LIMA, Lucas Milanez de. Gestão Da Dívida Pública e Bloco No Poder Uma Análise Comparativa Entre...

download LIMA, Lucas Milanez de. Gestão Da Dívida Pública e Bloco No Poder Uma Análise Comparativa Entre Os Governos FHC, Lula e Dilma

of 32

Transcript of LIMA, Lucas Milanez de. Gestão Da Dívida Pública e Bloco No Poder Uma Análise Comparativa Entre...

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    1/32

    esto da dvid pblic e bloco no

    po r uma anlise comparativa entre

    os governos FHC Lula e Dilma

    Lucas Milanez de Lima Almeida

    Professor de Economia na Universidade Federal da Paraba (UFPB)

    Eric Gil Dantas

    Doutorando em Cincia Poltica na Universidade Federal do Paran (UFPR)

    Paulo Antnio de Freitas Balanco

    Professor de Economia na Universidade Federal da Bahia (UFBA)

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    2/32

    Gesto da Dvida Pblica e Bloco no Poder: uma anlise comparativa entre os governos

    FHC, Lula e DilmaResumo: Neste artigo procuramos demonstrar que a poltica econmica brasileira adotada

    durante o perodo de 1995 a 2014, particularmente no que diz respeito gesto da dvida

    pblica, no sofreu significativas alteraes e esteve em sintonia com a preservao da posio

    hegemnica do setor financeiro no bloco no poder. Utilizou-se a metodologia da Anlise

    Discriminante, de forma a organizar os dados mensais em classes de acordo com as

    semelhanas apresentadas por eles. As informaes agrupadas pelo critrio de vizinhana

    mostraram uma tendncia acentuada para a homogeneizao das decises ligadas gesto da

    dvida pblica nos governos FHC, Lula e Dilma. Com isso, conclumos que este aspecto da

    poltica econmica refora a tese da predominncia da frao de classe financeira no bloco do

    poder atualmente constitudo no Brasil.

    Palavras chave:1. Bloco no poder; 2. Dvida pblica; 3. Burguesia financeira.

    Power bloc and public debt management: a comparative analysis of FHC, Lula and Dilma

    governments

    Abstract: In this article we try to demonstrate that the Brazilian economic policy adopted from

    1995 up to 2014, especially regarding the management of the public debt, underwent no

    significant changes, being in line with preserving the hegemonic position of the financial sector

    on the Power Bloc. We used the Discriminant Analysis methodology, in order to arrange the

    monthly data into classes according to their similarities. The information grouped by

    neighborhood criterion showed a marked tendency to homogenization of the decisions linkedto the management of the public debt during the presidential terms of FHC, Lula and Dilma.

    Thus, we conclude that this aspect of the economic policy reinforces the thesis of the

    predominance of the financial bourgeoisie class fraction in the current Brazilian Power Bloc.

    Keywords:1. Power bloc; 2. Public debt; 3. Financial bourgeoisie.

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    3/32

    s polticas de ajuste fiscal anunciadas pelo governo brasileiro em 2015

    reaqueceram o debate em torno da questo crucial do oramento e

    dos gastos do governo: at que ponto a maior parte das despesas do

    Estado, tais como assistncia e previdncia sociais e a oferta de servios pblicos

    de qualidade, pode ser negligenciada em favor de uma determinada classe?

    Alteraes no seguro-desemprego, abono salarial, seguro-defeso, polticassociais, contratao e aposentadoria dos servidores pblicos, reduo de verbas

    para educao, etc. foram algumas das medidas destinadas reduo das

    despesas governamentais. Com a finalidade de elevar as receitas, foi anunciado

    o aumento de impostos, a retirada de incentivos produo e comercializao

    de mercadorias, elevao das contribuies previdencirias, etc. O objetivo

    destas medidas seria gerar um supervit primrio de R$ 55,3 bilhes, tal como

    anunciado em maio de 2015. Contudo, dois meses depois, foi anunciado um

    novo ajuste com o qual, apesar da elevao do corte oramentrio para 79,4bilhes de reais, o governo reduziu a meta de supervit para 8,7 bilhes de reais.

    Todo este esforo visa garantir o pagamento das obrigaes advindas do

    endividamento pblico que, em agosto de 2015, chegou a 4 trilhes de reais,

    sendo 3,77 trilhes referentes dvida interna e 245 bilhes de dvida externa.

