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Licenciatura em ciências · USP/ Univesp
12.1 Introdução12.2 Soluções
12.2.1 Aspectos energéticos da formação de soluções12.2.2 Dissolução de sólidos em líquidos12.2.3 Dissolução de líquidos em líquidos: miscibilidade12.2.4 Dissolução de gases em líquidos
12.3 Representando reações em meio aquoso12.3.1 Equações gerais ou equações globais12.3.2 Equações iônicas totais12.3.2 Equações iônicas líquidas
12.4 Eletrólitos12.5 Dissociação e Ionização12.6 Solubilidade de eletrólitos12.7 Propriedades Coligativas
12.7.1 Diminuição do ponto de fusão e elevação do ponto de ebulição12.7.2 Redução da pressão de vapor12.7.3 Osmose e Pressão Osmótica
Referências
Guilherme A. MarsonAna Cláudia Kasseboehmer
SOLUÇÕES: ASPECTOS QUALITATIVOS12 Qu
ímic
a
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Química
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12.1 IntroduçãoGrande parte das transformações químicas ocorre em soluções aquosas. Uma vez dissolvidas,
as substâncias possuem maior energia cinética e maior possibilidade de colidirem para se
transformarem em outras substâncias. Por isso, muitos são os aspectos envolvidos na temática
soluções. Nesta aula estudaremos os aspectos qualitativos relacionados a soluções. Veremos
então a energia envolvida na formação de uma solução, os processos de dissolução, soluções com
eletrólitos e as propriedades coligativas.
12.2 Soluções12.2.1 Aspectos energéticos da formação de soluções
Dissolução refere-se ao processo de formação de uma solução a partir da mistura de uma
substância (soluto) em outra, sendo uma delas um líquido (solvente). A dissolução pode ser
acompanhada de uma reação química, mas neste texto tratamos apenas do processo de dissolução
em si, sem a formação de novas substâncias.
Durante a dissolução, três fenômenos concomitantes ocorrem:
1. Interações que mantêm as partículas do soluto coeso são vencidas.
2. Interações entre partículas do soluto e do solvente se estabelecem.
3. Interações entre algumas partículas do solvente são perturbadas em função das novas
interações estabelecidas com as partículas do soluto.
Do ponto de vista energético, a dissolução ocorrerá se:
1. O balanço energético das interações solvente-soluto for favorável, isto é, se as interações
entre as partículas do líquido e do soluto forem energeticamente mais favoráveis do que
as interações entre as partículas do líquido e entre as partículas do soluto.
2. Houver aumento da dispersão de energia na solução, ou seja, se a formação da solução
favorecer a dispersão de energia no sistema em relação ao sistema bifásico em que
solvente e soluto estiverem confinados em fases distintas.
O primeiro fator é expresso pela quantidade de calor envolvida no processo de dissolução,
o chamado calor de solução ou entalpia de solução DHsolução
. Admitem-se duas possibilidades:
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12 Soluções: Aspectos Qualitativos
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• Situação favorável à dissolução: o saldo energético é negativo, ou DHsolução
< 0Neste caso, a energia consumida para vencer as interações soluto-soluto e perturbar algumas
interações solvente-solvente é menor do que a energia liberada quando soluto e solvente estabe-
lecem interações. (Devemos lembrar que, ao estabelecer interações, se libera energia e, ao romper
interações, absorve-se energia).
• Situação desfavorável à dissolução: o saldo energético é positivo, ou DHsolução
> 0Neste caso, a energia consumida para vencer as interações soluto-soluto e perturbar algumas
interações solvente-solvente é maior do que a energia liberada quando soluto e solvente esta-
belecem interações.
Por essa razão, a imensa maioria dos processos de dissolução tem valores negativos de
DHsolução
, ou seja, libera energia, o que se nota pelo aumento da temperatura do sistema quando
a dissolução ocorre.
O aumento da dispersão de energia é denominado entropia e será discutido com mais detalhe
no texto sobre termodinâmica. Por ora podemos fazer as seguintes correlações operacionais no
tocante à dispersão de energia:
• Situação favorável à dissolução: a dissolução favorece a dispersão de energia
no sistema
Neste caso, o grau de liberdade no sistema aumenta quando a dissolução ocorre, de modo
que, admitindo mais possibilidades de movimento, aumenta a probabilidade de choque entre as
moléculas e, portanto, a energia se distribui mais facilmente no sistema.
