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LAVRADO RORAIMENSE E A BUSCA POR SUA IDENTIDADE NASCIMENTO, CLAUDIA HELENA CAMPOS (1); LINS, JUDSON WOJTILA DE ROLIM (2) 1. Universidade Federal de Roraima. Departamento de Arquitetura e Urbanismo Endereço Postal: Av. Cap. Ene Garcez, 2413 Bloco 5 Departamento de Arquitetura e Urbanismo Bairro Aeroporto Boa Vista/RR CEP 69310-000 E-mail [email protected] 2. Universidade Federal de Roraima. Departamento de Arquitetura e Urbanismo Endereço Postal: Av. Cap. Ene Garcez, 2413 Bloco 5 Departamento de Arquitetura e Urbanismo Bairro Aeroporto Boa Vista/RR CEP 69310-000 E-mail [email protected] RESUMO O Brasil possui nove conjuntos formados pelo clima, vegetação, hidrografia e relevo, ou seja, nove diferentes biomas e 49 ecorregiões, tecnicamente reconhecidos. Alguns desses biomas, em maior ou menor escala, são objetos de reconhecimento, discussões e ações relacionadas à preservação, e todos estes têm sido tema e foco de inúmeros esforços e considerações, em maior ou menor grau. Há evidente e crescente degradação do meio ambiente em larga escala e em processo acelerado, contudo também há a preocupação constante com a perpetuação de espécies da fauna e flora - refletida diretamente em estudos científicos que demonstrem a problemática da ausência de meios, registros e conhecimentos técnicos para o aprofundamento - e, consequentemente, meios para a manutenção do que consideramos a paisagem nativa, especialmente no extremo norte do Brasil. O lavrado, termo característico e reconhecido popularmente do cerrado no estado de Roraima, se destaca como paisagem de extensão da Gran Sabana venezuelana, que sofreu antropização a partir do uso da pecuária, primeiro ciclo econômico do estado (a partir do século XVIII) que permanece até os dias atuais. De tal forma que, a pecuária, findou por tornar-se a influência consolidadora e de certo modo transformadora nessa região. Este ecossistema nativo da Amazônia apesar de possuir similaridades ao Cerrado do Planalto Central possui em sua extensão, flora e fauna únicas. Ainda que de maneira indireta estejam parcialmente protegidas pelas reservas indígenas que ocupam mais de 50% de sua extensão no estado de Roraima, é pouco considerando o avanço do agronegócio na região. A vegetação nativa, exuberante e diversificada do Lavrado Roraimense, assim como em todos os biomas e ecorregiões existentes transita em uma faixa tênue de equilíbrio, onde a necessidade de salvaguardar se torna prioritária e fundamental. A riquíssima gama de componentes ainda inexplorados referentes à fauna e flora nativa, inclusive para utilização paisagística, também são fatores importantes e cujo aprofundamento teórico e técnico deve ter espaço. Boa Vista, por ser a cidade mais estruturada e desenvolvida do estado de Roraima, necessita incrementar avanços científicos no que se refere à conservação e manutenção da biodiversidade de seu bioma específico. Por tratar-se ainda de uma cidade em construção, apresenta elementos e fatores relevantes para ser promotora desses estudos. A necessidade vocacional de ser centro administrativo e de produção de conhecimento, de concentração populacional e de referência cultural, induzem à necessidade de ser o local de fomento da discussão

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LAVRADO RORAIMENSE E A BUSCA POR SUA IDENTIDADE

NASCIMENTO, CLAUDIA HELENA CAMPOS (1); LINS, JUDSON WOJTILA DE ROLIM (2)

1. Universidade Federal de Roraima. Departamento de Arquitetura e Urbanismo

Endereço Postal: Av. Cap. Ene Garcez, 2413 Bloco 5 – Departamento de Arquitetura e Urbanismo Bairro Aeroporto – Boa Vista/RR – CEP 69310-000

E-mail [email protected]

2. Universidade Federal de Roraima. Departamento de Arquitetura e Urbanismo Endereço Postal: Av. Cap. Ene Garcez, 2413 Bloco 5 – Departamento de Arquitetura e Urbanismo

Bairro Aeroporto – Boa Vista/RR – CEP 69310-000 E-mail [email protected]