    Tal maneira de governar, cuja fundamentao econmica encontra-se na

    dominao do capital financeiro e sua expresso poltica no neoliberalismo,

    comeou a ser introduzida no pas no incio dos anos 1990, com os presidentes

    Fernando Collor de Mello e Itamar Franco, sendo consolidada por Fernando

    Henrique Cardoso (FHC) e continuada no primeiro mandato de Luiz IncioLula da Silva (FILGUEIRAS, 2006; CARCANHOLO, 2010). Filgueiras et. al. (2010)

    afirmam que no segundo mandato do governo Lula ocorreu uma flexibilizao

    na poltica econmica que, contudo, no alterou profundamente as bases

    neoliberais. Teixeira e Pinto (2012) e Boito Jr. (2012), alm de concordarem

    com tal percepo, mencionam que em seu primeiro mandato Dilma Rousseff

    A

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    4/32

    Revista Outubro, n. 25, maro 2016144

    seguiu os preceitos do seu antecessor e manteve o afrouxamento no trip

    macroeconmico.

    Por outro lado, Boito Jr. e Berringer (2013) chegam a afirmar que amudana ocorrida durante os governos do Partido dos Trabalhadores

    manifestou uma alterao na correlao das foras que compem o Estado

    brasileiro. Segundo os autores, as classes ligadas ao capital financeiro

    internacional haviam perdido seu papel central, tal qual gozavam na dcada de

    1990, colocando-se, assim, em oposio s medidas econmicas e sociais

    tomadas por Lula e Dilma.

    Parte importante dos indicadores que podem mostrar a relao entre o

    Estado e uma classe social est contida no Oramento e na Execuo das

    Despesas de cada governo. A maneira atravs da qual os gastos so realizadosmostra os interesses defendidos em cada momento. Por exemplo, Almeida

    (2015) mostra que os juros e encargos, a amortizao e o refinanciamento da

    dvida pblica corresponderam a, em mdia, mais da metade das despesas

    realizadas nos governos do PSDB e do PT. Diante disto, no presente trabalho,

    interessa saber, atravs do canal chamado gesto da dvida pblica, se houve

    semelhanas na relao entre os governos FHC, Lula e Dilma e o setor

    financeiro, o que indicaria algum grau de dominncia e possvel continuidade

    da frao de classe financeira no bloco no poder.Assim, a questo que se pe a seguinte: h diferenas efetivas no que se

    refere administrao da dvida pblica nestes trs governos, tendo em vista

    que esta uma das principais fontes de renda extrada do Estado pelo capital

    financeiro? A hiptese levantada a de que, apesar da aparente mudana

    registrada pelos referidos autores, a componente da poltica econmica que

    garante a transferncia de recursos para a classe financeira foi mantida entre

    1995 e 2014, o que fortalece a ideia de que esta classe permaneceu na frao

    dominante ao longo destes anos.

    Alm desta introduo, o trabalho compreende uma exposio, na seo aseguir, acerca dos conceitos poulantzianos inerentes relao entre Estado e

    dominao de classe, assim como a questo da dvida pblica. Em seguida,

    como instrumento de comprovao da hiptese, apresentada a metodologia

    da Anlise Discriminante e a aplicao do algoritmo de classificao dos dados

    mensais ligados gesto da dvida. A seo 4 mostra os resultados obtidos e a

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    5/32

    Gesto da dvida pblica e bloco no poder 145

    LucasMilanezdeLimaAlmeida;EricGilDa

    ntasePauloAntniodeFreitasBalanco

    seo final compreende a anlise dos dados, juntamente com as concluses a

    que chegamos.

    Estado e dominao de classe:

    uma abordagem amparada em Poulantzas

    A efetivao do presente estudo requer a utilizao de uma construo

    terica inerente s cincias polticas, porm, de base materialista. Isto deve

    permitir a constatao da hiptese aqui levantada, qual seja, que uma

    determinada frao das classes dominantes brasileiras manteve, atravs de uma

    poltica econmica preocupada com a gesto da dvida pblica, um canal deextrao de riqueza durante os anos de 1994 e 2015. Por essa razo, a elaborao

    terica de Nicos Poulantzas se apresenta como uma abordagem suficientemente

    robusta como referncia principal para tal finalidade, alm de contribuies de

    outros autores que seguem, parcialmente ou no, a trilha daquele autor.

    Adicionalmente, pressuposto que a frao de classe financeira aquela

    que ocupa a posio de dominao entre as demais que integram o bloco no

    poder do Estado brasileiro, como a bibliografia citada j conclui. Por isso, antes

    de mais nada, e tendo em vista as limitaes impostas pelo teor dos objetivos do

    presente estudo, o artigo apresenta suscintamente as concepes de capital

    financeiro e classe social por ns adotadas.

