L. ÜLIVEIR~ AL~IEIDA · 2015-09-25 · antonio carlos velloso filho fabiano robalinho cav...
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ESCRITÓRIO DE A o v o e A J 1 !j\CLA/Nuau-oF FI. 2 SERGIO BE RMUDES
SERGIO BERMCDES MARCIO VIEIRA SOUTO COSTA FERREIRA MARCELO FONTES
Luís FELIPE FREIRE LISBÔA
PEDRO PAULO DE BARROS BARRETO WILSON PIMENTEL
GABRIEL PRISCO PARAISO GUIOMAR FEITOSA LIMA ME:>;DES FL.-Í.VIO JARDIM
ANA LGÍSA BARBOSA BARRETO PAULAMELLO
ALEXANDRE S!G~IARINGA SEIXAS GUILHERME VALDETARO MATHIAS ROBERTO SARDL'IHA JUNIOR M~RCELO LAMEGO CARPE:>;TER ANTONIO CARLOS VELLOSO FILHO FABIANO ROBALINHO CAV ALCA:>;TI
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RICARDO LORETTI HENRICI
JAIME HENRIQUE PORCHAT SECCO GRISSIA RIBEIRO VENÂNCIO MARCELO BORJA VEIGA ADILSON VIEIRA MACABU FILHO CAETANO BERENGUER RAFAEL DIREITO SOARES ANA PAULA DE PAULA ALEXANDRE FONSECA PEDRO HENlllQUE CARVALHO RAFAELA FUCCI GABRIELLÓS LOUIS DE CASTEJA HENRIQUE Á VILA
GUILHERME COELHO
ANA LUIZA COMPARA TO LIVIA IKEDA LIVIA SAAD JULLIANA CUNHA ALLAN BARCELLOS L. DE ÜLIVEIR~
PAULO BONATO RENATO CALDEIRA GRAVA BRAZIL VICTOR NADER BUJAN LAMAS GUILHERME REGUEIRA PITTA LUIZA PERRELLI BARTOLO JOÃO ZACHARIAS DE SÁ SÉRGIO SANTOS DO NASCIMENTO
GIOVANNA MARSSARI ÜLAVORIBAS
RAFAEL MOCARZEL CONRADO RAUNHEITTI LUIZA DIAS MARTINS THAIS VASCONCELLOS DE SÁ BRUNO TA.BERA F.-Í.BIO MANTUANO PRÍNCIPE
CONSULTORES RICARDO SILVA MACHADO RICARDO JUNQUEIRA DE ANDRADE ANDRÉ TAVARES
RENATO RESENDE BENEDUZI DIEGO BARBOSA CAMPOS ALESSANDRA MARTIN! MARIANA ARRUDA DE SOUZA DANIEL CHACUR DE MIRANDA PEDRO HENRIQUE NUNES
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LUIS TOMÁS ALVES DE ANDRADE MARCOS MARES GUIA
HELIO CAMPISTA GOMES (1925-2004) SALVADOR CÍCERO VELLOSO PINTO JORGE FERNANDO LORETTI
ROBERTA RASCIO SAITO ELENA LANDAU ANDRÉ CHATEAUBRIAND MARTINS PHILIP FLETCHER CHAGAS
GABRIEL DE ÜRLEANS E BRAGANÇA LUIZA LOURENÇO BIANCHINI
ANTONIA DE ARAUJO LIMA GUSTAVO FIGUEIREDO GSCHWEND
CAIO !-UIZ DE AL~IEIDA VIEIRA DE MELLO Pfllll:Ô MARINHO NUNES:
EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ FEDERAL DA VARA .... ;_.~·., - ,.~·.
FEDER1).L DA ji;ÃO-'
JUDICIÁRIA DO DISTRITO FEDERAL ... '~ li M
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1 rn 1111 ~li ~li IU ! Vara 24648-39.2015.4.01.3400
A ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE GRANDES CONSUMIDORES .,,_.
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1111
1 • .. IS
DE ENERGIA E DE CONSUMIDORES LIVRES ABRACE, sociedd.~ sem fins ~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~
lucrativos, inscrita no CNPJ sob o n. 53.812.772/0001-94, com endereço
no SBN Quadra 1, Bloco B, n. 14, Salas 701/702, Ed. CNC, Ase"' Norte,
Brasília/DF, CEP 70041-902, vem, com fulcro nos artigos 4°, inciso I,
273 e 282 do Código de Processo Civil, por meio de seus advogados ao
final subscritos 1 propor _a_ça_-_o ____________ decl ____ ar __ a_tó_'_r_i_a ____________ de_
inexig:ibilidade de :12re~ público, can pedido liminar de
antecipação dos efeitos da tutela, contra a AGÊNCIA NACIONAL DE
ENERGIA ELÉTRICA - ANEEL, autarquia em regime especial, vinculada ao
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02.270.669/0001-29, com sede no SGAN 603, módulo J, Brasília, Distrito
Federal, CEP 70830-110, pelos fatos e fundamentos a seguir aduzidos:
1 Doe. 1
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"""'
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SECLA/NUOU·Df FI. 3
I. PREÂMBULO
I.1. Contexto
1. No dia 11 de setembro de 2012, o Governo Federal, ao
anunciar a Medida Provisória n. 579/2012, realçava o objetivo de
"ampliar a competitividade da nossa economia" 2 e divulgava amplo
programa de redução do custo da energia.
2. A redução propalada em 11 de setembro de 2012 se assentava
em dois pilares: (i) a antecipação da renovação de diversas concessões
de geração com vencimento entre 2015 e 2017; e (ii) aportes do Tesouro
Nacional para financiar políticas públicas e subsídios custeadas por
encargos
elétrica3•
preço público político - adicionados às tarifas de energia
2 No discurso presidencial, a busca por ampliar a competitividade nacional foi destacada em 4 passagens:
"[ ... ] a nossa maior preocupação é aumentar o investimento público e privado, elevar os níveis de eficiência e ampliar a competitividade da nossa economia porque sabe que isso é crucial para que continuemos distribuindo renda, elevando o errprego e reduzindo a pobreza.
[ ... ] nessa nova etapa, os preços da energia vão contribuir para assegurar menor custo e maior competitividade às errpresas e menor preço e mais qualidade de vida à população sem nenhuma mágica.
[ ... ] para as empresas, energia mais barata significa menor custo de produção, e bens e serviços mais competitivos. [. .. ]
A redução das tarifas de energia, na verdade, tem impacto sobre toda a economia. Vai reduzir o custo das mercadorias, melhorar a participação do país na disputa internacional por mercados, criar mais errpregos, reduzir a inflação e estimular maior crescimento." Disponível em: http://www2.planalto.gov.br/acompanhe-oplanalto/discursos/discursos-da-presidenta/discurso-da-presidenta-da-republicadilma-rousseff-durante-cerimonia-de-anuncio-de-reducao-do-custo-de-energiabrasilia-df
3 Discurso presidencial em 11 de setembro de 2012:
"a energia hidrelétrica é uma energia gerada por uma hidrelétrica que é longeva. Que tem grande longevidade, que, portanto, o seu terrpo de duração é muito maior do que o terrpo de concessão e o terrpo de amortização. É simplesmente esse fator que permite que nós estejamos aqui nos propondo a transferir para os consumidores a energia já paga durante o contrato de concessão. [ ... ]
E as tarifas de energia vão diminuir, também, graças à decisão do governo de reduzir os encargos que hoje incidem sobre a conta de luz de todos os brasileiros, e também, por aportes que o Tesouro Nacional fará ao sistema para financiar políticas de atendimento a parcelas específicas da população mais carente."
2
SECLA/NUOU-DF FI. 4
3. A intenção era viabilizar redução média de 20% nas tarifas,
concentrando a redução na indústria com vistas a gerar emprego e
crescimento:
4.
"[ ... ] a partir do início de 2013 os consumidores residenciais vão ter sua conta de luz reduzida em 16, 2% e os industriais entre 19% e 28%. [ ... ]
A redução das tarifas de energia, na verdade, tem irrpacto sobre toda a economia. Vai reduzir o custo das mercadorias, melhorar a participação do país na disputa internacional por mercados, criar mais empregos, reduzir a inflação e estimular maior crescimento. " 4
Registre-se que a Excelentíssima Presidente da República
não apenas fez diagnóstico preciso quanto à necessidade de desonerar o
custo da energia sobre a indústria, como também tomou ação no sentido
de promover essa desoneração.
5. No entanto, pouco mais de dois anos depois daquele discurso
presidencial, indústrias serão obrigadas a fechar portas diante das
decisões da ANEEL a respeito do orçamento de 2015 da Conta de
Desenvolvimento Energético CDE,
consumidores brasileiros.
encargo a ser pago por todos
6. Quatro são as razões pelas quais, a despeito da louvável
intenção anunciada em set/2012, os efeitos sobre a indústria agora se
revelam perversos!
7. A primeira razão reside na decisão do Governo Federal de
alocar toda a "renda hidráulica" aos consumidores das distribuidoras,
chamados consumidores cativos, integrantes do Ambiente de Contratação
Regulada - ACR, discriminando o Ambiente de Contratação Livre - ACL,
em que se concentram os grandes consumidores e os consumidores
industriais de energia.
8. A segunda razão reside na circunstância de o Governo
Federal ter optado por promover a redução tarifária em ato único,
4 Idem.
3
SECLA/NUOU-DF FI. 5
editado em 24 de janeiro de 2013, quando o custo de geração era 93%
superior ao que, nos reajustes tarifários imediatamente anteriores,
fora considerado nas tarifas das distribuidoras:
9.
Tabela 1 - Corrparativo entre cobertura tarifária e custos incorridos pelas distribuidoras (processos tarifários do 1° trimestre de 2013)
Mês do Janela temporal Valor de Custo Nível de
considerada cobertura efetivamente cobertura reajuste
(12 meses tarifária incorrido* tarifária tarifário
subsequentes) (R$/Kih) (R$ f!.H'i) (%)
Janeiro de 2013 Fev/13 a Jan/14 135 260 52%
Fevereiro de 41% 2013 Mar/13 a Fev/14 127 310
Março de 2013 Abr/14 a Mar/14 219 350 63%
* Preço do rrercado de curto prazo verificado no Submercado Sudeste/Centro-ceste
Incentivados pelo sinal distorcido de custo, os
consumidores cativos, essencialmente residenciais e comerciais,
aumentaram consumo e impuseram a geração de usinas termelétricas cada
vez mais caras, elevando o chamado Preço de Liquidação de Diferenças -
PLD (preço da energia elétrica no mercado de curto prazo), o qual, via
de regra, refletia o custo marginal de operação, correspondente ao
custo da usina mais cara acionada para atendimento do consumo.
10. Esse consumo adicional estimulado pelo sinal invertido de
custo inflou os preços de todas as transações, com gravíssimo impacto
para o setor.
11. A terceira razão decorre da estrutura financeira
arquitetada pelo Governo para, mediante a captação de empréstimos e a
utilização de recursos existentes (saldos) em fundos setoriais, manter
as tarifas artificialmente baixas no biênio 2013-14, promovendo o
deslocamento do custo de geração para 2015.
12. De acordo com a estrutura arquitetada, o pagamento dos
empréstimos contraídos e a recomposição dos fundos setoriais
ocorreriam no futuro por intermédio da Conta de Desenvolvimento
4
-------------------------------------------------------
SECLA/NUOU·DF FI. 6
Energético - COE -, majorando a tarifa que, no biênio 2013-2014, não
gerava arrecadação compatível com os custos incorridos no fornecimento
de energia.
13. A quarta razão decorre do recuo do Governo Federal quanto
aos aportes do Tesouro para financiar políticas públicas custeadas por
encargos.
14. Com o recuo, foram alocados à Conta de Desenvolvimento
Energético COE paga por todos os consumidores brasileiros,
subsídios cujos custos eram, antes da Medida Provisória n. 579/2012,
rateados entre os consumidores das distribuidoras na proporção do uso
dos sistemas de transmissão e de distribuição.
15. A alocação à CDE não afetaria a indústria se tivesse sido
mantida a lógica de rateio desses custos. No entanto, sem qualquer
autorização ou discussão parlamentar nesse sentido, a ANEEL alterou o
critério de alocação dos encargos e passou a cobrá-los na proporção do
consumo de energia, onerando significativamente a indústria, que tem a
energia elétrica como intenso e custoso insumo em seus processos
produtivos.
16. Portanto, apesar do discurso do Governo Federal no sentido
de imprimir competitividade à economia
brasileira, após passar o biênio 2013-14
preços de energia elétrica impulsionados
nacional,
prejudicada
pelo consumo
a indústria
pelos altos
comercial e
residencial, é agora surpreendida e gravemente impactada com o
orçamento da Conta de Desenvolvimento Energético - COE - para o ano de
2015, fixado pela ANEEL em modestos 25 BILHÕES DE REAIS!!!
