Lendo Thomas Malthus e John Stuart Mill - each.usp.br · desvio para o campo da conjectura, não...

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Lendo Thomas Malthus e John Stuart Mill Renato Vicente EACH-USP/2009

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Lendo Thomas Malthus e John Stuart Mill

Renato Vicente

EACH-USP/2009

T. Malthus, Princípio da População, Capítulo 1

Princípio da População(a) Para introduzir o argumento devo pressupor que excluo da questão,no presente, todas as simples conjecturas, isto é, todas as suposições,cujo provável conceito não pode ser inferido com base em quaisquerpremissas filosóficas legítimas. Um escritor pode dizer-me queele pensa que o homem se transformará finalmente num avestruz.Propriamente não posso negá-lo. Mas antes que ele possa converterqualquer pessoa sensata ao seu modo de ver, ele deveria mostrar queo pescoço na espécie humana foi gradualmente se alongando, que oslábios se tornaram mais grossos e mais salientes, que as pernas e ospés estão permanentemente mudando sua forma e que o pêlo estácomeçando a transformar-se em tocos de penas. E, até que a probabilidadede tão maravilhosa mutação possa ser demonstrada, certamente é perdertempo e retórica divagar sobre a felicidade do homem em talestágio: descrever seus poderes tanto de correr como voar, retratá-lonuma situação em que todos os pequenos luxos sejam desprezados,em que os homens se dedicariam somente a acumular as coisas necessáriasà vida e em que, conseqüentemente, cada parcela de trabalhodo homem seria pequena, e grande sua parcela de lazer.

Princípio da População(b) Penso que posso elaborar adequadamente dois postulados.Primeiro: Que o alimento é necessário para a existência do homem.Segundo: Que a paixão entre os sexos é necessária e que permanecerá aproximadamente em seu atual estágio.

(c) Essas duas leis, desde que nós tivemos qualquer conhecimento da humanidade, evidenciam ter sido leis fixas de nossa natureza e, como nós não vimos até aqui nenhuma alteração nela, não temos o direito de concluir que elas nunca deixarão de existir como existem agora, sem um pronto ato de poder daquele Ser que primeiro ordenou o sistema do universo e que para proveito de suas criaturas ainda faz, de acordo com leis fixas, todas estas variadas operações.

Princípio da População(d) Não conheço nenhum escritor que tenha admitido que nesta terrao homem, fundamentalmente, seja capaz de viver sem alimento. Mas oSr. Godwin prognosticou que a paixão entre os sexos pode ser extintacom o tempo. Contudo, como ele considera esta parte de seu trabalho umdesvio para o campo da conjectura, não insistirei mais sobre isso agora,a não ser em afirmar que os melhores argumentos para provar a perfectibilidade do homem provêm de um estudo do grande progresso que ele já realizou desde o estado bárbaro e da dificuldade de dizer onde ele sedetém. Mas, com relação à extinção da paixão entre os sexos, nenhumprogresso, qualquer que ele seja, foi feito até aqui. Ela parece existir comtanto ímpeto agora como existia há dois ou há quatro mil anos. Existemexceções hoje como sempre existiram. Mas, como essas exceções não parecem crescer numericamente, decerto seria uma demonstração antifilosófica inferir, simplesmente a partir da existência de uma exceção, quea exceção com o tempo se tornaria a regra e a regra a exceção.

Princípio da População(e) Então, adotando meus postulados como certos, afirmo que o poder de crescimento da população é indefinidamente maior do que o poder que tem a terra de produzir meios de subsistência para o homem.

(f) A população, quando não controlada, cresce numa progressão geométrica. Os meios de subsistência crescem apenas numa progressão aritmética. Um pequeno conhecimento de números demonstrará a enormidade do primeiro poder em comparação com o segundo.

(g) Por aquela lei da nossa natureza que torna o alimento necessáriopara a vida humana, os efeitos desses dois poderes desiguais devemser mantidos iguais.

Princípio da População(h) Isso implica um obstáculo que atua de modo firme e constantesobre a população, a partir da dificuldade da subsistência. Esta dificuldade deve diminuir em algum lugar e deve, necessariamente, serduramente sentida por uma grande parcela da humanidade.

