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ATUAÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL NO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA DA UERN: a quem se dirige nossa intervenção profissional? Lúcia Helena Dantas Martins 1 RESUMO: O artigo que aqui se apresenta tem com objetivo contribuir com a reflexão do Serviço Social no Núcleo da Prática Jurídica da Universidade Estadual do Rio Grande do Norte UERN, num contexto de judicialização dos novos arranjos familiares, sendo influenciados pelas normas culturais vigentes, redefinindo sua composição e as relações estabelecidas entre seus membros. Deste modo, ressaltamos que é necessário fortalecer as prerrogativas do profissional no tocante ao enfrentamento das demandas dos usuários no intuito de garantir o acesso a política de assistência jurídica gratuita, sendo imprescindível que o/a profissional, possa transitar junto aos encaminhamentos burocráticos da Assistência Jurídica. PALAVRAS CHAVE: Serviço Social, Núcleos de Práticas jurídicas e Famílias. ABSTRACT: : The article presented here aims to contribute to the reflection of the Social Service in the Center of Legal Practice of the State University of Rio Grande do Norte - UERN, in a context of judicialization of the daily life of the new family arrangements. Families are not configured as a natural institution, but socially constructed, being influenced by current cultural norms, redefining their composition and the relationships established among their members. In this way, we emphasize that it is necessary to strengthen the prerogative of the professional in dealing with the demands of the users in order to guarantee access to a policy of free legal assistance, being essential that the professional, the social worker has the possibility of To go along with the bureaucratic referrals of Legal Assistance. KEYWORDS: Social Service, Centers of Legal Practice and Families. 1 INTRODUÇÃO 1 Mestranda no Programa de Serviço Social e Direitos Sociais da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Servidora Pública na Prefeitura Municipal de Mossoró, Assistente Social na Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Email: [email protected]

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ATUAÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL NO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA DA UERN: a

quem se dirige nossa intervenção profissional?

Lúcia Helena Dantas Martins1

RESUMO: O artigo que aqui se apresenta tem com objetivo contribuir com a reflexão do Serviço Social no Núcleo da Prática Jurídica da Universidade Estadual do Rio Grande do Norte – UERN, num contexto de judicialização dos novos arranjos familiares, sendo influenciados pelas normas culturais vigentes, redefinindo sua composição e as relações estabelecidas entre seus membros. Deste modo, ressaltamos que é necessário fortalecer as prerrogativas do profissional no tocante ao enfrentamento das demandas dos usuários no intuito de garantir o acesso a política de assistência jurídica gratuita, sendo imprescindível que o/a profissional, possa transitar junto aos encaminhamentos burocráticos da Assistência Jurídica.

PALAVRAS CHAVE: Serviço Social, Núcleos de Práticas

jurídicas e Famílias.

ABSTRACT: : The article presented here aims to contribute to the reflection of the Social Service in the Center of Legal Practice of the State University of Rio Grande do Norte - UERN, in a context of judicialization of the daily life of the new family arrangements. Families are not configured as a natural institution, but socially constructed, being influenced by current cultural norms, redefining their composition and the relationships established among their members. In this way, we emphasize that it is necessary to strengthen the prerogative of the professional in dealing with the demands of the users in order to guarantee access to a policy of free legal assistance, being essential that the professional, the social worker has the possibility of To go along with the bureaucratic referrals of Legal Assistance.

KEYWORDS: Social Service, Centers of Legal Practice and

Families.

1 INTRODUÇÃO

1 Mestranda no Programa de Serviço Social e Direitos Sociais da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Servidora Pública na Prefeitura Municipal de Mossoró, Assistente Social na Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Email: [email protected]

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O artigo que aqui se apresenta tem como objetivo contribuir com a reflexão da

atuação do Serviço Social no Núcleo da Prática Jurídica da Universidade Estadual do Rio

Grande do Norte – UERN, num contexto de judicialização da vida das famílias que acessam

a Assistência Jurídica gratuita e da emergência desse espaço para a intervenção

profissional. Para tanto iniciamos trazendo algumas reflexões o sobre o espaço sociojurídico

enquanto campo de atuação profissional do/a assistente social, destacando e

caracterizando os Núcleos de Práticas jurídicas enquanto espaço de atuação profissional

dentro das Universidades. Num segundo momento buscamos relacionar o serviço social e

os novos arranjos familiares, usuários da política de Assistência Jurídica do NPJ/UERN.