    Primeiramente, tal como elaborou Hilferding (1985), e desenvolvido por

    Lnin (1984), o capital financeiro se caracteriza, potencializando os fenmenos

    da concentrao e da monopolizao, pela fuso dos capitais industrial, e/ou

    comercial, com o capital bancrio. Contornando a discusso acerca da sua

    dinmica iniciativa j efetuada por Sabadini (2012) ao distinguir a viso

    tradicional da viso alternativa a respeito do capital financeiro diante das

    1 Neste trabalho, adota-se uma base terica apoiada fortemente em Poulantzas, mas, tambm,desenvolvida mais recentemente por alguns autores que o utilizam como referncia. Sendoassim, sem desconhecer a importncia dos atuais debates poulantzianos acerca da teoria doEstado, como, por exemplo, algumas dimenses da luta de classes naformulao/reformulao desta teorizao, dada a natureza do presente objeto de estudo,optou-se por no proceder a uma reviso destas discusses, preferindo, assim, afirmar adiretriz escolhida.

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    6/32

    Revista Outubro, n. 25, maro 2016146

    caractersticas estruturais do capitalismo atual e das formas de acumulao que

    se generalizaram (atravs do capital fictcio, por exemplo), acredita-se que o

    capital financeiro possui dinmica prpria, a qual no necessariamente dirigida pela lgica de acumulao bancria ou industrial, e tampouco

    apresenta-se como um momento de qualquer um destes dois tipos de capital.

    Torna-se mister, porm, admitir que o capital financeiro, como todo capital, se

    apropria do mais-valor produzido pela classe trabalhadora, seja sob a forma de

    lucro, juros ou at mesmo, como afirma Guilln (2011), por mecanismos

    financeiros novos que antes no estavam nas mos das diferentes fraes

    separadas do capital(IBID., p. 50).

    Por sua vez, o conceito de classe social aqui adotado parte daquele definido

    por Lnin (1980), segundo o qual uma classe determinada pela forma comoseus integrantes se relacionam com os meios de produo (essencialmente a

    propriedade), pelo papel ocupado por eles na organizao social do trabalho e

    pela maneira como participam da distribuio da riqueza social.

    Diante disto, possvel afirmar que o capital financeiro se vincula a uma

    frao integrante do conjunto dos capitalistas que, ao mesmo tempo, compem

    a classe social possuidora dos meios de produo, fundamento que caracteriza a

    burguesia em geral, mas difere das demais fraes ligadas aos outros tipos de

    capital no tocante participao na organizao social do trabalho e forma deapropriao da riqueza.

    Complementando esta definio, e recorrendo a Poulantzas (s./d.),

    assevera-se que, alm do critrio econmico exposto acima, os critrios polticos

    e ideolgicos so indispensveis para determinar e localizar as classes sociais

    numa formao social concreta (IBID., p. 17), seja para classe operria ou para a

    pequena burguesia. Isto significa que na frao financeira da classe capitalista,

    alm dos empresrios que nela se enquadram do ponto de vista econmico,

    existe um conjunto de indivduos que, por aderncia poltica e ideolgica, se

    harmonizam com ela.Assim, o Estado aqui entendido como uma esfera e um processo

    estratgicos onde se localizam, e se entrecruzam, as fraes de classe do bloco

    no poder. Imediatamente, portanto, tratamos o conceito decisivo de bloco no

    poder, o qual cumprir a finalidade de realizar a mediao entre as dimenses

    abstrato-formal e concreto-real do Estado quando atuam como mecanismo

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    7/32

    Gesto da dvida pblica e bloco no poder 147

    LucasMilanezdeLimaAlmeida;EricGilDa

    ntasePauloAntniodeFreitasBalanco

    unificador entre a acumulao (capital em geral) e as fraes de classe

    (pluralidade de capitais) (PINTO;BALANCO, 2014, p. 40).

    Como o objetivo aqui no se limita anlise poltica, mas inclui aeconmica, faz-se necessrio identificar claramente o espao e o lugar da

    economia, o espao das relaes de produo, de explorao e de extrao do

    excesso de trabalho (espao de reproduo e de acumulao do capital e de

    extrao da mais-valia no modo de produo capitalista) (Poulantzas, 1980, p.

    20). A base econmica, ou a infraestrutura, em qualquer modo de produo,

    inclusive no capitalismo, nunca se constituiu um nvel hermtico e

    enclausurado, que se auto-reproduz e desenvolve leis prprias de

    funcionamento. Isto quer dizer que a esfera poltico-estatal, uma instncia

    superestrutural do modo de produo est, sob diferentes maneiras,intrinsecamente presente no mbito das relaes de produo, portanto, de tal

    forma que se estabelece uma relao simbitica entres estas duas esferas. Deste

    modo, o capitalismo se reproduz, e assume diferentes formas ao longo de sua

    histria, espelhando transformaes simultneas entre a economia e o Estado.

    vista disso, o Estado atua, relativamente economia, cumprindo papeis

    presentes tambm no seio das relaes de produo e reproduo (IBID., p. 20-

    21).

