Laudo Técnico Vicuña

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MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS – IBAMA SECRETARIA DE MEIO AMBIENTE DO ESTADO DO PARANÁ INSTITUTO AMBIENTAL DO PARANÁ – IAP LAUDO TÉCNICO DO ACIDENTE DO NAVIO VICUÑA, OCORRIDO EM PARANAGUÁ NO DIA DE NOVEMBRO DE 2004 PARANAGUÁ MAIO-2005

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MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSO S NATURAIS RENOVÁVEIS

– IBAMA SECRETARIA DE MEIO AMBIENTE DO ESTADO DO PARANÁ

INSTITUTO AMBIENTAL DO PARANÁ – IAP

LAUDO TÉCNICO DO ACIDENTE DO NAVIO VICUÑA, OCORRIDO EM PARANAGUÁ NO DIA 15 DE NOVEMBRO DE 2004

PARANAGUÁ MAIO-2005

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MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSO S NATURAIS RENOVÁVEIS – IBAMA

SECRETARIA DE MEIO AMBIENTE DO ESTADO DO PARANÁ INSTITUTO AMBIENTAL DO PARANÁ – IAP LAUDO TÉCNICO DO ACIDENTE DO NAVIO VICUÑA, OCORRIDO EM PARANAGUÁ NO DIA 15 DE NOVEMBRO DE 2004

PARANAGUÁ MAIO-2005

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SUPERINTENDENTE DO IBAMA NO ESTADO DO PARANÁ

MARINO ELÍGIO GONÇALVES

SECRETÁRIO DO MEIO AMBIENTE NO ESTADO DO PARANÁ LUIZ EDUARDO CHEIDA

PRESIDENTE DO INSTITUTO AMBIENTAL DO PARANÁ

LINDESLEY DA SILVA RASCA RODRIGUES

Elaboradores do Laudo Técnico: Guadalupe Vivekananda - IBAMA João Antonio de Oliveira - IBAMA Luiz Francisco Ditzel Faraco - IBAMA Cláudio D’Oliveira - IAP Maria Lúcia Maranhão Biscaia de Medeiros – IAP Rosângela Maria Costa Frega - IAP Sandro Gomes Benkendorf - IAP - Estagiário Agradecimentos: Aos técnicos do IBAMA e IAP, que trabalharam em campo, e às demais entidades que contribuíram direta ou indiretamente no desenvolvimento das atividades durante essa emergência ambiental, citadas neste Laudo Técnico.

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1. ACIDENTE 1 1.1 OCORRÊNCIA 1 1.2 CARACTERÍSTICAS DO NAVIO 1 1.3 SUBSTÂNCIAS ENVOLVIDAS 1 1.3.1 METANOL 2 1.3.2 ÓLEO 3 Óleo combustível (MF-180) 3 Diesel marítimo (MDO) 4 Óleos lubrificantes 4 Shell Melina S-30 5 Shell Argina T-30 5 Shell Alexia 50 5 Shell Tellus 68 5 1.3.3 QUANTIDADES ENVOLVIDAS 6 Metanol 6 Óleo (combustíveis e lubrificantes) 6 1.4 EMPRESAS ENVOLVIDAS 7 1.5 PRINCIPAIS VAZAMENTOS OCORRIDOS 9 25/11/04 9 15/01/05 10 21/02/05 10 2. MEDIDAS DE GERENCIAMENTO DO ACIDENTE 11 2.1 MEDIDAS EMERGENCIAIS 11 2.1.1 COMBATE AO INCÊNDIO 11 2.1.2 PRIMEIROS DIAS DE COMBATE AO ACIDENTE 11 2.2 DESENVOLVIMENTO DAS ATIVIDADES 16 2.2.1 ATIVIDADES DE LIMPEZA DAS ÁREAS ATINGIDAS 17 Resíduos Sólidos Gerados pelo Acidente 18 2.3 SALVATAGEM 19 2.3.1 RECUPERAÇÃO E DESTINO DOS ÓLEOS 19 2.3.2 RETIRADA E DESTINO DOS DESTROÇOS DO NAVIO 19 Resíduos gerados pelo desmonte do navio 20 2.4 MEDIDAS ADMINISTRATIVAS E LEGAIS 20 Notificações 20 Autos de Infração do IBAMA 21 Termos de Embargo 23 Auto de Infração da Marinha do Brasil 23 Expedição de Portarias 23 Expedição de Instruções Normativas 24 Licenciamento do Terminal da Cattalini 25 Ações Ajuizadas 25 Outras Medidas 25 3. IMPACTOS CAUSADOS 26 3.1 CARACTERIZAÇÃO DAS ÁREAS ATINGIDAS 26 3.1.1 LOCALIZAÇÃO 26 3.1.2 MEIO FÍSICO 26 3.1.3 MEIO BIOLÓGICO 29 Flora 29 Manguezais e Marismas 29 Fitoplâncton 29 Fauna 30

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Ameaçada de Extinção 31 Zooplâncton 31

Fauna Bentônica 31 Ictiofauna 32 Avifauna 33

Interações Ambientais no Complexo-Estuarino-Lagunar-de-Iguape- Cananéia e Paranaguá 34 3.1.4 UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 35 ESTAÇÃO ECOLÓGICA DA ILHA DO MEL 36 PARQUE ESTADUAL DA ILHA DO MEL 36 ESTAÇÃO ECOLÓGICA DE GUARAQUEÇABA 37 PARQUE NACIONAL DO SUPERAGÜI 37 ÁREAS DE PROTEÇÃO AMBIENTAL DE GUARAQUEÇABA 37 3.1.5 ÁREA INDÍGENA DA ILHA DA COTINGA 37 3.1.6 MEIO SÓCIO-ECONÔMICO 39 A pré-história 39 A história 40 Aspectos sócio-econômicos e culturais das comunidades atuais 42 Atividades realizadas na Área Indígena da Ilha da Cotinga 43 Aspectos culturais da região 44 Organização social e política 44 Saúde Pública 45 Bens e serviços 45 3.2 DIMENSIONAMENTO DOS IMPACTOS 46 3.2.1 ÁREA ATINGIDA 47 3.2.2 IMPACTOS SOBRE A FAUNA 47 Resgate de fauna 48 Avaliação dos impactos 49 3.2.3 IMPACTOS SOBRE A FLORA 50 3.2.4 IMPACTOS SOBRE OS ORGANISMOS AQUÁTICOS DE INTERESSE

COMERCIAL 51 3.2.5 IMPACTOS SOBRE A QUALIDADE DAS ÁGUAS SUPERFICIAIS 53 3.2.6 IMPACTO SOBRE O MEIO SÓCIO-ECONÔMICO 54 Comunidades afetadas 54 Saúde humana 54 Efeitos na pesca e conflitos sociais 54 Efeitos nas atividades turísticas 56 Efeitos nos patrimônios públicos e privados 56

3.2.7 EXTENSÃO E GRAU DE CONTAMINAÇÃO NAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 56 3.2.7.1 IMPACTOS SOBRE AS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO FEDERAIS 57 APA de Guaraqueçaba 57 ESEC de Guaraqueçaba 59 PARNA do Superagüi 59 3.2.7.2 IMPACTOS SOBRE AS UNIDADES DECONSERVAÇÃO ESTADUAIS 60 Estação Ecológica e Parque Estadual da Ilha do Mel 60 Manguezais e marismas 61 Praias e costões 61 3.2.8 IMPACTOS SOBRE A ÁREA INDÍGENA DA ILHA DA COT INGA 62 4. CONCLUSÕES 64 5. RECOMENDAÇÕES 66 REFERÊNCIAS 67 APÊNDICES 69

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APÊNDICE 1 - Resultado das análises de contaminação das águas superficiais 69 APÊNDICE 2 - Mapa das áreas afetadas pelo acidente do Navio Vicuña 70 APÊNDICE 3 – Fotos sobre o acidente do Navio Vicuña 71 APÊNDICE 4 – Glossário 110 APÊNDICE 5 – Lista de Anexos 111

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SIGLAS APA Área de Proteção Ambiental APPA Administração dos Portos de Paranaguá e Antonina CAGEPAR Companhia de Águas e Esgoto de Paranaguá CDA - SUL Centro de Defesa Ambiental da Petrobras em Itajaí-SC CEI Comissão Especial de Investigação da Assembléia Legislativa CEM Centro de Estudos do Mar CENACID Centro de Apoio Científico em Desastres CEP Complexo Estuarino de Paranaguá CETESB Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental

CITES Convention on International Trade in Endangered Species of Wild Flora and Fauna COPEL Companhia Paranaense de Energia CPPR Capitania dos Portos do Paraná DPC Diretoria de Portos e Costas EMATER Empresa Paranaense de Extensão Rural EPI Equipamento de Proteção Individual ESEC Estação Ecológica FBCN Fundação Brasileira para Conservação da Natureza FUNAI Fundação Nacional do Índio FUNASA Fundação Nacional de Saúde GAT Grupo de Apoio Técnico da Marinha HPA Hidrocarbonetos Policíclicos Aromáticos HTP Hidrocarbonetos totais de petróleo IAP Instituto Ambiental do Paraná IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis ITOPF International Tanker Owners Pollution Federation NOAA National Oceanic and Atmospheric Administration O.N.G. Organização Não Governamental P&I CLUB Protection and Insurance Club PARNA Parque Nacional SANEPAR Companhia de Saneamento do Paraná SEMA Secretaria de Estado do Meio Ambiente SEMAE Serviço Municipal de Água e Esgoto do Município de Antonina SPVS Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental TCP Terminal de Contêineres de Paranaguá UFPR Universidade Federal do Paraná UNESCO Organização das Nações Unidas para a Ciência e Cultura

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LAUDO TÉCNICO DO ACIDENTE DO NAVIO VICUÑA 1. ACIDENTE 1.1 OCORRÊNCIA

O acidente ocorreu às 19:45 h do dia 15 de novembro de 2004, decorrente de duas explosões a bordo do Navio Vicuña, atracado no píer da empresa Cattalini Terminais Marítimos, na cidade de Paranaguá/PR, em operação de descarga de metanol. Momentos após a explosão, foram avistados fogo sobre o navio e no mar, além de grande quantidade de óleo. O metanol, espalhado num raio aproximado de 300 metros a partir do navio, na superfície das águas da Baía de Paranaguá, em direção oposta ao píer, incendiou-se e permaneceu queimando por diversas horas.

O Corpo de Bombeiros tentou resfriar o navio com jatos de água, bombeados a partir de dois rebocadores, pois havia riscos de novas explosões, em virtude das chamas e do estoque de óleo nos tanques do navio. Barreiras de contenção e absorção foram lançadas em torno do navio, na tentativa de conter o óleo. Porém, essa medida mostrou-se ineficiente por ser a quantidade de barreiras insuficiente em relação à quantidade de óleo existente na água. Devido a esse vazamento, que se prolongou por alguns meses, ocorreu a contaminação de diversas áreas do Complexo Estuarino de Paranaguá, um ambiente extremamente frágil e de elevada importância ecológica, evidenciada pelas unidades de conservação existentes nessa área.

Quatro tripulantes do navio vieram a óbito em decorrência do acidente, e milhares de pessoas foram evacuadas da área, pois justamente nesse local e data ocorria uma festa religiosa, dedicada à padroeira do Estado do Paraná, Nossa Senhora do Rocio. 1.2 CARACTERÍSTICAS DO NAVIO

Nome: N.T. Vicuña. Bandeira: Chilena Ano de fabricação: 1983 Estaleiro: Nakskov Skibsvaerft – Noruega. No IMO: 81000076 Comprimento total: 149,43 metros Comprimento proa a popa: 145,50 metros Capacidade máxima dos tanques de carga (100%): 21.192,00 m3 Capacidade operacional dos tanques de carga (98%): 20.762,00 m3 Largura: 22,44 metros Calado: 9,02 metros Bombas no convés: 32 para descarga Óleo combustível: 08 tanques, com capacidade total de 1.569,00 m3 Óleo diesel: 07 tanques, com capacidade total de 324,00 m3 Óleo lubrificante: 12 tanques, com capacidade total de 82,00 m3 Óleo residual: 05 tanques, com capacidade de 14,40 m3 Óleo descartado: 03 tanques, com capacidade total 9,40 m3 Água: 06 tanques, com capacidade total 317,37 m3 Tripulação: O navio tinha 28 tripulantes, sob o comando do Capitão Jaime Lopez Vasquez. Planta do navio: Anexo 001

1.3 SUBSTÂNCIAS ENVOLVIDAS Há necessidade de se fazer distinção entre os diversos produtos que o navio carregava, e que

vazaram após o acidente, entre a carga propriamente dita, que é o metanol, e os óleos combustíveis e lubrificantes, usados no próprio funcionamento do navio. Apesar do metanol ser o produto existente em maior quantidade no navio, no momento do acidente, foram os óleos combustíveis e

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lubrificantes os principais causadores dos impactos ambientais diagnosticados e descritos nesse documento. Desta forma, descreve-se a seguir cada um dos produtos separadamente.

1.3.1 METANOL

As informações detalhadas sobre as características do produto e sobre as quantidades

envolvidas constam dos documentos fornecidos pela empresa Cattalini Terminais Marítimos Ltda. (Anexo 002).

O metanol (Número da ONU: 1230), ou álcool metílico, é um líquido incolor, solúvel em água, inflamável (na presença de fonte de ignição) e tóxico (sua combustão gera produtos perigosos, tais como: formaldeído e monóxido de carbono).

Propriedades físico-químicas:

• Fórmula química: CH3OH • Densidade relativa: 0,792 • Ponto de ebulição: 64,5 ºC a 760 mmHg • Ponto de fusão: - 97,8 ºC • Ponto de fulgor: 11 ºC • Temperatura de auto-ignição: 385 ºC • Produto incompatível com oxidantes, ácidos e bases fortes.

Efeitos sobre a saúde humana: Se ingerido, mesmo que em pequenas quantidades, pode causar cegueira e morte, além de náuseas, dor de cabeça, dor de estômago, vômito e distúrbios visuais. Se inalado em altas concentrações pode causar irritação na mucosa, dor de cabeça, náusea, perda de consciência, distúrbios visuais e morte. Uma exposição contínua e prolongada ao produto, por inalação e/ou absorção, pode causar perda de compreensão, distúrbios visuais e cegueira. Pode também piorar problemas como enfisema e bronquite. Em contato com a pele pode causar irritação e ressecamento. Não é classificado como produto cancerígeno. Todavia, testes com ratos demonstraram um efeito teratogênico da exposição a elevadas concentrações.

Informações toxicológicas: Toxicidade aguda: DL50: 5,6 – 13,0 g/kg (pele para ratos); DL50: 20ml/kg (pele para coelhos).

Informações ecológicas: O metanol é facilmente biodegradado na água, decompondo-se em formaldeído e ácido fórmico, e pode causar sérios efeitos na vida aquática. Sua combustão libera gases tóxicos, principalmente formaldeído e monóxido de carbono.

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1.3.2 ÓLEO De acordo com o Artigo 2º, Inciso VIII, da Lei Federal no 9.966, de 28/04/2000, define-se

como óleo: “qualquer forma de hidrocarboneto (petróleo e seus derivados), incluindo óleo cru, óleo combustível, borra, resíduos de petróleo e produtos refinados”. Sendo assim, podemos dividir o óleo contido nos tanques do navio em três tipos principais: óleo combustível pesado (bunker), óleo diesel marítimo e óleos lubrificantes. As propriedades químicas e demais informações pertinentes a respeito de cada um desses produtos encontram-se descritas a seguir:

Óleo combustível (MF - 180)

Trata-se do combustível (bunker) do motor principal que propulsiona o navio. É uma mistura de óleos pesados destilados e residuais (entre 77,0 – 88,5% de óleo combustível 1A e 11,5 – 23,0% de óleo diesel marítimo), denominado comercialmente de MF 180, número que se refere à viscosidade do óleo. De acordo com as informações contidas na “Ficha de Informação de Segurança de Produto Químico – FISPQ”, fornecida pela Transpetro/Petrobras (Anexo 003), as principais características do produto são as seguintes:

Número FISPQ: Pb0064_P Número da ONU: 3082 Características físico-químicas:

- Ponto de fulgor: 61,0 ºC - Ponto de fluidez: 30,0 ºC - Densidade a 20 ºC: 0,9878 - Viscosidade: 180 cSt (mm2/s) a 50 ºC - Teor de enxofre (máximo): 4,5% - Teor de vanádio (máximo): 200 mg/kg

Características gerais: Líquido viscoso, escuro, pouco solúvel em água, de evaporação muito lenta, combustível, estável sob condições normais de uso. É incompatível com oxidantes fortes (cloratos, nitratos, peróxidos, entre outros). O aquecimento ou queima do produto pode liberar hidrocarbonetos poliaromáticos, na forma de particulados ou vapores.

Efeitos sobre a saúde humana: Por inalação pode provocar irritação das vias aéreas superiores, dor de cabeça, náuseas e tonturas, podendo em altas concentrações chegar a confusão mental e depressão até perda de consciência. Em contato com a pele pode causar irritação leve a moderada, podendo ser perigoso em caso de contato prolongado. Por ingestão, pode ser aspirado para os pulmões e provocar pneumonia química. Existe evidência suficiente, a partir de experiências com animais de laboratório, de que o produto é carcinogênico. No entanto, há poucas evidências de que o seja também para humanos. Os gases provenientes da queima do produto possivelmente são carcinogênicos para o homem. Pode liberar gás sulfídrico, um gás extremamente tóxico e inflamável.

Informações toxicológicas: Toxicidade aguda: DL50 > 3,0 g/kg (pele para coelhos); DL50 > 5,0 g/kg (dose oral para ratos).

Informações ecológicas: É um produto que sofre poucas perdas por evaporação (apenas 5 a 10% do total após uma semana), tem poucas frações solúveis em água, apresenta potencial elevado de bioacumulação e maior potencial para toxicidade crônica, embora alguns de seus componentes não sejam biodisponíveis. Da mesma forma, tende a persistir por mais tempo nos sedimentos ou substratos biológicos. Suas taxas de degradação são muito lentas, podendo causar impactos severos a aves e mamíferos, por ingestão ou revestimento. A dispersão química desse tipo de óleo é pouco

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eficaz e os processos de remoção dificultados sob quaisquer condições (NOAA, 2003 apud CEM/UFPR, 2005). Pode formar películas superficiais sobre a água. É considerado poluente. Vazamentos e derramamentos podem causar mortalidade dos organismos aquáticos e prejudicar a vida selvagem, particularmente as aves. Pode afetar a utilização de praias e costões rochosos com formação de películas de difícil remoção. Pode transmitir qualidades indesejáveis à água, afetando seu uso. Pode afetar o solo e, por percolação, degradar a qualidade das águas do lençol freático.

Diesel marítimo (MDO)

Trata-se de óleo diesel marítimo, com diferentes graus de pureza, geralmente misturado a

porcentagens variáveis de óleos mais pesados; serve como combustível de motores auxiliares e geradores. De acordo com o relatório de abastecimento da Transpetro/Petrobras (Anexos 004 a 007), o navio foi abastecido em 14/11/2004 com o chamado MGO (“Marine Gas Oil”), denominação que geralmente indica um óleo mais puro. As características desse produto, fornecidas pelo fabricante, estão descritas resumidamente a seguir. As informações completas constam da ficha de dados de segurança do produto – MSDS (Anexo 003).

Número MSDS: Pb 0147_E Número da ONU: 3082 Características físico-químicas:

- Ponto de fulgor: 60,0 ºC - Ponto de fluidez: não consta. - Densidade: 0,82 – 0,88 a 20 ºC/4 ºC - Viscosidade: 1,6 – 6,0 cSt a 40 ºC - Temperatura de decomposição: 400 ºC - Teor de enxofre (máximo): 1,0%

Características gerais: Produto formulado através da mistura de diversas correntes como: gasóleo, nafta pesada, diesel leve e diesel pesado, provenientes das diversas etapas de processamento do petróleo bruto. Líquido claro, inflamável, com odor característico, insolúvel em água, mas solúvel em solventes orgânicos. Estável em condições normais de utilização. Incompatível com agentes oxidantes.

Efeitos sobre a saúde humana: Pode causar dor de cabeça, náusea e tonturas. Irritante para o sistema respiratório, para a pele e para os olhos. Pode causar pneumonia química se aspirado para os pulmões. O contato prolongado com a pele pode causar dermatite.

Informações toxicológicas: Toxicidade aguda: DL50 > 5,0 g/kg (pele para coelhos); DL50 > 5,0 g/kg (dose oral para ratos).

Informações ecológicas: É um produto moderadamente volátil, deixando até um terço de seu volume sob a forma de resíduos após uma semana e apresentando potencial para impactos sublitorais (por dissolução, mistura e adesão a sedimentos). Pode formar um filme sobre a superfície da água, sendo moderadamente tóxico para os organismos aquáticos. Vazamentos e derramamentos podem causar mortalidade dos organismos aquáticos e prejudicar a vida selvagem, particularmente as aves. Pode transmitir qualidades indesejáveis à água, afetando seu uso. Pode afetar o solo e, por percolação, degradar a qualidade das águas do lençol freático.

Óleos lubrificantes

Segundo informações fornecidas pelo Armador (Anexo 008), a embarcação carregava, no dia

15/11/2004, quatro diferentes tipos de óleos lubrificantes, com as seguintes denominações

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comerciais: Shell Alexia – 50 (lubrificante dos cilindros), Shell Melina – S 30 (lubrificante do motor principal), Shell Argina T-30 (lubrificante do motor auxiliar) e Shell Tellus 68 (“Reserva Servo Motor”). Todos esses lubrificantes são compostos de uma mistura de óleos minerais altamente refinados derivados de petróleo, contendo ainda aditivos químicos específicos para as diferentes aplicações a que se destinam (esses aditivos correspondem a 5 - 9% do volume total).

As características desses óleos foram obtidas a partir das páginas do fabricante na internet (www.shell-lubricants.com e www.equivashellmsds.com), estando descritas a seguir de maneira resumida, sendo os detalhes encontrados no Anexo 009.

Shell Melina S-30

Número MSDS: 61181E - 3 Código do produto: 63665 Características físico-químicas:

- Ponto de fulgor: 204,44 ºC - Ponto de fluidez: -20,56 ºC - Densidade a 20 ºC: 0,8927 - Viscosidade: 90sSt – 100 cSt a 4,44 ºC - Material pouco inflamável, não ocorrendo combustão imediata (em geral só queima se pré-aquecido).

Shell Argina T-30

Número MSDS: 867159E - 8 Código do produto: 63474 Características físico-químicas:

- Ponto de fulgor: >176.67 ºC - Ponto de fluidez: > -20,56 ºC - Densidade a 20 ºC: não consta. - Viscosidade: > 150 cSt a 40 ºC - Material pouco inflamável, não ocorrendo combustão imediata (em geral só queima se pré-aquecido). - Além dos óleos minerais e dos aditivos, contém < 1,0% em volume de hidróxido de cálcio.

Shell Alexia 50 Número MSDS: 860910E - 1 Código do produto: 63649 Características físico-químicas:

- Ponto de fulgor: > 204,44 ºC - Ponto de fluidez: > -20,56 ºC - Densidade a 20 ºC: 0,88 – 0,89 - Viscosidade: > 150 cSt a 40 ºC - Material pouco inflamável, não ocorrendo combustão imediata (em geral só queima se pré-aquecido).

Shell Tellus 68 Número MSDS: 402288L - 0 Código do produto: 5061249, 5061250, 5061252, 5061287

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Características físico-químicas: - Ponto de fulgor: > 190,56 ºC - Ponto de fluidez: -28,89 ºC a -12,22 ºC - Densidade a 20 ºC: 0,87 – 0,88 - Viscosidade: > 22 cSt a 40 ºC - Material pouco inflamável, não ocorrendo combustão imediata (em geral só queima se pré-aquecido). Em relação aos efeitos sobre a saúde humana, informações toxicológicas e ecológicas, os

dados são os mesmos para os quatro tipos de óleos lubrificantes, conforme descrição abaixo:

Efeitos sobre a saúde humana: Pode causar irritação moderada das mucosas, se inalado, e dos olhos e da pele quando em contato direto. É moderadamente tóxico se ingerido. Existem indícios, provenientes de estudos com animais de laboratório, de que óleos lubrificantes, em geral, possuem efeitos carcinogênicos. Se aquecido acima de 82,22 ºC, pode liberar gás sulfídrico (H2S), que é um gás extremamente tóxico e inflamável. Informações toxicológicas: Toxicidade aguda: DL50 > 5,0 g/kg (pele para ratos); DL50 > 5,0 g/kg (dose oral para ratos).

Informações ecológicas: Não há dados ecológicos disponíveis sobre o produto. No entanto, por ser um óleo, é persistente e não imediatamente biodegradável. Todavia, é um produto que não tem potencial de bioacumulação.

1.3.3 QUANTIDADES ENVOLVIDAS

Metanol

O navio Vicuña chegou a águas brasileiras com 15.700,97 toneladas do produto, embarcadas

no Porto de Punta Arenas – Chile, em 06/11/2004, de acordo com documentos fornecidos pelos responsáveis pela embarcação e pela Cattalini (Anexo 002). Sua primeira parada foi no Porto de Rio Grande, no Estado do Rio Grande do Sul, onde foram descarregadas aproximadamente 4.470 toneladas desse produto. Sua segunda parada foi no Porto de Paranaguá, onde iria descarregar as 11.226,521 toneladas restantes. Essa carga era destinada a três empresas, a saber: 5.546,521 toneladas para a Borden Química Indústria e Comércio Ltda., de Curitiba/PR; 3.670,00 toneladas para a Dynea Brasil S/A, e 2.010,00 toneladas para a Synteko Produtos Químicos S.A., ambas de Araucária/PR. A Cattalini, empresa responsável pelo recebimento da carga, informa que foram descarregadas no total 7.147,288 toneladas, restando, desta forma, a bordo 4.079,233 toneladas no momento da explosão (Anexo 002). Por ser o metanol um composto inflamável, altamente volátil e explosivo, todo o produto existente no navio queimou-se, volatilizou-se ou ainda diluiu-se na água do mar nas primeiras horas, ou nos primeiros dias, após o acidente. Sendo assim, nenhuma quantidade desse material foi recuperada durante os trabalhos de salvatagem.

Óleo (combustíveis e lubrificantes)

O navio, ao atracar no píer da Cattalini, continha em seus tanques de combustível do motor

principal um total de 1.240,00 toneladas de óleo bunker (Anexo 008). Destas, 598 toneladas haviam sido bombeadas para o navio pela balsa a serviço da Transpetro/Petrobras no dia 14/11/2004, conforme documentação de registro do abastecimento fornecida pela empresa (Anexos 004 a 007). Ainda, segundo os responsáveis pelo navio, os tanques de diesel marítimo continham, no dia 15/11/2004, um total de 150,00 toneladas de óleo. Deste total, pouco mais de 120 toneladas correspondem ao MGO (“Marine Gas Oil”) bombeado para o navio pela balsa a serviço da

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Transpetro/Petrobras no dia 14/11/2004 (Anexos 004 a 007). A embarcação carregava ainda um total de 29.170,00 litros dos quatro tipos de óleos lubrificantes descritos acima, nas seguintes quantidades: Shell Alexia – 50 (lubrificante do cilindro; quantidade total: 6.070,00 litros), Shell Melina – S 30 (lubrificante do motor principal; quantidade total 18.850,00 litros), Shell Argina T-30 (lubrificante do motor auxiliar; quantidade total: 3.850,00 litros) e Shell Tellus 68 (“Reserva Servo Motor”; quantidade total: 400,00 litros).

Considerando os valores descritos e a densidade média de cada um dos óleos (bunker MF – 180: 0,98; diesel marítimo: 0,87 e lubrificantes: 0,89; todos os valores a 20 ºC), pode-se estimar que o navio carregava:

- óleo combustível (bunker): 1.240 toneladas, equivalentes a aproximadamente 1.265.000 litros;

- óleo diesel marítimo: 150 toneladas, equivalentes a aproximadamente 173.000 litros; - óleos lubrificantes: 26 toneladas, equivalentes a aproximadamente 29.000 litros. Portanto, no total, o navio carregava aproximadamente 1.416 toneladas de óleo, equivalentes

a 1.467.000 litros, sendo cerca de 87% desse total representado pelo óleo bunker. De acordo com o relatório da Transpetro/Petrobras, de 13/04/2005 (Anexo 003), foram recuperados 1.176.074 litros de óleo e 2.996.039 litros de água oleosa, depositados no tanque de separação do terminal da empresa em Paranaguá/PR. A partir dessa informação pode-se estimar que cerca de 291.000 litros de óleo não foram recuperados e, portanto, vazaram para o ambiente. Considerando a predominância de óleo combustível do tipo bunker (densidade = 0,98) pode-se estimar que esse volume seja equivalente a cerca de 285 toneladas. 1.4 EMPRESAS ENVOLVIDAS

Sociedad Naviera Ultragas Ltda. Endereço: El Bosque Norte 500 – 20th Floor – Zip Code 7550092 – Santiago/Chile, P.O. Box 131-34 EL GOLF. Fone 056 2 6301150 – Fax 056 2 2317948 – e-mail [email protected]. Proprietária e operadora do N.T Vicuña. Representada no Brasil pela Wilson Sons. Wilson Sons Agência Marítima Ltda. CNPJ: 00.423.733/0017-04 Endereço: Rua Rodrigues Alves, 753, CEP 83203-170, Paranaguá/Paraná. Agência marítima que representa a Ultragas no Brasil. Cattalini Terminais Marítimos Ltda. CNPJ: 75.633.569/0001-82 Endereço: Avenida Coronel Santa Rita, 2677, CEP 83221-340, Paranaguá/Paraná. Responsável pelo terminal privado onde aconteceu o acidente. Administração dos Portos de Paranaguá e Antonina (APPA) Endereço: Rua Antônio Pereira, 161, CEP 83221-030, Paranaguá/Paraná. Telefone: (41) 420-1102/420-1177, Fax: (41) 422-5324 Autarquia estadual vinculada à Secretaria de Estado dos Transportes. Autoridade portuária com jurisdição sobre a área, e gerenciadora das atividades e as operações do Porto Organizado de Paranaguá. Methanex Chile Limited Endereço: Avenida Apoquinondo, 3200, 5º, Santiago, Chile. Empresa que fabricou e vendeu o metanol. Borden Química Indústria e Comercio Ltda. CNPJ: 61.480.150/0015-78 Inscrição estadual: 101381692B

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Endereço: Rua Cyro Correia Pereira, 2525, CEP 81450-090, Cidade Industrial – Curitiba/PR Empresa compradora de parte do metanol. Synteko Produtos Químicos S/A CNPJ: 90.195.892/0019-45 Endereço: Rua Presidente Castello Branco, 800, CEP 83707-130, Araucária/PR Empresa compradora de parte do metanol. Dynea Brasil S/A CNPJ: 02.854.387-0002-50 Inscrição Estadual: 9.018.995.171. Endereço: Rua Roberto Hauer, 160 – Vila Hauer, CEP 81.610–180, Curitiba/PR Empresa compradora de parte do metanol. Petrobras Transporte S.A. - Transpetro Endereço: Avenida Coronel Santa Rita, s/n, Caixa Postal 611, CEP 83221-340, Paranaguá/PR Telefone: (41) 420-4100, fax: (41) 420-4212 Fornecedora do combustível e responsável pelo abastecimento do navio. Responsável pelo armazenamento e destino final dos resíduos oleosos retirados do navio. P&I Club (Clube de Proteção e Indenização) Cooperativa de armadores que auxilia seus associados sempre que estes têm algum problema cujo risco não é coberto pelo seu segurador. Que tem como correspondente em Paranaguá, a empresa Eduardo C. Kuhlmann Junior & Cia Ltda. Eduardo C. Kuhlmann Junior & Cia Ltda. (Kuhlmann Su rveyors e Consultants) CNPJ: 80.296.080/0001-03 Endereço: Rua Barão do Rio Branco, 942, CEP 83203-340, Paranaguá/PR Correspondente do P&I Club no Brasil. EMPRESAS CONTRATADAS PARA LIMPEZA DAS ÁREAS Ecosorb – Tecnologia de Proteção Ambiental Endereço: Av. Brigadeiro Luís Antonio, 1343, 4º andar, CEP 01317-910, São Paulo/SP Telefone: (11) 3177-6853; Atendimento Emergencial 24 h: 0800 70 70 326 Alpina-Briggs Defesa Ambiental S.A. CNPJ: 04.050.400/0001-62 Endereço: Estrada Marco Polo, 940, Bairro Battistini, CEP 09844-150, São Bernardo do Campo/SP Hidroclean Proteção Ambiental Endereço: Rua Lauro Mueller, 116/2603, CEP 22290-160, Rio de Janeiro/RJ Telefone: 55 21 2542-1152; fax: 55 21 3209-2705; www.hidroclean.com.br KCL Serviços Industriais Ltda. (mão-de-obra) Endereço: Rua Conselheiro Correa, 1611, Bairro Bockmann, Paranaguá/PR. Prest Service (mão-de-obra) Endereço: Rua Maneco Viana, 383, Paranaguá/PR Ambiental (retirada e eliminação de resíduos) Endereço: Rodovia do Café, km 134, s/n, Campo Largo/PR Interprise (embarcações)

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Endereço: Rua Barão do Rio Branco, s/n, Paranaguá/PR EMPRESAS CONTRATADAS PARA SALVATAGEM Wijsmuller Salvage B.V. Endereço: Sluisplein 34 IJmuiden, the Netherlands, P.O. Box 510/1970 AM IJmuiden Telefone: + 31 25 55 62 666, e-mail: [email protected], www.svitzerwijsmuller.com. Smit Salvage B.V. Endereço: Waalhaven O.Z. Rotterdam, Holanda. Representada no Brasil, para todas as atividades relacionadas com essas operações, pelo Salvage Master Hendrik Doornhein, residente na Rua Nereus, 19 3225 TG, na cidade de Hellevoetsluis, Holanda, portador da Carteira de Identidade de Marítimo no A150212. 1.5 PRINCIPAIS VAZAMENTOS OCORRIDOS

Além do vazamento inicial, ocorrido enquanto ainda havia óleo nos tanques do navio, e que causou a maior parte dos impactos registrados, outros vazamentos menores foram observados nos meses seguintes ao acidente, cabendo ressaltar os mais importantes e os principais acontecimentos a eles relacionados. 25/11/04

Um dos vazamentos ocorridos no Navio Vicuña, após o acidente, aconteceu na madrugada do dia 25/11/04, quando dois navios atracaram no Píer do Terminal de Infláveis da Transpetro, movimentando as barreiras de contenção e provocando o lançamento do óleo contido em seu interior. A equipe da empresa Alpina-Briggs, responsável pelo Ponto Zero, desconhecia qualquer tipo de atividade extraordinária nas proximidades do acidente e não estava preparada para uma situação de emergência como a ocorrida, pois mantinha um efetivo mínimo de funcionários e barcos para situações normais de trabalho. O movimento dos rebocadores fez com que o óleo escapasse das barreiras de contenção, espalhando-se por uma grande área na baía de Paranaguá.

