre notícias de ciência 177

Capí tu lo 10: Temas éticos na redação c ient í f ica 199

Capí tu lo 11: Transmi t indo notícias cient í f icas 213

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INTRODUÇÃO

ESTE L I V R O D E S A F I A VOCÊ a entrar no mundo do escritor de ciência, seja qual fo r o t i po de formação que você traga para o campo. Os guias mais anti-gos se concentravam nos problemas de como traduzir termos técnicos para uma linguagem mais comum, tornando os textos mais simples. Outra fo rma de escrever sobre ciência é olhar de modo mais amplo para os aspectos sociais e econômicos da ciência, da engenharia e da tecnologia. Você, o escritor, co-nhecerá uma fascinante comunidade de homens e mulheres engajados em em-preendimentos puramente individuais, que podem ter enorme impacto sobre as outras comunidades de nossa sociedade.

Você está entrando num per íodo de mudanças e de controvérsia, no qual se reexamina, também, o papel da ciência em nossa sociedade. Muitos te-mas importantes estão sendo analisados. Os métodos tradicionais de pesquisa aberta uti l izados pelos cientistas estão sendo alterados pelas pessoas que, no governo dos E U A , são responsáveis pela emissão de cheques destinados ao de-senvolvimento da ciência. Esses cheques, entretanto, são baseados em nossos impostos e representam, em sua maior parte, capital públ ico. A opin ião dos próprios cientistas é divergente quanto a se aumentar o sigilo em to rno das pesquisas não confidenciais, cujos efeitos são duvidosos para a nossa seguran-ça nacional. Outros temas questionam se a ciência deve ou não intervir em assuntos de vida e mor te de incapacitados e idosos, e até onde essa interven-ção deveria se estender. As questões de quanto t ratamento médico você e eu podemos custear e quanto nos deveria ser dado estão em discussão. Você está entrando para o campo da redação cient f f ica numa época em que novas in-dústrias estão sendo formadas a part ir de descobertas cientí f icas básicas sobre o material genético que é comum a todas as coisas vivas. A o escolher escrever para publicações populares, e não para as técnicas, você terá um papel a de-sempenhar no engajamento de seus concidadãos num debate de grande impor-tância para uma sociedade democrática.

Este l ivro encoraja você a estender sua criatividade ao máx imo para des-cobrir formas novas, bem como tradicionais, de contar histórias que irão aju-dar seus leitores, ouvintes e espectadores a compreenderem os desenvolvi-mentos técnicos e sociais provenientes de laboratórios espalhados por nosso pafs e pelo mundo. Os próprios cientistas estão demonstrando maior interesse em alcançar essa compreensão, mais do que têm demonstrado em muitos anos. Com efei to, como você irá ver, em certo ponto os cientistas estavam evi-tando deliberadamente a comunicação com a sociedade em geral.

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Este livro não pode ensinar-lhe ciência. O que faz é apontar alguns erros comuns cometidos por aqueles que escrevem sobre ciência e as maneiras de evitá-los. Você é encorajado a desenvolver suas próprias a'reas de conhecimen-to específ ico sobre ciência, medicina e engenharia. As faculdades e universi-dades oferecem uma série de cursos e quem escreve sobre ciência lê mu i to para melhorar a própria compreensão. Não pode desempenhar a tarefa de es-crever com um passado de informações acumuladas em uma ou mais áreas da ciência. Como verá, o jornal ismo c ien t í f i co e a ciência concentram-se no que é novo e signif icat ivo. Se você for t re inado em ciência, é est imulado a procurar maneiras mais atraentes e interessantes de explicar seu assunto do que aquelas usadas na publicação c ient í f ica t íp ica . Se essa fo rma de escrever fosse uma maneira eficiente de t ransmit i r a informação técnica a milhões de não-cientis-tas, então tais publicações cient í f icas ter iam quantidades mu i to maiores de leitores do que têm agora, mesmo entre cientistas. Howard Simons, ex-editor administrat ivo do The Washington Post, agora â frente do programa Nieman Fel lowship na Harvard Universi ty, aconselha escritores de ciência a se tor-narem pr imeiro repórteres.

No mundo da redação c ient í f ica para os meios de comunicação de mas-sa, um ensaio bem escrito e impor tante , dir ig ido a uns poucos leitores selecio-nados, pode ser deixado sem publicar para dar lugar a histórias de menor im-portância que l idam com o bizarro e o pseudocient í f ico ou com temas de me-ro interesse humano. U m dos desafios é, então, comunicar de fo rma precisa e interessante, para que o verdadeiro conhecimento desperte o interesse de um públ ico maior. Ser minucioso não significa necessariamente ser maçante, em-bora muitos nas comunidades c ient í f ica 6 jornal íst ica associem essas carac-terísticas.

É impor tante , também, t ransmi t i r com justiça e f idelidade uma idéia compreensível das pessoas que são cientistas e de seus líderes. Temer ou res-peitar por medo injust i f icadamente as pessoas que fazem a ciência ou as nor-mas públicas pode di f icu l tar a adoção de respostas racionais para o conheci-mento desenvolvido pelos cientistas. À medida que uma compreensão mais completa e realística se desenvolver a part i r de seus textos a respeito das ciên-cias físicas, bem como das sociais, você estará realizando um serviço educacio-nal para seus leitores e a sociedade em geral. Está em voga d iminu i r o efeito que qualquer ind iv íduo pode ter sobre a sociedade. Ent re tanto , o escritor que respeita a verdade e o bem-estar de seu públ ico terá um impacto que vai mui-to além de palavras sobre o papel e imagens na tevê.

Algumas partes de sua viagem podem ser di f íceis e outras, r idículas. Por exemplo, os funcionários do governo dos Estados Unidos na metade da déca-da questionavam o patr io t ismo de escritores do The New York Times e The Washington Post por elaborarem textos a respeito de projetos secretos sobre satélites e armas nucleares, embora a maior parte do material publ icado já

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tivesse sido impresso em outros veículos com a bênção de funcionár ios do De-partamento de Defesa ou discut ido abertamente nos parlamentos do mundo inteiro (Fr iendly , 1985). Quase ao mesmo tempo, os funcionár ios daquele de-partamento e de outros setores do governo permi t i ram o ingresso do escritor de ciência do Times, Wi l l iam J. Broad, no supersecreto mundo das "Star Wars", numa proposta americana de defesa contra mísseis teleguiados e ogivas nucleares. Portanto, esteja preparado para encontrar irracionalidade em pes-soas que consideram a racionalidade como seu ponto mais for te . A viagem co-mo escritor de ciência não será aborrecida e, se você tiver dúvidas sobre se uns poucos cientistas podem fazer diferença, use suas habilidades de investigação para analisar o efeito que cinco cientistas, conhecidos como o T T A P S Group, t iveram sobre o pensamento mundial com seu trabalho sobre o conceito de " inverno nuclear" (Smith, 1984).

Você encontrará um novo t ipo de redação c ient í f ica emergindo. É mais agressivo e os redatores de ciência estão dispostos a colocar os cientistas em algumas posições públicas desconfortáveis para expor as práticas cientí f icas que possam afetar a saúde e a segurança públicas. No The Wall Street Journal, o redator de ciência Jerry Bishop explorou os possíveis efeitos que um retar-damento na publicação de um impor tante estudo sobre cirurgia de câncer de mama teria sobre mulheres defrontadas com uma decisão médica imediata (Bishop, 1984).

Tenha prazer escrevendo a respeito de ciência, mas não embarque numa carreira de redator por pensar que será fáci l . Escrever é um trabalho duro e você deve gostar tanto de escrever quanto do tema. Há prazeres em escrever sobre ciência tanto para jornalistas como para aqueles que se consideram cien-tistas. Parte do apelo de escrever sobre ciência tem a ver com uma abundância de novos conhecimentos. Enquanto muitos outros assuntos começam a se re-petir depois de algum tempo, você irá se colocar diante de um f l u x o de infor-mação sempre fresca e em desenvolvimento, revelando nossa compreensão ca-da vez mais profunda sobre o mundo que nos cerca e o nosso mundo inter ior. Isso é parte da satisfação que os próprios cientistas encontram na pesquisa. Este l ivro o levará por águas rasas onde você poderá praticar enquanto desen-volve suas habilidades individuais e estilos de comunicar à comunidade mais ampla.

Mu i to provavelmente você irá encontrar alguns vilões, trapaceiros e charlatães além dos heróis, nesta viagem. Irá encontrar histórias promissoras sobre ciência e cientistas apenas para descobri-las enveredando por um beco sem saída. Como em todo empreendimento humano, a ciência nem sempre produz a história de sucesso inquestionável, uma imagem que as gerações an-teriores de redatores de ciência insti laram nas mentes dos consumidores dos meios de comunicação. Os f i lmes e os programas de televisão abalaram essa

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imagem com retratos de cientistas como pessoas perigosamente obcecadas, uma situação que perturba muitos desses profissionais. A reunião de 1985 da Amer ican Associat ion fo r the Advancement of Science dedicou um de seus programas a esse problema da " i m a g e m " . Mas a tendência geral da descoberta c ient í f ica tem sido melhorar a sociedade simplesmente porque quanto mais compreendemos a respeito de nosso mundo e de nós mesmos, melhores as es-colhas que poderemos fazer para nós mesmos e nossos f i lhos. Uma coisa é res-peitar tradições que serviram bem à humanidade; outra é permanecermos to-talmente amarrados a conhecimentos antigos e práticas superadas que podem nos levar ao desastre social. Parte da tarefa do escritor de ciência é ajudar as pessoas a selecionar esses elementos. Os cientistas podem ou não ser de ajuda concreta nessa tarefa em vir tude de sua proximidade aos temas. Os cientistas não têm, necessariamente, um ponto de vista uni f icado ao lidarem com ques-tões pol í t icas é sociais; muitas vezes f icam divididos entre si tão for temente como qualquer ou t ro grupo. Com toda a certeza, você irá conhecer indiv íduos interessantes e mesmo corajosos na comunidade c ient í f ica. Eles merecem ma-térias como pessoas que seu públ ico deveria conhecer.

Outra parte de seu desafio consiste em juntar os empreendimentos disper-sos da ciência para fo rmarem u m padrão coerente. A descoberta c ient í f ica vem â luz de modo picado e desordenado, cont rad i tó r io e mesmo com ten-dências que podem levar anos para serem extirpadas. Alguns cientistas estão pedindo aos jornalistas para julgarem e avaliarem a ciência, á medida que es-tão relutantes ou incapazes de depender apenas de seu própr io consenso. Isso lhe sugere desenvolver o seu própr io sentido de mundo e o que este promete àqueles que dependem de seus relatos. Escrever sobre ciência e medicina acar-reta responsabilidades tan to quanto prazeres.

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Capítulo 1

O que é redigir ciência?

A REDAÇÃO DE CIÊNCIA É UM ENTRE MUITOS novos t ipos de comunicação especializada que evoluem no século X X . Mais de c inco m i l pessoas, ape-nas nos Estados Un idos , consideram-se "escr i tores de c iênc ia " porque pas-sam o t e m p o t o d o o u a ma io r par te dele escrevendo sobre temas das áreas de conhec imen to a l tamente organiza-das conhecidas l ivremente c o m o ciên-cias. Isso inc lu i os campos óbvios co-bertos pelas ciências f ís icas, tais co-m o a f ís ica e a q u í m i c a , e as ciências naturais, b io logia e zoolog ia , por exemp lo , e todas as suas rami f ica-ções. Redigir ciência t a m b é m abran-ge temas c o m o a apl icação da ciência através da engenharia e tecnologia e, especialmente as ciências-arte da me-dic ina e cuidados c o m a saúde. As ciências social e de c o m p o r t a m e n t o t a m b é m são temas que c o m p e t e m ao redator c i e n t í f i c o .

Mi lhares de ou t ros redatores exa-m i n a m este mesmo corpo de conhe-c imen to sem se declararem f o r m a l -mente escritores c ien t í f i cos . No pro-cesso de escrever sobre c iência, tais redatores interagem c o m mu i tos dos quase três mi lhões de homens e mu-lheres contados pela Sc ient i f i c Man-power Commiss ion c o m o cientistas. Os redatores de ciência p o d e m ou não ser f o r m a l m e n t e t re inados em uma o u mais ciências.

C o m o redator de ciência você po-derá escrever o u d i f u n d i r , por exem-p l o , as pr imeiras matérias sobre medi -camentos novos, a descoberta de no-vas estrelas o u planetas, ou sobre a descoberta de novas fo rmas de vida nas profundezas dos oceanos — talvez mesmo em ou t ros planetas. Você po-deria ser u m dos pr imei ros escritores a b o r d o de uma nave espacial; ou po-derá estar re latando histórias envolv i -das c o m os temas do me io amb ien te ou energia d o m u n d o .

De u m a maneira geral, os escr i to-res de ciência consideram que suas carreiras são const ru ídas ao redor de expl icar ou t raduz i r c o n h e c i m e n t o c i e n t í f i c o para pessoas que p o d e m ser o u não cientistas. E m 1847, Ja-mes Prescott Joule fo i capaz de le-vantar-se d iante de uma igreja em Manchester, Inglaterra, e expor sua tese de que a energia se t rans fo rma em algo equivalente ao calor, e espe-rar que a maior ia das pessoas presen-tes a essa preleção púb l ica compreen-desse suas idéias. O p r ime i ro re lato pub l icado sobre as suas idéias e as ex-periências què apoiavam sua teor ia apareceram no jorna l semanal de Manchester. De u m Joule m o d e r n o seria esperado que anunciasse a sua descoberta n u m a reunião c o m ou t ros membros de sua especialidade c ien t í -f ica ou a publicasse antes n u m perió-

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dico c ient í f i co , e há milhares deles. Também se esperaria de Joule que explicasse sua teoria e experimentos em palavras tão técnicas que mui tos cientistas de outros campos não con-seguissem compreender seu significa-do.

Portanto, a redação c ient í f ica ten-de a ser dir igida para fora, para audi-ências além da estreita especialidade c ient í f ica onde a informação se origi-na. O escritor de ciência torna-se par-te de um sistema de educação e co-municação tão complexo como a ci-ência moderna e a sociedade mais ampla. Em seus alcances mais extre-mos, a redação c ient í f ica ajuda a transpor a brecha entre cientistas e não-cientistas. Tal é o mundo das duas culturas visto por C. P. Snow (1961) , um respeitado cientista, an-tes de se vol tar para a escrita de ro-mances e serviços governamentais. Snow temia uma situação de não-co-municação e compreensão entre pes-soas ligadas a disciplinas cient í f icas e aquelas que abandonassem a ciência e tentassem seguir apenas disciplinas humanistas. A redação c ient í f ica edu-ca, em vários níveis, adultos cuja edu-cação fo rmal termina no 2o. grau ou na faculdade. A redação c ient í f ica ajuda a educar crianças sobre o mun-do natural que as cerca além de seu ambiente imediato, além de suas salas de aula, além de sua l imitada experi-ência.

Como intermediários, os redatores de ciência devem esclarecer para si mesmos, seus editores e seu públ ico, algumas idéias e conceitos que não são tão claros mesmo para muitos ci-

entistas. Tome, como exemplo, o própr io conceito de ciência. O Dr. Dietr ich Schroeer, em. Physics and Its Fifth Dimension: Society (1972) , chama atenção para idéias paradoxais sobre o que é a ciência:

A ciência é o controle da nature-za. Embora esse conceito tenha uma tradição que remonta a mais de tre-zentos anos, a Francis Bacon e o in í -cio do que é aceito hoje como o "mé-todo c i e n t í f i c o " , o mesmo tem suas falhas. Cobre a tecnologia de produ-ção e manufatura, que mui tos que chamam a si mesmos de cientistas desdenham. Se a ciência significa controlar a natureza, não pode in-cluir a cosmologia, o estudo do uni-verso.

A ciência estuda o mundo mate-rial. Isso exclui a f ísica matemática, que é pr incipalmente teórica, intelec-tual e especulativa — tal como as con-clusões de A lber t Einstein a respeito de E = M C 2 . Pode ser vista como ex-c lu indo as ciências sociais e de com-por tamento porque estas enfocam o compor tamento social, não o mundo material. Este conceito poderia abri-gar especialidades novas tais como a biof ís ica e a biopsicología, baseado em pressuposições de que o compor-tamento é o resultado do estado f í -sico ou qu ím ico das pessoas num tempo dado.

A ciência é o conhecimento pú-blico. Embora seja um belo concei-to para o redator de ciência, essa pro-posição ocul ta vários obstáculos. A palavra " p ú b l i c o " causa o proble-ma. Inclui a ciência a pesquisa se-creta, uma prática combat ida em

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muitas universidades? A engenharia acrescenta alguma coisa ao conheci-mento c ient í f i co públ ico ou mera-mente à técnica privada? Estão os ca-dernos de anotações de Leonardo da Vinci , por exemplo, com suas im-pressionantes descobertas, fora do reino da ciência porque ele as escre-via em código de espelho e as manti-nha escondidas? Os cientistas dizem freqüentemente a redatores de ciên-cia que um trabalho não é ciência até que seja revisto por outros cientistas, profissionais igualmente capacitados, e publ icado na l i teratura c ient í f ica.

A ciência é o método experimen-tal. Com o método experimental co-mo padrão, a maior parte dos antro-pólogos, naturalistas, paleontólogos, e cientistas sociais poder iam ser ex-cluídos da ciência, uma vez que suas técnicas são pr incipalmente de obser-vação. Podem realizar experimenta-ção apenas l imitada com circunstân-cias variáveis e controladas.

Outra definição, " A ciência con-siste em deduções lógicas de muitas observações", é a que Schroeer consi-dera como a definição menos aceitá-vel. Muitas das melhores teorias da ciência fo ram baseadas em dados in-suficientes e mesmo falsos. A percep-ção inter ior e as intuições podem ser tão necessárias à ciência c o m o os fa-tos e a lógica. Raramente os relató-rios c ient í f icos publicados indicam certa desordem que acompanha a pesquisa c ient í f ica. A l i teratura cien-t í f ica tem mui tos trabalhos em que os dados não apóiam as conclusões. A maioria dos trabalhos publicados nunca tem suas hipóteses conf i rma-

das ou sequer verificadas por outros cientistas.

Sir Richie Calder, cientista e po-pular redator de ciência, chamou atenção para outras áreas da ciência onde os redatores ajudam a clarear as tr i lhas pelas quais os cientistas cami-nham. Uma dessas áreas inclui o reco-nhecimento da moda e dos cul tos na ciência. Os cientistas costumam se precipitar para áreas de pesquisa "quen tes " , especialmente quando há grandes quantias disponíveis, com a mesma rapidez com que os jovens se at i ram às últ imas modas em música e roupas. O interferon, u m elemento q u í m i c o produzido pelo organismo e que desempenha um papel no siste-ma imunológico humano, fo i uma área " q u e n t e " de pesquisas nos anos 60, esfr iou nos anos 70 e vo l tou a se aquecer na década de 1980. A visão dos vírus como causa de câncer, com ou sem est ímulo ambiental , tem sido aceita e rejeitada inúmeras vezes. A f í -sica nuclear e a f ísica de c i rcu i to inte-grado, fon te de maravilhas eletrôni-cas variando de computadores pes-soais a videogames, já t iveram suas épocas. Como fo i predi to por Calder, agora é o D N A em todas as suas ma-nifestações que está obtendo o máxi-m o de atenção em muitas áreas de pesquisa e aplicação cientí f icas (1963).

Calder também reconheceu a ne-cessidade de os redatores c ient í f icos separarem e explicarem para seus lei-tores os vários t ipos de cientistas. Os cientistas " p u r o s " ou acadêmicos buscam o conhecimento para o bem da ciência, explorando os paradoxos

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do mundo natural, clareando o des-conhecido, procurando a grande teo-ria. (O conhecimento, previne Calder, não é necessariamente sabedoria.) Cientistas " fundamenta is " , aplicados ou básicos, exploram problemas cujo estudo pode revelar informação que aumenta a compreensão do proble-ma, como no caso do mecanismo de uma doença, das propriedades de um metal ou do func ionamento de uma célula viva. Os cientistas "ap l icados" trabalham num programa específ ico, buscando respostas específicas; a sua pesquisa é com freqüência nãb-gene-ralizada, aplicável a uma única área. Tanto a pesquisa fundamental como a aplicada freqüentemente são cha-madas pesquisa "d i r i g ida" . Os " tec-nologistas", te rmo aplicado por mero cuidado à maioria dos engenheiros, t ransformam o conhecimento funda-mental em know-how de produção; obr igam os fatos c ient í f icos a traba-lhar em seu favor.

Os técnicos t ransformam um pro-du to em operações industriais. Uma das armadilhas da redação sobre ciên-cia e medicina tem sido conceder pre-matura e demasiada importância a uma descoberta c ient í f ica. Na medi-cina, produz falsas ilusões de "cu ras" antes que haja um registro sistemáti-co da remissão da doença. Histórias de "descobertas" cient í f icas muitas vezes ignoram os muitos passos entre uma e cem experiências de laborató-rio bem-sucedidas e a produção in-terminavelmente repetida de um me-dicamento ou novo aparelho. Os fei-tos conseguidos em laboratór io não podem com freqüência ser repetidos

lucrativamente na linha de produção, quase nunca com rapidez. Geralmen-te são necessários entre vinte e t r in ta anos para que uma descoberta se mo-va através dessa esteira até chegar a estar disponível para consumo.

No mundo de Calder, os cientis-tas acadêmicos-básicos são os "que to rnam possível". Os cientistas apli-cados e os tecnologistas são os "que fazem acontecer" . Os técnicos são os "que fazem func ionar " . Os cientis-tas sociais, pesquisadores de opera-ções, pesquisadores de mercado e ci-entistas comerciais são os "que fa-zem recompensar".

À medida que os escritores de ciência espalham informação fora do núcleo das disciplinas cient í f icas, a ciência perde alguma precisão e mui-t o do jargão técnico. Nos meios de comunicação de massa — jornais, rá-d io e televisão — a ciência torna-se popularizada e até mesmo "sensacio-nal izada", e por uma boa razão. Mu-lheres, homens e crianças, na maio-ria das vezes com tempo l imi tado e freqüentemente cansados, têm pouco incentivo para mergulharem na pro-sa indigesta, que pouco significado oferece às suas vidas cotidianas. Os escritores de ciência provêem o signi-f icado para seu públ ico part icular. Is-so é parte do processo de tradução, f reqüentemente om i t i do nos discur-sos formais e nos trabalhos escritos dos cientistas porque seus colegas su-postamente sabem o suficiente sobre aquele campo para agarrar o significa-do e f icariam insultados se fosse sole-t rado para eles. Portanto, o redator

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de ciência deve procurar o "signif ica-d o " para o seu público-alvo.

Às vezes a interpretação do escri-tor com respeito a esse significado pode não coincidi r com a do cientis-ta, cuja intenção era informar seus colegas. Isso leva a acusações de estar enganando o públ ico. Como grande parte do mundo do cientista é peque-na ou perigosa demais para ser senti-da diretamente, ou tão grande que seu tamanho — como no mundo dos cosmologistas — não pode ser com-preendido, quem escreve sobre ciên-cia para o públ ico em geral tenta ex-plicá-la em termos de analogia e sími-les. Estes são, por definição, menos exatos que a terminologia precisa usada pelos praticantes da ciência ou sua linguagem matemática, altamen-te hermética porém precisa. É oastan-te possível que os editores e escrito-res estejam subestimando o nível de capacidade de compreensão técnica e cientí f ica que seus ouvintes e leitores possuem em mui tos países avançados.

Os escritores de ciência, especial-mente aqueles que trabalham para os veículos de massa, tendem também a despir a ciência de muitas nuances. E ••ão exatamente essas sutilezas que deliciam os cientistas e freqüente-mente demonstram a outros cientis-las o br i lho de seu trabalho. Dessa lorma, ao escrever sobre ciência para

0 públ ico não-especializado, de uma maneira ou de outra, o escritor pode iicar vulnerável a acusações de super-

implif icação. Como será mostrado •diante, os redatores de ciência são inclinados a seguirem as idéias de 1 tuilherme de Ockham (1290-1347),

o monge franciscano excomungado e f i lósofo da ciência, que ajudou a le-var os primeiros cientistas para a tra-dição empír ica e experimental . U m de seus pr incípios, conhecido como " a Navalha de O c k h a m " , afirmava que a explicação mais simples de um fenômeno é provavelmente a explica-ção correta.

Isso não significa a defesa da sim-pli f icação irresponsável. A maioria dos escritores de ciência tentam con-f i rmar os fatos e interpretações de suas matérias com especialistas erudi-tos e de reputação. Esses cientistas incluem o pesquisador original e ou-tros cientistas que trabalham no cam-po. Entretanto, os repórteres de ciên-cia experientes sabem que os cientis-tas muitas vezes fazem avaliações po-bres das implicações e aplicações pos-síveis de suas descobertas.

Tome o laser, por exemplo. Nos anos 60, pouco depois da sua de-monstração, os redatores de ciência apressaram-se em perguntar sobre o potencial do laser para se tornar o " ra io da m o r t e " postulado pelos au-tores de f icção-cient í f ica. Quase uni-versalmente os cientistas tentaram derrubar a idéia de que o laser e seus raios concentrados de energia podia se tornar um instrumento út i l na ter-ra ou no espaço ao superar os obstá-culos de tamanho, fontes de energia e água, pó ou outra matéria em for-ma de part ículas. Entretanto, vinte e poucos anos depois, o Department o f Defense gabou-se de raios laser para combate, suficientemente poderosos para cegar soldados inimigos. A A i r Force l iberou fotografias e informa-

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ção confidencial sobre experiências usando aviões para testar potentes ar-mas a laser. E o presidente Ronald Reagan anunciou um programa de defesa nacional para desenvolver um sistema orbital de armas a laser e raios de partículas para destruir mísseis e satélites no espaço. Salvo tenha havido mudanças no programa, sem dúvida haverá protót ipos dessas ar-mas a bordo das versões tanto mil i ta-res quanto civis da cápsula espacial americana.

A cultura da ciência

Há uma outra visão quanto â reda-ção sobre ciências. O Dr. Joel Hilde-brand, que ensinava química e desen-volvia pesquisas na University of Cali-fornia-Berkeley quase até sua morte, aos 101 anos, ofereceu a seguinte ex-plicação de ciência: A ciência é o que os cientistas fazem (1957). Com to-das as suas ramificações, essa defini-ção oferece mui to ao escritor de ciên-cia. Jon D. Frankl in, redator de ciên-cia do vespertino Baltimore Sun e vencedor de dois prêmios Pulitzer, disse que ao invés de escrever sobre a esotérica da física das partículas, es-colheria escrever sobre os físicos (Le-wis, 1985).

A ciência, então, pode e deve ser compreendida como a atividade hu-mana que é. No entanto, é quase o oposto de como os cientistas geral-mente se revelam na maior parte de sua própria l iteratura. Muitos aparen-tam desejar denegrir por completo a personalidade na ciência. A o ler seus relatórios secos e desapaixonados nas publicações científ icas, você poderia

pensar que cada descoberta provém do pensamento f r io e racional, do planejamento cuidadoso e da execu-ção de experiências destinadas a do-brarem a natureza para que revele seus mistérios. Você nunca suporia, a partir da l iteratura, que a maior parte das experiências são fracassos. E tam-bém não lhe pareceria que a ciência é uma arena desordenada de tubos de ensaio quebrados, falhas de energia, ratos morrendo e competição. Uma demonstração da competit ividade existente fo i a batalha campal trava-da entre duas expedições de Ivy Lea-gue pela posse de ossos de dinossau-ro. Somente com a publicação de The Double He/ix, de James Watson (1968) é que boa parte do públ ico percebeu como os cientistas podem ser levados por uma feroz competi t i -vidade a reclamar a descoberta de al-go como a estrutura do ácido desoxi-ribonucléico — o D N A , o própr io se-gredo da vida. No entanto, no século X V I I , Newton e Leibniz disputaram em público com a mesma ferocidade o crédito de ter inventado o cálculo. A vida cient í f ica oferece poucas re-compensas para o segundo lugar, ao menos aos olhos de alguns cientistas. Pressões de competição foram usadas como desculpas por cientistas que violam o pr incíp io da pesquisa ao fal-sificarem seus resultados, ameaçando assim a integridade da ciência.

A o escrever sobre ciência, os escri-tores lidam com uma cultura humana de personalidades que muitos cientis-tas preferir iam não merecesse publici-dade. A ciência tem seus heróis ousa-dos, suas vít imas de violentação e pi-

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Ihagens pol í t icas e intelectuais, seus mourejadores e seus desprezados. Quando a Dra. Barbara McCI in tock recebeu seu Prêmio Nobel pela pes-quisa demonstrando que os genes eram móveis e transportáveis em mi-lho, havia v i r tualmente parado de pu-blicar sua pesquisa. Seus pr imeiros trabalhos haviam sido prat icamente ignorados até que a idéia de manipu-lação genética ent rou em moda na ciência. Ela fo i redescoberta. E em J. Robert Oppenheimer mui tos cientis-tas acreditam que a ciência moderna tem u m márt i r po l í t i co comparável a Gali leu. 0 f ís ico Oppenheimer le-vou a equipe do Los Alamos Natio-nal Laboratory ao desenvolvimento das primeiras bombas atômicas. Os roteiristas de cinema dramatizaram a história das ligações pol í t icas "es-querdistas" de Oppenheimer e como estas estavam relacionadas com as suas reservas em desenvolver a mais poderosa bomba de hidrogênio. Me-nos f o i escrito sobre Edward Teller, defensor da bomba de hidrogênio e um dos oponentes de Oppenheimer. E menos ainda se escreveu sobre os anos de quase-ostracismo que lhe fo-ram impostos por mui tos membros da comunidade c ient í f ica devido ao papel que desempenhou j u n t o ao go-verno dos Estados Unidos para con-ceder a Oppenheimer livre acesso a informações secretas.

Como em qualquer ou t ro empre-endimento humano, as fraquezas dos cientistas transparecem ocasional-mente: ambição, fraudes, plágio, rou-bo, ameaças, arrogância, medo e pre-conceito. Por trás dos relatórios de

pesquisas encontram-se exemplos de coragem física e moral , t rabalho sob condições impossíveis e assustadoras, e esperteza. Isso também é assunto pa-ra os escritores de ciência, um mate-rial que podem desenterrar com tra-balho e imaginação. Todas essas coi-sas, em con jun to , compõem um lado humano da ciência que os cientistas, na prática, preferem, em mui tos ca-sos, esconder, tal como faziam seus predecessores — sacerdotes e magos — que se apoiavam no mistério para dominar as mult idões que não per-tenciam ao seu grupo.

0 escritor de ciência Daniel Green-berg ident i f icou alguns dos papas e templos da ciência, seus centros de poder estabelecidos. Estes incluem os laboratórios e a escola de medicina da Harvard Universi ty, o Massachu-setts Inst i tute o f Technology, o Cali-fórn ia Inst i tute of Technology, a Stanford Univers i ty , departamentos selecionados em outras universidades e os Bell Laboratories antes da que-bra da A T & T . O establishment da ciência inclui também a National Academy o f Sciences, a Smithsonian Ins t i tu t ion e o Cosmos Club, de Vi/ashington, D. C. Entre os papas da ciência estão os t i tulares dessas insti-tuições e os de certos inst i tutos inde-. pendentes, como o Sloan-Ketter ing Câncer Center e o Carnegie Inst i tute, e os vencedores de prêmios Nobel. Dependendo da inf luência pessoal, o grupo dos "papas" da ciência pode incluir também o conselheiro de ciên-cia do presidente dos Estados Uni-dos. Os "banque i ros " da ciência, for-necendo bilhões em subsídios, in-

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cluem os National Institutes of Health, a National Science Founda-t i o n , partes do Department of Defen-se e do Department of Energy, a Na-t ional Aeronautics and Space Admi -nist rat ion, e importantes organiza-ções beneficentes, tais como a Ameri-can Câncer Society e a American Heart Association. U m punhado de companhias desfruta do status do es-tablishment porque dedicam signifi-cativas percentagens de seus orça-mentos á pesquisa fundamental em vez de destiná-las ao mero desenvol-v imento de produtos. Essas encon-tram-se pr imariamente nas indústrias qu ímica , eletrônica e aeroespacial (Greenberg, 1967).

Na cul tura da ciência e da medici-na existe competição entre os centros de poder. Por exemplo, os agraciados com os prêmios da Amer ican Câncer Society carregam quase tan to prestí-gio quanto os vencedores de prêmios Nobel . Os líderes da ACS sentem-se envergonhados se não percebem cien-tistas proeminentes antes de serem reconhecidos pela comissão do prê-mio Nobel em Copenhague. Existe a compet ição entre as universidades, hospitais e inst i tutos estabelecidos por d inheiro e pessoas, e entre estes e instituições de fora por esses mesmos recursos.

A ciência tem também suas pró-prias vozes estabelecidas, principal-mente os periódicos. Por representa-rem grandes segmentos de opinião c ient í f ica ou, ao menos, a liderança, essas publicações são fontes de mui ta informação para os escritores de ciên-cia. Science, a revista semanal da

American Association for the Advan-cement of Science, circula e influen-cia bem além dos 100.000 membros desta, que é uma das maiores organi-zações cientí f icas. Duas publicações médicas dos E.U.A. têm poderosa in-f luência c ient í f ica e po l í t ica: The New England Journal of Medicine e Journal of the American Medicai Association. Seus editores falam não apenas dos assuntos técnicos da ciên-cia como também de normas de pro-cedimentos, po l í t ica e consciência.

A ciência também tem suas "vo-zes" públicas. Em parte, esses repre-sentantes públicos da ciência são as criações dos escritores de ciência, es-pecialmente os jornalistas a serviço de veículos de penetração nacional. A Dra. RaeGoodel l , professora de co-municação c ient í f ica no M I T , identi-f i cou um grupo que ela bat izou de "os cientistas visíveis" (1977). Este grupo inclui os ganhadores do Nobel, os diretores de instituições prestigio-sas e administradores de agências go-vernamentais voltadas para a ciência e laboratórios federais. Os redatores de ciência dependem bastante desse l imi tado c í rcu lo para obterem infor-mações especializadas sobre assuntos polêmicos de alto conteúdo médico ou c ient í f ico . Isto às vezes leva a pro-blemas. Por exemplo, na discussão sobre os efeitos do uso da maconha, um estudo das matérias publicadas revelou que a maior parte da infor-mação dos jornalistas sobre a mesma vinha de fontes que não t inham expe-riência de pesquisa sobre os efeitos da droga. Os jornalistas c ient í f icos encontraram e ci taram, a seu cr i tér io,

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três dos cinco relatórios de pesquisa-dores mais f reqüentemente citados por outros cientistas envolvidos em estudos sobre a maconha. Mas a maior parte da informação impressa e d i fund ida vinha de cientistas alta-mente visados, cujas posições oficiais ou administrativas mantinham-nos afastados do contato d i reto com a pesquisa de campo (Shepherd, 1979).

A dependência de fontes de infor-mação tão distantes não é inteira-mente culpa dos jornalistas c ient í f i -cos. Os costumes tr ibais, no seio da comunidade c ient í f ica, podem fun-cionar como barreiras à comunicação de informação c ient í f ica através da popularização e dos meios de comu-nicação de massa (Dunwoody e Scot t , 1982, 52). A o entrar para o campo da redação de ciência, os redatores irão descobrir que esses costumes afe-tam o modo pelo qual l idam com as fontes de notícias cientí f icas. Os jor-nalistas tendem a lidar com os cien-tistas mais antigos, cuja reputação no seio da comunidade c ient í f ica está bem estabelecida. Eles são mais segu-ros e dispostos a falar. No caso dos pesquisadores mais novos, a cr í t ica dos colegas pode comprometer a po-sição na comunidade c ient í f ica, prin-cipalmente se estiverem em busca de avanço profissional, d i re i to â part ici-pação universitária ou reconhecimen-to de seu trabalho. Entretanto, Sha-ron D u n w o o d y e Michael Ryan (1983) estabeleceram, para um grupo de cientistas, que as questões de ética ou inveja podem ter menos relação com a concessão de entrevistas do que com o fa to de que os cientistas

mais antigos dão entrevistas melhores. A cr í t ica dos colegas, inclusive no que tange à publicação de uma pes-quisa individual numa revista de re-nome, cont inua sendo a primeira pr ior idade do cientista. Aumentar a compreensão pública da ciência lhes confere poucas recompensas mate-riais.

As restrições do empregador tam-bém podem desencorajar a comunica-ção públ ica. Os cientistas da indústria l idam com informações que dizem respeito a patentes a part i r das quais suas companhias esperam lucrar aci-ma dos concorrentes. Por esse mot i -vo, devem manter a boca bem fecha-da à respeito de seu trabalho. A pes-quisa desenvolvida em ambientes não-industriais não tem sido guarda-da tão ciosamente no passado. Isso pode estar mudando. É m u i t o cedo para dizer se os escritores de ciência irão ter dif iculdades em falar com os pesquisadores agora que a Harvard Univers i ty , por exemplo, espera ga-nhar d inheiro com a pesquisa sobre engenharia genética. Os escritores de medicina para veículos populares po-derão encarar uma nova concorrência das universidades e outras organiza-ções de pesquisa. Tan to a Harvard Medicai School como a Mayo Clinic publ icam boletins noticiosos sobre os cuidados com a saúde, dir igidos a assinantes entre o públ ico em geral. As empresas também estão aumen-tando seu uso de pesquisadores aca-dêmicos em idéias com valor comer-cial potencial ; as condições desses contratos de pesquisa podem impe-

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dir os cientistas de falarem sobre seu trabalho.

A pol í t ica pode repr imir a discus-são aberta. Alguns pesquisadores de universidades públicas relataram a D u n w o o d y e Ryan que podem relu-tar discutir detalhadamente seu tra-balho ou opiniões por temor â reação de legisladores. A origem e reprodu-ção humana são temas que provocam for te polêmica. A pesquisa na fer t i l i -zação e desenvolvimento de embriões humanos, por exemplo, fo i envolvi-da, nos anos 80, por um intenso de-bate religioso sobre quando exata-mente começa a " v i d a " e se terminar uma experiência poderia se tornar um assassinato. Os cientistas e enge-nheiros envolvidos em pesquisa mil i-tar ou espacial sigilosa podem ter ter-mos em suas subvenções e contratos especificando que a aprovação da agência f inanciadora deve ser dada antes que qualquer discussão pública sobre a pesquisa seja permit ida. Uma reunião c ient í f ica aberta assistiu ao cancelamento, após aprovação of i-cial, de mais de cem trabalhos cient í -f icos não sigilosos, devido ao aumen-to de sensibilidade em Washington quanto à divulgação de informações que possam afetar a segurança nacio-nal. Para demonstrar a posição do go-verno, agentes do FBI resolveram uma vez prender um ind iv íduo acusa-do de espionagem durante uma reu-nião c ient í f ica e não em o u t r o lugar qualquer.

U m grupo de cientistas procurado com mais freqüência pelos escritores de ciência parece menos in ib ido a res-pei to de contatos com a imprensa.

São os cientistas sociais^ Dunwoody e Ryan, num trabalho que se encon-tra em elaboração, especulam que isso resulta do fa to de serem as ciên-cias sociais um campo novo e de te-rem se desenvolvido em con jun to com os veículos de comunicação de massa. A publicidade pode ajudar esses cientistas a ganharem status e, talvez, f inanciamento.

Há um out ro grupo de pesquisa-dores que mostra uma disposição maior para popularização das ativida-des cientí f icas. São os cientistas que dependem pr incipalmente de fundos públicos para sua pesquisa. Como dis-seram a Dunwoody e Ryan, o reco-nhecimento públ ico ajuda a superar a maior parte das desvantagens da ex-posição pública. A publicidade e a aprovação pública dos cientistas aju-dam as agências que os mantêm a aparecerem bem em épocas de apro-vação de orçamento.

Os escritores de ciência aprendem os muitos lados dessa notável comu-nidade de indiv íduos altamente edu-cados e altamente treinados. As pes-soas e as instituições que a compõem são fontes e temas para matérias. O f ís ico John Z iman, em seu livro Pu-blic Knowledge, argumenta que a ciência é menos uma estrutura de co-nhecimento fo rmal e f i x o do que o é um consenso públ ico entre os cientis-tas sobre quem faz um " b o m " traba-lho ou quem não faz um trabalho confiável, que informação é aceita ou ignorada, e o que é obsoleto ou o que deve ser ressuscitado. Também é par-te do trabalho do escritor de ciência descobrir quando um dissidente ou

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inconformista merece ser ouvido e onde ir, dentro dessa comunidade cientf f ica, em busca de avaliações de pessoas e de pesquisa.

Schroeer previne os que compre-enderiam a ciência apenas como con-senso: o consenso pode atr ibuir ênfa-se demais ao fato de a ciência ser públi-ca. Isso pode lhe dar a impressão de uma organização monol í t ica de indi-víduos desinteressados e não o que Schroeer chama de "coleção de pri-mas-donas egoístas". O consenso po-de confundir ciência com religião, uma fé em dados não-verificáveis. O cientista individual pode realizar a sua própria pesquisa por razões mui-to diferentes do fato de ter que al-cançar um consenso. Conseguir posi-ções, obter uma promoção, fazer for-tuna ou outras ambições pessoais orientam os cientistas da mesma for-ma que a nós. O Dr. Hans Mark, que fo i elevado a vice-gerente da agência espacial dos EUA, disse ter deixado de ser um f ísico nuclear e se tornado um pol í t ico , um administrador. Você encontrará muitos outros administra-dores menos sinceros.

A o escrever sobre outros dos as-pectos culturais da ciência e tecnolo-gia, Robert Reinhold, do The New York Times, flagrou-se descrevendo a hora do almoço no restaurante Lion and Compass, em Sunnyvale, Califórnia. Por quê? Porque é aí que os cientistas e engenheiros da indús-tria eletrônica do "Si l icon Va l ley" vão comer e negociar milhões de dó-lares em avançada tecnologia de com-putadores. 0 proprietário do restau-rante, Nolan K. Bushnell, fo i o enge-

nheiro eletrônico que inventou os vi-deogames e vendeu sua empresa por vinte e o i to milhões de dólares. Rei-nhold escreveu: " O Lion and Com-pass é para o mundo dos computa-dores o que é o Sardi's para o distri-to teatral de Nova Y o r k " (7 de ja-neiro de 1984, 7). 0 Cosmos Club, em Washington, tem status similar para os que lidam com ciência aca-dêmica. Extrair um sentido dos lu-gares que os cientistas freqüentam quando deixam seus laboratórios po-de conferir uma nova compreensão do lado humano da ciência.

A ciência no governo

Além das histórias interessantes, muitas vezes absorventes sobre a des-coberta cientí f ica, e além das fasci-nantes, e, por vezes, estranhas perso-nalidades encontra-se outra esfera de preocupação para o redator cient í f i -c o — o f inanciamento da ciência. A ciência e sua irmã, a tecnologia, con-somem grandes quantidades de recur-sos nacionais. Nos anos 80, o orça-mento federal para pesquisa e desen-volvimento excedeu os cinqüenta bi-lhões de dólares provenientes de im-postos, a principal fonte de recursos para a ciência. Outros bilhões foram despejados na tecnologia aplicada pe-la empresa privada, geralmente em termos de novos produtos que po-dem criar problemas para a socieda-de e seus governos. As companhias obtêm isenções de impostos para despesas com pesquisa e desenvolvi-mento, o que os torna empreendi-mentos privados indiretamente finan-

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ciados pelos contr ibuintes. As solu-ções para esses problemas criados pe-la tecnologia geralmente requerem mais tecnologia para a defesa contra inimigos, para o contro le de novas doenças, para a produção de mais energia, para a criação de empregos, para o estabelecimento de colônias no espaço, para desfazer-se de resí-duos e para a realização de dezenas de outras missões que uma civiliza-ção complexa requer.

Essas funções de serviço social es-tão reunidas numa coluna de Phil l ip Bof fey do The New York Times, de-signada ciência e normas públicas. Daniel Geenberg produz um bolet im chamado Science and Government Report. Ambos relatam a interação entre decisões governamentais, mano-bras pol í t icas e efeitos públicos pro-duzidos pelos cientistas e sua tecno-logia. É um mundo de poder, dinhei-ro, inf luência e, não raro, normas das mais injustas, baixas e eleitoreiras. Para alguns repórteres de Washing-ton , a ciência é mais um interesse es-pecial, para tentar extrair d inheiro do bolso das pessoas, como ocorre com os construtores de estradas e outros, do que propr iamente um empreendi-mento sério e digno. A comunidade c ient í f ica pode se un i r , como o fez em 1983, para opor-se a membros do congresso que tentavam obter novas construções, laboratórios e outros fa-vores especiais para seus distr i tos, sem antes terem a alocação desses re-cursos públicos autorizada pelos membros de um júr i encarregado de rever a ciência j u n t o às agências go-vernamentais. Essas facilidades não

são pequenas vantagens pol í t icas. O Argonne National Laboratory , perto de Chicago, por exemplo, controla u m orçamento anual de 210 milhões de dólares, uma equipe de 4.500 pes-soas, mu i to bem remuneradas. As ba-talhas por tais facilidades valem a pe-na por causa do seu efeito sobre as economias locais. Enquanto os cien-tistas podem argumentar que estão usando de sua inf luência para assegu-rar que o dinheiro destinado à pes-quisa seja gasto nos lugares mais bem equipados e com ót imos profissionais para empregá-lo de maneira sensata, outros podem achar que esse exercí-cio de poder é meramente uma va-riação da pol í t ica eleitoreira.

Os redatores de ciência que co-brem a área de normas públicas olha-rão para um relatór io da National Academy of Sciences sobre como di-minu i r a "chuva ác ida" , buscando in-dicadores da indevida influência que exercem as companhias geradoras de energia. Os cientistas que trabalham numa indústria como funcionários ou consultores podem compor os pai-néis ou comissões que esboçam as re-comendações a serem levadas a efeito por agências reguladoras tais como a Environmental Protect ion Agency, a Consumer Product Safety Commis-sion e a Food and Drug Administ ra-t ion . Teoricamente, os cientistas co-locam de lado os preconceitos e in-clinações pessoais ao examinarem evi-dências; na prática, isto pode ser im-possível. Na pol í t ica pública o escri-to r de ciência deve lidar regularmen-te com os testemunhos conf l i tantes de cientistas, engenheiros ou outros

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especialistas igualmente quali f icados que recomendam soluções diametral-mente opostas para as questões públ i -cas. "Para todo Ph.D. existe um Ph.D. igual e o p o s t o " , diz uma piada. Isso coloca o escritor de ciência na posição de escolher, consciente ou inconscientemente, qual lado do tes-temunho ob tém maior peso numa história.

Os redatores dé ciência também li-dam com os temas mais amplos da saúde públ ica e segurança em tempos de crise ou furos noticiosos. Espere ser acusado de sensacionalismo. As matérias do redator de ciência podem lidar diretamente com a causa da cri-se, como quando o Monte St. Helen, no estado de Washington, ent rou em erupção, ou quando uma série de aci-dentes na usina nuclear de Three Mile Island fund iu a proteção do combus-t íve l , contaminando parte da usina com radiatividade e possivelmente ameaçando comunidades próximas. Esses eventos incomuns colocaram os cientistas e os redatores de ciência no meio de furos noticiosos onde sua ex-periência em comunicações públicas afetou diretamente o públ ico. Em ambos os casos, residentes próx imos acompanharam as reportagens not i-ciosas à procura das indicações que precisavam para fugir a f i m de salvar suas vidas. A o olhar para o elemento sensacionalismo, está claro que am-bos os eventos foram sensacionalis-tas por sua própr ia natureza. No caso do acidente nuclear de Three Mile Is-land, a maioria das matérias dos jor-nalistas esteve longe de ser sensacio-nalista; apesar do número de afirma-

ções alarmantes ter sido bem maior que o de informações mais t ranqüi l i -zadoras, todas t iveram como fon te os próprios funcionários da Nuclear Re-gulatory Comission. (Stephens e Edi-son, 1982).

Os redatores de ciência enfrenta-ram crí t icas às suas matérias quando vestígios de um poderoso pesticida, o ethylene dibromide (EDB) , usado pa-ra fumigar c í t r icos e grãos, apareceu por t odo o país em caixas de produ-tos de padaria. Como o EDB era sus-peito de ser u m carcinógeno mu i to for te , sua distr ibuição impercept ível através dos sistemas de alimentação resultou em matérias que alarmaram leitores e espectadores. 0 alarma fo i just i f icado? Os cr í t icos af i rmaram que o governo mudou as regras de uso do EDB simplesmente por causa do barulho po l í t i co , não por temor de um genuíno risco à saúde. Parte da confusão sobre o perigo do EDB reside em dois conceitos sobre o peri-go. Os cientistas e funcionár ios do governo poderiam falar dos riscos es-t imados de que o EDB no a l imento e na água poderia aumentar o risco de câncer em apenas alguns casos para cada 100.000 pessoas. Os jornalistas, como delegados para leitores indivi-duais, queriam que os cientistas fa-lassem sobre o risco enfrentado por uma pessoa que comprasse um paco-te de mistura para sonhos. A ciência não pode proporcionar essa resposta.

Por ou t ro lado, a visão tendencio-sa das fontes de um redator em as-suntos de interesse geral, tais como saúde pública, pode resultar em cr í t i -cas ao redator. A questão de se ava-

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liar riscos oferece mui tos exemplos. Os jornalistas c ient í f icos têm sido acusados de não compreender ou dei-xar de explicar os " fa tores de r isco" quando c i tam estudos c ient í f icos que a f i rmam que um aumento na taxa de mortal idade ou doença pode resultar da exposição a vários elementos quí-micos no meio ambiente, no local de t rabalho, em casa ou em qualquer ou-t r o lugar. Science in the Streets, um relatório do Twent ie th Century hund (1984) , conclui que a percepção da sociedade em relação aos perigos tec-nológicos, inc lu indo os de vazamen-tos de petróleo e poluição do ar, de-pende mu i to da maneira como esses riscos são apresentados pelos veículos de comunicação de massa. Alguns usuários desses meios os responsabili-zam por criarem ansiedade desneces-sária; o mesmo fazem alguns cientis-tas. Mu i to f reqüentemente, aqueles que agem desta maneira têm interes-ses pessoais ou f inanceiros em reduzir a preocupação com várias situações. No relatório do Fund, entretanto, a socióloga Doro thy Nelk in registra que os jornalistas de ciência são vul-neráveis ao cientista ou administra-dor que faz uma afirmação clara, de fáci l citação sobre o perigo (ou a au-sência dele) com base em poucos da-dos. Isso aparece mais na tevê e no rádio onde um sound bite de dez ou quinze segundos é comumente usado para explicar qualquer situação not i -ciosa.

Segundo conclu iu o relatór io, os redatores e jornalistas c ient í f icos de modo geral, não têm-se saído mal. Ent re tanto , o presidente Harrison E.

Schmi t t , antigo astronauta e senador americano pelo Novo México, discor-dou do resto da comissão. Aprender a avaliar o risco entre fontes especia-lizadas conf l i tantes será um problema constante para o redator de ciência. Schmi t t disse que o conhecimento sobre riscos potenciais âs vezes não deveria ser divulgado pelos jornalis-tas. A Dra. Nelk in e o resto da comis-são preferem que o jornalista ofereça aos leitores e espectadores uma visão anal í t ica e inteligente dos riscos exis-tentes de modo que o públ ico possa participar de fo rma consciente numa sociedade democrát ica.

Às vezes os jornalistas c ient í f icos usam seu conhecimento especial e fontes de notícias para proporcionar matérias secundárias ou que sir-vam como pano de fundo para ajudar as pessoas a compreenderem um no-vo evento. Quando o presidente Ro-nald Reagan e o Papa João Paulo II fo ram alvejados por assassinos poten-ciais, os redatores de ciência e medi-cina apresentaram matérias que deta-lhavam a natureza e gravidade dos fe-r imentos dos líderes e explicavam os passos cirúrgicos dados para salvar suas vidas. Com freqüência a rede de fontes noticiosas especializadas dis-poníveis aos redatores de ciência po-de ser usada para outros f ins. Quan-do o Premier soviético Yur i Andro-pov desapareceu da vida pública por vários meses, V ic to r Cohn, do The Washington Post, usou seus conta-tos com médicos em todo o país pa-ra descobrir o que seus colegas na Europa e outras áreas sabiam sobre os rumores da doença de Andropov .

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O resultado fo i uma matéria minu-ciosa sobre a seriedade de uma do-ença renal que afligia o l íder russo. A veracidade da matéria de Cohen fo i conf i rmada após a morte de Andro-pov, algumas semanas mais tarde.

Níveis de redação c ient í f ica

Os redatores c ient í f icos operam em mui tos níveis e graus de populari-zação, educação e esclarecimento. Seu conhecimento do nível de com-preensão de seus leitores ou especta-dores guia tanto a seleção de fatos como o grau de popularização. 0 rá-d io, a televisão e o jornal local atin-gem um públ ico de faixa etária e grau de instrução variados e de diferentes origens. Escrever a respeito de ciência para esse públ ico exige a seleção de tópicos de grande impacto ou grande significação. Em vir tude da l imitação de tempo ou espaço cient í f icos, os assuntos precisam compet i r com mui-tos outros t ipos de notícias e maté-rias.

Os grandes jornais com mais espa-ço, tais como o The New York Ti-mes, irão ver o públ ico de maneira di-ferente. Ü Times, com seus leitores mu i to bem informados, irá atender um públ ico interessado em ler sobre alguns avanços na ciência ou na me-dicina, temas que serão ignorados pe-los editores do New York Daily News. A escolha de notícias depende quase que inteiramente da visão que os editores têm sobre os interesses do seu públ ico, se predominantemente da classe trabalhadora ou profissio-nalmente treinada. Os redatores de

ciência do The Wall Street •Journal cobrem ciência, medicina, o meio ambiente e outros assuntos pelos efeitos que os novos desenvolvimen-tos terão potencialmente sobre seus leitores enquanto seres humanos e pessoas de negócio. Uma nova droga para uma doença do coração, por exemplo, pode interessar tan to ao lei-tor que é um executivo estressado como ao acionista da companhia que fabrica o medicamento.

Os redatores que escrevem sobre ciência para revistas t raçam o perf i l do seu públ ico de fo rma ainda mais l imitada. A escassez do espaço dispo-nível , bem como daquele dado às considerações do públ ico, fo rçam a Ladies Home Journal, por exemplo, a deixar a astronomia para ser tratada por outras publicações. A revista Ti-me, segundo um estudo, usa significa-t ivamente mais termos c ient í f icos sem tradução do que o faz a News-week. Nenhuma das duas trará tantas matérias sobre ciência quanto a Sci-ence News, cujos assinantes compram a revista para obterem uma grande dose semanal de informação c ient í f i -ca. Mas como a Science News é dirigi-da a u m públ ico composto de jovens e velhos, pessoas m u i t o bem informa-das e estudantes, bem como profis-sionais com ou sem cul tura c ient í f ica específica, seus redatores podem fa-zer na verdade mais traduções de ter-minologia c ient í f ica do que as revis-tas não-especializadas. Science, a re-vista semanal para membros da Ame-rican Association for the Advance-ment of Science, não tem compro-misso com a linguagem técnica em

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seus artigos principais, escritos por ci-entistas. Entretanto, usa va'rios jorna-listas para acompanhar de perto a mutável cena pol í t ica, em sua seção, "News and C o m m e n t " . A lém disso, Science atende a seu públ ico, alta-mente selecionado, com departamen-tos tais como "Th is Week in Science" e "Research News" . Ambos são escri-tos numa linguagem mais comum, f reqüentemente expl icando artigos técnicos de outra parte da revista, pa-ra ajudar os leitores tecnicamente treinados a compreenderem o jargão usado em várias disciplinas.

A Scientific American emprega vá-rios editores para trabalharem com os cientistas que escrevem os artigos da revista. Não obstante, o seu nível téc-nico permanece m u i t o al to para uma publicação voltada para u m públ ico não-técnico. Para uma noção mais popular do que está acontecendo em ciência, os leitores têm a Science Di-gest e a Science 85 (que muda de nú-mero de acordo com o ano), que também é publicada pela American Associat ion fo r the Advancement of Science. Para o fanát ico por ciência, que quer l i teratura de f icção c ient í -f ica mesclada com artigos conscien-ciosos sobre ciência, existe a revista Omni. As revistas Psychoiogy Today e Society se dir igem àqueles que pos-suem um interesse especial pelas ciên-cias sociais e de compor tamento . A American Health é uma entre muitas publicações que proporc ionam uma ampla gama de informação simples, conf iável , para pessoas preocupadas com todos os aspectos de sua saúde

pessoal, incluindo o aspecto econô-mico dos cuidados com a saúde.

Ou t ro t ipo de publicação que em-prega redatores de ciência são revistas que t ra tam de temas relativos a in-dústr ia, negócios e comércio. Revis-tas como a Business Week ou a For-bes, concentram-se nos interesses de administradores e acionistas em com-panhias importantes, que requerem mais simplicidade nas áreas técnicas que os leitores das revistas Aviation Week and Space Technology ou Che-mical Engineering, por exemplo. En-t re tanto , quanto mais estreito for o v íncu lo da revista com a indústria ou segmento de indústria ao qual se dir i-ge, mais seletivo será o seu interesse em ciência.

Os redatores de ciência também escrevem para companhias e inst i tui-ções, que produzem relatórios para atender a uma ampla variedade de propósitos. Poderá haver press relea-ses promovendo um produ to da com-panhia, uma brochura expl icando um processo em linguagem leiga ou uma revista para acionistas ou emprega-dos. A Exxon, por exemplo, usa re-datores de ciência para explicar suas ações com [elação â proteção do am-biente onde opera poços de petróleo e refinarias. A revista Exxon vai para um vasto públ ico que inclui jornalis-tas, membros do Congresso e outros considerados influentes no bem-estaf da companhia. A Du Pont distr ibui uma revista similar que estimula as aplicações de novos produtos qu ími -cos nos negócios e na indústria.

Os redatores de boletins noticio-sos irão focalizar suas matérias sobre

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ciência ainda mais estreitamente num campo cient í f ico ou técnico. Alguns poderão cobrir apenas um assunto ou agência, tal como o da Food and Drug Administ rat ion ou da National Science Foundation.

Freqüentemente é o grau de sim-plicidade que separa os redatores de ciência dos "redatores técnicos". Os redatores técnicos voltam-se para um público mui to especializado ou dão instruções passo a passo para a ope-ração, manutenção ou montagem de alguma coisa. Os redatores técnicos preparam manuais e relatórios cien-t í f icos e de engenharia, freqüente-mente como um esforço de marke-ting ou serviço ao consumidor de uma companhia. Muitos redatores técnicos também escrevem matérias mais simples sobre ciência e engenha-ria em áreas de seu conhecimento es-pecíf ico, seja como parte de seu tra-balho, seja como free-lancers. Alguns redatores de ciência e medicina tam-bém fazem trabalhos extras como editores e redatores técnicos, depen-dendo de seu conhecimento sdbre um determinado campo.

Redações científicas de âmbito internacional

Explicar ciência, medicina e enge-nharia, bem como as pessoas que as fazem é um trabalho que desafia re-datores em todo o mundo. Seus mé-todos refletem a natureza e os meios de comunicação de suas sociedades e países. Os redatores de ciência dos Estados Unidos, como os do Ociden-te, operam em geral individualmen-

te, mesmo que cada um possa ser um dos vários redatores de ciência que trabalham numa publicação tão gran-de como o New York Times. Os reda-tores de ciência japoneses trabalham dentro de um sistema hierárquico e de grupo. Uma equipe de redatores pode trabalhar em vários estágios de qualquer matéria. Na Rússia e na Chi-na, onde os meios de comunicação são vinculados ao governo, o treina-mento de redatores de ciência e a se-leção de matérias apresentadas são de preocupação oficial e têm, por obje-t ivo, proporcionar uma compreensão que significa avanço no bem-estar do Estado. Os redatores de ciência euro-peus tendem a ter uma percentagem maior de cientistas em seu meio. No Terceiro Mundo ou nos países em de-senvolvimento, os redatores de ciên-cia têm o desejo, mas não necessaria-mente o espaço e os canais para seu trabalho. Tentativas de formar asso-ciações de redatores nessas áreas, à maneira da British Science Writers Association ou da National Associa-t ion of Science Writers, nos EUA, produziram organizações que podem ou não existir em determinado mo-mento. Essas associações, formadas para aperfeiçoar as habilidades dos jornalistas locais através de seminá-rios e contato com cientistas, geral-mente surgem através do patrocínio de uma ou mais organizações interna-cionais, tais como a Pan American Union ou a Organization of Ameri-can States. A experiência da Asian Science Writers Association é t íp ica.

A Asian Science Writers Associa-t ion fo i organizada inicialmente em

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1970, após u m seminár io patrocina-do pela Press F o u n d a t i o n o f Asia, c o m os Estados Un idos a judando in-d i re tamente através da Asia Founda-t i o n . D u r o u cerca de c inco anos e in-c lu ía membros do Japão, das F i l ip i -nas, Malásia, Ta iwan e outras nações fo ra da China con t inen ta l . Termina-da a subvenção da Asia F o u n d a t i o n , as at ividades da associação de redato-res de ciência nos pafses mais distan-tes cessaram, dev ido às suspeitas de que a Asia F o u n d a t i o n fosse uma f rente para a U. S. Central In te l l i -gence Agency . E m 1977 f o i fe i ta uma tentat iva de reviver a organiza-ção, em Mani la , du ran te uma confe-rência assistida por t r i n t a e c inco membros dos países ao redor da Ba-cia do Pací f ico Or ien ta l . O g rupo c o n c o r d o u em procurar d inhe i ro em outras fon tes que não fossem seus própr ios governos o u os Estados Uni -dos. Nem os redatores nem os jor -nais envolv idos pareciam capazes de sustentar a organização c o m seus pró-prios recursos, c o m o fazem os mem-bros da Nat iona l Assoc ia t ion o f Science Wri ters , nos Estados Un idos (La ing, 1978) .

As organizações de redatores de ciência em out ros países t ê m aprox i -madamente os mesmos objet ivos que suas similares nos Estados Un idos . U m cient ista presente ao p r ime i ro Seminár io In teramer icano de Jorna-l ismo C i e n t í f i c o , há mais de v in te anos atrás, dec la rou :

A pesquisa científica, e isto é parti-cularmente comum na América La-tina, não pode se desenvolver sem o apoio total do governo. Por esse

motivo, é essencial que os governan-tes se torrçem conscientes da conve-niência e necessidade de ajudar a ciência a aplicar seus resultados na solução de muitos problemas nacio-nais. É igualmente importante criar um estado de opinião geral que fa-voreça o trabalho científico. (Car-don, 1962, 6)

Dessa maneira, uma parcela maior de responsabil idade q u a n t o à educação nacional pode estar recaindo sobre os redatores de ciência em países menos desenvolvidos.

U m re la tór io da conferência indi-cou que a repor tagem c ien t í f i ca pode ser mais po l i t izada em tempos de ten-são e con f l i t os internos, po l í t i cos o u armados. Fora dos Estados Unidos, t o d o o jo rna l i smo é m u i t o mais pol i -t i zado , m u i t o mais do que os ameri-canos estão acostumados a ver. A ciência, nos países c o m t rad ição cien-t í f i c a inexpressiva ou inexistente, é fac i lmente subs t i tu ída nos jornais por not íc ias de c o n f l i t o econômico ou p o l í t i c o .

Uma tentat iva poster ior fo i fe i ta no sent ido de organizar os jornal istas ao redor da questão de sua herança espanhola, através do Congress o f Ibero-Amer ican Science Journa l - ISM, realizado em Madr id em março de 1977. Isso resul tou numa ten ta t iva de f o r m a r a In teramer ican Science Wri ters Assoc ia t ion uma vez que to-dos os países de fala espanhola e por-tuguesa, c o m exceção de Cuba e Cos-ta Rica, estavam presentes. Houve mesmo conversas sobre a possibi l ida-de de f o r m a r uma Wor ld U n i o n o f Science Wr i ters embora o e n c o n t r o fosse a l tamente par t idár io e marcado

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por rivalidades internacionais (Cor-nell, 1977).

Os grupos que exist i ram por al-gum tempo incluem a European Sci-ence Writers Un ion e a Swiss Science Wri t ing Association. A Internat ional Science Writers Association cont inua exist indo. A ISWA tem cerca de 200 membros e tem sido mant ida inteira, pr incipalmente por Howard-Lewis, func ionár io de informações aposen-tado da National Academy of Scien-ces. A maior e mais estável das asso-ciações de redatores de ciência, a U. S. National Association of Çcience Writers, tem, entre seus membros, mais de t r in ta correspondentes es-trangeiros. O grupo maior está, não admira, no Canadá — onze membros. O restante está espalhado entre a Austrál ia (3) , França (3), Alemanha (3) e Inglaterra (2), com correspon-dentes na Irlanda, Israel, Japão, Mé-xico, Porto Rico, Arábia Saudita, Suécia e Suíça. Embora a maioria seja natural dos países onde residem, o número inclui alguns americanos que vivem no além-mar e escrevem para veículos americanos.

Os países da Europa Ocidental oferecem menos assistência aos jorna-listas c ient í f icos na coleta de infor-mações do que os Estados Unidos. Quando Lois Wingerson, antiga edi-tora de ciência da Record, de Bergen County, Nova Jérsei, t rabalhou na In-olaterra, encontrou pouco encoraja-mento para que seus artigos fossem «lém de relatos baseados em matérias ile ciência impressas no The Lancet, publicação médica inglesa e outras publicações técnicas. Também con-

cluiu que os funcionários dos órgãos de informação do governo exist iam pr incipalmente para glor i f icar seus patrões e não respondiam a chamadas telefônicas. Isso fo i especialmente comprovado no National Health Ser-vice. Os cientistas, incluindo os do Royal College of Physicians, pare-ciam tão intrigados na Grã-Bretanha como nos Estados Unidos com a preocupação dos jornalistas em obter informações mais frescas do que aquelas publicadas nos periódicos. Entretanto, a persistência de Winger-son em procurar contato direto com os cientistas resultou em entrevistas e visitas a laboratórios (Wingerson, 1979).

As reuniões cientí f icas no cont i -nente geralmente oferecem poucas acomodações especiais aos represen-tantes dos meios de comunicação, re-latou John F. Henahan, membro da NASW e free-lancer (1981). Ele usa-va Dub l in como base para cobrir reu-niões na Inglaterra e na Europa. O idioma freqüentemente se revelava uma barreira, embora as reuniões ge-ralmente incluíssem um ou mais cien-tistas que entregavam seus trabalhos em inglês. As poucas reuniões que proporcionaram traduções em vários idiomas funcionaram bem no in íc io , mas as traduções f icaram mais super-ficiais à medida que os t radutores se cansavam. A maioria das conferên-cias de imprensa sobre ciência é reali-zada no idioma local e os comunica-dos ao públ ico não podem ser feitos. Ser o único redator de ciência ameri-cano num país permite produzir ma-térias exclusivas, mas o tempo gasto

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em arranjar entrevistas é mu i to maior que nos Estados Unidos.

Na China, a redação popular de ciência parecia estar mais em mãos de cientistas que de jornalistas, diz Da-vid Perlman, editor de ciência do San Francisco Chronic/e, que Ia' esteve em duas visitas. Isso provavelmente ocor-re em função da teoria de responsabi-lidade social existente nos pafses marxistas, que torna a todos respon-sáveis por educar as massas do mo-do "apropr iado" . Entretanto, os edi-tores de ciência chineses têm os mes-mos problemas que os americanos: li-dar com cientistas que escrevem ar-tigos incompreensíveis aos leigos. Perlman achou que os jornalistas chi-neses se surpreenderam diante da ha-bil idade dos redatores de ciência dos E U A em fazerem contato pessoal com os cientistas sem terem de passar pela hierarquia de ministérios e dire-tores de laboratórios para obter en-trevistas. Os redatores de ciência chi-neses consideram impor tante concen-trar-se nas aplicações práticas da ciên-cia ao invés de explicar o abstrato e o fundamenta l . Os chineses estavam preocupados também com a maneira de desenvolver materiais para intro-duzir as crianças à ciência (Perlman, 1984).

Por mais de t r in ta anos, pelo me-nos, os jornalistas de ciência estran-geiros f ixados nos Estados Unidos têm passado com alguma facil idade pelas mesmas rotinas da cobertura noticiosa por que passam os jornalis-tas americanos. Isso pode mudar com o cl ima de intensa competição po l í t i -ca e comercial que está se desenvol-

vendo. Em 1983 a administração Reagan recusou uma permissão de li-cença para um correspondente cana-dense f i xado nos E U A , que escreveu matérias contradizendo as pol í t icas de administração sobre os aspectos técnicos do controle de armamentos e poluição do ar-água. O periódico br i tânico de ciência Nature, e a Eco-nomist, uma revista de notícias, man-têm membros de suas equipes nos Es-tados Unidos e procuram regularmen-te ter acesso a material c ient í f i co e técnico que está sendo cada vez mais restr i to, pelas normas, aos jornalistas americanos.

Isso pode provocar retaliação ex-terna passando-se a negar o acesso, tan to de cientistas quanto de redato-res c ient í f icos americanos, a confe-rências que l idem com temas indus-t r ia lmente importantes, tais como computadores e biotecnologia. Os re-datores de ciência americanos no exterior podem descobrir que têm de conseguir acesso por intermédio dos funcionár ios encarregados do setor c ient í f i co das embaixadas americanas. No presente, ent re tanto, o contato convencional e d i re to com as orga-nizações e instituições cient í f icas funciona.

A o ler o p r ó x i m o capí tu lo , você poderá perguntar: por que publicar not íc ias e matérias sobre ciência, en-genharia e tecnologia, afinal? Uma resposta de signif icado social incluir ia a importância econômica e po l í t ica da ciência numa democracia. Não há dúvida de que o que acontece em ci-ência e tecnologia nos afeta a todos. Entretanto, mui tos redatores de ciên-

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cia lhe d i rão que cobrem essa esfera porque há tema para boas matérias ali. A l é m disso é m u i t o d ive r t ido . Co-mo disse V i c t o r Cohn, do The Wash-ington Post: " O s cientistas são para os redatores de ciência o que os ra-tos são para os c ient is tas" (Good f ie ld , 1981, 94) .

Experiências

1. Leia a edição de domingo de um im-portante jornal nacional ou metropolita-no. Conte o número de matérias que con-sidera relacionadas è ciência. As fontes são cientistas ou outro tipo de fontes? Conte o número de matérias existentes no jornal. Que percentagem é relativa à ciência?

2. Leia uma revista popular sobre ciência. Em que categoria de ciência você acha que cada matéria se encaixa melhor: pura, bá-sica, aplicada, tecnológica, cultural ou de poITtica da ciência?

3. Busque as revistas de negócios e indús-trias em sua biblioteca; leia uma edição de uma revista e faça um relato sobre as maté-rias ligadas à ciência. Quantas há? Que es-pécie de cientista é sua fonte?

4. Obtenha uma edição de Science. Jour-nal oi the American Medicai Association, ou New England Journal of Medicine. Re-lacione uma lista de artigos técnicos que acha que mereceriam ser popularizados e dê os motivos.

5. Faça uma lista de matérias potencial-mente científicas para discussão em classe. Como você e seus colegas classificariam es-sas matérias pelos critérios deste capítulo?

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Capítulo 2

Evolução da redação científica

A REDAÇÃO CIENTIFICA, COMO É HOJE, deriva de u m sistema de comu-nicação secular. Teve seu in fc io no século X V I quando os pr imei ros cien-tistas se de f ron tavam c o m a censura e suas at iv idades pela Igreja e pelo Es-tado. Encontravam-se às escondidas em várias cidades para i n f o r m a r e m uns aos ou t ros sobre suas descobertas relativas à nova f i loso f ia natura l . Das reuniões desses grupos de el i te, que compreendia nobres, e rud i tos , art is-tas e mercadores, b r o t o u a t rad ição da comunicação aberta e oral sobre assuntos c ien t í f i cos .

A Accademia Secre to rum Naturae começou em Nápoles, I tá l ia , em 1560, c o m o a p r ime i ra de mui tas so-ciedades c ien t í f i cas que f loresceram nas cidades onde os novos "c ient is -tas " p o d i a m se reunir c o m fac i l idade. Roma t i nha sua Accademia dei L in-cei, que d u r o u de 1603 a 1630. Em Florença, a Accademia dei C i m e n t o fo i fundada sob a proteção do Grão-Duque Ferd inand de Mediei e seu ir-mão L e o p o l d o em 1657. D u r o u dez anos, t e r m i n a n d o pouco depois que Leopo ldo recebeu seu chapéu cardi-na l íc io . Os histor iadores suspei tam cie que o preço da m i t ra vermelha f o i a con t r ibu ição de Leopo ldo para a dis-solução da Accademia , u m grupo p rob lemát ico para a Igreja. A lguns de

seus membros f o r a m esquadr inhados pela Inquisição e u m m e m b r o da so-ciedade de Florença suicidou-se para evitar a t o r t u r a (Jeans, 1958, 148) .

Na Inglaterra, a Roya l Soc ie ty f o r the Improvemen t of Natura l K n o w -ledge f o i proposta por Francis Bacon em 1620 e aprovada em 1662 por Charles I I . . M u i t o s de seus membros est iveram se encon t rando duran te anos no Gresham College, em Lon-dres, e em O x f o r d sob o n o m e de In-visible College. Louis X I V estabele-ceu a Académie des Sciences, em Pa-ris, em 1666. O ele i tor Freder ico da Prússia seguiu o e x e m p l o c r iando a Academia de Ber l im em 1700. Os Es-tados Unidos regu lamentaram sua Nat iona l A c a d e m y o f Sciences em 1863.

Trocas de cartas, monograf ias e li-vros em la t im estabeleceram o padrão da comunicação entre ind iv íduos , en-t re sociedades nas cidades, e entre as sociedades nacionais. Os cientistas pre fer iam as cartas (com f reqüência impressas, de m o d o que cópias pu-dessem ser enviadas a vários cientis-tas) porque os func ionár ios dos go-vernos eram menos inc l inados a abr i r o que parecia ser correspondência or-dinár ia. Seus temores t i n h a m a lgum f u n d a m e n t o . Em 1667, Henry Olden-burg, secretário da Roya l Soc ie ty , f o i

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aprisionado na Torre de Londres quando o secretário de estado britâ-nico achou que alguns comentários cont idos numa comunicação c ient í f i -ca cri t icavam a conduta de guerra da Inglaterra com os holandeses pelo co-mércio das índias Orientais.

Foi Oldenburg quem inventou o jornal ismo c ient í f i co . Ele deu in íc io à publicação Philosophical Transac-tions, periódico da Royal Society, em março de 1665, com seu própr io esforço. Através do d o m í n i o de vá-rios idiomas, Oldenburg pôde tradu-zir tex tos de várias fontes para publ i-cação em inglês e lat im. Não o tivesse fe i to , o mundo poderia não ter toma-do conhecimento de coisas estranhas que u m confeccionador de roupas holandês, em Del f t , v iu quando exa-m i n o u gotas d'água com as mesmas lentes de aumento que usava para es-tudar o pano. Oldenburg conseguiu quase duzentas cartas do confeccio-nador , A n t o n i van Leeuwenhoeck, o pai da microscopia (Boorstein, 1983, 330, 390-417) . Isso ocorreu mui tos anos antes que a Royal Society assu-misse responsabilidade pela publica-ção d o per iódico c ient í f ico . Olden-burg estabeleceu precedentes de cien-tistas func ionando como editores de per iód icos da sociedade c ient í f ica e para publicações em vernáculo. Esses concei tos fortaleceram a pesquisa ci-e n t í f i c a na Europa.

M u i t o do que era publ icado podia ser compreend ido por qualquer das pessoas pouco letradas da época. À med ida que a cul tura aumentava, as pr imeiras versões de jornais e revistas apareceram na Inglaterra e na Euro-

pa, e seus publishers editores-impres-sores reescreviam e impr imiam os ar-tigos dos periódicos c ient í f icos de modo que pudessem interessar a seus leitores. Também arranjavam para que membros da sociedade escreves-sem para os leitores dos novos veícu-los de comunicação.

Nas colônias britânicas da Améri-ca do Nor te, esse padrão de comuni-cação c ient í f ica repetiu a experiência européia, com relatos de febre, cala-fr ios e varíola aparecendo no Publick Occurrences de Boston, em 1690. Benjamin Frank l in , u m dos fundado-res da Ciência Americana, escreveu um relato de suas experiências com papagaios e relâmpagos na edição de 19 de ou tub ro de 1752 da Pennsylva-nia Gazette, que publicava. Entretan-to , durante um século de grande ino-vação c ient í f ica, demonstrações bem-sucedidas do barco a vapor (1807), da locomot iva a vapor (1830) , do telé-grafo (1844) , e d o telefone (1876) re-ceberam menções relativamente inex-pressivas nos jornais. O interesse prin-cipal dos editores da época voltava-se para a po l í t ica partidária. Na era do jornal ismo pessoal, Horace Greeley escreveu sobre seu interesse em agri-cul tura e outros aspectos da ciência. Isto evoluiu para uma coluna sema-nal, "Science fo r the people" , que apareceu pela primeira vez com esse t í t u l o a 3 de março de 1877, após a morte de Greeley. Esse fo i um perío-do de escrever numa tônica c ient í f i -ca sobre as descobertas através da ex-ploração. Quando o século X I X ter-minou, o mesmo ocorreu com o fa to de se escrever sobre a exploração co-

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mo "ciência". Aventura poderia ser, mas não "c iência" .

Separação e Sensação

Na década de 1880, os caminhos da ciência e da sua popularização es-tavam divergindo. A ciência movia-se em direção â profissionalização extre-ma, evidente agora. A ciência e a pes-quisa cient í f ica estavam se tornando ocupações de tempo integral, fora do campo dos comerciantes, dos clérigos e dos que as praticavam por hobby. Os aficionados da ciência e suas ma-ravilhas ainda afluíam às palestras pú-blicas dos cientistas. Em 1883, o edi-tor de Science sentiu-se á vontade pa-ra incentivar amadores a juntarem es-pécimes de rochas, plantas e insetos que as sociedades científ icas locais pudessem discutir e analisar.

Um interesse comum por novos conhecimentos ainda existia entre ci-entistas e não-cientistas, mas este es-tava se separando. Os cientistas "pu-ros" que denegriam o estado da ciên-cia americana lideraram a separação. Havia cerca de quinhentos pesquisa-dores sérios publicando no país na-quela época, e eles enfatizavam o avanço de suas disciplinas na direção dos interesses do público e das indús-trias locais. Queriam os amadores fo-ra. Os cientistas estavam principal-mente em universidades ou empregos do governo, e alguns historiadores afirmam que seus motivos podem ter levado ao aumento de sua fat ia de prestígio e assistência financeira (Ke-vles et al., 1980). Na verdade, a ciên-cia americana da época não era nem tão pr imit iva nem tão simples como

afirmavam os líderes do movimento de profissionalização, com freqüência físicos.

A especialização, entretanto, esta-va no ar. Os pesquisadores cient í f icos abandonaram as sociedades locais, fundaram seus própios grupos profis-sionais e assumiram o controle de or-ganizações "nacionais", tais como a American Chemical Society. Em no-me de uma ciência melhor, o contro-le da American Association for the Advancement of Science (AAAS) passou aos cientistas da área de pes-quisas. A educação pública através de palestras e exposições em museus permaneceu com as soçjedades locais como um artefato freqüentemente administrado pelas elites sociais e f i-nanceiras.

A seu modo peculiar, o jornal ismo popular da época ajudou esse movi-mento. Embora alguns jornais e revis-tas veiculassem acuradamente not í -cias científ icas, outros usavam a pseudociência e a ciência sensaciona-lizada para promover a guerra entre os jornais. Os excessos cometidos pe-los jornais de Will iam Randolph Hearst e Joseph Pulitzer, para citar-mos apenas dois, deixaram para trás o nome Gee Whiz Science. O Dr. Hillier Krieghbaum diz: " O trauma de ter suas atividades mal representa-das fo i tão intenso que, mesmo déca-das depois e apesar do surgimento de jornalistas cientí f icos como profissio-nais voltados em tempo int jgra l para a ciência, os cientistas mais antigos c o n f vn aos recém-chegados os 'horrores' de se ter o seu trabalho vei-culado pelo"- liftios de comunicação

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de massa (Kr ieghbaum, 1978, 6). Es-ses horrores, naturalmente, eram au-mentados pelos cr í t icos do jornalis-mo e serviam àqueles que erguiam as barricadas entre os cientistas e os pouco instruídos.

