JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA...Civil, não se encontra a certidão de publicação do acórdão...

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA

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AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 165.165 - SP

(Registro nº 97.0077273-0)

Relator: O Sr. Ministro Nilson Naves

Agravante: Regina Célia Sarsano Ferreira

Agravado: O R. Despacho de fi. 122

Partes: Regina Célia Sarsano Ferreira e Notícias Populares S/A

Advogados: Drs. Nilo José Mingrone, Willians Duarte de Moura e ou-tros, e Taís Borja Gasparian e outros

EMENTA: Agravo de instrumento contra decisão denegatória de recurso especial. Instrução (peças de apresentação obrigató­ria). Certidão de publicação do acórdão. Decidiu a Corte Especial do STJ que a certidão de publicação do acórdão contra o qual interposto o especial (isto é, a certidão de intimação do acórdão recorrido) é peça de apresentação obrigatória. Votos vencidos (in­clusive o deste Relator). Anteriores precedentes das Turmas com­ponentes das li! e 3i! Seções. Jurisprudência que se consolidou. inclusive na 2i! Seção (opinião ressalvada). Agravo regimental desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribu­nal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a se­guir, por maioria, negar provimen­to ao agravo regimental. Vencido o Sr. Ministro Eduardo Ribeiro. Par­ticiparam do julgamento os Srs.

Ministros Eduardo Ribeiro, Walde­mar Zveiter e Menezes Direito. Au­sente, justificadamente, o Sr. Minis­tro Costa Leite.

Brasília, 10 de março de 1998 (data do julgamento).

Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Presidente. Ministro NILSON NAVES, Relator.

Publicado no DJ de 04-05-98.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 153

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RELATÓRIO

O SR. MINISTRO NILSON NA­VES: Diante do agravo regimental interposto, submeto à consideração da Turma o seguinte despacho:

"Não consta dos autos cópia da certidão de intimação do acórdão recorrido. O meu entendimento sempre foi o de que tal não se tra­ta de peça essencial à plena com­preensão da controvérsia (Súmu­la 288/STF e art. 544 e §§ do cód. de Pro Civil). Nesse sentido, tor­nei-me relator para acórdão de caso levado à consideração da 3ª Turma (AgRg no Ag-113.279, DJ 22.4.97).

Acontece, porém, que o assun­to foi à Corte Especial, e lá se de­cidiu, por maioria de votos, 'ser in­dispensável para instrução do agravo de instrumento contra de­cisão denegatória de recurso es­pecial ajuntada de certidão de in­timação do acórdão recorrido' (Questão de Ordem no Agravo de Instrumento n Q 153.273, sessão de 5.11.97). Fiquei vencido, mas devo daqui em diante obediência ao que ficou decidido na Corte Especial.

Destarte, do presente agravo de instrumento não conheço."

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO NILSON NA­VES (Relator): Para o Agravo Regi-

mental no Agravo de Instrumento n Q 113.279, julgado pela 3ª Turma, em 17.9.96, escrevi a seguinte emen­ta: "Agravo de instrumento contra decisão denegatória de recurso es­pecial. Peças de apresentação obri­gatória. Entre elas, segundo a dic­ção do art. 544, § 1Q

, do Cód. de Pro Civil, não se encontra a certidão de publicação do acórdão contra o qual interposto o especial (isto é, a certi­dão de intimação do acórdão recor­rido). Agravo de instrumento, de que o Relator não conhecera. Agra­vo regimental provido. Voto venci­do".

Sucede, como se viu do despacho ora agravado, que a Corte Especial. em 5.11.97, decidiu doutro modo. Aliás, as Turmas que compõem a 1 ª e a 3ª Seções deste Tribunal já vi­nham adotando essa orientação, por exemplo:

- "Processual civil. Agravo re­gimental no agravo de instru­mento. Traslado deficiente. Au­sência da certidão de publicação do acórdão recorrido. Súmula 288, STF. Precedentes. Art. 525 do CPC. Inaplicabilidade in casu.

1. O art. 525 do CPC desserve para embasar o agravo de instru­mento voltado contra decisão que in admite o recurso especial na origem.

2. A certidão de publicação do acórdão recorrido é peça essen­cial à formação do instrumento, consoante têm afirmado a Supre­ma Corte e o STJ.

3. Agravo regimental improvi­do. Decisão unânime." (Agravo

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Regimental no Agravo de Instru­mento n Q 157.681, 1ª Turma, Sr. Ministro Demócrito Reinaldo, DJ de 15.12.97)

- "Processual civil. Recurso especial inadmitido. Agravo para o STJ. Instrumento. Ausência de cópia da certidão de publicação do acórdão recorrido. Não-conhe­cimento do agravo: possibilidade. Precedentes do STJ e do STF. Agravo regimental improvido.

I - Nega-se seguimento a agravo quando não consta do ins­trumento cópia da certidão de pu­blicação do acórdão recorrido.

Ir -Agravo regimental impro­vido." (Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n Q

124.393, 2ª Turma, Sr. Ministro Adhemar Maciel, DJ de 3.11.97)

- "Agravo de instrumento -Traslado incompleto - Ausência de cópia da certidão de publica­ção do acórdão recorrido.

1. A certidão de publicação do acórdão recorrido é peça obriga­tória desde o advento da Lei 8.038/90, conforme jurisprudên­cia do STF e STJ, independente de ser a verificação da tempesti­vidade do recurso especial objeto ou não do agravo de instrumen­to.

2. Cabe ao agravante a junta­da das peças obrigatórias.

3. Agravo regimental improvi­do." (Agravo Regimental no Agra­vo de Instrumento n Q 142.257, 5ª Turma, Sr. Ministro Edson Vi di­gal, DJ de 13.12.97)

- "Processual civil. Agravo re­gimental. Formação do instru­mento. Controle da tempestivida­de do recurso especial.

Assentada jurisprudência so­bre a obrigatoriedade do trasla­do da certidão de publicação do acórdão recorrido, sob pena de não conhecimento do agravo.

Precedente do STF.

Agravo regimental a que se ne­gra provimento." (Agravo Regi­mental no Agravo de Instrumen­to n Q 162.964, 6ª Turma, Sr. Mi­nistro William Patterson, DJ de 1.12.97)

Aqui na 3ª Turma, adotou-se, por maioria de votos, a orientação que se firmou na apreciação, pela Corte Especial, da aludida Questão de Or­dem, conforme, entre outros, o Agravo Regimental no Agravo de Ins­trumento n Q 164.347, assim ementa­do: "Agravo. Peça essencial. Conso­lidou-se a jurisprudência do STJ no sentido de que a certidão de intima­ção do acórdão recorrido tornou-se peça essencial à formação do instru­mento, a partir da vigência da Lei 8.038/90. Agravo a que se negou provimento" (Sr. Ministro Costa Leite, sessão de 05.12.97).

A 4ª Turma, pelo que fui informa­do, adotou orientação análoga à das outras Turmas, a partir do corren­te ano, tal em face da decisão toma­da pela Corte Especial.

Pelo visto, trata-se de orientação assentada pela Corte, e que já vi­nha sendo adotada por 4 de suas 6 Turmas, reportando-se alguns dos

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seus julgados à orientação estabe­lecida há bom tempo pelo Supremo Tribunal (por exemplo, ver o Ag-176.874, DJ de 31.10.95, Sr. Minis­tro Néri da Silveira, aqui citado no Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 142.257, 5ª Turma).

O vezo, se é que se trate de cos­tume criticável, não é apenas de nossas Cortes. Os critérios técnicos são também adotados por outras Cortes, como a Supreme Court, pelo que se vê de Lawrence Baum, nes­sas passagens:

"Para merecer aceitação pela Corte Suprema um caso precisa satisfazer a certos requisitos téc­nicos. Acima de tudo, a petição de apreciação precisa atender às normas da Corte. Uma petição pode ser indeferida, por exemplo, pelo fato de o suplicante não ter fornecido o número requerido de cópias dos documentos constan­tes dos autos do processo. Estes requisitos são relaxados para as petições dos pobres. mas até mes­mo estas petições podem ser in­deferidas se for extremo seu des­vio das normas." ("A Suprema Corte Americana", Forense-Uni­versitária, 1985, págs. 148 e 149)

À vista de tal orientação, desde logo aplicável, nego provimento ao agravo regimental. Deixo, porém, ressalvado o meu ponto de vista.

VOTO - VENCIDO

O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: A Corte Especial real-

mente decidiu nos termos indicados pelo relator, mas não se alcançou maioria absoluta. Peço vênia para manter meu entendimento, pelas razões que expus ao ser apreciada a matéria naquele órgão:

"Admito seja útil a peça recla­mada para quando se pretenda proceder à conversão do agravo em recurso especial. Isso não obs­tante, não me parece possível emprestar à sua falta a conse­qüência questionada.

O Código de Processo Civil, ao regular o agravo, tendente a ob­ter a admissão de recurso espe­cial, é minucioso na enumeração das peças obrigatórias, que hão de ser apresentadas, pena de não conhecimento. Chega ao requin­te de entre elas arrolar a procu­ração outorgada ao advogado do agravante. E expressamente men­cionou a certidão de intimação da decisão agravada. Não exigiu, en­tretanto, viesse também a cer­tidão de intimação do acórdão recorrido. Não cominou, conse­qüentemente, a sanção de não conhecimento para quando fal­tasse.

Certo que, em certas circuns­tâncias, outras peças podem fa­zer-se indispensáveis. Assim, por exemplo, se o acórdão se reporta aos fundamentos da sentença, essa haverá de ser trazida; se ale­gada a inépcia da inicial, mister venha a respectiva cópia. Impor­tante assinalar, entretanto, que isso se verifica eventualmente,

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em função do caso concreto e, a toda evidência, não seria viável previsse o Código todas as hipó­teses que podem ocorrer.

Diverso, entretanto, é o caso em exàme. Aquela certidão mui­to dificilmente deixará de existir. Sua ausência será muito mais rara do que, por exemplo, as con­tra-razões ao especial ou a pro­curação da parte contrária. Não se estabeleceu, entretanto, de­vesse ser necessariamente apre­sentada. Não se a teve, pois, co­mo indispensável. Não me pare­ce razoável que a omissão da lei, se existe, haja de ser suprida, pu­nindo-se a parte que se fiou em

seus termos ao compor o instru­mento.

Assinalo, na linha do eminen­te Ministro Gomes de Barros, que os julgadores devem ter a caute­la de não transformar o processo em um campo minado. Durante décadas, a propósito de outros textos análogos, prescindiu-se da apresentação da peça em exame. A súbita guinada jurispruden­cial colhe de surpresa as partes, que poderão sofrer graves prejuí­zos. A mudança legislativa não pode ter efeito retroativo, mas a jurisprudência, na prática, termi­na por tê-lo."

Data venia, dou provimento.

RECURSO ESPECIAL NQ 55.941- DF

(Registro n Q 94.0032215-1)

Relator: O Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito

Recorrente: Eunice Blumenthal de Moraes

Recorridos: Rita Eliana Pacheco da Silva e cônjuge

Advogados: Drs. Cesar Cardoso e outros, e Rubem José da Silva

Sustentação Oral: Dl'. Cesar Cardoso, pela recorrente

EMENTA: Recurso especial. Ação reivindicatória. Promessa de compra e venda registrada.

1. A promessa de compra e venda irretratável e irrevogável trans­fere ao promitente-comprador os direitos inerentes ao exercício do domínio e confere-lhe o direito de buscar o bem que se encon­tra injustamente em poder de terceiro. Serve, por isso, como títu­lo para embasar ação reivindicatória.

2. Recurso especial conhecido e provido.

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ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, acordam os Senhores Mi­nistros da Terceira Turma do Supe­rior Tribunal de Justiça, na confor­midade dos votos e das notas taqui­gráficas a seguir, após o voto-vista do Senhor Ministro Eduardo Ribei­ro, por unanimidade, conhecer do recurso especial e dar-lhe provi­mento. Participaram do julgamen­to os Senhores Ministros Nilson Na­ves, Eduardo Ribeiro e Waldemar Zveiter. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Costa Leite.

Brasília, 17 de fevereiro de 1998 (data do julgamento).

Ministro WALDEMAR ZVEITER, Presidente. Ministro CARLOS AL­BERTO MENEZES DIREITO, Re­lator.

Publicado no DJ de 01·06·98.

RELATÓRIO

O SR MINISTRO CARLOS AL­BERTO MENEZES DIREITO: Re­curso especial interposto por Eunice Blumenthal de Moraes com o pro­pósito de reformar o v. Aresto pro­ferido pela egrégia 1 ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios que deci­diu:

''Ação reivindicatória. Promissário­comprador. Parte ilegítima.

O domínio constitui fundamento da ação reivindicatória, não bas­tando para tal fim a promessa de compra e venda, ainda que regis-

trada, uma vez que dela resulta apenas vínculo contratual com o titular do domínio." (fls. 213)

Alega a recorrente contrarieda­de aos artigos 524, 676, 677 e 859 do Código Civil, 5º do Decreto n Q

55.815/65, à Lei n Q 6.766/79 e ao ar­tigo 25 da Lei nº 6.756/79, além de divergência em relação a julgados deste Superior Tribunal de Justiça e dos Tribunais de Justiça de São Paulo e de Santa Catarina. Preten­de seja tido como justo título para a ação reivindicatória o contrato de promessa de compra e venda de que é detentora (fls. 219 a 230).

Decorreu in albis o prazo para contra-razões (fls. 231) e o especial foi admitido pela alínea c. (fls. 232)

É o relatório.

VOTO

O SR MINISTRO CARLOS AL­BERTO MENEZES DIREITO (Re­lator): A ora recorrente ajuizou ação reivindicatória alegando que foi ca­sada até 1974 e que um dos bens que constituem o patrimônio do casal, ainda não partilhado, é o aparta­mento objeto da ação "que perma­neceria na propriedade exclusiva do cônjuge varão desde que este depo­sitasse, em Juízo, até 31.01.75 o valor correspondente à metade da avaliação judicial do imóvel, sendo que o ex-marido somente formulou tal postulação em Juízo em 09.04.87, doze anos após o termo a quo para o depósito judicial". Segundo a au­tora, o ex-marido celebrou com a ré e com o ex-marido desta "um con-

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trato de promessa de compra e ven­da do imóvel já discriminado, que não se aperfeiçoou porque não lo­grou o vendedor conseguir suprir a ausência de assinatura de sua ex­mulher, que ignorava por inteiro a relação jurídica estabelecida por seu ex-marido, a ré e Rubem Souza da Silva". Ainda segundo a autora, como o negócio não foi ultimado a sentença "declarou rescindido o ne­gócio jurídico entabulado, não ha­vendo fixado prazo para desocupa­ção do imóvel porque o pedido não chegou a ser formulado pelo reque­rido José Aristides, em reconven­ção". Por tais razões, considera a autora ter direito ao pedido reivin­dicatório.

A sentença considerou que a pro­messa não é "título hábil a provar domínio, requisito primeiro, a ser observado nas ações reivindicató­rias, em razão de sua natureza obri­gacional onde o promitente-vende­dor permanece com a propriedade do bem até a transcrição do título de transferência no registro de imó­veis nos termos do art. 530, I e 533 do Código Civil Brasileiro". Foi, des­se modo, julgado extinto o proces­so. A sentença foi integralmente mantida, interposto, então, o espe­cial que foi admitido com apoio no dissídio jurisprudencial.

A tese que se encontra no Acórdão recorrido, e que está em julgamento, é sobre a legitimação ativa da auto­ra, tida nas instâncias ordinárias como promitente-compradora, para propor a ação reivindicatória.

A promessa de compra e venda, como é de comum sabença, produz

conseqüências jurídicas variáveis de acordo com a sua natureza. Mes­tre Caio Mário ensina, com a ha­bituallucidez, verbis:

"Sendo irretratável e constando de registro público, dá nascimen­to a direito real, e submete o pro­mitente-vendedor à execução coativa (Lei nQ 649, de 11 de mar­ço de 1949), obrigando-o o juiz a outorgar a escritura definitiva, sob pena de valer a sentença co­mo suprimento do ato recusado.