Os fatos que geraram tal situação são resultado da liberação, pela Portaria nº 50/CPPR da Capitania dos Portos do Paraná, de 24/11/04 (Anexo 010), do Terminal de Inflamáveis da Transpetro, que estava, desde 16/11/04, interditado para operação pela Portaria nº 41/CPPR (Anexo 010). No dia 24/11, a APPA encaminhou o Ofício nº 420/04 à Capitania dos Portos do Paraná (Anexo 011), no qual fazia uma série de questionamentos a respeito da liberação da atracação dos navios nesse píer. Esse ofício questionava, entre outros pontos, se a Capitania havia requisitado laudo da empresa de salvatagem Wijsmuller Salvage quanto à segurança dos mergulhadores da operação, do processo de retirada dos combustíveis e das movimentações das embarcações (Ponto Zero), face ao risco da liberação de óleo contido nos escombros. Outro questionamento feito foi em relação à informação de que a movimentação de águas pela navegação poderia prejudicar a performance das barreiras de absorção.

Mesmo tendo questionado a liberação do píer, a APPA, na mesma noite, autorizou a atracação dos navios, sem informar a Defesa Civil, os Órgãos Ambientais e as empresas que trabalhavam no local.

Em 26/11/04, através da Notificação nº 391219 (Anexo 012), o IBAMA solicitou informações à Alpina-Briggs sobre o efeito da atracação dos navios sobre os trabalhos de contenção do óleo no Ponto Zero. O representante da seguradora do navio, coordenador geral das atividades de limpeza, em resposta oficial à notificação (Anexo 013), declarou que a atracação, juntamente com as correntezas e a maré, comprometeu a eficiência das barreiras de contenção no local, o que pode ter resultado no aumento do vazamento de óleo.

Em razão desse episódio, o Ibama interditou o píer através de três Termos de Embargo/Interdição nos 364629 (Anexo 014), 364630 (Anexo 015) e 364631 (Anexo 016), destinados às empresas Petrobras, União Vopak e APPA, respectivamente.

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As operações no píer foram posteriormente liberadas, em 27/11/2004, através da assinatura de Termo Compromisso de Ajustamento de Conduta - TAC entre IBAMA, União Vopak, Alpina Briggs, Cattalini, Paranaguá Pilots, APPA e Petrobras (Anexo 017). Em 31 de janeiro de 2005 esse TAC foi aditivado (Anexo 018), liberando as atividades no píer durante as 24 horas do dia, após autorização dada pela CPPR para tal (Anexo 019).

15/01/05

Os trabalhos de içamento da proa do navio tiveram início no dia 13/01/05 e foram paralisados

às 09:30 h deste mesmo dia, devido ao excesso de peso da peça. Os trabalhos continuaram no dia 14/01/05, com a remoção das ferragens contidas sobre a peça e a retirada de água dos tanques, com a finalidade de diminuir o peso. Nestes dois dias, estiveram trabalhando na prevenção e contenção do óleo, as empresas Alpina-Briggs e Hidroclean. Na manhã do dia 15/01/05, devido à paralisação do içamento, o contingente foi diminuído, ficando como responsável pelos trabalhos somente a empresa Alpina-Briggs. Quando os trabalhos de içamento da proa foram retomados, ocorreu um vazamento, o qual não pode ser controlado apenas pelo contingente disponível. Esse vazamento poderia ter sido menor se a empresa SMIT Salvage, responsável pelo içamento, tivesse adotado as medidas de contenção anteriormente previstas no Plano de Controle Ambiental (Anexo 020).

Nesta mesma data o IBAMA lavrou a Notificação nº 218284 (Anexo 021), com as seguintes exigências: duplicação do número de embarcações de apoio; relocação das barreiras de contenção; retorno dos barcos e equipes de trabalho; disponibilização de helicóptero; informação, por escrito, do motivo da diminuição dos efetivos e barcos.

Foi lavrado o Auto de Infração do IBAMA nº 307627 (Anexo 022) para a empresa SMIT International do Brasil Ltda, por deixar de adotar medidas de precaução para conter possível vazamento de óleo combustível, durante os trabalhos de içamento da proa.

21/02/05

Os trabalhos de içamento da popa do navio iniciaram no dia 20/02/05 e foram paralisados em

devido ao excesso de peso da peça. Em virtude dessa paralisação, todo o aparato previsto no Plano de Remoção da Popa (Anexo 023), apresentado em 14/02/05, e que passou inclusive por um simulado, foi dispensado pela SMIT no dia 21/02/05. Ao executar furos no casco com a finalidade de retirar a água e diminuir o peso da peça, uma grande quantidade de óleo também vazou e não pode ser contida pelo pouco efetivo de técnicos que estavam no local naquele instante. Os Órgãos Ambientais já haviam questionado a pouca quantidade de embarcações apresentadas no Plano, conforme consta no relato da Ata 053 de 14/02/05 (Anexo 024) e obtiveram como resposta da SMIT que as embarcações eram suficientes e preparadas para a prevenção e contenção do óleo, assim, o plano foi aprovado conforme Ofício no 003/05 (Anexo 025).

A mancha de óleo atingiu uma área de 2,3 ha em um percurso de aproximadamente 6 km dentro das baías de Paranaguá e Laranjeiras, atingindo o Cais do Porto, o Terminal da Fospar e áreas de marisma da Ilha da Cotinga, que não foram atingidas pelos derramamentos anteriores. A empresa Spectrum estimou que vazaram 750 litros de óleo, destes, 500 foram contidos nas barreiras e 250 escaparam para o ambiente.

Em decorrência disso, o IBAMA lavrou o Auto de Infração nº 307631 (Anexo 026), em 02/03/05, para a empresa SMIT International do Brasil Ltda (SMIT Salvage B.V.).

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2. MEDIDAS DE GERENCIAMENTO DO ACIDENTE

2.1 MEDIDAS EMERGENCIAIS 2.1.1 COMBATE AO INCÊNDIO

Devido às características do produto transportado (metanol), imediatamente após a explosão o

navio foi tomado pelas chamas. As brigadas de incêndio da Petrobras, Cattalini e do Corpo de Bombeiros, iniciaram os trabalhos de combate, auxiliadas em um segundo momento pelas equipes da União Vopak e da Sadia, com o apoio de dois rebocadores. A coordenação dos trabalhos ficou ao encargo do Corpo de Bombeiros, até a extinção de todos os focos de incêndio existentes no navio. Conforme comunicado do comandante local do Corpo de Bombeiros, registrado na Ata no 001, do dia 17/11/04 (Anexo 024), o último foco de incêndio foi extinto no dia 16/11 por volta das 18:45 h, e o rescaldo terminou às 15:00 h do dia 17/11/2004. Nessa mesma ata, o Comandante comunicou que estava passando a responsabilidade sobre o navio para o correspondente do P&I Club, o qual comunicou que às 08:00 h do dia seguinte estaria assumindo a guarda do navio.

2.1.2 PRIMEIROS DIAS DE COMBATE AO ACIDENTE

Considerando a situação emergencial e o grande número de acontecimentos dos cinco

primeiros dias após o acidente, descreve-se a seguir, em maiores detalhes, a cronologia do ocorrido no período de 15 a 19/11/2004. Embora alguns assuntos já tenham sido tratados em outros itens, julgou-se importante ressaltá-los, mesmo com eventuais repetições. Poderá ser observado que nesses primeiros dias algumas informações apresentadas não eram precisas, tais como as quantidades de óleo e metanol existentes no navio. Posteriormente, os valores exatos foram levantados e encontram-se registrados em outros itens. De maneira geral, os relatos abaixo são baseados no conteúdo das Atas das Reuniões (Anexo 024) e demais documentos citados.

15/11/04 Ações: logo após ter tomado conhecimento do acidente, equipes do IBAMA e do IAP de Paranaguá deslocaram-se para a área, a fim de efetuar um levantamento dos fatos; foi solicitado o Plano de Arranjo Geral do navio.

Reuniões realizadas: às 23:34 h iniciou-se uma Reunião da Capitania dos Portos do Paraná, em Paranaguá, com representantes de diversos órgãos públicos e empresas (Anexo 027). Decisões tomadas: a Capitania comunicou que estava assumindo a coordenação das operações; três homens deveriam acompanhar as buscas no interior do navio para tentar localizar as vítimas; o IAP iria fazer uma inspeção quanto à parte ambiental atingida; deveriam ser aumentadas as atividades para contenção do óleo e providenciado o transbordo para uma chata; os rebocadores deveriam permanecer na área para efetuar rodízio no resfriamento do navio; o controle do acesso ao píer seria de responsabilidade da Cattalini. Informações importantes: o navio havia atracado às 20:06 h do dia 14/11/04, tinha 14.000 m3 de metanol e já havia descarregado 9.000 m3, restando, portanto, 5.000 m3 no momento da explosão; o navio encontrava-se abastecido com 1150 toneladas de óleo bunker e 150 toneladas de óleo diesel; a segunda explosão havia ocorrido às 19:46 h; havia preocupação quanto à segurança do píer e das pessoas, devido ao risco de ocorrerem novas explosões; o incêndio continuava e precisavam ser desenvolvidas ações no interior do navio, pois havia fogo na casa de máquinas; a Transpetro/Petrobras estava instalando barreiras de contenção no local e acionando o CDA - Centro de Defesa Ambiental de Itajaí/SC; dos 28 tripulantes, quatro estavam desaparecidos;

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16/11/04

Ações: equipes do IAP e IBAMA deslocaram-se para as diversas localidades das baías de Paranaguá, Antonina, Guaraqueçaba, Laranjeiras e Pinheiros, para registrar as áreas atingidas pelo óleo e a localização das manchas que ainda se encontravam nas águas; todas estas informações eram encaminhadas para a Coordenação do acidente, que as repassava à Defesa Civil, bem como a todas as pessoas e empresas que estavam envolvidas no acidente; foi iniciada a montagem de um banco de dados com as fotografias tiradas, por data e local, que serviu para o uso de todos até o final da operação de salvatagem; o IAP realizou coleta de amostras de água na Baía de Paranaguá; equipes da Defesa Civil Municipal efetuaram um levantamento dos danos causados nas propriedades próximas ao local da explosão (Anexo 028); barreiras de contenção foram colocadas próximas à área do vazamento, de forma tardia e em quantidade insuficiente para a formação de um anel completo de proteção ao redor da embarcação; somente dois lances de barreiras foram colocados, sendo um na proa e outro na popa do navio; foi dado início à retirada de óleo por barcaças; a APPA criou uma comissão para atuar no caso.

Reuniões realizadas: foi realizada reunião na Capitania dos Portos do Paraná (Anexo 029). Decisões tomadas: deveriam ser seguidos os procedimentos do Plano de Contingência do Porto; a Agência Nacional de Petróleo deveria ser informada do acidente; todos os tripulantes seriam ouvidos em Inquérito Administrativo; a busca aos desaparecidos continuaria; a avaliação de danos seria feita pela Defesa Civil do Município; deveria ser dada prioridade para: barreiras de contenção, combate ao incêndio, recolhimento do produto, busca dos desaparecidos, levantamento dos danos, atendimento à imprensa, sobrevôos de helicóptero; foi definido que o local de concentração seria na Cattalini; a Petrobras traçaria um plano para reflutuação e retirada do navio e o submeteria à aprovação da Autoridade Marítima; ficou proibida a atividade de mergulho na área do acidente; a Diretoria de Portos e Costas – DPC designou uma comissão de peritos para fazer o inquérito da Marinha, no prazo de 30 dias, e este seria encaminhado ao Tribunal Marítimo; a Secretaria de Saúde trataria das questões de contaminação de pescados. Documentos expedidos: a Capitania dos Portos do Paraná emitiu as Portarias nº 41/04/CPPR (Anexo 010), interditando provisoriamente para operações os Cais de Inflamáveis da Petrobras (berço externo e interno) e da Cattalini (externo e interno), e nº 42/CPPR (Anexo 010), proibindo as atividades de mergulho em qualquer ponto situado a menos de 2000 metros em toda a extensão do Terminal Marítimo de Inflamáveis da Cattalini. O IBAMA lavrou a Notificação nº 218283 (Anexo 030) para a empresa Cattalini Terminais Marítimos Ltda., solicitando fornecimento de informações quanto à quantidade de barreiras absorventes e localização destas, como também quantidade de barcos e pessoal envolvido na operação de contenção do vazamento de óleo. A empresa respondeu ao IBAMA, no mesmo dia, através da correspondência GO.157/04 (Anexo 031), a qual informava que foram fornecidos 200 m de barreiras de contenção, 100 m de barreiras de absorção, duas embarcações, brigada de emergência, composta por 40 funcionários, e acessórios para auxiliar na contenção. Informou ainda, que a empresa ECOSORB - Tecnologia de Proteção Ambiental estava enviado material e equipamentos de apoio suplementar. A APPA publicou a Portaria no 147/04 (Anexo 032), interditando para operação o Terminal de Inflamáveis da Petrobras, Cattalini e píer da Fospar, até ulterior deliberação pela sua Superintendência. Foi publicada a Instrução Normativa Conjunta IBAMA/IAP nº 025/04 (Anexo 033), proibindo qualquer atividade de pesca, coleta e consumo de organismos aquáticos, uso de água ou práticas desportivas que impliquem em banho ou contato com a água, nas baías de Paranaguá, Antonina e Guaraqueçaba, por um período de 60 (sessenta) dias, a contar do dia 16 de novembro. Informações importantes: não existiam barreiras de contenção e absorção suficientes sendo colocadas nas áreas sensíveis da baía, como manguezais, marismas, costões, que estavam sendo atingidas pelo óleo derramado; o combate a estas manchas estava sendo feito de maneira muito

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lenta; manchas de óleo apareceram na Ilha do Mel e Ilha da Cotinga; o IAP coletou amostras de água; a Defesa Civil comunicou que às 18:45 h as chamas no navio foram extintas, porém, continuavam os trabalhos de rescaldo, pois havia pontos de calor na praça de máquinas; um corpo foi achado e resgatado e outro localizado.

17/11/04

Ações: a partir desse dia foi criada uma Comissão de Meio Ambiente, ou Comitê Técnico, composto por representantes das seguintes instituições: IAP, IBAMA, Petrobrás, UFPR (CENACID e CEM), Defesa Civil e Armador (ITOPF), sob a coordenação da Defesa Civil, que passaram a discutir todos os assuntos relacionados ao gerenciamento do acidente, em especial aqueles relativos às questões ambientais. No período de 21 a 29 de novembro, esse comitê contou com o apoio de dois técnicos do Setor de Operações de Emergência da Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental – CETESB (vinculada à Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo). A área do acidente foi dividida em 08 pontos de monitoramento, denominados de Ponto Zero, 01, 03, 05, 07, 09, 11 e 13. Os órgãos ambientais iniciaram a identificação dos manguezais e costões atingidos pelo acidente. Foram colocadas barreiras de contenção ao redor do navio formando dois anéis de proteção. No entanto, devido à forte correnteza no local, o óleo não era contido totalmente dentro das barreiras. Caminhões-vácuo foram utilizados no píer para tentar recolher o óleo. Foram contratadas diversas empresas para fazer a contenção do óleo. O Armador iniciou a retirada da chapa que estava sobre o cais. A APPA colocou à disposição todas as bombas que o Porto possuía, porém, não dispunha de um caminhão para servir de depósito do material. Foi iniciado o trabalho de orientação às comunidades, através da Defesa Civil, IBAMA, Vigilância Sanitária, com apoio das O.N.G. SPVS e Instituto Ecoplan.

Reuniões realizadas: foi realizada reunião na Capitania dos Portos do Paraná (Anexo 034) e as duas reuniões ordinárias da Coordenação do Acidente (Reunião Técnica e Avaliação das Ações), as quais ocorriam na Cattalini. Documentos expedidos: a Capitania dos Portos do Paraná emitiu a Portaria nº 43/CPPR (Anexo 010), instaurando Inquérito Administrativo para apurar responsabilidades sobre o acidente. A empresa Cattalini comunicou oficialmente ao IBAMA a ocorrência do acidente (Anexo 035), informando que as operações transcorriam de maneira normal por parte da empresa e que todos os esforços estavam sendo feitos para minimizar os danos. Através do Ofício Circular no 010/04 (Anexo 036), a APPA comunicou que, na qualidade de Coordenadora do Plano de Contingência do Porto de Paranaguá e Antonina, estava disponibilizando as seguintes ferramentas de apoio: Grupo de Trabalho, designado pela Portaria nº 146/2004 – APPA, para prestar total apoio às demandas necessárias para restabelecimento da normalidade no Porto de Paranaguá; equipe de apoio para monitoramento ambiental de toda baía de Paranaguá e Antonina, com técnicos do Centro de Apoio Científico em Desastres - CENACID e Centro de Estudos do Mar – CEM, ambos da Universidade Federal do Paraná – UFPR; liberação do travessão do berço 201, e de áreas adjacentes, do cais público do Porto de Paranaguá, para apoio às operações de embarque de equipamentos e equipe técnica para a campanha de limpeza das áreas afetadas por ocasião do mencionado acidente; liberação do armazém 6 para apoio logístico às operações acima mencionadas; bombas de sucção de apoio para operações no píer público da APPA. O IBAMA lavrou o Auto de Infração nº 307028 para a Cattalini (Anexo 037), o Auto de Infração nº 307030 para a Wilson Sons – Agência Marítima Ltda (Anexo 038), o Auto de Infração nº 307031 para a Kuhlmann Surveyors e Consultants (P&I) (Anexo 039) e o Auto de Infração nº 307032 para a Sociedade Naviera Ultragas Ltda (Anexo 040), todos com multas diárias no valor de R$ 250.000,00, por inércia e lentidão nas ações de recuperação e contenção dos danos ambientais.

Decisões tomadas: com a criação do Comitê Técnico, estabeleceu-se que seriam realizadas duas reuniões diárias, uma denominada Reunião Técnica, da qual só participavam membros do Comitê, e

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outra denominada Avaliação das Ações, onde eram concentradas as informações sobre as atividades desenvolvidas em campo e transmitidas as deliberações do dia para as empresas envolvidas. No Ponto Zero foram solicitados a colocação de três anéis de contenção, recolhimento do material sobrenadante, tamponamento do vazamento e trabalho ininterrupto nas 24 horas. Nos pontos 01, 03, 05, 07, 09, 11 e 13 foram solicitados a instalação eficiente de contenção, absorção e recolhimento dos contaminantes e a não utilização de dispersantes. Foi definido que: a Cattalini providenciaria um vigia para o navio; os materiais dos tripulantes deveriam ser retirados do navio; a contenção do óleo seria atribuição da Petrobras e Alpina; a Cattalini e o Armador deveriam providenciar barreiras nos 360º ao redor do navio; o óleo retirado seria armazenado em barcaças; o Porto deveria formalizar tudo o que estava acontecendo na área.

Informações importantes: o Plano de Apoio Mútuo previa que a APPA deveria auxiliar com tudo o que fosse possível; a 1a Regional de Saúde registrou 16 casos de feridos atendidos em postos de saúde da cidade; a Petrobras informou que apesar dos recursos disponibilizados não foi possível conter o óleo, mas que seriam colocados três mil metros de barreiras de contenção em três anéis, e que foram recolhidos 320 m3 de óleo, com 20% de água; o Armador informou que o navio possuía uma carga de 1250 toneladas de óleo pesado, 150 toneladas de diesel e 50 toneladas de óleo lubrificante; as especialistas estrangeiras da ITOPF chegaram nesse dia; o Corpo de Bombeiros informou que o incêndio foi debelado e que o representante do navio poderia assumir a sua guarda.

18/11/04

Ações: a APPA disponibilizou à Alpina uma área do Porto para operacionalizar suas atividades, assim como um depósito para recolher os produtos da limpeza do óleo; a Alpina informou o recolhimento de 973 m3 de mistura óleo/água; no Ponto Zero foram colocados 800 m de barreiras e um cerco de barreiras absorventes entre os anéis, bem como ocorreu a utilização de mais um skimmer, totalizando sete; o vazamento de óleo continuava e foi colocada uma chata capaz de armazenar até 1200 toneladas de óleo; o Armador solicitou ao IAP área para armazenamento dos resíduos oriundos dos trabalhos de limpeza; os Órgãos Ambientais colocaram-se à disposição para esclarecimentos quanto aos locais de limpeza; foi solicitado novamente o Plano de Arranjo Geral do navio. Reuniões realizadas: Reunião Técnica e Reunião de Avaliação das Ações Documentos expedidos: foi emitida pela Capitania dos Portos do Paraná a Portaria nº 44/CPPR (Anexo 010), autorizando a empresa Wijsmuller Salvage BV a realizar operação de mergulho no Terminal Marítimo de Inflamáveis da Cattalini. O IBAMA emitiu a Notificação nº 301217 (Anexo 041) para a APPA, solicitando a apresentação de informações sobre quais foram as medidas tomadas pela instituição para minimizar os impactos ambientais causados pelo acidente, bem como a apresentação dos Planos de Emergência e Contingência. Decisões tomadas: foi determinado como prioridade no Ponto Zero: o bombeamento do óleo, colocação de skimmers na primeira sala, bombeamento dentro das barreiras e nos anéis de contenção; para os demais pontos deveria ser feita uma avaliação de diferentes alternativas de proteção e limpeza de praias, manguezais, marismas e baías; também foi aceita a sugestão para se fazer teste com aglutinante; foi solicitado mais agilidade da empresa Alpina, bem como um inventário do número e função dos equipamentos utilizados; a Capitania dos Portos pediu que todos os esforços fossem colocados no Ponto Zero. Informações importantes: as solicitações para os pontos 01, 09, 13 não foram atendidas; havia necessidade de aumentar a eficiência nos Pontos 05 e 07; o representante do Município de Pontal do Paraná alertou que o comércio de peixes estava sendo prejudicado assim como as atividades turísticas; o representante da Seguradora informou que cobriria todos os custos de limpeza dos

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locais atingidos; o Corpo de Bombeiros informou que dois corpos ainda não foram encontrados; o representante da Ecosorb solicitou avaliação da utilização de turfa, em teste a ser marcado; foi considerado que a Alpina não teve um desempenho satisfatório nos trabalhos de contenção e limpeza até este dia. 19/11/04 Ações: foi apresentado o Plano de Retirada e Remoção de Poluentes do N/T Vicuña (Anexo 042); na avaliação do Ponto Zero foi solicitada a correção do posicionamento e distanciamento das barreiras, além do uso de barreiras de absorção e barreiras oceânicas no terceiro anel, pois foi observada a ineficiência do sistema de contenção; foram solicitados: uma barcaça reserva ou sistema de caminhão para recolhimento de material, a apresentação de croqui dos locais de rompimento e vazamento do casco, as medidas de contenção do óleo, cronograma de execução, recolhimento e substituição das barreiras de absorção saturadas, bem como aumento do número de equipamentos de recolhimento; exigiu-se o controle da velocidade das embarcações da empresa Alpina nas proximidades das barreiras de contenção; a Defesa Civil solicitou a apresentação dos resultados das exigências feitas anteriormente e o Armador entregou um relatório, ainda que incompleto; a Seguradora solicitou que todas as falhas percebidas deveriam ser repassadas de imediato ao Armador; foram colocadas à disposição todas as fotos tiradas pelos Órgãos Ambientais; o Armador questionou o conteúdo das Atas dos dias anteriores; quatro especialistas do Rio Grande do Sul foram contratados para trabalhar na área de fauna junto ao IBAMA; quanto ao Ponto Zero, o Armador informou que a barreira oceânica é muito grande para a área e que foi sugerida a utilização de um carretel menor chamado HI-SPRINT, que funcionaria como um quarto anel; a empresa Wijsmuller iniciou o bombeamento de óleo do navio. Reuniões realizadas: foi realizada reunião na Capitania dos Portos do Paraná (Anexo 043) e as duas reuniões ordinárias da Coordenação do Acidente (Reunião Técnica e Avaliação das Ações), as quais ocorriam na Cattalini. Documentos expedidos: o IBAMA lavrou o Auto de Infração nº 307034 (Anexo 044), para a Alpina-Briggs, por deixar de executar ações de resgate/contenção de óleo vazado do navio Vicuña, nos pontos 01 e 03, no dia 18/11/04, medidas não cumpridas que colocaram em risco o meio ambiente de forma grave, bem como a saúde e o bem-estar da população. Decisões tomadas: foram solicitados: a manutenção de todas as exigências já formuladas e acordadas anteriormente, a apresentação de inventário sobre equipamentos utilizados (não entregue) e apresentação do relatório do material recolhido (documento não entregue). A Alpina assumiu o compromisso de melhorar a eficiência dos trabalhos até o dia 20. Ficou acertada a suspensão das operações de limpeza das rochas até segunda ordem. A Capitania solicitou um Plano Completo do Salvamento, que deveria ser apresentado em 10 dias, incluindo o plano do navio e a situação da contenção em torno do navio. Informações importantes: no Ponto 01 houve a reincidência do não atendimento das exigências anteriores; no Ponto 03 não houve atividade no período da manhã, sendo observado que só existiam barreiras de um lado do canal, havia concentração de material contaminante, sem que houvesse contenção e absorção do óleo; no Ponto 05 foi observado um sistema ineficiente de absorção; no ponto 07 foi observada uma grande concentração de óleo; nos Pontos 09, 11, 13 e 15 houve contenção dos contaminantes. O Armador informou que, segundo a Marinha, não havia vazamento em um dos tanques e que neste foi aberto um buraco para a retirada do produto. Verificou-se ainda que o tanque de bombordo estava intacto e o de boreste encontrava-se vazio. Foi apresentada a arquitetura do navio (Anexo 001) e declarado que se encontravam a bordo cerca de 1.150 toneladas de bunker, 4000 toneladas de metanol, 150.000 litros de óleo diesel e 29 m3 de óleo lubrificante.

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Informou-se que o cais de inflamáveis também estava interditado pela Marinha e pela APPA, e que laudos técnicos foram solicitados para análise e decisão de liberação. 2.2 DESENVOLVIMENTO DAS ATIVIDADES

Participaram do desenvolvimento das atividades relacionadas ao acidente as seguintes

instituições: IBAMA, Marinha do Brasil - Capitania dos Portos, UFPR, através do CEM e do CENACID, Polícia Federal, Petrobras, IAP, APPA, Defesa Civil, Corpo de Bombeiros, Polícia Militar do Paraná, Aviação do Governo, SEMA, Vigilância Sanitária, EMATER, Secretaria Estadual de Saúde, Procuradoria Geral do Estado, CETESB, Comissão da Defesa Civil Municipal, Guarda Municipal, Secretaria de Meio Ambiente de Paranaguá, ITOPF, SPVS, Instituto Ecoplan, Caramuru.

Como já mencionado, a partir do dia 17/11/04, foi criado um Comitê Técnico, composto por representantes do IAP, IBAMA, Petrobrás, UFPR (CENACID e CEM), Defesa Civil, Armador (ITOPF), sob a coordenação da Defesa Civil, com a finalidade de discutir os assuntos relacionados ao gerenciamento do acidente, envolvendo as atividades ambientais.

Na tentativa de otimizar e padronizar as ações de inspeção e limpeza, os locais atingidos pelo derramamento de óleo, nas baías de Paranaguá, Laranjeiras, Antonina e Guaraqueçaba, foram sub-divididos em áreas, criadas e numeradas sucessivamente à medida em que iam sendo identificados novos pontos de contaminação, conforme consta no mapa do Apêndice 02.

Os trabalhos de monitoramento dos técnicos ambientais, nas diferentes áreas, eram feitos diariamente e consistiam em: registro fotográfico, georreferenciamento dos pontos, obtenção de dados dos níveis de contaminação, acompanhamento dos trabalhos das equipes de limpeza, verificação da logística das empresas e seus efetivos em cada ponto, avaliação das atividades executadas, orientações técnicas e acompanhamento de experiências com novas técnicas de limpeza.

Todas as informações eram repassadas à Coordenação do Acidentes, que nos primeiros dias era de responsabilidade da Capitania dos Portos e posteriormente passou para a Defesa Civil e os Órgãos Ambientais (IBAMA e IAP). Para cada situação de contaminação observada, a partir dos relatos do monitoramento diário realizado pelos órgãos ambientais, nos diferentes ambientes atingidos, eram discutidos os procedimentos mais adequados a serem adotados, levando-se em consideração sempre um conjunto de fatores, tais como: possíveis danos ao ambiente, a conservação da natureza (unidades de conservação), interesse da área para o turismo, existência de áreas de cultivo de organismos marinhos, impactos visuais, potencial de remobilização do óleo e recontaminação de outras áreas, utilização da área por componentes específicos da fauna (por exemplo, aves migratórias) ou pela sociedade (balneários, marinas, atracadouros, zonas de pesca ou navegação, entre outros). Essa avaliação buscava sempre determinar um balanço social e ambiental positivo entre a atividade de limpeza proposta, a contaminação existente e os diversos fatores considerados.

Foi montado um banco de imagens com todas as fotos tiradas durante o atendimento ao acidente, que ficava à disposição de qualquer pessoa ou empresa que trabalhava no acidente. Adicionalmente, o CENACID/UFPR sistematizou as informações colhidas em campo, apresentando como resultado um mapa diário dos níveis de impacto de contaminação (Anexo 045), o qual classificava o risco ambiental em níveis variando de 1 a 3, de acordo com os seguintes critérios: nível 1- baixa densidade de informações no mapa geral de dados, informações indiretas, informações da população e telefonemas à Coordenação do Acidente; nível 2 – densidade média de informações no mapa geral de dados, informações diretas confirmadas pelas equipes de atendimento; nível 3 – densidade alta de informações no mapa geral de dados, presença extensiva de descontaminação em praias mangues e marismas e informações avaliadas pelas equipes de atendimento.

As informações eram registradas e levadas para discussão no Comitê Técnico, e registradas em atas (Anexo 024), primeiramente com o nome de Exigências dos Órgãos Ambientais e posteriormente com a denominação de Comitê Técnico. A ata referente à reunião de cada dia,

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contendo as recomendações para o dia seguinte, eram lidas e apresentadas em uma reunião denominada “Avaliação de Ações” (Anexo 024), a qual contava com a participação de todas as empresas envolvidas nos trabalhos de limpeza.

Em 29/11/2004 a Defesa Civil encaminhou ao IAP (Anexo 046), documento solicitando a análise do Plano Geral para as operações de resposta ao derrame, apresentado pelo Armador. Esse plano foi aprovado pelos órgãos ambientais, conforme consta na Ata no 022, de 01/12/2004 (Anexo 024), e passou a subsidiar também as estratégias de gerenciamento do acidente.

A Vigilância Sanitária, a Defesa Civil e o IBAMA empenharam-se para informar aos moradores das comunidades atingidas sobre as precauções que deveriam ser adotadas para evitar a contaminação, informando da proibição da pesca e ressaltando as conseqüências para a saúde no caso de ingestão de alimento contaminado ou de contato direto com os produtos tóxicos. Nessa atividade, houve o apoio das O.N.G. SPVS e Instituto Ecoplan. Com o mesmo objetivo, o IBAMA e o IAP emitiram um documento (Anexo 047) orientando os pescadores e a população em geral a respeito da captura, transporte e comércio de caranguejo-uçá, atividade que, normalmente, era liberada no período de 01/12 a 15/03, mas que também foi afetada pelo derramamento de óleo.