Os americanos não t inham jornais c ient í f icos nacionais no estr i to e no-vo sentido da "c iênc ia" . Nature co-meçou na Inglaterra em 1869 e atraiu notáveis cientistas como autores. Os americanos lançaram o American Journal of Science, em 1818, para not ic iar sociedades cient í f icas lo-cais. 0 Scientific American, funda-do em 1845, enfatizava as patentes, as invenções e a tecnologia. (Vida e sentido novos foram dados à revista quando o nome e o conteúdo foram rejuvenescidos após a II Guerra Mun-dial.) O American Naturaiist come-çou na década de 1860 quando um grupo de estudantes de Harvard esta-beleceu seu própr io centro de ciên-cia em Salem e lançou a revista Scien-ce News, em 1878, sob a editor ia de Wi l l iam C. W y c k o f f , que havia fe i to coberturas de reuniões cient í f icas pa-ra o The New York Herald Tribune. Science News, como t í t u l o também fo i rejuvenescido no século X X . Em parte isso fo i uma resposta ao aparen-te sucesso de Popular Science Mon-thly, fundada em 1872 para impr imi r not íc ias e análises de temas c ient í f i -cos nacionais e relatórios de inst i tui-ções cientí f icas. Uma série de outras revistas surgiu e desapareceu nesse per íodo, muitas vezes durando me-nos de um ano. Mesmo enquanto os cientistas se especializavam e frag-mentavam suas próprias publicações

em novas publicações altamente téc-nicas, queixavam-se de que as no t í -cias de ciência eram fragmentadas e não informavam através de linhas dis-ciplinares rigidamente traçadas.

Foi no f inal do século X I X que Thomas A. Edison, cuja tecnologia e publ icidade horror izavam muitos cientistas " p u r o s " , fundou uma re-vista com poder de permanência. John Michels, microscopista amador, era um redator free-lancer que escre-via sobre reuniões das sociedades cien-t í f icas para o New York Times. Ele convenceu Edison a apoiar a revista Science, que apareceu pela primeira vez em 3 de ju lho de 1880. A revista trazia, entre suas outras matérias, textos importantes sobre o trabalho de Edison. U m dos primeiros " f u r o s " de Science fo i o relato de Alexander Graham Bell sobre seu "photopho-ne". Mas na época da profissionaliza-ção da ciência, o status amador de Michels e a mão f i rme de Edison con-t ro lando gastos mant inham afastados os colaboradores ilustres. Eles gosta-vam de bons pagamentos. Dezoi to meses mais tarde, Edison transferiu a propriedade a Michels e pagou as d í -vidas da revista. Michels, novamente cobr indo sociedades cientí f icas para jornais de Nova Iorque, te rminou por despertar o interesse de Bell pela re-vista, mas ao fazê-lo perdeu sua pu-blicação. Bell aconselhou-se com mui tos cientistas na A A A S e conven-ceu-se de que Science t inha poten-cial. Subseqüentemente a judou a comprar o interesse de Michels. Co-mo edi tor , instalou Samuel H. Scudder, um cientista de Harvard e

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bibl iotecário com boas conexões aca-dêmicas e polí t icas. Daniel Coi t Gil-man, presidente da Johns Hopkins Universi ty, encabeçava o conselho de editores. Para sublinhar a orientação acadêmica e profissional de Science, Gilman escreveu: "Science nunca se-rá uma leitura fácil e nunca irá entre-ter quem procura curiosidades" (Kohls tedt , 1980, 33-41).

Bell e seu sogro Gardiner Hubbard investiram em Science desde 1883 até março de 1894 quando o então editor N.D.C. Hodges fechou a revis-ta por fal ta de fundos suficientes. I ronicamente, apesar de Bell lamen-tar o d inhei ro perdido, Hubbard em-prestou dinheiro a Hodges até o f im . Podia arcar com isso porque também havia iniciado uma nova publicação chamada National Geographic Maga-zine. Esta era popular e bem-sucedida ao ext remo.

Os líderes da A A A S , tendo perdi-do uma publicação fei ta a seu gosto, propuseram subsidiar uma Science re-nascida que iria publicar os trabalhos apresentados nas reuniões da socieda-de. De um modo que nem a própria A A A S compreende, o psicólogo Ja-mes Mckeen Cattel l tornou-se editor. Antes que A A A S concordasse em adotar Science, Cattel l havia persua-dido Bell e Hubbard a dar-lhe a pro-priedade. Cattel l t inha u m sólido pas-sado de pesquisas e conexões em No-va Iorque pela sua posição de profes-sor da Coiumbia University. Dinheiro de famí l ia livrava Cattel l de preocu-pações financeiras. Cattel l ed i tou a revista por cinqüenta anos, tornando-se um rico editor em vez de profes-

sor. A o f inal , a A A A S iria pagar à sua viúva mais de 250 mi l dólares pela propriedade da revista em 1945 (So-kal, 1980) .

Foi a melhor compra que a A A A S jamais fez. Como no caso de muitas outras revistas cientí f icas e médicas, sua publ icidade disparou quando bi-lhões de dólares de dinheiro federal fo ram despejados para a pesquisa de desenvolvimento depois da II Guerra Mundial . A publicidade de construto-res de equipamentos c ient í f icos, con-tratados do governo e universidades empregando cientistas t rans formou as revistas na principal fonte de ren-da para muitas sociedades cient í f icas, médicas e técnicas. Em 1980, o orça-mento de Science havia ultrapassado os 7 milhões de dólares. A circulação, mesmo tendo caído após um pico de 163 mi l exemplares em 1971, ainda era maior que 152 mi l e estava au-mentando em 1983 (Wolf le, 1980, 57-62). Apenas ao reconhecer o seu centésimo aniversário em 1 9 8 0 é que Science relembra os dois falsos iní-cios com os tecnólogos Edison e Bell. As suas edições são numeradas a par-t i r de Cattel l .

A o cont rár io do que ocorr ia nas sociedades cient í f icas da Europa, pr incipalmente da França, os cientis-tas americanos permaneciam alheios aos temas pol í t icos. A neutral idade po l í t i ca tornou-se a posição of ic ial para eles e para o seu trabalho. O jor-nalismo americano também seguia um caminho neutro denominado "ob je t i v i dade" . A A A A S também eli-m inou a preocupação com o sistema de educação americano; encerrou a

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publicação de Science Monthly, que havia sido organizado através da A A A S para explorar temas da comu-nidade educacional. A A A A S iria re-tomar o interesse pela educação quando subsídios federais para a edu-cação, concedidos em função da guerra, permit i ram ao pessoal mil i tar freqüentar cursos de pós-graduação em ciência, expandir as fileiras de Ph.D.'s, povoar laboratórios para no-vos cientistas-administradores, e pu-blicar jornais de pesquisa realçando as reputações dos laboratórios, das universidades e dos administradores. Os cientistas declararam-se, e ao seu trabalho, acima da pol í t ica. Alguns mantiveram a postura mesmo quando a pol í t ica de Ado lph Hit ler fez com que cientistas judeus, tais como Al-bert Einstein, abandonassem as uni-versidades alemães.

Ciência Selvagem e Popular

Embora os cientistas recuassem do contato profissional com o público em geral e as preocupações práticas da sociedade, os leigos não foram pri-vados de informação cient í f ica e téc-nica. Os editores da imprensa popu-lar escreviam sobre o que eles e seus leitores podiam compreender, mas com o objetivo de despertar o inte-resse dos leitores freqüentemente en-feitaram suas matérias com o bizarro e o imaginário. Wilhelm C. Roentgen serviu a ciência e provocou sensacio-nalismo em 1895. Os jornalistas des-creviam as radiografias do esqueleto humano e outros objetos ocultos. Al imentavam e aumentavam a curio-

sidade de seus leitores com muitas idéias relacionadas com isso, porém fantasiosas, incluindo a possível neces-sidade de se criarem roupas ínt imasfe-mininas à prova de radiação. A ciên-cia médica caminhava mal também. Na ignorância que segue qualquer no-va descoberta, Lancet, a venerável publicação médica inglesa, propôs que os homens passassem um peque-no tubo de raios catódicos sobre os rostos a cada manhã ao invés de ras-parem suas suíças. Com esse apoio autor i tár io, médicos, e charlatões (com freqüência indiferenciáveis) aplicaram tragicamente altas doses de raios X a seus pacientes com propósi-tos depilatórios.

Revistas sérias, como a Harper's e a Atlantic, exploravam eventos e te-mas científ icos. Uma nova espécie de revista florescia na forma de publica-ções comerciais e industriais voltadas para os negócios alinhados com as novas tecnologias que produziam ma-ravilhas químicas, mecânicas e elétri-cas. Os fazendeiros eram os alvos de revistas sobre agricultura cientí f ica. Essas publicações estavam em mãos privadas e podiam discutir livremente tópicos que as publicações científ icas preferiam ignorar, incluindo batalhas polít icas e pessoais no interior das so-ciedades especializadas.

Os jornais, que estavam rapida-mente se transformando em veículos de massa, davam aos leigos a impres-são de que a ciência se centrava no bizarro. Histórias sobre o estranho, o incomum e o impossível enchiam a imprensa popular após a virada do sé-culo. Entretanto, os jornais também

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apanharam o por ten to das teorias de A lber t Einstein sobre a relatividade e a revolução f ísica que se seguiu. A expansão do uso de serviços not ic io-sos telegráficos transmit ia textos so-bre bezerros de duas cabeças e afir-mações sobre elos darwinianos perdi-dos pelo cont inente. Ligações mun-diais como os cabos submarinos e o telégrafo sem f io aumentaram a velocidade e o âmbi to das comunica-ções bem como o embaraço dos cien-tistas cujo t rabalho era incorretamen-te relatado. Para outros, os tempos ofereciam oportunidades de publici-dade. Arqueólogos que desencavavam cidades enterradas e tumbas de faraós levavam jornalistas com suas barracas de acampamento. Tanta coisa pare-cia possível que mu i to pouco parecia impossível, mesmo o que fosse im-provável aos olhos dos editores.

Então como agora, os editores eram simpáticos a qualquer coisa que se encaixasse em sua definição de " u m a boa h is tór ia" . Alguns cientis-tas, com sua dignidade crescente e maneiras autoritárias, tornavam-se al-vos para o humor de jornalistas irre-verentes. Samuel Pierpont Langley, t i tu lar da Smithsonian Inst i tu t ion, atraiu reportagens mordazes com suas tentativas malsucedidas de fazer voar um modelo de aeronave motor i -zada, lançando-o de uma balsa no r io Pótomac. No entanto, mui tos jornais ignoraram a história dos irmãos Whight em K i t t y Hawk, Carolina do Norte, que ocorreu poucos dias de-pois da ú l t ima queda de Langley.

A lber t Einstein apresentou suas teorias da relatividade em 1905. A

ciência, na imprensa, ainda incluía mui ta coisa sobre as ousadas investi-gações físicas. Enquanto alguns aven-tureiros arriscavam tudo em balões e zepelins, aeroplanos fei tos à mão ou barulhentos carros de corr ida, outros se estendiam para os l imites da Terra: Robert E. Peary para o Pólo Nor te , em abri l de 1909, e Roald Amund-sen, da Noruega, para o Pólo Sul, em dezembro de 1911. A ciência tam-bém estava se movendo em direção à guerra com o resto do mundo , e â descoberta de quanto os Estados Uni-dos dependiam da Alemanha em ter-mos de produtos qu ímicos e conheci-mento qu ím ico . A I Guerra Mundial fo i caracterizada como a guerra dos qu ímicos quando os cientistas (e en-genheiros) descobriram novos modos de produzir material de guerra. Como os cientistas relataram, em suas con-venções, os jornalistas retransmit iam e glamourizavam as descobertas da qu ímica — para uma vida melhor, concordavam todos. O papel visível da qu ímica industr ial , desempenhado durante e após a I Guerra Mundial , a judou os jornalistas e seus patrões a reconhecerem que os cientistas mere-ciam atenção mais séria. A II Guerra tornou-se a guerra dos f ísicos por sua contr ibuição em div idir o á tomo para derivar bombas de fissão e poder nu-clear. Dessa vez nem mesmo os cien-tistas concordaram que uma vida me-lhor resultaria daí .

Um novo t ipo de jornalista c ient í -f ico surgiu entre as guerras. Esses jor-nalistas eram mais instrução que mui-tos dos seus predecessores. Isso lhes dava uma compreensão melhor de

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muitas das novas idéias e dos temas maiores da ciência. Earl J. Johnson, que passou de repórter a vice-presi-dente da Uni ted Press Internat ional, pertencia á velha escola. Esperava-se que os repórteres depois de cobr ir uma sangrenta greve ferroviária num dia, contou ele a uma platéia do Wi l l iam Al len White Memorial Lectu-re, passassem em seguida a relatar uma reunião de cientistas. "Sem dú-vida eu era um camarada versátil, mas era uma versatilidade superficial que nenhum serviço not icioso toleraria agora" (Johnson, 1965, 1).

U m dos que realizaram as mudan-ças na redação de ciência popular fo i o jornalista David Dietz. Dietz escre-veu sua primeira matéria sobre ciên-cia em 1915 para o Cleveland Press enquanto era calouro e correspon-dente no campus da Western Reserve Universi ty. Suas aulas de ciências de-ram-lhe o vocabulário necessário e o conhecimento de ciência daquela época para trocar idéias faci lmente com os cientistas. A sua contr ibuição fo i significativa para que jornalistas sérios e bem informados se especiali-zassem em reportagem c ient í f ica. Em 1919 Sir Oliver Lodge, da Inglaterra, concedeu a Dietz uma entrevista que const i tu iu , segundo o jornal ista, a pr imeira matéria de jornal sobre a li-beração de energia atômica. Dietz, que escreveu matérias sobre ciência e medicina por mais de sessenta anos, considerava os cientistas de Prêmio Nobel A r thu r C o m p t o n , Robert A . Mi l l i kan e Wendell Stanley seus ami-gos. Ele e o ast rônomo Edwin P. Hubble jogavam cartas no observató-

r io de Mount Wilson enquanto espe-ravam o momento certo de voltar o telescópio para a Nebulosa de Or ion. Certa ocasião, Dietz lembrou-se de ter d i to a Mi l l i kan que teria de perder sua palestra. A resposta de Mi l l i kan: " V á em frente e escreva seu tex to . Não precisa de minhas notas. Sabe tanto quanto eu sobre o assunto" (Dietz, 1977, 25, 26). O conhecimen-t o do tema por Dietz e a sua aceita-ção pelos cientistas não t iveram para-lelo em sua época e cont inuam assim hoje.

Enquanto Dietz se movia pelo país escrevendo sobre pouca coisa além de ciência e medicina, tornou-se um entre vários seguidores regula-res da t r i lha c ient í f ica. Entre seus companheiros estavam Alva Johnston do The New York Times. Quando o propr ietár io do Times, A d o l p h Ochs re formou o jornal , subst i tu iu os free-iancers por membros efetivos da equipe que se especializaram em re-portar novidades cientí f icas. Designa-do para cobr i r a reunião anual de 1922 da A A A S , Johnston convenceu os editores do Times a reservarem a maior parte de uma página a cada dia para suas matérias de Cambridge, Massachusetts. Essas matérias conce-deram a Johnston um Prêmio Pulitzer em 1823, o pr imeiro de vários conce-didos a jornalistas pela cobertura de notícias cientí f icas.

Em 1921, apareceu pela pr imeira vez um serviço not icioso dedicado à reportagem cient í f ica. O publisher de Dietz, E. W. Scripps, da Scripps-Ho-ward Newspapers e do serviço tele-gráfico da Uni ted Press, lançou o

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Science Service para disseminar not í -cias e matérias cientí f icas responsá-veis. Colocou o Dr. Edwin Slosson como encarregado, ajudado por ou-t ro jornal ista da Scripps-Howard, Watson Davis. O Science Service evo-luiu para a atual Science News, a úni-ca revista semanal popular de not í -cias cientí f icas.

Nesse per íodo entre guerras, ou-tros jornais colocaram profissionais em tempo integral para assuntos de ciência e medicina. Waldemar Kaem-pf fer t f o i nomeado editor de ciência no The New York Times, mas Wil l iam L. Laurence escreveu algumas das his-tórias mais memoráveis do Times. Howard Blakeslee passou a fazer re-portagem c ient í f ica para a Associated Press. O Herald Tribune de Nova Ior-que igualava o Times com John J. 0 ' N e i l l . Mesmo Wil l iam Randolph Hearst juntou-se ao movimento para restringir os aspectos mais selvagens da reportagem cient í f ica, colocando o Dr . Gob ind Behari Lal, então um estudante indiano graduado em ciên-cias sociais em São Francisco, como o edi tor de ciência da cadeia.

Embora esses repórteres especiali-zados cobrissem muitas das reuniões cient í f icas, não estava tudo bem em seus relacionamentos com os cientis-tas. De modo t ip icamente america-no, os repórteres se organizaram para aumentar seu poder de barganha, por privilégios de imprensa jun to às orga-nizações dos cientrstas. A National Associat ion of Science Writers (NASW) teve in íc io em 1934 com doze membros e Dietz como presi-dente. Outros membros inclu íam Ka-

empf fe r t , Laurence, Davis, Blakeslee, 0 ' N e i l l , Lal, Slosson, Robert Potter da Medicai Society of the County of New Y o r k e do Science Service, De-los Smi th da Uni ted Press, e A l len Schoenfield do The Detroit News. Out ro membro , Robert Dwyer , do New York Daily News e de sua Ci ty Press Associat ion, se concentrou so-bre os pesquisadores médicos em Bellevue e outros hospitais de Nova Iorque (Hohenberg, 1961). A o longo dos anos a NASW obteve u m conjun-to de privilégios operacionais em reu-niões cient í f icas que inc lu íam uma coordenação of ic ial da imprensa, sa-las, telefones, máquinas de escrever, cópias dos trabalhos para estudo, conferências de imprensa, livros de referência e outras acomodações pa-ra tornar a reportagem mais fác i l , mi-nuciosa e mais acurada.

0 ' N e i l l , Laurence, Blakeslee, Lal e Dietz, c inco fundadores da NASW part i lharam o prêmio Pulitzer de 1937 por suas reportagens sobre o terceiro centenário da Harvard Uni-versity e sua ênfase nos esforços para compreender os humanos e seu mun-do. No meio da II Guerra Mundia l , Laurence, do New York Times, desa-pareceu de vista e da imprensa; a ra-zão desse desaparecimento só fo i re-velada depois que as bombas atômi-cas foram lançadas sobre Hiroshima e Nagasaki. O governo dos E U A havia levado o relator de ciência do Times para o mundo secreto da energia nu-clear e dos úl t imos estágios de desen-volv imento e testes de armas. Lauren-ce testemunhou o pr imeiro teste da bomba atômica em T r in i t y Site, No-

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vo México, em 16 de ju lho de 1945. Escreveu as primeiras histórias sobre o uso da bomba atômica em Hiroshi-ma e Nagasaki e o rompimento do ar-mazém de energia nuclear. Isso t rou-xe a Laurence o seu segundo Prêmio Pulitzer, que recebeu em 1946.

Em 1984, John Noble Wi l ford, do The Wall Street Journal recebeu o Pulitzer pelo conjunto de seu traba-lho, primariamente os textos sobre os programas de exploração espacial dos EUA. O mais honrado, embora não o mais conhecido dos membros da NASW, entretanto, é John Fran-kl in, redator de ciência do vespertino Ba/timore Sun. Frankl in ganhou sozi-nho dois prêmios Pulitzer, em 1979 e 1985, por matérias sobre a mente e o cérebro. Através dos anos, muitos jornalistas receberam o Pulitzer e ou-tros importantes prêmios jornalíst i-cos por artigos sobre assuntos cientí-ficos inéditos, embora não tenham necessariamente se identif icado como redatores cientí f icos de tempo inte-gral.

As pressões da guerra e o seu tér-mino ajudaram a aproximar os cien-tistas e os escritores de ciência em torno de muitos assuntos. Havia dese-jos comparti lhados de compreender campos inteiros da ciência e tecnolo-gia, tais como radar e eletrônica, que haviam avançado tremendamente por detrás dos muros do segredo mil i tar. Físicos perturbados, entre outros, parti lhavam com os jornalistas o de-sejo de manter aberta e não-confiden-cial o máximo possível de informa-ção sobre energia nuclear. O desen-volvimento da penicilina em tempo

de guerra, acompanhado de novas pesquisas e técnicas de produção bio-lógicas faziam crer que as ciências da vida podiam tornar a medicina uma ciência verdadeira. A propulsão a ja-to , tomada aos laboratórios militares alemães derrotados, prometia um no-vo t ipo de transporte aéreo, a quebra da barreira do som, e velocidades e distâncias de vôo antes inimagináveis. A guerra produziu milhões de ho-mens e mulheres ansiosos para serem educados nessas novas ciências. A ciência havia sido tão út i l vencendo a II Guerra Mundial, que os cientistas do mundo inteiro sentiram uma transformação nos modos pelos quais as nações encaravam e financiavam a pesquisa cientí f ica. A grande ciência havia chegado, consumindo grandes quantidades de fundos públicos e en-trando no debate po l í t i co sobre f i-nanciamento e pol í t ica, o campo na-tural do jornalismo.

A competição das notícias cientí-ficas pelo espaço nos jornais e nas emissoras de televisão comerciais e educacionais em expansão levou os redatores de ciência e os editores a examinarem o seu público. A habili-dade das publicações em atrair e manter os leitores é crucial nos veí-culos comerciais para a estabilidade financeira. Em televisão e rádio, man-ter os índices de audiência mais ele-vados que os de redes e estações con-correntes é a alma do negócio.

Por que ler matérias científicas?

Os redatores e editores com fre-qüência presumem que as pessoas

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querem ver — devem ver — o que eles desejam t ransmit i r , escrever e publ i-car. Centenas de jornais, revistas e shows de rádio e T V que acabaram ou estão em vias de acabar conf i r -mam isso. Algumas publicações cien-t í f icas, a Science entre elas, prospe-ram porque se dir igem a um públ ico seleto de cientistas cujos interesses estão perfei tamente alinhados com o conteúdo da publicação. A maioria dos milhares de jornais c ient í f icos não consegue se manter a part i r de taxas de associação, mas são subsi-diados de algum modo e os cientistas pagam para ter suas pesquisas publi-cadas na maioria deles. Com freqüên-cia o dinheiro vem de parte de suas verbas para pesquisa. Os editores e re-datores de periódicos não-subsidiados raramente têm essa opção financeira. Na maioria das publicações comer-ciais, pagar para ter um art igo publ i-cado significaria tê-lo rotu lado como matéria paga.

Os editores e redatores de veículos de massa não têm garantia do interes-se dos leitores e por tan to tentam me-dir o que os leitores desejam. Duran-te os ú l t imos quarenta anos, pesqui-sas entre os leitores têm dado notas consideravelmente altas ao interesse dos leitores por informação c ient í f i -ca. Embora todas as pesquisas não se-jam diretamente comparáveis, esse in-teresse parece estar em crescimento.

U m dos primeiros estudos de pú-bl ico cobria 130 jornais publicados entre 1939 e 1950. Not íc ias sobre ciências, invenções, saúde e segurança colocavam-se acima de acidentes, go-verno nacional, governo local, recrea-

ção, esportes, arte, música e l i teratu-ra. Superando as not íc ias baseadas em ciência estavam a guerra, a defesa, cobertura de incêndios e desastres, quadr inhos, histórias de interesse hu-mano e o tempo (Swanson, 1955).

A National Association of Science Writers encomendou poster iormente duas pesquisas ao Survey Research Center na Universidade de Michigan. "Science, the News and the Pub l i c " fo i conduzida em 1957. O segundo estudo da NASW, "Satel l i tes, Science and the Pub l i c " (McLeode Swinehart , 1959) , saiu depois que a Rússia lan-çou o pr imeiro Sputn ik . Os pesquisa-dores descobriram que as categorias gerais de ciência, medicina e saúde det inham mais ou menos as mesmas posições, e que 90% dos leitores de então sabiam da existência do Sput-nik. Dois pontos se destacavam: a consciência de um evento c ien t í f i co é estimulada pela publicação de no t í -cias desse evento, e um considerável grupo de indivíduos são curiosos a respeito de qualquer coisa em ciência.

O Dr. Hil l ier Kr ieghbaum, um dos primeiros a ensinar e pesquisar a po-pularização da ciência, conc lu iu des-sas pesquisas que o " le i to r de ciên-c i a " t í p i c o é, no m í n i m o , d ip lomado pela escola secundária, mais velho que a maioria dos leitores, suficiente-mente rico para viver nos subúrbios metropol i tanos, e um consumidor pe-sado de veículos de comunicação — jornais, rádio, televisão e revistas (1959, 1902-95). Essa imagem ainda se mantém. Wi lbur Schramm con-c lu iu ainda que o conhecimento da ciência é amplo, porém não pro fun-

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damente d is t r ibu ído nos Estados Unidos. Há áreas de to ta l desconheci-mento e áreas de informação equivo-cada. O nível de educação e uso de veículos de massa são os dois indica-dores mais importantes quanto aos interesses em informação c ient í f ica que um ind iv íduo tem, ponto básico para que se or ientem as publicações e os programas c ient í f icos novos para u m públ ico al tamente educado. Os leitores selecionam a informação ci-ent í f ica com base nas suas "necessi-dades" percebidas. As mulheres, por exemplo, lêem mais notícias médicas do que os homens.

Esse públ ico deseja mais notícias cientí f icas. O nível de leitura aumen-ta onde os redatores de ciência colo-cam sua informação sob a fo rma de narrativa ou de história, onde a adap-tam às necessidades do seu públ ico, onde a personalizam e até mesmo a to rnam sensacionalista. E, conclu iu Schramm, a maior parte do que se aprende sobre ciência vem dos veícu-los de comunicação depois que as pessoas deixam a escola (1962, 1-20).

Quinze anos mais tarde, em 1971, as pesquisas sobre os usos dos veícu-los de comunicação realizados pela Newspaper Advert is ing Bureau colo-caram as notícias sobre ciência e in-venções em décimo-pr imeiro lugar. Entretanto, a saúde e o bem-estar pú-blicos, bem como os temas relaciona-dos com ciência e medicina, estavam em qu in to . O not ic iár io sobre meio ambiente, também for temente de-pendente da pesqu isa c ient í f ica, estava em nono lugar. Em 1976, em meio a preocupações sobre o supr imento

energético, a energia estava em pri-meiro lugar, acidentes-desastres-fenô-menos naturais em segundo, saúde e bem-estar públicos em terceiro, tem-po (um campo da ciência) em quar to, o meio ambiente em qu in to e a in-venção c ient í f ica em oitavo. Apesar dessas indicações de crescente inte-resse, o espaço dedicado a essas cate-gorias de notícias e matérias relacio-nadas è ciência permaneceu sendo cerca de 5% para os jornais desde 1942 (Kr ieghbaum, 1978).

O que buscam esses leitores e es-pectadores na ciência? Os psicólogos e sociólogos relacionaram vários n í -veis de "necessidades" que as pessoas buscam satisfazer através dos veícu-los de comunicação de massa. Em um nível , os veículos ajudam a preencher as necessidades de sobrevivência. Para qualquer organismo, assegurar o ali-mento, o abrigo, e o sexo é básico. Onde a pesquisa c ient í f ica se apóia nessas áreas, part icularmente se a in-formação se const i tu i em ameaça à segurança pessoal no preenchimento dessas necessidades, o interesse deve ser a l to, como no caso do interesse pela A IDS.

A maioria das pessoas, que são grandes consumidores dos veículos de comunicação, já resolveu suas necessidades básicas de sobrevivência. Raramente têm que se perguntar de onde virá a próx ima refeição. Entre-tan to há muitas necessidades além da sobrevivência. Manter ou melhorar a qualidade de sua sobrevivência ocupa posição de destaque na relação dessas necessidades. Maneiras de obter ali-mento melhor, moradia melhor, saú-

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de melhor e sexo melhor, como fo i relatado por pesquisadores c ient í f i -cos, têm aplicação imediata ou grati-f icam mu i to a vida das pessoas. Em termos modernos, as maneiras de ga-nhar o d inheiro necessário para asse-gurar u m padrão mais al to de sobrevi-vência para si mesmo ou para a famí -lia podem surgir das novas e promis-soras indústrias ou de ocupações mais agradáveis ligadas à ciência e suas aplicações potenciais. Com freqüên-cia, essa co-relação com os interesses humanos reconhecíveis são responsá-veis pela publicação e difusão de ma-térias derivadas da ciência mas de teor não-cient í f ico. A revista Money permanece como membro da NASW e os analistas de ações assistem a con-ferências sobre novidades cientí f icas para ter em primeira mão informa-ções que poderiam afetar o preço de ações em companhias públicas, tais como as que fabr icam e vendem dro-gas com tecnologias avançadas, assim como informação c ient í f ica de inte-resse para seus leitores enquanto con-sumidores.

O interesse dos leitores determina os temas mas um out ro fa tor também é determinante para que uma matéria seja impressa. Os redatores de ciência precisam, antes de mais nada, fazer as suas histórias passarem pelos editores "po r te i ros " , que t o m a m a decisão f i -nal sobre publicar uma matéria ou li-vro ou colocar um programa no ar. Um redator c ien t í f i co a f i rmou que conseguia publicar qualquer matéria sobre hemorróidas porque todo edi-tor tem esse problema. Quando um editor conhece um tema, irá tratá-lo

de fo rma diferente daquele que des-conhece. A famil iar idade ajuda, mes-mo com temas menos pessoais. Earl Ubel l , um redator de ciência para a imprensa e para os meios eletrônicos de comunicação, certa vez contou um caso sobre um redator c ient í f i co cuja primeira matéria sobre um novo assunto fo i parar no fundo do jorr al. " E , f inalmente, na terceira vez em que se tocou no assunto, ela quase saiu na primeira página porque, na-quela ocasião, o edi tor havia começa-do a entender que talvez aqui lo fosse not íc ia e que deveria fazer algo a res-p e i t o " (Communicat ion, 1964, 35). Algumas publicações usam redatores de ciência como " p o r t e i r o s " : os edi-tores pedem suas opiniões sobre se uma matéria de ciência d i fundida pe-lo rádio e pela T V ou por press re-lease é suficientemente impor tante para ser impressa.

As notícias cient í f icas ajudam a satisfazer outra necessidade humana: a necessidade de diversão, variedade — entretenimento. O novo conheci-mento preenche essa necessidade. A teoria da evolução de Charles Darwin, as fotografias com raios X de Roent-gen e as visões acerca do universo de A lber t Einstein capturaram as imagi-nações, proporcionaram conversas e estimularam o pensamento — não im-porta quão equivocadas — porque ofereciam idéias novas. As novas des-cobertas sobre o mundo natural em geral, quando suficientemente signifi-cativas, satisfazem uma sede de co-nhecimento da espécie humana. En-t re tanto, educar o públ ico não está necessariamente no al to das priorida-

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des dos cientistas. A lguns pensam que isso não é sua responsabi l idade. Er ic A s h b y , mestre do Clare College da Cambridge Univers i ty , certa vez pe rgun tou : " E m ú l t i m a análise, exis-te a questão de por que os cientistas dever iam c o m p e t i r c o m os cantores?" (1960 , 1166) . O cosmólogo Carl Sa-gan, depois de p roduz i r u m show am-p lamente anunc iado de as t ronomia para a televisão, f o i c r i t i cado pelos ci-entistas por ter abandonado a ciên-cia. Os edi tores geralmente não se consideram envolv idos no negócio da educação, t a m b é m .

Os pro je tos c ien t í f i cos às vezes t e r m i n a m ca indo no r i d í c u l o por cau-sa da necessidade que os meios de co-municação t ê m de variar. Os cientis-tas raramente compreendem esse tra-balho c o m leveza; para eles o f a t o de os meios de comunicação fazerem h u m o r a suas custas incomoda por m u i t o t e m p o . Mas alguns pro jetos são alvos naturais, não impor ta quão s igni f icat ivo ou insigni f icante ou quão vál ido o u quest ionável seu re-su l tado c i e n t í f i c o . Fo i o que ocor reu c o m o Dr . E r w i n O. Strassman, que se pôs em campo para pesquisar qual-quer correlação entre o tamanho dos bustos femin inos e a intel igência das mulheres ( 1 9 6 4 b ) .

Quando a matér ia apareceu no pe-r iód ico d i r ig ido à especialidade do méd ico , o t raba lho de escrever sobre aquela pesquisa f o i cair nas mãos de u m repór ter conhec ido por seu est i lo co lo r ido . O resul tado f o i uma histó-ria engraçada evocando imagens so-bre belezas desmioladas e Phi Beta Kappas sem busto. A conclusão algo

banal de que três quar tos das mulhe-res pesquisadas eram mis tura das duas f o i ignorada. O médico se quei-x o u :

Vocês usaram uma pequena obser-vação das últimas páginas, fora do contexto, e tornaram-na o tema principal da reportagem com uma manchete sensacionalista. Isto dá a impressão de que há apenas dois ti-pos de mulheres, aquelas com os peitos chatos mas com cérebros e aquelas com grandes seios e baixos Q.l's. . . para dramatizar o slogan "bustos-ou-cérebros" acrescentaram a seus artigos fotografias e entrevis-tas com estrelas de cinema bem pro-vidas de busto. Os comentários des-sas senhoras, baseados em informa-ção distorcida, tornaram minha in-

vestigação uma piada (Strassman, 1964a).

Há u m o u t r o lado da questão do n íve l de le i tura. A s impl i f icação leva-da a u m ex t remo pode alienar os lei-tores de dois modos. Pr ime i ro , por te rem as not íc ias c ient í f icas u m cor-po f i r m e e conf iável de leitores, levar a l inguagem especializada da ciência, seu jargão, a u m nível m u i t o ba ixo pode ofender os que compreendem me lhor a ciência e custar a u m veícu-lo a perda do respeito que deseja dos leitores esclarecidos. Isso pode l imi-tar a s impl i f icação onde uma publ ica-ção de ampla c i rculação, ta l c o m o The New York Times, t e m u m gran-de b loco de cientistas, engenheiros e médicos entre os seus leitores. O ou-t r o perigo é que o redator ou a pub l i -cação aliene fu turas fontes de n o t í -cias. C o m o o redator de ciência é m u i t o dependente da boa vontade e

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respeito daqueles que se encontram nas várias disciplinas científ icas, o ris-co da perda de comunicação pode inibir os redatores. Essa possibilidade com freqüência leva as publicações a designarem a redação de matérias crí-ticas a generalistas para evitar que os repórteres especializados ofendam suas fontes e para evitar também que um repórter escreva uma matéria fra-ca pelo temor de perder os contatos. Essa tática tem sido usada freqüente-mente nos esportes e assuntos poli-ciais onde os repórteres podem ficar mui to próximos ás suas fontes. Algu-mas organizações noticiosas mudam os repórteres para novos terr i tór ios regularmente, para evitar tais ocor-rências.

Redatores de ciência: quem e onde

Quem são as pessoas que escrevem sobre ciência, medicina e tecnologia? No sentido mais amplo, estas incluem qualquer um que construa suas histó-rias com t i jolos da pilha do conheci-mento desenvolvido pelas disciplinas científicas, engenharia e medicina. Is-so poderia cobrir cada redator que fa-ça uma pesquisa razoavelmente minu-ciosa para uma matéria, uma vez que a informação mais recente sobre qualquer assunto provavelmente se encontra com algum cientista da área de pesquisa. Num sentido mais restri-to, os redatores de ciência são aque-les que gastam a maior parte de seu tempo escrevendo sobre ciência ou assuntos a ela relacionados para um público que se encontra primaria-

mente fora das disciplinas científ icas. Há também alguns cientistas e médi-cos que ocasionalmente escrevem um relatório simplif icado sobre ciência, como faz o Dr. Lewis Thomas, chan-celer do Memorial Sloan-Kettering Câncer Center em Nova Iorque, em-bora a escrita não seja a sua ocupação primária. A coleção de ensaios de Thomas, The Lives of a Cell, recebeu o National Book Award, em 1974.

Na opinião do Dr. Miroslav Holub, autor de treze livros de poesia e pes-quisador de imunologia no Inst i tuto de Medicina Clínica e Experimental em Praga, Checoslováquia, o trabalho de Thomas é exemplar. " A melhor maneira de escrever sobre ciência é, na minha opinião, o ensaio cient í f i -co, por Lewis Thomas, ou seja, o en-saio que apresenta problemas selecio-nados e a maneira cient í f ica de pen-sar a respeito deles numa refinada forma l i terária" (1982-83, 21). A lém de escrever poesia, Holub edita uma revista de ciência popular, mas ope-ra sob um sistema de imprensa consi-deravelmente diferente daquele onde o fazem os escritores de ciência fora dos países do bloco autor i tár io. A educação na forma "ce r ta " de pensar nas regiões comunistas tem precedên-cia sobre o imediatismo, os assuntos em pauta e a competição. FiloSofica-mente, a not ícia não é particularmen-te prioritária.

Como essas formas polidas de se redigir ensaios levam tempo a serem conseguidas, raramente preenchem as necessidades dos leitores e redatores dos veículos de comunicação de mas-sa. Os jornalistas de ciência que te-

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nham uma coluna regular — e t e m p o para suavizar os tex tos — podem se aprox imar delas, c o m o o podem mui-t o bons e f luentes escritores.

Existe controvérs ia entre os jorna-listas c ien t í f i cos sobre aqueles dezoi-t o a v in te jornais que pub l icam sema-nalmente suplementos de ciência e saúde. U m g rupo favorece os suple-mentos por p r o m o v e r e m u m háb i to regular de le i tura e dar realce a suas matérias. 0 o u t r o sustenta que tais seções podem pr ivar os leitores diá-r ios de matérias c ient í f icas, restrin-g indo a cober tura sobre aquele assun-t o para u m dia por semana. Esses re-datores de ciência a f i r m a m que ta l concentração pode, c o m efei to, redu-zir o con teúdo da novidade c ien t í f i -ca de uma publ icação, assim como a quant idade de not íc ias que se levam ao conhec imento dos leitores.

A lguns escritores, inclusive cientis-tas, usam abordagens provocat ivas na redação c ien t í f i ca , mesmo que isso os exponha a cr í t i cas por serem irreve-rentes. Sarah B la f fer H r d y , uma an-t ropó loga que escreve para muitas re-vistas populares e semipopulares, as-sim c o m o para out ras publicações, é uma das melhores. Em seu ar t igo, " H e a t Loss" , para Science 83 (1983) , ela apanha o le i tor desprevenido c o m esta entrada d iver t ida para um tema sério: por que as fêmeas humanas não exper imen tam ciclos de " c i o s " .

"As mulheres são mesmo lamenta-velmente complicadas", queixa-se um veterinário apaixonado, na tri-logia de Alan Ayckbourn, The Nor-man Conquests. "Com outros ani-mais, bem, a maioria deles, estão ou

fora do cio ou no cio. Eu provavel-mente deveria ter nascido um cava-lo ou algo assim" (p. 73).

Alguns cientistas escrevem inteira-mente para u m mercado popu lar . 0 Dr . Isaac As imov , u m b i o q u í m i c o , é uma v i r tua l máquina de escrever. Es-creveu mais de t rezentos l ivros de ciência popular e f icção c ien t í f i ca ; ele perdeu a conta do número de ar t i -gos de revistas e jornais em sua cole-ção. En t re tan to , os redatores treina-dos em ciência cons t i tuem uma pe-quena mas crescente m inor ia dos es-cr i tores de ciência. Certa vez Earl Ubel l , bacharel em f ís ica, t rabalhan-do para The New York Herald-Tribu-ne, podia gabar-se de ser o ún ico a ter f o rmação c ien t í f i ca ent re os redato-res de ciência que c o m p u n h a m a equipe do jo rna l . Isso não é mais ver-dade. Lawrence K. A l t m a n do The New York Times t e m o grau de Mes-t re . As imov e cerca de dezenas de ou-tros membros da Nat iona l Associa-t i o n of Science Wr i ters t ê m Ph. D. O qu ímico-pesquisador I rv ing Bengels-do r f era ed i to r de ciência do Los An-geles Times antes de ir para o Jet Pro-pu ls ion Labora to ry c o m o redator técn ico especial izado; ele c o n t i n u o u a escrever uma coluna de ciência para o Los Angeles Herald.

Independentemente de t re inamen-t o , a maior ia dos redatores de ciência não t rabalha c o m o jornal istas ou nas equipes de jornais e revistas popula-res. Apenas cerca de 2 5 0 a 3 0 0 mem-bros dos mais de 1000 associados da Nat iona l Assoc ia t ion of Science Wri -ters são redatores que fazem parte da

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equipe; apenas cerca de 10% dos 1.700 jornais diários empregam reda-tores de ciência (NASW. 1983). A lém disso, a maioria dos redatores que es-crevem sobre ciência e medicina para os jornais trabalha nos maiores diá-rios metropol i tanos e regionais. Por muitos anos o Post-Bulletin, de Ro-chester, Minnesota, fo i o menor jor-nal que empregava um redator de me-dicina em tempo integral; com efei to, é publ icado na cidade onde a Cl ín ica Mayo é uma importante fon te de em-pregos e de notícias. A maioria dos jornais pequenos consegue suas no t í -cias cientí f icas através de repórteres de assuntos gerais, dos serviços tele-gráficos ou redatores de informação pública empregados por centros mé-dicos e c ient í f icos do lugar. Mui tos jornalistas c ient í f icos começaram suas carreiras cobr indo not íc ias mé-dicas e cient í f icas locais e transfor-maram esse interesse numa especiali-dade.

Embora redatores de ciência e me-dicina de tempo integral t rabalhem para revistas como Time e Newsweek, a maior parte dos membros das revis-tas trabalha para a ciência especializa-da e, pr incipalmente, publicações mé-dicas. As agências noticiosas — Asso-ciated Press, Reuters, e Uni ted Press International — empregam um pu-nhado de redatores de ciência ao re-dor do mundo. Out ro pequeno grupo de redatores c ient í f icos é af i l iado às redes de rádio e televisão, inc lu indo o Public Broadcasting System.

A maioria dos redatores de ciência de tempo integral trabalha em insti-tuições tais como universidades, hos-

pitais, organizações de ciência e saú-de, governo e comércio, e agências de relações públicas. Podem trabalhar para uma organização que emita press releases, boletins noticiosos, jornais, revistas, scripts de televisão ou outros t ipos de informação sim-ples das áreas c ient í f ica e médica pa-ra distr ibuição aos veículos de comu-nicação, pacientes de hospitais, mem-bros de associações, empregados e acionistas, contr ibuintes ou qualquer ou t ro t ipo de públ ico que possa ofe-recer benef íc io comercial ou institu-cional a part i r do contato públ ico. O mesmo padrão de emprego se man-tém para os cerca de 3.000 membros da Amer ican Medicai Writers Associa-t ion , cujo quadro de associados ultra-passa consideravelmente o da NASW, e para a menor Av ia t ion and Space Writers Associat ion, as organizações de redatores sobre meio ambiente e energia e várias associações de reda-tores agrícolas.

O número de membros desses gru-pos de redatores se expande e se con-trai segundo as condições econômicas e as crises de comunicação que de-mandam redatores com conhecimen-tos e contatos especializados. Os re-datores de ciência mudam para essas especialidades mais novas à medida que o mercado pede. As associações do meio ambiente nasceram da apro-vação de legislação para reduzir a po-luição do ar e da água. Escrever sobre energia tornou-se uma especialidade organizada na década de setenta com a escassez de petróleo ocorr ida quan-do os países estrangeiros reduziram sua exportação para os Estados Uni-

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dos. Da mesma forma, com a redução do programa de exploração espacial dos E U A nos anos setenta, o quadro de membros d im inu iu na associação de redatores sobre espaço. Temendo a imagem de influência comercial in-devida, a maior parte das organiza-ções de notícias técnico-cientí f icas realizam um contro le através do gru-po de membros "a t i vos " que escre-vem diretamente para leitores ou es-pectadores. Os educadores, funcioná-rios de informação do governo em agências orientadas para a ciência e o pessoal de relações públicas geral-mente têm status de "sóc io " . Isso im-pede seu acesso por votos, ao contro-le, da organização, que preserva a in-dependência do jornal ismo da domi-nação por aqueles redatores de ciên-cia pertencentes a organizações não-noticiosas. Tais restrições são irr i tan-tes e f reqüentemente produzem con-f l i t o dentro das organizações. Os es-critores de ciência incluem uma gran-de proporção de free-lancers entre seus membros. Por receberem grati f i -cações maiores que a média devido ao seu conhecimento especializado e tendo em vista a grande quantidade de publicações médicas que funcio-nam à base da publ icidade da indús-tr ia farmacêutica, os redatores c ient í -f icos e médicos prosperam como free-lancers onde mui tos outros reda-tores mal conseguem se arranjar. A l -guns free-lancers t rabalham principal-mente para escritórios de relações pú-blicas e informações. Muitos redato-res de ciência para os meios de comu-nicação também trabalham em regi-me de free-lancer como redatores de

ciência e tecnologia para livros e art i-gos de revistas.

Os escritores de ciência parecem ser um grupo excepcionalmente mó-vel. Segundo a NASW, por exemplo, cerca de vinte por cento de seus membros mudam de emprego ou en-dereço a cada três meses (NASW, 1983).

Geograficamente, os redatores de ciência tendem a ser um grupo do les-te e urbano. New Y o r k Ci ty , Boston e seus subúrbios contêm grandes nú-meros por causa das importantes ins-t i tuições editorais e cient í f ico-edu-cacionais existentes nessas áreas me-tropol i tanas. Washington, D. C., leva uma outra faixa a escrever sobre po-l í t ica c ient í f ica e pesquisa nos Natio-nal Institutes of Health (NIH) e ou-tras entidades do governo na área. A American Medicai Writers Associa-t i on tem seu quartel-general numa ci-dade próx ima, Bethesda, em Mary-land. Muitos redatores de Washington trabalham para instituições governa-mentais e associações médico-cientí-f icas. O Journal of the American Me-dicai Association, por exemplo, tem um redator especializado em pol í t ica e ciências físicas e naturais e o u t r o cobr indo os N IH . Outros redatores de ciência são designados para os es-cr i tór ios de importantes organizações noticiosas de Washington, incluindo The New York Times, Associated Press, Uni ted Press Internat ional , Ti-me, Newsweek e Business Week — McGraw-Hi l l Wor ld News.

A Cal i fórnia, pr incipalmente ao redor de Los Angeles e São Francis-co, também abriga um grande núme-

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ro de redatores de ciência que escre-vem para os maiores jornais da área, instituições do governo, centros mé-dicos de universidades e outros, a in-dústria aeroespacial e um crescente número de revistas especializadas nes-se e em outros assuntos. Chicago, en-quanto um centro de publicações co-merciais, pesquisa estatal e privada, pesquisa de saúde e medicina, produ-ção de drogas, e universidades, pro-porciona uma base para muitos ou-tos redatores científ icos. As concen-trações de redatores de ciência são mui to di luídas em outros lugares; o Texas, com a terceira maior popula-ção estadual t inha apenas uma dúzia de redatores de ciência relacionados na NASW em 1985.

Como eles chegaram lá?

Como tem sido registrado através de sua história, os redatores de ciên-cia vêm de todas as partes e forma-ções educacionais. Não existe um programa de treinamento reconheci-do ou exigências para o licenciamen-to desses profissionais. As interpreta-ções da cláusula de "imprensa l ivre" da Primeira Emenda da Constituição americana af i rmam que os jornalistas não podem ser controlados através de licenciamento. Nos países autoritá-rios, a qualidade de membro em um ou mais "s indicatos" reconhecidos é requerida antes que você possa traba-lhar. Alguns países podem exigir cre-denciais oficiais, tais como a gradua-ção em uma escola aprovada pelo go-verno. Algumas associações america-nas de escritores profissionais exigem

um ano ou mais de experiência para novos membros.

Se existe uma exigência a ser cum-prida de maneira a poder se redigir ci-ência (para que o sucesso possa ser assegurado), esta provavelmente resi-de na educação. A divisão mais geral-mente reconhecida entre os redatores de ciência encontra-se na formação ou no treinamento educacional. Os campos cient í f icos apóiam-se forte-mente na apresentação de credenciais para admissão; graus mais avançados trazem status. O status para jornalis-tas pode vir da organização de coleta noticiosa, e as fontes de notícias ge-ralmente lidam mais abertamente com alguém de status igual do que com alguém em quem percebam um status inferior. A rede de televisão e o The New York Times, por exem-plo, comandam a atenção de todos a não ser os mais arrogantes.

O treinamento em ciência, o co-nhecimento e credenciais proporcio-nam autoridade. A venda de artigos para publicação em cadeia, contendo conselhos médicos tem sido a maté-ria-prima do jornalismo americano por muitas décadas. Donna Buys, en-fermeira diplomada e escritora free-lancer, alcançou o sucesso escrevendo sob seu próprio nome ou sob uma co-autoria partilhada por outros profis-sionais de saúde, incluindo médicos. É preciso ter credenciais e treinamen-to para escrever artigos semitécnicos para muitas revistas especializadas.

Embora alguns redatores tenham sido originalmente treinados como ci-entistas, a maior parte dos escritores de ciência vem das artes liberais e do

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jornal ismo. Três t ipos de redatores de ciência ocuparam o campo através dos úl t imos sessenta anos. Após a I Guerra Mundial predominavam os re-pórteres gerais, com freqüência sem t re inamento universitário. Simples-mente cobr iam o que passava por seu caminho. Algumas pessoas eram de-signadas principalmente para a cober-tura de ciência. O número de redato-res c ient í f icos aumentou no per íodo após a II Guerra Mundial , através do mecanismo de editores-chefes que de-signavam alguém com compromisso ou com interesse em ciência ou me-dicina para fazer contatos com pes-soas na comunidade c ient í f ica. Os editores perceberam que seus traba-lhos seriam mais fáceis com alguém que conhecesse editoração e redação. Os editores se desesperavam ao ter que ensinar a cientistas e médicos co-mo substituir o jargão técnico por pa-lavras ou idéias concordantes com a sua percepção do que seria um "ho-mem c o m u m " . A maioria desses re-datores de ciência aprendeu seu tra-balho em serviço e apoiava-se nos poucos cursos de ciências que fize-ram na universidade e em leituras que realizaram depois. Também recebiam ajuda de seminários e briefings ofere-cidos por associações médicas e cien-t í f icas. Muitos jornalistas consideram tais sessões como formas mal-disfar-çadas de obter publicidade.

A educação em ciência pode aju-dar um redator a se especializar, mas pode colocá-lo numa posição estra-nha como jornalista profissional. Os editores têm relutância em criar espe-cialistas em suas publicações, espe-

cialmente em jornais. Tornar-se um redator de ciência de tempo integral pode exigir um estágio em reporta-gem geral ou redação, por um ano ou mais, numa publicação menor, antes de ir para uma publicação com espe-cialistas em ciência. Os controles or-çamentários dos jornais menores for -çam os editores a usarem poucas pes-soas para cobr i rem os vários t ipos di-ferentes de fatos que acontecem mes-mo na menor das comunidades. Os editores também combatem a idéia de ter especialistas capturados ou "co-op tados" para se tornarem advogados de pessoas ou pontos de vista que no-t ic iam regularmente. Os editores têm décadas de experiência nisso, em áreas tão estabelecidas como esportes e pol íc ia. Assim, desenvolver experi-ência em redação c ient í f ica depende mu i to de quão bem um redator gera histórias sobre ciência e medicina en-quanto está cobr indo outras maté-rias. A chave do jornal ismo de rádio e T V , de jornais e revistas está na for-ma como uma matéria é apresentada, e com que freqüência. As credenciais valem alguma coisa, mas não são tu-do. Os editores ainda querem boas matérias.

O sucesso da União Soviética com o Sputn ik fo i um momento decisivo para o jornal ismo c ient í f ico . A Co-lumbia University persuadiu as fun-dações Sloan e Rockfel ler a f inancia-rem programas de t re inamento cien-t í f i c o para jornalistas em meio de carreira com experiência em reporta-gem sobre ciência básica. 0 programa Nieman Fel low, da Harvard, que en-corajava o estudo das ciências, deu

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corpo a este pro je to . Nos anos 1960, outras universidades in ic iaram cursos ou programas de reportagem especia-lizada em ciência, meio ambien te e energia, enfa t izando os aspectos fo r -mais técnicos, econômicos, sociais e histór icos da ciência. O M I T oferece t re inamento de meio de carreira para um grupo selecionado de candidatos a escritores de ciência. Ass im, os es-cr i tores de ciência inc luem hoje u m grande número de pessoas c o m mais t re inamento fo rma l sobre ciência ci-en t í f i ca em seu passado, i nc lu indo mais habi l idade de avaliar c r i t icamen-te as provas estatíst icas e out ras evi-dências que os cientistas o ferecem para suas descobertas.

E n t r e t a n t o , a fami l ia r idade às ve-zes afeta a objet iv idade. A lguns edi-tores, pesquisadores de jo rna l i smo e sociólogos da ciência se p reocupam com o f a t o de que o cond ic ionamen-t o menta l necessário para a especiali-zação em ciência faz c o m que o reda-to r de ciência dos meios de comun i -cação seja menos capaz — ou dispos-t o — a ver falhas nas at ividades da co-munidade c ien t í f i ca . A exper iência demons t rou há m u i t o t e m p o as ten-dências dos especialistas de adotarem at i tudes, roupas, padrões e discursos das pessoas que cobrem. Os redatores de esportes deslizam para a g í r ia , re-pórteres pol ic iais agem c o m o t iras e os redatores do State Depar tmen t e dos negócios ado tam a postura carac-ter ís t ica de seus ambientes.

Os jornal istas de ciência t ê m admi-rado t a n t o os cientistas que a Dra. D o r o t h y Ne lk in , professora nos De-par tamentos de Ciência, Tecnolog ia e

Sociedade, e Sociologia na Cornel l Un ivers i ty , surpreende-se c o m os re-latos de c o n f l i t o entre cient istas e jornal istas. A idealização da ciência e dos cient istas é endêmica nos escritos dos jornal istas. Os jo rna is , apon ta ela, con t ra tam cr í t i cos de p o l í t i c a , de ar-tes e ou t ros campos, mas não de ciên-cia. Ela escreve:

Enquanto os redatores de política criticam e analisam, os redatores de ciência elucidam e explicam. . . . E tudo isso leva-me a duas perguntas: Por que a redação de ciência é tão pouco crítica em relação à ciência? E por que os cientistas são tão crí-ticos para com a imprensa, tão con-vencidos de sua intenção anticién-cia? (1984b, 4)

Uma recente pesquisa ent re reda-tores de ciência, realizada por Conrad J. S torad, indica um grande n ú m e r o de jornal is tas de ciência incl inando-se para uma postura mais c r í t i ca e anal í -t ica. Enquan to a demograf ia geral de Storad mostra que os redatores de ciência t endem a estar no i n í c i o da meia- idade, são a l tamente educados e c o m m u i t a experiência em repor ta-gens, aqueles que desejam avaliar o efe i to social e econômico da ciência t endem a ser mais jovens e mais sin-ton izados c o m a repor tagem mais p ro funda . Freqüentemente são pro-dutos da ciência universi tár ia e de cursos de redação c ien t í f i ca .

Escrever sobre ciência não const i -t u i obs tácu lo ao avanço da carreira. Não é uma estagnação do jo rna l i smo. Os edi tores Michael 0 ' N e i l l , do New York Daily News, J o h n T r o a n do Pittsburgh Press e Marv in S tone do U.

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S. News and World Report v ieram da exper iência com noticia'r ios c ien t í f i -cos. 0 mesmo acontece c o m Howard S imons, à f ren te do programa Nie-man e ant igo ed i tor -chefe do The Washington Post, e Ab iga i l T r a f f o r d B re t t , uma assistente de edi tor -chefe do U. S. News and World Report. Da-v id Hend in passou de ed i to r e colu-nista de ciência a vice-presidente do U n i t e d Features Syndicate and News-paper Enterpr ise Assoc ia t ion.

Gerard Piei, publisher do Scientific American de i xou seu t raba lho c o m o ed i to r de ciência da revista Life para const ru i r o Scientific American. Em 1985, a Amer i can Assoc ia t ion fo r the Advancement o f Science empossou Piei c o m o seu presidente, o p r ime i ro jornal is ta de ciência a encabeçar a maior entre as organizações c ien t í f i -cas. Mas os caminhos de carreira para as suítes execut ivas, tais como são nos jornais e revistas, dependem mais de c o m o você se relaciona c o m assun-tos mais amplos da sociedade e admi-nistração de publ icações — e sorte — do que de sua especialidade. Exata-mente c o m o mu i tos grandes editores e repórteres gostam de exercer o jo r -nal ismo em pequenas cidades ou co-munidades, mu i tos escritores de ciên-cia satisfazem-se em passar suas vidas

fazendo cober tura de assuntos e pes-soas que lhes interessam. Na persegui-ção de seus interesses eles se equipa-ram a mui tos cientistas que preferem a pesquisa à adminis t ração.

Experiências

1. Descubra em sua biblioteca jornais e revistas, principalmente dos principais cen-tros populacionais que tenham sido edita-dos por volta da virada do século. Encon-tre uma matéria de ciência ou medicina da época e compare-a com uma matéria de ciência atual.

2. Encontre um artigo científico para cada cinco anos de 1890 a 1950. Você reconhe-ceu os nomes dos cientistas do final do sé-culo dezenove? E quanto aos cientistas e aventureiros de 1900 a 1950? Procure-os nas histórias ou enciclopédias de ciência e relate o que realizaram.

3. Procure no Readers' Guide to Periódi-ca! Literature ou nos primeiros volumes do The New York Times Index que assuntos eram tratados como ciência na época.

4. Entreviste um de seus antigos professo-res de ciência ou um estudante graduado em ciência sobre sua postura em relação à popularização da ciência. O que pensa so-bre a redação científica para jornais? Ele precisa ou deseja saber sobre outros cam-pos da ciência? Qual é a atitude em relação à compreensão pública da ciência? Pode o seu cientista sugerir maneiras de melhorar o conhecimento público da ciência?

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Capítulo 3

Escolhendo notícias de ciência

A ABUNDANTE INFORMAÇÃO SOBRE ciência, medic ina, engenharia e tec-nologia pode ser sufocante. Toda ela interessa • po tenc ia lmente a a lguém, em a lgum lugar. Escolher entre as produções de centenas de milhares de cientistas é uma das tarefas mais d i f í -ceis para o ed i tor e o redator de ciên-cia. Os redatores de publ icações co-m o The New York Times e The Washington Post recebem a cada dia uma enorme p i lha de publ icações, re-latór ios e releases c ien t í f i cos de uni-versidades e inst i tu ições.

A o mesmo t e m p o , agências do go-verno federal , estadual e local pro-põem, e fe tuam ou a l teram diar iamen-te os regulamentos e a p o l í t i c a públ i -ca de saúde e segurança. Mesclados a t u d o isso há choques entre personali-dades, planos conf l i tan tes , solicita-ções de f i nanc iamen to à custa do di-nhei ro púb l i co e temas de pr ior idade. As indústr ias baseadas na ciência ali-m e n t a m essa to r ren te de in fo rmação com declarações de novos p rodu tos e processos. A natureza t a m b é m t e m o seu papel o ferecendo novas doenças, inundações inesperadas, erupções vul-cânicas, t e r remotos e ou t ros fenôme-nos de escala espetacular. Escolher qual a pequena parte de todos esses acontec imentos que merece ser publ i -cada é u m i m p o r t a n t e aspecto da ta-refa de u m jornal is ta c i e n t í f i c o , seja

ele ed i to r , redator , c o m u n i c a d o r ra-d i o f ô n i c o ou de televisão, ou especia-lista em in fo rmação. Os cient istas são m u i t o c r í t i cos a respei to de c o m o os jornal istas fazem isso.

Esse aspecto d o jo rna l i smo tam-bém intr iga os cientistas. Estudos in-d icam que os cientistas que t ê m mui -tos conta tos entre os prof iss ionais dos meios de comunicação de massa não p o d e m prever me lhor o que os jornal istas farão de sua pesquisa, do que aqueles que têm pouco acesso aos veículos de comunicação (Ryan , 1982) . Mas os cient istas provavel-mente sentir iam-se desconfor táveis se descobrissem que a decisão sobre o que é n o t í c i a intr iga os jornal is tas e publ ic istas quase t a n t o q u a n t o ás suas fontes.

Julgar bem a impor tânc ia das no-t íc ias faz parte do processo de t o m a -da de decisões do jorna l is ta bem-suce-d ido . Compreender alguns dos cr i té-r ios que de te rm inam o valor no t ic io -so irá ajudar a desenvolver o julga-m e n t o das not íc ias. O jogo segue as regras estabelecidas pelos ve ícu los de comunicação. C o m o u m redator de medic ina disse de u m méd ico conhe-c ido seu: " N ó s chegamos a u m acor-do. Ele dec id i rá q u a n d o seus pacien-tes estão doentes. Eu decid i re i quan-do são n o t í c i a . "

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Critérios tradicionais para a escolha de notícias

Em parte, a escolha do que deve ser publicado é feita por um consen-so de redatores e editores. Não há re-gras restritivas, embora haja uma con-cordância geral sobre os fatores leva-dos em consideração na decisão. Al-guns fatores são baseados na tradição e outros são de origem mais recente. O capricho também tem o seu lugar: um editor ou redator simplesmente gosta de escrever ou ler sobre um as-sunto, e por isso assume que os ou-tros também irão gostar. Às vezes o bom estilo pode superar na balança outros fatores detratores. Em geral, senso de oportunidade, " t i m i n g " , im-pacto, significado, pioneirismo e inte-resse humano são importantes. A va-riedade e o conf l i to também são con-siderações.

SENSO DE OPORTUNIDADE. Com algumas exceções, os profissionais da área de comunicação não di fundem conscientemente informação velha. Se sabem que algo fo i divulgado pre-viamente e novos desenvolvimentos não ocorreram, irão procurar outra história. Entretanto, o senso de opor-tunidade na reportagem cient í f ica significa mais do que simplesmente imediatismo. Pode acontecer hoje um evento que requeira uma olhada nas notícias de ontem. Por exemplo, um cientista pode ser entrevistado sobre um tópico antigo simplesmente por-que um pesquisador entrega hoje um trabalho numa reunião de especialis-tas. O evento de hoje proporciona

um "gancho not ic ioso" no qual pen-durar a história.

A lém disso, o que parece uma no-t íc ia de ontem pode não sê-lo. Por causa de atrasos na publicação cientí-f ica, a informação pode ter vários meses ou mesmo anos de idade, mas merece uma matéria quando um res-peitado jornal c ient í f ico aparece ho-je contendo o relatório da pesquisa. Com efeito, você pode apanhar jor-nais de domingo ou segunda-feira e encontrar ao menos uma matéria di-gerida das últimas edições do Journal of the American Medicai Association, The New England Journal of Medici-ne, ou da revista Science. A liberação da publicação é o furo noticioso. Co-mo os fins de semana são notoria-mente dias fracos de notícias, os edi-tores dessas revistas distribuem al-guns exemplares para os serviços tele-gráficos, jornais e outros veículos. Os jornalistas de ciência às vezes questio-nam se cada edição desses e outros jornais contém ou não uma história relevante, mas eles oferecem histórias que preenchem os padrões tanto de confiabil idade quanto de oportunida-de. Como a data de publicação de um dado trabalho c ient í f ico geralmente é conhecida pelo autor, os funcionários de relações públicas das universidades tentarão alertar os veículos de comu-nicação através de chamadas telefôni-cas ou com press releases sobre a pu-blicação iminente.

" T I M I N G " . Int imamente relacionado com o senso de oportunidade está o " t i m i n g " . Um assunto pode ser rele-vante na opinião de redatores e de

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editores, se estiver ligado a algum evento estranho à ciência. Assim o re-dator pode publicar no Natal uma matéria baseada em uma nova pesqui-sa psicológica sobre a melancolia na-tal ina. Cada inverno, vê também os redatores c ient í f icos se aprofunda-rem em temas como o andamento das pesquisas sobre condições meteo-rológicas, gripe e o d i to resfriado co-mum. Tal material teria menos signi-f icado para os leitores no Quatro de Julho.

IMPACTO. O impacto é ou t ro fator determinante do que publicar. Mui-tos editores dizem que a melhor ma-téria é aquela que afeta maior quant i-dade de leitores. Uma história c ient í -f ica t r iv ial pode vir a ser publicada em todo o mundo quando os redato-res e editores percebem que irá inte-ressar u m grande segmento de seus leitores. As pesquisas sobre sexo e muitos outros relacionamentos hu-manos já trazem o seu própr io públ i -co. A pesquisa médica obtém atenção porque as pessoas universalmente re-conhecem a doença como uma amea-ça. Se t iverem de escolher entre ma-térias médicas, a maioria dos redato-res e editores irá escolher as que ver-sam sobre câncer, doenças do cora-ção, ou outras igualmente letais em det r imento das que t ra tam de afl i-ções menos graves. Uma doença mor-tal pu debi l i tante pode não merecer atenção especial tanto da ciência quanto dos veículos de comunicação quando o número de pessoas afligidas por ela é pequeno demais para cha-mar a atenção dos jornalistas ou da-

queles que distr ibuem as verbas de pesquisa.

S I G N I F I C A D O . O signif icado, como é visto por redatores e editores, tam-bém cont r ibu i para a decisão de po-pularizar um tóp ico c ient í f i co . Mui-tos redatores de ciência perdem suas histórias porque não conseguem mos-trar aos seus editores que o assunto tem significado para o públ ico em ge-ral. Jerry Bishop, do The Wall Street Journal, escreve sobre pesquisa bási-ca, part icularmente em campos mé-dicos, e consegue ser publ icado por-que defende um ponto de vista pes-soal sobre saúde ou economia para seus leitores, dentro da matéria. Com freqüência esta é uma das tarefas mais dif íceis para um redator de ciên-cia quando os pesquisadores f icam re-ticentes em especular as aplicações potenciais de sua pesquisa.

A maioria dos jornais, por exem-plo, ignorou as primeiras tentativas de transplantar material genético de células de outras espécies vivas para células de bactérias. Como os cientis-tas disseram pouco sobre as implica-ções do t rabalho, os redatores fo ram incapazes de estabelecer o que mui-tos chamam "parágrafo de significa-d o " em suas matérias sobre os trans-plantes de genes. A frase "engenha-ria genética" ent retanto, ent rou no vocabulário c o m u m quando os cien-tistas e os industriais começaram a fa-lar mais l ivremente sobre os riscos e benefícios de usar essa técnica para manufaturar insulina humana e ou-tros produtos qu ímicos com bacté-rias contendo os genes ou plasmídeos

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transplantados. A técnica também to rnou possível a produção do inter-feron, um produto q u í m i c o de ocor-rência natural com potencial para combater doenças. Pela primeira vez desde que a substância fo i descober-ta quase t r in ta anos antes, os cientis-tas puderam obter quant idade sufi-ciente do p rodu to qu ím ico para tes-tar seus usos possíveis. Transplantes de células de tecido humano conten-do fragmentos de ácidos nucléicos produtores de hormônios promete-ram remédios potenciais para algu-mas doenças genéticas. Uma vez que os cientistas reconheceram essas pos-sibilidades, os redatores puderam ex-plicar para o públ ico em geral o que parecia, inicialmente, um belo t ruque de laboratór io, com significado ape-nas para os cientistas.

0 significado de alguma coisa para a ciência, mais até do que para os lei-tores, pode fazer com que uma maté-ria seja publicada. A descoberta de u m novo fenômeno, tal como um "buraco negro" , ou a conf i rmação de algum evento ou fenômeno predi to por uma das grandes teorias, tal co-mo ondas de gravidade, são exemplos disso. Estas acendem nossas imagina-ções embora não afetem diretamente nossas vidas, desde que o redator ci-en t í f i co reconheça a história ou con-vença o pesquisador a explicar.

PIONE1RISMO. Pioneir ismo e singu-laridade trazem em si a novidade, o f u r o not ic ioso que os cientistas às ve-zes amaldiçoam. Ser o pr imeiro em uma descoberta ou teoria é o objeti-vo da pesquisa. Os primeiros são no-

t íc ia. Às vezes a compet ição entre ci-entistas para obter os direitos do pri-meiro crédi to chega a se aproximar do não-ético, como fo i mostrado por James D. Watson em The Double Helix (1968), um relato de como Watson e Francis Crick descobriram a estrutura da molécula de A D N . Por ou t ro lado, ser o pr imeiro pode não levar à aclamação universal. Quando os cientistas do M I T realizaram uma Conferência de imprensa para anun-ciar a sua criação do pr imeiro gene art i f ic ia l , outros cientistas cr i t icaram os meios de comunicação por dar a este assunto tanta publicidade. Na vi-são desses cr í t icos, o crédi to deveria ter sido dado àqueles que descobri-ram as técnicas bioquímicas que tor-naram possível a construção dos ge-nes. Esse fo i o verdadeiro t ruque.

A singularidade, como cr i tér io no-t ic ioso, f reqüentemente traz uma ar-madilha em si sempre que se escreve sobre ciência. A ciência como méto-do apóia-se na capacidade de um ex-perimentador duplicar os resultados de out ro . Não conseguir obter resul-tados semelhantes tem compromet i -do vários casos. À incapacidade de outros pesquisadores em obter resul-tados preditos pode indicar técnicas de pesquisa falhas, uma experiência mal realizada, ou meramente u m evento de ocorrência única — uma aberração que não pode se esperar que ocorra ou seja observada geral-mente. Tais coisas como cobras de duas cabeças ou mutações bizarras em plantas expostas a pesada radia-ção são estranhezas que os jornalistas adoram, mas elas cheiram a sensacio-

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nalismo, no mundo da ciência. Não se trata de testar a previsibil idade dos resultados contra uma teoria confiá-vel. Alguns cientistas franzem a testa quanto a dar publ icidade a uma "p r i -mei ra" descoberta; eles preferem que uma duplicação por ou t ro cientista ocorra antes que as matérias sejam es-critas. Mas para os jornalistas, isso iria entrar em con f l i to com os crité-rios do senso de opor tunidade, uma vez que alguns experimentos levam anos e outros nunca são dupl icados, ou a duplicação jamais é tentada. A solução dos jornalistas é escrever a matéria.

INTERESSE H U M A N O . O interesse humano, ou t ro cr i tér io not ic ioso, é encontrado em matérias que apelam às emoções. Mas usar essa abordagem de sentimentos está potencialmente em con f l i t o com as tentativas dos cientistas de apresentar uma visão objetiva e desapaixonada de seu tra-balho. U m exemplo dessa abordagem implicaria em tentar extrair de u m ci-entista citações que refletissem o jú-bi lo, fadiga ou outros aspectos visce-rais da pesquisa. U m redator pode es-colher contar uma história através da pessoa ao lidar com um material mu i to abstrato. O interesse natural das pessoas por outras leva alguns re-datores a abordarem todas as maté-rias desse modo.

O interesse humano é freqüente-mente usado em esforços envidados para levantar d inheiro. 0 pessoal de relações públicas e os jornalistas ape-lam para a compaixão do leitor quan-do usam, em suas histórias, uma cri-

ança doente, aleijada ou excepcional. É uma técnica comumente usada por organizações privadas ou em audiên-cias diante de comissões do Congres-so quando os orçamentos federais pa-ra pesquisa estão sendo discutidos. Descrever uma v í t ima sofredora que representa os milhares ou milhões de pessoas que sofrem do mesmo mal provoca uma resposta mais fo r te que as estatísticas. U m cientista, bastante necessitado de fundos para pesquisa, propôs u m longo programa de televi-são para levantar contr ibuições para pesquisa básica.

Há, também, as histórias sobre animais. Os macacos enviados para testar as primeiras naves espaciais const i tu í ram o que os redatores cha-mam de "boa matér ia" . Bebês de f o -cas, águias, caracóis corredores, lo-bos, cavalos selvagens e outros con-quistam a atenção dos meios de co-municação. A questão dos animais uti l izados em pesquisas é part icular-mente sensível entre os proponentes dos direi tos dos animais. Sabe-se que eles ar rombam laboratórios e l iber-tam os animais. Cientistas que t raba-lham com cães, macacos e outros ani-mais têm desconfianças em relação a matérias que podem reflet ir abusos reais ou imaginários de animais.

Relacionado à história de interesse humano está o perf i l da personalida-de. As pessoas gostam de ler sobre outras pessoas. Quando o t rabalho de um cientista tem significado e impac-to , ou proporc iona reconhecimento ou fama, tal como o Prêmio Nobe l , os redatores de ciência podem achar mais fácil centrar suas histórias na

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fo rma pela qual a pessoa trabalha em ciência. Os subterfúgios, hobbies, ou outros interesses não-cientí f icos que as pessoas têm podem ajudar o reda-tor a mostrar o cientista como um ser humano afetuoso, minucioso, às ve-zes falfvel, buscador, f reqüentemente fa l ível , com o qual os leitores e es-pectadores podem se identi f icar. Uma audiência pode não entender a ciência mas apreciará a pessoa. Ü Dr. Paul de Kru i f descobriu, por volta de 50 anos atrás, com que eficiência as histórias sobre Pasteur e outros pio-neiros podiam ser contadas através do drama humano de suas vidas na busca de verdades cientí f icas. Suas histórias formaram uma das séries de maior sucesso jamais publicadas pelo Reader's Digest.

Com efeito, tem mais no mundo da pesquisa c ient í f ica do que sua co-ta de personalidades coloridas, fortes, distintas, e mesmo egoístas. Entre-tanto , o modo pelo qual os cientistas apresentam sua pesquisa enfatiza a metodologia estéril e minimiza os fa-tores humanos envolvidos, incluindo erro, acidente e sorte. As reportagens cientí f icas detalham pouca coisa da história da descoberta, quase nada a respeito dos passos mal dados que dist inguem caminhos sem saída da-queles que levam a novas percepções. O estilo impessoal exigido do relato c ien t í f i co normal é seco e aborreci-do, cont r ibu indo para que se vejam os cientistas como fr ios e negligentes. Entretanto, para um cientista, parti-cularmente um cientista jovem, fazer revelação demais à imprensa ou pare-cer irreverente demais quanto ao pro-

cesso e à metodologia leva à cr í t ica dos mais velhos quanto a parecerem não acreditar na ciência. No fo lc lore não-documentado da ciência há mui-tas histórias de cientistas cujo avanço profissional fo i atrapalhado pela pu-blicidade sobre seu trabalho. No mundo da medicina, a inveja profis-sional pode trazer a censura, acusa-ções de publicidade anti-ética e mes-mo a perda da licença.

No entanto, há histórias maravi-lhosas por trás da exploração do lado humano da ciência. O Dr. Gustave Ekstein, o grande neurocirurgião. e professor da University of Cincinnat i , era uma autoridade mundial em peri-qui tos e deixava centenas desses pás-saros voarem livremente por sua casa. Outros fazem o impossível para es-conder todos os aspectos de suas vi-das além de sua atividade profissio-nal. Os colegas provavelmente podem ajudá-lo a desenvolver tal informação pessoal.

A sorte tem sua parcela na ciência de sucesso. Como W. B. Gratzer da Cell Biophysics Uni t do Medicai Re-search Counci l , da Inglaterra, apon-t o u : " A f i n a l , descobertas mais valio-sas do que alguém se atreveria men-cionar tem sido o resultado de obser-vações acidentais de experiências mal concebidas, conduzidas por incompe-tentes" (1984, 17). Talvez mais cien-tistas seriam mais bem recebidos se fossem compreendidos como tendo a rapidez de reconhecer a importância do inesperado.

C I E N T I S T A S CÉLEBRES. Uma pa-rente do perf i l de personalidade é a

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entrevista de uma celebridade ou au-tor idade. Poucos cientistas são tão re-conhecidos pelo nome ou pelo rosto quanto os atores ou outras pessoas que consideramos celebridades. Eins-tein talvez tivesse sido uma exceção. Por ou t ro lado, há um grande núme-ro de cientistas cujos escritórios e/ou realizações projetam status e poder. O secretário da Smithsonian Insti tu-t ion , o presidente da National Acade-m y of Sciences, os vencedores do No-bel ou outros prêmios importantes, os funcionár ios executivos da Amer i -can Association for the Advancement of Science, American Chemical So-ciety, Amer ican Inst i tute o f Physics, National Institutes of Health e outros podem atrair a atenção dos veículos de massa como "cientistas visíveis" a quem esses veículos pedem para falar em nome da comunidade c ient í f ica. Seus nomes conferem mais respeita-bil idade e consideração a uma pesqui-sa. O q u í m i c o Linus Pauling, Prêmio Nobel, por exemplo, defendeu com algum sucesso o uso de doses maciças de vi tamina C como remédio, uma postura vista ceticamente por muitos de seus colegas. Tais pessoas mere-cem atenção por seus pontos de vis-ta e pela sua compreensão das repre-sentações do poder.

P R O X I M I D A D E . A proximidade é ou t ro dos valores tradicionais da no-t íc ia. Quanto mais perto os leitores e espectadores estão do local de um evento, mais provável que eles e os editores o considerem de interesse noticioso. Assim, milhares de pessoas morrendo durante uma enchente na

China recebem menos espaço not ic io-so do que uma enchente local que não mata ninguém. Isso tem vários aspectos dos quais o redator de ciên-cia deve estar consciente. Esses aspec-tos cont r ibuem para tornar as rela-ções entre cientistas e jornalistas mui-to sensíveis. Primeiro, a significação da proximidade pode superar a signi-ficação para a ciência. Os meios de comunicação em países vastos como os Estados Unidos e o Canadá são mu i to l imitados pela distância. A rá-d io F M e os sinais de tevê atingem apenas uma distância l imitada da ci-dade, não importa qual a capacidade que as estações instalam ou a que al-tura elevam suas torres para expandir a sua linha do horizonte. A maioria dos jornais pode distr ibuir com lucro cópias de cada edição apenas dentro de uma área l imitada. 0 l imi te é fre-qüentemente def in ido pelo local on-de encontram out ro jornal fo r te , faci-lidade de transporte, terreno, e pa-drões comerciais. Geralmente esse máx imo se estende a algumas cente-nas de qui lômetros, da cidade de pu-blicação, quando mu i to . Individual-mente, os veículos devem desenvol-ver leitores e ouvintes leais em núme-ro suficiente para proporc ionar um mercado para os anunciantes locais, caso contrár io irão à bancarrota. Es-tudos sobre esses leitores e ouvintes indicam que os veículos devem trazer informações sobre eventos locais ou regionais para manter o púb l ico em seus terr i tór ios.

O desejo de atenção por parte das tevês de rede e cabo, do rádio, das re-vistas nacionais e de alguns poucos

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jornais nacionais, tais como The Wall Street Journal e USA Today, obscu-rece muitas das implicações geradas pelo fato de que a maioria dos veícu-los é local. Uma conseqüência disso é que um cientista de uma universidade local, ao expor um trabalho numa reunião na cidade ou fora dela, pode receber cobertura noticiosa mesmo que o assunto e o interesse pelo au-mento de conhecimento c ient í f i co sejam mín imos. Provavelmente o es-cr i tó r io de relações públicas da uni-versidade irá informar à imprensa e â míd ia eletrônica local sobre o evento, talvez até mesmo proporcionar um sumário do t rabalho ou artigo de jor-nal. Tanto a universidade como os veículos noticiosos têm interesse em manter cobertura das pessoas locais e suas atividades. Esse interesse pode superar o peso da importância c ient í -f ica da pesquisa.

Segundo, a ocorrência de um evento especial pode testar e afiar as habilidades de u m redator. Quando uma organização c ient í f ica ou médi-ca local, estadual ou nacional se reú-ne numa cidade, os veículos locais irão relatar a reunião. Isto leva jorna-listas das mais variadas origens, expe-riências e habilidades ao contato com cientistas especializados. Mesmo nas cidades de 500 mi l habitantes ou mais, um repórter de assuntos gerais ou algum com uma especialização não-cientí f ica pode receber a tarefa de redigir a matéria. Quanto menor a cidade, mais generalizadas as tarefas dos repórteres. Algumas cidades mui-to grandes podem ter um repórter médico, mas não necessariamente u m

repórter c ient í f ico. Exceto nos maio-res jornais ou aqueles de âmbi to na-cional, os repórteres c ient í f icos e de medicina podem lidar com aspectos não-cientí f icos da cobertura not ic io-sa. Em Cincinnat i , por exemplo, o re-pórter c ient í f ico-médico pode cobr ir coletas de fundos pela associação do coração, Cruz Vermelha, e assim por diante. Isso não é necessariamente uma desvantagem. Coloca os repórte-res em contato com as realidades da pol í t ica c ient í f ico-médica e com a competição econômica entre as vá-rias organizações de saúde e pesquisa. Uma outra conseqüência da geografia da distr ibuição dos veículos é que quanto menor a cidade, mais impor-tante o papel da proximidade. Os veí-culos das cidades pequenas terão me-nos fontes de informação c ient í f ica disponíveis ao repórter e menos reda-tores c ient í f icos com experiência, se t iverem algum. Há as exceções, tal como em Rochester, Minnesota, cida-de da afamada Cl ín ica Mayo. Soman-do-se a isso, quanto menor for a equi-pe, mais trabalho se espera e menos tempo resta para pesquisar e escrever. Os sobreviventes desse sistema de car-reira geralmente mudam-se para uma cidade maior, para um serviço not i -cioso ou uma revista onde mais recur-sos — inclusive tempo — são disponí-veis. Os repórteres desenvolvem suas especializações, durante esse per íodo em veículos de pequeno a médio por-te e a í cometem a maioria de seus en-ganos. Dessa fo rma os redatores de ciência e pessoal de relações públicas que os cientistas encontram no cená-r io nacional e internacional têm a

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maior parte de seus erros atrás de si, dispõem de mais tempo e apoio para pesquisa e têrrr mais contatos c ient í -ficos. Quanto maior o veículo, menos o valor not icioso se prende à proxi -midade.