• Situação desfavorável à dissolução: a dissolução desfavorece a dispersão de
energia no sistema
Neste caso, a formação da solução diminui a probabilidade de choques entre as partículas;
logo, a distribuição de energia no sistema é menor.
A Tabela 12.1 resume estes fatores e indica qualitativamente os casos em que uma solução
deve ocorrer:Tabela 12.1: Casos em que o processo de dissolução é favorável em relação aos fatores de energia e entropia.
CasosBalanço energético
da dissoluçãoDispersãode energia
Dissolução
a DHsolução < 0
Há liberação de energia
Aumenta Ocorre
b Diminui Ocorre se a energia liberada compensar a diminuição da capacidade do sistema de distribuí-la
c DHsolução > 0
Há absorção de energia
Aumenta Ocorre se a capacidade de distribuição de energia do sistema compensar o balanço desfavorável
d Diminui Não ocorre
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12.2.2 Dissolução de sólidos em líquidos
A dissolução de sólidos em líquidos resulta, na maioria dos casos, num sistema com maior
grau de liberdade, pois a mobilidade das partículas do soluto na solução é necessariamente
maior do que no sólido. Portanto, o principal fator que governa a dissolução de sólidos em
líquidos é o balanço energético das interações líquido-líquido, sólido-sólido e sólido-líquido.
Tomemos como exemplo o caso da solubilidade da glicose em água e em álcool etílico:
A glicose é extremamente solúvel em água: 910 g/LA glicose é muito pouco solúvel em álcool etílico: 1,08 g/LÁgua e álcool etílico se misturam em qualquer proporção.
Curiosamente, todos estes compostos possuem grupos O-H em suas estruturas moleculares
e, portanto, são capazes de estabelecer ligações de hidrogênio entre si:
H
C
H
H
HH C O
Hálcool etílico
H2OÁgua
HCH2OH
H
OH
OH H
HH
HOOH
CC C
C
OO
glicose
Figura 12.1: Fórmulas estruturais da água, da sacarose e do álcool etílico.
A baixa solubilidade da glicose em álcool etílico pode ser explicada em termos dos fatores
discutidos a seguir.
Na água, as moléculas de glicose são rodeadas por mais moléculas de solvente do que no
etanol, pois a molécula de etanol é maior do que a molécula de água, portanto, a água estabelece
mais ligações com a glicose do que o etanol. Dizemos então que a glicose se encontra mais
solvatada em água do que em álcool etílico.
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12 Soluções: Aspectos Qualitativos
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O envolvimento de moléculas de solvente ao redor de moléculas do soluto é chamado
solvatação. No caso da água pode ser dito hidratação.
A energia liberada nas ligações de hidrogênio estabelecidas entre as moléculas de glicose e
água compensa a energia gasta na ruptura das ligações de hidrogênio entre moléculas de glicose
no cristal, o que não ocorre no caso do etanol, ou seja, as interações etanol-glicose são mais
fracas que as interações glicose-glicose.
Quanto mais intensas as interações no soluto, mais os fatores energéticos se acentuam.
Devemos esperar, portanto, que, na dissolução de sólidos iônicos como os sais, o balanço entre
a energia reticular e a energia de solvatação em água seja um fator determinante.
12.2.3 Dissolução de líquidos em líquidos: miscibilidade
Miscibilidade é a capacidade de um líquido de se misturar a outro, originando um sistema
homogêneo. No caso de líquidos, a miscibilidade será favorecida pela interação entre as molé-
culas dos líquidos envolvidos, o que dependerá da natureza das interações entre as moléculas
nos líquidos. Os exemplos mais comuns nas discussões sobre miscibilidade são os casos de
misturas de líquidos com moléculas de momento dipolo significativo, ditos polares, com
líquidos constituídos por moléculas de momento de dipolo pequeno, ditos apolares ou pouco
polares. Consideremos os líquidos cujas propriedades estão apresentadas na Tabela 12.2:
Tabela 12.2 :Propriedades físicas e químicas para algumas substâncias. / Fonte: DaviD, 2008.
