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LINKS URBANOSda escala metropolitana à escala localtrabalho final de graduaçãomaria claudia levy figliolinoorientador: abílio guerradez.2013

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trabalho final de graduaçãomaria claudia levy figliolino

orientador: abílio guerradez.2013

Propõe-se a percorrer diferentes células do

organismo vivo que é a cidade, costurando-as

de modo sutil e discreto. Direcionando-as para um crescimento, que mesmo

que incontrolável, seja consciente e includente.

Linkando-as, suavemente, admitindo suas diferenças e resultando na passagem

de uma à outra de maneira leve, sem bruscas rupturas.

Sempre constante.

Da infraestrutura metropolitana à escala

local, das decisões políticas da macrometrópole ao cotidiano do indivíduo. Procura-se tratar com

abrangência dos opostos, de modo a conectá-los, e fazer com que trabalhem juntos, e se multipliquem

com a tamanha imprevisibilidade a que lhes

é inerente.

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PLANTA DA CIDADE DE SAO PAULO_COMPANHIA CANTAREIRA E ESGOTOS 1881

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PLANTA DA CAPITAL DO ESTADO_JULES MARTIN 1890

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PLANTA DA CIDADE DE SAO PAULO_GOMES CARDIM 1897

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SARA BRAZIL_1930

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foto aérea. fonte: bingmaps 2013

“Habitar uma cidade é ser dela cidadão”[Jorge Wilheim]

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11Montagem de notícias de jornal sobre a favela do moinho

deste ano de 2012. O início do trabalho se pautou no desgosto frente ao território desigual observado em São Paulo.

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ário

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foto nelson kon / tratamento maria claudia levy

Introdução

1_Gestão pública: resgate do bairro

Recentes dinâmicas de estruturação urbana

Resgate do bairro

O Plano de Bairro em São Paulo

Organização administrativa da cidade

2_Terrain vague: obsolescência e oportunidade

Porque o bairro central

Barra Funda de Baixo

Terreno, começo de uma pesquisa

Novos protagonistas urbanos

3 _Projeto urbanístico e arquitetônico

1_Urbano

2_Terreno

3_Casa de cultura e cidadania

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os links são patterns urbanos básicos, portanto, nós de grande densidade que servem para costurar os tecidos urbanos limítrofes e reforçar fluxos em distintos níveis, cruzamentos que introduzem uma nova seção urbana, suturam descontinuidades e reforçam linhas de transporte; são enfim, essencialmente desenvolvidos no sentido transversal, sobre múltiplos níveis e estratos.

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[MONTANER, Josep Maria. Sistemas Arquitetônicos Contemporâneos. 1a edição, Barcelona, Gustavo Gili, 2008.p.127]

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François Ascher em seu livro Novos Princípios do Urbanismo [1] nos alerta da necessidade do urbanismo acompanhar uma nova sociedade que está emergindo. Uma nova sociedade exige um novo urbanismo, como já dizia Le Corbusier ao utilizar o termo L’Esprit Noveau – o novo urbanismo no qual acreditava em sua época.

A sociedade moderna, que cunhou o termo urbanismo, concebeu a cidade da maneira que vivemos hoje. Grande aglomerado de pessoas, abastecidas por sistemas e redes de infraestruturas elétricas, hídricas, pluviais, de transporte, etc.

Hoje, segundo Ascher, estamos vivendo a terceira grande revolução da sociedade desde a revolução da cidade clássica. As sociedades estão em mutação e vivem uma evolução profunda da maneira como pensam, agem, se relacionam socialmente, economicamente e politicamente. A gestão do território é fruto dessas condutas e não pode ser deixada de lado enquanto reflexão critica e constante da cidade.

Vivemos um momento mais do que nunca da errância. Não apenas a própria cidade se conforma como um grande labirinto, que sempre foi, mas o mundo, agora encontra-se conectado como um corpo único em que as informações fluem velozmente.

O movimento nos está intrínseco. A sensação de pertencimento é cada vez mais árdua, uma vez que as opções são demasiadas. Não englobam apenas meu bairro, minha cidade, mas o globo. O que ver, ler, escutar, a escolha se torna mais complexa, e a sistematização o maior desafio.

Essa afirmação não é de forma alguma negativa. Marta Bogéa em seu livro Cidade Errante explica a natureza do movimento da cidade e do homem e nos atenta, de uma certa maneira, à mesma sociedade em mutação que Ascher fala. O movimento agora nos é inerente, mas precisamos conseguir jogar com ele, isso significa reformular nossas concepções de cidade, arquitetura, política, cidadania e cultura.

Se a vida constitui-se de encontros, e a cidade nasce juntamente como objeto agregador desses encontros, não caberia aos arquiteto, enquanto grupo que trabalha com a configuração de espaços, desenhar aquilo que, para que o imprevisto possa ocorrer, é preciso ser previsto? [2]

Queremos construir uma cidade não apenas da informação, mas do conhecimento. A cidade da informação já nos é inerente. E para isso precisaremos de educação e formação. Precisaremos de uma politica pública, que seja inteligente, sólida, sistematizada, e nos ajude a construir junto com esse momento de agenciamento em rede, que está cada vez mais estabelecido.

Que cidade será essa que vamos construir?

Em diversos momentos na história da literatura, desde a modernidade, acompanhamos o retrato do ser urbano: protegido ou perdido, excluído ou incluído meio à multidão, mas sempre só. Este, tratado por Baudelaire, Allan Poe, Victor Hugo, Walter Benjamin, mais futuramente por Debord, entre outros. Seria talvez a mesma personagem a que Georg Simmel [3] nomearia como o típico habitante da grande cidade: aquele de caráter blasé.

1. ASCHER, François. Os novos princípios do urbanismo. São Paulo, Romano Guerra, Coleção RG bolso, volume 4. 2010

2. BOGÉA, Marta. Cidade errante. Arquitetura em movimento. 1ª edição. São Paulo, Senac São Paulo, 2009. p. 200

3. SIMMEL, Georg. As grandes cidades e a vida do espírito [1903]. Rio de Janeiro, Mana, v. 11, n. 2, out. 2005. p. 581

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Marcado pela indiferença o blasé é obrigado a anular seus sentimentos e não exteriorizar de fato aquilo que lhe está no interior. “O espírito moderno tornou-se mais e mais contábil” segundo as palavras do autor. Ou seja, sob a lógica de determinações numéricas e quantitativas, econômicas e temporal: levado pelo pulsar do relógio, pontual, sem muito espaço para o desvio, exteriorização dos sentidos e subjetivação.

Mediante a mera intensificação quantitativa das mesmas condições, esse resultado se inverte em seu contrário, nesse fenômeno peculiar de adaptação que é o caráter blasé, em que os nervos descobrem a sua derradeira possibilidade de se acomodar aos conteúdos e à forma da vida na cidade grande renunciando a reagir a ela – a autoconservação de certas naturezas, sob o preço de desvalorizar todo o mundo objetivo, o que, no final das contas degrada irremediavelmente a própria personalidade em um sentimento de igual depreciação. [4]

A insatisfação perante à cidade que desenha o habitante indiferente, depreciador da realidade. É natural daquele que consiga se desviar das objetivações e ritmos altamente pontuados, conseguir se sensibilizar. “Para poder criar a sua vida, precisa criar esse mundo”[5] como dizia Constant ao justificar a Nova Babilônia, onde propõe um projeto urbano utópico baseado no ambiente imaginário e no jogo recreativo, em que os cidadãos são participantes ativos da construção da cidade; essa por sua vez, uma cidade móvel para uma população nômade.

Ao pensar um cenário para esse novo urbanismo que ainda se apresenta como uma incógnita, não parece ruim almejar a Nova Babilônia, que por mais utópica que tenha sido em sua época, se mostra mais do que nunca atual.

O contemplativo não nos satisfaz mais. Queremos voz ativa, precisamos participar.

Arquitetos e urbanistas, partindo do pressuposto de que a cidade é viva, acreditam que cabe a nós decidirmos e encaminharmos o destino das cidades. Uma cidade sem desigualdade, habitada, que produza o que precisa consumir, seja sustentável, consciente, que abrace, tenha espaço para intervenção, mudanças, que permita e seja permitida.

Enquanto um organismo vivo, tem-se na sua menor célula – o homem – o princípio da mudança. Um cidadão ativo, vivo, colaborador e ator das ações da grande máquina urbana, que caminha com muitos pés e corações.

Compreendendo a crise perante as diferentes escalas da metrópole, propõe-se navegar na escala urbana, a fim de alcançar a escala humana, buscando o momento em que uma se conecta com a outra. Os vazios urbanos [6] são tratados de modo a representarem grandes parcelas de possibilidade, espaços intersticiais passíveis de ação, e indispensáveis para essa nova estruturação de cidade pós era industrial.

Iremos analisar num primeiro momento as dinâmicas de estruturação urbana, e suas mudanças no século XX, frente ao advento do automóvel, e mais tarde à chegada das novas tecnologias. Para depois compreender como funcionam as divisões político-administrativas do território e tentar entender qual a voz ativa do cidadão frente a

Cena do filme Asas do Desejo, Wim Wenders.

Ao lado: sem título_Laura Vinci. Ampulheta, intervenção Moinho Central Arte Cidade 1997. Foto Nelson Kon

4. Idem. Ibidem. p. 582

5. NIEUWENHUyS, Constant. “Nova Babilônia”. In: CARERI, Francesco. Walkscapes. O caminhar como prática estética. 1ª Edição, Barcelona, Gustavo Gili, 2013

6. Entendidos como grandes terrenos residuais meio ao tecido urbano construido, frutos da presença da indústria nas cidades.Ver: SOLÀ-MORALES, Ignasi. Terrain Vague. Cambridge, MIT Press, 1995

Contant Nieuwenhuys, “Nova Babilônia”

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tal modelo. Compara-se São Paulo com a cidade de Paris. Procurando se afirmar a importância do bairro como forte unidade de estruturação da cidade e célula básica para o planejamento. Escala de atuação aprazível, onde estabelecem-se os vínculos afetivos, de pertencimento e simbólicos nas relações humanas com a metrópole.

Agradeço enormemente Abílio Guerra, por me proporcionar a experiência de um ano em Paris. Sem a qual, não teria sido possível realizar o presente trabalho. Enquanto cidadã e estudante na França, pude viver e conviver na escala do bairro. Dinâmica que me despertou e me instigou o olhar perante certos aspectos da vida cotidiana, jamais observados na metrópole paulistana.

Num segundo momento realiza-se a análise e justificativa do terreno escolhido como objeto projetual. Pretende-se contar de forma resumida a história oficial desse local, apresentando um panorama da região e seus moradores, indicando o que foi tomado como referência de projeto. Além disso foram entrevistados diferentes moradores dos dois lados da estrada de ferro, compreendidos no bairro da Barra Funda de Baixo. De modo que dessem seu depoimento sobre sua relação com o lugar onde moram e sua percepção das transformações vividas na região.

No terceiro capítulo se destrincha o processo projetual que se desenvolveu ao longo deste ano. Processo que se dividiu em trés momentos distintos, abrangendo, cada um, uma escala diferente de atuação. Partindo de uma diretriz urbana para os grandes terrenos lindeiros à linha férrea até o desenho do objeto arquitetônico aqui proposto: uma transposição à linha do trem e um centro de bairro, equipamento gerido pela subprefeitura da sé.

A este trabalho agradeço o professor Jorge Wilheim pela pesquisa extensa e principalmente por seu olhar perante a cidade e o território, que me abriu para diversas questões cruciais que alimentaram a pesquisa. Agradeço sua humildade e sua disponibilidade ao me receber em seu escritório e conversar sobre meu projeto com muita atenção e dedicação.

Sua consulta foi imprescindível também devido sua participação no plano diretor

Abaixo fotos tiradas a partir do Viaduto Orlando Murgel, no centro da cidade de São Paulo. De um lado a Favela do Moinho, do outro terreno com ruinas de um antigo depósito tomadas por vegetação selvagem. Fotos autora

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de 2002, razão pela qual me adentrei no Plano de Bairro, uma de suas premissas. Política muito pouco discutida, que apresenta bibliografia escassa, em que encontrei muita dificuldade em me aprofundar.

A pesquisa contou com a estimada colaboração da Secretaria de Desenvolvimento Urbano, a SP Urbanismo e a Prefeitura de São Paulo, a que agradeço pela experiência do estágio este ano, que me proporcionou uma leitura muito mais clara da organização político-administrativa da cidade e das dificuldades de lidar com a extensão do território paulistano. Além de todos os conselhos de meus colegas, mapas e informações que agregaram muito à pesquisa.