E mais:

"Pelo nosso direito, a promessa de venda nunca pode operar a trans­ferência do domínio, dada a dis­tinção rigorosa entre o contrato definitivo e ° contrato preliminar. Cria este a obrigação de prestar um fato, e seu objeto é a outorga do contrato definitivo. Em con­traposição, o contrato definitivo de compra e venda gera uma obri­gação de dar, e seu principal efei­to é obrigação de transferir o do­mínio, mediante a tradição da coisa ou a transcrição do título. Descumprida a escritura defini­tiva, o comprador tem sempre execução direta, e assiste-lhe di­reito à imissão de posse: Infrin­gida a promessa de compra e ven­da, há distinguir se o contrato chegou a constituir direito real ou não. Em caso negativo, a conse­qüência é o ressarcimento de per­das e danos, natural em qualquer obrigação de fazer. Em caso afir­mativo, a promessa gera ônus real gravando a própria coisa, a

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qual o promitente-comprador tem o direito de perseguir em poder de qualquer terceiro adquirente. Esta solução de nosso direito, re­sultante de todo um sistema que se completou com a Lei nº 649/ 49, afina com a doutrina defen­dida na França desde Pothier, e ainda em vigor. Proferido o jul­gamento, não há mais mister que o contratante inadimplente pas­se o contrato de venda, porque a sentença proferida vale como pre­ceito e substitui a declaração de vontade recusada, podendo ser inscrita no registro imobiliário, como se fosse a própria escritu­ra.

A coisa comprometida, em virtu­de da constituição do ônus real, torna-se indisponível. Com fun­damento na promessa, que obe­deça aos requisitos acima enume­rados, o promitente-comprador adquire a faculdade de receber a escritura definitiva, e de anular o ato de alienação que o promi­tente-vendedor tenha realizado após o registro do contrato de promessa.

Reversamente, o promitente-ven­dedor tem o direito de consignar a coisa em juízo, constituindo o promitente-comprador em mora, desta forma liberando-se de toda obrigação" (Instituições de Direi­to Civil, Forense, Rio, vol. lII, 9ª ed., 1992, págs. 136/137.)

No mesmo diapasão é o magisté­rio de Arnoldo Wald, verbis:

"Não se admitindo no arrependi­mento para as promessas de ven-

da de imóveis e ainda atribuin­do-se um novo direito real em fa­vor do adquirente, bem como a efetivação da compra e venda, em caso de recusa injusta, estamos diante de um novo contrato típi­co, pelo qual as partes se obrigam reciprocamente a tornar eficaz a compra e venda de um bem imó­vel, mediante a reprodução do consentimento no título hábil". (Curso de Direito Civil Brasilei­ro, Obrigações e Contratos, Ed. Revista dos Tribunais, SP, 12ª ed., 1995, pág. 266.)

As lições dos dois eminentes civilistas, a meu juízo, autorizam conclusão diversa da tese esposada pelo Acórdão recorrido, na medida em que a promessa de compra e ven­da irretratável, sem cláusula de ar­rependimento, "dá nascimento a di­reito real, e submete o promitente­vendedor à execução coativa (Lei nº 649, de 11 de março de 1949) obri­gando o juiz a outorgar a escritura definitiva sob pena de valer a sen­tença como suprimento do ato recu­sado".

Isto quer dizer, concretamente, que, sendo embora um contrato preliminar, ou pré-contrato, como preferia Pontes de Miranda, sob o ângulo da dogmática tradicional, a promessa bilateral de compra e venda irretratável dá ensanchas a reivindicação do bem contratado, isto é, persegui-lo quando estiver injustamente em poder de tercei­ro. Merece, ainda uma vez, invoca­do o ensinamento de Caio Mário, verbis:

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"N o estado atual do nosso direito positivo, o contrato preliminar quando revestido de todos os re­quisitos do contrato principal e desacompanhado de cláusula de arrependimento, dá direito à exe­cução compulsória. Se o contrato principal é de compra e venda, a inscrição da promessa no regis­tro imobiliário constitui ônus real, e autoriza a adjudicação compul­sória; mas se de valor superior à taxa legal, depende da adoção da forma pública, porque esta é, a seu turno, essencial à criação de direito real" (ob. cit., pág. 64)

Esta Turma, ao julgar o REsp n Q

32.972/São Paulo, com o voto con­dutor do eminente Ministro Nilson Naves, vencidos os eminentes Mi­nistros Relator Cláudio Santos e Costa Leite, avançou uma outra e valiosa dimensão para o compromis­so de compra e venda, valendo des­tacar o seguinte trecho, verbis:

"Ora, tendo direito à aquisição do imóvel, o promitente-comprador pode exigir do promitente-vende­dor que lhe outorgue a escritura definitiva de compra e venda, bem como pode requerer ao juiz a adjudicação do imóvel. À vista da jurisprudência desta Casa, o registro não é necessário, nem o instrumento público, seja para o fim da Súmula 84, seja para que se requeira a adjudicação (entre outros julgados, ver REsp's 30, 5.463,9.945,10.383 e 9.414). Po­dendo dispor dessa eficácia, a promessa, gerando direito à ad­judicação, há de poder, penso eu,

gerar direito à aquisição por usu­capião ordinário. Estou pois ado­tando outro conceito de justo tí­tulo, talvez conceito mais abran­gente, e assim estou procedendo em face de julgados mais recen­tes desta Corre, dos quais estimo ter tirado corretas conseqüências."

Acompanhando o voto condutor, o eminente Ministro Eduardo Ribei­ro, asseverando que o voto do rela­tor "traduz a doutrina mais tradicio­nal, e considerada até mais ortodo­xa, pelo menos durante muito tem­po", não hesitou em considerar "construção prudente", no caso, aque­la acolhida pelo relator. Do mesmo modo, o eminente Ministro Walde­mar Zveiter afirmou que o voto ma­joritário "soma-se ao valor que o próprio Tribunal tem dado à pro­messa de compra e venda".

O que se observa é uma mudan­ça na natureza jurídica do compro­misso de compra e venda, a meu ver, tão intensa que se pode, até mes­mo, retirá-la, no que concerne às particulares conseqüências que pro­duz, do âmbito dos contratos preli­minares. A própria legislação, en­frentando a realidade social brasi­leira, no dramático problema habi­tacional, que deu nascimento a pro­gramas especiais de financiamento, ampliou o alcance do compromisso de compra e venda ao considerá-lo direito real, atingindo, ainda, as cessões e promessas de cessões de terrenos (cfr. Leis n Q 4.380/64 e n Q

6.766/79). Esse comportamento le­gislativo, na melhor expressão da soberania popular, levou em conta, seguramente, o fato de que as tran-

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sações imobiliárias, que cobrem, sem dúvida, camadas de baixa ren­da, de que são exemplos os negócios nas favelas, fazem o contrato de promessa de compra e venda trans­bordar, efetivamente, dos estreitos limites do pré-contrato.

É certo que o promitente-compra­dor em uma promessa de compra e venda irretratável e devidamente averbada, está investido de poderes mais amplos do que aqueles que a dogmática tradicional acolhia. Não se trata, apenas, de assegurar ao promitente-comprador a condição de titular de um direito real conce­dido por legislação especial, o poder de obter a adjudicação compulsória, de ter a execução direta ou a imissão de posse, negando-lhe a legitimação ativa para a ação reivindicatória. Seria reconhecer-lhe um minus, diante do interesse maior de preser­var o bem que lhe foi prometido ven­der de forma irrevogável e irretra­tável. Quem tem interesse de bus­car o bem assim negociado é o pro­mitente-comprador, tanto que lhe assiste direito de obter, mesmo con­tra o promitente-vendedor, a adju­dicação compulsória, investido de poderes para a imissão de posse e a execução direta. O promitente-com­prador não pode ter negado o seu direito de buscar o bem que se en­contra injustamente em poder de terceiro. Seria, assim, um minus pois que teria ele direito a investir contra o promitente-vendedor que lhe não aperfeiçoa o título, median­te a adjudicação compulsória, mas não teria direito a buscar o bem das mãos de quem injustamente o pos­sua. Demais disso, ao compromis-

sário-comprador é atribuído um di­reito real, com todas as suas conse­qüências. Veja-se o magistério de José Osório de Azevedo Jr., ver­bis:

"Muitos dizem que o direito de propriedade, "em si", ficou com o compromitente-vendedor. Nós preferimos dizer que a coisa em si (objeto do direito de proprie­dade) passou para o patrimônio do compromissário-comprador. Os juristas freqüentemente pare­cem sentir dificuldade em dar o devido relevo às realidades eco­nômicas em cujo ambiente e em razão das quais se consumam os negócios jurídicos. O grande Dar­cy Bessone, a quem tanto deve o desenvolvimento desta matéria, afirmou que "mesmo depois da promessa e da averbação e de sua inscrição, o imóvel continua a in­tegrar o patrimônio do promiten­te-vendedor, somente passando para o do promissário após a com­pra e venda e/ou a adjudicação transcrita" (Da compra e venda, cit., pág. 175). Um economista ou um simples comerciante, hoje já afeitos ao compromisso de com­pra e venda, ficariam admirados dessa afirmação. Temos para nós - repetimos - que o bem pas­sou para o patrimônio do compro­missário-comprador. Consideran­do o patrimônio como o complexo de relações jurídicas, com expres­são econômica, de uma pessoa, temos que o direito de proprieda­de que restou ao compromitente­vendedor após o pagamento do preço se aniquilou ao ponto de se

162 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.

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converter em mera obrigação de assinar uma escritura; essa obri­gação integra, por certo, o com­plexo de relações jurídicas do pro­mitente-vendedor mas, por não ter expressão econômica, não in­tegra o patrimônio."

E prossegue, com toda claridade, verbis:

"Como já vimos atrás (n. 4), de­pois de receber o preço o promi­tente-vendedor desliga-se do ne­gócio, pois já transmitiu ao com­promissário todo o conteúdo do direito de propriedade. Restou apenas a obrigação de cumprir o rito de assinar uma escritura, que muitas vezes é sonegada pa­ra evitar despesas supervenien­tes (alvarás, impostos, etc.) e ou­tras vezes para simplesmente criar condições propícias ao desfazi­mento do negócio já cumprido por uma das partes e inteiramente consolidado no tempo."

E, finalmente, adverte:

"Muitos entendem que esse modo de ver o problema ofende a ordem jurídica por causa da transcrição etc. Não pensamos assim. Para nós a ordem jurídica sofrerá pre­juízos muito mais graves se for negada ao compromissário a fa­culdade de reivindicar. Isto por­que o promitente-vendedor, não tendo mais direitos sobre o imó­vel, não pode reivindicar. Quem convencerá uma pessoa comum e normal, o bonus pater fami­lias, de que ela, que já entre-

gou o imóvel e recebeu o preço há tempos, deverá litigar com tercei­ros para reaver o bem, em nome próprio, e em seguida entregá-lo novamente ao compromissário?

Para verificar que é inviável -também do ponto de vistajurídi­co - a reivindicação por parte do promitente-vendedor, convém imaginar um conflito de interes­ses entre este e o compromissá­rio-comprador quanto à reivindi­cação, isto é, cada um move a sua ação para reaver o imóvel. Será razoável negar a pretensão do compromissário que pagou e que tem direito real sobre a coisa, e atender a pretensão de quem já recebeu o preço e se desvinculou do negócio? Qual dessas preten­sões têm conteúdo ético e jurídi­co?

Aí, sim, a ordem jurídica estará sendo transgredida. A faculdade de reivindicar é talvez o mais im­portante atributo do domínio e a ordem jurídica não pode tolerar que essa faculdade fique sem ti­tular, ou então, por outras pala­vras, que fique um bem imóvel à mercê de aventureiros sem que ninguém possa reivindicá-lo, ape­sar de o compromissário ter pago por esse bem e ter direito real amplíssimo sobre esse mesmo bem." (Compromisso de Compra e Venda, Saraiva, São Paulo, 2ª ed., 1983, págs. 61, 78 e 101)

Ao assinar a promessa de compra e venda irretratável e averbada, o promitente-vendedor, a meu juízo, transmite ao promitente-comprador

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 163

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todos os direitos sobre o imóvel pro­metido vender, dentre os quais aquele de reaver o bem de "quem quer que injustamente o possua" (art. 524 do Código Civil).

Na verdade, o que ocorre é uma transferência do promitente-vende­dor para o promitente-comprador dos direitos inerentes ao exercício do domínio sobre o bem prometido vender, sob pena de negar-se a pró­pria configuração do compromisso de compra e venda como um contra­to típico, para lembrar qualificação de Arnoldo Wald, capaz de gerar direito real, direito à aquisição por usucapião ordinário, que a legisla­ção e a jurisprudência, atentas ao evoluir constante do direito, já re­conhecem, sem tergiversação.

O pedido reivindicatório, dessa maneira, pode e deve ser exercido pelo promitente-comprador, ainda mais considerando que o estreita­mento da legitimação ativa, para a ação reivindicatória, em tais casos, beneficia, exclusivamente, o tercei­ro possuidor sem justo título.

Destarte, eu conheço do recurso e dou-lhe provimento para afastar a carência de ação e determinar o prosseguimento do feito como de direito.

VOTO- VISTA

O SR. MINISTRO NILSON NA­VES: Segundo o acórdão que ora se quer reformar, "O domínio consti­tui fundamento da ação reivindica­tória, não bastando para tal fim a promessa de compra e venda, ain-

da que registrada, uma vez que dela resulta apenas vínculo contratual com o titular do domínio". Enten­deu-se que a autora carecia da ação por ela intentada, que foi a ação fundada no art. 524 do Cód. Civil. Em conseqüência, julgou-se extin­to o processo, nos moldes do art. 267, inciso VI, do Cód. de Pro Civil.

Lê-se no despacho de admissão do recurso especial o seguinte: "Quan­to ao dissídio, o apelo está razoavel­mente formulado e merece trânsito pela discrepância desta decisão com a da 1 ª Câm. Cível do TJSP (RJTSP 43/206), a fim de que a Corte Excel­sa dê ao caso a interpretação mais consentânea". Desse acórdão pa­drão, em que se rejeitou a prelimi­nar de carência da ação de reivin­dicação, recolho essa passagem:

"Se os autores podem pedir a adjudicação compulsória dos promitentes-vendedores, porque são titulares de direito real, com maior razão podem reivindicar o imóvel do poder de quem o dete­nha ilegalmente.

Não é caso, portanto, de carên­cia e conseqüente extinção do processo.

É de ficar mantido o saneador que se houve com acerto" (pág. 207).

Dissídio existe, motivo por que também eu conheço do recurso.

No REsp 32.972, prevaleceu, nes­ta Turma, o entendimento de que pode e deve a promessa gerar direi­to à aquisição por usucapião ordi-

164 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.

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nário. Já foi o precedente citado no voto do Sr. Relator. Para ele, escre­vi essa ementa: "Usucapião ordiná­rio. Promessa de compra e venda. Justo título. Conceito. Tendo direi­to à aquisição do imóvel, o promi­tente-comprador pode exigir do pro­mitente-vendedor que lhe outorgue a escritura definitiva de compra e venda, bem como pode requerer ao juiz a adjudicação do imóvel. Segun­do a jurisprudência do STJ, não são necessários o registro e o instru­mento público, seja para o fim da Súmula 84, seja para que se requei­ra a adjudicação. Podendo dispor de tal eficácia, a promessa de compra e venda, gerando direito à adjudi­cação, gera direito à aquisição por usucapião ordinário. Inocorrência de ofensa ao art. 551 do Cód. Civil. Recurso conhecido pela alínea c, mas não provido" (DJ de 10.6.96).

Quero ainda entender, talqual­mente o Sr. Ministro Menezes Di­reito, que "O pedido reivindicatório, dessa maneira, pode e deve ser exer­cido pelo promitente-comprador, ainda mais considerando que o es­treitamento da legitimação ativa, para a ação reivindicatória, em tais casos, beneficia, exclusivamente, o terceiro possuidor sem justo título".

N o caso presente, se j á desfeito o negócio anterior (o contrato celebra­do com a ré e com o seu ex-marido), poderia a ação, quem sabe, também prosseguir como ação de imissão de posse (entre outros, ver o REsp 8.785, DJ de 27.5.91).

Acompanho o Sr. Relator.

VOTO- VISTA

O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: Trata-se de ação de rei­vindicação, ajuizada por quem não tem o domínio, mas é promitente­compradora. Tal assinalou o emi­nente Relator, a reivindicatória é ação de quem não tendo a posse, é proprietário e a promessa de venda não confere essa qualidade.

Quando se iniciou o julgamento, ocorreu-me a idéia de que já teria esta Turma considerado viável o pe­dido em exame. As pesquisas que fiz, entretanto, não o confirmaram. Localizei acórdão, de que relator o douto Ministro Dias Trindade, em que se teve como admissível o pedi­do de imissão na posse (REsp 8.785, DJ 27.5.91). Ao votar, naquele jul­gamento, embora acompanhando o Relator, fiz algumas ressalvas.

A questão, cumpre assinalar, diz com o direito material e só secun­dariamente com o processual. O proprietário tem direito, só por sê­lo, de haver a posse. O exercício desse direito encontrará obstáculo, caso o possuidor apresente título a ele oponível. O mesmo, entretanto, não se reconhece ao promitente­comprador. O fato de alguém ter essa qualidade não conduz, apenas por isso, a que tenha direito à pos­se do bem. Pode-se prometer a ven­da de um bem, sem que haja a trans­missão da posse. Não se trata de cláusula natural desse contrato, que se deva entender existente, ainda que não explicitada. À falta de trans­ferência por via contratual, perma­necerá a posse com o proprietário.