2.2.1 ATIVIDADES DE LIMPEZA DAS ÁREAS ATINGIDAS

As ações de limpeza e monitoramento das áreas contaminadas foram executadas pelas

empresas contratadas pelo Armador, no caso: Alpina-Briggs, ECOSORB, Hidroclean, KCL e Prest Service.

Nos primeiros dias após o acidente, os órgãos ambientais estabeleceram como recomendação geral de limpeza para manguezais, marismas, costões e pedras, e praias, as orientações abaixo descritas, conforme descrito em Ata de nº 011, de 21/11/04 (Anexo 024). Manguezais: não adentrar no manguezal e nas marismas, para fins de limpeza, de barco ou a pé; trabalhos na bordadura do manguezal somente de dentro do barco; proteger os manguezais com barreira absorventes; priorizar a limpeza pela ação natural de marés e correntes; monitorar as áreas atingidas. Marismas: após o mapeamento e a avaliação de cada área de marisma, será dada autorização ou não para o corte. Se autorizado o corte, este deverá ser feito na base do vegetal, coletando o material em sacos adequados e retirando o mesmo do local. Esse trabalho deve ser feito a partir de pequenos barcos. Em áreas de sedimento bastante arenoso, pode ser avaliada pontualmente a possibilidade/necessidade de se trabalhar por terra. Efetuar experimentos nas áreas trabalhadas (monitorar resposta; manter áreas controle não cortadas). Costões e Pedras: nos contaminados realizar a remoção manual do óleo empoçado com o uso de material absorvente (barreiras/pompom/almofadas/mantas) ou via sucção. Nos não contaminados colocar barreiras de proteção, impedindo a entrada de contaminante. Praias: remover manualmente as placas e o material contaminado, sendo necessária uma avaliação do uso de novas técnicas (peneiramento, utilização de pás e rastelos, entre outros).

À medida que os trabalhos de campo eram desenvolvidos, o Comitê Técnico passava a recomendar diferentes técnicas, de acordo com os níveis de contaminação e peculiaridades de cada área.

De maneira resumida foram aplicadas as seguintes técnicas de limpeza, contenção e remoção do óleo: limpeza natural: deixar com que o óleo seja degradado por processos naturais de intemperismo físico, químico e por biodegradação; adotado sempre que se considerava que uma intervenção sobre a área atingida seria potencialmente mais prejudicial do que a permanência do óleo no ambiente; foi adotado como regra geral, por exemplo, para as áreas de manguezal. Contenção do óleo com barreiras e remoção por sucção e bombeamento, utilizando caminhões-vácuo e diversos tipos de bombas (“skimmers”): aplicável quando há grandes quantidades de óleo líquido sobre a água. Utilizado quase que exclusivamente na área do navio (Ponto Zero) para remover os óleos que estava nos tanques da embarcação e que vazavam para a água.

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Utilização de materiais absorventes: foram utilizados diversos tipos de barreiras absorventes, além de pompons e mantas. Estes materiais foram utilizados para recolher camadas finas de óleo da água, que não podiam ser eficientemente removidas com as bombas de sucção, que se desprendiam tanto do navio quanto de outras áreas atingidas pelo derramamento (costões, manguezais, cais do porto, entre outros). Coleta manual de placas e pelotas de óleo: aplicável quando eram encontrados acúmulos de óleo já intemperizado, especialmente nas praias arenosas. Para melhorar a eficiência desse processo foram utilizados rastelos, pás, peneiras, entre outros materiais de coleta. Lavagem com água do mar em baixa pressão: aplicado em áreas onde ocorreu grande acúmulo de óleo na superfície e em sub-superfície, situação observada em algumas praias arenosas e em faixas de praias cobertas por seixos e rochas de diferentes tamanhos. O processo de lavagem era precedido de um revolvimento superficial do sedimento, para liberar o óleo enterrado, e foi associado à colocação de materiais absorventes para conter o óleo que era progressivamente liberado do sedimento. Raspagem manual de rochas: processo utilizado apenas pontualmente em algumas rochas localizadas em pontos turísticos de grande freqüência de visitantes (na Ilha do Mel) onde foram encontrados acúmulos de óleo que poderiam contaminar as pessoas através do contato direto. Essa raspagem retirava apenas a camada superficial do óleo, sem a utilização de solventes químicos, sendo aplicada em locais onde não havia presença de fauna incrustante (cracas, ostras, mexilhões, entre outros). Lavagem com água do mar em alta pressão: processo utilizado para remoção do óleo incrustado nas superfícies artificiais (cais do porto, marinas, atracadouros) e em algumas rochas de maior porte situadas em porções contaminadas do supra-litoral (em áreas pouco expostas à ação da maré e do tempo). Poda de vegetação contaminada: técnica aplicada à vegetação de marisma, restringindo-se às porções altamente contaminadas e a marismas que cresciam sobre sedimento arenoso (em geral bancos esparsos de Spartina alterniflora crescendo sobre praias arenosas), onde os efeitos do tráfego de pessoas sobre o sedimento e a vegetação eram mínimos.

Foram feitos ainda alguns testes e experiências com diferentes técnicas de limpeza, que, no entanto, mostraram-se ineficientes e/ou inadequadas para a situação e o ambiente onde foram aplicadas. Entre estas destacam-se: utilização de turfa orgânica (“peet sorb”) em áreas de marisma contaminadas, e uso de mantas absorventes para tentar remover, por fricção, o óleo incrustado nas raízes e troncos das árvores de mangue (técnica utilizada anteriormente pela Petrobras em um derramamento de óleo que atingiu manguezais na Bahia). Uma das experiências realizadas foi na Ponta Oeste, na Ilha do Mel, onde, no dia 08/12/2004, foram demarcadas três parcelas (de 2m x 2m, 6m x 6m e 8m x 8m) para monitoramento do ambiente afetado, realizando-se três tratamentos diferentes de limpeza, para observar o efeito destes sobre a regeneração da marisma. No entanto, como a mancha de óleo no local era muito grande, definiu-se, no dia 22/12/2004, cortar a marisma afetada, deixando-se apenas as três parcelas intactas para avaliação futura. Adicionalmente foram colocadas, no dia 17/12/2004, barreiras de contenção na tentativa de reter o óleo fino que se desprendia das placas ali depositadas.

Os resultados das ações de limpeza, com uma descrição do grau de contaminação inicial e da situação atual em que se encontram as áreas atingidas, estão contidos nos relatórios das vistorias conjuntas realizadas por equipes do IAP, IBAMA e CEM/UFPR, no final do mês de março e início de abril de 2005 (Anexo 048).

Resíduos Sólidos Gerados pelo Acidente

Os resíduos contaminados, retirados do local do acidente, são constituídos por areia, argila,

solo, resíduos orgânicos (galhos, folhas), plásticos, papéis, barreiras de absorção, entre outros. Os mesmos foram encaminhados para um depósito provisório, cedido pela APPA, licenciado pelo IAP através da Autorização Ambiental nº 8040 (Anexo 049), em nome de Wilson Sons Agência Marítima Ltda, para serem triados, embalados e transportados de modo seguro. As orientações

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quanto ao correto modo de armazenamento constam nos RIA – Relatórios de Inspeção Ambiental nº 43443, 43444 e 43446 (Anexo 050), tais como: proteção ao piso, registro de entrada e saída dos materiais, forração do caminhão, tempo de permanência dos produtos no depósito, iluminação do local, posicionamento de material para controle de incêndio, amarração das lonas, impedimento de pessoas estranhas no local, proibição de fumo, reutilização de barreiras no Ponto Zero. O piso do depósito (cimentado) foi protegido com lonas plásticas pretas, e sobre estas foram colocadas camadas de mantas e barreiras absorventes, impedindo a contaminação do piso.

A empresa Sociedad Naviera Ultragas/Wilson Sons Agência Marítima foi licenciada em 11/01/05, através da Autorização Ambiental nº 8351-IAP, para o transporte e co-processamento dos resíduos provenientes do navio Vicuña.

A Transportadora Santa Felicidade Ltda, licenciada pelo IAP através da Licença de Operação nº 2022 (Anexo 051), ficou responsável pelo transporte dos resíduos. O gerenciamento das operações ficou a cargo da empresa Ambiental Laboratório e Equipamentos Ltda. O material foi levado para co-processamento na empresa Companhia de Cimento Itambé, licenciada pelo IAP. Até a data de 25 de fevereiro de 2005, foram recolhidas e transportadas para co-processamento 502,725 toneladas de resíduos, conforme consta do romaneio (Anexo 052).

2.3 SALVATAGEM 2.3.1 RECUPERAÇÃO E DESTINO DOS ÓLEOS

Inicialmente, os trabalhos de salvatagem concentraram-se na retirada dos óleos contidos nos tanques do navio, e que deles vazavam, e na avaliação do dano causado na estrutura do navio. Estes trabalhos ficaram sob responsabilidade da empresa Wijsmuller Salvage B.V., contratada pelo Armador. A empresa apresentou, em 19/11/04, um Plano de Retirada e Remoção de Poluentes do N.T. Vicuña (Anexo 042). Em 29/11/2004, a empresa Wilson Sons encaminhou correspondência à Delegacia da Receita Federal comunicando a retirada de galões de tinta que estavam no navio (Anexo 053). Em 13/12/04, os trabalhos de salvatagem passaram a ser executados pela empresa SMIT Salvage, que, além da remoção dos destroços, também retirou óleo do navio. Em 04/12/04, o correspondente do P&I Club encaminhou ao IBAMA uma primeira solicitação de permissão para retirada do resíduo líquido do terminal da Petrobrás (Anexo 054). Conforme a Ata do Comitê Técnico de 07/01/05 (Anexo 024), foi localizado um tanque com óleo diesel no navio, de onde foram retirados 6000 litros. Os resíduos oleosos (óleo e água oleosa) recuperados nessas operações foram depositados no tanque da Transpetro/Petrobrás, em Paranaguá/PR, juntamente com outros oriundos dos trabalhos de limpeza. A Sociedad Naviera Ultragas Ltda solicitou ao IBAMA, em 21/01/05, autorização para o destino do óleo armazenado na Petrobrás (Anexo 055), cujo plano de transporte foi aprovado através do Ofício no 002/05/IAP/IBAMA (Anexo 055). Os resíduos oleosos ainda se encontram na Transpetro/Petrobrás aguardando transporte para o terminal de São Sebastião/SP, conforme Ofício no 140/04 (Anexo 056).

2.3.2 RETIRADA E DESTINO DOS DESTROÇOS DO NAVIO

A empresa Smit Salvage iniciou suas atividades em 13/12/04 com a tarefa da retirada dos

destroços do navio Vicuña do píer da Cattalini, incluindo a retirada dos óleos que se encontravam retidos na estrutura do navio. A Capitania dos Portos do Paraná emitiu, em 15/12/04, Portaria no 54/CPPR (Anexo 010), autorizando a empresa SMIT SALVAGE B.V a realizar operações de mergulho no casco do navio Vicuña, visando a preparação para a remoção do sinistrado.

O Comando do 5o Distrito Naval emitiu a Portaria no 163/COM5DN (Anexo 010), concedendo autorização para a remoção dos destroços no navio Vicuña para a Ponta do Poço, em Pontal do Paraná/PR.

A empresa apresentou, em 16/12/04, um Plano de Prevenção de Vazamento de Óleo proveniente da operação de remoção dos destroços (Anexo 057). Por exigência dos Órgãos Ambientais este documento foi modificado e reapresentado em 22/12/04 (Anexo 058). Em

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23/12/04, foram emitidos os RIA no 44954 e 44955/IAP (Anexo 059), à SMIT, solicitando alterações no plano apresentado, inclusive a troca do nome para Plano de Controle Ambiental – PCA. O plano foi reapresentado com as modificações solicitadas (Anexo 020), atendendo a solicitação da CEI - Comissão Especial de Investigação da Assembléia Legislativa do Paraná. A aprovação do documento deu-se através do Ofício nº 003/04 da Coordenação dos Órgãos Ambientais (Anexo 060).

O içamento da superestrutura iniciou-se às 14:15 h do dia 01/01/2005. Conforme Ata no 036, de 03/01/05, a Defesa Civil alertou a empresa SMIT de que o corte deveria ser iniciado sempre pelo período da manhã e nunca à tarde, devido à mobilização das equipes de contenção e para facilitar a visualização de possíveis produtos vazados. Além disso, há que se levar em conta que no verão sempre ocorrem tempestades no período da tarde. A última parte do navio Vicuña foi içada sobre a embarcação Superpesa X no dia 31/03/05. Em 19/04/05 foram concluídos os trabalhos de resgate das peças que foram lançadas ao redor do Píer da Cattalini na explosão do navio. Estas também foram depositadas na embarcação SUPERPESA X e encaminhadas à Ponta do Poço, em Pontal do Paraná.

Resíduos Gerados pelo Desmonte do Navio

O Plano de Controle Ambiental para a operação de remoção dos destroços do N.T. Vicuña,

apresentado em 23/12/04 (Anexo 020) e aprovado através do Of. nº 003/04 (Anexo 060), indica como local de destino provisório das partes do navio, área situada na localidade de Ponta do Poço, Município de Pontal do Paraná. A área foi licenciada pelo IAP através da Licença Ambiental nº 8279 (Anexo 061), concedida à empresa OPIS e OPIS Ltda., para a atividade de desmontagem de sucatas não contaminadas provenientes do navio Vicuña. Materiais não metálicos, retirados do navio, tiveram como destino a Companhia de Cimentos Itambé no Município de Balsa Nova/PR, para serem encaminhados ao co-processamento, trabalho este, feito pela empresa Ambiental. Esta atividade foi licenciada pelo IAP através da Autorização Ambiental nº 8351 (Anexo 062), para a Sociedad Naviera Ultragas/ Wilson Sons Agência Marítima Ltda. O material metálico não contaminado, retirado do navio, está sendo encaminhado à empresa GERDAU, situada no Município de Araucária/PR, empresa licenciada pelo IAP. A carga está sendo transportada pela Transportadora EROL Ltda, licenciada pelo IAP através da Licença de Operação (renovada) no 4359 (Anexo 063). Por solicitação da Defesa Civil, a Gerdau apresentou o Plano de Transporte de Sucata do Navio Vicuña (Anexo 064), que informa como será o corte e o transporte das peças. O transporte só poderia ocorrer no período de 10/01/05 a 28/02/05, nos dias de segunda a quinta-feira das 06:30 h às 17:30 h, devido à Operação Verão. Após 28 de fevereiro, poderia haver reavaliação do horário. A primeira carga de sucata foi transportada em 22/02/05, depois da liberação da Receita Federal. Posteriormente, a Gerdau solicitou a ampliação do horário de transporte (Anexo 065) o qual foi autorizado pela Defesa Civil (Anexo 066). As peças contaminadas passam por um processo de limpeza antes de serem retiradas da barcaça. Somente após verificação “in loco“ é que as peças podem ser retiradas das balsas e, posteriormente, colocadas nos caminhões para serem transportadas. Até a data de 20/04/05 foram transportadas para a empresa Gerdau 71 cargas, perfazendo um total de 1.558 toneladas de sucatas. Estas cargas estão depositadas no pátio da empresa, em Araucária, e foram separadas em lotes, sendo que a Receita Federal liberou o primeiro lote para consumo na empresa. As demais partes do navio encontram-se depositadas sobre as embarcações SUPERPESA VII e SUPERPESA X, atracadas na Ponta do Poço, em Pontal do Paraná.

2.4 MEDIDAS ADMINISTRATIVAS E LEGAIS Notificações Notificação nº 391219 (Anexo 012), do IBAMA, solicitou informações à Alpina-Briggs sobre o efeito da atracação dos navios sobre os trabalhos de contenção do óleo no Ponto Zero.

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Notificação nº 218284 (Anexo 021), do IBAMA, com as seguintes exigências: duplicação do número de embarcações de apoio; relocação das barreiras de contenção; retorno dos barcos e equipes de trabalho; disponibilização de helicóptero; informação, por escrito, do motivo da diminuição dos efetivos e barcos. Notificação nº 218283 (Anexo 030), do IBAMA, para a empresa Cattalini Terminais Marítimos Ltda., solicitando fornecimento de informações quanto à quantidade de barreiras absorventes e localização destas, como também quantidade de barcos e pessoal envolvido na operação de contenção do vazamento de óleo. Notificação nº 301217 (Anexo 041), do IBAMA, para a APPA, solicitando a apresentação de informações sobre quais foram as medidas tomadas pela instituição para minimizar os impactos ambientais causados pelo acidente, bem como a apresentação dos Planos de Emergência e Contingência. Autos de Infração do IBAMA

Em decorrência do acidente com o Navio Vicuña, algumas empresas foram autuadas pelo

IBAMA, por deixarem de adotar medidas de contenção e precaução quanto ao vazamento de óleo. Abaixo estão apresentados resumos de cada um dos Autos de Infração lavrados desde o início do acidente: Anexo 037 TIPO Auto de

Infração Nº DOC. 307028 DATA 17.11.04

EMPRESA Cattalini Terminais Marítimos Ltda. CNPJ 75.633.560/0001-82 ENDEREÇO Av. Cel. Santa Rita – 2677 – Rocio – Paranaguá

Art 70 Art.2º 54 §1º Art 1º-2º §3º III§5º Art 41 VI ENQUADRAMENTO Lei 9605/98 Decreto 3179/99 Decreto 3179/99

VALOR R$ 250.000,00 diária DESCRIÇÃO:Deixar de adotar as medidas exigidas de contenção de controle e regeneração dos produtos vazados do Navio Vicuña, no acidente do fia 15.11.04, conforme acordado em reunião realizada nos dias 16 e 17.nov.04, com os órgãos ambientais, IAP e IBAMA, coordenada pela Defesa Civil do Paraná, medidas estas não cumpridas que colocaram em risco o meio ambiente de forma grave, bem como colocar em risco a saúde e bem estar da população dos Municípios de Paranaguá, Antonina, Guaraqueçaba e Pontal do Paraná. A multa é diária.

Anexo 038 TIPO Auto de

Infração Nº DOC. 307030 DATA 17.11.04

EMPRESA Wilson Sons Agência Marítima Ltda. CNPJ ENDEREÇO Rua Rodrigues Alves, 753 – Centro - Paranaguá

Art. 70 Art.2º Art. 54

§3º Art. 1º-2º III§5º Art. 41 VI ENQUADRAMENTO

Lei 9605/98 Decreto 3179/99 Decreto 3179/99 VALOR R$ 250.000,00 diária DESCRIÇÃO: Deixar de adotar medidas necessárias para cessação, contenção e remoção das fontes de poluição por produtos químicos, inflamáveis, conforme exigido pelas autoridades ambientais. OBS: multa é diária até que todas as providências sejam adotadas, com a eficiência que a situação requer.

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Anexo 039 TIPO Auto de

Infração Nº DOC. 307031 DATA 17.11.04

EMPRESA KUHLMANN SURVEYORS E CONSULTANTS (P& I) - Wilson Sons Agência Marítima Ltda.

CNPJ ENDEREÇO Rua Barão do Rio Branco, 942 - Paranaguá

Art. 70 Art.2º 54 §3º Art. 1º-2º III§5º Art. 41 VI ENQUADRAMENTO Lei 9605/98 Decreto 3179/99 Decreto 3179/99

VALOR R$ 250.000,00 diária DESCRIÇÃO:Deixar de adotar medidas necessárias para cessação, contenção e remoção das fontes de poluição por produtos químicos inflamáveis, conforme exigido pelas autoridades ambientais. OBS: multa é diária até que todas as providências sejam adotadas, com a eficiência que a situação requer.

Anexo 040 TIPO Auto de

Infração Nº DOC. 307032 DATA 17.11.04

EMPRESA SOCIEDAD NAVIERA ULTRAGAS LTDA. – Wilson Sons Agência Marítima Ltda.

CNPJ ENDEREÇO Rua Rodrigues Alves, 753 – Centro - Paranaguá

Art. 70 Art.2º 54 §3º Art. 1º-2º III§5º Art. 41 VI ENQUADRAMENTO Lei 9605/98 Decreto 3179/99 Decreto 3179/99

VALOR R$ 250.000,00 diária DESCRIÇÃO:Deixar de adotar medidas necessárias para cessação, contenção e remoção das fontes de poluição por produtos químicos, inflamáveis, conforme exigido pelas autoridades ambientais. OBS: multa é diária até que todas as providências sejam adotadas, com a eficiência que a situação requer.

Anexo 044 TIPO Auto de

Infração Nº DOC. 307034 DATA 19.11.04

EMPRESA ALPINA BRIGGS DEFESA AMBIENTAL S.A. CNPJ 04.050.400/0001-62 ENDEREÇO Estrada Marco Pólo, 940

Art. 70 Art.1º 54 §3º Art. 1º-2º III§5º 41 VI ENQUADRAMENTO Lei 9605/98 Decreto 3179/99 Decreto 3179/99

VALOR R$ 250.000,00 diária DESCRIÇÃO:Deixar de executar ações de resgate/contenção de óleo vazada do navio Vicuña, no acidente do dia 15/11/04, nos pontos 01 e 03, no dia 18/11/04, conforme determinado pelos órgãos ambientais (IAP e IBAMA) e pela Defesa Civil, conforme consta na ATA 001 e 002 de 17/11/04, assinada pelo representante da empresa, medidas estas não cumpridas que colocaram em risco o meio ambiente de forma grave, bem como colocar em risco a saúde e bem estar da população. situação requer.

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Anexo 022 TIPO Auto de

Infração Nº DOC. 307627 DATA 17.01.05

EMPRESA SMIT – INTERNATIONAL DO BRASIL LTDA CNPJ 30.034.854/0001-30 ENDEREÇO Av. Venezuela, 3 sala 1508 – Rio de Janeiro

Art. 54 §3º V Art. 70 §1º Art. 41 VI §1º ENQUADRAMENTO Lei 9605/98 Decreto 3179/99

VALOR R$ 250.000,00 DESCRIÇÃO:Deixar de adotar medidas de precaução para conter possível vazamento de óleo combustível, durante os trabalhos de içamento da proa do Navio Vicuña, no dia 15/01/2005.

Anexo 026 TIPO Auto de

Infração Nº DOC. 307631 DATA 02.03.05

EMPRESA SMIT – INTERNATIONAL DO BRASIL LTDA CNPJ 30.034.854/0001-30 ENDEREÇO Av. Venezuela, 3 sala 1508 – Rio de Janeiro

Art. 54 V §3º Art. 70 §1º 41 VI §1º ENQUADRAMENTO Lei 9605/98 Decreto 3179/99

VALOR R$ 250.000,00 DESCRIÇÃO:Deixar de adotar medidas de contenção (conforme Atas) para conter possível vazamento de óleo, durante os trabalhos de içamento de parte da popa do Navio Vicuña, no dia 21/02/05.

Termos de Embargo emitidos pelo IBAMA Termo de Embargo/Interdição nº 364629 (Anexo 014), à Petrobras Transpetro S/A - Transpetro, embargando atividades de atracação e desatracação de embarcações, assim como a movimentação e transbordo de produtos no píer sob sua responsabilidade, até a emissão de Laudo Técnico do IBAMA. Termo de Embargo/Interdição nº 364630 (Anexo 015), à Empresa União Vopak Armazéns Gerais, embargando atividades de atracação e desatracação de embarcações, assim como a movimentação e transbordo de produtos no píer sob responsabilidade da Petrobras/Transpetro S/A, até a emissão de Laudo Técnico do IBAMA. Termo de Embargo/Interdição nº 364631 (Anexo 016), à APPA – Administração dos Portos de Paranaguá e Antonina, embargando atividades de atracação e desatracação de embarcações, assim como a movimentação e transbordo de produtos no píer sob responsabilidade da Petrobras/Transpetro S/A, até a emissão de Laudo Técnico do IBAMA. Auto de Infração da Marinha do Brasil – Capitania dos Portos do Paraná Auto de Infração nº 421P2004001526 (Anexo 067), para a empresa Sociedad Naviera Ultragás Ltda, por infringência aos artigos 16 e 17 “caput”, da Lei Federal no 9966/00. Expedição de Portarias Portaria nº 41/CPPR – Capitania dos Portos do Paraná (Anexo 010), de 16/11/04 , interditando para operação o Terminal de Inflamáveis da Petrobras e Cattalini.

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Portaria nº 42/CPPR (Anexo 010), de 16/11/04, proibindo as atividades de mergulho em qualquer ponto situado a menos de 2000 metros em toda a extensão do Terminal Marítimo de Inflamáveis da Cattalini. Portaria nº 43/CPPR (Anexo 010), de 17/11/04, instaurando Inquérito Administrativo para apurar responsabilidades sobre o acidente. Portaria nº 44/CPPR (Anexo 010), de 18/11/04, autorizando a empresa Wijsmuller Salvage BV a realizar operação de mergulho no Terminal Marítimo de Inflamáveis da Cattalini. Portaria nº 48/CPPR (Anexo 010), de 22/11/04, autorizando a empresa Mar e Ar – Serviços Subaquáticos a realizar operação de mergulho para elaboração de plano de restabelecimento de segurança da navegação, no terminal da Cattalini. Portaria nº 49/CPPR (Anexo 010), de 22/11/04, autorizando a empresa In-Shore Mergulho Profissional Ltda a realizar operação de mergulho para elaboração de plano de restabelecimento de segurança da navegação, no terminal da Cattalini. Portaria nº 50/CPPR (Anexo 010), de 24/11/04, liberando, sob condições, o Terminal de Inflamáveis da Transpetro. Portaria no 54/CPPR (Anexo 010), de 15/12/04, autorizando a empresa SMIT SALVAGE B.V a realizar operações de mergulho no casco do navio Vicuña, visando à preparação para a remoção do sinistrado. Portaria nº 68/CPPR (Anexo 010), de 28/12/04, interditando o berço externo do Terminal de Inflamáveis da Transpetro, face à interferência mútua com a operação de retirada dos destroços do navio Vicuña. Portaria no 163/COM5DN – Comando do 5o Distrito Naval (Anexo 010), de 16/12/04, concedendo autorização para a remoção dos destroços no navio Vicuña para a Ponta do Poço, em Pontal do Paraná/PR. Portaria no 047/05/IAP (Anexo 068), de 09/03/05, liberando as atividades de pesca, coleta e consumo de organismos aquáticos nas Baías de Paranaguá, Guaraqueçaba e Antonina, e criando a Área Operacional e de Monitoramento, na Baía de Paranaguá. Essa Portaria entrou em vigor na data de sua publicação, com efeitos retroativos a 06/01/2005. Portaria no 147/04 (Anexo 032), da APPA, interditando para operação o Terminal de Inflamáveis da Petrobras, Cattalini e píer da Fospar, até ulterior deliberação pela sua Superintendência. Expedição de Instruções Normativas Instrução Normativa Conjunta IBAMA/IAP no 025/2004: proibindo qualquer atividade de pesca, coleta e consumo de organismos aquáticos, uso de água ou práticas desportivas que impliquem banho ou contato com a água, nas baías de Paranaguá, Antonina e Guaraqueçaba, por um período de 60 dias, a contar do dia 16 de novembro de 2004(Anexo 033). Instrução Normativa Ministério do Meio Ambiente no 032, de 16/12/04, proibindo a pesca, na área de mar territorial compreendida entre os paralelos 25o20’00” e 25o40’00”e até a distância de 5 milhas náuticas a partir da linha de costa, por um período de 60 dias, a contar do dia 16/11/2004 (Anexo 069).

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Licenciamento do Terminal da Cattalini

A empresa Cattalini Terminais Marítimos Ltda. Requereu em 16/04/2003, através do SPI no 5.587.530-8-IAP/ERLIT, a renovação da Licença de Operação no 06218, com validade até 20/08/2003, para Armazenagem e Movimentação de Granéis Líquidos. Técnicos do IAP efetuaram vistoria na área do empreendimento, analisaram a documentação apresentada e emitiram parecer técnico, no qual relatam que a Empresa opera dentro das mesmas normas e padrões estabelecidos pelo EIA/RIMA quando da sua instalação, aprovados pelo Grupo de Análise no ano de 1988. Constataram também que todas as medidas de segurança contra risco de vazamento e sinistros continuavam a ser monitoradas conforme projetos e planos avaliados pelo IAP, sendo o parecer conclusivo favorável à renovação do licenciamento. Foi emitida Licença de Operação no 3041, datada de 09/10/2003, com validade até 08/10/2005, licenciando a atividade de armazenagem e movimentação de granéis líquidos (Anexo 070). Em complementação a essa licença, foi emitido o Ofício no 171-IAP/DIRAM/DLP, o qual relaciona os produtos liberados para armazenamento (Anexo 071). Ações ajuizadas

Diante das dimensões do acidente, 8.822 ações foram ajuizadas contra a Sociedade Naviera

Ultragas Ltda., por aqueles que se sentiram prejudicados. Outras Medidas Relatório 03 da Assessoria Técnica da CEI – Comissão Especial de Investigação da Assembléia Legislativa do Paraná (Anexo 072). Ofício da Coordenação do acidente à Procuradora Geral Federal, informando das medidas adotadas pela APPA no acidente do Vicuña (Anexo 073).

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3. IMPACTOS CAUSADOS

3.1 CARACTERIZAÇÃO DAS ÁREAS ATINGIDAS 3.1.1 LOCALIZAÇÃO

A Baía de Paranaguá, localizada no litoral do Estado do Paraná, sul do Brasil (25° 30' S e 48°

25' W), faz parte de uma grande interconecção do sistema estuarino que inclui a Baía de Iguape-Cananéia, no litoral sul do Estado de São Paulo (LANA et al., 2001), formando o Complexo Estuarino Lagunar Iguape-Cananéia-Paranaguá. Este complexo apresenta aproximadamente 5.800 km2 e se estende por 200 quilômetros de litoral, desde o norte da Estação Ecológica da Juréia, em São Paulo, até Pontal do Sul, no Estado do Paraná. Neste Estado, o sistema cobre 552 km2 de espelho d’água, mais 295,5 km2 de áreas vegetadas inundadas (NOERNBERG et al., 2004 apud ANDRIGUETTO FILHO et al., no prelo). O Complexo Estuarino de Paranaguá conecta-se ao mar aberto através de três canais: Canal Norte ou Barra Norte (entre Superagüi, Ilha das Peças, Ilha das Palmas até a altura do farolete na Ilha do Mel), Canal Sueste ou Barra Sueste (entre a Ilha do mel ao norte, a Ilha das Palmas, Rochedos Itapemas e a costa sueste da Ilha das Peças), Canal Sul ou Barra Sul, conhecido como Canal da Galheta (entre a ponta sul da Ilha do Mel, Ilha Rasa da Cotinga e Pontal do Sul), sendo este último o principal acesso utilizado pelos navios. Cabe ainda comentar que antigamente a Ilha do Superagüi era ligada ao continente por um istmo de aproximadamente quatro quilômetros, do qual foi separada em 1953, pela abertura do Canal do Varadouro, hoje utilizado para dar acesso ao Estado de São Paulo, a partir da Baía dos Pinheiros.

3.1.2 MEIO FÍSICO

O litoral do Paraná está bem descrito, em sua geografia física e geologia, nos trabalhos de

MAACK (1968) e BIGARELLA et al. (1978) apud CEM/UFPR (2001). Com mais de 1000 m de altitude, as escarpas abruptas da Serra do Mar separam a planície costeira do Primeiro Planalto Paranaense.

Existem similaridades geológicas e geomorfológicas na área de abrangência do Complexo Estuarino Lagunar de Iguape-Cananéia e Paranaguá. No contexto dos macrocompartimentos, adotado no Macrodiagnóstico da zona Costeira do Brasil (MMA/PNMA, 1998 apud CEM/UFPR, 2001), o litoral paranaense insere-se no macrocompartimento denominado Costa das Planícies Costeiras e Estuários, no qual situam-se a costa das planícies costeiras e estuários localizados entre São Vicente –SP e a Ponta do Vigia – SC. Compreende um largo embaiamento e um litoral retificado de longos arcos de praia, largas planícies costeiras e importantes estuários como os de Santos e Cananéia, em São Paulo, Paranaguá e Guaratuba, no Paraná, e São Francisco do Sul, em Santa Catarina.

O Complexo Estuarino de Paranaguá apresenta uma grande diversidade de ambientes, incluindo planícies de marés, baixios, ilhas, costões rochosos, marismas, rios de maré (gamboas) e manguezais (LANA, 1986 apud CEM/UFPR, 2001). O sistema estuarino caracteriza-se geomorfologicamente como um estuário de planície costeira (segundo classificação de estuários definida em KJERFVE, 1990 apud CEM/UFPR, 2001), ocorrendo feições deltáicas em sua desembocadura (ANGULO, 1995 apud CEM/UFPR, 2001).

Estuários constituem os únicos sistemas aquáticos onde ocorre a interação dinâmica entre as águas doces, as águas marinhas, o sistema terrestre e a atmosfera (DAY et al., 1989 apud CEM/UFPR, 2001).

A Baía de Paranaguá, de direção leste-oeste, tem 50 km de extensão, uma largura máxima de 7 km e área de 260 km2; e as baías de Guaraqueçaba, Laranjeiras e Pinheiros, com orientação norte-sul, cerca de 30 km, 13 km de largura e área de 200 km2 (ANDRIGUETTO FILHO et al., no prelo).