Agradeço à professora Andrea Tourinho por toda a contribuição intelectual referente à cidade e aos bairros, preservação e simbologia, além de toda a paciência e carinho.

Ao amigo, mas também professor, Marcus Vinicius Damon pelas conversas, auxílios e trocas mútuas que só enriqueceram, e que continuarão a acrescentar nosso trabalho enquanto arquitetos, artistas, designers, fotógrafos e músicos.

Dedico o trabalho à Abílio Guerra a quem devo minha formação enquanto tutor, professor, chefe e amigo.

Mônica Nogami Gaultier, tia querida que contribuiu enormemente para minha experiência, formação pessoal e profissional.

Adriano Bechara, Mateus Humberto e Francesco Restuccia pelas discussões que sempre subvertem meus pensamentos.

Nina Dalla, Gabriela Cherubini, Júlia Reis e Ju Machado por todo apoio, atenção, dedicação e amizade.

À minha família: Anna Isabel, Juliano, Alexandre pai e filho, Cristina, Cecília, Luiza, Gabriela, Laura, Olívia, Renata e todos que estão no meu dia-a-dia.

Para minha mãe.

Abaixo imagem dos meandros do canal do Pinheiros. Fonte: FRANCO, Fernando de Mello. A construção do caminho: a estruturação da metrópole através da conformação técnica da Bacia de São Paulo. Tese de doutorado. São Paulo, FAU USP. 2005. E estrada de ferro na entrada da Favela do Moinho, Campos Elíseos, São Paulo. Foto autora.

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As sociedades ocidentais estão em mutação, entrando em uma nova fase da modernidade, que assiste à evolução profunda das maneiras de pensar e agir, da ciência e da técnica, das relações sociais, da economia, das desigualdades sociais e das formas de democracia. Essas mutações implicam e tornam necessárias transformações importantes na concepção, produção e gestão de cidades e do território; elas engendram uma revolução urbana moderna, terceira desde a revolução da cidade clássica e da cidade industrial. [1]

Segundo Flávio Villaça a dinâmica de uma metrópole pode ser entendida ao se analisar o espaço intra-urbano compreendido em sua estrutura territorial. Ou seja, assumindo que os elementos diversos de uma cidade interagem entre si, desenhando o movimento comum às metrópoles – brasileiras, no caso de seu livro –, sendo estes estruturais [territoriais] ou superestruturais [estrutura econômica, política e ideológica – não territoriais]. [2]

Em seu livro Espaço Intra-urbano, o autor se propôs a compreender o ponto comum entre a forma de estruturação das metrópoles brasileiras, alegando que da mesma maneira que elas são de fato distintas, possuem uma série de semelhanças – decorrentes de um mesmo país, formação social, mesmo momento histórico, mesmo modo de produção e sob mesmo Estado – que consequentemente desenham uma similar estruturação do território urbano.

É importante compreender o território segundo a estruturação desenhada por Flavio Villaça. Principalmente, entender o papel do centro principal de São Paulo, definido como o coração da cidade, com a capacidade de aglutinar funções, atrair distintas classes sociais e faixas etárias. Nos limites de hoje, conhecido como Centro velho e Centro novo [distintos do chamado centro expandido, que compreende a Av. Paulista].

A lógica da cidade de São Paulo, segundo Flávio Villaça, até os anos 1960 se pautava na dinâmica centro – subcentros, movimento que conformava o tecido urbano e desenhava sua expansão. Havia de um lado o Centro principal [Centro velho + Centro novo], caracterizado pela alta oferta de empregos, comércio especializado e confluência de infraestruturas de transportes, servindo a cidade toda; e de outro lado os subcentros, definidos como centralidades secundárias, que conformavam uma estrutura local, mas que ainda assim eram complementados pela área central, a exemplo: Santo Amaro, Penha, Santana, etc.

Com a difusão do automóvel, e mais tarde do metrô e de

1.ASCHER, François. Os novos princípios do urbanismo. São Paulo, Romano Guerra, Coleção RG bolso, volume 4. 2010. p.17

2. VILLAÇA, Flávio. Espaço intra-urbano no Brasil. Studio Nobel, São Paulo, 1998.

Série: Espetáculo do crescimento, 2013. Foto Tuca Vieira tirada na ocasião da X Bienal de arquitetura de São Paulo.

Pâgina anterior: foto da passarela existenteque conecta o distrito de Santa Cecília à Barra Funda. Na rua Capistrano de Abreu, centro de São Paulo. Foto autora.

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Diagrama de centralidades em São Paulo segundo arquiteta Andrea Tourinho. Elaboração MCLF para palestra proferida pela autora no Simpósio: Áreas Centrais em Metrópoles Latino-Americanas realizado em Setembro de 2013

área central principal

bairros centrais

nova centralidade

novas centralidades

malha de novas centralidades sobreposta ao funcionamento da lógica centro-subcentros

subcentros conectados com centro principal.

[lógica centro-subcentro]

subcentros

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24Localização do Shopping Aricanduva em São Paulo. Terreno de aproximada-mente 1 milhão de metros quadrados.

Walt Disney apresentando em 1960 the Experimental Prototype of the City of Tomorrow [EPCOT]. Modelo de gated community americana baseada no automóvel.

3. TOURINHO, Andréa de Oliveira. Do Centro aos centros: bases teórico-conceituais para o estudo da centralidade em São Paulo. Tese de Doutorado, Fau Usp 2004

4. VILLAÇA, Flávio. Op.Cit. p. 265

5. Termo americano Leap Frog, para subusrbanização. Ver: TOURINHO, Andréa de Oliveira. Op. Cit.

6. ASCHER, François. Op. Cit. p.38

7. BRISSAC, Nelson. Ver: < www.artecidade.or.br/novo/pesquisa/zl/zl>. Acessado em 20 de Julho de 2013.

tecnologias de comunicação, foram criando-se novas centralidades, numa malha sobreposta a antiga malha hierárquica de centro-subcentros [3]. Hoje, novos centros guardam uma relação de competitividade acirrada com o Centro, formando uma lógica de ofertas alternativa, e quase apagando a antiga malha de predominância. O que Villaça viria a chamar de fruto da cidade tipicamente capitalista, àquela que se modela em função do mercado imobiliário, deslocando o centro principal para outros pontos da cidade [Paulista e Faria Lima a exemplo de São Paulo]. Potencializando a segregação sócio espacial do território.

A década de 1960 marcou nova transformação na natureza e estrutura do centro de São Paulo. O atual Centro novo foi também abandonado pelas camadas de alta renda, passando a orientar-se para as camadas populares. Surgiu um novo centro decadente, que se agregou ao antigo formando um único Centro velho. [4]

A exemplo das novas centralidades promovidas pelo mercado temos os shopping centers e as gated communities, fruto do Leap Frog [5] [suburbanização] nos EUA, modelo importado por nós a partir dos anos 1960.

O mercado imobiliário começou a deslocar o centro, o que provocou o processo de decadência do centro principal. Segundo Flávio Villaça, esse esvaziamento que se deu em diferentes cidades do Brasil, tem correlação direta com a difusão do automóvel. Comprova em sua tese que a partir dos anos 1960, com o crescimento da indústria automobilística, tem-se o esvaziamento e degradação dos importantes centros das metrópoles: a exemplo Salvador e Recife. Em São Paulo o mercado começou a expandir e mudar de localização sentido sudoeste, começando pela Av. Paulista, depois Faria Lima, hoje Berrini.

A maneira dos habitantes se relacionarem com sua cidade foi profundamente alterada. A partir do momento que se tem novas ferramentas de transporte e de comunicação, a expressão: “O ponto faz o negócio” já não se faz mais efetiva. O fator de localização estratégica deixa de ser estruturante para a dinamização da malha urbana uma vez o negócio pode criar o ponto partir de si.

Em muitos casos se tem a situação do comércio local sofrer competitividade com outros centros. Sendo mais fácil o acesso a informação, preço e pluralidade de funções [lazer, cultura, saúde, alimentação] num centro consolidado pelo mercado que pela centralidade local, que muitas vezes se encontra desestruturada e desarticulada. Os shoppings são um grande competidor nesse caso. [você sabia que o shopping Aricanduva possui o MC Donalds que mais vende de São Paulo?]

Todavia, os novos instrumentos de transporte e de comunicação abrem novas possibilidade de escolha em matéria de localização residencial, de atividades, e mudam a natureza do “local”: este não é herdado ou imposto, porém é resultado das lógicas reflexivas, das decisões que são tão mais complexas quanto maiores forem os meios de deslocamentos ou de telecomunicações disponíveis a indivíduos ou organizações. Isto não evita problemas de coesão social, pois estas lógicas podem resultar em novas formas de segregação. [6]

Assim como descreve Brissac: “Nos últimos anos, novos agentes e padrões de organização do espaço urbano anunciam um outro ciclo de reestruturação. Megaprojetos internacionais de redesenvolvimento vão reconfigurar regiões inteiras das cidades, baseados em imensas estruturas arquitetônicas multifuncionais. Investimentos intensivos que exigem desregulamentação e subordinação da administração pública. Uma dinâmica que, devido a sua escala, distingue-se por completo dos modos de ocupação e organização do espaço urbano até então promovidos pelo Estado e pelos interesses imobiliários tradicionais.”[7]

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Legenda imagens: Shopping Interlar Aricanduva, propaganda disponivel via youtube. Acessado 1 novembro 2013.

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Ao lado, os diferentes núcleos de forte identidade dos bairros centrais, que podem ser entendidos como fruto das grandes barreiras [trens e avenidas] que confluem na região central de São Paulo. Ao mesmo tempo que os isolam, são quem os delimitam e os escondem; tornando-os individualmente peças singulares formadoras desse grande tecido que é a área central. Elaboração: MCLF

8. TOURINHO, Andréa de Oliveira. Op.Cit.

9. GUERRA, Abilio. Grotão do Bixiga. Arquiteturismo, São Paulo, ano 06, n. 064.01, Vitruvius, jun. 2012 <http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquiteturismo/ 06.064/4389>

10. GUERRA. Abílio. Op. Cit.

Essa sobreposição de malhas de centralidade da cidade [centro-subcentro e novas centralidades], segundo Andrea Tourinho [8], começou a enfraquecer as dinâmicas locais dos centros de bairro, sobretudo a partir das duas últimas décadas do século XX devido às novas condições de localização do capital na metrópole – que se traduz na dispersão dos pontos de concentração do terciário pela cidade, sobretudo em suas áreas centrais.

A lógica da vida de bairro deixou de ser dominante estruturante da cidade. O que não significa que ela não exista. Ela existe e é um importante ator nos bairros em que se registra. Tomemos como exemplo o bairro do Bixiga.

O Bixiga possui um forte caráter de bairro. É só passear por suas ruas íngremes em um fim de tarde para saber. Não é à toa que nele se conformou a Associação Bela Vista, formada por atores locais para discussão do futuro do bairro. O grupo formado por diferentes instituições e grupos civis da região se reúne semanalmente para discutir o Plano de Bairro [parte da política dos Planos Regionais, política prevista no Plano Diretor de 2002 e retomada pela atual gestão de Fernando Haddad]. O que é um grande avanço para o bairro e muito importante para manutenção das dinâmicas e para sua representatividade nas ações do poder público.

Segundo o arquiteto e crítico Abílio Guerra, o Bixiga não é esquecido, é escondido, o que lhe atribui seu maior tesouro. Está na Bela Vista, no alto, entre Paulista e Consolação. Entre grandes eixos e avenidas, elevados, portanto entre. Bairro central: sim. Contudo desconhecido, protegido. Criou-se numa ilha intocada. Com todas suas características de bairro tradicional, permeada por sua arquitetura tombada, não sofreu grandes alterações na paisagem: o que lhe garante a identificação da população por sua paisagem urbana característica.