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Muito comumente, entretanto, o contrato em questão insere cláusu­la de transmissão da posse. Nesse caso, claro está que o promitente­comprador pode pleitear seja nela imitido, em cumprimento do que fi­cou avençado, se o promitente­vendedor se recusar a cumprir o pac­tuado. Poderá ocorrer, ainda, é o caso mais comum e o de que se co­gita no processo, que o bem se ache em poder de um terceiro. Se não tem título para isso, porque nunca o teve ou porque desconstituído o que ti-

nha, será caso de esbulho à posse do promitente-vendedor e os direi­tos desse passarão ao promitente­comprador que poderá pretender a posse, como sucessor.

No caso em exame, intentou-se obter a posse com base exclusiva­mente no fato de a autora ser pro­mitente-compradora. Embora não se haja de emprestar relevo ao ró­tulo dado ao pleito, o certo é que não se deduziu causa de pedir apta a le­var ao pretendido resultado.

Acompanho o Relator.

RECURSO ESPECIAL NQ 72.416 - RJ

(Registro n Q 95.0042159-3)

Relator: O Sr. Ministro Waldemar Zveiter

Recorrente: Maria Helena Cisne Cid

Recorrido: Jornal do Brasil S/A

Advogados: Ivan Paixão Franca e outro, e Sérgio Bermudes e outros

EMENTA: Responsabilidade civil - Lei de Imprensa - Dano moral indenizado acima da limitação imposta pelo art. 52 da Lei de Regência - Não recepção da norma pela Constituição em vigor - Depósito do art. 57, § 6 12 da mesma Lei - Descabimento de sua exigência por não recepcionado pela Carta Federal- Interpreta­ção sistemática - Recurso desacolhido.

I - O depósito prévio à apelação, no valor total da condenação imposta a título de indenização por dano moral advindo da ativi­dade jornalística, foi concebido na vigência de um sistema que previa a indenização tarifada. Adotando-se nas instâncias ordi­nárias indenização que ultrapasse esse valor máximo, há que se ter, por força de interpretação sistemática do dispositivo que impõe o depósito, por inaplicável também tal exigência.

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ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, acordam os Senhores Mi­nistros da Terceira Turma do Supe­rior Tribunal de Justiça, na confor­midade dos votos e das notas taqui­gráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do recurso especial. Sustentou oralmente, o Dr. Aldir Guimarães Passarinho, pela recor­rente. Participaram do julgamento os Senhores Ministros Menezes Di­reito, Costa Leite, Nilson Naves e Eduardo Ribeiro.

Brasília, 14 de abril de 1998 (data do julgamento).

Ministro COSTA LEITE, Presi­dente. Ministro WALDEMARZVEI­TER, Relator.

Publicado no DJ de 31-08-98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER: Cuida-se de Ação Ordi­nária de reparação de danos (moral e patrimonial) proposta contra J or­naI do Brasil, em razão de ter este publicado fato tipificado como cri­me, o qual macula a reputação e dignidade da cidadã (magistrada), aqui, recorrente.

Irresignado com a sentença de procedência (fls. 57) interpõe o es­tabelecimento jornalístico Apelação (fls. 971120).

Todavia, o Juízo singular que, ini­cialmente, dera seguimento à refe­rida apelação, sem a obrigatorieda­de do depósito (art. 57, Lei 5.2501

67), veio a retratar-se. Em face dis­so, apresentou o réu vencido (J or­naI do Brasil) Agravo de Instrumen­to e provido este, o Tribunal rece­beu a Apelação, no dúplice efeito e sem a exigibilidade do precitado depósito.

Tal fato deu ensejo a que a Auto­ra da ação reparatória manejasse também Agravo de Instrumento, pretendendo a prevalência do decre­to de desacolhimento daquela Ape­lação, ao entendimento de que o depósito do valor da condenação é imposição legal inarredável. Ao con­trário do Agravo do Réu, este últi­mo, o da autora, foi improvido, como assim (fls. 159):

"Apelação - Impugnação de sentença, em ação especial da Lei de Imprensa - Decreto de deser­ção, à falta do depósito determi­nado no art. 57, § 6Q da Lei n Q

5.250, de 09.02.67 - Orientação jurisprudencial, firme, de dispen­sa do depósito se a Apelação ver­sa montante exagerado da conde­nação - Deserção inocorrrente -Provimento do Agravo de Instru­mento para subida da Apelação."

Irresignada, a recorrente inter­põe o Especial (REsp 72.415) de fls. 164, onde alega que o aresto teria violado o § 6Q do art. 57 da Lei 5.2501 67, tendo ocorrido também, no seu entender, discrepânciajurispruden­cial com os paradigmas que trans­creve.

Contra o agravo, interposto pelo jornal do Brasil, que resultou no re­cebimento da Apelação, aparelhou

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também a recorrente recurso espe­cial CREsp 72.416), em apenso, mas em ambos (REsp's) a matéria ver­sada é a mesma, sendo certo que, contra o não seguimento do REsp 72.415, é que este STJ acolheu o Regimental da Autora, ora reque­rente.

Em síntese, a Autora (Maria He­lena Cisne Cid), nos recursos que apresenta (REsp's 72.415 e 72.416), insurge-se contra o acolhimento da Apelação da empresa-ré (Jornal do Brasil), sem o atendimento do que promana do art. 57, § 6º, da Lei 5.250/67 (recolhimento pelo réu do valor em que condenado, como con­dição de admissibilidade da Apela­ção).

No Tribunal de origem, negou-se seguimento ao apelo, ao entendi­mento de que o aresto impugnado deu razoável interpretação à hipó­tese (Súmula 400 do STF) e no que tange ao dissídio, este não se com­prova, eis que inexistente o confron­to analítico necessário a apreciação do recurso, - (fls. 200). Todavia, por força de provimento dado ao Regi­mental nº 53.894, em apenso, subiu a esta Corte e, aqui, como já dito, convolado no REsp 72.415/RJ.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER (Relator): O acórdão (Agravo de Instrumento) contra o qual se insurge a recorrente é do se­guinte teor (fls. 160/161):

"Mantido o R. Despacho agra­vado, de fls. 161 dos autos de ação especial (fls. 139 do traslado) pelo R. Despacho de fls. 154. Insurge­se a Agravante contra o decreto de deserção da Apelação interpos­ta contra a R. Sentença condena­tória, nos termos da Lei de Im­prensa (Lei nº 5.250, de 09.02.67). A deserção foi proclamada à fal­ta do depósito do valor da conde­nação, como exigido pelo art. 57, § 6º da mencionada Lei. A Agra­vante pretende inconstitucional a exigência, obstando a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes, na forma do art. 5º, LV, da Constituição da Repú­blica. Há resposta ao Agravo (fls. 141/142) sustentando a deserção, declarada com base no art. 57, § 6º, da Lei de Imprensa, pedin­do desprovido o Agravo. Julgan­do o recurso, cumpre ver que a exigência do depósito, a teor do art. 57, § 6º, mencionados, era condição de admissibilidade da Apelação. Esta foi recebida nos seus efeitos regulares (fls. 121 dos autos originais; fls. 42 do traslado), sem que feito o depósi­to "no prazo de sua interposição", como está no texto da lei aludi­da, como redigida pelo art. 12, da Lei nº 6.071, de 03.07.74. Não podia a subida da Apelação, as­sim admitida no 1 º grau, ser con­dicionada ao depósito, notada­mente quando viceja orientação jurisprudencial dispensando o depósito quando versa a Apela­ção, precisamente, a exorbitância da condenação, como é o caso (fls. 30 e seguintes). Haveria meio e

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modo de obstar o recurso em cau­sa tão-só com a fixação em valo­res incomensuráveis à condena­ção. A diretriz em apreço torna, até, dispensável cogitar a alegada inconstitucionalidade do art. 57, § 6º, da Lei de Imprensa. Inconsti­tucionalidade, aliás, inocorrente, não sendo condição, isolada, da Lei nº 5.250/67, para o recurso, o de­pósito da condenação. A Consoli­dação das Leis do Trabalho (De­creto-Lei nº 5.452, de 1º.05.43), em seu art. 899, § 1 º, exige, para qualquer recurso, sendo a conde­nação superior a determinado li­mite, o prévio depósito da respec­tiva importância. Há quase 50 anos! Nunca se alegou a sua in­constitucionalidade. Nem deste texto, nem de outros que, igual­mente, fazem igual exigência. Caso é, assim, de, na diretriz an­tes mencionada, que é a desta Câ­mara, dar provimento ao Agravo, para subida da Apelação, sem o depósito."

Antes, convém que se diga que a recorrente maneja dois recursos, o REsp nº 72.416 e o presente, mais em ambos, a matéria da insurgên­cia é a mesma do que resulta que a resolução deste vale para o outro.

Em seu inconformismo (fls. 172), argumenta a recorrente:

"Não havendo depósito, a de­serção passa a constituir conse­qüência necessária, obrigatória e irreversível.

Nestas condições agiu correta­mente dentro dos postulados le-

gais o Juiz que decretou a deser­ção do recurso da Ré, e conse­qüentemente, o acórdão recorri­do visivelmente afrontou, violen­tou, contrariou e negou vigência àquela norma legal, donde decor­re, como conseqüência inafastá­vel, o cabimento deste Recurso Especial."

Esse mesmo reclamo a recorren­te lança em seu Especial (REsp 72.416), mas agora atacando a con­clusão do aresto de fls. 148 (Ag. de Instrumento), como assim registra­do (fls. 149/150):

"Reporta-se o R. Despacho ao depósito da condenação, nos ter­mos do art. 57, § 6º, da Lei de Im­prensa. Donde o presente Agra­vo, devidamente instrumentado, com as razões da Agravada às fls. 128/129, pelo desprovimento do recurso, dada a correção do R. Despacho recorrido, que cumpriu o claro mandamento da lei. Às fls. 142 está o R. Despacho negando a retratação do R. Despacho agra­vado. É o que cumpre relatar. Jul­gando o recurso é de se relembrar o texto do art. 57, em seu § 6º, da Lei de Imprensa (Lei nº 5.250, de 09.02.67), na redação da Lei nº 6.071, de 09.07.74, art. 12: "Da sentença do Juiz caberá apelação, a qual somente será admitida mediante comprovação do depó­sito, pelo apelante, de quantia igual à importância total da con­denação. Com a petição de inter­posição do recurso o apelante pe­dirá expedição de guia para o depósito, sendo a apelação julga-

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da deserta se, no caso de sua in­terposição, não for comprovado o depósito.» Comprovado está que o douto Juízo a quo recebeu a apelação em seus regulares efei­tos. Cumpriu, assim, o seu ofício, no Juízo positivo da admissibili­dade do recurso desta sorte ad­mitido. Pelo texto transcrito, do art. 57, § 6º, da Lei nº 5.250/67, a apelação somente seria admissí­vel mediante comprovação do depósito - supramencionado. Admitida a Apelação sem o depó­sito, ainda que por eventual erro do douto Juízo a quo, não era dado a ele corrigir o erro. N ota­damente quando o Juízo de ad­missibilidade de recurso se faz, necessariamente, nos dois graus de jurisdição (o recorrido e aque­le para o qual se recorre), o que leva a concluir que ao 2º grau cabe rever o que se fizer preciso, e não ao próprio Juízo a quo. Também se tenha em conta ori­entação jurisprudencial relevan­te, a dispensar o depósito quan­do, na matéria impugnada na apelação, se incluir o que se refe­re ao exagero da condenação."

De ver-se que, em ambos os decisó­rios os fundamentos, quanto ao ponto objeto da insurgência foi o mesmo, afastou-se a exigibilidade do depósi­to, já que o excesso de seu valor foi a questão desenvolvida na Apelação.

Nesse tema a obrigatoriedade ou não do depósito do valor da conde­nação foi percucientemente analisa­da pelo eminente Ministro Sálvio de Figueiredo, quando prolatou voto no REsp 39.886/SP.

Naquela oportunidade, o eminen­te Ministro-Relator, acolhendo linea­mentos doutrinários procedeu à exegese do art. 57, § 6º da Lei 5.250/ 67, nestes termos:

"2. Em artigo publicado no ca­derno "Direito e Justiça", do Cor­reio Braziliense de 13.11.95, Lourival José dos Santos, consul­tor da "Associação Nacional dos Editores de Revistas", anotou:

"Para que se possa fazer uma análise equilibrada e, ne­cessariamente, imparcial so­bre a questão do limite das in­denizações por dano moral, de­correntes de publicações de imprensa, assunto polêmico no momento, dois pontos básicos deverão ser destacados: a. Em primeiro lugar, a irrestrita li­berdade de imprensa, que de­verá ser sempre conjugada com o direito do cidadão ser infor­mado, faculdades asseguradas pela Constituição Federal e que não poderão, jamais, ser subjugadas por interesses par­ticulares; b. Em segundo, o fato da Lei de Imprensa estar em pleno vigor, não sendo em nada conflitante com a Cons­tituição de 1988, conclusão a que se chega por qualquer ân­gulo jurídico pelo qual sej a examinada, obviamente se tal análise for realizada com isen­ção e imparcialidade.

Mister se faz aqui assinalar, ainda que em singela e modes­ta penada, as regras básicas,

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segundo as quais poderá ocor-. rer a ab-rogação ou a derroga­

ção de uma lei, ou seja, quan­do a lei nova provoca, total ou parcialmente; . a cessação da autoridade de uma lei anterior.

A norma posterior revoga a anterior quando expressamen­te o declare (revogação expres­sa), quando seja com ela in­compatível ou regule inteira­mente a matéria contemplada pela anterior (revogação táci­ta). Se, no entanto, estabelecer disposições gerais ou especiais a par das existentes, não revo­ga, tampouco modifica a lei an­terior (L.I.C.C.).

N o campo da legislação constitucional, como bem assi­nala Caio Mário da Silva Pe­reira, ("Instituições de Direi­to Civil", v. I, n Q 17) por se cons­tituir norma fundamental e "ser emanada da soberania na­cional, submete ao seu impé­rio todos os órgãos do Estado, discrimina as atribuições dos seus poderes, delineia todas as peças do organismo estatal". Porém, como o próprio autor ensina, somente perdem a fun­damentação existencial e se consideram ineficazes as leis que afrontam ou não se conci­liam com ela.

Nada impede que textos san­cionados sob a égide de uma norma constitucional revogada sejam recepcionados por nova Carta, desde que entre os mes­mos não haja conflito, sendo da­qui totalmente aplicável o dis-

posto no § 2Q do art. 2Q da LICC, atrás mencionado, porquanto não havendo contradição não há por que os textos não coe­xistirem pacificamente.

Ensina Carlos Maximilia­no que, para ab-rogação da au­toridade dá lei antiga, "a in­compatibilidade deve ser abso­luta e formal, de modo que seja impossível executar a norma recente sem postergar, des­truir praticamente a antiga; para a derrogação basta a in­conciliabilidade parcial, embo­ra também absoluta quanto ao ponto em contraste" ("Herme­nêutica e Aplicação do Direi­to", Ed. Fonseca, pág. 358).

O motivo deste modesto es­tudo é que certa parcela do Ju­diciário tem, com certa fre­qüência, utilizado-se de crité­rios próprios para a fixação de valores a título de indenização por danos morais, desprezan­do os parâmetros estabelecidos pela Lei n Q 5.250/67, dita Lei de Informaçâo, nesse âmbito, como se derrogados estivessem, pela Carta Magna atual, os arts. 51 e 52 daquela lei.

Antes de mais nada é preci­so ter presente que o dano moral, ao contrário do dano material, que se concretiza pela efetiva perda patrimonial, é aquele decorrente da ofensa à alma ou aos valores perten­centes ao universo íntimo do indivíduo, razão pela qual qualquer discussão nessa esfe­ra deverá seguir critérios lógi-

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cos, adequados à defesa das pessoas eventualmente feridas no campo da sensibilidade.

A Constituição brasileira, ao disciplinar os direitos e garan­tias fundamentais, assegurou "o direito de resposta, propor­cional ao agravo, além da in­denização por dano material, moral ou à imagem".

Resta saber se este texto é conflitante com o da lei de in­formação, no ponto em que esta última limita a indeniza­ção por danos morais a valo­res preestabelecidos. Está cla­ro que a Constituição previu a proporcionalidade da resposta, em relação ao agravo sofrido pelo ofendido e até aqui não se incompatibilizou com a lei de imprensa, a qual coloca tam­bém à disposição do ofendido, por matéria de imprensa, o di­reito à publicação de resposta, exatamente na mesma propor­ção da divulgação incriminada, com caracteres tipográficos se­melhantes ao da matéria que originou a reclamação e no mesmo órgão de imprensa que a deu a público (v. art. 30, I, L, n Q 5.250/67).