    Se o Estado, sobretudo no que tange s classes dominantes, exerce o papelde organizador, isto quer dizer que ele o faz, particularmente quanto

    burguesia, de acordo com o interesse poltico do bloco do poder no longo

    prazo. Este, por sua vez, constitudo por vrias fraes de classe,

    particularmente fraes das classes dominantes, mesmo aquelas remanescentes

    de modos de produo pretritos, mas ainda presentes em uma determinada

    formao social capitalista (IBID., p. 145).

    Este papel organizador executado pelo Estado deve ser visto como o

    operador da unidade conflituosa decorrente das alianas e do equilbrio,

    embora instvel, que so fixados entre os membros do bloco do poder.Contudo, deve ser destacado, que tal unidade somente pode ocorrer mediante o

    exerccio da hegemonia e direo por parte de uma das classes (ou fraes) que

    integram o bloco do poder. Ademais, a unificao e organizao da burguesia e

    do bloco do poder mediante a ao do Estado decorre da autonomia relativa

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    8/32

    Revista Outubro, n. 25, maro 2016148

    que este desfruta relativamente a essas fraes e que remete prpria, nas

    palavras de Poulantzas, autonomia constitutiva do Estado capitalista.

    Afirma-se que a burguesia se apresenta dividida em diversas fraes declasse, diviso esta que remete tanto ao capital monopolista quanto ao capital

    no monopolista, muito embora, por outro lado, o capital monopolista deva ser

    visto como compondo uma unidade contraditria e desigual, pois denota uma

    fuso entre vrias fraes do capital, de maneira nenhuma representando uma

    integrao monoltica. Ao mesmo tempo, tais fraes, embora em graus

    diferenciados, se posicionam no campo da dominao poltica compondo o

    bloco do poder. Entretanto, a hegemonia relativa do Estado perante as fraes

    das classes dominantes sempre mantida, mesmo que, o processo de

    monopolizao atual e a hegemonia do capital monopolista se efetive sobre oconjunto da burguesia. Ao tempo em que se reconhece que esta situao pode

    restringir a autonomia do Estado mas no anular j que a este deve ser delegado

    o papel incontornvel de organizador do interesse geral da burguesia (IBID., p.

    146-147).

    E, quanto ao bloco no poder, para defini-lo de maneira ainda mais precisa,

    acrescenta-se que o mesmo se constitui mediante a manifestao de trs

    elementos, a saber, em primeiro lugar, um conjunto de instituies prprias do

    Estado capitalista, mas que liga este luta poltica entre as classes. Quanto a esteelemento, evidentemente, se a noo de bloco do poder caracterizada de

    maneira dinmica, ento h que se considerar as mudanas que podem tornar

    as instituies datadas. Em segundo lugar, o bloco do poder se define tambm

    em funo das prticas polticas das fraes e classes dominantes, o que remete

    natureza do bloco em uma dada formao histrica e em uma determinada

    conjuntura do capitalismo. Este elemento acentua aquelas fraes que exercem

    a hegemonia, a qual, certamente, decorre da coeso poltico-ideolgica que esta

    estabelece em determinadas conjunturas histricas e espaciais. Em terceiro

    lugar, o bloco do poder se define mediante o vnculo das fraes ao modo deproduo capitalista de maneira a estruturarem uma diviso no interior da

    burguesia como totalidade. Logo, trata-se das fraes da burguesia que se

    estabelecem em funo do capital visto como pluralidade, pressuposto para a

    conformao das diversas fraes ligadas s formas concretas do capital, quais

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    9/32

    Gesto da dvida pblica e bloco no poder 149

    LucasMilanezdeLimaAlmeida;EricGilDa

    ntasePauloAntniodeFreitasBalanco

    sejam, a industrial, a comercial, a financeira e a agrria/agrcola (PINTO;

    BALANCO, 2014, p. 45-46).