17. Sem rodeios: a conta da COE fixada pela ANEEL para o ano de
2015 cria, sem prévia auditoria custos insuportáveis para os
consumidores industriais!
5
SECLA/NUCJU-DF FI. 7
18. No setor de mineração, alcança 42% do resultado líquido das
empresas em 2014. Na indústria química, representa até 85. Na
siderurgia, 83. No segmento de ferro ligas, pode superar 200.
19. E o problema não se resume ao impacto!
20. A ANEEL chama a indústria a suportar, entre outras
rubricas, (i) custos decorrentes do consumo dos consumidores cativos e
da exposição das distribuidoras ao mercado de curto prazo; (ii)
subsídios cujos custos, por decisão da ANEEL, passam,
acidente legislativo, a ser rateados na proporção
como que por
do consumo da
concessões energia; (iii) pagamento de indenizações de
correspondente renda hidráulica não é revertida à indústria;
cuja
(iv)
(v) custos gerados por desídia de determinados agentes;
energia não entregue.
e até mesmo
21. Consoante será demonstrado, a fixação da quota da CDE para
2015 revela um sem número de inconstitucionalidades e ilegalidades:
(i) exercício de política tarifária por ato infralegal, em
contrariedade flagrante ao princípio da reserva legal; (ii) criação de
subsídios cruzados sem base legal; e (iii) repasse de diversos e
vultosos custos desprovidos de comprovação ou de prévia auditoria.
I.2. Legitimidade da ABRACE
22. Na presente ação, a ABRACE, conforme
Assembleia Geral Extraordinária 5 questiona o
deliberação em
pagamento pelos
consumidores livres e grandes consumidores industriais de itens de
despesa que configuram a Conta de Desenvolvimento Energético - CDE.
23. Fundada em 22 de agosto de 1984, a ABRACE congrega 46
grandes grupos industriais, os quais respondem por cerca de 14% de
5 Doe. 3.
6
SECLA/NUOU·DF FI. 8
toda energia consumida no Brasil, e (ii) tem, conforme previsto no
artigo 2°, "a", do seu Estatuto6, a função de:
24.
"promover os interesses dos consumidores industriais de energia, atendidos no mercado livre ou regulado, [ ... ] inclusive judicial e extrajudicialmente, na forma do art. 5° inciso XXI da Constituição Federal"
É justamente essa função estatutária que se exerce com a
presente ação, proposta depois de a ABRACE ter dialogado com a ANEEL e
com o Ministério de Minas e Energia, entidades que receberam e ouviram
a ABRACE, mas, embora demonstrem consciência da necessidade de
encontrar solução, não sinalizam com a possibilidade de conter o
problema prestes a abalar gravemente a indústria.
25. Não se cuida de esforço retórico: a ABRACE, nesta ação,
defende a competitividade da produtividade e até mesmo de
sobrevivência de seus associados.
26. A tutela pretendida produz efeitos que transcendem a
indústria, beneficiando a economia nacional e, por consequência, toda
a sociedade brasileira, na medida em que, como enfatizou o próprio
Governo Federal no anúncio da Medida Provisória n. 579/2012, a redução
do custo da energia para a indústria contribui para "melhorar a
participação do país na disputa internacional por mercados, criar mais
empregos, reduzir a inflação e estimular maior crescimento."
II. ESTRUTURA
27. A presente inicial será assim estruturada:
(i) primeiro, serão avaliados precedentes em que o Supremo
Tribunal Federal esclareceu os limites ao poder estatal de instituir
encargos tarifários;
6 Doe. 2.
7
---~----~----------------------------------------
.--
SECLA/NUCJU-DF FI. 9
(ii) depois, serão analisados os vícios de
inconstitucionalidade e de ilegalidade verificados na CDE/2015, os
quais serão divididos em duas categorias: (a) vícios decorrentes
exercício de política tarifária pela ANEEL, a qual criou diversos
subsídios tarifários desprovidos de base legal ou como se tivesse
recebido "delegação em branco"; e (b) indevida inclusão de valores na
CDE/2015; e
(iii) a sequência, oferecem-se as razões determinantes da
antecipação de tutela e, ao final, formulam-se os pedidos.
III. ANTECEDENTE DE ANÁLISE
28. Como antecedente da análise dos vícios que marcam o
orçamento da COE para o ano de 2015, impõe-se resgatar os limites
assentados pelo Supremo Tribunal Federal para a criação do ''preço
público político" denominado encargo tarifário, gênero do qual a COE é
espécie.
III.1. Ação Declaratória de Constitucionalidade n. 9 (Medida Cautelar)
29. Na Ação Declaratória de Constitucionalidade n. 9, cujo
objeto era a Medida Provisória editada para enfrentar a escassez de
energia verificada em 2001, o Supremo Tribunal Federal declarou a
constitucionalidade da sobretarif a cobrada dos consumidores que não
observavam as metas de redução do consumo.
30. Na ocasião, o Ministro Moreira Alves ressaltou que, com a
nova ordem constitucional, tornou-se possível não só (i) a cobrança
pela contraprestação dos serviços - preço público em sentido estrito
ou tarifa em sentido estrito -, mas também (ii) a cobrança de valores
destinados a custear medidas voltadas à manutenção do serviço
adequado:
"O SENHOR MINISTRO MOREIRA ALVES - Considero que o preço público antes não era preço político, mas só preço público no sentido da contraprestação do serviço ou da mercadoria. Por isso mesmo é que
8
31.
SECLA/NUCJU-DF FI. 10
a Constituição era específica. Daí a razão pela qual eu ter dito, no voto que V. Exa. citou, que não era possível haver uma sobretarifa que se destinasse ao concessionário, mas a terceiro. Agora, pela Constituição, esse preço público pode ser, além de preço público stricto sensu, preço público político, ou seja, servir para a política tarifária, a fim de que seja possível às concessionárias cumprir 'a obrigação de manter serviço adequado'. [ ... 1 Hoje, o preço público tem também o caráter político. Daí se ter de adnitir, a meu ver, que haja poss:ibil.ida.de da utilização extra.l.:imites de um preço público, exclusivamente considerado cano tal, para atender fina1idades outras que, no entanto, têm uma limitação, que sejam para pezmitir que a concessionária possa cuzzprir a obrigação de manter o sezviço adequado. Se não for para isso, obviamente, não é possível uma política tarifária para outra finalidade. E o caso é exerrplo de livro".
Ficou sedimentado, assim, o entendimento de que o preço
público em sentido amplo tarifa em sentido amplo ou política
tarifária - compreende: ( i) o preço público em sentido estrito, ou
tarifa em sentido estrito, o qual corresponde à remuneração pelos
serviços prestados; e ( ii) o encargo tarifário - ou, na dicção do
Ministro Moreira Alves, o 'preço públ.ico político" - correspondente
aos valores destinados a custear políticas públicas voltadas à
manutenção de serviço adequado.
32. Com efeito, naquele precedente, o Supremo Tribunal Federal
assentou que os encargos tarifários, ou preços públicos políticos,
além de precisarem ser instituídos por lei, observariam o que o
Ministro Moreira Alves qualificou como "limitação": devem custear
finalidades "que sejam para pezmi.tir que a concessionária possa
cunprir a obrigaçã.o de manter o serviço adequado".
33. Ambas as limitações - instituição por lei e associação com
a obrigação de manter serviço adequado - foram extraídas diretamente
dos incisos III e IV do parágrafo único do artigo 175 da Constituição
Federal:
"Art. 175. Incumbe ao Poder Público [ ... ] a prestação de serviços públicos. Parágrafo único. A lei disporá sobre: [ ... ] III - política tarifária; IV - a obrigação de manter serviço adequado."
9
SEClA/NUCJU·DF FI. 11
III.2. Recurso extraordinário n. 576.189-4
34. Outras limitações à instituição de encargos tarifários no
setor elétrico foram assentadas no julgamento do Recurso
Extraordinário n. 576.189-4.
35. Naquele feito, discutiam-se os encargos de capacidade
emergencial e de aquisição de energia elétrica emergencial,
instituídos pela Lei n. 10.438/2002.
36. No voto condutor do acórdão, o Ministro Ricardo
Lewandowski, primeiro, estabeleceu distinção entre taxa e preço
público:
37. Em
"Tanto a taxa quanto o preço público constituem um pagamento realizado em troca da fruição de um serviço ou bem estatal, divisível e específico. A distinção entre ambas está em que a primeira caracteriza-se pela nota da compulsoriedade, porque resulta de uma obrigação legal, ao passo que o segundo distingue-se pelo traço da facultatividade por decorrer de uma relação contratual."
seguida, o Ministro descreveu as principais
características dos encargos tarifários, realçando que constituem
"contraprestação pecuniária pelo consumo de energia elétrica" e que é
"perfeitamente compatível com a ordem natural das coisas que [os
encargos] fossem cobrados daqueles que [da continuidade do serviço] se
utilizaram":
"Não vejo, também, no caso, a alegada violação aos princípios da moralidade, da isonomia, da proporcionalidade ou da razoabilidade. Isso porque, cano os encargos foram criados can o objetivo de permitir a continuidade dos serviços de geração e distribuição de energia elétrica no âmbito do Sistema Interligado Nacional, afigura-se perfeitamente cc:anpatível can a ordem natural das coisas que eles fossem cobrados daqueles que dela se utilizaram, na medida do respectivo consumo. Ou por outra, a sobrecarga e a dependência do sistema de distribúição e geração ao qual se conectaram os usuar1os era diretamente proporcional à quantidade de energia elétrica que consumiam. " 7
7 Original sem destaques.
10
SECLA/NUOU-DF FI. 12
38. Com efeito, além de ser volta do à manutenção de serviço
adequado, o encargo deve ser cobrado, na proporção do uso do serviço,
daquele que se beneficia da melhoria no serviço por ele - encargo -
viabilizada.
39. Portanto, a decisão unânime no Recurso Extraordinário n.
576.189-4 revela limitação adicional à instituição dos preços públicos
políticos: o sujeito passivo deve ser aquele que se utiliza do serviço
cuja adequada manutenção é propiciada pela política custeada pelo
encargo. Ou seja, de haver referibilidade entre o sujeito passivo e a
política pública custeada pelo encargo.
IV. VÍCIOS DE INCONSTITUCIONALIDADE E DE ILEGALIDADE
IV.1. Exercício inconstitucional de política tarifária
40.
IV.1.1. Ampliação das finalidades da CDE por ato infralegal
IV.1.1.1. Histórico 1.egisl.ativo da Conta de .Desenvol.vimento
Energético - CDE
A CDE foi criada pelo artigo 13 da Lei n. 10.438, de 26 de
abril de 2002, com três finalidades: (i) desenvolver o sistema
energético dos estados, (ii) estimular a competitividade da energia a
partir de fontes eólica, pequenas centrais hidrelétricas, biomassa,
gás natural e carvão mineral nacional, e (iii) promover a
universalização do serviço de energia elétrica em todo o território
nacional.
41. A Lei n. 10.762, de 11 de novembro de 2003, conferiu nova
redação ao artigo 13 da Lei n. 10. 438/2002, acrescentando a seguinte
finalidade da CDE:
"garantir recursos para atendimento à subvenção econômica destinada à modicidade da tarifa de fornecimento de energia elétrica aos consumidores finais integrantes da Subclasse Residencial Baixa Renda"
11
SECLA/NUOU·DF FI. 13
42. Por sua vez, a Lei n. 12. 783, de 11 de janeiro de 2013,
acrescentou outras duas finalidades, quais sejam: (i) ''prover recursos
para os dispêndios da Conta de Consumo de Combustíveis - CCC"; e (ii)
''prover recursos e penni tir a amortização de operações financeiras
vinculados à indenização por ocasião da reversão das concessões ou
para atender à finalidade de modicidade tarifária".
43. Por último, a Lei n. 12.839, de 9 de julho de 2013, previu
mais duas finalidades da CDE: (i) ''prover recursos para compensar
descontos aplicados nas tarifas"; e ''prover recursos para compensar o
efeito da não adesão à prorrogação de concessões de geração [ . .. ] ,
assegurando o equilíbrio da redução das tarifas [ ... ], consoante
disposto no § :;tJ do art. 1° da Lei nº 12. 783, de 11 de janeiro de
2013".