(i) Por todo o reino animal e vegetal a natureza espalhou largamente as sementes da vida, com a mão a mais generosa e pródiga. Ela foi relativamente parcimoniosa quanto ao espaço e à alimentação necessários para criá-los. As células vitais contidas nesta parte da terra, com bastante alimento e espaço para se expandir, preencherão milhões de mundos no decurso de uns poucos milhares de anos. A miséria que despoticamente permeia toda a lei da natureza limita estes mundos mediante determinadas restrições. Os reinos vegetal e animal se reduzem sob esta grande lei limitadora. E a espécie humana não pode, por simples esforços racionais, escapar dela. Entre as plantas e os animais suas conseqüências são a perda do sêmen, a doença e a morte prematura. Na espécie humana, a miséria e o vício. O primeiro, a miséria, é uma conseqüência absolutamente necessária da lei. O vício é uma conseqüência altamente provável e, por essa razão, o vemos predominar largamente, mas não pode, talvez, ser chamado de conseqüência absolutamente necessária. A provação da virtude é resistir a toda tentação do mal.

Princípio da População(j) Essa desigualdade natural dos dois poderes, da população e daprodução da terra, e essa grande lei da nossa natureza que deve manter constantemente uniformes suas conseqüências constituem a grande dificuldade, que a mim me parece insuperável no caminho da perfectibilidade da sociedade. Todos os outros argumentos são de importância pequena e secundária em comparação com este. Não vejo nenhuma forma pela qual o homem possa escapar da influência desta lei que impregna toda a natureza viva. Nenhuma igualdade fantasista, nenhuma norma agrária, no seu maior alcance, podem remover a sua pressão mesmo por apenas um século. E, por essa razão, a lei se mostra decisiva contra a possível existência de uma sociedade em que todos os membros viveriam em tranqüilidade, prosperidade e num relativo ócio, e não sentiriam nenhuma angústia para providenciar os meios de subsistência para si e para os filhos.

Princípio da População(k) Conseqüentemente, se as premissas estão corretas, o argumentoé conclusivo contra a perfectibilidade do conjunto da humanidade.

(l) Assim, esbocei as linhas gerais do argumento, e o examinareimais particularmente, mas penso que será fundamentado na experiência, a verdadeira fonte e base de todo o conhecimento que invariavelmente comprova sua verdade.

Perguntas

1. Qual a conclusão básica de Malthus?

2. Qual o argumento básico para ela?

3. O que poderia mostrar que:

(b) Penso que posso elaborar adequadamente dois postulados.Primeiro: Que o alimento é necessário para a existência do

homem.Segundo: Que a paixão entre os sexos é necessária e que

permanecerá aproximadamente em seu atual estágio.

(f) A população, quando não controlada, cresce numa progressão geométrica. Os meios de subsistência crescem apenas numa progressão aritmética.

4. Mill consegue estabelecer a conclusão?

Localizando a Conclusão Principal

C

(j) .... E, por essa razão, a lei se mostra decisiva contra a possível existência de uma sociedade em que todos os membros viveriam em tranqüilidade, prosperidade e num relativo ócio, e não sentiriam nenhuma angústia para providenciar os meios de subsistência para si e para os filhos.

Qual a razão imediata para acreditarmos em C ?

(e) Então, adotando meus postulados como certos, afirmo que o poder de crescimento da população é indefinidamente maior do que o poder que tem a terra de produzir meios de subsistência para o homem.

(g) Por aquela lei da nossa natureza que torna o alimento necessário para a vida humana, os efeitos desses dois poderes desiguais devem ser mantidos iguais.

(e) +(g) -> C

Quais as razões para (e) e (g)?

Qual a razão imediata para acreditarmos em (e) ?

(f) A população, quando não controlada, cresce numa progressão geométrica. Os meios de subsistência crescem apenas numa progressão aritmética. Um pequeno conhecimento de números demonstrará a enormidade do primeiro poder em comparação com o segundo.

(f)->(e) -> C

(g)

Quais as razões para (f) e (g)?

J. S. Mill, Princípios de EconomiaPolítica Livro V Capítulo 11

Parágrafo 12

Princípios de Economia Política

No Livro V Capítulo 11 §7 Mill argumenta

“a favor de restringir ao mínimo possível a intervenção de uma autoridade pública nos assuntos da comunidade”

Seguem então exceções a esta afirmação.

Princípios de Economia Política

(a) Preciso pedir atenção especial para a quarta exceção, já que, segundo acredito, a atenção dos economistas políticos não se deixou atrair suficiente por ela.

(b) Há questões em que se requer a interferência da lei não para sobrepujar o juízo dos indivíduos a respeito dos próprios interesses, mas para garantir a eficácia desse juízo: esses indivíduos mostram-se incapazes de garantir a eficácia desse juízo a não ser por meio de um acordo, acordo esse que não pode, mais uma vez, ser garantido se não receber validade da lei e se não for sancionado pela lei.