1.1 O espaço sociojurídico enquanto campo de atuação do/a assistente social.

O termo sociojurídico é relativamente recente na história do Serviço Social;

segundo Borgianne (2004) apude Cfess (2014, p.11), ele surge a partir de iniciativa da

Editora Cortez de publicar uma edição sobre o tema na então revista Serviço Social e

Sociedade, a de nº 67; para a construção desse processo o Conjunto Cfess/Cress

propuseram um Grupo de Trabalho dentre todos os Conselhos regionais de serviço

Social/Cress para elaboração dessa demanda fora, que versassem sobre a inserção

profissional no Poder Judiciário e no Sistema Penitenciário, dando origem a várias iniciativas

de discussão da temática.

Com a crescente judicialização da vida e a criminalização da pobreza, o Estado

tende a controlar cada vez mais a população que acessa os serviços públicos. Para isso

busca intensificar cada vez mais parcerias com as Universidades públicas e privadas. Por

sua vez as Instituições de Ensino Superior – IESs passam a contribuir com a sociedade, na

perspectiva da extensão, enquanto uma de suas dimensões que caracterizam o universo

acadêmico.

1.2 Núcleos de Práticas Jurídicas: breve apreciações

A Universidade enquanto espaço de construção do saber possui três dimensões

que se entrelaçam no universo acadêmico: o ensino, a pesquisa e a extensão. O campo de

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aprendizagem ou de uma relação política com a comunidade é a extensão. Neste sentido

Alencastro (2009) aponta que extensão seria:

Neste sentido, o campo da extensão em uma Universidade muito mais que espaço de aprendizagem ou de prestação de serviços (que é também), configura – se um campo, por excelência, de efetivação de uma relação política com a comunidade em que está inserida, podendo contribuir com a construção concreta de uma sociedade melhor. (ALENCASTRO, 2009, p. 5)

È através da extensão universitária que as Universidades conseguem retornar a

sociedade o conhecimento produzido de seus egressos em diversas áreas do

conhecimento, o que de fato pode levar a um projeto universitário voltado para atender as

demandas da sociedade acadêmica e os interesses dos cidadãos e cidadãs.

As Universidades por muito tempo mantiveram através da Faculdade de Direito

escritórios de advocacia modelos (grifo nosso) para garantir essa “função operadora do

direito aos seus alunos [...] funcionando, historicamente e mediante convênio com o poder

público, como uma instância de acesso ao poder judiciária” (ALENCASTRO,2009,p.35) a

população hipossuficiente, em consonância ao estabelecido na Lei 1060/50 que estabelece

no artigo 1º “Os poderes público federal e estadual, independente da colaboração que

possam receber dos municípios e da Ordem dos Advogados do Brasil, - OAB, concederão

assistência judiciária aos necessitados nos termos da presente Lei” e na Constituição

Federal de 1988 em seu artigo 5º, inciso LXXIV, que o “estado prestará assistência jurídica

integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”(Idem, 2009, p.35).

Nas Faculdades de Direito essa relação das três dimensões formativas se dá

prioritariamente, mas não exclusivamente nos Núcleos de Prática Jurídicas - NPJ como

espaço obrigatório do estágio curricular dos alunos de Direito. O marco legal do surgimento

dos NPJs ocorreu em 1994 com a portaria de nº 1886 de 30 de dezembro do Ministério da

Educação e Desporto que fixa as Diretrizes curriculares dos cursos jurídicos. Destaque para

os artigos 10 e 11 que definem a configuração mínima dos NPJs:

Art. 10º O estágio de prática jurídica, supervisionado pela instituição de ensino superior, será obrigatório e integrante do currículo pleno, em um total de 300 horas de atividades práticas simuladas e reais desenvolvidas pelo aluno sob controle e orientação do núcleo correspondente.