    Ainda, a definio do conceito de bloco no poder, ao mesmo tempo, remete funo da amplitude da hegemonia da classe ou frao que o comanda. O

    papel hegemnico, restrito ou amplo, sempre exercido por segmentos que

    participam do espao da dominao poltica, j que as classes apenas apoiadoras

    do poder de Estado no devem ser includas no bloco no poder. Dessa maneira,

    pode ser dito que a frao ou classe dominante que controla o bloco no poder

    exerce, simultaneamente, a hegemonia de forma restrita e ampla, sendo que esta

    ltima se estende sobre o conjunto da sociedade. Por outro lado, essa dupla

    caracterstica hegemnica da frao dominante est articulada questo da

    conjuntura das foras sociais.No que concerne relao entre o bloco no poder e a hegemonia, para os

    propsitos deste estudo preciso chamar a ateno para as potenciais

    modificaes do centro do poder no mbito do sistema estatal. O centro do

    poder pode passar a ostentar uma autonomia relativa mais ou menos intensa

    em determinada conjuntura. Tal possibilidade se coloca porque o centro do

    poder tem sua fora constituda a partir do mbito da luta de classes, e no por

    possuir uma fora endgena prpria. Por essa razo, quando uma frao de

    classe passa a predominar politicamente, estamos diante de uma situao naqual essa frao desfruta do controle ou influncia que essa classe (ou seus

    representantes) pode exercer sobre o aparelho que concentra o poder efetivo

    (CODATO;PERISSINOTO, 2001, p. 23).

    Por fim, quando da definio do contedo de suas polticas, o Estado tende

    a refletir, por um lado, as relaes contraditrias presentes em seu seio. Essas

    relaes, e seus movimentos, se enrazam nas foras sociais constitutivas do

    bloco no poder em determinada conjuntura. Particularmente, a poltica

    econmica, talvez a mais relevante entre as polticas pblicas encaminhadas

    pelo Estado, de forma alguma pode ser compreendida como o resultado dainiciativa exclusiva, e neutra, de especialistas ou tcnicos, que atuam mediante o

    status de agentes pblicos legitimados. Ao contrrio, tal situao no seria

    diferente na situao brasileira, j que, a nosso juzo, no longo prazo, a poltica

    pblica se conecta ao interesse da frao dominante no bloco no poder que

    ocupa a posio de hegemonia (OLIVEIRA, 2004).

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    10/32

    Revista Outubro, n. 25, maro 2016150

    Desnecessrio afirmar que, aquilo que a linguagem econmico-poltica

    denomina de interveno estatal, na verdade, expressa uma determinada

    correlao de foras no mbito do bloco do poder, expressando umacircunstncia de hegemonia que depende do momento histrico e da amplitude

    espacial em que a mesma se concretiza.

    A dvida pblica neste contexto terico: entre a economia e a poltica

    O interesse da literatura crtica brasileira a respeito da dvida pblica no

    acompanha o tamanho do seu problema, apesar do crescente empenho das

    mesmas pelo tema nos ltimos anos.2

    Na atualidade, o trabalho crtico mais substantivo tem sido conduzido pela

    auditora fiscal aposentada Maria Lucia Fattorelli, que coordena o movimento

    Auditoria Cidad da Dvida.3A autora argumenta que o Brasil enfrenta um

    problema denominado Sistema da Dvida, correspondente a uma gesto do

    endividamento que, ao invs de aportar novas verbas para o Estado, que seria a

    lgica do endividamento pblico, as retira constantemente. Para Fattorelli

    (2013),

    O funcionamento desse sistema garante perpetuao doendividamento pblico externo e interno, pois as dvidas crescem de

    maneira acelerada devido imposio de condies onerosas que

    exigem, continuamente a assuno de novas obrigaes para pagar

    dvidas anteriores, em processos reiterados, sem transparncia, cujo

    resultado a dominao financeira e econmica e uma ofensa

    soberania nacional (IBID., p. 50).

    A autora lista e discute dez mecanismos que abastecem o sistema: (i)

    ofertas excessivas de crditos e financiamento de megaprojetos; (ii)

    emprstimos bilaterais ligados; (iii) converses sucessivas de dvidas pblicas;

    (iv) capitalizao de custos e condies onerosas e abusivas de emprstimos; (v)

    2Os principais trabalhos dedicados temtica so produzidos pela ala mainstreamdas cinciassociais.

    3Esta organizao tem por objetivo a instaurao de uma auditoria na dvida pblica brasileira,j prevista na Constituio de 1988.

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    11/32

    Gesto da dvida pblica e bloco no poder 151

    LucasMilanezdeLimaAlmeida;EricGilDa

    ntasePauloAntniodeFreitasBalanco

    transformao de dvidas privadas em pblicas; (vi) negcios especulativos; (vii)

    salvamentos bancrios; (viii) endividamento obrigatrio por intermdio dos

    bancos privados; (ix) propostas enganosas de alvio de dvida que, na verdade,gera o aprofundamento do endividamento; e (x) modelo tributrio injusto.

    Outras duas importantes contribuies acerca do tema esto em Bin (2010),

    que relaciona sociologicamente a finana4 e a democracia liberal, tendo como

    objeto de pesquisa a dvida pblica, e em Ferreira (2005), que discute quem so

    os proprietrios dos papis que compem a dvida pblica brasileira. Segundo

    Bin (2010),

    Um ponto de partida para conectar analiticamente a esfera poltica

    com a financeira ver como esta ltima se relaciona com a democracia.

