JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA...Civil, não se encontra a certidão de publicação do acórdão...
Transcript of JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA...Civil, não se encontra a certidão de publicação do acórdão...
JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 165.165 - SP
(Registro nº 97.0077273-0)
Relator: O Sr. Ministro Nilson Naves
Agravante: Regina Célia Sarsano Ferreira
Agravado: O R. Despacho de fi. 122
Partes: Regina Célia Sarsano Ferreira e Notícias Populares S/A
Advogados: Drs. Nilo José Mingrone, Willians Duarte de Moura e ou-tros, e Taís Borja Gasparian e outros
EMENTA: Agravo de instrumento contra decisão denegatória de recurso especial. Instrução (peças de apresentação obrigatória). Certidão de publicação do acórdão. Decidiu a Corte Especial do STJ que a certidão de publicação do acórdão contra o qual interposto o especial (isto é, a certidão de intimação do acórdão recorrido) é peça de apresentação obrigatória. Votos vencidos (inclusive o deste Relator). Anteriores precedentes das Turmas componentes das li! e 3i! Seções. Jurisprudência que se consolidou. inclusive na 2i! Seção (opinião ressalvada). Agravo regimental desprovido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por maioria, negar provimento ao agravo regimental. Vencido o Sr. Ministro Eduardo Ribeiro. Participaram do julgamento os Srs.
Ministros Eduardo Ribeiro, Waldemar Zveiter e Menezes Direito. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Costa Leite.
Brasília, 10 de março de 1998 (data do julgamento).
Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Presidente. Ministro NILSON NAVES, Relator.
Publicado no DJ de 04-05-98.
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 153
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO NILSON NAVES: Diante do agravo regimental interposto, submeto à consideração da Turma o seguinte despacho:
"Não consta dos autos cópia da certidão de intimação do acórdão recorrido. O meu entendimento sempre foi o de que tal não se trata de peça essencial à plena compreensão da controvérsia (Súmula 288/STF e art. 544 e §§ do cód. de Pro Civil). Nesse sentido, tornei-me relator para acórdão de caso levado à consideração da 3ª Turma (AgRg no Ag-113.279, DJ 22.4.97).
Acontece, porém, que o assunto foi à Corte Especial, e lá se decidiu, por maioria de votos, 'ser indispensável para instrução do agravo de instrumento contra decisão denegatória de recurso especial ajuntada de certidão de intimação do acórdão recorrido' (Questão de Ordem no Agravo de Instrumento n Q 153.273, sessão de 5.11.97). Fiquei vencido, mas devo daqui em diante obediência ao que ficou decidido na Corte Especial.
Destarte, do presente agravo de instrumento não conheço."
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO NILSON NAVES (Relator): Para o Agravo Regi-
mental no Agravo de Instrumento n Q 113.279, julgado pela 3ª Turma, em 17.9.96, escrevi a seguinte ementa: "Agravo de instrumento contra decisão denegatória de recurso especial. Peças de apresentação obrigatória. Entre elas, segundo a dicção do art. 544, § 1Q
, do Cód. de Pro Civil, não se encontra a certidão de publicação do acórdão contra o qual interposto o especial (isto é, a certidão de intimação do acórdão recorrido). Agravo de instrumento, de que o Relator não conhecera. Agravo regimental provido. Voto vencido".
Sucede, como se viu do despacho ora agravado, que a Corte Especial. em 5.11.97, decidiu doutro modo. Aliás, as Turmas que compõem a 1 ª e a 3ª Seções deste Tribunal já vinham adotando essa orientação, por exemplo:
- "Processual civil. Agravo regimental no agravo de instrumento. Traslado deficiente. Ausência da certidão de publicação do acórdão recorrido. Súmula 288, STF. Precedentes. Art. 525 do CPC. Inaplicabilidade in casu.
1. O art. 525 do CPC desserve para embasar o agravo de instrumento voltado contra decisão que in admite o recurso especial na origem.
2. A certidão de publicação do acórdão recorrido é peça essencial à formação do instrumento, consoante têm afirmado a Suprema Corte e o STJ.
3. Agravo regimental improvido. Decisão unânime." (Agravo
154 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.
Regimental no Agravo de Instrumento n Q 157.681, 1ª Turma, Sr. Ministro Demócrito Reinaldo, DJ de 15.12.97)
- "Processual civil. Recurso especial inadmitido. Agravo para o STJ. Instrumento. Ausência de cópia da certidão de publicação do acórdão recorrido. Não-conhecimento do agravo: possibilidade. Precedentes do STJ e do STF. Agravo regimental improvido.
I - Nega-se seguimento a agravo quando não consta do instrumento cópia da certidão de publicação do acórdão recorrido.
Ir -Agravo regimental improvido." (Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n Q
124.393, 2ª Turma, Sr. Ministro Adhemar Maciel, DJ de 3.11.97)
- "Agravo de instrumento -Traslado incompleto - Ausência de cópia da certidão de publicação do acórdão recorrido.
1. A certidão de publicação do acórdão recorrido é peça obrigatória desde o advento da Lei 8.038/90, conforme jurisprudência do STF e STJ, independente de ser a verificação da tempestividade do recurso especial objeto ou não do agravo de instrumento.
2. Cabe ao agravante a juntada das peças obrigatórias.
3. Agravo regimental improvido." (Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n Q 142.257, 5ª Turma, Sr. Ministro Edson Vi digal, DJ de 13.12.97)
- "Processual civil. Agravo regimental. Formação do instrumento. Controle da tempestividade do recurso especial.
Assentada jurisprudência sobre a obrigatoriedade do traslado da certidão de publicação do acórdão recorrido, sob pena de não conhecimento do agravo.
Precedente do STF.
Agravo regimental a que se negra provimento." (Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n Q 162.964, 6ª Turma, Sr. Ministro William Patterson, DJ de 1.12.97)
Aqui na 3ª Turma, adotou-se, por maioria de votos, a orientação que se firmou na apreciação, pela Corte Especial, da aludida Questão de Ordem, conforme, entre outros, o Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n Q 164.347, assim ementado: "Agravo. Peça essencial. Consolidou-se a jurisprudência do STJ no sentido de que a certidão de intimação do acórdão recorrido tornou-se peça essencial à formação do instrumento, a partir da vigência da Lei 8.038/90. Agravo a que se negou provimento" (Sr. Ministro Costa Leite, sessão de 05.12.97).
A 4ª Turma, pelo que fui informado, adotou orientação análoga à das outras Turmas, a partir do corrente ano, tal em face da decisão tomada pela Corte Especial.
Pelo visto, trata-se de orientação assentada pela Corte, e que já vinha sendo adotada por 4 de suas 6 Turmas, reportando-se alguns dos
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 155
seus julgados à orientação estabelecida há bom tempo pelo Supremo Tribunal (por exemplo, ver o Ag-176.874, DJ de 31.10.95, Sr. Ministro Néri da Silveira, aqui citado no Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 142.257, 5ª Turma).
O vezo, se é que se trate de costume criticável, não é apenas de nossas Cortes. Os critérios técnicos são também adotados por outras Cortes, como a Supreme Court, pelo que se vê de Lawrence Baum, nessas passagens:
"Para merecer aceitação pela Corte Suprema um caso precisa satisfazer a certos requisitos técnicos. Acima de tudo, a petição de apreciação precisa atender às normas da Corte. Uma petição pode ser indeferida, por exemplo, pelo fato de o suplicante não ter fornecido o número requerido de cópias dos documentos constantes dos autos do processo. Estes requisitos são relaxados para as petições dos pobres. mas até mesmo estas petições podem ser indeferidas se for extremo seu desvio das normas." ("A Suprema Corte Americana", Forense-Universitária, 1985, págs. 148 e 149)
À vista de tal orientação, desde logo aplicável, nego provimento ao agravo regimental. Deixo, porém, ressalvado o meu ponto de vista.
VOTO - VENCIDO
O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: A Corte Especial real-
mente decidiu nos termos indicados pelo relator, mas não se alcançou maioria absoluta. Peço vênia para manter meu entendimento, pelas razões que expus ao ser apreciada a matéria naquele órgão:
"Admito seja útil a peça reclamada para quando se pretenda proceder à conversão do agravo em recurso especial. Isso não obstante, não me parece possível emprestar à sua falta a conseqüência questionada.
O Código de Processo Civil, ao regular o agravo, tendente a obter a admissão de recurso especial, é minucioso na enumeração das peças obrigatórias, que hão de ser apresentadas, pena de não conhecimento. Chega ao requinte de entre elas arrolar a procuração outorgada ao advogado do agravante. E expressamente mencionou a certidão de intimação da decisão agravada. Não exigiu, entretanto, viesse também a certidão de intimação do acórdão recorrido. Não cominou, conseqüentemente, a sanção de não conhecimento para quando faltasse.
Certo que, em certas circunstâncias, outras peças podem fazer-se indispensáveis. Assim, por exemplo, se o acórdão se reporta aos fundamentos da sentença, essa haverá de ser trazida; se alegada a inépcia da inicial, mister venha a respectiva cópia. Importante assinalar, entretanto, que isso se verifica eventualmente,
156 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.
em função do caso concreto e, a toda evidência, não seria viável previsse o Código todas as hipóteses que podem ocorrer.
Diverso, entretanto, é o caso em exàme. Aquela certidão muito dificilmente deixará de existir. Sua ausência será muito mais rara do que, por exemplo, as contra-razões ao especial ou a procuração da parte contrária. Não se estabeleceu, entretanto, devesse ser necessariamente apresentada. Não se a teve, pois, como indispensável. Não me parece razoável que a omissão da lei, se existe, haja de ser suprida, punindo-se a parte que se fiou em
seus termos ao compor o instrumento.
Assinalo, na linha do eminente Ministro Gomes de Barros, que os julgadores devem ter a cautela de não transformar o processo em um campo minado. Durante décadas, a propósito de outros textos análogos, prescindiu-se da apresentação da peça em exame. A súbita guinada jurisprudencial colhe de surpresa as partes, que poderão sofrer graves prejuízos. A mudança legislativa não pode ter efeito retroativo, mas a jurisprudência, na prática, termina por tê-lo."
Data venia, dou provimento.
RECURSO ESPECIAL NQ 55.941- DF
(Registro n Q 94.0032215-1)
Relator: O Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito
Recorrente: Eunice Blumenthal de Moraes
Recorridos: Rita Eliana Pacheco da Silva e cônjuge
Advogados: Drs. Cesar Cardoso e outros, e Rubem José da Silva
Sustentação Oral: Dl'. Cesar Cardoso, pela recorrente
EMENTA: Recurso especial. Ação reivindicatória. Promessa de compra e venda registrada.
1. A promessa de compra e venda irretratável e irrevogável transfere ao promitente-comprador os direitos inerentes ao exercício do domínio e confere-lhe o direito de buscar o bem que se encontra injustamente em poder de terceiro. Serve, por isso, como título para embasar ação reivindicatória.
2. Recurso especial conhecido e provido.
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 157
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Senhores Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, após o voto-vista do Senhor Ministro Eduardo Ribeiro, por unanimidade, conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento. Participaram do julgamento os Senhores Ministros Nilson Naves, Eduardo Ribeiro e Waldemar Zveiter. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Costa Leite.
Brasília, 17 de fevereiro de 1998 (data do julgamento).
Ministro WALDEMAR ZVEITER, Presidente. Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Relator.
Publicado no DJ de 01·06·98.
RELATÓRIO
O SR MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO: Recurso especial interposto por Eunice Blumenthal de Moraes com o propósito de reformar o v. Aresto proferido pela egrégia 1 ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios que decidiu:
''Ação reivindicatória. Promissáriocomprador. Parte ilegítima.
O domínio constitui fundamento da ação reivindicatória, não bastando para tal fim a promessa de compra e venda, ainda que regis-
trada, uma vez que dela resulta apenas vínculo contratual com o titular do domínio." (fls. 213)
Alega a recorrente contrariedade aos artigos 524, 676, 677 e 859 do Código Civil, 5º do Decreto n Q
55.815/65, à Lei n Q 6.766/79 e ao artigo 25 da Lei nº 6.756/79, além de divergência em relação a julgados deste Superior Tribunal de Justiça e dos Tribunais de Justiça de São Paulo e de Santa Catarina. Pretende seja tido como justo título para a ação reivindicatória o contrato de promessa de compra e venda de que é detentora (fls. 219 a 230).
Decorreu in albis o prazo para contra-razões (fls. 231) e o especial foi admitido pela alínea c. (fls. 232)
É o relatório.
VOTO
O SR MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO (Relator): A ora recorrente ajuizou ação reivindicatória alegando que foi casada até 1974 e que um dos bens que constituem o patrimônio do casal, ainda não partilhado, é o apartamento objeto da ação "que permaneceria na propriedade exclusiva do cônjuge varão desde que este depositasse, em Juízo, até 31.01.75 o valor correspondente à metade da avaliação judicial do imóvel, sendo que o ex-marido somente formulou tal postulação em Juízo em 09.04.87, doze anos após o termo a quo para o depósito judicial". Segundo a autora, o ex-marido celebrou com a ré e com o ex-marido desta "um con-
158 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.
trato de promessa de compra e venda do imóvel já discriminado, que não se aperfeiçoou porque não logrou o vendedor conseguir suprir a ausência de assinatura de sua exmulher, que ignorava por inteiro a relação jurídica estabelecida por seu ex-marido, a ré e Rubem Souza da Silva". Ainda segundo a autora, como o negócio não foi ultimado a sentença "declarou rescindido o negócio jurídico entabulado, não havendo fixado prazo para desocupação do imóvel porque o pedido não chegou a ser formulado pelo requerido José Aristides, em reconvenção". Por tais razões, considera a autora ter direito ao pedido reivindicatório.
A sentença considerou que a promessa não é "título hábil a provar domínio, requisito primeiro, a ser observado nas ações reivindicatórias, em razão de sua natureza obrigacional onde o promitente-vendedor permanece com a propriedade do bem até a transcrição do título de transferência no registro de imóveis nos termos do art. 530, I e 533 do Código Civil Brasileiro". Foi, desse modo, julgado extinto o processo. A sentença foi integralmente mantida, interposto, então, o especial que foi admitido com apoio no dissídio jurisprudencial.
A tese que se encontra no Acórdão recorrido, e que está em julgamento, é sobre a legitimação ativa da autora, tida nas instâncias ordinárias como promitente-compradora, para propor a ação reivindicatória.
A promessa de compra e venda, como é de comum sabença, produz
conseqüências jurídicas variáveis de acordo com a sua natureza. Mestre Caio Mário ensina, com a habituallucidez, verbis:
"Sendo irretratável e constando de registro público, dá nascimento a direito real, e submete o promitente-vendedor à execução coativa (Lei nQ 649, de 11 de março de 1949), obrigando-o o juiz a outorgar a escritura definitiva, sob pena de valer a sentença como suprimento do ato recusado.
E mais:
"Pelo nosso direito, a promessa de venda nunca pode operar a transferência do domínio, dada a distinção rigorosa entre o contrato definitivo e ° contrato preliminar. Cria este a obrigação de prestar um fato, e seu objeto é a outorga do contrato definitivo. Em contraposição, o contrato definitivo de compra e venda gera uma obrigação de dar, e seu principal efeito é obrigação de transferir o domínio, mediante a tradição da coisa ou a transcrição do título. Descumprida a escritura definitiva, o comprador tem sempre execução direta, e assiste-lhe direito à imissão de posse: Infringida a promessa de compra e venda, há distinguir se o contrato chegou a constituir direito real ou não. Em caso negativo, a conseqüência é o ressarcimento de perdas e danos, natural em qualquer obrigação de fazer. Em caso afirmativo, a promessa gera ônus real gravando a própria coisa, a
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 159
qual o promitente-comprador tem o direito de perseguir em poder de qualquer terceiro adquirente. Esta solução de nosso direito, resultante de todo um sistema que se completou com a Lei nº 649/ 49, afina com a doutrina defendida na França desde Pothier, e ainda em vigor. Proferido o julgamento, não há mais mister que o contratante inadimplente passe o contrato de venda, porque a sentença proferida vale como preceito e substitui a declaração de vontade recusada, podendo ser inscrita no registro imobiliário, como se fosse a própria escritura.