Com referência à indeniza­bilidade por danos morais e materiais, o legislador consti­tucional instituiu previsão de caráter geral, estabelecendo tais indenizações à guisa de um plus ao direito de respos­ta, com o que jamais desauto­rizou as regras específicas ado­tadas pela Lei Federal de Im-

prensa, sobre danos dessa na­tureza.

Basta que se coteje os tex­tos, com isenção, para que se conclua, sem esforço, que os mesmos se harmonizam, es­tando a especificidade da lei ordinária tão-somente a expli­citar o dispositivo genérico do diploma mandamental.

Abstraindo-se de entusias­mos e preconceitos e analisan­do-se com lógica parcimoniosa o texto constitucional, não há como se concluir contra o fato de que a Lei Especial de Im­prensa jamais frustrou o al­cance buscado pelo legislador da Carta Magna, ficando tudo o mais por conta de exageros exegéticos. O apego demasia­do à letra dos dispositivos pode ser prejudicial, porém muito mais será forçar a exegese de modo a pretender que o escri­to coincida com o subjetivismo do hermeneuta, "vislumbran­do no texto idéias apenas exis­tentes no próprio cérebro", como diz Maximiliano.

A Lei de Imprensa pode, eventualmente, para alguns intérpretes, não ter o texto ideal e, a propósito, há projeto de nova lei tramitando no Con­gresso, porém, enquanto esti­ver em vigor deverá ser acata­da por todos e não cumpre ao Judiciário a subversão da or­dem dos poderes constitucio­nalmente instituídos, para le­gislar em favor de suas próprias e particulares convicções, tam-

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pouco o poder de concluir que os princípios determinados por certa lei não se coadunam com o seu sentimento de justiça. Como diz Caio Mário da Sil­va Pereira "ao Poder Judiciá­rio não cabe a atribuição de abolir uma lei, de vez que tem competência é para aplicá-la" ("Inst. do Direito Civil", Foren­se, pág. 93).

Não se pode esquecer, tam­bém, que os valores para o dano moral foram estabeleci­dos numa época em que gras­sava na Nação clima de exce­ção e de censura aos meios de comunicação, sendo certo que os parâmetros instituídos pelo legislador, pela lógica daquele momento, certamente não pe­caram pela modéstia, tampou­co pretenderam incentivar a liberdade plena da manifesta­ção do pensamento e da pres­tação de informações. Ora, custa crer, por ser até paradoxal, que hoje, exatamente hoje, sob o pálio democrático, se esteja procurando intimidar a im­prensa sob a ameaça de inde­nizações milionárias, à custa de especulações injustificáveis a respeito de contradições ine­xistentes entre o texto da Car­ta Magna e o da Lei Especial".

3. Tenho que bem decidiu o Colegiado de origem ao aceitar o depósito do valor máximo da indenização tarifada por essa norma, nos seus arts. 50 e 51, assim redigidos:

"Art. 51. A responsabili­dade civil do jornalista pro­fissional que concorre para o dano por negligência, im­perícia ou imprudência, é li­mitada, em cada escrito, transmissão ou notícia:

I - a 2 salários mínimos da região, no caso de publi­cação ou transmissão de no­tícia falsa, ou divulgação de fato verdadeiro truncado ou deturpado (art. 16, números H e VI);

H - a 5 salários mínimos da região, nos casos de pu­blicação ou transmissão que ofenda a dignidade ou deco­ro de alguém;

IH - a 10 salários míni­mos da região, nos casos de imputação de fato ofensivo à reputação de alguém;

IV - A 20 salários miní­mos da região, nos casos de falta de imputação de crime a alguém, ou de imputação de crime verdadeiro, nos ca­sos em que a Lei não admite a exceção da verdade (art. 49, § 1Q

)"

"Art. 52. A responsabili­dade civil da empresa que explora o meio de informa­ção ou divulgação é limita­da a dez vezes as importân­cias referidas no artigo an­terior, se resulta de ato cul­poso de algumas das pes­soas referidas no art. 50".

A norma em questão é de 09/ 02/67, tendo o § 6Q do seu art.

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57 recebido a redação atual através da Lei 6.071/74.

A denominada "Lei de Im­prensa" portanto, estabeleceu um "sistema normativo" estan­que, fechado em si mesmo, o qual previa e tarifava a inde­nização por danos morais ou materiais experimentados pe­los cidadãos, em razão da ati­vidade noticiosa.

Entretanto, teria havido sen­sível modificação no sistema, à luz da qual fora deferida à au­tora, ora recorrente, indeniza­ção muito superior aos limites anteriormente estabelecidos, e que nesse contexto, a condição de efetuar depósito igual ao va­lor da condenação, para ter re­cebida a sua apelação, poderia impor à parte gravoso ônus, ve­dando-lhe o acesso ao "duplo grau de jurisdição".

Não foi outro, aliás, o enten­dimento externado por Vicen­te Grecco Filho, ao oficiar no feito como Procurador de Jus­tiça, em parecer que acabou por constituir-se na viga-mes­tra do aresto impugnado.

Darcy Arruda Miranda, comentando a Lei de Impren­sa, especialmente o seu art. 52, conclui pela revogação das dis­posições limitativas da respon­sabilidade civil, nestes termos:

"Como ficou assinalado li­nhas acima, na presente Lei de Imprensa o nosso legislador, retirando ao juiz larga mar­gem de arbítrio na reparação

do dano provocado por atos ilí­citos, partiu para o casuísmo, estabelecendo graus e limites ao ressarcimento, fixando ta­rifas inadequadas à extensão da responsabilidade nos cri­mes contra a honra, embora estendendo-a também ao dano moral, ao lado do ilícito civil, para efeito de reparação.

Ninguém desconhece que o dano material é ressarcível e se esquece, ao passo que o dano moral é indelével e não se es­quece, fica guardado na reten­tiva de quem dele tomou co­nhecimento.

A limitação da pena corres­pondente à responsabilidade do jornalista profissional em salários mínimos, corresponde à pena de multa quantitativa e esta já foi abolida pela Lei 7.209/64, em seu art. 2Q

, supri­mindo "quaisquer referências a valores de multa", suprimin­do-se a expressão multa de por multa", simplesmente, caben­do ao juiz, em cada caso, fixar­lhe o valor, de acordo com o padrão do art. 53.

Além do mais, a Constitui­ção Federal de 1988, acabou com as limitações de tempo e valor para as ações de repara­ção de danos materiais e mo­rais, ao dispor, em seu art. 5Q

,

X: "São invioláveis a intimida­de, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegu­rado o direito de indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação"

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("Comentários à Lei de Impren­sa", 3ª edição, 1995, ed. Revis­ta dos Tribunais, n Q 713, pág. 734).

Inclino-me, ao analisar a possível negativa de vigência ao § 6Q do art. 57 da Lei de Im­prensa, por não divisar no acórdão a ocorrência de tal ví­cio, posto que a interpretação sistemática desse dispositivo conduz à conclusão adotada pelo acórdão recorrido."

Daí que aqueles decisórios, ao aplicar o direito à espécie, laboran­do a exegese do art. 57, § 6º da Lei 5.250/67, também amoldou-se à ju­risprudência desta Corte, a qual, no precedente citado, assim concluiu (REsp 39.886/SP):

"Responsabilidade civil. Lei de Imprensa. Dano moral indeniza­do acima da limitação imposta pelo art. 52 da Lei de Regência. Revogação da norma em face da Constituição em vigor. Depósito do art. 57, § 6 Q da mesma Lei. Descabimento de sua exigência em montante superior ao limite máximo fixado pela Lei em ques­tão. Interpretação sistemática. Recurso desacolhido.

- O depósito prévio à apela­ção, no valor total da condenação imposta a título de indenização por dano moral advindo da ativi­dade jornalística, foi concebido na

vigência de um sistema que pre­via a indenização tarifada. Ado­tando-se nas instâncias ordinárias indenização que ultrapasse esse valor máximo, há que se ter, por força de interpretação sistemáti­ca do dispositivo que impõe o de­pósito, por inaplicável também tal exigência." (DJ 03.11.97)

Ora ciente de tal precedente e ainda mais das decisões que nesta Egrégia Turma compreenderam que após a Constituição de 1988, libe­rou-se a indenização por dano mo­ral, na espécie, da tarifação impos­ta pela Lei de Imprensa não há fa­lar em exigir-se o depósito prévio da indenização nela fixada para a in­terposição da Apelação, eis que am­bos não foram recepcionados.

Tal a hipótese dos autos e forte nos fundamentos deduzidos é que não conheço dos recursos.

VOTO

O SR. MINISTRO CARLOS AL­BERTO MENEZES DIREITO: Se­nhor Presidente, esta Corte sabe que tenho posição já assentada nes­ta matéria. Entendo que aquela in­denização tarifada corresponde ao depósito para o recurso. À medida que dispensamos a indenização tarifada, evidentemente que não se pode exigir o depósito.

Acompanho o eminente Ministro­Relator.

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RECURSO ESPECIAL Nº 88.375 - SP

(Registro nº 96.0009884-0)

Relator: O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro

Recorrentes: Regina Lúcia Lopes dos Santos e outros

Recorridos: Jefferson Antônio Lopes dos Santos, e Leonira de Fátima Lopes dos Santos e outro

Advogados: Drs. Paulo de Tasso Alves de Barros, Paulo Sérgio da Fon­seca Santos e Cid Wagner da Silva

EMENTA: Interesse de agir.

Hipótese em que se pretende a anulação de partilha, judicial­mente homologada, onde se incluiu imóvel de que, consoante o registro imobiliário, seriam proprietários os autores.

Existência de incerteza objetiva de que resulta o interesse em postular a anulação.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, acordam os Srs. Ministros da Terceira Turma do Superior Tri­bunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhe­cer do recurso especial e lhe dar pro­vimento.

Participaram do julgamento os Srs. Ministros Waldemar Zveiter, Menezes Direito e Nilson Naves.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Costa Leite.

Brasília, 19 de maio de 1998 (data do julgamento).

Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Presidente. Ministro EDUARDO RIBEIRO, Re­lator.

Publicado no DJ de 17-08-98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO EDUARDO RI­BEIRO: Trata-se de ação declarató­ria de anulação de partilha de bens, ajuizada por Regina Lúcia Lopes dos Santos e outros. Figuram como réus Leonira de Fátima Lopes e ou­tros. Alegam os autores que colacio­nado imóvel que não mais integra­va o patrimônio deixado por Antô­nio Lopes dos Santos. Exibiram do­cumentação referente a anterior transação, em que lhes fora aliena­do o referido bem.

A sentença deu pela carência da ação e, entendendo necessário, apre­ciou o mérito, julgando improceden­te o pedido.

O acórdão, que julgou a apelação, está assim ementado:

"Cerceamento de defesa. Não ocorrência. Questão que envolve

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somente matéria de direito. Jun­tada de documentação suficiente a ensejar o julgamento antecipa­do da lide. Aplicabilidade do art. 330, inciso I, do CPC.

Condições da ação. Interesse processual. Inexistência de pre­juízo ou dano. Ausência de lesão a direito subjetivo. Carência de ação caracterizada. Processo ex­tinto. Aplicabilidade do art. 267, inciso VI, e § 3Q

, do CPC."

No especial os autores alegaram que desconsiderado o disposto nos artigos 3Q do CPC e 76 do Código Civil. Argumentaram que o acórdão impugnado se teria equivocado quan­do não lhes reconheceu interesse processual, não atentando que ar­rolado imóvel de exclusivo domínio dos recorrentes.

Recurso admitido, opinando o Mi­nistério Público "pelo improvimen­to do presente Recurso Especial e manutenção do V. Acórdão Recorri­do por ser a melhor Justiça."

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO EDUARDO RI­BEIRO (Relator): Arrolou-se em in­ventário determinado imóvel, que teria sido vendido aos autores, fi­lhos do de cujus, sendo, em conse­qüência, incluído na partilha judi­cialmente homologada. O acórdão entendeu faltar interesse para plei­tear a anulação dessa, uma vez que o domínio do bem resultava do re­gistro imobiliário, que continuava

em nome dos autores. Enquanto esse existisse, não seria possível re­gistrar o formal de partilha.

Embora exata a observação de que o registro subsistiria até que fosse desconstituído por ação pró­pria, não me parece, data venia, correta a conclusão.

Como observou o julgado recor­rido, por certo que a Jurisdição não se movimenta para responder a con­sultas acadêmicas, sendo mister a existência de um dano ou de um perigo de dano que possa ser repa­rado ou evitado medinte o proces­so. O interesse supõe a necessidade do provimento jurisdicional para alcançar essa finalidade.

O equívoco do acórdão, a meu sentir, reside em ter limitado o pre­juízo, no caso, à perda da proprie­dade. Considero que outro bem ju­rídico, igualmente merecedor de tutela, encontra-se atingido. Com a homologação da partilha e conse­qüente expedição de formal, criou­se para os autores situação de in­certeza objetiva. Imóvel de que se consideram proprietários passou a figurar, em instrumento público, como pertencendo também a tercei­ros. Essa incerteza objetiva acarre­ta-lhes dano ou, ao menos, perigo de dano. Mencione-se, apenas como exemplo, a dificuldade em realizar qualquer negócio envolvendo aque­le bem.

E que a incerteza é bastante para que exista o interesse, demonstra o induvidosamente a própria admis­sibilidade do pedido de declaração negativa. Ahipótese é a isso assimi­lável.

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Tenho como violado o disposto no artigo 3Q do Código de Processo Ci­vil, razão por que conheço do recur­so e dou-lhe provimento para que, no egrégio Tribunal de origem, se prossiga no julgamento da apelação, superado o óbice que levou a extin­guir-se o processo.

VOTO

O SR. MINISTRO CARLOS AL­BERTO MENEZES DIREITO: Se-

nhores Ministros, estou de acordo com o Senhor Ministro-Relator, por­que, na realidade, existe um duplo documento: o primeiro, no registro de imóveis, dando a propriedade do bem aos autores, e o formal de par­tilha incluindo esse mesmo imóvel.

Como disse o Senhor Ministro­Relator, existe uma incerteza obje­tiva, clara, insofismável, sobrancei­ra a qualquer dúvida razoável, a justificar o interesse processuaL

Conheço do recurso e o provejo.

RECURSO ESPECIAL NQ 101. 739 - DF

(Registro nQ 96.0045879-0)

Relator: O Sr. Ministro Waldemar Zveiter

Recorrente: Paulo Octávio Investimentos Imobiliários Ltda.

Recorridos: Marlene Rodrigues de Oliveira e outros

Advogados: Drs. Roberto Luiz de Barros Barreto e outros, e Hebert da Silva Tavares e outros

EMENTA: Compromisso de compra e venda - Imóvel - Índice de reajuste - Financiamento - Pacto - BTN - IPCC - Dissídio - Caracterização.

I - Tendo sido o índice IPCC livremente pactuado entre as par­tes como substitutivo, deve ele ser aplicado, em respeito à avença.

II - Recurso conhecido e provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, acordam os Senhores Mi­nistros da Terceira Turma do Supe­rior Tribunal de Justiça, na con-

formidade dos votos e das notas ta­quigráficas a seguir, por unanimi­dade, conhecer do recurso especial e lhe dar provimento. Participaram do julgamento os Senhores Minis­tros Menezes Direito e Eduardo Ri-

178 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.

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beiro. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Costa Leite e Nil­son Nave.s.

Brasília, 04 de agosto de 1998 (data do julgamento).

Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Presidente. Ministro WALDEMAR ZVEITER, Relator.

Publicado no DJ de 14-09-98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER: Cuida-se de ação ordiná­ria ajuizada por Marlene Rodrigues de Oliveira e outros em desfavor de Paulo Octávio - Investimentos Imo­biliários Ltda., com o objetivo, den­tre outros, de condenar a Ré à devo­lução de quantias pagas a mais que o contratualmente devido, referen­te a reajustamento de parcelas do financiamento para aquisição de unidades habitacionais, com base em índice não contratado, o VRF (valor de referência de financiamen­to).

A r. sentença monocrática julgou parcialmente procedente o pedido, condenando a Ré a ressarcir os Au­tores dos valores aplicados no finan­ciamento em face da adoção de ín­dice de reajuste estranho ao pactua­do, devendo os mesmos ser calcula­dos até 28/02/91 pelo BTN e, após essa data, pela TR. (fls. 183/190).

Ambas as partes interpuseram recurso de apelação, tendo a Egré­gia Quarta Turma do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, à una-

nimidade de votos, dado parcial pro­vimento ao apelo da Ré e desprovi­do o dos Autores, em aresto assim ementado (fls. 235):

"Apelação_ Compra e venda -Financiamento_ ImóveL Corre-. ção. Juros. Confissão de dívida adicional. Sucumbência recípro­ca. Honorários.