A planície costeira é composta, em sua maior parte, por sedimentos quaternários depositados em ambientes continentais e marinhos. Morros e colinas isolados formados por migmatitos, diques

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de diabásio e sedimentos continentais terciários (Formação Alexandra) possuem uma ocorrência secundária.

A planície costeira paranaense, assim como o complexo estuarino da Baía de Paranaguá, tiveram sua formação profundamente vinculada à história das variações relativas do nível do mar durante o Quaternário, principalmente aquelas ocorridas nos últimos 120.000 anos. Nesse contexto, estudos da geologia de subsuperfície feitos por LESSA et al. (2000) apud CEM/UFPR (2001) proporcionaram um importante avanço no conhecimento da evolução geológica da planície costeira paranaense. Interpretaram a planície costeira de Paranaguá como sendo dois sistemas de laguna - ilha barreira que evoluíram depois das duas últimas transgressões (Transgressão Cananéia em 120.000 Antes do Presente - A.P. - e Transgressão Santos em 5.100 A.P.), correspondentes aos dois últimos períodos interglaciais do Quaternário. Identificaram as seguintes unidades geológicas: barreira holocênica transgressiva, barreira holocênica regressiva, estuário holocênico, canal estuarino holocênico, sedimentos continentais cenozóicos, estuário pleistocênico, barreira pleistocênica e embasamento cristalino.

Os sedimentos de fundo da Baía de Paranaguá consistem basicamente de uma mistura de material detrítico terrígeno com material biogênico, produzido pelas associações vegetais (manguezais, marismas, entre outros) que ocorrem nas margens e setores internos das gamboas da baía. Os teores de carbonato biodetrítico nos sedimentos de fundo da região são geralmente baixos. Nas porções mais internas e consequentemente mais protegidas, ocorre um maior desenvolvimento dos manguezais, que detêm grandes quantidades de sedimentos finos transportados pelas águas da baía. Em canais e outras porções onde a ação de correntes de maré é mais intensa o predomínio é de sedimentos terrígenos.

BIGARELLA et al. (1978) apud CEM/UFPR (2001) constataram que, via de regra, os sedimentos tornavam-se cada vez mais finos e menos selecionados para o interior da Baía de Paranaguá. Para BIGARELLA et al. (1970; 1978) apud CEM/UFPR (2001) a distribuição dos sedimentos ao longo das baías de Paranaguá e Antonina é paralela à distribuição de energia no ambiente, havendo duas áreas preferenciais de movimentação dos sedimentos:

a) Na sua metade oriental, mais próxima ao mar aberto, predominam correntes de maré o que ocasiona um selecionamento dos sedimentos arenosos através do fluxo e refluxo das correntes;

b) Na metade ocidental, predominam fluxos diretamente influenciados pela ação fluvial, predominando a deposição de sedimentos mal a muito mal selecionados formados de silte, argila e areia. A mistura entre sedimentos detríticos e restos orgânicos, nas áreas de pequena ação de correntes e ondas, confere aos sedimentos uma coloração escura. Os teores elevados deste componente devem-se às condições redutoras prevalecentes nos sedimentos de fundo.

As praias arenosas representam uma interface funcional entre o mar e a terra, onde a transferência de nutrientes ocorre nas duas direções. São ecossistemas altamente dinâmicos e relativamente frágeis, que recebem um forte impacto em decorrência das atividades humanas. Em ambientes estuarinos existem faixas de areias litorâneas (ou marginais), onde as formações de marismas e/ou mangues estão ausentes, e que se estendem em direção à água, geralmente formando uma planície de maré. Estes ambientes foram recentemente classificados como ambientes praiais de transição, onde os efeitos da maré começam a modificar ou a dominar a morfodinâmica praial.

Segundo IPARDES (1989), o clima do litoral do Paraná é controlado em sua maior parte pelo anticiclone do Atlântico Sul, onde os principais elementos regionalizadores são a temperatura e as geadas. Conforme a classificação de KOEPPEN, essa região possui dois tipos climáticos: Cfa e Cfd, sendo o primeiro o que mais se identifica com a região, por ser subtropical úmido mesotérmico, com verão quente. O mês mais frio apresenta temperatura média inferior a 18ºC, porém, superior a -3ºC, e no mais quente a temperatura média é superior a 22ºC. Esta área está sujeita a geadas pouco freqüentes, a precipitações regulares todos os meses e não apresenta estação seca definida, embora ocorra uma maior incidência de chuvas durante o verão e períodos de seca no inverno, sendo a pluviosidade média de 1988 mm (IPARDES, 1989 apud CEM/UFPR, 2005). Segundo ANDRIGUETO-FILHO et al. (no prelo), a estação chuvosa típica vai da primavera até o final do verão, com três vezes mais chuva do que a estação seca, do fim do outono ao fim do inverno.

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O regime de ventos é controlado pela influência do sistema semi-permanente da Alta do Atlântico Sul e pela passagem de sistemas frontais. Predominam ventos dos setores ENE, E, ESSE e SE, com intensidade média de 4 m/s. O sistema de brisa na região é bastante relevante, sendo detectadas amplitudes de até 2 m/s nos meses de novembro a março (CAMARGO e MARONE, 1995; CAMARGO et al., 1996 apud CEM/UFPR, 2001).

A temperatura superficial da água oscila entre 17 °C no inverno e 32 °C no verão (BRANDINI et al., 1985, 1988 apud CEM/UFPR, 2001) e os gradientes térmicos verticais raramente ultrapassam os 3 °C (KNOPPERS et al., 1987 apud CEM/UFPR, 2001).

A salinidade varia entre menos de 6,0 e 34,5 ‰, podendo ser observado um gradiente halino horizontal, com valores maiores próximos à desembocadura e valores mais reduzidos na região de Antonina, sob maior influência dos aportes fluviais (CEM/UFPR, 2001).

O Complexo Estuarino de Paranaguá recebe drenagem de uma área total de 3361 Km2 (SOARES, 1995 apud CEM/UFPR, 2001). As baías de Antonina e Paranaguá recebem a drenagem de aproximadamente 54% da área de toda a bacia hidrográfica litorânea do estado do Paraná e apresentam uma deficiência hídrica no inverno, quando a evaporação é 7 vezes superior à precipitação. No verão ocorre excedente hídrico, intensificando o aporte de água doce na direção do estuário. Também nessa época o potencial de erosividade pela chuva é oito vezes superior ao do inverno (MANTOVANELLI, 1999 apud CEM/UFPR, 2001). A maior parcela da carga de material em suspensão é introduzida no sistema estuarino em curtos períodos de tempo, registrando-se picos de concentração após fortes precipitações (MANTOVANELLI, 1999 apud CEM/UFPR, 2001).

O regime de maré é o principal mecanismo de fornecimento de energia para o sistema, fora a energia solar, apresentando amplitude média de 2,2 m e caráter predominantemente semidiurno, embora ocorram desigualdades diurnas e efeitos não lineares (MARONE e CAMARGO, 1995 apud CEM/UFPR, 2001) assim como forte assimetria nas elevações e correntes de maré.

A baía de Paranaguá apresenta-se como um estuário hipersíncrono, onde o efeito de convergência excede o de atrito, resultando numa amplificação da variação do nível do mar em direção à montante. Esta variação começa com 1,2 m em Pontal do Sul e atinge até 2,8 m em Antonina (LESSA ET AL, 1988; MANTOVANELLI, 1999 apud CEM/UFFPR, 2001). Alterações anormais do nível médio do mar são comuns, principalmente durante o inverno, atribuídas à passagem de frentes frias oceânicas e a ventos fortes, que geram grandes ondas e causam o empilhamento de água na costa (MARONE e CAMARGO, 1995 apud CEM/UFPR, 2001). As correntes de maré são fortes, atingindo velocidades máximas de enchente e vazante superiores a 80 cm/s e 110 cm/s, respectivamente, o que caracteriza um estuário do tipo positivo (MARONE et al., 1995a apud CEM/UFPR, 2001). Isto é devido à influência do atrito lateral e de fundo, o qual é gradativamente maior em direção à cabeceira e gradativamente menor em direção à desembocadura (CAMARGO, 1998 apud CEM/UFPR, 2001), assim como ao aporte de água doce e à circulação residual (MARONE et al., 1995a apud CEM/UFPR, 2001).

Dentro do complexo estuarino, porém, pouco do efeito do clima de ondas oceânicas é sentido, devido à proteção natural da costa e, especialmente, à presença da Ilha do Mel na entrada do Complexo Estuarino de Paranaguá. Todavia, a existência de áreas de largura considerável dentro do Complexo oferece uma pista de ventos suficiente para que ondas geradas localmente pelos ventos provoquem, em situações e horários particulares (notadamente no final da tarde), agitação marítima considerável que deve ser considerada em termos de potencial agente de mistura superficial de propriedades (ou poluentes) (CEM/UFPR, 2001).

Já na desembocadura do Complexo, o predomínio de ondas do quadrante S-SE gera uma deriva litorânea orientada para Norte. Segundo ÂNGULO (1992) apud CEM/UFPR (2001) a ocorrência de deriva litorânea para Norte pode ser observada na orientação das desembocaduras fluviais e morfologia dos deltas de vazante dos estuários de Paranaguá e Guaratuba. O lançamento de garrafas de deriva nos canais Norte e Galheta confirmou que as correntes predominantes na zona costeira adjacente ao Complexo Estuarino de Paranaguá são na direção Norte (MARONE et. al., 1995b apud CEM/UFPR,2001).

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3.1.3 MEIO BIOLÓGICO

Flora O litoral paranaense faz parte do domínio da Floresta Ombrófila Densa (Floresta Atlântica),

sendo considerada uma das florestas tropicais mais ameaçadas em níveis mundiais, e um dos mais significativos remanescentes de Floresta Atlântica do Brasil. De acordo com o Inventário de Áreas Úmidas do Brasil (USP, 1990), o Complexo-Estuarino-Lagunar de Iguape-Cananéia (SP) e Paranaguá (PR) representa uma das mais importantes reservas de manguezais do País. Sabe-se que as regiões mais conservadas situam-se nas bacias de drenagem das baías dos Pinheiros, Laranjeiras e Guaraqueçaba, onde a cobertura vegetal corresponde de 75 a 97,6% da área total (IPARDES, 1989; ANDRIGUETO, 1995; LIMA et al., 1998 apud CEM/UFPR, 2005).

A classificação da vegetação adotada por RODERJAN e KUNIYOSHI (1988), baseada em parâmetros altimétricos e condições edáficas diferenciadas, indica para o litoral paranaense as Formações Pioneiras de Influência Marinha (vegetação de praias e dunas, restinga); Formações Pioneiras de Influência Flúvio-Marinha (manguezais); Formações Pioneiras de Influência Fluvial (caxetais); Floresta Ombrófila Densa das Terras Baixas ou das Planícies Quaternárias (até 40 a 50 m a.n.m.); Floresta Ombrófila Densa Sub-Montana ou do Início da Encosta (40-50 a 500-700 m a.n.m.); Floresta Ombrófila Densa Montana (700 m a 1000 m a.n.m) e Floresta Ombrófila Densa Alto Montana (1000 m a 1800 m a.n.m.).

As áreas afetadas pelo acidente do Navio Vicuña referem-se às Formações Pioneiras de Influência Marinha e de Influência Flúvio-Marinha, bem como ao ambiente aquático. Sendo assim, as informações para caracterização da flora referem-se a tais ecossistemas.

Manguezais e Marismas

As três espécies de mangue que colonizam o litoral paranaense são: mangue-vermelho

Rhizophora mangle, mangue-preto Avicenia schaueriana e mangue-branco Laguncularia racemosa. Essas espécies frutificam, com pequenas variações, de março a outubro. Sua distribuição é muito variável de bosque para bosque e padrões de zonação raramente são evidentes. Quando isto acontece, R. mangle costuma ocupar as áreas marginais, próximas aos rios ou gamboas. Os grupamentos vegetais podem ser monoespecíficos, fato bastante comum nas áreas euhalinas de alta energia da Baía de Paranaguá, onde os manguezais são basicamente compostos de L. racemosa, ou pluriespecíficos, em áreas mais internas, onde as três espécies podem ser co-dominantes (CEM/UFPR, 2001). O limite austral da distribuição dos manguezais no Atlântico sul é Laguna, no Estado de Santa Catarina.

As marismas da Baía de Paranaguá são áreas de deposição marinha recente, regular ou irregularmente inundadas por águas salinas ou salobras e colonizadas por plantas vasculares herbáceas, tipicamente halófitas. As marismas locais, conhecidas tradicionalmente como praturás, ocorrem como associações mono-específicas ou de baixa diversidade, com predomínio da Poaceae (=Graminae) Spartina alterniflora, sob a forma de faixas estreitas e descontínuas, geralmente na margem frontal de manguezais (LANA et al., 1991 apud CEM/UFPR, 2005). As marismas são reconhecidas como ecossistemas extremamente produtivos, apesar das dificuldades metodológicas para se estimar suas taxas de produtividade (LANA et al., 1991 apud CEM/UFPR, 2005). Gêneros de algas comuns nas marismas da Baía de Paranaguá são Ulvaria spp., Enteromorpha spp. e Cladophora spp. Segundo ANDRIGUETTO FILHO et al. (no prelo), cerca de 100 espécies de macroalgas bênticas ocorrem na região, principalmente em costões rochosos expostos e nos manguezais.

Fitoplâncton

O plâncton é a comunidade de animais e vegetais pequenos, que sobrevivem em suspensão na

coluna de água, respondendo rapidamente às alterações físico-químicas do meio devido à sua

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elevada taxa de crescimento e mortalidade. Os organismos planctônicos representam a base da teia alimentar do sistema pelágico, e o principal mecanismo de dispersão de larvas de invertebrados marinhos, alguns dos quais são recursos importantes explorados pela população costeira ou cultivados em sistemas artificiais (p.ex., camarão e ostra) dentro da Baía de Paranaguá (CEM/UFPR, 2001).

Os principais fatores que controlam a produção do fitoplâncton na baía são: extensão da zona eufótica, concentração de nutrientes, salinidade, temperatura e herbivoria.

A produção fitoplanctônica é limitada pela luz nas áreas internas da baía, com maior turbidez, e pelas baixas concentrações de nutrientes, principalmente nitrogênio, nas áreas externas (BRANDINI et al., 1988 apud CEM/UFPR, 2001).

Nos setores intermediários e mesohalinos, o fitoplâncton é dominado por diatomáceas cêntricas e fitoflagelados do nanoplâncton (<20 µm). Dinoflagelados e silicoflagelados do microplâncton (>20 µm) são freqüentes, mas numericamente contribuem pouco para o fitoplâncton total (BRANDINI, 1985; THAMM, 1990; FERNANDES, 1992; BRANDINI e THAMM, 1994 apud CEM/UFPR, 2001). MOREIRA-FILHO et al., (1990) apud CEM/UFPR (2001) fizeram um levantamento das diatomáceas identificadas em todo o Estado do Paraná, constatando a ocorrência de 636 espécies, distribuídas em 115 gêneros, superando o dos demais grupos do fitoplâncton. A maioria das espécies identificadas ocorrem principalmente nos setores interno e intermediários da Baía de Paranaguá. A diatomácea Skeletonema costatum ocorre o ano todo e domina durante o verão, período de elevada precipitação, com decréscimo da salinidade e enriquecimento da zona eufótica com nutrientes da drenagem continental. Os demais gêneros deste grupo ocorrem em picos de abundância de curta duração, provavelmente associados ao regime de ventos (FERNANDES, 1992; REZENDE e BRANDINI, 1997 apud CEM/UFPR, 2001). Os gêneros Chaetoceros, Rhizosolenia e Leptocylindrus são freqüentes nas coleções planctônicas, mas apresentam padrões de variação sazonal irregular. No grupo das diatomáceas penadas dominam Thalassionema nitzschioides e Nitzschia spp., as quais apresentam uma relação positiva com a pluviosidade e o regime de ventos (THAMM, 1990; BRANDINI e THAMM, 1994; REZENDE e BRANDINI, 1997 apud CEM/UFPR, 2001). Entre as espécies bênticas, dominam as dos gêneros Navicula, Cocconeis e Diploneis, que ocorrem em grandes quantidades nos bancos de sedimentos da baía.

Fauna

Ameaçada de Extinção

Por essa região ser considerada a maior mancha remanescente da Floresta Atlântica, abriga

inúmeros animais ameaçados de extinção, que já não existem em outras regiões onde a floresta foi fragmentada. Entre estas, pode-se citar: a onça pintada Panthera onca, onça parda ou sussuarana Puma concolor capricornensis, jaguatirica Leopardus pardalis mitis, gato-do-mato Leopardus tigrinus, gato maracajá Leopardus wiedii, mico-leão-de-cara-preta Leontopithecus caissara, ariranha Pteronura brasiliensis, veado-bororó-do-sul Mazama nana, papagaio-de-cara-roxa ou chauá Amazona brasiliensis, jacutinga Pipile jacutinga, Maria-da-restinga Phylloscartes kronei, jaó Crypturellus noctivagus noctivagus, albatroz-de-sombrancelha Thalassarche melanophris, trinta-réis-real Thalasseus maximus, patinha Procellaria aequinoctialis, socó-jararaca Tigrisoma fasciatum, gavião-pombo-pequeno Leucopternis lacernulata, toninha ou boto amarelo Pontoporia blainvilllei, tartaruga-verde Chelonia mydas, tartaruga-oliva Lepidochelys olivacea, tartaruga-de-couro Dermochelys coriacea, tartaruga-cabeçuda Caretta caretta, tartaruga-de-pente Eretmochelys imbricata, entre outras. Além disso, espécies como o Leontopithecus caissara e Amazona brasiliensis são também consideradas endêmicas, isto é, só existem nessa região, sendo que o papagaio-de-cara-roxa ocorre de Garuva, no Estado de Santa Catarina, até Iguape, no Estado de São Paulo. Já o mico-leão-de-cara-preta está restrito ao Parque Nacional do Superagüi, especialmente na Ilha do Superagüi, com evidências de ocorrência no Vale do Rio dos Patos, que também faz parte do Parque, como também no Município de Ariri, em São Paulo.

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Zooplâncton Assim como no caso do fitoplâncton, os máximos de abundância do zooplâncton (até 80 org/l)

ocorrem nos setores intermediários (mesohalinos e polihalinos) da baía, em salinidades variando entre 15 e 30‰. Não se dispõe de informações sobre a produção secundária planctônica, que provavelmente está relacionada tanto com a disponibilidade sazonal dos microorganismos associados às partículas detríticas em suspensão, como com as flutuações da biomassa fitoplanctônica, dependendo do local e do período do ano.

Existem poucas informações disponíveis sobre a estrutura do zooplâncton da Baía de Paranaguá. Conforme observado em outros estuários tropicais e subtropicais, os copépodes e as larvas de invertebrados (meroplâncton) são os organismos mais abundantes do mesozooplâncton (>180 µm) na Baía de Paranaguá. A importância numérica dos copépodes dos gêneros Acartia, Paracalanus, Temora, Pseudodiaptomus, Oithona, Corycaeus e Euterpina foi bem caracterizada para os anos de 1993 a 1996, sugerindo um padrão recorrente de dominância destes organismos. São espécies capazes de tolerar uma ampla faixa de variação da salinidade e, portanto, bem adaptadas aos setores meso e polihalinos (CEM/UFPR, 2001). Os copépodes Acartia lilljeborgi, Oithona oswaldocruzi e Euterpina acutifrons dominam o holozooplancton desses setores (salinidade entre 12,1 e 34,2‰), principalmente na primavera e no verão. Nos meses de maior pluviosidade, os copépodes de águas menos salinas se dispersam espacialmente por uma ampla região da baía, como no caso de Pseudodiaptomus acutus, Labidocera fluviatilis e Oithona hebes (Lopes et al., 1997 apud CEM/UFPR, 2001). As espécies freqüentes, mas não dominantes, são os cladóceros Penilia avirostris e Evadne tergestina, a hidromedusa Liriope tetraphyla, os quetognatos do gênero Sagitta, o apendiculário Oikopleura dioica, e as larvas de Gastropoda, Cirripedia e Decapoda (MONTÚ E CORDEIRO, 1988 apud CEM/UFPR, 2001).

SILVA (1994) apud CEM/UFPR (2001) apresentou os resultados de um levantamento anual sobre a distribuição horizontal e vertical das larvas de ostras do gênero Crassostrea em dois locais da Baía de Paranaguá, verificando que o recrutamento é maior durante os períodos mais quentes, apesar da reprodução ser aparentemente contínua ao longo do ano. As larvas maduras tendem a se concentrar nas camadas de fundo, onde a probabilidade de contato com o substrato é, obviamente, maior (BOEHS e ABSHER, 1997 apud CEM/UFPR, 2001).

Fauna Bentônica

Os organismos bentônicos são aqueles associados aos fundos marinhos, como crustáceos,

moluscos e anelídeos poliquetas. Esses organismos bênticos são, por várias razões, excelentes ferramentas biológicas em estudos de poluição ambiental ou de monitoramento da qualidade ambiental. Em primeiro lugar, têm um modo de vida predominantemente séssil ou sedentário, pelo menos no que diz respeito à escala espacial de muitas das perturbações ambientais mais usuais. Isto faz com que efetivamente sofram as conseqüências dos agentes poluidores, não evitando a área perturbada, como o fariam peixes ou outros organismos mais móveis. Em segundo lugar, têm ciclos de vida relativamente mais longos do que os organismos planctônicos ou mesmo do que muitos animais do nécton. Isto facilitaria, por exemplo, a análise dos efeitos subletais ou crônicos de agentes poluidores sobre populações submetidas a perturbações. Finalmente, os organismos bênticos têm um espectro de tolerância muito variado a perturbações ambientais. Certas espécies são particularmente sensíveis a determinados poluentes, como o óleo, enquanto outras podem tolerar elevadas concentrações. A tolerância ou sensibilidade diferencial a diferentes poluentes permite que os organismos bênticos possam ser utilizados como indicadores de perturbações ambientais tanto pela sua presença como pela sua ausência, já que os efeitos de uma determinada forma de poluição podem se dar em diversos níveis. O nível mais evidente é aquele em que podemos constatar alterações nas densidades populacionais. Muitas populações são virtualmente excluídas na presença de perturbações ambientais antrópicas, enquanto outras podem sofrer declínios ou aumentos populacionais, dependendo da natureza da perturbação (CEM/UFPR, 2001).

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Algumas espécies encontradas na Baía de Paranaguá, dependendo das condições físico-quimicas e biológicas, são: poliquetas Polydora socialis, Sigambra grubii, Glycinde multidens, Heteromastus similis, Clymenella dalesi e Kinbergonuphis nonatoi, gastrópodo Heleobia australis, ofiuróide Hemipholis elongata, bivalvo Tellina lineata, bivalvos comestíveis Anomalocardia brasiliana e do gênero Mytella, caranguejo-do-mangue Ucides cordatus, caranguejo Uca, entre outras (CEM/UFPR, 2001).

Ao contrário do observado em regiões temperadas, onde a abundância de invertebrados atinge picos no fim da primavera e início do verão, populações de invertebrados bentônicos na Baía de Paranaguá apresentam alta abundância tanto no inverno quanto no verão, sem nenhum padrão pronunciado de variação sazonal. Oscilações nessas abundâncias ao longo do ano têm sido atribuídas a variações na cobertura e biomassa das plantas, pluviosidade, temperaturas baixas e taxas de predação (LANA et al., 2001).

Ictiofauna

Os estudos sobre o nécton regional do Estado do Paraná são limitados às regiões estuarinas e

costeiras. Os trabalhos estão restritos, em sua maioria, ao sistema estuarino da Baía de Paranaguá. Os aspectos da composição ictiofaunística corroboram a opinião generalizada de que o litoral do Estado do Paraná faz parte de uma região de transição faunística. Por isso, algumas espécies apresentam grande similaridade com a região tropical, de águas quentes, especificamente a Caraíbica. Contudo, por ser transicional, é nítida a presença de espécies de águas frias situadas mais ao sul (CEM/UFPR, 2001).

A literatura específica registrou 92 famílias, 191 gêneros e 313 espécies, dos quais 80, 179 e 289, respectivamente, correspondem exclusivamente aos Actinopterygii (peixes ósseos), estando particularmente inexplorada sua condroictiofauna (peixes cartilaginosos) (CEM/UFPR, 2001).

Dentre os Chondrichthyes (tubarões e raias) relatados, a família Carcharhinidae apresenta o maior número de espécies (7) e entre os Actinopterygii a família Myctophidae (37) para a região oceânica (ou de plataforma), Sciaenidae (22) e Carangidae (17) para as regiões costeiras e oceânicas (CEM/UFPR, 2001).

Por sua vez, a ictiofauna do sistema estuarino da Baía de Paranaguá está composta por 167 espécies. Deste total, aproximadamente 66 espécies são explotadas por 71% dos pescadores. Todas as espécies apresentam seu ciclo de vida, ou parte dele, essencialmente associado com as águas costeiras e estuarinas (CORRÊA, 1987, 1992 e 2001 apud CEM/UFPR, 2001).

O sistema estuarino da Baía de Paranaguá, por se tratar de uma área intermediária entre os rios e o oceano, está diretamente relacionada com as migrações dos peixes (ZIJLSTRA, 1986 apud CEM/UFPR, 2001). Temperatura e salinidade da água (associadas à pluviosidade e às marés) são os principais fatores que afetam sua distribuição (CORRÊA et al., 1995a, CORRÊA, 2001 apud CEM/UFPR, 2001).

De acordo com CEM/UFPR (2001), o comportamento migratório das espécies presentes na região pode definir quatro categorias principais:

I. Oceânicas que visitam a região para desova. Geralmente, nestes casos, a região contribui principalmente como local de criação.

II. Oceânicas que realizam todas as atividades de adulto, incluindo reprodução, em áreas distantes da costa, porém exploram a área para alimentação e crescimento. Geralmente invadem a região nos estágios larvais e pós-larvais por mecanismos ainda muito pouco compreendidos. O período de permanência pode variar entre alguns meses até alguns anos.

III. Costeiras que migram para regiões oceânicas para desova e desenvolvimento larval. Contudo, estão presentes na região nos estágios de juvenil e adulto.

IV. Estuarinas residentes que ocorrem na região em todos os estágios de desenvolvimento. São predominantes, levando-se em consideração apenas os estágios adultos e juvenis e o

período do ano, as seguintes espécies (citadas por ordem de abundância):

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a) verão (dezembro, janeiro, fevereiro): Mugil curema/M.gaimardianus (paratis), Cathorops spixii (bagre amarelo), Netuma barba (bagre branco ou guiri), Menticirrhus americanus (betara preta), Centropomus parallelus (robalo-peva) e Cynoscion leiarchus (pescada branca); b) outono (março, abril, maio): Cynoscion leiarchus (pescada branca), Mugil curema/M.gaimardianus (paratis), Mugil liza/M.platanus (tainhas e tainhotas), Cathorops spixii (bagre amarelo), Macrodon ancylodon (pescada membeca) e Netuma barba (bagre branco ou guiri); c) inverno (junho, julho, agosto): Cynoscion leiarchus (pescada branca), Cynoscion acoupa (pescada cambucu), Menticirrhus americanus (betara preta), Mugil liza/M.platanus (tainhas e tainhotas), Netuma barba (bagre branco), Centropomus parallelus (robalo-peva), M.curema/M.gaimardianus (paratis) e Cathorops spixii (bagre amarelo); d) primavera (setembro, outubro e novembro): Mugil curema/M. gaimardianus (paratis), Micropogonias furnieri (corvina), Netuma barba (bagre branco), Cathorops spixii (bagre amarelo), Cynoscion leiarchus (pescada branca), Menticirrhus americanus (betara preta) e Sciadeichthyes luniscutis (bagre bacia ou cangatá). Os períodos de primavera e do outono demarcam o início e final do período reprodutivo para

a maioria das espécies ícticas (CORRÊA et al., 1995b apud CEM/UFPR, 2001).

Avifauna Em relação às aves, excelentes bioindicadores de impacto de derrames de petróleo em áreas

marinhas, cabe ressaltar que, embora o litoral do Paraná apresente uma pequena extensão, existe um grande número de espécies, aproximadamente 300 das 1600 existentes no Brasil. Nos ambientes sob influência marinha no Estado do Paraná a plataforma interna foi recentemente classificada como de extrema importância para a conservação das aves no Brasil, ao passo que os ambientes de baía receberam o status de muito importantes. Tal reconhecimento deve-se ao fato de que muitas aves migratórias usam essas áreas como ponto de parada, por haver reprodução de aves aquáticas coloniais e também por abrigar importantes sítios de alimentação para aves marinhas em geral (Avaliação e Ações Prioritárias para Zona Costeira e Marinha, 2002 apud CEM/UFPR, 2005).

Conforme KRUL (2001) apud CEM/UFPR (2005), as aves podem ser agrupadas em quatro comunidades diferenciadas, de acordo com os ambientes que ocupam no litoral: estuarina, de manguezal, da plataforma, subdividindo-se em costeiras e pelágicas, e a das praias oceânicas.

Cada comunidade de aves apresenta um conjunto particular de espécies, que refletem condições ambientais também peculiares. Porém, algumas aves apresentam maior flexibilidade comportamental, o que lhes permite uma distribuição mais ampla, podendo, dessa forma, contribuir para a riqueza total de espécies em mais de uma comunidade (CEM/UFPR, 2001).

As aves pertencentes à comunidade estuarina são aquelas que ocorrem em áreas abrigadas da baía e obtêm seu alimento das áreas areno-lodosas expostas durante a maré baixa ou de áreas temporária ou permanentemente alagadas, como por exemplo, as garças Egretta spp., socós Nycticorax spp., maçaricos migrantes do hemisfério Norte Actitis macularia, Charadrius semipalmatus, Tringa spp., Pluvialis dominica. No corpo aquoso pode-se citar os biguás Phalacrocorax brasilianus. As marrecas Amazonetta brasiliensis e Anas bahamensis e o pato-do-mato Cairina moschata freqüentam tanto as áreas aquosas como as lodosas para se alimentarem. Existem também aves que se reproduzem em alto-mar, mas alimentam-se nas baías, como o atobá (Sula leucogaster). É evidente que existem inúmeras outras espécies que se enquadrariam nessa comunidade, como as saracuras, os colhereiros, entre outras.

A comunidade de manguezal compreende as espécies que dependem desse ecossistema para alguma de suas necessidades, capturando seu alimento tanto no solo lodoso como nas árvores, pode-se citar, nesse caso, o papagaio-de-cara-roxa Amazona brasiliensis, a saíra-dourada-de-costas-pretas Tangara peruviana, mariquita Parula pitiayumi, bem-te-vi Pitangus sulphuratus, martim-pescador dos gêneros Ceryle e Chloroceryle, entre outras espécies.

As pertencentes à comunidade da plataforma continental podem ser subdivididas em costeiras e pelágicas ou oceânicas. As primeiras são aquelas que ocorrem nas proximidades da costa,

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utilizando tanto as águas rasas da plataforma como os ambientes de baía como áreas de alimentação, destacando-se espécies como o atobá Sula leucogaster, o tesoureiro Fregata magnificens, gaivota Larus dominicanus, consideradas residentes, os trinta-réis ou andorinhas do mar do gênero Sterna, consideradas migratórias. Já entre as espécies de aves pelágicas ou oceânicas mais características de alto-mar pode-se citar os albatrozes Diomedea spp. e os petréis Puffinus spp..

Na comunidade das praias oceânicas são observadas as aves migratórias, algumas com mais abundância como Calidris fusciollis e C. Alba, outras, com uma ocorrência menor, são os batuiruçus Pluvialis dominica e P. squatarola, o vira-pedra Arenaria interpres, o maçarico-de-colete C. melanotus e o maçarico-de-papo-vermelho C. canutus. Apenas um maçarico é residente, o Charadrius collaris, sendo sua população bastante reduzida.

Conforme relatório do CEM/UFPR (2005), existem cinco ilhas no litoral paranaense que representam importantes pontos de reprodução de aves associadas aos ecossistemas marinhos: Figueira, Itacolomis e, principalmente, o Arquipélago de Currais. O atobá Sula leucogaster, o tesoureiro Fregata magnificens e a gaivota Larus dominicanus são espécies residentes que se reproduzem apenas em dois pontos da costa paranaense, que são o Arquipélago de Currais e a Ilha da Figueira. Em ambientes de baía destacam-se a Ilha do Guará, localizada em frente ao Porto de Paranaguá, e a Ilha do Rato, localizada na entrada da Baía de Guaratuba. No relatório do CEM/UFPR (2001) foi citado que no entorno das Ilhas Gererê, observa-se um local de alimentação para a andorinha-do-mar Sterna spp. e para o biguá Phalacrocorax brasilianus.

Pode-se ainda comentar a existência de ilhas que servem como pontos de dormitório de algumas espécies de aves, um exemplo disso é a Ilha do Pinheiro, localizada em baía do mesmo nome, dentro do Parque Nacional do Superagüi, onde dormem papagaios-de-cara-roxa e biguás.

Interações Ambientais no Complexo Estuarino Lagunar de Iguape – Cananéia e Paranaguá

Uma vez conhecidos os principais componentes da área afetada nos itens acima, pretende-se

nesse item chamar a atenção para a interessante interação existente entre todos os meios existentes no Complexo Estuarino Lagunar de Iguape-Cananéia e Paranaguá, de maneira que qualquer alteração em um dos seus pontos altera toda a cadeia trófica estabelecida.