A coisa comprometida, em virtude da constituição do ônus real, torna-se indisponível. Com fundamento na promessa, que obedeça aos requisitos acima enumerados, o promitente-comprador adquire a faculdade de receber a escritura definitiva, e de anular o ato de alienação que o promitente-vendedor tenha realizado após o registro do contrato de promessa.
Reversamente, o promitente-vendedor tem o direito de consignar a coisa em juízo, constituindo o promitente-comprador em mora, desta forma liberando-se de toda obrigação" (Instituições de Direito Civil, Forense, Rio, vol. lII, 9ª ed., 1992, págs. 136/137.)
No mesmo diapasão é o magistério de Arnoldo Wald, verbis:
"Não se admitindo no arrependimento para as promessas de ven-
da de imóveis e ainda atribuindo-se um novo direito real em favor do adquirente, bem como a efetivação da compra e venda, em caso de recusa injusta, estamos diante de um novo contrato típico, pelo qual as partes se obrigam reciprocamente a tornar eficaz a compra e venda de um bem imóvel, mediante a reprodução do consentimento no título hábil". (Curso de Direito Civil Brasileiro, Obrigações e Contratos, Ed. Revista dos Tribunais, SP, 12ª ed., 1995, pág. 266.)
As lições dos dois eminentes civilistas, a meu juízo, autorizam conclusão diversa da tese esposada pelo Acórdão recorrido, na medida em que a promessa de compra e venda irretratável, sem cláusula de arrependimento, "dá nascimento a direito real, e submete o promitentevendedor à execução coativa (Lei nº 649, de 11 de março de 1949) obrigando o juiz a outorgar a escritura definitiva sob pena de valer a sentença como suprimento do ato recusado".
Isto quer dizer, concretamente, que, sendo embora um contrato preliminar, ou pré-contrato, como preferia Pontes de Miranda, sob o ângulo da dogmática tradicional, a promessa bilateral de compra e venda irretratável dá ensanchas a reivindicação do bem contratado, isto é, persegui-lo quando estiver injustamente em poder de terceiro. Merece, ainda uma vez, invocado o ensinamento de Caio Mário, verbis:
160 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.
"N o estado atual do nosso direito positivo, o contrato preliminar quando revestido de todos os requisitos do contrato principal e desacompanhado de cláusula de arrependimento, dá direito à execução compulsória. Se o contrato principal é de compra e venda, a inscrição da promessa no registro imobiliário constitui ônus real, e autoriza a adjudicação compulsória; mas se de valor superior à taxa legal, depende da adoção da forma pública, porque esta é, a seu turno, essencial à criação de direito real" (ob. cit., pág. 64)
Esta Turma, ao julgar o REsp n Q
32.972/São Paulo, com o voto condutor do eminente Ministro Nilson Naves, vencidos os eminentes Ministros Relator Cláudio Santos e Costa Leite, avançou uma outra e valiosa dimensão para o compromisso de compra e venda, valendo destacar o seguinte trecho, verbis:
"Ora, tendo direito à aquisição do imóvel, o promitente-comprador pode exigir do promitente-vendedor que lhe outorgue a escritura definitiva de compra e venda, bem como pode requerer ao juiz a adjudicação do imóvel. À vista da jurisprudência desta Casa, o registro não é necessário, nem o instrumento público, seja para o fim da Súmula 84, seja para que se requeira a adjudicação (entre outros julgados, ver REsp's 30, 5.463,9.945,10.383 e 9.414). Podendo dispor dessa eficácia, a promessa, gerando direito à adjudicação, há de poder, penso eu,
gerar direito à aquisição por usucapião ordinário. Estou pois adotando outro conceito de justo título, talvez conceito mais abrangente, e assim estou procedendo em face de julgados mais recentes desta Corre, dos quais estimo ter tirado corretas conseqüências."
Acompanhando o voto condutor, o eminente Ministro Eduardo Ribeiro, asseverando que o voto do relator "traduz a doutrina mais tradicional, e considerada até mais ortodoxa, pelo menos durante muito tempo", não hesitou em considerar "construção prudente", no caso, aquela acolhida pelo relator. Do mesmo modo, o eminente Ministro Waldemar Zveiter afirmou que o voto majoritário "soma-se ao valor que o próprio Tribunal tem dado à promessa de compra e venda".
O que se observa é uma mudança na natureza jurídica do compromisso de compra e venda, a meu ver, tão intensa que se pode, até mesmo, retirá-la, no que concerne às particulares conseqüências que produz, do âmbito dos contratos preliminares. A própria legislação, enfrentando a realidade social brasileira, no dramático problema habitacional, que deu nascimento a programas especiais de financiamento, ampliou o alcance do compromisso de compra e venda ao considerá-lo direito real, atingindo, ainda, as cessões e promessas de cessões de terrenos (cfr. Leis n Q 4.380/64 e n Q
6.766/79). Esse comportamento legislativo, na melhor expressão da soberania popular, levou em conta, seguramente, o fato de que as tran-
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (lU): 151-206, novembro 1998. 161
sações imobiliárias, que cobrem, sem dúvida, camadas de baixa renda, de que são exemplos os negócios nas favelas, fazem o contrato de promessa de compra e venda transbordar, efetivamente, dos estreitos limites do pré-contrato.
É certo que o promitente-comprador em uma promessa de compra e venda irretratável e devidamente averbada, está investido de poderes mais amplos do que aqueles que a dogmática tradicional acolhia. Não se trata, apenas, de assegurar ao promitente-comprador a condição de titular de um direito real concedido por legislação especial, o poder de obter a adjudicação compulsória, de ter a execução direta ou a imissão de posse, negando-lhe a legitimação ativa para a ação reivindicatória. Seria reconhecer-lhe um minus, diante do interesse maior de preservar o bem que lhe foi prometido vender de forma irrevogável e irretratável. Quem tem interesse de buscar o bem assim negociado é o promitente-comprador, tanto que lhe assiste direito de obter, mesmo contra o promitente-vendedor, a adjudicação compulsória, investido de poderes para a imissão de posse e a execução direta. O promitente-comprador não pode ter negado o seu direito de buscar o bem que se encontra injustamente em poder de terceiro. Seria, assim, um minus pois que teria ele direito a investir contra o promitente-vendedor que lhe não aperfeiçoa o título, mediante a adjudicação compulsória, mas não teria direito a buscar o bem das mãos de quem injustamente o possua. Demais disso, ao compromis-
sário-comprador é atribuído um direito real, com todas as suas conseqüências. Veja-se o magistério de José Osório de Azevedo Jr., verbis:
"Muitos dizem que o direito de propriedade, "em si", ficou com o compromitente-vendedor. Nós preferimos dizer que a coisa em si (objeto do direito de propriedade) passou para o patrimônio do compromissário-comprador. Os juristas freqüentemente parecem sentir dificuldade em dar o devido relevo às realidades econômicas em cujo ambiente e em razão das quais se consumam os negócios jurídicos. O grande Darcy Bessone, a quem tanto deve o desenvolvimento desta matéria, afirmou que "mesmo depois da promessa e da averbação e de sua inscrição, o imóvel continua a integrar o patrimônio do promitente-vendedor, somente passando para o do promissário após a compra e venda e/ou a adjudicação transcrita" (Da compra e venda, cit., pág. 175). Um economista ou um simples comerciante, hoje já afeitos ao compromisso de compra e venda, ficariam admirados dessa afirmação. Temos para nós - repetimos - que o bem passou para o patrimônio do compromissário-comprador. Considerando o patrimônio como o complexo de relações jurídicas, com expressão econômica, de uma pessoa, temos que o direito de propriedade que restou ao compromitentevendedor após o pagamento do preço se aniquilou ao ponto de se
162 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.
converter em mera obrigação de assinar uma escritura; essa obrigação integra, por certo, o complexo de relações jurídicas do promitente-vendedor mas, por não ter expressão econômica, não integra o patrimônio."
E prossegue, com toda claridade, verbis:
"Como já vimos atrás (n. 4), depois de receber o preço o promitente-vendedor desliga-se do negócio, pois já transmitiu ao compromissário todo o conteúdo do direito de propriedade. Restou apenas a obrigação de cumprir o rito de assinar uma escritura, que muitas vezes é sonegada para evitar despesas supervenientes (alvarás, impostos, etc.) e outras vezes para simplesmente criar condições propícias ao desfazimento do negócio já cumprido por uma das partes e inteiramente consolidado no tempo."
E, finalmente, adverte:
"Muitos entendem que esse modo de ver o problema ofende a ordem jurídica por causa da transcrição etc. Não pensamos assim. Para nós a ordem jurídica sofrerá prejuízos muito mais graves se for negada ao compromissário a faculdade de reivindicar. Isto porque o promitente-vendedor, não tendo mais direitos sobre o imóvel, não pode reivindicar. Quem convencerá uma pessoa comum e normal, o bonus pater familias, de que ela, que já entre-
gou o imóvel e recebeu o preço há tempos, deverá litigar com terceiros para reaver o bem, em nome próprio, e em seguida entregá-lo novamente ao compromissário?
Para verificar que é inviável -também do ponto de vistajurídico - a reivindicação por parte do promitente-vendedor, convém imaginar um conflito de interesses entre este e o compromissário-comprador quanto à reivindicação, isto é, cada um move a sua ação para reaver o imóvel. Será razoável negar a pretensão do compromissário que pagou e que tem direito real sobre a coisa, e atender a pretensão de quem já recebeu o preço e se desvinculou do negócio? Qual dessas pretensões têm conteúdo ético e jurídico?
Aí, sim, a ordem jurídica estará sendo transgredida. A faculdade de reivindicar é talvez o mais importante atributo do domínio e a ordem jurídica não pode tolerar que essa faculdade fique sem titular, ou então, por outras palavras, que fique um bem imóvel à mercê de aventureiros sem que ninguém possa reivindicá-lo, apesar de o compromissário ter pago por esse bem e ter direito real amplíssimo sobre esse mesmo bem." (Compromisso de Compra e Venda, Saraiva, São Paulo, 2ª ed., 1983, págs. 61, 78 e 101)
Ao assinar a promessa de compra e venda irretratável e averbada, o promitente-vendedor, a meu juízo, transmite ao promitente-comprador
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 163
todos os direitos sobre o imóvel prometido vender, dentre os quais aquele de reaver o bem de "quem quer que injustamente o possua" (art. 524 do Código Civil).
Na verdade, o que ocorre é uma transferência do promitente-vendedor para o promitente-comprador dos direitos inerentes ao exercício do domínio sobre o bem prometido vender, sob pena de negar-se a própria configuração do compromisso de compra e venda como um contrato típico, para lembrar qualificação de Arnoldo Wald, capaz de gerar direito real, direito à aquisição por usucapião ordinário, que a legislação e a jurisprudência, atentas ao evoluir constante do direito, já reconhecem, sem tergiversação.
O pedido reivindicatório, dessa maneira, pode e deve ser exercido pelo promitente-comprador, ainda mais considerando que o estreitamento da legitimação ativa, para a ação reivindicatória, em tais casos, beneficia, exclusivamente, o terceiro possuidor sem justo título.
Destarte, eu conheço do recurso e dou-lhe provimento para afastar a carência de ação e determinar o prosseguimento do feito como de direito.
VOTO- VISTA
O SR. MINISTRO NILSON NAVES: Segundo o acórdão que ora se quer reformar, "O domínio constitui fundamento da ação reivindicatória, não bastando para tal fim a promessa de compra e venda, ain-
da que registrada, uma vez que dela resulta apenas vínculo contratual com o titular do domínio". Entendeu-se que a autora carecia da ação por ela intentada, que foi a ação fundada no art. 524 do Cód. Civil. Em conseqüência, julgou-se extinto o processo, nos moldes do art. 267, inciso VI, do Cód. de Pro Civil.
Lê-se no despacho de admissão do recurso especial o seguinte: "Quanto ao dissídio, o apelo está razoavelmente formulado e merece trânsito pela discrepância desta decisão com a da 1 ª Câm. Cível do TJSP (RJTSP 43/206), a fim de que a Corte Excelsa dê ao caso a interpretação mais consentânea". Desse acórdão padrão, em que se rejeitou a preliminar de carência da ação de reivindicação, recolho essa passagem:
"Se os autores podem pedir a adjudicação compulsória dos promitentes-vendedores, porque são titulares de direito real, com maior razão podem reivindicar o imóvel do poder de quem o detenha ilegalmente.
Não é caso, portanto, de carência e conseqüente extinção do processo.
É de ficar mantido o saneador que se houve com acerto" (pág. 207).
Dissídio existe, motivo por que também eu conheço do recurso.
No REsp 32.972, prevaleceu, nesta Turma, o entendimento de que pode e deve a promessa gerar direito à aquisição por usucapião ordi-
164 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.
nário. Já foi o precedente citado no voto do Sr. Relator. Para ele, escrevi essa ementa: "Usucapião ordinário. Promessa de compra e venda. Justo título. Conceito. Tendo direito à aquisição do imóvel, o promitente-comprador pode exigir do promitente-vendedor que lhe outorgue a escritura definitiva de compra e venda, bem como pode requerer ao juiz a adjudicação do imóvel. Segundo a jurisprudência do STJ, não são necessários o registro e o instrumento público, seja para o fim da Súmula 84, seja para que se requeira a adjudicação. Podendo dispor de tal eficácia, a promessa de compra e venda, gerando direito à adjudicação, gera direito à aquisição por usucapião ordinário. Inocorrência de ofensa ao art. 551 do Cód. Civil. Recurso conhecido pela alínea c, mas não provido" (DJ de 10.6.96).
Quero ainda entender, talqualmente o Sr. Ministro Menezes Direito, que "O pedido reivindicatório, dessa maneira, pode e deve ser exercido pelo promitente-comprador, ainda mais considerando que o estreitamento da legitimação ativa, para a ação reivindicatória, em tais casos, beneficia, exclusivamente, o terceiro possuidor sem justo título".
N o caso presente, se j á desfeito o negócio anterior (o contrato celebrado com a ré e com o seu ex-marido), poderia a ação, quem sabe, também prosseguir como ação de imissão de posse (entre outros, ver o REsp 8.785, DJ de 27.5.91).
Acompanho o Sr. Relator.
VOTO- VISTA
O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: Trata-se de ação de reivindicação, ajuizada por quem não tem o domínio, mas é promitentecompradora. Tal assinalou o eminente Relator, a reivindicatória é ação de quem não tendo a posse, é proprietário e a promessa de venda não confere essa qualidade.
Quando se iniciou o julgamento, ocorreu-me a idéia de que já teria esta Turma considerado viável o pedido em exame. As pesquisas que fiz, entretanto, não o confirmaram. Localizei acórdão, de que relator o douto Ministro Dias Trindade, em que se teve como admissível o pedido de imissão na posse (REsp 8.785, DJ 27.5.91). Ao votar, naquele julgamento, embora acompanhando o Relator, fiz algumas ressalvas.
A questão, cumpre assinalar, diz com o direito material e só secundariamente com o processual. O proprietário tem direito, só por sêlo, de haver a posse. O exercício desse direito encontrará obstáculo, caso o possuidor apresente título a ele oponível. O mesmo, entretanto, não se reconhece ao promitentecomprador. O fato de alguém ter essa qualidade não conduz, apenas por isso, a que tenha direito à posse do bem. Pode-se prometer a venda de um bem, sem que haja a transmissão da posse. Não se trata de cláusula natural desse contrato, que se deva entender existente, ainda que não explicitada. À falta de transferência por via contratual, permanecerá a posse com o proprietário.
R. sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 165
Muito comumente, entretanto, o contrato em questão insere cláusula de transmissão da posse. Nesse caso, claro está que o promitentecomprador pode pleitear seja nela imitido, em cumprimento do que ficou avençado, se o promitentevendedor se recusar a cumprir o pactuado. Poderá ocorrer, ainda, é o caso mais comum e o de que se cogita no processo, que o bem se ache em poder de um terceiro. Se não tem título para isso, porque nunca o teve ou porque desconstituído o que ti-
nha, será caso de esbulho à posse do promitente-vendedor e os direitos desse passarão ao promitentecomprador que poderá pretender a posse, como sucessor.
No caso em exame, intentou-se obter a posse com base exclusivamente no fato de a autora ser promitente-compradora. Embora não se haja de emprestar relevo ao rótulo dado ao pleito, o certo é que não se deduziu causa de pedir apta a levar ao pretendido resultado.
Acompanho o Relator.
RECURSO ESPECIAL NQ 72.416 - RJ
(Registro n Q 95.0042159-3)
Relator: O Sr. Ministro Waldemar Zveiter
Recorrente: Maria Helena Cisne Cid
Recorrido: Jornal do Brasil S/A
Advogados: Ivan Paixão Franca e outro, e Sérgio Bermudes e outros
EMENTA: Responsabilidade civil - Lei de Imprensa - Dano moral indenizado acima da limitação imposta pelo art. 52 da Lei de Regência - Não recepção da norma pela Constituição em vigor - Depósito do art. 57, § 6 12 da mesma Lei - Descabimento de sua exigência por não recepcionado pela Carta Federal- Interpretação sistemática - Recurso desacolhido.
I - O depósito prévio à apelação, no valor total da condenação imposta a título de indenização por dano moral advindo da atividade jornalística, foi concebido na vigência de um sistema que previa a indenização tarifada. Adotando-se nas instâncias ordinárias indenização que ultrapasse esse valor máximo, há que se ter, por força de interpretação sistemática do dispositivo que impõe o depósito, por inaplicável também tal exigência.
166 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151·206, novembro 1998.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Senhores Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do recurso especial. Sustentou oralmente, o Dr. Aldir Guimarães Passarinho, pela recorrente. Participaram do julgamento os Senhores Ministros Menezes Direito, Costa Leite, Nilson Naves e Eduardo Ribeiro.
Brasília, 14 de abril de 1998 (data do julgamento).
Ministro COSTA LEITE, Presidente. Ministro WALDEMARZVEITER, Relator.
Publicado no DJ de 31-08-98.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER: Cuida-se de Ação Ordinária de reparação de danos (moral e patrimonial) proposta contra J ornaI do Brasil, em razão de ter este publicado fato tipificado como crime, o qual macula a reputação e dignidade da cidadã (magistrada), aqui, recorrente.
Irresignado com a sentença de procedência (fls. 57) interpõe o estabelecimento jornalístico Apelação (fls. 971120).
Todavia, o Juízo singular que, inicialmente, dera seguimento à referida apelação, sem a obrigatoriedade do depósito (art. 57, Lei 5.2501
67), veio a retratar-se. Em face disso, apresentou o réu vencido (J ornaI do Brasil) Agravo de Instrumento e provido este, o Tribunal recebeu a Apelação, no dúplice efeito e sem a exigibilidade do precitado depósito.
Tal fato deu ensejo a que a Autora da ação reparatória manejasse também Agravo de Instrumento, pretendendo a prevalência do decreto de desacolhimento daquela Apelação, ao entendimento de que o depósito do valor da condenação é imposição legal inarredável. Ao contrário do Agravo do Réu, este último, o da autora, foi improvido, como assim (fls. 159):
"Apelação - Impugnação de sentença, em ação especial da Lei de Imprensa - Decreto de deserção, à falta do depósito determinado no art. 57, § 6Q da Lei n Q
5.250, de 09.02.67 - Orientação jurisprudencial, firme, de dispensa do depósito se a Apelação versa montante exagerado da condenação - Deserção inocorrrente -Provimento do Agravo de Instrumento para subida da Apelação."
Irresignada, a recorrente interpõe o Especial (REsp 72.415) de fls. 164, onde alega que o aresto teria violado o § 6Q do art. 57 da Lei 5.2501 67, tendo ocorrido também, no seu entender, discrepânciajurisprudencial com os paradigmas que transcreve.
Contra o agravo, interposto pelo jornal do Brasil, que resultou no recebimento da Apelação, aparelhou
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 167
também a recorrente recurso especial CREsp 72.416), em apenso, mas em ambos (REsp's) a matéria versada é a mesma, sendo certo que, contra o não seguimento do REsp 72.415, é que este STJ acolheu o Regimental da Autora, ora requerente.
Em síntese, a Autora (Maria Helena Cisne Cid), nos recursos que apresenta (REsp's 72.415 e 72.416), insurge-se contra o acolhimento da Apelação da empresa-ré (Jornal do Brasil), sem o atendimento do que promana do art. 57, § 6º, da Lei 5.250/67 (recolhimento pelo réu do valor em que condenado, como condição de admissibilidade da Apelação).
No Tribunal de origem, negou-se seguimento ao apelo, ao entendimento de que o aresto impugnado deu razoável interpretação à hipótese (Súmula 400 do STF) e no que tange ao dissídio, este não se comprova, eis que inexistente o confronto analítico necessário a apreciação do recurso, - (fls. 200). Todavia, por força de provimento dado ao Regimental nº 53.894, em apenso, subiu a esta Corte e, aqui, como já dito, convolado no REsp 72.415/RJ.
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER (Relator): O acórdão (Agravo de Instrumento) contra o qual se insurge a recorrente é do seguinte teor (fls. 160/161):
"Mantido o R. Despacho agravado, de fls. 161 dos autos de ação especial (fls. 139 do traslado) pelo R. Despacho de fls. 154. Insurgese a Agravante contra o decreto de deserção da Apelação interposta contra a R. Sentença condenatória, nos termos da Lei de Imprensa (Lei nº 5.250, de 09.02.67). A deserção foi proclamada à falta do depósito do valor da condenação, como exigido pelo art. 57, § 6º da mencionada Lei. A Agravante pretende inconstitucional a exigência, obstando a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes, na forma do art. 5º, LV, da Constituição da República. Há resposta ao Agravo (fls. 141/142) sustentando a deserção, declarada com base no art. 57, § 6º, da Lei de Imprensa, pedindo desprovido o Agravo. Julgando o recurso, cumpre ver que a exigência do depósito, a teor do art. 57, § 6º, mencionados, era condição de admissibilidade da Apelação. Esta foi recebida nos seus efeitos regulares (fls. 121 dos autos originais; fls. 42 do traslado), sem que feito o depósito "no prazo de sua interposição", como está no texto da lei aludida, como redigida pelo art. 12, da Lei nº 6.071, de 03.07.74. Não podia a subida da Apelação, assim admitida no 1 º grau, ser condicionada ao depósito, notadamente quando viceja orientação jurisprudencial dispensando o depósito quando versa a Apelação, precisamente, a exorbitância da condenação, como é o caso (fls. 30 e seguintes). Haveria meio e
168 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.
modo de obstar o recurso em causa tão-só com a fixação em valores incomensuráveis à condenação. A diretriz em apreço torna, até, dispensável cogitar a alegada inconstitucionalidade do art. 57, § 6º, da Lei de Imprensa. Inconstitucionalidade, aliás, inocorrente, não sendo condição, isolada, da Lei nº 5.250/67, para o recurso, o depósito da condenação. A Consolidação das Leis do Trabalho (Decreto-Lei nº 5.452, de 1º.05.43), em seu art. 899, § 1 º, exige, para qualquer recurso, sendo a condenação superior a determinado limite, o prévio depósito da respectiva importância. Há quase 50 anos! Nunca se alegou a sua inconstitucionalidade. Nem deste texto, nem de outros que, igualmente, fazem igual exigência. Caso é, assim, de, na diretriz antes mencionada, que é a desta Câmara, dar provimento ao Agravo, para subida da Apelação, sem o depósito."
Antes, convém que se diga que a recorrente maneja dois recursos, o REsp nº 72.416 e o presente, mais em ambos, a matéria da insurgência é a mesma do que resulta que a resolução deste vale para o outro.
Em seu inconformismo (fls. 172), argumenta a recorrente:
"Não havendo depósito, a deserção passa a constituir conseqüência necessária, obrigatória e irreversível.
Nestas condições agiu corretamente dentro dos postulados le-
gais o Juiz que decretou a deserção do recurso da Ré, e conseqüentemente, o acórdão recorrido visivelmente afrontou, violentou, contrariou e negou vigência àquela norma legal, donde decorre, como conseqüência inafastável, o cabimento deste Recurso Especial."
Esse mesmo reclamo a recorrente lança em seu Especial (REsp 72.416), mas agora atacando a conclusão do aresto de fls. 148 (Ag. de Instrumento), como assim registrado (fls. 149/150):
"Reporta-se o R. Despacho ao depósito da condenação, nos termos do art. 57, § 6º, da Lei de Imprensa. Donde o presente Agravo, devidamente instrumentado, com as razões da Agravada às fls. 128/129, pelo desprovimento do recurso, dada a correção do R. Despacho recorrido, que cumpriu o claro mandamento da lei. Às fls. 142 está o R. Despacho negando a retratação do R. Despacho agravado. É o que cumpre relatar. Julgando o recurso é de se relembrar o texto do art. 57, em seu § 6º, da Lei de Imprensa (Lei nº 5.250, de 09.02.67), na redação da Lei nº 6.071, de 09.07.74, art. 12: "Da sentença do Juiz caberá apelação, a qual somente será admitida mediante comprovação do depósito, pelo apelante, de quantia igual à importância total da condenação. Com a petição de interposição do recurso o apelante pedirá expedição de guia para o depósito, sendo a apelação julga-
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 169
da deserta se, no caso de sua interposição, não for comprovado o depósito.» Comprovado está que o douto Juízo a quo recebeu a apelação em seus regulares efeitos. Cumpriu, assim, o seu ofício, no Juízo positivo da admissibilidade do recurso desta sorte admitido. Pelo texto transcrito, do art. 57, § 6º, da Lei nº 5.250/67, a apelação somente seria admissível mediante comprovação do depósito - supramencionado. Admitida a Apelação sem o depósito, ainda que por eventual erro do douto Juízo a quo, não era dado a ele corrigir o erro. N otadamente quando o Juízo de admissibilidade de recurso se faz, necessariamente, nos dois graus de jurisdição (o recorrido e aquele para o qual se recorre), o que leva a concluir que ao 2º grau cabe rever o que se fizer preciso, e não ao próprio Juízo a quo. Também se tenha em conta orientação jurisprudencial relevante, a dispensar o depósito quando, na matéria impugnada na apelação, se incluir o que se refere ao exagero da condenação."
De ver-se que, em ambos os decisórios os fundamentos, quanto ao ponto objeto da insurgência foi o mesmo, afastou-se a exigibilidade do depósito, já que o excesso de seu valor foi a questão desenvolvida na Apelação.
Nesse tema a obrigatoriedade ou não do depósito do valor da condenação foi percucientemente analisada pelo eminente Ministro Sálvio de Figueiredo, quando prolatou voto no REsp 39.886/SP.
Naquela oportunidade, o eminente Ministro-Relator, acolhendo lineamentos doutrinários procedeu à exegese do art. 57, § 6º da Lei 5.250/ 67, nestes termos:
"2. Em artigo publicado no caderno "Direito e Justiça", do Correio Braziliense de 13.11.95, Lourival José dos Santos, consultor da "Associação Nacional dos Editores de Revistas", anotou:
"Para que se possa fazer uma análise equilibrada e, necessariamente, imparcial sobre a questão do limite das indenizações por dano moral, decorrentes de publicações de imprensa, assunto polêmico no momento, dois pontos básicos deverão ser destacados: a. Em primeiro lugar, a irrestrita liberdade de imprensa, que deverá ser sempre conjugada com o direito do cidadão ser informado, faculdades asseguradas pela Constituição Federal e que não poderão, jamais, ser subjugadas por interesses particulares; b. Em segundo, o fato da Lei de Imprensa estar em pleno vigor, não sendo em nada conflitante com a Constituição de 1988, conclusão a que se chega por qualquer ângulo jurídico pelo qual sej a examinada, obviamente se tal análise for realizada com isenção e imparcialidade.
Mister se faz aqui assinalar, ainda que em singela e modesta penada, as regras básicas,
170 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.
segundo as quais poderá ocor-. rer a ab-rogação ou a derroga
ção de uma lei, ou seja, quando a lei nova provoca, total ou parcialmente; . a cessação da autoridade de uma lei anterior.
A norma posterior revoga a anterior quando expressamente o declare (revogação expressa), quando seja com ela incompatível ou regule inteiramente a matéria contemplada pela anterior (revogação tácita). Se, no entanto, estabelecer disposições gerais ou especiais a par das existentes, não revoga, tampouco modifica a lei anterior (L.I.C.C.).
N o campo da legislação constitucional, como bem assinala Caio Mário da Silva Pereira, ("Instituições de Direito Civil", v. I, n Q 17) por se constituir norma fundamental e "ser emanada da soberania nacional, submete ao seu império todos os órgãos do Estado, discrimina as atribuições dos seus poderes, delineia todas as peças do organismo estatal". Porém, como o próprio autor ensina, somente perdem a fundamentação existencial e se consideram ineficazes as leis que afrontam ou não se conciliam com ela.
Nada impede que textos sancionados sob a égide de uma norma constitucional revogada sejam recepcionados por nova Carta, desde que entre os mesmos não haja conflito, sendo daqui totalmente aplicável o dis-
posto no § 2Q do art. 2Q da LICC, atrás mencionado, porquanto não havendo contradição não há por que os textos não coexistirem pacificamente.
Ensina Carlos Maximiliano que, para ab-rogação da autoridade dá lei antiga, "a incompatibilidade deve ser absoluta e formal, de modo que seja impossível executar a norma recente sem postergar, destruir praticamente a antiga; para a derrogação basta a inconciliabilidade parcial, embora também absoluta quanto ao ponto em contraste" ("Hermenêutica e Aplicação do Direito", Ed. Fonseca, pág. 358).
O motivo deste modesto estudo é que certa parcela do Judiciário tem, com certa freqüência, utilizado-se de critérios próprios para a fixação de valores a título de indenização por danos morais, desprezando os parâmetros estabelecidos pela Lei n Q 5.250/67, dita Lei de Informaçâo, nesse âmbito, como se derrogados estivessem, pela Carta Magna atual, os arts. 51 e 52 daquela lei.
Antes de mais nada é preciso ter presente que o dano moral, ao contrário do dano material, que se concretiza pela efetiva perda patrimonial, é aquele decorrente da ofensa à alma ou aos valores pertencentes ao universo íntimo do indivíduo, razão pela qual qualquer discussão nessa esfera deverá seguir critérios lógi-
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 171
172
cos, adequados à defesa das pessoas eventualmente feridas no campo da sensibilidade.
A Constituição brasileira, ao disciplinar os direitos e garantias fundamentais, assegurou "o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem".