Uma terceira conseqüência da lo-calização é que os jornalistas e o pes-soal de relações públicas irão procu-rar os cientistas locais para explicar o trabalho de outros cientistas e co-mentar assuntos envolvendo ciência e tecnologia. A mesma pesquisa entre leitores que revela a administradores de jornais que estão negligenciando a população e os temas locais com o perigo de perder circulação, também lhes revela que os leitores desejam ouvir as opiniões dos especialistas lo-cais e explicações sobre eventos maiores. Isto é outra área da cobertu-ra de notícias cient í f icas que oferece ao redator de ciência ou publicista iniciante uma opor tunidade para se desenvolver. Supervalorizada, a pro-ximidade se transforma num provin-cianismo cômico. A maioria dos reda-tores e editores procura o equ i l íb r io .

V A R I E D A D E E E Q U I L f B R I O . A va-riedade e o equ i l íb r io são fatores for -tes que determinam o conteúdo dos jornais, revistas e transmissões not i -ciosas. Permeiam todos os veículos, incluindo jornais c ient í f icos, porque cada um deles está l imi tado seja pelo tempo, seja pelo espaço ou por am-bos. Os locutores programam uma se-leção da " m e l h o r " mistura de histó-rias para uma audiência em determi-nado dia. 0 material c ient í f ico pode ser empurrado para fora pela po l í t i -

ca. Uma matér ia sobre astronomia se-rá equi l ibrada com uma matéria so-bre medic ina mais provavelmente do que com ou t ra história sobre uma das ciências f ísicas. As revistas de ciência popular desejam uma mistura de ma-térias sobre f ísica, biologia e ciências sociais.

C O N F L I T O . Conf l i to , para o bem ou para o mal , é um componente da se-leção not ic iosa. Com freqüência o con f l i to pode ser pessoal ou ocul to. Pode envolver dois famosos cirur-giões cardíacos que não podem mais part i lhar créditos ou instalações hos-pitalares porque o seu con f l i to pes-soal é intenso demais. O con f l i to po-de emergir a part i r dos objetivos da pesquisa e dos testes, c o m o ocorreu entre médicos, engenheiros biomédi-cos e administradores de hospital du-rante o implante do pr imei ro coração art i f ic ial . As teorias podem conf l i tar . O con f l i to também pode envolver o redator c ien t í f i co em assuntos mais amplos de ética e de normas públicas. O redator médico ou c ien t í f i co sensí-vel irá registrar a disputa e suas cau-sas.

A abordagem adversária para re-solver conf l i tos é uma tradição nos Estados Unidos. O ganho, a perda ou o compromisso resultam da estraté-gia de se colocar um ou mais pontos de vista em combate mais ou menos aberto. Numa época mais simples da ciência, cada realização de laborató-rio era considerada progressiva, bené-fica e recompensadora. Os cientistas, assim como os redatores de ciência e o públ ico em geral concordavam com

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esse ponto de vista, a julgar pela acei-tação não-crí t ica dispensada a anún-cios de descoberta c ient í f ica antes da II Guerra Mundial e por muitos anos depois. Mui tos redatores de ciência, suspeita-se, gostavam de suas carrei-ras porque relatar esses avanços pare-cia isento de controvérsia. U m fa to estabelecido pelo método c ient í f ico parecia mais f i xo , quase certo.

O combate po l í t i co entre os cien-tistas que desenvolveram a bomba atômica e outros produtos de fissão e fusão nucleares sacudiu um pouco da complacência dos jornalistas e de seu públ ico. 0 cl ima de intensa pes-quisa e desenvolvimento na II Guerra Mundial produz iu a penicil ina e o D D T , um eficiente pesticida para as zonas de combate tropicais, que aju-dou a espalhar preocupações com o meio ambiente por causa de seu efei-to letal nas aves. Mais de vinte anos depois que o relatór io do diretor na-cional de saúde dos E U A condenou o hábi to de fumar cigarros, depois que a maioria dos médicos parou de fu-mar, a indústria do tabaco pode en-contrar cientistas credenciados dis-postos a declarar que a relação entre o f u m o e o câncer dos pulmões ou doenças d o coração não estava esta-belecida com f irmeza suficiente.

Agora os redatores de ciência fa-lam sobre o jornal ismo como o jorna-lismo da incerteza. Mu i to dessa incer-teza provém do fa to de que cientistas de uma determinada área da ciência podem concordar sobre os números mas não sobre o que esses números significam para as pessoas em termos de efeitos f ísicos, sociais, econômicos

e pol í t icos. Com freqüência, até mes-m o os números não concordam. Ou-t r o fator nesse con f l i t o da incerteza reside na natureza da ciência. Ela é estatística e casual. Os leitores de no-t ícias cient í f icas estão procurando respostas pessoais, individuais, que se apl iquem a eles a part i r dessa in for -mação. A informação c ient í f ica pode suprir informação geral necessária pa-ra levar os indiv íduos a tomarem de-cisões mais prudentes.

No que se refere à ciência propria-mente di ta, os escritores de ciência estão mu i to ocupados em relatar o que alguns chamam de efeitos c ient í -f icos para além da ciência, do âmb i to social e da tecnologia. Os assuntos médicos não gravitam mais em t o r n o do saber se uma doença pode ou não ser curada. 0 novo enfoque dado à questão — o de quando prolongar a vida e a vida de quem deve ser pro-longada — envolve uma série de con-siderações de ordem f inanceira, ét ica, profissional, social e po l í t i ca . Os re-datores que escrevem sobre energia se deparam também com problemas tão dif íceis quanto estes, em suas repor-tagens. Pede-se-lhes que dêem cober-tura à discussão, entre batalhões de especialistas da área de ciência, sobre o melhor modo de converter maté-rias-primas em energia ú t i l , e seus custos. O uso agrícola de pesticidas e herbicidas, os perigos dos hormônios usados nos animais que servem para a alimentação e os preservativos usados nos al imentos são campos de batalha similares. O mesmo ocorre c o m o campo da nutr ição humana e animal , onde existe uma preocupação a res-

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peito do potencial das bactérias ani-mais para desenvolverem resistência a ant ib iót icos veterinários. Tal resistên-cia poderia levar a infecções humanas que não podem ser tratadas com su-cesso porque as versões humanas dos ant ib iót icos também se tornaram ine-ficientes. À disposição dos leitores há edições de livros de bolso, publicações sobre saúde e segurança e brigas po l í -ticas cujo resultado terá conseqüên-cias potencialmente sérias.

Esses e outros temas geram inten-sas pressões emocionais. Às vezes eles se t ransformam em con f l i t o f ís ico, impondo aos redatores c ient í f icos um cuidado maior na cobertura not i-ciosa. As pessoas em lados diferentes da discussão de temas como a cons-trução de usinas e armas nucleares, abor to e a salvação de baleias, inter-romperam reuniões cient í f icas e mé-dicas com manifestações, algumas das quais terminaram em conf l i tos vio-lentos. Esse t i po de con f l i to tenta os jornalistas a centrarem suas histórias inteiramente sobre esse evento. Fre-qüentemente com a cooperação entu-siástica de seus editores. Para evitar perder todas as outras not íc ias de uma reunião c ient í f ica, o consenso entre responsáveis redatores c ient í f i -cos tem sido relegar tais diversões pa-ra uma matéria separada, conhecida como "sidebar". Outros escritores pesam conscienciosamente a impor-tância de tal r ixa para a reunião co-mo um t o d o e concedem-lhe espaço em suas matérias de acordo com isso.

Os redatores de meio ambiente en-caram complex idade similar. Sua se-

leção de notícias e ênfase na seleção é complicada pela probabi l idade de que os perigos para o meio ambiente se revelem inicialmente de imodo in-signif icante, evoluam lentamente e le-vem um longo tempo para reverter. As soluções podem oferecer muitas combinações de técnicas e custos. A falta e a falha de energia elétrica ofe-recem evidentes situações emergen-ciais. Os perigos oferecidos ao meio ambiente e à saúde pelas usinas de energia nuclear não são temas a se-rem discutidos apenas por especialis-tas, mas são tão carregados de emo-ção, que uma discussão calma é d i f í -ci l . A lém disso, o desenvolvimento de informação segura pode levar anos.

Alguns cr í t icos, tan to da ciência quanto da redação c ient í f ica, gosta-riam que os jornalistas, tradicional-mente neutros na reportagem de con-f l i tos, assumissem o papel de selecio-nar qual lado desses conf l i tos oferece as evidências mais confiáveis (Good-f ie ld, 1981). Se os veículos de comu-nicação de massa são meros agentes de poder na sociedade onde operam, como a f i rmam alguns pesquisadores da área, isto é efet ivamente tarefa ár-dua para um grupo que há apenas uns vinte anos considerava suficiente rela-tar o que era d i to por u m cientista e t raduzir o seu jargão em palavras fá-ceis de entender. Praticamente, os jornalistas, como observadores neu-tros em situações de conf l i tos , ten-tam relatar imparcialmente todos os aspectos do con f l i to à medida que es-tes se desenvolvem.

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Outros valores importantes para a notícia científica

0 conf l i to, a proximidade, o inte-resse humano, a personalidade e simi-lares não são os únicos valores impor-tantes para a notícia, que acionam os meios de comunicação de massa. O psicólogo Abraham Maslow desenvol-veu a proposição de que as pessoas agem para preencher certas "necessi-dades e gratificações". A idéia de que parte desse preenchimento pode vir através da mídia impressa e eletrôni-ca orienta grande parte do processo de seleção de notícias científ icas. Um jornal imprime uma abundância de histórias sobre órgãos sexuais femini-nos e seus distúrbios. A equipe dá a elas o nome de "histórias de ú tero" . Os editores assumem que cada mu-lher tem um e se preocupa a respeito; o interesse masculino é considerado automático. Essas histórias encaixam-se nas "necessidades" de Maslow co-mo informação de sobrevivência. Os leitores e a intensidade de leitura pre-sumivelmente aumentam com a apli-cação dessas orientações psicológicas.

NECESSIDADES DE SOBREVIVÊN-CIA. Um grande interesse de leitores e espectadores volta-se para matérias ou temas que lidam com aspectos fundamentais de sobrevivência, como alimentação e moradia, transporte básico, saúde e segurança pessoal, se-xo e procriação, e algum nível de afeição e contato social. Também postulados como necessidades de so-brevivência por Maslow são o empre-go do tempo de maneira significativa,

habilidades básicas de trabalho e al-gum mín imo de tempo livre para usar como agradar a cada um. As ameaças á gratificação dessas necessidades evocam respostas profundas e pode-rosas.

As leis de preservação do meio ambiente podem dever seu nascimen-to a tais respostas. A surpreendente velocidade com a qual as leis que ver-sam sobre o meio ambiente passaram nos anos setenta refletiu for te apoio público. As regulamentações foram aprovadas sem grandes debates públi-cos, seja no Congresso, seja nos meios de comunicação, um fato raro em se tratando de leis que implicam em mudanças profundas numa socieda-de. A lei do f luorcarbono, que alguns poucos cientistas consideravam uma ameaça á camada de ozônio que pro-tege a Terra de pesada radiação ultra-violeta, passou rapidamente por pes-quisas e estudos rumo a sua decreta-ção. Outra grande ameaça â saúde emergiu em 1984 e provocou pressão pública nos funcionários estaduais da área de saúde e na Environmental Protection Agency. O pessoal dessa área estava preocupado com as quan-tidades do pesticida cancerígeno ethylene dibromide (EDB) descober-to nos lençóis de água. Quando vestí-gios do EDB apareceram nas misturas de f locos de mi lho e farinha, e nos frutos cítr icos, o uso do pesticida fo i proibido e outras medidas de contro-le foram tomadas. Outras reações igualmente fortes foram provocadas pelo medo de se expor as pessoas ao l ixo atômico e à dioxina, um subpro-duto qu ím ico ligado ao câncer e aos

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defeitos congênitos. A EPA comprou uma cidade inteira de Missouri que estava contaminada pela d iox ina con-t ida no refugo de óleo que fo i borr i-fado ali para fazer baixar a poeira nas ruas da cidade.

Noticiar tais atividades pode fazer com que "os meios de comunicação" sejam acusados de estar assustando as pessoas desnecessariamente. Os médi-cos do Missouri, por exemplo, conse-guiram marcar uma convenção da American Medicai Association, para passar uma resolução censurando os veículos de comunicação e o públ ico que reagirem exageradamente à ameaça da dioxina. A resolução fo i cancelada no dia seguinte pelos dele-gados.

O campo da ciência conhecido co-mo análise de risco surgiu de tais ocorrências; elas f izeram com que os cientistas sociais olhassem para tais questões como se os riscos de sobre-vivência fossem mais aceitáveis se as pessoas pudessem escolher seus pró-prios riscos, como fumar ou dir igir ; e menos aceitáveis se um risco é lança-do sobre elas por outras. Tais são os efeitos perturbadores que acompa-nham a reportagem dos temas de so-brevivência.

NECESSIDADES C U L T U R A I S . O "est i lo de v ida" ou as necessidades culturais podem dominar os interes-ses dos leitores, depois que as necessi-dades de sobrevivência são satisfeitas. Os temas nessas áreas incluem como fazer as melhores escolhas alimenta-res e nutr icionais, como melhorar condições de trabalho ou fazer esco-

lha de carreira. O sexo e a sexualida-de do mesmo modo, podem ser exa-minados em termos de qualidade. A maneira como as outras pessoas usam seu tempo e dinheiro é de grande in-teresse, talvez para guiar os leitores na melhoria de suas escolhas de habi-tação, transporte, recreação e vestuá-rio.

Nesse nível, onde está a maioria dos usuários dos meios de comunica-ção, as pessoas têm a necessidade e a opor tunidade de aumentar seu auto-conhecimento para proporcionar um auto-aperfeiçoamento. Assim, proje-tos de pesquisa, especialmente na área das ciências sociais, podem ser de amplo interesse mesmo que os ci-entistas os considerem l imitados quanto á sua aplicabil idade apenas aos pequenos grupos envolvidos nos testes. Os repórteres, editores e leito-res podem ter empatia pelas pessoas envolvidas na experiência e extrair dela u m significado que pode não ter se mostrado de imediato. Os jornalis-tas podem sentir-se mais confortáveis l idando com as ciências sociais por-que t iveram cursos similares na escola ou o material parece mais int imamen-te relacionado â experiência humana do que as ciências físicas.

NECESSIDADES DE CONHECI-M E N T O . A lém dessas necessidades emergem as "necessidades de conhe-c i m e n t o " , a satisfação da curiosidade em to rno do organismo humano. Es-sas necessidades podem estar ligadas, no que se refere a ciência e tecnolo-gia, a possibilidades de crescimento em áreas pessoais e econômicas ou a

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desenvolvimento oferecendo novas possibilidades de carreira. Podem ser encaradas como entretenimento ape-nas de modo marginal, embora o or-ganismo humano aprecie a variedade. A receptividade â nova informação vinda da ciência, medicina e ciências sociais aumenta, embora o conheci-mento contr ibua pouco ou nada para a vida diária, exceto pelo fato de se saber algo novo. Os leitores e especta-dores dos meios de comunicação de massa também, a esse nível, podem estar interessados em ver como as pessoas mu i to diferentes deles pró-prios trabalham e vivem. Isto prova-velmente esta' ref let ido no sucesso das publicações sobre celebridades e no cont inuado interesse por figuras como Alber t Einstein. Esse mesmo fa to possivelmente responde pela dis-posição de muitos leitores para acom-panhar assuntos mui to complexos quando o redator conta a história através da vida pessoal do pesquisa-dor.

As matérias desenvolvidas para proporcionarem respostas âs necessi-dades de sobrevivência, cultura e co-nhecimento tendem a ser chamadas "matérias de serviço". Proporcionam um serviço aos leitores que procuram orientação que os ajude nos afazeres diários. O escritor de ciência pode ser chamado para fornecer matérias de serviços tais como "de que forma en-contrar um m é d i c o " ou "nove cami-nhos para uma vida saudável".

D E M O G R A F I A . As revistas são espe-cialmente sensíveis para julgar as no-t ícias, tendo como objet ivo a compo-

sição do seu públ ico: demografia. De-f in i r notícias cient í f icas significa de-fini-las como "not íc ias para quem?" Exemplos de dois extremos são a ciência escrita para a revista infant i l Highlights e a que é dir igida aos assi-nantes adultos de Science Digest. A pesquisa sobre o contro le da natalida-de terá um significado diferente para os leitores de Seventeen e os leitores das publicações da Amer ican Associa-t i on of Retired Persons ou de certas revistas patrocinadas por igrejas. As revistas Science e Science 85 são fei-tas pela mesma organização, mas o públ ico de cada uma tem expectati-vas diferentes a respeito do conteúdo da publicação. Mesmo dentro de Sci-ence você encontrará diferentes graus de simplif icação da not íc ia ; os edito-res de "Research News" , por exem-plo, podem achar necessário explicar um relatório técnico especializado de modo que um grupo mais amplo de cientistas compreenda sua importân-cia. As considerações a respeito dos níveis de escolaridade, t ipos de edu-cação, ocupação, renda, idade, dis-t r ibuição por sexo e quaisquer inte-resses especiais, bem como outras características que ident i f icam um determinado públ ico desempenham papéis fundamentais na determinação das histórias que serão impressas ou transmitidas.

A inf luência de considerações de-mográficas estende-se aos jornais me-tropol i tanos. Se você é um redator ou editor de ciência poderá selecio-nar e escrever matérias baseado na f i -losofia do jornal , se é que ele a man-tém, de que toda história deveria in-

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teressar a todos .eitores. Diferen-tes escolhas de matérias cabem, se o material é dir igido a um segmento se-lecionado, informado e talvez tecni-camente treinado dos leitores. Crité-rios um tanto diferentes irão orientar o julgamento se você for um redator de ciência e tecnologia designado pa-ra a seção comercial da publicação. Os especialistas em notícias econômi-cas encontram essa espécie de confl i -to , se deve se abordar um tema co-mo uma história de "consumidor " ou como uma dirigida à comunidade econômica.

Notícias de desordem social O sociólogo Herbert J. Gans

(1980) identif ica out ro valor noticio-so em Deciding What's News, um re-latório sobre o tempo que passou nos escritórios da CBS, NBC, Times e Newsweek. Esse valor pressupõe que certos padrões de comportamento, mitos ou crenças guiam uma comuni-dade. Esses podem ser prorr ulgados por seus líderes e t idos como paradig-ma: ou modelos a serem seguidos, e apregoados como virtudes para aque-les de fora da comunidade. Na comu-nidade cient í f ica, esses padrões in-cluem a honestidade no registro do resultado de observações r.ientíficas, precisão dos dados, perfeição dos re-latórios, imparcialidade na revisão do trabalho de colegas, publicação julga-da apenas por méri to, crédito por pri-meira descoberta e assim per diante. Gans concluiu que as violações de tais normas oferecem exemplos de desordem social e moral, que os meios noticiosos acham irresistíveis.

Na úl t ima parte do século X X — vol-tando atrás até os primórdios da ciên-cia — inúmeros exemplos de viola-ções das normas de pesquisas c ient í f i -cas surgiram ao ponto de merecer uma investigação do Congresso e uma torrente de matérias.

Depsr dendo de com quem você fala, esses exemplos são raros ou são apenas pequena parte do que real-mente ocorre nos laboratórios de pes-quisa cientí f ica. Dois redatores de ci-ência do New York Times, ambos antigos membros da equipe de reda-ção da revista Science, analisaram es-sas ocorrências em Betrayers of the Truth (1983), que deveria ser leituia suplementar para qualquer fu tu ro re-pórter c ient í f ico. Broad e Wade afir-mam que os exemplos de violações descobertos representam apenas a ponto de um iceberg de fraude, rou-bo, apadrinhamento, favorit ismo e falhas no autopoliciamento da co-munidade cient í f ica. Cientistas que prestaram declarações diante do Sub-commit tee on Investigations and Oversight of the Committee on Science and Technology, United Sta-tes House o f Representatives, entre 31 de março e 1 de abril de 1981 (U. S. Congress, 1-350), af irmaram que os pesquisadores identificados com as violações eram aqueles poucos indiví-duos que sofriam abalos diante de in-tensidade mental e física de seu tra-balho.

Tais histórias também caem no domín io do redator de ciência. Ele provavelmente ouvirá a respeito delas quando começa a cobrir matérias so-bre o que os cientistas fazem como

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membros da comunidade. Essas ocor-rências assumem, para o públ ico em geral, significado mais amplo onde consideráveis somas de dinheiro pú-bl ico mantêm a pesquisa, onde a pes-quisa precisa ser publ icamente repu-diada por causa de seus erros, e onde o perigo para a saúde e segurança pú-blica estão envolvidos. Freqüente-mente as drogas que necessitam de prescrição médica (comumente deno-minadas drogas "ét icas") devem ser removidas do mercado porque dados enganosos ou incompletos ocul tam mortes, defeitos de nascimento e efeitos colaterais menos severos. No caso de Sir Cyr i l Bur t , da Grã-Breta-nha, um pioneiro no desenvolvimen-t o de normas públicas a part i r de ex-tensões de seus estudos sociais, sua pesquisa conquistou-lhe um lugar no sistema de educação br i tânico de mo-do que a po l í t ica escolar do governo, com base na citada pesquisa, afetou as crianças durante décadas. Após a mor te de Burt em 1971, o reexame de seus dados e trabalhos cient í f icos levaram outros pesquisadores a ques-t ionar a validade de ambos (Kamin, 1974).

Em termos de valores noticiosos tradicionais, o redator de ciência no jornal ismo americano funciona como o vigia da comunidade c ient í f ica de pesquisa. Quão bem os jornalistas po-dem fazê-lo certamente está em aber-t o para debates. Em matéria de pol í -t ica e negócios públicos, a pol íc ia, os promotores e similares descobrem mais exemplos de condutas ilegais do que os jornalistas. Dada a natureza técnica da pesquisa c ient í f ica e médi-

ca, outros cientistas ou funcionários de regulamentação em agências tais como a Food and Drug Administra-t i on são mais passíveis que os jorna-listas de ver os sinais de dados incon-sistentes ou consistentes demais. Os jornalistas provavelmente ouvirão so-bre situações questionáveis pela pri-meira vez através de comunicados oficiais de funcionários governamen-tais ou institucionais a não ser que te-nham fontes mu i to boas nas rodas de mexericos da ciência.

Ambigüidade nas not íc ias cientí f icas

Nesses meios de comunicação os valores noticiosos const i tuem fontes de mui ta ambigüidade e conf l i to en-t re redatores de ciência e seus infor-mantes. As tensões que existem po-dem ser exageradas, mas os cientistas acumularam algumas queixas sérias contra a ciência, como é apresentada nos veículos de comunicação de mas-sa. Tanto os cientistas como os escri-tores de ciências concordam que as piores distorções do material c ient í f i -co aparecem nos t í tu los colocados em matérias de jornais diários. Vir-tualmente cada redator de ciência po-de se lembrar de ao menos um exem-plo no qual um t í t u l o era enganoso, quando não errôneo. Em parte isso resulta do sistema de edição do jor-nal, no qual a necessidade que p edi-to r da matéria tem de causar impacto leva-o além do que há na própria ma-téria. Os redatores de t í tu los usam padrões de medidas diferentes dos usados pelos cientistas e redatores de

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ciência, que colocam a maior impor-tância na precisão e no signif icado da informação. Os editores colocam a cor e a excitação como padrões pri-mários para classificar a matéria cien-t í f i ca (Johnson, 1963).

Uma parte do conf l i to ocorre por-que os redatores de ciência não con-seguem mostrar os pontos principais de sua matéria de fo rma clara, direta o suficiente para o seu pr imeiro lei-to r , o edi tor . Alguns cientistas suge-rem que o redator de ciência também escreva o t í t u l o , mas tal prática iria entrar em con f l i t o com muitas opera-ções internas dos jornais. Mui tos jor-nais pedem aos redatores de ciência para aconselharem os editores na se-leção de matérias locais e telegráficas. Pode ser possível ao redator sugerir palavras ou termos para os t í tu los que se encaixem nas matérias. Poucos redatores experimentaram colocar t í -tulos " t e s t e " em suas histórias antes de enviá-las ao copidesque.

Conf l i to maior existe em to rno da questão de se dar ou não cobertura à ciência sob a fo rma de " n o t í c i a " . Os cientistas argumentam que os prazos e limitações de espaço trabalham contra a precisão e a adequação da not íc ia c ient í f ica. A o invés de cobr i r as notícias cient í f icas como "even-t o " , alguns cientistas e jornalistas ir iam relatar os desenvolvimentos ci-ent í f icos como "processo", usando matérias mais longas, mais minuciosa-mente pesquisadas ou o fo rmato em série para mostrar como os desenvol-vimentos c ient í f icos se constroem gradualmente a part ir de uma série de descobertas de vários pesquisadores.

Entretanto, isto se choca com a de-manda de cobertura noticiosa compe-t i t iva diariamente por parte da im-prensa e dos repórteres de rádio e T V , bem como com as expectativas dos administradores de departamen-tos editoriais, que esperam matérias diárias. Uma resposta às queixas dos cr í t icos tem sido um sistema de con-senso operado pelos membros de um "c í r cu lo i n te rno" de repórteres cien-t í f i cos dos mais importantes meios noticiosos. A o se consultarem entre si, e com os cientistas que os aten-dem, nas salas de imprensa, em even-tos como reuniões cient í f icas, che-gam a um consenso geral sobre as me-lhores matérias do dia. Tornam-se mais colaboradores que competidores em suas tentativas de esclarecer pon-tos sutis e assegurar a precisão da in-formação. Isso lhes permite se con-centrar na precisão enquanto os alivia das queixas dos seus editores sobre deixarem de cobr ir uma história que pode lhes parecer melhor porque a concorrência a possui (Dunwoody , 1978). Este c í rcu lo interno de reda-tores fornece mu i to do que o públ ico lê como notícias de ciência, porque inclui membros da equipe de grandes publicações como Los Angeles Ti-mes, The Wall Street Journal, The Boston Globe, New York Daily News, Newsweek, Chicago Tribune, The Washington Post, San Francisco Chronicle, Philadelphia Inquirer, e The New York Times. Outros mem-bros representam a Associated Press, Uni ted Press Internat ional , Scripps-Howard Newspapers e Hearst News-papers — Baltimore American. Assim,

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mui to da reportagem cient í f ica fre-qüentemente representa um consenso edi tor ia l .

Aqu i reside um paradoxo com o qual todos os redatores de ciência precisam conviver. Estes produzem a maior parte das notícias de ciência popularizada impressas nos jornais dos E U A , mas os cientistas que cr i t i -cam os redatores de ciência como grupo os recompensam com freqüên-cia como indiv íduos, concedendo-Ihes prêmios pela excelência da sua redação cient í f ica. Como em muitos paradoxos da ciência, as causas disso aguardam maior pesquisa.

A o examinar o enigma, a professo-ra Sharon D u n w o o d y , que ensina re-dação c ient í f ica na University of Wis-consin, descobriu que esses redatores c ient í f icos ob têm grande parte de seu material em conferências de impren-sa. Como as conferências de impren-sa são arranjadas por cientistas e as-sociações cient í f icas, cujos membros são qualif icados para julgar a signifi-cação ou obter orientação, conclu iu que os cientistas parecem exercer uma grande dose de influência sobre o que os meios de comunicação im-primem e transmitem. Por o u t r o la-do, muitos redatores de ciência disse-ram que as observações de Dunwoo-dy não procedem, já que são os reda-tores c ient í f icos que requerem confe-rências de imprensa sobre tópicos es-pecíf icos em reuniões cientí f icas. Uma vez que os prêmios de jornalis-mo são freqüentemente inst i tu ídos para encorajar o aperfeiçoamento, os patrocinadores podem estar premian-do o que pode se salvar do l ixo.

Parte da cr í t ica dos cientistas dir i -gida à redação e apresentação de ciência popularizada pode ser uma questão de postura. O fa to de u m ci-entista ou grupo de cientistas come-çarem a elogiar os jornalistas aberta-mente, significaria questionar uma tradição de quase cem anos de cul tu-ra c ient í f ica. Os cientistas estão longe de afastar-se dos meios de comunica-ção. Dunwoody pesquisou um grupo de cientistas e descobriu que 75% de-les acolheriam bem uma nova entre-vista com um jornalista. 15% dos cientistas haviam iniciado o pr imei ro contato com a imprensa, e 30% ou mais haviam escrito ao menos uma matéria para a imprensa popular . Apesar de os cientistas terem d i t o que a pior cobertura de ciência é fe i ta pe-los repórteres de rádio e televisão, mostravam-se mu i to interessados em aparecer na televisão (Dunwoody e Scot t , 1982). Assim, o redator de ci-ência deve manter em mente que a aparente relutância em ser entrevis-tado pode ser ou não genuína. Os re-datores de ciência podem ter de agüentar a mesma sorte de embaraços impostos a jornalistas de outras espe-cialidades até que provem às suas fontes que são precisos, bem infor-mados e habilidosos. Os redatores precisam saber dist inguir entre uma fonte determinada a evitar uma en-trevista e outra que pode ser induzida a fazê-la. Portanto os redatores de-vem trabalhar no aperfeiçoamento de suas habilidades no campo das rela-ções humanas.

U m teste dessas habilidades pode acontecer quando um redator se de-

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parar com alguns dos preconceitos subjacentes nas visões que os cientis-tas têm da imprensa. Como fo i obser-vado por Dunwoody e Scot t , essa percepção inclui a idéia de que os jor-nalistas são de status inferior ao dos cientistas. Essa imagem pode ser compensada pelo poder ou prestígio que algumas publicações conferem a seus redatores ou a força da reputa-ção pessoal do jornalista. 0 veículo para o qual o redator trabalha tam-bém pode fazer diferença. Se você re-presenta uma revista, o cientista pro-vavelmente será mais condescenden-te. Os cientistas preferem a impren-sa ao rádio e â T V para transmit i r uma mensagem pública e têm as re-vistas em melhor cotação que os jor-nais. Talvez isso reflita seu reconheci-mento de que mais cuidados de pes-quisa e redação entram em artigos de revistas, d iminuindo assim as possibi-lidades de erro. Essa preferência pode simplesmente significar que as revis-tas se parecem mui to com periódicos cient í f icos familiares aos cientistas.

Os jornais, por outro lado, são ele-mentos estranhos em alguns aspectos. Primeiro há aqueles problemas com os t í tu los. Depois há a companhia que matérias científ icas nos jornais representam diariamente como: assas-sinatos, batalhas polít icas, crimes, te-diosos conselhos de dieta, "caixas pretas" que transformam água em ga-solina e horóscopos. Nas publicações sensacionalistas essa mistura também inclui receitas de curas milagrosas e visitações de seres extraterrestres.

As habilidades no campo das rela-ções humanas podem não ser sufi-

cientes para vencer o preconceito. Às vezes a relutância do cientista em fa-lar pode não ser superada para uma entrevista. Se a situação é d i f í c i l de-mais, descubra outra fonte. Como se-rá mostrado no próximo capí tu lo , ra-ramente você f ica sem caminhos al-ternativos para a informação cient í-fica.

Um assunto que a maioria dos ci-entistas, particularmente aqueles de universidades estaduais polit icamen-te sensíveis, têm relutância em tocar é o debate sobre a origem da vida: o criacionismo contra o evolucionismo, a Bíbl ia versus Darwin. Por ou t ro la-do, há cientistas que gostam de rus-gas com os criacionistas. Muitos cien-tistas são religiosos e seguem duas grandes fés. Uma é a existência de um Deus. A outra, a fé na ciência, que lhes diz que há ordem no univer-so, que os humanos podem discernir essa ordem, e que é bom para eles fa-zê-lo. Outros seguem apenas sua fé na ciência.

Risco Tecnológico

Os cientistas, assim como os reda-tores de ciência, estão divididos quanto a relatar os riscos existentes no ambiente de alta tecnologia de nosso complexo mundo. Já que a ex-perimentação com humanos não é aconselhável, os riscos devem ser esti-mados estatisticamente e através de experimentação com não-humanos. A lém dessa generalização, usar dados resultantes de experiências com ani-mais para estimar o risco da canceri-genidade ou outra condição patológi-

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ca gera problemas. U m problema é a aceitação de resultados em animais como válidos para humanos. Diferen-tes animais testados produzem resul-tados diferentes. Um out ro proble-ma reside em colocar em perspectiva a interpretação de dados feita por um cientista — a descoberta é conserva-dora ou liberal? Ou t ro problema com números de " r i sco " é que diferentes t ipos de testes com freqüência pro-porcionam números diferentes. Al-guns desses problemas de estimar a validade de testes fei tos em animais fo ram salientados num relatório do Interdiscipl inary Panei on Chemical Carcinogenicity (1984). A extrapola-ção de resultados de experiências fei-tas em animais para predizer a inci-dência humana deve considerar os quatro fatores:

1. Onde a resposta (câncer) ocorre em taxas de 10% a 100%, os assim chamados modelos matemáticos do-se-resposta proporc ionam resultados similares.

2. Onde as taxas de respostas são mais baixas, e talvez não observáveis, os vários modelos matemáticos de in-cidência humana predita dão resulta-dos mu i to variáveis.

3. As reações a doses pequenas do cancerígeno potencial também va-r iam; isso mantém viva a teoria de que um " l i m i t e " tolerável para a re-posição existe; nem todos os pesqui-sadores aceitam o conceito de l imite.

4. Linhas de animais experimen-tais e culturas de células usadas nos testes têm ancestralidade e ambien-tes quase homogêneos, embora sua resposta à exposição tóx ica varie —

nem todas f icam com câncer; a ances-tralidade humana — e possivelmente a resposta — é di ferente.

Como esse painel fo i convocado por solicitação do American Indus-t r ia l Health Counci l , com o apoio de indústrias químicas interessadas no resultado das suas deliberações, nem todos os pesquisadores concordam com suas restrições quanto à uti l ida-de de se predizer causa e efeito para indivíduos em grandes populações humanas. Estatisticamente, poucas pessoas estão contaminadas em rela-ção à população to ta l , mas membros individuais do públ ico dos meios de comunicação têm dif iculdade em ava-liar o significado de tais riscos.

A reportagem sobre riscos numa escala diferente con f ron tou jornalis-tas de todos os t ipos, incluindo espe-cialistas em ciências, a 3 de dezembro de 1984. O vazamento de um gás qu ím ico venenoso da fábrica de pes-t ic ida da Union Carbide Corporat ion, em Bhopal, índia, resultou nas esti-mativas de 2.000 mortos e possivel-mente 200.000 feridos. Esse fo i um dos mais sérios acidentes industriais registrados e representa um risco de ocorrência pouco provável — mas com uma alta probabil idade de morte ou fer imento a qualquer pessoa en-volvida. Uma das conseqüências do acidente de Bhopal fo i uma exigência pública de que as empresas divul-guem o t ipo e natureza de todos os produtos químicos uti l izados em suas dependências. A tarefa de relatar o risco que tais produtos químicos re-presentam, para uma questão tão po-lêmica, emocional e ligada â sobrevi-

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vência, caberá aos redatores de ciên-

cia.

Experiências

1. Procure nos jornais de uma semana ou em várias revistas, matérias que contenham informação científica ou médica. A partir do tema do redator ou sua abordagem do assunto, você pode classificá-las como his-tórias sobre eventos ou processos?

2. Você pode caracterizar essas histórias a partir dos valores noticiosos tradicionais como sendo usados por razões de proxi-midade, personalidade, impacto, ou outros valores tradicionais? Você viu valores de sobrevivência, culturais e de conhecimento funcionando?

3. Marque um encontro com um cientista ou peça a seu instrutor para arranjar a visi-ta de um cientista á classe para discutir sua visão de como os meios de comunicação de massa julgam a importância da notícia. O cientista pode dar o nome de alguns re-datores que fazem um bom trabalho?

4. Examine os jornais de uma semana. Com uma régua, meça o conprimento de cada matéria e t í tu lo contendo informa-ções científicas, médicas ou sobre ciên-cias sociais. Que categoria obtém maior es-paço?

5. Convide um agente de publicidade da universidade ou da equipe da sociedade médica local, ou o presidente da comissão de relações públicas da sociedade médica para visitar sua classe. Discuta o critério que ele ou ela adota para decidir que ma-térias deverão ser recomendadas para os veículos de comunicação locais.

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Capítulo 4

Como reunir notícias de ciência

DUAS HISTÓRIAS ILUSTRAM ASPEC-TOS-CHAVE da coleta de not ic ias de ciência, engenharia, medic ina e tec-nologia. Os repórteres perguntaram uma vez a u m famoso c r iminoso por que roubava bancos. "Po rque é ali que o d inhe i ro está" , rep l icou ele, es-pantado de que alguém o perguntas-se. Fazer uma carreira na redação ci-en t í f i ca signif ica localizar os cofres do conhec imen to c i e n t í f i c o , penetrá-los até onde se encontra o interesse púb l ico e enf rentar uma série de me-didas de proteção.

A ou t ra histór ia pode ser apócr i fa , mas sabe-se que u m cient ista resmun-gou ao fa lec ido Wi l l i am L. Laurence, redator de ciência do New York Ti-mes e vencedor do Prêmio Pul i tzer : "Vocês redatores de ciência v ivem das migalhas de nossa mesa". Disse Laurence: " I n f e l i z m e n t e , senhor, é uma vida d i f í c i l porque as migalhas f reqüentemente estão velhas".

Laurence ref let ia a impaciência de mui tos jornal istas de ciência c o m al-guns dos costumes tr ibais dos cientis-tas. C o m a exceção das pr imeiras im-plantações de corações mecânicos em seres humanos, vôos espaciais ameri-canos p i lo tados, a queda da b o m b a atômica e certos desastres naturais, os redatores de ciência raramente par t ic ipam da construção de not íc ias

c ient í f i cas . A ciência emerge c o m o no t í c ia mais f reqüentemente e m con-venções de cientistas, médicos e enge-nheiros, ou c o m a d is t r i bu ição de seus per iód icos prof issionais. Sema-nas, meses e mesmo anos p o d e m es-coar-se ent re uma descoberta c i e n t í -f ica ou médica e seu aparec imento na l i teratura c ien t í f i ca . O jorna l is ta c o m boas fon tes no seio da c o m u n i d a d e c ien t í f i ca pode f icar sabendo de u m evento e não poder escrever a respei-t o porque o t raba lho não f o i rev is to, consagrado e pub l icado. Superar tais obstáculos para uma matér ia c i e n t í f i -ca fresca é parte do jogo.

A t í p i c a matéria científica

A t í p i c a matér ia c ien t í f i ca é u m art igo sobre " c o m o f a z e r " , conhec i -do por qua lquer u m que fez cu rso de redação de matérias ou leu q u a l q u e r dos numerosos l ivros ou art igos sobre redação exposi t iva. A tarefa d o escri-t o r é compreender o " c o m o " o u o " p o r q u ê " de a lgum processo c i e n t í f i -co ou m é d i c o e sua signi f icação, e t ransmi t i r isso ao le i tor ou especta-dor c o m a m á x i m a precisão possí-vel. Mesmo se a f o r m a de sua reda-ção é a h is tór ia-not ic iosa-padrão-5-W, grande parte de sua pesquisa se-rá vol tada para obter uma c o m p r e -

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ensão do processo da ciência, seus procedimentos passo a passo, e a fre-qüentemente suti l lógica do raciocí-n io c ient í f ico . Pontos-chave da lógi-ca, processo e procedimentos irão completar o histór ico que o seu pú-bl ico irá precisar para compreender seja notícias, seja matérias mais lon-gas.

Assegurar a cooperação e as infor-mações necessárias f ica mais fácil quando os jornalistas mostram aos ci-entistas que estão trabalhando na di-reção de alguns objetivos comuns a ambos. O sucesso de experimentados redatores c ient í f icos em lidar com cientistas provém, em parte, da con-fiança mútua estabelecida através dos anos com base na integridade e boas intenções de ambas as partes.

Perseguidores de Realidade

Como muitas pessoas apontam, os jornalistas e os cientistas têm vários pontos de concordância básicos. Am-bos procuram conhecer a realidade e, possivelmente, a verdade. Os jorna-listas geralmente l idam com informa-ção específica e opor tuna sobre even-tos que julgam importantes e interes-santes. Os cientistas usam esses deta-lhes para construir generalidades so-bre o mundo natural, previsibil idade, e mesmo universalidade. O cientista e o jornalista part i lham um interesse pela objetividade (Tankard, 1976, 42; Mehlberg, 1958, 14). Tanto o cientis-ta quanto o escritor de ciência acredi-tam no conhecimento aberto e públ i-co dessa realidade. Ciência secreta não é ciência. Ambos acreditam no

relato preciso e honesto dessa realida-de. O cientista e o redator c ient í f ico casam o senso de oportunidade na re-portagem, embora suas escalas de tempo sejam bastante diferentes.

Algumas de suas diferenças vêm do a t r i to entre duas fés. Grandes no-t íc ias no campo da ciência podem es-capar aos jornalistas se estes não con-seguem compreendê-las, não podem ver a sua relação com seus leitores e espectadores, não podem convencer um editor de sua importância ou não podem colocar suas complexidades em palavras que pensam irão interes-sar leitores, espectadores e editores. A ausência de figuras ou de outros t i -pos de imagens pode di f icul tar o tra-balho de um repórter c ient í f i co de televisão. A fé dos jornalistas na ne-cessidade desses elementos é tão for -te quanto a dos cientistas no método c ient í f ico . A fé de ambas as discipli-nas suportou testes severos.

A fé na necessidade de se ter senso de oportunidade freqüentemente ge-ra conf l i to , especialmente quando as preocupações médicas e de segurança const i tuem um fator em jogo. Os jor-nalistas vivem do imediat ismo dos eventos. Os cientistas temem a pre-maturidade na revelação de seu co-nhecimento até que seus dados, pro-cedimentos e conclusões tenham sido estudados por seus colegas e publica-dos de um modo por eles aprovado. Como humanistas práticos, os jorna-listas se sentem desconfortáveis quan-do uma descoberta potencialmente salvadora de vidas pode levar um ano ou rrais para entrar em ampla circula-ção por causa do processo de publica-

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ção cientí f ica. Os pesquisadores mé-dicos, por outro lado, sabem que muitas terapias promissoras não vão a parte alguma ou azedam mesmo de-pois da sua aceitação pelos médicos.

Os cientistas e escritores de ciên-cia freqüentemente discordam, tam-bém, sobre graus de precisão e meti-culosidade na reportagem. A realida-de para o redator c ient í f ico inclui o arredondamento ou a supressão de al-guns números porque os leitores dei-xam de ler se o seu jornal ou progra-ma de televisão se parece demais com um exercício de matemática em sa-la de aula. A tradução de termos téc-nicos em analogias ou ilustrações ameaça basicamente o amor que os cientistas têm pela precisão. E para os cientistas pesquisadores, o conhe-cimento é uma coisa mu i to pessoal. A ampla disseminação, mesmo com pleno crédito, diminui — ainda que pouca — a satisfação do saber mais do que qualquer outra pessoa sobre um aspecto do mundo que nos cerca.

Como fo i discutido no capí tu lo anterior, os praticantes de jornalismo têm fé num conjunto de valores noti-ciosos mui to diferente daquele no qual confia a maioria dos cientistas. A fé dos jornalistas é reforçada por seus colegas, exatamente como o é a fé dos cientistas. Sobre essa fé J. Her-bert Al tschul l , antigo professor de jornalismo na Indiana University, previne: "Os artigos de fé são, por de-finição, irracionais, isto é, não se che-ga a eles pela razão. São freqüente-mente mantidos com a paixão de ver-dadeiros crentes. Um artigo de fé não está sujeito â análise cr í t ica. Acredi-

ta-se ou não. Uma pessoa é de fé ou é um estranho, um in f ie l " (1983, 287).

Como em qualquer fé, há mem-bros que, em terminologia religiosa, "desertaram" em diferentes níveis. Talvez todos o tenham fei to, se você insistir no ideal num mundo não tão ideal. O cientista e o escritor de ciên-cia freqüentemente se apóiam nas fa-lhas um do outro e às vezes estas são notícia. Esse capí tu lo visa aumentar seu conhecimento sobre as concor-dâncias entre o redator de ciência e o cientista na seleção de notícias so-bre o que os cientistas estão fazendo. Mas como Altschul l observa: " A di f i -culdade em se acomodar artigos de naturezas opostas sobre nunca deve-ria ser minimizada." A sua escolha de notícias científ icas não irá sempre sa-tisfazer todos os cientistas o tempo todo.

Onde encontrar notícias científicas

Como o assaltante de banco, os re-datores cient í f icos vão às fontes — às pessoas, às reuniões e às publicações — para reunir notícias científ icas. Es-colher entre as matérias possíveis po-de parecer irresistível, imobil izando alguns redatores. Essa mul t idão de fontes possíveis inclui qualquer um dos 3 milhões de cientistas, qualquer uma das milhares de publicações ci-entíficas impressas pelo mundo, ou qualquer artigo no interior dessas pu-blicações.

No rio de publicações a dif iculda-de em escolher a melhor matéria cient í f ica dessa torrente amazônica é

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aumentada porque mu i to mais de metade desses artigos pouco impres-siona a comunidade c ient í f ica. Com efei to, a quantidade de periódicos ci-ent í f icos const i tui em si uma espécie de obstáculo; alguns têm fama de te-rem começado como veículos onde pesquisadores c ient í f icos e médicos publicavam trabalhos rejeitados por outros meios mais prestigiados. Os ci-entistas tentam publicar no periódico ou periódicos mais lidos por seus cole-gas. Comumente essa é a publicação de sua sociedade ou especialidade cien-t í f i ca . Descobrir quais as publicações importantes para um campo da ciên-cia é um pr imeiro passo para se loca-lizar artigos importantes. Os editores de uma das principais publicações médicas, o New England Journal of Medicine, descobriram que mais de 80% dos trabalhos que rejeitavam apareciam subseqüentemente em ou-t r o lugar. Portanto, a pesquisa signifi-cativa não é necessariamente encon-trada apenas nos periódicos mais co-nhecidos.

Parte do significado da contr ibu i -ção de um cientista à compreensão é medida pela freqüência com que ou-tros cientistas usam aquele trabalho em sua própria pesquisa, constroem experiências novas baseando-se nele, ou citam-no em seus próprios artigos para publicações especializadas. Rela-t ivamente poucos desses artigos são citados mais de uma vez por outros pesquisadores, indicando quão pouco os cientistas conf iam na pesquisa de outros. Uma maneira de medir a "boa c iência" é verif icar na l i teratura ou com outros cientistas a freqüên-

cia com que um relatór io ou um cien-tista é citado na pesquisa de outros.

Embora muitas pesquisas de se-gunda clasSe encham as publicações menos conhecidas, os periódicos es-pecializados são o lugar para come-çar. Percorrer o índice de uma publi-cação pode alertá-lo para um art igo potencialmente valioso como not íc ia. A o invés de ler todo um artigo de um desses periódicos que pareça interes-sante, mui tos redatores vão pr imeiro à seção de "conc lusão" ou " s u m á r i o " do artigo para começar a julgar se o tema ou os resultados podem ou não interessar ao públ ico não especializa-do. O estilo comum para escrever o t rabalho c ient í f i co é o oposto do ar-t igo popular. Os cientistas geralmen-te colocam os problemas de pesqui-sas, teorias e métodos de pesquisa no in íc io do art igo. Então apresentam os dados e f inalmente dão sua conclu-são. É mu i to lógico para o propósito do cientista, mas não para o jornalis-ta. Às vezes os resumos const i tuem um rápido indicador da importância ou interesse do assunto para a not í -cia, mas com muita freqüência, ofere-cem apenas um relato seco ou quase etéreo do que realmente aconteceu. A lém disso, na conclusão, o cientista deve apresentar as suas palavras mais fortes e convincentes.

Compl icando a escolha de uma história adequada nos jornais existe algo conhecido, em parte como hu-mor , a " L P U " , que significa, "least pubiishabie unit". (unidade menos publicável). U m trabalho do t ipo LPU lida com apenas parte dos resul-tados de uma série de experiências ou

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projetos de pesquisa. Os cientistas, part icularmente nas universidades, re-cebem aumentos de salário, prestígio, promoções e direitos em parte como resultado dos trabalhos que publ i-cam. Como a maioria dos experimen-tos c ient í f icos são trabalho duro que envolve várias pessoas, pesadas des-pesas com laboratórios e/ou animais para pesquisa, e longos períodos de tempo, alguns pesquisadores extraem o máx imo de publicações possíveis de seus dados. Div idem os resultados em muitas facetas para dar crédi to a cada membro da equipe e talvez al-gum crédi to ao departamento ou ao administrador do ins t i tu to também. Vários trabalhos publicados a part i r dos mesmos dados básicos ajudam a demonstrar produt iv idade quando a equipe pede mais dinheiro do gover-no ou de fundações privadas. Quando um redator de ciência encontra um artigo de jornal intr igante, faria bem em perguntar aos cientistas se é parte de um projeto de pesquisa maior e onde se enquadra naquele projeto. Tais perguntas podem levar a uma história mais significativa.

Provavelmente você irá escolher uma história possivelmente c ient í f ica na base de seu valor como not íc ia jornal íst ica — significação para a ciência, impacto, ou as necessidades de seus leitores ou espectadores. Dar alguma perspectiva e pano de fundo à história é importante. Como os cien-tistas escrevem para outros cientistas, não expl icam com freqüência o que esses resultados signif icam para ques-tões mais amplas de conhecimento ou ignorância c ient í f ica. O redator de

ciência precisa obter comentários so-bre o que os resultados ali recém-re-latados signif icam, se são novos ou não, e se são significativos. Mas mes-mo se você acha que sabe, vale a pe-na conf i rmar seu ju lgamento com uma segunda opinião.

A redação c ient í f ica, como em to-do o jornal ismo, apóia-se sobre cinco fatores: documentação, verif icação, interrogação, observação e participa-ção. Periódicos especializados forne-cem documentação aceitável. Os re-datores de ciência tendem a cometer menos enganos na transcrição de da-dos ou citações do art igo. 0 trabalho também contém uma espécie de veri-f icação porque outros cientistas, su-postamente tão informados quanto o pesquisador, leram o trabalho e veri-f icaram as suposições e os dados quanto á sua plausibil idade. As histó-rias derivadas de u m jornal c ient í f i co de uma maneira geral contêm grande aceitabilidade por parte dos cientis-tas. Os artigos publicados merecem crédi to por causa da pressuposição da honestidade c ient í f ica na execução e no relato das experiências.

Os artigos de periódicos, no entan-to , têm desvantagens do ponto de vis-ta jornal ís t ico. Os eventos descritos neles terão acontecido meses ou anos antes. O estilo é seco, desapaixonado. Outros cientistas realizando pesquisas relacionadas já terão tomado cons-ciência do relatório há mu i to tempo. Embora simplesmente a publicação seja suficiente como fu ro not ic ioso, os redatores c ient í f icos prudentes fa-rão contato com os pesquisadores e outros profissionais do campo antes

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de escrever uma matéria. Novos fatos podem acrescentar cor e opor tunida-de à história, atualizando-a. Em casos extremos, as evidências recentes ou outras influências podem forçar os ci-entistas a modi f icarem e mesmo reco-lherem o art igo.

A interrogação de outros cientis-tas deveria levar â avaliação do traba-lho e dos pesquisadores. Essas avalia-ções podem ser extremamente c r í t i -cas, exigindo que você busque, j un to aos pesquisadores originais, uma res-posta à altura dessas crít icas. Os no-mes das pessoas a quem recorrer po-dem ser obt idos de várias maneiras. Mui tos artigos listam os nomes dos co-autores. Notas de rodapé de art i-gos publicados contêm referências ao trabalho do qual deriva a nova pes-quisa, e um catálogo de cientistas ou um 1/Vho's Who irão fornecer-lhe sua cidade natal ou locação universitária. Quando você falar aos pesquisadores, pergunte-lhes pelos nomes e localiza-ções de outros que estejam trabalhan-do em pesquisas similares. Freqüente-mente o funcionár io que lhe atenda no serviço de informações de um co-légio ou universidade local irá ajudá-lo a localizar alguém no campus que conheça o assunto, ou que possa indi-car alguém que o conheça. Os bibl io-tecários podem encaminhá-lo para outros trabalhos publicados, incluin-do artigos populares, que irão ajudar a colocar esse desenvolvimento em perspectiva. Um número crescente de bibliotecas e organizações noticiosas subscrevem serviços de informação computadorizada que podem acelerar sua pesquisa de l i teratura. 0 fíeader's

Guide to Periódica/ Literature e ou-tros catálogos são boas opções para se começar. Essas técnicas exigem tempo e esforço que muitos redato-res c ient í f icos dizem não poder dis-pender perto do f inal do prazo para entregar a matéria. Freqüentemente a história é escrita apenas com base no periódico c ient í f i co , dando-se o crédi to para essa fonte. Muitos reda-tores poderiam encontrar tempo para ler um art igo de enciclopédia sobre o tema. Depois de algum tempo escre-vendo informação c ient í f ica você irá desenvolver sua própr ia lista de con-tatos, construída com confiança mú-tua, para avaliação e para informação.

As melhores histórias, e as mais di-f íceis de interpretar, f reqüentemente vêm de periódicos associados a uma estreita especialidade ou sociedade c ient í f ica, tal como as subseções do American Inst i tute of Physics. Como os cientistas gostam de divulgar seu melhor t rabalho em publicações que tenham prestígio e que sejam lidos pelos colegas que conhecem seu cam-po, o redator de ciência irá encontrar menos referências e perspectivas mais amplas nesses periódicos. Entre os periódicos mais f reqüentemente ut i l i -zados e citados pelos jornalistas estão o New England Journal of Medicine (NEJM), o Journal of the American Medicai Association ( J A M A ) , e as pu-blicações inglesas Lancet para medi-cina e Nature (para ciência em geral). Colaboradores se engalf inham por to-do o mundo para serem incluídos nessas publicações. Seus editores es-tabelecem normas rígidas para a revi-

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são de pesquisa realizada por um co-lega, quanto a sua originalidade.

0 per iódico mais f reqüentemente ci tado dos E U A é o Science, publica-do pela Amer ican Association for the Advancement of Science. Parte da ra-zão pela qual os jornalistas conf iam em Science é sua freqüência semanal e sua seção "News and C o m m e n t " , um guia para os conf l i tos sobre a po-l í t ica c ient í f ica e os negócios públ i-cos, os f inanciamentos do governo e outros tópicos. Embora os longos ar-tigos sobre ciência, na parte da f rente da revista, sejam datados, eles podem fornecer aos redatores de ciência po-pular, do pon to de vista da not íc ia, bom material in format ivo para histó-rias sobre "eventos" e matérias que se prestam a interpretações mais am-plas. Ar t igos assinados por funcioná-rios do governo também oferecem vi-sões de como a pol í t ica c ient í f ica fe-deral se desenvolve. Sua seção "Re-search News" , escrita e editada por Ph. D's, ajuda os redatores de ciência a localizarem novos e significativos desenvolvimentos porque é uma se-ção escrita para ser compreendida através de linhas disciplinares. Os re-pórteres da "Research News" con-quistaram vários prêmios de reporta-gem. No f inal de Science está "Re-por ts " , uma seção às vezes lida por redatores de ciência à procura da pri-meira evidência de descoberta ou pes-quisa c ient í f ica de interesse humano. Como os editores de Science podem oferecer um per íodo de tempo relati-vamente rápido de seis semanas ou menos para a publicação, a Nat ional Aeronautics and Space Administ ra-

t ion e outras agências usaram Science para publicar as primeiras análises ci-ent í f icas dos dados das explorações lunares e planetárias e outros eventos importantes. Parte da primeira pes-quisa sobre a identif icação do vírus da A I D S fo i publicada em Science. As cartas dirigidas ao editor ocasio-nalmente revelam disputas sobre te-mas c ient í f icos e de pol í t ica.

Science News, uma revista sema-nal de poucas páginas, publicada pelo Science Service em Washington, D. C., é outra parte do sistema de "a le r ta " para os redatores de ciência. Os jor-nalistas da Science News, dedicam mui to mais tempo â leitura de perió-dicos c ient í f icos que a maioria dos profissionais da área. Suas notícias e matérias precisas e mu i to populares oferecem pontos de partida para ou-tros jornalistas pesquisarem suas pró-prias histórias, para seus públicos par-ticulares. Às vezes jornais e revistas irão re impr imi r essas matérias intac-tas, com permissão e crédi to.

Informação antecipada sobre a pu-blicação de matérias no periódico ci-en t í f i co é comum. Muitos dos impor-tantes periódicos da sociedade c ient í -f ica enviam cópias ou provas de art i-gos antecipadamente aos redatores de ciência dos principais jornais, serviços noticiosos e revistas. Alguns têm equipe de relações públicas que cha-mam repórteres selecionados na im-prensa, no rádio e na T V . Muitas uni-versidades irão alertar os redatores ci-ent í f icos locais quando um de seus cientistas tem um art igo publ icado. Alguns enviarão um press release quando determinado art igo é aceito

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para publicação, embora alguns pe-riódicos científ icos insistam no sigilo até a publicação efetiva. Um longo tempo pode se passar antes da publi-cação efetiva, embora o redator cien-t í f i co possa receber uma cópia ma-nuscrita do artigo ou um resumo do mesmo. Se a nova descoberta é sufi-cientemente significativa, os agentes de publicidade locais ou mesmo a so-ciedade nacional irão realizar uma en-trevista formal ou conferência de im-prense a respeito da publicação. O re-dator de ciência deve ser incluído, como contato, na lista das institui-ções que lidam com ciência, medicina e tecnologia.

Os Cientistas — cara a cara

A interrogação ou a coleta de no-tícias científ icas por meio de entre-vistas diretas com as pessoas respon-sáveis por nova informação cient í f ica é uma das mais agradáveis tarefas do redator de ciência. A sua atitude e a forma de abordagem são importan-tes. Prepare-se para a entrevista lendo o máximo que o tempo permit ir so-bre a área de interesse do cientista. Se você entrar dançando ou saraco-teando no laboratório do pesquisador esperando fazer uma piada sobre o trabalho para o qual ele vive e a sua completa ignorância, a atmosfera po-de se reduzir a Zero Absoluto a não ser que as circunstâncias sejam mui-to, mui to especiais. Blair Justice, que f inanciou seu Ph. D. em psicologia es-crevendo notícias científicas, diz que o verdadeiro teste da aceitação de um redator de ciência ocorre quando ele

chama um pesquisador diretamente e diz: "Gostaria de falar-lhe sobre o seu t rabalho." Isso significa eliminar cha-teações e floreios como conferências de imprensa, arranjos do pessoal de relações públicas e conexões da cida-de natal. Você está dependendo de sua própria reputação, abordagem e persuasão para obter uma entrevista.

Fazer sua tarefa de casa é essen-cial. Aprenda algo sobre o cientista e o assunto. Antes de uma entrevista, às vezes antes mesmo de procurar uma, você deve ao menos recorrer a um 1/Vho's Who nacional ou regional em busca de material biográfico. Os bibliotecários podem indicar-lhe ou-tras referências. A "morgue" ou a bi-blioteca de um jornal pode conter mais material informativo. Isso lhe dará bastante informação sobre a pes-soa, economizando tempo de entre-vista. Se a pessoa trabalha numa uni-versidade ou num negócio voltado para a tecnologia há boas chances de que o departamento de relações pú-blicas ou a secretária do departamen-to do cientista possa fornecer uma biografia e talvez mesmo algumas có-pias de artigos que outros redatores tenham publicado sobre o cientista ou trabalhos que ele mesmo tenha publicado.

Até que você conquiste uma boa reputação com os cientistas, você po-de ter de depender da assistência do pessoal de relações públicas. A maio-ria dos escritórios de relações públi-cas mantêm arquivos de biografias e recortes de seu pessoal. Às vezes o departamento de RP irá obter cópias

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de artigos c ient í f icos que um pesqui-sador tenha publ icado.

Você geralmente tem uma razão para escolher um cientista em parti-cular, mas obter algumas informações sobre seu passado campo não irá pre-judicar. Ler um artigo de enciclopé-dia ainda é melhor do que não fazer nenhum t ipo de preparação. Assume-se que você tenha fe i to já algum tra-balho para um curso de ciências e que você tenha um interesse genuíno pelo assunto, assim como se assume também, que você já leu revistas de not íc ias e de ciências. Ninguém sabe tudo, entretanto, e todos são apanha-dos despreparados uma vez ou outra. Um cientista visitante pode chegar à cidade inesperadamente, por exem-plo. Os cientistas temem tan to a le-gendária ignorância dos jornalistas que mesmo uma preparação e conhe-cimentos modestos podem evocar uma dose de boa vontade incomum numa fonte. Os cientistas esperam ter de explicar seu trabalho para os que não são da área, mas é demais pedir-lhes que eduquem um redator desde o in íc io.

Uma referência ú t i l e pouco co-nhecida para os redatores de ciência é a Encydopedia of Ignorance, por Ro-nald Duncan e Miranda Weston-Smith (1978). Os editores persuadi-ram cerca de sessenta cientistas a es-crever ensaios sobre o que é sabido e desconhecido em seus campos. Essa publicação também pode servir como fonte de idéias para matérias.

O cientista deve saber com ante-cedência o que você deseja falar. Uma vez solicitei uma entrevista com

uma f igura importante em ciência po-l í t ica para conhecê-la, nada mais. Seu homem de relações públicas perdeu isso de algum modo na transferência da informação. Ambos perdemos — o cientista, porque se perguntava por que mot ivo eu estava ali, e eu, por-que não podia imaginar sua irr i tação sobre chegarmos ao mot ivo do en-contro. Portanto, deixe claro com an-tecedência o que você deseja falar. Isso ajuda seu entrevistado a se aprontar para suas perguntas, algu-mas das quais você deve preparar an-tes da entrevista. Evite colocar per-guntas " fechadas", aquelas que po-dem ser respondidas com um sim ou um não. As perguntas com saídas abertas não podem ser resolvidas com monossílabos como resposta. Elas trarão mais informação e oferecerão a ambos um prazer maior pelo encon-t ro. As perguntas fechadas são me-lhores para obter e verificar fatos es-pecíficos: números, horários, locais e datas.

Às vezes, mesmo quando você está preparado, seu entrevistado irá per-manecer tac i turno, pouco comunica-t ivo e de pouca ajuda. Para o redator de ciência este é o equivalente de uma " testemunha hos t i l " de u m pro-motor. Poderá ser preconceito contra jornalistas cient í f icos, poderá ser me-do, poderá ser um mau almoço e po-derá ser má fé ao aceitar o encontro. Seja qual fo r a razão, será melhor pa-ra o redator procurar outras fontes, das quais há muitas para quase todos os temas. Como fo i observado antes, os cientistas maduros e experientes estão sempre mais dispostos a falar. E

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a maioria dos cientistas que já tive-ram contato com representantes dos veículos de comunicação aceitam bem outros contatos. Saia com o que conseguir. O ou t ro lado desta moeda é que, na maioria das vezes a sua pre-paração irá capacitá-lo a convencer o seu entrevistado de que você é edu-cável. O entrevistado irá se abrir para você e às vezes sugerir novos aspectos para a matéria. Você deve ir à entre-vista preparado para deixar de lado algumas perguntas e seguir novas pis-tas se tiver oportunidade.

Provavelmente terá de encorajar o cientista a abandonar o jargão técni-co e part i r para uma linguagem mais comum, analogias e explicações. "Vocês não ir iam falar desse modo com sua mãe", censurou um cientis-ta a seus colegas por usarem lingua-gem técnica ao explicar seu trabalho a não-cientistas. Naturalmente, você estará em apuros se a mãe tiver um Ph. D. em física.

Ocasionalmente você poderá en-contrar alguém que deseje conhecer as perguntas antes. Os jornais geral-mente não gostam de fazer isso em assuntos pol í t icos. Você terá de fazer seu própr io ju lgamento a respeito da ciência se a sua publicação não tiver normas rígidas. Os redatores desco-br i ram que um con jun to de questões provocativas pode estimular uma pes-soa que está cansada das mesmas an-tigas perguntas ou que é conhecida como d i f í c i l de contatar. Algumas empresas fornecem a seus executivos, cientistas e pessoal de relações públi-cas conjuntos de respostas padrão preparadas com antecedência a part ir

de perguntas anteriores. Algumas companhias e indiv íduos usam o sis-tema da pergunta escrita como ma-neira de desencorajar jornalistas.

U m bom entrevistador tenta não tomar mais tempo do que o necessá-r io de um entrevistado. Você sempre pode vol tar, com sua reputação pro-vavelmente melhorada. Assegure-se de que tem os números do escritório e da casa do cientista de modo que possa telefonar-lhe para verif icar fa-tos, citações e perspectiva — e preen-cher em sua história os claros deixa-dos por perguntas que esqueceu de perguntar ou respostas que não com-preendeu inteiramente. Oferecer-se para fazer isso pode evitar de se ouvir a desagradável solicitação de " ler a história para verif icar a precisão, quando tiver te rminado" . Poucas or-ganizações permi tem que uma fon te leia matérias, histórias e scripts termi-nados ou assistam com antecedência a uma matéria em f i ta ou f i lme. En-t re tanto, demonstrar sua própr ia preocupação com a precisão da ma-téria com freqüência reassegura o en-trevistado e ajuda-o a afastar as soli-citações para você "most rar seu tex-t o " . Por ou t ro lado, os redatores de ciência da área de relações públicas trabalhando para uma organização ci-ent í f i ca ou médica podem esperar que todas as suas matérias sejam re-vistas por uma ou mais pessoas da or-ganização, inclusive pelos própr ios in-d iv íduos que são objeto delas. Algu-mas revistas seguem essa prática tam-bém. Os repórteres de jornais e servi-ços noticiosos evitam mostrar as ma-térias porque a rapidez dos processos

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editoriais para cumpr i r prazos, pode resultar em mudanças no tex to .

Por causa de suscetibilidades sobre a divulgação de pesquisas antes da re-visão dos colegas e de sua publicação, alguns cientistas podem se mostrar reticentes a respeito de pesquisas em andamento. Se o risco da divulgação prematura for uma ameaça à publica-ção do trabalho, o cientista pode evi-tar falar sobre certas áreas. Entretan-to , o redator não deve cair na armadi-lha da auto-censura antes de inquir i r . Seja direto. Quando os cientistas esti-verem preocupados, eles lhe dirão e apreciarão seu reconhecimento do problema.

Pode ser possível obter uma pro-messa de not i f icação quando fo r che-gada a hora. A Dra. Barbara Gastei, médica e escritora de textos para pu-blicações populares e médicas, acon-selha os pesquisadores que temem a publicação prematura á oferecerem para chamar os jornalistas quando es-t iverem prontos para discut ir seu tra-balho (1983). Entretanto, o acompa-nhamento do processo permanece sendo responsabilidade do redator. Os cientistas têm memórias notoria-mente ruins para redatores de ciên-cia, exceto para aqueles que traba-lham nos principais jornais e redes de tevê. 0 mesmo se aplica a muitas pes-soas da área de RP.

Gastei também aponta dois pro-blemas que freqüentemente confun-dem as entrevistas cientistas-jornalis-tas. Primeiro, existe um grupo de ci-entistas que pensa que os jornalistas deveriam obter t odo o seu material das publicações cientí f icas. Esses ci-

entistas acham que as entrevistas des-perdiçam tempo quando toda a infor-mação necessária está disponível nas publicações. Ela previne os cientistas de que quando eles tentam escrever fora de sua própr ia especialidade, po-dem ficar tão perdidos e inclinados a erros como qualquer jornalista. A Dra. Gastei admoesta os cientistas-es-critores de que eles também ir iam precisar obter informação fresca so-bre a pesquisa e conf i rmar a validade do trabalho fe i to mu i to antes de ter sido publ icado. Diz aos cientistas-es-critores que eles, também, ir iam pre-cisar do que o jornalista não-cientis-ta precisa: citações, detalhes de inte-resse humano, impressões, cor e des-crições. Essas coisas acrescentam car-ne e sangue aos ossos nus da vida c ient í f ica descrita na l i teratura.

Gastei lida com ou t ro problema, conseguir a precisão dos detalhes en-quanto se perde o enfoque maior de uma matéria. Assegure-se de que cap-tou o conceito central ou a imagem geral e que pode colocá-la claramente para seus leitores ou espectadores an-tes de começar a falar em detalhes. Dê perspectiva e orientação a si mes-mo e a seus leitores; mostre-lhes a floresta antes de levá-los para as árvo-res isoladas. Essa informação é parte do "parágrafo de signif icação" ou do histórico.

Ler Gastei irá proporcionar- lhe uma boa revisão das práticas cient í -ficas do ponto de vista do cientista, assim como modos de abrir novas li-nhas de comunicação com uma fon te que permanece cética em relação à popularização. Além disso, você, co-

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mo muitos outros redatores e edito-res, pode desejar aproximar-se de um cientista ou médico para escrever um artigo para sua publicação. Se o espe-cialista compreende melhor alguns dos problemas e técnicas, você estará servindo seu público de uma maneira nova. Uma cópia do livro da Dra. Gastei poderia ser um presente út i l para suas fontes.

O cientista reticente tem um opos-to, pois a ciência tem também seus buscadores de publicidade, como ocorre na maioria das profissões. Al-guns são cientistas mui to bons que quebram a imagem estereotipada que têm os habitantes de laboratórios: t í -midos e retraídos. Alguns poucos compreendem bem demais como ma-nipular jornalistas para concederem tempo no ar e t inta a assuntos que têm pouco valor, mas podem ajudar a decorar um pedido de f inanciamento ou o livro de recortes das relações pú-blicas da universidade. Décadas atrás, esses cientistas adquir iram o apelido de "operators". A opinião de uma outra pessoa pode ser de ajuda se vo-cê suspeitar que está sendo excessiva-mente usado.

Observando a ciência de perto

A observação direta da ciência, por parte dos jornalistas, no ato em que está se fazendo, é rara. A maioria dos eventos significativos não pode ser vista de modo algum em muitas ciências. A descoberta surge da mani-pulação de dados, seja nas cabeças dos cientistas seja em longas análises de computador.

As aplicações e a tecnologia ofere-cem chances melhores para o redator ver e relatar o que acontece. Por exemplo, os escritores de ciência já andaram em aviões, dentro de fura-cões, ao lado de pesquisadores me-teorológicos. Ritchie Ward, autor de livros e artigos de revistas, fo i convi-dado para um vôo à América do Sul onde passou uma semana com cien-tistas oceânicos a bordo de um navio de pesquisas, simplesmente porque os cientistas gostaram de um de seus li-vros que encontrou um caminho para fazer parte do material de leitura do navio (1978, 19).

Escavações arqueológicas, expedi-ções de campo, visitas a laboratórios e outras oportunidades podem se abrir ao redator de ciência que procu-ra. Os cientistas, particularmente os administradores, gostam de mostrar suas instalações. Mesmo se você não observar uma "descoberta" verdadei-ra, as descrições dos lugares e condi-ções nas quais a ciência é realizada constituem leitura interessante para aqueles que podem imaginar mas nunca têm a chance de sair de trás da cortina. Enquanto você não vir al-guns aparelhos usados pelos físicos ou pesquisadores de energia, vai lhe faltar a sensação exata a respeito de sua escala de operações. Uma visita a laboratórios não é exatamente o mes-mo que descer ruidosamente por um canal de Everglades com um biólogo aquático, mas qualquer experiência pessoal o ajudará a colocar os assun-tos em perspectiva melhor.

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Participação ainda mais rara

Os cientistas gostariam que hou-vesse mais redatores de ciência com experiência em pesquisa. Você não pode avaliar o problema sem compre-ender a localização, as condições ou a experiência física. Alguns redatores procuram experimentar o que estão discutindo. O oceanógrafo Bill Cromie, e presidente do Council for the Advancement of Science Wri t ing (CASW), ajudou cientistas no dif icí-l imo esforço de capturar tartarugas gigantes para marcá-las com etique-tas. Uma vez teve de ser resgatado de uma ilha de gelo que se derretia. Da-vid Perlman, do San Francisco Chro-nicle, também part icipou de expedi-ções científ icas de campo como membro trabalhador da equipe. Am-bos relatam que sua compreensão da ciência evidenciada na sua redação cient í f ica é melhor por causa das ex-periências. Devido à contr ibuição que emprestaram ao trabalho das expedi-ções, ambos experimentaram maior aceitação das pessoas quanto aos seus esforços de reportagem e amizades com membros das expedições. Várias universidades, laboratórios privados, hospitais e instalações governamen-tais, tais como os National Institutes of Health, levam os redatores cientí-ficos para dentro de suas rotinas coti-dianas por algumas semanas ou me-ses. Através da realização de trabalho út i l , que varia desde escrever press re-leases e anotar observações até mes-mo lavar vidros do laboratório, o re-dator obtém experiência direta sobre como a ciência é feita.

Às vezes períodos formais de in-ternato são oferecidos para estudan-tes de nível superior ou já graduados bem como para jornalistas que já exercem a profissão. Freqüentemente estipula-se uma remuneração. O MIT oferece dois t ipos de experiências pesquisa-estudos para aqueles que po-dem dispor de um tempo no seu tra-balho como redatores de ciência. Um dura algumas semanas, o ou t ro cobre um ano acadêmico com as despesas pagas. 0 programa Nieman Fellows, da Harvard, paga aos jornalistas por um ano acadêmico, que pode incluir cursos científ icos. Redatores de ciên-cia treinando na Columbia University cortam cadáveres em aulas de anato-mia como parte de sua experiência educacional. A American Association for the Advancement of Science ofe-receu por vários anos a alguns jovens cientistas um programa interno em jornais, TV e revistas para mostrar-lhes como os meios de comunicação funcionam.

Essas experiências acrescentam au-tenticidade e drama às histórias de pesquisa cientí f ica. Mesmo aqueles cujo treinamento inclui cursos de ciência e experiência em laboratórios deveriam tirar vantagens de qualquer oportunidade que possam agarrar, mesmo se for apenas para passar al-gumas horas com pesquisadores tra-balhando durante toda a noite numa experiência intrincada. Mesmo o té-dio tem significado. Sua experiência irá acrescentar detalhes e maior per-cepção ao seu trabalho, coisas que de outra maneira lhe escapariam a não

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ser que seja um entrevistador imagi-nativo.

Relatórios especiais

Outra fonte de matérias cient í f i -cas pode ser encontrada em relatórios especiais. É comum funcionários e agências do governo entregarem te-mas particularmente complicados pa-ra serem analisados por um painel es-pecializado, tal como uma "comissão de faixa azul". Freqüentemente esse é um método usado para retardar uma decisão ou justif icar uma deci-são pol í t ica impopular. Tais pai-néis de investigação especial foram usados para pesquisar as causas do acidente da usina nuclear de Three Mile Island, e para determinar se os f luorocarbonos, amplamente usados em condicionadores de ar e refrigera-dores, deveriam ser controlados por causa de seu potencial para danificar a camada atmosférica que protege a terra. O redator de ciência pode ba-sear matérias nas conclusões do rela-tór io. No mundo competi t ivo dos jornalistas, alguns receberam prêmios por terem contatos que lhes fornece-ram antecipadamente uma cópia de um relatório ou de seus descobrimen-tos, antes da sua divulgação oficial. Você também deve descobrir quem marca os contatos com essas comis-sões e quem os consegue. Não é in-comum encontrar-se um painel cheio de membros cuja história pessoal e profissional di f icul ta a consideração imparcial dos temas. Sempre que isso ocorrer, o potencial de distorção num relatório deve ser mencionado.

Os relatórios podem ser encontra-dos em desenvolvimento na maioria das agências governamentais federais e de muitos estados. A National Aca-demy of Sciences e a National Aca-demy of Engineering administram uma organização de investigação co-nhecida como o National Research Council (NRC). É a maior fonte de renda da academia. O trabalho prin-cipal do conselho é avaliar dados cient í f icos sobre problemas específi-cos e compilar relatórios que reco-mendam ações técnicas a serem de-senvolvidas pela agência governamen-tal que solicita o estudo. 0 National Research Council não pesquisa dire-tamente, embora possa contratar la-boratórios privados ou governamen-tais para a realização de testes espe-cíf icos. Com exceção de alguns estu-dos sobre armamento e outros proble-mas de segurança nacional, o traba-lho do NRC é de domín io público.

Geralmente o relatório será divulga-do aos jornalistas pela agência patro-cinadora. Os relatórios do NRC têm inconvenientes similares aos das co-missões de faixa azul. Os membros dos painéis que avaliam os dados e fa-zem as recomendações podem ser tra-zidos, por causa de sua experiência, de firmas, negócios e instituições com interesse econômico na maneira pela qual os problemas serão resolvi-dos. Os membros dos painéis não pre-cisam ser membros das academias; podem servir como voluntários por causa do prestígio, ou outros prêmios provenientes da sua associação com as academias. As academias tentam

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fazer recomendações que evitem inte-resses confl i tantes.

Muitas agências governamentais conduzem grande parte de sua pró-pria pesquisa. O Nationai Bureau of Standards e a Consumer Product Sa-fety Commission, por exemplo, pres-tam informações de interesse para re-datores de publicações comerciais ou orientadas para o consumidor. Fre-qüentemente o primeiro alerta de ris-cos na segurança, nos Estados Uni-dos, vem da rede de informações so-bre danos, operada pela comissão de segurança dos produtos. Dependendo das tendências polít icas ou comer-ciais dos funcionários federais em qualquer momento dado, as normas de uma agência quanto à coleta e di-vulgação dessa informação pode va-riar. Redatores de ciência alertas po-dem ser os primeiros a detectar tais mudanças e elas podem merecer not í -cia. Wil l iam J. Broad, do The New York Times, fo i o pr imeiro a desco-brir quando o Department of Energy parou de divulgar testes subterrâneos de bombas nucleares.

O Department of Defense, as três forças armadas, e a National Aero-nautics and Space Adminis t rat ion (NASA) mantêm gigantescos orça-mentos destinados ao desenvolvimen-to de pesquisas em seus próprios la-boratórios e aos contratos de pesqui-sas repassados para universidades, ins-tituições não-lucrativas e firmas co-merciais. Seus projetos abrangem des-de pesquisa básica e fundamental, ao trabalho f inal de desenvolvimento e engenharia para grandes projetos. Mui to do trabalho de defesa é não-

restrito ou facilmente retirado da classificação de restrito por alguém desejando um pouco de publicidade. Quando um projeto está com proble-mas pol í t icos, os redatores acham mais fácil obter acesso a informações se os militares pensarem que um pou-co de compreensão pública ajudará. Os contratantes também podem re-ceber a visita de um jornalista ou se-rem entrevistados por ele sobre te-mas de natureza mil i tar delicados. Qualquer dessas organizações pode proporcionar ao redator de ciência um ponto de partida na pesquisa pa-ra uma matéria. Os National Institu-tes of Health e os Centers for Disease Control freqüentemente compilam relatórios sobre a situação de proble-mas médicos e das pesquisas que fi-nanciam. Você pode usar isso como fontes iniciais de referência para suas matérias, exatamente como usa os ar-tigos de periódicos científ icos. Escre-va a essas agências pedindo esse ma-terial e entre para suas listas de cor-respondentes.

Reuniões científicas

Uma das mais ambíguas fontes de matérias científ icas é a reunião cien-t í f ica. Geralmente realizadas uma vez por ano, essas reuniões congregam os membros de uma sociedade para fa-lar sobre negócios profissionais e ouvir relatórios de cientistas sobre sua pesquisa e, freqüentemente, nor-mas, ética ís f inanciamento. Os médi-cos as têm, os virologistas as têm e o mesmo acontece com enfermeiras e biólogos experientes. Essas reuniões

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honram a tradição c ient í f ica de dis-cut i r e cr i t icar abertamente a pesqui-sa relatada na reunião. Várias socie-dades também realizam reuniões lo-cais, municipais, estaduais e regio-nais, assim como nacionais.