IV.1.1.2. DeHmitação das :finalidades da CIE
44. Com efeito, as oito finalidades previstas em lei para
utilização de recursos da CDE são as seguintes:
(i) promover a universalização do serviço de energia
elétrica;
(ii) garantir a modicidade da tarifa dos consumidores de
Baixa Renda;
(iii) prover recursos para os dispêndios da CCC;
(iv) prover recursos e permitir a amortização de operações
financeiras vinculados tanto à indenização por ocasião
da reversão das concessões quanto à indenização para
atender à finalidade de modicidade tarifária;
(v) promover a
partir da
competitividade da energia produzida a
fonte carvão mineral nacional nas áreas
atendidas pelos sistemas interligados;
12
SECLA/NUOU-DF FI. 14
(vi) "promover a competitividade da energia [ ... ] de fontes
eólica, termossolar, fotovoltaica, pequenas centrais
hidrelétricas, biomassa, outras fontes renováveis e
gás natural";
(vii) "prover recursos para compensar descontos aplicados
nas tarifas"; e
(viii)"prover
adesão
recursos para compensar o
à prorrogação de concessões
energia elétrica".
efeito da não
de geração de
IV. 1.1. 3. Acréscimo de :final.idades por decreto
45. Embora as finalidades tenham sido fixadas na Lei n.
10. 438/2002, o Governo, por intermédio dos Decretos n. 7. 945/2013,
8.203/2014, 8.221/2014 e 8.272/2014, promoveu a ampliação do escopo da
COE mediante a criação de 7 novas atribuições:
(i) neutralizar a exposição das cdistribuidoras no mercado
de curto prazo, decorrente da alocação das cotas de
garantia física de energia e de potência e da não
adesão à prorrogação de concessões de geração;
( ii) "cobrir o custo adicional para as concessionárias de
distribuição decorrente do despacho de usinas
termelétricas acionadas em razão de segurança
energética, conforme decisão do Comitê de
Monitoramento do Setor Elétrico";
(iii) "neutralizar a exposição contratual involuntária das
concessionárias de distribuição no mercado de curto
prazo, decorrente da compra frustrada no leilão de
energia proveniente de empreendimentos existentes
realizado em dezembro de 2013";
13
46.
SECLA/NUCJU-DF FI. 15
(iv) "cobrir os custos com a realização de obras no sistema
de distribuição [ ... ] definidas pela Autoridade
Pública Olímpica APO, para atendimento aos
requisitos determinados pelo Comi tê Olímpico
Internacional";
(v) "cobrir os custos relati vos à exposição involuntária
das concessionárias de distribuição no mercado de
curto prazo";
(vi) cobrir os custos adicionais das distribuidoras
relativos ao despacho de usinas vinculadas a Contratos
de Comercialização de Energia Elétrica no Ambiente
Regulado - CCEAR, na modalidade por disponibilidade;
(vii) "cobrir os custos relativos à Conta no Ambiente de
Contratação Regulada - CONTA-ACR, de que trata o art.
1º do Decreto nº [8.221/2014]".
Em virtude dessa ampliação de escopo, foram repassados da
CDE às distribuidoras 12,5 bilhões de reais , dos quais, de acordo com
decisão da ANEEL apenas 3, 1 bilhões de reais devem ser devolvidos à
CDE em 2015.
47. Observe-se que o Decreto que atribuiu novas funções à CDE
não seria, por si só, ilegal se houvesse aporte de recursos do Tesouro
Nacional para custeá-las.
48. No entanto, o recuo na decisão de aporte do Tesouro, somado
às decisões da ANEEL de utilizar recursos da CDE para custear essas
novas funções e de determinar a devolução de apenas 3, 1 bilhões de
reais em 2015, fez com que fosse estendido, sem base legal, a
abrangência desse encargo.
49. Portanto, o repasse ilegal de recursos da CDE ainda
desfalca a conta em 9, 4 bilhões de reais, valor esse que, se não
tivesse sido ilegalmente utilizado ou se fosse integralmente devolvido
14
SECLA/NUCJU·DF FI. 16
em 2015, tem o condão de promover significativa contenção do orçamento
fixado para 2015.
50. Considerando que os associados da Autora respondem por
cerca de 14% do montante global de arrecadação das quotas da CDE,
verifica-se que essas empresas são compelidas a pagar mais de 1, 3
bilhão de reais em razão do repasse ilegal de recursos da CDE.
51. Por não estarem previstas em lei, essas finalidades fixadas
em decreto revelam o inconstitucional alargamento do alcance desse
encargo tarifário, afrontando o artigo 175, parágrafo único, inciso
III, da Constituição Federal, o princípio da reserva legal e os
fundamentos determinantes da decisão tomada pelo Supremo Tribunal
Federal no julgamento da ADC n. 9.
52.
IV.1.2. Cobrança da CDE nas tarifas de uso dos sistemas de transmissão e
de distribuição e o critério de rateio das despesas do encargo
A ANEEL também incorre em inconstitucionalidade e
ilegalidade ao desvirtuar o critério de alocação dos custos da CDE.
53. Dispõe o § 1 º do artigo 13 da Lei n. 10. 438/2002 que as
quotas anuais da CDE, pagas por todos os agentes que comercializem
energia com consumidor final, são recolhidas 'mediante encargo
tari:fário incluído nas tari:fas de uso dos sistemas de transmissão ou
distribuição [. .. ] ".
54. Com efeito, em virtude de a lei ter determinado a cobrança
da CDE nas Tarifas de Uso dos Sistemas de Transmissão ou Distribuição
- TUST ou TUSD - , a alocação dos custos da CDE deveria observar a
mesma lógica de alocação de custos observada na construção dessas
tarifas, ou seja, o rateio de custos deveria ocorrer na proporção do
uso dos sistemas de transmissão e distribuição.
15
SEClA/NUCJU-DF FI. 17
55. Por imperativo de lei, a COE deve se amoldar aos critérios
de alocação dessas tarifas - e não desnaturar esses critérios. Aplica
se, no ponto, a máxima segundo a qual o acessório segue o principal.
56. Assim, a metodologia de rateio da COE, tal qual a
metodologia de rateio da TUSO e da TUST, deve assegurar maiores
encargos para os agentes que mais oneram os sistemas de transmissão e
de distribuição de energia elétrica.
57. No ponto, vale invocar a advertência feita pelo Ministro
Ricardo Lewandowski no julgamento do RE n. 576.189-4:
58.
"Bem analisada a questão constato que tais encargos carecem do requisito 'compulsoriedade', elemento sem o qual não há falar em tributo, embora estejam presentes na conformação deles as demais notas que integram a definição legal acima transcrita, a saber [ ... ] v) são exigidos na f onna e pelos meios definidos na
legislação pertinente, não possuindo o sujeito ativo qualquer discricionariedade quanto à sua cobrança. " 8
Retenha-se a afirmação de que os encargos são exigidos
pelos meios definidos na legislação pertinente.
59. A definição, pela legislação, dos meios de cobrança do
encargo, entre os quais se inclui o critério de alocação de custos,
guarda conformidade com o princípio da reserva legal e com a noção de
que a ordem jurídica brasileira não admite a delegação pura, delegação
em branco.
60. Com efeito, no ordenamento jurídico brasileiro, a par da
necessidade de o ato infralegal estar amparado em lei - da qual retire
seu fundamento de validade - , é mister que a lei ofereça padrões e
parâmetros que permitam o controle da legalidade do ato subalterno.
61. Não há espaço, pois, para que a lei incumba o Poder
Executivo da tarefa de conferir-lhe concreção sem que haja a fixação
8 Recurso Extraordinário 576.189/ RS. Relataria Ministro LEWANCOWSKI. 22/04/2009. Página 6.
16
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SECLA/NUCJU-DF FI. 18
das balizas em cuja órbita a atividade regulamentar haverá de
gravitar.
62. Em outras palavras, não pode, sob pena de ofensa ao
princípio da legalidade, haver a chamada "delegação pura", a qual
enseja atividade regulamentar ilimitada e irrestrita.
63. No ponto, confira-se o voto proferido pelo Ministro Luiz
Fux no julgamento do Recurso Extraordinário n. 684.281/PR, no qual se
explicita a vedação constitucional à delegação pura, ofensiva ao
princípio da legalidade:
64.
"[ ... ] a lei, fixando parâmetros e padrões, comete ao regulamento essa aferição. Não há falar, em casos assim, em delegação pura, que é ofensiva ao princípio da lega!idade genérica (C.F., art. 5°, II) e da legalidade tributária (C.F., art. 150, I).
No julgamento do RE 290.079/SC, decidimos questão semelhante. Lá, a norma primaria, D.L. 1.422/75, art. 1°, § 2°, estabeleceu que a alíquota seria fixada pelo Poder Executivo, observados os parâmetros e padrões postos na norma primária. No meu voto, fiz a distinção da delegação pura, que a Constituição não permite, da atribuição que a lei canete ao regu1amento para a aferição de dados, em concreto, justamente para a boa aplicação concreta da lei."
A ratio subjacente à conclusão alcançada pelo Supremo
Tribunal Federal no aludido julgado permite entrever que, caso a lei
não houvesse fixado os parâmetros a serem observados no exercício da
atividade regulamentar levada a cabo pelo Executivo, ficaria
caracterizada violação ao princípio da legalidade9•
9 No julgamento das cautelares nas ações diretas de inconstitucionalidade em face da Medida Provisória n. 144/2003, o Ministro Gilmar Mendes consignou que se afigura ofensiva ao princípio da legalidade a ausência de parâmetros na lei que atribui ao Executivo a tarefa de exercer a atividade regulamentar:
"[ ... ) o Min. Gilmar Mendes, tendo e:n conta a ausência de parâmetros l.egais ou de diretrizes e:n dispositivos da noz:ma .i.zzpugnada, o que possibil.i taria a atuação il.imitada do Poder Executivo no exercício da atividade regu1amentar, deferiu o pedido de medida cautelar quanto aos artigos 1° e 2° referida Medida Provisória, por considerar caracterizada a aparente ofensa ao princípio da legalidade (CF, arts. 5°, II e 84, IV) e à reserva legal prevista no art. 175 da CF [ . .. } . " (Informativo/STF 335)
17
-
SECLA/NUCJU-DF FI. 19
65. Assim, tal qual exaustivamente rei ter ado na jurisprudência
do Supremo Tribunal Federal, se não há espaço para a delegação pura,
tampouco haverá para a delegação "contra legem".
66. No caso, ao ter a lei estabelecido a cobrança da COE nas
tarifas de uso dos sistemas de transmissão e de distribuição, o
critério de alocação dos custos da COE não pode ser diferente daquele
que orienta essas tarifas: cobrança na proporção do uso dos sistemas.
67. Defender o contrário significa admitir que a Lei deixou ao
livre arbítrio da ANEEL, sem qualquer parâmetro de controle, a
definição dos critérios de alocação de custos da COE, como se a ANEEL
tivesse ampla margem para criar subsídios, transferir renda e promover
política tarifária.
68. Por óbvio, tal leitura não se coaduna com os princípios da
legalidade e da reserva legal e com o artigo 175, parágrafo único, da
Constituição Federal.
69. Prova de que a ANEEL tem promovido política tarifária sem
qualquer parâmetro de controle está no movimento verificado com a
Conta de Consumo de Combustíveis Fósseis - CCC - e a Reserva Global de
Reversão - RGR -, encargos que, com a edição da Lei n. 12. 783/2013,
passaram a integrar a COE.
70. Embora não tenha havido qualquer discussão legislativa
sobre alteração no critério de alocação dos custos desses encargos, a
ANEEL alterou o critério de alocação que os informava, passando a
cobrá-los segundo o consumo de energia, e não mais na proporção do uso
dos sistemas.
71. Assim, como que por acidente legislativo, sem qualquer
discussão legislativa nesse sentido, os consumidores industriais foram
onerados, pois usam pouco os sistemas de transmissão e de
distribuição, mas são eletrointensivos, consumindo muita energia.
18
SECLA/NUOU·DF FI. 20
72. Tal exemplo mostra que a ANEEL faz política tarifária sem
nenhuma deferência ao que previsto em lei.
IV.1.3. Indevido repasse da despesa "Indenização de concessões" à
quota da COE
IV.1.3.1. Fina.1idade da indenização
73. Outra violação ao artigo 175, parágrafo único, inciso III,
da Constituição Federal e ao princípio da reserva legal se verifica em
relação à inclusão da rubrica "Indenização de Concessões".
74. Como já mencionado, a Medida Provisória n. 579/2012,
antecipou a renovação das concessões que venceriam entre 2015 e 2017.
75. No momento da antecipação, investimentos vinculados às
concessões não estavam integralmente amortizados, motivo pelo qual se
fez necessário indenizá-los, para depois reduzir as tarifas para o
patamar pretendido.
76. Com efeito, o pagamento da indenização foi pressuposto para
a antecipação da captura da "renda hidráulica",
destacado, foi integralmente alocada aos
distribuidoras, ou seja, ao ACR.
a qual, consoante
consumidores das
77. Logo, a despesa com "Indenização de Concessões" não pode
ser rateada pelos consumidores do ACL, os consumidores livres, via
COE, por faltar o requisito da referibilidade no componente tarifário.