    No Brasil, depois de uma evoluo errtica de sua histria republicana,a democracia liberal d sinais de consolidao. No entanto, na questo

    econmica - ao tocar nesse ponto empurramos o conceito de

    democracia para longe de sua concepo liberal - o sentido tem sido o

    inverso, o que, alis, coerente com a prpria consolidao das

    instituies liberais (IBID, p. 5).

    Entre os pontos em comum, presentes nas anlises destes dois ltimos

    autores, est a advertncia para a presena de indivduos do sistema financeiro

    inseridos nas principais instituies do Estado, ou do aparelho de Estado,

    responsveis direta e indiretamente pela poltica econmica.5Mediante uma investigao mais profunda, Codato et. al. (2016) tambm

    apresentam exemplos de dirigentes com este perfil circulando entre instituies

    desta natureza. Os autores realizaram uma pesquisa com os 39 diretores do

    Banco Central do Brasil (BCB) que circularam nos ltimos vinte anos na

    instituio (abrangendo os governos FHC, Lula e Dilma). A principal concluso

    a que chegaram foi a de que as diretorias de poltica econmica (em

    contraponto s diretorias meramente administrativas e fiscais) so ocupadas

    por pessoas oriundas de fora da instituio, principalmente do sistema

    4Bin (2010) trata a finana como um conceito relacionado s classes favorecidas no processo detransferncia de mais-valia pela via financeira, e no como o clssico conceito formuladopor Rudolf Hilferding.

    5A esse respeito h uma diversa bibliografia de matrizes tericas diversas, da teoria da escolharacional ao marxismo, nacional e internacional, tal como Adolph (2013), Minella (1996),Novelli (1999), Oliveri (2007), Loureiro (1997), dentre muitos outros.

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    12/32

    Revista Outubro, n. 25, maro 2016152

    financeiro e da Pontifcia Universidade Catlica do Rio de Janeiro (PUC-Rio),

    que, adicionalmente, possuem uma formao baseada nos princpios do

    mainstream econmico. Outro achado importante, e que, de certa forma,tambm posto a prova no presente artigo, que no h diferenas no perfil

    destes diretores se compararmos os trs governos, ou seja, independentemente

    de ser FHC, Lula ou Dilma, os diretores so oriundos do sistema financeiro e

    pertencem ao mainstream.6

    A respeito das principais instituies de ensino de teoria econmica

    hegemnica no pas, a Fundao Getlio Vargas/RJ e a PUC-Rio so as que

    desfrutam da maior simpatia do capital financeiro. Loureiro (1997) diz,

    Ainda temos em termos de diferenciao das estratgias profissionais,o plo constitudo pela EPGE e pela PUC-Rio pode ser denominado

    privatista, no s pelo fato de os dois centros serem estabelecimentos

    de ensino privado, mas sobretudo por valorizarem teoricamente o

    papel do mercado no sistema econmico. Alm disso, tambm por

    estabelecerem laos estreitos com empresas privadas, particularmente

    com bancos, onde so consultores. (IBID, p. 76-7).

    Neste contexto, recorrendo frmula de Gramsci, possvel denominar

    estes profissionais, de acordo com Bin (2010), e em sintonia com a anlise do

    mainstream realizada por Codato et al. (2016), de intelectuais orgnicos das

    finanas.

    Em momentos mais recentes, economistas atuando como intelectuais

    orgnicos da finana instalados no aparelho do Estado apareceram

    como figuras fundamentais para a reproduo dos [preceitos]

    universais do momento, como a estabilidade monetria e a

    responsabilidade fiscal. Na histria mais recente, ao mesmo tempo que

    denunciavam a calamidade da inflao e desenhavam planos para

    cont-la, difundiam uma verdadeira cultura da instabilidade

    monetria, processo que lhes conferiu legitimidade e autoridade para,

    como pedagogos da instabilidade, diagnosticar e remediar os males dopas (BIN, 2010, p. 84).

    6Por outra via, outro autor que trata, nas suas palavras, das anomalias do Sistema Monetrio eda estrutura de mercado da dvida pblica Nakano (2005). Para o autor, um dosproblemas seria o fato de que o Brasil um pas nico no mundo, no qual o Banco Centraldetermina diretamente a taxa de juros que remunera ttulos da dvida pblica (IBID., p. 11).