RESUMO O Brasil possui nove conjuntos formados pelo clima, vegetação, hidrografia e relevo, ou seja, nove diferentes biomas e 49 ecorregiões, tecnicamente reconhecidos. Alguns desses biomas, em maior ou menor escala, são objetos de reconhecimento, discussões e ações relacionadas à preservação, e todos estes têm sido tema e foco de inúmeros esforços e considerações, em maior ou menor grau. Há evidente e crescente degradação do meio ambiente em larga escala e em processo acelerado, contudo também há a preocupação constante com a perpetuação de espécies da fauna e flora - refletida diretamente em estudos científicos que demonstrem a problemática da ausência de meios, registros e conhecimentos técnicos para o aprofundamento - e, consequentemente, meios para a manutenção do que consideramos a paisagem nativa, especialmente no extremo norte do Brasil. O lavrado, termo característico e reconhecido popularmente do cerrado no estado de Roraima, se destaca como paisagem de extensão da Gran Sabana venezuelana, que sofreu antropização a partir do uso da pecuária, primeiro ciclo econômico do estado (a partir do século XVIII) que permanece até os dias atuais. De tal forma que, a pecuária, findou por tornar-se a influência consolidadora e de certo modo transformadora nessa região. Este ecossistema nativo da Amazônia apesar de possuir similaridades ao Cerrado do Planalto Central possui em sua extensão, flora e fauna únicas. Ainda que de maneira indireta estejam parcialmente protegidas pelas reservas indígenas que ocupam mais de 50% de sua extensão no estado de Roraima, é pouco considerando o avanço do agronegócio na região. A vegetação nativa, exuberante e diversificada do Lavrado Roraimense, assim como em todos os biomas e ecorregiões existentes transita em uma faixa tênue de equilíbrio, onde a necessidade de salvaguardar se torna prioritária e fundamental. A riquíssima gama de componentes ainda inexplorados referentes à fauna e flora nativa, inclusive para utilização paisagística, também são fatores importantes e cujo aprofundamento teórico e técnico deve ter espaço. Boa Vista, por ser a cidade mais estruturada e desenvolvida do estado de Roraima, necessita incrementar avanços científicos no que se refere à conservação e manutenção da biodiversidade de seu bioma específico. Por tratar-se ainda de uma cidade em construção, apresenta elementos e fatores relevantes para ser promotora desses estudos. A necessidade vocacional de ser centro administrativo e de produção de conhecimento, de concentração populacional e de referência cultural, induzem à necessidade de ser o local de fomento da discussão

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sobre a definição do conceito "lavrado", tecnicamente inexistente. O presente artigo constitui parte das discussões do Trabalho de Conclusão de Curso em Bacharelado em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Roraima, em andamento, que visa propor a concepção do Jardim Botânico do Lavrado, no Estado de Roraima, como instância de apropriação cultural e técnica de reconhecimento dessa ecorregião e sua identidade. Palavras-chave: Paisagem; Lavrado Roraimense; Identidade.

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O Lavrado Roraimense e a busca por sua identidade

O que chamam de lavrado, na verdade, é um mosaico de um monte de coisas. (Mário Cohn-Haft)

Ao se trazer o termo Lavrado Roraimense para discussão, em si, já se caracteriza como um

ato de resistência cultural. Alguns estudos acadêmicos, especialmente do campo da Biologia,

reforçam a necessidade de entendimento do Lavrado como recorte específico de estudo.

Somam-se a esses os que visualizam a fragilidade hidrológica desse sistema e reforçam o

discurso dos biólogos, na necessária defesa dessa paisagem natural. Mas o chamado

Lavrado Roraimense traz em si uma interface cultural quase invisível, mas expresso em seu

próprio termo, que popularmente o diferencia da Gran Sabana Venezuelana.

Figura 1: Vista aérea de Boa Vista/RR. Fotografia Alexander Hamilton Rice Jr., 1924

Fonte: Domínio Público

A ocupação do território que hoje se configura como Estado de Roraima se fez na margem

esquerda do Rio Branco, com um insipiente povoado que, a partir do processo colonizador

capitaneado pela ordem carmelitana, no século XVIII, após a falência da tentativa de

instalação do Forte São Joaquim, na confluência dos rios Tacutu e Uraricoera (à época, rio

Parima), sob o argumento de reprimir os ataques ingleses, holandeses e espanhóis nessa

região. O povoado do Rio Branco, em 1858 foi elevado à categoria de Freguesia de Nossa