78. Apesar de a lei ter previsto o financiamento via COE, não
se previu expressamente que o rateio deveria incluir agentes estranhos
ao benefício, donde se conclui estar mantida a referibilidade.
79. Para melhor expressar esse raciocínio, mister se faz
compreender a composição da tarifa no atual regime de concessões de
serviços públicos.
19
SECLA/NUOU-DF FI. 21
IV. 1. 3. 2. Reserva l.egal. e poli tica. tarifária e subsídio cruzado
80. A reserva legal configura preocupação maior do constituinte
com determinados temas, como ocorreu com a criação de tributos (art.
150, I, CF/88), tipificação de crimes (art. 5°, XXXIX, CF/88) e, no
que interessa, a política tarifária dos serviços públicos (art. 175,
p. ú., III, CF/88).
81. Se o princípio da legalidade já incide também sobre esses
assuntos, conferir idêntico sentido à reserva legal implicaria em
atribuir palavras inúteis à Constituição, o que não se admite.
82. O sentido da reserva legal, portanto, é impedir que haja a
delegação, por lei, a ato infralegal para disciplinar o objeto sob
proteção da reserva. Somente por lei, determinados temas poderão ser
tratados, entre eles a política tarifária.
83. Sobre o postulado da reserva de lei, convém citar o
seguinte trecho de voto do Ministro Celso de Mello, no julgamento da
ADI 2075:
84.
"[ ... ] Não cabe, ao Poder Executivo, em tema regido pelo postulado da reserva de lei, atuar na anânala (e inconstitucional) condição de legislador, para, em assim agindo, proceder à inposição de seus próprios critérios, afastando, desse modo, os fatores que, no âmbito de nosso sistema constitucional, só podem ser legitimamente definidos pelo Parlamento. É que, se tal fosse possível, o Poder Executivo passaria a desempenhar atribuição que lhe é institucionalmente estranha (a de legislador), usurpando, desse modo, no contexto de um sistema de poderes essencialmente limitados, corrpetência que não lhe pertence, com evidente transgressão ao princípio constitucional da separação de poderes. [ ... ] " 1º
IV.1. 3. 3. Iizpossibil.ida.de de criação de subsídio cruzado
por atos da ANEEL
Nessa linha de raciocínio, não poderia a ANEEL, sem
previsão legal específica, não poderia a ANEEL ter imputado aos
10 STF, Tribunal Pleno, ADI 2075 MC, Relator Ministro Celso de Mello, julgado em DJ 27.6.2003.
20
SECLA/NUOU-DF FI. 22
conswnidores livres despesa da COE com indenização paga em benefício
exclusivo dos consumidores cativos, sob pena de violação à reserva
legal e ao princípio da legalidade.
85. Os atos questionados criaram, por via transversa, hipótese
de subsídio cruzado, o que não se permite sem expressa previsão legal
nesse sentido.
86. Sem expressa previsão legal, não pode um decreto executivo
ou, pior, atos administra ti vos da ANEEL, estenderem o pagamento de
encargo setorial a agentes estranhos ao benefício por ele trazido.
87. Por outras palavras, na ausência de disposição legal
expressa, não se pode preswnir que haverá subsídio cruzado.
88. Os encargos
público que reflete a
consistem justamente na parcela do preço
"política tarifária", daí porque o Ministro
Moreira Alves os denominou de "preços públicos políticos".
8 9. Com efeito, não pode a ANEEL instituir subsídio cruzado
carente de previsão legal, sob pena de afronta ao artigo 175,
parágrafo único, inciso III, da Constituição Federal e aos fundamentos
vinculantes do acórdão proferido na Ação Declaratória de
Constitucionalidade n. 9.
90. Não se diz que o encargo não tenha sido criado por lei.
Entretanto, a lei não previu que agentes estranhos ao benefício
financiado pela política pública seriam sujeitos passivos da imposição
tarifária.
91. Não havendo previsão expressa de sujeição passiva a agentes
estranhos ao benefício, não se pode presumir a criação de subsídio
cruzado. Caso contrário, haverá violação ao princípio da legalidade e
à reserva de lei para fixação de política tarifária.
21
SECLA/NUOU·DF FI. 23
92. Disso decorre outra limitação constitucional à fixação da
política tarifária: a necessária referibilidade entre subjetiva entre
o ônus tarifário e o benefício com o serviço prestado.
93.
IV.1. 3. 4. Limites constitucionais à po1ítica tari:fária:
necessária re:feribi1idade subjetiva entre o ônus tari:fário
e o bene:fício can o serviço presta.do
No silêncio da lei, não se presume a política tarifária nem
se presume a existência de subsídio cruzado.
94. A contrario sensu, ausente disposição legal expressa,
presume-se que o usuário beneficiário da política pública será o
sujeito passivo do ônus financeiro (encargo) por ela criado.
95.
que:
96.
Nesse diapasão, Marçal Justen Filho é claro ao lecionar
"Insista-se em que a simples adoção do modelo de concessão já reflete uma proposta política sobre a repartição dos encargos atinentes ao fornecimento de utilidades essenciais. Reflete a concepção de que o custo dessas utilidades será arcado diretamente pelos que delas se utilizam. Celebrada a concessão, consagra-se o postulado de que paga quem usa e na medida em que o faz. " 11
Do mesmo modo, na já citada Medida Cautelar na Ação
Declaratória de Constitucionalidade n. 9 e do também já citado RE n.
576.189-4, o Supremo Tribunal Federal, embora tenha reconhecido que
seria possível a cobrança de "preços públicos políticos" na tarifa,
estabeleceu limites constitucionais a essa exação.
97. O primeiro limite constitucional à política tarifária já
foi tratado e está expresso na Constituição: a reserva legal para a
criação desses encargos que compõem a "tarifa em sentido amplo".
11 JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria Geral das Concessões de Serviço Público. São Paulo: Dialética, 2003, pp. 374-375.
22
SECLA/NUCJU·DF FI. 24
98. O segundo limite consiste na necessária referibilidade que
deve haver entre o beneficiário da política pública e a sujeição
passiva do encargo criado.
99. A referibilidade decorre da reserva legal, porque,
(i) somente a lei pode estabelecer a política tarifária;
( ii) o encargo consubstancia j ustarnente o caráter político
da tarifa ("preço público político");
(iii) o encargo deve estar voltado à obrigação de manter
serviço adequado;
(iv) o sujeito passivo deve ser aquele que se utiliza do
serviço cuja adequada manutenção é propiciada pela
política custeada pelo encargo;
(v) ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer algo
senão em virtude de lei; e
(vi) na ausência de lei, não se presume que terceiro arcará com o custo financeiro da política pública, mas sim o próprio beneficiário.
100. A referibilidade da tarifa também pode ser extraída de um
dos pressupostos básicos para sua cobrança: o uso efetivo.
101. Em outros momentos, foi intenso o debate jurídico que
buscava diferenciar taxa de tarifa.
102. Entre as principais distinções, destacou-se a
compulsoriedade da taxa, dada sua natureza tributária, face à
facultatividade da tarifa, que tem natureza contratual (súmula n.
545/STF).
103. A compulsoriedade da taxa foi j ustarnente o critério
considerado pelo Ministro Ricardo Lewandowski para, no julgamento do
23
SECLA/NUOU-DF FI. 25
Recurso Extraordinário n. 576.189-4, estabelecer distinção entre as
taxas e os encargos tarifários.
104. Outro critério determinante para distinção entre taxa e
tarifa é o fato de que as taxas podem ser cobradas pela mera
disponibilização do serviço ou pela utilização potencial (art. 145,
II, CF/88), enquanto a tarifa somente pode ser cobrada pelo uso
efetivo do serviço.
105. O recente julgamento da ADI n. 800, pelo Supremo Tribunal
Federal, no qual se definiu a natureza jurídica do pedágio, reforçou
esse pressuposto de cobrança das tarifas, corno se observa do voto do
Ministro Teori Zavascki:
"[ ... ] preço público, com natureza contratual, o fazem com base nas seguintes considerações: [ ... ] (c) a cobrança se dá em virtude da utilização efetiva do serviço, não sendo devida com base no seu oferecimento potencial. " 12
106. Pois bem, o subsídio cruzado nada mais é do que uma
cobrança de tarifa por serviço não efetivamente utilizado por aquele
de quem se cobra. Ao subsidiar tarifa de terceiro, o usuário paga por
serviço que não utilizou.
107. Ao se exigir que a cobrança da tarifa pressuponha uma
utilização efetiva do serviço, o que se estipulou, em outras palavras,
foi que aquele que não utiliza o serviço não deve pagar (ou subsidiar)
por aquele que de fato o usa.
108. Cobrar a tarifa daquele usuário meramente potencial seria o
mesmo que obrigá-lo a subsidiar a tarifa do usuário efetivo.
109. Corno visto, essa imposição é própria das taxas, que são
tributos, de natureza compulsória, mas não das tarifas.
110. O pagamento do subsídio cruzado foge do conceito clássico
de tarifa, pois não configura contraprestação equivalente ao serviço
12 STF, TribW1al Pleno, ADI 800, Relator Ministro Teori Zavascki, DJe-125 DIVULG 27-06-2014.
24
SECLA/NUOU·DF FI. 26
prestado. Por isso, somente aquele que utilizou o serviço se sujeita
ao pagamento da tarifa.
111.
IV.1. 3. 5. Da necessidade de vinculação da destinação dos
encargos à prestação de serviço público adequado
De toda sorte, há, ainda, outro argumento apto a afastar o
rateio da indenização das concessões de geração não prorrogadas.
112. Além da (i) reserva legal e da (ii) referibilidade, o
Supremo Tribunal Federal estabeleceu uma terceira limitação à política
tarifária: (iii) a necessidade de vinculação dos encargos setoriais à
obrigação de manter serviço público adequado.
113. Consoante já verificado, o Ministro Moreira Alves, no voto
na ADC n. 9, advertiu que, embora seja possível, por lei, o acréscimo
de encargos na tarifa, eles devem guardar estrita pertinência com a
obrigação de manter serviço adequado.
114. Entendimento contrário permitiria que fossem inseridos na
tarifa encargos destinados a financiar as mais variadas ações estatais
cujo custo deve ser suportado pelo orçamento público, mais
especificamente, pelos impostos.
115. A vinculação dos encargos tarifários ("preço público
político") se assemelha à sistemática das contribuições sociais,
espécie tributária que se diferencia dos impostos justamente por ter
destinação vinculada a específica finalidade, como observam Leandro
Paulsen e Andrei Velloso:
"A doutrina amplamente majoritária concebe as contribuições como tributos teleológicos, afetados a finalidades específicas e vocacionados a servir de instrumento para a atuação estatal em segmentos determinados.
Clara nesse sentido é a lição de Misabel Derzi, ao ressaltar que as contribuições se assimilam 'a impostos finalísticos'. Portanto, a sua peculiaridade reside essencialemente na destinação do produto arrecadado, que é constitucionalmente determinada." Humberto Ávila também se manifesta nessa linha,
25
116.
SECLA/NUCJU-DF FI. 27
mas dá ênfase ao caráter instrumental das contribuições: o 'que existe no regime jurídico-constitucional das mesmas e lhes confere identidade específica é a circunstância de serem instrumento para a promoção de finalidades constitucionalmente postas em caráter permanente' .
[ ... ] Não pairam dúvidas na doutrina e na ao fato de as contribuições serem finalidades específicas. "13
jurisprudência quanto tributos afetados a
Nesse jaez, os encargos tarifários, igualmente, estão
constitucionalmente vinculados à obrigação de manter o serviço público
adequado. Não podem financiar despesa estranha a essa finalidade
específica, sob pena de se afigurarem inconstitucionais.
117. O conceito de serviço adequado é encontrado no artigo 6º,
§ 1°, da Lei n. 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, que assim
estabelece:
118. No
"Art. 6º Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários, conforme estabelecido nesta Lei, nas normas pertinentes e no respectivo contrato.