Mas, no fundo, o que torço mesmo é para que a esqueçam por mais algum tempo – com sorte, algumas décadas –, que troquem a revitalização artificial da área pela vitalidade arcaica que lhe dá o caráter. O isolamento tem como aliado a própria inexistência oficial do Bixiga, bairro tradicionalíssimo desprezado pela divisão administrativa da cidade, afinal não passa de uma denominação popular para uma parte do distrito da Bela Vista, sendo o grotão sua parte mais baixa, geograficamente. Passear por ali é se deparar com a memória da cidade provinciana que São Paulo foi até anteontem. [10]

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Nos bairros centrais não é apenas o Bixiga que se encontra nessa situação. Ao observarmos a malha central, ela se divide pelos grandes eixos: Leste - Oeste, Norte - Sul, desde a ferrovia até as grandes avenidas advindas do plano de Prestes Maia. E o que está entre esses importantes rasgos, fios condutores de grandes fluxos, são bairros ilhados, retalhos na colcha da cidade, consequentemente excluídos e protegidos: protegidos da especulação, da invasão, do turista; excluídos por que o mercado imobiliário lhe virou as costas; conhecidos por sua história: muitas vezes bairros operários, tradição no samba, na macarronada, no comércio local ou serviço especializado, mas sempre com cara de bairro.

Reconhecemos o traço que caracteriza os bairros centrais: seja por suas edificações tombadas, seja pelo pequeno comerciante de ofício, seja pelo comércio especializado que se estruturou de tal maneira a estabelecer uma dinâmica local paralela à dinâmica metropolitana de incansáveis fluxos, gerando uma vida intrínseca ao local, de forte reconhecimento daqueles que lá habitam.

O “boom” econômico brasileiro transformando a natureza do morar. Barra Funda, São Paulo. Foto Francesco Jodice, 2006. Fonte: BURDETT, Ricky, SUDJIC, Deyan [eds.]. Living in the endless city. Londres, Phaidon. 2011

Casario no grotão da Bela Vista. Foto Abílio Guerra.

Ao lado: Santa Cruz do Capibaribe, PE. Foto Tuca Vieira. Série: Espetáculo do crescimento, 2013. X Bienal de arquitetura de São Paulo.

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O bairro como unidade urbana

Brasil está com a cidadania atrasada.[1]

Estamos aqui retomando uma dinâmica que já foi muito presente na cidade de São Paulo: a vida de bairro, movimento muito rico e estimulador, principalmente nos bairros centrais aqui tratados.

A vida de bairros anteriormente operários, onde se localizavam pequenas vilas, era marcada pela criançada na rua, os mais velhos papeando na porta de casa, mensagens que eram gritadas da janela, roupas sendo lavadas no espaço comum à todos, e etc. Cenas que compõem o imaginário de quem pensa nos bairros como a Móoca, Bom Retiro, Bixiga há 50 anos atrás. Os próprios clubes esportivos, muito comuns na cidade de São Paulo – a exemplo Clube dos Ingleses, Clube Helvétia, Esporte Clube Sírio, entre outros – se iniciaram a partir dessa forte dinâmica de bairro, para encontro da sociedade civil, discussões das questões locais, trocas intelectuais, culturais, etc.

O bairro corresponde à dimensão de ter-ritório ideal para a reinvindicação coletiva. Em território maior, na região administra-tiva, surgem conflitos de prioridade entre um bairro e outro; em escala menor, na rua domiciliar, as reinvindicações esgotam-se rapidamente. [2]

Dizer que hoje a vida de bairro não existe mais em São Paulo seria um exagero. Mas podemos dizer sim que ela está em extinção.

Segundo o arquiteto Jan Gehl a atual vida cotidiana, antigamente totalmente atrelada ao espaço público, hoje se alterou. As tarefas vinculadas à rotina, antes realizadas na rua, como passar um recado, chamar o vizinho, lavar a roupa, brincar, socializar, etc., foram perdendo seu espaço no âmbito público. Podendo hoje ser realizadas dentro de casa, fenômeno fruto das novas tecnologias e intrínseco à dinâmica atual da sociedade. [3]

Atualmente o espaço público para ser atraente e congregar pessoas, precisa oferecer atividades complementares à rotina. Trabalho este, que pauta a

1. Jorge Wilheim em entrevista realizada pela autora. Junho 2013

2. WILHEIM, Jorge. Projeto São Paulo: propostas e melhorias da vida urbana. Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1982. p. 64

3. Palestra proferida por Helle Søholt, sócia fundadora do escritório Gehl Architects, na Prefeitura de São Paulo em abril de 2013 na ocasião da inauguração do projeto Centro Diálogo Aberto, coordenado pela SP Urbanismo.

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oAo lado: samba na Barra Funda entre amigos em dia de sábado. Rua Anhanguera, 2013. Foto autora.

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ação do escritório Gehl Architects, especialistas em consultoria de governos, a que Jan Gehl, importante arquiteto urbanista, com longa pesquisa na área e cunhador do termo “Cidade para pessoas”, é fundador. [4]

Cidade como campo de negociação

São Paulo cresceu abruptamente nos anos 50, resultado da vinda de uma grande massa de origem rural, que pouco sabia das tradições da vida urbana. A dinâmica de inclusão dessa massa nas metrópoles marcou o processo de industrialização do século XX.

Com a descentralização do processo industrial observada nas últimas décadas, o desafio se coloca novamente: como reorganizar as cidades, como possibilitar o desenvolvimento econômico em novas bases.

As dinâmicas da economia global têm provocado profundas alterações na estrutura produtiva e na organização territorial do país, com a emergência de novos pólos industriais e o redesenho da infraestrutura logística, sobretudo ferroviária e portuária. Com isso altera-se o papel estratégico da metrópole: ela deixa de sediar atividades industriais, transferidas para outros locais, e tende a se consolidar como um centro de gerenciamento corporativo e de serviços. [5]

O urbanista Jorge Wilheim, em sua extensa pesquisa, principalmente quando se trata de São Paulo, fomenta uma ideia que nos é muito aprazível: a tentativa de redinamização da grande metrópole de São Paulo através de múltiplas e pequenas dinâmicas locais. Como organizar a cidade por bairros e não sob a atual lógica de centralidades dispersas?

Baseando-se em um modelo existente e efetivo de governo descentralizado como a cidade de Paris podemos visualizar a ideia: organizar administrativamente a cidade por arrondissements [equivalente a nossa divisão de subprefeituras], fornecendo aos respectivos “subprefeitos” uma autonomia decisória efetiva perante a municipalidade, ou seja de cunho jurídico e orçamentário.

Uma mairie [subprefeitura] de um arrondissement em Paris é o edifício político que representa o conselho do arrondissement [conseil d’arrondissement], presidido pelo Prefeito do arrondissement [Maire d’arrondissement, ou o equivalente ao Subprefeito em São Paulo]. Este último por sua vez é eleito pelo próprio conselho, oito dias após a eleição do prefeito da cidade.

O conselho de cada arrondissement por sua vez é escolhido através de eleições diretas, realizadas no próprio edifício da subprefeitura, sendo o número de conselheiros proporcional à seu território. O voto não é obrigatório e a população ao votar precisa comprovar que mora nos limites administrativos daquela subprefeitura.

A independência política e jurídica da mairie d’arrodissement veio a partir de uma lei estabelecida em 1982, que organizou administrativamente as três maiores cidades da França: Paris, Marseille e Lyon [Lei PML], prevendo esse espaço de representação

4. Jan Gehl (nascido em 17 de setembro, 1936) é um arquiteto dinamarquês e consultor de projeto urbano, cuja carreira tem-se centrado na melhoria da qualidade de vida urbana, orientando redesenhos de cidades, com foco no pedestre e ciclista. [fonte: www.gehlcitiesforpeople.dk/]

5. PEIXOTO, Nelson Brissac. Paisagens Urbanas. São Paulo, Senac São Paulo, 2004. p.44

Dubai. Foto Francesco Jodice, 2009.

Ao lado: contraste entre construções observada nos Campos Elíseos/Santa Ceciília. Foto autora.

Próxima página: Largo da Concórdia. Foto Tuca Vieira.

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do poder civil perante a municipalidade, além de prover uma gestão mais autônoma dos diferentes bairros [descentralizando o poder no âmbito da municipalidade]. Um equilíbrio entre o conselho da cidade de Paris e o conselho local do arrondissement. Com poder decisório sobre seu território [referente sempre à questões de administração local: escolaridade, auxílio social, equipamentos esportivos, lazer, etc.] e de representatividade direta do cidadão. [6]

Dentro de seu edifício ocorrem exposições de alunos e artistas locais, eleições, registros civis [casamentos, nascimento, óbito, título eleitoral], e, principalmente organização e sistematização das atividades disponíveis na região: feiras livres, festivais, cursos, entre outras atividades [comércios e serviços].

O cidadão em contato com essas informações se apropria de seu bairro, sendo incentivado o contato entre moradores de uma mesma região, que utilizam a subprefeitura como espaço de troca e convívio, e principalmente como ferramenta para ordenamento de informações do bairro, fomentando a dinâmica local social, econômica, politica e culturalmente. A prática da cidadania pelo habitante é conquistada, de tal maneira, que ele se sinta parte da política social de sua própria rotina. Poder importantíssimo que todo habitante necessita para se tornar um cidadão.

Mas quais são os problemas urbanos que se destacam ao analisarmos a vida de um bairro e quais as formas de sua solução? É ao nível da vida cotidiana do bairro que se percebem as carências em informações, em oportunidades de trabalho, creches, escolas de primeiro grau e animação cultural. É ao nível do bairro que convém que se inicie a organização da sociedade civil em seu legítimo anseio de participar com eficácia. [7]

Por uma [re]apropriação do bairro

Quando se tratam de decisões municipais, de caráter abrangente da cidade, não são todos os cidadãos que se sentem no direito e capacidade de comentar e se posicionar. Mas quando se trata de sua rua, sua feira, sua praça, seu cotidiano e rotina, um habitante de um bairro torna-se um expert, melhor do que ninguém nesse conhecimento. Nesse caso imagina-se um debate público muito mais profundo e palpável para um cidadão se apropriar, e assim exercer seus direitos.

Uma sociedade civil não articulada, no âmbito desse microcosmos tratado, não tem conhecimento e acesso à seus direitos. A cidade vive uma constante mudança, a cidade é um organismo vivo. Como criar mecanismos para manter esse organismo saudável e sempre preocupado com sua saúde e bem estar? Garantindo que cada célula se represente e saiba seu lugar, suas necessidades e suas demandas.

Fortalecer a dinâmica de bairro, não é um retorno à vida de comunidade. Muito menos é uma utopia. É um modo mais organizado e sistemático de possibilitar o exercício da cidadania em perímetros geográficos de proximidade e manter um mecanismo de manutenção dentro de um contexto tão plural como é a cidade de São Paulo.

6. Statut et institution de Paris. In: www.paris.fr/politiques. Acessado em 1 de novembro de 2013.

7. WILHEIM, Jorge. Projeto São Paulo: propostas e melhorias da vida urbana. Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1982. p. 65

Praça de atendimento no Vale do Anhangabaú. Apesar do local privilegiado, o edifício não é convidativo. Foto Autora.

Projeto Cine B na Luz. Associação Amo a Luz. Fonte: www.apropriacaodaluz.blogspot.com.br/

Festival Baixo Centro, 2013. Carlos Serejo, Sebastião de Oliveia, Luana Minari, Jeff Lemes, Toco e Cau, do grupo Ocupeacidade. Foto Baixo Centro.

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As atividades locais, pequenos serviços, antigos moradores, tradições do bairro, comércios vicinais, já são inerentes aos bairros. Todo bairro possui sua dinâmica própria, cotidiana viva, assiste todo dia o ir de seus habitantes, e os recolhe na hora de dormir.

Como de uma maneira delicada e estimuladora dessas dinâmicas já preexistentes o poder público pode agir, para reforço de uma organização administrativa localizada?

A partir da premissa da “Cidade para Pessoas” de Jan Gehl, [8], para esta ser de fato vivida, é necessário instaurar-se uma dinâmica de organização política administrativa em que o cidadão tenha sua representatividade efetiva nas decisões. Abrindo-se sempre que possível, processos abertos, transparentes e participativos.

Uma vida de proximidade significa distâncias físicas e geográficas acessíveis. Para se criar laços sociais, afetivos e significativos com o lugar que se habita.

8. Pesquisa do arquiteto e urbanista Jan Gehl, que se pauta na premissa de que as cidades são feitas de pessoas e não de edifícios. Gehl prega a importância do desenho para a escala humana, desde o mobiliário urbano à grandes metrópoles. Enaltece o uso dos espaços públicos e defende que o Poder Público é um ator crucial para o diálogo do território com a população. Para mais informações ver: GEHL, Jan. Cidade para pessoas. São Paulo, Editora Perspectiva. 2013

Parque Minhocão, 2012. Foto Tiago Queiroz

Ao lado: New Road, Gehl Architects. Prova de que os diferentes podem conviver juntos. Acervo Gehl Architects.