Senhora do Carmo do Rio Branco. Ainda com a categoria de vila do município amazonense de

Moura até meados do século XX, manteve-se com a configuração de um pequeno núcleo que

mediava o chamado Porto do Sal e o extenso lavrado (Figura 1), onde eram desenvolvidas

atividades de pecuária extensiva. Apenas em 1943 é criado o Território Federal do Rio

Branco, tendo Boa Vista como sede administrativa, possivelmente como forma de gerenciar o

fluxo econômico advindo do garimpo de diamantes descoberto à época na Serra do

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Tepequém. Nesse período também é estimulada a ocupação do interior, com atividades

agropecuárias, gerando grande influxo populacional.

Assim sendo, o termo “lavrado” traz referência ao processo histórico de colonização, com

perspectiva agropecuária. Esse mesmo processo, que o caracteriza, também é o indutor de

riscos para essa paisagem que se apresenta em sua potência de flora, fauna, relevo e

geologia, mas que também guarda riquezas que devem ser valorizadas e preservadas.

Grupos e etnias indígenas – mais de trinta nações, como os Yanomami, Wai-wai, Maiongong,

Macuxi, Ingaricó, Wapixana, Waimiri-atroari e Taurepang –, práticas culturais diversas, além

de potencial valor patrimonial internacional fazem parte desse território que possui em seu

nome a identidade histórica e socioeconômica das práticas humanas nessa região. Embora

de amplos horizontes, o Lavrado Roraimense possui identidade clara, como uma marca

precisa, um documento de práticas culturais que ultrapassam fronteiras, mas que é tradução

do povo do Estado de Roraima.

Aspectos físicos da paisagem

O Brasil possui sete conjuntos formados pelo clima, vegetação, hidrografia e relevo, ou seja,

sete diferentes biomas, de acordo com a Conferência das Nações Unidas Sobre

Desenvolvimento Sustentável – RIO+20 são eles: Mata Atlântica, Amazônia, Cerrado,

Caatinga, Pampas, Pantanal e Ambientes Costeiros, além disso possui 49 ecorregiões1, na

qual este objeto de estudo, o lavrado, se insere.

Algumas discussões e ações relacionadas à preservação não somente da Floresta

Amazônica e da Mata Atlântica, mas da biodiversidade como um todo, tem sido tema e foco

de inúmeros esforços e observações, considerando-se o acelerado processo de degradação

ambiental que o planeta apresenta nesse momento.

Do gigantesco território brasileiro, que abrigou os autointitulados descobridores, até as

providências relacionadas à preservação, conservação e pesquisa dos recursos naturais, por

assim dizer, dos governantes na atualidade, muito se perdeu por mera ignorância ou mesmo

descaso.

A preocupação constante com a perpetuação de espécies da fauna e flora refletida

diretamente em estudos científicos demonstra a problemática da ausência de meios, registros

1 As ecorregiões são unidades de paisagem, flora e fauna, que servem de base para o planejamento da preservação da biodiversidade e não respeitam as fronteiras entre os países. Elas são determinadas por um conjunto de características muito mais vitais que a simples divisão política das terras e são uma ferramenta eficiente para orientar projetos de conservação. Fonte: www.ibama.gov.br Acesso em: agosto de 2014.

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e conhecimentos técnicos, ainda na atualidade, para o aprofundamento e consequentemente

para a manutenção do que consideramos a paisagem nativa no território brasileiro e mais

especificamente no extremo norte do Brasil, onde está situado o chamado Lavrado

Roraimense. Desta forma temos que:

Lavrado é o termo local para a região das savanas de Roraima. Trata-se de um ecossistema único, sem correspondente em outra parte do Brasil, com elevada importância para a conservação da biodiversidade e dos recursos hídricos. Esta paisagem faz parte do grande sistema de áreas abertas estabelecido entre o Brasil, a Guiana e a Venezuela com mais de 60.000 km

2.

O lado brasileiro é quase que totalmente restrito à Roraima, detendo mais de 70% (43.358 km

2) de todo este complexo (...) Dentro da divisão de biomas e

ecorregiões que o Brasil adota, esta grande paisagem é definida como a ecorregião das “Savanas das Guianas”, inserida no Bioma Amazônia. Apesar de seu importante contexto ecológico, toda esta região está sob a ameaça da expansão do agronegócio e ainda não possui nenhuma unidade de conservação de proteção integral ou uso sustentável. (Campos, Pinto, Barbosa, 2008, p. 1).