§ 1° Serviço regularidade, generalidade, tarifas."
exame do
adequado é o que satisfaz as condições de continuidade, eficiência, segurança, atualidade, cortesia na sua prestação e modicidade das
mérito da Declaratória de
Constitucionalidade n. 9, o Supremo
Ação
Tribunal Federal julgou
constitucional a cobrança daquela sobretarifa por ter vislumbrado,
naquele caso, vinculação ao serviço público adequado:
"1. O valor arrecadado corno tarifa especial ou sobretarifa imposta ao consumo de energia elétrica acima das metas estabelecidas pela Medida Provisória em exame será utilizado para custear despesas adicionais, decorrentes da inplementação do próprio plano de racionamento, além de beneficiar os consumidores mais poupadores, que serão merecedores de bônus. Este acréscimo não descaracteriza a tarifa cc:ano tal, tratandose de um mecanismo que pennite a continuidade da prestação do serviço, com a captação de recursos que têm corno destinatários os fornecedores/concessionários do serviço. Implementação, em
13 PAULSEN, Leandro; VELLOSO, Andrei Pitten. Contribuições: Teoria geral contribuições em espécie. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2013, p.33-34. Original sem destaques.
26
SECLA/NUCIU·DF FI. 28
momento de escassez da oferta de serviço, de política tarifária, por meio de regras com força de lei, conforme previsto no artigo 175, III da Constituição Federal. [ ... ]
4. Ação declaratória de constitucionalidade cujo pedido se julga procedente. " 14
119. Aqui, diferentemente, não se vislumbra vinculação entre (i)
o pagamento de indenizações ao investidor privado, cuja sua concessão
expirou, e (ii) a prestação do serviço público adequado.
120. Não há vinculação do pagamento de indenizações a
investidores com a "regularidade, continuidade, eficiência, segurança,
atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das
tarifas." (art. 6°, § 1°, Lei n. 8.987/95).
121. Nenhum dos elementos do "serviço adequado" se vincula ao
pagamento de uma indenização por antecipação da extinção de um
contrato da União com os prestadores do serviço.
122. Desse modo, não é possível . que outros agentes sejam
obrigados ao pagamento das referidas indenizações, através de sua
inclusão na quota da COE, muito menos mediante rateio segundo critério
não previsto em lei.
123. Por mais essa razão, portanto, é indevido o pagamento,
devendo essa rubrica também ser excluída da quota de COE dos
consumidores livres.
IV .1. 4. Indevido repasse da despesa "subvenção redução tarifária
equilibrada"
IV.1.4.1. Subvenção cano des.locamento teaporal. de custo
124. Igualmente, a alocação, promovida pela ANEEL, da despesa
"Subvenção Redução Tarifária Equilibrada" na COE - despesa essa que
14 ADC 9, Relator (a) : GRACIE, Tribunal Pleno, 02148-01 PP-00001.
Min. NÉRI DA SILVEIRA, Relator (a) p/ Acórdão: Min. ELLEN julgado em 13/12/2001, DJ 23-04-2004 PP-00006 EMENT VOL-
27
SECLA/NUCJU-DF FI. 29
soma quase 400 milhões de reais
do ACL.
não pode alcançar os consumidores
125. Referida subvenção consistiu em empréstimo para que a
redução tarifária anunciada pelo Governo Federal fosse efetivamente
alcançada.
126. O Governo Federal pressupôs que todos os concessionários de
geração adeririam às condições de prorrogação das concessões, o que
permitiria antecipar a captura da renda hidráulica em favor da
modicidade tarifária, mas nem todos os concessionários de geração
aderiram.
127. Nesse sentido, para cumprir a promessa de redução das
tarifas em 20% 15, a Lei n. 12.839/2013 estabeleceu que recursos da COE
poderiam "compensar o efeito da não adesão à prorrogação de concessões
de geração de energia elétrica", o que, combinado com aportes do
Tesouro Nacional16, resultaria na propalada redução.
15 No ponto, cumpre destacar observação feita pelo Tribunal de Contas da União:
"38. Inicialmente, a redução de despesas prevista pela MP nº 579/2012 era de R$ 21, 7 bilhões, o que daria o desconto médio de 20% nas tarifas. Contudo, alcançou somente R$ 16,8 bilhões, sendo R$ 4,2 bilhões em geração, R$ 5 bilhões em transmissão e R$ 7, 6 bilhões em redução de encargos tarifários. Com esse valor menor, o desconto seria apenas de 15%. Ocorre que o Governo resolveu aumentar o aporte do Tesouro Nacional e manter os 20% de desconto originalmente previstos ... " (TCU, Acórdão n. 2.565/2014).
16 A participação do Tesouro Nacional teve os seus contornos apresentados na própria exposição de motivos da Medida Provisória n. 579/2012:
"A União, por meio da transferência de créditos referentes à divida de Itaipu, bem como da compra dos créditos que a Centrais Elétricas Brasileiras S.A. - ELETROBRAS também detém contra Itaipu, transferirá recursos da ordem de R$ 3.300. 000. 000 (três bilhões e trezentos milhões de reais) em 2013, para pagar as despesas vinculadas aos encargos setoriais. [ ... ]
Para o exercício de 2013, estima-se que o impacto seja de R$ 3. 300. 000. 000 (três bilhões e trezentos milhões de reais). [. .. ] Para o exercício de 2014, estima-se que o impacto seja de R$ 3. 600. 000. 000 (três bilhões e seiscentos milhões de reais), sendo R$ 3.300.000.000 (três bilhões e trezentos milhões de reais), correspondentes aos créditos que a ELETROBRAS e o Tesouro Nacional detém junto à Itaipu e R$ 300.000.000 (trezentos milhões de reais) correspondentes às operações entre ELETROBRAS e Tesouro Nacional para atenuar os efeitos cambiais da tarifa de Itaipu."
28
SECIA/NUCJU-DF FI. 30
128. Além de prever o aporte de recursos financeiros pelo
Tesouro Nacional na forma acima descrita, a Medida Provisória n.
579/2012, em seu artigo 20, estabeleceu a possibilidade de a
ELETROBRAS, na condição de gestora dos fundos setoriais
correspondentes à CDE e à Reserva Global de Reversão - RGR, "contratar
operações de crédito [ ... ] para atender à finalidade de modicidade
tarifária".
129. Para essas operações, a garantia seria o "fluxo futuro de
recebimento da arrecadação da CDE e da RGR".
130. Com efeito, as providências concebidas pela Medida
Provisória n. 579/2012 aporte do Tesouro Nacional e operações de
crédito envolvendo fundos setoriais - evidenciam ter sido necessária a
obtenção de empréstimos para se alcançar a redução tarifária de 20%,
empréstimos esses pagos com recursos a serem auferidos, no futuro, a
partir da própria tarifa que, naquele momento, não gerava arrecadação
compatível com os custos incorridos no fornecimento de energia.
131. A rubrica "Subvenção Redução Tarifária Equilibrada", ora
incluída como despesa a ser financiada pela quota de CDE repassada aos
consumidores livres 17 , consiste justamente no pagamento desses
empréstimos, obtidos para financiar a redução que se revelou
temporária das tarifas dos consumidores cativos.
132. A conclusão inexorável é no sentido de que a lei não
concebeu a "subvenção" como subsídio cruzado, mas mera prorrogação do
pagamento de parcela da tarifa, conforme reconheceu o TCU no Acórdão
n. 2.565/2014:
"42. Para obter a redução tarifária, o Governo se valeu não só do Tesouro Nacional, mas postergou para 2015 aumentos nas tarifas que deveriam ter sido repassadas já em 2013. Adiou também o recolhimento de cotas da COE para a cobertura da
17 O repasse dessa despesa aos associados da Autora alcança valores superiores a 54 milhões de reais.
29
SECLA/NUCJU-DF FI. 31
exposição involuntária e do acionamento de termelétricas por segurança energética, por um período de até cinco anos."
IV. 1. 4. 2. Reserva lega1: sujeição passiva e inexistência de
subsídio cruzado
133. Com efeito, a "subvenção" não foi concebida como subsídio,
mas mero deslocamento temporal de custo, ou seja, empréstimo tomado em
nome dos consumidores cativos e em benefício deles, razão pela qual se
afigura lógico afirmar que os recursos para pagamento viriam do
Tesouro Nacional ou dos próprios beneficiários do deslocamento: os
consumidores cativos.
134. Menos ainda pretendeu-se instituir subsídio cruzado: jamais
se previu, legalmente, que os consumidores livres pagariam o
componente do encargo (COE) que beneficiou unicamente os consumidores
cativos.
135. A subvenção ora incluída na COE beneficiou unicamente os
consumidores cativos. Agora, a ANEEL pretende, sem previsão legal para
tanto, repassar os custos daquele deslocamento ao ACL, formado
essencialmente por consumidores industriais.
136. Assim, pelos mesmos motivos expostos quanto à "Indenização
de Concessões", a despesa com "Subvenção Redução Tarifária
Equilibrada" não pode ser imputada aos consumidores livres, sob pena
de ofensa à reserva legal e à necessária referibilidade da tarifa.
IV .1. 5. Indevido repasse da despesa "restos a pagar" à quota da
COE
137. Por idênticas razões, além de outras, também é indevido o
repasse da rubrica "Restos a pagar'' aos consumidores livres.
138. No orçamento da COE para o ano de 2015, a componente
"Restos a pagar" abarca despesas cujos pagamentos ficaram pendentes ao
longo de 2014, despesas essas da ordem de 2,87 bilhões de reais.
30
SECLA/NUCJU-DF FI. 32
139. Em virtude de atraso nos pagamentos de 2014, a ANEEL
acresceu 125 milhões de reais a título de atualização monetária, o
que, somado aos valores não pagos de 2014, majorou a quota da CDE para
2015 em cerca de 3 bilhões de reais.
140. Segundo a ANEEL, a existência de restos a pagar no final de
2014 deve-se "à insuficiência de transferência de recursos do Tesouro
Nacional em relação ao valor orçado para aquele ano"18•
141. De fato, a Secretaria do Tesouro Nacional STN
comprometeu-se com aporte de recursos da ordem de 11, 8 bilhões de
reais para o ano de 201419•
142. Todavia, conforme prestação de contas da ELETROBRAS acerca
da movimentação financeira da CDE, o aporte efetivo do Tesouro ao
longo de 2014 foi de 9, 2 bilhões de reais. Logo, a União deixou de
honrar 2, 6 bilhões de reais, o que representa quase a totalidade da
rubrica "restos a pagar" de 2015.
143. Na medida em que há previsão expressa no art. 13, § 1°, da
Lei n. 10. 438/2002, de repasse de créditos da União à CDE, não cabe
transferir despesas que deveriam ser cobertas com recursos do Tesouro
Nacional em 2014 para as quotas da CDE de 2015.
144. Essa é a primeira razão pela qual é indevido o repasse da
rubrica "Restos a pagar" aos consumidores livres.
145. A segunda razão gravita em torno da circunstância de a
maior parte de "restos a pagar" (1, 609 bilhão de reais) decorrer de
repasse de recursos da COE para custear despesas das concessionárias
18 Trecho extraído do Anexo da Nota Técnica n. 33/2015-SGT-SRG/ANEEL. 19 A Tabela 7 da Nota Técnica n. 103/2014-SRE/ANEEL, de 7 de abril de 2014, que tratou da definição da quota da COE para o ano de 2014, mostra que o orçamento da Conta considerou o aporte do Tesouro Nacional em 11, 8 bilhões de reais. Nota Técnica disponível em:
http://www.aneel.gov.br/cedoc/nreh20141699.pdf
31
SECLA/NUCJU-DF FI. 33
de distribuição com compra de energia para atendimento de seus
mercados cativos.
146. Tal rubrica revela-se idêntica à já analisada "Subvenção
Redução Tarifária Equilibrada", com a única diferença de que esta se
refere ao exercício de 2015, enquanto aquela se referia ao de 2014.
147. Sem muito esforço, verifica-se estarem presente os mesmos
óbices à inclusão dos consumidores livres no rateio de rubricas já
analisadas, quais sejam, (i) necessidade de haver referibilidade entre
o pagamento da tarifa e a utilização efetiva do serviço, ou entre o
benefício recebido e a contraprestação devida; e (ii) impossibilidade
de se criar subsídio tarifário no silêncio da lei.
148. A terceira razão refere-se ao fato de que, durante o ano de
2014, recursos da COE foram repassados às distribuidoras por força de
atos do Poder Executivo, sem o devido respaldo legal. Caso não
houvesse tal repasse, haveria saldo suficiente de recursos para
pagamento integral das despesas de 2014.
149. Com efeito, é indevido o rateio da rubrica "restos a pagar
2014" com os consumidores livres, pois não há disposição legal
expressa que lhes atribua esse dever jurídico, sob pena de se criar
subsídio cruzado por via transversa, subsídio esse que onerará os
associados da Autora em mais de 400 milhões de reais.
IV.2. Indevida inclusão de custos na COE
IV. 2 .1. Atraso de obras necessárias à interligação de Manaus e
Maca pá
IV. 2 .1.1. Incozporação da CCC pel.a COE
150. Além do exercício inconstitucional de política tarifária,
houve indevida inclusão de custos na conta.