- Durante a vigência do BTN como índice de correção pactua­do, outro não se lhe pode substi­tuir. Extinto esse, o a ser adota­do é aquele que veio substituí-lo, nos termos do contrato, devendo, por conseguinte, ser a TR.

- A estipulação expressa, no contrato, dejuros compensatórios, em 1% ao mês, não é ilegal.

- Inexistindo vício maculador da manifestação de vontade, im­procede a pretensão anulatória do ato jurídico de confissão da dí­vida adicional.

- Sendo recíproca a sucum­bência, cada parte deve suportar a verba dos seus respectivos ad­vogados."

Ainda in conformada, Paulo Octá­vio Investimentos Imobiliários Ltda, interpõe Recurso Especial, susten­tando ocorrência de dissídio juris­prudencial com o REsp nº 36.162-11 SP e com o decidido naADIn nº 493-0/600.

Com contra-razões (fls. 260/265), o apelo foi admitido (fls. 267) e en­caminhado a esta Corte.

É o relatório.

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VOTO

O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER (Relator): Pelo que se de­preende dos autos e pode-se cons­tatar às fls. 16 (instrumento parti­cular de promessa de compra e ven­da), convencionaram as partes a correção das parcelas do financia­mento pela variação do BTN ou, no caso de sua extinção, pelo índice que viesse a sucedê-lo ou pelo IPCC.

O acórdão recorrido, ao adotar como índice a TR, dissentiu de inú­meros julgados desta Corte que, após o julgamento da ADIn referi­da no Especial, afirmaram não ser a TR índice de correção monetária, mas sim de remuneração de capital (REsp n Q 110.785/SP, DJ 04/5/98, de minha relatoria e EREsp 64.712/SP, Relator Sr. Ministro William Patter­son, DJ 26/2/96).

E, tendo sido o índice IPCC livre­mente pactuado entre as partes como substitutivo, deve ele ser apli­cado, em respeito ao avençado con­soante o também decidido no REsp n Q 36.162-1/SP, apontado no Espe­cial como aresto paradigma.

Esta é a orientação prevalente em ambas as Turmas da Seção de Direito Privado, de que são exem­plos os seguintes julgados:

"Contrato de compra e venda. Índice substituto. Previsão con­tratual. Precedente da Corte.

1. Havendo a previsão de índi­ce substituto no contrato, assim o setorial, não há razão alguma para afastá-lo, merecendo respei­tado o pacto.

2. Recurso especial conhecido e provido." (REsp n Q 120.670IDF, Relator Sr. Ministro Carlos Al­berto Menezes Direito, DJ de 25/ 05/98).

"Promessa de venda e compra. Fator de atualização eleito pelos contraentes em hipótese de extin­ção do indexador oficial. Impos­sibilidade de adoção, como tal da "TR".

Não constituindo a TR (Taxa Referencial) fator de atualização monetária, era insuscetível de ser tida como mero substitutivo do BTNF e, conseqüentemente, não podia ser empregada, como tal, no reajustamento das parce­las avençadas. Reconhecimento da infração contratual cometida pelos promitentes-vendedores.

Recurso especial conhecido e provido, em parte." (REsp n Q

74.658/SP, Relator Sr. Ministro Bar­ros Monteiro, DJ de 24/06/96).

Pelo exposto, conheço do recurso pela caracterização do dissídio pre­toriano e dou-lhe provimento para determinar a aplicação do IPCC, tal como pactuado.

É o meu voto.

180 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.

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RECURSO ESPECIAL NQ 112.561 - RJ

(Registro n Q 96.0070003-6)

Relator: O Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito

Recorrente: Editora O Dia Ltda.

Recorrido: Luiz Henrique Marinho Pires

Sustentação Oral: Dr. Joseual Sirqueira (pela recorrente)

Advogados: Drs. Joseual Sirqueira e outros e Celso Pereira de Andrade

EMENTA: Indenização por danos morais. Publicação emjornal. Condenação em valor inferior ao indicado na inicial. Sucumbên­cia parcial não caracterizada.

1. O quantum pedido a título de indenização por danos morais, neste caso, tem natureza estimativa, assim, a condenação em va­lor inferior, por si só, não caracteriza a sucumbência recíproca.

2. Recurso especial não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, acordam os Senhores Mi­nistros da Terceira Turma do Supe­rior Tribunal de Justiça, na confor­midade dos votos e das notas taqui­gráficas a seguir, por maioria, não conhecer do recurso especial, ven­cidos os Senhores Ministros Costa Leite e Eduardo Ribeiro. Participa­ram do julgamento os Senhores Mi­nistros Costa Leite, Nilson Naves, Eduardo Ribeiro e Waldemar Zvei­ter.

Brasília, 10 de novembro de 1997 (data do julgamento).

Ministro COSTA LEITE, Presi­dente. Ministro CARLOS ALBER­TO MENEZES DIREITO, Relator.

Publicado no DJ de 15-06-98,

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO CARLOS AL­BERTO MENEZES DIREITO: Cui­da-se de Recurso Especial interpos­to pela Editora O Dia Ltda., com base no artigo 105, inciso IIl, alíneas a e c, da Constituição Federal, con­traAcórdão proferido pela 3ª Câma­ra Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, assim emen­tado, verbis:

"Ação Ordinária - Reparação de danos - Ato lesivo à honra -Danos morais - Estampando, em primeira página, foto do au­tor. Oficial da Polícia Militar, atribuindo-lhe participação em matança de menores, não há dú­vida de que tal publicação afron­tou-lhe a honra, lesionando a sua reputação, mesmo com a correção

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posterior - Indenização cabível, -eXigível e pertinente a título de danos morais - Quantitativo ade­quad~ - Sentença correta - Ape­fu não provido." (fls. 150)

Houve embargos de declaração (fls. 153 a 155), acolhidos mediante a seguinte fundamentação:

"Embora haja indicação de quan­ti~vo indenizatório na inicial, .

• 6 que importa considerar é que a ação foi julgada integralmente procedente, só se podendo ter por vencida uma das partes, não sen­do caso, na espécie, de se aplicar a regra do artigo 21 do CPC, ain­da que a indenização seja aquém da inicialmente pretendida.

A fim de que tal fique declarado, dá-se acolhida aos embargos ofer­tados." (fls. 159)

Sustenta o recorrente que o Tri­bunal a quo violou a norma do ar­tigo 21 do Código de Processo Civil, eis que teria havido sucumbência recíproca, devendo os honorários e as custas ser repartidos proporcio­nalmente (fls. 162 a 173).

Para comprovar a divergência jurisprudencial, traz julgados des­ta Corte e do Supremo Tribunal Fe­deral.

Houve contra-razões (fls. 202 a 204) e o recurso especial foi admiti­do (fls. 206 a 208), subindo os autos a esta Corte (fls. 209-verso).

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO CARLOS AL­BERTO MENEZES DIREITO (Re­lator): O recorrido propôs ação de indenização por danos morais con­tra o recorrente, que publicou em periódico a foto daquele como sen­do um dos acusados de matar me­nores no centro do Rio de Janeiro.

Pediu o autor indenização não in­ferior a 400 (quatrocentos) salários mínimos vigentes à época do paga­mento (fls. 05), tendo a sentença, mantida em segundo grau, condena­do o réu a pagar importância equi­valente a 5.000 (cinco mil) URV's (fls. 79).

Para justificar o pedido de inci­dência da norma do art. 21 do Códi­go de Processo Civil, pertinente à sucumbência recíproca, diz o recor­rente, no especial datado de 06.05.96, que 5.000 (cinco mil) URV's equiva­leriam a apenas 77 (setenta e sete) salários mínimos.

Mas não há como se acolher a ir­resignação do recorrente.

O valor de 400 (quatrocentos) sa­lários mínimos a título de dano mo­ral não tem qualquer parâmetro, constituindo, na verdade, pedido aleatório, cujo acolhimento depen­deria da avaliação subjetiva, pelo Juiz, das circunstâncias fáticas da causa.

Conclui-se, com isso, que o valor pedido na inicial é meramente esti­mativo e a condenação em impor­tância inferior àquele não enseja sucumbência recíproca, devendo o réu arcar com a totalidade das custas e dos honorários advocatícios.

182 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.

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Sobre o tema, trago o seguinte precedente desta Turma:

"Indenização. Valor estimativo. Sucumbência parcial.

Sendo meramente estimativo o valor da indenização pedida na inicial, não ocorre a sucumbên­cia parcial se a condenação fixa­da na sentença é inferior àquele montante." (REsp n Q 21.696-9/SP, 3ª Turma, Relator Ministro Cláu­dio Santos, DJ de 21.06.93)

Assinale-se que a divergênciaju­risprudencial não está comprovada porque o recorrente não demonstra a semelhança fática necessária.

Ante o exposto, não conheço do recurso especial.

RETIFICAÇÃO DE VOTO -VENCIDO

O SR. MINISTRO COSTA LEI­TE: Srs. Ministros, vou pedir vênia para dissentir do douto voto de S. Exa. Penso que não haja aqui sim­ples estimativa, eis que se timbrou o proveito econômico, pedindo-se in­denização não inferior a quatrocen­tes salários mínimos. Se a indeni­zação não alcançou tal soma, há sucumbência, data venia.

VOTO

O SR. MINISTRO NILSON NA­VES: Sr. Presidente, de acordo com o voto que proferi no REsp-71.576/ RS, peço vênia para acompanhar o voto do Sr. Relator.

VOTO - VENCIDO

O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: Sr. Presidente, embora na hipótese invocada pelo eminen­te Relator tenha acompanhado o Sr. Ministro Cláudio Santos, o meu en­tendimento, realmente, fixou-se no julgamento do Recurso Especial n Q

7l.576/RS, a que fez referência o Sr. Ministro Nilson Naves.

O certo é que há uma dificuldade em relação ao tema, dada a própria fluidez, quando se trata de estabe­lecer o valor de dano moral.

Recomenda-se que, quando da fixação desses honorários, se aja real­mente com eqüidade, muita mode­ração, tenha em conta cuidadosa­mente as circunstâncias.

O que não se pode é deixar de ter em conta que houve uma sucumbên­cia por parte do autor. Se ele pediu quatrocentos e lhe foi dado seten­ta, é evidente que sucumbiu. Isso não há de ser simplesmente igno­rado. É preciso que as partes te­nham um pouco mais de pondera­ção, quando se trata de formular tais pedidos, não os fazendo em quantitativos exagerados.

Acompanho o Sr. Ministro Costa Leite.

VOTO

O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER: Sr. Presidente, peço li­cença a V. Exa. e ao eminente Mi­nistro Eduardo Ribeiro para ficar com o ponto de vista q[ue já tenho manifestado, tanto no precedente

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 183

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citado do Recurso Especial nº 21.696/ SP, Relator o Sr. Ministro Cláudio Santos, quanto no julgamento do Re­curso Especial nº 71.576, de que foi relator o Sr. Ministro Nilson Naves. Neste último, relembrado agora no voto-vista de S. Exa., ficou patente que ali o pedido formulado também fora certo, em quantia adredemente fixada pelo autor.

N este caso que estamos julgan­do, embora considere relevantes os fundamentos deduzidos no recurso, e pelo nobre advogado, da tribuna, que recebeu o eco de Suas Excelên­cias, os Srs. Ministros Presidente e Eduardo Ribeiro, em verdade, o que

consigo extrair é que o pedido tam­bém foi meramente estimativo. Te­mos que reconhecer que a nossaju­ris prudência oscilou na matéria so­bre ser possível ou não ao autor for­mular o pedido relegando ao juízo o arbitramento do seu quantitativo, cuidando-se de indenização por dano moral. Hoje evoluímos para admitir essa espécie. Dos autos ex­traio que o pedido formulado pelo autor foi, como disse, meramente estimativo.

Assim sendo, peço venla para acompanhar os votos dos Srs. Mi­nistros Relator e Nilson Naves.

RECURSO ESPECIAL Nº 120.404 - GO

(Registro nº 97.0011920-3)

Relator: O Sr. Ministro Nilson Naves

Recorrentes: Geraldo Dias e cônjuge

Recorridos: Economia Crédito Imobiliário S/A - Economisa e outro

Advogados: Drs. Isaú dos Santos, e Francisco Carlos Dantas e outros

EMENTA: Reivindicatória. Usucapião e anulatória. 1. Conexão. Julgada uma das ações (no caso, duas foram), desaparece o mo­tivo da reunião dos processos. Não é importante, em caso tal, haver apelação, porque "a conexão somente ocorre na mesma instância" (CC-3.075). Inocorrência de decisões contraditórias, tendo os processos tramitado perante o mesmo juízo. 2. Matéria de prova, quanto à alegação de afronta ao art. 524 do Cód. Civil (Súmula 7). Falta de prequestionamento. 3. Recurso especial não conhecido.

184 R. sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.

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ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribu­nal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a se­guir, por unanimidade, não conhe­cer do recurso especial. Afirmou suspeição o Sr. Ministro Eduardo Ribeiro. Participaram dojulgamen­to os Srs. Ministros Waldemar Zvei­ter, Menezes Direito e Costa Leite.

Brasília, 10 de março de 1998 (data do julgamento).

Ministro COSTA LEITE, Presi­dente. Ministro NILSON NAVES, Relator.

Publicado no DJ de 27-04-98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO NILSON NA­VES: A sentença de fls. 708/716, aco­lhendo o pedido reivindicatório, de­terminou aos réus que restituíssem o imóvel descrito na inicial. Entra­ram eles com embargos de declara­ção, dizendo que a sentença se omi­tira (por exemplo, quanto à existên­cia de outras ações), e logo após, antes que o juiz se pronunciasse a respeito dos embargos, eles apela­ram, e os autos subiram ao Tribu­nal, mas, antes, disse o juiz, no des­pacho em que ordenou a subida, que os embargos eram protelatórios.

No Tribunal, à apelação negou­se provimento, em acórdão assim ementado:

"Reivindicatória. Cerceamento de defesa inexistente. 1 - Em se tratando de ação reivindicatória, mister se faz que o autor apre­sente instrumento hábil que ca­racterize que a res reivindicató­ria lhe pertença, que haja descri­ção da área individualizada e que prevaleça o seu domínio sobre a alegada posse justa ou injusta do réu.

Preenchidos tais requisitos,jul­ga-se procedente o pedido reivin­dicatório. 2 - Inexiste cercea­mento de defesa, face ao indefe­rimento de realização de nova perícia, já que o Juiz não está adstrito ao laudo pericial e só a ele caber avaliar a necessidade de nova perícia. Apelo conhecido e improvido."

Os réus interpuseram recursos extraordinário e especial. Neste, a par do art. 524 do Cód. Civil e de textos constitucionais, os recorren­tes apontam dispositivos processuais, alegando, quanto a esses, o seguin­te:

"Assim, o julgamento da rei­vindicatória isoladamente, sem apreciação da anulatória, proces­so em apenso, e sem deferir a reu­nião da ação de usucapião em curso pelo mesmo douto juízo e cartório, veio afrontar dispositi­vo de lei federal, o contido no ar­tigo 103 do Código de Processo Civil, ... "

" ... Por não pronunciar a douta sentença sobre todas as questões

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 185

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postas pelos recorrentes, data venia, negou vigência aos arti­gos 458 e 459 do Código de Pro­cesso CiviL"

o recurso especial foi admitido, visto que, segundo o despacho de fls. 881/4,

" ... Cabia, pois, ao Tribunal de­cidir sobre a existência ou não de conexão entre a ação reivindica­tória e a ação de usucapião e, no caso afirmativo, cassada a sen­tença, determinar a reunião das ações, a fim de que sejam decidi­das simultaneamente, como pre­vê o art. 105 do CPC."

o recurso extraordinário não foi admitido. Não houve agravo.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO NILSON NA­VES (Relator): Pretendem os recor­rentes seja ordenada a reunião das ações, a fim de que sejam decididas simultaneamente. Neste ponto, de­cidiu o acórdão da seguinte forma:

"Por último, a existência de ou­tras ações conexas a esta (anula­tória de títulos e de usucapião) não tem o condão de desconsti­tuir os títulos de propriedade apresentados pelas autoras, pois, além delas terem sido protocola­das após a proposição da presen­te demanda, ou seja, em 22.11.93, (fls. 755) e em 01.02.93 (fls. 761), respectivamente, as mesmas ain-

da se encontram sub judice, con­forme informações prestadas pelo insigne Magistrado de 1 º Grau (fls. 803 e 805), não restando ca­racterizada assim, a coisa julga­da."