§ 1º O núcleo de prática jurídica, coordenado por professores do curso, disporá instalações adequadas para treinamento das atividades de advocacia, magistratura, Ministério Público, demais profissões jurídicas e para atendimento ao público.

§ 2º As atividades de prática jurídica poderão ser complementadas mediante convênios com a Defensoria Pública outras entidades públicas judiciárias empresariais, comunitárias e sindicais que possibilitem a participação dos alunos na prestação de serviços jurídicos e em assistência jurídica, ou em juizados especiais que venham a ser instalados em dependência da própria instituição de ensino

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superior. § 1º O núcleo de prática jurídica, coordenado por professores do curso, disporá instalações adequadas para treinamento das atividades de advocacia, magistratura, Ministério Público, demais profissões jurídicas e para atendimento ao público.

§ 2º As atividades de prática jurídica poderão ser complementadas mediante convênios com a Defensoria Pública outras entidades públicas judiciárias empresariais, comunitárias e sindicais que possibilitem a participação dos alunos na prestação de serviços jurídicos e em assistência jurídica, ou em juizados especiais que venham a ser instalados em dependência da própria instituição de ensino superior ( art. 10).

Art. 11º As atividades do estágio supervisionado serão exclusivamente práticas, incluindo redação de peças processuais e profissionais, rotinas processuais, assistência e atuação em audiências e sessões, vistas a órgãos judiciários, prestação de serviços jurídicos e técnicas de negociações coletivas, arbitragens e conciliação, sob o controle, orientação e avaliação do núcleo de prática jurídica. (art.11) (PORTARIA Nº 1886, 1994, p.2 )

A importância dessa portaria segundo Aguiar (1996) apud Oliveira (2005) se dá

pelo fato da mesma vir a enfrenta um dos maiores problemas dos cursos jurídicos,

preenchendo uma lacuna na formação dos alunos no tocante ao estágio curricular que

apenas preparava os alunos para prática advocatícia, negligenciando outras áreas de

atuação dos bacharéis em Direito como a magistratura e o ministério Público, que pode

ocorrer de forma complementar com celebrações de convênios com Defensorias Públicas,

Juizados Especiais, entidades sindicais, etc, possibilitando “a participação dos alunos na

prestação de serviços jurídicos e em assistência Jurídica”( OLIVEIRA, 2005, p. 1).

Historicamente esses Núcleos mantiveram uma relação aproximada com o

Poder Público, tendo como principal objetivo garantir o acesso à justiça em seu aspecto

restrito, o que nos leva a questionar se essa medida não estaria reforçando a judicialização

da questão social 2 e que justiça social estaríamos promovendo nessa perspectiva de

intervenção profissional.

Alencastro (2009) defende que a atuação de um Núcleo de Prática Jurídica vá

além do espaço de formação de profissional do Direito, superando a “assistência

judiciária/jurídica”. Que seja um espaço de troca de saberes, interlocução com outros atores

sociais:

Comungamos da defesa de uma atuação mais ampla de um Núcleo de prática jurídica, que vá além do espaço de formação profissional, em uma área, que seria do Direito. Um Núcleo deve caminhar na perspectiva de consolidação de um campo

2 [...] diz respeito ao conjunto das expressões das desigualdades sociais. engendradas na sociedade

capitalista madura[...] Marilda Iamammoto, , 2001, p.15.

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que supere a “assistência Judiciária/jurídica”, assumindo um novo papel e novas atribuições para além de uma operacionalidade legalista, estabelecendo novas relações com a esfera pública e, a partir do diálogo com outros atores sócio- políticos presentes tanto no âmbito da sociedade civil, quanto no âmbito governamental, deflagre um novo modo de enfrentar as demandas populares que, antes ou associadas às jurídicas, são preponderantemente sociais ( ALENCASTRO, 2009, p.4).