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lo Quando abordamos o tema do planejamen-to urbano, não há como fugir da política, afinal, o próprio termo política tem suas raízes na urbe, a pólis grega. Porém não há como ignorar o vasto campo do contexto social, desde reinvindicações urgentes e di-versificadas de moradores até as pressões e atividades econômicas do mercado imo-biliário, das idiossincrasias partidárias ao sentimento de classe, da pressa de setores governamentais ao individualismo enraiza-do na cultura migrante. [1]

Jorge Wilheim [2] foi questionado sobre o plano diretor de São Paulo, documento que ajudou a produzir há dez anos, referente ao que gostaria de comentar nesse momento de revisão vivido pela atual gestão de Fernando Haddad. O urbanista explica que é natural a revisão de um documento produzido dez anos atrás, julgando-a necessária nesse atual momento de retomada, e se queixa do não cumprimento de uma das diretrizes contempladas no documento, que diz não ter sido se quer iniciada: O plano de bairro.

A eficácia do Plano de Bairro para Wilheim é que, através de pequenas ações de baixo custo realizadas no bairro, se têm uma melhoria IMEDIATA. Quanto ao nível administrativo, segundo o urbanista, a escala menor se faz muito mais simples de trabalhar, tornando o planejamento EFICAZ.

Oferecer ferramentas políticas para a população é uma atitude de auxílio para a manutenção do exercício da cidadania e da participação responsável ou co-responsável da democracia. Permitindo que os próprios moradores de uma região coordenem sua manutenção natural. A cidade é orgânica, muda constantemente. A preservação material ou imaterial não se guarda intocada, se ajuda a guiar o pulsar e o crescer.

Temos que ter a sensibilidade de oferecer para os bairros e seus cidadãos, a possibilidade de se entrosar e exigir seus direitos, terem representatividade e ciência de suas responsabilidades e deleites. Barrar uma operação urbana, opinar nas grandes construções, no potencial construtivo, nos incentivos urbanísticos decididos pelo poder público. Se proteger e mudar

Plano de Bairro de Perus, 2012. Única subprefeitura que realizou tal política, estabelecida pelo Plano Diretor de 2002.

1. WILHEIM, Jorge. São Paulo uma Interpretação. São Paulo, Editora Senac 2011. p.194

2. Jorge Wilheim em entrevista para o Roda Viva em 4/02/2013

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Mas o que é o plano de bairro?Os Planos de Bairros são complementares ao Plano Diretor e aos Planos Regionais Estratégicos e têm como objetivo estabelecer diretrizes específicas para determinados locais da cidade. Estas diretrizes não podem ser contraditórias ao que for definido no Plano Diretor, no Zoneamento e nos Planos Regionais, mas sim complementares. Poucos Planos de Bairros foram elaborados na Cidade de São Paulo, mas existe a oportunidade de se definir no novo Plano Diretor os critérios e regras para elaboração dos Planos de Bairro. Estes planos podem ser elaborados por distritos e não necessariamente por bairros, lembrando que sua principal característica é tratar de assuntos locais, sempre atentando para as orientações do Plano Diretor.[www.gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br]

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conforme precisarem e desejarem.

Uma população articulada exige uma população com um grau de instrução, com saúde, educação, informada, e principalmente: cidadã. Quem não é cidadão, não mora. Não almeja nada pelo lugar que não considera sua casa. A partir do momento que a pessoa vive: anda, sente a cidade, ouve, troca, aprende, ensina – se sente parte desse organismo e por ele irá lutar e exigir. A cidade desumanizada, não forma cidadãos, pois não lhes oferece uma vida digna, e nem mesmo lhe dá ferramentas para exigir. O ensinamento vem do próprio viver, do cotidiano, do ir e vir, conhecer, desejar. Se você vive para sobreviver, você não percebe que está de fato vivendo. Uma cidade de sobreviventes funciona, mas não se mexe, ela marcha, ela é morta, ela é automatizada.

A luta pelos direitos sociais faz com que o cidadão tenha de se qualificar para interagir no processo político. Seja para defender seus próprios interesses ou os interesses de sua comunidade. Esse exercício é vital para a cidade, e a partir do momento que o cidadão não se sente com uma representatividade efetiva em seu microcosmos, ao menos de acompanhar o processo das decisões, ele se abstém, e se anestesia. No momento que se sente dono de um conhecimento [escala da comunidade/bairro/vida cotidiana], ele se sente mais responsável para agir, opinar, e assim iniciando seu processo político, que o fará se qualificar e se organizar.

Rede Social Bela Vista, organização civil da Bela Vista, que está articulando a população local para organizar o Plano de Bairro, demanda do futuro Plano Diretor [que está em processo de aprovação]. Fonte: www.redesocialbelavista.com.br

Ao lado imagem de cortiço na Rua Conselheiro Nébias, Santa Cecília. Representando ausência do poder público na região.

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e A era da informação permite estabelecermos novas formas de organização, no trabalho e na obtenção do conhecimento. Em lugar da estrutura piramidal hierárquica, o trabalho pode der organizado sob forma de redes ou malhas, em que os integrantes são assimétricos quanto ao poder que exercem – porém integrados, interagentes e focalizados na área a que, em conjunto, se dedicam. [1]

Assumindo que a representatividade de um cidadão perante o Estado se dá na proximidade que se tem da decisão que é tomada, observamos que em São Paulo estamos com um déficit de representação governamental.

Quando se trata da micropolítica, a figura que mais representa grupos de interesses específicos em nosso modelo eleitoral seria o vereador. Este, por sua vez, não é vinculado à nenhum território. Por mais que tenha sido eleito representando um bairro ou uma comunidade, responde na Câmara à demandas da cidade toda.

Existem em São Paulo as subprefeituras, criadas em 2002 na gestão da Marta Suplicy. Órgão que instituiu-se justamente para tratar de questões locais aos distritos. Contudo o projeto não foi levado para frente, e nos últimos anos esvaziou-se. Não sendo atualmente uma referência de gestão de escala local, inclusive nunca cumprindo uma premissa básica do Plano Diretor de 2002, que era o desenvolvimento do Plano de Bairro. A subprefeitura de Perus foi a única das 32 subprefeituras paulistanas que concluiu a demanda. [2]

Decidimos então nos debruçar sobre a estrutura de governo que rege a cidade de Paris como um comparativo ao modelo paulistano. Para assim compreender o funcionamento de um governo descentralizado, buscando aplicar uma organização diversa da que atualmente organiza nosso território.

Na França, o que de fato dá representatividade para as comunidades – esteja ela inserida em um aglomerado urbano ou no campo – é sua autonomia e poder parcial de decisão sobre questões jurídicas, legislativas e, principalmente orçamentárias.

As grandes cidades francesas foram reorganizadas politicamente, após a aprovação da lei PML [Paris, Marseille e Lyon] de 1982. Constituiu-se na descentralização no nível da cidade, sobre o fundamento de fortificar administrativamente o elemento conhecido historicamente: o arrondissement [limite político administrativo existente simbolicamente desde 1795, que equivaleria à nossa subprefeitura,]. A subprefeitura de cada arrondissement – edifícios políticos previstos no urbanismo moderno de Haussmann – concebeu uma construção jurídica especifica, instituindo conselhos e prefeitos do arrondissement eleitos por sufrágio universal pela população habitante da região. O resultado dessa lei foi

1. WILHEIM, Jorge. São Paulo uma Interpretação. São Paulo, Editora Senac 2011. p.67

2. Lembrando que a atual gestão de Fernando Haddad está trabalhando na fortificação das subprefeituras, ação que está em processo. Após o Plano Diretor, o próximo passo é garantir o Plano Regional Estratégico, que já se refere à cada subprefeitura. E por último o Plano de bairro, previsto para das início em 2014. Ver: http://gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/

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Divisão de subprefeituras em São Paulo realizada em 2002, reestruturando a cidade em áreas administrativas de 350 mil a 450 mil habitantes. Cada uma compreendendo um conjunto plural de distritos. Na época eram 31, atualmente são 32, com a nova de Sapobemba. Fonte SMDU 2013

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muito positivo e deu início a uma forte dinâmica de bairro, hoje indispensável nas cidades citadas. [3]

A representatividade observada na França, em níveis urbanos, civis e legislativos, torna o cidadão muito mais implicado nas decisões políticas e consequentemente mais ativo, uma vez que sente a eficácia de sua participação. Já o sistema brasileiro, federativo, importado dos Estados Unidos, nos coloca numa hierarquia em que o baixo escalão da pirâmide não possui autonomia legislativa e orçamentária. Ou seja, não se desenvolvem projetos nos distritos, pois não há verba, nem poder jurídico nas subprefeituras, ficando a cargo da Prefeitura coordenar. O que resulta numa efetividade de poder muito restrita dos pequenos aglomerados.

Mesmo que falando abstratamente dos níveis de poder, em linhas gerais, o poder decisório, seja do município, da subprefeitura, ou de associações de bairros, é muito menor, comparando com o poder decisório e político da prefeitura.

Recaímos no problema de gestão pública que Jorge Wilheim está cansado de reafirmar. Para ele tamanha é a importância da organização e sistematização do território, que aceitou ser secretário estadual de Economia e Planejamento entre 1975 e 1979. Já havia compreendido que no fundo a questão recai na verticalidade/horizontalidade do sistema de governo.

Em Nova Iorque foram criados além dos Boroughs [equivalente à nossa subprefeitura] os Boards, conselhos formados por moradores da região eleitos para serem representantes de um certo grupo, que se aproxima mais à nossa escala de bairro. Esses representantes, através de reuniões mensais na comunidade, conseguem atuar como instrumentos de pressão sobre as decisões tomadas pelo poder público, incluindo e representando todos os diferentes grupos de moradores no processo, assim como aprovar ou vetar projetos para a região. Os Boards, por sua vez, são quem compõem o conselho dos Boroughs. Assim garantindo a participação mesmo quando o território se apresenta extenso. [4]

As subprefeituras em São Paulo quando foram criadas, havia a intenção de descentralização do poder. Contudo, o processo que se iniciou não obteve continuidade na gestão seguinte, e retrocedeu.

Outro fator importante é considerar que a estrutura eleitoral brasileira é eficaz, e o voto é obrigatório, o que já auxilia para uma reflexão política [mesmo que seja mínima] pelos seus habitantes.

Como se utilizar da dinâmica eleitoral existente efetiva e da divisão das subprefeituras já inerentes ao território desde 2002 para empoderar e legitimar as ações locais?

O Conselho Municipal, diretriz do Plano Diretor de 2002 e do Plano Diretor 2013, está sendo pela primeira vez implementada este ano e será uma ferramenta que auxiliará muito nesse processo. Contudo, qual a legitimidade desse conselho? Terá ele poder efetivo de decisão? Ao lado mapa das Communities

Boards em Nova Iorque. Fonte www.nyc.gov

3. A história das mairies de Paris têm seu início em 1795 enquanto divisão territorial. Para mais informações consultar www.paris.fr/

4. About community Boards. Ver: http://www.nyc.gov/html/cau/html/cb/about. Acessado em 20 de setembro de 2013.

O Conselho Participativo Municipal é um organismo autônomo da sociedade civil, reconhecido pelo Poder Público Municipal como espaço consultivo e de representação da sociedade nas 32 subprefeituras da cidade de São Paulo. As eleições serão dia 8 de dezembro de 2013. Não se sabe ainda a efetividade que esse conselho terá. Ver: www.conselhoparticipativo.prefeitura.sp.gov.br/

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Board Composition & MembershipCommunity boards are local representative bodies. There are 59 community boards throughout the City, and each one consists of up to 50 unsalaried members, half of whom are nominated by their district’s City Council members. Board members are selected and appointed by the Borough Presidents from among active, involved people of each community and must reside, work, or have some other significant interest in the community.ResponsibilitiesCommunity boards have a variety of responsibilities, including but not limited to:• Dealing with land use and zoning issues. CBs have an important advisory role and must be consulted on the placement of most municipal facilities in the community. Applications for a change in or variance from the zoning resolution must come before the board for review, and the board’s position is considered in the final determination.• Assessing the needs of their own neighborhoods. CBs assess the needs of their community members and meet with City agencies to make recommendations in the City’s budget process.• Addressing other community concerns. Any issue that affects part or all of a community, from a traffic problem to deteriorating housing, is a proper concern of community boards.[efetividade dos conselhos municipais de Nova Iorque: os Boards. fonte: http://www.nyc.gov/cau/cb]

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aris Mairie du 19eme arrondissement

desde 1878População: 184.787 habitantesTerritório: 6, 79 km2Densidade [hab/km2]: 27.489[fonte www.mairie19.paris.fr/]

Diagrama do funcionamento municipal de Paris atualmente.