É interessante ressaltar, que, Lavrado, Cerrado e Campos são sinônimos, entretanto suas

similaridades param por aí; influências geográficas, climáticas e territoriais são fatores

relevantes nesse aspecto e que foram levantados durante a 8ª Conferência Internacional de

Áreas Úmidas – Intecol, em 2008.

Apesar de parecido com a paisagem do Centro-Oeste, os campos naturais de Roraima possuem uma diversidade estimada de espécies de plantas por quilômetro quadrado maior que a do cerrado (0,0125 espécie/km

2 contra

0,0032 espécie/km2). Isto é por conta da maior extensão em área dos

cerrados do Brasil Central, que dilui a densidade de espécies por unidade de área. Entretanto, o lavrado está no Hemisfério Norte, cercado pela Floresta Amazônica e pelo Planalto das Guianas, o que confere à paisagem características e evolução natural únicas. (Fonseca, 2008).

Este ecossistema nativo da Amazônia, e ainda pouco conhecido, apesar de possuir

similaridades ao Cerrado do Planalto Central possui em sua extensão, flora e fauna

riquíssimas ocasionadas pela variação entre altitude, clima e pluviosidade.

São mais de 600 espécies animais registradas, muitas delas exclusivas desta região. Mesmo com a ameaça da expansão do agronegócio pairando sobre estes ricos ecossistemas amazônicos, ainda não existe um hectare sequer de área protegida nos 4 milhões de hectares de campos naturais em Roraima. (Fonseca, 2008).

Orquídeas belíssimas surgem em meio ao lavrado, nas margens de igarapés, lagos e

buritizais e com mais de 450 espécies das quais a Bletia, a Caularthron bilamellatum que

ocorrem somente no estado de Roraima em florestas secas de galeria ou veredas de

buritizais.

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As veredas de buritizais 2 estão presentes em toda a extensão do lavrado roraimense

demonstrando também sua abundante reserva hídrica, além de viveiros para diversos

animais, como as aves que pairam pelo lavrado roraimense destacando-se por cores e sons e

que também clamam pela oportunidade de uma maior pesquisa, como por exemplo, a

Jandaia-Sol (Aratinga solstitialis), que habita as regiões mais secas do lavrado roraimense e

que foi traficado aos milhares nas décadas de 1970 e 1980, e que hoje ainda resistem na

região.

Enquanto os cerrados são razoavelmente conhecidos, inclusive por estarem próximos aos maiores centros urbanos do Brasil, ao lavrados de Roraima ainda guardam diversos segredos. Sua aviafauna é muito particular, com várias espécies características e exclusivas dessa formação vegetal. Aves como o Pedro-Celouro (Sturnella magna), o Téu-Téu-da-Savana (Burhinus bistriatus) e o Uru-do-Campo (Colinus cristatus) são derivados de ancestrais que vieram da América do Norte e chegaram a região por meio de corredores aberta ou de gramínea, há milhões de anos, em períodos glaciais, quando boa parte da floresta desapareceu ou secou (...) Outras aves interessantes dos lavrados incluem o Sabiá-da-Praia (Mimus gilvus), a Garrincha-dos-Lhanos (Campylorhynchus griséus) e o Periquito-de-Bochecha-Parda (Aratinga pertinax). (SILVEIRA, s/d., p. 41)

Juntamente com os buritizais, os lagos3 , presentes na região nordeste do território de

Roraima, também apresentam importante papel na paisagem e nesses microcosmos ainda

pouco desvendados, de tal maneira que o crescimento das cidades de Roraima,

desordenadamente, ocasionou de forma inconsequente a antropização de alguns desses