Diante desse conceito ampliado de NPJ compreende - se ser esse espaço como

um palco de diferentes saberes, integrado entre si de forma orgânica e que tem vislumbrado

um projeto societário vinculado a valores e princípios que almejam a emancipação humana.

1.3 O Nucleo da Prática Jurídica na Universidade do Estado do Rio Grande do Norte -

UERN: desvendando o cenário

O Núcleo da Prática jurídica da Universidade Estadual do Rio Grande do Norte–

Uern ligado a Faculdade de Direito – FAD3 - regido pela Resolução de N. 44 do Conselho de

Ensino Pesquisa e Extensão da UERN – CONSEPE, desenvolvendo um trabalho de

Assistência Jurídica à população hipossuficiente com abrangência aos municípios de

Mossoró e Serra do Mel, imprimindo ao trabalho os pressupostos da extensão universitária.

O NPJ/Mossoró dispõe de técnicos especializados (advogados e assistentes sociais),

estudantes de direito e de serviço social como também funcionários administrativos que dão

encaminhamentos as diversas demandas oriundas dos usuários dos serviços. A Resolução

que legitima as atividades do NPJ/UERN desde 2014 está em processo de reformulação, o

que poderá a vir a incluir novos sujeitos profissionais como psicólogos e pedagogos.

Cotidianamente são inúmeras as situações apresentadas pelos/as usuários/as

nos atendimentos, dentre elas as mais frequentes são: separação, violência doméstica,

adultério, maus-tratos, abandono na gravidez, incapacidade para a vida Cível, partilha de

bens, etc., que geram diferentes ações judiciais. Dentre elas podemos citar: divórcio

consensual, divórcio litigioso, guarda, pensão alimentícia, alimentos gravídicos,

reconhecimento de paternidade, investigação de paternidade, curatela, registro de

nascimento fora do prazo, declaração de óbito fora do prazo.

3 A UERN possui duas unidades de Núcleo de Prática Jurídica, uma no município de Mossoró e outra

na cidade de Natal, onde a Universidade tem um Campi avançado; os dados empíricos se relacionam com as atividades e demandas do NPJ/Mossoró.

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O Serviço Social é uma das portas de entrada para o atendimento aos usuários

que atendam aos requisitos da Assistência Judiciária gratuita do Núcleo. As demandas que

chegam para o/a Assistente Social são reflexos do cotidiano das famílias, da forma em que

se organizam, dos arranjos familiares que se constituem dentro do ciclo de vulnerabilidade

sócio – econômico em que vivem, exigindo a intervenção do Estado através da oferta de

serviços em órgãos especializados nas questões de Direito de Família.

2 O SERVIÇO SOCIAL E AS FAMÍLIAS: O DIREITO A ASSISTÊNCIA JURÍDICA

GRATUITA NO NPJ/UERN

2.1 O conceito de família e os novos arranjos familiares

A contextualização da família na sociedade possui arcabouço diversificado de conceitos. A concepção de família que historicamente foi sendo construída é fruto da trajetória de sua existência na sociedade (OLIVEIRA, 2009, p.23).

Podemos afirmar que nesse contexto a família não se configura enquanto

instituição natural, mas ela é construída socialmente, sendo influenciada pelas normas

culturais vigentes, redefinindo sua composição e as relações estabelecidas entre seus

membros.

Engels (1985, p. 22) citado por Oliveira (2009, p. 23) afirma que:

Todas as grandes épocas de progresso da humanidade coincidem, de modo mais ou menos direto, com as épocas em que se ampliam as fontes de existência. O desenvolvimento da família realiza – se paralelamente, mas não oferece critérios tão conclusivos para delimitação de períodos.