À época do julgamento da apela­ção, o Juiz de Direito de Luziânia prestara ao Tribunal as seguintes informações:

"Conforme requisitado no Ofí­cio nº 026/96, datado de 22.03.96, passo a prestar as informações referentes àAção Ordinária Anu­latória nº 1. 7 55/93, requerida por Geraldo Dias em desfavor de Eco­nomia - Créd. Imob. S/A -Economisa, sendo que a mesma foi julgada improcedente em 08.05.96 e com relação à Ação de Usucapião nº 1.218/93 em que Geraldo Dias move em desfavor de Economia - Créd. Imob. S/A Economisa e Vila Verde S/A -Arquitetura, Engenharia e Paisa­gismo, tendo sido protocolizada em 01.02.93 e em audiência de justificação designada para o dia 21.09.93 foram julgados os auto­res carecedores de ação com a conseqüente extinção do proces­so. Foram interpostos embargos de declaração e depois apelação havendo o Tribunal reformado a decisão, estando o processo aguardando manifestação da parte autora para que a mesma requeira a citação da parte. In­formo mais da existência do Mandado de Segurança nº 7.130-1/101 em que é relator M. W. de Oliveira N egry."

186 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.

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Ora, a ação ordinária anulatória estava julgada por sentença. Por isso, ao admitir o recurso especial, disse o Presidente Sabino de Freitas que essa ação era de ser afastada da discussão dos autos, porquanto, e aí citou Theotonio Negrão, "dei­xa de existir conexão quando uma das causas já foijulgada", mas acres­centou:

"O usucapião, alegado em de­fesa na contestação (fls. 75, 1 Q

voI.) e por meio de ação própria, não foi apreciado. A omissão da sentença de fls. 708/716 deu cau­sa aos embargos de declaração de fls. 724/729, que mereceram do dirigente do processo o despacho ilegível de fls. 790. Na apelação de fls. 731-735, os ora recorren­tes pediram que o Tribunal apre­ciasse os embargos de declaração e anulasse a sentença, por cercea­mento de defesa. O acórdão não examinou o usucapião alegado em defesa na contestação e, data venia, examinou incorretamen­te a ação de usucapião. Com efei­to, não é correta a afirmação de que a ação conexa de usucapião não tem o condão de desconstituir os títulos de propriedade apresen­tados pelas autoras e que tendo a referida ação sido protocoliza­da após a ação reivindicatória e estando sub judice, não há coi­sa julgada, quando de coisa jul­gada não se trata e, sim, de co­nexão. A ação conexa de usuca­pião, se acolhida, desconstitui o título de propriedade dos reivin­dicantes: ... "

Efetivamente, há precedentes se­gundo os quais "Não há conexão que poderia determinar a reunião :-dos processos, se um deles já se achajul­gado, sem relevo a circunstâll.ciade haver apelação, posto que a:ctm-e­xão somente -ocorre na mesma ins­tância. Destaca-se afacultatividade da reunião de processos conexQs" (CC-3.075, Sr. Ministro Dias Trin­dade, DJ de 14.9.92). De igual modo, CC-15.824, Sr. Ministro Gomes de Barros, DJ de 9.9.96. Em tal asp~c­to, estou, portanto, de acordo com o Presidente Sabino de Freitas.

N o que concerne ao usucapião, que se diz argüido em defesa (tenho dúvidas se o foi, porque os então contestantes cingiram-se, ao final da resposta, em dizer "que a soma­tória de tempo para efeitos de pos­se já autoriza o usucapião, que por si só descaracteriza o domínio pre­tendido pelas autoras", o que me parece insuficiente em se tratando de defesa admitida pela Súmula 237/STF), desta questão, admitin­do-se que tenha sido suscitada pela parte, não cuidou o acórdão que se deseja reformar, nem lhe foram opostos embargos de declaração (Súmulas 282 e 356/STF). Além dis­so, o recurso, no particular, é defi­ciente, não indicando nem texto de lei violado nem dissídio jurispru­dencial (Súmula 284/STF).

Quanto à reunião das ações, afim de que fossem decididas simultanea­mente, tal não era possível, material­mente, levando-se em conta que a reivindicatória já corria desde 1989, sentenciada que foi em 21.3.93, ao passo que a ação de usucapião só foi

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ajuizada em 1.2.93, e veio a ser des­pachada um dia após proferida aquela sentença. Mas as ações tra­mitaram perante o mesmo juízo, e nelas ao que tudo indica o mesmo juiz proferiu sentença. Em sendo assim, risco não houve de que pu­desse haver julgamento contraditó­rio: que fossem proferidas decisões contraditórias. O ideal e recomen­dável, em casos assim, é que o jul­gamento do usucapião preceda ao da reivindicatória. Isto aqui não era possível, como se viu. Por isso, não deparo com a alegada ofensa ao art. 103. Nem se invocou o art. 105. Ca­bia aos recorrentes, já na contesta­ção, terem enfaticamente se defen­dido, argüindo, de modo claro e ob­jetivo, o usucapião, ou terem ajui-

zado em melhor tempo a ação de usucapião, de modo que ambas as ações corressem ao mesmo tempo. Nada disto foi feito. Não podem eles agora se queixar da circunstância de uma ação ter sido julgada antes da outra. Ora, o conceito segundo o qual, julgada uma das ações, desa­parece a finalidade da reunião, aqui também se aplica.

Quanto ao mais, falta cabimento ao recurso: sobre o art. 524 do Cód. Civil, a questão suscitada não é tipi­camente de direito, por notoriamen­te envolver matéria probatória (Súmula 7); sobre os arts. 458 e 459, faltou-lhes prequestionamento, a propósito da questão ora levantada.

Não conheço do recurso especial.

RECURSO ESPECIAL Nº 123.676 - SP

(Registro nº 97.0018149-9)

Relator: O Sr. Ministro Waldemar Zveiter

Recorrente: Voith S/A Máquinas e Equipamentos

Recorrido: Francisco Carneiro de Oliveira

Advogados: Drs. Orlando Machuca e Marcelo Cortona Ranieri

EMENTA: Processual Civil- Apelação - Instrumento de man­dato apresentado no ato de sua interposição.

I - Em face da sistemática vigente (CPC, art. 13), o juiz não deve extinguir o processo por defeito de representação antes de ense­jar à parte prazo para suprir a irregularidade, sendo que a inti­mação para tal fim deve ser feita em seu nome, pessoalmente, e não em nome do advogado, que não se sabe, até então, se real­mente a representa.

188 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.

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U - o atual Código de Processo Civil prestigia o sistema que se orienta no sentido de aproveitar ao máximo os atos processuais, regularizando sempre que possível as nulidades sanáveis.

lU - Tem-se como sanada a irregularidade de representação ju­dicial da parte, quando ofertado o instrumento de mandato no ato de interposição do recurso de apelação.

IV - Recurso conhecido e provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, acordam os Senhores Mi­nistros da Terceira Turma do Supe­rior Tribunal de Justiça, na confor­midade dos votos e das notas taqui­gráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso especial e lhe dar provimento. Participaram do julgamento os Senhores Ministros Menezes Direito e Eduardo Ribeiro. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Costa Leite e Nilson Naves.

Brasília, 4 dejunho de 1998 (data do julgamento).

Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Presidente. Ministro WALDEMAR ZVEITER, Relator.

Publicado no DJ de 10-08-98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER: Cuidam os autos de Ação de Reparação de Danos por ato ilí­cito proposta por Francisco Carnei­ro de Oliveira contra Voith SI A Má­quinas e Equipamentos.

A contestação foi apresentada dentro do prazo legal, desacompa-

nhada, no entanto, do instrumento de mandato, tendo o d. Juiz assina­lado prazo de cinco dias para a com­petente regularização da represen­tação processual (fls. 159).

Dito despacho, publicado pela imprensa oficial em nome do causí­dico da empresa, restou inatendido, o que motivou, na sentença, o de­creto de revelia, tendo a ação sido julgada parcialmente procedente.

Em sede de apelação alegou o vencido que a revelia não poderia ter sido decretada, pois apresentou no prazo a contestação e o compro­vante do pagamento da taxa da Car­teira de Previdência dos Advogados de São Paulo, faltando apenas o ins­trumento do mandato; que as inti­mações em nome de seu patrono não chegaram ao alcance deste e que seu representante legal não foi intima­do sobre o prosseguimento do feito, com a advertência da pena de de­cretação da revelia (fls. 166/168).

A Oitava Câmara de Direito Pri­vado do Colendo Tribunal de Justi­ça do Estado de São Paulo, à unani­midade, negou provimento ao ape­lo, ao entendimento de que desne­cessária a intimação pessoal da par­te para regularização da represen­tação de seu advogado (fls. 191/194).

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 189

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Inconformada, interpôs a recor­rente Recurso Especial, com base no art. 105, UI, a e c, da Constituição, alegando negativa de vigência do art. 37 do CPC. Sustenta, em sínte­se, que a irregularidade é absoluta­mente sanável e que a intimação para a regularização da represEm­tação processual deveria ter sido feita pessoalmente ao representan­te legal da empresa-ré. Aponta dis­sídio jurisprudencial, trazendo à colação o REsp nº 29.223-6/SP (fls. 198/202).

Com contra-razões (fls. 205/207), o nobre Terceiro Vice-Presidente da­quele Tribunal o admitiu (fls. 209/ 210).

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER (Relator): O Acórdão está, assim, sumariado por sua ementa (fls. 192):

"Revelia - Instrumento de mandato apresentado somente com o apelo - Desnecessária a intimação pessoal da parte para regularização da representação de seu advogado - Recurso improvido. "

As razões dessa decisão estão deduzidas pelo enllnente Relator, nestes termos (fls. 193/194):

"Como se comprova pelo subs­tabelecinumto de fi. 169 trazido conl as razões de apelação, os ad-

vogados da ré estavam constituí­dos desde 13 de junho de 1994, tendo oferecido a contestação ao feito tempestivamente em 7 de julho daquele ano (fl. 22), deixan­do no entanto de instruí-la com a procuração exigida pelo art. 37 do Código de Processo Civil, man­tendo-se inertes mesmo depois de intimados conforme publicação de fl. 161 a regularizar sua repre­sentação nos autos no prazo de cinco dias assinado pelo Meritís­simo Juiz.

Não colhe o argumento do ape­lo, segundo o qual o ínclito Ma­gistrado havia de conferir a dila­ção de quinze dias para a regula­rização da representação, tal como prevista na segunda parte do referido dispositivo legal. É que semelhante ressalva da lei processual não se aplica à hipó­tese em causa por três argumen­tos: primeiro porque, no caso, não se configura a necessidade de evitar decadência ou prescrição, nem se cuida de prática de atos urgentes; segundo porque, nada obstante ter o Meritíssimo Juiz fixado o prazo de cinco dias, a dilação de quinze dias prevista em lei é automática (Theotonio Negrão, nota 6c ao artigo 37 do Código de Processo Civil) e, po­dendo ter sido cumprida nesse interstício não o foi, visto como o instrumento de mandato somen­te foi trazido com o apelo, tercei­ro porque, assim como a ré, por seu advogado, foi intimada da r. sentença pelo Diário Oficial, tan­to que dela recorreu no prazo, assim também se operou a inti-

190 R. Sup. Trib. Just., Brasilia, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.

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mação pela imprensa quanto à providência omitida, referente à regularização da representação.

N em há falar-se, como preten­de a apelante, de intimação pes­soal da parte para que regulari­ze representação de seu advoga­do, e isso pelas razões acima ex­postas, além de que é o advogado e não a parte que, nos termos da norma de rito, não será admitido a procurar em juízo sem instru­mento de mandato.

Nessas condições, não elidida a r. sentença pelas razões recur­sais, remanesce mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos.

Posto isso, pelo meu voto nego provimento à apelação."

Insurge-se a recorrente alegan­do que a parte deveria ter sido inti­mada pessoalmente a suprir o de­feito da representação processual e também que: "Provado o fato da existência do instrumento de man­dato, cabia ao E. Tribunal, face à relevância do assunto e de suas con­seqüências, acolher o apelo no sen­tido de que a Recorrente tivesse a oportunidade de dar regular pros­seguimento ao feito, em seus ulte­riores trâmites e não estancá-lo de­cisivamente, a duras penas, consi­derando-se o fato mera irregulari­dade formal sanável". (fls. 201)

Com razão o recorrente.

Em verdade, assentado najuris­prudência da Corte Especial o en­tendimento segundo o qual, a falta de instrumento de mandato consti­tui defeito sanável nas instâncias

ordinárias, aplicando-se, para o fim de regularização da representação postulatória, o disposto no art_ 13, do CPC, conforme assentado no REsp nº 50.538-0IRS - relator Sr. Ministro Costa Leite - RSTJ 681 383 e no EREsp nº 14.827IMG, jul­gado pela Eg. Segunda Seção, do qual fui relator para o acórdão que restou assim ementado:

"Processual Civil - Instru­mento de mandato - Inexistên­cia.

I -Assentado najurísprudên­cia da Corte o entendimento no sentido de que, não apresentan­do o signatário do recurso de ape­lação o instrumento de mandato e não se valendo da faculdade prevista no art. 37 do CPC, deve­rá o Dr. Juiz marcar prazo razoá­vel para que seja a falta suprida. Aplicação do disposto no art. 13, do mesmo diploma processual ci­vil.

II - Embargos conhecidos e providos." (DJ de 09/05/94).

Portanto, nas hipóteses em que não apresentado o instrumento de procuração pelo apelante, deve o Magistrado-relator marcar prazo razoável para que seja a falta su­prida. Se não cumpre a obrigação, então, não precisa sequer ser sub­metido o apelo à apreciação do Ór­gão Colegiado. Neste caso, deve ° Relator, de pronto, inadmíti-Io, sim­plesmente, já que o recebimento recurso não víncula o Tribunal quem (RE n f2 85.516/SP - DJ de 11.11.70). Esta é a correta exegese

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.

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que se extrai do art. 13, do Código de Processo Civil.

Aqui a hipótese é outra.

Ao contrário do que entendera o Aresto, tenho que a irregularidade da representação postulatória foi sanada com a oferta do instrumen­to de mandato no ato da interposi­ção do apelo, não obstante intima­do o advogado da parte apelante pelo Dr. Juiz singular para esse fim; este fato, por si só, não tem o con­dão de invalidar o ato, porque tal intimação não foi efetuada pessoal­mente ao representante da empre­sa-ré.

Tal como anotou o em. Ministro Athos Carneiro, ao proferir voto-vis­ta nos Embargos de Divergência supracitado:

"O que a tradução literal do art. 37 do CPC está conduzindo, em última análise, é uma autên­tica transformação do advogado em substituto processual das par­tes - e não em seu mero manda­tário. Aquelas é que são os sujei­tos de relação jurídica processual, por óbvio. E, por óbvio também, elas é que têm de pronunciar-se se o advogado, que se apresenta como defensor delas, foi por elas realmente constituído como tal. Daí a intimação dever ser dirigida a elas - que ratificam ou não um mandato, até então meramente subentendido, e que a partir daí passa a ser corporifi­cado através do instrumento. Não propiciar às partes a decisão a respeito de seu patrono agride ao próprio princípio constitucional de ampla defesa.

"Ademais, é de se perguntar­ante o princípio teleológico do cui prodest?"

A quem aproveitaria anular-se uma demanda judicial, facilmen­te emendável? Ao Estado-Juiz, perpetuando-se os litígios que perturbam as relações sociais?l Aos próprios litigantes, que no­vamente teriam de reiniciar tudo de novo, por causa de uma mera nuga processual?

Daí, a compreensível exproba­ção da Suprema Corte, ao acolher o RE 82.932/MA (RTJ 86/853), contra a que chama de fetichismo das formas; tanto mais quanto

"O Código de Processo Civil..., infenso ao fetichismo formal, ad­mitindo o suprimento ou repeti­ção dos atos defeituosos, ainda que cominada pena de nulidade, se não há prejuízo para as par­tes ... "

De concluir-se, pois, que o digno Relator não poderia ter negado pro­vimento ao apelo, posto que, em hi­póteses tais, a regularização de nu­lidades sanáveis, o suprimento des­tas haverá de ser feito onde prati­cado o ato; procedimento este que nenhum prejúízo acarreta à parte adversa.

De ressaltar, ainda, que o deman­dante não deve responder por even­tuais erros procedimentais de seu advogado; como no caso versante, ao deixar de sanar no momento opor­tuno, a nulidade constatada.

Não tenho como válida a asserti­va posta no Aresto de que a intima-

192 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.

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ção deve ser dirigida à pessoa do patrono da parte.

Ao contrário, neste caso, a inti­mação deve ser dirigida às partes que, na verdade, são sujeitos da re­lação jurídica processual; e não ao advogado, que é mero mandatário. A elas cabe o direito de pronunciar­se se o advogado, que se apresenta como seu defensor, foi, realmente, por elas constituído como tal. Daí porque reafirma-se, deve a intima­ção ser dirigida a elas, que ratifi­cam ou não um mandato, até então meramente subentendido, e que a partir desse ato se corporifica ou se consolida através do instrumento. Não propiciando às partes o direito de manifestar-se no pertinente à pessoa de seu patrono, constitui

ofensa ao princípio constitucional de ampla defesa (REsp nº 52.904-21RS - DJ de 06102195).