Fórmula estrutural Momento dipolarMiscibilidade em água,
% em massa a 25 oC
Álcool etílico
H
C
H
H
HH C O
H
1,67 Total
Álcool propílico
H
C
H
H
OH C C
H
H H
H
1,58 Total
Álcool butírico
H
C
H
O HH C C
H
H H
C
H
H
H
1,66 7,3
Clorofórmio
Cl
C
Cl
H Cl 1,04 0,82
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Na Tabela 12.2, ressalta-se que, embora todos os compostos sejam polares, suas miscibilida-
des em água variam drasticamente. A primeira diferença notável é os álcoois serem todos mais
miscíveis do que o clorofórmio, o que se deve ao fato dos álcoois possuírem o grupo funcional
O-H, de modo que podem estabelecer ligações de hidrogênio com a água. O clorofórmio
estabelece ligações com a água do tipo dipolo-dipolo que, como discutimos anteriormente, são
menos intensas que as ligações de hidrogênio. Logo, as interações entre moléculas de clorofórmio
e a água não são suficientemente fortes para romper ligações de hidrogênio entre as moléculas
de água e, por essa razão, o clorofórmio, embora polar, não é miscível em água. Examinando
os álcoois, vemos que a polaridade e a presença de ligações de hidrogênio não explicam as
diferenças de solubilidade, já que são todos praticamente equivalentes quanto a isto. No caso, a
solubilidade cai drasticamente do álcool propílico para o álcool butírico. Nos álcoois, apenas o
grupo OH interage fortemente com a água. O restante da molécula é formado por ligações CH
e CC, as quais são praticamente não polarizadas. Quando um álcool se dissolve, então, a porção
da molécula formada por átomos de C não contribui com interações com a água. Os líquidos
são, porém, bastante condensados, e estas porções que não interagem perturbam as interações
entre as moléculas de água. Quanto maior o volume da porção que não interage com a água,
mais ligações de hidrogênio na água deverão ser modificadas para acomodar a molécula de
soluto. No caso dos álcoois, quando o tamanho desta porção atinge 4 carbonos, as interações
do grupo OH não mais compensam a perturbação da porção apolar da molécula, o que resulta
numa diminuição significativa de solubilidade quando comparamos o álcool propílico com o
álcool butírico. Compostos essencialmente apolares como os derivados do petróleo, ou com-
postos de moléculas com grandes porções apolares como os óleos e as gorduras comestíveis, são
praticamente insolúveis em água.
12.2.4 Dissolução de gases em líquidos
Os casos discutidos anteriormente permitem-nos supor que gases polares sejam mais solúveis
em solventes polares, e gases apolares sejam mais solúveis em líquidos apolares. A solubilidade
dos gases é muito influenciada pela temperatura, diminuindo consideravelmente com o aumento
da temperatura na maioria dos casos. A pressão exerce efeito oposto, favorecendo os choques
das partículas gasosas com o líquido e, portanto, contribuindo com a solubilização do gás. O que
se observa ao se abrir uma lata de refrigerante é justamente o efeito da diminuição brusca da
pressão na lata, resultando na rápida saída de gás em forma de bolhas.
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No liquido, há pouco espaço entre as moléculas, então, a solubilidade dos gases dependerá
das interações que possam estabelecer com as moléculas do líquido e do tamanho das moléculas
do gás. Gases com moléculas grandes que interajam pouco com o líquido tenderão a ser muito
pouco solúveis. A Tabela 12.3 apresenta a solubilidade de alguns gases em água:
Tabela 12.3: Solubilidade de algumas substâncias gasosas em água. / Fonte: DaviD, 2008.
Gás FórmulaMassa molar,
g/molMomento de dipolo,
DebyesSolubilidade em H2O
a 25 oC, g/L
Metano CH4 16,04 0 0,035
Monóxido de carbono
CO 28,01 0,12 0,026
Monóxido de nitrogênio
NO 30,01 0,16 0,10
Dióxido de carbono
CO2 44,01 0 1,45 (reage parcialmente)
Dióxido de enxofre
SO2 64,06 1,62 94
Amônia NH3 17,03 1,42 310 (reage parcialmente)
Trióxido de enxofre
SO3 80,06 0 Completamente solúvel(reage completamente)
Os dados da tabela acima sugerem que, de maneira geral, o fator que governa a solubilidade
dos gases em água (um solvente polar) é o momento de dipolo e, portanto, a capacidade de
estabelecer interações com o dipolo da água. Gases como metano, monóxido de carbono e
monóxido de nitrogênio são muito pouco solúveis em água, ao passo que o dióxido de enxofre
é cerca de 1000 vezes mais solúvel do que os gases apolares. Contudo, a regra do momento
de dipolo não explica as altas solubilidades da amônia, do dióxido de carbono e do trióxido
de enxofre. No caso destes compostos, ocorrem reações parciais ou totais com a água, o que
aumenta drasticamente a solubilidade.