O século XX trouxe significativas mudanças para a vida em sociedade, e em

especial ao universo familiar. Com a chegada da industrialização as famílias passaram por

profundas transformações e tiveram suas funções e necessidades marcadamente

modificadas pela influência da passagem da sociedade agrária para a industrial. Essas

alterações impulsionaram todos os membros da família a terem outros projetos e funções

dentro do grupo familiar.

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Segundo Oliveira (2009, p. 25) a família vivencia as dificuldades e entraves que

o sistema capitalista impõe aos sujeitos me sociedade:

Diante das transformações societárias, sobretudo com a predominância do monopólio do capital, podemos afirmar que a família também é sujeito dessa história socialmente construída, vivenciando todas as mazelas do sistema capitalista. A divisão do trabalho, fruto da Revolução Industrial, trouxe transformação profunda na sociedade (OLIVEIRA, 2009, p. 25).

Nesse processo a família vem apresentando novas configurações e exigindo de

seus membros uma redefinição dos papéis outrora exercidos uma ora pelo pai outra pela

mãe; hoje não podemos apenas falar nesse modelo de família e sim em famílias em seus

diferentes arranjos, não só ligadas por laços de parentesco, mas por laços de afetividade

como as famílias formadas por casais homoafetivos, por um dos genitores e os filhos, por

laços de afetividades.

Mediante essas transformações o Direito de Família em momentos históricos

determinados avança no tocante a garantia do reconhecimento da unidades familiar de

casais do mesmo sexo, mas encontra resistência na efetivação desses direitos no

conservadorismo crescente em nossa sociedade, como exposto por Mello (2006), a família

é resultado dos diferentes atores políticos que vivem em sociedade:

[...] família é uma instituição social, resultante de um acordo entre distintos atores políticos acerca de quais agrupamentos conjugais e parentais devem contar com a proteção do Estado e a legitimidade da sociedade. Especificamente no Brasil, porém, em face do vazio legal, temos nos deparados com situações contraditórias, em que a dimensão familiar dos vínculos afetivos-sexuais entre gays e entre lésbicas [..] (MELLO, 2006, p. 49).

Mediante o exposto, devemos compreender que a constituição familiar se

apresenta diante da diversidade dos sujeitos sociais, inseridos em relações sócias

complexas que desempenha determinadas funções e que para tanto necessitam da

proteção do Estado, na função de garantidor dos direitos a pessoa humana e não

sobrepondo a família valores conservadores e hierarquizados.

Já Souza et al (2012,p.107), explicita que o conceito de família pode ser

compreendido como, “[...] pela formação de laços consanguíneos ou não, convivendo sob

mesmo teto, de forma que o modelo de organização, a função dos papéis familiares e as

relações de afeto determinem a configuração a qual está inserida.”

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Na contemporaneidade, o que vai identificar a família já não é a celebração do casamento ou do envolvimento de caráter sexual, e sim o afeto que permeia o relacionamento. A afetividade será o principal sentimento a sustentar a formação dos relacionamentos conjugais [...] (SOUZA et al 2012,p.110).

O modelo de família composto por pai, mãe e filho sofre de forma mais intensa

essas transformações, com consequência direta na dissolução da união conjugal com

pedidos de divórcio ou constituição e dissolução de união estável, reconhecida pelo Código

Civil de 2003, o que leva a redefinição dos papeis dos membros familiares que tramitam nas

Varas de Família. O Direito de Família Andrade (2005) apud Silva (2013, p.02) os papéis

desempenhados na família começam a se modificar com a separação; diante disso novos

membros tendem a incorporar o núcleo familiar, enquanto que outros o deixam para

constituir outra família.

Paralelo a isso o divórcio Direto a partir de 2010 passou a configurar como

direito dos cônjuges que não tem mais interesse em permanecerem com os laços

matrimoniais; a chamada nova lei do divórcio brasileiro permite as partes reconstruírem seus

relacionamentos sem a espera de um lapso de tempo; é possível hoje então que os casais

se separem sem que haja a imposição do Estado em exigir um tempo mínimo para dissolver

essa união.