2 Veredas de buritizais: “é a fitofisionomia (tipos de vegetação) com a palmeira do Buriti (Maurotia flexuosa) emergente, em meio a agrupamentos mais ou menos densos de espécies arbustivo-herbáceas. As veredas são circundadas por Campo Limpo, geralmente úmido, e os buritis não formam dossel como ocorre no Buritizal. Nas Veredas os buritis caracterizam-se por altura média de 12 a 15 metros e a cobertura varia de 5% a 10%. As veredas são encontradas em solo hidromórfico (saturado por água), durante a maior parte do ano. Geralmente ocupam os vales ou áreas planas acompanhando linhas de drenagem mal definidas, em geral sem murunduns (morrote ou microrelevo). Também são comuns numa posição intermediária do terreno, próximo as nascentes (olhos d’água), ou na borda de matas de galeria (formas de vegetação que acompanham o curso das águas). A ocorrência da Vereda condiciona-se ao afloramento do lençol freático, decorrente de camadas de permeabilidade diferentes em áreas sedimentares do Cretáceo e Triássico (RIBEIRO & WALTER, 1988). As Veredas exercem papel fundamental na manutenção da fauna do Cerrado pois atua como local de pouso para a avifauna, de refúgio, de abrigo, de fonte de alimento e de local de reprodução também para a fauna terrestre e aquática.” Fitofisonomias: Bioma cerrado. Disponível em < http://www.icmbio.gov.br/> Acesso em: agosto de 2014.

3 Em Roraima, onde bacias lacustres são uma forte característica do lavrado, seus lagos, por outro lado, ainda não foram adequadamente investigados. As informações disponíveis se restringem a simples descrição de suas formas (Barbosa & Ramos, 1959 e Franco et al. 1975). Por outro lado Absy et al. (1997) e Simões Filho et al. (1997) concentram-se em estudos palinológicos e nas características dos sedimentos de lagos da região nordeste e sul do Estado. Latrubesse & Nelson (2001) estudaram a região no entorno da cidade de Boa Vista, e concluem que os lagos estão associados a campos de dunas remanescentes fortemente erodidos, e formados por deflação. Estes lagos localizam-se de fato em áreas de campo de dunas. Desta forma se questiona qual seria a origem dos demais lagos da região, uma vez que, se distribuem por toda a savana de Roraima, ao contrário dos depósitos eólicos, que são restritos a regiões dos rios Cauamé, Tacutu e na foz do rio Mucajaí. Disponível em < http://sbgeo.org.br/> Acesso em: agosto de 2014.

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lagos e com isso uma forte mudança na paisagem se fez perceptível e suas consequências

muitas vezes irreparáveis e desastrosas para o meio ambiente.

Estes lagos, de formas goticulares, circulares, elipsoidais e geminadas, apresentam-se em sua maioria conectados aos igarapés, constituindo suas nascentes. São lagos pequeno (em geral < 5 hectares) e raso com profundidades em sua maioria variáveis entre 0,8 e 1,8 m. Em função disso, são fortemente influenciados pela sazonalidade, a julgar pelo caráter intermitente apresentado pela maioria (cerca de 65 %). Estes lagos se caracterizam ainda por apresentarem-se densamente colonizados por macrófitas aquáticas, principalmente por ciperáceas (macrófitas emersas), as quais se distribuem ao longo das bacias, conforme as variações de profundidades destas.(Menezes, 2006).

Cabeceiras de igarapés e até mesmo rios transitam nesta ecorregião tão forte visualmente e

ao mesmo tempo tão indefesa das ações humanas. Sobram razões para proteção do

Lavrado, agora só falta vontade a quem toma as decisões no Cerrado do Planalto Central.

(Fonseca, 2008).

A vegetação nativa, exuberante e diversificada do Lavrado Roraimense, assim como em

todos os biomas e ecorregiões existentes no Brasil transita em uma faixa tênue de equilíbrio,

onde a necessidade de salvaguardar se torna prioritária e fundamental e vai além se

colocarmos em foco o conhecimento que ainda poderíamos obter com um aprofundamento

maior de estudos direcionados a essa vegetação. São essas pequenas porções de flora,

como oásis que permeiam lagos e igarapés ladeados por veredas de buritizais que alimentam

a hidrografia dos rios que afluem para o principal corpo hídrico: o Rio Branco.

Além disto, a região é importante para peixes migratórios que chegam até o Tacutu e Uraricoera, formadores do rio Branco. Mas o conhecimento sobre os sistemas aquáticos do lavrado ainda são bastante limitados. Pouco se conhece, por exemplo, sobre a importância dos lagos temporários que se formam durante as chuvas e abrigam peixes que transitam entre os diferentes cursos d’água da região. Outro grupo pouco estudado é o de mamíferos. (Fonseca, 2008).

O pouco conhecimento, ausência de instâncias de pesquisas que se aprofundem sobre esse

território, faz com que o Lavrado Roraimense seja tratado mais sob a perspectiva do seu

potencial econômico do que sobre outras dimensões, como a do conhecimento.