Resta saber se este texto é conflitante com o da lei de informação, no ponto em que esta última limita a indenização por danos morais a valores preestabelecidos. Está claro que a Constituição previu a proporcionalidade da resposta, em relação ao agravo sofrido pelo ofendido e até aqui não se incompatibilizou com a lei de imprensa, a qual coloca também à disposição do ofendido, por matéria de imprensa, o direito à publicação de resposta, exatamente na mesma proporção da divulgação incriminada, com caracteres tipográficos semelhantes ao da matéria que originou a reclamação e no mesmo órgão de imprensa que a deu a público (v. art. 30, I, L, n Q 5.250/67).
Com referência à indenizabilidade por danos morais e materiais, o legislador constitucional instituiu previsão de caráter geral, estabelecendo tais indenizações à guisa de um plus ao direito de resposta, com o que jamais desautorizou as regras específicas adotadas pela Lei Federal de Im-
prensa, sobre danos dessa natureza.
Basta que se coteje os textos, com isenção, para que se conclua, sem esforço, que os mesmos se harmonizam, estando a especificidade da lei ordinária tão-somente a explicitar o dispositivo genérico do diploma mandamental.
Abstraindo-se de entusiasmos e preconceitos e analisando-se com lógica parcimoniosa o texto constitucional, não há como se concluir contra o fato de que a Lei Especial de Imprensa jamais frustrou o alcance buscado pelo legislador da Carta Magna, ficando tudo o mais por conta de exageros exegéticos. O apego demasiado à letra dos dispositivos pode ser prejudicial, porém muito mais será forçar a exegese de modo a pretender que o escrito coincida com o subjetivismo do hermeneuta, "vislumbrando no texto idéias apenas existentes no próprio cérebro", como diz Maximiliano.
A Lei de Imprensa pode, eventualmente, para alguns intérpretes, não ter o texto ideal e, a propósito, há projeto de nova lei tramitando no Congresso, porém, enquanto estiver em vigor deverá ser acatada por todos e não cumpre ao Judiciário a subversão da ordem dos poderes constitucionalmente instituídos, para legislar em favor de suas próprias e particulares convicções, tam-
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.
pouco o poder de concluir que os princípios determinados por certa lei não se coadunam com o seu sentimento de justiça. Como diz Caio Mário da Silva Pereira "ao Poder Judiciário não cabe a atribuição de abolir uma lei, de vez que tem competência é para aplicá-la" ("Inst. do Direito Civil", Forense, pág. 93).
Não se pode esquecer, também, que os valores para o dano moral foram estabelecidos numa época em que grassava na Nação clima de exceção e de censura aos meios de comunicação, sendo certo que os parâmetros instituídos pelo legislador, pela lógica daquele momento, certamente não pecaram pela modéstia, tampouco pretenderam incentivar a liberdade plena da manifestação do pensamento e da prestação de informações. Ora, custa crer, por ser até paradoxal, que hoje, exatamente hoje, sob o pálio democrático, se esteja procurando intimidar a imprensa sob a ameaça de indenizações milionárias, à custa de especulações injustificáveis a respeito de contradições inexistentes entre o texto da Carta Magna e o da Lei Especial".
3. Tenho que bem decidiu o Colegiado de origem ao aceitar o depósito do valor máximo da indenização tarifada por essa norma, nos seus arts. 50 e 51, assim redigidos:
"Art. 51. A responsabilidade civil do jornalista profissional que concorre para o dano por negligência, imperícia ou imprudência, é limitada, em cada escrito, transmissão ou notícia:
I - a 2 salários mínimos da região, no caso de publicação ou transmissão de notícia falsa, ou divulgação de fato verdadeiro truncado ou deturpado (art. 16, números H e VI);
H - a 5 salários mínimos da região, nos casos de publicação ou transmissão que ofenda a dignidade ou decoro de alguém;
IH - a 10 salários mínimos da região, nos casos de imputação de fato ofensivo à reputação de alguém;
IV - A 20 salários minímos da região, nos casos de falta de imputação de crime a alguém, ou de imputação de crime verdadeiro, nos casos em que a Lei não admite a exceção da verdade (art. 49, § 1Q
)"
"Art. 52. A responsabilidade civil da empresa que explora o meio de informação ou divulgação é limitada a dez vezes as importâncias referidas no artigo anterior, se resulta de ato culposo de algumas das pessoas referidas no art. 50".
A norma em questão é de 09/ 02/67, tendo o § 6Q do seu art.
R Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (lll): 151-206, novembro 1998. 173
174
57 recebido a redação atual através da Lei 6.071/74.
A denominada "Lei de Imprensa" portanto, estabeleceu um "sistema normativo" estanque, fechado em si mesmo, o qual previa e tarifava a indenização por danos morais ou materiais experimentados pelos cidadãos, em razão da atividade noticiosa.
Entretanto, teria havido sensível modificação no sistema, à luz da qual fora deferida à autora, ora recorrente, indenização muito superior aos limites anteriormente estabelecidos, e que nesse contexto, a condição de efetuar depósito igual ao valor da condenação, para ter recebida a sua apelação, poderia impor à parte gravoso ônus, vedando-lhe o acesso ao "duplo grau de jurisdição".
Não foi outro, aliás, o entendimento externado por Vicente Grecco Filho, ao oficiar no feito como Procurador de Justiça, em parecer que acabou por constituir-se na viga-mestra do aresto impugnado.
Darcy Arruda Miranda, comentando a Lei de Imprensa, especialmente o seu art. 52, conclui pela revogação das disposições limitativas da responsabilidade civil, nestes termos:
"Como ficou assinalado linhas acima, na presente Lei de Imprensa o nosso legislador, retirando ao juiz larga margem de arbítrio na reparação
do dano provocado por atos ilícitos, partiu para o casuísmo, estabelecendo graus e limites ao ressarcimento, fixando tarifas inadequadas à extensão da responsabilidade nos crimes contra a honra, embora estendendo-a também ao dano moral, ao lado do ilícito civil, para efeito de reparação.
Ninguém desconhece que o dano material é ressarcível e se esquece, ao passo que o dano moral é indelével e não se esquece, fica guardado na retentiva de quem dele tomou conhecimento.
A limitação da pena correspondente à responsabilidade do jornalista profissional em salários mínimos, corresponde à pena de multa quantitativa e esta já foi abolida pela Lei 7.209/64, em seu art. 2Q
, suprimindo "quaisquer referências a valores de multa", suprimindo-se a expressão multa de por multa", simplesmente, cabendo ao juiz, em cada caso, fixarlhe o valor, de acordo com o padrão do art. 53.
Além do mais, a Constituição Federal de 1988, acabou com as limitações de tempo e valor para as ações de reparação de danos materiais e morais, ao dispor, em seu art. 5Q
,
X: "São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito de indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação"
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.
("Comentários à Lei de Imprensa", 3ª edição, 1995, ed. Revista dos Tribunais, n Q 713, pág. 734).
Inclino-me, ao analisar a possível negativa de vigência ao § 6Q do art. 57 da Lei de Imprensa, por não divisar no acórdão a ocorrência de tal vício, posto que a interpretação sistemática desse dispositivo conduz à conclusão adotada pelo acórdão recorrido."
Daí que aqueles decisórios, ao aplicar o direito à espécie, laborando a exegese do art. 57, § 6º da Lei 5.250/67, também amoldou-se à jurisprudência desta Corte, a qual, no precedente citado, assim concluiu (REsp 39.886/SP):
"Responsabilidade civil. Lei de Imprensa. Dano moral indenizado acima da limitação imposta pelo art. 52 da Lei de Regência. Revogação da norma em face da Constituição em vigor. Depósito do art. 57, § 6 Q da mesma Lei. Descabimento de sua exigência em montante superior ao limite máximo fixado pela Lei em questão. Interpretação sistemática. Recurso desacolhido.
- O depósito prévio à apelação, no valor total da condenação imposta a título de indenização por dano moral advindo da atividade jornalística, foi concebido na
vigência de um sistema que previa a indenização tarifada. Adotando-se nas instâncias ordinárias indenização que ultrapasse esse valor máximo, há que se ter, por força de interpretação sistemática do dispositivo que impõe o depósito, por inaplicável também tal exigência." (DJ 03.11.97)
Ora ciente de tal precedente e ainda mais das decisões que nesta Egrégia Turma compreenderam que após a Constituição de 1988, liberou-se a indenização por dano moral, na espécie, da tarifação imposta pela Lei de Imprensa não há falar em exigir-se o depósito prévio da indenização nela fixada para a interposição da Apelação, eis que ambos não foram recepcionados.
Tal a hipótese dos autos e forte nos fundamentos deduzidos é que não conheço dos recursos.
VOTO
O SR. MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO: Senhor Presidente, esta Corte sabe que tenho posição já assentada nesta matéria. Entendo que aquela indenização tarifada corresponde ao depósito para o recurso. À medida que dispensamos a indenização tarifada, evidentemente que não se pode exigir o depósito.
Acompanho o eminente MinistroRelator.
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (lll): 151-206, novembro 1998. 175
RECURSO ESPECIAL Nº 88.375 - SP
(Registro nº 96.0009884-0)
Relator: O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro
Recorrentes: Regina Lúcia Lopes dos Santos e outros
Recorridos: Jefferson Antônio Lopes dos Santos, e Leonira de Fátima Lopes dos Santos e outro
Advogados: Drs. Paulo de Tasso Alves de Barros, Paulo Sérgio da Fonseca Santos e Cid Wagner da Silva
EMENTA: Interesse de agir.
Hipótese em que se pretende a anulação de partilha, judicialmente homologada, onde se incluiu imóvel de que, consoante o registro imobiliário, seriam proprietários os autores.
Existência de incerteza objetiva de que resulta o interesse em postular a anulação.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso especial e lhe dar provimento.
Participaram do julgamento os Srs. Ministros Waldemar Zveiter, Menezes Direito e Nilson Naves.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Costa Leite.
Brasília, 19 de maio de 1998 (data do julgamento).
Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Presidente. Ministro EDUARDO RIBEIRO, Relator.
Publicado no DJ de 17-08-98.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: Trata-se de ação declaratória de anulação de partilha de bens, ajuizada por Regina Lúcia Lopes dos Santos e outros. Figuram como réus Leonira de Fátima Lopes e outros. Alegam os autores que colacionado imóvel que não mais integrava o patrimônio deixado por Antônio Lopes dos Santos. Exibiram documentação referente a anterior transação, em que lhes fora alienado o referido bem.
A sentença deu pela carência da ação e, entendendo necessário, apreciou o mérito, julgando improcedente o pedido.
O acórdão, que julgou a apelação, está assim ementado:
"Cerceamento de defesa. Não ocorrência. Questão que envolve
176 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.
somente matéria de direito. Juntada de documentação suficiente a ensejar o julgamento antecipado da lide. Aplicabilidade do art. 330, inciso I, do CPC.
Condições da ação. Interesse processual. Inexistência de prejuízo ou dano. Ausência de lesão a direito subjetivo. Carência de ação caracterizada. Processo extinto. Aplicabilidade do art. 267, inciso VI, e § 3Q
, do CPC."
No especial os autores alegaram que desconsiderado o disposto nos artigos 3Q do CPC e 76 do Código Civil. Argumentaram que o acórdão impugnado se teria equivocado quando não lhes reconheceu interesse processual, não atentando que arrolado imóvel de exclusivo domínio dos recorrentes.
Recurso admitido, opinando o Ministério Público "pelo improvimento do presente Recurso Especial e manutenção do V. Acórdão Recorrido por ser a melhor Justiça."
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO (Relator): Arrolou-se em inventário determinado imóvel, que teria sido vendido aos autores, filhos do de cujus, sendo, em conseqüência, incluído na partilha judicialmente homologada. O acórdão entendeu faltar interesse para pleitear a anulação dessa, uma vez que o domínio do bem resultava do registro imobiliário, que continuava
em nome dos autores. Enquanto esse existisse, não seria possível registrar o formal de partilha.
Embora exata a observação de que o registro subsistiria até que fosse desconstituído por ação própria, não me parece, data venia, correta a conclusão.
Como observou o julgado recorrido, por certo que a Jurisdição não se movimenta para responder a consultas acadêmicas, sendo mister a existência de um dano ou de um perigo de dano que possa ser reparado ou evitado medinte o processo. O interesse supõe a necessidade do provimento jurisdicional para alcançar essa finalidade.
O equívoco do acórdão, a meu sentir, reside em ter limitado o prejuízo, no caso, à perda da propriedade. Considero que outro bem jurídico, igualmente merecedor de tutela, encontra-se atingido. Com a homologação da partilha e conseqüente expedição de formal, criouse para os autores situação de incerteza objetiva. Imóvel de que se consideram proprietários passou a figurar, em instrumento público, como pertencendo também a terceiros. Essa incerteza objetiva acarreta-lhes dano ou, ao menos, perigo de dano. Mencione-se, apenas como exemplo, a dificuldade em realizar qualquer negócio envolvendo aquele bem.
E que a incerteza é bastante para que exista o interesse, demonstra o induvidosamente a própria admissibilidade do pedido de declaração negativa. Ahipótese é a isso assimilável.
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 177
Tenho como violado o disposto no artigo 3Q do Código de Processo Civil, razão por que conheço do recurso e dou-lhe provimento para que, no egrégio Tribunal de origem, se prossiga no julgamento da apelação, superado o óbice que levou a extinguir-se o processo.
VOTO
O SR. MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO: Se-
nhores Ministros, estou de acordo com o Senhor Ministro-Relator, porque, na realidade, existe um duplo documento: o primeiro, no registro de imóveis, dando a propriedade do bem aos autores, e o formal de partilha incluindo esse mesmo imóvel.
Como disse o Senhor MinistroRelator, existe uma incerteza objetiva, clara, insofismável, sobranceira a qualquer dúvida razoável, a justificar o interesse processuaL
Conheço do recurso e o provejo.
RECURSO ESPECIAL NQ 101. 739 - DF
(Registro nQ 96.0045879-0)
Relator: O Sr. Ministro Waldemar Zveiter
Recorrente: Paulo Octávio Investimentos Imobiliários Ltda.
Recorridos: Marlene Rodrigues de Oliveira e outros
Advogados: Drs. Roberto Luiz de Barros Barreto e outros, e Hebert da Silva Tavares e outros
EMENTA: Compromisso de compra e venda - Imóvel - Índice de reajuste - Financiamento - Pacto - BTN - IPCC - Dissídio - Caracterização.
I - Tendo sido o índice IPCC livremente pactuado entre as partes como substitutivo, deve ele ser aplicado, em respeito à avença.
II - Recurso conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Senhores Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na con-
formidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso especial e lhe dar provimento. Participaram do julgamento os Senhores Ministros Menezes Direito e Eduardo Ri-
178 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.
beiro. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Costa Leite e Nilson Nave.s.
Brasília, 04 de agosto de 1998 (data do julgamento).
Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Presidente. Ministro WALDEMAR ZVEITER, Relator.
Publicado no DJ de 14-09-98.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER: Cuida-se de ação ordinária ajuizada por Marlene Rodrigues de Oliveira e outros em desfavor de Paulo Octávio - Investimentos Imobiliários Ltda., com o objetivo, dentre outros, de condenar a Ré à devolução de quantias pagas a mais que o contratualmente devido, referente a reajustamento de parcelas do financiamento para aquisição de unidades habitacionais, com base em índice não contratado, o VRF (valor de referência de financiamento).
A r. sentença monocrática julgou parcialmente procedente o pedido, condenando a Ré a ressarcir os Autores dos valores aplicados no financiamento em face da adoção de índice de reajuste estranho ao pactuado, devendo os mesmos ser calculados até 28/02/91 pelo BTN e, após essa data, pela TR. (fls. 183/190).
Ambas as partes interpuseram recurso de apelação, tendo a Egrégia Quarta Turma do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, à una-
nimidade de votos, dado parcial provimento ao apelo da Ré e desprovido o dos Autores, em aresto assim ementado (fls. 235):
"Apelação_ Compra e venda -Financiamento_ ImóveL Corre-. ção. Juros. Confissão de dívida adicional. Sucumbência recíproca. Honorários.