Diversas razões tornam essas reu-niões atraentes aos colecionadores de notícias. Por si mesmo, as reuniões cientí f icas já representam um evento not icioso local. Sociedades mu i to grandes, tais como a Amer ican Medi-cai Associat ion, Amer ican Geophysi-cal Union, ou a Amer ican Associa-t i o n for the Advancement of Science ( A A A S ) , atraem milhares de partici-pantes de todo o mundo. Personali-dades famosas estão na cidade, dispo-níveis para entrevistas, se você puder agarrá-las. Os programas, distr ibuí-dos com antecedência, relacionam as apresentações de trabalhos c ient í f i -cos: mais ou menos uma dúzia para uma sociedade pequena, centenas pa-ra as grandes como a A A A S , o Ame-rican Inst i tute of Physics, ou o Ame-rican Inst i tute of Aeronautics and Astronautics. A seleção de histórias cient í f icas a part i r de quantidades co-mo essas é uma tarefa d i f í c i l para o redator de ciência.

A lém disso, existe a competição. As reuniões da A A A S podem atrair centenas de jornalistas às salas de im-prensa. Convenções importantes co-mo essas mobi l izam os serviços noti-ciosos, bem como os redatores dos jornais nacionais e dos grandes diá-rios regionais. Revistas noticiosas e periódicos comerciais enviam equipes para a reunião. A lém disso, redato-res free-lancer de todo o país af luem

a essas reuniões à procura de histó-rias, de novas idéias e de conta to com cientistas que podem ser fontes de in-formação de grande uti l idade. Ele-mentos das televisões local e de ou-tras redes vêm à procura de maté-rias. Entre os jornalistas haverá pes-soal de relações públicas e funcioná-rios de informação do governo pro-movendo os oradores de suas institui-ções e renovando contatos com re-presentantes dos meios de comunica-ção. Existe um cl ima de festa cont i -do. Parte da formal idade que rege os contatos, mesmo com os cientistas domésticos se dissipa.

Nas salas de imprensa das associa-ções maiores, cópias da maioria dos trabalhos a serem apresentados são deixadas à disposição para serem apa-nhadas. A liberação das histórias es-critas a part ir dessas cópias geralmen-te está condicionada ao dia e hora em que cada trabalho será apresentado. Em outras reuniões, a equipe pode reproduzir uma cópia de um trabalho para arquivo, mediante solicitação. Mui tos jornalistas c ient í f icos escre-vem suas histórias a part i r dessas có-pias evitando ficar sentados durante as palestras. Entretanto, isso se revela embaraçoso se o orador deixa de comparecer ou faz modificações im-portantes. Repórteres de ciência que usam esse material antes da apresen-tação efetiva geralmente incluem nas suas matérias uma frase tal como: " E m um trabalho a ser apresenta-do. . . " e fazem uma verif icação para ver se o t rabalho fo i apresentado con-forme programado.

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Nas ocasiões em que trabalhos são retirados dos programas, as razões disso podem valer uma reportagem. Em 1983, por exemplo, a administra-ção Reagan ordenou que os cientis-tas retirassem cerca de cem trabalhos não-confidenciais de uma reunião da Society of Photo-Optical Engineers. Foi a pr imeira indicação da determi-nação dessa administração em fazer cumpr i r a nova po l í t i ca de manter a ciência e tecnologia americanas fora do alcance de outros países. Curiosa-mente, alguns cientistas — a maioria dos quais mant idos por concessões e contratos do governo — protestaram contra essa censura da pesquisa cien-t í f ica . O assunto só f icou conhecido porque u m repórter da Science News part ic ipou da reunião.

Se a sala de imprensa não tem có-pia de u m trabalho, os oradores com freqüência trazem cópias extras para distr ibuir a todos que desejarem. Em reuniões de pesquisa médica, obter cópias pode ser compl icado pelo fa-to de que alguns periódicos se recu-sarão a publ icar a pesquisa se outras publicações t iverem usado histórias e dados detalhados retirados de u m tra-balho apresentado numa reunião pú-blica.

O R G A N I Z A Ç Ã O D A IMPRENSA. Se a ocasião é suficientemente impor-tante para atrair os redatores de ciên-cia dos meios de comunicação nacio-nais, como fo i mencionado antes, u m pequeno grupo de cerca de uma dú-zia de redatores dos maiores jornais e serviços noticiosos alcançará um con-senso sobre qual história escolher pa-

ra aquele dia. Também se informarão jun to à equipe da sala de imprensa e j u n t o aos diretores de relações públ i-cas da sociedade sobre a que grupo de cientistas deveriam solicitar confe-rências noticiosas. Esse grupo de re-datores de ciência sêniores exerce enorme inf luência por várias razões. Eles representam veículos poderosos de grande circulação. Geralmente sa-bem mais sobre questões de ciência, contemporânea do que outros repór-teres porque comparecem regular-mente à maior ia das principais reu-niões das associações. Também co-nhecem pessoalmente os cientistas mais importantes e os funcionár ios das sociedades.

Sharon D u n w o o d y , analista de re-dação c ient í f ica , conclu iu que a orga-nização da conferência de imprensa permite a manipulação dos veículos pelas equipes das associações c ient í -ficas (1979a). As not íc ias que pro-vêm da reunião são controladas pela programação de conferência de im-prensa porque torna certos tópicos mais fáceis de serem cobertos. Geral-mente o consenso dos redatores so-bre que história irão enfatizar se rela-ciona à matéria de uma das conferên-cias de imprensa onde os redatores têm a opor tunidade de obter deta-lhes maiores diretamente dos autores dos trabalhos escolhidos para aquele dia. A conveniência e eficiência das conferências de imprensa levam ou-tros escritores de ciência, que podem ter menos compreensão d o tema, a seguirem os líderes. Os redatores de ciência protestaram que as conferên-cias de imprensa haviam evo lu ído a

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part ir de solicitações de jornalistas c ient í f icos (Bishop, 1980).

Dunwoody também concluiu que os redatores de ciência com mais for-mação c ient í f ica e os que não costu-mam ser pressionados por prazos, tais como redatores de revistas, t inham matérias mais interessantes que aque-las escritas pelo grupo, e escolhiam temas diferentes. Free-lancers e reda-tores das equipes de redação de re-vistas usarão mais as reuniões para colherem informações e obterem en-trevistas para matérias de enfoque mais amplo do que o farão os jorna-listas premidos por um ou mais pra-zos diários. Freqüentemente esses re-datores se satisfarão com reunir có-pias para os seus arquivos de informa-ções (uma tática út i l para outros redatores também). As reuniões são um bom lugar para arranjar futuras visitas e entrevistas. U m redator tam-bém pode recolher trabalhos menos importantes que facilitarão' a elabora-ção de matérias em outra ocasião ou em outros departamentos do jornal ou revista. A pesquisa psicológica po-de iniciar uma matéria para a seção li-gada a estilo de vida, por exemplo, ou um f ís ico pode falar sobre o vôo de bolas de beisebol ou golfe, numa matéria para a página de esportes. Biólogos podem ser encontrados fa-lando sobre os hábitos de peixes, pás-saros e outros animais selvagens.

Quanto maior a organização mais sofisticados serão os preparativos pa-ra o contato com a imprensa. As or-ganizações pequenas podem não dis-por de uma sala de imprensa, deixan-do a seu cargo encontrar oradores e

funcionários. As maiores oferecerão máquinas de escrever e telefones, có-pias dos trabalhos e alguns materiais de referência c ient í f ica. As reuniões maiores também preparam áreas se-paradas para entrevistas de rádio e te-levisão, e providenciam tomadas de força e conexões de telefone confor-me necessário.

C O N F I A R EM CONFERÊNCIAS. Apesar das vantagens que oferecem as reuniões como fon te de matérias para jornalistas e da respeitada tradi-ção das reuniões cientí f icas, mui tos cientistas não gostam de ver matérias escritas a part i r de apresentações orais. A pesquisa apresentada, ale-gam, é f reqüentemente experimental e os dados insubstanciais. Os temas podem ser tr iviais e, no entanto, al-cançar as manchetes enquanto traba-lho mais consistente passa desperce-bido. Os trabalhos não são revistos tão minuciosamente quanto aqueles apre-sentados aos periódicos cient í f icos, e a pesquisa apresentada numa reunião pode nunca aparecer numa publica-ção. As conferências de imprensa, di-zem os cientistas, oferecem a hábeis operadores a oportunidade de conse-guir publicidade, ao insinuar que existe a possibilidade da inveja, tanto quanto a genuína preocupação com a ciência, estarem em jogo. Ou t ro pon-to contra as matérias provindas de reuniões, de acordo com alguns dos cientistas, é que pesquisadores sérios cedem lugar a estudantes graduados e os trabalhos geralmente entram na programação apenas para preencher espaço.

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Essa é uma posição curiosa. Os jornalistas não têm qualquer inf luên-cia no que os cientistas incluem em seus programas. Se há uma abundân-cia de ciência de segunda categoria, isso é um problema de controle de qualidade que diz respeito àqueles que planejam a reunião, não aos jor-nalistas que a relatam. Se essa pesqui-sa é tão pouco confiável como alguns cientistas indicam, por que os cientis-tas desperdiçam tempo preparando ou comparecendo a essas reuniões? Talvez eles compareçam pelas mes-mas razões que a imprensa — é um evento e você sempre obtém algo de-le. Os pesquisadores af i rmam que t i -ram'mais da conversa com colegas do que das sessões formais. A inveja pro-fissional pode ter também o seu pa-pel na reclamação. Por ou t ro lado, o comparecimento de cientistas da im-prensa d im inu iu signif icativamente na reunião anual em 1985, da A A A S , levantando questões sobre a cont inui -dade do interesse em reuniões desti-nadas ao corpo geral das preocupa-ções cient í f icas.

Apesar do que os cientistas dizem sobre as matérias provindas de reu-niões, os jornalistas jamais ignorariam uma reunião grande na cidade como podem ignorar u m grande incêndio ou explosão. Cobr i r o que está acon-tecendo na cidade é uma das tradi-ções do jornal ismo. E as reuniões têm fe i to emergir os novos rumos da ciên-cia. Algumas das primeiras especula-ções sobre os v í rus como causadores de câncer fo ram tornadas públicas pela pr imeira vez em reuniões c ient í -ficas. Assim, afirmações arrasadoras

sobre a pouca importância do mate-rial parecem infundadas. O fa to de as sociedades profissionais convidarem a cobertura jornal íst ica indica que os líderes das organizações sentem que existem alguns benefícios na cobertu-ra noticiosa. A diferença dos traba-lhos, em termos de qualidade, se exis-te, só faz aumentar a pressão sobre o redator de ciência para selecionar uma matéria de valor para o seu pú-bl ico. As reuniões oferecem aos reda-tores uma opor tunidade de apanha-rem os cientistas ao ar livre, longe da proteção de secretárias, estudantes graduados e portas de laboratórios.

A o invés de se basear em trabalhos individuais, você poderia subst i tuí- los por entrevistas com cientistas visitan-tes. Certif ique-se de que seu t rabalho de casa f o i fe i to antes para ajudar a assegurar uma sessão f ru t í f e ra . Algu-mas vezes você poderá imaginar uma história original ao se deparar com um tema c o m u m sendo abordado em vários trabalhos. E parte da cobertura noticiosa das reuniões tem a ver com os negócios de rot ina da própr ia so-ciedade, tal como a eleição de novos funcionários. Afastar-se do grupo de redatores pode proporcionar histórias exclusivas para o redator que se pre-para para a reunião.

Cobrir reuniões cient í f icas perma-necerá na agenda do redator de ciên-cia por m u i t o tempo. As reuniões oferecem vantagens demais para que arrisquemos ignorá-las. A suposta qualidade infer ior dos trabalhos ofe-rece um desafio para ver ou farejar uma história melhor a part i r das fon-tes disponíveis. Como redator com

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alguma experiência em ciência, você pode encontrar histórias originais nessas reuniões. Se o campo for estra-nho à sua experiência passada, procu-re orientação dos presidentes locais do programa quanto aos melhores tó-picos da reunião. Geralmente essas pessoas podem ser contatadas através da sociedade ou do escritório de rela-ções públicas de uma universidade antes da reunião.

Uma lista das reuniões ou conven-ções programadas para a sua área geral-mente pode ser encontrada nas câma-ras de comércio locais ou nos centros de convenções. A revista Science pu-blica uma listagem completa das da-tas e lugares das reuniões científicas. Os membros da National Association of Science Writers rotineiramente re-cebem aviso de futuras reuniões vin-do dos escritórios de relações públi-cas de várias sociedades. Os redatores são aconselhados a verificar sobre o acesso da imprensa bem antes da data da reunião. Algumas das sociedades menores, mais especializadas, têm de-sencorajado a cobertura da imprensa em geral e outras admitem free-lan-cers apenas se estes apresentarem provas, tais como a carta de um edi-tor , de que estão ali trabalhando nu-ma tarefa específica.

Fontes de relações públicas

Há mais redatores de ciência trabalhando para empresas e institui-ções do que para veículos de comu-nicação. Esses redatores de relações públicas oferecem outra fonte út i l de informação científ ica. Alguns jornais

e estações de rádio irão imprimir e transmit ir os press re/eases de ciência como lhes foram passados, embora os veículos maiores com equipes melho-res irão relatá-los e editá-los de ma-neira a servir a sua clientela específi-ca. Entretanto, parte da melhor reda-ção de ciência é realizada pelo pes-soal de relações públicas. Alguns press releases consti tuem matérias de ciência melhores do que suas versões reescritas pelos veículos. Isso não acontece com a maioria. A qualidade da redação tem pouca importância na decisão dos veículos em prepararem sua própria versão.

Os redatores de ciência dos veícu-los de comunicação têm em mente que as matérias preparadas por em-presas comerciais, universidades, hos-pitais e outras instituições são dirigi-das à promoção do bem-estar das or-ganizações, e não a satisfação das ne-cessidades dos leitores ou espectado-res. Isso significa que você deve fazer muitas perguntas sobre as idéias com-piladas de press releases, brochuras e revistas institucionais. Essas fontes podem necessitar de suplementação porque raramente mencionam estu-dos semelhantes feitos por outras ins-tituições, por exemplo. Um hospital pode alardear a compra de uma nova peça de equipamento médico, mas deixa de dizer que há outras na cida-de exatamente iguais. Um hospital ou cl ínica pode anunciar a existência de um novo procedimento médico sem dar informações passadas ou prospectivas a esse respeito, tais co-mo os riscos envolvidos ou tratamen-tos alternativos. Os agentes de publi-

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cidade da indústria farmacêutica são notór ios por promoverem ligeiras va-riações nas drogas existentes ("me too drugs") sem mencionar os produ-tos dos competidores. Os efeitos co-laterais, que são aquelas reações que acompanham os efeitos pretendidos de qualquer droga, raramente são mencionados nos press releases. É trabalho do redator de ciência perma-necer alerta a essas omissões e pro-porcionar a perspectiva e imparciali-dade necessárias.

Por o u t r o lado, o pessoal de rela-ções públicas pode oferecer aos reda-tores de ciência dos meios de comu-nicação assistência na identif icação de matérias e na obtenção de entre-vistas. Isso, teoricamente, é a sua ra-zão de ser, embora qualquer observa-dor prudente irá reconhecer que seu pr imeiro objet ivo é a promoção e a proteção das organizações que pagam seus salários. Em muitas organiza-ções, a atividade de relações públicas é considerada parte de marketing e vendas. No in íc io do desenvolvimen-to dos escritórios de relações públ i-cas, o t ra tamento imparcial dos meios de comunicação locais era um dos pr inc íp ios de operação estabele-cidos. Durante os ú l t imos anos isso mudou. Sob o raciocínio do marke-ting pelo maior retorno, as necessi-dades dos redatores c ient í f icos que trabalham para os meios de comuni-cação locais podem ser sacrificadas em função dos prováveis benefícios, resultantes da colocação de uma his-tór ia exclusiva numa das publicações nacionais ou nas redes de televisão. Algumas vezes jornalistas locais nego-

ciam com uma inst i tuição a igualdade de direi tos com os meios nacionais, mas obter a história antes cont inua sendo o alvo.

Desse modo, o redator de ciência arrisca-se a apanhar de alguém de fo-ra em seu própr io te r r i tó r io . Esse é o argumento para manter-se em bons termos com o escri tór io de relações públicas, mas também para desenvol-ver o máx imo possível suas próprias fontes na comunidade c ient í f ica. Essa colocação das melhores histórias para o efei to máx imo nos meios de comunicação nacionais é uma conse-qüência da quantidade de press re-leases sendo enviados a redatores de ciência dos meios de comunicação. Por causa da quantidade, os releases com freqüência são abertos e selecio-nados por um func ionár io menos gra-duado, não por um redator de ciên-cia. Muitas organizações estão redu-zindo o número de press releases em favor de uma colocação mais pessoal e especializada de histórias indivi-duais.

O redator de ciência da área de re-lações públicas com freqüência esco-lhe a que matérias de uma importan-te inst i tuição dar publ icidade. Em instituições menores, o departamento de RP precisa trabalhar m u i t o duro para localizar informação fresca e obter um release aprovado pelos administradores de escalão superior. O trabalho de RP inclui examinar mi-nuciosamente informações que ser-vem como histór ico para serem distri-buídas e preparar conferências de im-prensa. Mu i to f reqüentemente os re-datores de ciência da área de relações

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públicas são cri t icados porque um cientista ou administrador deseja dar publicidade a um material que é tr i-vial ou incompleto. Os redatores dos veículos de comunicação podem sim-plesmente ignorar tal matéria ou, no pior dos casos, divertir-se com a ten-tat iva de publicidade. Em 1981, a Harvard University fo i r idicularizada por dar publicidade a certas pesquisas como "novas" quando eram, na ver-dade, uma extensão de trabalhos fei-tos uma década antes na U C L A . Em-bora o trabalho anterior fosse ci tado em notas de rodapé, sua relação com a pesquisa mais nova não fora torna-da clara nos materiais passados aos repórteres. Paul Jacobs, do Los Ange-les Times, t ropeçou no cientista que deu origem à técnica que lidava com o est ímulo do crescimento ósseo, en-quanto procurava avaliação de outros cientistas a respeito da not íc ia anun-ciada por Harvard (Silberner, 1981).

Matérias promovendo drogas no-vas trazem maus momentos aos jor-nalistas de ciência. Com mui ta fre-qüência as drogas desapontam ou se mostram inesperadamente perigosas depois que matérias foram escritas a part i r de dados proporcionados pelos seus fabricantes e agências do governo. Soube-se de press releases que dimi-nu í ram os perigos ou deixaram de mencioná-los, diz J im Sibbison, ant igo redator da Associated Press e da Food and Drug Admin is t ra t ion. Os fabrican-tes de drogas podem também evitar perguntas sobre os perigos do produ-to , se puderem, durante conferências de imprensa. Assim os repórteres que se apoiam apenas nos press releases po-

dem perder informações significati-vas. Apoiar-se nas notícias liberadas pelo governo não oferece garantia. Sibbison descobriu mui ta coordena-ção e consultas entre a F D A e as companhias farmacêuticas sobre ma-teriais de publ icidade. Às vezes, avi-sos sobre riscos sérios em drogas no-vas são editados nas matérias dos re-pórteres, de modo que a responsabi-lidade pela fal ta de aviso não cabe in-teiramente aos redatores e ao pessoal de relações públicas. As boas reporta-gens sobre remédios novos devem in-cluir a solicitação de cópias do " ró tu -l o " ou " b u l a " que a lei exige que conste da caixa que contém a droga de prescrição. Os repórteres também podem obter cópias das cartas for-mais que os fabricantes devem enviar a outros médicos quando emergem si-nais de perigo. O bolet im da F D A , que é grátis e de periodicidade quin-zenal, Drug Bulletin, também pode dar pistas aos redatores de ciência quanto à descoberta de fatalidades ou outros problemas relacionados com remédios (Sibbison, 1985).

O pessoal das equipes dos veículos de comunicação, entretanto, pode conseguir ajuda para obter entrevistas através do escritório de relações pú-blicas. O pessoal competente, da área de relações públicas em ciência deve conhecer as especialidades e o signi-f icado do trabalho nas suas insti tui-ções. Com freqüência sugerem maté-rias aos redatores de ciência. Aconse-lham os executivos da companhia so-bre que histórias poderão atrair a atenção dos veículos, a embalagem necessária e que material in format ivo

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pode melhorar a u t i l idade de uma conferência de imprensa. Os func io -nários de relações públ icas t a m b é m podem oferecer a u m redator dos meios de comunicação pr iv i légios nas bib l iotecas de universidades e empre-sas assim c o m o faci l i tar- lhes a pesqui-sa computador izada de l i te ra tura pa-ra matérias mais impor tantes. Nas ra-ras ocasiões em que u m evento na área de ciência ou medic ina se consti-t u i n u m " f u r o " not ic ioso, tal c o m o os pr imei ros implantes de corações ar t i f ic ia is, u m func ionár io de relações públ icas que compreende o que os meios de comunicação precisam para relatar adequadamente uma histór ia pode dar uma o rdem def in i t i va para a coleta de not íc ias , que pode se to rnar uma situação de compet ição onde não ex is tem regras.

Experiências

1. Há várias perguntas implícitas no capí-tulo que você deveria fazer como redator

científico ao selecionar um tema para ma-téria. Anote o maior número dessas per-guntas que puder.

2. Localize vários periódicos científicos em sua biblioteca e procure idéias para a matéria. Traga uma lista para a classe e re-late por que acha que essas são boas possi-bilidades de textos.

3. Folheie uma revista de ciência e outro periódico em busca da lista de reuniões científicas. Há reuniões programadas perto de sua cidade? Prepare uma lista de reu-niões de ciência locais. Peça à classe para votar nas que soarem mais promissoras pa-ra histórias de ciência popular.

4. Obtenha de sua câmara de comércio ou escritório de convenções uma lista de reu-niões, se existe alguma. A classe poderá comparecer? Contate os patrocinadores enumerados pelo escritório de convenções.

5. Algumas bibliotecas de universidades são depósitos de documentos do governo; se a sua é assim, obtenha uma lista das aquisições recentes e veja se alguma ofere-ce a possibilidade de uma matéria de ciência.

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Capítulo 5

Distorção e como evitá-la

RARAMENTE, NA PRÁTICA, A ESCO-LHA DE UMA matéria de ciência e suas fontes pode ser tão compl icada como parece no processo descr i to an-ter iormente. Equacionar o significa-do, os interesses do púb l ico e os valo-res not ic iosos tornam-se habituais à medida que você amadurece na reda-ção do not ic iár io de ciência. Com efei to, redatores e editores arriscam-se a cair com mui ta faci l idade em ro-tinas para decidir a seleção de maté-rias. Apenas uma atenção constante quanto à necessidade de se ter mate-rial recente e uma abordagem mais atualizada para temas antigos podem manter o redator fora do lugar-co-m u m .

Menos administrável é o risco de se distorcer a not íc ia de ciência nessa busca de algo novo para leitores e es-pectadores. Em alguma parte entre o processo de seleção de tópicos e o processo de redação, o cientista e o redator divergem. Isso é responsável por parte das cr í t icas sobre a popula-rização, dando uma impressão falsa do que é boa ciência e boa reporta-gem c ient í f i ca . Uma série de pergun-tas cr í t icas ajudará o redator de ciên-cia a d im inu i r o índice de erro. Irão permanecer diferenças de opin ião que as disciplinas de jornal ismo e ciência (ou jornalistas e cientistas)

podem jamais resolver. Para os cien-tistas que respeitam apenas os pe-r iódicos c ient í f icos, a redação sim-ples sobre ciência e medicina repre-senta o m á x i m o da entropia. Se você não está entendendo, ver i f ique a se-gunda lei da termodinâmica n u m li-vro de f ís ica.

Hipóteses científicas

Uma fon te de distorções na reda-ção c ien t í f i ca vem através de pontos de vista diferentes sobre hipóteses cient í f icas. Com muitas exceções no-táveis, a ciência exper imental move-se em pequenos passos, cada qual precedido por uma hipótese que propõe uma explicação da total ida-de ou parte de um fenômeno natural. Baurch S. Blumberg, M. D., Ph.D. e vencedor do Prêmio Nobel de 1976 por seu t rabalho levando à identi f ica-ção do v í rus da hepati te B como cau-sador do câncer no f ígado e a uma vacina cont ra a doença, abre, desse modo, a sua fala como orador de uma fo rmatu ra em 1983.

A ciência ou o m i t o irão expl icar sat isfator iamente os fenômenos observados na natureza; o m i t o é es-tabelecido para aceitação como única explicação. Nenhuma out ra possibil i-dade é permi t ida. U m exemplo f o i a teoria mant ida pela Igreja sobre o

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planeta Terra (e a humanidade) como centro do universo.

As hipóteses (explicações) cient í -ficas são estabelecidas para serem tes-tadas; a hipótese será uma for te afir-mação " inequ ívoca" , e a experiência destinada a produzir dados que rejei-tarão a hipótese se esta for falsa. Se, após testes suficientes, os dados mos-t rarem que a hipótese não fo i rejei-tada, esta poderá ser aceita — experi-mentalmente e provisoriamente. En-t re tanto, dados posteriores e hipóte-ses relacionadas podem enfraquecer, modi f icar ou anular a hipótese, por-que cada teste pode gerar idéias para novas hipóteses. Dessa fo rma, a hipó-tese original pode nunca ser "com-provada" do modo comumente entendido, mesmo se sobreviver a mui tos testes. A hipótese permanece apenas "não-reje i tada", sempre dis-ponível para ser considerada falsa e suplantada por uma hipótese ou teo-ria mais completa, que expl ique a realidade de uma maneira melhor. Os pesquisadores podem agir como se a hipótese ou teoria fosse provada (ver-dadeira) até que se quebre ou seja subst i tuída. Às vezes você poderá en-contrar duas teorias em uso ao mes-mo tempo. O universo newtoniano, por exemplo, é suficiente para a via-gem espacial planetária e mui tos ou-tros empreendimentos de astrono-mia; entretanto, apenas a visão eins-teiniana do universo será suficiente para explicar outros fenômenos. Diz o Dr. Blumberg: " É u m paradoxo in-teressante que a ciência com freqüên-cia seja vista como uma série de fatos estabelecidos, quando poderia ser

mais corretamente compreendida co-mo uma coleção integrada de hipóte-ses não-relacionadas." (1983, 12).

O jornal ismo, entretanto, prefere fatos estabelecidos; uma história com qualif icações e proteções demais pa-rece fraca e não-confiável. Se os cien-tistas af i rmam em seus discursos, tra-balhos ou publicações que os dados apoiam a hipótese, o jornalista aceita isso, não havendo qualquer protesto de outras áreas cient í f icas. É o cien-tista, e não o consenso da comuni-dade, que se espera deva aceitar a res-ponsabilidade pelo trabalho. As pro-teções modestas, com freqüência su-permodestas, são ignoradas ou a his-tór ia é el iminada. Entretanto, mais redatores de ciência estão colocando avisos em suas histórias através de frases qualif icativas tais como: "se o relatór io permanecer vá l ido" ou "até conf i rmado ou rejeitado por mais pesquisas". Os repórteres de ciência podem procurar e citar cientistas que discordem, arriscando-se à inimizade do pesquisador cujo t rabalho é posto em dúvida. É duvidoso que os edito-res jamais permi tam avisos tão proe-minentes nas redações de ciência co-mo os que os jornalistas usam para marcar matérias pol í t icas sobre go-vernos que censuram matérias, preve-n indo os leitores de que o conteúdo pode ser of ic ial mas não necessaria-mente acurado. Se os guardadores dos portões da ciência, aqueles que revisam os trabalhos c ient í f icos ou encobrem os oradores numa reunião fossem insistir em que os cientistas negassem o que haviam af i rmado po-

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deria fazer pouco sentido escrever so-bre o que os cientistas estão dizendo. Os próprios cientistas poderiam se frustrar por ter seus resultados tão proscritos por seus colegas e para seus colegas.

Onde os cientistas oferecem infor-mação fora do ambiente, de uma reu-nião ou de um periódico c ient í f ico, o redator pode proporcionar sinais de aviso. Tais avisos não precisam ser in-tromissões. Estas incluir iam observar que " o trabalho não fo i publ icado" ou que o cientista "planeja apresen-tar os resultados" numa reunião espe-cíf ica. Uma outra proteção não intro-missiva, " n u m relatório formal a ser publicado em breve" pode ser usada onde um periódico c ient í f ico aceitou a pesquisa para publicação numa data futura. Quando dois cientistas libera-ram seus relatórios de pesquisa para a National Science Foundat ion sobre a possibilidade de que as árvores pode-riam "comunicar-se" prevenindo ou-tras árvores quando os insetos ou as doenças as atacam — liberando pro-dutos químicos aéreos similares aos pheromones, uma história da Asso-ciated Press trazia esta frase: "Se con-firmadas, as descobertas da Universi-ty of Washington iriam marcar a primeira vez em que se mostra que as plantas emitem produtos químicos que levam informação a outras." (Leary, 1983, A-2). Desse modo, os redatores podem imaginar palavras para transmit ir a sensação de desco-berta cient í f ica e a sua qualidade ex-perimental sem enfraquecer suas ma-térias.

Fragmentação

Outra fonte de distorção reside na natureza da reportagem sobre even-tos ou em tratar a ciência como notí-cias rápidas. Sem ao menos alguma informação histórica para a matéria, as histórias de ciência podem deixar os leitores sem uma perspectiva da importância do que está sendo relata-do. Tal perspectiva pode envolver de-f in i r um termo e a maneira pela qual os médicos o usam. Uma "epidemia" , por exemplo, significa para os cien-tistas da saúde uma incidência da doença acima da ocorrência normal. Não significa necessariamente uma ocorrência alcançando amplas áreas geográficas ou grande número de pes-soas. Pode significar essas coisas, mas determinar isso requer outras ques-tões para levantar as localizações e a quantidade de vít imas.

As acusações de distorção podem envolver a forma pela qual o redator aborda uma matéria. Essa fo i a con-clusão a que chegou o pessoal do Na-tional Câncer Institute, que analisou 2.138 matérias publicadas sobre cân-cer num período de três meses. 0 es-tudo indicava que pequena cobertura fo i dada â informação que ajudaria as pessoas a prevenir o câncer ou lidar com seus efeitos. E a cobertura jorna-lística tendia a reforçar o que o dire-tor de informações do NCI chamava de aspectos "negativos" (mortes) mais do que estratégias "posi t ivas" (lidar com o câncer). As matérias so-bre os efeitos causadores de câncer dos produtos químicos raramente da-vam informações sobre os perigos re-

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lativos das substâncias ou sobre como os indivíduos podiam lidar com o acaso (Van Nevel,1979). Os jornalis-tas não precisam aceitar essa acusa-ção uma vez que quase todos os gru-pos com os quais l idam terão a sua própr ia idéia do estilo apropriado de apresentar sua mensagem. Entretanto u m engano comum do redator de ciência iniciante é não saber distin-guir entre os muitos t ipos de cânce-res e as variadas estimativas de sobre-vivência de suas v í t imas. Quando o presidente Ronald Reagan submeteu-se a uma cirurgia de câncer no cólon em 1985, os especialistas em câncer e cirurgia deram estimativas de sua so-brevivência por cinco anos sem a ocorrência de outra espécie de câncer de 4 0 a 80%.

Essas acusações, entretanto, suge-rem que os redatores e editores de ciência deveriam insistir em propor-cionar alguma informação histórica nas matérias para colocar a nova in-formação em perspectiva, deveriam referir-se ao risco individual onde a doença é um fator e deveriam relatar maneiras de minimizar os riscos de sobrevivência. (Isso pode requerer mais espaço do que alguns editores estão dispostos a conceder.) A análise do Câncer Inst i tute reconhece, entre-tanto , que onde estiver fa l tando pers-pectiva os jornalistas não precisam carregar toda a culpa. Às vezes os es-pecialistas em câncer e seus assisten-tes de informação não sabem como é for te um carcinógeno em compara-ção com ou t ro , não têm recomenda-ções sobre como evitar exposição ou, em casos de uma nova doença, as

causas. Nesse estudo, 92% das maté-rias eram reportagens de notícias pro-priamente ditas, com apenas 7% de histórias e 1%de reportagens em pro-fundidade ou com informações histó-ricas. Ironicamente, enquanto apenas 7% cont inham recomendações dos cientistas quanto a ações individuais, 46% cont inham recomendações sobre o que as agências governamentais po-deriam fazer para minimizar a expo-sição de indivíduos.

Os jornalistas devem assumir algu-ma responsabilidade pela distorção. O National News Counci l censurou o The New York Times em 1983 por uso incorreto de fatos em sua matéria sobre os riscos para a saúde const i tu í -dos por herbicidas, usados nos cam-pos de arroz do Arkansas. O conselho disse que uma afirmação de um bio-q u í m i c o fo i usada fora de contex to para respaldar o t í t u l o de uma maté-ria que dizia que "médicos e cientis-tas " apoiavam as afirmações de peri-go. O relatório dizia que o repórter do Times om i t i u os fatos que mostra-vam que algumas das áreas de arroz t inham baixas taxas de incidência de câncer, enquanto mencionava índices de mortal idade cont idos num relató-r io divulgado um ano antes, ao invés de usar um número-média mais bai-xo, baseado em vários anos ou mes-m o números de uma taxa de morte mais elevada de uma área que não plantava arroz. A matéria do jornal também mencionava um estudo cor-relacionando a incidência de palato fend ido e uso de herbicidas, sem mencionar a conclusão do estudo de que o aumento no índice de palatos

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tendidos era o resultado de melhor pesquisa médica e não do uso de herbícidas. A perspectiva e as infor-mações históricas devem incluir rela-tos completos sobre estudos cientí-ficos. A reportagem seletiva que igno-ra os fatos contraditórios fere a credi-bilidade de cientistas e jornalistas (National News Council, 1984).

Relatando a ambigüidade científica

Faça uma pergunta clara aos cien-tistas: seus dados apóiam uma deci-são que aprova ou rejeita um quími-co, um produto ou uma atividade? Este é o conselho de Barbara Culli-ton, editora da revista Science e anti-ga presidente da NASW. Esse t ipo de questionamento é decisivo no que concerne normas públicas onde se discutem temas para além da ciência: l ixo tóx ico, chuva ácida e outras questões relativas ao meio ambiente. Em 1981 o ministro da saúde ameri-cano recomendou que as mulheres grávidas evitassem o álcool para mi-nimizar o risco de seus bebês adquiri-rem síndrome de álcool fetal. Os re-datores de ciência apontaram para o fato de que os dados eram antigos; a nova interpretação do ministro da saúde fo i conservadora. Cul l i ton observou: " À luz do óbvio estresse psicológico que a postura do ministro poderia criar, é razoável pensar que uma matéria sobre a sua decisão de-veria incluir informação sobre as am-bigüidades da informação c ient í f ica" (1981, 19).

Com freqüência apenas os dados cientí f icos não apoiarão uma decisão

e não se deve esperar que o façam. Os dados e a opinião cient í f ica podem orientar uma decisão, mas a intuição, o julgamento e a pol í t ica também de-sempenham papéis na decisão. Lixos químicos tóxicos vazando de depósi-tos abandonados, por exemplo, obviamente são prejudiciais á saúde e arruinam casas e outras propriedades nos arredores. Será possível reunir todos os dados um dia? Décadas po-dem se passar antes que uma condi-ção patológica esteja plenamente es-tabelecida. Mas as decisões polít icas deveriam ser retardadas até que todo o indicador c ient í f ico tenha sido re-latado? A não ser que a indulgência resulte de decisões polí t icas e gover-namentais, isso continuará um fator poderoso inf lu indo nas normas públi-cas, fator esse que os meios de comu-nicação podem e irão influenciar. Por outro lado, Robert C. Cowen, editor de ciência natural para o Christian Science Monitor e outro antigo presi-dente da NASW, previne que o trata-mento simplista de temas carregados de emoção que são tecnicamente complexos representam quase um embaraço para os redatores de ciên-cia (1984). No entanto devem os re-datores de ciência ou quaisquer ou-tros jornalistas ficar restritos a noti-ciar apenas os dados nus, suficientes ou insuficientes? As decisões devem sempre ser racionais? Devem apenas fatos cientif icamente estabelecidos apoiar as decisões?

Ciência não-ortodoxa

Na vida de cada jornalista de ciên-cia aparecerá alguém reivindicando

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novas, espantosas e fantásticas desco-bertas. Poderia ser o inventor de uma máquina que alegadamente produz mais energia do que consome, ou t ro aparelho de "mo to -pe rpé tuo " . Ou poderia ser uma matéria de periódico c ient í f i co propondo uma maneira completamente nova de encarar um tema relativo à ciência. Os cientistas or todoxos irão incentivá-lo a não pu-blicar a história. Mas a competição entre você mesmo e outros jornalistas ou entre os meios de comunicação pode exigir alguma espécie de ação. Seu editor aguarda explicações. A afirmação não or todoxa de um novo ponto de vista sobre a natureza pode ser válido. Os vírus como causa pos-sível para alguns t ipos de câncer fo-ram vaiados quando propostos ini-cialmente. Pouco depois, quase todos os pesquisadores de câncer fo ram ar-rastados para a caça aos vírus. Como você separa, para seus leitores, o real do falso? A resposta não é fáci l e às vezes nunca é alcançada.

O f ís ico Jeremy Bernstein, que es-creve ciência popularizada para o The New York Times e o The New Yorker, entre outros, duvida que não-cientis-tas possam discernir ciência não-con-vencional, mas boa, daquela que ele chama ciência "de araque". Nem ele acredita que os próprios cientistas possam fazer a dist inção em campos afastados de suas próprias especiali-dades. Bernstein faz três perguntas quando encontra uma proposta não-convencional:

1. Ela explica alguma coisa? (E, diga diretamente, o que explica?)

2. Ela prediz alguma coisa? O ato de predizer é o coração da hipótese e teoria cient í f icas; os resultados de-vem ser suscetíveis a testes indepen-dentes. Pergunte que fatos preditos estão impl íc i tos — (não para que serve uma descoberta.)

3. Está ligada a alguma coisa? (Devem ser suspeitas as afirmativas que não se ligam a outras grandes teorias que sobreviveram até agora ao teste de muitos pesquisadores em muitas situações diferentes). 0 traba-lho de 1905 de Einstein que deu no-va diretr iz à f ísica ligava-se com a f í -sica de Newton e outros e predizia efeitos que poderiam ser testados ex-perimentalmente contra a teoria (Bernstein, 1982, 21 A ) .

Três outras perguntas, acessíveis mesmo a redatores de não-ciência, oferecem alguma ut i l idade que é ba-seada em credenciais. Estas vão além de Bernstein.

1. Onde o cientista trabalha? As conexões com uma universidade, ins-t i t u t o ou companhia de pesquisas de boa reputação, podem avalizar a competência para realizar o trabalho reivindicado; a aceitação impl íc i ta de colegas bem treinados em pesquisa pode reassegurá-lo e a seu editor. A fal ta de tal conexão pode levantar suspeitas sobre o pesquisador e pode merecer um lugar em qualquer histó-ria resultante, jun to com a resposta do cientista. Se você tem dúvidas, chame os colegas do pesquisador ou o func ionár io de informações da ins-t i tu ição para levantar fatos específi-cos.

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2. Qual é o passado educacional do pesquisador? Você pode verificar o seu treinamento? O orgulho que a maioria dos pesquisadores tem de suas listas de graduações e outras cre-denciais geralmente torna-os propen-sos a fornecer essa informação. Você pode sentir que não convém fazer as perguntas diretamente, sob certas cir-cunstâncias. As biografias da maioria dos doutores em fi losofia encontram-se nos Who's Who ou outros catálo-gos especializados. Tais biografias, entretanto, são preparadas pela pes-soa, e podem não ser totalmente con-fiáveis. Houve casos de informações forjadas. Novamente, uma chamada às instituições pode revelar discrepân-cias entre as afirmativas da pessoa e o registro. Até que uma série de peças fossem pregadas às universidades e centros médicos, nos anos oitenta, as credenciais e referências raramente eram checadas. As universidades e hospitais ainda se descobrem engana-dos uma vez ou outra por farsantes espertos. Você também poderá des-cobrir que a pessoa está trabalhando numa área cient í f ica alheia a seu campo de treinamento. Nada diz que o cientista treinado em buscar infor-mação não pode aprender um campo novo, mas especialistas atuando fora de sua especialidade são um risco.

3. O cientista publicou alguma coisa recentemente em periódicos científ icos de reputação? Como as outras perguntas, esta não oferece um teste seguro (de tornassol) em si e por si. Entretanto, a aceitação atra-vés da revisão pelos colegas é um ponto a mais na direção da credibil i-

dade na ciência. A falta de publica-ções recentes pode indicar uma longa ausência da pesquisa ou a entrada nu-ma nova área. A não ser que o pes-quisador tenha saído recentemente da universidade, a ausência de qual-quer registro de publicações merece um inquérito adicional. Se o trabalho aparece num periódico menos conhe-cido, você deveria considerá-lo válido se checar a reputação do periódico com outros cientistas do campo. Essa publicação cient í f ica tem alguma sig-nificação para a comunidade c iént í f i -ca? É realmente um periódico de ciência? Algumas revistas científ icas de segunda classe sujeitam-se, para preencher o espaço, a dar publicida-de a indústrias farmacêuticas e de equipamentos, sem questionar mui to . Outras mantêm altos padrões de acu-rácia, significado e senso de oportuni-dade. Trabalhos de pesquisa forjados, falsificados e roubados têm aparecido em periódicos secundários e publica-ções descuidadamente editadas, desti-nadas mais ao lucro do que para in-formação.

Outras pesquisas novas

Mesmo com base em relatórios de pesquisa or todoxa, os redatores de ciência podem melhorar seu estilo de reportagem com perguntas que po-dem afastar possíveis distorções na forma f inal do artigo. Essas perguntas incluem:

1. 0 seu cientista pode dar-lhe os nomes de outros que trabalham no campo? Caso a resposta seja negativa, por quê? Porque muita coisa na ciên-

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cia é constru ída sobre o t rabalho de outros, um pesquisador competente provavelmente terá em mente outros cientistas que têm conhecimento so-bre o mesmo problema ou sobre pro-blemas int imamente relacionados. As notas de rodapé nos relatórios de pes-quisa freqüentemente contêm indica-ção para outros pesquisadores se os materiais realmente são adequados ao trabalho sob discussão. A lém disso, se o t rabalho é genuíno, você pode descobrir outros colaboradores, que merecem ser mencionados. Uma cr í -t ica à redação de ciência popular en-volve acusações de que os redatores ignoram quem merece crédito igual, talvez maior, por este ú l t i m o avanço. Os press releases de universidades po-dem deixar imp l í c i to , por omissão, que suas escolas são as únicas com cientistas fazendo u m t ipo particular de pesquisa. Isso é bobagem. Insista que o escritório de imprensa ou o cientista forneçam nomes e lugares onde trabalho relacionado esteja sen-do realizado.

Alguns funcionár ios de RP podem insistir em não dar os nomes de ou-tros, alegando que não têm por que dar publicidade a t rabalho de fora de suas próprias instituições. Esse racio-c ín io espúrio indica uma disposição por parte dos cientistas e do pessoal de RP para permi t i rem distorção em benef íc io pessoal. Alguns poucos redatores de ciência a f i rmam que a pesquisa é tão compet i t iva que esta l inha de quest ionamento pode ofen-der u m cientista. Se os sentimentos estão tão tensos, a situação pede abertamente para se obter outra opi-

nião. Você não deve favores. Esse é exatamente o t ipo de agente de im-prensa ou-cient ista que irá expô-lo a cr í t icas sobre sua acurácia e fal ta de minúcia se você permi t i r que ele o faça desistir de encontrar uma fon te alternativa de informação.

2. De onde vem o dinheiro para a pesquisa? Os seus custos tornam im-provável o seu auto-f inanciamento ou a realização de experiências baratas, a não ser naqueles casos incomuns que se tornarão boas matérias por causa de sua singularidade. Verbas do governo federal, que podem ser veri-ficadas com a agência de financia-mento se as respostas levantarem suas suspeitas, são o t i po mais co-m u m de apoio f inanceiro. Essas ver-bas são identif icadas por um código dado à agência f inanciadora e por um número dado ao f inanciamento, que algumas agências pedem seja usado em qualquer matéria impressa, inclu-indo os press releases. No caso de al-guns produtos farmacêuticos e de saúde e de outra pesquisa aplicada, a identif icação dos patrocinadores po-de indicar uma inclinação tendencio-sa para que os resultados sejam favo-ráveis para a companhia patrocinado-ra. A imprecisão a respeito de patro-c ín io , seja por parte do cientista ou funcionár io de relações públicas, po-de indicar a necessidade de especifi-cação. U m cientista de universidade, usado como porta-voz " n e u t r o " na conferência de imprensa que apresen-tava uma droga nova fo i mais tarde descoberto ser um consultor contra-tado pelo fabricante.

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3. A subvenção poderá ser renova-da? Os redatores de ciência suspeitam que a publicidade em torno da época em que uma subvenção expira pode ajudar a consti tuir renovações. Isso parece improvável a muitos cientistas que esperam que a revisão feita por outros cientistas sobre a aplicação dessas verbas e os resultados alcança-dos levem a renovações. Mas se o ci-entista ocasional acha que a publici-dade ajuda, você poderá ter ofereci-das a você algumas descobertas apres-sadamente arranjadas. Essa é uma possibilidade para funcionários de re-lações públicas das instituições tam-bém e as crít icas resultantes podem embaraçar a escola ou a companhia assim como os cientistas envolvidos.

4. Que outras companhias fazem esse produto? Os repórteres de ciên-cia dos veículos de comunicação têm uma visão desconfiada de compa-nhias farmacêuticas e outras orienta-das para produtos, com alguma ra-zão. Cada companhia, incluindo seus cientistas, está no ramo para seu pró-prio benefício. Por isso muitos press releases seguem diretamente de mui-tas companhias anunciando novas drogas, articulações de bacia, marca-passos, membros artificiais e outros aparelhos. Vistos fora de contexto, cada um pode parecer um avanço sig-nif icativo. A experiência dos redato-res de ciência, entretanto, leva-os a acreditar que foram com freqüência usados demais para publicidade gra-tu i ta e enganosa. Os escritores confia-vam demais na ética dê suas fontes. Muitas novas drogas e aparelhos eram produtos feitos para competir com os

vendidos por outras companhias. Os produtos podem valer uma história pelos padrões jornalísticos, mas para evitar enganar leitores, editores e a si mesmo, pergunte se são realmente novos ou se têm mesmo alguma coisa a mais do que os produtos existen-tes. Pergunte também sobre as limi-tações de seu uso e, no caso de dro-gas, sobre os efeitos colaterais que possam oferecer riscos para alguns consumidores potenciais. Compare o que é d i to a respeito da segurança quanto ao consumo dessa droga, com o que está indicado no seu " r ó t u l o " ou na " b u l a " sobre suas contra-indi-cações de uso.

Distorção por omissão

Deixar de fora de uma matéria in-formação de importância crucial por causa de limitações de espaço e tem-po ou preguiça, ou ignorância, atrai sérias conseqüências. Um exemplo clássico ocorreu quando a Rand Cor-porat ion, uma instituição de pesqui-sa, liberou um relatório indicando que alguns alcoólatras poderiam ser capazes de recomeçar a beber após o tratamento. Embora os principais jor-nais e serviços noticiosos que recebe-ram a matéria tivessem informação resumida sobre as incertezas dessa conclusão, muitos dos qualif icativos desapareceram na edição de jornais e estações de rádio e TV menores que transmit iram a história. Como resul-tado, a Rand fo i castigada por todos os setores que lidam com o tratamen-to do uso abusivo do álcool por — su-postamente — dizer de forma direta

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que os alcoólatras poderiam voltar a beber, o que, na verdade, ela rião dis-se. Como fo i mencionado antes, Sibbison (1985) descobriu press re-leases que omi t iam os avisos das bu-las, redatores de ciência que não olhavam além dos press releases e avi-sos a consumidores que eram edita-dos das histórias dos repórteres.

Em out ro exemplo, poucas maté-rias de ciência questionavam os peri-gos da exposição aos raios X quando a mamografia fo i proposta como me-dida de saúde geral para a detecção do câncer de mama. Quando o risco dessa proposta se tornou aparente mais tarde, apareceram matérias di-zendo às mulheres para evitarem raios X de seios. Por sua vez, as impli-cações em evitar raios X quando os médicos os recomendavam foram pesquisadas mais tarde (Shaw, 1977). Um terceiro exemplo vem dos anos oitenta. Nessa época, as companhias começaram a vender botas de saúde que permit iam às pessoas ficarem penduradas pelos calcanhares, em uma barra, teoricamente aliviando a pressão na coluna e nos músculos das costas. Algumas histórias impressas nos jornais e transmitidas pelos meios de difusão observaram que essa ativi-dade devia ser feita com alguém por perto para ajudá-lo a descer antes que você desmaiasse ou que o f l uxo de sangue na cabeça estourasse vasos sangüíneos fracos. Na verdade, pou-cas histórias chegaram a verificar, com médicos, os benefícios alegados. Esses exemplos mostram que os reda-tores de ciência devem perguntar so-bre efeitos adversos da nova tecnolo-

gia, marcar as histórias de novas téc-nicas médicas como experimentais, e inquerir médicos e cientistas sobre efeitos potenciais das novas descober-tas se se pretende aplicá-las ampla-mente.

Perspectivas da distorção

Existem poucos remédios eficazes para se receitar contra a distorção. Mui to depende do senso de integrida-de e responsabilidade do redator. Co-mo todo jornalista, os redatores de ciência têm a responsabilidade de compreender e relatar inteiramente qualquer história que abordam. Se você não alcança o ideal, não deve-rá ser por falta de tentativa. Essa é a primeira proteção contra a distorção.

Outra proteção reside numa atitu-de aberta e tolerante em relação à cr í t ica. E apesar da cr í t ica freqüente-mente vigorosa, os cientistas e reda-tores de ciência estão mais perto uns dos outros na maioria dos pontos do que qualquer dos grupos freqüente-mente admite. As exceções podem ser aquelas, tanto na ciência como no jornalismo, que caem na intolerância de acreditar demais em sua própria retórica. Talvez seja i lustrativo de co-mo a ciência se tornou fragmentada o fato de que os cientistas são mui to mais crí t icos a respeito de matérias feitas sobre suas pessoas do que sobre cientistas em campos similares ou di-ferentes. Essa é uma história comum para jornalistas; eles a ouvem tam-bém de autoridades municipais, ju i -zes, criminosos e outros segmentos da sociedade, exceto quando os alvos

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são retratados heroicamente. Tal cr í -t ica não reflete necessariamente dis-torção significativa (Tichenor et a/., 1970).

Um produto das notícias distorci-das de ciência e medicina, acusaram os cientistas, é que as pessoas são le-vadas a decisões errôneas. A for tuna-damente as pessoas raramente con-f iam em apenas uma fonte de infor-mação ao tomarem decisões sobre suas vidas. Elas veri f icam as informações dos meios de comunicação com ami-gos, experiências pessoais e autorida-des. Os cientistas e os médicos estão errados quando descarregam toda a culpa sobre os meios de comunicação ao serem perturbados por chamados sobre novo t ra tamento ou afirmações equivocadas. Isso não desculpa o re-dator de ciência da fal ta de precisão e impressões enganosas, apesar de ra-ramente ser ele o único responsável pelo fa to.

A lguma distorção é auto- induzida e provavelmente inevitável. Qualquer redator médico pode prevenir cuida-dosamente os leitores quanto a um novo t ra tamento ou droga ser experi-mental, ter sido testado apenas com animais, e provavelmente estar a anos do uso geral. As pessoas ainda assim chamam seus médicos para perguntar sobre o t ra tamento. Entretanto, os redatores c ient í f icos devem rever suas histórias em busca de frases que pudessem encorajar essas falsas espe-ranças. Out ra fon te de falsa esperan-ça é que os cientistas tendem a exa-gerar suas realizações, exatamente co-mo o fazem os prefeitos, governado-res e presidentes. Às vezes isso leva a

conferências de imprensa sobre des-cobertas menores ou, por exemplo, os poderes curativos superotimistas at r ibuídos aos raios X no in íc io deste século. Os cientistas também são co-nhecidos por alegar erros de citação e de representação quando a sua hipér-bole é impressa, como o fazem os po-l í t icos.

No caso da distorção, mu i to dos desacordos entre cientistas e redator vem das diferenças nas duas fés. A o mesmo tempo em que o professor Michael Ryan encontrou os cientistas e os jornalistas mais em acordo do que em desacordo sobre pontos de reportagens cient í f icas, ele salienta que os jornalistas não concordam com o desejo dos cientistas de ler suas matérias antes da publicação ou com o fa to de os repórteres escreve-rem os t í t u los das matérias c ient í f i -cas. Raramente um cientista concor-dará com os repórteres sobre a afir-mação de que as notícias cient í f icas parcas vezes são sensacionalistas; o que é sensação para um é a cor e o in-teresse humano para ou t ro . Não há concordância com a idéia de ter ape-nas o cientista para avaliar a contr i -buição de sua pesquisa. Nem o reda-to r de ciência aceitará o argumento de que ele não deve interpretar aí conclusões dos cientistas. Os cientis-tas acham que informações mu i to im-portantes são omit idas; a maioria dos redatores de ciência acha que não. Ambos discordam tota lmente a res-peito de escrever sobre ciência como not íc ia apenas depois que fo r publ i-cada num periódico c ien t í f i co (Ryan, 1979, 1982).

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O redator de ciência deve manter em mente que nem a ciência nem a redação cientí f ica são monolít icas. A aceitação em cada grupo depende grandemente das performances indi-viduais, pessoais. Você se sairá me-lhor com algumas matérias do que com outras. Alguns cientistas expres-saram admiração por sua coragem em sair para escrever para os veículos de comunicação sobre ciência em geral. Um cientista, salientam eles, faz bem em conhecer os segmentos de uma grande disciplina. Os redatores de ciência são solicitados a escrever his-tórias sobre muitos campos de conhe-cimento especializado.

Uma ameaça de distorção mais sé-ria â aceitação individual de um reda-tor de ciência pode ser a tendência em direção ao que pode ser chamado "novo sensacionalismo" no jornalis-mo americano e talvez mundial. Esse é moldado no estilo de apresentação do tablóide inglês, alguns trabalhos de Rupert Murdoch e o National En-quirer ou outros dos "jornais de su-permercado", que usam muitas maté-rias baseadas em ciência. A conselho de consultores tais como professor Stuart Schwartz, da Geórgia State University, alguns jornais de cidades pequenas estão adotando um estilo de reportagem e de manchetes mais vivo, estridente e de abordagem pes-soal. "Mamilos causam câncer" é fre-qüentemente citado como o t í t u l o mais memorável de um jornal de Ohio recriado por Schwartz (Holder, 1983).

Esse estilo, mais gráficos colori-dos, contrasta grandemente com a

abordagem geralmente modesta dos cientistas em relação à publicação. Schwartz advoga um estilo fantástico de descrever e ilustrar e elogia a abor-dagem do National Enquirer para ma-térias de jornal. Embora gráficos me-lhores, mais claros e o uso de cor pos-sam com efeito tornar muitas maté-rias de ciência mais fáceis de enten-der, os jornais que obedecem esse es-t i lo têm sido criticados fortemente pelos cientistas por distorção. Reco-nhecendo a cr í t ica, o National Enqui-rer instalou um procedimento mui to r ígido de verificação de fatos. A posi-ção de Schwartz sustenta que o con-trato do redator é com os leitores, não com os cientistas ou colegas jor-nalistas, e que os leitores comuns não gostam de histórias aborrecidas. Isso é verdade, mas a vivacidade não deve superar a responsabilidade do autor de apresentar uma história tão apu-rada e livre de distorção quanto pos-sível (Holder, 1983).

Enganos e fraudes

Enganos e fraudes na ciência colo-cam um problema de distorção intei-ramente diferente para os jornalistas cientí f icos. A não ser que o redator possua todos os talentos de um cien-tista pesquisador, é improvável que ele realize eficientemente a função de vigia da imprensa. Mas provavelmen-te qualquer fraude de um cientista se-rá descoberta por pesquisadores cole-gas, e o redator pode ouvir a respeito através de um amigo no laboratório ou de uma nota em publicação cien-t í f ica. Quando a fraude é descoberta,

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as convenções da ciência pedem uma retratação públ ica dos trabalhos de pesquisa do cientista suspeito publ i -cados pelo per iódico c ien t í f i co . Os editores desses periódicos, como suas contrapartes nos meios de comunica-ção populares têm relutância em im-pr imir tais notas de correção. É o si-nal de que o sistema de revisão pelos colegas fa lhou.

A extensão da fraude na pesquisa c ient í f ica, médica e de engenharia permanece em disputa. Os escritores de ciência Wi l l iam J. Broad e Nicholas Wade, do The New York Times, anti-gamente com a revista Science, d izem que há u m bocado de fraudes. Em Betrayers of the Truth (1983), eles discutem mais de uma dúzia de casos de fraude em ciência. Alguns deles fo ram revelados apenas após um sé-culo de aceitação. Teoricamente os mecanismos de autopol ic iamento da ciência deveriam tê-las rejeitado rapi-damente. O homem de Pi l tdown teve um lugar aceito na ciência por perto de t r in ta anos, depois que fo i supos-tamente desenterrado em 1908; não fo i conclusivamente marcado c o m o uma fraude até o advento da datação por radiocarbono nos anos cinqüen-ta. Os líderes da comunidade c ient í f i -ca af i rmam que os casos de fraudes são poucos, relativamente ao tama-nho da comunidade, e resultam de enganos de técnicos e de indivíduos quebrando-se sob a pressão de suas exigentes tarefas e ambições.

Não obstante, o estudo de Broad e Wade sugere que há perguntas que o redator c ieht í f ico pode colocar, quando estiver cético a respeito de

um cientista ou relatório, que podem ajudar a revelar algo da qualidade da pesquisa.

1. O trabalho ou a publicação contém todos os resultados de todas as experiências? A ciência exige rela-tór ios completos. O apoio a uma hi-pótese por vezes fo i mais realçado pela reportagem seletiva de experiên-cias, incluindo apenas os dados que se ajustavam mais perfeitamente à teoria.

2. Até que exte/isão os dados ofe-recidos como evidência fo ram suavi-zados em relação aos dados nus? Pa-rece bom demais? A experimentação é um negócio mais confuso do que mui tos cientistas admitem. Não é fa-to desconhecido dos pesquisadores que cortam e arredondam dados para fazê-los se encaixar aos resultados preditos por suas hipóteses. Obvia-mente o curso em métodos de esta-t íst ica e pesquisa ajudará o redator de ciência a reconhecer padrões inco-muns.

3. Outros cientistas ci taram esse pesquisador? A citação na pesquisa de outros cientistas indica que o tra-balho fo i dupl icado ou usado em no-vos experimentos e que resistiu. Mui-to trabalho de pesquisa nunca mais é testado; permanece na l i teratura e às vezes é ressuscitado. A citação signi-f ica que outros pesquisadores con-f iam no trabalho da pessoa. A quan-tidade de trabalhos publicados relata-da por um cientista às vezes pode não ser relevante por causa de técnicas usadas para aumentar a quantidade de publicações e part i lhar de crédito

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por trabalhos realmente realizados por outros.

4. Quanto tempo levou para com-pletar a série de experiências? A pes-quisa é consumidora de tempo. Uma pesquisa fraudada pode trair-se por-que ao cientista fa l ta tempo f ís ico para completar o t rabalho e recorre ao " lápis mágico" ou " labora tór io a seco" — f raudando os dados. Broad e Wade c i tam o exemplo de coelhos numerados que aparecem, desapare-cem e reaparecem novamente na pes-quisa. Alguns dados parecem ter so-f r i do o " fenômeno Andréa Dor ia " — perdido por acidente e reconstruído.

5. O trabalho f o i publ icado ou aceito para publicação? Uma queixa sobre a reportagem de ciência tem si-do de que matérias são escritas sobre trabalhos que nunca aparecem nova-mente no sistema de relatos c ient í f i -cos; suspeitas a f i rmam que esses tra-balhos podem ter sido escritos a par-t i r de premissas frágeis que fo ram abandonadas.

6. O relatór io é suficiente para al-guém repetir a experiência? Alguém mais a fez? Às vezes os pesquisadores podem achar passos ou ingredientes essenciais deixados de fora ou que apenas o pesquisador original pode fazer a experiência func ionar , embo-ra o relatór io c ien t í f i co af i rme dar toda a informação necessária essen-cial para ' repet i r a experiência. Pou-cos cientistas deixam seus dados crus disponíveis para inspeção.

7. O pesquisador estava procuran-d o por esse fenômeno o u alguma ou-tra coisa, relacionada ou não-relacio-nada? A ciência está cheia de inciden-

tes de descobertas acidentais, de des-cobertas inesperadas e felizes, que os pesquisadores reconheceram como indicando algo novo. Algumas das grandes descobertas, incluindo os raios X , caíram no colo de pessoas que buscavam outra coisa. A resposta pode proporcionar uma nova aborda-gem à sua história.

8. Qual fo i a contr ibuição do pes-quisador ao trabalho? Existem exem-plos suficientes para que Broad e Wa-de concluam que o roubo de crédi to por descobertas é u m risco para o cientista. Diretores de laboratórios podem reclamar crédi to por t rabalho fe i to por outros ou aparecerem como autor sênior em trabalhos, sem terem fe i to qualquer pesquisa. Cientistas apropriaram-se de dados de experi-mentações de outros. Quando desco-bertos, os erros podem ser a t r ibu ídos a assistentes, pressões de t rabalho, memórias falhas e expectativas ir-reais, entre outros fatores.

Entre as causas de fraude â parte o engano d i re to , há o auto-engano e a po l í t i ca de poder. Os cientistas vêem o que desejam ver nos resultados, uma das razões para a revisão pelos pares. Mas o sistema de revisão pelos colegas de profissão ocasionalmente deixa passar conclusões pouco funda-mentadas e houve alguma indicação de que membros poderosos da comu-nidade de pesquisa podem receber menos escrut ínios do que outros. Trabalhos de instituições de pesquisa t radic ionalmente fortes podem inibir as crí t icas, de acordo com Broad e Wade. A po l í t ica é u m fator suti l na comunidade c ient í f ica como em ou-

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tras comunidades. Algumas de suas possibilidades estão apenas agora sen-do experimentadas por sociólogos e historiadores da ciência. As reuniões e os periódicos de ciência que os his-tor iadores e sociólogos da ciência oferecem aos redatores c ient í f icos são out ra fon te de matérias sobre a cul tura da ciência e, ocasionalmente material para corr igir distorções da auto-reportagem dos cientistas.

Medidas corretivas recomendadas por aqueles escolhidos para investigar casos de fraudes alegadas incluem abrir e part i lhar arquivos de dados brutos, pedir a laboratórios externos para veri f icarem experiências, usar es-tudos mais codif icados, desencorajar cientistas de trabalharem sozinhos, reforçar o interesse na qualidade da pesquisa mais do que na quant idade de publicações e divulgar padrões de-talhados de análise e preservação de dados em todos os laboratórios.

A ciência entre os po l í t i cos

A credibi l idade c ient í f ica se apro-x ima do seu maior perigo quando misturada na elaboração das normas públicas. Os redatores de ciência ne-cessitam estar conscientes de algumas das distorções da ciência introduzidas por cientistas quando testemunham em debates sobre normas públicas. Como f o i mencionado antes, po r si só os dados podem não ser suficiente-mente for tes para darem uma indica-ção clara das direções pol í t icas. Ü u os cientistas podem atacar a credibi l i -dade da pesquisa de outros cientistas, a f i rmando que a interpretação ou o

p rópr io procedimento são falhos. O sistema p o l í t i c o americano é adver-sarial, o que pode não ser adequado à idéia d o consenso c ient í f ico . Como a maior ia dos pesquisadores c ient í f icos dependem de verbas federais e de consultorias que prestam às indús-trias, questões legít imas podem ser colocadas a respeito de sua indepen-dência, quanto às pressões exercidas por interesses especiais dent ro de uma agência, por indústrias associa-das com uma agência para a qual tra-balham ou da qual recebem fundos para pesquisa. Como ocorreu c o m a Environmental Protect ion Agency, sob a administração Reagan, uma mudança na esfera po l í t i ca pode pro-duzir ordens cancelando alguma pes-quisa o u modi f icando suas direções.

O sistema adversarial coloca os ci-entistas uns contra os out ros em au-diências do Congresso, convocados para servir de testemunha para sena-dores e representantes quando discu-tem a legislação. Não se deve ser in-gênuo em pensar que as testemunhas são chamadas a essas audiências por uma equipe imparcial do comi tê. Os membros da equipe chegam com f i -liações partidárias. Algumas testemu-nhas são chamadas e algumas solici-tam ser ouvidas por causa de seu inte-resse nas leis sob consideração. As notícias cient í f icas distorcidas che-gam ao públ ico porque esse sistema adversarial proporc iona a existência de ciência part idária, e os jornalistas precisam fornecer informação histó-rica nessa área. Com freqüência as testemunhas realmente ouvidas são chamadas por causa de seu prest ígio.

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conexões com instituições de prestí-gio ou suas opiniões públicas sobre o assunto mais do que pela experiên-cia em pesquisa na área relevante. Não é incomum que fatores po l í t i -cos, econômicos e emocionais se so-breponham á objet ividade c ient í f ica na interpretação dos dados.

Os conf l i tos de interesse geralmen-te são econômicos, embora possam ter uma carga ética ou moral . O go-verno federal, por exemplo, agiu em 1983 para retirar dos pais e seus mé-dicos o d i re i to de escolher manter as vidas de crianças nascidas tão defor-madas que a qualidade da existência dos bebês, a existência de seus pais e sua sobrevivência f inanceira pareciam estar em jogo. Essas orientações do governo federal deveriam ser postas em vigor através do fechamento de todos os f inanciamentos do governo para qualquer hospital cujos médicos não aderissem ás novas diretrizes fe-derais. Quando o fo rma lde ído , usado para fazer isolamento para casas e ca-sas móveis tornou-se suspeito de cau-sar reações severamente tóxicas ou alérgicas nos residentes dessas casas, a Environmental Protect ion Agency, a Occupational Safety and Health Admin is t ra t ion , e a Consumer Pro-duct Safety Commission foram inca-pazes de alinhar apoio suficiente para conseguir que seus dados fizessem com que esse isolamento fosse retira-do de uso. Os esforços de lobby da indústria no congresso prevaleceram para manter os materiais no mercado. Obviamente os cientistas industriais têm suas próprias questões de sobre-vivência.

Questões de sobrevivência

A distorção de informação cient í -fica e tecnológica ocorre com mais facil idade em situações de "sobrevi-vência" onde a nutr ição, a energia ou o meio ambiente estão em jogo. A distorção pode ser posit iva ou negati-va — ot imista a respeito das implica-ções da descoberta ou salientando seus aspectos de ameaça á vida. En-t re tanto o redator deve encontrar uma fonte c ient í f ica que possa fazer extrapolações sobre qualquer desco-berta ou conf i rmar suspeitas que ele possa ter sobre o significado de impl i-cações da descoberta. Algumas desco-bertas obviamente tocarão teclas uni-versais de "sobrevivência".

Tome os relatórios conf l i tantes so-bre a pesquisa dos efeitos do alimen-to sobre o compor tamento humano. U m xeri fe do Texas leu histórias so-bre os efeitos calmantes dos alimen-tos naturais no temperamento das pessoas e ordenou que as máquinas de vender comida na prisão fossem esvaziadas de batatas fr i tas, doces e congêneres. Mas apesar de numerosas matérias sobre os efeitos malignos das "junk foods", com elevado teor de carboidratos, sal e colesterol, so-bre o compor tamento, uma conferên-cia de pesquisadores em nutr ição conclu iu que o principal efeito das "junk foods" era a sonolência (Kola-ta, 1982). Poucas matérias equaciona-ram isso com a preocupação dos cien-tistas com os efeitos mais a longo prazo causados à saúde pelos alimen-tos carregados de colesterol. Então, uma campanha geral para modi f icar a

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dieta americana fo i lançada em 1984 pela American Câncer Society e a American Heart Association, com quase ninguém examinando as possí-veis exceções — pessoas que pode-riam ter sido prejudicadas pela dieta recomendada. Relações óbvias entre pão e massas e casos possíveis de es-quizofrenia quimicamente induzida foram inferidos de descobertas de que o glúten de tr igo reduzia a eficá-cia do t ratamento de um grupo de esquizofrênicos (Singh e Kay, 1976).

As distorções podem se originar em campos tais como nutr ição, ener-gia e meio ambiente quando o reda-tor se impor ta com um aspecto ape-nas em lugar de buscar fontes para se-parar os possíveis desdobramentos positivos e negativos das decisões po-lít icas. U m pesticida nocivo ao meio ambiente a longo prazo, pode ser subst i tu ído por ou t ro mais perigoso para aqueles que o aplicam, criando um novo problema de saúde ocupa-cional ou risco inesperado para aque-les que podem ser acidentalmente borr i fados com ele. Custos de energia mais baixos ou estáveis podem levar nações a fu turos racionamentos de energia porque a exploração de novas reservas de petróleo, a produção de equipamentos elétricos mais eficien-tes ou o desenvolvimento de fontes de energia alternativa podem parar por razões econômicas ou porque as pessoas f icam mais complacentes.

As explosões vulcânicas, terremo-tos e outras liberações de forças natu-rais gigantescas também tocam os pri-mit ivos temores de sobrevivência. As previsões a respeito colocam os reda-

tores de ciência num di lema. Ignorar a previsão de um cientista é arriscar-se a ser deixado para trás em furos noticiosos e colocar o públ ico em pe-rigo. Os cal i fornianos fo ram coloca-dos em estado de inquietação várias vezes por previsões de que u m abalo impor tante irá ocorrer ao longo da fenda de San Andreas dentro de u m per íodo de tempo específ ico, embora na época das previsões, a maioria dos cientistas que estudavam a terra acre-ditasse não ter conhecimento sufici-ente para fazer uma previsão confiá-vel. Muitas organizações noticiosas relatarão tais previsões; as melhores perguntarão aos pesquisadores se o cientista que está predizendo é qual i f i -cado em seu campo ou se o que se sa-be nessa área de conhecimento ho-je torna possível fazer previsões váli-das e com pequena margem de erro. Essa informação se tornará parte de qualquer matéria.

Warren E. Leary da Associated Press encontrou ou t ro di lema ao rela-tar u m estudo que ligava a contagem de espermatozóides drasticamente baixa em homens jovens a vestígios de produtos qu ímicos tóx icos en-contrados em seu sêmen. Ele obte-ve do cientista uma lista de causas al-ternativas para uma baixa contagem de espermatozóides e isso proporc io-nou u m respaldo para colocar o estu-do do pesquisador em perspectiva (1979) .

A o escrever sobre temas de sobre-vivência você pode achar conveniente pedir aos pesquisadores que salien-tem áreas específicas onde mais co-nhecimento é necessário. A fon te po-

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de ser o cientista que anuncia uma descoberta ou alguém trabalhando no mesmo campo ou num out ro a ele re-lacionado. É importante pedir á fon-te para traçar uma linha entre o fato e sua interpretação, opinião ou espe-culação. Pergunte que provas apóiam seu ponto de vista.

A distorção em matérias de serviço

A matéria de "serv iço" tem uma longa história nos meios de comuni-cação. Esse t ipo de artigo pretende contar a leitores ou espectadores co-mo melhorar aspectos de suas vidas: saúde, nutrição, beleza, segurança, educação, ocupação e assim por dian-te. 0 cuidado deve reinar aqui por-que você espera que as pessoas ajam de acordo com suas recomendações. A coluna médica escrita por médicos, às' vezes em colaLoração com um jor-nalista, é um bom exemplo, como o é a coluna de conselhos pessoais, tal como a da psicóloga Joyce Brothers. Uma das possibilidades sérias de dis-torção reside em dar conselhos obso-letos e desencaminhadores. No cam-po da saúde mental, duas não profis-sionais (Abigail Van Buren e A n n Landers) recebem pontuação alta no item "precisão" porque construíram uma rede de contatos cientí f icos e médicos dispostos a parti lhar com elas a úl t ima informação. Os redato-res também estão sempre mui to dis-postos a recomendar que seus leitores procurem orientação profissional. A sua performance não apóia os mitos de que tais colunas oferecem indica-

ções obsoletas ou equivocadas (Tan-kard e Adelson,1982). O efeito dos artigos de serviço não pode ser subes-t imado; a informação dos meios de comunicação pode ser tão importan-te quanto as fontes de informação se-xual para adolescentes, por exemplo. (Courtr ight e Baran, 1980).

A preocupação com os temas de sobrevivência também revela charla-tães. Observe a proliferação de vende-dores de vitaminas, minerais e outros suplementos de saúde. O American Medicine News SerVice oferece aos subscritores dos meios de comuni-cação uma " l inha d i re ta" para verifi-car fpntes ou obter informação adi-cional além de sua cobertura de reu-niões médicas e científ icas como fon-te de história sobre medicina, saúde, nutr ição, cuidado com crianças, apti-dão física e estilo de vida. Tais maté-rias podem ser verificadas com médi-cos locais, uma vez que muitas idéias novas podem levar vários anos para serem geralmente aceitas como práti-cas médicas. Consultar médicos locais sobre novas técnicas fará com que os leitores saibam se tais serviços estão ou não disponíveis em sua área. Com freqüência os médicos locais podem ser o t rampol im para histórias de ser-viço lembrando os leitores sobre doenças comuns a uma área, tais co-mo os cânceres de pele induzidos pe-lo sol no sul e no oeste, e como lem-bretes para procurar tratamento pro-fissional diante da ocorrência de sin-tomas.

As matérias de serviço arriscam-se â distorção ao omi t i rem discussões de risco (perigo de incêndio associado a

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novos plásticos, por exemplo) geral-mente porque os redatores se interes-sam por apenas um aspecto da maté-ria. Um estudo de artigos de revista sobre insetos não conseguiu encon-trar nenhum exemplo de um redator sugerindo outra coisa que não modos de destruir insetos (Morre et al., 1982). Na verdade, a maioria dos insetos são benéficos ou neutros em seus relacio-namentos com o homem e sua pro-priedade. O jornal diário de Aust in, Texas, por out ro lado, encontrou grande popularidade entre os leitores para uma longa série que simplesmen-te identificava e explicava os hábitos de numerosos insetos, aves e mamífe-ros locais. As fontes, naturalmente, eram cientistas dá universidade local.

Distorção no interesse humano

Alguns esforços cientí f icos, apesar dos protestos sobre distorção por parte dos cientistas, podem ser avalia-dos principalmente por seu potencial para gerar conversa entre os usuários dos meios de comunicação de massa. Atualmente é d i f í c i l compreender porque isso deveria preocupar seja cientistas seja redatores de ciência, embora a trivialização de seu traba-lho seja freqüentemente citada por pesquisadores. A perspectiva no signi-ficado mais amplo da ciência é boa, mas quando as pessoas falam estão abertas a aprender e não precisa ser tudo tão sério como o é para os cien-tistas. Uma história negligenciada nessa categoria é o debate sobre se os ancestrais das aves desenvolveram sua habilidade de voar saltando de árvo-

res para planar ou correndo no chão. (Lewin, 1983).

Histórias tais como anéis de detri-tos rodeando o sistema solar, tenta-tivas de resgatar baleias na praia, os processos lentos e multifásicos do en-velhecimento, e a descoberta de cida-des antigas podem ser mais interes-santes por seus aspectos específicos do que por seu lugar no esquema ge-ral do universo. Para Sandra Blakes-lee, que escreve para o The New York Times (1983), os detalhes hu-manos da antiga dieta revelados atra-vés de um novo método de detectar isótopos de plantas em ossos fósseis claramente suplantaram a elegância do método. Ou considere um extre-mo, uma história sobre o barbeiro, que mata lentamente milhões na América do Sul, infectando-os com a doença de Chagas, mas que pode ser conhecido melhor nos Estados Uni-dos por picar as pessoas no rosto e defecar na ferida do que pela miséria que causa, graças a uma matéria transmitida pela Reuters (Reuters, 1981).

O redator também pode encontrar um parágrafo ou uma matéria út i l ao esclarecer porque certos animais são usados como partes da pesquisa para ajudar a condição humana. Os ratos, onipresentes na ciência, têm um sis-tema reprodutivo que proporciona um análogo próx imo aos dos huma-nos. O sistema cardiovascular dos porcos oferece respostas aceitáveis para testes destinados em úl t ima aná-lise aos humanos. Explicar esses rela-cionamentos pode ajudar a compre-ender a ciência. Com freqüência exis-

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te a tentação de dar um t i ro fácil nos cientistas ridicularizando sua pesqui-sa por causa dos animais usados co-mo temas de pesquisa; o melhor pro-cedimento é perguntar pelas razões da escolha e onde a pesquisa se encai-xa num cenário mais amplo.

Distorção em documentos públicos

Os tribunais e os órgãos normati-vos, como a EPA, oferecem registros públicos que o redator de ciência po-de usar para informação. Os Environ-mental Impact Statements oferecem um exemplo de tais registros públi-cos. Embora essas análises de efeitos possíveis de coisas tais como impor-tantes projetos de construção sejam supostamente objetivos, os dados po-dem ser obl íquos ou omit idos. Os re-latórios de progresso e investigação deveriam ser examinados criticamen-te por falhas similares; essas se trans-formaram em pastas da Nuclear Re-gulatory Commission, por exemplo, assim como de outras agências. A maioria das agências estaduais e fede-rais tem o equivalente a um inspetor geral ou um escritório de contabilida-de responsável por monitorar os ne-gócios internos de uma agência. Esses escritórios podem ser uma fonte de tais documentos.

Os jornalistas freqüentemente irão obter notícias de violações de cientis-tas a normas ou padrões da socieda-de, através dos tr ibunais ou arquivos policiais. Na maioria das vezes isso envolve indivíduos ou companhias acusadas de desrespeito à lei, violação

de um trust ou não-cumprimento de um contrato ou regulamento. Onde puderem, as companhias concordarão com um acordo pelo qual não te-nham de alegar nem culpa nem ino-cência. O redator de ciência é limita-do por privilégio legal ao que é relata-do abertamente no tr ibunal ou ao que consta nos documentos arquiva-dos sobre o caso. Isso pode produzir distorção por omissão porque rara-mente existe algum registro de provas de libelo que revele a história inteira, como no caso em que a Mobi l Corpo-ration concordou em pagar mais de 100.000 dólares e conduzir uma cam-panha educacional depois que a En-vironmental Protection Agency acu-sou a companhia de violar as regras sobre a quantidade de chumbo na ga-solina ( "Mob i l wi l l pay " , 1983). Tais decretos de anuência e acordos nego-ciados comumente não dão detalhes sobre ofensas alegadas e nem reco-nhecem culpa.

Todos os t ipos de acusação podem ser feitos quando um processo civil é encaminhado. Embora esses docu-mentos sejam o registro público, as leis do libelo em muitos estados irão exigir que você espere até que a ou-tra parte forneça uma resposta subs-tancial antes que esse material seja li-berado para impr imir . Como uma ré-plica pode levar várias semanas, os jornalistas podem tentar obter o ou-t ro lado da história chamando o acusado. Às vezes é suficiente apon-tar que o processo dá apenas um lado de uma história. Tal l imite não se aplica à acusação criminal, que é le-vantada pelo estado. A imparcialida-

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de diz que você deve fazer t o d o es-f o r ç o para dar ao acusado uma opor -tun idade de responder às acusações.

Por o u t r o lado, u m d o c u m e n t o pr iv i legiado, ta l c o m o u m oferec ido c o m o evidência n u m ju lgamento ou a t ranscr ição o f ic ia l de tes temunho ju rado na cor te, pode ser usado sem temor de l ibelo conquan to você seja acurado na repor tagem. Os procedi-mentos de cor te podem oferecer ao redator de ciência a única o p o r t u n i -dade de ver o u ouv i r dados necessá-rios para p roduz i r uma matér ia sem correr risco f inance i ro por causa das leis de l ibelo. Ta l f o i o caso quando cientistas da Industr ia l Bio-Test, Inc. f o r a m acusados de falsi f icar estudos usados por empresas para ob te rem a graduação de segurança necessária aos p rodu tos a l iment íc ios , farmacêu-t icos e q u í m i c o s (Marshal l , 1983) .