Elaboração MCLF.

Principais funções da Mairie d’arrondissement:

_Planejamento: aprovação de projeto [permissão para construção], e aprovação do uso do solo.

_Educação: contribuir no desenvolvimento local do ensino público.

_Habitação: garantir que 30% das habitações disponíveis sejam de cunho social.

_Cultura: cultura e vida associativa. Comunicação e informação e serviços envolvidos.

_Assistência Social: gestão do comitê de chamado de CASVP [centre d’action sociale de la Ville de Paris].

_Registros do Estado Civil: nascimento, óbito, casamento, registro eleitoral, etc.

_Serviços: limpeza urbana, serviços locais e manutenção de equipamentos públicos.

47Mapa Paris intra muros. Fonte CASSINI [http://carto.apur.org/]

<Guia mensal Le Paris du 19eme. Publicação editada pela Mairie du 19eme. Todas as mairies possuem sua própria revista de conteúdo. Objetivo de divulgação de atividades, serviços, entre outras informações sobre a região.

>Página inicial da Mairie du 19eme e página do link guia do 19eme. O portal se mostrou bem interativo e de fácil navegação.

>Ao lado a perspectiva da edificação de 1878. A praça Armand Carrel é o espaço público que recebe o edifício político emblemático no 19eme arrondissement. Fonte Google

Cidade de ParisPopulação: 2.257.981 hab.Território: 105,40 km2 Densidade [hab/km2]: 20.980[fonte www.paris.fr]

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desde 2002População: 431.106Território: 26,2 km2Densidade [hab/km2]: 16.454[fonte IBGE / censo de 2010]

Diagrama do funcionamento municipal de São Paulo

atualmente. Elaboração MCLF.

* Após sua criação, as subprefeituras foram esvaziadas, não cumprindo as funções que lhe foram previstas.A partir deste ano, 2013, a situação se alterou, e o desejo da atual gestão é cada vez mais lhe atribuir autonomia.

Principais funções da Subprefeitura*:

_Planejamento: execução de zoneamento e normas urbanas; código de obras.

_Serviços: Limpeza urbana, serviços locais.

_Transporte: manutenção de ruas

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Cidade de São PauloPopulação: 11.253.503 hab.Território: 1.521,101 km2Densidade [hab/km2]: 7.398,26[fonte IBGE / censo de 2010]

Subprefeitura da Sé inserida na RMSP. Fonte SMDU 2013. Elaboração MCLF.

Página inicial do portal da Subprefeitura da Sé de São Paulo. e página dos serviços de equipamentos públicos. O portal se mostrou pouco interativo e confuso para navegação.

Ao lado imagens da inserção do edifício da Sub Sé. Foto autora, 2013.

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Nessa página encontram-se imagens tiradas a partir do google street view das subprefeituras e mairies das cidades de São Paulo e Paris respectivamente. As mairies de Paris possuem a premissa de sempre estar em frente ou próximas a praças públicas. São de fácil acesso e bem localizadas no bairro. Já as

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subprefeituras não possuem um padrão. Sendo muitas vezes de difícil acesso, a exemplo a Sub de Pinheiros que está ao lado de uma grande avenida e a marginal. Em contraponto temos a mairie do 11eme arrondissement que, como podemos observar na imagem, está sediando um casamento.

casamento!

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Alguns dos portais de subprefeituras de São Paulo foram fotografados, assim como alguns dos portais das mairies de Paris. Analisando graficamente ambas interfaces digitais podemos perceber de imediato, respectivamente, um espelhamento na relação do órgão perante sua comunidade.

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A importância da comunicação gráfica é extrema, visto que é através desta plataforma que a população pode ter acesso aos serviços, esportes, cultura, lazer, educação e religião oferecidos por sua região. Sua comunicabilidade representa um profundo impacto na relação do habitante com sua cidadania e com seu bairro. Ou seja: seu cotidiano.

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Diagramas de comparação governamental.

São Paulo: fonte BURDETT, Ricky, SUDJIC, Deyan [eds.]. Living in the endless city. Londres, Phaidon. 2011. Tradução autora.

Paris: produção Mônica Nogami Gauter e Maria Claudia Levy.

Estes organogramas ilustram como estruturas de governo são organizadas em São Paulo e Paris. Eles têm a função de dar uma primeira impressão de como as responsabilidades básicas são arranjadas, identificando as principais funções no nível federal, estadual e municipal. Ainda que oferecendo uma visão geral comparativa, eles não têm a intenção de fornecer um sistema detalhado de cada governo, que pode ser encontrado apenas ao se analisar caso a caso.

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nível nacional

nível regional

nível estadual

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SUBPREFEITURAS COM MAIS AUTONOMIA

[cenário]

ORGANIZAÇãO MUNICIPAL DE SãO PAULO HOJE

CENTROS DE BAIRRO PARA APOIO DAS SUBPREFEITURAS

[cenário]

FUNCIONAMENTO DE PARIS [exemplo]

PREFEITURA

SUBPREFEITURA

EQUIPAMENTOS MUNICIPAIS

Diagrama do funcionamento municipal de São Paulo atualmente.

Elaboração MCLF

Proposta 1: Proferir mais autonomia a cada subprefeitura

Proposta 2: Criar edificícios administrativos de apoio à

subprefeitura. Que contenham principalmente praças de

atendimento

Exemplo de governo descentralizado: Paris. As subprefeituras possuem

autonomia perante à municipalidade,. Em termos populacionais uma subprefeitura em Paris [Mairie

d’arrondissement] possui metadedo númeto de habitantes de uma subprefeitura em São Paulo

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Descentralização e participação:_Retomar o conceito de descentralização do poder, dando maior autonomia às subprefeituras;_Proceder, em cada subprefeitura, à realização de Planos de Bairros e eventual avaliação e revisão dos Planos Diretores de cada subprefeitura;_Implementar a constituição e atuação de conselhos, de modo especial os Conselhos de Representantes, revendo a melhor forma de ver a sociedade sendo representada, em cada subprefeitura, fortalecendo assim a legitimidade da política de descentralização;_Implantar novas formas eletrônicas de expressão e participação cidadã, e fazer, sem hesitação, uso das formas constitucionais de consulta popular;_Iniciar estudos, levantamentos e debates destinados a reunir subsídios para o próximo Plano Diretor Estratégico, com vigência de 2012 a 2022.[Trecho de propostas pontuais para São Paulo em: WILHEIM, Jorge. São Paulo uma interpretação. 2011, p. 225]

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• praça da república

• estação marechal deodoro

• favela do moinho

• terminal princesa isabel

• estação barra funda

• memorial da américa latina

• escola de samba

• parque da água branca

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60.000M2

• jardim da luz / pinacoteca

• museu de arte sacra

• espaço anhembi • estação tietê

• parque dom pedro ii

• terminal dom pedro ii• anhangabaú

• subprefeitura da sé

• largo do paissandú• praça da

república• estação brás

• estação da luz / museu da língua portuguesa

• estação julo prestes / sala são paulo

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O Centro é o espaço de representação de toda a sociedade, o que o faz ser um campo compartilhado. E, como tal, o Centro se caracteriza por ser um campo de conflito. Pensar e agir sobre a transformação da área central de São Paulo exige enfrentar o campo de projeto como um campo de negociação dos conflitos, onde a coexistência pacífica se torne não apenas possível, mas sobretudo desejável. [1]

Focamos principalmente nos bairros centrais, por sua vocação enquanto bairros de identidade forte, ao mesmo tempo que servem à cidade toda, tanto pelo comércio especializado, rede de transporte público e empregos oferecidos. Os bairros centrais são muito importantes e são de extremos interesse de estudo pois abrangem em si, as duas escalas que permeiam a crise das cidades contemporâneas: Escala metropolitana versus escala local.

A vitalidade do centro relaciona-se à sua capacidade de atrair todas as classes sociais e faixas etárias.[...] Sua organização oscilou entre guardar traços da cidade colonial e responder às necessidades de transformação impostas pelo dinamismo da metrópole em cada uma de suas etapas. [2]

Apesar do centro ser o coração da cidade – receber milhões de pessoas diariamente, possuir grande parte dos equipamentos culturais, oferecer trabalho, grande pólo de comércios especializados, ser a região mais bem servida de transporte público – existe inegavelmente uma forte dinâmica local, muito rica e ímpar em cada um de seus diferentes bairros: seja Centro Velho, Centro Novo, Santa Ifigênia, Campos Elíseos, Luz, Santa Cecília, Bom Retiro, Móoca, Glicério, Bixiga, Consolação, Higienópolis, Vila Buarque, Baixo Augusta, etc.

Muito ligado a sua história, juntamente com as nuances da linha férrea, que foi rasgando parte da área central, outra parte foi sendo construída já no tecido danificado. As grandes avenidas também tiveram sua parte na conexão de grandes eixos metropolitanos que

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1. FRANCO, Fernando de Melo, “Campo Compartilhado”, In: Centro Diálogo Aberto. São Paulo, SP Urbanismo, 2013

2. MEyER, Regina Maria Prosperi; GROSTEIN, Marta Dora. A leste do centro. Territórios do urbanismo. São Paulo, Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2010. P. 21

Ao lado: Rua Barão de Itapetininga. 1974. Acervo SP Urbanismo

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segmentavam na escala do humano: o próprio Elevado Costa e Silva, a Avenida Radial Leste, Avenida do Estado, Avenida Rio Branco, entre outros importantes eixos viários presentes na malha central. O resultado desses grandes recortes e costuras foram bairros escondidos, dinâmicas internas muito fortes e únicas em cada ilha conformada pelos desenhos axiais que convergem sentido Vale do Anhangabaú, como previa o plano de Prestes Maia.

A desvalorização da área central se deve principalmente à necessidade de reestruturação da indústria e dos modos de produção, o que fez a cidade virar as costas para a região. O que não significa que não há vida lá, há sim e muita. Inclusive deslegitimando o atual termo muito utilizado pelas mídias ao referirem-se aos projetos de requalificação das áreas centrais como projetos de “revitalização”.

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Barra Funda de Baixo

Na segunda metade do século XIX, o loteamento de uma vasta propriedade da família Prado, conhecida como Chácara do Carvalho deu origem ao bairro da Bar-ra Funda. A ocupação da área se acentuou a partir de 1892, quando entrou em funcionamento a estação da São Paulo Railway, ferrovia popularmente denominada “Inglesa”.

A facilidade do transporte e o preço dos terrenos fa-voreceu a implantação de inúmeras indústrias na área menos elevada do bairro, que passou a ser identifica-da como Barra Funda de Baixo. Próxima ao Rio Tietê, aí também estavam instaladas olarias e, das águas se re-tirava areia para construção. Entre os estabelecimentos fabris estavam a Fábrica de Vapor de Tecido e Fiação de Corda e de Barbante, em 1892, e a Cristaleria Paulista, na Rua Conselheiro Brotero, em 1905.

Na Barra Funda de Baixo também residia parte signifi-cativa dos imigrantes moradores no bairro, muitos dos quais eram proprietários de pequenas oficinas artesa-ba

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nais e manufaturas de fundo de quintal. E famílias ne-gras, cujas mulheres eram empregadas domésticas nos bairros próximos, de Campos Elíseos, Santa Cecília e Perdizes. Os homens negros, quando não emprega-dos em indústrias, carregavam mercadorias na ferrovia, eram vendedores ambulantes ou prestavam serviços temporários no comércio das redondezas.

O ponto de encontro desses trabalhadores era o Largo da Banana, hoje integrado à área do Memorial da Amé-rica Latina, onde praticavam capoeira e formavam rodas de samba. Em 1914, eles fundaram o primeiro cordão carnavalesco da cidade; em sequência surgiriam outros, também organizados nos territórios negros existentes na Bela Vista e na Baixada do Glicério.

Na Barra Funda de Cima, a paisagem era predomi-nantemente a de um bairro residencial, pontuado por casas térreas e pequenos estabelecimentos de comér-cio e serviços.

Fonte: DPH. Guia de bens culturais da cidade de São Paulo. São Paulo, Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2012.

Abaixo: panorâmica da passarela existente em direção ao terreno em foco. Foto autora.

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Visão seriada desde o trem Foto e elaboração autora.