Conforme citado no relatório do CEM/UFPR (2001), estuários comportam-se como sistemas muito abertos ou interligados, apresentando trocas de matéria e energia com áreas continentais e marinhas adjacentes, isto é, não existem limites geográficos que possam determinar até onde vão as interações, pois o sistema é naturalmente dinâmico.

Os estuários destacam-se por sua alta produção biológica que ocorre como reflexo: (1) da alta diversidade de sistemas produtores (e.g. manguezais, fanerógamas submersas, algas bentônicas, marismas e fitoplâncton), (2) do abundante suprimento de nutrientes provenientes de aportes fluviais, pluviais e antrópicos, (3) da renovação d'água nos ciclos de maré, (4) da rápida remineralização e conservação de nutrientes através de uma complexa teia trófica, que inclui organismos detritívoros e filtradores (DAY et al., 1989 apud CEM/UFPR, 2001) e (5) da troca de nutrientes e outras propriedades biogeoquímicas entre o sistema bentônico e a coluna d'água estuarina, através dos processos de erosão e ressuspensão dos sedimentos de fundo (NICHOLS, 1986 apud CEM/UFPR, 2001).

Os manguezais constituem um dos sistemas mais produtivos do mundo (300 a 2000 gC/m2) (MANN, 1982 apud CEM/UFPR, 2001) e funcionam como habitats de criação, proteção e alimentação de diversas espécies de moluscos, crustáceos e peixes estuarinos e costeiros (MITSCH & GOSSELINK, 1986 apud CEM/UFPR, 2001), muitas das quais representam importantes recursos pesqueiros. Além disso, atuam na regulação dos ciclos químicos, influenciando na manutenção de nutrientes e material orgânico particulado na zona costeira (DAY et al., 1989 apud CEM, 2001).

As informações pretéritas sobre a comunidade planctônica na Baía de Paranaguá apontam o setor mediano, entre a Ponta do Teixeira e o Porto de Paranaguá, como um dos mais ricos em plâncton animal e vegetal. Contaminação por óleo e seus derivados teria efeitos tóxicos imediatos sobre todo o sistema planctônico e, conseqüentemente, sobre as demais comunidades biológicas

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marinhas que dele dependem como fonte de matéria orgânica ou como meio de dispersão (p.ex., larvas e ovos de invertebrados e peixes).

Os principais recursos explorados nos manguezais locais ou em suas proximidades imediatas são: o caranguejo-do-mangue Ucides cordatus, siris do gênero Callinectes, camarões dos gêneros Penaeus e Xiphopenaeus, juvenis de manjuba, o berbigão Anomalocardia brasiliana, a ostra-do-mangue Crassostrea rhizophorae, além de bivalvos do gênero Mytella, conhecidos por bacucus e sururus (MIRANDA, 2004 apud CEM/UFPR, 2005).

3.1.4 UNIDADES DE CONSERVAÇÃO

Devido a essas características biológicas citadas, houve necessidade de proteger com mais

intensidade a região em forma de unidades de conservação de proteção integral (ou seja, de uso restrito) e de uso sustentável. Atualmente existem no litoral paranaense como um todo, um total de 22 unidades de conservação federais, estaduais e municipais, formando um verdadeiro mosaico de diferentes categorias de manejo e um corredor biológico natural.

A Lei Federal nº 9985, de 18 de junho de 2000, que consolida o Sistema Nacional de Unidades de Conservação - SNUC, no seu Art. 7º, § 1º, diz: “O objetivo básico das Unidades de Proteção Integral é preservar a natureza, sendo admitido apenas o uso indireto dos seus recursos naturais, com exceção dos casos previstos nesta Lei.” E no § 2º estabelece que “O objetivo básico das Unidades de Uso Sustentável é compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável de parcela dos seus recursos naturais.”.

Devido à sua importância, o litoral paranaense recebeu reconhecimento internacional através de dois títulos da Unesco: o primeiro em 1993, passando a ser considerado como Reserva da Biosfera, denominada Serra da Graciosa - Vale do Ribeira, a primeira no Brasil; o segundo foi conferido em 1999, quando algumas dessas unidades foram incluídas no Sítio do Patrimônio Mundial Natural da Costa Sudeste.

Dentre as unidades de conservação abrangidas pela Reserva da Biosfera no Estado do Paraná encontram-se as unidades de conservação federais, como: a Área de Proteção Ambiental - APA de Guaraqueçaba, Estação Ecológica - ESEC de Guaraqueçaba, Parque Nacional - PARNA do Superagüi, PARNA de Saint-Hilaire/Lange, como também quatro Reservas Particulares do Patrimônio Natural - RPPN, a Reserva Natural Salto Morato, Sebuí, Morro da Mina e Águas Belas. Entre as estaduais, pode-se citar a ESEC da Ilha do Mel, o Parque Estadual do Marumbi, o Parque Estadual da Ilha do Mel, a APA de Guaratuba, a APA da Serra do Mar, a ESEC do Guaraguaçu, o Parque Estadual do Rio da Onça e a Floresta Estadual do Palmito.

Como Sítio do Patrimônio Mundial foram consideradas: a Estação Ecológica de Guaraqueçaba, o Parque Nacional do Superagüi, a Estação Ecológica Estadual da Ilha do Mel, o Parque Estadual do Marumbi e a Reserva Natural Salto Morato.

De acordo com a Lei nº 9985/2000, a Estação Ecológica tem como objetivo a preservação da natureza e a realização de pesquisas científicas (Art. 9º); o Parque Nacional tem como objetivo básico a preservação de ecossistemas naturais de grande relevância ecológica e beleza cênica, possibilitando a realização de pesquisas científicas e o desenvolvimento de atividades de educação e interpretação ambiental, de recreação em contato com a natureza e de turismo ecológico (Art. 11º) e Área de Proteção Ambiental é uma área em geral extensa, com um certo grau de ocupação humana, dotada de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais especialmente importantes para a qualidade de vida e o bem-estar das populações humanas, e tem como objetivos básicos proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais (Art. 15º).

Das 22 unidades de conservação da região, 06 foram diretamente atingidas pelo acidente do Navio Vicuña. As consideradas como de proteção integral, foram as seguintes: Estação Ecológica da Ilha do Mel, Parque Estadual da Ilha do Mel, Estação Ecológica de Guaraqueçaba e Parque Nacional do Superagüi. Aquelas consideradas como unidades de conservação de uso sustentável, ou seja, onde pode haver algum tipo de uso dos recursos naturais foram as Áreas de Proteção

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Ambiental de Guaraqueçaba, a federal e a estadual. Segue abaixo uma breve descrição sobre as mesmas.

ESTAÇÃO ECOLÓGICA DA ILHA DO MEL - A Estação Ecológica da Ilha do Mel foi criada pelo Decreto nº 5.454 de 21/09/82, com área de 2.240,69 ha. Situa-se na ilha de mesmo nome, município de Paranaguá, litoral sudeste do Estado, na entrada da baía de Paranaguá, entre as Latitudes Sul 25º29’e 25º34’32” e Longitudes Oeste 48º17’15” e 48º23’16”. Geologicamente, a Ilha do Mel é composta por duas partes ligadas por um istmo. A porção sudoeste é formada por vários morros interligados por planícies com cordões litorâneos e dunas, e a porção noroeste, mais extensa, é formada por um único morro e uma planície com cordões litorâneos. Seu relevo é de plano a forte ondulado, com altitudes que variam desde o nível do mar até altitudes de 150 metros. As áreas de planície são constituídas por um sistema de solo Podzol, com variações, e nas áreas de morro, geralmente de relevo montanhoso e escarpado, ocorrem solos Litólicos e Cambissolos. A Estação Ecológica situa-se em região de Floresta Atlântica (Floresta Ombrófila Densa) e possui cobertura vegetal que varia desde tipos predominantemente herbáceos, passando por agrupamentos arbustivos, densos ou abertos, até florestas bem desenvolvidas com dois estratos arbóreos, um arbustivo e um herbáceo. Nelas distinguem-se a vegetação das praias e dunas (Formações Pioneiras com Influência Marinha) e os brejos herbáceos entre os cordões litorâneos (Formações Pioneiras com Influência Fluvial). Nas Formações Pioneiras com Influência Flúvio-Marinha incluem-se os manguezais e as áreas de marismas, também chamados de “brejos salinos”, que na Ilha do Mel ocupam área pouco representativa, especialmente em comparação às áreas localizadas nas partes mais internas da Baía de Paranaguá. As maiores extensões de manguezais e marismas são encontradas na parte norte-oeste, especialmente nas desembocaduras dos pequenos rios da planície litorânea, e também entre Nova Brasília e no Morro do Miguel, no Saco do Limoeiro. Ainda define-se na Ilha do Mel a floresta dos cordões litorâneos (Floresta Ombrófila Densa das Terras Baixas) e com menor expressão, a vegetação secundária em vários estágios de regeneração (capoeirinha, capoeira e capoeirão). Sua fauna abriga várias espécies ameaçadas de extinção, como a jaguatirica e o papagaio-de-cara-roxa. É administrada pelo Instituto Ambiental do Paraná.

PARQUE ESTADUAL DA ILHA DO MEL - O Parque Estadual da Ilha do Mel foi criado através do Decreto Estadual no 5.506 de 21/03/2002, com área de 338,70 ha atendendo aos preceitos de conservação, pois neste segmento sul da ilha ocorre a maior ocupação por habitantes nativos e antigos veranistas que ali construíram suas casas de lazer. Neste segmento sul da ilha foram excluídas as zonas de ocupação compreendidas por: Núcleos de Equipamentos Comunitários (3,48 ha); Áreas para Acampamento (3,57 ha) e as Zonas de Ocupação, propriamente ditas, com 120,46 ha. Nos morros da parte sul da Ilha, hoje Parque Estadual, especialmente no Morro do Miguel ou Bento Alves, estão presentes alguns rios sem denominação específica e com pequena expressão cartográfica. No entanto, são importantes rios para abastecimento de água da ilha, tendo em vista um sistema de captação da água proveniente destes mananciais. A ilha passa por contínuo processo de alteração, por um lado recebendo areias e crescendo sobre o oceano, mais precisamente em frente ao Morro do Farol; por outro lado, sendo erodida em suas bordas com a água que corta barrancos e quase dividindo a ilha em duas porções, principalmente na região do istmo, entre o Farol e Nova Brasília. São mais de dez belíssimas praias que atraem o visitante, principalmente na alta temporada de verão, destacando-se entre elas as praias do Farol, Forte, Limoeiro, Cedro, Praia do Miguel, Praia de Fora e Prainha. A vegetação da parte leste-sul da ilha é composta principalmente por Floresta Ombrófila Densa Sub-Montana. Nos morros, especialmente do Meio, do Miguel e Bento Alves, formados por rochas antigas do complexo cristalino brasileiro, ocorre esta formação fitogeográfica. Em alguns trechos são encontradas áreas com vegetação secundária em diferentes estágios de desenvolvimento, onde em certas ocasiões torna-se difícil a distinção entre as florestas secundárias mais desenvolvidas e as florestas primárias, mais ou menos perturbadas por extração seletiva de espécies. A fauna descrita na Estação Ecológica não encontra o mesmo refúgio no Parque devido a maior concentração urbana em seu entorno. É administrada pelo Instituto Ambiental do Paraná.

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ESTAÇÃO ECOLÓGICA DE GUARAQUEÇABA – Foi criada em 1982 pelo Governo Federal, através do Decreto nº 87.222, de 31 de maio de 1982. Localiza-se na sua maior parte no município de Guaraqueçaba. Abrange aproximadamente 13.000,00 ha de manguezais (Formações Pioneiras de Influência Flúvio-Marinha) e algumas manchas de restinga (Formações Pioneiras de Influência Marinha), como também, em menor intensidade, a Floresta Ombrófila Densa das Terras Baixas, presentes em algumas ilhas dos municípios de Guaraqueçaba e Paranaguá, como Laranjeiras, Povoçá, Rabelo, Galheta e Ilha da Banana. Sua importância é a de resguardar áreas de manguezais intactas como um banco genético de espécies de crustáceos e moluscos, servindo ainda como área de alimentação para muitas espécies de aves, como o papagaio-de-cara-roxa, colhereiros, garças, socós e para o guaxinim ou mão-pelada. É administrada pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis.

PARQUE NACIONAL DO SUPERAGÜI – Foi criado em 1989, com 21.400,00 ha, pelo Decreto Federal nº 97.688, de 20 de abril, e ampliado em 1997, pela Lei Federal nº 9.513, de 20 de novembro, tendo hoje 33.988,00 ha. Localiza-se totalmente no município de Guaraqueçaba e abrange parte das Ilhas do Superagüi e Peças, integralmente as Ilhas do Pinheiro e Pinheirinho e, no continente, o Vale do Rio dos Patos. No seu interior existe a vegetação de praias e dunas (Formações Pioneiras de Influência Marinha), manguezais (Formações Pioneiras de Influência Flúvio-Marinha), caxetais (Formações Pioneiras de Influência Fluvial), Floresta Ombrófila Densa de Terras Baixas e Sub-Montana. Ressalta-se que, por sua importância cultural e paisagística, em 1970 Superagüi foi inscrita sob o nº 27 no Livro de Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico da Divisão do Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural do Paraná, concretizando-se o Tombamento somente em 1985. O Parque abriga inúmeras espécies ameaçadas de extinção, entre elas, espécies endêmicas, como o papagaio-de-cara-roxa e o mico-leão-de-cara-preta. Além disso, dentro de seus limites existem sítios pré-históricos, que preservam a história dos homens dos sambaquis, e sítios históricos, que preservam a história da colonização suíça na Ilha do Superagüi e adjacências. Apresenta a maior extensão de praia virgem no Estado do Paraná, chamada Praia Deserta, que por manter o seu estado original, recebe anualmente aves migratórias. É administrado pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis.

ÁREAS DE PROTEÇÃO AMBIENTAL DE GUARAQUEÇABA – Existem duas APA, uma em nível federal, administrada pelo IBAMA, e a outra em nível estadual, administrada pelo IAP. A primeira foi criada pelo Decreto nº 90.883, de 31 de janeiro de 1985, com 314.000,00 ha, passando, em 1997, a ter 296.000,00 ha, devido à ampliação do Parque Nacional do Superagüi. A segunda foi criada pelo Decreto Estadual nº 1.228, de 27 de março de 1992, com 191.595,50 ha. A APA Estadual abrange o município de Guaraqueçaba, em toda a sua extensão. Já a APA Federal abrange áreas dos municípios de Guaraqueçaba, Antonina, Paranaguá e Campina Grande do Sul. De qualquer forma, as duas APA apresentam formações de manguezais (Formações Pioneiras de Influência Flúvio-Marinha), restingas (Formações Pioneiras de Influência Marinha), caxetais (Formações Pioneiras de Influência Fluvial), Floresta Ombrófila Densa de Terras Baixas, Sub-Montana, Montana e Alto-Montana, além das áreas aquáticas estuarinas, abrangendo as baías de Pinheiros, Guaraqueçaba, Paranaguá e Antonina. São aproximadamente 50 comunidades que fazem parte da APA Federal de Guaraqueçaba. Existem, aproximadamente, 78 sambaquis na APA e inúmeros animais ameaçados de extinção, tais como a onça pintada, a onça parda, jaguatiricas, gatos-do-mato, gavião-pombo, o papagaio-de-cara-roxa, entre outras.

3.1.5 ÁREA INDÍGENA DA ILHA DA COTINGA

As informações sobre a Área Indígena da Ilha da Cotinga basearam-se em ALMEIDA

MUNIZ (2005), da Fundação Nacional do Índio – FUNAI (Anexo 074). O Governo Federal deflagrou, através da FUNAI, o Processo Administrativo nº 550/98, de

Regularização Fundiária da Terra Indígena da Ilha da Cotinga, Município de Paranaguá, Estado do Paraná, com área de 1.685,00 ha, conforme Portaria nº 256/MJ, de 28.05.92.

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Por força da mencionada Portaria Ministerial, restou declarada como de posse indígena, para efeito de demarcação, a área indígena da Ilha da Cotinga, com superfície aproximada de 1.685,00 ha e perímetro também aproximado de 40.839,00 metros. Devidamente demarcada, foi homologada pelo Presidente da República, através do Decreto nº 92, de 16 de maio de 1994, e caracterizada como de posse imemorial do Grupo Guarani-M’bya, com um total de 1.701,20 ha e perímetro de 41.895,73 m, abrangendo as ilhas da Cotinga e Rasa da Cotinga.

Três aspectos da vida guarani expressam uma identidade que dá especificidade, forma e cria um "modo de ser guarani": a) o ava ñe'ë (ava: homem, pessoa guarani; ñe'ë: palavra que se confunde com "alma") ou fala, linguagem, que define identidade na comunicação verbal; b) o tamõi (avô) ou ancestrais míticos comuns e c) o ava reko (teko: "ser, estado de vida, condição, estar, costume, lei, hábito") ou comportamento em sociedade, sustentado em arsenal mítico e ideológico. Estes aspectos informam ao ava (Homem Guarani) como entender as situações vividas e o mundo que o cerca, fornecendo pautas e referências para sua conduta social (SUSNIK, 1980:12 apud MUNIZ, 2005).

Os Guarani hoje em dia denominam os lugares que ocupam de tekoha. O tekoha é, assim, o lugar físico – terra, mato, campo, águas, animais, plantas, remédios, entre outros – onde se realiza o teko, o “modo de ser”, o estado de vida guarani. Engloba a efetivação de relações sociais de grupos macro familiares que vivem e se relacionam em um espaço físico determinado. Idealmente este espaço deve incluir, necessariamente, o ka’aguy (mato), elemento apreciado e de grande importância na vida desses indígenas como fonte para coleta de alimentos, matéria-prima para construção de casas, produção de utensílios, lenha para fogo, remédios, entre outros. O ka’aguy é também importante elemento na construção da cosmologia, sendo palco de narrações mitológicas e morada de inúmeros espíritos. Indispensáveis no espaço guarani são as áreas para plantio da roça familiar ou coletiva e a construção de suas habitações e lugares para atividades religiosas.

Deve ser um lugar que reúna condições físicas (geográficas e ecológicas) e estratégicas que permitam compor, a partir da relação entre famílias extensas, uma unidade político-religiosa-territorial. Idealmente um tekoha deve conter, em seus limites, equilíbrio populacional, oferecer água boa, terras agricultáveis para o cultivo de roçados, áreas para a construção de casas e criação de animais. Deve conter, antes de tudo, matas (ka'aguy) e todo o ecossistema que representa, como animais para caça, águas piscosas, matéria-prima para casas e artefatos, frutos para coleta, plantas medicinais, entre outros.

O tekoha deve ser considerado em face da realidade contemporânea que conduziu os índios a valorizá-lo e concebê-lo da forma como o fazem, com a consciência de que a recuperação plena do território do passado é uma empreitada inatingível. Portanto, mais do que ver os aspectos político-religiosos como externos às condições históricas de sua articulação, nos parece oportuno ver o tekoha como resultado e não como determinante, como um processo continuado de ajustamento situacional em torno da determinação de uma relação territorial entre índios e brancos. Assim sendo, o tekoha seria uma unidade política, religiosa e territorial, que deve ser definida em virtude das características efetivas – materiais e imateriais – de acessibilidade ao espaço geográfico por parte dos Guarani.

Vista sob este prisma, a relação entre os Guarani e a terra ganha outro significado, inscrito na tradição cosmológica e na historicidade. Enfatizando-se a noção de tekoha enquanto espaço que garantiria as condições ideais para efetuar essa relação, os índios procuram reconquistar e reconstruir espaços territoriais étnica e religiosamente exclusivos a partir da relação umbilical que mantêm com a terra, ao passo que flexibilizam e diversificam a organização das famílias extensas, podendo assim manter uma relação articulada e dinâmica com o território mais ampliado, neste caso como espaço contínuo.

Cabe salientar o fato de que o vínculo osmótico entre os índios e a terra não é genérico, não existindo, portanto, uma relação abstrata entre Guarani indiferenciados e lugar também indiferenciado; ao contrário, o que se estabelece é uma relação entre famílias extensas específicas que se vinculam historicamente a lugares precisos, e que, a interrupção da continuidade ocupacional provoca exaltação da noção de origem antiga (ymaguare), baseada no sentimento de autoctonia, e a produção (quando as condições o permitem) de um efeito circulação, quando procuram se manter o

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mais próximo possível dos lugares de seus antepassados, deslocando-se circularmente ao redor deles sempre que são expulsos ou importunados pelo branco. A circulação ao redor de lugares dos quais por alguma razão foram afastados, permite aos Guarani dar continuidade à manutenção do equilíbrio cósmico, embora muitas vezes de modo fragmentário, o que permite minimamente a relação telúrica com o mundo. São assíduas e freqüentes as atividades religiosas guarani, com práticas de cânticos, rezas e danças que, dependendo da localidade, da situação ou das circunstâncias, são realizados cotidianamente, iniciando-se ao cair da noite e prolongando-se por várias horas. Os rituais são conduzidos pelos ñanderu que são líderes e orientadores religiosos; contemplam necessidades corriqueiras como colheita da roça, ausência ou excesso de chuva. A cerimônia em si, dirigida por um líder religioso, tem início ao cair do sol e finda na aurora do dia seguinte. Este xamã deve conhecer o mborahéi puku ou “canto comprido”, cujos versos, que não se repetem, não podem ser interrompidos depois de iniciada a cerimônia. A cada verso entoado pelo ñanderu a comunidade o repete, sempre acompanhados pelos mbaraka confeccionado e usado por homens e os takuapu usados por mulheres. Ao amanhecer, terminado o mborahéi puku (canto comprido), há o batismo da colheita (mandioca, cana, abóbora, batata doce, milho, entre outros), que permaneceu depositada no altar. Na noite seguinte a cerimônia do avati kyry continua com cantos e danças mais profanos, os kotyhu e os guahu, por toda a comunidade e por muitas visitas que participam da cerimônia.

3.1.6 MEIO SÓCIO-ECONÔMICO

A pré-história

Para melhor entender a história do litoral paranaense faz-se necessário reportar-se à pré-

história, pois somente assim será compreendida a real importância do litoral paranaense como fonte de informações sobre as raízes e costumes da população, levando-se em conta, ainda, que os sítios arqueológicos são considerados um patrimônio nacional e muitos podem estar sofrendo algum tipo de alteração sem que estejam devidamente cadastrados e estudados, fragmentando a história dos paranaenses e, conseqüentemente, dos brasileiros.

São inúmeros os sambaquis existentes no litoral paranaense, sendo de extrema importância para o registro das informações sobre os paleomeríndios dessa região, como também para obter dados sobre aspectos geológicos, uma vez que se concentram próximos à orla ou às margens de rios.

Sambaqui é um lugar que já foi povoado por populações indígenas que, explorando recursos do litoral, deixaram ali uma acumulação de conchas e moluscos, restos de sua dieta alimentar. Na sua maior parte, são formados por diversas camadas arqueológicas provenientes de sucessivas ocupações de culturas distintas, intercaladas por períodos de abandono, quando ocorre a formação de solo ou deposição sedimentar marinha (CEM/UFPR, 2001).

Segundo NASCIMENTO JUNIOR (1957), Ermelino de Leão referia-se aos homens dos sambaquis como “sambaquibas” e que se tratava de uma raça primitiva, sucedida pelos Tupi na posse do litoral ao Sul de Cabo Frio até Santa Catarina. Existiam diferenças físicas e culturais entre eles, sendo os homens do sambaqui de porte mais avantajado do que os Tupi, conforme comparações realizadas entre ossos e calota craniana dos mesmos.

Segundo BIGARELLA (1976), que estudou alguns sambaquis para obter informações sobre o nível do mar em diferentes épocas, os sambaquis da planície costeira do Paraná apresentam idades desde 1540 a 7803 anos.

BLASI et al. (1989), ressalta em seus estudos de cadastramento de sambaquis na região de Guaraqueçaba que estes são encontrados normalmente sobre as restingas, próximos aos manguezais ou encostados nas rochas cristalinas, ou mesmo sobre elas, não sendo fácil identificá-los devido à vegetação que os recobre. Conforme PARELLADA e GOTTARDI NETO (1994), também em estudos sobre os sambaquis de Guaraqueçaba, de uma forma geral, estes mostram uma significativa variação na sua composição malacológica, predominando as valvas de Crassostrea sp. (ostra), Anomalocardia brasiliana (berbigão), Mytella sp. (bacucu) e Thais haemastoma (caramujo).

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Encontraram ainda, outros itens alimentares, como: coquinhos carbonizados, escamas, otólitos, vértebras de peixes e ossos de mamíferos, como também artefatos diferenciando-se entre lâminas de machado e lascas, principalmente de diabásio e quartzo.

Tais sambaquis mais tarde serviram de referência para a distribuição dos índios Carijó, que procuravam instalar-se nas proximidades destes como uma reverência aos seus ancestrais. Os sambaquis eram o testemunho de sua genealogia e quanto mais camadas no sambaqui, mais nobre a estirpe. Existia um cacique para cada tribo, mas também um chefe maior, o Chefe da Nação. Embora as referências apontem que toda a costa, desde Cananéia, em São Paulo, até São Francisco do Sul, em Santa Catarina, pertencia à Nação Carijó, muitas eram as tribos distribuídas por toda essa área, pela costa, pelas ilhas e ribanceiras de rios, no entanto, a sede da Nação era em Paranaguá, por ser ali a moradia do Chefe da Nação e seus descendentes, inclusive, o rio Ytim-Berê também lhe pertencia e só aos de sua descendência podiam carijar naqueles manguezais, então, Itiberê quer dizer (Y= rio, TIM= baixios, BERÊ= Grande Cacique) rio de baixios pertencentes ao Chefe da Nação (CONSELHO MUNICPAL DE CULTURA apud FERREIRA DE FREITAS, 1999). Por muitos anos esse rio, que assumiu uma grande importância na colonização de Paranaguá, foi chamado de Taguaré (rios de muitos guarás) por ter sido assim entendido pelos brancos, no entanto, ao descobrir-se como os índios realmente o chamavam, passou imediatamente a ser chamado de Itiberê (FERREIRA DE FREITAS, 1999).

A história

Segundo VIEIRA DOS SANTOS (1850), os índios Carijós habitavam todo o litoral

paranaense. Esse mesmo autor ressaltou que a Nação Carijó habitava desde os montes de Juréia, ou desde Cananéia, no Estado de São Paulo, até Santa Catarina. A controvérsia seria apenas na divisa do Estado do Paraná com São Paulo, especificamente na região de Superagüi, onde MARTINS (1939) defende que eram os índios Tupiniquins os habitantes. Sejam Carijós ou Tupiniquins, todos foram extintos durante o processo de colonização.

Conta VIEIRA DOS SANTOS (1850) que toda a colonização do complexo-estuarino-lagunar de Iguape-Cananéia e Paranaguá iniciou em Cananéia, em 1501, a mando do Rei de Portugal. Quando chegou Martim Affonso de Souza a Cananéia, em 1531, lá encontrou portugueses das primeiras expedições, já entrosados com os índios.

Segundo ROCHA POMBO (1929), com a chegada da primeira expedição colonizadora a São Vicente, pelos idos de 1532, a Baía de Paranaguá chamou a atenção. Os colonos de São Vicente e Cananéia vinham por canoas e outros tipos de embarcação ao lagamar, fazendo a transpoisção dos produtos por terra na região de Ararapira, já que ainda não existia o Canal do Varadouro.

Em 1549, quando o alemão Hans Staden procurou abrigo em Superagüi, após o naufrágio da expedição espanhola com destino ao Rio da Prata, já encontrou portugueses e índios (MARTINS, 1939).

Segundo FERREIRA DE FREITAS (1999) o povoamento do litoral de Paranaguá começou por volta de 1550, na Ilha da Cotinga, servindo de ponto de referência das buscas de ouro. Duas décadas depois foi conquistada a margem esquerda do Rio Itiberê, habitada pelos índios Carijó.

Em 29 de julho de 1648, o povoado foi elevado à categoria de Vila, passando a chamar-se Vila de Nossa Senhora do Rosário de Paranaguá, sendo seu fundador Gabriel de Lara. Em 1656 foi criada a Capitania de Nossa Senhora do Rosário de Paranaguá. Em 1710, Paranaguá perdeu a regalia de sede da Capitania, pois esta foi incorporada à Capitania de São Paulo. Em 1724 Paranaguá tornou-se sede da 2a. Comarca da Capitania de São Paulo. Em 1842 foi elevada à categoria de cidade, bem como Curitiba. Em 1853 a Comarca de Curitiba, na Província de São Paulo, foi elevada à categoria de Província, passando a chamar-se Província do Paraná.

O Porto de Paranaguá primeiramente era chamado de Porto de Nossa Senhora do Rosário, na parte sul da rua da praia, à curta distância da Igreja Matriz. Devido ao seu crescimento, mudou-se para a foz do Rio Itiberê e, depois, para a enseada do Gato, denominando-se Porto do Gato devido ao fato de pertencer essa área a um descendente do bandeirante Manuel da Borba Gato. Em 1873 o Porto foi melhorado e, em 1874, foi proposto que passasse a denominar-se Dom Pedro II

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(FERREIRA DE FREITAS, 1999). Em 23 de maio de 1917, através do Decreto no 6.053, a concessão do Porto foi transferida para o Governo do Estado do Paraná, estando a administração do Porto sob responsabilidade da Autarquia Estadual APPA. Esta concessão perdura até hoje, tendo sido revisada e consolidada através do Decreto Federal no 22.021 (de 27/10/1932), do Decreto Estadual no 686 (de 11/07/1947), que dispõe sobre a organização do Porto e cria o órgão estadual Administração do Porto de Paranaguá, e do Decreto Federal no 26.398 (de 23/02/1949), através do qual o Governo Federal formalizou oficialmente a concessão por 60 anos dos portos de Paranaguá e Antonina ao Governo Estadual. A ampliação do Porto iniciou-se em 24 de novembro de 1926, tendo sido inaugurada oficialmente em 17 de março de 1935. Em 1968 foi inaugurada a BR 277, ligando Paranaguá a Curitiba, auxiliando no desenvolvimento das atividades portuárias. Em 10 de novembro de 1971 o órgão estadual de administração do Porto teve sua denominação alterada para Administração dos Portos de Paranaguá e Antonina (APPA). O contrato de concessão que havia se iniciado em 1949 foi substituído pelo Convênio de Delegação no 037/2001, celebrado em 11 de dezembro de 2001, entre o Estado do Paraná e a União, e que estendeu a concessão por mais 25 anos, a partir de janeiro de 2002. Esse novo contrato vigora, portanto, até 1º de janeiro de 2027, sendo prorrogável, na forma da Lei no 9.277, de 10 de maio de 1996 (Fonte: página da APPA na internet: www.pr.gov.br/portos).

Um importante acontecimento para o Complexo Estuarino de Paranaguá foi a fundação da colônia agrícola suíça na península de Superagüi, por Carlos Perret Gentil (MARTINS, 1939). Segundo BOUTIN (1996), as famílias suíças construíram suas casas com rochas e argamassa de sambaquis locais e fizeram plantação de café, uva, arroz e banana na Ilha do Superagüi, destacando-se como líder William Michaud, o qual deixou muitos descendentes na região e telas por ele pintadas sobre as paisagens naturais, que fazem parte do acervo do Museu Paranaense, em Curitiba, e em Museu na Suíça. Houve também uma colônia alemã no Município de Guaraqueçaba, nas proximidades da comunidade de Serra Negra e que, segundo MARTINS (1939), fracassou em 1832.

A fundação de Antonina data de 1714, embora os primeiros povoadores tenham surgido de 1648 a 1654. O acesso principal sempre foi via marítima; somente em 1972 foi aberta a PR 405, ligando Guaraqueçaba a Antonina.

O Município de Pontal do Paraná é novo, foi criado em 1995, sendo formado por uma parte do balneário que pertencia a Paranaguá, por isso, sua história mescla-se com a de Paranaguá.

Toda essa história ainda faz parte da vida das pessoas que vivem no litoral e também passa a fazer parte dos pontos turísticos dessas cidades.

Em Paranaguá, a Igreja de Nossa Senhora do Rocio, no final do cais do porto, foi construída em 1813. A Igreja de São Benedito data de 1784, foi construída pelos escravos, sendo tombada pelo Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, em 1962, e totalmente restaurada em 1967. É considerada entre as melhores e mais autênticas edificações populares do colonial brasileiro. A Igreja de Nossa Senhora do Rosário é considerada como a primeira edificada no Paraná. Foi construída entre 1575-1578 e tombada pelo Patrimônio Histórico e Artístico do Paraná em 1967. Além dessas edificações, outras existentes no centro histórico merecem destaque: o Teatro da Ordem, o Palácio Visconde de Nacar, o Museu de Arqueologia e Etnologia (da UFPR), que era o Colégio dos Jesuítas, fundado em 1708, o Mercado Municipal, inaugurado em 1859, e o prédio do Instituto Histórico e Geográfico de Paranaguá, antiga sede da Casa Escolar Humanitária, construído em 1896.