NH3(aq) + H2O(l) → NH4 +
(aq) + OH−(aq)
CO2(aq) + H2O(l) → H+(aq) + HCO3
−(aq)
SO3(g) + H2O(l) → H+(aq) + HSO4
−(aq)
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Quando uma reação química ocorre, entra em jogo no balanço energético a formação e ruptura
de ligações covalentes, as quais envolvem energias tão ou mais intensas que as interações iônicas.
12.3 Representando reações em meio aquosoPrimeiramente, vale a pena consagrar algumas linhas a diferentes modos de representar equações
químicas de reações em soluções aquosas. São três os tipos de representações a considerar.
12.3.1 Equações gerais ou equações globais
Nestas representações são mostradas as fórmulas completas de reagentes e produtos. Como
exemplo, consideremos a reação resultante da imersão de uma barra de alumínio metálico a
uma solução aquosa de sulfato de cobre. A solução azul de sulfato de cobre se descolore na
medida em que a barra de alumínio torna-se recoberta de um sólido avermelhado floculoso, o
cobre metálico. O processo pode se representado pela equação:
3 CuSO4(aq) + 2 Al(s) → Al2(SO4)3(aq) + 3 Cu(s)
12.3.2 Equações iônicas totais
O sulfato de cobre e sulfato de alumínio são solúveis, então podemos reescrever a equação
explicitando este fato:
3 Cu+2(aq) + 3 SO4
−2(aq) + 2 Al(s) → 2 Al3+
(aq) + 3 SO4−2
(aq) + 3 Cu(s)
Nesta forma de representação, os compostos iônicos solúveis em água são representados
dissociados, isto é, com os respectivos cátions e ânions escritos livres em solução com o índice
“aquoso” (aq). Note que a quantidade de cátions e ânions respeita a estequiometria dos compostos
e o balanceamento da equação. Assim representada, a equação explicita íons que estão no meio
reacional, mas não participam da reação, pois aparecem tanto nos reagentes quanto nos produtos.
No caso, estes íons são os íons sulfato, SO4−2.
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12.3.2 Equações iônicas líquidas
Nas equações iônicas líquidas, são mostradas apenas as espécies que reagem. A equação
iônica líquida é obtida através da eliminação dos íons que não participam da equação iônica
total, no caso, os íons sulfato, SO4−2:
3 Cu+2(aq) + 2 Al(s) → 2 Al3+
(aq) + 3 Cu(s)
12.4 EletrólitosA água pura é um mal condutor de eletricidade. Contudo, algumas substâncias solúveis em
água originam soluções capazes de conduzir corrente elétrica. Estas substâncias são chamadas
eletrólitos e diferenciam-se daqueles que são solúveis em água, mas não conduzem corrente
elétrica, os chamados não-eletrólitos. Os eletrólitos por sua vez distinguem-se uns dos outros
em fortes e fracos. Eletrólitos fracos não conduzem bem eletricidade em solução aquosa diluída.
A condução de corrente elétrica se dá pelo movimento de partículas carregadas. No caso de
soluções aquosas, a corrente elétrica se conduz pelo movimento de íons em solução. Logo, a força
de um eletrólito depende do número de íons em solução e das cargas desses íons (Figura 12.2).
Figura 12.2: Experimento de condutibilidade de soluções aquosas. A solução é acoplada em série num circuito contendo uma lâmpada como indicador de passagem de corrente. A solução funciona como um resistor. A água pura praticamente não conduz corrente (a). Uma solução de um eletrólito fraco como ácido acético conduz pouco corrente elétrica (b). Uma solução de um eletrólito forte como o sulfato de potássio conduz muito mais corrente elétrica, o que se nota pela intensidade da luz. Em cada caso, os balões apresentam uma representação das espécies no seio da solução.
a b c
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12.5 Dissociação e IonizaçãoA força de eletrólitos iônicos é diretamente proporcional à carga dos íons e sua mobilidade
em solução aquosa. Quando um composto iônico se dissolve em água, seus íons se separam
num processo denominado dissociação. Por exemplo, o NaCl, separa seus íons ao se dissolver
em água. Veja Figura 12.3:
2H O +(s) (aq) (aq)NaCl Na Cl−→ +
Figura 12.3: Representação submicroscópica da dissociação do NaCl em água. Os íons já estão formados e apenas se separam na interação com a água. / Fonte: modificado do banco de Imagens LENAQ/UFSCar.