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O resultado da desindustrialização é o terreno vago [1]

Entre Campos Elíseos, Bom Retiro, Barra Funda e Santa Cecília. Quando digo entre é literalmente entre. Um espaço que não se conformou. No limbo de sua existência indefinida, se desenha pelos limites daqueles que o margeiam. Não havia como ocupá-lo.

O mesmo lugar que presenciou o desenvolvimento de São Paulo, participando ativamente do seio que alimentou seu vasto crescimento, não vingou.

Simples resultado de uma incompatibilidade de diferentes gestores. Duas companhias ferroviárias distintas, São Paulo Railway e Sorocabana, a primeira com seu término na Estação da Luz e a última com seu término na estação Júlio Prestes, ambas com o desafio de lidar com áreas de várzea, território de baixo custo e desocupado na época, a qual inseriram suas estradas de ferro. Desenhou-se um grande vazio, justificado pelo esboço de um dia talvez construir uma grande estação, que nunca se consumou.

O espaço entre pertencia à Rede Ferroviária Federal S/A, e devido uma dívida de IPTU foi para leilão em 1999. Após o leilão, foi para a União, e ainda encontra-se em posse indefinida devido brigas legislativas. A par de sua questão burocrática - estado jurídico – ele existe, ele está.

Existe por si, pelo vazio conformado pelo limite dos bairros que o rodeiam. Cresceram desde seu início de maneira indiferente um com outro, afinal desenvolveram-se do impulso gerado pela linha férrea, cada um com um fim definido pelas estradas de ferro, desenhando o terrain vague [2] aqui em questão.

Campos Elíseos meio ao luxo de uma sociedade burguesa se conformando, no final do século XIX. Consistindo principalmente em casarões de barões do café e suas famílias. Avenidas largas, fartas. Uma distância razoável do centro, que garantia toda a privacidade de uma luxuosa casa de bairro clássico, nos moldes europeus da época.

O Bom Retiro pelo nome já se conforma como o bairro

Industrias em São Paulo 1919. Fonte: FRANCO, Fernando de Mello. A construção do caminho: a estruturação da metrópole através da conformação técnica da Bacia de São Paulo. Tese de doutorado. São Paulo, FAU USP. 2005

Intervenção de João Resende. Arte Cidade

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1. MORALES, Ignasi Solà. Terrain Vague, Anyplace MIT 95

2. Termo utilizado por Solà-Morales. A importância do termo ser dito em francês se dá pelo autor devido a ambiguidade de ambas palavras não se expressarem em outra língua. MORALES, ignasi Solà. Presentes y Futuros. La arquitectura en las ciudades. Vague em português pode ser traduzido como vago, incerto, onda, movimento, vazio.

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isolado, do retiro e do descanso. Ironicamente ao seu futuro uso, que seria justamente o de negar esse retiro, do negócio em sua mais pura raiz. O bairro testemunhou a chegada de inúmeras fabricas e industrias, juntamente com suas vilas operárias, conformando esse território ao mesmo tempo que produtivo e pragmático, quanto popular e descontraído.

Na Barra Funda de Baixo residia parte significativa dos imigrantes moradores do bairro industrial, muitos dos quais eram proprietários de pequenas oficinas artesanais e manufaturas de fundo de quintal. Assim como famílias cujas mulheres e homens eram empregadas domésticas nos bairros próximos, de Campos Elíseos, Santa Cecília e Perdizes.

Juntamente com o rasgo, barreira de nível local, gerado por essas duas linhas de trem, estava a contrastante capacidade de conexão entre dois pontos tão distantes, proporcionado pela capacidade de rápido deslocamento do trem.

O local e o regional, dialogam com um contraste jamais coexistente antes. As distâncias passam a ser medidas por tempo e não mais por quilometragem. Talvez mais fácil ir da Luz até Paranapiacaba que ir a pé de um lado ao outro do trilho do trem.

Esse buraco tornou-se a própria metáfora para o esvaziamento posterior que a linha de trem passou a significar na rede de transportes brasileira. A razão principal pela qual São Paulo desenvolveu-se e inchou, deixou de ser importante para o momento econômico seguinte almejado pela metrópole, que na década de 30 já vinha iniciando sua tendência à indústria automobilística.

A crise do café afetou os barões e os bairros industriais sofreram, e sentiram essa queda. Juntamente com eles, a ferrovia, que lá estava para testemunhar essa dinâmica que viria ao fim.

Bairros importantíssimos para a concepção da cidade, foram esvaziando-se. O transporte férreo foi perdendo sua força e cedendo seu lugar na economia. O que não se pensou, imagino que naturalmente, pois foi a primeira vez que o mundo vivenciou essa experiência, era o destino desses terrenos centrais, vastos, e agora esvaziados de conteúdo e sentido no contexto que viria a seguir.

Espaços intersticiais surgiram e nada se fez. Regiões foram degradando-se e fomos nos distanciando deles, ao invés de combatê-los, integrando-os ao tecido consolidado. Segundo Solà-Morales “são bordas carentes de uma incorporação eficaz, são ilhas interiores esvaziadas de atividade, são esquecidos restos que permanecem fora da dinâmica urbana”.

Atualmente a questão pula aos olhos. O problema é mundial. Não há metrópole que não sofra dessa decisão tomada por políticas passadas. Como resolver? O vazio está lá, materializado, enorme, complexo, difícil de se pensar um reestabelecimento.

Foto aérea Nelson Kon, 2009

Esquema dos distritos ao redor do terreno. Elaboração MCL

Mapa funcional da cidade de São Paulo, 1955 Fonte: FRANCO, Fernando de Mello. A construção do caminho: a estruturação da metrópole através da confor-mação técnica da Bacia de São Paulo. Tese de doutorado. São Paulo, FAU USP. 2005

BOM RETIRO

CAMPOS ELíSEOS

SANTA CECILIA

BARA FUNDA

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Esse movimento para com o patrimônio industrial, ou mais importante, vazio industrial, encontra-se cada vez mais em pauta no mundo contemporâneo. Sabemos que temos que reciclar, aproveitar estruturas pré concebidas, redes centrais de articulações vitais. Contudo a batalha é sempre a mesma. A reconversão.

Nuestras ciudades están pobladas por este tipo de territorio. Áreas abandonadas por la industria, por los ferrocarriles, por los puertos; áreas abandonadas como consecuencia de la violencia, el recesso de la actividad residencial o comercial, el deterioro de lo edificado; espacios residuales e los márgenes de los rios, vertederos, canteras; áreas infrautilizadas por inaccesibles entre autopistas, al margen de operaciones inmobiliarias, cerradas sobre si mesmas, de acceso restringido por teóricas razones de seguridade y protección. [3]

Temos grandes exemplos de urbanismos mundiais de reestruturação de grandes pólos econômicos que entram em decadência: observamos grandes intervenções urbanas em ex áreas portuárias, industriais em Barcelona, Londres, Argentina, Nova Iorque, Alemanda, etc. E caímos num debate contemporâneo: de como reintegrar essas regiões ao tecido urbano, de maneira suave, de modo a recosturar, linkar, reintegrar, sem grandes políticas de arrasa quarteirão que apagam a história e recomeçam como se nada houvesse...

Mas o que verdadeiramente merece destaque é pensar o vazio não como algo negativo, que segrega. E sim como o que permite, como se a todo minuto se encontrassem num estágio de plena transformação, ou seja, pensar o vague como a onda, em pleno movimento, caminhando para o infinito das possibilidades que o abraçam.

Terreno antiga rodoviária na Cra-colândia Sao Paulo. Foto Autora, 2010

Terrain vague. Foto Marcus Vinicius Damon, 2013.

3. SOLÀ-MORALES, Ignasi. Presentes y Futuros. La arquitectura en las ciudades. Barcelona, Collegi Oficial d’Arquitectes de Catalunya / Centre de Cultura Contemporània. 1996, 10-23. p. 23

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Um lugar vazio, sem cultivos nem construções, numa cidade ou num subúrbio, um espaço indeterminado sem limites precisos. Um lugar que é exógeno e estranho, fora do circuito das estruturas produtivas das cidades, uma ilha interna desabitada, improdutiva e muitas vezes perigosa, contemporaneamente à margem do sistema urbano e parte fundamental do sistema. [...] O vazio é a ausência, mas também a esperança.

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[Solà-MoraleS. Ignasi. “Urbanité Intersticielle”. Inter art actuel, n. 61, 1995. In: CarerI, Francesco. Walkscapes. o caminhar como prática estética. 1ª edição, Barcelona, Gustavo Gili, 2013. p. 43]

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O IBA Emscher-Park foi o plano de reabilitação na área industrial no distrito alemão da Renânia do Norte-Westfália, de 1989. Meio ao cenário do pós guerra, a região industrial alemã localizada na várzea do Rio Emscher, antes conhecida por sua glória e riqueza, após sofrer bombardeamentos e um profundo esvaziamento, se vê passando por um intenso processo de degradação e declínio econômico.

Dezessete cidades se unem para desenvolver esse plano, que prevê seis diretrizes de atuação: parque paisagístico do Rio Emscher; reforma ecológica do sistema do Rio Emscher; novo aproveitamento de construções industriais; trabalhar no parque; desenvolvimento integrado de moradia em bairros; iniciativas sociais, emprego e qualificação. O projeto foi um sucesso, apesar da ausência de incentivos federais, e é hoje até um importante roteiro turístico para quem visita a Alemanha.

Pioneiro quando se refere ao patrimônio industrial, se baseiam numa intervenção que se aproveite do já construido e consolidado. A partir de uma área totalmente degradada, desvalorizada, inicia-se um processo de transformação e recriação, principalmente programática, subvertendo o uso das edificações existentes.

A antiga zona industrial na beira do Rio Emscher é transformada em um parque linear, em que se restauram, reutilizam e reaproveitam todas as construções ali presentes (entre outros projetos propostos pelo consórcio conformado por 17 cidades da Renânia do Norte-Westfalia). Resultando numa paisagem verdadeiramente romântica, meio à ruínas e lembranças conturbadas, tanto da guerra – e de toda violentação que a região sofreu – quanto da época, motivo de orgulho, em que eram o grande pólo tecnológico e industrial da Alemanha.

Mettre en place un processus. Michel Corbou 2010. Lanschaft Park, Duisburg Nord. Paisagismo de Latz and Partner, 1991.

Paisagem do romantismo industrial. Lanschaft Park, Duisburg Nord. Paisagismo de Latz and Partner, 1991.

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oficina boraceaclube escola anhanguera

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novos protagonistas urbanos levantados

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Nos vastos intervalos abandonados proliferam-se favelas, comércio de rua, atividades de reciclagem e outros modos informais de ocupação do espaço urbano. É onde grupos que na sociedade contemporânea são socialmente excluídos e desenvolvem diferentes dispositivos de sobrevivência na metrópole [1]

Paralelo ao forte caráter histórico e tradicional do bairro [2] – presente desde as ruínas e edifícios históricos degradados até os pequenos comércios locais – existe o esvaziamento estampado nas ruas, resultado do processo industrial que por lá passou. A ausência do poder público que abriu espaço para a marginalização [3], a ocupação, a tomada do espaço por aqueles que lhe tiveram para si.

Presencia-se na região: a Favela do Moinho, a famosa região conhecida como Cracolândia, moradores de rua, catadores de papelão, cortiços, produtoras de cinema, imigrantes, o coletivo Baixo Centro, a Galeria Baró, a Casa de Cultura Digital, a Associação Parque Minhocão, entre outros...

Esses mesmos vazios que permitem o ilícito, e que podem ser vistos como negativo da cidade formal e desejável, são os respiros que permitem as ocupações de borda, as manifestações legitimas da sociedade civil.

Esse processo de reestruturação regional se dá simultaneamente a uma intensa reorganização urbana, com massivos investimentos em enclaves modernizados e o completo abandono de vastas áreas da cidade, sobretudo as zonas industriais. Surgem situações urbanas críticas.[4]

Berlim, Nova Iorque, Amsterdã, são cidades que viveram esse momento de ressignificação de grandes glebas industriais, também conhecidas como “constelações espaciais” , através da subcultura. Iniciam-se como bairros perigosos, abandonados, mas que permitiram a diversidade, o convívio, novas formas de ocupação, seja de moradia, seja artística cultural.

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1. PEIXOTO. Nelson Brissac. Arte/Ci-dade Zona Leste Máquinas Urbanas. São Paulo, Artedardo, 2011.p.15

2. Entende-se o bairro tratado como Barra Funda de Baixo / Santa Cecília, região que mistura características dos dois bairros e se faz única, um terceiro elemento.