Essas transformações exigem do/a assistente social uma formação profissional

baseada em princípios teóricos/metodológico, ético/político e técnico/operativo, que

possibilitam ao profissional uma visão capaz de compreender as novas determinações

sociais para a família brasileira diante dos novos conceitos históricos da vida em família.

2.2 A atuação do Serviço Social na garantia do direito à Assistência Jurídica na UERN

O processo de trabalho do/a assistente social junto ao NPJ/UERN deverá ter

como como pressupostos a garantia ao acesso ao serviço de assistência jurídica que o

núcleo oferta a população, a partir dos critérios pré - estabelecidos garantindo o acesso à

justiça gratuita aqueles que comprovem a incapacidade financeira para arcar com os

honorários do advogado, sendo o Estado o responsável por prestar essa assistência.

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O/a Assistente Social no campo sociojurídico é o profissional que identifica as

necessidades do usuário e a realidade social em que eles estão inseridos, a partir de seu

cotidiano familiar. Requer do profissional a necessidade de habilidades, competências e

compromissos éticos políticos que o/a permite transitar no meio dos encaminhamentos

burocráticos que a Assistência Jurídica exige para a garantia de direitos sociais e jurídicos,

além do previsto na Resolução que legitima a intervenção do NPJ/UERN 4 profissional,

ultrapassando as contradições e limites institucionais numa perspectiva de totalidade,

passando a interpretar aspectos relevantes para compor eixos da sua intervenção

profissional.

O campo sociojurídico se apresenta ao Serviço Social como um espaço amplo

de intervenção, requerendo do/a assistente social conhecimento específicos da área

profissional e do Direito “que comporta inestimável número de questões tanto éticas quanto

técnicas”.(FORTI, 2012:79, CFESS). Cabe ao Assistente Social realizar uma escuta

qualificada da situação dando os devidos encaminhamentos; para isso o profissional se

utiliza dos instrumentos normativos que subsidiam a intervenção profissional, como a Lei

8662/93, o Código de Ética e da legislação social, que ampara o sistema de direito dos/as

cidadãos/cidadãs a partir da Constituição Federal de 1988.

O locus institucional nada mais é do que o local “de intermediação entre o

Estado e a população que a ela procura, espaço esse transversalizado por forças e

interesses criados no âmbito dos projetos da sociedade ocidental [...]”( Fávero, 2001,p.32).

Dentro dessa estrutura institucional o serviço social vem ganhando espaço e

reconhecimento do seu papel junto a população e a Faculdade de Direito, imprimindo ao seu

processo de trabalho uma relativa autonomia na defesa intransigente da justiça social, da

democracia e dos direitos humanos como princípios defendidos pelo Código de Ètica

Profissional.

Notadamente é preciso destacar que apesar do reconhecimento da profissão

nessa estrutura não podemos nos esquecer de que a profissão sofre com as determinações

da reestruturação do capital, com os efeitos da transnacionalidade da economia, onde

4 Do Setor Social

Art. 29 -Compete ao Setor Social fazer triagem de carência individual das partes interessadas que procuram os

Serviços de Assistência Judiciária gratuito, realizado pelos estagiários da Prática Jurídica.

§ 1º -A triagem prevista no caput deste artigo será realizada por assistentes sociais, que farão levantamento

completo da situação econômico- financeira dos requerentes.

§ 2º -A triagem serve também para operacionalização do estágio, fazendo com que o estagiário só atenda a quem

realmente está necessitando de Serviços Jurídicos gratuitos.

Art. 30 O Setor Social do Núcleo de Prática Jurídica é composto por duas (02) Assistentes Sociais, que darão

expediente em tempo integral de 40 horas semanais

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segundo Faria (2001) apud Fávero (2011) os chamados excluídos do sistema perdem

paulatinamente suas condições materiais para exercer seus direitos básicos.