Mas, existem muitos casos de eletrólitos formados por compostos moleculares, isto é,
formados por partículas neutras. Tais compostos não conduzem ou pouco conduzem corrente
elétrica na forma pura, mas produzem soluções aquosas fortemente condutoras. Este é o caso de
compostos moleculares como o ácido clorídrico, HCl. Como a condução de corrente elétrica
em meio aquoso pressupõe a presença de íons, a existência de eletrólitos moleculares como o
HCl leva-nos a propor que estas substâncias não apenas se dissolvem em água, mas sofrem uma
reação em meio aquoso que origina íons responsáveis pela condução. A condução de eletrólitos
moleculares se explica, portanto pela ocorrência de ionização. No caso do HCl:
2H O +(g) (aq) (aq)HCl H Cl−→ +
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12 Soluções: Aspectos Qualitativos
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Figura 12.4: Representação submicroscópica da ionização do HCl em água. Após ser borbulhado em água, a substância que era covalente ioniza-se na interação com a água e transforma-se em íons.
Para os fins deste texto, consideramos três principais classes de solutos que são eletrólitos fortes:
1. ácidos fortes,
2. bases fortes e
3. a maioria dos sais solúveis.
Esses compostos são completamente, ou quase completamente, ionizados (ou dissociados)
em soluções aquosas diluídas e, por isso, são eletrólitos fortes.
Tabela 12.4: Características gerais e tipos de eletrólitos.
Exemplosnatureza do composto
Solubilidade em água
% de ionização em solução aquosa diluída
Ácidosfortes HCl
HClO4
Molecular alta 100%
fracosCH3CH2CO2H
HFMolecular alta > 50%
Bases
fortes KOHCa(OH)2
Iônico alta 100%
insolúveis Mg(OH)2Al(OH)3
Iônico baixa 100% em soluções muito diluídas
fracas NH3CH3CH2NH2
Molecular alta > 50%
Saissolúveis NaCl, KNO3,
NH4Br Iônico alta 100%
insolúveisCaSO4, CuCl,
Ag3(PO4)2
Iônico baixa 100% em soluções muito diluídas
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Figura 12.5: Propriedades eletrolíticas de soluções aquosas. A condutividade das soluções varia de acordo com a quantidade de íons livres presentes na solução. / Fonte: modificado do banco de Imagens LENAQ/UFSCar.
12.6 Solubilidade de eletrólitosPara fins práticos, é interessante adotar algumas regras qualitativas de solubilidade que podem
ser úteis na predição sobre o comportamento de eletrólitos.
1. A maioria dos compostos de íons metálicos do Grupo IA (Li+, Na+, K+, Rb+, Cs+)
e o íon amônio, NH4+, são solúveis em água.
2. A maioria dos nitratos, NO3−, acetatos, CH
3COO−, cloratos, ClO
3− e percloratos, ClO
4−,
são solúveis em água.
3. A maioria dos haletos (cloretos Cl− ,brometos Br−, e iodetos, I−) são solúveis com
exceção de sais de Ag, Pb e Hg. Os fluoretos, F−, são solúveis em água, com exceção
de MgF2, CaF
2, SrF
2, BaF
2 e PbF
2.
4. A maioria dos sulfatos, SO42−, são solúveis em água, com exceção de PbSO
4, BaSO
4 e
HgSO4. CaSO
4, SrSO
4 e Ag
2SO
4 que são pouco ou moderadamente solúveis.
5. A maioria dos hidróxidos, OH−, são insolúveis em água, com exceção dos metais do
Grupo IA e os íons mais pesados dos metais do Grupo IIA, começando pelo Ca(OH)2.