Aspectos históricos e culturais da paisagem

Porém já que os estrangeiros a tem noutra estima, e sabem suas particularidades melhor e mais de raiz que nós (aos quais lançaram já os

Portugueses fora dela à força d’armas por muitas vezes) parece coisa decente e necessária, terem também os nossos naturais a mesma notícia”

(Magalhães de Gandavo, 1576)

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As lutas de fronteiras no limite norte brasileiro sempre foram intensas, desde o período

colonial. Porta de acesso ao território amazônico, no coração da floresta, a região guardava

também uma dimensão de sonho e riquezas. O padre jesuíta João Daniel descrevendo o

Tesouro Descoberto no Máximo Rio Amazonas no século XVIII apresenta como aquele

Além das grandes riquezas, e mui ricos mineraes de ouro, prata, diamantes , e mais pedras preciosas, e variedade de metaes, de que o grande Amazonas se abona pelo mais rico rio do mundo (...) abunda tanto em gêneros, e especiarias não só estimáveis, mas em todo o mundo preciosos, que bastariam ao canonizar pelo mais rico rio. (Daniel, 1976, p. 383)

A imagem de opulência do território da região foi alimentada ao longo dos séculos,

especialmente, pela lenda da existência do Eldorado, com o lago Parima e sua principal

cidade, Manoa. Por sua vez, seres míticos, como amazonas e homens guerreiros ferozes,

sem cabeça e com olhos na barriga – também conhecidos como kanaimés – reprimiam a

chegada do invasor. No período colonial, as margens míticas (UGARTE, 2003) foram

fundamentais para a definição e proteção. Mesmo o religioso jesuíta discorre, cruzando

teogonia, sobre a região:

Para cima do Rio Negro, ou pela sua altura, ou entre ele, e o grande Rio Japorá se discorre estar o celebérrimo Lago de Ouro, e cidade Manoa, por cujo descobrimento se tem cansado muitos aventureiros; porém ninguém dá com ele ao mesmo tempo, que todos afirmam a sua existência. (...) Há campos tão férteis, nos quaes crescem os pastos com tal vício, e altura, que abafa o gado, morrem os cavalos, esconde-se a caça, encobrem-se as feras, e ficam a perder de vista os mesmos cavaleiros. (...) De sorte, que já houve autor que levado de tanta fartura, riqueza e regalo, duvidou, se a América seria o verdadeiro paraíso de delícias, em que Deos creou a Adão; porque as suas delícias na verdade a equivocam como paraíso terreal; e mais poderia conjecturar isto, não só por andarem nus os seus naturaes como andavam Adão e Eva no Paraíso (bem que vestidos com a graça, e hábitos sobrenaturaes) mas também pela tradição de alguns naturaes que herdaram dos seus antepassados, e avós tortos, de que Adão habitara no Rio Topajós, e morara na casa, ou palácio, que ainda se conserva. (...) Parece-me demasiada exageração o querer comparar a América com o Paraíso de deleites, mas será genuína a semelhança de todo o Estado do Amazonas e Grão Pará, e todo o grande destricto dos seus colaterais rios, se o assemilharmos, a uma bem cultivada quinta, a um bem adereçado jardim, ou a uma bem vistosa, e alegre floresta. Com a diferença que a floresta necessita de cuidadoso desvelo para as flores, o jardim do jardineiro para a mestria, e a quinta do quinteiro, ou feitor para os fructos...” (Daniel, 1976, p. 300-301)

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Figura 2: “Nieuwe Caerte” (Novo Mapa da Maravilhosa, Grande e Rica Terra da Guiana), 1598. Fonte: World Digital Library/UNESCO

É justamente este território (Figura 2), de conflitos e de sonhos, que corresponde o Lavrado

Roraimense. Alguns estudos, tanto da área da Antropologia, quanto da Arqueologia e mesmo

da Geografia acreditam ser as reminiscências do grande lago interior que haveria existido há

10 milhões de anos. Em 1987, Roland Stevernson, em expedição internacional, afirmou ter

identificado marcos geológicos da existência do lago salobro na bacia dos rios Branco (Brasil)

e Rupununi (Guiana).