32
SECLA/NUOU-DF FI. 34
151. O artigo 13 da Lei n. 10. 438/2002 é categórico ao prever
que os dispêndios da Conta de Consumo de Combustíveis - CCC passam a
compor o orçamento da COE:
"Art. 13. Fica criada a Conta de Desenvolvimento Energético -CDE visando ao desenvolvimento energético dos Estados, além dos seguintes objetivos: [ ... ]
III - prover recursos para os dispêndios da Conta de Consumo de Combustíveis - CCC; [ ... ]"
152. O voto de encerramento da Audiência Pública n. 3/2015 -
ANEEL corrobora essa leitura:
"Destaca-se que, por considerar que o custo de consumo de combustíveis para a geração de energia elétrica nos sistemas isolados compõe o orçamento da CDE, também será tratada neste Processo a aprovação do orçamento da CCC para 2015."
153. Nos termos da Lei n. 12.111/2009, a CCC tem o propósito de
reembolsar parcela do custo total de geração incorrido "no atendimento
ao serviço público de distribuição de energia elétrica nos Sistemas
Isolados".
154. Todavia, verifica-se que a ANEEL, na definição da quota de
COE para o ano de 2015, incluiu, como rubrica da CCC, despesas
relacionadas ao atendimento dos sistemas elétricos de Manaus e Macapá,
sistemas esses que, por Lei, não mais se enquadram como Sistemas
Isolados.
IV. 2. 1. 2. lizprópria cobertura de custos de geração do
Sistema. Manaus cem recursos da CX'C
155. Segundo o orçamento da CCC/2015, mais de 2 bilhões de reais
destinam-se à cobertura dos custos incorridos pela Eletrobras Amazonas
Energia S.A. - AMAZONAS no suprimento do Sistema Manaus.
156. Tais valores decorrem de custos associados ao contrato de
fornecimento de gás natural e a contratos de compra de energia oriunda
de térmicas a óleo combustível, cuja geração ainda se revela
necessária em razão de o sistema de distribuição não ter sido adequado
33
SECLA/NUOU-DF FI. 35
pela AMAZONAS para viabilizar a plena interligação ao Sistema Manaus
ao Sistema Interligado Nacional - SIN.
157. Com efeito, a ausência de adequação do sistema de
distribuição impede que o Sistema Manaus seja integralmente suprido
pela energia elétrica proveniente das instalações de transmissão que
promoveram, desde o final de 2013, a integração desse sistema ao SIN.
158. A decisão da ANEEL de incluir tais custos de geração como
despesas da CCC se assenta na premissa de que por não estarem
concluídas as obras que viabilizariam a conexão da distribuidora à
linha de transmissão Tucuruí-Oriximiná-Manaus, o Sistema Manaus não
estaria interligado ao Sistema Interligado Nacional.
159. Tal premissa tem amparo na Portaria/MME n. 258/2013, a qual
estabelece (i) que a interligação dos sistemas isolados ao SIN "fica
condicionada à efetiva operação comercial das instalações de
transmissão necessárias à interligação plena dos sistemas, inclusive
as instai.ações de âmbito da distribuição", e (ii) que, até a operação
de todas as instalações elétricas, o sistema em processo de
interligação "permanecerá sob as regras dos Sistemas Isolados".
160. Todavia, as disposições constantes da Portaria ~ n.
258/2013 contrariam a Lei n. 12.111/2009!
161. Isso porque, na dicção do artigo 4° da Lei n. 12.111/2009,
"os agentes dos Sistemas Isolados serão considerados integrados ao SIN
e submetidos às suas regras a partir da data prevista no contrato de
concessão para a entrada em operação da linha de transmissão de
interligação dos Sistemas".
162. A Lei n. 12 .111/2009 evidencia que a interligação está
atrelada à entrada em operação da linha de transmissão.
163. A Portaria/MME n. 258/2013, ao estabelecer que a
interligação depende da "efetiva operação comercial [ ... ] inclusive
34
SECLA/NUCJU-DF FI. 36
[d]as instal.ações de âmbito da distr:ibuição", desloca o marco temporal
previsto na Lei n. 12.111/2009.
164. A demora da AMAZONAS na adequação de sua rede de
distribuição não pode, pois, alter ar a condição de inter ligado do
sistema.
165. Nesse sentido, não cabe imputar como despesa da CCC/CDE
custos de geração que não seriam incorridos caso a distribuidora
tivesse cumprido sua obrigação de adequar os seus sistemas elétricos.
166. Na situação sob apreço, os investimentos em transmissão
foram realizados e a interligação está concluída desde 2013, conforme
atestado inclusive em relatório de fiscalização da ANEEL.
167. Cabe à ANEEL, em consonância com o art. 4 ° da Lei n.
12.111/2009, assegurar que o dano causado pela distribuidora não
produza efeitos sobre a CCC/CDE, em vez de socializar dano, de
responsabilidade da AMAZONAS, com todos os agentes do setor, o que
caracteriza, mais uma vez, subsídio cruzado não apenas sem o devido
respaldo legal, mas em total confronto can a lei.
168. É oportuno ressaltar que a indevida consideração de custos
de geração para atendimento ao Sistema Manaus na CCC onera os
associados da Autora em mais de 300 milhões de reais, valor esse
inserido na quota da COE em total afronta às disposições da Lei n.
12.111/2009.
IV. 2 .1. 3. Inprópria cobertura de custos do Sistema. Macapá
com recursos da CCC
169. Semelhante ao caso do Sistema Manaus, o orçamento da CCC
para o ano de 2015 também prevê cobertura de despesas com geração para
outro sistema que, por Lei, encontra-se interligado: o Sistema Macapá.
35
SECLA/NUOU-DF FI. 37
170. Em virtude do atraso na adequação dos sistemas de
distribuição de responsabilidade da Companhia de Eletricidade do Amapá
- CEA, o Sistema Macapá não foi considerado interligado pela ANEEL,
embora a linha de transmissão Tucuruí-Jurupari-Macapá, que promove a
conexão dos sistemas elétricos da CEA ao Sistema Interligado Nacional
- SIN, esteja em operação comercial desde maio de 2014.
171. Assim, por não reconhecer que o Sistema Macapá encontra-se
interligado, a ANEEL, no orçamento da CCC para 2015, incluiu o valor
de 314 milhões de reais, referente ao contrato de compra e venda de
energia elétrica celebrado entre a CEA e a ELETRONORTE para
atendimento ao Sistema Macapá.
172. Pelo Despacho n. 4. 686/2014, a ANEEL autorizou a CEA a
prorrogar o referido contrato até (i) 30 de junho de 2015 ou (ii) até
a data de interligação da CEA ao Sistema Interligado Nacional - SIN, o
que ocorresse por último, assim o fazendo sob o argumento de que isso
aumentaria a "margem de segurança, de modo a ensejar a plena
interligação dos sistemas elétricos da CEA ao SIN'.
173. Tal decisão foi tomada em 2 de dezembro de 2014, ou seja,
após a entrada em operação comercial da linha de transmissão que, nos
termos da Lei n. 12 .111/2009, torna o Sistema Macapá interligado ao
SIN.
174. Portanto, não cabe considerar, como despesa da CCC, os
custos decorrentes dessa prorrogação de contrato de compra de energia,
pois autorizada pela ANEEL após o Sistema Macapá estar interligado.
175. Cabe à CEA suportar os custos desse contrato firmado com a
ELETRONOTE, contrato esse cuja prorrogação foi motivada pelo atraso
incorrido pela própria distribuidora na adequação do sistema de
distribuição.
36
SECLA/NUOU-DF FI. 38
176. A imprópria consideração de custos de geração para
atendimento ao Sistema Macapá na CCC onera os associados da Autora em
mais de 40 milhões de reais, valor esse inserido na quota da COE sem o
devido amparo legal.
IV.2.2. Indevido repasse do custo relacionado ao gasoduto Urucu
Coari-Manaus no estabelecimento da gutoa da COE
177. Consoante destacado, uma das finalidades da COE consiste em
"prover recursos para os dispêndios da [ ... ] CCC'', cujos valores são
definidos segundo o Plano Anual de Combustíveis - PAC - elaborado pela
ELETROBRAS, a qual também é responsável pela gestão dos recursos
financeiros da CCC.
178. A partir da análise das informações apresentadas pela
ELETROBRAS no PAC para 2015, verifica-se que a parcela correspondente
ao transporte do gás natural relativo ao gasoduto Urucu-Coari-Manaus,
gasoduto esse responsável pelo escoamento do combustível extraído do
poço de Urucu até as usinas termelétricas instaladas em Manaus,
alcança o valor de 463 milhões de reais.
179. Segundo manifestado pela área técnica da ANEEL20, o patamar
de custo atribuído ao transporte do gás natural oriundo de Urucu não
deriva de valor regulatório, na medida em que essa referência
regulatória de preço ainda é objeto de discussão no âmbito do Processo
Administrativo n. 48500.006917/2005-46.
180. Assim, na ausência de preço regulatório, a Agência praticou
"por métrica contratual, o valor médio entre o requerido pelo
fornecedor [ PETROBFAS] e o exigido pelo comprador [Amazonas
Distribuidora de Energia S.A. - AME]".
20 Manifestação apresentada no Relatório de Análise de Contribuições da AP 003/2015, anexo da Nota Técnica n. 33/2015-SGT/ANEEL, de 26 de fevereiro de 2015.
37
SECLA/NUOU·DF FI. 39
181. Pontuou ainda a ANEEL que "definido o preço final, o que
deve ocorrer em 2015, os efeitos serão retroativos desde o início do
fornecimento do gás natural, porém colocados em fluxo de caixa e
absorvidos somente nos preços futuros do produto".
182. A discussão sobre a fixação de referência regulatória de
preço para parcela transporte do gás natural proveniente de Urucu foi
iniciada pela ANEEL em março de 2014, mediante instauração da
Audiência Pública AP 005/2014, a qual, embora transcorridos mais de 13
meses desde sua abertura, ainda não foi concluída.
183. Essa demora compromete o alcance de um dos objetivos
colimados pela Lei n. 12.111/2009, qual seja, a de que a sistemática
da CCC contenha "mecanismos que induzam à eficiência econômica e
energética"21•
184. Nesse contexto, a fixação do preço de referência do
transporte de gás natural para definição dos valores a serem lançados
nas cotas da CDE em 2015 deve incorporar, por analogia, os princípios
que norteiam a aplicação do disposto no art. 3° da Lei n. 12.111/2009,
regulamentado pelo Decreto n. 7.246/2010, referente à sub-rogação dos
benefícios do rateio da CCC para empreendimentos que promovam a
redução do dispêndio atual ou futuro da Conta, quais sejam esses
princípios:
21 § 12 22 § 1º 23 § 4º
(i) o montante a ser sub-rogado deve observar "o valor do
investimento do projeto básico aprovado pela ANEEL"22;
(ii) ANEEL deve reconhecer "os investimentos prudentes
considerados na elaboração do projeto básico" 23;
( iii) a regulamentação da CCC deve prever mecanismos que
"induzam à eficiência econômica e energética" 24; e
do art. 3º da Lei n. 12.111/2009.
do art. 12 do Decreto n. 7.246/2010. do art. 12 do Decreto n. 7.246/2010.
38
SECLA/NUCJU·DF FI. 40
(iv) a troca de combustível fóssil por gás natural dá
ensejo ao benefício da sub-rogação segundo valores de
investimentos "devidamente homologados pela ANEEL" 25 •
185. Se, para fins de sub-rogação, são considerados os valores
de investimentos constantes da fase de projeto, esse mesmo conceito
deve ser replicado para definir o preço regulatório da parcela
"transporte do gás natural proveniente do gasoduto Urucu-Coari-Manaus"
a ser coberta pela CCC.
186. Como reforço a esse argumento, registra-se que a ANEEL, no
âmbito do Processo 48500.006917/2005-46, negou provimento às
solicitações apresentadas pela PETROBRAS e pela CIGÁS para sub-rogação
dos benefícios do rateio da CCC referente aos custos de implantação do
gasoduto Urucu-Coari-Manaus.
187. A ANEEL assim o fez sob a alegação de que o aumento do
custo de implantação do gasoduto de quase 2 bilhões de reais
(diferença entre os valores declarados pelas empresas e os valores de
projeto), combinado com a modalidade de contratação denominada "open
book" tornou o custo variável de geração a gás natural superior
àquele incorrido com óleo combustível, o que levou à conclusão de que
o empreendimento não promove redução do dispêndio atual ou futuro da
ccc.
188. É importante ter em perspectiva também que o TCU, no
Acórdão nº 336/2014, destacou que a modalidade de contratação "open
book" encontra vedação no art. 55, inciso III, da Lei n. 8. 666/1993,
motivo pelo qual recomendou a abertura de procedimento apartado para
apurar a responsabilidade de gestores da Amazonas Distribuidora de
Energia S .A. - AME e da ELETROBRAS "sem prévia estipulação do preço a
ser pago à CIGÁS relativo ao fornecimento de gás".