Documentos de cor te e ju lgamen-tos ofereceram visões similares sobre lado obscuro da ciência e cientistas na d isputa sobre se a chuva radiat iva ma tou o u não carneiros duran te tes-tes c o m bombas nucleares em Neva-da, e nas acusações de que o Kepone, u m pest icida fabr icado pela A l l i e d Chemical Co rpo ra t i on , havia pre jud i -cado a pesca no Rio James, na V i rg í -nia (Smi th , 1982 ; Cot iaux e Dar l ing, 1976) . Ju lgamentos, audiências pú-blicas e documentos a eles relaciona-dos oferecem t a n t o provas diretas c o m o indiretas bem c o m o dados que podem não ser obten íve is nem pub l i -cáveis de o u t r o m o d o . Freqüente-mente revelam fatos sobre uma com-panhia o u i n d i v í d u o enquanto se re-ferem a ou t ros temas. Esse é o mate-

rial pr iv i leg iado, mas é sujei to a dis-torções por causa do sistema adver-sarial. A m b o s os lados de u m tema de advocacia t endem a superestimar seus própr ios dados, seus própr ios casos e usar dados seletivos. Juizes e júr is de-t e r m i n a m os fatos assim c o m o a cul-pa o u a inocência. 0 sistema não en-coraja apresentações equi l ibradas. Em casos onde a segurança púb l ica está em r isco, os redatores de ciência encon t ram pressão crescente para que eles e seus veículos f o r c e m o equ i l í b r i o .

Experiências

1. No papel de "redator de ciência céti-co" releia matérias de ciência que você leu ou matérias em jornais e revistas atuais. Es-colha uma ou duas histórias que necessi-tam de resposta quanto a algumas das per-guntas colocadas nesse capítulo. Prepare-se para discuti-las em classe.

2. Prepare uma lista de temas contempo-râneos que precisam de algum comentário científico para serem colocados em pers-pectiva. Verifique o catálogo de sua uni-versidade ou faculdade e selecione nomes de pessoas que você acha que poderiam dar alguma luz sobre esses temas.

3. Há questões adicionais que você possa levantar para testar a credibilidade de ma-térias de ciência, medicina e engenharia? Prepare uma lista delas para discussão em classe.

4. Peça a um estudante graduado ou um instrutor de ciência para sugerir outros tes-tes sobre como medir o valor de um relató-rio científico.

5. Examine matérias de ciência de jornais ou revistas em busca de exemplos de pos-síveis distorções que deveriam ter sido cor-rigidas na matéria. Pode sugerir maneiras de verificar a existência de distorção?

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Capítulo 6

Contando a sua história de ciência

VOCÊ ESTÁ PRONTO PARA ESCRE-VER UM PRIMEIRO RASCUNHO da sua matéria ou script de ciência. Vo-cê passou esses pontos decisivos:

1. Seleção de um tema a partir de um periódico c ient í f ico, uma reu-nião, uma entrevista, uma conferên-cia de imprensa, um press release, um palpite, ou outras fontes;

2. Verificação de sua idéia quanto ao seu valor noticioso através de docu-mentação (periódicos cient í f icos e trabalhos), interrogatório (entrevistas de fontes), observação (visita a lo-cais), participação (experiência pró-pria).

Também se assume que sua infor-mação é acurada, que você tomou cuidado na tomada de notas ou nos registros para obter números e cita-ções corretas, e que você sente que tem informação suficiente para com-preender sua história. Essa informa-ção deve incluir material histórico su-ficiente para ligar os novos desenvol-vimentos de uma maneira significati-va à informação mais antiga. Saiba como essa nova informação muda nossa compreensão. Não deveria ser necessário que seu editor perguntas-se: "Por que isso é importante?" ou "Por que temos de publicar isso?"

O parágrafo de signif icância

Por que sua história é importante deve estar claro em sua matéria. Re-datores profissionais colocam esse sentido num "parágrafo de signif icân-c ia" , mesmo quando esse implica apenas uma curta frase ou sentença. Isso estabelece a conexão entre você e seus leitores: por que você está es-crevendo a matéria e por que eles de-vem lê-la. O parágrafo de significân-cia dá ao seu editor e ao responsável pelos t í tu los , se você escreve para jor-nais, o gancho no qual pendurar o t í -tu lo ou manchete e decidir qual a projeção a ser dada à história. A falta de uma informação clara, breve e ine-quívoca contr ibu i para manchetes inacuradas, enganosas e excessiva-mente sensacionalistas. Com freqüên-cia demais a ausência de uma afirma-ção de significado ou a presença de uma informação nebulosa resulta da falha do redator-repórter em compre-ender a matéria. Em tempos passados e mais simples, a reportagem descriti-va do que os cientistas diziam parecia ser suficiente, mesmo se o significado não fosse por si evidente. Agora você está escrevendo numa era anal í t ica. É importante impelir as fontes a res-ponderem à pergunta: " O que isso significa?" Você terá uma informa-

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ção mui to út i l e direta para citar ou parafrasear. Admi t i r confusão não causa dano permanente à sua reputa-ção. Mesmo que você pense que sabe o significado, verifique com uma ou mais de suas fontes.

Você pode também desenvolver uma apresentação original da signifi-cância. Às vezes as anotações, entre-vistas e gravações em f i ta não se fun-dem numa afirmação clara de signifi-cado, ou esta pode estar despida de jargão técnico ou sem significação. Desenvolva sua própria versão em lin-guagem clara e teste-a em confronto com os cientistas. "Posso dizê-lo des-se modo. . . " é uma maneira decente de iniciar a paráfrase de uma afirma-ção cientí f ica. "Como podemos fa-lar sobre isso em inglês?" é um come-ço viável também. Falando de modo geral, de acordo com estudos de ati-tudes, o cientista, o leitor e o repór-ter estarão mais de acordo sobre a acurácia e significado da matéria do que os editores e leitores de textos (Tannembaum, 1962, 1963). O arti-go ou trabalho de um cientista pode não conter uma afirmação de signifi-cado; o mesmo depende do conheci-mento do público para pegar o signi-f icado. Entretanto, haverá tempos em que você, como redator, discorda-rá de uma fonte sobre o significado, desenvolvimento ou aplicação da pes-quisa. Confie em seu conhecimento, sua percepção, seus instintos — mas verifique-os com pessoas qualificadas.

As informações sobre significado devem aparecer ao começo de sua matéria ou ali por perto. Elas podem ser o t í t u l o . No entanto, esse ponto

lógico de organização fica com fre-qüência perdido, quando os redatores se enrolam subconscientemente nos detalhes que relatam. Bastante fre-qüentemente o significado pode ser omi t ido ou estar profundamente en-terrado numa história. Se estiver en-terrado longe do t í t u l o da matéria, os leitores podem ficar confusos ou aborrecidos porque não conseguem ver por que devem gastar seu tempo com você.

Escolhendo a forma de uma matéria

Os redatores, particularmente os redatores de ciência, têm mais esco-lhas sobre como fazer seu trabalho do que muitos acreditam. O processo todo é uma série de escolhas ou um consenso estabelecido com os edito-res. Nunca uma história se "escreveu por si mesma", como alguns repórte-res af i rmam. Se algumas histórias saem facilmente de sua máquina de escrever ou processadora, provavel-mente é porque o conteúdo torna as suas decisões fáceis ou você vê rapi-damente um início que funcionará. Você pode ser mais rápido do que al-guns de seus colegas em tomar uma decisão. Entretanto, é fácil esquecer que não existe uma maneira certa de organizar uma história. Todas as ma-térias representam uma série de esco-lhas criativas

O papel de guardiães de editores torna a sua concordância essencial, especialmente para o redator de ciên-cia iniciante. A pesquisa recente indi-ca que é nesse ponto que o "sensacio-

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n a l i s m o " geralmente entra nas maté-rias de ciência. E m seu estudo sobre editores e repórteres de ciência pa-ra jornais, C a r r o l l J . G l y n n , da Cornel l Un ivers i ty , de f in iu o sensacionalismo c o m o "co loca r ênfase excepcional em aspectos singulares de uma situa-ç ã o " . Os edi tores dão mais peso a es-se e lemento na avaliação de uma ma-tér ia do que os repórteres, e a razão pode bem estar na associação mais longa do ed i tor c o m o jo rna l i smo, uma incl inação ins t i tuc iona l em gerar exci tação pela exci tação em si. Para i lustrar a natureza consensual da sele-ção de matér ias, G l y n n re la tou que os edi tores acredi tam serem os ideali-zadores de uma grande percentagem das matérias de ciência enquan to os repórteres d izem que a percentagem v inda dos edi tores é m u i t o baixa. Ca-da qual aparentemente acredi ta que suas barganhas p roduzem dois vence-dores ( G l y n n , 1985, 70) .

Gera lmente a pr imei ra escolha re-side entre uma abordagem de " n o t í -cia de i m p a c t o " e de " a r t i g o de des-t a q u e " o u "lead de efe i to l e n t o " . A l -guns jornais e algumas poucas esta-ções de rád io e T V insistem em man-chetes de impac to para v i r tua lmente toda matér ia. Obv iamente a escolha é i m p o r t a n t e porque a aber tura modela a maneira pela qual a matér ia inte i ra se desenvolve. As manchetes de im-p a c t o geralmente são t í t u l o s sumá-rios, var iando entre a t rad ic iona l his-tó r ia not ic iosa (quem-o quê-quando-onde-por que-como) que p roduz a matér ia em p i râmide inver t ida, c o m os fatos ar rumados em o r d e m decres-cente de impor tânc ia , e sumários

mais in fo rma is que co locam fatos-chave, embora c o m f reqüência rot i -neiros, l igeiramente mais para d e n t r o na matér ia. Esses ú l t imos são conhe-cidos c o m o " n o t í c i a s suaves" ou "leads de impac to o u de e fe i to len-t o " . V i r t u a l m e n t e todas as matérias de revistas são uma f o r m a d o ar t igo de destaque. A matér ia de revista ge-ra lmente é f o r m a d a ao redor de u m " t e m a " ou idéia centra l , d o qua l faz parte a in fo rmação sobre a sua signi-f icância.

S U M Á R I O D A S N O T I C I A S NOS LEADS. A q u i há alguns exemplos de sumários dos leads para matérias de " n o t í c i a s de i m p a c t o " :

Menos casos novos da síndrome da imunodef iciência adquirida, ou AIDS, foram relatados nos Estados Unidos na segunda metade de 1983 do que na primeira metade do ano, disseram funcionários federais da saúde ontem. Entretanto, preveni-ram que é cedo demais para tirar conclusões sobre uma tendência de longo prazo (Altman, 1984, 6).

MIDDLETOWN, Pa., Jan. 5 (AP) -Operários encarregados da limpeza do reator nuclear danificado na Three Mile Island poderiam estar expostos a seis vezes mais radiação do que se pensou inicialmente, dis-se hoje a Nuclear Regulatory Commission (Associated Press, 1984b, 6).

Tais sumários dos leads, sobre eventos inc luem f reqüentemente nu-ma sentença, (1) quem disse o u reali-zou a ação, U) o que aconteceu: uma descrição do evento/ação, (3) quando

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e (4) onde o evento/ação ocor reu. O " p o r q u e " e o " c o m o " ta l matér ia descri t iva ou " o b j e t i v a " vem mais tarde e geralmente são a t r i bu ídos a uma ou mais fontes not ic iosas. Habi l -mente escritos, tais sumários t ransmi-t e m a in fo rmação rap idamente e até mesmo de f o r m a cadenciada. Entre-t a n t o , perdem pela extensão e fre-qüen temente escondem o p o n t o de uma matér ia atrás de dados que o lei-t o r desconhece.

A q u i está o u t r o t i p o de sumár io de lead: a conclusão que deixa os da-dos de ro t ina para u m parágrafo pos-te r i o r :

ALBANV, N.Y., Jan. 6 - Um rela-to hoje ao governador Cuomo con-cluiu que os serviços psiquiátricos estão num estado crônico de crise por toda New York City e são capa-zes de lidar apenas com os mais do-entes, violentos e suicidas entre os pacientes. (Barbanel, 1984).

Os leitores encont ra ram o " q u e m " integrado n u m parágrafo dando pers-pect iva sobre onde a l iberação desse re la tór io se encaixa numa cont rovér -sia po l í t i ca em curso sobre os cuida-dos c o m a saúde menta l . N u m ar t igo est r i tamente c i e n t í f i c o , Walter Sul l i -van, do The New York Times, co lo-cou os três parágrafos ro t ine i ros bem para den t ro da h is tór ia , dando mais peso a " o q u e " estava sendo d i t o , u m aviso sobre as incertezas e o signif ica-d o :

Cinco grupos experimentais, na ín-dia, Ohio, Japão, Sufça e Utah, di-zem que registraram, com detecto-res, fenômenos que poderiam possi-

velmente ser interpretados como deterioração ocasional de prótons, os blocos de construção de toda a matéria. Mas são rápidos em apon-tar que as observações poderiam ser explicadas de outros modos. A prova real de tal deterioração te-ria implicações arrasadoras, pois os prótons existem nos núcleos de to-dos os átomos, e sua deterioração iria destruir gradualmente toda a matéria no universo. A destruição não iria ocorrer, entretanto, antes da passagem de bilhões e bilhões de anos (Sullivan, 1984, 6).

Todos os exemplos seriam melho-

rados se a sua essência pudesse ser

condensada em menos palavras, mas

o mater ia l técn ico t rabalha cont ra

isso. Essa é uma das razões pelas

quais mu i tos repórteres e editores

gostam de uma abordagem de desta-

que.

LEADS

LEADS M A I S I M P O R T A N T E S . Os leads mais impor tantes t o m a m mui-tos caminhos, sempre co locam o sig-n i f i cado bem para d e n t r o da histór ia. A d i ferença, en t re tan to , reside em usar abordagens dramát icas ou l i t e rá -rias e aplicá-las t a n t o a eventos not i -ciosos c o m o a matérias completas, re-portagens de situação ou análises que p o d e m não estar ligadas a u m evento ou t e m p o especí f ico. Pat r ick Young , d o Newhouse News Service, começou sua matér ia sobre as descobertas no Geron to logy Research Center desse m o d o :

BALTIMORE - Por que envelhece-mos?

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A resposta permanece desconhe-cida. Mas em um quarto de século de exploração dessa pergunta in-temporal, os pesquisadores do Balti-more Longitudinal Study of Aging definiram mais de perto o que é en-velhecer e demoliram alguns mitos e estereótipos sobre os idosos (1983, sec. 1, 30).

Por causa da poderosa pressão so-cial sobre os afetados pela lepra, u m redator da Associated Press começou uma matér ia desse m o d o :

LOS ANGELES (AP) - Carlos imi-grou do México em 1969, casou-se e teve dois filhos, agora com 6 e 11 anos. Mas tem um segredo para com seus filhos — Carlos tem lepra (Associated Press. 1983, 32D).

A par t i r desse i n í c i o human izado e personal izado a matér ia movia-se através de t rechos que serviam c o m o referência e que l idavam c o m pon tos c o m o a u m e n t o na incidência da lepra c o m a chegada de pessoas de ou t ros países, o n ú m e r o de v í t imas em t o d o o m u n d o e nac ionalmente, declara-ções de médicos de que a doença não é contagiosa, e que novos t ra tamen-tos estão sendo desenvolvidos.

Jer ry E. B ishop e Michael Wald-holz, do The Wall Street Journal, f i-zeram do parágrafo s igni f icat ivo a sua abertura:

Estimulados por importantes avan-ços na engenharia genética, os pes-quisadores estão providenciando uma hoste de novas vacinas que po-deriam evitar doenças em milhões de pessoas. As novas vacinas podem ser o maior dividendo até hoje da recém-descoberta habilidade dos

cientistas em manipular genes e transferi-los de um organismo para outro. As vacinas, que poderiam constituir armas seguras e baratas contra muitas doenças infecciosas, representam a primeira mudança básica na tecnologia das vacinas em cerca de duzentos anos (1983, 31).

A matér ia que permi te essa se-qüência de af i rmat ivas dramát icas se desenvolve c o m uma redução do c l í -max antes de começar uma nova fo r -ma de contar a h istór ia no c o r p o da matér ia. Essa f o r m a f o i comparada a uma " a m p u l h e t a " em est rutura por-que após a in t rodução você pode sal-tar para a organização p o n t o por p o n t o ou seguir u m desenvolv imento c rono lóg ico . Essa est rutura de " a m -p u l h e t a " pode ser a t r i b u í d a t a m b é m a u m evento not ic ioso. Depois do lead convencional do t i p o 5 -W-&-H, você pode passar para uma crono lo-gia de eventos ou u m re la to detalha-do do çvento-chave, numa seqüência lógica, crescendo na direção de u m f i -nal p lanejado. Os redatores mais cui-dadosos irão planejar o f ina l no mo-m e n t o em que f i x a r e m sua aber tura ou começarem a dec id i r sobre u m fa-to-chave, c i tação ou o u t r o mater ia l c o m o qual encerrar a matér ia. Isso evita que você se encurrale em a lgum can to de onde escape c o m d i f i cu lda-de. Lembre-se t a m b é m , que a h istór ia c ien t í f i ca básica é a matér ia sobre " c o m o f a z e r " .

Desenvolvendo o corpo

Desenvolver o corpo de sua maté-ria de ciência freqüentemente se tor-na um exercício para fazer não-cien-

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tistas apreciarem objetos, idéias, pro-cessos e eventos fora da experiência sensorial comum. Enquanto estabele-ce o curso de sua matéria através da escolha de um lead você pode consi-derar as restrições reais do tempo que você dispõe para escrever, de maneira a cumpr i r seu prazo. Out ro l imite real envolve espaço que lhe é destina-do e que estabelece a extensão de sua matéria. Mais de 600 palavras numa matéria noticiosa ou artigo de fun-do noticioso podem exigir arranjos especiais, exceto no caso de eventos mu i to dramáticos. O espaço e o tem-po l imi tam a ampl i tude de sua repor-tagem em termos de detalhes e dra-matização.

Out ro fator a considerar é o grau de legibilidade de sua história. Essa é uma combinação de dois elementos. Apesar de os cientistas reclamarem do sensacionalismo, as histórias de ciên-cia, quando avaliadas por pesquisado-res da área de comunicações, tendem a ser classificadas como tediosas. Sur-preendentemente, as matérias c ient í -ficas dos jornais são classificadas co-mo mais chatas e mais di f íceis de ler do que as das revistas noticiosas, que usam termos mais técnicos. A maté-ria de ciência dos jornais em geral se classifica como adequada para públ i -cos de nível universitário, embora se-ja dir igida a um nível de leitores me-nos informados do que as matérias de revistas noticiosas (Levine, 1981; Pitts, 1980; Kwolek, 1973, 225).

Um elemento de legibilidade é a extensão das frases. É mu i to fáci l es-crever frases, especialmente leads que contenham 40, 50 ou mesmo 100 pa-

lavras. (Há um exemplo no tex to pre-cedente.) Essa é uma razão por que os textos universitários às vezes fa-zem dormi r . As histórias que tenham compr imento médio de frases entre 17 e 20 palavras parecem ser classifi-cadas, pela maioria do seu públ ico, como leitura fáci l . Isso não significa que você não possa usar sentenças mais longas. Significa que você mistu-ra compr imentos de sentenças para atingir um nível onde as pessoas com educação ginasial ou menos podem pegar o seu signif icado mais facilmen-te. Isso também é ú t i l quando os membros de u m públ ico com habili-dades de leitura mais altas, se vol tam para você em busca de ajuda quando estão cansados, quando procuram distrair sua atenção de negócios preo-cupantes, ou simplesmente quando uma compreensão fáci l de material d i f í c i l é desejada. A não ser que você tenha consciência do problema, é mu i to fáci l você se pegar escrevendo uma história que apenas um profes-sor universitário pode compreender. Assim, quanto mais longa a frase, mais longas as palavras, maior o risco de perder o f i o da lógica e seus leito-res.

O ou t ro elemento principal na le-gibil idade das matérias de ciência en-volve a tradução de termos técnicos. O vocabulário especializado nos cam-pos c ien t í f i co e médico to rnam im-possível evitar de todo o uso de jar-gão. Entretanto, o redator pode defi-nir as palavras do cientista antes ou depois de sua colocação numa frase. Isso exige o planejamento da constru-ção de cada frase de modo que a tra-

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dução, expl icação ou de f in ição pare-ça natura l e não desajeitada. T o m e cu idado no const ru i r a t radução para evitar falar de c ima c o m seu púb l ico . Ser desajei tadamente óbv io o fende mesmo aqueles que sentem necessida-de da expl icação. Inclua tais def in i -ções em sua matér ia do m o d o mais d iscreto possível, u m pouco antes ou depois de usar pela pr imei ra vez uma palavra técnica.

A q u i há algumas outras dicas. Use palavras curtas quando puder , escreva exp l i c i tamente , dê exemplos de apli-cações prát icas e analogias. Use pala-vras "pessoais" quando puder . Escre-va "sua exper iênc ia " ao invés de " a exper iênc ia " .

Os números, l inguagem da ciência quan t i ta t i va , causam ataques nos re-datores c ien t í f i cos . Os edi tores ode iam in tu i t i vamente os números. Pensam que os números p rovocam af l ição nos leitores. Os números pro-vocam af l ição nos editores. Essa afl i-ção pode at ing i r os edi tores mais que os leitores, uma vez que mu i tos leito-res l idam c o m números rot inei ra-mente. E n t r e t a n t o o le i tor não esco-lhe c o m u m e n t e u m t e x t o de matemá-t ica c o m o le i tura de recreação. Por-tan to , use os números selet ivamente. Inc lua apenas os números mais im-por tantes. Exp l ique seu s igni f icado.

Essa m á x i m a se aplica de m o d o di-ferente a cada per iód ico. Os edi tores do Scientific American raramente se enco lhem d iante de números preci-sos, mesmo na classe dos bi lhões e t r i lhões. A maior ia das pessoas que c o m p õ e o púb l i co prof iss ional e al-tamente bem i n f o r m a d o da revista

pode compreender a idéia de 10-à-sexta-potência ser igual a u m mi lhão . A maior ia dos ou t ros públ icos fo ra das comunidades c ient í f icas, de en-genharia e dos negócios, provavel-mente acharia essa notação c ien t í -f ica aborrecida senão in t r igante. A não ser que u m número preciso faça uma d i ferença c r í t i ca na compreen-são da matér ia , o a r redondamento dos números fac i l i ta a lei tura.

Quando o t a m a n h o re lat ivo é u m fa to r , a compreensão pode ser au-mentada fazendo-se comparações c o m coisas fami l iares, tais c o m o dis-tâncias entre pon tos geográficos, ve-locidades, pi lhas de moedas, grãos de t r igo o u areia. (As comparações c o m o tamanho de u m p e r í o d o em seu jorna l ou revista o ferecem uma refe-rência ú t i l pela qual u m le i tor pode visualizar tamanhos relat ivos). As proporções oferecem o u t r o instru-men to ú t i l para comparação. Dizer que de te rm inado planeta é qua t ro ve-zes maior o u menor do que a Ter ra ou que uma tempera tu ra é mais alta que a do Sol oferece ao não-cient ista algumas conexões mentais e f ís icas c o m a realidade c ien t í f i ca .

Para dar aos leitores leigos alguma compreensão do d i m i n u t o tamanho de um ún ico á t o m o , Gary Z u k h a v usou esta analogia:

Para se ver o núcleo de um átomo, este deveria ser tão alto quanto um edifício de quatorze andares! O nú-cleo de um átomo alto como um edifício de quatorze andares teria o tamanho aproximado de um grão de sal. Como uma partícula nuclear tem cerca de duas mil vezes mais

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massa que um elétron, os elétrons girando ao redor de seu núcleo te-riam a massa semelhante à das par-tículas de pó. O domo da basílica de São Pedro, no Vaticano, tem um diâmetro de cerca de quatorze andares. Imagine um grão de sal no meio do domo de São Pedro com algumas partículas de pó girando ao seu redor nos limi-tes externos do domo (1979, 32).

Supondo que nem todos vis i taram ou puderam visualizar a basíl ica de São Pedro, mas apenas referências lo-cais, falar de u m estádio conhec ido que tenha f o r m a t o esférico poder ia subst i tu i r bem a basí l ica. Tais estru-turas darão aos artistas gráf icos uma base de encon t ro à qual poderão fa-zer as i lustrações para contar parte da mensagem de sua matér ia.

Os redatores de ciência da revista Fortune t êm excelentes artistas gráf i-cos para apoiar suas palavras c o m de-senhos, tabelas, mapas e ou t ros pic-togramas most rando visualmente as relações numéricas. Est imulados por U S A Today e ou t ros jornais nacio-nais, mais jornais e revistas estão reti-rando os números das matérias e co-locando-os em quadros e tabelas ilus-t ra t ivos. Os redatores devem pensar em suas histórias c o m o " p a c o t e s " de palavras e i lustrações. Ocasionalmen-te os cientistas prov idenc iarão dese-nhos e tabelas ou rascunhos para or ien tar artistas gráf icos. Eles pode-r iam proporc ionar mais se você pedis-se. A distorção nas proporções de seus ins t rumentos gráf icos será toma-da tão seriamente c o m o suas pala-vras.

T a n t o os números c o m o os dese-nhos cons t i tuem armadi lhas e opor-tunidades de má- interpretação. Sem-pre que possível, o redator de ciência deveria checá-los dup lamente c o m o pesquisador. Mantenha as i lustrações (tabelas de números, desenhos e fo to -grafias) tão simples q u a n t o possível para o púb l i co em geral. Deixe que a i lustração enfat ize apenas o detalhes-chave que se encaixam em sua maté-ria.

Instrumentos literários

U m arsenal de ins t rumentos lite-rários pode ajudá- lo a escrever sua ma-tér ia de ciência e fazer o invisível f i-car v ivo para leitores, ouv intes e es-pectadores. Todos f o r a m acostuma-dos pelos própr ios cientistas a tentar descrever o que não pode ser visto. Esses ins t rumentos inc luem a ambi-entação do cenário, anedotas, analo-gias, descrições, detalhes sensórios es-pec í f icos, paradoxos, metáforas, sí-miles, narrativas, c rono log ia e assim por d iante.

A M B I E N T A Ç Ã O DE C E N Á R I O . U m dos ins t rumentos l i terár ios mais populares é a ambientação dos cená-rios. Os exemplos abundam por cau-sa de seu valor em atrai r u m púb l i co para a matér ia. Mendel escolhendo suas ervi lhas, por exemplo . Veja co-m o Richard D. Lyons, do The New York Times, leva você para o ama-nhã.

CORCORAN, Calif. — Imagine a fa-zenda do futuro. Tal operação po-deria combater insetos substituindo

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o bombardeio com enormes doses de produtos químicos pela mistura de atrativos sexuais aos inseticidas para diminuir o uso dos pesticidas. Essa fazenda do futuro teria muitas colheitas que seriam semeadas, cul-tivadas, fertilizadas, colhidas, empa-cotadas e despachadas sem serem tocadas por mãos humanas. Células fotoelétricas iriam localizar os fru-tos prontos para embalagem de mo-do que apenas frutos maduros che-gassem ao mercado. . . Futuristas como possam ser tais idéias, elas es-tão sendo usadas hoje, aqui no San Joaquín Valley (1983, 1).

J u d i t h Randal do Daily News de Nova Iorque usa a ambientação do cenár io para aguçar o paradoxo d o imaginár io t rans fo rmado em real:

WASHINGTON - Parece ficção-ci-entffica: supor que ser contratado ou promovido poderia depender dar-se bem numa bateria de testes de sangue por ter genes compatíveis. No entanto, 59 companhias — a maioria delas na lista da revista For-tune das 500 mais importantes cor-porações dos EUA — revelaram re-centemente ao Congressional Office of Technology Assessment que pla-nejam fazer da verificação genética uma parte de sua política de pessoal dentro dos próximos cinco anos (1982, 8A).

Richard D. S m i t h , u m ant igo edi-t o r de The Sciences, baseado em No-va Iorque, usa a ambientação de ce-nár io para colocar os leitores n u m au-d i t ó r i o escuro onde u m cient ista está exp l icando os mistér ios da S í n d r o -me da Imunodef ic iênc ia A d q u i r i d a ( A I D S ) :

O primeiro slide na tela durante a apresentação do imunologista John

Hadden não foi um gráfico nem um diagrama nem uma micrografia de elétron. Ao invés disso, era uma xi-logravura japonesa de um elefante rodeado por homens cegos. . . Mais do que qualquer imagem projetada durante os quatro dias da conferên-cia, em novembro, essa ilustrou a enorme brech^ entre o que sabemos e o que precisamos saber sobre a epidemia que o U.S. Public Health Service declarou sua primeira prio-ridade (1984, 8).

A N E D O T A S . O u t r o i ns t rumen to é o uso de anedotas. As anedotas são mi-ni-histór ias, histórias d e n t r o da histó-ria, que i lust ram u m p o n t o em seu ar-t igo ou servem c o m o aber tura . A his-tó r i a do elefante na matér ia prece-dente é t a n t o u m estabelec imento de cenár io c o m o uma anedota que ca-racterizava o conhec imen to dos cien-tistas das causas ou et io log ia da A I D S . T a n t o a B íb l ia q u a n t o o Reader's Digest as usam c o m o cha-marizes e t ruques para dar v ida às partes tediosas. Anedotas , c o m o por exemp lo , o que aconteceu quando uma nova idéia f o i oferecida pela pr i-meira vez ao púb l i co , são d i f í ce is de obter porque precisam ser apropr ia-das à matér ia, encaixando-se exata-mente na mesma. Para obtê-las, você provavelmente terá de fo rçar seus en-trevistados c o m perguntas abertas, tais c o m o : " C o m o v o c ê . . . ? " , " O n d e você. . . ? "

O U T R O S I N S T R U M E N T O S . No in-te r io r da histór ia, você pode usar ou-t ros ins t rumentos l i terár ios para re-t ra tar o que é invisível para o não-ci-ent ista ou para uma pessoa t re inada

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em ciência, numa discip l ina m u i t o di-

ferente. A lguns desses ins t rumentos ,

que t a m b é m dão vida ao t e x t o , in-

c luem a metá fora , o s ími le e a ana-

logia.

A metá fora ten ta descrever u m evento, exper iência o u pensamento c o m base em alguma ou t ra coisa. Vo-cê está fa lando e escrevendo f igurat i -vamente, de ixando uma coisa perma-necer c o m o o equivalente do o u t r o , para efei tos de comparação. A metá-f o r a insinua, em vez de estabelecer comparações exatas. Quando cientis-tas fa lam "ca tedra l da c iênc ia" , eles t razem à sua mente uma bela estru-tu ra , elevando-se para os céus e cons-t r u í d a c o m os t i j o los e as pedras do conhec imento .

S ími le é a f igura de l inguagem que os professores lhes d izem ser in t rodu-zida por " c o m o " . C u r t o e compac to , o s ími le impl ica em congruência (ou quase-congruência) ao invés de sole-t rar a coisa p o n t o por p o n t o . " O s elé-t rons movendo-se c o m o vagalumes para estados mais baixos de energ ia" é u m s ími le invocando algo conheci-do para descrever a l iberação de u m f ó t o n de energia q u a n d o u m e lé t ron muda de u m estado ex te rno de maior energia para uma ó rb i t a mais baixa, in ter io r , ao redor d o núcleo de u m á t o m o . A constante chuva de poeira cósmica sobre a ter ra pode, por exemplo , ser comparada à camada de poeira que se j un ta sobre seu carro. Earl Ubel l usou uma abordagem du-pla para descrever o aparec imento dos componentes do á t o m o :

Grande excitação ontem no Hotel New York. . . A notícia é que o próton parece um pêssego. O nêu-tron é como uma noz. A descrição pode revelar a longo prazo o que mantém o universo unido. A estória começa com a descoberta do pró-ton há meio século; o nèutron foi encontrado trinta anos atrás (1961, 3).

Ubel l não estava se d i ve r t i ndo c o m os esforços dos cientistas, mas essa paródia arrancada do est i lo lin-gü ís t i co chinês p r o p i c i o u o uso de metá fo ra ao longo do ar t igo. Com menos de qu inhentas palavras, Ubel l conseguiu uma maneira d is t in tamen-te d i fe rente de descrever a essência de uma nova visão da est ru tura atô-mica. Não subestime o poder de es-crever c o m novidade e c o m uma voz f o r t e e at iva. Uma exper iência sobre legibi l idade realizada pelo professor L l o y d Bost ian (1983) mos t rou que mesmo estudantes universi tár ios lêem matérias de ciência mais ráp ido e des-c o b r e m os temas mais interessantes q u a n d o você escreve na voz ativa. Há indicações em seus estudos de que os lei tores menos letrados apreciam a re-dação ativa ainda mais. O "es t i l o no-m i n a l " , aquela f o r m a abstrata de es-crever encont rada em tex tos e traba-lhos c ien t í f i cos , é o mais ted ioso e di-f í c i l de compreender . A l é m disso, faz c o m que você escreva mais palavras.

A analogia exige que você faça ou insinue uma longa comparação entre duas situações nas quais você traça m u i t o s pon tos de s imi lar idade. Por e x e m p l o , você poder ia i lustrar a enorme escala do t e m p o geológico

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antes dos humanos aparecerem na ter ra em te rmos de cidades ao longo de uma caminhada o u viagem trans-con t inen ta l de Nova Iorque a Los Angeles.

Procure f iguras de l inguagem para dar v ida aos seus tex tos . Peça aos cientistas comparações, analogias e s ími les. Procure f iguras de l inguagem na conversação casual dos cientistas. Crie suas própr ias f iguras de lingua-gem, mas teste-as de encon t ro aos concei tos dos cientistas que entrevis-ta para assegurar que as comparações são válidas. Evite a metá fora mis ta ; considere o que está d izendo c o m o se você estivesse ten tado a ter "oceanó-grafos sondando mais p r o f u n d a m e n t e no mar do c o n h e c i m e n t o . "

Lembre-se t a m b é m da narrat iva, essa f i e l companhei ra do con tador de histór ias; disposta de f o r m a l inear; p r i n c í p i o , meio e f i m . Gera lmente a organização é c rono lóg ica. A o cons-t r u i r a h istór ia numa seqüência tem-pora lmente ordenada de eventos, m u i t o s dos seus problemas de organi-zação se resolvem por si. Isso to rna a narrat iva uma das fo rmas mais popu-lares. Quase todos os redatores pro-fissionais irão dizer- lhe para planejar c o m o irá te rminar a h istór ia quando planeja o i n í c io , não impor ta qual a f o r m a . Os passos-chave levando a uma descoberta p o d e m ser usados so-zinhos o u ligados à cronolog ia . Na narrat iva, o f ina l t o m a conta de si mesmo.

Coloque o problema diretamente

Seu p r ó p r i o ta len to c o m a lingua-

gem e os usos l i terár ios irão determi-

nar o q u a n t o você br inca c o m as téc-nicas mais fabulosas do drama e da li-te ra tura . Saiba, en t re tan to , que usar alguns t ruques de redação é me lhor do que colocar d i re tamente o proble-ma no coração de sua matér ia de ciência. Embora isso possa roubar graça ao est i lo (ou pretensões a isso), é comunicação de p r ime i ra . O est i lo d i re to pode nem sempre ser o me-lhor , mas é ef ic iente. Har ry Nelson, do Los Angeles Times, encur ta sécu-los de tecnologia médica c o m isso:

Dentes falsos, olhos de vidro e peru-cas podem não soar como descober-tas médicas, mas, centenas de anos atrás, constituíram o início do Ho-mem Biônico. Hoje, novos materiais sintéticos e tecnologia eletrônica expandiram grandemente a capacidade do ho-mem de construir uma variedade de órgãos artificiais e partes de repo-sição que imitam modestamente as criações da natureza (1984, séc. 5,90).

O Business Week e ou t ros per iód i -cos industr ia is ou prof iss ionais favo-recem esse t i p o de i n í c i o por causa da fac i l idade c o m a qual at inge os in-teresses econômicos de seus leitores, c o m o most ra esse e x e m p l o :

A cada outono um desastre natural atinge os fazendeiros dos EUA, cau-sando centenas de milhões de dóla-res em perdas agrícolas. Até agora, os fazendeiros não foram capazes de fazer muito contra a mortífera geada anual. Mas alguns cientistas acreditam agora que podem dar a volta no problema. Eles identifica-ram o culpado, e este não é Jack Frost.

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Ao invés disso, é um grupo de desprezíveis bactérias que têm a curiosa habilidade de formarem cristais de gelo quando o mercúrio mergulha apenas um par de graus abaixo do ponto de congelamento ("Aquecendo. . ." 1983, 138).

O free-lancer B i l l Cromie , t a m b é m d i re to r do Counc i l f o r the Advance-m e n t of Science W r i t i n g e oceanógra-f o , dispôs desse m o d o o p rob lema es-sencial para a Mosaic, uma publ ica-ção popu lar sobre ciência para a Na-t i ona l Science F o u n d a t i o n :

O hidrogênio queima sem fazer su-jeira. Propriamente oxidado produz apenas calor e água. Uma vez que a água é também uma fonte de hidro-gênio, o ciclo deveria se repetir in-definidamente e o combustível não deveria exaurir-se jamais.

O problema é que a energia re-querida para extrair hidrogênio da água é maior do que a energia pro-duzida ao queimar o hidrogênio. Mas se a energia usada para separar a água em oxigênio e hidrogênio pe-la hidrólise pudesse ser solar, o hi-drogênio poderia concentrar e acu-mular efetivamente a luz do sol pa-ra uso posterior (1981, 7).

Personalizar a história

Contar a sua h is tór ia através das pessoas envolvidas representa ou t ra maneira de aumentar a atenção. As pessoas gostam de ouv i r sobre outras pessoas, especialmente se são famo-sas, talentosas, incomuns ou expressi-vas. Você pode t rançar in formações a respeito da ciência que elas p ra t icam c o m as in formações histór icas sobre o assunto e o mater ia l de apo io de

sua histór ia. N u m per f i l de personali-dade, o cen t ro da histór ia é uma pes-soa, mas essa histór ia pode ser às ve-zes contada através dos olhos de ami-gos e, às vezes de in imigos:

NOVA IORQUE - Bruce Alperts conheceu Barbara McCIintock há cerca de 13 anos, quando fez um curso que ela ministrava no lugar onde estava baseado, o Cold Spring Harbor Laboratory, em Long Island.

Alperts é microbiólogo e Mc-CIintock é uma geneticista de plan-tas, de modo que não há muita so-breposição em seu trabalho. Mas McCIintock tem o tipo de mente que não presta atenção a classifica-ções. O mundo inteiro da ciência biológica está a seu alcance.

Foi mais ou menos nessa época que a comunidade biológica come-çou a perceber que tinha um gênio não-apreciado em Barbara McCIin-tock. Essa avaliação atingiu sua con-clusão apropriada no início de ou-tubro quando McCIintock, com 81 anos, recebeu o Prêmio Nobel de Medicina de 1983 por seu trabalho sobre "genes saltadores" que reali-zou mais de trinta anos antes. (Edelson, 1983, 31).

A abordagem através da personali-dade, adorada pelas revistas not ic io -sas, dá ao redator mais l iberdade para aberturas in fo rmais e prazeirosas. A q u i está Tracy K idder para Science 83 entrev is tando u m dos mais desta-cados cientistas da Harvard Univer-s i t y :

Mike McEIroy gosta das grandes questões. A origem da vida, por exemplo. Tem lidado com ela du-rante os últimos dez anos. McEIroy ocupa uma das prestigiosas cadei-

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ras de química da Harvard e desfru-ta da invejável liberdade — o dinhei-ro de pesquisa, os aprendizes, a au-tonomia para satisfazer os seus gos-tos ecléticos. Ouvi-lo divagar sobre as origens da vida é uma maneira maravilhosa de passar uma tarde tranqüila em pleno inverno da Nova Inglaterra.

Cerca de três bilhões de anos atrás, um pouco repentinamente, e, concordam muitos cientistas, por causa do florescimento da vida, o oxigênio apareceu na atmosfera da terra (1983, 59).

Uma abertura que mis tura vários elementos, c o m o o faz esta, p romete aos leitores que você irá d iscut i r cada aspecto da histór ia. É u m inst rumen-t o para conquistar os leitores e a t ra í -los através da histór ia até que você tenha cober to cada i tem. ( U m dos lapsos de redatores e editores e não apenas na redação c ien t í f i ca — é omi -t i r u m ou mais elementos quando vo-cê escreve; esse emp i lhamen to de ele-mentos é uma f o r m a de organizar a sua histór ia. Mas você precisa entre-gar cada u m deles ao seu le i tor . )

Em outras variações, você pode concentrar-se n u m g rupo de cientis-tas, tais c o m o uma equipe de c i rur -giões de transplantes de coração o u na equipe comple ta de u m labora tó r io ou empresa e na f o r m a c o m o estes combinaram ta lentos e personal ida-des para to rnar a ins t i tu ição única. Desenvolver uma análise e descrição das interações dos ta lentos c i e n t í f i -cos e das personalidades da equipe pode mostrar c o m o a ciência f u n c i o -na. No per íodo da grande ciência, o cientista sol i tár io é uma rar idade. Mas isso é uma ou t ra h istór ia.

Ou t ra abordagem para humanizar a ciência é personalizar suas reações, embora isto traga alguns riscos se vo-cê fo r sensível a cr í t icas. A d i f i cu lda-de em escrever u m re la tór io persona-l izado sobre uma visita a u m labora-t ó r i o pode tentar os imaturos a zom-barem da ocasião. Por o u t r o lado, u m relato acurado, escr i to de maneira sensível, inte l igente e séria, poder ia ser ef icaz. Mais f o r t e seria seu relato pessoal da observação ou part ic ipa-ção numa exper iência ou expedição de campo. Lembre-se do d i tado do redator : mostre (descreva), não con-te. Seja especí f ico, concre to c o m seus detalhes. Evi te o abstrato a não ser que você o siga de per to c o m u m exemp lo que i lustre a abstração.

Escrever numa crise

O que f o i d i t o acima impl ica u m a abordagem prazeirosa, bem pen-sada, à redação c ien t í f i ca . Isso é en-ganoso porque mesmo sob as mais le-ves pressões de prazo, o jo rna l i smo precisa c o m p o r uma histór ia n u m r i t -m o mais ráp ido do que o do estudio-so. Uma das cont r ibu ições que u m re-dator de ciência t raz ao jo rna l i smo é alguma p ro fund idade de conhecimen-t o prévio sobre o m u n d o natural e c o m o encontrar as pessoas que po-dem ampl iar o conhec imen to do re-dator de ciência. Nunca esse conhe-c imen to é testado mais f o r t e m e n t e c o m o quando você precisa escrever em meio a uma crise de novas n o t í -cias. Ap renda a pensar a t ivamente pa-ra escrever a t ivamente, na antecipa-ção desse dia. U m programa bastante

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abrangente de leitura talvez seja a única maneira de se preparar.

Embora poucos jornalistas o admi-tam, há mu i to poucos " fu ros noticio-sos" nos jornais e revistas ou trans-missões de rádio e televisão. A maio-ria dos eventos relatados diariamente pode ser antecipada, ao menos em linhas gerais. " F u r o no t ic ioso" signi-f ica o inesperado. U m exemplo seria a tentat iva de assassinato de um che-fe de estado e a necessidade de reda-tores de ciência o u medicina para es-crever sobre seus fer imentos, a serie-dade e o curso do t ra tamento de emergência. Outros exemplos in-cluem a ameaça de haver uma fusão no núcleo de um reator de energia nuclear, como a que aconteceu na usina nuclear de Three Mile Island, a 28 de março de 1979, uma erupção vulcânica, ou o aparecimento de uma nova doença, tal como a A I D S ou a doença dos legionários. U m desastre tal como uma maciça fal ta de ener-gia, um ter remoto, tsunami, ou algo semelhante proporc ionam outros exemplos. Rot inei ro como possa pa-recer cada vôo espacial é para o jor-nalista uma crise em andamento pronta para acontecer. O fogo na cápsula espacial que matou três astro-nautas no programa Apo l l o dos E U A e uma explosão durante uma missão lunar i lustram com que velocidade a rot ina pode se deteriorar. Sugestões de crises similares nos programas nu-clear e espacial russos escapam de tempos em tempos.

Essas situações pedem que o reda-tor de ciência tenha velocidade e ca-pacidade de improvisar. Dependendo

da natureza das not íc ias, do número de mortos e da extensão de danos à propriedade, o própr io evento prova-velmente superará a ciência como his-tór ia pr incipal. 0 redator c ien t í f i co , entretanto, será chamado para tornar os eventos inteligíveis aos leigos e sob as mais fortes pressões de prazo, com toda a probabi l idade. Com efei to, de u m ponto de vista jornal ís t ico, os editores podem olhar para tal mo-mento como just i f icat iva para ter um redator de ciência na equipe. 0 reda-to r é um banco de informação histó-rica instantânea sobre os eventos e sobre fontes de informação.

Espera-se que você lance mão do seu conhecimento, de pesquisa de bi-bl ioteca ou de computador , que pos-sa ser realizada num curto espaço de tempo e de quaisquer especialis-tas que possam oferecer informação adicional. Poucas ocasiões geram a busca de informação em uma área es-pecíf ica ou a compet ição acirrada en-t re os meios de comunicação, como uma crise. Mesmo o anúncio de um evento singular, tal c o m o o pr imeiro transplante de coração ou ou t ro ór-gão impor tante, pode trazer uma atmosfera de crise. Quando o dentis-ta Barney Clark recebeu o pr imeiro coração mecânico, centenas de jorna-listas de todo o mundo , com conheci-mento médico variando do leigo ao profissional, inundaram o hospital com pedidos de informação, pessoal-mente ou por telefone.

É pouco dizer que tais eventos oferecem as piores condições para a coleta de informações. Freqüente-mente a informação não existe. No

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caso do acidente nuclear de Three Mile Island, os especialistas em ener-gia nuclear fo ram incapazes de esta-belecer imediatamente a causa ou a extensão do acidente. Descobrir a causa da doença dos legionários, as-sim chamada porque emergiu após uma convenção da Amer ican Legion em Filadélf ia, levou meses de pesqui-sas de laboratór io e de campo.

Embora os especialistas de infor-mação e de relações públicas possam entrar em cena, seus acessos a fontes competentes podem ser l imitados. Nenhum plano realmente aplicável de relações públicas ou informação pública pode ser escrito adiantada-mente para cobr ir todas as cont in-gências. Mesmo quando existe um plano b ru to , com mui ta freqüência os administradores públicos e priva-dos perdem a paciência ou mudam suas prioridades a respeito da discus-são plena e aberta dos eventos. As suas próprias fontes de informação podem se demonstrar inadequadas ou incompletas. A competição cresce fe-roz entre os representantes dos veí-culos de comunicação por qualquer isca de informação. Os rumores pre-encherão o vácuo, e o jornalista cien-t í f i c o — não menos que qualquer ou-t ro — enfrenta a possibilidade de ir para o ar ou de ter que redigir com informação não-verificada.

Durante uma crise você está por sua própr ia conta para improvisar o mais que puder. Os cientistas seniores oferecem boas fontes durante crises, part icularmente se você l idou antes com eles ou seus colegas. Em situa-ções normais, você poderá seguir tr i -

lhas convencionais, burocráticas, de comunicação. U m estudo das prefe-rências dos cientistas quanto à co-municação diz que eles preferem fa-lar diretamente a jornalistas. Os cien-tistas mais jovens irão recorrer a u m escritório de informação pública com mais freqüência do que os mais anti-gos, a maioria dos quais entra em contato com os veículos diretamente. Apenas um pouco mais da metade dos cientistas contratados disse que era impor tante para os cientistas tor-nar seu conhecimento disponível ao públ ico, de modo que as relações cor-diais no passado pudessem ser mais importantes para o redator numa cri* se do que o senso de responsabilidade dos cientistas. Os jornalistas iniciam a maior parte dos contatos, e apenas cerca de 15% dos cientistas abol ir ia os escritórios de relações públicas na universidade sob estudo. Enquanto uma grande percentagem (66%) dos cientistas achava que o escri tór io de informações públicas às vezes atrapa-lhava a comunicação, 72% disseram que os membros da equipe de rela-ções públicas tornavam o relaciona-mento com os veículos mais fáci l (Dunwoody e Ryan, 1983).

Em resposta ao problema de obter informação numa crise, u m redator que cobre a área de exploração espa-cial tentou manter tanta independên-cia quanto possível para si mesmo construindo uma bibl ioteca por tát i l de referência, sobre rodas. Levava a sua bibl ioteca técnica a cada lança mento, reservando um assento de avião para o carrinho. Na maioria das instâncias, entretanto, o redator de

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ciência deve improvisar , cons t ru indo sua histór ia a par t i r de leituras feitas no passado, experiências e quaisquer fontes qual i f icadas que possam ser al-cançadas.

Essas são as ocasiões em que as fés da ciência e do jo rna l ismo co l idem, f reqüentemente para d e t r i m e n t o de ambos em termos de respeito públ i -co. A solução na Rússia e alguns ou-t ros países autor i tá r ios é simplesmen-te não not ic iar desastres até depois de re la tór io e investigações plenos es-ta rem comple tos . A lgumas vezes de-sastres impor tan tes nunca são relata-dos em púb l ico . A lguns cientistas e f iguras po l í t i cas gostar iam de uma circunspecção simi lar apl icada no Ocidente . Essa é, en t re tan to , uma ex-pectat iva f ú t i l d iante de meios de co-municação destinados a serem fontes de in fo rmação independentes do go-verno ou outras fon tes estabeleci-das. Os jornal istas de ciência devem ser tão persistentes c o m o quaisquer ou t ros em defender seu acesso á in-fo rmação.

Os jornal istas de ciência t a m b é m encaram pressões de anunciantes. Em uma d isputa o Journal of the Ameri-can Medicai Association perdeu 2 5 0 mi l dólares em anúncios quando u m fabr icante de drogas co locou obje-ções a uma matér ia sobre u m produ-t o dos compet idores. Uma das edi to-ras d o JAMA disse ao redator médico H o w a r d Wol insky que f o r a demi t i da no debate sobre os art igos que a re-vista i m p r i m i a a respeito de p rodu tos compet idores e sua apresentação fa-

vorável ou desfavorável (F i tzgera ld, 1984) . As organizações de ve ícu los de comunicação var iam grandemente em sua disposição e recursos para re-sist irem a tais pressões.

Experiências

1. Leia artigos numa edição de uma revis-ta de ciência popular ou matérias de ciên-cia num jornal. Analise os instrumentos li-terários usados pelos redatores.

2. Leia inteiramente vários artigos em re-vistas como Science, New Scientist, Nature ou outros periódicos científicos ou médi-cos. Você pode encontrar exemplos em que os cientistas usam esses recursos lite-rários?

3. Percorra várias edições da revista Science ou outros periódicos científicos. Na seção "Reports" de Science você en-contrará cientistas relatando resultados de seu trabalho. Escreva várias combinações de aberturas e "parágrafos de significãn-cia" a partir de sua leitura. Traga os seus parágrafos de abertura e significado e uma cópia do artigo original para discussão em classe.

4. Leia vários artigos científicos ou médi-cos para descobrir um ao redor do qual vo-cê possa desenvolver uma abertura de "ambientação de cenário". Os Periódicos médicos são especialmente bons para isso porque os médicos freqüentemente usam o método de estudo de casos para relatar seus resultados.

5. No que você leu até agora, deve ter en-contrado um artigo que gostaria de trans-formar em matéria de ciência ou medicina popularizada. Escreva a matéria para seu jornal diário local.

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Capítulo 7

A redação científica e o interesse público

VÁRIAS ÁREAS DA REDAÇÃO CIEN-TIFICA apresentam aos jornal istas problemas especiais de repor tagem. Essas áreas inc luem p o l í t i c a e normas públ icas, no t i c iá r io econômico , rela-ções públ icas e assuntos t ransc ien t í -f icos tais c o m o agr icu l tura , meio am-biente, energia, nu t r i ção , segurança nacional , depós i to de l i xo t ó x i c o , saúde e medic ina. Embora as fon tes c ien t í f i cas e a in fo rmação desempe-nhem papéis c r í t i cos nas histór ias so-bre esses temas, o redator deve ir a lém da ciência para dar ao púb l i co uma repor tagem adequada.

As histórias sobre tais tóp icos con-têm elementos carregados de valores not ic iosos: c o n f l i t o , sobrevivência, d inhe i ro , poder , impac to e persona-l idade. Esses afe tam e são afetados pela comun idade c ien t í f i ca , assim co-m o todas as out ras comunidades o u interesses especiais. Os l íderes e agên-cias governamentais desempenham papéis at ivos nas interações desses grupos, c o m o mediadores, apoiado-res, alvos e protetores do " interesse p ú b l i c o " . Os dados c ien t í f i cos e tec-nológicos, quando convém,são organi-zados para a d isputa entre os par t ic i -pantes do jogo. Cientistas e engenhei-ros eminentes e não tão eminentes vão à arena públ ica para oferecer suas interpretações dos dados e est imular

ações públ icas " rac iona i s " favorecen-do u m lado ou o u t r o . Por não esta-rem os cientistas e engenheiros fazen-do re latór ios para os seus colegas, suas revelações e interpretações fo -ram consideradas menos que comple-tas em mui tas ocasiões. N e n h u m dos cientistas ou seus empregadores atra iu censura da comunidade c ien t í -f ica por tais at ividades de p o l í t i c a pú-blica.

En t re tan to , a confusão gerada f o i grande ent re jornal istas, func ionár ios públ icos e o púb l i co em geral. Os au-tores das po l í t i cas e os jornal istas não sabem em quem acreditar c o m tan tos tes temunhos conf l i tantes. T ã o grande f o i a confusão que cerca de v in te anos atrás o Dr . A r t h u r K a n t r o w i t z , presidente da Avco-Everet t Research Labora to ry , Inc., propôs a criação de uma " c o r t e da c iênc ia " na qual pai-néis compostos de ju izes especializa-dos e m i t i r i a m uma decisão sobre a validade dos argumentos técnicos. As t radições judic ia is pe rm i tem ás cor-tes, c o m ou sem júr is , de te rminarem t a n t o a lei c o m o os fatos.

A idéia de uma cor te de teste em 1978 quando o governador R u d y Perpich env iou 150 soldados do esta-do para cont ro la r os habi tantes de, Minnesota pro testando cont ra a cons-tante exposição á radiação eletromag-

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nética possivelmente perigosa, prove-niente de uma linha de transmissão de eletricidade de 400 qui lovol ts. O governador Perpich estava disposto, e a Ford Foundat ion e a National Science Foundat ion do governo dos E U A concordaram, a pagar os custos da experiência. Entretanto, nem os defensores do meio ambiente nem as duas cooperativas de energia, que ha-viam vencido nas cortes regulares, pu-deram concordar sobre essa fo rma de arbitragem.

Muitas disputas como essas vão agora ao sistema judicial regular para resolução, e vários juizes duvidam da habil idade das cortes em chegarem a um acordo justo. Para alguns parece que a tecnologia ultrapassou a habili-dade da sociedade de compreender e contro lar os temas levantados por ela. U m exemplo disso é o status le-gal dos embriões humanos congela-dos. São esses agrupamentos de célu-las seres humanos? A té que ponto os cientistas podem fazer experiências com eles ao longo de seus estágios de crescimento? Podem herdar proprie-dades de um ou de ambos os pais se estes morrerem antes que tais em-briões sejam transplantados para uma mãe e levados ao nascimento? Essa situação ocorreu quando u m casal ri-co faleceu, deixando u m par de em-briões em uma cl ín ica australiana de pesquisa sobre fer t i l idade, em 1984. Quem possui os embriões? Alguém herda os embriões juntamente com outras propriedades? Quais são as res-ponsabilidades dos herdeiros para com esses pedaços de matéria viva?

Out ro exemplo: O pr imeiro cida-dão sueco a receber u m coração arti-f icial tornou-se legalmente m o r t o quando seu própr io coração morreu, pela definição estabelecida por seu país.

Como Daniel S. Greenberg, u m dos poucos jornalistas especializados em ciência e po l í t i ca pública obser-vou, a idéia de uma corte de ciência não era nem tão boa nem tão má. Sua maior falha era a suposição de que os fatos c ient í f icos e técnicos po-dem ser isolados de sua ambientação social, po l í t ica e econômica. " C o m o se revela, na maior parte das contro-vérsias c ient í f ico-pol í t icas, os fatos c ient í f icos estão menos em questão do que os valores ligados a eles", dis-se Greenberg (1978).

A reportagem sobre temas pol í t i -cos, normas públicas, meio ambien-te, economia e negócios, bem como sobre sociedade, leva o redator de ciência a se prender mais a aspectos das realidades dos afazeres mundanos do que à " real idade" da ciência. É u m mundo de poder po l í t i co e eco-nômico, que historicamente perma-nece vulnerável à manipulação para fins privados e individuais. Esses f ins incluem o ganho assim como o evitar danos econômicos ou danos a reputa-ções pessoais. É o mundo no qual o estudo c ient í f i co pode ser solicitado a produzir respostas nas quais o go-verno e a pol í t ica social podem se ba-sear. É um mundo no qual as respos-tas podem ser exigidas antes que a ciência desenvolva dados suficientes para orientação pol í t ica.

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Política e normas públicas

Os redatores de ciência que lidam com assuntos públicos devem perma-necer conscientes da pol í t ica que afe-ta a ciência básica e ciência aplicada, bem como das peças-chave desse jo-go. A pol í t ica envolve ordenar o re-lacionamento entre indivíduos e en-tre instituições numa sociedade. É também a arte do compromisso. A pol í t ica é a arte de usar poder, pes-soal e institucional. Por causa dos va-lores ligados a temas envolvendo po-der governamental, os assuntos ten-dem para o compromisso ou para os trade-offs como os engenheiros a cha-mam. Todo mundo obtém algo; nin-guém consegue tudo o que pede. . . normalmente. Os trade-offs podem ser feitos com base em fatores outros que não os fatos cient í f icos ou sua validade. Emoção, trabalhos, votos, dinheiro, amizades e valores institu-cionais são algumas das bases para a resolução de confl i tos pol í t icos. O envolvimento primário entre a ciên-cia e os cientistas e o governo vem através do dinheiro e conceitos dife-rentes sobre o bem-estar geral.

O R Ç A M E N T O E F I N A N Ç A S . O di-nheiro dos impostos federais, coleta-do de todos nós, alimenta a ciência nos países mais industrializados. Não fo i sempre desse modo. Antes da dé-cada de quarenta e da Segunda Guer-ra Mundial, a ciência pura era um em-preendimento pequeno, pago quase inteiramente por orçamentos univer-sitários, fundações privadas ou doa-ções de indivíduos. Apenas a ciência

agrícola, como parte do compromis-so assumido pelo Department of Agricul ture de aplicar verbas em uni-versidades rurais e de melhorar o tra-balho agrícola nos Estados Unidos, recebeu financiamentos constantes e substanciais do governo. Apenas a in-dústria química, liderada pela DuPont, mantinha programas subs-tanciais de pesquisa. A indústria da aviação financiava seus próprios mo-delos novos, com algum encoraja-mento do War Department (como era chamado então). A Primeira Guerra Mundial demonstrou a praticabilida-de da ciência química e de aviação. A Segunda Guerra Mundial demonstrou que mesmo ciências mais exóticas po-diam ser impelidas, com grandes quantias de dinheiro de impostos, a descobertas práticas: energia nuclear, eletrônica, medicina, óptica, foguetes de propulsão a jato e outras. O com-bate, o ú l t imo dos temas de sobrevi-vência, sempre fo i uma incubadora para a ciência e tecnologia novas. O sucesso com inovações em tempos de guerra levou a maioria dos países a adotar subsídios financeiros do go-verno para a ciência e tecnologia em época de paz.

Os orçamentos e gastos do gover-no são temas pegajosos para se escre-ver a respeito. Em 1984, o Battelle Memorial Institute, em seu relatório anual, estimou que 94,2 bilhões de dólares seriam gastos nos Estados Unidos com pesquisa e desenvolvi-mento. Mais de metade disso, 48,8 bilhões de dólares viriam da indús-tr ia, uma mudança em relação aos primeiros dias pós-Segunda Guerra

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Mundial , quando o dinheiro do go-verno sufocava a contr ibuição da in-dústria privada. Os gastos do orça-mento de pesquisa e desenvolvimento do governo dos E U A fo ram calcula-dos em 42,7 bilhões de dólares. As estimativas de orçamento colocaram a contr ibuição federal, em 1984, em 46,7 bilhões de dólares, que inclu íam dinheiro a ser compromet ido com projetos, mas não realmente gasto.

Os redatores de ciência devem ser cuidadosos ao analisar financiamen-tos. Os anos orçamentários federais começam em outubro . Os orçamen-tos geralmente recebem menos fun-dos que os administradores das agên-cias requerem. E há dois orçamentos federais e estaduais: um envolve di-nheiro designado ou autor izado para pesquisa e desenvolvimento; o ou t ro orçamento lida com dinheiro efetiva-mente apropriado para ser gasto em qualquer ano dado. Como grandes projetos de tecnologia aplicada levam vários anos a serem construídos, co-mo no caso de uma nova aeronave, o dinheiro pode ser compromet ido ou autor izado para projetos mais apro-priados e gasto durante vários anos. Misturar os números autorizados e os apropriados numa matéria pode con-fund i r os redatores e os leitores. Es-colha um ou ou t ro con jun to — ou use tabelas mu i to claras para mostrar as diferenças.

Os redatores de ciência devem per-manecer sensíveis às mudanças nas alocações de d inheiro de pesquisa e desenvolvimento. No ano fiscal de 1984, o orçamento of ic ial de pesqui-sa e desenvolvimento de 46,7 bilhões

de dólares fo i d iv id ido desse modo: pesquisa básica — 7,2 bilhões, pesqui-sa de defesa — 28,1 bilhões, outras agências — 11,4 bilhões. Dos 7,2 bi-lhões e pouco para pesquisa básica, cerca de metade vai para escolas e universidades, com aproximadamen-te dez escolas obtendo a maior parte do dinheiro. O Of f ice of Science and Technology Policy (OSTP) estimou que os gastos com pesquisas foram mais ou menos divididos por igual en-tre agências que apoiavam as ciências da vida (3,3 bilhões) e as ciências f ísi-cas e engenharia. Entretanto, a mar-gem financeira das ciências físicas e engenharia era aproximadamente de 600 milhões - 3,9 bilhões. Esses fun-dos são gastos através dos vários de-partamentos e agências. Existe um es-cr i tór io central para monitorá-los no Off ice of Science and Technology Policy presidencial. Existe uma con-traparte no Of f ice of Technology Assessment do Congresso. Apesar das afirmativas oficiais de racionali-dade, a distr ibuição desse dinheiro é objeto de muita po l í t i ca .

Os contatos em cada escritório fornecem ao redator postos-de-escuta para a maior parte dos temas que sur-gem no governo. Outras fontes in-cluem a equipe e os membros eleitos dos vários comitês e subcomitês da Câmara e do Senado que têm a res-ponsabilidade pela autorização orça-mentária, sua apropriação e supervi-são para cada agência.

Mesmo se você não estiver em Washington, entre nas listas de cor-reio para receber relatórios e as trans-crições de audiências desses escritó-

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rios e comitês. Eles podem lhe forne-cer informação histórica sobre o te-ma bem como fontes de informação para projetos específicos. Se a bibl io-teca da sua faculdade ou universidade local é u m deposi tór io of icial para documentos do governo, esses docu-mentos estarão disponíveis lá. Obtê-los dos comitês e agências geralmente é mais rápido. A National Science Foundat ion e os National Institutes of Health custeiam a maior parte da pesquisa de ciência e medicina básica. A alocação de fundos entre as várias agências e mesmo dentro delas é mui-to uma função de lobby po l í t i co .

Os principais jogadores na po l í t ica da ciência e suas alocações de fundos são as várias fundações não-lucrativas de "doenças" . Elas proporc ionam muitas das testemunhas que argu-mentam pelo aumento ou mudança de apropriações a cada ano. Os mui-tos National Institutes of Health são produto de lobbies desses grupos de interesse especial em medicina e saú-de pelas suas doenças favoritas. Os re-datores devem olhar também para a influência pol í t ica de legisladores po-derosos a favor de facilidades em seus distr i tos. Os administradores de uni-versidades e cientistas proeminentes serão encontrados fazendo lobby a favor de seus representantes com tan-ta intensidade quanto qualquer o u t r o interesse especial.

AGÊNCIAS R E G U L A M E N T A D O -RAS. As agências regulamentadoras federais e estaduais freqüentemente oferecem aos redatores de ciência ou-tras visões da pol í t ica e pol í t icas da

ciência, medicina e alta tecnologia. A lém de proporcionarem notícias através das leis que apoiam ou dei-xam de apoiar, fornecem coletas de dados que apoiam a regulamentação assim como alguma pesquisa que acrescenta conhecimento ao celeiro da ciência. A Eovironmental Protec-t i on Agency é uma agência regula-mentadora t íp ica com pesada ativida-de de pesquisa em adi tamento às res-ponsabilidades de regulamentação e seu cumpr imento . Às vezes a regula-mentação está ligada a responsabili-dades promocionais, como no De-partment of Agr icul ture. Isso leva a um conf l i to de interesses em muitos casos, uma vez que tais agências ge-ralmente se tornam cativas da cliente-la que também regulam. A antiga A t o m i c Energy Commission fo i des-feita com base nisso, com a pesquisa para o desenvolvimento de mecanis-mos movidos a energia atômica entre-gue ao Department of Energy, e a se-gurança de operação e funções de su-pervisão passadas para a Nuclear Re-gulatory Commission. A alta adminis-tração da Environmental Protect ion Agency passou por uma reorganiza-ção completa em 1984 depois que se revelou que as pol í t icas da agência fa-voreciam as companhias que a EPA devia regulamentar. Os jornalistas aprenderam a desconfiar de compro-missos com agências regulamentado-ras durante mudanças na administra-ção. Novos designados pol í t icos po-dem ou não experimentar o sucesso na mudança da direção dos progra-mas de pesquisas da agência que de-f inem a necessidade ou a extensão da

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regulamentação. A natureza técnica dos dados que apoiam a regulamen-tação presta-se às habilidades do re-dator de ciência.

Com freqüência a regulamentação está com departamentos de gabine-tes, tais como o U.S. Department o f Agr icu l ture, por causa das influências pol í t icas dos interesses especiais que regulamenta. O USDA apóia toda uma faixa de projetos de pesquisa por seus próprios cientistas e labora-tór ios e cientistas em universidades e faculdades voltados ao uso da ter-ra. O objet ivo do USDA é tornar a agricultura mais lucrativa, o que o torna um regulamentador amigável.

0 relacionamento de uma agência com a indústria que apóia e regula-menta f reqüentemente põe sob sus-peita algumas das descobertas das pesquisas e coloca agências em con-f l i to . Por exemplo, quando a conta-minação por ethylene dibromide (EDB) fo i descoberta em alimentos a base de grãos, em 1984, os redatores de ciência encontraram o EPA ten-tando escrever leis mais estritas para o uso de pesticidas — e seu eventual abandono — enquanto o USDA tra-balhava para manter o veneno carci-nogênico em uso para que os planta-dores de cí t r icos controlassem inse-tos (Sun, 1984). Entretanto, o f i m do uso de EDB acenou com uma oportu-nidade para a indústria nuclear por-que a irradiação dos grãos e f ru tos para matar insetos e suas larvas emer-gia como um contendor fo r te para subst i tuir os pesticidas químicos. A indústria nuclear iria lucrar com as vendas mui to aumentadas de equipa-

mento para processar os produtos agrícolas. Entretanto, como é t í p i co ocorrer em casos como esse, havia pouco, se é que havia algum, questio-namento sobre a conveniência de se es-palhar fontes de radiação nuclear em tudo o que parecesse ser um terminal de armazenamento de grãos nos Esta-dos Unidos, Canadá e México. Essas são questões que os redatores de ciência e especialmente aqueles da re-portagem ambiental devem levantar. Procure por soluções que levantam novos problemas.

Tais conf l i tos interagências estão longe de serem raros. Eles const i tuem ou t ro aspecto da po l í t ica cient í f ica. Os redatores de ciência irão procurar em vão por uma po l í t ica central e ra-cionalizada para a ciência do país. Há pol í t icas dentro de cada agência quanto à natureza e custeio das pes-quisas que servirão à "missão" de ca-da agência. Assim, as tendências de agências ou inst i tutos podem levar a conf l i to . A agricultura, por exemplo, pode custear pesquisa sobre como au-mentar o rendimento dos campos de tabaco enquanto o Department of Health and Human Services tenta de-sencorajar o uso de tabaco, apoiando pesquisas sobre seus efeitos deletérios.

Mesmo tendo exist ido para cada presidente, desde John F. Kennedy, um conselheiro of ic ial para a área de ciência, a plural idade de interesses trabalhando através do congresso e da Casa Branca às vezes produz pol í-ticas confl i tantes. Por exemplo, nu-ma certa altura a administração Rea-gan estava advogando a redução dos custos com cuidados médicos e a

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intromissão do governo nos assuntos privados. Então, em conf l i to com sua postura anter ior , a administração en-t rou na assim chamada controvérsia "Baby Doe" para forçar uma opera-ção de salvamento da vida de uma criança retardada, com espinha bífida (uma condição em que a coluna espi-nhal não se fecha, deixando a medula espinhal exposta) e outros defeitos de nascimento. Os pais e seu médico haviam concordado em deixar a cri-ança morrer em lugar de mantê-la confinada por toda a vida aos cuida-dos insti tucionais, pagos por fundos federais de cuidados médicos e bem-estar.

O uso dessa pol í t ica data da época do dólar federal. As instituições e in-div íduos recebendo dinheiro federal concordam em obedecer às diretrizes da agência f inanciadora ou se arris-cam a ter o apoio ret irado. No caso "Baby Doe", qualquer hospital ou médico recusando al imento ou trata-mento seria considerado como vio-lando os direi tos civis da criança e desperdiçando o apoio federal. É uma tática disponível para o governo em quase qualquer controvérsia.

As agências regulamentadoras são as mais negligenciadas das organiza-çfies do governo em termos dos veí-culos de comunicação de massa. Mo-vem-se lentamente, num processo quase judicial . Seu trabalho é com freqüência altamente técnico e suas regulamentações escritas em prosa le-gal quase espessa demais para ser de-cifrada. Uma agência geralmente fa-vorece aquelas que regulamenta. Obter uma história com freqüência

significa compreender decisões que dependem de mudanças pequenas mas significativas no nível dos riscos estatísticos permit idos.

0 medo dos jornalistas aos núme-ros com freqüência entorpece sua efi-ciência na reportagem de ações regu-lamentadoras. Por exemplo, na con-trovérsia do EDB, que produziu man-chetes de pr imeira página durante se-manas por causa das questões de so-brevivência com relação a alimentos contaminados, apenas Wi l l iam Hines do Chicago Sun-Times produziu in-formações úteis para os leitores, num estado de cu l t ivo de cí t r icos quando as regulamentações finais fo ram emi-tidas. Seis jornais diários estudaram as notícias publicadas sobre o EDB ser pro ib ido depois de nove meses, mas apenas a história de Hines deu aos consumidores e plantadores uma leitura sobre a quantidade de EDB permit ida a permanecer nos f ru tos até que o seu banimento entrasse em vigor (1984).

Outra consideração na reportagem de temas de po l í t ica pública é que os Estados Unidos operam em dois ní-veis governamentais: federal e esta-dual. Freqüentemente eles estão em conf l i to . 0 Estado de Mississipi, por exemplo, uma vez t o m o u conta de uma fábrica de pesticida abandonada para produzir um formic ida de longa duração que a EPA dissera devia ser banido. Geralmente a lei federal se sobrepõe à lei do estado em conf l i to , mas até que as regras estaduais sejam examinadas na Corte, ambas podem permanecer em vigor. Onde não há conf l i to , cs sistemas operam em para-

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leio, com as disputas, especialmente sobre assuntos de meio ambiente, in-do para a corte em um ou ou t ro caso — ou ambos. Quando acordos coope-rativos para a implementação de re-gras são elaborados entre agências fe-derais e estaduais, a agência estadual aplicará ambos os conjuntos de regu-lamentos.

A o mesmo tempo, essas agências são fontes de matérias, muitas publ i-cadas pelas agências para seu própr io benef íc io. Relatórios e estudos con-duzidos por cientistas da agência, contratados fora ou por painéis de re-visão, geralmente necessitam atualiza-ção e verificação cuidadosa em com-paração a outras fontes de informa-ção. De uma maneira geral, é uma boa pol í t ica que os jornalistas cient í -f icos perguntem " q u e m lucra?" ao examinar as conclusões de tais estu-dos. Em muitos casos as agências pe-dirão á National Academy of Sci-ences para agir como uma "cor te de c iênc ia" nos estudos de problemas onde a evidência c ient í f ica não é cla-ra, os problemas pol í t icos mui to sen-síveis e os temas econômicos conf l i -tantes. Esse fo i o caso quando a Na-t ional Academy of Sciences estudou dados sobre a questão da chuva ácida e conclu iu que havia com efeito uma conexão entre a queima de carvão no centro-oeste industrial e a acidez nos lagos do nordeste e do Canadá. Esse relatór io estava em con f l i t o com as argumentações da administração Rea-gan que defendia a necessidade de se realizar mais pesquisa antes que tal relação pudesse ser fei ta (Pasztor, 1983).

A negligência geral para com as agências regulamentadoras por parte dos outros jornalistas permite ao re-pórter de ciência talhar aqui uma po-sição profissional. Howard Simons, antigo redator de ciência e mais tarde edi tor administrat ivo do The Wash-ington Post, disse que uma das suas técnicas para obter histórias exclusi-vas era ir a essas agências que poucos repórteres tocavam e cavar até desco-brir uma história baseada em ciência que pudesse vender a seus editores. 0 poder das agências regulamentadoras e os interesses econômicos que afe-tam apoiam um campo quase ocu l to de jornalistas. Esses são os redatores de ciência e negócios para os periódi-cos industriais e profissionais e para boletins noticiosos especializados cu-jos subscritores esperam uma cober-tura acurada e técnica da interação entre ciência, tecnologia e pol í t ica afetando os negócios dos subscritores.

Para os jornalistas cobr indo essas agências, a compreensão da mescla de ciência, tecnologia e interesses econô-micos e legislação governadora da agência é essencial. Todos os elemen-tos devem estar presentes numa ma-téria. Parte desse trabalho é fei ta com mais facil idade para o jornalista des-de que os dados de impacto econômi-co se tornaram uma parte exigida de muitas proposições regulamentado-ras. Os cálculos de impacto econômi-co são vulneráveis às tendências da agência, de modo que o redator de ciência deve ser cético a tais predi-ções. As especialidades científ icas, tais como reportagem ambiental e de energia, cobr i ram várias agências fe-

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derais e suas contrapartes (em regula-mentação aquática, aérea e terrestre) no nível estadual e às vezes municipal ou de distr i to. Os congressistas locais e legisladores estaduais, em algumas instâncias, podem extrair informa-ções dessas agências. Pode ser neces-sário usar as leis de Freedom of In-format ion and Open Records esta-duais e federais para obter registros de decisões, dados de pesquisa e ou-tras informações.

Ciências, negócios e economia

Os redatores de ciência que escre-vem para leitores do mundo dos ne-gócios devem se preocupar com a in-teração da ciência e tecnologia com dinheiro, poder, empregos e outros fatores sócio-econômicos. Se o foco da publicação ou programa está sobre a comunidade de negócios, os fatores econômicos provavelmente dominam a ciência na abordagem do redator a qualquer matéria. No The Wall Street Journal, Forbes e Business Week, por exemplo, um redator deve procurar um ângulo econômico que just i f ique a impressão da sua história. As exce-ções são feitas, geralmente, apenas se você puder demonstrar um efeito, tal como de saúde ou financeiro, sobre a vida pessoal do público. Exemplos de algumas das mais minuciosas matérias ciência-tecnologia-negócios aparecem numa revista inglesa, The Economist. Sua perspectiva ligeiramente diferen-te quanto ao mundo assim como o seu valor em mostrar como integrar o passado econômico com o jornalismo cient í f ico fazem com que valha a pe-na lê-lo.

Várias razões tornam a reporta-gem de ciência e tecnologia um com-ponente fundamental de muitas co-berturas noticiosas do campo dos ne-gócios. (1) As organizações comer-ciais produzem e consomem a maior parte da nova tecnologia mundial e proporcionam empregos nessa área. (2) a ciência aplicada que cria e re-solve problemas sociais provavelmen-te virá dos grupos comerciais. (3) À medida que as organizações comer-ciais f icam maiores, podem suplantar o poder dos governos em influência nacional e internacional. (4) Para o leitor geral e da área de comércio a compreensão de aplicações comer-ciais da ciência e da tecnologia ajuda-rá a entender as tendências sociais, polít icas e econômicas. (5) Há um cruzamento e fusão crescentes das comunidades econômicas e cient í f i -cas como resultado do uso da ciência e tecnologia pelo comércio.

Alguns dos melhores e piores as-pectos da ciência e tecnologia apare-cem na reportagem comercial. Certa-mente é bom para redatores de ciên-cia e tecnologia escreverem sobre os benefícios econômicos inerentes a novas aplicações de conhecimentos. Por exemplo, considere a promessa da ciência-arte, da engenharia genéti-ca e a criação seletiva de organismos. Essa aplicação potencial da ciência produziu para Steven J. Marcus do The New York Times uma importan-te matéria de seção de comércio so-bre a possibilidade de criar micróbios para limparem tipos específicos de resíduos agrícolas, um problema am-biental de d i f í c i l solução, e excretar

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subprodu tos q u í m i c o s úteis (1984) . Com mu i ta f reqüência, en t re tan to , a matér ia c iência-comércio tende a cen-trar-se un icamente nos benef íc ios po-tenciais em te rmos de empregos e lu-cros. Da mesma f o r m a , as histórias de ixam de exp lorar as possibil idades negativas, especialmente aqueles efei-tos que uma nova tecnologia pode p roduz i r quando apl icada amplamen-te. A profusão de art igos plásticos quase indestrut íve is , por exemp lo , quase sufocou os métodos convencio-nais de lidar com l i xo .

A indústr ia farmacêut ica oferece mu i tos exemplos de novos p rodu tos c o m resultados indesejados. No mes-m o dia em que a h is tór ia dos micró-bios apareceu no The New York Ti-mes c o m as esperanças da engenharia genética, o jorna l t a m b é m relatou a af i rmação l ida por u m ju iz federal em Minneapol is , o Justice Milers Lord, para três func ionár ios de companh ia farmacêut ica c o m o parte de u m acor-do est imado em 4 ,6 mi lhões de dóla-res de processo cont ra as vendas de u m ins t rumento de con t ro le de nata-l idade. Disse o Justice Lord:

A sua companhia, sem prevenir as mulheres, invadiu seus corpos aos milhões e causou-lhes milhares de danos. . . Sua companhia, diante da avassaladora evidência nega sua cul-pa e continua seu monstruoso engo-do. Vocês tomaram a linha mais baixa como linha-guia e a estrada baixa como seu caminho. Essa é a irresponsabilidade das corporações em seu pior aspecto (Associated Press, 1984a, 9)

U m médico que t rabalha para u m fabr icante de drogas f o i escolhido co-

m o alvo de atenção especial pelo Juiz que o acusou de violar " t o d o s os pre-ceitos é t i cos " do j u r a m e n t o hipocrá-t i co . Uma cor te de apelações fez c o m que a af i rmação do ju i z na cor te fos-se e l iminada do registro c o m o sendo f o r t e demais para a ocasião.

As companhias, f reqüentemente lideradas por f i rmas dos E U A , cr iam mu i tos p rodu tos novos e úteis. Mui-tos causam pouca, se alguma, per tur-bação no mercado ou na sociedade além dos lucros. E n t r e t a n t o , o poten-cial para o bem e para o dano nacio-nal e mesmo mund ia l acompanha ca-da p r o d u t o que causa os rápidos e ef icientes sistemas de marketing e d is t r ibu ição das empresas modernas. Às vezes os efei tos não podem ser previstos; f o r a m necessários quase c inqüenta anos para que o potencia l para a po lu ição d o ar pelos au tomó-veis produz idos em massa fosse reco-nhecido. Às vezes os efei tos já são co-nhecidos, e ignorados, quando são negativos. Os adminis t radores de em-presas têm sido conhecidos por supri-m i r dados adversos ( inc lu indo mor-tes) a respeito de p rodu tos , tentar usar in f luência po l í t i ca para conquis-tar endosso c i e n t í f i c o e governamen-tal a p rodu tos espúrios e obter dis-pensa de decisões de cortes af i rman-do responsabil idade de companhias por m o r t e e fe r imentos . U m nível de risco conhec ido pode ser aceito mera-mente c o m o o custo de fazer negó-cios. A inf luência de interesses espe-ciais pode ser exerc ida através de pro-messas de votos ou cont r ibu ições a campanhas.