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    13/32

    Gesto da dvida pblica e bloco no poder 153

    LucasMilanezdeLimaAlmeida;EricGilDa

    ntasePauloAntniodeFreitasBalanco

    Estes idelogos so encontrados no somente no aparelho de Estado, mas

    tambm na academia e na mdia em geral: televiso, jornal impresso, rdio,portais de internet, etc. No entanto, a bibliografia se ressente ainda de pesquisas

    empricas neste sentido.

    Ferreira (2005) discute dois outros aspectos centrais na poltica dos

    banqueiros, que tambm remete presso para a manuteno da dvida pblica:

    sindicatos patronais e financiamento de campanha. As associaes de classe,7

    para o autor, se inserem dentro da disputa na sociedade pela hegemonia, aqui

    tambm no sentido gramsciano. Estas organizaes patronais financeiras8

    surgem justamente em funo da ausncia de monolitismo entre os capitalistas,

    o que, tendo em vista o interesse particular das diversas fraes dominantes,torna imperiosa a prtica do lobby, tanto no Executivo quanto no Legislativo.

    Outra forma que abre caminho para este lobby justamente o financiamento de

    campanhas eleitorais. Para corroborar o argumento do autor, apresentamos os

    dados levantados por ele a respeito da participao da contribuio dos bancos

    no financiamento aos principais candidatos presidncia nas eleies de 2002:

    Jos Serra 30,36%, Lula 23,75% e Ciro Gomes 12,19%.

    Todavia, reforando o que foi dito acima, constata-se uma lacuna na

    bibliografia crtica acerca da dvida pblica, em boa medida porque a mesmano tratada de forma estatisticamente comparativa e estrutural visando

    detectar as semelhanas e diferenas entre os diferentes governos. Ou seja,

    mediante o uso de procedimentos que permitam responder pergunta de

    fundo: a dominao do capital financeiro manteve-se ao longo dos governos?

    7Federao Nacional dos Bancos (FENABAN), Federao Brasileira de associaes de Bancos (FEBRABAN), Confederao Nacional das Instituies Financeiras (CNF), AssociaoBrasileira de Bancos Comerciais (ABBC) e Associao Brasileira de Bancos Internacionais(ABBI).

    8Ary Minella provavelmente o principal pesquisador no Brasil sobre o tema, com importantestrabalhos tais como Minella (1988, 1996, 2007).

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    14/32

    Revista Outubro, n. 25, maro 2016154

    Metodologia

    A Anlise Discriminante (AD) uma tcnica amplamente utilizada noreconhecimento de padres nas mais diversas reas da cincia (Milanez e

    Pontes, 2014; Lei et al., 2012; Wu, Liang e Yang, 2008; Liang e Wu, 2005; Lin e

    Mcclean, 2001; Altman, Marco e Varetto, 1994). A partir de um conjunto prvio

    de informaes acerca de um fenmeno, a AD tem como um de seus objetivos

    classificar novas amostras deste fenmeno de acordo com suas similaridades e

    distines em relao aos dados j conhecidos (Rencher, 1998 e 2002).

    No presente trabalho, optou-se pelo uso do algoritmo k-Nearest-Neighbors

    (k-NN), tendo em vista seu carter determinstico e no paramtrico (Bishop,

    2006; Duda, Hart e Stork, 2001). Como o nome sugere, a classificao de cada

    observao pelo algoritmo k-NNdepende dos seus k vizinhos mais prximos.

    Assim, sendo uma observao (valor de uma varivel) um ponto e estabelecido

    seu entorno, o novo dado (valor da nova varivel a ser classificada) ser

    rotulado de acordo com a classe dos demais pontos (valores) que apresentarem

    maior frequncia em sua vizinhana. A figura abaixo, em um espao de duas

    dimenses, nos permite visualizar o que foi dito.

    Figura 1 Critrio de seleo baseada nosk

    vizinhos mais prximos

    Fonte: elaborao prpria.

    k= 1

    k= 3

    k= 5

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    15/32

    Gesto da dvida pblica e bloco no poder 155

    LucasMilanezdeLimaAlmeida;EricGilDa

    ntasePauloAntniodeFreitasBalanco

    Pode-se observar que, se escolhido o primeiro vizinho mais prximo como

    critrio de vizinhana (k= 1), a classificao do novo dado (crculo pontilhado)

    ser na classe preta, pois no menor crculo contnuo (que representa avizinhana de k= 1) a observao mais frequente pertence a esta classe. Caso

    seja selecionado um entorno com os trs vizinhos mais prximos (k = 3), a

    classe ser a cinza, pois, nesta vizinhana (crculo contnuo intermedirio), esta

    a que apresenta maior frequncia, com uma bola preta e duas cinzas. Quando

    k= 5, ou seja, quando se busca a classificao de acordo com os cinco vizinhos

    mais prximos (vizinhana representada pelo crculo contnuo grande), a

    classificao retorna para o preto, j que a frequncia de bolas pretas de trs e

    a de cinzas dois.