24 § 12 do art. 3º da Lei n. 12.111/2011. 25 § 4º do 'art. 12 do Decreto n. 7.246/2010.
39
. -
SECLA/NUOU-DF FI. 41
189. Ademais, o TCU detenninou à ANEEL a adoção de providências
para fixação do ''preço regulatório do combustível gás natural
associado ao Contrato de Compra e Venda de Gás Natural OC 1902/2006
para fins de reembolso pela [CCC}, em cumprimento ao art. 3°, inciso
VII, da Lei nº 9. 427/1996".
190. Em matéria veiculada no Jornal Nacional da Rede Globo em 20
de abril de 2015 26, foi noticiado que o TCU, na análise das obras da
PETROBRAS tratadas no âmbito das investigações da Operação Lava Jato,
identificou "aumentos bilionários depois da assinatura dos contratos" .
191. Entre essas obras, encontra-se o Gasoduto Urucu-Coari
Manaus, cujo orçamento inicial em 2006 era de 2, 4 bilhões de reais,
mas ao final da obra, três anos depois, alcançou quase 4,5 bilhões de
reais.
192. Ainda segundo a matéria, relatórios do TCU apontam que um
dos contratos celebrados para a implantação do referido gasoduto foi
objeto de aditivos que somaram 563 milhões de reais, "84% acima do
contra ta do".
193. Logo, é possível compreender as razões da discrepância
entre (i) o valor de R$ 4,36/MMBTu, utilizado como referência quando
da tomada de decisão para construção do gasoduto em 2005, e (ii) o
valor de R$ 16, 24/MMBTu requerido pela PETROBRAS ao final de sua
implantação.
194. Em resumo, a postura de não se adotar, na definição das
quotas da CDE/2015, o preço de 4,36/MMBTu para a parcela transporte do
gás natural que escoa pelo gasoduto Urucu-Coari-Manaus, valor
considerado referência na fase de concepção do projeto, caracteriza
26 A matéria do Jornal Nacional foi retratada na página do Gl na internet, no link:
http://gl.globo.com/jornal-nacional/noticia/2015/04/tcu-identifica-aumentosbilionarios-nos-custos-de-obras-do-petrobras.html
40
SECLA/NUOU-DF FI. 42
violação aos princípios da legalidade, moralidade, e eficiência, na
medida em que:
(i) a ANEEL, em suas atribuições precípuas de regular e
fiscalizar, deve promover acompanhamento sistemático
da gestão dos recursos da CCC, avaliar periodicamente
a eficiência do encargo e estabelecer parâmetros
regulatórios para incentivar a adoção das melhores
práticas de gestão da Conta;
(ii) a Lei n. 12.111/2009 introduz mecanismos de indução à
eficiência econômica e energética na prestação dos
serviços no Sistema Isolado; e
(iii) o Decreto n. 7 .246/2010 estabelece a competência da
ANEEL para definir limites para o reembolso, pela
CCC/CDE, dos custos com geração de energia elétrica
nos Sistemas Isolados.
195. Desse modo, não é possível que a CCC/CDE, possa financiar e
restituir custos que não realizem o objetivo principal do encargo, que
é justamente a promoção de eficiência energética e econômica.
196.
descaso
Diante desse objetivo, fica
e a ineficiência de agentes
ainda mais patente que o
específicos não pode ser
socializado com todos os demais atores do setor, sob pena de violação
aos princípio da legalidade, da moralidade e da eficiência.
IV.2.3. Absurda utilização de recursos advindos de quota de COE
para reembolso de carvão mineral de usina terrnelétrica
indisponível
197. Observe-se, ainda, que, dos itens de despesa que compõem o
orçamento da COE para o ano de 2015, consta o valor de 1,2 bilhão de
reais a ser destinado à cobertura dos custos incorridos por usinas
41
SECLA/NUOU-DF FI. 43
termelétricas que utilizam carvão mineral nacional como combustível
principal.
198. Está previsto o repasse de 118 milhões de reais para a
Usina Termelétrica UTE Presidente Médici, de propriedade da
Companhia de Geração Térmica de Energia Elétrica - CGTEE, integrante
do grupo ELETROBRAS.
199. A UTE Presidente Médici (Fases A e B) é composta por 4
unidades geradoras: ( i) duas referentes à Fase A, em operação desde
1972, e (ii) outras duas referentes à Fase B, em operação comercial
desde 1988.
200. A Fase A da UTE Presidente Médici encontra-se totalmente
indisponível para operação desde setembro de 2013, motivo pelo qual a
área de fiscalização da ANEEL (i) emitiu ato suspendendo a operação
comercial , (ii) lavrou auto de infração e (iii) requereu autorização
da Diretoria da Agência para instaurar processo punitivo tendente à
declaração de caducidade dessa usina.
201. Por meio do Despacho n. 102, de 20 de janeiro de 2015, a
Diretoria da ANEEL, reconhecendo que a Fase A da UTE Presidente Médici
não tem mais condições de operar, decidiu "autorizar a
Superintendência de Fiscalização dos Serviços de Geração - SFG a dar
início ao processo de caducidade da concessão da Fase A da Usina
Termelétrica de Presidente Médici, de titularidade da Companhia de
Geração Térmica de Energia Elétrica - CGTEE".
202. Apesar do cenário de total indisponibilidade da Fase A, a
ANEEL considerou, no orçamento da COE para o ano de 2015, 118 milhões
de reais com compra de combustível cujo volume exigiria a operação
dessa Fase A da usina.
203. Na Audiência Pública n. 003/2015, que discutiu o orçamento
da COE para o ano de 2015, foi apresentada contribuição destacando a
impropriedade de reembolso, pela COE, de custos com combustível para
42
SEClA/NUOU-DF FI. 44
usina termelétrica que sabidamente não reúne as mínimas condições de
operação e, por esse motivo, responderá processo punitivo tendente à
declaração de caducidade de sua concessão.
204. Em resposta a essa contribuição 27, a ANEEL declarou que "o
reembolso da COE para o carvão mineral deve, por dispositivo legal,
garantir a compra mínima contratada [de combustível]".
205. Adernais, ressaltou a ANEEL que as quantidades do
combustível não utilizadas na Fase A da UTE Presidente Médici
"eventualmente podem ser realocadas nas demais usinas a carvão
beneficiárias da COE".
206. Ambas as alegações da ANEEL revelam flagrante ausência de
respaldo em dispositivos legais e normativos.
207. Os critérios para aplicação de recursos da COE para
alcançar a sua finalidade de "promover a competitividade da energia
produzida a partir da fonte carvão mineral nacional" estão definidos
no § 4° do art. 13 da Lei n. 10.438/2002:
208.
"§ 4 ° O repasse da COE a que se refere o inciso V do caput observará o limite de até 100% (cem por cento) do valor do combustível ao seu correspondente produtor, incluído o valor do combustível secundário necessário para assegurar a operação da usina, mantida a obrigatoriedade de compra mínima de combustível estipulada nos contratos vigentes na data de publicação desta Lei, a partir de 1° de janeiro de 2004, destinado às usinas tennelétricas a carvão mineral nacional, desde que estas participem da otimização dos sistemas elétricos interligados, compensando-se os valores a serem recebidos a título da sistemática de rateio de ônus e vantagens para as usinas tennelétricas de que tratam os§§ 1° e 2° do art. 11 da Lei nº 9. 648, de 1998, podendo a Aneel ajustar o percentual do reembolso ao gerador, segundo critérios que considerem sua rentabilidade competitiva e preservem o atual nível de produção da indústria produtora do combustível."
Em síntese, o repasse da COE destinado a usinas
termelétricas que utilizam carvão mineral nacional deve (i) conferir
27 Anexo da Nota Técnica n. 33/2015-SGT/ANEEL, de 26 de fevereiro de 2015. Disponível para consulta em: http://www.aneel.gov.br/aplicacoes/audiencia/arguivo/2015/003/resultado/rac -
anexo nt 33 - ap 003 2015.pdf
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SEClA/NUOU·DF FI. 45
cobertura não só para os custos de aquisição do carvão, mas também
para os custos relacionados ao "combustível secundário necessário para
assegurar a operação da usina", (ii) observar a "obrigatoriedade de
compra mínima de combustível estipulada nos contratos vigentes", (iii)
abarcar usinas termelétricas "desde que estas participem da otimização
dos sistemas elétricos interligados" e (iv) considerar critérios da
ANEEL aplicáveis a "ajuste de percentual do reembolso ao gerador".
209. A Lei, ao tratar da obrigatoriedade de compra mínima de
carvão, buscou conferir, às atividades que envolvem a lavra, o
beneficiamento e o transporte do carvão mineral, patamar mínimo de
exploração continuada.
210. Contudo, é importe ter em perspectiva que a obrigatoriedade
de compra mínima de carvão é do agente de geração, o qual, no caso da
UTE Presidente Médici - Fase A, é a CGTEE.
211. Conforme explicitamente definido no § 4° do art. 13 da Lei
n. 10.438/2002, o repasse de recursos da COE para cobertura de custos
relacionados ao carvão é "destinado às usinas termelétricas a carvão
mineral nacional, desde que estas participem da otimização das
sistemas el.étricos interligacios".
212. Com efeito, o requisito para usina termelétrica que utiliza
carvão mineral nacional ter os seus custos de combustível cobertos com
recursos da COE é "particip[ar] da otimização dos sistemas elétricos
interligados".
213. O Decreto n. 4. 541/2002 apresenta, em seu art. 1 º, inciso
X, a definição de "usinas termelétricas a carvão mineral nacional que
participam da otimização dos sistemas elétricos interligados":
"X - Usinas Terrnelétricas a Carvão Mineral Nacional que Participam da Otimização dos Sistemas Elétricos Interligados: aquelas usinas com flexibilidade, que podem ser despachadas pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico - CNS e cumprir as instruções de despacho para atender as conveniências da otimização."
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SECLA/NUCJU-DF FI. 46
214. A UTE Presidente Médici Fase A não reúne condições
técnicas de cumprir as instruções de despacho do ONS, até mesmo porque
atos emitidos pela fiscalização da ANEEL suspenderam a operação
comercial das duas unidades geradoras dessa usina.
215. Logo, há expressa vedação legal ao repasse de recursos da
COE para cobertura dos custos com combustível de usina termelétrica
que não possui meios de propiciar a contrapartida para esse repasse:
gerar energia elétrica.
216. O fato de o combustível adquirido não resultar em geração
de energia é de responsabilidade da CGTEE, sem que seja possível
transferir os custos do contrato de combustível para aqueles que
suportam a COE: os consumidores.
217. A alegação da ANEEL de que esse combustível que a UTE
Presidente Médici - Fase A sabidamente não utilizará eventualmente
poderá ser realocado nas demais usinas a carvão beneficiárias da COE,
além de não ter respaldo legal, está em desacordo com as disposições
da Resolução Normativa n. 500/2012.
218. As despesas da COE com as usinas terrnelétricas a carvão
mineral nacional são definidas segundo previsão realizada pelo ONS de
forma individualizada, previsão essa "baseada na otimização
eletroenergética", conforme disposto no art. 2º da Resolução Normativa
n. 500/2012.
219. Portanto, cada usina terrnelétrica que atende aos requisitos
de reembolso da COE já teve a sua geração estimada para o ano de 2015,
de maneira que não há espaço para incluir a UTE Presidente Médici -
Fase A no rol de usinas beneficiárias para elevar a cobertura de
combustível das demais usinas.
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SECLA/NUOU·DF FI. 47
220. Além disso, o § 4° do art. 2° da Resolução Normativa n.
500/2012 estabelece que eventual sobra de combustível em determinado
ano "deverá ser considerada na programação do ano posterior''.
221. Dados disponibilizados pela ELETROBRAS em seu sítio
eletrônico 28 apontam que o Complexo Presidente Médici, composto pelas
Fases A, B e C, consumiu em 2014 cerca de 2,34 milhões de toneladas de
carvão mineral nacional. Todavia, no orçamento da COE para o ano de
2014, foi conferido repasse de COE para volume de 3, 3 milhões de
toneladas de carvão.
222. Assim, houve sobra próxima a 1 milhão de toneladas de
combustível, quantidade essa (i) que é mais do que suficiente para a
UTE Presidente Médici - Fase B operar durante todo o ano de 2015 e
(ii) que, conforme determinação normativa, deve ser considerada no
orçamento da CDE do ano subsequente.
223. Portanto, é descabido o valor de 118 milhões de reais
relativos ao reembolso dos custos com combustível para a UTE
Presidente Médici (Fases A e B) no orçamento da COE para o ano de
2015.