Antonina conta com três igrejas em seu acervo: a Matriz de Nossa Senhora do Pilar, de São Benedito e do Bom Jesus do Saivá. A primeira teria sido construída em 1714 e a última é um monumento histórico do século XVIII, cuja construção teve início entre os anos de 1789 e 1817. Esse monumento foi tombado em 1970 e completamente restaurado em 1976. Além dessas igrejas, merece registro a Fonte da Carioca, que abasteceu a cidade de água de 1867 a 1930, sendo tombada pelo Patrimônio Histórico e Artístico do Paraná, em 1969. Ainda pode-se citar a Estação Ferroviária e o Teatro Municipal, construído na metade do século XIX.

Em Guaraqueçaba, apesar da descaracterização de seus prédios históricos, pode-se observar a Igreja do Nosso Senhor do Bom Jesus dos Perdões e o casarão, atual Centro de Visitantes do IBAMA e da Fundação Brasileira para a Conservação da Natureza - FBCN, que data de 1870,

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sendo restaurado em 1985, com recursos do Fundo Mundial para a Vida Selvagem – WWF. Também existe o prédio da Antiga Câmara de Vereadores, com águias esculpidas em destaque e duas fontes d’água, bem como ruínas de antigas áreas de processamento do arroz, além das ruínas da colonização suíça na Ilha do Pinheiro e Ilha do Superagüi.

Aspectos sócio-econômicos e culturais das comunidades atuais

Pelo acima exposto, de forma geral, as populações do litoral paranaense são resultado da

miscigenação entre índios, colonizadores europeus, predominando os portugueses, e negros. Sua maneira de viver ainda prende-se muito ao passado, embora já ocorra uma nítida

modificação em seus hábitos, principalmente em Paranaguá, onde a urbanização foi maior. O município de Paranaguá conta hoje com, aproximadamente, 127.339 habitantes; Pontal do

Paraná com 14.297, Antonina com 19.174 e Guaraqueçaba com 8.288 (Fonte: página do IBGE na internet: www.ibge.gov.br).

CUNHA e ROUGELLE (1989) comentam que a forma de organização econômica dessas comunidades rurais baseava-se na pesca e/ou lavoura, desenvolvidas em moldes domésticos, alternando-se conforme a época, sendo, tanto uma como outra atividade, exploradas a partir das especificidades do ambiente, mediante tecnologia rústica ou artesanal.

Os primeiros colonizadores que se estabeleceram na região desenvolviam, sobretudo, atividades agrícolas, sendo a pesca considerada apenas como uma parte complementar da subsistência (ROUGEULLE, 1989 apud CEM/UFPR, 2001). Nos dias de hoje, este cenário econômico está modificado e grande parte da população local depende significativamente da pesca.

O Litoral Paranaense ocupa uma área correspondente a 3,04% da área total do Estado e consolidou-se nas suas atividades econômicas pela sua posição estratégica de corredor exportador, devido à existência do Porto de Paranaguá. Considera-se este como um dos principais terminais marítimos do País, sendo o maior do sul do Brasil, atuando principalmente na exportação de grãos. Sua área de influência abarca todo o Estado do Paraná, grande parte dos Estados vizinhos e o Paraguai, sendo interconectado por rodovias e estradas de ferro que possibilitam o acesso ao terminal marítimo. O Porto é responsável pela movimentação de milhões de toneladas de carga por ano. No ano de 2003 foram movimentadas 33.556.427 toneladas de mercadorias, somadas as importações e exportações, e divididas entre: carga geral (6.252.530 t), granéis líquidos (4.325.989 t) e granéis sólidos (22.977.908 t) (Fonte: página da APPA na internet: www.pr.gov.br/portos). Em Antonina foi, recentemente, reativado o Porto – Terminal Barão de Teffé, que, no apogeu da erva-mate, era considerado o 4º do Brasil. Atualmente existe também o Terminal da Ponta do Félix, considerado o mais moderno terminal para cargas refrigeradas da América do Sul.

Além das atividades portuárias a região caracteriza-se também pelas atividades turísticas de suas cidades históricas, já que Paranaguá, Antonina e Guaraqueçaba representam os marcos das primeiras ocupações no Estado do Paraná, conforme relatado no item sobre a história da região. Aliado a isso, as atividades turísticas também se desenvolvem em razão da conservação dessa região, que possui um verdadeiro mosaico de unidades de conservação. Segundo CEM/UFPR (2001), o atual estado de conservação dos manguezais do Paraná é um resultado do próprio processo de ocupação do Estado, já que os principais núcleos urbanos e as atividades agrícolas e industriais concentraram-se, depois da colonização pioneira do litoral, no primeiro planalto.

Resumindo, hoje, os padrões de ocupação, organização e dinamismo da região estão estreitamente vinculados às atividades portuárias, de turismo, pesca e comércio.

Mesmo assim, existe ainda um perfil para as atividades agrícolas de pequeno porte, baseadas principalmente na cultura do arroz, feijão, milho, banana, mandioca, além de algumas culturas não convencionais, como é o caso do gengibre. A atividade pecuária restringe-se aos bubalinos, bovinos e suínos, sendo que a bubalinocultura ficou restrita a Antonina e Guaraqueçaba.

Voltando à questão da pesca na Baía de Paranaguá sabe-se que é a ocupação principal e/ou secundária de mais de 70% da população litorânea, com a tendência geral ao abandono de outras atividades para dedicarem-se exclusivamente a ela (SPVS 1992 e CORRÊA et al. 1997 apud CEM/UFPR, 2001). A atividade pesqueira caracteriza-se por duas situações distintas: a pesca

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oceânica, de maior valor comercial, e a pesca no interior das baías, desenvolvida de forma artesanal. Os moradores das vilas, localizadas no continente ou em ilhas, fazem dela a principal fonte não só de alimentação quanto de recursos naturais capturados para comercialização. O camarão sete barbas, a tainha e o robalo estão entre as espécies mais capturadas. Segundo dados da Prefeitura de Paranaguá, o camarão sete barbas é um dos principais produtos comercializados pelo município (CEM/UFPR, 2001).

A pesca oceânica, apesar de ser feita com barcos a motor, não é considerada uma pesca de grande escala, como a realizada pelo Estado de Santa Catarina, no entanto, possui grande expressão regional, tanto em termos do volume quanto de emprego que gera. A pesca é realizada pela população local principalmente na área estuariana e em mar aberto é praticada, sobretudo, pelos moradores de comunidades que apresentam uma comunicação com o mar-aberto, tais como a Vila das Peças, Barra do Superagüi e Barra do Ararapira.

Desde meados da década de 90 os moradores de algumas localidades passaram a dedicar-se à maricultura. Assim, em Europinha, Amparo e comunidades da Ilha Rasa e Ilha das Peças, há cultivo de ostras e na Ilha do Mel de mexilhões. Na Baía de Paranaguá encontra-se também um cultivo comercial de camarão.

Atividades realizadas na Área Indígena da Ilha da Cotinga

Parte da Ilha da Cotinga foi transformada em Área Indígena abrigando os índios Guarani

M’bya, onde, segundo ALMEIDA MUNIZ (2005), a agricultura, a pesca e a caça destacam-se entre as atividades da sua economia, praticadas sempre que possível. Destacando-se também a atividade de cestaria ou comumente conhecida como produção de artesanato, com participação do ethos familiar, particularmente pela difusão da cultura guarani e o seu modo de ser. Praticam uma economia de subsistência, marcada pela distribuição e redistribuição dos bens produzidos, coletados ou retirados dos meio, como a pesca e a extração vegetal, na qual relações de produção econômica, seja qual for a atividade, são pautadas por vínculos sociais definidos pelo parentesco. A “propriedade” (uso exclusivo) das roças e o consumo dos produtos é da família elementar, depois do nascimento dos filhos do casal, o que não exclui distribuição de bens produzidos ou adquiridos, serviços nas roças do sogro e a realização de mutirões dentro dos grupos macro familiares.

As dimensões dessas roças são relativamente reduzidas. Não superam 1,5 a 6,0 ha por unidade familiar. Nela, todos os familiares participam – segundo uma divisão de gênero do trabalho – com encargos e atividades próprias a um e a outro. Plantam milho (avati morot e avati tupi), mandioca (mandi’o), batata doce (jety), cana-de-açúcar (takuare’e), abóbora, (andai), mamão, laranja, banana (pakova), amendoim (manduvi), urucum (yruku), vários tipos de feijão de árvore (kumanda), arroz, feijão e outros produtos destinados à alimentação da família e espécies utilizadas como remédios (pohã ñana). A sobrevivência guarani tem sido garantida por esses roçados, base de sua economia, mesmo com as possibilidades de mudanças motivadas pelo contato, seja em relação à “changa”, seja em relação ao acesso à tecnologia moderna. Apenas uma variedade de milho, o avati tupi (milho amarelo) é plantado para comercialização. Esta variedade se diferencia do avati morot (milho branco), considerada planta sagrada que não deve ser utilizada para comércio, mas que é elemento determinante nas cerimônias anuais do avati kyry, que é o batismo do milho e das plantas novas.

Cabe às mulheres a tarefa de pilar o milho e preparar a chicha, fazer a chipa, uma espécie de bolo de milho. A variedade de tipos e formas de preparação do milho é grande: produzem avatiku’i (farinha de milho), hu’ikyra (farinha de milho com banha), hu’i rovaja (farinha de milho com mandioca, cozida na panela sem folha de plantas), chipa mbixi (feita no fogo, embrulhada em folha de plantas, em geral bananeira), mbeju (farinha de milho amassada na panela), avati mbixi (milho verde assado), chipa kukui (do milho branco, chipa guasu), chipa perõ (milho assado feito bolo com a mão que depois vai para água quente), chipa jetyiru (milho misturado com batata doce, como chipa perõ), mbaipy (mingau de milho), kãguyjy miri (milho ralado e levado ao fogo com água), avati pororo (pipoca). O mesmo acontece com a mandioca, que apesar de não ser uma planta sagrada é também bastante apreciada pelos Guaranis e que tem presença garantida em sua

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alimentação. Preparam a mandioca de diferentes formas como pirekai (mandioca assada), pireti (mandioca assada sem casca), mandi’o mimoi (mandioca cozida), karaku (chicha de mandioca). Além disso, a batata doce (jety) e a cana-de-açúcar (takuare’e) também são apresentadas sob vários aspectos; os quatro produtos são muito apreciados no preparo do kãguy ou chicha, uma bebida fermentada muito apreciada por estes indígenas e que são consumidas em grande quantidade em suas festas profanas e cerimoniais religiosos.

Conhecimentos tradicionais dotam os Guarani de aguçada sapiência no trato com os espaços disponíveis, mesmo em condições adversas como são os casos dos acampamentos que reivindicam a ocupação plena de seus tekoha como visto acima, de modo a usufruir ao máximo da área disponível. Praticam o que os agrônomos denominam de sistema agroflorestal, no qual combinam atividades de caça, pesca, coleta e agricultura de forma interligada e vinculada; relacionada a essa técnica, realizam o pousio (período de descanso da terra).

A área indígena é contemplada com uma escola e um posto de saúde e atendida por sistema de energia fotovoltaica, implantado pela COPEL.

Aspectos culturais da região

Pelo menos três grandes festas realizadas em Paranaguá são de longa tradição e reúnem as

comunidades de pescadores da região. A primeira delas, realizada no dia 15 de novembro, é a Festa de Nossa Senhora do Rocio, padroeira do estado. A segunda, realizada na segunda quinzena de Janeiro, é a Festa de Nossa Senhora dos Navegantes, que acontece na Igreja de Nossa Senhora do Rosário, na Ilha dos Valadares. Esta festa é dividida em duas partes: a religiosa, com novenas, procissão e queima de fogos, e a quermesse popular, com barracas de comidas típicas e shows com artistas locais. A terceira festa gira em torno de um dos principais peixes capturados na região, a tainha. A Festa da Tainha é realizada na segunda quinzena de junho e é um dos componentes da tradicional "Festa do Pescador", tanto na cidade de Paranaguá como na Ilha do Mel, objetivando a confraternização dos pescadores em comemoração ao dia 29 de junho, dia de São Pedro, considerado protetor dos pescadores. Na ocasião realizam-se regatas de embarcações à vela, remo e motor, shows artísticos e venda da tradicional tainha e de frutos do mar (CEM/UFPR, 2001).

No município de Antonina existe a Festa de Nossa Senhora do Pilar, no dia 15 de agosto. Anualmente, também ocorre o Festival de Inverno, incluído no calendário do Município com o apoio da Universidade Federal do Paraná, e que se transformou realmente num evento anual relevante para a cidade além da Exponina, realizada em junho.

Em Guaraqueçaba a principal festa religiosa é a de Bom Jesus dos Perdões, no dia 05 de agosto. As comunidades das ilhas também comemoram a festa dos seus padroeiros, como São José em Ararapira, São Sebastião na Vila das Peças, São Pedro na Barra do Superagüi, entre outras.

Uma das tradições da região, como um todo, era o fandango, dança típica utilizada, principalmente, para finalizar as colheitas das plantações das comunidades locais. Atualmente ainda existe um grupo em Paranaguá e outro em Guaraqueçaba que mantêm a tradição da dança.

Organização social e política

Além da política partidária que aglutina cidadãos na disputa pelos cargos executivos e

legislativos dos municípios de Paranaguá, Antonina, Guaraqueçaba e Pontal do Paraná, os moradores da região aglutinam-se também em torno de associações de moradores e organizações de classe. Nestes municípios há associações de comerciantes, sindicatos de trabalhadores e também diversas associações de moradores. Todas as ilhas da Baía de Paranaguá têm associações formalizadas. A mais populosa das ilhas da Baía, a Ilha dos Valadares, com 22 mil habitantes, pertence à União, mas negocia, atualmente, sua municipalização (CEM/UFPR, 2001).

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Saúde pública A rede hospitalar de Paranaguá é constituída por quatro hospitais localizados na sede do

município de Paranaguá, na região do centro da cidade. O Hospital Infantil Antônio Fontes, especializado em Pediatria, é uma instituição pública estadual e atende exclusivamente pelo Sistema Único de Saúde - SUS; a Santa Casa de Misericórdia de Paranaguá era um hospital geral de natureza filantrópica; atendia 95% de sua capacidade atual pelo SUS e o restante dos leitos era destinado à hospitalização de pacientes particulares e de convênios, recentemente o Governo do Estado assumiu esse hospital; o Hospital Paranaguá e a Clínica São Paulo são hospitais gerais de natureza privada, que não estão integrados ao SUS e atendem exclusivamente a planos, convênios de saúde e particulares. Os três hospitais gerais possuem uma unidade de pronto-socorro para atendimento de emergências em regime de 24 horas.

Os hospitais de Paranaguá têm disponíveis os exames de eletrocardiografia, endoscopia digestiva, endoscopia urológica, provas de função pulmonar, patologia clínica, radiologia, ultra-sonografia cardiológica, ultra-sonografia geral, mamografia e serviço de hemoterapia e hemodiálise. Contudo, carecem ainda de outros serviços especializados que possam atender tanto à população do município quanto aos moradores das ilhas próximas, evitando com isso deslocamentos freqüentes a Curitiba. Além disso, convém ressaltar que muitos dos serviços existentes não estão disponíveis ao SUS.

O Município de Antonina conta com um hospital, denominado Dr. Silvio Bitencourt Linhares. Guaraqueçaba também tem um hospital, chamado Brigadeiro Eppinghaus.

Os serviços de saúde pública dispensados aos moradores das ilhas localizadas na Grande Baía de Paranaguá são um tanto precários. Com exceção da Ilha do Teixeira, todas as demais têm Postos de Saúde. Contudo, a parca infra-estrutura não permite a realização de exames ou o estabelecimento de diagnósticos mais sofisticados. Em situações emergenciais, os moradores têm que se deslocar até Paranaguá, Guaraqueçaba ou Antonina para buscar atendimento médico. Conforme a gravidade da situação, de Paranaguá podem ter que se deslocar até Curitiba em busca de um atendimento mais complexo. Em São Miguel e Ponta do Ubá o atendimento médico é realizado apenas mensalmente (CEM/UFPR, 2001).

Bens e serviços

Na área de influência municipal de Paranaguá, além das rodovias estaduais PR-508

(Alexandra - Matinhos), PR-407 (de acesso à Praia de Leste) e PR 405 (ligando Antonina a Guaraqueçaba), a única rodovia federal é a BR-277, que dá acesso ao Porto e área urbana de Paranaguá. Nesta área, existe também o sistema de transporte ferroviário, que é feito através da Ferrovia Curitiba - Paranaguá. Para o transporte aéreo, o Município de Paranaguá conta com um aeroporto público denominado Paranaguá - SBPG, cuja pista asfaltada possui 30 m de largura e 1455 m de comprimento. Por fim, o transporte hidroviário, seja ele fluvial ou marítimo, é a marca da região, devido a sua característica física, assinalada pela profusão de grandes meandros de rios que desembocam no mar (CEM/UFPR, 2001).

Antonina pode ser acessada tanto pela BR 277 como pela Estrada da Graciosa, e via marítima. O Município de Guaraqueçaba pode ser acessado a partir de Antonina, pela PR 405. Esta

possui 78 quilômetros de extensão, e continua sem pavimentação desde 1972, quando foi aberta, até os dias de hoje, dificultando em muito o acesso dos moradores a centros maiores, como também a ida de visitantes por meios terrestres, sendo os acessos hidroviários os mais utilizados.

Nos núcleos mais afastados, a água para consumo é obtida em poços e pequenos rios. Até há pouco tempo, a região litorânea era abastecida exclusivamente por poços artesianos individuais.

Os serviços de abastecimento de água no litoral paranaense, realizados pela SANEPAR, atendem quase todos os municípios. As exceções ficam por conta de Antonina, que é coberta pelo Serviço Municipal de Água e Esgoto - SEMAE, conveniado com a Fundação Nacional de Saúde - FUNASA, e Paranaguá, onde a Companhia de Águas e Esgoto de Paranaguá - CAGEPAR, que é a

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concessionária, atende somente a Ilha do Mel e Alexandra e a sub-concessionária, Águas de Paranaguá, abastece Paranaguá.

Com relação ao tratamento de esgoto, a maior parte da região litorânea não conta com estação de tratamento ou rede de captação de esgoto, sendo utilizadas as convencionais fossas sépticas. Em Paranaguá já existe uma estação de tratamento para 60 mil habitantes, podendo ser duplicada.

As populações dos municípios de Paranaguá, Antonina, Guaraqueçaba e Pontal do Paraná recebem energia elétrica fornecida pela Companhia Paranaense de Energia Elétrica - COPEL. Quase todas as ilhas também são atendidas pela mesma Companhia, a qual instalou em cada uma delas um sistema de energia monofásica ou de energia solar. Nas comunidades da Ilha do Superagüi e Ilha das Peças foram instaladas, pela COPEL, as placas para captação de energia solar, com exceção da Barra do Superagüi e Vila das Peças, que receberam instalação elétrica convencional através de cabo submarino, que saiu de Pontal do Sul, passou pela Ilha do Mel e Vila das Peças, desativando o gerador a diesel existentes nessas duas localidades, e desta última foi para a Barra do Superagüi.

Recentemente foram instalados telefones comunitários e individuais em quase todas as ilhas da região. 3.2 DIMENSIONAMENTO DOS IMPACTOS

Os danos ambientais decorrentes do acidente aconteceram em dois momentos distintos, a

saber: 1) no momento da explosão ocorreu o vazamento da carga do navio, ou seja, vazou o metanol,

que por ser produto altamente inflamável e volátil queimou-se, volatilizou-se e dilui-se na água, provocando efeitos imediatos e de curto prazo relacionados à combustão do produto (fogo, inclusive sobre o mar, e liberação de gases tóxicos), e à sua diluição na água do mar (nesse processo são liberados principalmente formaldeído e ácido fórmico, ambos compostos tóxicos para a vida marinha).

2) o segundo foi durante o derrame dos óleos diversos contidos no navio (bunker, diesel, lubrificantes), ocorrido a partir da explosão, com o rompimento de alguns tanques, e que persistiu ao longo dos meses que se seguiram ao acidente, até a remoção total do navio do local. Esses vazamentos representaram aporte significativo de material contaminante sobre as áreas direta e indiretamente afetadas, com conseqüências imediatas e a curto prazo, já parcialmente mensuradas e descritas nesse relatório, e a médio e longo prazos, ainda a serem avaliadas por um trabalho futuro de monitoramento.

A contaminação hídrica atingiu as águas das baías de Paranaguá, Antonina e Laranjeiras, deslocando-se para mar aberto através do canal Sueste, rumo ao Parque Nacional do Superagüi e às águas costeiras da plataforma continental. Através do canal da Galheta, atingiu a faixa de praias oceânicas, depositando péletes de piche entre Pontal do Sul e Shangri-lá (balneários de importância turística, especialmente na época de verão, e onde vivem e trabalham diversas comunidades de pescadores artesanais), no Município de Pontal do Paraná, conforme relatado na Ata no 016, de 25/11/04 (Anexo 024).

Não houve comprometimento do abastecimento de água potável nos municípios litorâneos. Apesar de não ter havido mensuração ou estimativa da contaminação atmosférica, essa certamente ocorreu, considerando que a queima do metanol libera gases tóxicos e perigosos (formaldeído e monóxido de carbono) e que a maior parte da carga existente no navio evaporou ou queimou durante a explosão e o incêndio.

Os efeitos tóxicos da contaminação nas águas do estuário e nas águas costeiras atingiram, inicialmente, todo o sistema planctônico e, consequentemente, as demais comunidades biológicas marinhas que dele dependem como fonte de matéria orgânica ou como meio de dispersão (p.ex. larvas e ovos de invertebrados, moluscos e peixes). Houve também contaminação das praias, costões e do substrato marinho. Num primeiro momento essa contaminação concentrou-se na zona entre-marés, faixa naturalmente mais suscetível a esse tipo de impacto, e que no Complexo Estuarino de Paranaguá é ocupada principalmente por manguezais e marismas. Posteriormente, o

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óleo que se encontrava na superfície da água tende a ser intemperizado e degradado, podendo vir a se depositar sobre o fundo marinho. Observou-se também percolação do óleo em sub-superfície em diversas faixas da zona entre-marés, especialmente em praias de areia mais grossa e em praias cobertas por rochas.

Cabe alertar que os efeitos de um derrame de óleo dependem de características ambientais do local atingido (tipo de costa, quantidade de energia, condições atmosféricas, entre outros) e das características do óleo envolvido (sua composição, quantidade derramada, entre outros). Por exemplo, o óleo diesel é um composto leve, que apresenta efeitos tóxicos agudos, extremamente graves, que se manifestam imediatamente após um curto período de exposição, mas que logo são dissipados (é um óleo pouco persistente no ambiente), ao contrário do óleo bunker, que é um óleo pesado, residual, com uma toxicidade aguda menor, podendo permanecer por décadas nos sedimentos e no ambiente aquático exercendo seus efeitos tóxicos (CEM/UFPR, 2005).

3.2.1 ÁREA ATINGIDA

A estimativa da área total de costa atingida pelo derramamento de óleo foi realizada a partir

de observações de campo feitas por técnicos dos órgãos ambientais, do ITOPF e do CEM/UFPR, e foram sistematizadas e transformadas em uma tabela e num mapa, que constam do Relatório do CEM/UFPR (Anexo 075). Os tipos de costa afetados podem ser divididos em: manguezais e marismas, praias arenosas, costões rochosos e estruturas artificiais (enrocamentos, piers, entre outros). No total, aproximadamente 170,00 quilômetros de costa foram atingidos pelo óleo. Isto representa aproximadamente 15% da extensão total (1.130 km) de costa na região. Os níveis de contaminação considerados foram: alto, médio e baixo. Esses níveis foram determinados de maneira relativa para cada local, em comparação com os demais locais afetados. Consideraram-se como parâmetros padrões internacionais de estimativa de contaminação, tabulados pelo CENACID (Anexo 076), e metodologia proposta pela CETESB (Anexo 077).

Em relação ao tipo de costa e ao nível de contaminação os resultados podem ser resumidos da seguinte maneira:

a) Manguezais e marismas: atingidos no total 67,48 km de costa, sendo 37,65 km em nível baixo de contaminação, 24,35 km em nível médio e 5,48 km em nível alto.

b) Praias arenosas: atingidos no total 86,63 km de costa, sendo 64,19 km em nível baixo de contaminação, 12,73 km em nível médio e 9,71 km em nível alto.

c) Costões rochosos: atingidos no total 13,81 km de costa, sendo 6,09 km em nível baixo de contaminação, 3,60 km em nível médio e 4,12 km em nível alto.

d) Estruturas artificiais: atingidos no total 2,00 km de costa, em nível baixo de contaminação.

3.2.2 IMPACTOS SOBRE A FAUNA O dimensionamento dos danos ocorridos sobre os diversos componentes da fauna baseia-se,

principalmente, no relatório dos trabalhos de resgate de fauna (Anexo 075), elaborado pela equipe do IBAMA, com o apoio em campo das Organizações Não-Governamentais (O.N.G.) SPVS e Instituto Ecoplan e Caramuru, e pelo relatório de avaliação do impacto inicial do acidente (Anexo 078), elaborado pelo CEM/UFPR. Esses dois relatórios possuem metodologia e objetivos diversos, e por isso serão considerados separadamente. O primeiro busca encontrar e coletar e/ou registrar os organismos afetados pelo derramamento, tratando adequadamente os que ainda encontram-se vivos, buscando restabelecê-los e devolvê-los ao ambiente, e analisando os encontrados mortos para determinar as causas da morte e eventuais relações entre esta e os produtos derramados pelo acidente. O segundo teve por objetivo avaliar o impacto agudo do derramamento de óleo sobre os diversos compartimentos do ecossistema, utilizando, inclusive, para a análise de alguns dos componentes da fauna, os dados obtidos a partir do trabalho de resgate.

Na avaliação dos possíveis efeitos a médio e longo prazo do derramamento de óleo, deve-se considerar que a época do acidente (verão) coincide com os períodos de maior atividade reprodutiva de grande parte dos organismos marinhos da região. Por um lado isso pode ser bastante prejudicial,

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especialmente para aquelas espécies que têm um ciclo de vida longo, com período grande de maturação, produzindo poucos filhotes por ano e investindo bastante energia nessa produção. Os mamíferos marinhos são o exemplo mais claro desse grupo de animais. A contaminação por óleo nesses animais, justamente no período de pico dos nascimentos, pode ter efeitos catastróficos sobre as populações. Por outro lado, a maioria dos invertebrados marinhos tem ciclos de vida curtos, produzem grande quantidade de ovos e, geralmente, reproduzem-se ao longo de todo o ano, com picos no verão, o que lhes atribui uma maior capacidade de recuperação.

Resgate de fauna

O trabalho de resgate de fauna iniciou-se no dia 18/11/2004, foi coordenado pelo Núcleo de

Fauna e Recursos Pesqueiros da Gerência Executiva do IBAMA no Paraná, e contou com a participação de voluntários da SPVS, Instituto Ecoplan e Caramuru, num total de 50 pessoas envolvidas. Nessa atividade foram utilizados seis barcos das O.N.G., dois do IBAMA e dois do IAP, além de outros materiais e equipamentos necessários, tais como: computadores, impressoras, GPS, veículos, containeres equipados para reabilitação dos animais, entre outros. Além do resgate propriamente dito, foram também executadas as seguintes atividades: orientação para as comunidades atingidas, reabilitação dos animais resgatados (em estrutura específica montada para esse fim) e monitoramento das áreas atingidas.

Foram resgatados animais de diversas espécies, incluindo tartarugas marinhas, aves, peixes, crustáceos, mamíferos marinhos, entre outros. A lista completa das espécies resgatadas encontra-se detalhada no Anexo 075. No total, ingressaram no hospital veterinário, montado especificamente para o evento, 134 animais, sendo 115 mortos e 19 vivos. Destes últimos, nove animais morreram durante o tratamento. Dos 10 que foram recuperados, alguns foram devolvidos ao ambiente natural e outros foram encaminhados para o Centro de Triagem de Animais Silvestres – CETAS, localizado em Tijucas do Sul/PR. Um resumo do número de indivíduos, divididos por grandes grupos, encontrados e levados para o hospital veterinário durante os trabalhos de resgate de fauna encontra-se na Tabela 01.

Destacam-se entre os animais mortos as duas espécies de tartarugas-marinhas: Chelonia mydas (tartaruga-verde), com 21 indivíduos resgatados (20 mortos e 01 vivo) e Eretmochelys imbricata (tartaruga-de-pente), com 01 indivíduo encontrado morto, ambas constantes da Lista Oficial da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção e do Anexo I da CITES (“Convention on International Trade in Endangered Species of Wild Flora and Fauna”, ou Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies Ameaçadas da Flora e da Fauna Selvagens).

Além dos animais resgatados e levados para o hospital, foram observados em campo, e registrados no relatório, 348 caranguejos da espécie Ucides cordatus (o caranguejo-uçá, espécie de grande interesse comercial na região) contaminados por óleo, sendo que destes 236 estavam mortos e 112 vivos. Em contato com pescadores de comunidades atingidas, as equipes de resgate colheram alguns relatos de mortandade de espécies de interesse comercial, entre as quais destacam-se: contaminação e mortandade de sardinhas capturadas próximo à Prainha (Ponta do Ubá, município de Paranaguá-PR) no final do mês de novembro, e mortandade de pós-larvas de camarão, observada em frente à Vila das Peças, na Ilha das Peças, município de Guaraqueçaba-PR.

Cerca de um mês após o acidente foi realizada uma avaliação do impacto da contaminação sobre populações de ostras, cracas e caranguejos em diversos pontos da área atingida, através de estimativas visuais de mortalidade em áreas de costões, manguezais e marismas. Nesses levantamentos foi observada mortalidade expressiva de ostras e cracas em, praticamente, todas as áreas vistoriadas, chegando inclusive a 100% de mortalidade em faixas de costões nas ilhas da Cotinga e das Cobras. Os dados brutos dessas estimativas encontram-se na forma de tabela no Anexo 075.

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Tabela 01. Resumo do número de indivíduos, divididos por grandes grupos, encontrados e levados para o hospital veterinário durante os trabalhos de resgate de fauna. * os valores referentes às tartarugas marinhas incluem os 22 animais encontrados pelas equipes de resgate mais os 14 animais encontrados pela equipe do CEM/UFPR, que não estão computados no relatório do IBAMA (Anexo 075). ** os animais encontrados vivos e sem óleo foram capturados e trazidos para o hospital por

membros da comunidade, não sendo considerados como atingidos pelo derrame. Avaliação dos impactos

Os relatórios detalhados da avaliação do impacto agudo do derramamento de óleo sobre os

diversos compartimentos do ecossistema do Complexo Estuarino de Paranaguá (CEP) encontram-se no Anexo 078. Destacamos a seguir os principais impactos observados sobre a fauna da região.

No estudo da ictiofauna foi utilizado como bioindicador o bagre (Cathorops spixii). Os indivíduos coletados em duas áreas, uma contaminada (próximo ao píer da FOSPAR) e outra considerada como controle (baía de Laranjeiras), foram avaliados para presença de alterações morfológicas, fisiológicas, bioquímicas e genéticas. Os resultados indicam que houve poucas alterações morfológicas, mas que houve disfunção de processos regulatórios de íons após a exposição ao óleo. No entanto, o estabelecimento de uma relação mais direta e conclusiva de causalidade entre a presença de óleo e as alterações observadas depende de um monitoramento a médio e longo prazo. Em relação à ictiofauna, foram analisados também os efeitos da contaminação sobre a estrutura das comunidades, utilizando-se para tal duas planícies de maré localizadas em uma área atingida (canal do Sucuriú) e duas outras consideradas como controle (ilha Rasa, baía de Laranjeiras). Os resultados indicaram alteração nos padrões normais da ictiofauna nas planícies de maré com óleo. Essas assembléias atingiram uma configuração típica de áreas fortemente poluídas.

Em relação aos vertebrados, foram analisados os mamíferos marinhos, as tartarugas e as aves. Entre os mamíferos marinhos, as duas espécies de cetáceos que ocorrem comumente na região são: o boto-cinza (Sotalia guianensis; espécie constante do Anexo I da CITES) e a toninha (Pontoporia blainvillei; espécie constante da Lista Oficial da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção); ambas apresentam picos de atividade reprodutiva (maior número de nascimentos) justamente no verão, época em que ocorreu o acidente. Durante os estudos de avaliação do impacto foram encontrados uma fêmea adulta e três machos do boto-cinza, nenhum deles com vestígios de óleo. De maneira geral, os resultados da avaliação indicaram que essas espécies não sofreram efeitos agudos da contaminação pelo óleo.