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Desse modo, o redator de ciência orientado para o comércio irá procu-rar desenvolvimentos c ient í f icos e tecnológicos com significado para a indústria. Os redatores de ciência e tecnologia também devem experi-mentar as fontes de companhias so-bre as possibilidades de uso errôneo de novos produtos, os efeitos desses produtos quando mult ip l icados aos milhões, e os resultados dos estudos de "análise de riscos". É uma admi-nistração de companhia imprudente aquela que não tenta tais estudos, considerando os prejuízos potenciais no julgamento de responsabilidade por produto. As cópias de tais análi-ses freqüentemente encontram o ca-minho para as mãos dos jornalistas. Às vezes companhias de seguro e la-boratórios de testes independentes podem fornecer tal material. A revis-ta Consumer Reports opera seus pró-prios laboratórios de testes.

Uma outra fonte de análise de tec-nologia podem ser os relatórios de la-boratórios do governo. U m grande número das pessoas treinadas como cientistas gastam seu tempo testando e analisando produtos, moni to rando o meio ambiente e coletando e anali-sando dados. A maioria dos projetos do governo envolvendo pesquisa, de-senvolvimento e engenharia é realiza-da sob contrato federal, e análises po-dem ser encontradas em agências pa-trocinadoras tais como a National Aeronautics and Space Administ ra-t ion, o Department of Energy, a En-vironmental Protect ion Agency, De-partment o f Transportat ion e o De-partment of Defense. Essas agências

também operam seus laboratórios na-cionais próprios. Como a informação em algumas dessas agências é conf i -dencial ou ao menos "seguramente m a n t i d a " pela po l í t i ca , os redatores de ciência podem obter sua primeira visão cr í t ica da nova tecnologia atra-vés de trabalhos c ient í f icos em reu-niões de cientistas e engenheiros ou de um relatór io interno de uma agên-cia. Na maior parte dos casos uma vi-sita aos laboratórios privados ou fe-derais pode ser arranjada para repor-tagem sobre u m projeto em part icu-lar. Em outros casos, os veículos de comunicação e a indústria podem ser forçados a usar o Freedom of In for-mat ion A c t para obter dados cr í t icos sobre um p rodu to ou indústria das fontes federais.

Acompanhando o crescimento da indústria relacionada à ciência nos Estados Unidos encontra-se o cresci-mento de boletins noticiosos e perió-dicos sobre comércio dedicados a ca-da ramo e sub-ramo de uma indús-tr ia. O jornalista c ient í f i co que aprende um campo especializado po-de bem descobri-lo lucrat ivo para tra-balhar para — o u para iniciar — uma dessas publicações. Essas publicações da indústria servem, também, como fontes de not íc ias e informação his-tór ica sobre a indústr ia. Obviamente uma tendência ou ponto de vista pró-indústria irá prevalecer na maioria dos casos, mas isso será fáci l de loca-lizar e descontar, se necessário, se vo-cê f icar famil iar izado com o campo.

EMPREGOS, E N E R G I A E PATEN-TES. Ou t ro lado da reportagem co-

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mércio-ciência será mais controver-so do que cobrir o marketing da no-va tecnologia ou correr atrás de um cont ra to governamental ou out ro . Os aspectos c ient í f icos e médicos da saú-de são tópicos mu i to negligenciados na maioria dos países. Escrever sobre a segurança e saúde do trabalho ofe-rece problemas ao redator de ciência por causa da di f iculdade de obter in-formação confiável e livre de l ibelo.

A manufatura de mui tos produtos envolve exposição a poderosos pro-dutos químicos. Isso inclui pí lulas de controle de natalidade, pesticidas, componentes eletrônicos e outros. Algumas indústrias, tais como a mi-neração de carvão e urânio e a indús-t r ia têx t i l expõem os operários a con-dições que produzem doença, tal co-mo o debi l i tante " p u l m ã o negro" da mineração de carvão. A responsabili-dade por doenças e lesões relaciona-das ao trabalho, como a segurança de produtos, será negada pela maioria das companhias e defendida na corte.

Por exemplo, defrontados com pro-cessos alegando responsabilidade por exposição de operários e consumido-res a produtos do asbesto, os seus fa-bricantes fo ram acusados de usar as leis de bancarrota como parte de sua estratégia de defesa. Mui to da infor-mação a ser obt ida nessa área virá através de sindicatos, documentos de corte ou às vezes do National Insti tu-te of Occupational Safety and Health (NIOSH) ou da Occupational Safety and Health Aamin is t ra t ion , ambas agências federais. O vigor com que es-sas agências investigam condições de

trabalho pode variar de administra-ção a administração.

A reportagem sobre energia é ou-t ra especialidade relacionada à ciên-cia cujo foco é fundamentalmente or ientado para os negócios. Embora exista uma vasta e complexa pesqui-sa e um establisment de engenharia avançada no governo e na indústria, as questões de disponibi l idade de energia geralmente giram ao redor da questão: "Por que preço?" A mir ía-de de fontes de tecnologias de ener-gia oferece ao redator de ciência a úl-t ima equação de trade-off na escolha das perguntas sobre quanta energia, de que fontes, a que preços e, no ca-so da energia nuclear, a que máx imo risco. As estimativas realistas dos cus-tos comparativos de energia devem incluir o custo a longo prazo do ar-mazenamento de l ixo radioativo.

As patentes e o d i re i to de proprie-dade para fazer d inheiro com novas invenções são ou t ro aspecto da repor-tagem comércio-ciência. Obter infor-mação que é considerada patenteável torna-se d i f í c i l porque a revelação prematura pode custar ao inventor ou a uma companhia os direitos de patente se os examinadores de paten-te considerarem conhecimento co-m u m a informação, aplicação, ou téc-nica. A informação sobre patentes pode emergir de uma ou duas manei-ras. Uma é a concessão de uma paten-te, a t r ibu indo ao inventor ou proprie-tár io da patente os direitos comer-ciais. As matérias sobre patente tam-bém podem emergir na corte quando a propriedade de uma patente é ameaçada. Uma matéria começou

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cerca de vinte anos atrás quando um antigo graduado da Columbia Univer-sity processou seu professor vence-dor de Prêmio Nobel e a Bell Tele-phone Laboratories sobre o crédito por um conceito-chave na invenção do laser. Mais que uma matéria sobre patente, esse é out ro aspecto da bata-lha cont ínua dos cientistas por esta-belecer a prioridade pela primeira descoberta. Com instrumentos tão amplamente usados como o laser ou as fotocopiadoras, fortunas estão em jogo. Algumas das batalhas de corte mais duramente travadas no fu tu ro irão envolver direitos de patente em processos de biotecnologia e enge-nharia genética, parte da literatura aberta do mundo cient í f ico. Os direi-tos a tais processos serão comprados e vendidos entre companhias.

Um dos cont ínuos problemas de escrever sobre negócios e seu envol-vimento com normas do governo des-tinadas a proteger a saúde e seguran-ça de trabalhadores e consumidores tem sido a confiança dos legisladores em dados da indústria. Em ao menos uma instância, a credibil idade c ient í f i -ca da EPA ao aprovar pesticidas fo i ameaçada quando se descobriu que os cientistas da EPA estavam mera-mente tomando dados fornecidos pe-la indústria para testes sobre a toxic i -dade de pesticidas e passando-os adiante como trabalho independente. O uso similar de dados de compa-nhias de petróleo fo i encontrado no Department of Energy. A reportagem da indústria não é passível de salien-tar os aspectos de " p i o r caso" de um produto e os repórteres de ciência de-

vem perguntar sobre as fontes de da-dos usadas para tomar decisões. Uma maneira pela qual os interesses espe-ciais funcionam num sistema pol í t ico é prejudicar a eficiência de uma agên-cia persuadindo os administradores ou legisladores a manter o número de pessoal treinado abaixo do neces-sário para fazer um trabalho meticu-loso de regulamentação e testes.

Associações de indústria ou co-mércio podem fornecer-lhe dados mas você deve estar avisado que esses grupos patrocinados pela indústria desempenham um papel de obstácu-los á regulamentação potencial. A Lead Industry Association certa vez ameaçou processar os U.S. Centers for Disease Contro l se seus cientistas não desmarcassem uma reunião desti-nada a revelar aos médicos como pre-venir envenenamento por chumbo em crianças novas (Marshall, 1984a).

Relações públicas e especialistas em informação

Os redatores de ciência são empre-gados por empresas ou pelo governo como funcionários de informações públicas em estabelecimentos de pes-quisa e engenharia avançada do go-verno, indústria e instituições não-lucrativas. Esses redatores de ciência e especialistas em informações públi-cas provavelmente perfazem a maio-ria daqueles que se chamam redato-res de ciência. Há mais homens e mu-lheres trabalhando em relações públi-cas e informações de ciência do que empregados como redatores c ient í f i -cos de jornais, revistas, rádio e televi-

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são. Muitos trabalharam como reda-tores de ciência em veículos de co-municação antes de aceitarem empre-gos na indústria. Com freqüência esse pessoal de relações públicas é o pri-meiro contato entre jornalistas e uma companhia, agência ou um cientista. Mui tos desses redatores de ciência inst i tucionais também se comunicam diretamente com não-cientistas atra-vés das publicações e transmissões de suas próprias companhias.

Os redatores de ciência "da casa" têm como alvos os empregados e equipe da insti tuição. Outros produ-zem jornais, boletins noticiosos e re-vistas para audiências externas, inclu-indo consumidores, acionistas, con-tr ibuintes, líderes de opinião pública e meios de comunicação de massa. Seu trabalho mais importante é expli-car a insti tuição e suas atividades às pessoas que têm ou podem ser per-suadidas a ter um interesse di reto na organização, incluindo seu progresso f inanceiro e tecnológico. Out ro pes-soal de relações públicas coloca maté-rias diretamente para os jornalistas ou responde às suas perguntas sobre matérias. Numa organização peque-na, uma pessoa pode realizar todas essas tarefas.

Especialistas de informação astu-tos operam como jornalistas para construir sua própria série de conta-tos e informantes, especialmente den-t ro de uma grande corporação, tal co-mo a IBM ou uma universidade im-portante. A o contrár io dos jornalis-tas, que raramente mostram seu tex-to às suas fontes, o redator de ciência de relações públicas espera que a sua

fon te leia o tex to para verificar a acu-rácia e o t o m ou as palavras. Teorica-mente, isso aumenta o nível de preci-são, embora o redator c ient í f i co pos-sa não gostar de discutir as palavras exatas com cientistas, departamentos legais e administradores da institui-ção. Às vezes essas batalhas funcio-nam para ocultar da pessoa de rela-ções públicas e dos empregados e pes-soas de fora, fatos sobre as operações da companhia.

Num curso normal de eventos, as companhias tendem a seguir o precei-to de que o melhor relações públicas é a verdade. Entretanto, a ligação do pessoal de relações públicas a organi-zações corporadas e de marketing in-dica claramente que seu trabalho é vender produtos, serviços e imagens. Às vezes as companhias tentarão es-camotear informação do departa-mento de relações públicas. Assim, os redatores de ciência de relações pú-blicas agirão bem em fazer tantas per-guntas quantas fazem os jornalistas sobre os projetos de pesquisa e desen-volv imento. Provavelmente os jorna-listas irão fazer o mesmo t ipo de per-guntas e o escritório de relações pú-blicas pode achar prudente sugerir que se evite a ou mesmo que alguma limpeza seja feita para que a compa-nhia ou inst i tuição não se encontre em circunstâncias embaraçosas. Uma das funções do pessoal de relações públicas é antecipar ou prever a rea-ção dos veículos de comunicação às atividades de uma organização.

Muitos jornalistas de ciência ten-dem a pensar que o pessoal de rela-ções públicas vendeu com freqüência

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demais aos meios de comunicação histórias que não representam avan-ços genuínos em ciência e tecnologia. Assim, os jornalistas dos meios de co-municação de massa são especialmen-te sensíveis a uma torrente de chama-dos, press releases e outros materiais que empurram produtos que são ape-nas aperfeiçoamentos marginais sobre a produção de outras companhias. Os redatores podem obter uma medida de proteção contra serem enganados ao perguntar pelo nome genérico ou qu ím ico de qualquer droga " n o v a " e verificar esse nome nos livros de refe-rência qu ímica de outros produtores. Ocasionalmente, foram escritas maté-rias cr í t icas sobre conferências de im-prensa convocadas para divulgar pes-quisa e desenvolvimento duplicados ou questionáveis.

Há mui tos passos também que um redator de ciência de relações públ i-cas pode dar para assegurar u m bom desenlace, se a pesquisa interna indi-ca que um projeto merece publicida-de. Um desses é preencher as defici-ências dos redatores dos veículos, in-clusive providenciando informação histórica bem pesquisada. Essa infor-mação pode ser proporcionada aos jornalistas através de kits de Imprensa d is t r ibu ídos na conferência de im-prensa ou como informação de apoio ligada a um release not icioso. Como os anúncios geralmente são feitos por conveniência da instituição em seu escritório de relações públicas, deve-ria haver tempo suficiente para asse-gurar pesquisa e acurácia minuciosas. Em mui tos casos em que a pesquisa ou trabalho contratado é f inanciado

através de uma verba ou cont ra to do governo, a insti tuição é requerida pe-lo acordo a verificar o release e escla-recer quaisquer conferências de im-prensa com a agência que está pagan-do pela pesquisa. Em outras instân-cias, a agência contratante fará o pró-prio anúncio para receber os benefí-cios da publicidade.

Nem todos os anúncios de negó-cios são baseados apenas em procu-rar propaganda gratuita através da publicidade. As regulamentações da Securities and Exchange Commission referem-se às companhias cujas ações são comercializadas nas bolsas de va-lores para que anunciem novos desen-volvimentos passíveis de ter efei to signif icativo nas operações de uma companhia, pr incipalmente seus lu-cros. 0 pessoal de relações públicas esperto também deve ter respostas a perguntas financeiras e afins onde es-sas são parte do anúncio. Mui tos administradores de companhias pre-ferem contar o menos possível sobre azares, custos e lucros potenciais. Mas há outras fontes que os de fora podem usar. Os jornalistas podem obter estimativas independentes de analistas da indústria nos mercados de ações ou dos competidores. A Se-curities and Exchange Comission, mantém informação em profundida-de sobre companhias cujas ações são comercializadas no mercado públ ico. As bibliotecas e revistas de negócios oferecem outras fontes de dados. Mais e mais jornalistas veri f icam os relatórios tr imestrais e anuais das em-presas e os mais detalhados relatórios f inanceiros arquivados no SEC. Os

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jornalistas também usam os 990 for-mulários do Internai Revenue Service para obter informação de renda sobre organizações de pesquisa não-lucrati-vas.

Existem suspeitas de que muitas realizações cient í f icas e tecnológicas dúbias anunciadas em conferências de imprensa da indústr ia provêem d o desejo da administração de acrescen-tar um bocadinho ao preço das ações da companhia.

Os periódicos do comércio indus-tr ia l oferecem fontes de informação alternativas e embasadas para os jor-nalistas. Tais periódicos comerciais também são uma fon te importante de histórias sobre companhias a res-pei to de suas atividades. Alguns pe-riódicos operam agressivamente e mantêm fontes independentes de in-formação no interior de companhias que fazem parte da indústria que co-brem. Os redatores de ciência de rela-ções públicas precisam se tornar fa-mil iarizados com essas fontes de in-formações alternativas para evitar afirmações confl i tantes e proteger a si mesmos de situações que podem causar uma perda de confiança pelos jornalistas. Sabe-se de companhias que sacrificaram pessoas de relações públicas colocando-as em circunstân-cias comprometedoras. Se a pessoa de relações públicas não consegue dissuadir a companhia de liberar in-formação enganosa, a demissão pro-vavelmente é o melhor curso quando o func ionár io de relações públicas deu o melhor conselho possível e o teve rejeitado. Uma vez destruída a confiança entre os jornalistas dos

meios de comunicação torna-se d i f í -ci l reconquistá-la. A not íc ia da per-formance ética viaja rapidamente no pequeno mundo dos redatores de ciência nas relações públicas e nos veículos de comunicação.

Seguindo os mesmos passos de ve-rif icação que o jornalista usa está a auto-proteção mesmo para aqueles que produzem publicações internas, que ocasionalmente chegam aos jor-nalistas e tornam-se "dicas de no t í -cias" para os veículos de massa. Se a publicação de uma companhia traz informação falsa ou enganadora, é improvável que a organização carre-gue a culpa por qualquer controvérsia que resulte, mesmo se essa tiver cir-culado como pol í t ica de administra-ção. Por ou t ro lado, os redatores de ciência de relações públicas têm vá-rios fatores trabalhando a seu favor. Não são muitos redatores de ciência que se entregam à reportagem investi-gativa. Algumas das ações fo ram resu-midas pelo Dr. Rae Goodel l (1981).

1. A ciência e os cientistas int imi-dam grande parte da imprensa.

2. Os editores e redatores não têm confiança em investigações c ient í f i -cas.

3. Os redatores de ciência sabem da sensibilidade da comunidade cien-t í f i ca às crít icas e temem perder suas fontes.

4. Como os redatores de ciência part i lham do entusiasmo dos cientis-tas pela ciência e seus valores, são fa-ci lmente cooptados.

5. A maioria dos escritores de ciência não tem interesse em cobrir

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aspectos pol í t icos e econômicos da ciência.

6. Tanto redatores de ciência quanto cientistas tendem a focalizar as perguntas no tecnicamente possí-vel em lugar daqui lo que é desejado.

7. Os editores de jornais diários não compreendem a natureza da ciência e concedem mais tempo e fle-xibi l idade para matérias de profundi -dade.

Se você escreve para uma corpora-ção publ icamente comercializada, universidade ou organização não-lu-crativa, você pode assistir a reuniões cient í f icas para ampliar ou manter seus contatos com jornalistas c ient í -ficos. Essas reuniões também ofere-cem insights no trabalho dos compe-tidores. Você pode esperar pagar uma taxa de inscrição na reunião, embora algum pessoal da área de informações receba cortesias da sala de imprensa sem taxas, como ocorre com a maio-ria dos jornalistas.Não é bom usar a ocasião para uma promoção mais do que discreta de sua organização. É possível, entretanto, ter cópias dos trabalhos de seus cientistas colocados na sala de imprensa ou arranjar entre-vistas. Os administradores da sala de imprensa de uma reunião c ient í f ica podem pedir ao redator de ciência de uma indústria para ajudar a arreba-nhar os cientistas da companhia se es-tes se enquadrarem nas necessidades de imprensa da sociedade, mas orga-nizar uma conferência de imprensa de companhia em separado quebra o protoco lo . O redator de ciência de re-lações públicas geralmente pode ar-ranjar entrevistas para jornalistas in-

dividuais assistindo à reunião sem in-vadir o te r r i tó r io da sociedade.

O redator de ciência da indústria também pode ter de lidar com uma nova f igura que aparece nas reuniões cientí f icas. É o analista de seguros que, trabalha independentemente, ou para uma das casas de corretagem de ações. Esses analistas estarão procu-rando por sinais de pesquisa que pos-sam levar as ações de uma companhia a aumentar ou d iminui r sua cotação. Alguns jornalistas f inanceiros assis-tem a reuniões cientí f icas e médicas com o mesmo propósi to. Com fre-qüência, tal informação não virá de um relatór io de companhia mas de uma universidade ou pesquisador do governo que testou o p rodu to para verificar sua eficácia ou segurança. Esses analistas, que podem ser anti-gos jornalistas de ciência ou pessoal de relações públicas, também assis-tem às conferências de imprensa para fazerem a sua avaliação do efei to de novos produtos sobre os destinos de uma companhia. Os analistas inde-pendentes freqüentemente publ icam boletins noticiosos com conselhos a acionistas, aumentando a necessidade de preparar-se para questões econô-micas além daquelas relativas a ciên-cia e tecnologia.

A L G U M A S QUESTÕES NOVAS. As companhias que fabr icam drogas que necessitam de prescrição ou materiais que devem ser administrados por mé-dicos colocam alguns problemas no-vos para os praticantes de relações públicas e marketing c ient í f icos. É a prática de anunciar e promover dro-

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gas com nomes comerciais, aparelhos médicos, e outros materiais direta-mente a consumidores. No passado, os médicos eram os únicos alvos des-se t i po de promoção, sob a teoria de que apenas o médico iria escolher o t ra tamento para um paciente. Em 1980, entretanto, a Collagen Corpor-at ion, produtora de um material que poderia ser usado para alisar cicatri-zes e marcas de espinhas, part iu, atra-vés de publicidade em revistas femi-ninas, a encorajar as pessoas a requisi-tarem o tratamento. Alguns fabrican-tes de drogas também procuraram a permissão da Food and Drug Admi -nistrat ion para anunciar seus produ-tos que necessitam de prescrição mé-dica em publicações de consumido-res. Robert P. Charrow, professor de Dire i to na University of Cincinnat i , preveniu que isso aumenta a exposi-ção de uma companhia a processos por responsabilidade. Quando produ-tos médicos são comercializados ape-nas para médicos, a dout r ina legal de " in termediár io i n f o r m a d o " requer que o fabricante previna apenas os médicos sobre os efeitos colaterais possivelmente indesejáveis ou as con-seqüências de tal t ratamento. (Charrow, 1983; " S m o o t h bel l ing" , 1984). Embora este seja u m tema possível de decisão nas cortes, o mar-keting públ ico pode exigir que os administradores de relações públicas da ciência incluam avisos similares em todas as apresentações públicas. Muitos jornalistas culpam o pessoal de relações públicas por ser pouco franco a respeito dos riscos agora as-sociados com novas drogas.

Parte da pressão para anunciar no-mes de marca e medicamentos paten-teados diretamente aos usuários pro-vém da crescente demanda por dro-gas "genéricas". Esses medicamentos são vendidos sob seus nomes qu ími -cos ao invés de nomes de marca. As medicações genéricas são vendidas por consideravelmente menos que suas contrapartes com nome de mar-ca ou "propr iedade" . Enquanto exis-tem essas pressões econômicas com-petidoras, haverá afirmações compe-t idoras sobre se os genéricos são tão eficientes quanto os nomes de mar-ca, mesmo se o consenso das autor i-dades médicas aceitar o uso de gené-ricos. O redator de ciência das corpo-rações pode ser pressionado a defen-der o produto mais caro da compa-nhia em notícias e textos de publici-dade sem parecer estar desafiando a convenção c ient í f ica, embora algum cientista, em algum lugar, poderá ser encontrado para proporcionar dados de pesquisa favorecendo um produto com nome de marca.

Também em pauta tan to para os redatores de ciência da indústria co-mo dos veículos de comunicação es-tá a possibilidade de que as decisões sobre desenvolvimento c ient í f i co irão tender a concentrar-se nas mãos do que David Dickson, o repórter de ci-ência em Washington para Nature, chama "classe de líderes de corpora-ções, bancos ou mi l i tares" , sem esta-rem sujeitos às considerações do pro-cesso democrát ico maior na socieda-de (1984). Dickson assume que os cientistas de universidades, obtendo a maior parte de seu apoio na indús-

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t r ia, irão achar mais d i f í c i l manter a independência e a discussão aberta em face desse poder po l í t i co e finan-ceiro e as tentações de novas for tu-nas possíveis em tais áreas emergen-tes como as formas de vida construí-das através da engenharia genética. Uma visão mais benigna afirma que as empresas estão comprando pesqui-sa universitária para aprender primei-ro sobre desenvolvimentos novos e não para controlá-los.

Entretanto, o debate sobre a su-pervisão ou controle de tais formas de vida produzidas pelo homem, co-mo as bactérias que foram alteradas para atingir vários fins comerciais, irá continuar. O National Inst i tute of Health mantém poder de aprovação informal sobre tais micróbios destina-dos ao uso em laboratórios. Mas ex-perimentações posteriores irão reque-rer testes externos, que os ambienta-listas vêem como um risco de altera-ções no equi l íbr io da natureza consi-derando-se as chances de que tais mi-cróbios venham a escapar das áreas de testes. Isso ocorreu com a introdu-ção de outros organismos, tais como formigas vermelhas nas regiões onde não têm inimigos naturais.

Avaliação de riscos

Ter influência sobre a forma pela qual os meios de comunicação irão abordar estas e outras questões será uma questão para os redatores de ci-ência resolverem. A "a juda" especia-lizada será oferecida sob o disfarce de educar redatores e leitores da manei-ra "apropr iada" para observarem o

risco tecnológico. Isso coloca um problema para todos os redatores de ciência porque, se por um lado pode resultar na retenção de informação ao público, por out ro pode despertar medos desnecessários. Adicionalmen-te, a ciência, arte, ou técnica de esti-mar os riscos para a sociedade e para os indivíduos é nova e altamente es-peculativa. Os métodos e dificulda-des de prever tais riscos merecem ma-térias.

Alguns cientistas ir iam, como o antigo astronauta e senador pelo No-vo México Harrison H. Schmit t , esca-motear estimativas de perigo aos jor-nalistas ou pedir-lhes para censurar informação sobre possíveis perigos na tecnologia (Schmitt , 1984,17). Essa é uma solicitação antiga, indo no mí-n imo até as instâncias em que prefei-tos pediam aos jornais para não divul-garem a presença de tubarões na praia porque isso iria afetar os negó-cios turíst icos. As análises custo-bé-nefício ou risco-benefício pedem que a sociedade, de certo modo a sangue-f r io , aceite certo número de mortes, por exemplo, em desastres de avia-ção, porque garantir a segurança tota l contra morte ou ferimentos tornaria o custo da viagem aérea proibi t ivo. Nós vivemos num mundo estatístico onde corremos nossos riscos. Mas os jornalistas foram criticados por alar-mar leitores sobre riscos tecnológicos que são mui to mais baixos que o ris-co de fer imento ao cruzar uma via metropoli tana, dirigir um carro atra-vés da cidade ou outras situações de " r i sco" comuns e aceitas.

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Parte da controvérsia reside em se as pessoas escolhem os riscos que cor-rem, tais como dir igir ou fumar cigar-ros ou se têm o risco imposto a elas por outras. Um exemplo de tal risco imposto poderia ser viver nos arredo-res de uma fábrica onde os adminis-tradores iniciam a produção de um produto qu ím ico suspeito de ocasio-nar doença. Um tema de discussão no campo da saúde ocupacional é se os trabalhadores de uma indústria de-vem ou não aceitar uma exposição maior a riscos qu ímicos por causa de seu trabalho do que o públ ico em ge-ral deve aceitar. Out ro fator nos ní-veis de risco aceitáveis reside no co-nhecimento pleno do risco. Por exemplo, os bombeiros na cidade na-tal do autor estavam dispostos a com-bater um fogo qu ím ico numa fábrica de t intas — até descobrirem que 0 ed i f í c io cont inha nitrocelulose, algo-dão-pólvora, um explosivo usado em sua fo rma l íquida como ingrediente em certas t intas. Os jornalistas cient í -f icos terão muitas oportunidades de escrever sobre esse novo campo de determinação de riscos á medida que a pesquisa sobre ele crescer durante os próx imos anos.

Por trás das objeções ao relato de riscos pelos meios de comunicação de massa — mesmo exagerados e sensa-cionalistas, estão interesses econômi-cos e profissionais que podem achar mais d i f í c i l atingir seus objetivos eco-nômicos por causa da opinião pública adversa. A calamidade industrial em Bhopal, índia, em 1984, aumentou a exigência pública de que as compa-nhias revelem a presença de todas as

substâncias perigosas em suas depen-dências. U m aumento na quantidade de acidentes de estradas e ferrovias provocou uma pressão similar nas dé-cadas de 1960 e 1970 e fo rçou as companhias químicas a rotularem carros-tanque t ransportando produ-tos químicos perigosos. As compa-nhias o f izeram com relutância, exa-tamente como muitas resistem à reve-lação franca dos riscos no trabalho. Entretanto, um comitê da National Academy of Sciences a f i rmou que in-formar os trabalhadores sobre os ris-cos existentes em seus locais de tra-balho é uma ação ética fundamenta-da nos benefícios para a sociedade em geral a partir do d i re i to de um indiví-duo à autodeterminação.

A socióloga Doro thy Nelk in, uma estudiosa da ciência na sociedade e membro do quadro de diretores da A A A S , af i rma que o acesso dos veí-culos de comunicação à informação a respeito dos riscos assim como bene-f íc ios da tecnologia é fundamental para a existência de uma cidadania informada capaz de empenhar-se com conhecimento em escolhas polí t icas. A comunicação opor tuna da informa-ção sobre os riscos ao públ ico tam-bém tem importância prática. A co-bertura dos meios de comunicação pode exagerar o problema dos riscos, mas aumentar a consciência pública, pode também elicitar o apoio que é necessário para trazer os riscos sob controle. Pode forçar funcionários públicos a serem responsáveis perante seus consti tuintes. E pode ajudar a trazer problemas cr í t icos à agenda pública (Nelk in, 1984a, 21). Na reali-

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dade, esses são os resultados deseja-dos por grupos de interesse especial quando estes so l ic i tam o apoio dos meios de comunicação, f reqüente-mente c o m dados superestimados, para o seu lado da questão.

Fontes de informação

A q u i estão algumas fontes de in-

fo rmação que irão ajudá-lo a pesqui-

sar assuntos t ransc ient í f i cos . A

maior ia pode ser encontrada em qual-

quer b ib l io teca, embora algumas se-

jam experiências especializadas dis-

poníveis na maior ia das faculdades

ou universidades e mui tas bibl iotecas

de empresas.

C O M É R C I O : The Wall Street Journal Index (companhias, tóp icos gerais), cobre de 1957 até o presente. Bu-siness Index (seções de comérc io em jornais desde 1979) . Standard and Poor's Corporation fíecords (atuali-zado anualmente) . Moody's Industrial Manual (anual). The Stock Market Directory, 1982 (cobre 1500 compa-nhias). Directory of Corporate Affi-liations (anual). America's Corporate Families (anual). Standard and Poor's Industry Surveys (anual), cobre 697 indústr ias e f i rmas impor tantes.

P O L Í T I C A : Congressional Quarterly (semanal). National Journal (sema-nal). Public Affairs Information Ser-vice (PAIS) , mensal e d ispon íve l atra-vés de c o m p u t a d o r em algumas bi-bl iotecas.

M E D I C I N A E C I Ê N C I A : Index Medi-

eus, International Nursing Index, and

Index to Dental Literature, acúmu lo impresso mensale anual pela National Library of Medicine e t a m b é m índice de c o m p u t a d o r M E D L I N E . American Men and VJomen of Science (catálo-go).

BASES DE D A D O S C O M P U T A D O -R I Z A D O S : Pharmaceutical News In-dex (not íc ias da indústr ia farmacêut i -ca). Science C i ta t i on Index (vida e ciências f ísicas). M E D L I N E (medici-na, enfermagem e odonto log ia ) . C E N D A T A (dados demográf icos do Bureau of Census). O acesso a estes pode vir em pacote c o m subscrições de mu i tos serviços comercia is de da-dos.

Experiências

1. Examine a seção de notícias de comér-cio de um jornal metropolitano. Faça uma lista de matérias que tenham um forte con-teúdo de ciência ou tecnologia. Em que dessas diferem de outras matérias de ciên-cia que você já leu?

2. Percorra uma edição do The Wall Street Journal. Quantas histórias reque-riam explicação de algum aspecto da ciên-cia ou tecnologia?

3. Examine cópias recentes de Business l/Veek, The Economist ou Forbes à procu-ra de histórias cuja significação econômica ou de negócios repouse sobre ciência ou tecnologia.

4. Procure no Readers'Guide to Periodical Literature, no Business Index, ou no The Wall Street Journal Index por histórias in-dicando processos sobre responsabilidade de produtos.

5. Você pode descobrir histórias envol-vendo comércio e ciência-tecnologia nas quais haja pistas de que pessoal de relações públicas do governo ou da indústria aju-dou essas matérias a serem impressas?

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Capítulo 8

notícias de ciência, de medicina e saúde

A MAIOR PARTE DA REPORTAGEM MÉDICA LIDA COM not íc ias trans-c ient í f icas. Em lugar nenhum há ten-dências de empreendimentos c ien t í f i -cos mais mesclados por valores eco-nômicos, po l í t i cos , de personalidade e sociais do que na medic ina e ciên-cias de saúde ou suas relações. Histó-rias de vida ou mor te , os valores de sobrevivência, são específicas e pes-soais embora também amplas e ge-rais. As doenças c o m o o câncer e as do coração, para tomar exemplos óbvios, são individual izadas; nós so-f remos e morremos um por u m . Essas doenças também declaram milhões de vidas a cada ano em estatísticas sem rosto e sem nome que as r o t u l a m c o m o as mais f reqüentes causas de mor te . En t re tan to , a maior ia dos mé-dicos e dentistas conquista suas posi-ções de respeito e suas vidas através do cu idado diár io de males menores: febres, gargantas irr i tadas, ossos que-brados, gengivas e dentes doentes, he-morró idas, infecções, úlceras, acnes, resfriados, gripes, músculos distendi-dos, apendic i te , pressão sangüínea alta etc. etc. etc. D i f i c i lmente temas que fazem no t í c ia . Ou faz? Seu im-pacto é universal.

Os redatores de ciência precisam compreender a cu l tu ra da saúde e da medic ina para escreverem de maneira

ef ic iente nessa área. Impor tantes co-m o as fontes de not íc ias são em ou-tros campos, a cooperação do pessoal nos campos da saúde e medicina é vi-tal para o redator. Este cap í tu lo so-bre not íc ias c ient í f icas de medic ina e saúde irá ajudar os redatores a evita-rem algumas das armadilhas que po-dem alienar fontes e guiar os redato-res a alguns aspectos que o pessoal da área discute apenas com relutância.

Na segunda metade do século X X , a medic ina desenvolveu-se de uma ar-te incerta para algo que se ap rox ima da ciência. Isso não é subestimar os séculos anteriores de conhec imento médico d i f i c i lmente conquistado an-tes da descoberta e produção de ant i-b iót icos, t a n t o quanto apontar para o redator de ciência como tem sido re-lat ivamente maior o p r o d u t o de déca-das recentes e quantos fatores ainda permanecem desconhecidos. Uma do-ença temida , a var ío la, f o i e l iminada. Muitas pessoas sobrevivem a males e doenças antes fatais. O aumento da longevidade da vida não é senão o re-sul tado dessa revolução nos cuidados médicos eficientes. Permanece quase esquecido o fa to de que nos pr imei-ros anos da década de 1900 mui tos homens e mulheres mor r iam antes de completar 50 anos. A expectat iva de vida excede agora os 70. Desse ún ico

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fa to ramificam-se dezenas de mudan-ças na sociedade que afetam as opor-tunidades de trabalho, escolha de car-reiras, cuidado com os idosos, po l í t i -ca, alocação de recursos, atividades de lazer e serviços sociais.

As profissões que l idam na área de cuidados com saúde empregam mi-lhões de pessoas no mundo inteiro no que é chamado "dispensa de cui-dados com saúde". Apoiando-os há outros fabricantes de drogas, supri-mentos e instrumentos médicos. Hos-pitais e cl ínicas às dezenas de milha-res através dos Estados Unidos dão representação física inst i tucional à idéia dos cuidados com a saúde. Tais instituições freqüentemente empres-tam identidade às cidades que as abri-gam, como faz a Mayo Clinic com Rochester, Minnesota, ou a Mennin-ger Cl inic com Topeka, Kansas.

Medicina é dinheiro. O impacto econômico da indústria de cuidados com a saúde é intenso. Durante as dé-cadas de setenta e oi tenta, o custo crescente dos cuidados médicos e ae saúde e das drogas elevou os índices de inflação e representou dilemas econômicos nacionais. O orçamento nacional para medicina excede 350 bilhões de dólares por ano, mais ae 10% do Produto Nacional Bru to pe-las estimativas do Department of Health and Human Services. Isso cor-responde a aproximadamente 1.400 dólares por pessoa. Em 1984 a Ame-rican Medicai Association pediu aos seus membros médicos para pararem de aumentar os honorários durante um ano. As rendas de mui tos médi-cos alcançaram números surpreen-

dentes. Alguns médicos e fornecedo-res de produtos médicos alcançaram a riqueza através de subornos entre planos de seguros de saúde federais, estaduais e particulares. E a imagem dos médicos como gentis f iguras pa-ternas mudou para a de tecnocratas de elite, eficientes mas alienados. Uma indústria menor surgiu para mostrar aos médicos como adminis-trar suas práticas lucrativas, investir seu dinheiro e empenhar-se em ativi-dades pol í t icas, geralmente em opo-sição aos programas nacionais de cui-dados com a saúde. De uma falta de médicos na metade do século, os go-vernos dos Estados Unidos e os go-vernos de outras nações avançadas começaram a se perguntar se não fo-ram treinados médicos mais do que suficientes mesmo que sua distr ibui-ção nas áreas metropol i tanas tenha deixado muitas cidades rurais caren-tes de médicos e hospitais.

O acesso ao t ra tamento médico abrangente, de pr imeira classe — dis-cut ido nos anos sessenta pela A M A — por causa de um tema de po l í t ica na-cional como os fundos Medicare e Medicaid para os idosos e os indigen-tes fo ram ameaçados com o esvazia-mento. As ações dos médicos para de-sacelerar os crescentes custos com a medicina não t rouxe resposta similar dos hospitais, também líderes na in-flação dos anos setenta e oi tenta. Na realidade, os hospitais ofereciam tan-t o potencial de lucro que grandes companhias, tais como a Humana, e a Hospital Corporat ion of Amer ica, fo-ram formadas para o negócio de pos-suir e operar hospitais. Isso reverteu

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uma tendência de quase um século durante o qual a propriedade de hos-pitais mudou-se das mãos privadas, geralmente as de um médico, para as de organizações públicas, não-lucra-tivas ou religiosas. Os hospitais públ i-cos municipais restantes fo ram força-dos a compet i r por pacientes pagan-tes ou segurados para ajudar a d i lu i r os custos hospitalares daqueles doen-tes e pobres que eles, como inst i tui-ções públicas, eram obrigados a acei-tar. A u m e n t o correspondente nos seguros privados médicos, dentários e de saúde levaram os negócios a pro-porcionar o custo da cobertura para seus empregados e dependentes como benef íc io marginal. Perguntas pertur-badoras fo ram levantadas sobre se o preço de tratar a doença havia ou não se movido além das possibilidades de todos a não ser os ricos?

Na segunda metade do século, no-vas formas de cuidados com a saúde entraram para o uso geral, encoraja-das pela economia e pol í t ica públ ica. Uma f o i a Health Maintenance Orga-nizat ion, surgida como pioneira nos anos quarenta, como Kaiser Perma-nente, na Cal i fórnia, para os empre-gados do que era então a Kaiser In-dustries. A H M O t inha o objet ivo de proporcionar cuidados médicos pré-pagos, às vezes na própr ia c l ín ica da HMO, não apenas um seguro para pa-gar uma parte das contas do hospital e do médico se você ficasse doente. Em teoria, a HMO oferecia tanto aos médicos como aos membros vanta-gens em relação aos cuidados médi-cos através da prática independente. Out ro desenvolvimento recente nos

Estados Unidos é a "c l ín ica de emer-gências menores" de d o m í n i o priva-do. Localizada na vizinhança de edi-f íc ios de escritórios ou shopping cen-ters, supera os médicos de famí l ia , que há m u i t o tempo haviam deixado para trás os chamados a d o m i c í l i o e os números em recesso de alas de emergência dos hospitais. As faci l ida-des para a "c i rurgia no d i a " aparece-ram também, para pacientes que pre-cisavam dos serviços protet ivos de salas de operação inteiramente equi-padas, mas apenas algumas horas de cuidados de enfermagem pós-opera-tór ios durante a recuperação. Depois, para eles, era ir para casa, para recu-perar-se em leitos menos dispendio-sos com a ajuda da famí l ia , amigos ou enfermeiras visitantes. A década de setenta também assistiu rejuvenes-cer o interesse por duas práticas mé-dicas mais antigas: as parteiras e o parto em casa.

Ou t ro novo desenvolvimento fo i o mov imento beneficente no qual o conceito de medicina preventiva ex-pandiu-se além da vacinação contra a doença e além da legislação de saúde pública destinada a assegurar comi-da, água e remédios seguros. Esse de-senvolvimento encontrou apoio na comunidade médica que encorajou as pessoas a assumirem mais responsabi-lidade pessoal por sua própr ia saúde ao invés de esperarem que os médicos restaurassem e consertassem. Ironica-mente, o movimento ret i rou parte de sua força da falta de confiança no sis-tema existente de cuidados com a saúde baseado na ciência. O movi-mento enfatizava a dieta, exercícios.

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ambiente l impo e, para alguns, uma fé quase mística numa série de vita-minas, alimentos saudáveis "natu-rais", instrumentos e outra paraferná-lia que se acreditava servisse para manter a forma e mobilizar as defesas naturais contra a doença e o envelhe-cimento. Essa é uma área de cuidados com a saúde freqüentemente assolada por fraudes e charlatães, incluindo al-guns com diplomas médicos, atacan-do através dos receios das vít imas da doença e de sua disposição de tentar qualquer caminho para uma cura. As indústrias da carne e dos laticínios enfrentaram um decl ín io quando mi-lhões de adultos trocaram a carne vermelha e o leite por aves, peixes e grãos.

O papel dos veículos de comunicação na saúde e medicina

A medicina absorve mui to o uso dos meios de comunicação e emprega a maior parte dos relatores de ciência e medicina. Os hospitais e os centros de pesquisa médica empregam reda-tores, editores, fotógrafos e artistas para as comunicações com a equipe, pacientes e comunidade médica. Par-te da produção, especialmente para os fotógrafos e artistas, envolve a do-cumentação de procedimentos cirúr-gicos e preparação de relatórios de pesquisas. Alguns relatórios de pes-quisas são polidos e editados por re-datores médicos e editores a partir de relatos brutos preparados pelos pes-quisadores. Outros redatores médi-cos, alguns na equipe e outros como

free-lancers, preparam materiais edu-cativos para os funcionários, os pa-cientes e o público. Estes incluem brochuras, panfletos e roteiros para fi lmes e fitas. Alguns escritores de ciência servem como especialistas educacionais para traduzir e estender instruções médicas para pacientes. Alguns poucos redatores de ciência relataram ter encontrado um conse-lho de relações públicas contratado para promover médicos individuais ou membros de práticas de grupo.

As instituições médicas também usam redatores de ciência e editores para fazer os press releases destinados aos veículos de comunicação, publi-cações para empregados, revistas e outros materiais que informam equi-pe, membros, líderes da comunidade, pacientes, antigos pacientes e doado-res em potencial, sobre as necessida-des e atividades da instituição. Esses redatores geralmente trabalham na comunidade ou departamentos de re-lações públicas e escrevem notícias gerais e matéria promocional, assim como artigos médicos e de ciência popular.

Outros redatores de ciência e me-dicina produzem um vasto suprimen-to de publicações médicas dirigidas a cada segmento da comunidade médi-ca: médicos, enfermeiros, administra-dores, técnicos, fabricantes e assim por diante. Muitas dessas publicações se originam com as associações pro-fissionais para cada especialidade mé-dica e ocupacional. Quase todo pe-riódico patrocinado é acompanhado por uma publicação comercial, tal como Medica! World News, geralmen-

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te privada. Ambos os conjuntos de publicações apóiam-se nos anuncian-tes de suprimentos médicos e medica-mentos. Muitas das publicações co-merciais são de "circulação contro-lada", enviadas gratui tamente a prati-cantes na área da saúde. Os redatores dessas publicações estarão envolvidos com matérias sobre a ciência e a po-l í t ica da ciência e da medicina nas ca-pitais estaduais e em Washington, D. C. Mudanças em programas federais, apropriações, normas e administrado-res afetam os profissionais dessas áreas e seus bolsos. Quase cada ramo das ciências médicas e de saúde tem sua legislação diante do congresso a cada ano. O Journal of the American Medica/ Association, o Medicai Tri-bune e Medicai World News oferecem exemplos de publicações que mistu-ram informações de ciência, medici-na, pol í t ica e profissional em cada edição.

Outras revistas tais como Medicai Economics e Dental Economics, atraem leitores e anunciantes profis-sionais com artigos mostrando aos profissionais como administrar seus escritórios, seu tempo e seus investi-mentos. Por causa das altas rendas de médicos e administradores médicos, as revistas têm sido publicadas para lhes mostrar como administrar seu tempo livre e como se d iver t i r . Quase todas essas publicações profissionais l imi tam suas circulações a membros licenciados ou registrados nessa pro-fissão ou uma especialidade. RN é di-rigida a enfermeiros diplomados, por exemplo, enquanto Today's OR Nur-se dirige o seu material para enfer-

meiros de salas de operações. Hos-pitais é para aqueles que administ ram uma variedade de instituições de cui-dados com a saúde. Como você pode-ria imaginar, os redatores para essas publicações traduzem menos jargão técnico porque escrevem para profis-sionais que compreendem os detalhes de seu negócio e exigem u m al to grau de acurácia técnica e f inanceira.

Outros empregadores importantes de escritores de ciência e medicina e editores incluem o governo, nos ní-veis federal e estadual, e as organiza-ções de voluntários, tais como a American Heart Associat ion ou a Amer ican Câncer Society, associadas a doenças específicas. A l é m de servi-rem como veículos para a redação ci-ent í f ica, essas agências e associações const i tuem importantes fontes de in-formação para redatores de ciência e medicina que escrevem para veículos de massa. Com as profissões médicas, as instituições médicas e as publica-ções médicas especializadas, f o r m a m a base para um sistema de comunica-ção médica, saúde e medicina para o públ ico em geral.

Os propagadores da medicina tam-bém encontram seus canais em publi-cações para consumidores de todas as variedades, incluindo jornais e revis-tas. A maioria das publicações femi-ninas traz uma coluna regular de no-t ícias médicas relacionadas às mulhe-res, ao lar ou às crianças. Quando um jornal expande sua equipe noticiosa para incluir especialistas em ciência, geralmente escolhe um redator médi-co pr imeiro. A American Health t ipi-fica várias publicações destinadas ao

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público em geral que oferecem not í-cias de desenvolvimento em pesquisa médica, nutrição, medicina clínica, aptidão física e outros aspectos do "est i lo de vida saudável". Por causa do grande interesse popular pela me-dicina e pelas pessoas que fazem me-dicina e desenvolvem na prática, as promessas de suas pesquisas, a medi-cina tem sido o ponto alto da revista para o consumidor. Isso envolve tan-to aqueles que escrevem para a co-munidade médica como aqueles que escrevem sobre a comunidade médica num esquema único de relacionamen-tos. Compreender isso como um sis-tema de comunicação irá suavizar seu caminho através da redação médica.

Os escritores que popularizam a medicina irão chocar-se com a " In -gelfinger Rule", que desencoraja a re-velação prematura de resultados de pesquisas. Por isso os redatores po-dem ter dif iculdade em persuadir al-guns médicos pesquisadores a fala-rem livremente antes da publicação de sua pesquisa em periódico espe-cializado. O Dr. Arno ld S. Relman, editor do New England Journal of Medicine, o mais r ígido praticante da regra, tem tentado esclarecer sua po-l í t ica de não publicar uma história que recebeu o que considera publici-dade prematura. O Dr. Relman acon-selha os pesquisadores médicos a não entregarem aos redatores de ciência o trabalho efetivo apresentado numa reunião e fornecer detalhes demais, inclusive números, antes que os cole-gas revisores do NEJM tenham visto o material e a NEJM tenha publicado a pesquisa (1984). A Ingelfinger Rule

será discutida mais amplamente no capí tu lo 9, mas um de seus efeitos é aumentar a chance de erro quando você cobre reuniões de pesquisas mé-dicas, a não ser que você possa fazer uma verificação cruzada dos números de suas anotações com o cientista.

Trabalhando com médicos

Como membros de uma das mais antigas e mais cerradamente organiza-das profissões, os médicos movem-se numa trama sensível de relações com pacientes, outros médicos, hospitais, equipes de enfermagem, a lei e o pú-blico. A área mais sensível é a da con-fiança e confidencialidade entre mé-dico e paciente. Como redator você precisa de informação de pacientes. Mas como os equívocos na transmis-são da informação médica sobre pa-cientes específicos podem tanto ser divulgados abertamente como guar-dados em sigilo, a informação confiá-vel é quase não-obtenível sem a co-operação do médico. Alguns são mais cooperativos com os jornalistas do que outros e o ajudarão a obter o consentimento dos pacientes para as matérias assim como arranjarão tem-po para entrevistas. Cultivar a amiza-de profissional com esses médicos pa-ga muitos dividendos. Como a comu-nidade médica é tão apertadamente tecida, a sua reputação por acurácia, conhecimento e consideração irá se espalhar rapidamente. Se for boa, vo-cê poderá encontrar um f l uxo cres-cente de sugestões de matérias em sua direção. Isso pode aumentar a sua lista pessoal de contatos para infor-

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mação e avaliação de histórias poten-ciais.

Numa crise de coleta de not íc ias, tais como uma cirurgia impor tante num líder mundial , os jornalistas mé-dicos precisam dessa rede de contatos noticiosos para obter rapidamente in-formações tanto específicas quanto gerais sobre procedimentos cirúrgi-cos, chances de recuperação, e assim por diante.

Por causa de seu tempo freqüente-mente l imi tado, os médicos apreciam o tempo que você passa pesquisando o tóp ico de matéria específ ico antes de começar uma entrevista. Essa pes-quisa inclui ampla leitura de enciclo-pédias médicas assim como artigos es-pecíf icos de periódicos ou estudos de casos. U m dos cursos mais úteis que um redator médico iniciante pode fa-zer é o curso de terminologia médica, disponível em muitas universidades para estudantes pré-médicos e de en-fermagem. Será de grande ajuda ao conversar com médicos e traduzir ar-tigos médicos.

Os doutores em medicina escre-vem mui tos relatórios como estudos de casos e estes prestam-se faci lmente à dramatização e às anedotas. Res-tr ingir tal dramatização entretanto, é uma boa regra mesmo que muitos de-talhes cl ínicos específicos, tais como tamanho de tumores, graus de defor-mação e perda de sangue ou funções corporais sejam soletrados com ex-cruciante exatidão. Algumas vezes o uso de u m pseudônimo ou nome fal-so será adequado para um paciente por causa da natureza do caso ou da possibilidade de invadir a privacidade

de alguém. Tal uso de nome falso de-ve f icar mu i to claro para seus leito-res. Embora isso leve a uma das áreas éticas sensíveis do jornal ismo, os re-datores usam pseudônimos regular-mente. A identi f icação pode ser reali-zada com apenas o pr imei ro nome. Quando o " m e n i n o da bo lha" , um jovem do Texas, chamado David, morreu em 1984, depois de ter pas-sado 12 anos em quartos fechados com telas plásticas por ter nascido sem capacidade imunológica. os reda-tores de ciência entraram numa cons-piração com médicos, enfermeiros, amigos e os pais de David para esca-motear o nome da famí l ia e com isso proteger sua identidade, privacidade e sua liberdade de estudar e ter ou-tros contatos l imitados com o mundo exter ior . Em troca, os redatores obti-veram a cooperação da famí l ia em providenciar acesso para matérias e informação sobre a criança enquanto esta crescia. U m pseudônimo não o protege automat icamente contra o assédio públ ico ou invasão de privaci-dade, entretanto. A verdadeira iden-t idade pode emergir simplesmente porque o caso é único.

A o lidar com médicos, os redato-res de medicina deviam se lembrar de que nenhuma pessoa pode " fa lar pela medic ina" . As opiniões são estri-tamente individuais na med ic inacomo o são na pol í t ica e nos afazeres públi-cos. U m consenso entre os médicos pode se desenvolver sobre a prática médica aceita, mas os casos indivi-duais podem exigir exceções a proce-dimentos geralmente aceitos, e cáda médico toma responsabilidade apenas

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por suas próprias ações e opiniões. As ações médicas são sujeitas a revisão tanto pelos seus colegas como por con-selhos de revisão médica. Tal revisão pelos colegas pode ter lugar ao nível local ou estadual onde a associação médica estadual geralmente assume a responsabilidade por licenciar médi-cos.

Os médicos lhe contarão sobre procedimentos-padrão, e você pode usar o Merck Manual of Diagnosis and Therapy como um breve guia desses procedimentos. O Physicians Desk fíeference, comumente conhe-cido como PDR, irá revelar muitos fatos sobre drogas e seus efeitos. Co-mo grande parte da informação em ambas as referências provém dos fa-bricantes de drogas, muitos redatores de ciência procuram mais informação com professores de medicina e farma-cologia. Nesse contexto, os redatores de ciência devem sempre inquirir so-bre efeitos colaterais específicos de qualquer terapia por droga. Nenhum produto qu ímico suficientemente po-deroso para ter um efeito significati-vo na neutralização de uma doença ou seus sintomas se apresentará sem alguns efeitos indesejáveis.

Os redatores de ciência iniciantes precisam desconfiar de tratamentos errôneos dirigidos à própria doença e aqueles dirigidos a aliviar os sinto-mas. Os tratamentos do resfriado co-mum, por exemplo, aliviam os sinto-mas mas não atacam os vírus que o provocam. Apenas alguns poucos re-médios, nesse estágio, afetam doen-ças causadas por vírus, e estes estão em uso l imitado e experimental.

Existe também uma respeitada tradi-ção na medicina de que o alívio dos sintomas, particularmente sintomas ameaçadores de vida, de uma doença não-tratável pode dar ao corpo o tempo para curar a si mesmo ou pa-ra que a doença estabeleça seu curso, como acontece com o resfriado.

Os redatores de ciência também devem moderar seu entusiasmo por novos tratamentos e novas drogas ao discuti-los com os médicos. As maté-rias nos meios de comunicação popu-lares a respeito de novos procedi-mentos são um dos agravos, freqüen-temente citados, a médicos e pesqui-sadores praticantes. Tais matérias po-dem ser embaraçosas se o médico ain-da não ouviu falar do procedimento. Mais importante, os médicos temem que estas levantem falsas esperanças em pacientes para quem um novo tra-tamento ou droga não é adequado ou não fornece um prognóstico melhor (um termo médico para prever o pro-vável resultado) que o de outros tra-tamentos. Com algumas exceções, e às vezes resultados trágicos, os médi-cos são mui to conservadores a respei-to de adotar novos tratamentos.

Médicos e hospitais

Quase tão sensível quanto o rela-cionamento médico-paciente é o rela-cionamento médico-hospital. Os hos-pitais são lugares mui to politizados com "pecking orders" estritas e com-plicados relacionamentos de poder entre médicos, equipe administrativa, enfermeiros diplomados, enfermeiros em treinamento, técnicos, secretárias

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e voluntár ios. Os médicos, quase sem exceção, necessitam de aceitação for-mal em cada hospital onde trabalham para poder cuidar dos pacientes que enviam para lá. A permissão pode ser revogada. As anotações que os médi-cos fazem dos pacientes, principal-mente as feitas por cirurgiões, são re-vistas regularmente e confrontadas com o desempenho esperado naquele hospital e, em especial, com os regis-tros de todos os casos de uma doença específica. Alguns hospitais são mais rígidos que outros. U m hospital le-vou anos para reconhecer e afastar um cirurgião de coração que estava legalmente cego de um olho. Entre-tanto, a necessidade de médicos para praticarem num hospital redunda em benef íc io do redator médico, parti-cularmente aquele em in íc io de car-reira. A necessidade de publ icidade dos hospitais ajuda a assegurar a co-operação dos médicos ocasional-mente.

Todos os hospitais precisam enco-rajar a confiança da comunidade ne-les, e procuram fazê-lo através da pu-blicidade a respeito de seu sucesso, equipamentos, instalações, pessoal, serviços e pacientes. A maioria dos hospitais tem alguém que os promo-ve e nos hospitais menores essa pes-soa pode ser o principal administra-dor ou presidente do quadro de dire-tores. Outros têm membros que são profissionais de relações públicas ou de relações comunitárias. Aqueles en-carregados de relações públicas po-dem ajudar a arranjar not íc ias ou co-berturas de matérias. Quando os mé-dicos, pacientes e equipes de hospital

concordam que a matéria irá ajudar a todos, os arranjos para a matéria ofe-recem poucos problemas. Mas há muitas histórias a serem contadas. O administrador do hospital terá pon-tos de vista diferentes da equipe mé-dica. Isso envolve manipulação mú-tua pela imprensa e fonte , natural-mente, mas todas as partes entram nisso com os olhos abertos. Outra ajuda em arranjar matérias pode vir de funcionár ios e pessoal de relações públicas para associações que forne-cem dinhei ro para lutar contra doen-ças específicas, êspecialmente perto da época do esforço de captação de recursos anuais. Como os funcionár ios competentes dos hospitais e das asso-ciações estão dentro da comunidade médica, são com freqüência, infor-mados secretamente de avaliações so-bre a organização e seus vários mem-bros. Eles podem, se o redator de ciência estiver atento ao que dizem, afastá-lo das histórias tr iviais e do médico o u administrador ocasional que procura publ icidade pessoal com pouco fundamento .

Os próprios hospitais sáTo temas legít imos para matérias. Cada qual tem sua própr ia personalidade, po l í -tica e estilo. Você provavelmente de-ve arriscar perder parte de sua boa vontade acumulada e inquir i r sobre tais estatísticas como as taxas de mortal idade e taxas de infecção por estafi lococos em pacientes dentro dos próprios hospitais. Existem al-guns marcos referenciais que servem de indicadores da qualidade dos cui-dados. A comparação de preços e quartos e outros serviços entre hospi-

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tais locais e regionais proporciona matérias bem aceitas. Muitos regis-tros estarão disponíveis, naturalmen-te, nos hospitais públicos, mas qual-quer hospital que aceita pacientes do Medicare e Medicaid, financiados por impostos, enviam relatórios financei-ros públicos às agências que pagam as contas. A Blue Cross também põe em disponibil idade as análises das contas. Tais registros permitem-lhe comparar os custos entre os hospitais lucrativos e não-lucrativos de sua área. Em algu-mas instâncias, esses custos podem ser elevados a uma taxa de 25% ou mais para pacientes de hospitais co-merciais.

Um repórter médico precisa de fa-miliaridade com os vários "códigos" de hospital, ou polít icas que gover-nam a liberação de informação públi-ca sobre pacientes. O repórter médi-co pode esperar ser usado freqüente-mente por editores de notícias para apoiar repórteres gerais na coleta de informações sobre pacientes feridos em acidentes e desastres. O bom rela-cionamento pessoal com as equipes médica, de enfermagem e administra-tiva de hospitais locais ajudará a ace-lerar esse processo. Tais contatos não podem ser desenvolvidos numa crise.

Médicos entre médicos e outros

Os clínicos compõem um dos mais complexos subconjuntos da comuni-dade médica. São sujeitos a mexeri-cos, observações, engodos, inveja, admiração e assim por diante, através de toda a gama de emoções. Praticam individualmente e em grupos, temas

que podem tornar uma leitura fasci-nante para um público dependente deles para assegurar a própria vida. A inveja pode ser elevada na comunida-de médica, e algumas sociedades mé-dicas de cidades ou municípios po-dem ainda ter normas rígidas referen-tes à auto-promoção á custa de ou-tros médicos, embora essas restrições tenham d iminu ído . Em anos anterio-res, os médicos, como os advogados, eram proibidos de fazer publicidade exceto através de listas de telefone e placas de escritório. Algumas socieda-des médicas locais proibiam as listas de especialidades. Em algumas cida-des o presidente da sociedade médica pode ser o único a falar sobre temas médicos.

Os médicos correm graves riscos de abuso de drogas, alcoolismo e ou-tros perigos que cercam as profissões de alto potencial de stress, como ocorre com a comunidade médica in-teira. Regularmente as sociedades médicas e os hospitais encontram fal-sos profissionais entre os médicos da comunidade. As rendas disponíveis dos médicos estão bem acima dos 80.000 dólares em média, de acordo com as pesquisas de Medicai Econo-mics. Os neurologistas levam para ca-sa mais de 90.000 dólares. Rendas como essa tornam os médicos um mercado mui to atraente para anun-ciantes e para esquemas de confiança. Inveja existe entre as especialidades e entre os ramos das artes curativas, co-mo na competição existente entre os osteopatas, os médicos clínicos, e quiropráticos.

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Os médicos regulam suas próprias profissões, embora o l icenciamento seja fe i to através dos governos esta-duais na maioria dos casos. Muitos médicos consideram po l í t i co , embora não obr igatór io, pertencer à Amer i -can Medicai Association. Cada estado tem sua própr ia associação médica com graus variáveis de contro le sobre os médicos que trabalham sob sua égide. Os abusos desse sistema de au-to-regulamentação em favor ou con-tra médicos individuais af loram regu-larmente. As associações de médicos estão entre os mais poderosos coleto-res de d inhei ro para campanha de co-mitês de ação pol í t ica de vários t ipos. Perfis dessas organizações e sua ope-ração oferecem aos redatores uma opor tunidade de explicar importan-tes segmentos de nossa sociedade aos leitores. A eleição de médicos para encabeçar associações médicas da ci-dade, mun ic íp io ou estado propor-ciona-lhe a chance de traçar o perf i l desses líderes médicos em função de seu consul tór io. Outros médicos en-trarão no olhar públ ico através da pol í t ica, negócios e às vezes do cri-me. Os registros da corte e julgamen-tos — inc lu indo julgamentos por má prática — f reqüentemente dão ao jor-nalista médico uma visão di ferente sobre a prática da medicina na comu-nidade. Por causa do potencial de da-no às reputações das pessoas para quem a reputação é um a t r ibu to pro-fissional pr incipal , nenhum aviso de-veria ser necessário sobre a aderência estrita aos mais altos padrões de acu-rácia e imparcial idade ao se lidar com a comunidade médica.

A medicina e a lei A associação médica de seu estado

provavelmente oferece o melhor ca-minho para localizar sumários das leis que governam a prática da medicina no local. Dar uma examinada nessas leis pode sugerir matérias que valham a pena desenvolver. Alguns acharam necessário moni torar o modo como os médicos prescrevem narcóticos num esforço de controlar o abuso de drogas no estado. Os estados também variam na maneira em que permi tem a dispensa de cuidados médicos ao in-digente e ao encarcerado. Escrever sobre como esses subsistemas de dis-pensa de cuidados com a saúde ope-ram oferecem aos leitores mais co-nhecimento de sua comunidade em situações dramáticas.

Leis estaduais e federais governam a liberação da informação médica so-bre indiv íduos. De acordo com estu-dos por A lan F. Westin e M. A . Baker (1972), sistemas de gravação com-putadorizados permi tem acesso ilegal a dados pessoais cuja proteção é das obrigações mais sagradas do médico. É menos culpa dos médicos indivi-dualmente do que dos hospitais, c l í -nicas e companhias de seguro. As companhias de seguro reúnem infor-mações e reclamações de saúde, e as quitações que esses pacientes preci-sam assinar para obter pagamentos de seguro permi tem a troca de dados in-dividuais. Cópias de histórias médicas às vezes aparecem nas mãos de com-panhias de crédito e empregadores. A computadorização também permite a quase todos que saibam os códigos de acesso a t i rarem e venderem cópias

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não autorizadas de registros médicos dos hospitais. A proteção de tais re-gistros em seu estado é tema para uma matéria de alto interesse.

Processos por má prática alegando morte ou ferimentos indevidos como resultado do erro de um médico ofe-recem para os redatores médicos ou-tra área que vale a pena explorar. Os seguros contra as queixas de má prá-t ica custam á profissão médica mais de um bilhão de dólares por ano, se-gundo certas estimativas. A pesquisa médica e as novas técnicas para de-terminar a condição de bebês no úte-ro desencadearam novas questões le-gais para médicos e juizes. Há tam-bém as questões de "wrongful birth" e "wrongful life" para crianças com severos defeitos de nascença que po-dem ser atr ibuídos â prática médica. Periodicamente as decisões sobre tais queixas levam os prêmios de se-guro a níveis que fazem os médicos anunciarem que não irão mais fazer partos.

A lei levanta outras questões per-turbadoras. A suprema corte do esta-do de Washington decretou em 1984, por exemplo, que duas crianças retar-dadas não deveriam ter nascido. Essa decisão coloca os médicos na posição de fazer papel de Deus, dizem os clí-nicos. Casos similares ocorreram em Nova Jersey e Califórnia. Outros sem dúvida acontecerão à medida que a peneiração genética em busca de de-fei tos potenciais de nascimento se tornar mais intensamente usada. Os processos por wrongful birth também podem surgir de nascimentos após operações de esterilização. Como as

crianças podem recorrer à Justiça através de seus pais, estão legalmente protestando contra seu própr io nasci-mento. Tais casos irão aumentar ain-da mais o conf l i to ético, moral e po-l í t ico que já se revolve ao redor do aborto.

Questões literais de vida ou morte envolvem leis e polít icas regulamen-tando quando as pessoas estão legal-mente mortas, uma vez que máquinas de coração e pulmão artif iciais e ou-tros instrumentos podem suster a vi-da física mui to depois que a ativida-de do coração e do cérebro deixa de se registrar em instrumentos de moni-toração. Os redatores de ciência fica-rão envolvidos em histórias sobre se as pessoas podem ou não escolher morrer, solicitando que o tratamento prolongador da vida seja detido por razões de custo e de qualidade de sua vida remanescente. Tais escolhas, fre-qüentemente forçadas sobre parentes abatidos, estão entre os temas que os redatores médicos podem esclarecer.

Medicina e a política pública

Os redatores de ciência e medicina irão escrever sobre a medicina como pol í t ica pública em vários níveis. O U.S. Department of Health and Hu-man Services controla mui to ao di-nheiro e das polít icas federais, embo-ra nos Estados Unidos a saúde públi-ca seja descentralizada.

Cada cidade ou munic íp io de qualquer tamanho terá seu funcioná-rio de saúde pública, geralmente um médico trabalhando em tempo inte-gral ou parcial para supervisionar e

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fazer cumpr i r leis e determinações afetando todos os residentes. A clora-ção e a adição de f lúor à água é um exemplo de po l í t ica de saúde públ i-ca. Os funcionár ios da área de saúde locais também podem supervisionar e operar cl ínicas de saúde pública, pro-gramas pré-natais e outros projetos de serviços médicos. Os números e mesclas de serviços variam de estado a estado e são mu i to sensíveis ao cli-ma po l í t i co local. As inspeções de co-mida de lugares públicos podem ser dirigidas de um escritório desse t ipo. Nos casos de epidemias de gripe ou doenças mais sérias, o func ionár io de saúde pública pode ter autoridade pa-ra fechar escolas e lugares de reunião pública. Grande parte da função do escritório é educacional. Para os reda-tores de ciência e medicina esse escri-tó r io f reqüentemente se revela uma fon te de not íc ia incerta. Mui to de-pende do vigor po l í t i co da pessoa que detém a posição. Alguns funcio-nários têm sido conhecidos por mino-rar a existência de problemas de saú-de para evitar disputas pol í t icas lo-cais.

Como os munic íp ios são circuns-crições administrativas do estado, o of ic ial de saúde pública também po-de responder ao diretor do departa-mento estadual de saúde pública. O departamento de saúde do estado da Flórida localizou pr imeiro os altos níveis de pesticida ethylene dibro-mide (EDB) em bolos empacotados e outras misturas de padaria e proscre-veu sua venda. Nova Iorque e Califór-nia têm departamentos de saúde esta-dual fortes. Em outros estados, os

funcionár ios da saúde pública podem não ter o poder legal para assumirem tais ati tudes. Os funcionár ios de saú-de pública vivem num estado de ten-são com médicos particulares e hospi-tais locais porque prat icam a medici-na em larga escala e porque traba-lham como empregados do governo e não como profissionais liberais. Por serem funcionár ios públ icos, os mé-dicos na saúde pública não precisam ser realmente tão reticentes ao falar com os jornalistas como os outros médicos. Entretanto a po l í t i ca local to rna alguns mu i to t ím idos .

Os departamentos de saúde esta-duais são boas fontes noticiosas para escritores de ciência. Esses departa-mentos proporc ionam atividades de testes e coleta de dados numa escala estadual ou nacional. Números sobre a incidência das doenças são aqui compilados a part ir de dados envia-dos por médicos e hospitais; com fre-qüência, os primeiros avisos sobre au-mentos em doenças af loram aqui. Os estados do oeste, por exemplo, emi-tem avisos sobre animais com raiva e a peste bubônica através de func io-nários estaduais de saúde. Alguns es-tados programam a supervisão de hospitais e clínicas de repouso atra-vés do funcionár io estadual de saúde assim como a organização de progra-mas de saúde pública de larga escala. As estatísticas reunidas aqui propor-cionam ao escritor de ciência út i l in-formação de fundo para matérias so-bre qualquer problema médico.

Todas as fases da saúde pública concentram-se no Off ice of the Sur-geon General in the Department of

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Health and Human Service federal, que provê grande parte do financia-mento para programas estaduais. As estatísticas e análises f luem dos ní-veis local e estadual para os Center fo r Oisease Control , em Atlanta. Os médicos e técnicos do CDC são a tro-pa de choque da epidemiologia envia-da para áreas de crises de saúde pú-blica, tais como ondas de encefalite e meningite, para encontrar fontes e causas e sugerir remédios aos funcio-nários da saúde locais se necessário. Lidam com a doença em ampla escala e levam sua responsabilidade a sério como porta-vozes públicos em situa-ções críticas de saúde. Com freqüên-cia esses funcionários federais de saú-de serão mais condescendentes com os jornalistas do que os funcionários de saúde locais.

Política de pesquisa médica

A pesquisa médica recebe a maior parte de seu f inanciamento através de um ramo do Department of Health and Human Services, os National Ins-t i tutes of Health. O N IH é localizado no subúrbio de Bethesda, em Wash-ington, Maryland, juntamente com um aglomerado de outras organiza-ções federais de saúde. O NIH é pro-vido de mais de 4 bilhões de dólares por ano para a pesquisa básica e apli-cada de saúde. Esse dinheiro é gasto em seus próprios centros de pesquisa ou como verbas para cientistas de pesquisa (que podem ser ou não mé-dicos) em universidades, hospitais e instituições de pesquisa independen-te.

Fundado após a II Guerra Mundial para proporcionar financiar a pesqui-sa biológica básica, o N IH tem sido incapaz de resistir aos esforços pol í t i -cos de dividir seus recursos entre su-bstitutos centrados em uma ou mais doenças. Dir igindo essa atomiza-ção encontram-se as organizações na-cionais de voluntários que têm força pol í t ica através do Congresso e sub-comitês que supervisionam o orça-mento do NIH. Essa divisão de recur-sos, tornou-se conhecida como sín-drome da "doença do mês" entre os redatores científ icos. Na verdade, só em 1984 havia onze institutos dife-rentes. Entretanto, os esforços de lobby da Ar thr i t is Foundat ion (tr inta e seis milhões de sofredores estima-dos nos Estados Unidos) conseguiram produzir o décimo segundo — O Na-t ional Institute for Ar thr i t is and Mus-culoskeletal Diseases. Os outros insti-tutos são National Câncer Institute; Heart, Lung and Blood Institute, Dental Institute; Ar thr i t is , Diabetes and Digestive and Kidney Diseases, Neurological and Communicative Disorders and Stroke; Al lergy and In-fectious Diseases; General Medicai Sciences; Child Health and Human Development; Eye; Environmental Health Sciences; e Aging.

0 que está em discussão é se o di-nheiro da pesquisa, treinamento e equipamentos dispensado através do Congresso ao orçamento de cada ins-t i t u to di lui ou não a pesquisa básica que poderia ser usada para atacar mais de uma doença. Cada inst i tuto, entretanto, tem uma poderosa clien-tela de organizações de saúde volun-

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tárias nos distr i tos de origem de cada representante e senador dos E U A . Es-sas organizações são capazes de exer-cer pressões fortes e emocionais so-bre funcionários eleitos. Existe, é cla-ro, a compet ição pelo dinheiro entre os cientistas de pesquisa básica, médi-cos e aqueles fazendo pesquisas no campo de uma doença específica.

Para o redator de ciência e medici-na popular, cada inst i tu to é uma fon-te de informação. Cada um tem sua própr ia equipe de relações públicas, coordenada através do escritório da diretor ia geral de N I H . Para a impren-sa médica, cada mov imento no siste-ma do N I H é uma história importan-te. Os inst i tutos podem fornecer lis-tas dos receptores de suas verbas e in-formação de f u n d o sobre status da pesquisa em seus vários campos. Os inst i tutos também podem arranjar entrevistas com especialistas em suas diferentes áreas de especialização. O N I H opera a U. S. L ibrary of Medici-ne e bases computadorizadas de da-dos tais como M E D L I N E e Index Me-dicus para pesquisa de l i teratura com-pleta com o pessoal médico e redato-res de medicina.

Drogas e medicina

Outra impor tante fonte de no t í -cias sobre pesquisa e aplicações de saúde é a Food and Drug Administ ra-t ion. A F A D também tem ligações com departamentos estaduais de saú-de, mas seu impacto maior vem atra-vés do l icenciamento d i reto das no-vas drogas de prescrição e principais equipamentos médicos para uso nos

Estados Unidos. Através do Bureau of Biologics, a Food and Drug A d m i -nistrat ion também licencia, conserva e encoraja a produção de vacinas con-tra uma hoste de doenças. Como a medicina preventiva, a vacinação está agora menos favorecida por causa das drogas antibacterianas, tais como as sulfas, penicil inas e tetraciclinas que efetivamente curam a maioria das doenças com menos despesas e pro-blemas. Mas como os ant ib iót icos func ionam apenas em infecções bac-terianas, a vacinação antes da infec-ção é a estratégia mais eficiente para lidar com doenças viróticas. Confun-dir a eficiência dos ant ib iót icos con-tra doenças bacterianas com trata-mento possível de infecções viróticas é uma das armadilhas para o redator de ciência iniciante. Muitas doenças viróticas não têm vacina que as cure. Com efei to, remédios eficientes para doenças raras podem não ser produzi-dos porque seu desenvolvimento e produção não permi t i r iam lucros. Por algumas dessas condições, a F D A di-rige um fundo de pesquisa e desen-volv imento de "orphan drugs".

O conceito de vacinações em mas-sa sofreu um revés em 1976, quando funcionários da saúde perceberam uma ameaça de gripe porcina morta l varrendo os Estados Unidos. Uma va-cina fo i apressadamente colocada em produção e administração. Mas reve-lou-se a possibil idade do ato de vaci-nação produzir uma condição de in-validez conhecida como s índ romede Guil lain-Barre. Os analistas da repor-tagem c ient í f ica com freqüência ci-tam a cobertura noticiosa do progra-

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ma de vacinação contra a gripe porci-na como o exemplo do governo ma-nipulando os meios de comunicação para apoiarem uma inoculação pre-matura em massa apenas para ver os veículos voltarem a opinião contra o projeto porque os médicos e funcio-nários de saúde pública não preveni-ram contra os riscos a indivíduos sen-síveis.

0 resultado dessa descoberta fo i a relutância de muitos países a darem a vacina difteria-coqueluche-tétano (DPT) às crianças. Conquanto as chances de uma reação fatal à vacina são mui to menores que o risco de morte por qualquer uma das doenças, as incertezas da decisão paralisam um grande número de pais. Uma questão adicional reside na relutância dos fa-bricantes de vacinas em seguirem os passos daqueles médicos pioneiros que descobriram a inoculação contra a doença. Onde as vacinas foram cul-padas por danos, grandes julgamentos legais fizeram com que os fabricantes de vacinas repensassem a lucrativida-de da produção de vacinas.

Drogas e segurança

As drogas, ao menos por defini-ção, são venenos. Entre os truísmos da prática médica "dar alguma coisa" a um paciente traz resultados. Às ve-zes essa "alguma coisa" é um place-bo, uma pí lula de açúcar sem poten-cial curativo demonstrado, que não obstante, parece ajudar o paciente. Por que os médicos e pesquisadores pensam que funciona com freqüência é uma matéria que merece desenvol-

vimento. A investigação irá levá-lo para dentro de uma das áreas quase místicas da f i losofia médica na qual os médicos invocam os maravilhosos poderes do corpo de curar a si pró-prio. Mas os humanos têm uma fasci-nação pelo consumo de drogas assim como a maioria dos médicos. A in-dústria das drogas está baseada nessa procura de uma "bala de prata" que, na mitologia da farmacologia, derru-be magicamente doenças específicas. Até recentemente a maioria das dro-gas era derivada das plantas seja di-retamente, seja por identificação dos produtos químicos efetivos que po-diam por sua vez ser manufaturados. Esses produtos químicos das plantas são a base de úteis remédios regio-nais. Agora a química ligada a com-putadores promete a capacidade de desenhar moléculas químicas que preencham as especificações para o combate à doença.

O Bureau of Drugs da F D A , teori-camente, moni tora a segurança das drogas. Na verdade verifica dados de uma série de testes de laboratório, testes animais, testes humanos em pe-quena escala e testes de campo "c l í -nicos" em grande escala. Esses dados são fornecidos, de modo geral, pelo fabricante da droga. Esses testes pré-licenciamento podem custar ao fabri-cante de drogas milhões de dólares, incentivo suficiente para obter novas drogas e equipamento médico para colocar no mercado. Às vezes a FDA contrata testes independentes para verificar os dados do fabricante ou explorar onde este não entrou. Até as primeiras leis de segurança contra

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drogas, em 1938, os fabricantes de drogas podiam comercializar qual-quer coisa. O governo t inha de provar que era perigoso para conseguir que uma droga suspeita fosse retirada do mercado. As leis promulgadas desde então fazem o fabricante provar a se-gurança e a eficácia antes da aprova-ção. A F D A moni tora os dados e ana-lisa o desenho da pesquisa para ver se os testes produzirão os dados corre-tos.

A lei de 1938 bro tou da tragédia. A sulfani lamida, a primeira droga mi-lagrosa, requeria doses grandes, p í lu -las mu i to grandes que as crianças não engoliam com facil idade. Como a sul-fani lamida não se dissolvia em água ou álcool, os solventes médicos mais comuns, as companhias começaram a vender um el ixir ( l íqu ido) de sulfa misturada com diethyleneglycol, me-lhor conhecido como anticongelante. Cerca de 100 pessoas, pr incipalmente crianças, morreram por ter os seus rins destruídos, risco que poderia ter sido detectado antes, como o f o i mais tarde, através de testes com ani-mais. Esse incidente resultou no re-quer imento legal de demonstração de segurança antes da colocação no mer-cado e na subcultura médica de in-dústrias voltadas para testes de dro-gas e na criação de ratos. Abunda a suspeita de que parte dos testes é ma-nipulada para produzir resultados fa-vorecendo o fabr icante. Tentar man-ter o contro le de qualidade dos testes e da administração de testes perma-nece como uma preocupação cons-tante para todos os laboratórios.

O registro da F D A e da indústria de drogas é, no m í n i m o , confuso. As-sim o repórter médico não deve f icar surpreso de ver drogas retiradas após terem sido colocadas no mercado. Todas as agências do governo rece-bem crí t icas por se basearem demais em dados fornecidos pela indústria. Com milhões investidos no desenvol-v imento e testes a pressão aumenta sobre os administradores das compa-nhias farmacêuticas para começar a vender o p r o d u t o e recuperar seus custos. O investimento do governo e da indústria na droga interferon, que parecia prometer imunidade contra um amplo expectro de vírus, fo i esti-mado em 5 0 0 milhões de dólares sem qualquer p rodu to út i l . Se o F D A en-contrar companhias submetendo da-dos falsos de testes, pode pr incipiar uma ação legal. Entretanto, o poten-cial para ganhar bilhões por meio de vendas pode just i f icar os riscos, aos olhos da companhia farmacêutica. As multas são comumente aceitas como parte do custo de fazer negócios.

Testemunhos relatados quando as v í t imas de uma droga levam uma companhia à corte indicam que os fa-bricantes podem aceitar rotineira-mente a possibil idade de certo núme-ro de mortes. (Out ro exemplo de ris-co imposto aos consumidores por agentes externos). Os jornalistas mé-dicos podem bem acrescentar a seu repertór io de perguntas algumas so-bre o número esperado de mortes preditas para qualquer droga nova. Que número é aceitável? Uma droga contra ar t r i te fo i ligada a 29 mortes na Europa quando o Commi t tee on

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the Safety of Medicines da Inglaterra a proibiu. Os testemunhos de paren-tes de um americano v í t ima da droga que processaram o fabricante indica-ram que o diretor de pesquisa do fa-bricante não considerava isso inespe-rado. Poucas, se alguma, indústrias farmacêuticas saíram dos negócios por produzirem maus remédios.