Princípios de Economia Política

(c) Para ilustrar o caso, e sem formar juízo prévio sobre esse ponto específico, posso aludir à questão da diminuição da jornada de trabalho. Suponhamos (algo difícil de ser suposto, seja isso fato ou não) que a redução generalizada da jornada de trabalho nas fábricas, digamos de dez para nove horas, beneficiaria os trabalhadores, que receberiam por nove horas de trabalho salários tão altos quanto ou quase tão altos quanto receberiam por dez.

(d)Caso fosse esse o resultado, e se os envolvidos estivessem convencidos de que esse seria o resultado, a limitação, poderiam defender alguns, será adotada espontaneamente.

Princípios de Economia Política

(c) Para ilustrar o caso, e sem formar juízo prévio sobre esse ponto específico, posso aludir à questão da diminuição da jornada de trabalho. Suponhamos (algo difícil de ser suposto, seja isso fato ou não) que a redução generalizada da jornada de trabalho nas fábricas, digamos de dez para nove horas, beneficiaria os trabalhadores, que receberiam por nove horas de trabalho salários tão altos quanto ou quase tão altos quanto receberiam por dez.

(d)Caso fosse esse o resultado, e se os envolvidos estivessem convencidos de que esse seria o resultado, a limitação, poderiam defender alguns, será adotada espontaneamente.

Princípios de Economia Política

(e) Eu respondo que não será adotada enquanto um corpo de interessados não se formar para insistir a respeito dessa limitação. Um trabalhador que se recusasse a trabalhar mais de nove horas enquanto houvesse outros dispostos a trabalhar dez ou não conseguiria emprego ou, caso contratado, se veria obrigado a abrir mão de um décimo de seus ganhos.

(f) No entanto, independentemente de quanto estivesse , por isso, convencido de que trabalhar menos atenderia aos interesses de sua classe, o trabalhador feriria os próprios interesses ao dar o exemplo, a não ser que tivesse garantias de que todos ou a maioria dos seus companheiros o seguiriam.

Princípios de Economia Política

(g) Mas suponha ter sido firmado um acordo geral para toda a classe: não seria esse eficaz mesmo que não fosse sancionado pela lei ?

(h) Não se não for imposto por um consenso na prática tão rigoroso quanto o proporcionado pela lei. Porque, independentemente de quão benéfica seja a observância da regulamentação para a classe como um todo, o interesse imediato de todos os indivíduos seria violá-la: e quanto mais indivíduos aderissem à regra, mais se beneficiariam os indivíduos que a rejeitassem.

(i) Se quase todos se restringissem a trabalhar nove horas, os que optassem por trabalhar dez se valeriam das vantagens proporcionadas pela restrição e se valeriam do lucro de infringi-la; receberiam o salário de dez horas de trabalho por nove horas trabalhadas mais o salário por uma hora a mais.

Princípios de Economia Política

(j) Concordo que se a ampla maioria dos trabalhadores aderir às nove horas não haveria nenhum prejuízo; o benefício valeria, em sua maior parte, para a classe, enquanto os que desejassem trabalhar mais e ganhar mais teriam chance de fazê-lo.

(k) Esse, com certeza, seria o panorama a desejar. E, pressupondo-se que uma redução das horas de trabalho sem uma diminuição dos salários poderia dar-se sem prejudicar a entrada das mercadorias em seus mercados – algo que, sob qualquer aspecto, é uma questão factual, e não uma questão de princípio - , a maneira mais desejável para que se garantisse esse efeito seria por meio de uma mudança tranqüila nos hábitos do mercado; a jornada de trabalho menor tornando-se, por decisão espontânea, a prática geral, mas sem tirar dos que não desejassem adotá-la toda a liberdade de fazê-lo.

Princípios de Economia Política

(l) Provavelmente, no entanto, um número tão grande de trabalhadores preferiria a jornada de trabalho de dez horas nas condições melhoradas que a limitação não poderia ser preservada como prática geral: o que alguns fizeram por opção outros se veriam obrigados a fazer por necessidade, e os que haviam escolhido as jornadas mais longas a fim de ganhar mais seriam obrigados, ao final, a trabalhar sem receber um salário maior do que o que recebiam antes.

(m) Pressupondo-se então que seria do interesse de todos trabalhar apenas nove horas caso cada um tivesse a garantia de que todos os outros fariam o mesmo, não haveria outra forma de atingir esse objetivo a não ser convertendo o suposto acordo mútuo em algo obrigatório sob ameaça de punição, consentindo em vê-lo garantido por lei.