3. A palavra marginalização não entendida como termo negativo, e sim como forte oponente autônomo contra o não marginal, “formal”. Tem-se assim como grande exemplo o cinema marginal reconhecido internacionalmente, que teve seu berço no Campos Elíseos.

4. PEIXOTO, Nelson Brissac. Paisagens Urbanas. São Paulo, Senac São Paulo, 2004. p.50

5. Terrenos amplos, subutilizados. Termo utilizado por LANGE, Bastian. “Espaços abertos temporários em Berlim”. In: ROSA, Marcos Leite (Org.). Microplanejamento. Práticas urbanas criativas. São Paulo, Editora de Cultura, 2011. p 180

Ao lado: Parque Minhocão. Intervençao Muda_coletiva e Basurama Brasil. Apoio Baixo Centro. Fotos Baixo Centro

Miguel Metralha, jornalista que trabalha em editora de revista de pornográfia na Luz. Cena de “O Pornógrafo” de João Callegaro, 1970. Cinema Marginal e Boca do Lixo.

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Amsterdã tem uma tradição de intervenções por coletivos artísticos no centro e conhece uma cultura de ocupação de prédios vazios desde os anos 70, quando havia grande carência de moradia para estudantes e recém-formados. [6]

O espaço urbano aberto deve ser experimentado, e podemos ver os movimentos atuais que acontecem no Minhocão por exemplo. Surge essa nova figura urbana: os “culturepreneur” [7] ou empredor cultural, que representa a figura catalisadora do processo de renovação espacial e urbana.

De forma alguma vemos uma falta de vitalidade nos bairros, mas sim um descuido, degradação, falta de segurança, má gestão pública. Ao observar o “mapa emotivo” do bairro em questão percebemos este momento de revalorização e ressignificação. E isso deve-se ao novo movimento de pessoas na área. Simples e apenas. Pessoas, gente, seres, que usam, passam, consomem, fazem, trazem, expões, ousam, levam, constroem, destroem, transformam.

Os protagonistas urbanos ocupam o Minhocão aos domingos, geram atividades noturnas e diurnas, articulam a população, promovem atividades, exigem, lutam, reúnem, criticam...Segundo Fernando de Melo Franco ”é o inter-relacionamento dos conteúdos programáticos dessas faixas que constrói a potência desse lugar”. [8]

Há exemplos de revitalizações feitas em áreas de Nova Iorque e Berlim nos anos 80 e 90, em que iniciativas culturais foram tomadas, porém no eixo da subcultura. São estruturas informais, uma arte com participação da comunidade local, vanguardista e inovadora, tendo, como por exemplo em, Nova Iorque, iniciado com um movimento de invasão, consistindo na ocupação totalmente ilegal de artistas em antigos galpões industriais. A exemplo temos a Factory de Andy Warhol pioneira de ocupação no Soho, hoje um dos bairros mais valorizados de Manhattan.

O papel de subculturas e coletivos de jovens têm suas iniciativas sendo capazes de reforçar estruturas sociais, gerar novos empregos, novas possibilidades econômicas nas áreas de turismo, arte e vida noturna. Ajudando na amenização dos efeitos negativos da gentrificação – uma vez que se sabe que o local sofrerá tal impacto [como imaginamos na região da Luz].

Berlim nos anos 70 e início dos 80 afirmou sua posição de ilha alternativa na Alemanha e se tornou famosa internacionalmente por sua cena subcultural, o movimento de invasão em Kreuzberg e estilo de vida alternativo e punk. Depois da queda do Muro em 1989 uma cultura de clubes de música eletrônica e uma nova cena de arte se desenvolveram. Os prédios industriais vazios, terrenos baldios e áreas que circundavam o Muro eram excelentes ambientes para as raves ilegais. A partir desta cena underground uma rede informal de clubes de música eletrônica surgiu.[9]

Um bom exemplo deste tipo de intervenção em São Paulo é a Rua Augusta, em

6. NEFS, Marten. Incubadoras urbanas. Políticas de revitalização urbana através de subculturas. A experiência paulistana e o contexto internacional. In: http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/05.058/487

7. Termo utilizado por LANGE, Bastian. “Espaços abertos temporários em Berlim”. In: ROSA, Marcos Leite (Org.). Microplanejamento. Práticas urbanas criativas. São Paulo, Editora de Cultura, 2011. p. 178

8. FRANCO. Fernando de Melo. “Contrários e contraditórios”, In: ROSA, Marcos Leite (Org.). Microplanejamento. Práticas urbanas criativas. São Paulo, Editora de Cultura, 2011. p. 142

9. NEFS, Marten. Op. Cit.

Minhocão durante o Festival Baixo Centro, 2013. Foto Tiago Queiroz.

Festa Junina na Rua Anhanguera 2013. Realizada pelo coletivo Galpão Anhaguera.

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que através de iniciativas culturais privadas, clubes noturnos e casas de shows, a rua ganhou fama e é reconhecida por sua diversidade de público 24 horas por dia, recebendo desde turistas a prostitutas todos os dias. Deste modo garante-se a diversidade programática e valoriza-se a região através de um processo natural, envolvendo os moradores locais, diferente de processos de valorização imobiliária que observamos regidas pela lei do mercado [muito comuns à São Paulo].

Abre-se espaço para um estilo de vida alternativo, aberto, gera vida à região, atrai todo tipo de público, traz diversos tipos de atividade. A área torna-se mais movimentada, por consequência mais segura, por conseguinte valoriza-se – surgindo um segundo problema que merece muita atenção: a “expulsão” das classes menos favorecidas.

O objetivo é minimizar a desigualdade dos lugares, uma das precondições para se aproximar de uma intangível sustentabilidade e construir urbanidade onde a história só tem aportado valores funcionais. Trata-se de outra visão de paisagem, não recorrente em São Paulo, compreendida como espaço destinado à morada. [10]

Queremos uma cidade que seja para a morada, para a cidadania, para todos.

Independente de como o processo de valorização da terra se der em determinada gleba – amena debaixo pra cima, ou imposta de cima para baixo – sempre irá gerar a segregação sócio espacial, de quem São Paulo é primeira vítima.

O que nos interessa tratar neste argumento é como munir a população para ao menos compactuar com os processos. Dialogar: exigindo seus direitos cada vez mais, e lutando pelo que acreditam, pela sua morada.

10. FRANCO. Fernando de Melo. “Contrários e contraditórios”. In: ROSA, Marcos Leite (Org.). Microplanejamento. Práticas urbanas criativas. São Paulo, Editora de Cultura, 2011. P. 146

Factory de Andy Warhol. Soho, Ny.

Gordon Matta-Clark. Conical Intersect, 1975

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Casa da Cultura e Cidadania. Centro de Bairro na Barra Funda de Baixo / Santa Cecília. Equipamento gerido pela subprefeitura da Sé. São Paulo SP

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ÁGUA BRANCA

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“As mudanças na esfera produtiva introduzidas no país no fim do século 20 agem diretamente sobre as áreas originalmente organizadas pela produção industrial. A obsolescência das instalações do primeiro parque fabril, associada à desconcentração industrial decorrente do processo de reestruturação produtiva, coloca em disponibilidade um estoque volumoso de áreas aptas a uma redefinição de uso”FRANCO. Fernando de Melo. Contrários e contraditórios, em: ROSA, Marcos Leite (Org.). Microplanejamento. Práticas urbanas criativas. São Paulo, Editora de Cultura, 2011. P. 146

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Fonte: Bing Maps, 2013Elaboração: MCLF, 2013Fonte terrenos: Operação Urbana Lapa-Brás 2009

BRÁS BRESSER

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A partir do princípio de que a metrópole contemporânea tem como seu maior caráter a presença simultânea do local e do metropolitano, como duas escalas distintas, buscamos um modelo que trate deste paradoxo de modo que eles consigam conviver, assim como seus habitantes consigam se identificar.

A ideia seria reintegrar os vazios urbanos à cidade, assumindo-os enquanto parte diversa do tecido urbano tradicional e tornando-os pontos cruciais de convergência e coexistência para a recostura proposta, nos âmbitos territoriais, sociais e econômicos.

Para transformá-los em nós convergentes seria necessário pensar no programa mais adequado para abrigarem. Mas qual escala atender?

A resposta foi AMBAS. E então se assume a dificuldade. Como tratar das duas escalas, metaforizadas na própria linha férrea, que conecta pontos tão distantes e fragmenta aquilo tão próximo?

Seria necessário identificar momentos para se responder à cada escala. Assim como momentos que se trabalharia ambas sobrepostas.

No estudo de caso aqui contemplado, grande parcela de 60 mil m2 entre Bom Retiro, Campos Elíseos, Santa Cecília e Barra Funda, optamos por atender ambas. Trabalhando sempre numa resolução conjunta, que viria a ser o grande desafio a solucionar.

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grandes terrenos

90Situação Atual_

• trem para cargas e passageiros• grande volume de passageiros Barra Funda, Luz, Brás• estações sub utilizadas [Júlio Prestes]• grandes pátios em Lapa, Luz, Pari• barreira territorial com dificuldade para transposição de pedestres• heterogeneidade de uso e ocupação do solo entre regiões a sul e norte da ferrovia• baixa densidade populacional no trecho norte• condição de drenagem deficiente na região de várzea ao norte da ferrovia• importante: considerar que haverá um aumento substancial da densidade de habitantes

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91Situação Proposta_

• trilhos para transporte de pessoas não mais de cargas, com a construção do ferroanel• construção de novas estações entre as existentes• aproveitamento dos grandes terrenos desocupados pela ferrovia para implantação de novos espaços públicos, áreas verdes, sistema cicloviario, e equipamentos nas escalas metropolitana e local;• criação de conexões que permitam alternativas de deslocamento para pedestres• criação de transposições que ofereçam programas atrativos de permanência ao longo do eixo da linha férrea

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croquis de estudo

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linha 16 [prevista 2025]

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PARQUE AGUA BRANCA

JARDIM DA LUZ

TRANSPOSIÇAO A DESENVOLVER

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> Área permeável

> Âgua

> Percursos e vida

> Edificações e atividades

OBJETODESENVOLVIDO

> Novas Transposições / Ciclovia

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>Vista do terreno a partir da passarela existente. Foto Marcus Vinicius Damon. 2013Elaboração MCLF, 2013

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Imagina se aqui fosse uma ciclovia???

Esse verde me faz imaginar um parque ai!

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Tomamos como partido o não enterramento da linha férrea [forte previssa da Operação Urbana Lapa-Brás SMDU PMSP 2009]. Pois acredito que não devemos apagar nossa história para reescrevê-la. Possuímos uma estrutura que não nos deixará esquecer de nosso passado industrial. Temos que transformar a linha férrea em paisagem natural a ser contemplada, a imagem atual das ruínas obsoletas em espaços públicos que reúnam, muros que agregam, galpões que ganham vida. A infraestrutura está colocada, cabe a nós aproveitá-la e devolver para a cidade o que sempre lhe pertenceu, o convívio público e a paisagem.Fotos do terreno tiradas do trem pela autora. 2013

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Área permeávelO primeiro passo, foi imaginar uma grande área permeável, partindo de uma massa árborea que funcionaria como o Jardim em Movimento, conceito do paisagista francês Gilles Clément – mata de baixa manutenção que é constituída de modo a se auto replicar e se manter.

ÁguaO segundo momento foi o desejo do elemento água, que se faria presente ao longo do terreno todo. O córrego Anhanguera seria destamponado [assumindo que tal ação só seria viabilizada se implementado um sistema de troncos coletores ao longo dos rios afluentes ao Tiete]. E seria criado um espelho d’água [5 cm apenas, para baixa manutenção e evitar dificuldades de travessia], como elemento ordenador do território, de modo a se implementar os programas ao longo deste novo eixo criado.

Novas transposições / cicloviaImaginou-se uma travessia a aproximadamente cada 500m ao longo da linha férrea. De modo a resultar em duas novas transposições a se traçar neste estudo de caso. Assumindo importantes eixos a serem conectados, decidiu-se por desenhá-las como segue no mapa indicado. Outro importante partido aqui contemplado é desativação dos trilhos da linha 8 diamante do metro entre a Barra Funda e a Júlio Prestes [estudos da CPTM provaram que estação JP é subutilizada], realizando nesse trecho então um caminho verde: com ciclovia, pista de corrida e espaço para caminhada e descanso.