6. A maioria dos carbonatos, CO32−, fosfatos, PO
43− , e arseniatos, AsO
43− , são insolúveis em
água, com exceção dos metais do Grupo IA e NH4+. MgCO
3 é moderadamente solúvel.
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12 Soluções: Aspectos Qualitativos
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7. A maioria dos sulfetos, S2−, são insolúveis em água, com exceção dos metais do Grupo
IA e Grupo IIA e o íon amônio.
8. A maioria dos ácidos inorgânicos são solúveis em água. Exemplos: HCl, HNO3,
H2SO
4, HI etc. Moléculas de ácidos orgânicos com baixo peso molecular também são
solúveis. Exemplos: CH3CO
2H (acético), C
6H
6CO
2H (benzóico) etc.
Tabela 12.5: Regras de solubilidade para compostos iônicos comuns em água. / Fonte: vogel, 2002.
Geralmente Solúveis ExceçõesFluoretos (F−) Sem exceções comuns
Cloretos (Cl−) Insolúveis: AgCl, Hg2Cl2Solúvel em água quente: PbCl2
Brometos (Br−) Insolúveis: AgBr, Hg2Br2, PbBr2Moderadamente solúvel: HgBr2
Iodetos (I−) Insolúveis: muitos iodetos de metais pesados
Sulfatos (SO42−) Insolúveis: BaSO4, PbSO4, HgSO4
Moderadamente solúveis: CaSO4, SrSO4, Ag2SO4
Nitratos (NO3−), Nitritos (NO2
−) Moderadamente solúvel: AgNO2
Percloratos (ClO4−) Moderadamente Solúvel: KClO4
Acetatos (CH3COO−) Moderadamente Solúvel: AgCH3COO
Geralmente Insolúveis ExceçõesSulfetos (S2−) Solúveis: os de NH4
+, Na+, K+, Mg2+, Ca2+
Óxidos (O2−), Hidróxidos (OH−) Solúveis: Li2O*, LiOH, Na2O*, Ca(OH)2, SrO*, Sr(OH)2
Carbonatos (CO32−), Fosfatos
(PO43−), Arsenatos (AsO4
3−)Solúveis: os de NH4
+, Na+, K+
* Dissolve mediante aquecimento originando hidróxidos.
Usando a tabela de solubilidade
A formação de uma fase sólida numa fase liquida é denominada precipitação. O produto das reações de precipitação é um sólido pouco solúvel ou insolúvel que se deposita no fundo (precipitado). Nas reações entre íons em fase aquosa, a precipitação ocorre porque a interação entre os íons em solução é mais forte do que a interação dos íons com as moléculas de água. Um dos exemplos mais importantes de precipitação é a formação de carbonatos, tratados em aulas anteriores no caso da formação de estalagmites nas cavernas. Suponha que se misturem soluções aquosas de carbonato de sódio, Na
2CO
3, e cloreto de cálcio, CaCl
2. Pelas regras de solubilidade, podemos dizer que tanto o
Na2CO
3 quanto o CaCl
2 são compostos iônicos solúveis. No instante da mistura, a solução resultante
contém quatro íons:
Na+(aq), CO3
2−(aq), Ca2+
(aq), Cl−(aq)
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Aplicando as regras de solubilidade, nota-se que o par de íons Ca2+ e CO32− formam um composto
insolúvel de fórmula CaCO3.
12.7 Propriedades ColigativasEm 1901, o químico Jacobus Henricus Van’t Hoff, Jr. foi laureado com o primeiro Nobel de
química “em reconhecimento pelos extraordinários serviços prestados pela descoberta das leis
da dinâmica química e da pressão osmótica em soluções” (Fundação Nobel). Van’t Hoff estu-
dava como a presença do soluto alterava a estrutura do solvente, explorando uma propriedade
coligativa denominada pressão osmótica.
Do ponto de vista energético, uma solução se forma pois a mistura de solvente e soluto
num sistema homogêneo é energeticamente favorável. Logo, tende a permanecer como tal
nas condições de pressão e temperatura em que se formou. Para provocar a separação de fases
é necessário perturbar o sistema, seja alterando a pressão, a temperatura, ou retirando ou adi-
cionando material para alterar sua composição. Nessa perspectiva, propriedades coligativas são
manifestações macroscópicas da estabilidade energética de uma solução e de sua capacidade de
acomodar perturbações, ou seja, de manter-se como sistema homogêneo.