224. O reembolso pela COE de combustível que sistematicamente
não tem sido utilizado para geração de energia elétrica caracterizaria
enriquecimento ilícito da CGTEE e má gestão de recursos públicos pela
ELETROBRAS.
225. Essa rubrica da COE bem ilustra a inaceitável ausência de
processos de fiscalização e de auditoria das despesas desse oneroso
fundo setorial!
28 Página da ELETROBRAS na Internet, na seção Programas e Fundos Setoriais - Fundos Setoriais - Conta de Desenvolvimento Energético (COE) - Movimentação de Combustível (Carvão Mineral) - 2014:
http://www.eletrobras.com/elb/data/Pages/LUMIS5717AOF6PTBRIE.htm#2014
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SECLA/NUCIU·DF FI. 48
V. RAZÕES PARA DEFERIMENTO DA TUTELA ANTECIPADA
226. Estão presentes todos os requisitos autorizadores da
concessão de antecipação dos efeitos da tutela ao final pretendida.
227. O requisito da verossimilhança do direito encontra-se
estampado nos capítulos anteriores, a partir da exaustiva demonstração
de que:
(i) a ANEEL elasteceu e desvirtuou o encargo, chegando ao
ponto de criar política pública ao arrepio da lei, em
desrespeito ao princípio da separação de poderes (art.
2º, CF/88), ao criar, por vias oblíquas, subsídios
cruzados indevidos;
(ii) o cálculo das quotas de COE para 2015 violam os
princípios da legalidade e da reserva legal, na medida
em que a lei não determinou expressamente que agentes
seriam sujeitos passivos do ônus por benefícios não
usufruídos;
(iii) houve violação da necessária referibilidade que deve
haver entre o usuário beneficiário da política
pública e a sujeição passiva do encargo criado.
(iv) algumas das despesas incluídas na COE fogem da
constitucional vinculação da destinação dos encargos à
prestação de serviço público adequado; e
(v) a ANEEL promove o repasse e a socialização de despesas
voluntariamente incorridas por determinados agentes
ineficientes, onerando os demais atores do setor, mais
uma vez sem respaldo em lei.
228. O perigo de dano irreparável ou de difícil reparação, por
sua vez, consiste no fato de que a ANEEL autorizou a aplicação da nova
quota da CDE, com todas as indevidas despesas mencionadas, a partir de
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SECLA/NUCJU-DF FI. 49
março de 2015, conforme disposto na Resolução Homologatória n.
1. 857 /2015.
229. Em te:rmos unitários, a quota da COE para o ano de 2015,
aplicável às regiões Sudeste, Centro-Oeste e Sul, comparada com a de
2014, sofreu elevação de incríveis 1.100% (mil e cem por cento): de R$
4,8/MWh para R$ 52,8/MWh.
230. Em virtude de o consumo anual dos associados da Autora ser
da ordem de 72. 708. 000 MWh, os desembolsos com o pagamento desse
encargo sairão do patamar de 350 milhões de reais em 2014 para quase 4
bilhões de reais em 2015!
231. Considerando que a ANEEL, antes de fixar essa quota de COE
majorada em inimagináveis 11 vezes, aplicou valores provisórios do
encargo para os meses de janeiro e fevereiro de 2015 da ordem de R$
7 /MWh, o período de março a dezembro de 2015 envolverá pagamentos
ainda mais vultosos para compensar a arrecadação obtida com os valores
provisórios em janeiro e fevereiro.
232. Considerando também que a cobrança das quotas da COE tem
periodicidade mensal, cuja data-limite é o 10º dia do mês subsequente
ao da competência, chega-se à conclusão de que os associados da
Autora, desde 10 de abril de 2015, estão submetidos a pagar,
mensalmente, valor próximo ao equivalente ao desembolso ocorrido ao
longo de todo o ano de 2014.
233. Em outras palavras, o valor mensal a ser pago em 2015
praticamente correspondente à soma de todos os valores mensais pagos
em 2014!
234. Já no próximo dia 10 de maio de 2015 os associados terão de
arcar com a segunda onerosa cobrança mensal da quota da COE/2015.
48
SECLA/NUOU-DF
235. Esse aumento sem precedentes da quota da CDE
sobremaneira os custos da indústria, podendo comprometer
resultado operacional obtido pelas associadas da Autora em 2014.
FI. 50
impacta
todo o
236. No caso do segmento de ferro-ligas, a estimativa é de que o
custo da CDE alcance surpreendentes 200% do lucro líquido auferido no
ano passado!
237. Observe-se, ainda, que, desde 2013, a atividade industrial
apresenta trajetória de retração, com quase 6% de redução acumulada.
238. Diante da abrupta elevação dos custos de importante insumo
para a indústria, a energia elétrica, não se vislumbra cenário outro
que não a manutenção dessa trajetória nefasta de retração da atividade
industrial.
239. É importante ter em perspectiva que esta ação declaratória
de inexigibilidade de preço público não tem o condão de obter, do
Poder Judiciário, isenção no pagamento da CDE em 2015.
240. Se as teses trazidas nesta inicial forem acolhidas, a
redução a ser alcançada será inferior a 40% do valor de quota de CDE
estabelecido pela Resolução Homologatória n. L 857 /2015, ou seja, o
valor unitário da quota de CDE seria reduzido de R$ 52,8/MWh para algo
em torno de R$ 31/MWh, o que, comparado com o valor praticado em 2014,
R$ 4,8/MWh, representa aumento superior a 600%.
241. A elevação do custo da energia elétrica, insumo básico para
as indústrias, consumidores livres associados da Autora, implicará a
perda de competitividade dos produtos nacionais perante os importados,
seja no mercado doméstico ou no exterior.
242. Além de consequências nefastas para a economia do país
(redução do PIB e aumento da inflação) , os efeitos dessa elevação
serão diretamente sentidos pelos trabalhadores, que, além de perderem
seus postos de trabalho, experimentarão aumento de preço em produtos
de primeira necessidade.
49
SECLA/NUCJU·DF FI. 51
243. Em alguns setores, o custo da energia elétrica ultrapassa o
limite da viabilidade do negócio, motivo pelo qual a interrupção da
aplicação da atual quota da COE se afigura medida extremamente urgente
e necessária, pois o cenário de pagamento das despesas indevidas da
COE ao longo de todo o ano de 2015 causará o fechamento de diversas
grandes empresas, ou sua fuga para países vizinhos.
244. Com efeito, o aumento do custo da energia elétrica para os
consumidores industriais é desproporcional e atenta contra a
valorização do trabalho humano, a busca do pleno emprego, a defesa do
consumidor e a redução das desigualdades sociais e regionais.
245. A suspensão do repasse das despesas impugnadas à COE
permitirá aos grandes consumidores de energia a continuidade de seus
negócios e dos empregos a eles atrelados, sob contexto de grave crise
já instalada na economia nacional.
246. Assim, a antecipação dos efeitos da tutela é medida sem a
qual ocorrerão danos gravíssimos ou de dificílima reparação, razão
pela qual se faz imperiosa a sua concessão imediata.
VI. PEOIOOS
247. O flagrante risco na demora indica que o largo prazo em
quádruplo para contestar de que dispõe a Ré (60 dias!) já será
suficiente para causar danos graves ou de difícil reparação aos
associados da Autora.
248. Assim, a fim de conciliar a imperiosa necessidade da
concessão de antecipação dos efeitos da tutela com as garantias do
contraditório, requer-se a concessão inaudita altera parte ou a
intimação da ANEEL para, preliminarmente, manifestar-se no prazo de
72h (art. 22, §2º, Lei n. 12.016/09, analogicamente) sobre a medida de
urgência pleiteada, sem prejuízo de seu prazo legal para contestação.
50
SECLA/NUOU-DF FI. 52
249. Nesses termos, a Autora pede, em antecipação dos efeitos da
tutela ao final pretendida, a suspensão do pagamento da parte
controversa da quota da CDE/2015, até o trânsito em julgado, pelos
associados da Autora, determinando-se à ANEEL o recálculo do encargo
sob os seguintes parâmetros:
(i) para os associados participantes do Ambiente de
Contratação Livre (ACL),
(i.1) a exclusão
"indenização
dos custos relacionados
de concessões";
(i.1.a)
(i.1.b)
à
à
"subvenção redução tarifária equilibrada";
(i .1. c) a "restos a pagar"; (i .1. d) ao atraso de
obras associadas à interligação do Sistema
Manaus; (i.1.e) ao atraso de obras associadas à
interligação do Sistema Macapá; (i .1. f) ao valor
que extrapola preço de referência do transporte
de gás natural no gasoduto Urucu-Coari-Manaus; e
(i.1.g) ao combustível das Fases A e B da UTE
Presidente Médici; e
(i.2) após, o rateio dos valores remanescentes com base
no uso da rede de transmissão ou distribuição, em
consonância com a metodologia de cálculo da Tarifa de
Uso do Sistema de Transmissão (TUST) e da Tarifa de Uso
do Sistema de Distribuição (TUSD) .
(ii) para os associados participantes do Ambiente de Contratação
Regulada (ACR) ,
(ii.1) a exclusão dos custos relacionados (ii.1.a) ao
atraso de obras associadas à
ao
do
interligação do
atraso de obras
Sistema Ma capá;
Sistema Manaus; (ii .1.b)
associadas à interligação
(ii.1.c) ao valor que extrapola preço de
51
SECLA/NUOU-DF FI. 53
referência do transporte de gás natural no
gasoduto Urucu-Coari-Manaus; e
combustível das Fases A e B da
Médici; e
(ii.l.d) ao
UTE Presidente
(ii. 2) após, o rateio dos valores remanescentes com base
no uso da rede de transmissão ou distribuição, em
consonância com a metodologia de cálculo da Tarifa
de Uso do Sistema de Transmissão (TUST) e da
Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD) .
250. Após, requer a citação da ANEEL para, se assim desejar,
apresentar contestação, sob pena de revelia.
251. Ao final, no mérito, pede:
(i) a confirmação
declaração de
associadas da
da tutela antecipada, bem como a
inexigibilidade, em relação às
autora, da quota CDE/2015, com a
condenação da ANEEL em obrigação de fazer consistente
no recálculo do encargo (CDE), nos mesmos termos do
pedido liminar;
(ii) a condenação da ANEEL na obrigação de promover
compensação, com descontos futuros, do encargo pago no
mês de abril de 2015;
(iii) a condenação da ANEEL na obrigação de promover
compensação, com descontos futuros, de eventuais
outros pagamentos mensais da quota CDE/2015 no curso
da ação, na remota hipótese de não ter sido deferida a
suspensão do pagamento durante todo o processo; e
(iv) a condenação da ANEEL ao pagamento dos ônus de
sucumbência.
52
SECLA/NUCJU-DF FI. 54
252. Protesta-se pela juntada posterior de dos instrumentos de
mandato faltantes, nos termos do artigo 37 do CPC, bem como na
produção de todos os meios de prova em direito admitidos.
253. A autora informa, finalmente, que os seus advogados recebem
intimações, nesta cidade, no endereço constante do timbre desta
petição e dá à causa o valor de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais),
para meros efeitos fiscais.
Flávio Jardim OAB/DF 17.199
abril de 2015
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SECLA/NUCIU·DF FI. 55
RELAÇÃO DE DOCUMENTOS
Doe. 1 - Atos constitutivos;
Doe. 2 - Ata da 289ª Reunião do Conselho Diretor da ABRACE (eleição do presidente);
Doe. 3 -
Doe. 4 -
Doe. 5 -
Doe. 6 -
Doe. 7 -
Doe. 8 -
Doe. 9 -
Relação dos associados;
Ata da Assembleia Geral Extraordinária, de 31 de março de 2015, da ABRACE (deliberou-se a judicialização);
Discurso da Presidenta da República, Dilma durante a cerimônia de anúncio de redução do energia;
Rousseff, custo de
Voto no Processo Administrativo (abertura da Audiência Pública subsídios para a definição da CDE);
48500.005122/2014-91 003/2015 para colher
Contribuição da ABRACE no âmbito da Audiência Pública 003/2015;
Nota Técnica 33/2015-SGT-SRG/ANEEL;
Relatório de análise das contribuições recebidas na AP 003/2015;
Doe. 10 - Resolução Homologatória n. 1857, de 27 de fevereiro de 2015;
Doe. 11 - Despacho nº 504, de 27 de fevereiro de 2015;
Doe. 12 - Resolução Normativa nº 650, de 27 de fevereiro de 2015;
Doe. 13 - Relatório e voto no Processo nº 48500.005122/2014-81;
Doe. 14 - Nota Técnica 103/2014-SRE/ANEEL.
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