A história clássica da prevenção no marketing de drogas reside no ca-so da Tal idomida. A Dra. Francês D. Kelsey da F D A recebeu a maior re-compensa civil do governo por sua ação ao bloquear sua venda neste país. Como alguns relatórios sobre o tranqüil izante mencionavam exem-plos de neurite periférica, uma dor-mência nos dedos e outras extremida-des, ela deteve a aprovação sob tre-menda pressão do fabricante de dro-gas e seus distribuidores. Enquanto esperava, os médicos europeus come-çaram a relatar milhares de crianças nascidas sem membros, a par de ou-tros defeitos, ou com nadadeiras em lugar de braços depois que suas mães tomaram a droga durante a gravidez. O caso teve dois efeitos, um deles jor-nalístico. O FDA começou a requerer testes para defeitos de nascença po-tenciais. O outro efeito fo i estimular o London Times num desafio quase aberto às leis da Inglaterra contra a publicação de matérias pré-julgamen-to sobre o caso na corte. A equipe do jornal arriscou-se à censura depois de descobrir que o fabricante inglês es-tava usando táticas mui to duras na negociação de acordos com pais das crianças deformadas pela tal idomida.

Escrever sobre testes Como resultado desse incidente na

década de sessenta, que não fo i com-pletamente acertado, as companhias farmacêuticas passaram a fazer testes mais longos e complicados e reduzi-ram o r i tmo da introdução de novas drogas. Até o f inal do século, muitas novas drogas estarão entrando no mercado. Algumas, como a droga contra artr i te, serão recolhidas devi-do às suas conseqüências. Os jornalis-tas de ciência podem esperar também escrever sobre acusações contra fabri-cantes que estejam ocultando mortes por causa de algumas drogas. Tam-bém haverá pistas de que as compa-nhias estão super legisladas enquanto os fabricantes pressionam por testes mais fáceis e marketing mais rápido. A maioria dos redatores de ciência aceita esses testes por seu valor apa-rente, raramente inquir indo profun-damente quanto aos métodos e técni-cas. Entre os testes mais significativos de eficiência ou efetividade há varia-ções do teste "dup lo cego". Uma par-te de um grupo de testes recebe o produto; a outra parte, o grupo de controle, não recebe. Quando o teste é administrado por uma terceira par-te neutra, mesmo o experimentador não sabe que membros do grupo re-cebem a droga que está sendo testa-da. Isso minimiza os efeitos de place-bo, onde as pessoas demonstram me-lhoria simplesmente porque pensam estarem obtendo o remédio ou por-que alguém está lhes prestando aten-ção.

Os jornalistas não devem aceitar como válido nenhum teste sem grupo

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de controle a não ser que o pesquisa-dor ofereça razões aceitáveis para não usar o contro le. Algumas condições são tão raras que juntar dois grupos para um teste pode ser impossível. Os estatísticos médicos trabalham com números de pequenos grupos, com li-mites reconhecidos de validade, por essa razão. Questões éticas em vez de proporcionar t ra tamento médico a alguns e negá-lo a outros podem às vezes ser responsáveis pela invalida-ção do teste. Como uma medida para até quão longe um teste pode se des-viar dos m ín imos aceitáveis, alguns experimentadores acreditam que ne-nhum teste com menos de 100 amos-tras de indiv íduos serão suficientes. Os testes qu ímicos ou de campo de al imentos, drogas e produtos médicos envolveram milhares de pessoas. Com mui ta freqüência esses testes podem ser conduzidos em países estrangeiros onde as normas em relação às drogas são m u i t o mais relaxadas. Os escrito-res de ciência devem procurar deta-lhes sobre como os testes são condu-zidos.

Os testes em animais precedem e às vezes substi tuem os testes huma-nos. Você não provoca deliberada-mente um câncer em seres humanos, por exemplo, para ver se pode curá-lo. Também os animais podem passar por vários t ipos de nascimento-mor-te para aprox imar os ciclos humanos que ultrapassariam a vida dos experi-mentadores. A extrapolação de testes animais nunca é exata. Esse é o pri-meiro contra-ataque lançado quando um fabricante de um produto comer-cial é prejudicado por testes e resulta-

dos de testes. A outra contraqueixa é que oferecer à força quantidades extremamente grandes de um produ-to, ou adi t ivo a l iment íc io , por exem-plo, proporc iona leituras falsas. Essa posição contém tanto a verdade quanto a hipérbole enganosa. Depen-dendo dos animais escolhidos para os testes, as substâncias que causam da-nos aos sistemas humanos — c o m o in-dicado pelos antigos testes animais com drogas de sulfa — tenderão a causar danos a sistemas animais simi-lares. Mu i to da confiança nos testes com animais desenvolveu-se através de novos testes com produtos qu ím i -cos que inicialmente eram suspeitos como fontes de doenças humanas. O back-testing envolve dar aos animais substâncias ligadas às doenças huma-nas e ver se resultam em condições si-milares. Os pesquisadores também examinam os dados animais retros-pectivamente quando reações inespe-radas às drogas aparecem. A lógica convencional assusta-se com a idéia de que oferecer aos animais doses realmente grandes de uma substância, como adoçante art i f ic ial , por exem-plo, prova que a substância causa câncer nos humanos. O ataque cont i -nua: "Por que você teria de t o m a r 50 barris de refrigerante para obter essa quant idade."

Isso é verdade, até aí . O câncer, por exemplo, é uma doença que se desenvolve lentamente ao longo de um tempo relativamente grande e em taxas imprevisíveis. A f i losof ia sim-plif icada subjacente a esses testes ani-mais af i rma que algumas cobaias fi-cam com câncer ou outra doença

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com alimentação forçada de cur to prazo, números previsíveis de sujei-tos, incluindo os humanos, irão de-senvolver cânceres similares ao longo de um per íodo mais amplo com dosa-gens menores. E em 50 anos você po-deria mu i to bem estar exposto ao equivalente de vários barris de uma substância. Isso não significa que vo-cê, individualmente, será ou não uma v í t ima. Como ind iv íduo, você pode não ser suscetível, exatamente como alguns fumantes inveterados não de-senvolvem câncer nos pulmões. Mas isso é uma maneira de desenvolver al-gum conceito sobre os " fatores de r isco" aumentados quando números de pessoas ou animais são expostos ao p rodu to qu ím ico suspeito. Quan-do comparado com a incidência co-nhecida de uma população geral ou grupo de controle cont ra indo uma doença, os pesquisadores podem des-cobr i r os números indicando um fa-to r de risco de 1,3 ou 1,5 para ani-mais recebendo a substância. Isso sig-nif ica uma chance de 30% ou 50% maior de contrair a doença através da exposição â substância sendo testada. Os cientistas se sentirão mais confor-táveis com os redatores de ciência que abordam o relato dos riscos cau-telosamente, cuidadosamente.

Peça mais detalhes aos cientistas sobre tais fatores de risco. Isso ajuda-rá a aumentar a credibi l idade de suas matérias. Poderá ser boa prática pro-curar detalhes num modelo experi-mental usado desde que um esquema particular de testes pode produzir uma taxa mais baixa ou mais alta de doença do que outros modelos para o

mesmo teste de doença. Parte da vali-dação da co-relação entre o câncer e o f u m o , colocada mais de 20 anos atrás no pr imeiro relatór io do U.S. surgeon general, por exemplo, está sendo superada na crescente taxa de câncer nos pulmões entre as mulhe-res, muitas das quais fumavam quan-do o re latór io apareceu pela primeira vez. Entretanto, esses outros estudos relacionados mostram "associação", não causa e efeito claramente def ini-dos, de modo que sempre haverá es-paço abundante para os especialistas argumentarem sobre a qualidade tan-to da experiência como da interpreta-ção dos dados. O consenso e aceita-ção pela comunidade médica de tais resultados deve ser colocado à prova pelo repórter.

Todas as sugestões sobre como moni torar a " b o a " ciência se aplicam à medicina. O redator de ciência deve investir em qualquer de vários bons dicionários médicos e em u m ou mais livros leigos sobre cuidados médicos. Obviamente não há subst i tuto para cursos organizados de fisiologia ou medicina, mas você não é médico e não estará fazendo diagnósticos. Vo-cê apenas escreve sobre doenças. Vo-cê está procurando comunicar o mais acuradamente possível o que as auto-ridades médicas contam a você. Cur-sos formais irão ajudar a sua compre-ensão se você t iver a opor tunidade e o tempo de freqüentá-los. Os cursos da saúde pública e de administração hospitalar são comuns em muitos co-légios. Os redatores médicos estão sempre num processo de aprendiza-do.

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Quase todos estão fami l iar izados c o m relatos jo rna l ís t icos e várias do-enças, sejam dramat izados e enfoca-dos numa única v í t i m a ou sumariza-dos. Possivelmente é a matér ia médi-ca escrita e t ransmi t ida mais f reqüen-temente pelos meios de comunicação de massa. A l g u m a pesquisa indica que essas não são as matérias que mais interessam aos leitores. As ma-térias sobre problemas específ icos de saúde e doenças podem ter pequeno impac to em leitores indiv iduais, con-c lu iu Hugh M. Culber tson e G u i d o H. Stempel I I I (1984) após pesquisar lei-tores de u m g rupo de jornais do cen-tro-oeste. Os custos médicos e assun-tos de seguros ocupavam a atenção de 74% dos pesquisados, mas apenas 12% das menções dos jornais. Essa preocupação c o m os aspectos econô-micos da medic ina estava dez vezes mais elevada do que ou t ros interesses relacionados à saúde.

Experiências

1. Procure em um ou mais Periódicos mé-dicos por um relatório de estudo de caso e transforme-o numa matéria de ciência popular.

2. Visite os laboratórios de um funcioná-rio da área de saúde da cidade ou municí-pio e reúna material para uma matéria so-bre o que se passa ali. Arranje para entre-vistar a pessoa encarregada do escritório em suas operações pela sua cidade.

3. Arranje, se puder, que o presidente ou diretor executivo da sociedade médica da cidade, município ou estado visite a classe e fale tanto sobre a cobertura de medicina dos veículos de comunicação de sua área como sobre os mais prementes problemas médicos, inclusive a economia.

4. Selecione um ou mais hospitais locais ou da área e reúna material para um perfil sobre o hospital, os serviços que oferece, como opera, suas especialidades, custos por paciente, seus problemas e assim por diante. Junte amostras de boletins inter-nos, memorandos de quadros de aviso, press releases e revistas externas que o aju-dariam a documentar sua matéria. Diga que serviços de emergência são disponíveis.

5. Obtenha estatísticas de seu funcionário de saúde pública local para mostrar as con-dições médicas de sua cidade. Quantos mé-dicos você tem em relação à população ge-ral? Isso é mais alto ou mais baixo do que a média estadual ou nacional?

6. Passe um dia ou noite como participan-te observador, se puder obter permissão, com a equipe de emergência de um hospi-tal, uma equipe de emergência de serviços médicos, uma clínica de emergências me-nor ou uma clínica de saúde pública.

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Capítulo 9

Controles sobre notícias de ciência

MUITOS CONTROLES FORMAIS E INFORMAIS rodeiam a comunicação de informação sobre ciências, medici-na, engenharia e tecnologia. Embora alguns sejam comuns a todo jornalis-mo, esses controles e sua aplicação variam com o país, o assunto, o tem-po e a ocasião. É importante compre-ender a natureza desses controles porque eles podem retardar a reunião ou publicação de informação em mo-mentos os quais você menos pode su-portar um retardamento. Sabendo que existem, você pode antecipar-se e dessa maneira evitar situações que provocam confronto e demora.

Alguns controles são únicos à ciência e tecnologia como cultura e como negócio. Outros controles, tais como as leis do libelo e invasão de privacidade, afetam todos os jornalis-tas, mas têm significados especiais quando você lida com cientistas, mé-dicos, e engenheiros ou seu traba-lho. Outros controles, primariamente aqueles de censura direta em nome da segurança nacional, têm dentes mais afiados tanto para os jornalistas como para os cientistas.

Convenções da ciência

Falamos antes sobre o pr inc íp io de que os dados se tornam "c iência" apenas após a revisão pelos colegas de

um cientista e publicação num perió-dico de reputação. Assim você pode-rá encontrar resistência a qualquer discussão detalhada do mais atual tra-balho de pesquisa de um cientista. Is-so é um exemplo de como a redação de ciência pode ser controlada pelos códigos profissional e ético de outro grupo. Uma das querelas mais gra-ves para os redatores de ciência tem sido uma disputa desse t ipo com o Dr. Arno ld S. Relman, editor do New England Journal of Medicine. Sobre o Dr. Franz Ingelfinger, predecessor do Dr. Relman no NEJM, o periódico es-tabeleceu uma pol í t ica de que ne-nhum trabalho de pesquisa que tivesse sido discutido extensivamente na im-prensa ou em periódicos da profissão médica seriam aceitos para publicação no NEJM. Essa decisão contr ibuiu para o termo "Ingelf inger Rule" — regra Ingelfinger — para a redação ci-ent í f ica. Poucos outros periódicos se-guem essa prática tão rigidamente. Em parte, submeter um artigo ao NEJM é concordar com o m í n i m o de publicidade enquanto este está sob re-visão ou no prelo. Embora o Dr. Relman (1979) tenha di to que não faz objeção a reportagens noticiosas das apresentações nas reuniões cien-t í f icas, desencoraja a concessão de entrevistas posteriormente, a distri-

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buição de cópias de t rabalho â im-prensa ou cópias de slides e gráficos, uma vez que esses podem aparecer no NEJM. Tal gráfico precip i tou uma confrontação entre o redator de ciên-cia Johnn E l l io t t , do Journal of the American Medicai Association, o Dr . Relman e o Dr . Sander Shapiro, um dos dois autores da University of Wisconsin de um trabalho de pesqui-sa l ido numa reunião da American Fer t i l i t y Society (E l l io t t , 1979).

A Regra Ingelfinger sofre oposição de dois grupos de redatores de medi-cina e ciência. Os redatores de jornais sustentam que as pol í t icas da NEJM podem arrolhar informações que os médicos precisam imediatamente. Se tal informação aparece pr imei ro num trabalho l ido numa reunião aberta médica e c ient í f ica, os médicos que não assistiram poderiam ser alertados por reportagens noticiosas. O o u t r o grupo de oposição inclui redatores e editores de revistas comerciais de me-dicina e saúde, algumas populares e algumas dirigidas unicamente a médi-cos. Enquanto os redatores de veícu-los de massa têm o seu papel de aler-tar o públ ico, as revistas de médicos objet ivam passar aos médicos o má-x i m o de informação ú t i l que o tempo e o espaço permi tem. Essas publica-ções médicas comerciais estão em compet ição econômica direta com o NEJM, embora o a l t ru ísmo de ambos os grupos seja temperado pelo auto-interesse em levar as informações a seus públicos pr imeiro.

Os médicos, af i rma o Dr . Relman, têm o di re i to de ler sobre os novos desenvolvimentos inicialmente na li-

teratura profissional; e os redatores de ciência devem freqüentar as reu-niões apenas para informação de fun-do, uma vez que mu i to do trabalho apresentado nas reuniões é incom-pleto e não revisado e pode jamais vir a ser publ icado. Ele também aponta que a NEJM precisa de material fres-co, original e não-publicado para manter seu status. Embora o foco de debate seja sobre o material apresen-tado em reuniões cient í f icas, o Dr . Relman também disse aos repórteres que a pol í t ica visa tentar evitar a li-beração de qualquer informação não verif icada, tal como afirmações de cura de câncer que levantam falsas es-peranças (McDonald, 1983) .

Os argumentos de Relman foram derrubados pelos contra-argumentos de outros editores de periódicos. O Dr. Wi l l iam Barclav, editor do Jour-nal of the American MedicaI As-sociation, diz que os médicos não tra-tam pacientes na base do que lêem na imprensa popular. O Dr. Edward Hu th , editor de Annals of Internai Medicine, diz que conf ia nos veículos de massa e na imprensa médica para preveni-lo sobre novos desenvolvi-mentos. O Dr. Michael Gregg, editor de Morbidity and Mortality Weekly Report, publ icado pelos Centers for Desease Cont ro l , diz que tal po l í t ica pode inibir o cientista de relatar prontamente informações crít icas re-levantes à saúde pública. Mark B loom, redator de ciência para American Health e um dos cr í t icos mais severos da regra, apresentou evidência de que a pol í t ica não tem apoio dos editores

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de periódicos ingleses e canadenses ( "B loom vs. Relman", 1982).

A rigidez do sistema de informa-ção cient í f ica pode ter retardado por vários anos o reconhecimento públi-co e médico de que as crianças eram vulneráveis à Sfndrome de Imunode-ficiência Adquir ida, AIDS. O Dr. Larry Bernstein do Albert Einstein College of Medicine contou à redato-ra de ciência Rita Rubin (1985) que em 1981 ele e outros médicos tenta-ram persuadir os editores do periódi-co da American Academy of Pedia-trics que desde 1978 eles estavam re-cebendo, duas ou três crianças a cada semana, com sintomas de A IDS. Os editores do periódico rejeitaram o relatório proposto pelos médicos ad-vert indo sobre a A IDS e pré-AIDS em crianças. Naquele estágio inicial da pesquisa sobre a AIDS, acredita-va-se que a doença fosse l imitada a homens homossexuais adultos. De modo que se passaram quase cinco anos antes que os perigos mais am-plos da contaminação da A I D S se tornassem conhecidos. Wil l iam Stock-ton, antigo diretor de notícias cient í-ficas do The New York Times, amea-çou recorrer ao Freedom of Informa-t ion Act para obter informação onde a pesquisa é financiada com dinheiro de impostos. "Sou um jornalista em primeiro lugar e redator de ciência em segundo", disse ele ao grupo de redatores de ciência, af i rmando que a tarefa da imprensa é informar o pú-blico, não educá-lo. Stockton disse que havia submetido uma de tais so-licitações de informação retida pelo The Journal of Infectious Diseases.

Entretanto, o artigo solicitado apare-ceu numa edição distr ibuída pouco depois que a solicitação do FOI t inha sido arquivada, e Stockton não cont i -nuou no assunto. (Frenkel, 1981).

Liberdade de informação

Embora o Freedom of Informa-t ion Ac t tenha sido usado para obter dados cientí f icos, os esforços não partiram de jornalistas mas de empre-sas. Jerry E. Bishop, redator de ciên-cia para The Wall Street Journal, mantém a posição de que apenas quando fundos para pesquisa provêem totalmente de fontes privadas o cien-tista tem o direi to de decidir quando e onde a informação deve ser libera-da. Diz Bishop: "Uma obrigação fun-damental de qualquer um que acei-ta fundos públicos é a revelação pública de como e onde esses fundos são usados. Essa revelação não pode ser feita quando quem recebe o di-nheiro decide fazê-la. Deve ser fei ta por solicitação" (1982, 2).

Tal posição não recebeu apoio ju-dicial. Em 3 de março de 1980 a Su-prema Corte dos EUA decidiu que o grupo privado ou individual traba-lhando com fundos federais podia re-ter informação que não houvesse sido fornecida a uma agência do governo. A corte a f i rmou que o Congresso não torna uma pessoa "agente" do gover-no ao conceder-lhe fundos para pes-quisa. Antes a corte havia di to que os dados não podiam ser arrancados de um grupo privado para o benefício de out ro grupo em termos de ganho financeiro (Forsham v. Califano,

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1980, 1978; Ciba-Geigy v. Mathews, 1977; Washington Research Project v. Dept. of Health, Education and We/fare, 1974).

U m dos medos dos cientistas a res-peito do uso da FOI e das leis esta-duais de registros abertos se refere à revelação de nomes de pacientes ou temas de pesquisa se os dados brutos podem ser obt idos l ivremente. A po-sição das cortes leva os cientistas ago-ra a submeter sumários de dados ao patrocinador de sua agência uma vez que apenas o material que estiver re-almente nas mãos de agências fede-rais pode ser forçado a revelações. Antes da legislação da Suprema Cor-te, um repórter da Uni ted Press In-ternat ional obteve dados do National Inst i tute of Neurological and Comu-nicative Disorders and Stroke antes da sua publicação. O cientista fo i cri-t icado publ icamente por liberar os dados prematuramente, quando na verdade estes fo ram forçados sob protesto da NINCDS, relatou o Dr . Donald B. Tower , t i tu lar do institu-to. Inacurácias na história causaram temores e ansiedades sem fundamen-to a respeito dos efeitos de anestési-cos em bebês durante o nascimento, revelou Dr. Tower aos redatores de ciência (1979). A queixa do Dr. Tower fo i ecoada por Mor ton H. A l -per, M.D. anestesista-chefe do Boston Hospital for Women.

Quando estiverem buscando infor-mação sob alegação do FOI ou a lei dos registros abertos, os redatores de ciência talvez devam considerar o ju l -gamento em duas fases. Primeiro vale a pena ter a informação depois que

você a conseguiu? Segundo, se se tra-ta de dados brutos, você pode fazer com que sejam interpretados com ha-bilidade? Então vem a decisão sobre publ icar a matéria ou não. No caso do NINCDS ou casos de pesquisa in-completa, (que poderiam bloquear a complementação de um programa) contatar os pesquisadores assim co-mo examinar os seus dados poderia ter evitado o surgimento de temores sem fundamento sobre os perigos dos anestésicos, dos quais há diversos. Embora toda experimentação com humanos requeira a assinatura de um "consent imento consciente" que su-postamente explica o projeto,algumas pesquisas podem ser prejudicadas pe-la publicidade integral ou errada a respeito do seu objet ivo. Por ou t ro lado, uma matéria que empurra os leitores a perguntarem mais a seus médicos sobre procedimentos médi-cos d i f ic i lmente representa uma in-trusão para o médico.

Relatórios e recomendações de programas em áreas de ciências apli-cadas tais como defesa, exploração do espaço, transportes e saúde no tra-balho podem ser retidos para escon-der avaliações embaraçosas da agên-cia. A segurança nacional freqüente-mente é dada como a razão do segre-do. Apenas onde a eficiência da agência, os gastos ou outras decisões estejam em questão, a necessidade de informar leitores sobre atividade of ic ia l parece ter primazia. A aplica-ção de julgamento à matéria perma-nece nas mãos do redator da ciência, mas a revelação completa de qual-quer fase da atividade do governo pa-

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rece mais desejável que o segredo. Es-sa f i losof ia não é universalmente par-ti lhada.

Copyright e marca registrada

Os redatores de ciência podem in-correr em problemas legais em duas outras áreas. A revista Science venceu um julgamento contra Science Digest em 1980 porque a capa e o logotipo de uma Science Digest redesenhada enfatizavam a palavra "Science". En-quanto a corte não disse que a infra-ção era deliberada, decidiu que "D i -gest" não estava realçado da mesma forma. Poucos redatores de ciência criam revistas, mas se você desenha t í tu los de colunas ou boletins not i-ciosos (ou revistas) saiba que os pu-biishers de publicações estabelecidas lutarão arduamente para defender seus direitos de propriedade. Quase todo redator recebeu uma nota de uma ou outra companhia queixan-do-se sobre o uso do nome de uma marca registrada sem capitalização e crédito.

Como é colocada tanta ênfase em basear matérias de ciência e medici-na em trabalhos lidos em reuniões, o risco de infr ingir o copyright é mui to real. Os fatos não são protegidos por copyright, embora seja honesto dar crédito aos cientistas e periódicos ci-ent í f icos em todas as matérias que usam seus dados. Tal crédito não pre-cisa ser tão elaborado a ponto de es-tragar sua matéria. E se o periódico publicou uma parte errada da pesqui-sa, seu editor pode dividir a culpa com você.

A violação ao copyright e o plágio envolvem o uso das palavras exatas de um autor, conforme publicadas. Não há linhas-guias rígidas sobre que quantidade você pode republicar de um periódico ou trabalho preparado para uma reunião, que é protegido automaticamente como trabalho cria-t ivo, como o é o manuscrito de um redator de ciência. Algumas citações extraídas de um trabalho ou artigo de jornal, com o respectivo crédi to, provavelmente não atrairão crít icas ou, pior, um processo legal. Entretan-to , publicar todo ou a maior parte de um trabalho como se tivesse sido es-cr i to para a sua publicação se aproxi-ma de uma violação clara tanto do es-p í r i to como da letra da lei de su-pyright. Um trabalho impresso em múltiplas cópias e d is t r ibu ído numa reunião pode ser considerado "pub l i -cado" num sentido l imitado, mas a propriedade do copyright permanece com o autor até que ele assine um formulár io legal transferindo o direi to de publicação. Se você deseja publi-car um trabalho especialmente bom e que vá ser l ido, você e o editor de sua publicação devem assegurar a obten-ção de permissão escrita e oferecer pagamento ao cientista. Isso é fe i to regularmente em publicações técni-cas, uma vez que as idéias ganham autoridade sob a assinatura de um ci-entista. Mas seus editores devem tra-tar honestamente o cientista-autor.

Controles administrativos.

Diversos controles administrativos ou imprevistos podem interferir em

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seu t rabalho. Alguns são deliberados e alguns são acidentais. Patrick Young, redator de ciência para a New-house News Service, descrobriu que os funcionár ios de informações do governo ás vezes tornam-se com-petidores. Ten tou obter o que pensa-va ser uma história mais ou menos ro-t ineira sobre o pro jeto de pesquisa sobre os olhos patrocinado pelos N I H . O médico insistia em que a co-ordenação fosse através do escritório de informações do N I H , que arrasta-va os pés nas respostas às perguntas de Young. Quando Young questio-nou a legalidade de se reter informa-ção, descobriu que os N I H t inham seus próprios press releases moven-do-se em processo de liberação den-t r o dos N I H . Young re t i rou sua ma-téria do escritório pr incipal de comu-nicação dos N I H baseado em que as perguntas dos meios de comunicação deviam ser respondidas antes, mesmo se u m press release está em andamen-t o (1981) .

Isso provoca uma disfunção no processo de informação. As matérias ás vezes se perdem quando um jornal ou estação fura uma matéria. Por causa disso é aparentemente exclusi-va de um compet idor , os outros veí-culos podem ignorar a matéria até que seja realmente uma matéria mui-to grande. Isso resulta em informa-ções úteis que deixam de entrar em circulação geral. Funcionários de in-formação alertas com freqüência pre-param uma conferência de imprensa com o cientista ou arranjam algum ou t ro evento de míd ia para dar um

ângulo novo á história para redatores que haviam sido passados para trás.

Uma maneira de fugir de um blo-queio burocrát ico ou administrat ivo é descobrir até que altura da hierar-quia da agência o apoio se estende. Freqüentemente u m empregado de n í-vel inferior entende equivocadamen-te a po l í t ica ou a força que recebe para uma ação. Empurrar a questão escada acima pode abrir negociações que produzam uma melhor compre-ensão por parte de todas as pessoas quanto ao que realmente é a pol í t ica em questão. Algumas vezes o pessoal da informação sente-se simplesmente t í m i d o em relação a abordar um cien-tista para uma entrevista. E às vezes lhes dizem para serem evasivos com u m jornalista. Alguns cientistas-ad-ministradores usarão outra pessoa, se puderem, para evitar discutir tópicos sensíveis. Tente chamar a pessoa dire-tamente se lhe disserem que é " m u i t o ocupada para atendê- lo". Ou t ro tru-que é falar ao assistente do adminis-trador ou ir a u m superior. Mas tente a negociação com outras táticas antes de usar a art i lharia pesada de uma so-licitação de FOI . Isso é mais rápido e menos danoso às relações no interior de uma burocracia. Às vezes, entre-tanto , você poderá ter de usar a FOI o u as leis dos registros abertos para convencer os administradores de que é sério.

Para repetir , o jornal ismo c ient í f i -co é uma questão de ju lgamento, e você pode descobrir que as boas rela-ções com o func ionár io de informa-ções lhe proporcionarão resultados melhores do que passar por cima do

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escritório de informações. Algumas pessoas da área de informações são rápidas e cooperativas; outras podem precisar informar-se. Os melhores po-dem levar você através da burocracia e ajudá-lo a convencer as fontes dos méritos de se conceder ehtrevistas. Ocasionalmente você pode querer le-var uma situação â atenção dos fun-cionários da associação local ou na-cional de redatores de ciência ou me-dicina e procurar sua ajuda para as-segurar a liberação de informação.

Outra alternativa é encontrar fon-tes de informação. Se você fo r ousa-do e disposto a arriscar-se ao desa-pontamento, f reqüentemente poderá fazer suficientes chamadas telefôni-cas a pesquisadores que estejam de-senvolvendo trabalho similar para conseguir arrancar-lhes a essência da informação bloqueada. Essa é uma tát ica usada f reqüentemente quando uma comissão especial ou painel ou t i tu lar de uma agência retém infor-mação enquanto está arranjando uma conferência de imprensa para a tele-visão. Se a matéria vale a pena, se va-le o t rabalho extra e a despesa de chamar qualquer especialista que po-derá ter uma visão adiantada da infor-mação. Nao são mui tos eventos que merecem esse t ra tamento. Isso pode ser usado para mostrar que você co-nhece seu trabalho e não está depen-dendo de eventos encenados ou co-mendo na mão do escritório de infor-mações.

Ou t ro controle administrat ivo é o "release time" para reieases de not i -cias ou periódicos. O NEJM, por exemplo , pede aos repórteres que as-

sinem uma carta concordando sub-meter-se^à hora de release na segun-da-feira para obter cópias adiantadas de cada tema. Em certa época, os press reieases t raziam rot ineiramente not íc ias sobre o dia e hora que o ma-terial podia ser usado. Essa prática f o i largamente abandonada, embora alguns eventos especiais possam ser coordenados desse modo. Poucos press reieases são usados na íntegra pelos principais veículos de qualquer maneira, de modo que u m acordo desse t i po causa poucos problemas. Antes de concordar em fazê-lo ou romper u m acordo, o redator de ci-ência prudente deve verif icar a histó-ria e ver por que uma hora de libera-ção f o i especificada.

As horas para liberação freqüente-mente aparecem nas cópias para a im-prensa de trabalhos preparados para uma reunião c ient í f ica. Geralmente essa hora está ligada ao dia e hora em que o orador deverá fazer a sua palestra. Na possibilidade de u m ora-dor retirar o trabalho - o que acon-tece — seria tol ice escrever uma histó-ria baseada no que poderia ser uma pesquisa não confiável. U m trabalho que é ret irado pode valer uma maté-ria, se o cientista quiser discut i r por que fo i ret irado do programa. Dada a natureza rot ineira da maioria dos tra-balhos e reieases noticiosos, você de-ve ter razões mu i to boas para violar a hora da liberação. Uma reputação de ousadia é uma coisa; a não confia-bil idade ou descuido é outra. Se uma história está embargada para to -dos os jornalistas, você tem tempo extra para preparar uma matéria

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mais minuciosa que os seus compet i -dores. Mas quando um veículo rompe um release o acordo geralmente é considerado quebrado para todos.

0 d i re i to de acesso a laboratór io, bases militares e outras instalações coloca problemas di f íceis agora. Em certa época, durante a guerra f r ia dos anos cinqüenta, o autor percorreu to-das as áreas não-classificadas de uma base de comando aéreo estratégico sem uma escolta. Era u m privi légio conquistado por insistir em que, co-mo cidadão e cont r ibu in te , o repór-ter devia ter permissão para andar em qualquer lugar onde o motor is ta de caminhão de cerveja ou qualquer ou-t ro entregador servindo à base pudes-se ir. Leads para muitas histórias não-confidenciais interessantes fo ram conseguidos apenas por conversar com pessoas, observar e ouvi r . Tornei-me parte do cenário, na realidade. Evi-tando as partes de acesso restr i to da base, não dei â pol íc ia mi l i tar razão para suspeitar de quaisquer violações de segurança. Isso f o i antes da guerra do V ie tnã e dos protestos ant imi l i ta-res às vezes violentos, antes que dois presidentes fossem assassinados e an-tes do crescimento daquela fo rma pe-culiar de assassinato conhecida como ter ror ismo po l í t i co . O privi légio pode não valer o risco agora.

Escolher membros da imprensa é u m controle administ rat ivo comum entre fontes civis e mil i tares. Você pode pensar que um acompanhante irá interferir em seu estilo de entre-vistar, mas por que deixar que isto ocorra? Pode ser f is icamente perigoso andar desacompanhado por algumas

instalações de pesquisa mil i tares ou civis. Di f ic i lmente existe qualquer questão que você perguntaria a um cientista ou administrador que não possa perguntar diante de u m funcio-nário da área de informações. Você às vezes tem que pedir-lhe para não in t roduz i r as suas perguntas numa en-trevista, mas a maioria deles está ge-nuinamente do lado dos jornalistas na obtenção da liberação de informa-ções. Mas isso é outra f o r m a de con-t ro le administrat ivo que você, como redator de ciência, deve pesar por seu efeito em seu acesso à informa-ção. Você não precisa desistir de sua independência simplesmente porque fo i designado para cobr ir áreas de in-formação delicada.

O acesso às instalações da pesqui-sa privada é um assunto di ferente. Como cidadão e cont r ibu in te , você tem algum di re i to de entrar na maior parte das instalações do governo. Em propriedade privada, o d i re i to de acesso é contro lado pelo proprietá-r io. Você obterá mais cooperação — e mais controle sobre o que lhe é d i to — ao lidar com operações de pesquisa comercial por desenvolver seu traba-lho através de funcionár ios de infor-mações. Se você não confiar na infor-mação que receber, não pode ficar perambulando pelo lugar sem se arris-car a cometer um del i to de invasão. Algumas histórias podem valer esse risco, mas uma determinação recente da Suprema Corte dos E U A , entre-tan to , proíbe a invasão de proprieda-de privada mesmo quando cobr indo um evento noticioso públ ico, a não ser que o propr ietár io lhe dê o con-

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sentimento. Isso poderia demonstrar-se mui to grave para redatores que ocasionalmente cobrem desastres de aviões e acidentes industriais em ins-talações de pesquisa por cruzar pro-priedade privada ao alcançarem o lo-cal do acidente. As leis estaduais po-dem ajudar a ultrapassar barreiras uma vez que a lei comum dá aos jor-nalistas algum direito de acompanhar bombeiros, policiais e outros funcio-nários públicos às áreas de desastre.

Seja cauteloso. Os desastres de aviação são um triste espetáculo, pois neles há pedaços de corpos humanos e de aviões espalhados por toda par-te. Os aviões, hospitais e laboratórios industriais freqüentemente contêm gases e l íquidos exóticos cuja força explosiva ou efeitos venenosos po-dem atrapalhar todos os seus planos. A exposição à radiação é sempre uma possibilidade que envolve alguns aci-dentes militares e civis. Vigie seus fo-tógrafos. Alguns laboratórios têm oxigênio puro e hidrogênio na área, como os hospitais, que podem ser atin-gidos pelo calor ou fagulhas de uma unidade de flash ou a fagulha de uma câmera operada eletricamente. O mes-mo pode valer para o seu gravador de f i ta , rádiotransmissor-receptor ou ou-t ro equipamento. Em algumas áreas eletricamente sensíveis, seu terminal de computador portát i l pode ser proibido se é que você leva um para uma entrevista.

Se o seu fu ro inclui uma instala-ção do governo, civil ou mil i tar, vale a pena obter do Quartel General em Washington, D. C., uma declaração clara da pol í t ica de acesso a acidentes

de avião e outros desastres. Um en-tendimento semelhante sobre o que a pol ícia estadual ou local tem permis-são de fazer no local deve ser explica-do numa carta para você. Freqüente-mente as polít icas oficiais não são co-nhecidas ao nível de campo ou pelos funcionários locais que terminam por traçar suas próprias regras. Não é in-comum para a polícia estadual assu-mir que está sob direção de funcioná-rios federais no local de um acidente quando a pol í t ica oficial pode permi-t i r o acesso pela imprensa. E a polícia mil i tar geralmente favorece o acesso para jornalistas, com ou sem escolta de imprensa. Como certos militares abrigam uma tendência contra a re-portagem aberta de tais eventos, uma carta ou cartão indicando a pol í t ica oficial de acesso pode ser algo inte-ressante para trazer consigo.

Riscos de difamação impressa (libelo) e privacidade

As leis de libelo também colocam algumas ameaças mui to reais aos jor-nalistas de ciência. Os riscos são espe-cialmente altos em áreas de transci-ência, carregados de conotações pol í-ticas e emocionais. Você pode se emaranhar num processo de libelo mais ou menos inocente ou descuida-damente. Médicos, pesquisadores, en-genheiros, enfermeiras e pessoal semi-profissional nas profissões científ icas baseiam-se em suas boas reputações para garantir a sua subsistência, suas posições e seu bem-estar geral. Prote-ger essa reputação é parte integrante do exercício de suas profissões.

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O libelo (difamação impressa) e a calúnia (difamação falada) são danos â reputação que podem ser reparados através do ju lgamento de processo ci-vi l . Defender-se contra um processo de difamação na corte, mesmo se você ganhar, custa m u i t o dinheiro. O curso e o l ivro sobre a lei das comuni-cações devia ser parte do armamento de todo redator. Ent retanto, uma de-f in ição curta e func ional de libelo af i rma que o l ibelo é uma afirmação falsa, impressa ou transmit ida pelo rá-d io ou pela T V , a respeito de alguém, o que tende a levar essa pessoa ao ódio, desprezo ou ridicularização pú-blicos ou prejudicá-la no seu negócio ou ocupação. A palavra chave é falsa.

O libelo precisa conter quatro ele-mentos: publicação, inc lu indo comu-nicação ao menos para uma terceira pessoa; identificação por nome ou como membro de um grupo suficien-temente pequeno para identif icação; dano ou prejuízo real, inc lu indo pre-ju í zo monetár io, reputação prejudica-da, angústia e sof r imento mental , ri-dicularização e humilhação; e fraude sabendo que uma afirmação era falsa, estimular dúvidas acerca de sua ve-racidade ou publicá-la com comple-to desprezo ( m a l í c i a ) sobre se era verdadeira ou falsa. A verdade é sua melhor defesa contra acusações de li-belo. O comentár io imparcial é outra.

Sugerir erradamente que alguém tem uma doença terr ível ou repug-nante oferece um exemplo de libelo. Desafiar o ju lgamento profissional é ou t ro . Um médico recebeu retratação de uma revista de ciência que ques-t ionara o t ipo de t ratamento que ha-

via prescrito para um paciente proe-minente. A possibilidade de libelo pode desencorajar redatores de so-licitar comentários excessivamente cr í t icos sobre o t rabalho de um cien-tista. Você pode ser culpado de libelo mesmo quando cita alguém correta-mente e o que a pessoa diz contém afirmações caluniosas sobre outra.

Uma companhia pode ser proces-sada por l ibelo c o m o um indiv íduo associado a uma corporação sujeito às leis. Dar a entender que uma com-panhia está com problemas f inan-ceiros é uma fo rma singular de libe-lo à corporação, a não ser que você comprove a acusação. As compa-nhias que se enquadram no capí-t u lo II sobre lei da bancarrota não estão falidas, mas buscando pro-teção legal para se reorganizarem sem serem forçadas à bancarrota; essa dis-t inção deve estar clara em qualquer matéria. A identi f icação errada de uma pessoa ou companhia pode re-sultar em libelo, tal como dar o nome errado do fabricante de um produto perigoso. Portanto, qualquer história que possa danif icar uma reputação merece verif icação minuciosa, talvez com um advogado. Lembre-se, os fa-tos precisam ser comprováveis na cor-te, se necessário. Isso não e a mesma coisa que "ac red i ta r " que são verda-deiros.

Como essas regras de libelo se apli-cam à redação cient í f ica? Quando o ator Rock Hudson estava hospitaliza-do , os repórteres t iveram o cuidado de não dizer que Hudson t inha A I D S

'até que ele e seus agentes concede-ram permissão. Obtenha consenti-

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mento de indiv íduos ou pais e guar-diães de menores, assinado se neces-sário, para matérias e fotograf ias usa-das em conexão com histórias médi-cas. Deixe claro que pretende publ i -car o material que obtenha. Não ex-traia informação usando' nomes ou propósitos falsos. Obtenha ambos — ou mais — os lados de qualquer histó-ria, e dê às pessoas a opor tunidade de responder a ataques. Deixe claro em suas matérias que t iveram essa opor-tunidade. "Consen t imen to " e "opor -tunidade de rép l ica" oferecem defe-sas contra l ibelo e invasão de privaci-dade.

A F I G U R A P Ú B L I C A . A idéia do " func ionár io p ú b l i c o " ou " f igura pú-b l ica" tem significado especial na re-portagem de ciência, tecnologia e me-dicina. As pessoas que são figuras não-públicas ou "pr ivadas" necessi-tam de mu i to poucas provas de dano à sua reputação se processam por li-belo. A f igura pública deve provar que o l ibelo fo i publ icado com com-pleto desprezo pela verdade ou com sérias dúvidas a respeito da mesma. " M a l í c i a " é o te rmo legal para isso. Mas def inir uma f igura pública não é tão fáci l . Nem todos os empregados públicos ou pessoas que recebem di-nheiro públ ico são funcionár ios pú-blicos ou figuras públicas quando vis-tos pelas cortes. Em teoria, a Supre-ma Corte dos E U A disse que as f i -guras públicas são pessoas que "ocu-pam posições de poder e inf luência tão abrangentes que são consideradas figuras públicas para todos os propó-s i tos" como o são aquelas que por não serem famosas'se colocam, vo-

luntar iamente, numa controvérsia pú-blica.

A corte determinou que os empre-gados públicos, são funcionár ios pú-blicos se têm, ou parecem ter, res-ponsabilidade substancial por condu-zir assuntos do governo. Isso, até aqui, inclui funcionár ios eleitos, can-didatos a algum cargo impor tante , pol íc ia, ju izes,examinadores médicos do condado, e um psiquiatra no hos-pital estadual. Um professor de q u í -mica de nível secundário fo i conside-rado funcionár io públ ico enquanto um professor de história não o fo i . An -tigos governadores e uma pessoa con-tratada pelo governo fazendo análise de impacto ambiental não fo ram con-siderados funcionár ios públ icos nem figuras públicas.

Os cientistas de pesquisa podem não ser figuras públicas. Ronald R. Hutchinson, um pesquisador da ciên-cia do compor tamento , fo i declarado figura de destaque quando processou o senador Wi l l iam Proxmire e um as-sessor de imprensa, que concederam a Hutchinson a premiação pejorativa Golden Fleece para pesquisa patro-cinada pela N A S A e pela Marinha. Proxmire disse que a pesquisa, sobre por que os macacos e outros animais apertam os punhos e as mandíbulas sob stress, era u m desperdício de di-nheiro. Hutchinson demonstrou com sucesso o seu ponto de vista ao anali-sar como os humanos poderiam com-portar-se sob stress. O caso Hutchin-son v. Proxmire (1979) estabeleceu ou t ro precedente. Como o senador emi t iu a acusação num press release — e não de sua posição priviJegiada

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como senador — repetiu-a numa trans-missão, o senador perdeu sua imuni-dade sob a cláusula de discurso ou debate da Consti tuição dos E U A , sentenciou a corte.

Se você trabalha com base em do-cumentos oficiais ou no discurso de pessoas que gozam de imunidade, você tem uma defesa contra l ibelo. Os eventos que ocorrem na corte aberta, por exemplo, são prerroga-tivas se você der um relato imparcial e acurado. Os documentos da corte e outros registros públicos trazem prer-rogativas para você. Jornalistas e ou-tros também têm permissão de usar a defesa de "op in ião e comentár io ho-nesto" num assunto de interesse pú-bl ico e/ou fato apresentado num ar-t igo como verdadeiros ou que se acredita serem verdadeiros. Isso deve ser comentár io ou opin ião, não uma alegação de fa to , e identif icável como opinião. Mesmo quando os jornalistas ident i f icam suas matérias como uma " c o l u n a " , impl icando comentár io im-parcial e opinião, jú r i e ju iz podem não concordar. U m redator de ciên-cia do Atlanta Journal and Consti-tution fo i considerado culpado de li-belo ao traçar uma comparação entre as propostas de um vencedor de Prê-mio Nobel para esterilização paga a pessoas de Q l Daixo e as experiências médicas na Alemanha Nazista; em-bora a indenização concedida fosse apenas de 1 dólar, o jornalista perdeu a causa e o jornal pagou uma conside-rável conta legal (Associated Press, 1984c).

Figuras públicas têm sido ident i f i -cadas como atores e animadores, o

autor de um livro de dietas, uma fun-dação contra o abuso de drogas, uma companhia de seguros, opositores da f luoretação, atletas profissionais e um repórter esportivo. Pessoas que levantam fundos para projetos de ca-ridade, um cientista de pesquisa com patroc ín io, um ex-condenado, um jó-quei e um promotor ativo na pol í t ica fo ram todos considerados não-públi-cos. Assim, a determinação de quem é uma f igura pública torna-se mu i to intr incada e o redator de ciência de-veria basear-se em outras defesas pos-síveis. Escrever sobre pesquisa frau-dulenta pode esperar repúdio públ ico após uma investigação of ic ial , numa audiência pública, ou em retratação publicada num periódico c ient í f ico .

REPORTAGEM N E U T R A . Como os jornalistas de ciência operam a par-t i r de material publ icado, o conceito mais novo de "reportagem neut ra" como defesa de libelo é importante. Ele provém de uma matéria do The New York Times relatando que a re-vista da A u d u b o n Society havia acu-sado vários cientistas proeminentes de serem "porta-vozes de cientistas" pagos, que citavam a contagem anual dos passados no natal, pela sociedade como prova de que os bandos esta-vam sobrevivendo apesar do pesticida D D T , um assunto mu i to atacado po-l i t icamente em 1972. Embora um jú r i de corte distr i tal decidisse que os cientistas haviam sofr ido l ibelo, a se-gunda corte de apelações dos EUA emi t iu o ju lgamento contra o Times e a A u d u b o n Society. A Suprema Cor-te recusou-se a ouvir a apelação dos

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cientistas (Edwards v National Au-dubon Society). Isso abre caminho para relatar sobre acusações publica-das numa disputa com base em que você está apenas transmit indo acusa-ções proferidas com veemência em debate público.

A lei federal de libelo é um campo relativamente novo e em desenvolvi-mento. A maior parte das leis de li-belo são leis estaduais e o redator também precisa ter familiaridade com as leis locais sobre publicação a transmissão em rádio e televisão. Essas variam de estado para estado em tais coisas como o estatuto das li-mitações, o tempo além do qual você não pode ser processado. As cortes também estão olhando com mui to rigor para as tentativas daqueles que foram criticados de desviar as crít icas através de processos. Alguns publishers estão processando, por sua vez, se acham que os processos são levantados para embargá-los e aos membros de suas equipes. Em alguns estados e retratação oportuna, a cor-reção ou a argumentação pode de-monstrar sua boa-fé em reduzir os da-nos possíveis. Às vezes a retratação apenas é suficiente para evitar um processo, que também significa pesa-das despesas para os queixosos. Os redatores não devem tentar fazer re-tratações sem o conselho de um ad-vogado, que pode negociar um acor-do que inclua uma concordância em não processar se você publicar uma correção. Correções mal enúnciadas ou rancorosas, podem tornar a situa-ção pior. E alguns estados oferecem o l imitado respaldo de leis de prote-

ção que podem evitar que você seja forçado a identificar fontes de infor-mação; essa proteção pode ser mui to fraca e l imitada.

Às vezes os redatores precisam de seu própr io advogado e seguro con-tra libelo. Quando as indenizações por libelo eram mui to inferiores aos julgamentos de muitos milhões de dólares que começaram na década de setenta, os redatores assumiram que o jornal ou revista pagaria os custos da defesa de libelo. Hoje isso não é mais automaticamente assim. Reda-tores free-lancers com freqüência de-vem assinar contratos condicionan-do-os a pagarem ou parti lharem des-pesas de libelo. Além disso, os inte-resses do redator e do jornal podem ser diferentes. Um jornal e sua com-panhia de seguro contra libelo podem deixar o redator encalacrado concor-dando que é mais barato resolver um caso de libelo fora da corte e pagar a indenização. Parte dessa indenização pode ser depositada em ju ízo em no-me de um redator e o redator pode querer defender sua reputação na corte ao invés de fazer acordo.

Invasão de privacidade As pessoas envolvidas em eventos

de valor noticioso cedem um pouco em seu direito à privacidade, estejam envolvidas no evento voluntária ou involuntariamente. Geralmente as cortes deferem ao julgamento do re-dator sobre o que é notícia ou não. Portanto, você geralmente pode es-crever sobre temas de legít imo inte-resse público com segurança, mesmo

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se o tóp ico não fo r um evento de no-t ícias rápidas.

Entretanto, a lei da privacidade também tem algumas armadilhas es-peciais para os redatores de ciência. Às vezes uma matéria proporciona-rá a opor tun idade tanto para l ibelo como invasão de privacidade. A lei da privacidade protege o d i re i to de ser "deixado em paz" . De certo modo , é o o u t r o lado da lei do l ibelo, quanto mais verdadeira a af irmação, maior a invasão de privacidade. Como o libe-lo, a lei da privacidade aplica-se ape-nas a pessoas vivas, mas as cortes re-conhecem direitos de privacidade pa-ra parentes de pessoas famosas ou pú-blicas, vivas ou mortas. As violações podem ocorrer através de intrusão em negócios privados além do que é relevante para a not íc ia. Desse modo você pode ver-se sobre terreno pouco f i rme desenvolvendo material sobre as famí l ias e vidas pessoais de cientis-tas e pacientes que não cooperam com seu projeto. A revelação de ma-terial sensacionalista sobre saúde, vida sexual ou afazeres econômicos pode intrometer-se através da publ i-cidade de assuntos privados. Relatar e fotografar o que tem lugar em pú-bl ico, como numa rua pública ou ter-reno públ ico, não const i tu i intromis-são. Informações de mau gosto reti-radas da história de uma pessoa po-dem const i tu i r uma invasão de priva-cidade se ela sobrevive à transgressão.

O consent imento lhe oferece uma defesa, mas o consent imento pode ser ret irado. Redatores de ciência co-br indo as operações de coração arti-f icial no hospital da Humana Corpo-

rat ion, em Louisvil le, se depararam com esse problema. O Dr. Wi l l iam C. DeVries disse aos redatores de ciência, pouco depois de ter implantado o terceiro coração art i f ic ial , que iria l imitar a informação que daria à im-prensa sobre os pacientes ou o proce-d imento experimental . A té esse mo-mento os redatores de ciência consi-deraram a assistência de informações que lhes fora dada u m exemplo per-fe i to da cooperação entre imprensa e médico, u m exemplo de relações pú-blicas de l ivro didát ico. DeVries cha-mou a operação de "no t íc ias antigas agora... vocês simplesmente não pre-cisam saber tanto quanto precisavam antes". (A l tman, 1985, 6). Diz que os receptores dos corações estavam sen-do afetados por terem de responder a perguntas da imprensa e serem fo to-grafados e que desejava preservar seus dados e análises para publicação cien-t í f ica . À sua ação seguiu-se a cr í t ica pública de outros membros da comu-nidade de pesquisa médica sobre a quantidade de dados liberada diaria-mente em conferências de imprensa.

Ocasionalmente uma pessoa irá cooperar com entrevistas e fotogra-fias, mas mudará de idéia sobre ter a matéria publicada. Isso pode ser pos-sível quando você estiver enfocando o ind iv íduo para representar uma ví-t ima t íp ica de uma doença, por exemplo. A não ser que você possa persuadir o ind iv íduo a voltar atrás, irá precisar encontrar ou t ro exem-plo.

A apropriação do nome, a seme-lhança, ou personalidade de uma pes-soa, com propósitos de exploração

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comercial também viola a privacida-de. O retrato de um cientista usado como uma notícia ou matéria mais longa é uma coisa; mesmo se for t i rado num lugar públ ico, usar esse retrato num anúncio para um produto, in-cluindo a sua publicação, pode ser uma violação — sem consentimento assinado. Você também pode invadir a privacidade, em algumas cortes, se re-velar segredos comerciais ou demons-trar como a pessoa realiza alguma ha-bilidade especial de modo que essa possa ser duplicada.

Colocar numa pessoa um falso bri-lho é outra armadilha legal na lei da privacidade. Pode ocorrer quando você tenta dramatizar ou condensar fatos ou eventos numa notícia ou ma-téria mais longa ou quando aciden-talmente coloca o nome real de uma pessoa numa composição de vários caracteres, como faria ao personalizar um relato de alguma pesquisa de ci-ência social de longo alcance. Quan-do você usa um personagem compos-to , diga-o. É mui to possível, uma vez que a lei de privacidade ainda está em desenvolvimento, que os redatores de ciência interpretem erradamente os propósitos dos cientistas ou sua pes-quisa e você caia numa situação de "falso b r i lho" . É claro, também, que você deve resistir às tentações de se divertir à custa de pesquisa cient í f ica de indivíduos quando o tédio de es-crever histórias sérias faz com que vo-cê anseie por algo divert ido sobre que escrever. A ridicularização e o falso br i lho também podem originar pro-cesso.

Obstáculos comerciais Dados os problemas do libelo e da

privacidade, você pode compreender porque a revista Science escreveu mui to cuidadosamente e respeitosa-mente sobre um inventor que rece-beu muita publicidade em New Or-leans, e sobre o jornalista de televisão que havia adotado a causa do inven-tor . 0 inventor se queixava de ter si-do prejudicado pelo U.S. Patent and Trademark Off ice que se recusou a conceder-lhe a patente de uma má-quina que parecia gerar mais energia do que era necessário para operá-la. Isso pareceria desafiar a segunda lei da termodinâmica e ser a máquina de modo perpétuo que a ciência declara impossível. O redator de ciência El iot Marshall (1984, 6) c i tou toda a im-pressionante documentação apoiando a queixa do inventor, incluindo afir-mações dos engenheiros tecnicamen-te capacitados que fizeram avaliações da mesma.

Quando um cientista ou uma com-panhia tem o documento para obten-ção de uma patente sob estudo, o se-gredo prevalece, porque admit i r que a informação exclusiva caia no co-nhecimento geral pode invalidar a re-quisição de uma patente. A docu-mentação, 'na literatura cient í f ica, é parte das provas legais para estabele-cer os direitos sobre invenção e pa-tente, que geralmente cabem ao em-pregador do cientista. Essa é outra razão pela qual a primeira not íc ia significa tanto, mesmo para os pesquisadores de ciência básica. Por mais de- vinte anos depois-que a ex-plosão de pesquisa e desenvolvimento

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se seguiu à II Guerra Mundial , os di-reitos de patentes de invenções finan-ciados através de contrato ou verba do governo ca i ram no d o m í n i o públi-co. Gradualmente a indústria tem se movido para diante em sua solicita-ção de direitos exclusivos de paten-tear tais desenvolvimentos com pro-pósitos comerciais, e conseguiu em algumas partes da indústria espacial e da defesa. O governo ainda usa estas gratui tamente.

Assim você pode ser solicitado a abster-se de escrever sobre algumas coisas que você vê em laboratórios in-dustriais ou manufaturas. A lém de aparelhos potencialmente patenteá-veis em teste, você pode ver valiosos segredos comerciais, modos de fazer coisas que não são patenteáveis. A l -gumas companhias irão proib i r suas câmeras, em suas instalações. As me-lhores companhias se oferecerão para t i rar fotografias por você.

Os cientistas na indústr ia privada podem manter a boca fechada sobre o que discutem. Em algumas compa-nhias, simplesmente conversar sobre campos de pesquisa de interesse é pro ib ido pelos administradores como revelação dos planos da companhia para o fu tu ro . Outras f i rmas são mais abertas e colocam um ponto f inal às discussões da pesquisa apenas quando o desenvolvimento claro de um pro-du to parece econômico. Os cientistas também abafam sua cr í t ica aos com-petidores ou às práticas industriais para evitar complicações com leis co-merciais. Eles podem, entretanto, fornecer-lhe material histór ico se vo-cê t ransmit i r o t i po de confiança

que permite esse t ipo de troca com ou sem encargo. As companhias de pesquisa e desenvolvimento podem também permit ir- lhe usar suas bibl io-tecas técnicas. E matérias desenvolvi-das após visitas a uma fábrica podem dar aos leitores uma compreensão melhor da comunidade, mesmo se a companhia não revelar todos os seus segredos. Pode ser út i l para você mais tarde na compreensão da companhia ou alguns novos produtos.

Em muitas corporações grandes, os administradores da pesquisa de campo ou das instalações de produ-ção têm autoridade l imitada para li-dar com os meios de comunicação. As solicitações para uma visita à fá-brica ou laboratório podem necessi-tar de aprovação do quartel-general da corporação. É no m í n i m o justo dar alguma idéia do t i po de história que está procurando, de modo que as pessoas possam preparar respostas pa-ra você. E é uma boa idéia manter contatos na sede da corporação, mes-mo se fo r com o pessoal de relações públicas, para aqueles momentos em que você precisar de alguma informa-ção ou favor, às pressas, ao lidar com os administradores locais.

Os cientistas pesquisadores da vida podem ficar mais relutantes em dis-cut i r a pesquisa com os meios de co-municação à medida que se torna crescentemente possível usar organis-mos vivos, tais como bactérias, em processos de produção de remédios, proteínas puras ou outros produtos valiosos. Os cientistas vêem esses pro-cessos, inclusive a clonagem e a enge-nharia genética, como caminhos para

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os tipos de fortunas pessoais feitas antes pelos cientistas em química, plásticos, computadores e eletrônica. A Harvard e outras universidades com biólogos de pesquisa altamente capacitados iniciaram suosidiárias co-merciais devotadas à tal bio-engenha-ria e tecnologia, que poderiam afetar o f luxo de informação das reuniões científicas, literatura e veículos de comunicação.

Outro obstáculo comercial à obtenção de informação cient í f ica e técnica pode aflorar com pessoas contratadas pelo governo. Essa é uma cláusula encontrada na maioria dos contratos entre uma companhia e uma agência do governo. O contrato condiciona a companhia a obter aprovação da agência antes de liberar qualquer informação sobre o contra-to. Um propósito da cláusula é mini-mizar a publicidade que o contratado recebe e assegurar a agência de que será notif icada de qualquer liberação de informações. Algumas vezes os funcionários das agências desejam as-segurar que eles, e não seu contrata-do, recebam créditos pelos novos de-senvolvimentos. Os funcionários de informação do governo e da indús-tria lutam regularmente entre si e com os seus supervisores técnicos de administração para autorizar a libe-ração de tais informações. Os redato-res de ciência dos meios de comuni-cação freqüentemente farão melhor solicitando acesso e entrevistas tanto á agência como ao contratado.

Por causa da sórdida história dos contratos do governo (remontando à época das legiões romanas, pelo me-

nos) o processo aberto e compet i t ivo de licitação existe. Desse modo os re-datores de ciência têm acesso à infor-mação cientí f ica e técnica assim co-mo às especificações de preço, e tem-po-por-desempenho. Esse processo de licitações é destinado a manter os contratados honestos e os preços bai-xos. Não funciona sempre, mas qual-quer um pode usar os "Quadros de Lic i tação" nas instalações governa-mentais para obter informação sobre contratos propostos e especificações de equipamento, desempenho, insta-lações e assim por diante. Algumas compras de segurança nacional são mantidas secretas ou detalhes da pro-posta restritos a pessoas autorizadas. Notificações de licitações não-confi-denciais geralmente são remetidas pe-lo correio perto do escritório contra-tante. Você pode examinar os contra-tos propostos e os existentes, tam-bém, a não ser que sejam confiden-ciais. Os relatórios do progresso da maioria dos projetos também são re-gistro público. Encontre o "Quadro de Licitações", onde os avisos de contratos são colocados, e aprenda a usá-lo.

Segurança e censura

Infelizmente, aos olhos de muitos cientistas, a guerra e os avanços tec-nológicos caminham juntos. Isso sig-nifica que você irá encontrar esforços de censura total e sigilo visando a se-gurança e a defesa nacionais. Você fi-cará surpreso pela facilidade com que material " T o p Secret" pode ser desclassificado quando o administra-

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dor de um projeto do governo acha que você escreverá uma matéria favo-rável. Portanto, peça a informação. A maioria do que está classificado pro-vavelmente não deveria estar, mas classificá-los é mais fáci l para func io-nários do governo t ím idos do que se arriscarem a uma consulta pessoal. U m relatór io sobre os usos do arco e flecha permanece classificado, pelo ú l t imo relato. A l é m disso, a classifi-cação é uma maneira fáci l de escon-der falhas e outros problemas tecno-lógicos ou pol í t icos embaraçosos dos repórteres e outros estranhos.

Duas vezes, ao menos, o governo federal ten tou censurar matérias so-bre a ciência e tecnologia das armas nucleares. Em março de 1950 a A t o -mic Energy Commission persuadiu a Scientific American a destruir três mi l exemplares da revista para apagar várias passagens de u m art igo do f ís i-co ganhador de Prêmio Nobel, Hans A . Bethe, sobre o desenvolvimento da bomba de fusão de hidrogênio. T o d o o material havia sido tomado por Bethe de fontes não-classificadas, pr imariamente livros disponíveis em bibliotecas públicas. O presidente Harry S. T ruman havia ordenado que o t rabalho da bomba-H continuasse, contrar iamente ao conselho de mui-tos cientistas, inclusive Bethe, que trabalhou nas bombas atômicas, ou de fissão. A explicação pública para tal ação fo i que o artigo poderia ser tomado mais a sério por causa da re-putação de Bethe. Esse é um dos poucos casos de restrição prévia de publicação bem-sucedida nos Estados Unidos.

Em 1979, o Department of Ener-gy e o Justice Department obt iveram uma injunção para impedir a revista The Progressive de publicar u m artigo in t i tu lado " H o w a Hydrogen Bomb Works" . A batalha fo i longa e com-plicada e os jornalistas venceram os censores quando meia dúzia de ou-tras publicações publ icaram o art igo ou outros similares, independente-mente. A publicação simplesmente re-velou quanto da informação já estava nas prateleiras das bibliotecas abertas ou em livros didáticos e quão pouco dos detalhados processos de uma bomba-H foram revelados. Isso dif i -c i lmente era suficiente para se cons-t ru i r uma bomba; pouco, se algo, apareceu que fosse desconhecido de qualquer f ís ico que fizesse um míni -mo de pesquisa sobre o tópico. Com efeito, durante o f inal da década de setenta, vários estudantes de f ísica reuniram relatórios de pesquisa sobre como construir bombas nucleares. Um dos enganos de The Progressive residiu em submeter o manuscri to ao governo para aprovação. A aprovação fo i naturalmente recusada, acenden-do o debate. A const i tuição dos E U A como interpretada pela Suprema Cor-te, p ro íbe a restrição antes da publ i-cação, mas isso não evita que funcio-nários federais e mesmo estaduais tentem censurar se você lhes der oportunidade.

Esse e outros incidentes indicam que a melhor tát ica do jornalista é publicar antes. Se você como jornalis-ta pode descobrir a informação, é quase certo que qualquer agente de espionagem também possa fazê-lo. A

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censura é uma técnica através da qual os inimigos de um país freqüente-mente sabem mais sobre as forças e fraquezas dos EUA dos que os cida-dãos. Se você conseguir acesso a ma-terial confidencial e decidir que a pu-blicação não irá ferir a segurança na-cional, não se vanglorie na matéria impressa por ter visto material restri-to. Por que provocar algum burocrata com a idéia de que de algum modo ele cometeu algum engano? Para o re-lato completo do caso do The Pro-gressive, leia "The Progressive the Bomb and the Papers", de Bruce M. Swain (1982).

Na gestão do presidente Ronald Reagan muitos avanços no acesso pú-blico à informação reverteram nova-mente. A censura com propósitos de segurança nacional e para inibir a tro-ca de tecnologia comercialmente va-liosa enrijeceu em muitas áreas da ci-ência e tecnologia. Houve algumas in-dicações de que grande parte da ten-dência para o sigilo veio do Depart-ment of Commerce, e dos militares. De modo que a segurança nacional não estava envolvida. Science News descobriu que quase um terço dos 600 trabalhos não-confidenciais no programa da Society of Photo-Optical Instrumentation Engineers para a reunião de San Diego foram cancela-dos a pedido dos departamentos de Defesa e Comércio (Greenberg, 1982). Visitas de cientistas russos fo-ram canceladas e universidades e so-ciedades científ icas sofreram pressões para restringir a participação em reu-niões a "cidadãos americanos ape-nas". E houve relatos de algumas uni-

versidades que restringiram a inscri-ção em certas aulas de engenharia e ciência de computadores para estu-dantes americanos.

Erwin Knol l , editor do The Pro-gressive, compi lou uma lista de ou-tros esforços de censura: um aviso à Scripps-Howard News Service de que este poderia ser processado sob o A tomic Energy A c t de 1954 por re-ceber documentos indicando que fal-tava urânio nas instalações nucleares de Oak Ridge em quantidades sufi-cientes para construir 85 bombas; avisos de violações de leis de espiona-gem dadas a dois antigos especialistas da inteligência da Ai r Force que desa-fiaram as explicações oficiais de co-mo um jato da Korean Ai r Lines fo i derrubado, e 9 dos 175 trabalhos de pesquisa sobre criptografia impugna-dos pela National Security Agency (Knol l , 1984). Algumas propostas evi-tariam que estrangeiros viessem aos Estados Unidos para conseguir certos t ipos de graduação em física e eletrô-nica. As ações de 1983 foram sufi-cientes para fazer com que a Ameri-can Association for the Advancement of Science iniciasse um projeto espe-cial de pesquisa sobre os efeitos po-tenciais do sigilo sobre a condução da pesquisa cientí f ica (Chalk, 1983).

Controle de conferências de imprensa

Dois outros mecanismos poten-ciais de controle sobre o que é relata-do perdem a importância ao lado das restrições de segurança, que podem ter efeito l imitador sobre a informa-

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ção c ient í f ica ou médica que é trans-mi t ida aos cientistas e ao públ ico. Os analistas de redação c ient í f ica Rae Goodel l , do M I T , e Sharon Dun-w o o d y , da University of Wisconsin, se concentraram nas regras para o uso de conferências de imprensa e acesso a salas de imprensa para l imitar os da-dos e a fo rma em que eles são obt i-dos pela imprensa. Um grupo seleto de jornalistas fo i convidado para o que f icou conhecido como a Asilo-mar Conference, onde os cientistas elaboraram as diretrizes para minimi-zar os perigos na pesquisa da recom-binação do D N A , o método pelo qual novo material genético é colocado em células de bactérias para produzir insulina. Um embargo que a maioria dos- repórteres aceitou passivamente, pelo privi légio de assistir, evi tou que procurassem pontos de vista alterna-tivos e conf l i tantes aos apresentados pelos organizadores da conferência. Assim, os riscos de escape de mutan-tes fo ram enfatizados sob os pontos de vista dos cientistas menos preocu-pados com os perigos de bactérias fu-gitivas. As diretrizes da conferência foram vir tualmente abandonadas pe-los N I H e universidades quando pro-dutos comerciais pareceram possíveis 5 part ir dessas técnicas de Dio-enge-iharia. Goodel l conclu iu que os jor-lalistas tomam com freqüência de-nais o caminho mais fácil , escreven-io a part ir do que estiver disponível >ara eles (Goodel l , 1981).

Dunwoody chegou prat icamente à nesma conclusão após analisar 800 listórias de uma reunião anual da Vmerican Associat ion for the Acivan-

cement of Science. A maioria dos re-pórteres cobr iu os tópicos apresenta-dos durante as conferências de im-prensa (Dunwoody , 1979b). Jerry Bishop do The Wall Street Journal admi t iu para Dunwoody a maior par-te de seus pontos e reconheceu que a prática cont r ibu i para uma vida mais confortável , mas disse que a prática era mais obra dos repórteres do que dos cientistas. O que é relatado, disse Bishop, é menos notícias de ciência do que o que é a melhor história den-tre as de uma reunião de um dia espe-cial. Em out ro dia uma história simi-lar poderia ser ignorada. Sem as con-ferências de imprensa, freqüentemen-te realizadas por solicitação dos re-pórteres, poucos repórteres ir iam às reuniões, disse Bishop (1980).

Códigos de hospitais

Out ro controle sobre o que os re-datores de ciência publ icam reside nos códigos hospitalares estabelecen-do a pol í t ica para liberar informação sobre pacientes. Tan to a Colorado Hospital Association como a South Carolina Hospital Association, e ou-tras profissões de serviço de saúde, procedem por regras de informação uni formes adotadas em seus estados. Na Primavera de 1981, The Denver Post soube de um bebê sendo opera-do no útero da mãe numa tentat iva de prevenir a hidrocefal ia, uma con-dição onde a pressão dos f lu idos so-bre o cérebro pode retardar o desen-volv imento mental. O jornal desejava detalhes completos da operação. O escritório de informações do Centro

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Médico de Denver recebeu ordens da adminis t ração do hospital de não res-ponder a perguntas.

Os médicos também recusaram-se a cooperar , mas o jorna l obteve uma cópia do re la tó r io dos médicos, que não havia sido entregue a u m per iód i -co méd ico para publ icação. Os médi-cos recusaram-se a dar mais in fo rma-ções. U m apelo ao Code of Coope-ra t ion C o m m i t t e e da Colorado Hos-pi ta l Commiss ion t r o u x e uma deter-minação de que o paciente havia se to rnado uma pessoa públ ica por cau-sa dessa operação pioneira e havia perd ido o d i re i to de pr ivacidade. Co-m o a comissão t inha poderes apenas de aconselhar, os médicos e adminis-tradores do hospi ta l ignoraram a de-terminação. O t raba lho dos médicos apareceu no N E J M treze meses após a cirurgia. Esse inc idente oferece u m exemp lo espetacular do que pode acontecer quando jornal istas procu-ram in formações hospitalares além da ro t ina .

Gera lmente a in formação será so-bre pacientes c o m problemas médi-cos mais comuns : fe r imentos provo-cados por projéte is , queimaduras, aci-dentes de au tomóve l e similares. Os redatores de ciência e medic ina de-vem ob te r cópias da or ientação de ca-da hospi ta l para a l iberação de in fo r -mações. Esta geralmente é baseada nas recomendações da Amer i can Hos-p i ta l Assoc ia t ion. Elas estarão ajusta-das para se encaixarem c o m várias leis estaduais relativas á pr ivacidade e ao t i p o de in fo rmação que pode ser l iberado nos assim chamados casos de registro púb l i co . As especificações va-

r iam, mas você geralmente pode obter o nome do paciente, natureza do acidente, localização geral dos fe-r imentos e sua natureza, uma decla-ração sobre o seu estado e o n o m e do médico. A in fo rmação se to rna m u i t o mais l im i tada onde existe es tupro, in-tox icação ou doença menta l . Onde o caso não é de registro púb l i co , a per-missão escrita para a l iberação de qualquer in fo rmação pode ser ob t ida do paciente.

Os redatores de ciência devem obter cópias do p lano de l iberação de in formações de cada hospi ta l du ran te desastres naturais ou acidentes que envolvem mui tas pessoas. Os redato-res de ciência quase cer tamente serão empurrados para tal cober tu ra no t i -ciosa geral po rque são mais fami l ia-rizados com o pessoal dos hospi ta is do que os ou t ros membros da equipe.

Experiências

1. Obtenha cópias de códigos hospitalares de sua área e prepare uma matéria sobre as políticas de informação dos hospitais para seus leitores. Descubra um código unifor-me para a associação hospitalar estadual e o que envolve.

2. Entreviste ou convide como palestrante um cientista ou médico que discuta a In-gelfinger Rule e suas vantagens e deficiên-cias. Como ele responderia à situação em Denver? A demora de treze meses na pu-blicação afetaria muitas crianças doentes? Como você descobriria quantas?

3. Contate a polícia de sua cidade e/ou uma base militar próxima e peça uma có-pia do regulamento que determina o aces-so dos jornalistas às áreas de desastre, in-cluindo quedas de aviões e acidentes indus-

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triais. Os hospitais militares podem ter re-gulamentações sobre liberação de informa-ção que dif iram das dos hospitais civis. Talvez você possa arranjar um palestrante entre seus contatos.

4. Selecione um tema para matéria e cha-me administradores de laboratórios ou centro de pesquisas de sua cidade ou de uma universidade. Você encontra proble-

mas com segredos industriais ou informa-ção confidencial?

5. As universidades têm regras diferentes sobre projetos de pesquisa classificada nos campos por causa das dificuldades poten-ciais de ter a pesquisa das faculdades publi-cada. Quais são as orientações em seu campus? Você pode localizar cientistas que encontraram dificuldades, inclusive re-visão a priorI, com a publicação de sua pes-quisa?

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Capítulo lu

Temas éticos na redação científica

COMO REDATOR DE CIÊNCIA VOCÊ ENFRENTA UM NÚMERO ma io r que o cos tumei ro de escolhas éticas que a t o r m e n t a m os jornal istas. Essas po-dem envolver, por exemp lo , o subor-no, ofer tas de d inhe i ro para anunciar uma droga. A l t o n Blakeslee, u m res-pei tado redator de ciências da Asso-ciated Press duran te m u i t o s anos, re-latou que lhe ofereceram 17.000 dó-lares para mencionar o nome de uma droga comerc ia l em uma de suas ma-térias. O d inhe i ro seria pago indireta-mente e secretamente pelo fabr icante da droga ( C o m m u n i c a t i o n , 1946, 60) . Você encont rará alguns lapsos por parte dos veículos, c o m o o fez El i-zabeth M. Whelan (1984) . Mater ia l da A m e r i c a n Medicai Assoc ia t ion e da A m e r i c a n A c a d e m y of F a m i l y Physicians convenceu-a de que os edi-tores da Time e Newsweek m in imiza-ram os perigos do f u m o nas matérias para os suplementos especiais de saú-de das revistas para evitar c o n f l i t o c o m os anunciantes de cigarros.

Gera lmente as práticas éticas de-senvolvem-se para ajudar a manter os redatores e seus veículos fo ra de con-f l i tos de interesses reais ou aparentes que possam compromete r a acurácia e a veracidade de suas reportagens. Para alguns redatores, as escolhas ét i-cas serão or ientadas pelos códigos de

ét ica adotados por seus jornais, esta-ções de r á d i o - T V , revistas e redes. A l -guns desses códigos p r o í b e m aceitar viagens grátis, a lo jamento e a l imenta-ção de uma f o n t e not ic iosa. U m dos códigos mais r íg idos, o do Louisville Courier Journal and Times, não per-m i t i r á que os repórteres acei tem se-quer uma refeição de cortesia. Os re-datores devem fazer a lgum pagamen-to . Em out ras publ icações, os admi -nistradores edi tor ia is sentem que ne-n h u m redator m a d u r o pe rm i t i rá que alguns dólares de comida e bebida grátis in f luenc iem o que escrevem. C o n t u d o , para evitar que surja algu-ma in f luência indevida, cada vez mais redatores c ien t í f i cos e suas publ ica-ções estão pagando suas despesas pa-ra o seminár io anual pa t roc inado pela A m e r i c a n Câncer Society para u m número seleto de redatores dos pr in-cipais veículos de comunicação. Os seminários são realizados na véspera do esforço anual de captação de re-cursos para o câncer e as redes locais f reqüentemente pagam parte das des-pesas de enviar u m jornal is ta da sua área.

Essas reuniões, onde a A C S reúne redatores de ciência e medic ina c o m especialistas em pesquisa e t ra tamen-t o de câncer, t êm sido uma t rad ição de décadas na ACS. A l a n C. Davis, da

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sociedade do câncer, defende a práti-ca de reunir redatores e cientistas em ambientes confortáveis no in íc io de novas linhas de descoberta. As trocas sociais e profissionais têm lugar numa atmosfera relaxada. Jerry Bishop do The Wall Street Journal considera que as ocasiões estenderam as confe-rências de imprensa e af irma que elas agora contêm menos notícias cientí-ficas ao que em anos anteriores. Diz Bishop, "nunca estive numa confe-rência de imprensa que tenha sido convocada para benefício da impren-sa, tenha sido ela organizada pela Ca-sa Branca, Merck, Harvarò, U C L A ou pelo Departamento de Bombeiros Voluntár ios" . Ele não se sente obri-gado a ir ou escrever uma matéria a não ser que algo novo seja apresenta-do. Os benefícios para a ACS são ir-relevantes. O falecido Pat McGrady, que iniciou os seminários, disse que os palestrantes dos seminários origi-nalmente eram escolhidos por seu va-lor noticioso, mas seu sucesso levou os administradores da ACS a assumir mais a direção e especificar quais pa-lestrantes poderiam ser convidados. Na medida em que o conteúdo noti-cioso decaiu, McGrady disse ter pe-dido para sair da organização dos se-minários anuais (Davisef al., 1978).

Um risco do contato prolongado pode ser conduzir os redatores para um pensamento não-crít ico e afastá-los de pontos de vista adicionais. O Dr. Osler L. Peterson e Dr. H. Jack Geiger (redator de ciência antes de entrar para a escola de medicina) cha-maram a atenção para esse risco da aceitação não-crítica, vários anos

atrás, ao objetarem as afirmações da ACS de que " u m em três pacientes que contraem o câncer é curado". Geiger apontou que os redatores e editores devem pedir mais explica-ções quando tais afirmações são fei-tas porque estas dão ao leitor médio a idéia de que as vít imas de qualquer espécie de câncer que têm tal chance de sobreviver cinco anos são conside-radas curadas. Na realidade, os cânce-res ocorrem em muitas formas e t i-pos, observou Geiger, e essa estatísti-ca de sobrevivência é o produto da média de todas as taxas de sobrevi-vência. Juntar a média mui to alta de sobrevivência de um t ipo de câncer de pele com a taxa mui to baixa do câncer dos pulmões, por exemplo, engana. Mas esses truques estatísticos cont inuam a ser explorados em várias ocasiões, e a boa prática ética e pro-fissional pede que você peça detalhes todas as vezes que alguém lhe fornece um número " m é d i o " . Provavelmente ele é enganoso para você e seus leito-res (Peterson e Geiger, 1962).

Conflitos de interesse

Aceitar uma viagem e despesas fre-qüentemente significa a diferença en-tre obter uma matéria e não obtê-la, para alguns redatores. As grandes or-ganizações de comunicações têm a verba de despesas para pagar por qualquer cobertura. Isso não é válido para os jornais, revistas e estações de rádio e televisão pequenas, onde a maioria dos jornalistas iniciantes co-meça. Os free-lancers também perde-riam oportunidades de matérias e a

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chance de, às vezes, obter novas ex-periências sem assistência das fontes de informação. Essas fontes, obvia-mente, têm um interesse em obter publicidade em troca de pagar todas ou parte das despesas do redator. E alguns redatores têm a reputação de viver bem e tomar tudo que podem obter de tais viagens. Outros redato-res disseram que reagem com hiper-cr i t ic ismo, às vezes, para mostrar sua independência. E o pessoal de rela-ções públicas, cujos orçamentos com-portam essas mordomias, podem não convidar novamente um redator se uma matéria desagradar seus chefes. O redator não pode apagar todos os pensamentos sobre tais possibilida-des. Entretanto, o contrato social es-tá estabelecido entre o redator, o edi-tor e o lei tor. Obter a reputação de jornal ista faci lmente comprável di f i -c i lmente ajudará a sua reputação ou a de sua publicação. Considerações prá-ticas reforçam a idéia de que escrever para publicação sempre envolve julga-mento e equi l íbr io . U m dos marcos de orientação do redator deve ser o conselho do f i lósofo A lbe r t Camus, de que não devemos ment i r sobre o que sabemos.

Os free-lancers têm mais assuntos para decidirem por si mesmos do que os redatores de equipe, que têm o be-nef íc io das pol í t icas estabelecidas por seus editores e códigos de ética. Mesmo os redatores de equipe enca-ram essas decisões quando fazem free-lancer em parte do tempo , como ocorre com muitos redatores de ciên-cia. Poucas pessoas podem viver intei-ramente de matérias free-lancer, mes-

mo nos campos de ciência e medici-na. Alguns free-lancers farão t rabalho de relações públicas e escreverão tex-tos de publ icidade. Isso exige uma vi-são clara de nossa própria integridade c o m o redator e a compreensão de exatamente que espécie de t rabalho você está fazendo em qualquer mo-mento dado. Muitos redatores se re-cusam a tocar textos de publ icidade e promocionais. Por causa de conf l i tos aparentes ou reais e da compet ição, muitas publicações não permi t i rão que seus redatores de equipe façam trabalho free-lancer. Outras compa-nhias l im i tam o trabalho para fora a livros ou veículos não-competi t ivos.

Outra escolha delicada para os re-datores de ciência envolve saber exa-tamente de que publicações aceitar encomendas de matérias. A Pfizer, por exemplo, patrocinou a distr ibui-ção de America's Health, uma revista orientada para o consumidor da World Wide Medicai Press, Inc. Em-bora tanto a Pfizer como o publisher declarem não haver qualquer influên-cia sobre o conteúdo da revista, exis-te a possibilidade de que um redator pudesse ser ident i f icado com um in-teresse comercial. Sua reputação de imparcialidade poderia sofrer.