As tartarugas marinhas, por sua vez, foram afetadas diretamente pelo óleo. Além dos indivíduos coletados pelos trabalhos de resgate de fauna, descritos acima, a equipe do CEM encontrou e examinou alguns outros, totalizando 36 tartarugas, sendo 32 mortas e 04 vivas. Desse

GRUPO MORTOS VIVOS C/ÓLEO VIVOS S/ÓLEO ** TOTAL Tartarugas * 32 04 - 36

Peixes 35 - - 35 Aves 22 13 - 35

Mamíferos – botos

04 - - 04

Répteis (exceto tartarugas)

- - 03 03

Outros mamíferos (felinos)

- - 02 02

Crustáceos (caranguejos)

20 01 - 21

Outros invertebrados

13 - - 13

Não-identificado 01 - - 01 TOTAL 127 18 05 150

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total, foram encontrados 33 indivíduos (todos juvenis) de Chelonia mydas (tartaruga-verde), espécie de hábito herbívoro que utiliza o estuário principalmente como área de alimentação, onde consome preferencialmente algas dos costões e baixios, além da macrófita aquática Halodule wrightii (“grama marinha”), que ocorre sobre os baixios. Dessa espécie foram encontrados ainda 03 indivíduos que apresentavam, como único sinal visível de dano, a perda total do tecido que recobre o crânio e a ausência de olhos em um deles e a deterioração dos tecidos da face e nadadeiras nos outros dois. Como esses organismos respiram próximo à superfície, esse tipo de lesão pode ter ocorrido imediatamente após a explosão, quando o metanol se espalhou sobre o mar nas adjacências do navio e queimou durante várias horas, ou como resultado do contato direto com o óleo na superfície da água. Foram encontrados ainda: 01 indivíduo (juvenil) de Eretmochelys imbricata e 02 indivíduos de Caretta caretta, sendo 01 juvenil e 01 adulto. Cabe ressaltar que esse adulto era uma fêmea em fase reprodutiva, encontrada carregando ovos em formação. Essas duas espécies alimentam-se de moluscos, peixes, crustáceos e esponjas em costões rochosos. Além do impacto direto, observado na forma de uma mortalidade anormal nos meses de novembro e dezembro de 2004, se comparada às séries históricas do censo de óbitos realizado pelo CEM/UFPR, destaca-se também que muitas áreas de alimentação dessas tartarugas foram atingidas pelo óleo (tanto os costões rochosos quanto os bancos de “grama marinha”), o que pode vir a trazer impactos futuros sobre as populações dessas espécies. As três espécies de tartaruga citadas constam da Lista Oficial da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção (Anexo 079) e do Anexo I da CITES.

Ocorrem no litoral paranaense aproximadamente 300 espécies de aves, sendo que a área da plataforma continental é considerada como de extrema importância para a conservação desse grupo e a área da baía como muito importante (CEM/UFPR, 2005), conforme comentado no item sobre a caracterização da área atingida. A importância da região deriva, em parte, do fato desta ser ponto de parada de espécies migratórias, ponto de reprodução de aves aquáticas coloniais, além de conter sítios de alimentação de aves marinhas em geral. Como agravantes do impacto do derramamento de óleo deve-se considerar que: (a) este atingiu principalmente a região entre-marés, ambiente que atrai uma grande quantidade de aves, que procuram essas áreas, especialmente na maré baixa, para alimentação; e (b) o verão é o período reprodutivo de diversas espécies de aves na região, além de coincidir com a época de chegada de espécies migratórias. Como efeito inequívoco do acidente, várias aves foram encontradas encobertas de óleo e muitas outras foram observadas com contaminação crônica. Foi observada também a mortalidade por inanição de alguns filhotes nas colônias reprodutivas, possível indicativo de impacto indireto, já que os filhotes dependem diretamente dos pais para sua alimentação. Os dados referentes à quantificação das aves capturadas encontram-se na forma de tabela no relatório referente aos trabalhos de resgate de fauna, já descritos anteriormente (Anexo 075).

Na avaliação do impacto sobre a fauna dos ambientes de manguezal, marismas, costões e bancos não-vegetados, observou-se mortalidade massiva de ostras (Crassostrea rhizophorae), cracas (Balanus improvisus e Chthamalus rhizophorae) e mexilhões (Brachidontes spp.), especialmente nos costões e manguezais que sofreram alto grau de contaminação (CEM/UFPR, 2005).

Na avaliação das praias estuarinas foram realizadas amostragens apenas na linha de detritos. Os resultados apresentados são pouco conclusivos a respeito do impacto do óleo sobre a fauna dessa região. Observou-se uma diminuição na densidade de tocas do caranguejo “Maria-farinha” (Ocypode quadrata) nas praias. Por outro lado, as populações de diversas espécies de anfípodes, típicos desse ambiente, mostraram resultados antagônicos. Enquanto algumas espécies apresentaram densidades menores após a contaminação, outras apresentaram densidade maior nas amostragens realizadas após o acidente, em comparação com dados pré-existentes (CEM/UFPR, 2005).

3.2.3 IMPACTOS SOBRE A FLORA

Os impactos sobre a flora concentraram-se sobre as plantas que colonizam os ambientes entre-

marés, especialmente as três espécies de árvores que formam os manguezais locais: Rhizophora

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mangle, Laguncularia racemosa e Avicennia schaueriana, e a espécie de Poaceae (=Graminae), Spartina alterniflora, principal componente das marismas. As marismas na baía de Paranaguá ocorrem geralmente na forma de faixas estreitas em frente aos manguezais e por isso não constam separadamente das estimativas de área total de distribuição e área total atingida.

Estima-se que um total de 67,48 quilômetros de costas ocupado por manguezais e marismas foi atingido por óleo, sendo 37,65 km com nível baixo de contaminação, 24,35 km com nível médio e 5,48 km com nível alto. Os manguezais e marismas altamente contaminados constituem-se de algumas faixas nas ilhas do Mel, Rasa da Cotinga e Cotinga, além de uma enseada (com aproximadamente 250-300 metros de extensão) próxima à Pedra da Cruz. Nessas áreas, assim como em algumas faixas na região de Piaçagüera, foi observada uma mortalidade em massa de indivíduos de Spartina alterniflora, claramente causada pelo recobrimento quase total dos tecidos aéreos e do substrato pelo óleo. De acordo com o relatório do CEM/UFPR (Anexo 078), esses impactos sobre as marismas foram significativos, ainda que pontuais (representando menos de 5% da costa margeada por este tipo de vegetação). Ainda segundo esse relatório, as marismas e as planícies de maré podem funcionar como verdadeiros reservatórios de óleo no ambiente por se desenvolverem em ambientes de baixa energia, de baixa declividade e de reduzida movimentação de água, favoráveis à deposição de sedimentos.

Nos manguezais predominou uma contaminação na forma de impacto de franja frontal, ou seja, o óleo atingiu principalmente as árvores na faixa frontal, que retiveram a maior parte do contaminante. Dessa forma, pode-se fazer uma estimativa da área total atingida. Considerando uma faixa frontal de, em média, dois metros de largura e uma extensão total de 67,48 quilômetros de costa atingida, chega-se a um valor de 134,96 km2 de manguezais impactados (134.960,00 m2, ou cerca de 13,50 hectares). Esse cálculo deve ser considerado subestimado, já que em diversos pontos o óleo penetrou nos bosques de mangue além da franja frontal. O padrão geral observado é de contaminação concentrada na franja frontal, com o óleo adentrando os bosques de maneira esparsa e em quantidades variáveis ao longo da faixa atingida. Os efeitos da contaminação sobre esses ambientes foram observados predominantemente na faixa que sofreu um alto nível de contaminação. Nessas áreas, em especial na enseada adjacente à Ponta da Cruz (já citada) e em uma faixa de cerca de 500 metros de extensão na ilha da Cotinga (Canal do Sucuriú), houve recobrimento total do substrato, das raízes, troncos e galhos inferiores das árvores de mangue. Foi observada mortalidade massiva de plântulas das três espécies de mangue. Nas árvores adultas, foram observados sinais de estresse, tais como: folhas enrugadas e propágulos crestados. Até o mês de março de 2005, não havia sido observada mortalidade de árvores adultas de mangue. No entanto, em vistorias realizadas no início do mês de abril foi observada mortalidade de diversos indivíduos das três espécies de mangue: cerca de 5 indivíduos adultos de Avicennia schaueriana, 20 de Rhizophora mangle (com predominância de juvenis) e entre 5 e 10 indivíduos de Laguncularia racemosa, em uma faixa de 30-40 metros de extensão, na face noroeste da ilha da Cotinga, próximo à Ponta da Cruz, conforme consta dos relatórios de vistoria (Anexo 048). Essa mortalidade está provavelmente relacionada à grande quantidade de óleo encontrado em sub-superfície nessa faixa, mesmo depois da área ter sido lavada e de terem se passado mais de cinco meses do acidente. É possível que outras árvores adultas de mangue ainda venham a morrer, especialmente nas áreas altamente contaminadas, onde ainda hoje existe óleo recobrindo as plantas e o substrato e enterrado em sub-superfície.

Além dos impactos observados sobre as plantas descritas acima, ocorreu também grande mortalidade de algas que vivem associadas aos manguezais e marismas, especialmente as do gênero Ulvaria spp. e Enteromorpha spp.

3.2.4 IMPACTOS SOBRE OS ORGANISMOS AQUÁTICOS DE INTERESSE

COMERCIAL Com o objetivo de avaliar o impacto do derrame sobre a qualidade dos organismos aquáticos

para consumo, para respaldar as atitudes de manutenção ou suspensão da Instrução Normativa Conjunta IBAMA/IAP no 025/04, que proibia qualquer atividade de pesca, coleta e consumo de

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organismos aquáticos nas baías de Paranaguá, Antonina e Guaraqueçaba, foram realizadas coletas de amostras de organismos aquáticos nas áreas direta e indiretamente afetadas pelo derrame de óleo. Os tecidos desses organismos foram testados para contaminação por hidrocarbonetos totais de petróleo (HTP) e hidrocarbonetos policíclicos aromáticos (HPA), análises realizadas no laboratório Analytical Solutions, em Florianópolis/SC. Este laboratório é certificado na ISO 9001/2000 e foi selecionado pelo IAP através do Sistema de Gestão da Qualidade, tendo apresentado a documentação necessária, comprovando sua capacitação e confiabilidade técnica na realização destes tipos de análise.

O Brasil não possui legislação com níveis de contaminação de HPA e HTP para organismos aquáticos. A NOAA - National Oceanic and Atmospheric Administration estabeleceu por ocasião do acidente com o navio Exxon Valdez, ocorrido no Alasca em 1989, critérios de contaminação de tecidos de peixes para HPA (OIL SPILL CONFERENCE, 2001), como segue:

Não Contaminado < 10 µg/kg Minimamente contaminado 10 a 99µg/kg Moderadamente contaminado 100 a 1000 µg/kg Fortemente contaminado > 1000 µg/kg. A Portaria no 451, de 19/09/97, da Vigilância Sanitária, não estabelece níveis de HTP e HPA

para alimentos. É evidente que amostras que apresentem valores acima de 1000 µg/Kg, conforme a NOAA, não devem ser consideradas próprios para consumo.

Com o objetivo de avaliar a contaminação dos organismos aquáticos, foram realizadas coletas em dois momentos:

- Período de 29/11 a 12/12/04: resultados apresentados no Parecer Técnico IAP/DPQ 26/04 (Anexo 080); coleta em áreas direta e indiretamente afetadas pelo derrame. Pontos distribuídos pelas baías de Antonina (siris e caranguejos), Guaraqueçaba (peixes e ostras), Laranjeiras (peixes e ostras), Paranaguá (ostras) e Pinheiros (peixes, ostras e caranguejos).

- Período 06/01/05 - resultados apresentados no Parecer Técnico IAP/DPQ 02/05 (Anexo 081); coleta em áreas diretamente afetadas pelo derrame. Pontos distribuídos na Baía de Paranaguá: baixio da Ponta da Piaçagüera (sururu e caranguejo); baixio da Ilha das Cobras (berbigão); Ponta da Cruz – Ubá (ostras); Ponta Oeste da Ilha do Mel (bacucu e ostras); Ilha Rasa da Cotinga (ostras) e Ilha Rasa (ostras).

A malha amostral utilizada nas coletas realizadas no primeiro período previu a coleta de amostras em áreas direta e indiretamente afetadas pelo derrame, com objetivo de verificar se os organismos aquáticos utilizados para consumo humano estavam ou não contaminados. Com isto os técnicos do IBAMA/IAP teriam segurança em suspender a proibição estabelecida pela Instrução Normativa Conjunta IBAMA/IAP no 025, de 16/11/04 (Anexo 033), cuja vigência era motivo de descontentamento e questionamento por parte dos pescadores locais. Era esperado que as amostras de ostras coletadas pelos técnicos do CEM/UFPR, nas áreas diretamente impactadas (entorno do terminal da Cattalini, Canal do Anhaia, Europinha e Itiberê), apresentassem contaminação, fato que não foi verificado nos resultados analíticos. Isto pode ser explicado pelo fato de se tratarem de organismos filtradores, cuja exposição ao derrame é cumulativa, além de sofrer influência de marés e correntes marinhas, o que levou ao registro da contaminação apenas depois de alguns dias. Por medida de precaução, o Parecer Técnico DPQ 26/04 recomendava a manutenção da Instrução Normativa da proibição de pesca somente na Baía de Paranaguá, onde as operações de salvatagem dos destroços do navio estavam em curso.

Em Janeiro de 2005, a malha amostral utilizada para avaliar a contaminação dos organismos aquáticos considerou somente a área diretamente afetada, concentrando para tanto, esforços amostrais na Baía de Paranaguá. O número de organismos avaliados foi ampliado com a inclusão de amostras de sururu, berbigão, além de ostras, excluindo os peixes. Isto porque, os organismos filtradores e sésseis poderiam melhor representar o impacto do óleo, uma vez que os peixes, pela sua mobilidade, podem evitar as áreas atingidas pelo derrame. Nas amostras analisadas foram avaliados HTP e HPA. Destes dois parâmetros, o mais específico para a detecção de contaminação por óleos é o HPA, cujos métodos de detecção são mais minuciosos e capazes de extrair porções mínimas de contaminação por óleos. O parâmetro HTP é realizado com método que detecta tanto

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hidrocarboneto de óleos, quanto aqueles biogênicos, encontrados naturalmente nos ambientes, pois são gerados por mecanismos biológicos naturais, podendo ser gorduras de animais. Somente os cromatogramas de HTP que apresentam n-alcanos C12 a C36 são compatíveis com a contaminação por óleo (vide resultado analítico da amostra 0045SC005, anexa ao citado parecer, cujo valor foi de 359466,43 µg/kg). Os resultados analíticos confirmam a hipótese de contaminação dos organismos filtrantes, pela detecção de HPA em exemplares de bacucu (7961,45 µg/kg) e ostras (9,4 µg/kg), da Ponta Oeste da Ilha do Mel e ostras da Ilha Rasa da Cotinga (40,61µg/kg). Verificou-se ainda, a contaminação dos caranguejos (12,2 µg/Kg), no Baixio da Ponta da Piaçagüera. Estes resultados confirmam o que foi verificado como rota do óleo, pelos estudos de dispersão realizados pelos técnicos do CEM/UFPR.

Se considerarmos os valores da NOAA para peixes, verifica-se que os teores encontrados nos exemplares de bacucú demonstram que estes organismos estão fortemente contaminados. As ostras da Ilha Rasa da Cotinga e os caranguejos do Baixio da Ponta da Piaçagüera estão minimamente contaminados, enquanto as ostras da Ponta Oeste da Ilha do Mel não estão contaminadas. Por precaução, nas áreas com registro de contaminação foi proibida a coleta e o consumo destes organismos, pela Portaria IAP no 47/05 de 09/03/05, retroativa a 16/01/05.

Estes resultados são compatíveis com aqueles apresentados no relatório do CEM/UFPR (Anexo 078), que encontraram um valor de HPA em caranguejos (1230,7 µg/kg), coletados no entorno do Terminal da Cattalini em 04/01/05, classificado como de moderado a alto, sendo compatível com valores de áreas contaminadas por óleo. Verifica-se ainda, que o valor detectado na amostra de bacucu (7961,45 µg/kg) é maior que o valor encontrado na amostra de caranguejo (1230,7 µg/kg), o que pode ser explicado pelo fato de que organismos filtradores acumulam mais o óleo.

Além de serem espécies de interesse comercial, os organismos avaliados são, em relação ao seu hábito alimentar, filtradores e detritívoros, inserindo-se no início da cadeia alimentar. Sendo assim, servem de alimento para diversos outros organismos que compõem o ecossistema do estuário em questão, podendo vir a contaminar, pelo consumo direto, organismos que não foram originalmente atingidos pelo óleo (peixes e aves, por exemplo).

A contaminação verificada nestes grupos justifica ações de monitoramento a médio e longo prazo, como indicadores da eficácia das ações de limpeza e minimização do impacto do derrame, em áreas diretamente afetadas, sabidamente, os costões, baixios e mangues na rota de dispersão do óleo no Complexo Estuarino da Baía de Paranaguá. Além disto, os resultados poderão respaldar ações de proibição de coleta e consumo destes organismos, garantindo assim a segurança alimentar de pescadores e consumidores locais destes organismos.

3.2.5 IMPACTOS SOBRE A QUALIDADE DAS ÁGUAS SUPERFICIAIS

Para avaliar o dano ambiental causado pelo acidente sobre a qualidade das águas superficiais

do complexo estuarino da baía de Paranaguá e das águas costeiras do litoral do Paraná, o IAP realizou coletas de amostras de água no período entre 16/11/2004 e 01/03/2005 (os resultados dessas análises encontram-se tabulados no Apêndice 01). Os detalhes referentes à metodologia de coleta e análise, e aos resultados das mesmas constam do documento intitulado “Parecer Técnico IAP/DEPAM/DPQ no 06/2005 - Relatório da mensuração e avaliação do dano ambiental na água de superfície no acidente ambiental do Navio Vicuña ocorrido na Baía de Paranaguá em 15/11/2004” (Anexo 082). As amostras coletadas nas baías de Paranaguá, Antonina, Guaraqueçaba e Laranjeiras foram testadas para presença dos seguintes compostos: metanol, óleos e graxas, BTXe, HPA, HTP, além do teste de toxicidade, realizado com a bactéria Vibrio fischeri, organismo utilizado como bioindicador de toxicidade aguda sobre organismos aquáticos. Os efeitos da toxicidade aguda caracterizam-se por serem mais drásticos e por manifestarem-se após um curto período de exposição dos organismos a concentrações do elemento químico contaminante. Foram coletadas ainda amostras em praias utilizadas como balneários, nas seguintes localidades: Antonina, Ilha do Mel e na faixa de praias oceânicas entre Pontal do Sul e Caiobá. Nessas amostras foram avaliados apenas os parâmetros: óleos e graxas e HTP.

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Estes resultados evidenciam o impacto do derrame sobre a qualidade das águas superficiais, no entorno do navio, na Ilha da Cotinga e Ilha do Mel, coincidindo com a rota de dispersão do óleo. O período mais crítico de contaminação ocorreu entre os dias 17/11/04 a 06/12/04, sendo que a presença de HTP e HPA ocorreu até a data de 26/11. Os resultados dos testes de toxicidade aguda registram impacto até a data de 06/12/04, demonstrando a maior sensibilidade deste indicador. O impacto sobre a balneabilidade das praias pode ser evidenciado na praia de Shangri-lá, até a data de 28/11, sendo que a partir de 07/12 nenhuma anormalidade foi verificada em todas as 11 praias avaliadas. Com isto, a avaliação destes indicadores foi suspensa e manteve-se apenas o teste de presença de Escherichia coli, utilizado rotineiramente para avaliar a presença de esgotos domésticos.

3.2.6 IMPACTOS SOBRE O MEIO SÓCIO-ECONÔMICO

Comunidades Afetadas

As comunidades diretamente afetadas pelo acidente do Navio Vicuña foram as seguintes:

MUNICÍPIO DE PARANAGUÁ: Piaçagüera, Amparo, Europinha, Eufrasina, Beira Rio, Valadares, Rocio, Ponta do Ubá, São Miguel, Ilha do Mel. MUNICÍPIO DE ANTONINA: Teixeira, Ponta Grossa. MUNICÍPIO DE GUARAQUEÇABA: Medeiros, Massarapuã, Tromomó, Rasa, Mariana, Ponta do Lanço, Almeida, Itaqui, Guaraqueçaba (cidade), Peças, Laranjeiras, Tibicanga, Bertioga, Ilha do Pinheiro, Barra do Superagüi, Colônia de Superagüi, Barbados, Canudal, Vila Fátima, Barra do Ararapira, Sebuí, Poruquara. MUNICÍPIO DE PONTAL DO PARANÁ: Pontal do Sul, Shangrilá.

Todas essas comunidades sobrevivem da pesca, caracterizada como artesanal, tal como relatado no item sobre a caracterização da área. Existem desde pescadores que comercializam os pescados até aqueles que apenas os consomem. De qualquer forma, todos foram afetados com o acidente do navio Vicuña, em diferentes graus de intensidade.

Saúde Humana

Por ocasião do acidente, quatro tripulantes da embarcação vieram a óbito. De acordo com o

Relatório Geral sobre o Navio Vicuña, elaborado pela Defesa Civil - Corpo de Bombeiros (Anexo 028), dois corpos foram encontrados no dia 16 de novembro, logo após o acidente, um próximo à Ilha das Cobras e outro próximo à Ilha Rasa; o terceiro foi encontrado perto de Piaçagüera, no dia 29 de novembro, e o quarto foi encontrado próximo ao píer da Catallini no dia 28 de março.

O acidente ocorreu justamente nas proximidades do local onde estavam em andamento os festejos de Nossa Senhora do Rocio, padroeira do Estado do Paraná. Por medida de segurança, a Defesa Civil evacuou milhares de pessoas que participavam da festa na praça localizada em frente ao Santuário do Rocio. O fato da tradicional procissão ter iniciado às 17:00 h para levar a Santa à Matriz, localizada no centro histórico da cidade, diminuiu a concentração de pessoas na praça. No entanto, muitos permaneceram no local aguardando o show da cantora Elba Ramalho.

De acordo com a informação prestada pela Secretaria Estadual de Saúde – SESA (Anexo 083), no dia do acidente o Hospital Paranaguá atendeu 16 feridos em decorrência da explosão. No dia posterior, uma pessoa foi atendida em virtude do desabamento de uma estrutura metálica, que teria perdido a estabilidade devido à explosão. Nas Unidades Básicas de Saúde – UBS do Município de Paranaguá foram atendidas quatro pessoas hipertensivas, após o acidente, que relataram ter ficado muito assustadas com o episódio.

Esses foram os danos diretos, no entanto, há que se ressaltar os danos psicológicos, pois é evidente que o acidente trouxe à tona sentimentos de insegurança para a população de Paranaguá, justamente por ter sentido a fragilidade do sistema de proteção e a vulnerabilidade a que as famílias estão expostas, caso aconteçam outros acidentes.

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Efeitos na pesca e conflitos sociais

Em decorrência da publicação da Instrução Normativa Conjunta IBAMA/IAP no 025/04, que

proibiu a pesca e a coleta de organismos aquáticos nas baías de Paranaguá, Guaraqueçaba, Antonina e Laranjeiras, houve necessidade de pagamento de seguro desemprego por parte do Ministério de Trabalho e de fornecimento de cestas básicas para atendimento emergencial dos pescadores residentes nas áreas atingidas. No entanto, o fato dos pescadores não poderem exercer sua atividade econômica trouxe uma série de conflitos que essas alternativas paliativas e emergenciais não puderam satisfazer. Quanto às cestas básicas, o processo foi mais rápido do que em relação ao seguro desemprego. Foram distribuídas 15171 cestas básicas. Destas, 1165 foram entregues em Antonina, 926 em Pontal do Paraná, 6480 em Guaraqueçaba e 6600 em Paranaguá. Tal entrega realizou-se em três etapas, sendo a primeira entrega realizada no mês de dezembro, a segunda em janeiro e a terceira em fevereiro, mediante a assinatura de recibos. As cestas foram subsidiadas pela empresa Cattalini e pelo P&I Club. Houve também a participação do Ministério da Agricultura, que disponibilizou alimentos a granel para compor cestas básicas. O Armador comprou quatro mil sacos plásticos para o acondicionamento dos produtos, sendo tal ação desenvolvida pela Defesa Civil.

Entretanto, em relação ao seguro emergencial, até que todos os trâmites burocráticos fossem vencidos, as comunidades afetadas passaram por grandes privações, pois, como foi dito, a maioria dos pescadores sobrevivem da pesca, não somente para comercialização, mas também para sua própria alimentação, sendo o peixe a principal fonte de proteína da sua dieta alimentar. Nesse caso, cabe salientar que nem todas as famílias receberam cestas básicas, pois foi uma estratégia atender somente os pescadores ativos, considerando que os aposentados e outros profissionais continuariam recebendo seus salários normalmente. Porém, sabe-se que estes são salários de pequeno vulto, sendo a pesca fundamental para complementar a alimentação dessas pessoas. Além disso, havia necessidade de recursos financeiros para pagar conta de luz, água e energia, bem como compra de remédios, entre outras situações que precisavam ser cuidadas, estando tal fato registrado em Memória de Reunião (Anexo 084 e Anexo 085). A abertura da captura do caranguejo estava prevista para iniciar dia 01/12, porém, com a proibição advinda do acidente, esse rendimento extra para o pescador nessa época do ano foi descartado. Por todas essas razões, os pescadores realizaram uma manifestação pública no dia 30 de novembro.

A empresa Cattalini e o P&I Club ofereceram o pagamento de um salário mínimo emergencial para os pescadores, dividindo esse ônus entre as duas empresas. Em relação a isso, somente a Cattalini pagou meio salário mínimo, pois como os pescadores entraram na justiça contra o P&I Club, este se viu impedido de efetuar os pagamentos até a retirada das ações ajuizadas.

Existiam muitas dúvidas entre os pescadores sobre o pagamento do seguro desemprego advindo do acidente e aquele devido ao defeso do camarão dentro das baías, que seria iniciado no dia 15 de dezembro. Além disso, a preocupação dos pescadores era com aqueles que têm menos de seis meses de carteira profissional, pois seriam excluídos dos benefícios, bem como aqueles que pescam em alto-mar, cuja Instrução Normativa não os incluía. Com as notícias que saíram na mídia, o comércio de pescado foi afetado como um todo em toda a extensão litorânea, uma vez que as pessoas ficaram com receio de consumi-lo.

O representante da Secretaria da Pesca no Estado do Paraná, em reunião do dia 01.12.04 (Anexo 085) informou que todo o trabalho para se conseguir o seguro emergencial foi feito tal como o é para o período do defeso, preenchendo-se o mesmo formulário somente para obter maior rapidez no trâmite do processo, porém, trata-se de outro recurso, talvez isso tenha trazido confusão. Informou que os pescadores de mar aberto também seriam atendidos, uma vez que não estavam conseguindo vender seus produtos, bastando estar registrados em um dos municípios atingidos. Por fim, explicou que, quanto aos pescadores com menos de seis meses de carteira, o Secretário da Pesca e o Ministro do Trabalho, através de uma Instrução Normativa a ser oficializada, tentariam incluí-los. Segundo informações da Secretaria de Trabalho, o seguro foi denominado Seguro Desastre Ecológico, baseado na IN IBAMA/IAP no 025, sendo pagas duas parcelas de R$ 280,00,

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tendo atendido 632 pescadores em Paranaguá, 1200 em Guaraqueçaba e 278 em Antonina. O pagamento foi feito somente aos pescadores devidamente habilitados. Aqueles que não tinham ainda um ano de carteira, bem como os contratados, não foram incluídos.

Em alguns locais foi possível contratar pessoas da própria comunidade para realizar os serviços de limpeza de óleo nas áreas atingidas, bem como foram alugadas embarcações. No entanto, essa iniciativa também gerou conflitos entre os moradores que não queriam ser contratados para não perder o direito sobre o seguro defeso, querendo ser contratados como autônomos. Entretanto, nem todas as reivindicações puderam ser atendidas, pois as empresas deveriam atender às questões trabalhistas. Também houve reclamação porque, inicialmente, foram contratados trabalhadores de Paranaguá, o que os moradores não aceitaram, sendo a reivindicação aceita pelas empresas. Segundo relatório da KCL Serviços Industriais (Anexo 086), a contratação de pessoal das comunidades variou muito, de acordo com a necessidade de limpeza de cada área, sendo atendidas as seguintes localidades: Ponta do Ubá, Ilha das Peças, Ilha do Mel e Ilha do Superagüi.

Nos cultivos de ostras, localizados em Europinha, Amparo, Poruquara, Medeiros, Ilha Rasa e Ilha das Peças houve relatos de prejuízos pela falta de consumidores, uma vez que a população em geral deixou de consumir o produto, reduzindo desta forma a receita naquelas comunidades. Foi detectada mortandade de ostras na comunidade de Almeida (Ilha Rasa), APA de Guaraqueçaba, conforme descrito no item que trata dos impactos nas unidades de conservação. Na Ilha das Peças também foram evidenciados danos às redes de pesca, que se tornaram inviáveis para uso. De forma geral, ocorreu a contaminação de redes, rampas e barcos na maioria das comunidades próximas ao acidente.

Efeitos nas atividades turísticas

Em relação às atividades turísticas, houve relato de prejuízos junto às pousadas localizadas na

Ilha do Mel, porém estes não foram dimensionados. Analisando-se os registros mensais de entradas de turistas na Ilha do Mel, realizados pelo IAP (Anexo 087), verifica-se uma queda bastante significativa do número de visitantes na ilha em dezembro de 2004 (9.977 pessoas) em comparação com o mesmo mês em 2003 (18.545 pessoas) e em 2002 (21.402 pessoas). Em janeiro de 2005 o número de visitantes sobe bastante, chegando a 34.692 pessoas, valor bem próximo ao observado no mesmo mês em 2004 (36.361), e maior do que o observado em 2003 (28.513 pessoas) e 2002 (34.216). O número de visitantes observado em fevereiro de 2005 (18.761) também se aproxima do valor observado durante esse mês nos anos anteriores. Esses números demonstram que houve impacto do acidente sobre a atividade turística na ilha, e que este ocorreu durante o mês de dezembro de 2004. Este censo de visitantes representa a evidência irrefutável do impacto do derrame sobre o turismo da Ilha, ainda que na Ata no 033 (Anexo 024), haja relato de que no dia 22/12/2004, as praias da ilha encontravam-se limpas, uma vez que os trabalhos de limpeza das áreas atingidas tinham sido intensificados devido à proximidade das festas de final de ano. Não houve registros oficiais de prejuízos nas hospedarias localizadas nas ilhas de Superagüi e Peças, apenas relatos informais de moradores dizendo que muitas pessoas desmarcaram a ida para as ilhas citadas para as festas de passagem do ano.

Efeitos nos patrimônios públicos e privados

Foram registrados, em decorrência da explosão, danos no píer e nos bairros próximos.

Conforme relatório do Corpo de Bombeiros (Anexo 028), foram 108 casos de avarias em residências nas proximidades da explosão, nos bairros do Rocio, Vila Cruzeiro, Vila Guarani, Becker, Jardim Araçá, consistindo de rachaduras nas paredes e no telhado, em todas as casas e em vidros quebrados em 78 delas. Inclui-se nessa relação o Santuário Estadual da Nossa Senhora do Rocio. A “queda” de energia danificou 04 televisores, 02 geladeiras, 01 aparelho de som e 01 de microondas, além de ter queimado 11 lâmpadas. Ainda, segundo o relatório citado as explosões causaram danos materiais nas instalações da Petrobras, que vão desde danos na estrutura das instalações do laboratório, do píer e do Departamento de Saúde, Meio Ambiente e Segurança, até

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quebra de vidros e telhas. Outros danos materiais observados relacionam-se à contaminação de barcos de pesca, redes, rampas de barco e atracadouros, entre outras estruturas artificiais atingidas pelo óleo.

3.2.7 EXTENSÃO E GRAU DE CONTAMINAÇÃO NAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO

Parte da costa e das ilhas do Complexo Estuarino de Paranaguá encontra-se protegida por

legislação específica, na forma de unidades de conservação federais e estaduais, devido a suas importantes características ambientais e sua relevância no contexto sócio-ambiental e para a conservação da natureza no litoral paranaense. A localização e as principais características dessas unidades de conservação encontram-se descritas em item específico da seção 3.1 Caracterização das Áreas Atingidas. As seis unidades de conservação que abrigam áreas atingidas diretamente pelo óleo são:

Unidades de Conservação Federais: Estação Ecológica de Guaraqueçaba, Parque Nacional do Superagüi e Área de Proteção Ambiental Federal de Guaraqueçaba.

Unidades de Conservação Estaduais: Estação Ecológica da Ilha do Mel, Parque Estadual da Ilha do Mel e Área de Proteção Ambiental Estadual de Guaraqueçaba (esta e a APA Federal de Guaraqueçaba estão parcialmente sobrepostas).

Além destas, foi atingida também a área da Reserva Indígena Guarani localizada nas Ilhas da Cotinga e Rasa da Cotinga.

As unidades de conservação são espaços territoriais especialmente criados e protegidos pelo Poder Público. Sua criação está prevista inclusive na Constituição Federal (Artigo 225). Desde a promulgação da Lei Federal no 9.985/2000, que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, essas áreas são criadas e administradas com base em legislação específica. Além disso, a Lei de Crimes Ambientais (Lei Federal no 9.605/1999) estabelece como agravante de um dano ambiental o fato dele ter sido causado dentro de uma unidade de conservação. Este mesmo instrumento legal possui ainda um artigo específico para danos causados direta ou indiretamente a essas áreas protegidas (Artigo 40).