- Durante a vigência do BTN como índice de correção pactuado, outro não se lhe pode substituir. Extinto esse, o a ser adotado é aquele que veio substituí-lo, nos termos do contrato, devendo, por conseguinte, ser a TR.
- A estipulação expressa, no contrato, dejuros compensatórios, em 1% ao mês, não é ilegal.
- Inexistindo vício maculador da manifestação de vontade, improcede a pretensão anulatória do ato jurídico de confissão da dívida adicional.
- Sendo recíproca a sucumbência, cada parte deve suportar a verba dos seus respectivos advogados."
Ainda in conformada, Paulo Octávio Investimentos Imobiliários Ltda, interpõe Recurso Especial, sustentando ocorrência de dissídio jurisprudencial com o REsp nº 36.162-11 SP e com o decidido naADIn nº 493-0/600.
Com contra-razões (fls. 260/265), o apelo foi admitido (fls. 267) e encaminhado a esta Corte.
É o relatório.
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (IH): 151-206, novembro 1998. 179
VOTO
O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER (Relator): Pelo que se depreende dos autos e pode-se constatar às fls. 16 (instrumento particular de promessa de compra e venda), convencionaram as partes a correção das parcelas do financiamento pela variação do BTN ou, no caso de sua extinção, pelo índice que viesse a sucedê-lo ou pelo IPCC.
O acórdão recorrido, ao adotar como índice a TR, dissentiu de inúmeros julgados desta Corte que, após o julgamento da ADIn referida no Especial, afirmaram não ser a TR índice de correção monetária, mas sim de remuneração de capital (REsp n Q 110.785/SP, DJ 04/5/98, de minha relatoria e EREsp 64.712/SP, Relator Sr. Ministro William Patterson, DJ 26/2/96).
E, tendo sido o índice IPCC livremente pactuado entre as partes como substitutivo, deve ele ser aplicado, em respeito ao avençado consoante o também decidido no REsp n Q 36.162-1/SP, apontado no Especial como aresto paradigma.
Esta é a orientação prevalente em ambas as Turmas da Seção de Direito Privado, de que são exemplos os seguintes julgados:
"Contrato de compra e venda. Índice substituto. Previsão contratual. Precedente da Corte.
1. Havendo a previsão de índice substituto no contrato, assim o setorial, não há razão alguma para afastá-lo, merecendo respeitado o pacto.
2. Recurso especial conhecido e provido." (REsp n Q 120.670IDF, Relator Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, DJ de 25/ 05/98).
"Promessa de venda e compra. Fator de atualização eleito pelos contraentes em hipótese de extinção do indexador oficial. Impossibilidade de adoção, como tal da "TR".
Não constituindo a TR (Taxa Referencial) fator de atualização monetária, era insuscetível de ser tida como mero substitutivo do BTNF e, conseqüentemente, não podia ser empregada, como tal, no reajustamento das parcelas avençadas. Reconhecimento da infração contratual cometida pelos promitentes-vendedores.
Recurso especial conhecido e provido, em parte." (REsp n Q
74.658/SP, Relator Sr. Ministro Barros Monteiro, DJ de 24/06/96).
Pelo exposto, conheço do recurso pela caracterização do dissídio pretoriano e dou-lhe provimento para determinar a aplicação do IPCC, tal como pactuado.
É o meu voto.
180 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.
RECURSO ESPECIAL NQ 112.561 - RJ
(Registro n Q 96.0070003-6)
Relator: O Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito
Recorrente: Editora O Dia Ltda.
Recorrido: Luiz Henrique Marinho Pires
Sustentação Oral: Dr. Joseual Sirqueira (pela recorrente)
Advogados: Drs. Joseual Sirqueira e outros e Celso Pereira de Andrade
EMENTA: Indenização por danos morais. Publicação emjornal. Condenação em valor inferior ao indicado na inicial. Sucumbência parcial não caracterizada.
1. O quantum pedido a título de indenização por danos morais, neste caso, tem natureza estimativa, assim, a condenação em valor inferior, por si só, não caracteriza a sucumbência recíproca.
2. Recurso especial não conhecido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Senhores Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por maioria, não conhecer do recurso especial, vencidos os Senhores Ministros Costa Leite e Eduardo Ribeiro. Participaram do julgamento os Senhores Ministros Costa Leite, Nilson Naves, Eduardo Ribeiro e Waldemar Zveiter.
Brasília, 10 de novembro de 1997 (data do julgamento).
Ministro COSTA LEITE, Presidente. Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Relator.
Publicado no DJ de 15-06-98,
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO: Cuida-se de Recurso Especial interposto pela Editora O Dia Ltda., com base no artigo 105, inciso IIl, alíneas a e c, da Constituição Federal, contraAcórdão proferido pela 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, assim ementado, verbis:
"Ação Ordinária - Reparação de danos - Ato lesivo à honra -Danos morais - Estampando, em primeira página, foto do autor. Oficial da Polícia Militar, atribuindo-lhe participação em matança de menores, não há dúvida de que tal publicação afrontou-lhe a honra, lesionando a sua reputação, mesmo com a correção
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 181
posterior - Indenização cabível, -eXigível e pertinente a título de danos morais - Quantitativo adequad~ - Sentença correta - Apefu não provido." (fls. 150)
Houve embargos de declaração (fls. 153 a 155), acolhidos mediante a seguinte fundamentação:
"Embora haja indicação de quanti~vo indenizatório na inicial, .
• 6 que importa considerar é que a ação foi julgada integralmente procedente, só se podendo ter por vencida uma das partes, não sendo caso, na espécie, de se aplicar a regra do artigo 21 do CPC, ainda que a indenização seja aquém da inicialmente pretendida.
A fim de que tal fique declarado, dá-se acolhida aos embargos ofertados." (fls. 159)
Sustenta o recorrente que o Tribunal a quo violou a norma do artigo 21 do Código de Processo Civil, eis que teria havido sucumbência recíproca, devendo os honorários e as custas ser repartidos proporcionalmente (fls. 162 a 173).
Para comprovar a divergência jurisprudencial, traz julgados desta Corte e do Supremo Tribunal Federal.
Houve contra-razões (fls. 202 a 204) e o recurso especial foi admitido (fls. 206 a 208), subindo os autos a esta Corte (fls. 209-verso).
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO (Relator): O recorrido propôs ação de indenização por danos morais contra o recorrente, que publicou em periódico a foto daquele como sendo um dos acusados de matar menores no centro do Rio de Janeiro.
Pediu o autor indenização não inferior a 400 (quatrocentos) salários mínimos vigentes à época do pagamento (fls. 05), tendo a sentença, mantida em segundo grau, condenado o réu a pagar importância equivalente a 5.000 (cinco mil) URV's (fls. 79).
Para justificar o pedido de incidência da norma do art. 21 do Código de Processo Civil, pertinente à sucumbência recíproca, diz o recorrente, no especial datado de 06.05.96, que 5.000 (cinco mil) URV's equivaleriam a apenas 77 (setenta e sete) salários mínimos.
Mas não há como se acolher a irresignação do recorrente.
O valor de 400 (quatrocentos) salários mínimos a título de dano moral não tem qualquer parâmetro, constituindo, na verdade, pedido aleatório, cujo acolhimento dependeria da avaliação subjetiva, pelo Juiz, das circunstâncias fáticas da causa.
Conclui-se, com isso, que o valor pedido na inicial é meramente estimativo e a condenação em importância inferior àquele não enseja sucumbência recíproca, devendo o réu arcar com a totalidade das custas e dos honorários advocatícios.
182 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.
Sobre o tema, trago o seguinte precedente desta Turma:
"Indenização. Valor estimativo. Sucumbência parcial.
Sendo meramente estimativo o valor da indenização pedida na inicial, não ocorre a sucumbência parcial se a condenação fixada na sentença é inferior àquele montante." (REsp n Q 21.696-9/SP, 3ª Turma, Relator Ministro Cláudio Santos, DJ de 21.06.93)
Assinale-se que a divergênciajurisprudencial não está comprovada porque o recorrente não demonstra a semelhança fática necessária.
Ante o exposto, não conheço do recurso especial.
RETIFICAÇÃO DE VOTO -VENCIDO
O SR. MINISTRO COSTA LEITE: Srs. Ministros, vou pedir vênia para dissentir do douto voto de S. Exa. Penso que não haja aqui simples estimativa, eis que se timbrou o proveito econômico, pedindo-se indenização não inferior a quatrocentes salários mínimos. Se a indenização não alcançou tal soma, há sucumbência, data venia.
VOTO
O SR. MINISTRO NILSON NAVES: Sr. Presidente, de acordo com o voto que proferi no REsp-71.576/ RS, peço vênia para acompanhar o voto do Sr. Relator.
VOTO - VENCIDO
O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: Sr. Presidente, embora na hipótese invocada pelo eminente Relator tenha acompanhado o Sr. Ministro Cláudio Santos, o meu entendimento, realmente, fixou-se no julgamento do Recurso Especial n Q
7l.576/RS, a que fez referência o Sr. Ministro Nilson Naves.
O certo é que há uma dificuldade em relação ao tema, dada a própria fluidez, quando se trata de estabelecer o valor de dano moral.
Recomenda-se que, quando da fixação desses honorários, se aja realmente com eqüidade, muita moderação, tenha em conta cuidadosamente as circunstâncias.
O que não se pode é deixar de ter em conta que houve uma sucumbência por parte do autor. Se ele pediu quatrocentos e lhe foi dado setenta, é evidente que sucumbiu. Isso não há de ser simplesmente ignorado. É preciso que as partes tenham um pouco mais de ponderação, quando se trata de formular tais pedidos, não os fazendo em quantitativos exagerados.
Acompanho o Sr. Ministro Costa Leite.
VOTO
O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER: Sr. Presidente, peço licença a V. Exa. e ao eminente Ministro Eduardo Ribeiro para ficar com o ponto de vista q[ue já tenho manifestado, tanto no precedente
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 183
citado do Recurso Especial nº 21.696/ SP, Relator o Sr. Ministro Cláudio Santos, quanto no julgamento do Recurso Especial nº 71.576, de que foi relator o Sr. Ministro Nilson Naves. Neste último, relembrado agora no voto-vista de S. Exa., ficou patente que ali o pedido formulado também fora certo, em quantia adredemente fixada pelo autor.
N este caso que estamos julgando, embora considere relevantes os fundamentos deduzidos no recurso, e pelo nobre advogado, da tribuna, que recebeu o eco de Suas Excelências, os Srs. Ministros Presidente e Eduardo Ribeiro, em verdade, o que
consigo extrair é que o pedido também foi meramente estimativo. Temos que reconhecer que a nossajuris prudência oscilou na matéria sobre ser possível ou não ao autor formular o pedido relegando ao juízo o arbitramento do seu quantitativo, cuidando-se de indenização por dano moral. Hoje evoluímos para admitir essa espécie. Dos autos extraio que o pedido formulado pelo autor foi, como disse, meramente estimativo.
Assim sendo, peço venla para acompanhar os votos dos Srs. Ministros Relator e Nilson Naves.
RECURSO ESPECIAL Nº 120.404 - GO
(Registro nº 97.0011920-3)
Relator: O Sr. Ministro Nilson Naves
Recorrentes: Geraldo Dias e cônjuge
Recorridos: Economia Crédito Imobiliário S/A - Economisa e outro
Advogados: Drs. Isaú dos Santos, e Francisco Carlos Dantas e outros
EMENTA: Reivindicatória. Usucapião e anulatória. 1. Conexão. Julgada uma das ações (no caso, duas foram), desaparece o motivo da reunião dos processos. Não é importante, em caso tal, haver apelação, porque "a conexão somente ocorre na mesma instância" (CC-3.075). Inocorrência de decisões contraditórias, tendo os processos tramitado perante o mesmo juízo. 2. Matéria de prova, quanto à alegação de afronta ao art. 524 do Cód. Civil (Súmula 7). Falta de prequestionamento. 3. Recurso especial não conhecido.
184 R. sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do recurso especial. Afirmou suspeição o Sr. Ministro Eduardo Ribeiro. Participaram dojulgamento os Srs. Ministros Waldemar Zveiter, Menezes Direito e Costa Leite.
Brasília, 10 de março de 1998 (data do julgamento).
Ministro COSTA LEITE, Presidente. Ministro NILSON NAVES, Relator.
Publicado no DJ de 27-04-98.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO NILSON NAVES: A sentença de fls. 708/716, acolhendo o pedido reivindicatório, determinou aos réus que restituíssem o imóvel descrito na inicial. Entraram eles com embargos de declaração, dizendo que a sentença se omitira (por exemplo, quanto à existência de outras ações), e logo após, antes que o juiz se pronunciasse a respeito dos embargos, eles apelaram, e os autos subiram ao Tribunal, mas, antes, disse o juiz, no despacho em que ordenou a subida, que os embargos eram protelatórios.
No Tribunal, à apelação negouse provimento, em acórdão assim ementado:
"Reivindicatória. Cerceamento de defesa inexistente. 1 - Em se tratando de ação reivindicatória, mister se faz que o autor apresente instrumento hábil que caracterize que a res reivindicatória lhe pertença, que haja descrição da área individualizada e que prevaleça o seu domínio sobre a alegada posse justa ou injusta do réu.
Preenchidos tais requisitos,julga-se procedente o pedido reivindicatório. 2 - Inexiste cerceamento de defesa, face ao indeferimento de realização de nova perícia, já que o Juiz não está adstrito ao laudo pericial e só a ele caber avaliar a necessidade de nova perícia. Apelo conhecido e improvido."
Os réus interpuseram recursos extraordinário e especial. Neste, a par do art. 524 do Cód. Civil e de textos constitucionais, os recorrentes apontam dispositivos processuais, alegando, quanto a esses, o seguinte:
"Assim, o julgamento da reivindicatória isoladamente, sem apreciação da anulatória, processo em apenso, e sem deferir a reunião da ação de usucapião em curso pelo mesmo douto juízo e cartório, veio afrontar dispositivo de lei federal, o contido no artigo 103 do Código de Processo Civil, ... "
" ... Por não pronunciar a douta sentença sobre todas as questões
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 185
postas pelos recorrentes, data venia, negou vigência aos artigos 458 e 459 do Código de Processo CiviL"
o recurso especial foi admitido, visto que, segundo o despacho de fls. 881/4,
" ... Cabia, pois, ao Tribunal decidir sobre a existência ou não de conexão entre a ação reivindicatória e a ação de usucapião e, no caso afirmativo, cassada a sentença, determinar a reunião das ações, a fim de que sejam decididas simultaneamente, como prevê o art. 105 do CPC."
o recurso extraordinário não foi admitido. Não houve agravo.
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO NILSON NAVES (Relator): Pretendem os recorrentes seja ordenada a reunião das ações, a fim de que sejam decididas simultaneamente. Neste ponto, decidiu o acórdão da seguinte forma:
"Por último, a existência de outras ações conexas a esta (anulatória de títulos e de usucapião) não tem o condão de desconstituir os títulos de propriedade apresentados pelas autoras, pois, além delas terem sido protocoladas após a proposição da presente demanda, ou seja, em 22.11.93, (fls. 755) e em 01.02.93 (fls. 761), respectivamente, as mesmas ain-
da se encontram sub judice, conforme informações prestadas pelo insigne Magistrado de 1 º Grau (fls. 803 e 805), não restando caracterizada assim, a coisa julgada."