O free-lancer também poderia ter a ofer ta de dois cheques pela mesma matéria. Uma companhia ou insti tui-ção pode oferecer um cachê para pes-quisar e escrever uma matéria e per-mi t i r que o redator venda a mesma ao edi tor de uma revista ou jornal . Redatores de viagens encontram isso com mui ta freqüência. Em tal situa-ção, seu edi tor deve saber os deta-

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lhes sobre o acordo, incluindo quais-quer bônus por colocar tal história numa publicação específica. Então o editor tem a decisão sobre se tal his-tór ia entra em conf l i to ou não com a ética do editor ou pol í t ica da compa-nhia. A revelação de tal acordo não deve vir como surpresa para o editor depois da publicação. Alguns editores e redatores insistem em incluir em suas histórias um parágrafo explican-do que o redator fo i convidado da fonte noticiosa enquanto reunia o material.

Alguns editores aceitam o conf l i to de interesses, se estes são revelados aos leitores. Entretanto os redatores de ciência crit icaram a Associated Press por uma série em dez partes so-bre câncer, escrita por A l t o n Blakes-lee, um membro aposentado da equi-pe da AP. Blakeslee escreveu a série como consultor pago pela American Câncer Society. A AP pediu para ver os artigos e vendeu a série aos jornais sem lhes contar que Blakeslee fo i pa-go pela American' Câncer Society, fonte da maior parte da informação. A decisão mereceu protestos tanto de Blakeslee quanto da ACS, mas os edi-tores da AP preferiram identif icar o autor como " t raz ido da aposentado-r ia " para a ocasião. ( 'B loom, 1979). Esses confl i tos potenciais demons-tram que muitas publicações prefe-rem ter redatores de equipe fornecen-do todos os seus textos.

Ganho financeiro pessoal

Redatores de ciência que perten-cem à equipe devem também com-

preender as polít icas da companhia sobre o uso de informações para ga-nhos pessoais, enquanto se faz "traba-lho contratado" como membro pago da equipe. Algumas organizações no-ticiosas proíbem retirar informação reunida para uma história da equipe, dando-lhe uma nova tendência e ven-dendo a história revista para outra publicação, mesmo uma não-compe-tidora. Isso, como em muitas outras situações invocando esses problemas de ética mui to pessoais, parece exces-sivo a outros redatores. Os fatos, mantêm eles, não se tornam proprie-dade exclusiva de uma companhia e quando redatores fazem matérias du-rante seu própr io tempo, deveriam ser livres para vender esse produto de seu esforço criativo. Um redator do New York Times entrou em disputa com sua companhia porque seu livro fo i aceito por um competidor da divi-são de publicação de livros do Times. Esses e outros exemplos levam os re-datores a se perguntar quão profun-damente a pol í t ica da corporação de-ve intrometer-se nas decisões éticas e financeiras pessoais. Enquanto o re-dator produz as histórias solicitadas pela empresa, deve ter a escolha livre do uso de seu tempo?

Uma questão financeira mais te-naz aflige os especialistas tanto de ci-ência como de comércio. Trata-se do uso de suas oportunidades para des-cobrir informações prévias sobre uma companhia e lucrar com isso em ne-gócios ou investimento em ações. Os redatores de ciência e comércio tra-balham no principal nível de planeja mento dos negócios e da alta tecnolo-

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gia. Os redatores de serviços telegrá-ficos e jornais e revistas nacionais sa-bem que uma matéria favorável ou desfavorável afetará os preços das ações à medida que os subscritores compram ou vendem suas ações de-pois de lerem a matéria. Os redatores de ciência sabem que são bajulados por alguns fabricantes de drogas com a esperança de aumentar o mercado de ações. Os cientistas e médicos que investigam a eficiência de drogas de-frontam-se com tentações similares. Um relatório ru im sobre os efeitos colaterais de uma droga, por exem-plo, pode fazer as ações caírem. E os redatores de ciência e comércio têm informações prévias e oportunidades de chamar seus corretores antes que a matéria apareça. Bishop, d o The Wall Street Journal encontrou analistas de ações em conferências de imprensa e reuniões científ icas. Também conta a história dos 300 milhões de dólares em ações da Merck & Co. mudando de mãos na véspera de um press re-lease prévio ser impresso. Freqüente-mente os analistas estão em listas de mala-direta que lhes possibilitam obter cópias adiantadas de periódicos cientí f icos e outros materiais. Outro repórter do Wall Street Journal obte-ve de um analista de ações o tex to completo de uma pesquisa cl ínica fa-vorável dois meses antes de sua data de publicação. Existem suspeitas de que o pesquisador e o analista tives-sem esperanças por uma boa matéria para levantar o preço das ações (Bi-shop, 1981).

Algumas publicações pro íbem possuir ações nas empresas sobre as

quais você escreve, e muitos redato-res permanecem voluntariamente fo-ra do mercado. Outros redatores con-sideram que o modo pelo qual qual-quer ação irá se mover é arriscado, no melhor dos casos, e não vêem quais-quer problemas em possuir ações e especular. Recomendar ações especí-ficas, entretanto, poderia forçá-lo a ser registrado como agente sob as re-gras da Securities and Exchange Commission. Comprar e vender ações baseado, em informações prévias des-se t ipo poderia deixá-lo vulnerável a acusações de "insider trading", em-bora o SEC não seja uma força de sanção escrita. Como quaisquer con-troles ou licenças do SEC sobre uma publicação, tais como um bolet im noticioso sobre investimentos, amea-çam violar garantias Constitucionais da liberdade de imprensa, a ética pes-soal pode ser o único guia aqui. Mas há tentações potencialmente crimi-nosas também; um redator de comér-cio terminou na prisão por procurar pagamento para reter uma matéria desfavorável.

Ética das publicações

Os administradores de publicações às vezes precisam olhar para seus pró-prios padrões éticos. A Science 83 in-cluiu anúncios classificados que pro-metem graduação colegial pelo cor-reio e diplomas sem aulas. Isso pare-ce uma notícia estranha numa revista patrocinada pela American Associa-t ion for the Advancement of Science, cujos membros são tão cuidadosos sobre o caráter original de seus pró-

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prios credenciados e de seus colegas. A publicação de um anúncio não é necessariamente o endosso de um produto, mas o leitor poderia se per-guntar o que mais a publicação acha-ria aceitável. Anúncios de remédios questionáveis, assim como terapias e aparelhos, aparecem regularmente nos jornais.

Os veículos de comunicação fre-qüentemente atraem crít icas pela bai-xa velocidade e espír i to rancoroso com que reconhecem o erro. É mui to mais fácil agora obter uma correção do que no passado, exceto em casos envolvendo um libelo potencial. Mas muitos redatores e editores parecem relutantes em admit i r que são huma-nos e erram. A natureza técnica da maioria das matérias de ciência torna os redatores de ciência especialmente vulneráveis. O The New York Times levou mais de três meses para reco-nhecer uma interpretação errônea nu-ma matéria sobre matemática apesar de matemáticos terem chamado a atenção do Times para o fato. Os ma-temáticos ficaram aborrecidos, prin-cipalmente porque a matéria se espa-lhou pelo país por meio da distribui-ção dos serviços telegráficos. Quando f inalmente publicada, a concessão de erro estava enterrada seis parágrafos após o in íc io de uma nova matéria cujo golpe era de que os matemáticos americanos estavam agora dizendo que a descoberta matemática era me-nos significativa do que parecia antes. Exceto para correções exigindo os conselhos de um advogado, tais como em caso de libelo, parece haver pou-ca razão para evitar colocar os enga-

nos para trás o mais rápido possível. A relutância em corrigir erros é uma das razões por que muitos leitores di-zem que não conf iam em jornalistas. A possibilidade de imaginar uma cor-reção pode temperar alguns saltos apressados a conclusões. The At/anta Journal and Constitution admit iu er-ro em associar a radiação de uma usi-na nuclear do Rio Savannah a uma doença do sangue rara e fatal, que não t inha qualquer elo conhecido com a radiação como causa. Os reda-tores confundiram a doença fatal com outra menos séria, cuja incidên-cia na população estava dentro das normas esperadas.

Contar o que você sabe

Cada redator de ciência é solicita-do a enterrar uma história uma vez ou outra. Geralmente a solicitação vem de cientistas que o previnem pa-ra não escrever sobre os relatórios de um deles. O redator tem a escolha, uma vez que há mais para se escrever sobre ciência do que a maioria das pessoas jamais terá tempo de publi-car. A ocasião para tal solicitação ocorre, geralmente quando alguma nova interpretação é fornecida a da-dos antigos ou uma nova teoria é pro-posta. Não há respostas firmes, mas os redatores de ciência respeitados tendem a ser libertários. Imprimirão o tema se for interessante para os lei-tores em geral e deixarão os cientistas ponderarem sobre seu conceito mais tarde. A verdade geralmente sairá por si mesma e irão escrever sobre a bata-lha enquanto esta ocorre. E se o as-

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sunto não passa pelo teste do debate, deixarão de escrever a respeito. Os re-datores de ciência tendem, ao menos sob esse assunto, a concordar com o Dr. Barry Commoner , o ambientalis-ta, que incentiva você a se lembrar que a mãe-natureza sempre tem o úl-t i m o lance.

Os cientistas não estão sempre cer-tos. Earl Ubel l (Communicat ion, 1964, 36) lembra-se que o pr imei ro cientista a apontar vírus como causa de leucemia "quase fo i esfolado vi-v o " numa reunião c ient í f ica. Ubel l fo i pressionado a ignorar o relatório do cientista. Pouco depois a pesquisa do cientista recebeu o Prêmio Kalin-ga das Nações Unidas, e a maioria dos pesquisadores do câncer estava se-guindo a t r i lha do vírus. A ciência e a medicina f reqüentemente seguem modas, algumas das quais, como as sangrias, podem durar um século ou mais. Às vezes os cientistas desco-brem que const ru í ram suas carreiras sobre idéias desacreditadas ou fora de moda e teorias que defendem até se-rem forçados a abandonar.

Por que e como você deve mode-rar essa tendência a impr imir? As dú-vidas podem permanecer mesmo de-pois de determinar que uma pesquisa ou uma interpretação vai ao encontro de todos os testes sugeridos antes. As previsões de desastre, por exemplo, vão ao encontro de todos os testes de valores noticiosos. Quando uma agên-cia do governo emite um release not i -cioso, como a U.S. Geological Survey fez em 1979, sobre indicações de u m ter remoto potencial, você não pode simplesmente jogar o anúncio fora.

Pergunte se o que fo i predi to está no campo da especialidade dos pesquisa-dores e, além disso,se o campo de ciên-cia possui as técnicas para que o re-sultado seja confiável. Colocada a vá-rios cientistas, essa pergunta deve permit i r - lhe saber se tal not íc ia ba-seada em previsão tem apoio geral ou se é teoria de um ou alguns poucos pesquisadores. Dessa maneira sua his-tór ia pode ser ponderada pelo con-senso. Mas não há chance de que avi-so sobre saúde pública e segurança se-jam ignorados.

A lgum ju í zo c r í t i co é inevitável. John Lear, antigo editor de ciência na Saturday Review, certa vez obteve uma carta assinada por sete cientistas eminentes, incluindo um vencedor de Prêmio Nobel, protestando contra a possibilidade de que meteori tos te-nham escavado as bacias oceânicas há muitos e muitos anos. Lear apontou que enquanto outros cientistas pode-riam discordar, as credenciais do pes-quisador eram tão boas quanto as de-les e que o respeitado periódico bri-tânico Nature publ icou o trabalho do homem. " N ã o há nenhuma teoria aceita", escreveu Lear (1962, 41).

Simi larmente, os antropólogos fus-tigaram o The New York Times por escrever sobre um artigo, ret irado de periódico erudi to , acusando os espe-cialistas em Astecas de encobrirem a extensão do canibalismo na antiga so-ciedade. U m c r í t i co manteve que mesmo se um periódico respeitado trazia o art igo, isso não significava que seria apropr iado para o jornal passar esses pontos de vista para o públ ico. O debate no periódico erudi-

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t o estava bem, mas "não na imprensa popular onde as pessoas tendem a acreditar- em qualquer coisa que le iam", disse um antropólogo (Rens-berger, 1977, sec. 2, 23). Embora dis-postos a dar publ icidade às lutas de outras pessoas, os jornalistas podem não fazer publ icidade demasiada so-bre suas próprias escaramuças éticas. Quase ninguém escreveu sobre um ar-t igo de pesquisa indicando que arti-gos de jornal dando publicidade a as-sassinatos-suicídios por pi lotos de aviões parecem inspirar assassinatos-suicídios adicionais (Phil l ips, 1978). Os jornalistas de ciência podem ter raciocinado que não havia meios de supr imir as matérias sobre qualquer assassinato-suicídio; assim, por que se to r tu rar a respeito?

A maioria dos jornalistas, sem qualquer outra razão compulsiva, se alinhará com Bishop, do The Wall Street Journal quando solicitada a manter informação c ient í f ica fora de publicação. "Os repórteres de ciência não devem se meter a avaliar pesquisa c ient í f ica; não éseu papel serem cole-gas revisores.. . O repórter que tenta tomar esse t ipo de decisão torna-se um pregador, u m moral izador, não um repór te r " (1981, 20).

Você vive com seus enganos. Harry Nelson, editor médico do Los Angeles Times, sabia inst int ivamente que não devia ter fe i to uma matéria a part i r de um relatór io do Memorial Sloan-Kettering Inst i tute dizendo que uma droga suspeita usada no tra-tamento do câncer realmente de-monst rou alguma eficiência. Ver i f i -cou todos os indicadores de legit imi-

dade da pesquisa e do pesquisador. Sua matéria f o i protegida por qual i f i -cativos. Estudos posteriores, entre-tanto , não verif icaram os resultados. Ele suspeita que o relatór io fo i passa-do para ele por entusiastas da droga como cura milagrosa (1978) .

O colunista Bob Green (1982) irá lamentar por longo tempo ter deixa-do de disfarçar adequadamente o no-me de uma estudante secundária cujas iniciais verdadeiras í isou numa maté-ria sobre seus problemas com a droga. Suas amigas rapidamente identi f ica-ram-na e colocaram-na no ostracismo para seu desespero pessoal. A part i r dessa e outras experiências, diz ele, aprendeu a ajudar aqueles que não sa-bem o suficiente sobre os efeitos da publ icidade para se defenderem. A l -gumas vezes os redatores seguem ou-tras razões para a autocensura. Co-mo grupo, os redatores de ciência atendem às solicitações de nenhu-ma publ icidade dos pesquisadores do sexo Wi l l iam Masters e Virgínia John-son-Masters, mesmo enquanto esta-vam publ icando seus relatórios deri-vados de medir e fotografar a relação sexual humana. Matérias sensaciona-listas poderiam ter sido escritas a par-t i r da l i teratura aberta, mas os reda-tores de ciência evidentemente senti-ram a necessidade de proteger a pes-quisa de ataques se a natureza exata do pro jeto se tornasse amplamente conhecida. Portanto, os redatores de ciência podem e deverão exercer au-tocensura, mas querem passar o julga-mento, bom ou ruim. Faz parte d o aprendizado ver a si mesmo c o m o

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jornalista, e não como educador ou cientista. Algumas vezes você estará errado.

A ética nas escolhas

Outra questão de ética tem a ver com o padrão de suas escolhas de ma-térias para reportagem. Escolher es-crever regularmente sobre o bizarro, incomum, o excepcional em ciência e medicina mostra aos leitores o que você ou seus editores pensam ser im-portante em ciência. Se esses leitores concordam ou não com você é outra coisa. Pode-se afirmar que tais esco-lhas depreciam a ciência.

Você deve apoiar grupos comuni-tários a exporem seus pontos de vista para o bem da sociedade? O redator de ciência free-lancer David R. Zimmerman (1979) questiona se os redatores de ciência devem ou não envolver-se e às suas publicações mes-mo em atividades tais como histórias educacionais envolvidas com contro-le de natalidade, hábito de fumar, dietas de baixo colesterol e todas as outras campanhas de organizações voluntárias. Por natureza, essas são como todas as campanhas de relações públicas, não-críticas, tediosas e cha-tas. Há razões suficientes para que os jornalistas as ignorem, diz Zimmer-man. Além disso, essas campanhas usam os veículos para um cliente de relações públicas parcialmente ou completamente ocul to e representam a promoção de um interesse especial tanto quanto esclarecimento. Quan-do você ou seu veículo se alistam em tais campanhas, podem ter sido co-optados pelos promotores para seus

propósitos ao invés de separar mate-rial para o público geral de material de auto-serviço, um sinal de precau-ção colocado por John L. Hu l t i ngdo The Boston Globe em seu manual so-bre princípios éticos para a American Society of Newspaper Editors (1983).

Isso pode ser interpretado como se você se envolvesse em uma causa onde o propósito é mais abertamente po l í t i co do que para o bem geral. Por out ro lado, alguns cr í t icos da impren-sa censuram os veículos por não dis-porem de um raciocínio ou f i losofia clara para os tipos de matérias que es-colhem. Esses cr í t icos querem que os veículos operem mais por propósitos educacionais ou de responsabilidade social. O Dr. Gene Burd da Universi-t y of Texas em Aust in analisou um jornal metropol i tano em busca de evidências de jornalismo preventivo em medicina, matérias dando histó-rias educacionais aos leitores sobre como prevenir problemas ou lidar com situações tais como o stress. Em-bora a quantidade de espaço para no-tícias de medicina e saúde devotada à saúde preventiva (17%) tenha surpre-endido Burd, a maior parte deste pro-vinha da coluna de saúde de Jane E. Brody, distr ibuída pelo The New York Times, ou outros redatores de fora. Mui to pouco tex to de saúde preventiva vinha do redator de medi-cina e saúde do jornal sobre temas lo-cais (Burd, 1981).

Isso oferece uma visão de aborda-gem fi losófica a uma cobertura de ciência e medicina. Out ro redator, trabalhando com uma percepção di-ferente de notícias científ icas, pôde

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explorar os efeitos potenciais do ape-lo do Papa João Paulo II em novem-bro de 1983 para que os físicos aban-donassem a pesquisa para armamento mil i tar. Cinco meses depois, nenhu-ma publicação do mundo havia anali-sado o efeito. Não teria o possível efeito da persuasão moral se registra-do com os redatores de ciência como uma matéria além do evento da de-claração do Papa?

Fraudes na redação científica

Há profundas explorações f i losófi-cas disponíveis sobre o que causa fraudes na ciência, mas a maioria dos repórteres científ icos não as encon-trarão na cobertura das notícias diá-rias. Uma fraude simples, talvez ino-cente, é um evento mais provável. Po-de ser sobre você ou sobre o leitor na pressa da publicação ou transmissão eletrônica. A edição de ju lho de 1983 da revista Omni trazia uma matéria pretendendo ligar o uso humano pré-histórico do símbolo da suástica a uma pesquisa mostrando que tal pa-drão poderia ter sido formado no céu pelo gás de um cometa ou out ro objeto celestial encontrando campos magnéticos no espaço. Um dos dois investigadores com crédito pela des-coberta disse que a pesquisa não indi-cava tal conclusão. Além disso, os dois homens não haviam trabalhado juntos por muitos anos, implicando que algum trabalho mui to antigo ha-via se introduzido na imprensa como notícia fresca (Oslo, 1983).

Por ou t ro lado, você pode ser en-ganado — e enganar seus leitores.

Joseph Skaggs, um instrutor de co-municações de massa na School of Visual Arts em Nova Iorque, enganou um repórter crédulo da United Press International com uma conferência de imprensa art i f icial e releases noti-ciosos sobre hormônios de uma su-perbarata que curava alergias e ou-tros problemas. Uma verificação rot i-neira pelos indicadores discutidos aqui e antes teria descoberto uma universidade não-existente como pis-ta de que as coisas não eram confor-me apresentadas. Mas a UPI não fo i a única enganada. Uma coleção de re-cortes mostrou que aproximadamen-te cem jornais usaram a história. Uma das armadilhas em ciência é que suas descobertas são tão grandes que qua-se qualquer coisa soa possível (Mc-Donald, 1981).

0 jornalismo está mui to além do tempo, em 1913, quando Joseph Knowles e Michael McKeogh levaram uma proposição ao Boston Post. Knowles viveria praticamente nu, na floresta, por dois meses, como uma experiência "c ien t í f i ca " de sobrevi-vência, vestindo-se com peles de ani-mais e comendo nozes, frutinhas, raí-zes, peixe, patos selvagens e veados. McKeogh escreveria as matérias a par-t i r de mensagens que Knowles rabis-caria com carvão em cascas de bér-tula. Infelizmente era tudo falsifica-ção. A pele de urso de Knowles t inha dois buracos de balas e ele fo i visto entrando na cabana de McKeogh on-de reinava um chefe de cozinha (Car-son, 1981). Essa era uma época em que a fraude médica e cient í f ica tam-bém reinava. Elas cont r ibu í ram mui-

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t o para a desconf iança entre a ciên-cia e os meios de comunicação, c o m estes f reqüen temente se revelando u m cúmpl i ce disposto. Seja cét ico a respeito de histórias que pareçam boas demais para serem verdadeiras; c o m f reqüênc ia , não o são.

T a n t o a f raude médica quan to a c ien t í f i ca ainda estão por aí . A chave para a f raude reside no segredo. A ci-ência, o jo rna l i smo e o governo con-duz idos em segredo, não desafiados, o ferecem chances demais para abuso de conf iança. Rex Buchanan, u m re-dator de ciência e professor de reda-ção c ien t í f i ca vê a necessidade de os jornal istas mante rem algo da posição adversária c o m os cientistas sem alie-narem as fon tes de in fo rmação cien-t í f i ca . Isso exige comunicação aberta e to lerante c o m os cientistas (1979) .

Você é envolvido?

Podem ser levantadas questões, t a m b é m , sobre a ética do não-envol-v i m e n t o , t a n t o para cientistas c o m o para redatores de ciência. Essa é a postura que alguns cientistas ado tam, que não aceita responsabil idade pelos usos fe i tos de suas descobertas. Os jornal istas estão sob ataque t a n t o por sua neutra l idade na repor tagem c o m o por serem part idár ios. Uma sociedade de leitores e espectadores sentindo-se confusa e incapaz de separar assuntos a l tamente técnicos d i f i c i lmen te pode ser culpada por olhar o c ient ista co-m o f r i o e o jornal is ta c o m o confuso, e ambos, no melhor dos casos, igual-mente impoten tes quando seus rela-tór ios não têm mater ia l que poder ia

guiar os não-cientistas na avaliação do impac to de novas descobertas. Es-colher a coisa certa a fazer numa de-mocracia deve levar, c o m o avisa o pesquisador Daniel Yanke lov ich , a que os cient istas reduzam seu isola-m e n t o e aprendam uma discipl ina mais confusa, c o m o lidar c o m o ato de fazer po l í t i ca públ ica na arena aberta. T a m b é m serão necessários jornal istas dispostos a aprender e compreender o que esses cientistas estão fazendo se o púb l i co f izer esco-lhas racionais. Yanke lov ich escreve: "Ma is cedo ou mais tarde as decisões que de te rm inam a nossa sobrevivên-cia deverão ser endossadas pelo elei-t o r a d o " (1984 , 12).

Antes de aceitar c o m animação excessiva a arb i t ragem dos assuntos públ icos pelos cient istas, os jornal is-tas poder iam m u i t o bem se lembrar dos avisos d o fa lec ido Po lykarp Kusch, f í s i co e vencedor de Prêmio Nobe l :

A ciência não pode fazer um grande número de coisas, e assumir que a ciência pode descobrir uma solução técnica para todos os problemas é caminho para o desastre. . . A ciên-cia, em si mesma, não é a fonte dos padrões éticos, da visão moral, da sabedoria que é necessária para fa-zer julgamento de valor, embora se-ja um ingrediente importante para fazer julgamento de valor. Um nú-mero desanimador de cidadãos acre-dita que cabe ao cientista fazer o julgamento, como se ele tivesse um conjunto especialmente válido de valores (Kusch, 1961, 3).

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A pseudociência nos veículos de comunicação

A grande quantidade de falsa ciên-cia ocupando tempo e espaço nos veículos de comunicação é assunto de preocupação imediata dos cientis-tas e redatores de ciência. Os admi-nistradores dos meios de comunica-ção se preocupam sobre a credibilida-de dos meios enquanto exercem mui-to pouca influência sobre o conteúdo que os leitores educados e conhece-dores, assim como os espectadores af irmam ser de valor dúbio, no me-lhor dos casos. Os horóscopos diários e outro material de astrologia ofere-cem o mais notável exemplo dessa es-pécie de material. Sua publicação po-de ser justif icada pelo fato de que mi-lhões de pessoas acreditam em horós-copo e exigem-no de seu jornal ou comprarão outro. Os valores de en-tretenimento também proporcionam um raciocínio para a publicação dos horóscopos. Entretanto, isso enfra-quece o caso dos veículos quando procuram impor respeito na base da acurácia e seriedade de propósitos.

Os meios de comunicação são vul-neráveis também, em terreno ético, à publicação de uma grande variedade de assuntos de moda, de medicina e saúde, sem buscar informação adicio-nal, especializada. Periodicamente, por exemplo, os meios de comunica-ção trarão matérias sobre pessoas que saciam as suas vontades em tentativas exóticas para curar qualquer t i po de doença crônica. Sentar-se em antigas minas de urânio para absorver radia-ção ou voar para algum país estran-geiro para tomar injeções de misterio-

sas drogas milagrosas oferecem ape-nas dois exemplos. Os repórteres ge-rais assim como os de ciência devem ser céticos sempre que alguém os aborda com afirmativas de "cu ra " através de alguma fórmula ou apare-lho exclusivo e secreto, um simples método de alívio, testemunhos vagos de pessoas cuja identidade plena não pode ser estabelecida ou alguma solu-ção especial dietética ou nutricional. Outra pista para um jogo de confian-ça é quando a promoção repousa em limpar o corpo de venenos njio-espe-cificados.

Os redatores devem ser prevenidos de que estão por tomar parte em prá-ticas não-éticas se a fonte de notícias alega aprovação da Food and Drug Admin is t ra t ion; a lei federal não per-mite sugerir a aprovação da FDA no marketing. Cuidado, por tanto, com afirmações de que a FDA, o esta-blishment médico ou as conhecidas fundações de doenças estão em algu-ma conspiração para reter informa-ções ou a aprovação do assim chama-do tratamento. Freqüentemente essas promessas estão envolvidas por uma confusão de termos vagos de sonori-dade cient í f ica que a um exame na-da significam. Isso ajuda o charlatão negar ter fe i to quaisquer promessas quando a lei começa a perceber a pa-tifaria.

Os médicos charlatães usam os re-datores e o público ao negociar uma transferência de confiança, uma tare-fa tornada mais fácil por algumas das bem divulgadas práticas médicas e econômicas de hospitais e médicos. A

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tát ica incluiu comparações de custo, t ratamentos in t rodutór ios grátis, afir-mações de que todos os médicos são açougueiros ou envenenam os pacien-tes, dizendo aos crédulos que os pra-ticantes da medicina convencional es-tão "ocupados demais" para dar ple-na atenção a uma condição, e uma dúzia de outras alegações para minar sua confiança. Esses são truques de vendedores bem conhecidos, levando-o a concordar em um pon to e trans-portar essa concordância para outros campos.

Outra t rama favori ta dos charla-tães é a redescoberta de uma " c u r a " na China, Áf r ica, T ibet ou outra terra exót ica conhecida pelos antigos e perdida durante séculos.

Os testemunhos são part icularmen-te di f íceis de resistir. Poucos ofere-cem documentação de que as pessoas foram diagnosticadas como realmen-te tendo a doença afirmada. Entre-tanto, mesmo as pessoas com as do-enças mais devastadoras às vezes sen-tem-se melhor , embora brevemente. Algumas doenças simplesmente se-guem seu curso, com ou sem trata-mento. Somente um número sufici-ente de remissões espontâneas da do-ença, por razões que os médicos gos-tar iam de compreender, são registra-

das para apoiar a esperança e susten-tar o charlatanismo. Cuidado com afirmações tan to cientí f icas quanto médicas que dependem de percep-ções sensoriais; os sentidos podem ser enganados como qualquer mágico po-de testemunhar. Insista em ver os da-dos de teste reunidos de uma manei-ra organizada e neutra. Ver i f ique as fontes de tais dados.

Os redatores podem ser induzidos na aceitação e publicação de material não-ético através do endosso de uma associação aparentemente legí t ima, profissional ou de negócios. Ver i f i -que os membros de tais associações. Nada é mais fáci l de formar do que uma associação auto protetora. Veri-f ique credenciais; no campo dos cui-dados médicos e de saúde, não existe tal coisa como uma escola confiável sem créditos.

A National Associat ion of Science Writers af i rma que você deve tomar todas as medidas necessárias para as-segurar que toda a informação que transmite seja acurada, verdadeira e imparcial. A associação também fran-ze a testa a receber remuneração pa-ra permit i r que seu nome seja usado para " p r o m o v e r " um serviço comer-cial, p roduto ou organização.

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Capítulo 11

Transmitindo notícias científicas

AS REPORTAGENS NOTICIOSAS CIEN-TIFICAS EM RÁDIO E TV chegam em tamanhos e qualidades de pacotes al-tamente variáveis. Os pacotes variam de " n o t í c i a s " curtas de v inte a no-venta segundos, espremidas entre eventos locais e mundiais nos not ic iá-rios da no i te , aos documentár ios ela-borados de uma hora de duração, do National Geographic e a série educa-cional " C o s m o s " que fez do ast ro f í -sico Carl Sagan, da Cornel l Univers i ty , uma celebridade internacional . Cada documentá r io e cada programa de uma série pode levar semanas a ser p roduz ido , e ás vezes meses ou anos. Para alcançar os padrões técnicos da rede é necessário equ ipamento elabo-rado de produção e f i lmagem ou v í -deo-teipe. Isso to rna os documentá-rios proposições m u i t o dispendiosas. A l é m do mais, os shows de ciência e medicina são vistos c o m o programas de interesse de u m públ ico l im i tado.

Houve algumas exceções. O Heal th Science Center da Univers i ty o f Texas, em Houston, p roduz iu , com propósi tos educacionais e de re-lações públ icas, uma série de progra-mas de conselhos médicos que rece-beram per to de dois minu tos de pre-cioso t e m p o de transmissão em shows noticiosos de dúzias de cidades no Texas e em outras partes do país. O

sucesso dessa série reside parcialmen-te em seu moderador , Dr . Red Duke, um médico envolvente, de fala arras-tada, de bigodes crespos, cujos óculos de vovô de aros de aço não puderam esconder sua projeção de intensa preocupação pelos pacientes. Ele pa-recia soar m u i t o d i ferente de seu mé-dico de f a m í l i a costumeiro.

Esse sucesso ilustra dois proble-mas que os jornal istas de rádio e T V encaram ao fazer reportagem de no-t íc ias c ient í f icas. Em televisão, espe-c ia lmente, você precisa de uma com-binação de voz e personalidade que se mesclam ao assunto em f o c o pa-ra prender uma audiência o t e m p o suf ic iente para conseguir contar a maior ia das histórias de ciência. A personalidade pelo rádio chega com a mesma fo rça através do t i m b r e de voz e r i t m o do discurso, combinados com as vozes de out ros atores do dra-ma. De o u t r o modo , a tendência d o públ ico a mudar para algo mais dra-mát ico ou magnét ico produz uma baixa audiência que uma rede ou es-tação local não pode suportar . Os ín-dices baixos de audiência prejudica-ram essencialmente um programa se-manal de T V sobre ciência, apresenta-do por Walter Cronk i te , que t inha a imagem e reputação de ser o apresen-tador , merecedor da maior conf iança

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nas not íc ias das redes. A honestidade e confiança não foram suficientes para manter a audiência, uma vez que ele se mostrou afastado dos eventos excitantes e f reqüentemente estres-santes das notícias diárias, para os espectadores.

A Nat ional Public Radio, algumas poucas estações locais e o Public Broadcasting Service mantêm com-promissos com programas de ciência e natureza porque a po l í t ica di ta que devem fazê-lo. Também l idam com uma audiência fiel de pessoas educa-das e afluentes, espectadores ideais de not íc ias cientí f icas. O "Undersea Wor ld of Jacques Costeau" fo i um marco na televisão pública. A Cable News Network também usou progra-mas médicos regulares patrocinados por uma companhia farmacêutica. A American Association fo r the Ad-vancement of Science exper imentou com notas de rádio de noventa segun-dos distr ibuídas às estações comer-ciais para uso gratui to e o Amer ican Inst i tute of Physics ten tou interes-sar estações de T V usando " f lashes" de ciência de dois minutos durante os shows de notícias. Eventualmente, estações de rádio comercial dedicam tempo â ciência e medicina e os ani-madores de shows de entrevistas irão arrebanhar um cientista entre seus convidados uma vez por outra. Freqüentemente os especialistas li-dam em ciência aplicada, tal como o hor t icu l tor que responde a perguntas sobre métodos de plant io e podas de árvores. Há excecões. A estação KGO, FM, de São Francisco, concedeu em 1983 duas horas semanais a um pro-

grama de ciência cobr indo todas as áreas, exceto as ciências sociais e a medicina. Suspeitas trocadas entre os comunicadores eletrônicos indicam que acreditam que os programas de ci-ência convencional atraem uma au-diência estimada entre 10 e 20% dos espectadores de fãs de ciência hard-core que assistirão a qualquer coisa desse gênero. Com freqüência, pro-gramas de ciência-natural são encai-xados em brechas de tempo onde o nível de audiência é baixo de qual-quer maneira. Uma vantagem dos seg-mentos curtos dedicados à programa-ção de ciência é que eles podem ser in t roduzidos em programas not ic io-sos ou tempo comercial não-vendido sem mui ta perturbação á programa-ção regular. A falta de apelo comer-cial seguro da ciência cont r ibu i para uma dolor ida frustração com os veí-culos entre os redatores de ciência e cientistas que vêem a televisão como uma maneira especialmente efetiva de ensinar a respeito de ciência às pessoas.

Embora todas as três redes nacio-nais tenham um ou mais especialistas em notícias cientí f icas as aparições ao vivo de Jules Bergman da A B C , que é o deão dos jornalistas c ient í f i -cos da televisão, após cerca de t r in ta anos com a rede, ou de Robert Bazell, da NBC, são limitadas pr incipalmente a matérias noticiosas curtas exceto quando "grandes eventos" ocorrem na ciência ou medicina. Bergman, por exemplo, obtém sua maior exposição de câmera durante os vôos espaciais ou quando um ou t ro evento tecno-lógico, tal como a implantação do

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primeiro coração art i f ic ial , faz not í -cia por outras razões que não a ciên-cia envolvida. O especialista em ci-ência apóia a cobertura noticiosa do evento com explicações ou entrevis-tas interpretando os processos téc-nicos que rodeiam o evento em si. Bergman e Phil Lewis, seu produtor , receberam o Prêmio Science in So-ciety da National Association of Sci-ence Writers por "Asbestos: The Way to Dusty Death" . Esse documentário brotou de um evento noticioso de uma controvérsia pública que irrom-peu quando processos alegando do-enças relacionadas ao asbestos amea-çaram a estabilidade financeira de companhias na indústria do asbestos. O documentário desafiou Bergman a explicar os aspectos médicos, econô-micos e legais da história.

Escrevendo para veículos eletrônicos

O apelo dos veículos eletrônicos, especialmente a televisão e suas vari-antes, atrai os redatores de ciência apesar da feroz competição por em-pregos e tempo no ar. George Ale-xander, repórter de ciência para Los Angeles Times, deixou seu jornal após vinte e cinco anos de jornalismo impresso para um fellowship de um ano na Macy Foundat ion destinado a levar mais jornalistas cientí f icos para os meios eletrônicos. Sua maior sur-presa fo i o ajustamento necessário para minimizar suas próprias contr i-buições e deixar seus temas contarem a história com suas próprias palavras. Os jornalistas dos meios eletrônicos

podem trabalhar um dia ou dois nu-ma matéria de dois minutos ou uma semana numa que leve seis minutos (Alexander, 1985). Muitos jornalistas descobriram que necessitam de trata-mento vocal e certo t ipo de at i tude para lidar com os equipamentos de gravação e as complexidades de cor-tar e retalhar as fitas de gravação magnética.

Para a maioria dos jornalistas cien-t í f icos, a melhor oportunidade para a redação de ciência em rádio e televi-são virá como produtor . Há pequena especialização de personalidades de vídeo com suas equipes de televisão local para notícias e matérias porque se espera que cubram vários eventos noticiosos a cada dia. Muitos preci-sam escrever também seus próprios scripts. Os altos salários dos corres-pondentes noticiosos das redes tor-nam antieconômico, na visão da ad-ministração da T V , ter "pessoas" envolvidas tempo demais na lo-gística de pesquisar uma matéria, promover os compromissos de f i lma-gem e movimentar equipes de câme-ra pelo ambiente. Esse trabalho fica a cargo do produtor.

O produtor é responsável por pes-quisar e apresentar idéias de matérias, conduzindo-as através do processo de seleção, fazendo ou orientando pes-quisa de campo, escolhendo locações, administrando as equipes de câmeras, organizando as seqüências de produ-ção e freqüentemente escrevendo o esboço f inal (ou a versão final) do script. Depois que tudo isso está no lugar, os "anchors" entram para rever o script e gravar as seqüências onde

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aparecem. A televisão é u m esforço de grupo. Embora a introdução de novas câmeras leves miniaturizadas e material de gravação sonora não torne mais a televisão duas mi l libras, em lápis, de jornal ismo, é mais traba-lhosa para os jornalistas do que o jor-nalismo impresso. Alguns shows de tevê são fei tos como produções de es-túd io ; "Cosmos" , por exemplo, usava elaborados ambientes de palco para realçar a sensação de que o modera-dor Sagan estava fazendo uma viagem pelo universo.

Os repórteres de rádio precisam de um gravador de f i ta de qualidade pa-ra transmissão, um que reproduza as conversações e entrevistas com uma f idel idade melhor do que os gravado-res de f i ta disponíveis na fa ixa mais baixa na escala de preços. U m repór-ter de imprensa pode arranjar-se com l impidez suficiente de som para transcrever as notas-chave. O repórter radiofônico pode trazer pessoas para o estúdio para entrevistas ao vivo no ar, mas arrisca-se a perder a audiência se a qu ímica produzir um aconteci-mento chato. Os repórteres de rádio podem juntar seus próprios comentá-rios aos das pessoas a quem entrevis-tam. Essa técnica el imina trechos te-diosos e malfalados da f i ta , mas po-de ser prejudicada distorcendo-se as palavras e o contexto do entrevistado. Muitos funcionários de relações pú-blicas irão fornecer "atual idades" pa-ra uso pelo rádio, afirmações pré-gra-vadas que oferecem explicação e comentár io de temas do campo da ci-ência ou ciência-comércio públicos. Você pode obter até mesmo respos-

tas pré-gravadas, com o con jun to de perguntas a serem feitas pelo apre-sentador. Estas vêm de companhias e instituições visando publ icidade grá-tis usando o nome do cientista para promover a f inal idade de sua escola, companhia ou ponto de vista. De ma-neira geral é publ icidade gratui ta. Os funcionários de relações públicas também produzem curtos segmentos de v ídeo para uso em redes de comu-nicações internas para t re inamento de empregados de informação. Tais produtos raramente discutem os da-dos menos atraentes de u m tema ou exploram inteiramente as profunde-zas da controvérsia.

Dos repórteres dos serviços tele-gráficos também se espera que escre-vam para o rádio e para a imprensa. Para servir consumidores da l inha do rádio, os redatores dos serviços not i -ciosos também incluirão uma matéria curta escrita para estações de rádio que subscrevem os serviços not ic io-sos. Com freqüência os repórteres do serviço not ic ioso irão ler seus textos em fornecimentos às estações. Os es-cr i tór ios de relações públicas tam-bém enviam fi tas e releases noticiosos adaptados para rádio. O rádio tem a habil idade de usar efeitos sonoros e música para evocar imagens e respos-tas emocionais nas mentes dos ouvin-tes. O uso excessivo dessas e outras técnicas, tanto na tevê como no rá-d io , pode levá-lo para aquela f ronte i -ra cinzenta, mutável, entre informa-ção e entretenimento fabr icado. O uso habil idoso do som " n a t u r a l " pode evocar respostas poderosas. Em 1984 Walter Cronki te fez u m uso efi-

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ciente dos sons suaves e estalidos me-tálicos de robôs trabalhando numa fá-brica deserta e escura para "H igh Tech: Dream or Nightmare?" As ce-nas estabeleciam um t o m para o show, que levantava questões sobre o uso f u t u r o de humanos nas fábricas e os t ipos de empregos, se algum, dis-poníveis para a maioria dos trabalha-dores. A televisão também está sujei-ta a fazer os redatores procurarem pela frase de efeito agudo; o te rmo "trabalhadores de colar inho de aço " , de Cronki te , descrevendo os robôs é um exemplo. Essas frases se registram através do ouvido e se f i xam no cé-rebro.

Uma das queixas dos cientistas, al-guns dos quais se del iciam com a opor tunidade de aparecer na televi-são ou no rádio, é que os jornalistas dos meios eletrônicos são part icular-mente vulneráveis ao cientista-opera-dor que pode condensar ou supersim-pli f icar uma situação complexa numa frase enganosa. Em televisão isso está ligado com os perigos da imagem-pensamento, nos quais os argumentos ponderados e racionais apoiando uma suposição c ient í f ica, podem ser subs-t i t u ídos por uma série de imagens e palavras zumbidas que levam os es-pectadores a uma conclusão mais rá-pida que a mente — e a razão — po-dem seguir. Os tempos curtos desti-nados a cada matéria num programa noticioso compõem os problemas e to rnam o veículo vulnerável à distor-ção e á interpretação incorreta.

Escrever para rádio e televisão vem mais naturalmente para alguns redatores de ciência do que para ou-

tros. A chave para a redação eficiente de rádio e tevê é lembrar-se de que você está transfer indo informação através do ouv ido e não através do o lho. O ouvido aceita a informação num r i t m o mu i to mais lento e requer o condic ionamento da mente a rece-ber através do ouv ido. Entretanto, á medida que você desenvolver a habili-dade de escrever para o ouv ido , vai poder apreciar a beleza da precisão com que pode controlar esse instru-mento maravilhoso, a voz humana, através de seus scripts.

Esse contro le é realizado por se saber que a voz normal de discurso transmite de 150 a 180 palavras por m i n u t o . Isso permite que você ou as pessoas para quem você escreve esti-mem o tempo de uma matéria em termos de segundos. Quando você se famil iar izar mais com seu p rópr io r i t -mo de discurso ou o de alguém para quem escreve regularmente, você po-de atingir o tempo requerido com precisão. Você e seu apresentador de-vem ler o script inteiro em voz alta para localizar redação ru im e incerta na versão falada e obter u m tempo real. (Pelas mesmas razões, mui tos re-datores de imprensa descobrirão que suas matérias saem beneficiadas ao serem lidas em voz alta para revelar problemas similares nas matérias para os meios impressos.) Alguns redato-res têm a habilidade de ouvir uma matéria enquanto a lêem silenciosa-mente.

Por que você está escrevendo para voz e ouv ido, que processam a infor-mação mais lentamente que o o lho, suas frases devem ser mu i to mais cur-

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tas, mais declarativas. Isso requer pensamentos claros e agudos. As sen-tenças mais curtas também dão ao seu apresentador a opor tunidade de respirar. Use u m estilo at ivo sempre que puder. Diferentemente da pala-vra impressa, as convenções de rádio e televisão favorecem o uso da reda-ção no presente. Você pode misturar o presente e o passado, o que é de-sencorajado na maior parte dos traba-lhos impressos. Embora as pessoas ge-ralmente leiam uma matéria de jor-nais e revistas silenciosamente e a sós, a rádio e a televisão parecem para os membros da audiência m u i t o mais pessoais do que a imprensa. Por isso você pode adotar um esti lo de abor-dagem pessoal um tan to mais casual do que poderia usar para uma maté-ria que fosse para a imprensa. Evite a orientação que lhe diz para escrever como fala, a não ser que fale efetiva-mente mu i to bem. Escrever para os meios eletrônicos é escrever como vo-cê gostaria de falar. Apenas algumas poucas estações especializadas tole-ram a expressão carregada de gír ia e informal idade. Dirigir-se diretamente é mais aceitável para os editores de not íc ias de rádio e televisão do que o é para os editores dos meios impres-sos.

Há algumas coisas a evitar ao es-crever para o ouvido. Não alinhe as palavras com " s " e " c " ou outras si-bilantes juntas. O mesmo vale para as percussivas, tais como "Peter Piper picked a peck..." As sibilantes e per-cussivas podem fazer o seu apresenta-dor soar como uma instalação elétri-ca em curto-c i rcui to. Você estará si-

bi lando para o ouvinte. Evite juntar fatos e números demais numa única sentença. Enquanto os editores dos meios impressos gostam dessa reda-ção retesada e compacta, atirar coi-sas demais para o ouv inte sobrecar-rega-lhe o ouvido e o cérebro. A re-dação falada é m u i t o mais relaxada e contém palavras incluídas para sepa-rar as partes pesadas de fatos que f lu-tuam através de uma sentença.

A comunicação falada é mais efi-ciente quando o ouv ido e o cérebro estão condicionados a receber sua in-formação. Por isso, poucos redatores de rádio começarão uma matéria ou sentença com um nome, a não ser que a base para identif icação já tenha sido exposta na matéria. " U m f ís ico disse hoje que . . . "precederá a senten-ça contendo o nome d o cientista a não ser que ele seja bem conhecido. Alguns fatos de rot ina podem ser omi t idos inteiramente. Idades, t í t u -los precisos, endereços e às vezes no-mes de cidades perdem a pertinência de comandar o tempo numa reporta-gem curta de rádio ou televisão. Você economiza cada palavra que pode porque não terá suficientes delas pa-ra contar todos os fatos relevantes. A informação histórica também obtém pouco espaço de tempo nas matérias noticiosas eletrônicas.

Os repórteres de rádio têm uma vantagem sobre suas contrapartes da tevê. Podem encaixar ou coletar uma conversação telefônica na transmis-são ou em seus gravadores de f i ta sem acordos anteriores elaborados. Você deve, entretanto, dizer a seu entrevis-tado que está gravando a conversa

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para uso dos meios eletrônicos. Ao editar trechos de conversação para a transmissão, você precisa ter cuidado de manter esses fragmentos no con-texto da conversação toda. Isso é jor-nalismo ético.

Palavras com imagens

Duas coisas que os vefculos ele-trônicos não podem tolerar é ar para-do e telas mortas. Você se lembra de dirigir e ouvir o rádio? Subitamente não há som. Isso o espantou? Você pode ter se perguntado se foi o rádio que quebrou. Um problema de energia t i rou a estação do ar? 0 apresentador pode ter apenas f icado fora da cabine por mais tempo do que pretendia, permit indo que uma f i ta ou disco terminasse. Seja o que for que aconteceu, certamente não fo i plane-jado. Como você viu pelo fato de adaptar os scripts para 150 a 180 pa-lavras por minuto , você pode estimar o tempo até uma fração de segundo. O processo trabalha ao contrár io — ou simultaneamente — para a televi-são. As imagens e palavras são coor-denadas do mesmo modo, com as molduras ou centimetragem de ima-gens a ser usada na história. Isso per-mite que você inclua imagens de uma transmissão de tevê ao coordená-las com a voz do apresentador. Você de-ve preencher o tempo no ar reservado para a matéria. E os segmentos de som devem igualar os segmentos de f i lme ou f i ta em cada cena da maté-ria. O f i lme e a f i ta são medidos pela velocidade de projeção, em quadros por segundo para o f i lme ou polega-

das por segundo para a f i ta . Rara-mente as histórias na televisão são a f i ta completa, não editada, " c rua " , registrada pela equipe de câmera. Elas são editadas, o que você como produtor pode fazer também, para preservar apenas as melhores ima-gens e citações.

Você pode usar na matéria f i l -me ou f i ta "de f o r a " , de um cien-tista ou escritório de informação pú-blica, "dublando-as" ou copiando segmentos e retalhando-os para sua matéria. Muitos pesquisadores f i l -mam experiências ou gravam exem-plos para mostrar suas discussões. Os hospitais de ensino podem ter a as-sistência de fotógrafos mui to especia-lizados, artistas e redatores para aju-dá-los. Você precisa apenas saber a extensão de tempo requerido para mostrar uma quantidade adequada de ação cient í f ica, a ferti l ização de um óvulo pelo esperma, por exemplo. Então você pode escrever a quantida-de de tex to necessária a cobrir e ex-plicar a imagen pelo tempo em que o f i lme ou f i ta estará no tubo ou tela de cinema. Quando você tem o acom-panhamento de imagens, não precisa colocar a matéria toda em palavras. Deixe que as imagens contem o máxi-mo possível, explicando o menos que precisar. A o trabalhar com imagens, não explique o que é óbvio ao espec-tador. Use suas preciosas palavras pa-ra informação de fundo, destacar o significado e explicar o que sua audi-ência não está vendo mas precisa sa-ber para compreender a imagem. Os redatores de televisão e f i lmes, bem

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como os editores, seguem a regra de que "menos é mais".

Se a f i ta ou f i lme tem seu própr io som, como um entrevistado respon-dendo a uma pergunta ou um som inerente â ação sendo observada, você precisará de um par de transi-ções. Essas são palavras conhecidas como "lead in" e "lead out" destina-das a condicionar seus espectadores à mudança de cena por acontecer. Se a f i ta ou f i lme não tem som própr io, você deve providenciar um "voice over" para explicar o que está acon-tecendo. Novamente, evite explicar o óbvio.

Os scripts podem ser escritos in-teiramente em maiúscula ou maiúscu-las e minúsculas. Uma das conven-ções da transmissão eletrônica é o script "allkaps". Entretanto, uma combinação de letras maiúsculas e minúsculas é mais fácil de ler. Prova-velmente seu texto será colocado num gerador de caracteres que proje-tará o script num aparelho de leitura off-câmera que permite aos apresen-tadores seguirem o tex to sem parece-rem estar lendo de um script. Com freqüência o equipamento para lei-tura é uma tela de televisão oculta na mesa do apresentador. Os geradores de caracteres, de modo bastante se-melhante aos processadores de pala-vras, podem também colocar infor-mação adicional e instrumentos gráfi-cos diretamente na tela. Por exemplo, você pode aumentar a informação lo-cal com um "crawler " de palavras ao longo do pé da imagem ou em pon-tos-chave destacados. Você não está l imitado, também, a imagens em mo-

vimento de fi lmes ou fitas. Uma fo to-grafia parada pode ser "congelada" na tela para dar aos espectadores uma visão de perto de alguma parte-chave da ação. Muitas estações têm artis-tas gráficos que preparam mapas, gráficos, e ilustrações com imagens paradas para ilustrar seu ponto. Estes podem ser alimentados para a ima-gem eletrônica de projetores para fo-tografias e slides. Parte da arte da te-levisão bem-sucedida e interessante reside em escolher a mescla de tais materiais para produzir o efeito certo em sua audiência assim como ilustrar seu ponto.

Procurando a ação

As imagens paradas são considera-das de pequeno nível de interesse na programação de televisão, mesmo que seja a melhor maneira de ilustrar o ponto de sua história. Aceite, entretanto, que a tevê é o veículo do movimento. Assim, uma matéria com muita ação irá derrubar uma história sem ação. Um dos desafortunados obstáculos visuais das matérias de ci-ência e medicina é que muitos dos mais dramáticos momentos não po-dem ser vistos ou não podem ser fo-tografados — ou não há ação. Você pode conseguir animação simulada através de várias técnicas. Uma técni-ca é a fotografia em lapsos de tempo, aquelas imagens onde você vê uma f lor se abrindo, por exemplo. Como com a f lo r se abrindo, a fotografia de lapsos de tempo perdeu sua novidade e tornou-se um lugar-comum. As ve-zes passear o foco da câmara através

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de várias partes de uma fotograf ia pa-rada especialmente dramática de uma experiência funciona para obter mo-v imento simulado aos olhos do espec-tador . A animação real, o processo pelo qual os personagens dos dese-nhos animais parecem mover-se, é dispendiosa e demorada, d i f ic i lmente adequada para notícias curtas. Gráf i -cos mais rápidos, inc lu indo gráficos animados, podem ser obt idos de no-vos programas de software desenvol-vidos para microcomputadores. No momento essas possibilidades gráficas emergentes func ionam melhor nas meios de programadores experientes.

Por o u t r o lado, os "pacotes gráfi-cos" estão se tornando cada vez mais parte da documentação c ient í f ica, e muitas de suas fontes noticiosas po-dem produzi-las como parte de suas investigações. Seu pessoal de câmera pode fotografar essas ilustrações da tela de um computador ou talvez tê-las duplicadas em fitas vídeo-cassete. Pergunte sobre essas possibilidades eletrônicas. Em algumas universida-des, laboratórios do governo, hospi-tais e indústrias, há artistas gráficos, fotógrafos ou técnicos de design as-sistidos por computador , o computer-aided design (CAD) que podem ser capazes de produzir simulações para você. Os próprios investigadores ou escritórios de relações públicas po-dem fazer os arranjos. As ilustrações geradas por computador que incluem mov imento simulado at ingiram um nível mu i to realista em alguns labora-tór ios. O processo de programação é tedioso e caro. A medida que se aprende sobre programação para

tais ilustrações, esse processo po-de oferecer tanto a cientistas como a jornalistas c ient í f icos um m o d o mais acurado de retratar para a audi-ência em geral como os especialistas pensam que o mundo f ís ico opera. Is-so acrescentará novas dimensões à compreensão através de ver o não-vi-sível.

Simi larmente, as figuras em movi-mento podem documentar partes da investigação real. As cópias podem estar disponíveis se você pedir. Mui-tos processos de alta velocidade, tais como túnel de vento e testes de tem-peratura, usam fotograf ia de alta ve :

locidade chamada Schtieren (som-bras), que registra as mudanças na densidade do ar ao redor de um obje-t o em teste. Alguns laboratórios te-rão o equipamento eletrônico neces-sário para acrescentar cores falsas à fotograf ia em preto e branco. É dessa maneira que a cor é acrescentada às fotograf ias de satélites da terra, dis-poníveis através de escritórios do go-verno. A técnica pode ser aplicada a outras imagens computadorizadas pa-ra t ransformar o invisível em uma imagem.

Em muitos eventos noticiosos, tais como lançamentos espaciais, os cien-tistas e o escritório de relações públ i-cas podem colocar à disposição mo-delos, chamados mock-up, e ajudan-tes em t re inamento como figurantes e apoio para acrescentar interesse vi-sual às suas matérias. Os médicos fre-qüentemente fazem operações simu-ladas em animais, bonecos e cadáve-res como parte de sua preparação pa-ra procedimentos experimentais. Esse

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pode ser u m material for te para colo-car na televisão. A maior parte da ci-rurgia experimental é documentada rot ineiramente, passo a passo, com comentários do experimentador-che-fe. O problema de gosto pode forçá-lo a editar parte dos segmentos mais sangrentos ou a ter a coragem e apoio da administração para t ransmit i r ma-terial que pode chocar u m grande nú-mero de espectadores. U m ramo pe-queno porém em crescimento da lei lida com a responsabilidade legal dos veículos pela disseminação de mate-rial que pode ter efeitos adversos em espectadores desavisados. Os experi-mentos com animais podem provocar protestos de grupos de proteção aos animais além de ilustração para suas matérias. O redator pode querer con-siderar um aviso aos espectadores de que tal material está entrando numa produção.

A maioria das ilustrações, part icu-larmente para histórias noticiosas, se-rá tomada no local por suas equi-pes de câmeras. A melhor das reu-niões cientí f icas lhe providenciará um lugar isolado para entrevistar cientistas. Se isso não fo r parte dos arranjos para a imprensa, você terá de encontrar seu própr io canto t ranqüi-lo. Quanto mais leve e mais por tát i l for o equipamento ENG (e le t ron ic news gathering — coleta eletrônica de notícias) isso se tornará mais fáci l , mas você precisa propor as perguntas. Isso fica mu i to d i f í c i l quando você sabe que terá apenas uns poucos se-gundos para a matéria no ar. A maio-ria dos repórteres de tevê fará uma entrevista a seco antes de gravar, aju-

dando o entrevistado a procurar res-postas curtas e diretas onde possível. Mas você já pensou nos problemas de tentar explicar o D N A em t r in ta se-gundos?

Algumas restrições de tempo fa-zem as entrevistas de televisão pare-cerem supersimplificadas. Out ro obs-táculo é que os entrevistadores de te-vê raramente são especialistas em ciência. São generalistas ou têm uma famil iar idade melhor com o material da po l í t ica e dos negócios públicos. Assim, a habil idade de um repórter em compreender o coração de uma história ou compr imi r as perguntas e respostas em poucos segundos pode orientar mais as escolhas de matérias d o que o significado do conteúdo c ien t í f i co e tecnológico. Quanto mais perto a descoberta ou aplicação che-ga da experiência humana geral, mais provável que a televisão, o verdadeiro meio de comunicação de massa, irá usar a história. " C o m o resultado esse sistema requer jornalistas com estô-magos fortes, capazes de fazer per-guntas embaraçosas que sabem ser es-túp idas" , diz Ira F la tow (1979, 10), da National Public Radio. Os jorna-listas eletrônicos têm apenas uma chance com a matéria.

Como as ilustrações na televisão f luem diante do espectador, despir o trabalho de arte e foco da fotograf ia até os elementos mais simples é mais impor tante do que para os jornalistas dos meios impressos. Uma ilustração completa num jornal ou revista pode ser estudada e reestudada pelo lei tor, mas isso fica além da capacidade de memória dos espectadores de televi-

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são. O material gravado em vídeo-cas-setes pode ser uma exceção se o equi-pamento tiver uma função de "stop-action" que irá congelar e manter o quadro na tela de tevê para projeção demorada. Algum material educacio-nal faz uso dessa capacidade para per-mit ir aos espectadores estuoarem uma cena até que compreendam o que vêem.

Combinar a seqüência de ilustra-ções e descrições que as acompanham exige mui to da mesma lógica e arte para organizar uma matéria longa de ciência para impressão. A história se move da abertura, através de pontos-chave até seu cl ímax. A matéria noti-ciosa curta pode cobrir , no máximo, apenas um aspecto da história. Evite sobrecarregar a matéria com detalhes que consomem tempo. Se tiver uma matéria mais longa, você poderá pre-ver a organização com "story-boards". Estes são esboços grosseiros, desenhados no formato de tela, das ilustrações-chave da história, os mar-cos que ajudam a visualizar a organi-zação e progresso da matéria. Obvia-mente a produção de televisão envol-ve mais do que os passos gerais deli-neados aqui. Vários livros lidando com o processo de escrever para tevê estão disponíveis, mas esses passos básicos servirão para você começar. Muitos colégios e ginásios oferecem cursos de produção de televisão, e em muitas comunidades a empresa local de cabo oferece acesso gratuito ou barato ao treinamento de produção de tevê como parte de seu contrato local.

Acurácia versus estereótipo

Nem todos os jornalistas de ciên-cia aceitam o padrão da televisão co-mercial, mesmo quando o sucesso fi-nanceiro vem com a fórmula. O anti-go presidente da NASW, Edward Edelson do Daily News de Nova Ior-que chamou a fórmula para "That 's Incredible" de "piores notícias pos-síveis para jornalistas que estão ten-tando escrever seriamente sobre ciên-cia e medicina nos E U A " . A mescla proposta de matérias que o ofendeu apoiava-se fortemente em itens sobre percepções extra-sensoriais, "espan-tosas" realizações científ icas, pesqui-sa com rãs e outros animais, vodu e "grandes mistérios naturais". Esses são elementos da ciência schlock, a pseudociência que trata do bizarro (1980, 2).

Um cientista preveniu os entrevis-tadores de televisão que podem es-tar na tr i lha errada perseguindo o apelo do medo na ciência. As pergun-tas pessimistas dos entrevistadores de tevê estão em agudo contraste com as perguntas otimistas que o cientista diz receber de públicos que vêem promessas na ciência e tecnologia. É uma postura mental para a qual um jornalista, de imprensa ou eletrônico, pode escorregar facilmente (Rosen, 1977).

Parte dessa armadilha é formada através de programas de entreteni-mento na televisão. Grande parte do aprendizado que ocorre sobre a ciên-cia e cientistas chega indiretamente através dos shows de entretenimento. Com algumas exceções, esses progra-mas estereotiparam a ciência como

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ameaçadora e os cientistas como fr ios, calculistas e f reqüentemente re-preensíveis. Ou os cientistas fo ram retratados como supercérebros, capa-zes de produzir milagres, o que pode bajular os cientistas mas erra o alvo. Ou t ro estereótipo é o cientista que é br i lhante no laboratório mas canhes-t ro fora dele. Com o ressurgimento do interesse pela ciência, tais at i tu-des podem levar a expectativas erra-das devido a uma imagem fabricada ou à desistência da part icipação de ci-dadãos em assuntos e confiança no especialista.

O f ís ico Jeremy Bernstein, um re-dator de ciência para The New Yor-ker, encontra objeções ao uso de ela-boradas técnicas de palco e produção para reportagem c ient í f ica: (1) os pontos c ient í f icos podem se perder na beleza do cenário; (2) você pode tornar os eventos excessivamente vi-suais, além da realidade; e (3) os re-sultados preditos podem não ocorrer. Em lugar de conseguir o efeito dra-mát ico através de cenários, pode ser suficiente mostrar simplesmente a seu públ ico os locais, as construções onde os importantes eventos de ciên-cia t iveram lugar, os laboratórios on-de a ciência é fei ta hoje. Ele também aconselha a recriação de famosas pa-lestras nas quais cientistas revelaram suas descobertas (1981).

O efei to da televisão nos especta-dores é poderoso e pode ter resulta-dos inesperados. A Royal Medicai So-ciety entrou numa séria disputa pú-blica com a Brit ish Broadcasting Cor-porat ion (BBC) após um documentá-rio alegando inadequação nos testes

bri tânicos em relação à mor te antes da remoção de órgãos para transplan-te. As doações de rins caíram 50% (UPI, 1980). Por ou t ro lado, o uso de-liberado do poderoso efei to do veícu-lo com propósi to po l í t i co fo i a inten-ção do Dr. Bernard Nathanson quan-do produziu um vídeo-teipe de ima-gens cenográficas de um fe to sendo abortado.

Os jornalistas de ciência também têm a oportunidade de corr igir im-pressões equivocadas da ciência e da medicina como aparecem nos shows de entretenimento. Mike Oppenheim, M. D., argumentou em TV Guide que a violência nos shows de entreteni-mento deveria ser ainda mais efetiva mostrando o que realmente aconte-ce como conseqüência de fer imentos de t i ro , por exemplo, embora um he-rói sendo fer ido no ombro pareça em fo rma novamente após uma semana com o braço numa t ipóia, a verdade é mu i to mais dolorosa, e é uma dor e incapacidade de longa duração. As matanças a faca não são rápidas e fá-ceis, disse o Dr. Oppenheim. " A l é m disso, qualquer u m que tenha obser-vado u m peão inexperiente matar um porco sabe que a sujeira resultante deve ser vista para se acreditar que a mor te humana é similar. Mostrar a violência como ela é realmente faria mu i to no sentido de desencorajar qualquer fascinação por ela, argu-menta. Já atacados por mostrar vio-lência demais, os produtores de T V mal podem imaginar levar mais realis-mo para os anunciantes aprovarem (Oppenheim, 1984, 20).

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"As pessoas assistiriam a mais ciência na televisão e aprenderiam mais se os organizadores de progra-mas pudessem produzir um bom es-petáculo em vez de uma boa lição de vida selvagem. Há alguns S/JOws de horário nobre que misturam conteú-do médico com drama" , diz Barbara Cul l i ton, antiga presidente da NASW e editora de notícias para a revista Science. Não há evidência de que o público esteja saturado de notícias científ icas, diz ela. " A o contrário, há uma demanda que é interessante" (1982-83,4) .

Don Herbert, que apareceu na NBC por quinze anos como " M r . Wizard", oferece esse guia de quatro passos para escrever para os meios de comunicação eletrônicos, familiar a qualquer pessoa que escreva matérias longas.

1. Conquiste a atenção dos especta-dores. 2. Desperte a curiosidade com pro-messas de coisas interessantes à fren-te. 3. Desenvolva uma " t r a m a " : o que acontecerá em seguida? 4. Resolva a " t r a m a " , cumpra a pro-messa, satisfaça o espectador.

Herbert empacotou isso num for-mato de 90 segundos para demons-trar fenômenos cientí f icos, num show mágico. O problema é o mesmo encarado por pessoas que escrevem comerciais de puDlicidade como mi-nidramas. Conseguem-nos muitas ve-zes em menos de 90 segundos para um comercial. É preciso cuidado e re-

f lexão, mas isso poderia arrancar a re-portagem de ciência dos moldes este-reotipados de entrevista de tevê e longos documentários nas transmis-sões de notícias. Algumas organiza-ções estão tentando isso agora com clips educacionais sobre ciência, me-dicina e cuidados com a saúde (Her-bert, 1982-83, 9).

CONTROVÉRSIA. Alguns dos ou-tros problemas da cobertura de ciên-cia e eventos médicos da televisão in-cluem obter notícias antes do conhe-cimento levantando alarme desneces-sário nos espectadores e assustando as pessoas em relação ao tratamento. Estes foram ilustrados por: " A I D S : Profile of an Epidemic." Esse do-cumentário de 1984 sobre a doença recentemente identificada conheci-da como "S índrome da Imunodefi-ciência Adqu i r i da " (AIDS) fo i prepa-rado pelo Public Broadcasting Sys-tem . O reconhecimento da A I D S como condição identificável ocorreu em 1979 e f icou conhecida fora dos círculos médicos em 1981. Os Cen-ters for Disease Control federais em At lanta avisaram inicialmente sobre sua prevalência entre homens homos-sexuais promíscuos e usuários regula-res de drogas. O padrão de um colap-so na habilidade das vít imas a persis-t i r ao que são chamadas infecções "opor tunis tas" e um câncer raro fo-ram descobertos também entre um conjunto de imigrantes do Haiti nos Estados Unidos e algumas vít imas de doenças sangüíneas, tais como hemo-filias, que requerem tratamento com transfusões de sangue. Mui to mais

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tarde f o i conhecida of ic ia lmente em bebês nascidos de usuárias de drogas e alguns homens possivel-mente bissexuais. Alguns médicos no A lber t Einstein Hospital tentaram antes obter material sobre bebês para a l i teratura médica, mas foram repe-lidos (Rubin , 1985). Inicialmente a doença parecia l imitada aos Estados Unidos. À medida que a consciência da doença se espalhou, ela fo i relata-da por médicos em vários países e, f i -nalmente, identif icada como ampla-mente instalada na Áfr ica. O to ta l de casos em meados de 1984 fo i relata-d o como abaixo de quatro mi l . No f i -nal de 1985, o número de pessoas identif icadas nos Estados Unidos com A I D S chegava a mais de quator-ze mi l , com mais de mi l outros na Europa. O número de v í t imas pare-cia quase dobrar a cada ano e a taxa de mortal idade parecia próx ima aos 80%. Suas ví t imas inc lu íam várias pessoas, de ou t ro modo saudáveis, que haviam cont ra ído a doença atra-vés de transfusões de sangue, incluin-do uma freira. U m teste p r im i t i vo de anticorpos contra a doença, para es-t imar a exposição, fo i desenvolvido apenas depois de quatro anos, prima-riamente para proteger as doenças de sangue. O Congresso e a administra-ção federal providenciaram fundos de emergência para pesquisa sobre as causas da A I D S , cuidados, possíveis curas e vacinas potenciais contra a doença.

A história da A I D S cont inha to-dos os elementos necessários para a reportagem sensacionalista: sexo, ameaça à saúde, mistério e alta pro-

babil idade de morte. A cr í t i ca de to-dos os veículos reportando sobre a A I D S fo i quase universal. O Dr. Vir-gil A . Hatcher, professor na escola de medicina da New Y o r k University e autor de um l ivro sobre A I D S , rece-beu tantos elogios como cr í t icas pelo documentár io da PBS. Entretanto, a matéria da PBS fo i produzida depois que novos conhecimentos emergiram, conhecimentos não disponíveis seja a médicos seja a jornalistas trabalhan-do no caso antes. O Dr. Hatcher cul-pou o programa por deixar de def inir claramente os elementos que carac-ter izam a doença. Esta deveria ter si-do uma das primeiras tarefas dos re-datores e produtores, mas teria fica-do obsoleta na época que apareceu; os haitianos, por exemplo, fo ram mais tarde removidos c o m o grupo de risco especial de pegar ou t ransmit i r A I D S quando a prevalência geral do vírus suspeito se to rnou melhor co-nhecida. O estigma ligado aos haitia-nos pela ignorância inicial sobre a doença era, em retrospecto, desneces-sário. Entretanto, parte das primeiras cicatrizes associadas à A I D S reside na ignorância dos jornalistas de como a comunidade aplica o te rmo "epide-m i a " a qualquer aumento além da in-cidência " n o r m a l " esperada de uma doença. Assim, uma epidemia pode envolver números relativamente pe-quenos para casos de uma doença ra-ra. Entretanto, no desenvolvimento da história da A I D S , a versão "sensa-cional is ta" ainda pode se mostrar mais acurada à medida que os médi-cos desenvolvem seus dados. Dessa maneira, as notícias correram adiante

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do conhecimento. A reportagem não podia esperar pelos anos necessários para desenvolver informação mais plena, embora ainda incompleta.

Outra cr í t ica envolvia a falha dos meios de comunicação em transmi-t i r as imensas dif iculdades que os pes-quisadores enfrentam para localizar as causas da A I D S ou qualquer doen-ça nova através dos métodos lentos, dolorosos da pesquisa básica. A epi-demiologia ajuda a localizar, escrever e def inir mui tos aspectos de uma do-ença nova, mas os pesquisadores po-dem postular várias e ainda conf l i tan-tes teorias ou hipóteses, que precisam ser testadas e verificadas. Durante o calor da controvérsia sobre a A I D S documentada pela PBS, tanto os cientistas franceses como os america-nos ident i f icaram um vírus acredita-do como a causa da A IDS. No f inal de 1985, a comunidade c ient í f ica ainda não havia alcançado consenso universal sobre se este era o mesmo vírus idênt ico ou duas versões do mesmo, levantando a possibilidade de que o vírus da A IDS, como o da gri-pe, simplesmente poderia ser capaz de passar por uma mutação mais rapi-damente do que os cientistas podiam desenvolver vacinas.

0 própr io documentár io da A I D S parecia cont rad i tó r io , observou o Dr . Hatcher. U m de seus propósitos era estabelecer que a A I D S é d i f í c i l de t ransmit i r de uma v í t ima para colegas de trabalho, pessoal médico e famí -lias. Essa falta de compreensão da do-ença causou um certo afastamento en-tre empreendedores, enfermeiras, mé-dicos, empregadores, operadores de

banco de sangue, amigos e conheci-dos casuais e os pacientes da A I D S . Enquanto tentava trazer racionalida-de generalizada a essa imagem, o Dr . Hatcher no tou , um ponto que se re-feria aos baixos perigos da transmis-são casual de uma pessoa para outra fo i negado pelo f inal do programa, que prevenia: "Use precauções extre-mas quando em contato com um pa-ciente da A I D S . " (Esse fo i , entretan-to , um conselho que mui tos na co-munidade médica ir iam apoiar a par-t i r de ''seu própr io conhecimento das incertezas da ciência e medicina até que todas as evidências possíveis so-bre a A I D S tivessem sido desenvol-vidas, e fo i uma indicação de opi-niões divergentes encontradas nas dis-putas médicas).

O Dr. Hatcher elogiou os produto-res da PBS por t ransmi t i rem uma des-crição suficiente e ampla dos sinais que os leigos poderiam usar para re-conhecer a A I D S em seus estágios mais precoces. No entanto, quando um func ionár io públ ico, casado, no Texas declarou ter tais sintomas, os jornalistas não o pressionaram para reconhecimento públ ico da verdadei-ra natureza do seu estado. Tanto os jornalistas de imprensa como os dos meios eletrônicos usaram material de-talhado de seu cert i f icado de ób i to , entretanto, para permit i r que seus públicos inferissem a A IDS, embora isso nunca tenha sido d i to explicita-mente. Dr. Hatcher também elogiou os produtores por omi t i rem descri-ções e fotografias dos procedimentos de t ratamento, que podem ser dolo-rosos. Os produtores de tevê, mais do

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que os redatores da imprensa, devem ser sensíveis à possibilidade de que pessoas precisando de t ratamento pa-ra a A I D S , câncer ou quaisquer ou-tras doenças procurem evitar o trata-mento depois de vê-lo e às suas con-seqüências (Hatcher, 1984). Os médi-cos freqüentemente afastam as soli-citações dos pacientes em relação a tais detalhes ou passam ligeiramente por eles, pela mesma razão.

Em situações de furos noticiosos, os poderosos efeitos das imagens de televisão ligados a situações de crise, como o acidente de 1979 na usina nuclear de Three Mile Island ou even-tos terr i tor iais e de seqüestros aéreos, f izeram com que a tevê se tornasse foco de consideráveis crí t icas de ou-tros do meio e de fora. Uma linha de crít icas af i rma que a tevê, com a aju-da de escritores de não-ciência dos veículos impressos, exagerou os peri-gos dos vazamentos de irradiação em Three Mile Island. Os cr í t icos do po-der nuclear, por ou t ro lado, acusam as redes de televisão de minimizar a seriedade do acidente. Vários estudos seguindo-se àquele incidente particu-lar mostrado pelos repórteres de tevê geralmente agiram responsavelmente, mas espelharam a confusão entre os cientistas nucleares e engenheiros em cena.

Após o acidente, a cr í t ica real diri-gida à T V fo i a falta de análise pon-derada. A socióloga Doro thy Nelk in (1984a) a t r ibu iu a falta de tais análi-ses parcialmente às pressões da tevê para selecionar material visualmente estimulante. Cabeças falantes, diz ela, não são consideradas estimulantes o

suficiente para prender uma audiên-cia. A realidade precisa ser transfor-mada em entretenimento, no ethos da tevê. Como os jornalistas geral-mente e os repórteres de televisão em particular têm l imitada percepção dos riscos tecnológicos, eles tendem a se basear em funcionários do go-verno como fontes de informação com autoridade, responsáveis e neu-tras. Quando o governo está confuso ou insensível a riscos emergentes, os jornalistas provavelmente vol tam aos seus pré-condicionamentos aos shows de entretenimento. As perguntas mais fáceis que podem fazer são: " E se. . .?" , que evocam respostas espe-culativas arrancadas das possibilida-des dos piores casos.

Seja u m meio impresso ou eletrô-nico, há pr imi t iv ismo em todos nós. Quando os cientistas estão intrigados, como o professor David M. Rubin (1980) escreveu no acidente de Three Mile Island, um temor antigo leva os redatores a usarem todos os recursos para informação enquanto condicio-nados a procurar pelo pior . Dr. Edward Burger, d i retor do Inst i tute of Health Policy Analysis da George-t o w n University Medicai Center, con-tou Daniel Machalaba do The Wall Street Journal, "o públ ico merece ser educado a respeito de ciência, mas a imprensa enfatiza o s impl íst ico e o assustador" (Machalaba, 1984). Mas quando os xamãs alcançam o l imite de seu conhecimento, o que se en-contra ali fora pode ser mu i to assus-tador. A maior parte da história de Three Mile Island f o i escrita (Sills, 1982), mas os dramas inerentes na

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busca da cura e prevenção da A I D S ainda devem ser desempenhados, jun-tamente c o m sabe-se lá quantos ou-tros dramas aguardando para serem descobertos. Por exemp lo , u m dos novos quebra-cabeças da A I D S emer-giu na descoberta de uma concentra-ção de v í t imas numa pequena cidade da F ló r ida assolada pela pobreza. Por quê? F ique s in ton izado.

Desvendar tais mistér ios colocados por u m m u n d o natural é o p ropós i to da ciência. Colocar o progresso errá-t i c o da ciência em perspectiva é a ta-refa da redação c ien t í f i ca , faça-o vo-cê apenas c o m palavras ou som, mo-v i m e n t o e imagem. Todos os redato-res c ien t í f i cos devem ser versáteis e dispostos a operar no meio de comu-nicação que possibi l i ta a me lho r com-preensão. Seja qual f o r a sua escolha, será uma exc i tante jornada intelec-tua l e f ís ica, em boa companh ia , para o desconhecido. Poderá ser uma aventura satisfatória.

Experiências

1. Das matérias de ciência que você leu, escolha um ou dois assuntos que pensa preencherem os requisitos para um progra-ma de televisão, e explique por que, num memorando de uma página destinado a convencer um diretor de notícias de tevê que eles podem ser produzidos.

2. Baseando-se na revista Science, o New England Journal of Medicine ou outro Pe-riódico, escreva duas matérias noticiosas para o rádio. Se tiver um gravador, grave-as para ouvir e criticar em classe.

3. Escolha uma matéria de sua leitura de Periódicos ou a partir da experiência e pre-pare um script de tevê de dois minutos, e os storyboards para o mesmo. Talvez sua classe possa reunir o melhor das matérias num programa de ciência.

4. Entreviste o funcionário de informa-çfles públicas da universidade para um pro-grama de rádio ou vídeo sobre os proble-mas de lidar com os cientistas e os assun-tos científicos em sua escola.

5. Arranje para visitar a sala de imprensa de uma universidade local ou estação de televisão durante as preparaçSes para um. noticiário; observe a seleçSo e edição de matérias.

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Impresso por Gráfica Portinho Cavalcanti Ltda.

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que transcende, sem dúvida, o seu valor prático como guia para determi-nada classe sócio-profissional, desen-volve uma abordagem pormenorizada de temas pertinentes como a coleta, seleção, controle, tratamento técnico e divulgação das notícias sobre os dife-rentes campos das ciências, as cone-xões entre o interesse público e a re-dação científica, e as questões éticas que esta compreende.

Confiante no seu papel de veículo de democratização cultural, o Autor reconhece que a redação científica tende a ser dirigida para fora, ou seja, para audiências situadas além da es-trita especialidade científica onde a informação se origina. O escritor de ciência aparece aqui focalizado como parte de um sistema de educação e comunicação tão complexo como a ciência moderna e a sociedade mais avançada do ponto de vista de seu de-senvolvimento técnico-científico. Em seus alcances mais extremos, o jorna-lismo científico pode ajudar-nos, de forma vigorosa, a transpor o fosso entre cientistas e não-cientistas. Essa é a mensagem fundamental deste livro que a EDITORA FORENSE UNI-VERSITÁRIA tem o orgulho de con-fiar aos leitores brasileiros e, em par-ticular, às nossas comunidades cientí-fica e jornalística cada vez mais aten-tas à responsabilidade de se veicula-rem informações sobre a produção das ciências no mundo atual.

Capa: Rimsky

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OUTRAS OBRAS DE INTERESSE PERMANENTE

A ÉTICA NO JORNALISMO: Um Guia para Estudantes, Profissionais

e Leitores Philip Meyer

Esta obra de Philip Meyer, Professor de Jornalismo William Rand Kenan, Jr., da Universidade Chapei Hill da Carolina do Norte e um dos mais expressivos representantes do chamado jornalismo de precisão, baseia-se em uma ampla pesquisa sobre editores, coordenadores ou diretores editoriais e outros profis-sionais da área jornalística. O livro documenta a confusão ética atestada na imprensa dos EUA no rastro do escândalo de Water-gate e da controvérsia dos Papéis do Pentágono. Ele fornece uma fundamentação analítica e histórica para mostrar como a imprensa alcançou esse nível de crise e sugere maneiras como esta pode ser mudada para melhor. Procura focalizar, sob uma nova perspectiva, algumas áreas importantes da preocupação ética - a pressão por parte dos anunciantes, a objetividade, o conflito de interesses, a invasão da privacidade - a fim de exa-minar como os diversos jornais lidam com esses problemas ou com outros afins.

PROFISSÃO JORNALISTA: RESPONSABILIDADE SOCIAL

Cremilda Medina A EDITORA FORENSE UNIVERSITÁRIA, que teve o

privilégio de publicar obras fundamentais de grandes pensadores de nosso tempo como A Arqueologia do Saber de Michel Fou-cault e Cultura de Massas no Século XX de Edgar Morin, está consciente de haver destinado ao público brasileiro um texto ca-pital sobre esta classe profissional e a comunicação no mundo moderno. Na tarefa de traçar o quadro de responsabilidade so-cial em que se insere o jornalismo, o estudo de Cremilda Medina vai muito além e aprofunda a nossa compreensão dos aspectos essenciais da questão: agir sobre realidades que nos são contem-porâneas exige um tremendo esforço que abrange a vigilância crítica sobre si próprio e sobre a estrutura social e política do país em que se trabalha, sobretudo quando pesa sobre este o ta-cão de regimes ou governos autoritários.