Tendo em vista o exposto acima, descreveremos a seguir os danos ambientais causados especificamente nessas áreas que se encontram sob proteção especial da legislação.

Os impactos de curto prazo (observados nos primeiros dias e meses após o acidente) sobre o meio biótico das unidades de conservação podem ser descritos, de forma resumida, considerando-se: a extensão de costa atingida, para cada um dos ambientes encontrados, e o grau de contaminação, considerado de maneira relativa para cada local, em comparação com os demais locais afetados.

De maneira geral, podemos dividir os ambientes da zona entre-marés (faixa da costa naturalmente mais sujeita à contaminação por óleo presente na água do mar) no complexo estuarino da baía de Paranaguá em: praias arenosas, baixios não-vegetados, manguezais, marismas e costões rochosos. Além desses ambientes naturais, devem ser consideradas também as estruturas artificiais, tais como: atracadouros, rampas de barco, cais do porto, enrocamentos, criatórios de ostras, entre outros. Os ambientes estão sujeitos a diferentes condições físico-químicas e de energia, de acordo com o setor da baía em que se localizam. Como regra geral, considera-se que em áreas mais abrigadas e de baixa energia os impactos por óleo tendem a ser mais persistentes e o tempo de recuperação dos ambientes tende a ser maior.

De acordo com LANA et al. (2001), o complexo estuarino da baía de Paranaguá é composto de dois corpos d’água principais: as baías de Paranaguá e Antonina, e as baías de Laranjeiras e Pinheiros. As UC existentes na região protegem, além da Ilha do Mel, principalmente ilhas e margens das baías de Laranjeiras e Guaraqueçaba (a APA Federal de Guaraqueçaba engloba também a margem norte das baías de Paranaguá e Antonina), onde a densidade demográfica é menor e o estado de conservação dos ambientes é mais elevado, em comparação com as áreas próximas à cidade de Paranaguá e ao complexo portuário Paranaguá - Antonina.

A seguir, descrevemos o impacto do derrame de óleo sobre cada uma das UC federais e estaduais, considerando danos imediatos (ou de curto prazo) sobre os ecossistemas. A real

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magnitude dos impactos só poderá ser dimensionada a partir de um monitoramento realizado a médio e longo prazo.

3.2.7.1 IMPACTOS SOBRE AS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO FEDERAIS

APA de Guaraqueçaba

Apesar da APA englobar o Parque Nacional do Superagüi e a Estação Ecológica de

Guaraqueçaba, nesse item serão descritos somente os impactos sobre a APA, já que a ESEC e o PARNA, por serem UC de Proteção Integral, sujeitas a normas mais rígidas de proteção, serão tratadas em itens específicos.

Na área da APA foram afetados os seguintes locais: - Área 23 A, B e C - Piaçagüera/Amparo: margem norte da baía de Paranaguá, a jusante do

local do acidente e em frente e a jusante do cais principal do Porto de Paranaguá, nas localidades de Amparo e Piaçagüera. O grau de contaminação nesses locais variou entre médio e máximo, sendo que os ambientes mais afetados foram as marismas na região de Piaçagüera, tendo sido observado mortalidade significativa da porção aérea da gramínea Spartina alterniflora, principal componente desses ambientes na região. Segundo o relatório do CEM/UFPR (2005), foi observada nessa área mortalidade da alga Ulvaria spp., encontrada associada a manguezais e marismas. Houve contaminação pontual de costões rochosos e de um pequeno manguezal (grau médio) na localidade de Amparo, e contaminação, por placas de piche, de toda a extensão de praias. No total, aproximadamente cinco quilômetros de costa foram afetados nesse local.

- Área 23 D - fundo do Saco do Tambarutaca: região composta por baixios de maré colonizados, em sua maioria, por marismas e manguezais. Essa faixa, de aproximadamente quatro quilômetros, sofreu um grau mínimo de impacto, tendo sido observado contaminação (moderada) de marismas apenas na porção sul. Cerca de dois meses após o acidente foi encontrada uma área contaminada na extremidade norte dessa enseada, provavelmente atingida por óleo proveniente de áreas próximas altamente contaminadas (descritas a seguir).

- Área 22 - enseada imediatamente adjacente à Pedra da Cruz: banco arenoso de aproximadamente 250 metros de extensão ocupado por uma faixa de manguezal (formado pelas três espécies típicas dos manguezais locais: Avicennia schaueriana, Laguncularia racemosa e Rhizophora mangle, com predominância das duas últimas) de aproximadamente 10 metros de largura, com presença de faixas de marisma e de um costão rochoso adjacente. Esse manguezal foi, possivelmente, o de mais alto grau de contaminação em todo o complexo estuarino. Tanto o sedimento quanto as raízes, caules e ramos inferiores das árvores ficaram totalmente cobertos por óleo. Essa foi também a única área de manguezal onde trabalhos de limpeza no interior do bosque foram autorizados, devido à presença de grandes quantidades de óleo líquido sobre o sedimento e entre as árvores. Existia a possibilidade desse óleo ser remobilizado e vir a contaminar outras áreas adjacentes. Uma limpeza inicial foi realizada, para a retirada do óleo acumulado, e a área foi posteriormente abandonada para que se processassem os processos de limpeza natural do ambiente. Quase três meses após o acidente, ainda não foi observada mortalidade de árvores adultas de mangue nesse local. O único sinal de estresse observado nas árvores até o momento (informação corroborada pelo relatório do CEM/UFPR) é a presença de propágulos de Rhizophora mangle crestados, apresentando uma coloração marrom (em oposição ao verde do propágulo saudável). Ocorreu, no entanto, mortalidade expressiva de plântulas das três espécies. Foi observada ainda mortalidade massiva da vegetação de marisma (Spartina alterniflora), sem sinal aparente de recuperação até o momento, além de grande mortalidade (de acordo com relatório do CEM/UFPR) das cracas Balanus improvisus e Chthamalus rhizophorae, e da ostra Crassostrea rhizophorae, encontrada sobre as raízes de mangue e no costão rochoso. O alto grau de contaminação dessa área transformou-a em um foco de poluição de áreas adjacentes, especialmente na forma de placas de piche que se desprendem e chegam às praias.

- Área 21 C - enseada da Prainha (Ponta do Ubá): o ambiente no local constitui-se de uma praia arenosa, bordejada por uma franja de manguezal ao sul e por costões rochosos ao norte.

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Houve contaminação (grau médio) de toda a extensão da praia por pelotas de piche, que continuam a ser observadas no local, mais de três meses após o acidente. Houve contaminação (grau mínimo) do manguezal e de algumas porções do costão rochoso, além dos dois atracadouros, em especial daquele localizado no meio da praia, no qual foram observadas placas e manchas de óleo ao longo de todo o piso e dos corrimãos. Foi observado, ainda, um acúmulo grande de óleo em uma pequena faixa coberta por gramíneas, localizada entre a praia e o manguezal. A extensão total dessa enseada é de aproximadamente dois quilômetros, sendo a metade sul ocupada pelo manguezal e a outra metade pela praia. Entre a ponta do Ubá e a foz do rio Medeiros existe uma faixa de aproximadamente três quilômetros, ocupada principalmente por uma franja de manguezal. Esse manguezal sofreu contaminação esparsa por óleo, variando entre mínima e média. Em alguns pontos deste trecho, a contaminação nas raízes de mangue se estendeu por cerca de 50 m, desde a franja mais externa até as partes mais internas do mangue, em uma variação de cerca de um metro de altura, caracterizando uma contaminação média.

- Área 21 B - rio Medeiros: nos primeiros dias após o acidente foram avistadas manchas de óleo na água deslocando-se em direção ao rio Medeiros. A contaminação neste trecho foi tida como mínima, com pequenas placas de óleo sendo detectadas na praia da comunidade de Medeiros de Baixo, e também em pequenos trechos nos manguezais da margem norte do rio e também nas ditas ‘lanternas’, bóias artificiais que sustentam as estruturas de criação de moluscos, em frente à comunidade. Foi observada uma pequena faixa de marisma (aproximadamente 20 X 2 metros) contaminada por óleo na planície de maré localizada imediatamente ao norte da foz do rio. Uma outra área contaminada em nível mínimo foi detectada ao norte da foz do rio Medeiros, na comunidade de Massarapuã. Posteriormente, no mês de janeiro, durante os trabalhos de remoção dos restos do navio, houve novos vazamentos, que acabaram por contaminar (contaminação mínima) uma área de marismas, na localidade denominada Almeida, na Ilha Rasa, nas proximidades da Ilha do Rabelo, que é parte da ESEC de Guaraqueçaba. Em 16 de fevereiro, em visita a Almeida, foi detectada mortandade de ostras retiradas pelas comunidades dos cultivos próximos à contaminação, da ordem de 60 – 70%.

- Área 09 - Ilha das Cobras: nessa ilha houve contaminação intensa da costa oeste (Área 09A), numa faixa de costão rochoso localizada entre o píer e o farolete (ponta sul), numa extensão de, aproximadamente, 500 metros. Ao longo dessa faixa, altamente contaminada, houve mortalidade de organismos que vivem incrustados nas rochas, em especial de ostras. Algumas semanas após o acidente, foi encontrada uma grande quantidade de óleo líquido enterrado em uma pequena praia de areia grossa, localizada entre as rochas, próximo da extremidade sul dessa porção de costão. No restante dos costões que circundam a ilha, a contaminação variou entre grau mínimo e médio, com ocorrência de óleo mais esparsa. Na praia arenosa, localizada em frente às instalações do Governo do Estado, houve contaminação mínima por pelotas de piche, que também foram observadas, em pequena quantidade, em algumas rochas localizadas em ambas as extremidades da praia.

ESEC de Guaraqueçaba

- Área 21 C - Ilha da Banana: nessa ilha houve contaminação leve dos costões e da praia (< de

15% de cobertura) por placas de piche de até 20 centímetros de diâmetro, aproximadamente. Não foram observados sinais de estresse ou mortalidade por parte da flora e da fauna.

PARNA do Superagüi

- Área 19 - Praia Deserta: houve contaminação (grau mínimo) da porção sul da praia Deserta,

numa extensão de cerca de 14 km, por placas de piche. Essa praia é um importante sítio de ocorrência de aves migratórias, especialmente no período que se seguiu ao acidente. Foram observadas placas de piche também na praia em frente à vila Barra do Superagüi. No canal do Superagüi foram contaminados alguns cercos de pesca, localizados próximo à vila. Essas estruturas, altamente contaminadas, tornaram-se focos de poluição, liberando filmes de óleo durante vários dias seguidos.

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- Área 15 B - Praia da ilha das Peças: houve contaminação por placas de piche de diversos tamanhos (incluindo grandes placas, com mais de 30 centímetros de diâmetro) ao longo de toda a extensão de praia, desde a vila das Peças até a entrada do canal do Superagüi, num total de aproximadamente 12 km. A contaminação foi maior na porção inicial, mais próxima à vila, e numa faixa da praia onde ocorrem formações denominadas piçarras, inclusive com deposição de óleo sobre estas formações. Foi observada, em diversos pontos ao longo da praia, a ocorrência de placas de óleo enterradas na areia; fenômeno observado em diversos outros pontos da baía, e atribuível à dinâmica natural das praias da região, que passam por um período de acreção que coincide com o verão. Durante o outono e o inverno, essas praias sofrem processos de erosão, que poderão vir a desenterrar as placas de óleo, gerando uma nova fase de contaminação do ambiente. Os trabalhos de remoção do óleo foram iniciados alguns dias após o acidente, e persistiram, quase que ininterruptamente, até meados do mês de fevereiro. Essa porção de praia caracteriza-se como um ponto de coleta natural de detritos, e vem sendo constantemente re-contaminada, ainda que em quantidades menores e em uma faixa menos extensa do que o observado nas primeiras semanas. Além de constatada e avaliada pelas equipes que realizavam o monitoramento da área, a contaminação dessas praias da ilha das Peças foi também relatada em parecer técnico, datado de 26/11/2004, do Laboratório de Estudos Costeiros, do Departamento de Geologia da UFPR (Anexo 088).

- Área 15 A - Rio das Peças: houve contaminação, em grau mínimo, do manguezal que ocupa as margens do Rio das Peças. Foi observada também presença de óleo (contaminação variando de mínima a média) em algumas faixas de marisma e manguezal existentes em ambos os lados da foz do rio, sem, no entanto, sinais de mortalidade massiva da vegetação. Em sucessivos monitoramentos realizados na região, constatou-se que o limite norte de ocorrência de óleo ao longo dessa costa da ilha das Peças (correspondente ao limite norte de ocorrência de óleo na margem leste da baía de Laranjeiras) ficou delimitado, aproximadamente, pelo ponto de coordenadas UTM 22J 0767503mE, 7183580mN, totalizando cerca de 3 km de extensão, em sentido NW, a partir da foz do rio. Tabela 2. Resumo das áreas atingidas em cada uma das UC federais. Legenda (Ambientes) – Mg: Manguezais; Ms: Marismas; Co: Costões Rochosos; Pr: praia; Art: estruturas artificiais

Área Nome unidade de conservação

Ambientes Grau de contaminação

Extensão (km)

23A, B e C

Amparo e Piaçagüera

APA de Guaraqueçaba

Mg; Ms; Co; Pr.

Méd. – Máx. 5,00

23D Saco do Tambarutaca

APA de Guaraqueçaba

Mg; Ms. Mín. – Méd. 4,00

22 Pedra da Cruz

APA de Guaraqueçaba

Mg; Ms; Co.

Máx. 0,25

21C Prainha/ Ponta do Ubá

APA de Guaraqueçaba

Mg; Co; Pr; Art.

Mín. – Méd. 5,00

21B Rio Medeiros/ Almeida

APA de Guaraqueçaba

Mg; Pr; Ms; Art.

Mín. 5,00

09 Ilha das Cobras APA de Guaraqueçaba

Co; Pr; Art.

Mín. – Máx. 3,00

21C Ilha da Banana ESEC de Guaraqueçaba

Co; Pr. Mín. 0,80

19 Praia Deserta/ Superagüi

PARNA do Superagüi

Pr; Art. Mín. 14,00

15B Praia Ilha das Peças

PARNA do Superagüi

Pr. Méd. 12,00

15A Rio das Peças PARNA do Superagüi

Mg; Ms; Pr.

Mín. – Méd. 3,00

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3.2.7.2 IMPACTOS SOBRE AS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO ESTADUAIS As informações citadas abaixo estão detalhadas no Anexo 089.

Estação Ecológica e Parque Estadual da Ilha do Mel Dentre as ilhas atingidas inclui-se a Ilha do Mel, constituída por duas unidades de

conservação estaduais (Parque Estadual da Ilha do Mel e Estação Ecológica da Ilha do Mel). A contaminação atingiu principalmente a ponta Oeste da ilha, onde o óleo concentrou-se em ambiente de marisma e mangue, espalhando-se, a partir daí, por outras partes da ilha com a lavagem da maré.

O extremo ponto oeste da Ilha do Mel recebeu a maior carga de óleo e manchas de óleo de menor intensidade foram avançando no sentido da Praia do Rio do Cedro, Nova Brasília e Fortaleza. Esta porção da Ilha está totalmente inserida na Estação Ecológica. Em uma primeira vistoria realizada no dia 24 de novembro foram avaliados estes pontos obtendo-se suas coordenadas de localização através de aparelhos de GPS.

Manguezais e marismas

- Área 11A - Praia Radio Farol (Coordenadas 0768436 – 7177664): Pequena gamboa com

mangue pouco desenvolvido, com Rhizophora mangle na franja, e Laguncularia racemosa de até 3 a 4 m de altura. Ocorreu a entrada de óleo pela gamboa atingindo o sistema radicular de algumas árvores. O óleo adentrou no mangue alguns metros, mas os danos são parciais. Há ainda plântulas desprovidas de óleo.

- Área 11B – 1) Ponta Oeste (Coordenadas 0767828 – 7177674): Plântulas de Avicennia schaueriana cobertas de óleo. 2) Ponta Oeste (Coordenadas 0763118 – 7176721): Local indicado para estabelecimento de parcelas de monitoramento. Mangue situado na franja da praia com marisma intensamente afetada pelo óleo. Toda a porção aérea da Spartina encontra-se coberta, com raras brotações não atingidas ou recentes. Os bancos de plântulas encontram-se seriamente comprometidos, destacando-se mudas de Rhizophora mangle e Laguncularia racemosa (altura até 1 m). A porção frontal do mangue situado junto e por trás da marisma encontra-se intensamente coberta por óleo, mangue este, composto dominantemente por L. racemosa, associado com R. mangle, e que se estende até o canal do rio Fundo (margens – coordenadas 0764623 – 7177601) e praia adiante. Todas as porções frontais desse mangue encontram-se com o sistema radicular coberto de óleo, sempre aqueles indivíduos arbóreos situados mais defronte à praia. Quando efetuou-se um pequeno corte no solo verificou-se a presença de uma camada de óleo sob a areia, em diferentes profundidades. No entorno das plantas de marisma, o óleo encontra-se 1 cm abaixo da camada de areia mais superficial. Em pontos da praia um pouco mais acima, encontra-se uma camada de óleo a uma profundidade de 2 ou 3 cm, e inclusive duas camadas de óleo a 5 e 10 cm. Neste local foi efetuado o teste dos Pompons, que se encontravam repletos de óleo. Neste local também foi aplicada a turfa, absorvente de origem orgânica, mas não foi possível identificar seus resultados pela dificuldade de localização. Avaliou-se o grau de danos às Spartina alterniflora cortando-se seus talos, e verificou-se que seu caule ainda encontrava-se vivo, apresentando coloração verde normal. Considerando-se o potencial de disseminação da contaminação do óleo no entorno, o grau intenso de danos às referidas plantas, a facilidade de acesso e, ainda, a pouca extensão dessas formações, optou-se pela poda seletiva da porção aérea dessas plantas, removendo as folhas que se encontravam totalmente cobertas pelo óleo.

- Área 14 - Lagoa da Praia de Fora, próxima ao Farol em Brasília (Coordenadas UTM 22J 0771047 – 7172459): Na entrada do canal da Lagoa, junto à praia, há gramíneas e intensa regeneração de Laguncularia racemosa, com até 20 cm de altura. Neste local identificou-se a presença de pequenas placas de óleo mais denso. Percorrendo-se o entorno da lagoa não foram encontradas novas áreas afetadas.

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Praias e Costões

As praias e os costões atingidos na Ilha do Mel estão localizados tanto na Estação Ecológica como no Parque Estadual. As praias, em alguns casos, não tiveram o derrame de óleo direto, sendo afetadas apenas com pelotas de óleo, trazidas pela maré, provenientes de pontos mais atingidos, como a Ponta Oeste. Os costões, por sua vez, foram atingidos por pequenas manchas de óleo.

3.2.8 IMPACTOS SOBRE A ÁREA INDÍGENA DA ILHA DA COT INGA

Conforme descrito no item “Características da área atingida”, as ilhas da Cotinga e Rasa da

Cotinga fazem parte de uma Reserva Indígena Guarani. O óleo atingiu essa área de maneira mais intensa nas faces Norte e Noroeste das ilhas, atingindo o ambiente entre-marés, formado por costões rochosos, praias arenosas, manguezais e marismas. Dentro da numeração estabelecida para monitoramento das áreas atingidas, a área da Reserva Indígena corresponde aos pontos: 03, 05, 06, 07 e 08. De maneira geral, as áreas 06 e 08 são predominantemente ocupadas por manguezais e marismas e sofreram pouca ou nenhuma contaminação. Nos relatórios das vistorias realizadas no final de março e início de abril, após a finalização dos trabalhos de retirada dos destroços do navio (Anexo 048), constam descrições da contaminação ocorrida nos pontos 03, 05 e 07, das atividades de limpeza realizadas nessas áreas e da situação atual em que se encontram. Essas informações estão descritas resumidamente a seguir.

Área 03 – Ilha da Cotinga

Descrição do ambiente: faixa estreita de zona entre-marés, formada predominantemente por

seixos e rochas de diversos tamanhos, sobre um substrato arenoso, intercalado por pequenas praias de areia grossa. Sobre o substrato rochoso observa-se uma alta densidade de ostras, além de significativa ocorrência de cracas, gastrópodes e caranguejos. Ao longo de toda essa faixa há ocorrência de árvores esparsas das três espécies típicas dos manguezais da região, crescendo tanto entre os seixos quanto nas praias arenosas.

Grau de contaminação: a área foi atingida por óleo combustível proveniente dos primeiros vazamentos, ocorridos logo após a explosão do navio. De maneira geral as faces norte e noroeste da ilha (sub-áreas 3 A-4 e 3 A-5) foram as mais atingidas, constituindo-se em pontos naturais de coleta do material contaminante. O grau de contaminação ao longo da costa variou desde áreas pouco atingidas (cerca de 20% de cobertura por óleo) até áreas totalmente contaminadas (100% de cobertura), com predominância de áreas com mais de 70% de contaminação. O óleo recobriu predominantemente as áreas rochosas e troncos e raízes dos mangues (no nível máximo de maré) no supralitoral, tendo percolado para a sub-superfície do substrato no médio e infra-litorais.

Área 05 – Ilha Rasa da Cotinga

Descrição do ambiente: planície de maré formada por uma praia de sedimento arenoso a

areno-lodoso (supra e médio-litorais), bordejada por um extenso baixio lodoso não-vegetado (infra e sub-litorais). A praia é ocupada por faixas intermitentes de marismas e agrupamentos de árvores de mangue, que ocorrem em alguns pontos associadas às marismas e em outros de forma isolada, formando faixas com em média menos que 5 metros de largura.

Grau de contaminação: a área foi atingida por óleo combustível proveniente dos primeiros vazamentos, ocorridos logo após a explosão do navio, e por vazamentos menores ocorridos posteriormente, em especial no dia 24/02/2005. A contaminação proveniente dos vazamentos iniciais atingiu, principalmente, uma faixa de cerca de 500 metros, a partir da entrada do canal do Sucuriu e em direção leste, ao longo da face norte da ilha. Uma faixa de marisma localizada logo na entrada do canal sofreu alto grau de contaminação (90% de cobertura das estruturas aéreas), em uma extensão de cerca de 30 metros. Em uma faixa de praia de 20 metros de extensão, localizada adjacente à foz de um pequeno curso d’água (UTM 756189 – 7175998), foi encontrada grande

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quantidade de óleo enterrado na areia. Os marismas e mangues existentes nos dois extremos dessa faixa tiveram um alto grau de contaminação. No restante desses 500 metros iniciais diversas faixas de marisma e manguezal sofreram grau de contaminação variando entre 70 e 90% de cobertura (folhas no caso das marismas e troncos e raízes nos mangues). Nos cerca de quatro quilômetros que se seguem, a contaminação foi leve e esparsa, atingindo 20% de cobertura em pontos isolados das marismas e dos mangues, com exceção de uma faixa de cerca de 25 metros de extensão na qual a contaminação chegou a 70%. No vazamento ocorrido em 24/02, o óleo atingiu uma faixa de aproximadamente 800 metros (entre os pontos UTM 22J 0757884 mE, 7175842 mN e 0758672, 7175726), ocupada predominantemente por faixas de marismas de 10 – 15 metros de largura, associadas a bancos de árvores jovens de mangue. A contaminação, provavelmente, ocorreu durante a maré alta, tendo atingido apenas a porção superior da vegetação. Como as plantas de marisma encontravam-se já em período reprodutivo, o óleo atingiu principalmente as flores e sementes. Estima-se que a quantidade de óleo nesse segundo evento de contaminação foi significativamente menor do que a proveniente dos vazamentos ocorridos logo após o acidente, já que não foi observada, no período após o dia 24/02, presença de placas de óleo sobre a superfície ou óleo enterrado no sedimento, limitando-se a contaminação à parte superior das folhas de Spartina e dos troncos e raízes de mangue.

Área 07 – Canal do Sucuriu

Descrição do ambiente: Planícies de maré ocupadas por manguezais e marismas. Grau de contaminação: a área foi atingida por óleo combustível proveniente dos primeiros

vazamentos. A contaminação ocorreu em níveis variáveis ao longo de toda a extensão das margens do canal do Sucuriu, com predominância de contaminação da franja frontal dos bosques de mangues. Uma faixa de aproximadamente 1000 metros, localizada na Ilha da Cotinga (Área 07-A), sofreu um alto nível de contaminação e está descrita em maiores detalhes a seguir.

Área 07-A – Ilha da Cotinga - margem do Canal do Sucuriú

Descrição do ambiente: faixa estreita de manguezal (com predominância de Rhizophora

mangle e Laguncularia racemosa), no geral, não ultrapassando cinco metros de largura, crescendo sobre substrato arenoso a areno-lodoso. Presença de agrupamentos de Spartina alterniflora ocupando faixas intermitentes em frente ao manguezal e no interior deste, entre as raízes e troncos das árvores.

Grau de contaminação: a área foi atingida por óleo combustível proveniente dos primeiros vazamentos, ocorridos logo após a explosão do navio. O óleo desses vazamentos atingiu, predominantemente, uma faixa de cerca de um quilômetro de extensão, situada entre as coordenadas UTM 0754419, 7176234 e 0754967, 7175291. Houve alto índice de contaminação, acima de 90% de cobertura (troncos e raízes de mangues, superfície do solo e folhas de marisma), em praticamente todo esse trecho.

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4. CONCLUSÕES

1 - A explosão no Navio Vicuña provocou a morte de quatro tripulantes, além de danos materiais ao patrimônio público e privado. 2- Causou a liberação de 4.079,233 toneladas de metanol, que queimaram, evaporaram ou diluíram-se nas águas da Baía de Paranaguá, causando efeitos imediatos e severos, porém de curto prazo, sobre o ambiente. Exemplo disto foi a morte de três tartarugas marinhas, encontradas com dilaceração facial. 3 - Em decorrência da explosão houve rompimento dos tanques de óleo no navio, resultando em vazamentos de óleo bunker, óleo diesel e óleos lubrificantes, num total aproximado de 291.000 litros, causando impactos de curto prazo, além de impactos de médio e longo prazo, ainda a serem dimensionados e avaliados, sobre os diversos ambientes do Complexo Estuarino de Paranaguá e da faixa costeira do litoral paranaense. 4 – A extensão total de costa atingida pelo derrame de óleo foi de 170 quilômetros, que representam 15% dos 1.130 km de costa da região do Complexo Estuarino de Paranaguá. Em termos de extensão linear, as praias arenosas foram as mais atingidas, com cerca de 88 km, seguidas dos manguezais e marismas (68 km) e costões rochosos (14 km), além das estruturas artificiais atingidas, que somam 2 km. 5 – Esses ambientes foram atingidos em diferentes graus de contaminação: praias, 64,19 km em nível baixo de contaminação, 12,73 km em nível médio e 9,71 km em nível alto; manguezais e marismas, 37,65 km em nível baixo, 24,35 km em nível médio e 5,48 km em nível alto; costões rochosos, 6,09 km em nível baixo, 3,60 km em nível médio e 4,12 km em nível alto; estruturas artificiais, 2,00 km em nível baixo de contaminação. 6 – Os ecossistemas mais severamente atingidos pelo derrame, e com maior dificuldade de limpeza, foram os manguezais e marismas, onde se observou a mortalidade das árvores e gramíneas típicas desses ambientes. Os pontos mais contaminados localizam-se na Ilha do Mel, Ilha Rasa da Cotinga, Ilha da Cotinga e nas proximidades da Pedra da Cruz (Ponta do Ubá). O acúmulo de óleo nestes locais representa fonte intermitente de contaminação do ambiente, com efeitos a médio e longo prazo. 7 – Foram atingidas quatro unidades de conservação de proteção integral (Parque Nacional do Superagüi, Estação Ecológica de Guaraqueçaba, Parque Estadual da Ilha do Mel e Estação Ecológica da Ilha do Mel), bem como duas de uso sustentável (Áreas de Proteção Ambiental de Guaraqueçaba – federal e estadual) e uma área indígena (Ilha da Cotinga). 8 – Entre as espécies de fauna atingidas, destacam-se as tartarugas marinhas, sendo encontrados mortos 32 indivíduos das espécies: tartaruga-verde Chelonia mydas (29), tartaruga-de-pente Eretmochelys imbricata (01) e tartaruga-cabeçuda Caretta caretta (02), as quais pertencem à Lista Oficial da Fauna Ameaçada de Extinção e ao Anexo I da CITES, bem como quatro indivíduos vivos de Chelonia mydas, com sinais de contaminação por óleo. 9 – Os dois outros grupos animais severamente atingidos foram: a) os crustáceos, em especial o caranguejo-uçá (Ucides cordatus), espécie de interesse comercial, habitante dos manguezais da região, e as cracas, que ocorrem nos costões rochosos e sobre raízes de mangues; b) os moluscos, em especial as ostras, que ocorrem nos costões e sobre as raízes de mangues, mexilhões, habitantes dos costões, bacucus e berbigões, que vivem em baixios e manguezais.

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10 – As comunidades de peixes que habitam as planícies de maré das áreas atingidas foram impactadas pelo óleo, fato evidenciado pela alteração observada em sua composição de espécies, que atingiu uma configuração típica de áreas fortemente poluídas. 11 – Em relação à avifauna, houve impacto imediato, sendo encontrados 22 indivíduos mortos e 13 vivos, com evidências de contaminação, de diversas espécies de aves marinhas. 12 – Análises laboratoriais indicaram contaminação por Hidrocarbonetos Policíclicos Aromáticos -HPA em tecidos de ostras, caranguejos e bacucus coletados nas áreas atingidas pelo derramamento. Estas são espécies comumente utilizadas como alimento pela população da região. 13 – O derramamento de óleo contaminou as águas superficiais das baías de Paranaguá, Antonina e Laranjeiras e as águas costeiras da plataforma continental As áreas mais atingidas foram a Baía de Paranaguá, no entorno do navio, a Ilha da Cotinga e a Ilha do Mel. A qualidade das águas das praias oceânicas e daquelas da Ilha do Mel foi afetada pelo derrame num período curto de tempo, uma vez que o último registro de substâncias indicadoras da presença de óleo na água ocorreu em 28/11/2004, no balneário de Shangri-lá. 14 - A contaminação decorrente do derramamento de óleo causou a proibição da pesca, o que trouxe prejuízos diretos para a atividade pesqueira, de expressivo valor sócio-econômico na região, e, conseqüentemente, para as comunidades de pescadores. 15 – Os Planos de Emergência do Porto Organizado de Paranaguá e das empresas que nele operam não se mostraram adequados ao atendimento de emergências desse porte.

16 – As ações de contenção do óleo derramado foram insuficientes e não conseguiram evitar a gravidade dos danos sobre a biota e as áreas afetadas. 17 – Em face do pouco tempo transcorrido desde o acidente, os estudos e avaliações realizados, até o momento, não são capazes de avaliar a total magnitude dos impactos desse evento sobre o ambiente na região, tarefa que exigirá estudos complementares a longo prazo.

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5. RECOMENDAÇÕES 1 – Os Planos de Emergência do Porto Organizado de Paranaguá e das empresas que nele operam devem ser revistos e devidamente avaliados, de forma integrada, com o intuito de melhorar o sistema de resposta a futuros acidentes, que certamente ocorrerão, evitando e/ou minimizando os impactos destes; 2 – Considerando que o Complexo Estuarino de Iguape – Cananéia e Paranaguá não dispõe de um sistema integrado de informações e resposta a acidentes de grande porte, como o ocorrido, recomenda-se a instalação e operação de um Centro de Defesa Ambiental. 3 – Considerando: - a complexidade das interações ecológicas no Complexo Estuarino de Paranaguá, que incluem um papel fundamental como área de reprodução e de alimentação de um grande número de espécies marinhas; - a época em que ocorreu o acidente, que coincidiu com o período reprodutivo da maioria destas espécies; - a importância desse ecossistema nos contextos social, econômico e ambiental do país; - a extensão do impacto observado até o momento; - a existência de unidades de conservação afetadas; - a persistência e a toxicidade de alguns componentes dos óleos derramados; Recomenda-se que a avaliação dos impactos desse acidente tenha continuidade, através de pesquisas e monitoramento a longo prazo. 4 – Considerando que: - a área portuária de Paranaguá corre o risco de estar envolvida em novos acidentes com substâncias tóxicas; - existem várias comunidades isoladas morando no seu entorno, como Piaçagüera, Amparo, Europinha, Ponta do Ubá, bem como das ilhas da Cotinga, Rasa, Peças e Superagüi. Recomenda-se que tais comunidades sejam inseridas em um programa de capacitação e de educação ambiental, que possibilite sua atuação em tais emergências, tornando-se facilitadores e multiplicadores do trabalho dos Órgãos Ambientais, Defesa Civil e da Vigilância Sanitária. Paranaguá, 02 de maio de 2005.

Guadalupe Vivekananda Bióloga M.Sc. – IBAMA

CRB – 03437-03 D

João Antonio de Oliveira Biólogo – IBAMA CRB – 17161-03 D

Luiz Francisco Ditzel Faraco Biólogo M.Sc. – IBAMA

CRB – 34186-03 D

Claudio D’Oliveira Engenheiro Agrônomo – IAP

CREA – 10441 D

Maria Lúcia Maranhão Biscaia de Medeiros Bióloga M.Sc.- IAP CRB – 0137-03 D

Rosângela Maria Costa Frega Técnica - IAP

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REFERÊNCIAS

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