Tenho, pois, por comprovado o dissídio com o REsp 9.223-61 SP -ReI. Min. Costa Leite (fls. 201) e que o Aresto, ao decidir como o fez, vio­lou a norma inscrita no art. 37, do CPC, discrepando da orientação se­dimentada na jurisprudência da Corte.

Ante o exposto, conheço do recur­so e dou-lhe provimento para, cas­sado o Acórdão recorrido e a senten­ça que decretou a revelia do réu, aplicando o direito à espécie e su­prida que está a representação, de­terminar que a ação prossiga, como de direito.

É o meu voto.

RECURSO ESPECIAL Nº 135.633 - RJ

(Registro nº 97.0040113-8)

Relator: O Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito

Recorrente: Viação Aérea São Paulo SI A - VASP

Recorridos: Fábio Pereira Nunes Medeiros - menor impúbere e outro

Representado por: José América Cabral Medeiros

Interessada: Companhia de Seguros do Estado de São Paulo - COSESP

Advogados: Drs. Ana Lúcia Barbetti e outros, e Mauro Attílio Mellone e outros

EMENTA: Acidente aéreo. Indenização tarifada. Regimejuridi­co anterior. Culpa grave. Constituição de capital. Precedentes da Corte.

1. Considerando o quadro que suportou a identificação da culpa grave, não há como buscar interpretação divergente daquela aco-

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 193

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lhida pela Corte Especial em precedente que contemplou a exce­ção ao sistema da indenização tarifada diante do dolo genérico, incluindo, pois, o dolo eventual.

2. Não há razão suficiente para a constituição de capital, ademais da inclusão dos beneficiários na folha de pagamento, quando a questão da solvabilidade da devedora não foi considerada pelo Acórdão recorrido.

3. Recurso especial conhecido e provido, em parte.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, acordam os Senhores Mi­nistros da Terceira Turma do Supe­rior Tribunal de Justiça, na confor­midade dos votos e das notas taqui­gráficas a seguir, por unanimidade, conhecer em parte do recurso espe­cial e, nesta parte, dar-lhe provi­mento. Participaram do julgamen­to os Senhores Ministros Costa Lei­te, Nilson Naves e Eduardo Ribei­ro. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Waldemar Zveiter.

Brasília, 16 de abril de 1998 (data do julgamento).

Ministro COSTA LEITE, Presi­dente. Ministro CARLOS ALBER­TO MENEZES DIREITO, Relator.

Publicado no DJ de 08-06-98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO CARLOS AL­BERTO MENEZES DIREITO: Tra­ta-se de recurso especial interposto por Viação Aérea São Paulo S/A­VASP, com fundamento nas alíneas a e c do permissivo constitucional, contra Acórdão proferido pela 8ª Câ-

mara do Tribunal de Alçada Cível do Estado do Rio de Janeiro, cuj a ementa é a seguinte:

"Responsabilidade civil.

Acidente aeronáutico.

Indenização de direito comum pleiteada pelos filhos menores da vítima.

Falecimento de Comissária de Bordo, juntamente com todos os ocupantes da aeronave, em aci­dente ocorrido na Serra de Ara­tanha, Estado do Ceará.

Competência do Tribunal de Al­çada fixada pelo Egrégio Tribu­nal de Justiça.

A indenização de direito comum não está excluída do âmbito do di­reito aeronáutico, a exemplo do que ocorre nas hipóteses de aci­dente do trabalho (Súmula do STF, Verbete n Q 229).

Evidenciando a prova dos autos que o acidente decorreu de culpa grave dos prepostos da empresa aérea, a indenização deve ser am­pla, não incidindo os limites pre­vistos na legislação especial.

Provimento parcial do recurso da empresa aérea (VASP), para re-

194 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.

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duzir o pensionamento a 2/3 da remuneração da vítima; bem co­mo para determinar que os hono­rários advocatícios incidam sobre o montante das prestações ven­cidas e uma anuidade das vincen­das.

Desprovimento dos recursos da Seguradora (COSESP) e do Ins­tituto de Resseguros do Brasil­IRB." (fls. 56)

Sustenta a recorrente que oAcór­dão recorrido contrariou os artigos 103, 106, 150, 248 e 257 do Decre­to-Lei nº 32/66 (Código Brasileiro do Ar) e os artigos 20, § 5º, 602 e 620 do Código de Processo Civil, na me­dida em que, equiparando a culpa grave ao dolo, deixou de aplicar a lei especial e determinou que a questão fosse apreciada à luz do Direito comum, afastando, assim, o limite da indenização, bem como o prazo decadencial para o ajuiza­mento da ação. Alega, também, que como empresa solvente, é dispensá­vel a constituição de capital, sendo cabível optar por uma garantia me­nos gravosa. Sustenta, ainda, que deve ser aplicado à hipótese, o De­creto-Lei nº 32/66 (Código Brasilei­ro do Ar), legislação vigente à épo­ca do fato, em obediência ao princí­pio da irretroatividade da lei. Indi­ca arestos desta Corte e de outros Tribunais para comprovar a diver­gência jurisprudencial.

Houve contra-razões e o recurso especial não foi admitido, subindo os autos a este Tribunal em razão de provimento dado a agravo de ins­trumento, em despacho de minha lavra.

Nesta instância, oficiou a ilustra­da Subprocuradoria Geral da Repú­blica no sentido do não-conhecimen­to do recurso.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO CARLOS AL­BERTO MENEZES DIREITO (Re­lator): Menores impúberes repre­sentados pelo pai ajuizaram ação de responsabilidade civil contra a em­presa recorrente em decorrência do falecimento de sua mãe em aciden­te aéreo, sendo ela comissária de bordo. A sentença julgou proceden­te o pedido para condenar a ré "a pagar aos autores pensões vencidas desde a data do acidente, com base na remuneração da vítima, corrigi­da monetariamente e acrescida de juros de 1% ao mês, desde a data do evento até o limite da sobrevida pro­vável da vítima, fixado em 65 anos. Julgou, ainda, procedente a denun­ciação para condenar a seguradora a ressarcir a ré nos limites da apó­lice de seguro. O recurso de apela­ção da empresa foi provido pelo Tri­bunal de Alçada Cível do Rio de J a­neiro, para reduzir o valor do pen­sionamento a 2/3 da remuneração da vítima, bem como para determi­nar que os honorários advocatícios incidam sobre o montante das pres­tações vencidas e uma anuidade das vincendas.

O que o especial questiona, basi­camente, é a aplicação do Decreto­Lei nº 32/66, em vigor à época, ou sej a, a indenização tarifada para os casos de danos decorrentes de aci-

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 195

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dentes aéreos, presente o prazo de­cadencial de dois anos, que foi ul­trapassado pelos recorridos. Escla­rece o especial que o julgado recor­rido considerou a culpa grave dos prepostos para afastar a incidência da lei especial. Cuida, ainda, da decadência e da constituição de ca­pital.

A questão da decadência deve ser, desde logo, afastada porque não de­safiada no Acórdão recorrido, bal­dio, portanto, de prequestionamen­to.

A questão da equiparação da cul­pa grave ao dolo para efeito da não aplicação da indenização tarifada tem sido examinada já pela Corte.

O Tribunal de origem considerou a culpa grave presente diante da prova dos autos, assim relatório do Ministério da Aeronáutica, por seu órgão especializado, que afirmou ter o Comandante, durante a descida, se desligado "de outros impulsos sensoriais, tais como observação da distância e da altitude (Fator Hu­mano)" e, ainda, pelo planejamento deficiente da descida, pela ausência de "observância das regras de trá­fego aéreo (não cumprimento das instruções do controle, não obser­vância da altitude mínima de segu­rança e não manutenção da veloci­dade prevista para vôo em terminal abaixo de 10.000 pés)", com o que restou configurado "grave indisci­plina de vôo", ademais de ter havi­do "falta de disciplina na cabine" e ausência de "cumprimento das nor­mas operacionais da empresa".

Em recentíssimo precedente, pos­terior ao precedente da Corte Es-

pecial que admitiu que o "art. 106 do Decreto-Lei n Q 32, de 1966, con­templa como exceção ao regime da indenização tarifada o dolo genéri­co, incluindo, pois, o dolo eventual" (Embargos de Divergência n Q 6.052-SP, Relator designado o Senhor Mi­nistro Pádua Ribeiro), decidiu esta Corte, Relator o Senhor Ministro Eduardo Ribeiro que a culpa grave só poderá ser equiparada ao dolo "quando reveladora de descaso fla­grante, de absoluto desprezo pela segurança. Como tal não se pode entender a equivocada avaliação, pelo piloto, das condições que ense­j ariam o pouso com recursos apenas visuais" (REsp n Q 23.815-RJ, DJ de 14/04/97). Neste julgamento, acom­panhado por mim e pelo Senhor Ministro Costa Leite, o qual desta­cou que o caso "se distingue daque­le que foi apreciado pela Corte Es­pecial", afirmei em voto-vista que "não seria possível pôr o comporta­mento do piloto que avaliou prefe­rível o vôo visual, naquela espécie de tutela que alcança o ato cuja rea­lização danosa o agente, conscien­temente, se arriscou produzir", com o que "não seria possível a indeni­zação pelo direito comum, na medi­da em que as instâncias ordinárias não concluíram, claramente, pela existência de dolo, mesmo eventual, na linha de precedentes desta Tur­ma e da Corte Especial".

Ora, neste caso, a avaliação é bem diversa. O Tribunal de origem constatou a falta grave pelo desca­so na observância das regras de trá­fego aéreo, pelo descumprimento das instruções do controle, pela gra-

196 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.

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ve indisciplina de vôo, pela falta de disciplina na cabine, pelo não cum­primento das normas operacionais. Esta circunstância peculiar ao caso sob julgamento não autoriza, a meu juízo, o dissenso com o critério da equiparação estabelecido pela Cor­te Especial, interpretando a regra própria da lei de regência vigente ao tempo do acidente.

Dessa maneira, a argumentação da empresa recorrente, neste par­ticular, não tem substância para suscitar dissenso do precedente da Corte Especial.

Todavia, razão tem a recorrente no que se refere à constituição de capital, na linha de entendimento desta Corte. Para o Tribunal de ori­gem, a constituição não merece

afastada porque a inclusão dos be­neficiários do pensionamento na fo­lha de pagamento da empresa "cons­titui forma de pagamento e, não ga­rantia deste". Esta Corte tem enten­dido ser suficiente a inclusão dos beneficiários na folha de pagamen­to, na forma de diversos preceden­tes, alguns indicados no especial.

De fato, não havendo, a meu juí­zo, qualquer indicação no Acórdão recorrido quanto à solvabilidade da empresa, a inclusão na folha de pa­gamento revela-se suficiente para o cumprimento da obrigação impos­ta.

Destarte, eu conheço do especial em parte, e nessa parte dou-lhe pro­vimento para afastar a constituição de capital.

RECURSO ESPECIAL NQ 141.559 - RJ

(Registro n Q 97.0051677-6)

Relator: O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro

Recorrente: Zein Comércio e Construções Ltda. Recorridos: Abram Lejb Finkielsztejn e outros

Advogados: Drs. Carlos Mário da Silva Velloso Filho e outros, e Ulisses Riedel de Resende e outros

Sustentação Oral: Dr. Carlos Mário da Silva Velloso Filho, pela recor­rente

EMENTA: Obrigação de fazer. Execução. Multa. Limite.

Ao contrário do Código de 39, a lei vigente não estabelece limi­tação para o valor da multa cominada na sentença que tem o ob­jetivo de induzir ao cumprimento da obrigação e não o de ressar­cir. Nem se justifica tolerância com o devedor recalcitrante que, podendo fazê-lo, se abstém de cumprir a sentença. Impossibilida­de de cumprimento de que não se cogitou.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 197

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ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, acordam os Srs. Ministros da Terceira Turma do Superior Tri­bunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não co­nhecer do recurso especiaL

Participaram do julgamento os Srs. Ministros Waldemar Zveiter, Menezes Direito, Costa Leite e Nil­son Naves.

Brasília, 17 de março de 1998 (data do julgamento).

Ministro COSTA LEITE, Presi­dente. Ministro EDUARDO RIBEI­RO, Relator.

Publicado no DJ de 17 -08-98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: A egrégia Quarta Câma­ra Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, julgando apelação interposta por Zein Co­mércio e Construções Ltda., no pro­cesso em que litiga com Abram Lejb Finkielsztejn e outros, proferiu acór­dão assim ementado:

"Multa para coagir a fazer. Ale­gação de que supera o valor da obrigação principal. Falta de in­dicação deste valor, não compro­vado. Se o recurso pretende limi­tar o valor da multa ao da obri­gação principal, deve, para obtê­lo, indicar tal valor. Apelo despro­vido."

A apelante formulou pedido de declaração. Rejeitado, interpôs re­curso especial.

Pretende que vulnerado o artigo 920 do Código Civil, por ter o ares­to impugnado entendido que inviá­vel, na hipótese, limitar-se o valor da multa cominatória diária ao da obrigação principal, ponto sobre o qual afirmou existir dissídio. Arro­lou julgados.

Recurso admitido e processado_

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO (Relator): Observo, de iní­cio, parecer-me certo que o acórdão se desviou do tema que lhe era sub­metido. É que, em primeiro grau, li­mitou-se o Juiz a ter como inadmis­síveis os embargos, salientando não ser possível apresentar novos a cada penhora que se fizesse. Ocorre, en­tretanto, que essa questão não foi versada no especial, escapando, por conseguinte, ao exame deste Tribu­nal.

O tema a ser decidido diz com a existência ou não de limite para a multa, imposta em sentença, ten­dente a induzir o réu ao cumpri­mento de obrigação de fazer. Mais especificamente, se incide o dispos­to no artigo 920 do Código CiviL

N o direito anterior havia dispo­sitivo expresso, estabelecendo um teto. Assim é que o Código de 39 dis­punha, em seu artigo 1.005, que a cominação pecuniária não excede­ria o valor da prestação. Não se aco-

198 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.

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lheu norma análoga na lei proces­sual em vigor. Há de entender-se que se optou pelo sistema adotado em ordenamentos europeus, em que para as astreintes não se prevêem lindes, sendo exigíveis enquanto não se verificar o adimplemento.

Deve-se n:Jtar que o devedor in­corre na cláusula penal, a que se refere a disposição do Código Civil, desde que verificada a mora, en­quanto que a multa de que se cogi­ta só incide, uma vez decorrido o prazo, fixado pelo juiz, para o cum­primento da obrigação. Aqui se tra­ta de desobediência de ordem judi­cial.

A doutrina mais autorizada tem­se orientado no sentido de reconhe­cer que, no Código de 73, não sub­siste o limite. E isso se justifica dado o objetivo de forçar o adimplemen­to e não o de ressarcir.

A jurisprudência desta Terceira Turma perfilha o mesmo entendi­mento, como se verifica dos julga­mentos proferidos nos Recursos Es­peciais 8.065 e 43.389.

O dissídio não está demonstrado. O acórdão do Supremo Tribunal Fe­deral, embora mencionando o arti­go 920 do Código Civil, teve em con­ta a lei processual anterior a 73 onde, como salientado, norma ex­pressa determinava limitação. Tam­bém não há divergência com o jul­gado relativo ao REsp 13.416, de que relator o Ministro Sálvio de Fi­gueiredo. Ali, é certo, afirmou-se que aplicáveis os princípios que nor­teiam os artigos 920 e 924. Trata­va-se de hipótese, entretanto, em que inviabilizada a execução espe­cífica, havendo de converter-se em perdas e danos.

Essa última circunstância é de relevo. Se a prestação é possível e o devedor abstém-se de adimpli-la, está-se diante de recalcitrância e a multa será indefinidamente exigível. Coisa diversa sucederá quando se patenteie sua inviabilidade. Em tal caso, poder-se-á cogitar da conver­são em perdas e danos, pena de ter­se o absurdo de o devedor ver-se obri­gado perpetuamente ao pagamento de multa, sem que lhe seja possível evitá-lo. Trata-se aqui de questão de fato de que o acórdão não cuidou.

Uma última observação. Conso­ante o direito vigente, possível ao juiz, na execução, alterar o valor da multa. Também quanto a isso, entretanto, silentes acórdão e re­curso.

Não conheço do especial.