Do ponto de vista microscópico, uma vez que o processo de dissolução é baseado em interações
entre as moléculas de solutos e solventes, é de se esperar que as propriedades observáveis da
solução resultante sejam diferentes das propriedades do solvente puro. Portanto, as propriedades
coligativas são manifestações macroscópicas dos seguintes fatores:
1. quantidade de partículas de soluto presentes;
2. natureza das interações entre as partículas de solvente e soluto.
2(aq) 2 3(aq) 3(s) (aq)
2+ + 2 +(aq) (aq) (aq) 3 (aq) 3(s) (aq) (aq)
2+ 2(aq) 3 (aq) 3(s)
CaCl + Na CO CaCO 2 NaCl
[Ca +2 Cl ]+[2 Na +CO ] CaCO +2 [Na +Cl ]
Ca +CO CaCO
− − −
−
→ +
→
→
190
12 Soluções: Aspectos Qualitativos
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Como a imensa maioria dos sistemas encontrados na natureza são soluções, a compreensão
das propriedades coligativas é fundamental para tentar explicar, do ponto de vista molecular,
como diversos fenômenos naturais ocorrem.
12.7.1 Diminuição do ponto de fusão e elevação do ponto de ebulição
Levando em conta o princípio discutido na introdução desta seção, devemos esperar que, se
a formação de uma solução líquida é energeticamente favorável, há uma tendência do sistema
de se manter no estado líquido. Dessa forma, tomando o solvente puro como referencial, as
soluções que envolvem este solvente terão um ponto de ebulição maior e um ponto de ebulição
menor do que o solvente puro. Devemos esperar também que, quanto maior a concentração de
soluto, maiores devem ser as diferenças nos pontos de fusão e ebulição da solução em relação
ao solvente puro.
O abaixamento do ponto de fusão de uma solução é denominado efeito crioscópico.
Exemplos: polietileno glicol é adicionado nas asas de aviões antes que decolem sob neve,
para evitar a deposição de gelo nas asas; em países temperados, joga-se sal nas ruas para derreter
a neve; a concentração de soluto em peixes que habitam águas muito frias é elevada para evitar
o congelamento dos tecidos.
O efeito crioscópico pode ser descrito quantitativamente pela expressão:
f cT K mD =
onde a diferença observada entre o ponto de ebulição da solução e do solvente puro, DTc, é
proporcional à molalidade (concentração de partículas do soluto por massa de solvente) através
da constante crioscópica Kc.
O aumento do ponto de ebulição de uma solução é denominado efeito ebulioscópico
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Exemplo: solutos como polietileno glicol são colocados na água do circuito de resfriamento
de motores automotivos, evitando que, em caso de sobreaquecimento, a solução de resfriamento
ferva se a temperatura superar o ponto de ebulição da água pura.
O efeito ebulioscópico pode ser descrito quantitativamente pela expressão:
DTe = Kbm
onde a diferença observada entre o ponto de ebulição da solução e do solvente puro, DTe é
proporcional à molalidade através da constante ebulioscópica Ke.
Estudos de ebulioscopia e de crioscopia foram extremamente importantes para ampliar o
nosso conhecimento sobre a estrutura das soluções iônicas. Van´t Hoff notou que havia desvios
nos valores de DTf e DT
e determinados em soluções concentradas de compostos iônicos. A aná-
lise dos resultados levou Van´t Hoff a concluir que os íons dissolvidos poderiam associar-se em
solução, formando pares iônicos. Num par iônico, um cátion e um ânion permanecem ligados e
solvatados por moléculas de água. Portanto, a ocorrência de pares iônicos diminui a quantidade
efetiva de partículas livres de soluto na solução. Além disso, um par iônico se comporta como
uma partícula mais pesada. A medida do grau de dissociação (ou ionização) de um eletrólito em
água é o fator de van’t Hoff, i, para a solução.
i = DTf (efetivo) / DTf (não-dissociado) = Kfm (efetivo) / Kfm (previsto)= m (efetivo) / m (previsto)
Quando i é levado em consideração, os desvios podem ser explicados. Este exemplo ilustra
que o número de partículas dissolvidas não explica por si as propriedades coligativas, devendo
ser consideradas as interações associativas entre as partículas. Analogamente, isto equivale a
comparar as abordagens diferenciadas que temos para gases reais e ideais, lembrando que os
desvios da idealidade somente podem ser explicados levando-se em conta as interações entre
as partículas do gás.