À época do julgamento da apelação, o Juiz de Direito de Luziânia prestara ao Tribunal as seguintes informações:
"Conforme requisitado no Ofício nº 026/96, datado de 22.03.96, passo a prestar as informações referentes àAção Ordinária Anulatória nº 1. 7 55/93, requerida por Geraldo Dias em desfavor de Economia - Créd. Imob. S/A -Economisa, sendo que a mesma foi julgada improcedente em 08.05.96 e com relação à Ação de Usucapião nº 1.218/93 em que Geraldo Dias move em desfavor de Economia - Créd. Imob. S/A Economisa e Vila Verde S/A -Arquitetura, Engenharia e Paisagismo, tendo sido protocolizada em 01.02.93 e em audiência de justificação designada para o dia 21.09.93 foram julgados os autores carecedores de ação com a conseqüente extinção do processo. Foram interpostos embargos de declaração e depois apelação havendo o Tribunal reformado a decisão, estando o processo aguardando manifestação da parte autora para que a mesma requeira a citação da parte. Informo mais da existência do Mandado de Segurança nº 7.130-1/101 em que é relator M. W. de Oliveira N egry."
186 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.
Ora, a ação ordinária anulatória estava julgada por sentença. Por isso, ao admitir o recurso especial, disse o Presidente Sabino de Freitas que essa ação era de ser afastada da discussão dos autos, porquanto, e aí citou Theotonio Negrão, "deixa de existir conexão quando uma das causas já foijulgada", mas acrescentou:
"O usucapião, alegado em defesa na contestação (fls. 75, 1 Q
voI.) e por meio de ação própria, não foi apreciado. A omissão da sentença de fls. 708/716 deu causa aos embargos de declaração de fls. 724/729, que mereceram do dirigente do processo o despacho ilegível de fls. 790. Na apelação de fls. 731-735, os ora recorrentes pediram que o Tribunal apreciasse os embargos de declaração e anulasse a sentença, por cerceamento de defesa. O acórdão não examinou o usucapião alegado em defesa na contestação e, data venia, examinou incorretamente a ação de usucapião. Com efeito, não é correta a afirmação de que a ação conexa de usucapião não tem o condão de desconstituir os títulos de propriedade apresentados pelas autoras e que tendo a referida ação sido protocolizada após a ação reivindicatória e estando sub judice, não há coisa julgada, quando de coisa julgada não se trata e, sim, de conexão. A ação conexa de usucapião, se acolhida, desconstitui o título de propriedade dos reivindicantes: ... "
Efetivamente, há precedentes segundo os quais "Não há conexão que poderia determinar a reunião :-dos processos, se um deles já se achajulgado, sem relevo a circunstâll.ciade haver apelação, posto que a:ctm-exão somente -ocorre na mesma instância. Destaca-se afacultatividade da reunião de processos conexQs" (CC-3.075, Sr. Ministro Dias Trindade, DJ de 14.9.92). De igual modo, CC-15.824, Sr. Ministro Gomes de Barros, DJ de 9.9.96. Em tal asp~cto, estou, portanto, de acordo com o Presidente Sabino de Freitas.
N o que concerne ao usucapião, que se diz argüido em defesa (tenho dúvidas se o foi, porque os então contestantes cingiram-se, ao final da resposta, em dizer "que a somatória de tempo para efeitos de posse já autoriza o usucapião, que por si só descaracteriza o domínio pretendido pelas autoras", o que me parece insuficiente em se tratando de defesa admitida pela Súmula 237/STF), desta questão, admitindo-se que tenha sido suscitada pela parte, não cuidou o acórdão que se deseja reformar, nem lhe foram opostos embargos de declaração (Súmulas 282 e 356/STF). Além disso, o recurso, no particular, é deficiente, não indicando nem texto de lei violado nem dissídio jurisprudencial (Súmula 284/STF).
Quanto à reunião das ações, afim de que fossem decididas simultaneamente, tal não era possível, materialmente, levando-se em conta que a reivindicatória já corria desde 1989, sentenciada que foi em 21.3.93, ao passo que a ação de usucapião só foi
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 187
,.
ajuizada em 1.2.93, e veio a ser despachada um dia após proferida aquela sentença. Mas as ações tramitaram perante o mesmo juízo, e nelas ao que tudo indica o mesmo juiz proferiu sentença. Em sendo assim, risco não houve de que pudesse haver julgamento contraditório: que fossem proferidas decisões contraditórias. O ideal e recomendável, em casos assim, é que o julgamento do usucapião preceda ao da reivindicatória. Isto aqui não era possível, como se viu. Por isso, não deparo com a alegada ofensa ao art. 103. Nem se invocou o art. 105. Cabia aos recorrentes, já na contestação, terem enfaticamente se defendido, argüindo, de modo claro e objetivo, o usucapião, ou terem ajui-
zado em melhor tempo a ação de usucapião, de modo que ambas as ações corressem ao mesmo tempo. Nada disto foi feito. Não podem eles agora se queixar da circunstância de uma ação ter sido julgada antes da outra. Ora, o conceito segundo o qual, julgada uma das ações, desaparece a finalidade da reunião, aqui também se aplica.
Quanto ao mais, falta cabimento ao recurso: sobre o art. 524 do Cód. Civil, a questão suscitada não é tipicamente de direito, por notoriamente envolver matéria probatória (Súmula 7); sobre os arts. 458 e 459, faltou-lhes prequestionamento, a propósito da questão ora levantada.
Não conheço do recurso especial.
RECURSO ESPECIAL Nº 123.676 - SP
(Registro nº 97.0018149-9)
Relator: O Sr. Ministro Waldemar Zveiter
Recorrente: Voith S/A Máquinas e Equipamentos
Recorrido: Francisco Carneiro de Oliveira
Advogados: Drs. Orlando Machuca e Marcelo Cortona Ranieri
EMENTA: Processual Civil- Apelação - Instrumento de mandato apresentado no ato de sua interposição.
I - Em face da sistemática vigente (CPC, art. 13), o juiz não deve extinguir o processo por defeito de representação antes de ensejar à parte prazo para suprir a irregularidade, sendo que a intimação para tal fim deve ser feita em seu nome, pessoalmente, e não em nome do advogado, que não se sabe, até então, se realmente a representa.
188 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.
U - o atual Código de Processo Civil prestigia o sistema que se orienta no sentido de aproveitar ao máximo os atos processuais, regularizando sempre que possível as nulidades sanáveis.
lU - Tem-se como sanada a irregularidade de representação judicial da parte, quando ofertado o instrumento de mandato no ato de interposição do recurso de apelação.
IV - Recurso conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Senhores Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso especial e lhe dar provimento. Participaram do julgamento os Senhores Ministros Menezes Direito e Eduardo Ribeiro. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Costa Leite e Nilson Naves.
Brasília, 4 dejunho de 1998 (data do julgamento).
Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Presidente. Ministro WALDEMAR ZVEITER, Relator.
Publicado no DJ de 10-08-98.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER: Cuidam os autos de Ação de Reparação de Danos por ato ilícito proposta por Francisco Carneiro de Oliveira contra Voith SI A Máquinas e Equipamentos.
A contestação foi apresentada dentro do prazo legal, desacompa-
nhada, no entanto, do instrumento de mandato, tendo o d. Juiz assinalado prazo de cinco dias para a competente regularização da representação processual (fls. 159).
Dito despacho, publicado pela imprensa oficial em nome do causídico da empresa, restou inatendido, o que motivou, na sentença, o decreto de revelia, tendo a ação sido julgada parcialmente procedente.
Em sede de apelação alegou o vencido que a revelia não poderia ter sido decretada, pois apresentou no prazo a contestação e o comprovante do pagamento da taxa da Carteira de Previdência dos Advogados de São Paulo, faltando apenas o instrumento do mandato; que as intimações em nome de seu patrono não chegaram ao alcance deste e que seu representante legal não foi intimado sobre o prosseguimento do feito, com a advertência da pena de decretação da revelia (fls. 166/168).
A Oitava Câmara de Direito Privado do Colendo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, à unanimidade, negou provimento ao apelo, ao entendimento de que desnecessária a intimação pessoal da parte para regularização da representação de seu advogado (fls. 191/194).
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 189
Inconformada, interpôs a recorrente Recurso Especial, com base no art. 105, UI, a e c, da Constituição, alegando negativa de vigência do art. 37 do CPC. Sustenta, em síntese, que a irregularidade é absolutamente sanável e que a intimação para a regularização da represEmtação processual deveria ter sido feita pessoalmente ao representante legal da empresa-ré. Aponta dissídio jurisprudencial, trazendo à colação o REsp nº 29.223-6/SP (fls. 198/202).
Com contra-razões (fls. 205/207), o nobre Terceiro Vice-Presidente daquele Tribunal o admitiu (fls. 209/ 210).
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER (Relator): O Acórdão está, assim, sumariado por sua ementa (fls. 192):
"Revelia - Instrumento de mandato apresentado somente com o apelo - Desnecessária a intimação pessoal da parte para regularização da representação de seu advogado - Recurso improvido. "
As razões dessa decisão estão deduzidas pelo enllnente Relator, nestes termos (fls. 193/194):
"Como se comprova pelo substabelecinumto de fi. 169 trazido conl as razões de apelação, os ad-
vogados da ré estavam constituídos desde 13 de junho de 1994, tendo oferecido a contestação ao feito tempestivamente em 7 de julho daquele ano (fl. 22), deixando no entanto de instruí-la com a procuração exigida pelo art. 37 do Código de Processo Civil, mantendo-se inertes mesmo depois de intimados conforme publicação de fl. 161 a regularizar sua representação nos autos no prazo de cinco dias assinado pelo Meritíssimo Juiz.
Não colhe o argumento do apelo, segundo o qual o ínclito Magistrado havia de conferir a dilação de quinze dias para a regularização da representação, tal como prevista na segunda parte do referido dispositivo legal. É que semelhante ressalva da lei processual não se aplica à hipótese em causa por três argumentos: primeiro porque, no caso, não se configura a necessidade de evitar decadência ou prescrição, nem se cuida de prática de atos urgentes; segundo porque, nada obstante ter o Meritíssimo Juiz fixado o prazo de cinco dias, a dilação de quinze dias prevista em lei é automática (Theotonio Negrão, nota 6c ao artigo 37 do Código de Processo Civil) e, podendo ter sido cumprida nesse interstício não o foi, visto como o instrumento de mandato somente foi trazido com o apelo, terceiro porque, assim como a ré, por seu advogado, foi intimada da r. sentença pelo Diário Oficial, tanto que dela recorreu no prazo, assim também se operou a inti-
190 R. Sup. Trib. Just., Brasilia, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.
mação pela imprensa quanto à providência omitida, referente à regularização da representação.
N em há falar-se, como pretende a apelante, de intimação pessoal da parte para que regularize representação de seu advogado, e isso pelas razões acima expostas, além de que é o advogado e não a parte que, nos termos da norma de rito, não será admitido a procurar em juízo sem instrumento de mandato.
Nessas condições, não elidida a r. sentença pelas razões recursais, remanesce mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos.
Posto isso, pelo meu voto nego provimento à apelação."
Insurge-se a recorrente alegando que a parte deveria ter sido intimada pessoalmente a suprir o defeito da representação processual e também que: "Provado o fato da existência do instrumento de mandato, cabia ao E. Tribunal, face à relevância do assunto e de suas conseqüências, acolher o apelo no sentido de que a Recorrente tivesse a oportunidade de dar regular prosseguimento ao feito, em seus ulteriores trâmites e não estancá-lo decisivamente, a duras penas, considerando-se o fato mera irregularidade formal sanável". (fls. 201)
Com razão o recorrente.
Em verdade, assentado najurisprudência da Corte Especial o entendimento segundo o qual, a falta de instrumento de mandato constitui defeito sanável nas instâncias
ordinárias, aplicando-se, para o fim de regularização da representação postulatória, o disposto no art_ 13, do CPC, conforme assentado no REsp nº 50.538-0IRS - relator Sr. Ministro Costa Leite - RSTJ 681 383 e no EREsp nº 14.827IMG, julgado pela Eg. Segunda Seção, do qual fui relator para o acórdão que restou assim ementado:
"Processual Civil - Instrumento de mandato - Inexistência.
I -Assentado najurísprudência da Corte o entendimento no sentido de que, não apresentando o signatário do recurso de apelação o instrumento de mandato e não se valendo da faculdade prevista no art. 37 do CPC, deverá o Dr. Juiz marcar prazo razoável para que seja a falta suprida. Aplicação do disposto no art. 13, do mesmo diploma processual civil.
II - Embargos conhecidos e providos." (DJ de 09/05/94).
Portanto, nas hipóteses em que não apresentado o instrumento de procuração pelo apelante, deve o Magistrado-relator marcar prazo razoável para que seja a falta suprida. Se não cumpre a obrigação, então, não precisa sequer ser submetido o apelo à apreciação do Órgão Colegiado. Neste caso, deve ° Relator, de pronto, inadmíti-Io, simplesmente, já que o recebimento recurso não víncula o Tribunal quem (RE n f2 85.516/SP - DJ de 11.11.70). Esta é a correta exegese
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.
que se extrai do art. 13, do Código de Processo Civil.
Aqui a hipótese é outra.
Ao contrário do que entendera o Aresto, tenho que a irregularidade da representação postulatória foi sanada com a oferta do instrumento de mandato no ato da interposição do apelo, não obstante intimado o advogado da parte apelante pelo Dr. Juiz singular para esse fim; este fato, por si só, não tem o condão de invalidar o ato, porque tal intimação não foi efetuada pessoalmente ao representante da empresa-ré.
Tal como anotou o em. Ministro Athos Carneiro, ao proferir voto-vista nos Embargos de Divergência supracitado:
"O que a tradução literal do art. 37 do CPC está conduzindo, em última análise, é uma autêntica transformação do advogado em substituto processual das partes - e não em seu mero mandatário. Aquelas é que são os sujeitos de relação jurídica processual, por óbvio. E, por óbvio também, elas é que têm de pronunciar-se se o advogado, que se apresenta como defensor delas, foi por elas realmente constituído como tal. Daí a intimação dever ser dirigida a elas - que ratificam ou não um mandato, até então meramente subentendido, e que a partir daí passa a ser corporificado através do instrumento. Não propiciar às partes a decisão a respeito de seu patrono agride ao próprio princípio constitucional de ampla defesa.
"Ademais, é de se perguntarante o princípio teleológico do cui prodest?"
A quem aproveitaria anular-se uma demanda judicial, facilmente emendável? Ao Estado-Juiz, perpetuando-se os litígios que perturbam as relações sociais?l Aos próprios litigantes, que novamente teriam de reiniciar tudo de novo, por causa de uma mera nuga processual?
Daí, a compreensível exprobação da Suprema Corte, ao acolher o RE 82.932/MA (RTJ 86/853), contra a que chama de fetichismo das formas; tanto mais quanto
"O Código de Processo Civil..., infenso ao fetichismo formal, admitindo o suprimento ou repetição dos atos defeituosos, ainda que cominada pena de nulidade, se não há prejuízo para as partes ... "
De concluir-se, pois, que o digno Relator não poderia ter negado provimento ao apelo, posto que, em hipóteses tais, a regularização de nulidades sanáveis, o suprimento destas haverá de ser feito onde praticado o ato; procedimento este que nenhum prejúízo acarreta à parte adversa.
De ressaltar, ainda, que o demandante não deve responder por eventuais erros procedimentais de seu advogado; como no caso versante, ao deixar de sanar no momento oportuno, a nulidade constatada.
Não tenho como válida a assertiva posta no Aresto de que a intima-
192 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.
ção deve ser dirigida à pessoa do patrono da parte.