Princípios de Economia Política

(n) Não estou expressando nenhuma opinião favorável a um decreto-lei do tipo, algo nunca requerido neste país, e que eu, certamente, sob as condições atuais, não recomendaria: mas isso serve para exemplificar a forma pela qual grupos de pessoas podem precisar da ajuda da lei a fim de tornar efetivo o juízo elaborado coletivamente a respeito dos próprios interesses, provendo a cada indivíduo uma garantia de que seus competidores seguirão o mesmo caminho dele, sem o que ele não poderia adotar para si mesmo, com segurança, esse caminho.

Perguntas

1. Qual a conclusão básica de Mill?

2. Qual o argumento básico para ela?

3. O que poderi aprovar que é verdadeira a seguinte afirmação?

(m) Pressupondo-se então que seria do interesse de todos trabalhar apenas nove horas caso cada um tivesse a garantia de que todos os outros fariam o mesmo, não haveria outra forma de atingir esse objetivo a não ser convertendo o suposto acordo mútuo em algo obrigatório sob ameaça de punição, consentindo em vê-lo garantido por lei.

4. Mill consegue estabelecer a conclusão?

5. Consegue imaginar outro exemplo que implique emargumentos semelhantes?

Localizando a Conclusão Principal

(a) Preciso pedir atenção especial para a quarta exceção, já que, segundo acredito, a atenção dos economistas políticos não se deixou atrair suficiente por ela.

(b) Há questões em que se requer a interferência da lei não para sobrepujar o juízo dos indivíduos a respeito dos próprios interesses, mas para garantir a eficácia desse juízo: esses indivíduos mostram-se incapazes de garantir a eficácia desse juízo a não ser por meio de um acordo, acordo esse que não pode, mais uma vez, ser garantido se não receber validade da lei e se não for sancionado pela lei.

C

Qual a razão imediata para acreditarmos em C ?

(p) Pressupondo-se então que seria do interesse de todos trabalhar apenas nove horas caso cada um tivesse a garantia de que todos os outros fariam o mesmo, não haveria outra forma de atingir esse objetivo a não ser convertendo o suposto acordo mútuo em algo obrigatório sob ameaça de punição, consentindo em vê-lo garantido por lei.

p -> C

O que poderia mostrar que (p) é verdadeiro ?

Quais seriam as alternativas à força da lei ?

(e) ... Um trabalhador que se recusasse a trabalhar mais de nove horas enquanto houvesse outros dispostos a trabalhar dez ou não conseguiria emprego ou, caso contratado, se veria obrigado a abrir mão de um décimo de seus ganhos.

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(f) ..., independentemente de quanto estivesse , [...], convencido de que trabalhar menos atenderia aos interesses de sua classe, o trabalhador feriria os próprios interesses ao dar o exemplo, a não ser que tivesse garantias de que todos ou a maioria dos seus companheiros o seguiriam.

Alternativa 1: O indivíduo tenta agir sozinho.

Quais seriam as alternativas à força da lei ?

Alternativa 2: Os indivíduos tentam um acordo geral

(i) Se quase todos se restringissem a trabalhar nove horas, os que optassem por trabalhar dez se valeriam das vantagens proporcionadas pela restrição e se valeriam do lucro de infringi-la; receberiam o salário de dez horas de trabalho por nove horas trabalhadas mais o salário por uma hora a mais.

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(h) ....independentemente de quão benéfica seja a observância da regulamentação para a classe como um todo, o interesse imediato de todos os indivíduos seria violá-la...

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(g) [Mesmo] um acordo geral para toda a classe [...] não seria [...] eficaz[...] (h) Não se não for imposto por um consenso na prática tão rigoroso quanto o proporcionado pela lei.

Quais seriam as alternativas à força da lei ?

Alternativa 3: Uma ampla maioria adere por decisão espontânea

(l) Provavelmente [...] um número tão grande de trabalhadores preferiria a jornada de trabalho de dez horas nas condições melhoradas que a limitação não poderia ser preservada como prática geral: o que alguns fizeram por opção outros se veriam obrigados a fazer por necessidade, e os que haviam escolhido as jornadas mais longas a fim de ganhar mais seriam obrigados, ao final, a trabalhar sem receber um salário maior do que o que recebiam antes.

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(x) [ a escolha da maioria não seria eficaz]

Diagramando o Argumento

e -> fi -> h -> g

l -> [x][não há outras alternativas]

p -> C