Estamos diante de um Estado Penal, onde a lógica capitalista na era do

neoliberalismo penaliza a pobreza, levando a população acessar a justiça com mais

frequência. Como Assistentes Sociais, que trabalhamos nos conflitos da relação capital –

trabalho temos, “portanto, um norte e decisões a serem tomadas e podemos ter

profissionais que, no desenvolvimento de suas ações, não entendam a finalidade do que é

expresso no nosso Código de Ètica”.(FORTI, 2012.p. 87), agindo de forma a criminalizar as

questões trazidas pela população.

As demandas que são apresentadas pelos/as usuários/as nos atendimentos

junto ao NPJ/UERN são bastante variadas. Em sua maioria refere - se a demandas da Vara

de Família em situação de vulnerabilidade social ou em situações de conflitos familiar, o que

nos leva a compreensão de que é imprescindível uma formação que agregue novos

conhecimentos e valores de proteção e solidariedade entre os indivíduos pertencentes ao

grupo familiar.

A heterogeneidade das famílias atendidas nos permite identificar alguns arranjos

familiares presentes em nossa sociedade: família nuclear (pai, mãe e filhos), monoparental (

mãe e filhos ou pai e filhos), chefiadas por mulheres, famílias geracionais ( genitor, filho e

avó/s), famílias recompostas com a presenças de filhos de outros relacionamentos, idosos

convivendo sem a presença de uma geração mais nova e casais sem filhos.

A procura dessas famílias pela Assistência Jurídica em diferentes momentos

reflete a vulnerabilidade desses arranjos familiares frente às determinações sociais e

econômicas vigente em nossa sociedade. São situações de necessidades urgentes e de

sobrevivência nos colocando muitas vezes em conflito com o próprio sistema judiciário e sua

morosidade na resolutividade. Tais demandas versam sobre situações cotidianas das

famílias como: divórcio, a guarda e alimentos dos filhos menores, divisão de bem, violência

doméstica, maus tratos a crianças e adolescentes, alienação parental, abandono na

gravidez, etc.

Diante da diversidade de situações acima elencadas o/a assistente social tem a

prerrogativa inicial com as famílias o acolhimento de suas necessidades, realizar uma

escuta qualificada e propor através do dialogo com as partes a resolutividade da situação de

forma extrajudicial, o que possibilita a garantia dos direitos ali negados. Essa dinâmica

extrajudicial tem como objetivo dá celeridade aos processos das Varas de Família o que tem

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impacto positivo na vida das pessoas e ao Judiciário, pois possibilita uma menor demanda

por ações litigiosas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Serviço Social tem sido requisitado para atuar em variados espaços sócios

ocupacionais de garantias de direitos através de oferta de políticas sociais públicas. A

contribuição do Serviço Social nos espaços que compõe o Sistema de Garantia de Direitos,

vem se configurando como um campo bastante heterogêneo no tocante a demanda hoje

judicializada pela sociedade.

A inserção do Assistente Social no campo sociojuridico está diretamente

relacionada às questões aqui pontuadas no contexto das Varas de Família e veivenciadas

pelos Núcleos de Práticas jurídicas numa relação de dependência mútua entre sociedade e

poder público. Os NPJs como espaço de atuação profissional no âmbito do sociojuridico,

onde . Podemos evidenciar as complexas demandas postas pela questão social e suas

refrações junto aos novos arranjos familiares, exigindo o enfrentamento dessas pelas

diferentes áreas do saber Cientifico e do saber Popular.

Portanto, o assistente social atua junto das famílias que tem seus direitos

negados em determinados contextos de vulnerabilidade social e econômica afim de

contr5ibuir com o processo de cidaania dos sujeitos envolvidos.

REFERÊNCIAS

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CFESS. II Seminário Nacional: o serviço social no campo sociojurídico na perspectiva da concretização de direitos/conselho federal de serviço social - gestão tempo de luta e resistência._ Brasília: CFESS, 2012.

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