Ao contrário, neste caso, a intimação deve ser dirigida às partes que, na verdade, são sujeitos da relação jurídica processual; e não ao advogado, que é mero mandatário. A elas cabe o direito de pronunciarse se o advogado, que se apresenta como seu defensor, foi, realmente, por elas constituído como tal. Daí porque reafirma-se, deve a intimação ser dirigida a elas, que ratificam ou não um mandato, até então meramente subentendido, e que a partir desse ato se corporifica ou se consolida através do instrumento. Não propiciando às partes o direito de manifestar-se no pertinente à pessoa de seu patrono, constitui
ofensa ao princípio constitucional de ampla defesa (REsp nº 52.904-21RS - DJ de 06102195).
Tenho, pois, por comprovado o dissídio com o REsp 9.223-61 SP -ReI. Min. Costa Leite (fls. 201) e que o Aresto, ao decidir como o fez, violou a norma inscrita no art. 37, do CPC, discrepando da orientação sedimentada na jurisprudência da Corte.
Ante o exposto, conheço do recurso e dou-lhe provimento para, cassado o Acórdão recorrido e a sentença que decretou a revelia do réu, aplicando o direito à espécie e suprida que está a representação, determinar que a ação prossiga, como de direito.
É o meu voto.
RECURSO ESPECIAL Nº 135.633 - RJ
(Registro nº 97.0040113-8)
Relator: O Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito
Recorrente: Viação Aérea São Paulo SI A - VASP
Recorridos: Fábio Pereira Nunes Medeiros - menor impúbere e outro
Representado por: José América Cabral Medeiros
Interessada: Companhia de Seguros do Estado de São Paulo - COSESP
Advogados: Drs. Ana Lúcia Barbetti e outros, e Mauro Attílio Mellone e outros
EMENTA: Acidente aéreo. Indenização tarifada. Regimejuridico anterior. Culpa grave. Constituição de capital. Precedentes da Corte.
1. Considerando o quadro que suportou a identificação da culpa grave, não há como buscar interpretação divergente daquela aco-
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 193
lhida pela Corte Especial em precedente que contemplou a exceção ao sistema da indenização tarifada diante do dolo genérico, incluindo, pois, o dolo eventual.
2. Não há razão suficiente para a constituição de capital, ademais da inclusão dos beneficiários na folha de pagamento, quando a questão da solvabilidade da devedora não foi considerada pelo Acórdão recorrido.
3. Recurso especial conhecido e provido, em parte.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Senhores Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer em parte do recurso especial e, nesta parte, dar-lhe provimento. Participaram do julgamento os Senhores Ministros Costa Leite, Nilson Naves e Eduardo Ribeiro. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Waldemar Zveiter.
Brasília, 16 de abril de 1998 (data do julgamento).
Ministro COSTA LEITE, Presidente. Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Relator.
Publicado no DJ de 08-06-98.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO: Trata-se de recurso especial interposto por Viação Aérea São Paulo S/AVASP, com fundamento nas alíneas a e c do permissivo constitucional, contra Acórdão proferido pela 8ª Câ-
mara do Tribunal de Alçada Cível do Estado do Rio de Janeiro, cuj a ementa é a seguinte:
"Responsabilidade civil.
Acidente aeronáutico.
Indenização de direito comum pleiteada pelos filhos menores da vítima.
Falecimento de Comissária de Bordo, juntamente com todos os ocupantes da aeronave, em acidente ocorrido na Serra de Aratanha, Estado do Ceará.
Competência do Tribunal de Alçada fixada pelo Egrégio Tribunal de Justiça.
A indenização de direito comum não está excluída do âmbito do direito aeronáutico, a exemplo do que ocorre nas hipóteses de acidente do trabalho (Súmula do STF, Verbete n Q 229).
Evidenciando a prova dos autos que o acidente decorreu de culpa grave dos prepostos da empresa aérea, a indenização deve ser ampla, não incidindo os limites previstos na legislação especial.
Provimento parcial do recurso da empresa aérea (VASP), para re-
194 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.
duzir o pensionamento a 2/3 da remuneração da vítima; bem como para determinar que os honorários advocatícios incidam sobre o montante das prestações vencidas e uma anuidade das vincendas.
Desprovimento dos recursos da Seguradora (COSESP) e do Instituto de Resseguros do BrasilIRB." (fls. 56)
Sustenta a recorrente que oAcórdão recorrido contrariou os artigos 103, 106, 150, 248 e 257 do Decreto-Lei nº 32/66 (Código Brasileiro do Ar) e os artigos 20, § 5º, 602 e 620 do Código de Processo Civil, na medida em que, equiparando a culpa grave ao dolo, deixou de aplicar a lei especial e determinou que a questão fosse apreciada à luz do Direito comum, afastando, assim, o limite da indenização, bem como o prazo decadencial para o ajuizamento da ação. Alega, também, que como empresa solvente, é dispensável a constituição de capital, sendo cabível optar por uma garantia menos gravosa. Sustenta, ainda, que deve ser aplicado à hipótese, o Decreto-Lei nº 32/66 (Código Brasileiro do Ar), legislação vigente à época do fato, em obediência ao princípio da irretroatividade da lei. Indica arestos desta Corte e de outros Tribunais para comprovar a divergência jurisprudencial.
Houve contra-razões e o recurso especial não foi admitido, subindo os autos a este Tribunal em razão de provimento dado a agravo de instrumento, em despacho de minha lavra.
Nesta instância, oficiou a ilustrada Subprocuradoria Geral da República no sentido do não-conhecimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO (Relator): Menores impúberes representados pelo pai ajuizaram ação de responsabilidade civil contra a empresa recorrente em decorrência do falecimento de sua mãe em acidente aéreo, sendo ela comissária de bordo. A sentença julgou procedente o pedido para condenar a ré "a pagar aos autores pensões vencidas desde a data do acidente, com base na remuneração da vítima, corrigida monetariamente e acrescida de juros de 1% ao mês, desde a data do evento até o limite da sobrevida provável da vítima, fixado em 65 anos. Julgou, ainda, procedente a denunciação para condenar a seguradora a ressarcir a ré nos limites da apólice de seguro. O recurso de apelação da empresa foi provido pelo Tribunal de Alçada Cível do Rio de J aneiro, para reduzir o valor do pensionamento a 2/3 da remuneração da vítima, bem como para determinar que os honorários advocatícios incidam sobre o montante das prestações vencidas e uma anuidade das vincendas.
O que o especial questiona, basicamente, é a aplicação do DecretoLei nº 32/66, em vigor à época, ou sej a, a indenização tarifada para os casos de danos decorrentes de aci-
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 195
dentes aéreos, presente o prazo decadencial de dois anos, que foi ultrapassado pelos recorridos. Esclarece o especial que o julgado recorrido considerou a culpa grave dos prepostos para afastar a incidência da lei especial. Cuida, ainda, da decadência e da constituição de capital.
A questão da decadência deve ser, desde logo, afastada porque não desafiada no Acórdão recorrido, baldio, portanto, de prequestionamento.
A questão da equiparação da culpa grave ao dolo para efeito da não aplicação da indenização tarifada tem sido examinada já pela Corte.
O Tribunal de origem considerou a culpa grave presente diante da prova dos autos, assim relatório do Ministério da Aeronáutica, por seu órgão especializado, que afirmou ter o Comandante, durante a descida, se desligado "de outros impulsos sensoriais, tais como observação da distância e da altitude (Fator Humano)" e, ainda, pelo planejamento deficiente da descida, pela ausência de "observância das regras de tráfego aéreo (não cumprimento das instruções do controle, não observância da altitude mínima de segurança e não manutenção da velocidade prevista para vôo em terminal abaixo de 10.000 pés)", com o que restou configurado "grave indisciplina de vôo", ademais de ter havido "falta de disciplina na cabine" e ausência de "cumprimento das normas operacionais da empresa".
Em recentíssimo precedente, posterior ao precedente da Corte Es-
pecial que admitiu que o "art. 106 do Decreto-Lei n Q 32, de 1966, contempla como exceção ao regime da indenização tarifada o dolo genérico, incluindo, pois, o dolo eventual" (Embargos de Divergência n Q 6.052-SP, Relator designado o Senhor Ministro Pádua Ribeiro), decidiu esta Corte, Relator o Senhor Ministro Eduardo Ribeiro que a culpa grave só poderá ser equiparada ao dolo "quando reveladora de descaso flagrante, de absoluto desprezo pela segurança. Como tal não se pode entender a equivocada avaliação, pelo piloto, das condições que ensej ariam o pouso com recursos apenas visuais" (REsp n Q 23.815-RJ, DJ de 14/04/97). Neste julgamento, acompanhado por mim e pelo Senhor Ministro Costa Leite, o qual destacou que o caso "se distingue daquele que foi apreciado pela Corte Especial", afirmei em voto-vista que "não seria possível pôr o comportamento do piloto que avaliou preferível o vôo visual, naquela espécie de tutela que alcança o ato cuja realização danosa o agente, conscientemente, se arriscou produzir", com o que "não seria possível a indenização pelo direito comum, na medida em que as instâncias ordinárias não concluíram, claramente, pela existência de dolo, mesmo eventual, na linha de precedentes desta Turma e da Corte Especial".
Ora, neste caso, a avaliação é bem diversa. O Tribunal de origem constatou a falta grave pelo descaso na observância das regras de tráfego aéreo, pelo descumprimento das instruções do controle, pela gra-
196 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.
ve indisciplina de vôo, pela falta de disciplina na cabine, pelo não cumprimento das normas operacionais. Esta circunstância peculiar ao caso sob julgamento não autoriza, a meu juízo, o dissenso com o critério da equiparação estabelecido pela Corte Especial, interpretando a regra própria da lei de regência vigente ao tempo do acidente.
Dessa maneira, a argumentação da empresa recorrente, neste particular, não tem substância para suscitar dissenso do precedente da Corte Especial.
Todavia, razão tem a recorrente no que se refere à constituição de capital, na linha de entendimento desta Corte. Para o Tribunal de origem, a constituição não merece
afastada porque a inclusão dos beneficiários do pensionamento na folha de pagamento da empresa "constitui forma de pagamento e, não garantia deste". Esta Corte tem entendido ser suficiente a inclusão dos beneficiários na folha de pagamento, na forma de diversos precedentes, alguns indicados no especial.
De fato, não havendo, a meu juízo, qualquer indicação no Acórdão recorrido quanto à solvabilidade da empresa, a inclusão na folha de pagamento revela-se suficiente para o cumprimento da obrigação imposta.
Destarte, eu conheço do especial em parte, e nessa parte dou-lhe provimento para afastar a constituição de capital.
RECURSO ESPECIAL NQ 141.559 - RJ
(Registro n Q 97.0051677-6)
Relator: O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro
Recorrente: Zein Comércio e Construções Ltda. Recorridos: Abram Lejb Finkielsztejn e outros
Advogados: Drs. Carlos Mário da Silva Velloso Filho e outros, e Ulisses Riedel de Resende e outros
Sustentação Oral: Dr. Carlos Mário da Silva Velloso Filho, pela recorrente
EMENTA: Obrigação de fazer. Execução. Multa. Limite.
Ao contrário do Código de 39, a lei vigente não estabelece limitação para o valor da multa cominada na sentença que tem o objetivo de induzir ao cumprimento da obrigação e não o de ressarcir. Nem se justifica tolerância com o devedor recalcitrante que, podendo fazê-lo, se abstém de cumprir a sentença. Impossibilidade de cumprimento de que não se cogitou.
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 197
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do recurso especiaL
Participaram do julgamento os Srs. Ministros Waldemar Zveiter, Menezes Direito, Costa Leite e Nilson Naves.
Brasília, 17 de março de 1998 (data do julgamento).
Ministro COSTA LEITE, Presidente. Ministro EDUARDO RIBEIRO, Relator.
Publicado no DJ de 17 -08-98.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: A egrégia Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, julgando apelação interposta por Zein Comércio e Construções Ltda., no processo em que litiga com Abram Lejb Finkielsztejn e outros, proferiu acórdão assim ementado:
"Multa para coagir a fazer. Alegação de que supera o valor da obrigação principal. Falta de indicação deste valor, não comprovado. Se o recurso pretende limitar o valor da multa ao da obrigação principal, deve, para obtêlo, indicar tal valor. Apelo desprovido."
A apelante formulou pedido de declaração. Rejeitado, interpôs recurso especial.
Pretende que vulnerado o artigo 920 do Código Civil, por ter o aresto impugnado entendido que inviável, na hipótese, limitar-se o valor da multa cominatória diária ao da obrigação principal, ponto sobre o qual afirmou existir dissídio. Arrolou julgados.
Recurso admitido e processado_
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO (Relator): Observo, de início, parecer-me certo que o acórdão se desviou do tema que lhe era submetido. É que, em primeiro grau, limitou-se o Juiz a ter como inadmissíveis os embargos, salientando não ser possível apresentar novos a cada penhora que se fizesse. Ocorre, entretanto, que essa questão não foi versada no especial, escapando, por conseguinte, ao exame deste Tribunal.
O tema a ser decidido diz com a existência ou não de limite para a multa, imposta em sentença, tendente a induzir o réu ao cumprimento de obrigação de fazer. Mais especificamente, se incide o disposto no artigo 920 do Código CiviL
N o direito anterior havia dispositivo expresso, estabelecendo um teto. Assim é que o Código de 39 dispunha, em seu artigo 1.005, que a cominação pecuniária não excederia o valor da prestação. Não se aco-
198 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.
lheu norma análoga na lei processual em vigor. Há de entender-se que se optou pelo sistema adotado em ordenamentos europeus, em que para as astreintes não se prevêem lindes, sendo exigíveis enquanto não se verificar o adimplemento.
Deve-se n:Jtar que o devedor incorre na cláusula penal, a que se refere a disposição do Código Civil, desde que verificada a mora, enquanto que a multa de que se cogita só incide, uma vez decorrido o prazo, fixado pelo juiz, para o cumprimento da obrigação. Aqui se trata de desobediência de ordem judicial.
A doutrina mais autorizada temse orientado no sentido de reconhecer que, no Código de 73, não subsiste o limite. E isso se justifica dado o objetivo de forçar o adimplemento e não o de ressarcir.
A jurisprudência desta Terceira Turma perfilha o mesmo entendimento, como se verifica dos julgamentos proferidos nos Recursos Especiais 8.065 e 43.389.
O dissídio não está demonstrado. O acórdão do Supremo Tribunal Federal, embora mencionando o artigo 920 do Código Civil, teve em conta a lei processual anterior a 73 onde, como salientado, norma expressa determinava limitação. Também não há divergência com o julgado relativo ao REsp 13.416, de que relator o Ministro Sálvio de Figueiredo. Ali, é certo, afirmou-se que aplicáveis os princípios que norteiam os artigos 920 e 924. Tratava-se de hipótese, entretanto, em que inviabilizada a execução específica, havendo de converter-se em perdas e danos.
Essa última circunstância é de relevo. Se a prestação é possível e o devedor abstém-se de adimpli-la, está-se diante de recalcitrância e a multa será indefinidamente exigível. Coisa diversa sucederá quando se patenteie sua inviabilidade. Em tal caso, poder-se-á cogitar da conversão em perdas e danos, pena de terse o absurdo de o devedor ver-se obrigado perpetuamente ao pagamento de multa, sem que lhe seja possível evitá-lo. Trata-se aqui de questão de fato de que o acórdão não cuidou.
Uma última observação. Consoante o direito vigente, possível ao juiz, na execução, alterar o valor da multa. Também quanto a isso, entretanto, silentes acórdão e recurso.
Não conheço do especial.
VOTO
O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER: Sr. Presidente, no caso referido que julgamos recentemente, fiquei vencido, compreendendo que ali se cuidava de pena imposta pelo descumprimento. Não vejo, também, outra forma, a não ser acompanhar o Ministro-Relator, inobstante a sustentação, como sempre erudita, feita da tribuna. Mas, tenho até que S. Exa. foi um pouco além, já indicou dois caminhos dizendo que na execução é possível o Juiz rever essa parte e comprovar a existência desse obstáculo para o cumprimento, e não apenas uma desobediência a uma determinação judicial.