Para além das narrações mitológicas, o Lavrado é rico de expressões culturais e de potencial

de estudos e pesquisas. A variedade florística tem sido objeto de constante pesquisa,

publicações e valorização como ícones de referência visual. A cultura das várias nações

indígenas, especialmente os Macuxi, são campo ainda pouco explorado, porém reconhecido

em seu potencial, ao ponto de ser o gentílico popularmente utilizado para todos que moram

em Roraima. Ser um “macuxi” significa desejar banho nos igarapés e lagos da região nas

tardes quentes, comer paçoca – carne-de-sol desfiada e apiloada com farinha – ou damorida

– espécie de sopa, cujos principais ingredientes são carne de caça ou peixe e pimenta.

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Figura 3: Vista de um trecho do Lavrado Roraimense Foto: Edgard Dias Magalhães

Fonte: http://edgarddm.files.wordpress.com/2007/03/mvc-848s-lavrado.jpg

Pimenta é um capítulo a mais, que compõe o cenário e a vivência: mais de cinquenta espécies

cultivadas nas áreas rurais e comunidades indígenas de Roraima vêm sendo pesquisadas

pelo agrônomo Dr. Francisco Joaci Freitas Luz. O mesmo pesquisador é responsável ainda

por algumas publicações sobre as orquídeas roraimenses, identificando, como já dito,

algumas endógenas do Lavrado.

O cavalo lavradeiro, decorrente de espécimes da raça andaluz e garrano, oriundos das

primeiras fazendas de gado da região, inseridas pelos colonizadores espanhóis e

portugueses na região. São um caso do cruzamento das redes históricas com as dinâmicas

da natureza. São das últimas raças equinas que vive em liberdade no mundo, e por isso são

conhecidos como cavalos selvagens. Atualmente estima-se que existam cerca de dois mil

animais, apenas.

As práticas socioculturais se estabelecem, via de regra, de forma harmônica, com a

apropriação das potencialidades do Lavrado pela população, e mesmo com fins comerciais.

Alguns empresários, na região do Lavrado, tiram proveito econômico das lagoas, criando

parques aquáticos, como o Aquamak e o Ecopark.

“Na parte central do Estado, próximo da capital, Boa Vista, estão as terras planas e as savanas, com palmeiras e buritizais, Também são múltiplas as belezas naturais, revelando singularidades em seus cenários, com montes, cachoeiras, estações ecológicas, corredeiras, vales, fazendas, parques, sítios arqueológicos, ilhas, lagos, praias, além de manadas de cavalos

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selvagens que galopam livres nos lavrados nativos do nordeste de Roraima”. (VERAS, 2011)

O cultivo de flores e sua comercialização é bastante profícua na cidade de Boa Vista, também

como traço importante a se destacar, embora haja uma intensa inserção de espécies

exógenas. Na capital, o Parque Anauá, que fora anteriormente a sede de uma fazenda dos

idos do início do século XX, foi incorporada à dinâmica urbana, tornando-se espaço constante

de atividades lúdicas e culturais em torno do antigo Lago dos Americanos. Desta forma, o

Lavrado se insere na estrutura urbana, de maneira harmônica, mas nem sempre é assim.

Paisagem e choque

A modificação das paisagens naturais nas quais as comunidades humanas se assentaram, antes mesmo de sua conversão ao uso

agrícola, aconteceu, portanto, em respostas as profundas interrogações sobre a existência: qual seria o lugar do homem na

ordem cósmica geral, qual seria o seu destino? (PANZINI, 2013, p. 23).

Hoje, o lavrado roraimense está parcialmente protegido pelas reservas indígenas que ocupam

atualmente mais de 50% de sua extensão no Estado de Roraima, entretanto, isso não garante

sua preservação considerando, também, o avanço acelerado do agronegócio4 na região.

Atualmente, a única garantia de conservação a este ambiente amazônico, são as 27 Terras Indígenas que cobrem cerca de 58 por cento do lavrado Ainda assim, uma forma de proteção para lá de indireta. Todo o restante é ameaçado pelo agronegócio, com a expansão de culturas como soja, arroz, cana-de-açúcar e plantações de Acácia (Acacia mangium), para produção de celulose. "Já são cerca de 65 mil hectares de áreas ocupadas pelo agronegócio. Parece pouco, mas se a gente pensar que há alguns poucos anos não tinha quase nada, percebe-se que ele (o agronegócio) está entrando vai chegar aqui com força por aqui", afirma o pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) em Roraima, o ecólogo Reinaldo Imbrozio Barbosa. (Fonseca, 2008).