1

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3

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implantação geral da proposta

LINHA 8 CPTM

CICLOVIA

SENACaudiovisual

LINHA 8 CPTM

LINHA 7 CPTM

foto aérea s/ escala. fonte bingmaps2013

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implantação geral da proposta

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CÓRREGO ANHANGUERA

SENACaudiovisual

CONSELHO GESTOR

PÁTIO ESPELHO D’AGUA AVENIDA

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VIADUTO ORLANDO MURGEL

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HABITAÇãO ESTAÇãO INTERMODAL

METRO E TREM

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VIADUTO ORLANDO MURGEL

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RUÍNAS RECEM

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foto aérea s/ escala. fonte bingmaps2013

GRANDE MASSA ARBÓREA/JARDIM EM MOVIMENTO

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EDUCAÇãO/CULTURA/LAZER

córrego anhanguera córrego anhanguera

cptm linha 7cptm linha 7

cicloviacptm linha 8

espelho d’água

_córrego aflorado_área verde_respiro para a cidade_ciclovia no lugar da ferrovia_equipamento para bairro_transposição_centro de bairro sob passarela de transposição_metropolitano X local

_córrego aflorado_área verde_respiro para a cidade_ciclovia no lugar da ferrovia_equipamento para bairro

_vazio_muro_grande barreira_desqualificado_inacessível_POSSIBILIDADE

INFORMAÇãO/REFEIÇãO/DESCANSO/WI-FI

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_córrego aflorado_área verde_respiro para a cidade_ciclovia no lugar da ferrovia_equipamento para bairro_transposição_centro de bairro sob passarela de transposição_metropolitano X local

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ACOLHIMENTO

INFORMAÇãO

ATELIÊ CURSO DE IDIOMA REFEITÓRIO

BALCãO DO TRABALHO

ACESSO DIGITAL:LEITURA/DESCANSO/

AUDITÓRIO

PRAÇA DE ATENDIMENTO

prog

ram

a

* Programa proposto por Jorge Wilheim em que desempregados da região poderiam encontrar tarefas diárias para realizar nas proximidades. Ver: WILHEIM, Jorge. São Paulo uma Interpretação. São Paulo, Editora Senac 2011.

111

PREFEITURA

SUBPREFEITURA

EQUIPAMENTOS MUNICIPAIS

CENTRO DE BAIRRO

centro de bairro

EDUCAÇAO/CULTURA/LAZER CIDADANIA

SUBPREFEITURAS COM MAIS AUTONOMIA

[cenário]

ORGANIZAÇãO MUNICIPAL DE SãO PAULO HOJE

CENTROS DE BAIRRO PARA APOIO DAS SUBPREFEITURAS

[cenário]

FUNCIONAMENTO DE PARIS [exemplo]

Um centro de bairro, gerido pela subprefeitura, foi o equipamento imaginado para apoiar a comunidade local e fomentar sua dinâmica econômica e social, nomeado de CASA DA CULTURA E CIDADANIA [CACC]. Um espaço de sistematização das atividades e serviços oferecidos pela região, como também espaço para 1) ouvidoria [praça de atendimento: hoje apenas presente na subprefeitura]; 2) balcão do trabalho*; 3) acesso a internet livre, leitura e descanso de periódicos online; 4) espaço para usufruto dos moradores locais, entendido na barra funda como ateliês, oficinas, espaço para exposição e apresentações artísticas; e 5) um centro de idioma para prioritariamente receber os estrangeiros que trabalham na indústria têxtil para aprender o português. Foi imaginado também 6) um espaço para reunião do conselho gestor do bairro [eleito pela população local], com sanitários e vestiários, juntamente com bicicletário e playground.

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RUA CAPISTRANO

CAMINHO VERDE / CICLOVIA

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ELEVAÇAO OESTE

RUA GRECO

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ACESSO PRINCIPAL

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ACESSO PRINCIPAL

LEGENDA PISO

A. CALÇADA: PEDRA DE GRANITO

B. GRAMA

C. PASSARELA: PISO DECK

D. PISO PEDRA PERMEAVEL

E. MASSA ARBOREA INTENSA

F. CORREGO DESTAMPONADO

G. ESPELHO D’AGUA

_RUÍNAS

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perspectiva interna

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estrutura

elevação oeste

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o O jardim romântico de Rosa Kliass

Ao caminhar pela intervenção de Kliass no Parque da Juventude em São Paulo, é impossível não sentir paz e quietude. O que antes representava repressão, agora é elemento lúdico, promotor de convivência e bem-estar à população. O usuário sente-se distante do presídio que ali habitava [Carandiru].

O elemento que era antes um segregador, tornou-se o elemento integrador. O que antes era motivo de alerta, virou fonte de prazer. O muro neste projeto não é uma barreira, e sim um convite à um agradável passeio. Se este possui alguma relação com a memória do presídio? Quem decide é o usuário. Segundo palavras da autora: “Se você quiser que exista uma relação com a memória do presídio, ela existe!”.

Ao andar pela obra, aquele que sabe o que o espaço representou, a dor que provocou, pode sim enxergá-la como um memorial. Contudo não de maneira negativa e sombria, e sim de modo transformador e revigorante, deixando o passado no passado.

As memórias fortes do Carandiru, o impacto que causou no entorno, podem ser totalmente superados por gerações futuras, e quem sabe esquecidos por completo. Para que serviria preservar uma memória de maneira árdua, que poderia em algumas décadas esvaziar-se de sentido? Neste ponto de vista, Kliass realizou o projeto sob medida: não chegou a comprometer o caráter lúdico, prazeroso e agradável de seu jardim – tornando a visita um passeio denso e apreensivo – mas também não se deixou fazer cair no esquecimento. O fator decisivo é a bagagem de cada visitante.

O projeto, apesar de sujeito à interpretações, está longe da melancolia em qualquer caminho escolhido. A memória, de alguma forma está no ar poético das ruínas, no olhar metafórico daquele que observa o parque da perspectiva do antigo vigia em cima do muro. Ela é sentida na pele.

Mesmo aquele que chega nu de conhecimentos sobre o passado do local, percebe, através da clara demarcação e contraste, o que foi objeto sujeito à intervenção e o que foi objeto interventivo. Por exemplo da maneira que o aço corten é implementado, ao cicatrizar as falhas da muralha de concreto indiscretamente. O diálogo com o passado é realizado de maneira cética e clara, havendo uma clara diferenciação. Até mesmo sugerindo uma mudança de comportamento: a muralha – que antes era proibida para àqueles usuários do complexo quando ainda presídio – agora é o ponto imperdível para àqueles que frequentam o parque, podendo observá-lo com uma visão geral e ampla, apelidada por Ruth Verde Zein de perspectiva vôo de pássaro.

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fotos nelson kon

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planta térreo

planta primeiro

planta cobertura

plan

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Um grande espaço amplo se constroi, de planta livre, desenhado sempre com largos corredores de passagem e algumas inflexões que contém partes mais definidas do programa [sanitário, cozinha e salas de aula]. O auditório foi colocado na extremidade devido a dificuldade de trabalhar com um fluxo livre e contínuo dado tamanha extensão do objeto: 145m de comprimento.

O programa se torna sempre fluído, não havendo rupturas entre os espaços que acontecem ao longo do grande salão. Sendo separados apenas por diferentes cotas de nível e pé direito que variam ao longo do percurso induzido.

Um momento importante do objeto é o mezanino que se apresenta como uma varanda externa que corta o volume internamente. Uma separação em vidro transversal ao objeto a separa do interno, mantendo suas extremidades abertas. Para acessá-lo pode subir as escadas internas ou utilizar a rampa externa que leva à cobertura [alternativa para quem quer cruzar, pois há também um elevador e uma escada no volume do conselho gestor]. É permitido o acesso ao mezanino mesmo que a Casa esteja fechada - em dias de apresentação noturna no auditório por exemplo é possível acessá-lo.

O espaço é aqui entendido como democrático e de todos. O acesso à informação e a ouvidoria são os pontos fortes para a prática da cidadania conquistada através do convívio, da educação e da formação desses habitantes.

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cort

e lo

ngitu

dina

l “Ao redefinir infraestrutura não apenas como sistema funcional, mas como suporte para novos significados atribuídos pela negociação e pelo compartilhamento de usos, poderemos promover a fricção entre a universalidade da técnica com particularidades da cultura local. Ou fomentar a reorganização de sistemas de escala metropolitana fechados, em um campo aberto de possibilidades aderentes à localidade. Contrários e, por que não, complementares” [FRANCO. Fernando de Melo. Contrários e contraditórios, em: ROSA, Marcos Leite (Org.). Microplanejamento. Práticas urbanas criativas. São Paulo, Editora de Cultura, 2011. p.146 ]

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corte longitudinal

Transposição: As funções todas foram acopladas na base da edificação criada. Em sua cobertura recebe uma larga transposição, com dimensão de 15 metros de largura, para uso metropolitano e diário de quem trabalha na região e precisa atravessar a linha férrea. Em sua generosa extensão permite que ocorreram feiras e atividades de lazer, assim como um belo mirante para o vazio que ainda se mantém desenhado. A larga cobertura se serve também da rede WI FI, e teto jardim, transformando assim em uma passarela-praça.

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cort

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corte transversal A

corte transversal B

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corte transversal D

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fonte acervo SPBR

perspectivaconcurso open house vitra_concepção do cruzamento de dois prismas, buscando o externo dentro do interno.

vista da treliça de aço

corte longitudinal. destaque para a varanda interna à edificação

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iA inserção do edifício se dá aproveitando as duas cotas de nível, que caracterizam a área destinada, no campus da PUC - Rio de Janeiro.

Assim como o térreo do projeto, seu programa se faz duplo, dividido essencialmente em dois volumes: privado (administrativo) e público (também chamado de o edifício). “A possibilidade que este duplo térreo oferece se coaduna muito bem com a natureza bi-partida do programa proposto para a biblioteca, a saber: – acervo ou armazém, e administração; – áreas de público, ou o edifício”. (Memorial descritivo projeto SPBR)

Sem janelas na extensão longitudinal, o que garante a iluminação do conjunto são as duas aberturas nas extremidades do volume, no eixo norte e sul, e sheds na cobertura. O salão principal, com 1.300 metros quadrados (15m de largura, 90m de comprimento e pé direito de 9m) é iluminado pela varanda (única abertura no sentido longitudinal), que se caracteriza por ser um pequeno volume que rompe transversalmente o edifício, trazendo um ambiente externo para o interior do projeto.

O que impressiona mais do projeto, é seu corte. A fluência das áreas, a separação funcional, a utilização de mezaninos, pés direitos duplos e até triplos, transformam o volume prismático em uma única grande sala sem monotonia. A separação dos ambientes cabe pela diferença de cota de altura, agregando diferentes áreas em um mesmo espaço. A transparência das ambiências deve-se também ao piso transparente presente nas estruturas acima do salão principal. Apenas a área de estudo, no último pavimento, cota 17,00m, encontra-se em um local mais reservado.

A estrutura do projeto é de aço, com treliça nas duas fachadas principais, vão central de 45 metros e balanços de 15 e 30 metros. A decisão estrutural foi uma escolha posterior à forma.

A linguagem do edifício instiga uma lógica de uso de concreto armado, isso se deve ao fato de que, no início do processo projetual, o escritório se debruçou sobre as duas opções construtivas, e somente no meio do processo que se optou definitivamente pelo aço, justificada através da leveza da estrutura e das fundações, além da facilidade que se conquistar o vão de 42 metros adotado formalmente.

fonte acervo SPBR

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mod

ulaç

ão

detalhe cobertura verde com piso elevado sem escala

A estrutura da edificação foi imaginada a partir da premissa da pré-fabricação. Um módulo que poderia ser reproduzido em série, com a cobertura no topo e passível de se elevar do chão para a permeabilidade do terreno. De modo a se adaptar a diferentes relevos e poder ser reproduzido ao longo da linha férrea sem limitação.

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legenda

1. MÓDULOS DE PISO 500X750mm

2. PISO ELEVADO

3. LAJE ALVEOLAR

4. TRELIÇA METALICA DE AÇO PATINÁVEL APARENTE 350mm

5. MONTANTES 50X100mm

6. CHAPA PERFURADA DE COBRE

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1

3

456

módulo explodido sem escala

7.5m

5.0m

módulos da cobertura 1/100

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corte transversal Celevaçao sem escala

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corte transversal C

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luz

bibl

iogr

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prancha de projeto entregue novembro 2013

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prancha de projeto entregue novembro 2013

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