Acompanho o eminente Relator.
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 199
RECURSO ESPECIAL NQ 149.102 - RS
(Registro n Q 97.0066367-1)
Relator: O Sr. Ministro Nilson Naves
Recorrente: Banco do Brasil S/A
Recorrido: Silvestre da Silva Cavalheiro
Advogados: Drs. Eliezer de Oliveira Felinto Melo e outros, e Cassemiro Luiz Antonioli
EMENTA: Depositário infiel. Prisão. Pode a prisão ser decretada no próprio processo em que se constituiu o encargo, independentemente da propositura de ação de depósito (Súmula 619/STF). Recurso especial conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso especial e lhe dar provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Eduardo Ribeiro, Waldemar Zveiter e Menezes Direito. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Costa Leite.
Brasília, 17 de fevereiro de 1998 (data do julgamento).
Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Presidente. Ministro NILSON NAVES, Relator.
Publicado no DJ de 01-06-98.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO NILSON NAVES: Em petição que lhe endereçou
o Banco do Brasil S.A., despachou assim o juiz:
"Embora o e. STF tenha editado a Súmula 619, que permite seja decretada a prisão nos próprios autos da execução, filio-me à doutrina esposada pelo Des. Adroaldo Fabrício, que exige o devido processo legal, nos termos do CPC, mais de acordo com as disposições constitucionais. Portanto, intime-se para que ajuíze a pertinente ação de depósito."
Ao agravo de instrumento o Tribunal de Alçada negou provimento, verbis:
"2. A inconformidade é com a decisão entendendo que a prisão civil, do depositário infiel, não prescinde da ação de depósito, não cabendo decretada nos próprios autos da execução.
A questão é conhecida, sabidamente dividindo opiniões. A po-
200 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.
sição sustentada pelo agravante encontra respaldo, resultando inclusive sumulada pelo Excelso Pretório, ao tempo em que lhe estava afeto o julgamento de matéria infraconstitucional (Verbete 619). Não menos ponderosa, todavia, é a corrente na linha de pensamento do magistrado, encontrando apoiamento em abalizada doutrina e consagradajurisprudência. E que in casu melhor fica, inclusive, com a moderna orientação restritiva da prisão civil, limitação elevada à hierarquia constitucional (CF, art. 5º, LXVII).
Com efeito, a prisão do depositário infiel, como rara exceção, pode aceitar-se como legitimada quando assegurada a mais ampla defesa. E isso não há de ocorrer sumariamente, sem ser permitida a entrega da coisa (ou o equivalente em dinheiro) ou oferecer contestação, levando à decisão na forma do art. 904 do CPC.
Nestes termos, nega-se provimento ao recurso."
o acórdão de fls. 73/75 rejeitou os embargos de declaração, daí o presente recurso especial, que foi admitido pelo despacho de fls. 117/ 9, em resumo:
"Alega o recorrente que o acórdão guerreado negou vigência aos artigos 2º, 515, 535, 600, inciso I e 904, todos do Código de Processo Civil, além de divergir da Súmula 619 do Supremo Tribunal Federal e da jurisprudência de outros tribunais."
"N o que tange ao artigo 904 do CPC, reconheço que a matéria é polêmica, inclusive neste Tribunal. Contudo, a adoção de uma das correntes, diante da existência de posições conflitantes, não implica negativa de vigência à lei, conforme orientação do Ministro Luiz Gallotti nos Recursos Extraordinários nllS. 75.914-PR (RTJ 65/296) e 68.506-SP (RTJ 54/60).
Quanto ao dissídio, imperioso reconhecer que a decisão recorrida lavra divergência com a Súmula 619 do Supremo Tribunal Federal e com os paradigmas de fls. 102.
Diante do exposto, admito o recurso pela alínea c do permissivo constitucional."
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO NILSON NAVES (Relator): Na petição a que me referi no relatório, pediu ao juiz o Banco do Brasil S.A. que, "restando incontroversa a infidelidade do depósito judicial, requer o Credor, se digne Vossa Excelência de, forte no art. 904 e seu parágrafo único, do Código de Processo Civil, determinar a intimação do ExecutadoDevedor para que entregue todos os bens penhorados no prazo de 24 h (vinte e quatro horas), ou o seu equivalente em dinheiro, sob pena de ser-lhe decretada a prisão por de-
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 201
positário infiel." Entendeu, todavia, o magistrado, que era necessária a ação de depósito, malgrado a Súmula 619/STF, segundo a qual "A prisão do depositário judicial pode ser decretada no próprio processo em que se constituiu o encargo, independentemente da propositura de ação de depósito."
Na 3ª Turma, j á se decidiu assim, com o meu voto de adesão, segundo a ementa escrita pelo Sr. Ministro Dias Trindade: "Civil. Prisão de depositário infiel. Decreto inoportuno. A prisão civil de depositário infiel somente pode ser decretada após julgada procedente a ação de depósito" (DJ de 06.04.92). Na 5ª Turma, ao contrário da 3ª, decidiu-se assim, segundo a ementa escrita pelo Sr. Ministro Costa Lima: "Prisão Civil. Depositário judicial. Bens não encontrados. Proposta de pagar o equivalente em dinheiro. Ilegalidade. 1. Pacificada a jurisprudência no sentido de que a prisão do depositário dispensa a instauração da ação de depósito, podendo ser efetivada no próprio processo executivo (STF, Súmula-619). 2. Se o depositário judicial, intimado para apresentar os bens que lhe foram confiados, comparece ajuízo e afirma que está impossibilitado de fazêlo depois que o Oficial de Justiça certificou não os haver encontrado, propondo-se a depositar o equivalente em dinheiro, a sua prisão encontra obstáculo na Constituição.
3. As disposições do Código de Processo Civil- artigos 902, I e 904-não devem limitar-se apenas aos casos em que fique comprovado que está impossibilitado de fazê-lo em decorrência do perecimento do bem. 4. Recurso provido" (DJ de 18.10.93).
Aqui na 3ª Turma, recentemente acompanhei voto do Sr. Ministro Menezes Direito, conforme o qual "A prisão do depositário infiel pode ser decretada no próprio processo em que se constituiu o encargo, como consolidado na Súmula n Q 619-STF". Nesse caso, todavia, o recurso acabou não sendo conhecido, de acordo com o voto do Sr. Ministro Eduardo Ribeiro, que para o acórdão escreveu a seguinte ementa: "Recurso especial. Razão de decidir não enfrentada no recurso. Inviabilidade desse" (DJ de 27.10.97).
N o caso em exame, a questão foi enfrentada. É certo que há, no acórdão, referência ao texto constitucional, parece-me, contudo, que se cuida de questão infraconstitucional, tendo a ver com o Cód. de Pro Civil. O dissídio indicado diz respeito à Súmula 619/STF, e está comprovado, daí que do recurso conheço.
Conhecendo do recurso, dou-lhe provimento, à vista do princípio inserto na Súmula 619/STF (ver REsp-48.195, DJ de 27.10.97), para afastar o fundamento apresentado pela instância ordinária.
202 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.
RECURSO ESPECIAL NQ 150.467 - RJ
(Registro n Q 97.0070883-7)
Relator: O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro
Recorrentes: Omar dos Santos Carvalho e outro
Recorrida: MB Bioquímica Ltda.
Advogados: Drs. Flávio Antônio Carneiro Carvalho e outros, e Sebastião Alves dos Reis Júnior e outros
Sustentação Oral: Dr. Hildebrando Pontes Neto, pelos recorrentes
EMENTA: Direitos autorais. Utilização, não autorizada, de trabalho científico, na divulgação de produto. Indenização. Arbitramento.
O ressarcimento devido ao autor haverá de superar o que seria normalmente cobrado pela publicação consentida. A ser de modo diverso, sua aquiescência seria, na prática, dispensável. Cumpre, ao contrário, desestimular o comportamento reprovável de quem se apropria indevidamente da obra alheia.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer em parte do recurso especial e, nesta parte, dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator.
Participaram do julgamento os Srs. Ministros Waldemar Zveiter, Menezes Direito, Costa Leite e Nilson Naves.
Brasília, 11 de novembro de 1997 (data do julgamento).
Ministro COSTA LEITE, Presidente. Ministro EDUARDO RIBEIRO, Relator.
Publicado no DJ de 24-08-98.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: Trata-se de liquidação de sentença, em ação movida por Omar dos Santos Carvalho e José Soares dos Santos, condenada Boehringer Mannhein Bioquímica S/A ao pagamento de indenização, pela utilização não autorizada de trabalho dos autores.
Decidiu o aresto recorrido que pela "publicação de artigo científico não é admissível que a indenização devida seja estimada no valor das vendas do produto ao qual o aludido artigo haja sido utilizado como propaganda. A indenização há de ser arbitrada com bom senso e cometimento, tal como fez o decisum apelado, com suporte na prova técnica".
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998. 203
A parte relativa ao dano moral foi tomada por maioria de votos, vencido o relator, que provia o recurso, parcialmente, para acolher o pedido quanto ao ponto. Embargos infringentes providos.
Os autores interpuseram recurso especial da parte unânime do acórdão, sustentando negativa de vigência do art. 458, IIl, c/c o art. 165 do Código de Processo Civil e 122 da Lei 5.988/73, além de apontar dissídio de jurisprudência. Afirmam que se deixou de apreciar matéria deduzida no processo, omissão essa já apontada nos embargos de declaração. Acrescentam que, caso assim não se entenda, o acórdão, ao eleger outro critério para a fixação do quantum indenizatório, que não aquele estabelecido na Lei 5.988/73 (art. 122), deixou de aplicar o critério legal específico. Asseveram que a violação fraudulenta de direito autoral não pode ter a mesma conseqüência da utilização de obra regularmente contratada. Invocam julgados que teriam consagrado entendimento diverso do acolhido no acórdão.
Não admitido o recurso, provi agravo, convertendo-o em especial.
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO (Relator): Trabalho científico de cuja elaboração participaram os recorrentes foi utilizado na divulgação de produto da recorrida. Isso se fez sem que precedesse au-
torização dos autores. Daí a procedência do pedido de ressarcimento de danos, cuidando-se agora de liquidar o valor da condenação.
Sustenta-se, no recurso, nulidade da sentença, por infringir o artigo 458 do Código de Processo Civil, evidente o erro datilográfico, constante da petição, ao grafar artigo 450. Norma nele contida teria sido desconsiderada, ao não se examinar a questão, tendo em conta o artigo 122 da Lei 5.988/73.
Entendo que não houve a apontada infração da lei. A sentença, embora não se referindo diretamente ao dispositivo, não deixou de examinar o tema nele regulado, ao afirmar que a utilização da obra, em informe publicitário, "não autoriza os autores a participar nos resultados de sua comercialização", como se fossem sócios, sem assumir os riscos do negócio. Esse mesmo foi o entendimento do acórdão, como se verifica da cópia de fls. 61162.
Não há, também, como acolher a pretensão dos recorrentes nos termos amplos em que formulada. O invocado artigo 122 prevê, para o caso de imprimir-se obra, sem permissão do autor, a perda, em benefício desse, dos exemplares apreendidos e o pagamento dos demais pelo preço da venda ou da avaliação. No caso, a publicação prestouse à divulgação de um certo produto. A incidência daquela norma jamais poderia levar à perda do valor correspondente à comercialização desse. Não se trata aqui de edição de trabalho que tem, por si mesmo, valor comercial.
204 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.
Considero, entretanto, que passível o recurso de conhecimento, em parte, pelo dissídio.
A sentença aceitou o arbitramento proposto pelo perito, que se fundou na remuneração que seria percebida pelos autores, durante o período em que, segundo a inicial, se dedicaram às pesquisas de que resultou o trabalho. O julgamento foi confirmado em segundo grau. Vê-se, pois, que se elegeu entendimento que faz corresponder a indenização, em caso de publicação não autorizada, ao que seria normalmente devido ao autor. Ora, no REsp 23.746, de que foi relator o Ministro Sálvio de Figueiredo (DJ 02.10.95), consagrouse outra orientação, traduzida na opinião de Carlos Alberto Bittar, invocada naquele julgamento, e que reproduzo:
" ... deve-se estipular, como indenização, importância bem superior ao valor normal do mercado para contratação regular, em função do caráter sancionatório de que se reveste a teoria da responsabilidade civil, sob pena de consagrar-se, judicialmente, a prática lesiva, estimulando os usuários a dispensar o prévio contato com o titular para a obtenção de sua anuência e a discussão do quantum a pagar."
Essa efetivamente é a melhor doutrina. A ser de modo diverso, não se precisaria mais do consentimento do autor para publicação de suas obras. Negado aquele, far-se-ia essa, não obstante, e o pagamento se-
ria o mesmo que se houvesse aquiescência. Na vigência dos dispositivos do Código Civil pertinentes à matéria, já se pronunciara o Supremo Tribunal Federal, em acórdão de que relator Victor Nunes Leal, citado no especial, acentuando que o ato vedado não pode ter a mesma conseqüência do permitido (RTJ 38/ 271).
Conheço em parte do recurso e dou-lhe provimento para aumentar em cem por cento a condenação, pelos danos patrimoniais, passando a indenização para cento e quarenta e quatro salários mínimos, sem prejuízo da parcela incluída no julgamento dos embargos infringentes.
VOTO
O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER: Sr. Presidente, quando o nobre Advogado estava fazendo sua sustentação da tribuna, vi-me em dificuldade por também não encontrar na espécie forma de violação a esse art. 122. Este, parece-me mais adequado para a publicação desautorizada de trabalho científico, mas que se faça com a edição de exemplares. Aqui houve uso indevido do trabalho científico que serviu à comercialização desses produtos sem a autorização dos autores.
Estou tranqüilo porque vejo que o eminente Ministro Eduardo Ribeiro traz um precedente da nossa Seção, da relatoria do eminente Ministro Sálvio de Figueiredo, e dessa forma, pode-se conhecer do recurso pelo dissídio, pela letra c e não pela letra a. Nesse sentido parece-me
R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (UI): 151-206, novembro 1998. 205
também apropriada a forma escolhida pelo eminente Ministro-Relator para exacerbar a quantificação que, posta como foi, descaracteriza o aspecto sansionatório que deve ter o princípio.
Acompanho o eminente MinistroRelator nessa parte em que dobra a indenização pelo dano material, por não podermos ir além desse entendimento.
É como voto.
VOTO
O SR. MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO: Senhor Presidente, também não tenho dúvida nenhuma sobre a impossibilidade de buscarmos a incidência do art. 122, do Código Civil. A destinação do referido artigo e seu parágrafo único é específica para o caso de livros. Tenho muita dificuldade de enfrentar a alteração do valor da indenização, mas o Senhor
Ministro Eduardo Ribeiro, como sempre, com lucidez, ultrapassou a barreira do conhecimento pela alínea c, com o critério, tecnicamente imbatível, que é o precedente ter admitido que o dano, nestes casos, não deve corresponder exatamente ao valor da contratação de mercado e sim avançar um pouco mais para que seja explicitada a qualificação indenizatória. Esse foi o sentido do precedente, de resto lastreado, apoiado, fincado, na doutrina brasileira, de que é uma de suas excelentes expressões o Professor Carlos Alberto Bitar.
Quero crer que este veio apontado pelo Ministro Eduardo Ribeiro, autoriza, sem violentar nossajurisprudência, que faz oel usão de conhecimento para que se examine o laudo pericial, o conhecimento deste recurso e o seu respectivo provimento para que se defira a qualificação indenizatória que não foi levada na devida conta pelo julgado recorrido.
206 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (111): 151-206, novembro 1998.