Muitos defendem o avanço do agronegócio como única alternativa para que o progresso

chegue até Roraima. De fato os campos do lavrado oferecem boas condições para a pecuária

e para diversas outras culturas, entretanto, em que momento este progresso poderá ser

relevante comparado a perdas inestimáveis de flora e fauna ainda inexplorados?

Some-se a isto o grande potencial mineralógico do Estado de Roraima, com identificação de

grandes jazidas de diamantes, ouro, nióbio, urânio, tório, cobalto, molibdênio, titânio, tantalita,

4 “Entendemos por agronegócio, a totalidade das operações de produção e distribuição de suprimentos agrícolas, das operações de produção nas unidades agrícolas, do armazenamento, do processamento e da distribuição. Ainda devemos adicionar a este conjunto, os serviços financeiros, de transporte, marketing, seguros, bolsas de mercadorias, entre outras. Todas estas operações são elos de cadeias, que se tornaram cada vez mais complexos.” Conceito de Agronegócio. Disponível em < http://www.gestaonocampo.com.br/> Acesso em: agosto de 2014.

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columbita, cassiterita, entre outros minerais. A médio ou longo prazo, essas dinâmicas

exploratórias vão atingir o Lavrado Roraimense, inexoravelmente.

Outro ponto que pede atenção é o avanço do processo de urbanização, especialmente de Boa

Vista, sobre as lagoas e buritizais. Mesmo os processos conduzidos pelo poder público

(Cunha, 2014; Jucá, 2014) tem desconsiderado a fragilidade desse ecossistema, inserindo

conjuntos habitacionais de baixa renda, especialmente, sobre o sistema de lagoas, banhados

e veredas do Lavrado na região a oeste da capital. O processo de urbanização, contudo, dá

resposta mais rápida, provocando inundações a cada novo período chuvoso, quando as

lagoas sazonais, por conta de sua estrutura de subsolo, concentram novamente a demanda

pluviométrica.

Por todos esses riscos, há a necessidade de que as amazonas e canaimés retomem seus

papéis de guardiões do território, em novo processo de defesa. O campo que tem sido

apontado é o dos estudos de valorização das relações que se estabelecem no Lavrado

Roraimense, identificando suas potencialidades e investindo em processos de controle,

gestão e desenvolvimento econômico sustentável. Se o agronegócio na região não pode ser

excluído como possibilidade econômica, ao menos outras práticas deverão ser elaboradas

com o objetivo de minimizar as suas consequências e buscar novas alternativas sustentáveis.

Por ser o Lavrado um espaço rico em possibilidades e potencialmente pouco conhecido,

técnica e academicamente, a perspectiva da criação do Jardim Botânico do Lavrado vinculada

às diversas áreas contempladas em universidades locais não traria apenas benefícios

imediatos, mas a médio e longo prazo, algo que seria maior que as riquezas minerais5 outrora

exploradas na região.

Não é por falta de proposta ou de pessoas empenhadas em proteger o lavrado. Reinaldo Barbosa faz parte de um grupo formado por Pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) em Roraima, analistas ambientais do Ibama e Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Boa Vista, que apresentou ao governo federal os planos para a criação do Parque Nacional do Lavrado, com 61 mil hectares, no Leste do Estado, entre a Serra da Lua e o médio rio Tacutu. A área representa apenas 1,5 % do total de campos naturais em Roraima. (Fonseca, 2008).

Uma ecorregião tão exuberante no máximo dessa palavra deve ser levada em consideração,

não apenas de forma a atender a demanda espacial de desenvolvimento inevitável da

humanidade, mas acima de tudo para promover a perpetuação cultural e por que não dizer

5 A exploração de ouro, por exemplo, foi um dos ciclos econômicos mais intensos de Roraima, tanto economicamente quanto no que tange à degradação do meio-ambiente, tendo sido determinante para a ocupação efetiva do interior do estado. Entre 1987 e 1991 foram identificadas cento e oito pistas clandestinas construídas nas reservas Yanomamis.

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histórica e ecológica, uma vez que as linhas do tempo ainda que marcadas pelo fogo

clandestino, pelos grãos de arroz ou soja e pelas patas de rebanhos, ainda podem revelar um

final menos dramático que o caminho atual nos leva a crer.

Referências

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