VOTO

O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER: Sr. Presidente, no caso referido que julgamos recentemen­te, fiquei vencido, compreendendo que ali se cuidava de pena imposta pelo descumprimento. Não vejo, também, outra forma, a não ser acompanhar o Ministro-Relator, inobstante a sustentação, como sem­pre erudita, feita da tribuna. Mas, tenho até que S. Exa. foi um pouco além, já indicou dois caminhos di­zendo que na execução é possível o Juiz rever essa parte e comprovar a existência desse obstáculo para o cumprimento, e não apenas uma desobediência a uma determinação judicial.

Acompanho o eminente Relator.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 199

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RECURSO ESPECIAL NQ 149.102 - RS

(Registro n Q 97.0066367-1)

Relator: O Sr. Ministro Nilson Naves

Recorrente: Banco do Brasil S/A

Recorrido: Silvestre da Silva Cavalheiro

Advogados: Drs. Eliezer de Oliveira Felinto Melo e outros, e Cassemiro Luiz Antonioli

EMENTA: Depositário infiel. Prisão. Pode a prisão ser decreta­da no próprio processo em que se constituiu o encargo, indepen­dentemente da propositura de ação de depósito (Súmula 619/STF). Recurso especial conhecido e provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribu­nal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a se­guir, por unanimidade, conhecer do recurso especial e lhe dar provimen­to, nos termos do voto do Sr. Minis­tro-Relator. Participaram do julga­mento os Srs. Ministros Eduardo Ribeiro, Waldemar Zveiter e Mene­zes Direito. Ausente, justificada­mente, o Sr. Ministro Costa Leite.

Brasília, 17 de fevereiro de 1998 (data do julgamento).

Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Presidente. Ministro NILSON NAVES, Relator.

Publicado no DJ de 01-06-98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO NILSON NA­VES: Em petição que lhe endereçou

o Banco do Brasil S.A., despachou assim o juiz:

"Embora o e. STF tenha edita­do a Súmula 619, que permite seja decretada a prisão nos pró­prios autos da execução, filio-me à doutrina esposada pelo Des. Adroaldo Fabrício, que exige o devido processo legal, nos termos do CPC, mais de acordo com as disposições constitucionais. Por­tanto, intime-se para que ajuíze a pertinente ação de depósito."

Ao agravo de instrumento o Tri­bunal de Alçada negou provimento, verbis:

"2. A inconformidade é com a decisão entendendo que a prisão civil, do depositário infiel, não prescinde da ação de depósito, não cabendo decretada nos pró­prios autos da execução.

A questão é conhecida, sabida­mente dividindo opiniões. A po-

200 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.

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sição sustentada pelo agravante encontra respaldo, resultando inclusive sumulada pelo Excelso Pretório, ao tempo em que lhe es­tava afeto o julgamento de maté­ria infraconstitucional (Verbete 619). Não menos ponderosa, to­davia, é a corrente na linha de pensamento do magistrado, en­contrando apoiamento em abali­zada doutrina e consagradajuris­prudência. E que in casu melhor fica, inclusive, com a moderna orientação restritiva da prisão civil, limitação elevada à hierar­quia constitucional (CF, art. 5º, LXVII).

Com efeito, a prisão do depo­sitário infiel, como rara exceção, pode aceitar-se como legitimada quando assegurada a mais ampla defesa. E isso não há de ocorrer sumariamente, sem ser permiti­da a entrega da coisa (ou o equi­valente em dinheiro) ou oferecer contestação, levando à decisão na forma do art. 904 do CPC.

Nestes termos, nega-se provi­mento ao recurso."

o acórdão de fls. 73/75 rejeitou os embargos de declaração, daí o presente recurso especial, que foi admitido pelo despacho de fls. 117/ 9, em resumo:

"Alega o recorrente que o acór­dão guerreado negou vigência aos artigos 2º, 515, 535, 600, inciso I e 904, todos do Código de Proces­so Civil, além de divergir da Sú­mula 619 do Supremo Tribunal Federal e da jurisprudência de outros tribunais."

"N o que tange ao artigo 904 do CPC, reconheço que a matéria é polêmica, inclusive neste Tribu­nal. Contudo, a adoção de uma das correntes, diante da existên­cia de posições conflitantes, não implica negativa de vigência à lei, conforme orientação do Mi­nistro Luiz Gallotti nos Recursos Extraordinários nllS. 75.914-PR (RTJ 65/296) e 68.506-SP (RTJ 54/60).

Quanto ao dissídio, imperioso reconhecer que a decisão recor­rida lavra divergência com a Sú­mula 619 do Supremo Tribunal Federal e com os paradigmas de fls. 102.

Diante do exposto, admito o re­curso pela alínea c do permissi­vo constitucional."

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO NILSON NA­VES (Relator): Na petição a que me referi no relatório, pediu ao juiz o Banco do Brasil S.A. que, "restan­do incontroversa a infidelidade do depósito judicial, requer o Credor, se digne Vossa Excelência de, forte no art. 904 e seu parágrafo único, do Código de Processo Civil, deter­minar a intimação do Executado­Devedor para que entregue todos os bens penhorados no prazo de 24 h (vinte e quatro horas), ou o seu equi­valente em dinheiro, sob pena de ser-lhe decretada a prisão por de-

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 201

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positário infiel." Entendeu, todavia, o magistrado, que era necessária a ação de depósito, malgrado a Súmu­la 619/STF, segundo a qual "A pri­são do depositário judicial pode ser decretada no próprio processo em que se constituiu o encargo, inde­pendentemente da propositura de ação de depósito."

Na 3ª Turma, j á se decidiu assim, com o meu voto de adesão, segundo a ementa escrita pelo Sr. Ministro Dias Trindade: "Civil. Prisão de de­positário infiel. Decreto inoportuno. A prisão civil de depositário infiel somente pode ser decretada após julgada procedente a ação de depó­sito" (DJ de 06.04.92). Na 5ª Tur­ma, ao contrário da 3ª, decidiu-se assim, segundo a ementa escrita pelo Sr. Ministro Costa Lima: "Pri­são Civil. Depositário judicial. Bens não encontrados. Proposta de pagar o equivalente em dinheiro. Ilegali­dade. 1. Pacificada a jurisprudên­cia no sentido de que a prisão do depositário dispensa a instauração da ação de depósito, podendo ser efetivada no próprio processo exe­cutivo (STF, Súmula-619). 2. Se o depositário judicial, intimado para apresentar os bens que lhe foram confiados, comparece ajuízo e afir­ma que está impossibilitado de fazê­lo depois que o Oficial de Justiça certificou não os haver encontrado, propondo-se a depositar o equiva­lente em dinheiro, a sua prisão en­contra obstáculo na Constituição.

3. As disposições do Código de Pro­cesso Civil- artigos 902, I e 904-não devem limitar-se apenas aos casos em que fique comprovado que está impossibilitado de fazê-lo em decorrência do perecimento do bem. 4. Recurso provido" (DJ de 18.10.93).

Aqui na 3ª Turma, recentemente acompanhei voto do Sr. Ministro Menezes Direito, conforme o qual "A prisão do depositário infiel pode ser decretada no próprio processo em que se constituiu o encargo, como consolidado na Súmula n Q 619-STF". Nesse caso, todavia, o recur­so acabou não sendo conhecido, de acordo com o voto do Sr. Ministro Eduardo Ribeiro, que para o acór­dão escreveu a seguinte ementa: "Recurso especial. Razão de decidir não enfrentada no recurso. Inviabi­lidade desse" (DJ de 27.10.97).

N o caso em exame, a questão foi enfrentada. É certo que há, no acór­dão, referência ao texto constitucio­nal, parece-me, contudo, que se cui­da de questão infraconstitucional, tendo a ver com o Cód. de Pro Civil. O dissídio indicado diz respeito à Súmula 619/STF, e está comprova­do, daí que do recurso conheço.

Conhecendo do recurso, dou-lhe provimento, à vista do princípio inserto na Súmula 619/STF (ver REsp-48.195, DJ de 27.10.97), para afastar o fundamento apresentado pela instância ordinária.

202 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.

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RECURSO ESPECIAL NQ 150.467 - RJ

(Registro n Q 97.0070883-7)

Relator: O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro

Recorrentes: Omar dos Santos Carvalho e outro

Recorrida: MB Bioquímica Ltda.

Advogados: Drs. Flávio Antônio Carneiro Carvalho e outros, e Sebastião Alves dos Reis Júnior e outros

Sustentação Oral: Dr. Hildebrando Pontes Neto, pelos recorrentes

EMENTA: Direitos autorais. Utilização, não autorizada, de traba­lho científico, na divulgação de produto. Indenização. Arbitramento.

O ressarcimento devido ao autor haverá de superar o que seria normalmente cobrado pela publicação consentida. A ser de modo diverso, sua aquiescência seria, na prática, dispensável. Cumpre, ao contrário, desestimular o comportamento reprovável de quem se apropria indevidamente da obra alheia.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos vo­tos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer em par­te do recurso especial e, nesta parte, dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator.

Participaram do julgamento os Srs. Ministros Waldemar Zveiter, Menezes Direito, Costa Leite e Nil­son Naves.

Brasília, 11 de novembro de 1997 (data do julgamento).

Ministro COSTA LEITE, Presi­dente. Ministro EDUARDO RIBEI­RO, Relator.

Publicado no DJ de 24-08-98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: Trata-se de liquidação de sentença, em ação movida por Omar dos Santos Carvalho e José Soares dos Santos, condenada Boehringer Mannhein Bioquímica S/A ao paga­mento de indenização, pela utiliza­ção não autorizada de trabalho dos autores.

Decidiu o aresto recorrido que pela "publicação de artigo científi­co não é admissível que a indeniza­ção devida seja estimada no valor das vendas do produto ao qual o alu­dido artigo haja sido utilizado como propaganda. A indenização há de ser arbitrada com bom senso e co­metimento, tal como fez o decisum apelado, com suporte na prova téc­nica".

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 203

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A parte relativa ao dano moral foi tomada por maioria de votos, ven­cido o relator, que provia o recurso, parcialmente, para acolher o pedi­do quanto ao ponto. Embargos in­fringentes providos.

Os autores interpuseram recur­so especial da parte unânime do acórdão, sustentando negativa de vigência do art. 458, IIl, c/c o art. 165 do Código de Processo Civil e 122 da Lei 5.988/73, além de apon­tar dissídio de jurisprudência. Afir­mam que se deixou de apreciar ma­téria deduzida no processo, omissão essa já apontada nos embargos de declaração. Acrescentam que, caso assim não se entenda, o acórdão, ao eleger outro critério para a fixação do quantum indenizatório, que não aquele estabelecido na Lei 5.988/73 (art. 122), deixou de aplicar o crité­rio legal específico. Asseveram que a violação fraudulenta de direito autoral não pode ter a mesma con­seqüência da utilização de obra re­gularmente contratada. Invocam julgados que teriam consagrado en­tendimento diverso do acolhido no acórdão.

Não admitido o recurso, provi agravo, convertendo-o em especial.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO (Relator): Trabalho cien­tífico de cuja elaboração participa­ram os recorrentes foi utilizado na divulgação de produto da recorrida. Isso se fez sem que precedesse au-

torização dos autores. Daí a proce­dência do pedido de ressarcimento de danos, cuidando-se agora de li­quidar o valor da condenação.

Sustenta-se, no recurso, nulida­de da sentença, por infringir o arti­go 458 do Código de Processo Civil, evidente o erro datilográfico, cons­tante da petição, ao grafar artigo 450. Norma nele contida teria sido desconsiderada, ao não se examinar a questão, tendo em conta o artigo 122 da Lei 5.988/73.

Entendo que não houve a apon­tada infração da lei. A sentença, em­bora não se referindo diretamente ao dispositivo, não deixou de exa­minar o tema nele regulado, ao afir­mar que a utilização da obra, em informe publicitário, "não autoriza os autores a participar nos resulta­dos de sua comercialização", como se fossem sócios, sem assumir os riscos do negócio. Esse mesmo foi o entendimento do acórdão, como se verifica da cópia de fls. 61162.

Não há, também, como acolher a pretensão dos recorrentes nos ter­mos amplos em que formulada. O invocado artigo 122 prevê, para o caso de imprimir-se obra, sem per­missão do autor, a perda, em bene­fício desse, dos exemplares apreen­didos e o pagamento dos demais pelo preço da venda ou da avalia­ção. No caso, a publicação prestou­se à divulgação de um certo produ­to. A incidência daquela norma ja­mais poderia levar à perda do valor correspondente à comercialização desse. Não se trata aqui de edição de trabalho que tem, por si mesmo, valor comercial.

204 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.

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Considero, entretanto, que pas­sível o recurso de conhecimento, em parte, pelo dissídio.

A sentença aceitou o arbitramen­to proposto pelo perito, que se fun­dou na remuneração que seria per­cebida pelos autores, durante o pe­ríodo em que, segundo a inicial, se dedicaram às pesquisas de que re­sultou o trabalho. O julgamento foi confirmado em segundo grau. Vê-se, pois, que se elegeu entendimento que faz corresponder a indenização, em caso de publicação não autoriza­da, ao que seria normalmente devi­do ao autor. Ora, no REsp 23.746, de que foi relator o Ministro Sálvio de Figueiredo (DJ 02.10.95), consagrou­se outra orientação, traduzida na opinião de Carlos Alberto Bittar, invocada naquele julgamento, e que reproduzo:

" ... deve-se estipular, como in­denização, importância bem su­perior ao valor normal do merca­do para contratação regular, em função do caráter sancionatório de que se reveste a teoria da res­ponsabilidade civil, sob pena de consagrar-se, judicialmente, a prática lesiva, estimulando os usuários a dispensar o prévio contato com o titular para a ob­tenção de sua anuência e a dis­cussão do quantum a pagar."

Essa efetivamente é a melhor doutrina. A ser de modo diverso, não se precisaria mais do consentimen­to do autor para publicação de suas obras. Negado aquele, far-se-ia es­sa, não obstante, e o pagamento se-

ria o mesmo que se houvesse aquies­cência. Na vigência dos dispositivos do Código Civil pertinentes à ma­téria, já se pronunciara o Supremo Tribunal Federal, em acórdão de que relator Victor Nunes Leal, cita­do no especial, acentuando que o ato vedado não pode ter a mesma con­seqüência do permitido (RTJ 38/ 271).

Conheço em parte do recurso e dou-lhe provimento para aumentar em cem por cento a condenação, pe­los danos patrimoniais, passando a indenização para cento e quarenta e quatro salários mínimos, sem pre­juízo da parcela incluída no julga­mento dos embargos infringentes.

VOTO

O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER: Sr. Presidente, quando o nobre Advogado estava fazendo sua sustentação da tribuna, vi-me em dificuldade por também não encon­trar na espécie forma de violação a esse art. 122. Este, parece-me mais adequado para a publicação desau­torizada de trabalho científico, mas que se faça com a edição de exem­plares. Aqui houve uso indevido do trabalho científico que serviu à co­mercialização desses produtos sem a autorização dos autores.

Estou tranqüilo porque vejo que o eminente Ministro Eduardo Ribei­ro traz um precedente da nossa Se­ção, da relatoria do eminente Minis­tro Sálvio de Figueiredo, e dessa forma, pode-se conhecer do recurso pelo dissídio, pela letra c e não pela letra a. Nesse sentido parece-me

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (UI): 151-206, novembro 1998. 205

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também apropriada a forma escolhi­da pelo eminente Ministro-Relator para exacerbar a quantificação que, posta como foi, descaracteriza o as­pecto sansionatório que deve ter o princípio.

Acompanho o eminente Ministro­Relator nessa parte em que dobra a indenização pelo dano material, por não podermos ir além desse enten­dimento.

É como voto.

VOTO

O SR. MINISTRO CARLOS AL­BERTO MENEZES DIREITO: Se­nhor Presidente, também não tenho dúvida nenhuma sobre a impossi­bilidade de buscarmos a incidência do art. 122, do Código Civil. A des­tinação do referido artigo e seu pa­rágrafo único é específica para o caso de livros. Tenho muita dificul­dade de enfrentar a alteração do va­lor da indenização, mas o Senhor

Ministro Eduardo Ribeiro, como sempre, com lucidez, ultrapassou a barreira do conhecimento pela alí­nea c, com o critério, tecnicamente imbatível, que é o precedente ter admitido que o dano, nestes casos, não deve corresponder exatamente ao valor da contratação de mercado e sim avançar um pouco mais para que seja explicitada a qualificação indenizatória. Esse foi o sentido do precedente, de resto lastreado, apoia­do, fincado, na doutrina brasileira, de que é uma de suas excelentes ex­pressões o Professor Carlos Alber­to Bitar.

Quero crer que este veio aponta­do pelo Ministro Eduardo Ribeiro, autoriza, sem violentar nossajuris­prudência, que faz oel usão de co­nhecimento para que se examine o laudo pericial, o conhecimento des­te recurso e o seu respectivo provi­mento para que se defira a qualifi­cação indenizatória que não foi le­vada na devida conta pelo julgado recorrido.

206 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.