12.7.2 Redução da pressão de vapor
Sabe-se que soluções de solutos não voláteis (líquidos não-voláteis ou um sólido) apresentam
pressão de vapor menor do que o solvente puro, isto é, as moléculas de solvente evaporam a uma
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taxa mais lenta na solução do que no estado puro. Um dos fatores fundamentais na evaporação é
o acesso das moléculas do solvente à interface solução-vapor. Na solução, as moléculas do soluto
ocupam parte do volume da solução; logo, na interface solução-vapor onde ocorre a evapo-
ração, há menor área de superfície por molécula de solvente na solução do que no solvente
puro, diminuindo a taxa de evaporação do solvente em solução em relação ao solvente puro.
Esta explicação não leva em conta a interação entre as partículas e se aplica a um número limitado
de casos conhecidos que obedecem à chamada Lei de Raoult para soluções ideais. Contudo, há
muitos casos que não seguem a Lei de Raoul, sobretudo em soluções iônicas.
Um dos exemplos mais importantes da aplicação deste conceito é a evaporação da água salgada.
Quanto maior a concentração de sal, mais difícil será a evaporação, já que a pressão de vapor
solvente diminui com a concentração do soluto. A evaporação de água nos oceanos e nas salinas se
dá porque o equilíbrio líquido-vapor nunca é atingido, já que os ventos removem constantemente
as moléculas de água que escapam da solução, mesmo em altas concentrações de sal.
12.7.3 Osmose e Pressão Osmótica
Osmose é um fenômeno que ocorre quando soluções de concentração diferente são colo-
cadas em recipientes distintos unidos por um material semipermeável, como, por exemplo, uma
membrana. A membrana tem propriedades tais que permite a passagem do solvente, mas barra
a passagem do soluto. Se monitorarmos as soluções nos recipientes, notaremos que:
1. A solução menos concentrada diminui de volume e aumenta sua concentração.
2. A solução mais concentrada aumenta de volume e diminui sua concentração.
Tais observações indicam que houve passagem de solvente da solução mais diluída para a
mais concentrada. Dizemos que houve passagem de solvente por osmose. No plano micros-
cópico, osmose é o processo espontâneo em que moléculas de solvente passam através de uma
membrana semipermeável, partindo de uma solução de menor concentração de soluto para
uma solução de maior concentração de soluto.
A rapidez e a intensidade do processo dependem diretamente da diferença de concentrações
entre os compartimentos. A osmose pode ser quantificada se o experimento for feito entre
dois capilares distintos separados por uma membrana. Quando houver passagem de solvente
de um capilar ao outro, o volume no lado menos concentrado aumentará, elevando a altura da
coluna de solução neste lado. Através da diferença de alturas nos níveis dos capilares podemos
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calcular um valor de pressão, que será proporcional às diferenças de concentração nas soluções.
Esta pressão é denominada pressão osmótica, sendo um parâmetro importante para determinar
propriedades de soluções, solutos e de membranas. A pressão osmótica é medida experimental-
mente num osmômetro.
Osmose e saúdeAs membranas das células vivas são seletivas e semipermeáveis, sendo capazes de transportar solvente (água) e solutos de forma controlada. Como a concentração de solutos nas células é diferente do meio exterior, há um fator osmótico constante que precisa ser controlado para que a célula se mantenha viva. O mesmo ocorre no interior da célula com organelas como a mitocôndria, e fora dela, nos tecidos e sistemas do organismo. A digestão de alimentos é um processo complexo em que os fenômenos osmóticos desempenham papel fundamental. Bactérias que causam doenças diarreicas produzem toxinas que interferem nos fenômenos osmóticos intestinais. A diarreia ainda é uma das principais causas de mortalidade infantil no mundo. O soro caseiro, usado no tratamento de tais doenças é uma solução de sacarose e cloreto de sódio em concentrações próximas àquelas fisiológicas no organismo, ditas isotônicas.
Figura 12.6: Pressão osmótica nas células do sangue. / Fonte: modificado do banco de Imagem LENAQ/UFSCar.
Após ler este texto e assistir à videoaula, responda ao questionário para verificar seu aprendizado.
Bom trabalho!
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