    Diante disto, percebe-se que a escolha do nmero de vizinhos de granderelevncia no processo de classificao, na medida em que cada um deles dar

    um voto para eleger a classe da nova observao. Baseando-se em Enas e Choi

    (1986), McLachlan (2004) sugere que a quantidade de vizinhos (k) deve ser um

    nmero mpar (para minimizar as chances de empate) que mais se aproxime de:

    Onde N o total de observaes.

    O prximo passo, ento, estabelecer a mtrica da distncia entre os

    pontos. Quando os dados so nmeros reais e esto na mesma unidade de

    medida, Hastie, Tibshirani e Friedman (2009) recomendam o uso da Distncia

    Euclidiana ( ), calculada da seguinte forma:

    Onde xeyso dois vetores de dimenso n.

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    16/32

    Revista Outubro, n. 25, maro 2016156

    Por fim, preciso estabelecer as probabilidades das novas observaes

    estarem contidas em cada classe. O critrio adotado foi o da proporcionalidade,

    segundo o qual as chances de uma observao estar em uma classe sero dadaspela frequncia relativa do tamanho de cada classe ( ) em relao ao total de

    observaes ( ). A formulao a seguinte:

    Onde a probabilidade de uma nova observao estar contida na classe .

    Aplicao do Algoritmo k

    Como o objetivo do trabalho verificar se h similaridades entre os dados

    mensais ligados gesto do endividamento entre os governos FHC, Lula e

    Dilma, a tcnica de classificao foi aplicada de maneira diferente daquela

    tradicionalmente utilizada.

    O procedimento realizado consistiu em retirar da amostra total ( ) uma

    nica observao e consider-la como se fosse nova (sem classificao). A partir

    disto, dos dados restantes, utilizou-se o algoritmo k-NNpara reclassific-

    la de acordo com a sua vizinhana. Assim, foi possvel saber a que governos(classes) cada uma das observaes mensais se assemelhou mais.

    Existem trs possibilidades de classificao de cada nova observao: 1) de

    acordo com a classe (governo) original, neste caso temos um acerto do

    algoritmo; 2) de acordo com outra classe (governo), caso onde ocorre um erro

    de classificao;9ou 3) o novo dado no classificado. Esta possibilidade ocorre,

    por exemplo, quando h um empate na frequncia das classes. Para evitar tal

    resultado, escolheu-se, como medida de desempate, o voto de minerva do

    vizinho mais prximo. Assim, se houver algum dado no classificado, sua classeser dada pela classe do primeiro vizinho mais prximo.

    No presente estudo, cada erro representa um ms de um determinado

    governo, que foi classificado como diferente deste governo realmente

    9Nos quadros de resultados apresentados a seguir, os acertos ficam na diagonal principal e oserros nas demais clulas.

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    17/32

    Gesto da dvida pblica e bloco no poder 157

    LucasMilanezdeLimaAlmeida;EricGilDa

    ntasePauloAntniodeFreitasBalanco

    observado, na medida em que os valores se assemelharam mais ao ocorrido no

    perodo de outro presidente, em detrimento do original. Assim, quanto maior a

    taxa de erro, maior o grau de similaridade entre meses de governos diferentes.A diviso dos dados em classes foi feita respeitando a ordem cronolgica

    dos respectivos presidentes, tal como apresentado a seguir.

    Quadro 1 Diviso prvia dos dados segundo os mandatos presidenciais

    !"#$%'(# *+,-$$#. /'01%2 3%4

    !"#$%$&' )"$#*+," -%#&'.'

    /!)-01%$"*#' &" 2334 5"6"78#' &" 9::9

    ;,*6 *' ;,?% &% @*?A% /;,?%0 1%$"*#' &" 9::B 5"6"78#' &" 9:2:5*?7% C%$% D',.."EE

    5*?7% D',.."EE /5*?7%01%$"*#' &" 9:22 5"6"78#' &" 9:2F

    Fonte: elaborao prpria.

    As informaes fornecidas pelo BCB se iniciam em janeiro de 1995,

    primeiro ms de mandato do Presidente FHC, e encerram em dezembro de

    2014, ltimo ms do primeiro governo Dilma Rousseff, totalizando 240

    observaes de cada varivel. Os dados disponibilizados pela Secretaria do

    Tesouro Nacional (STN) tm a mesma data final; porm, se iniciam apenas emjaneiro de 1997. Assim, estes ltimos totalizam 216 meses de informao. No

    caso do Produto Interno Bruto Mensal (PIB Mensal), os dados correspondem a

    uma estimativa feita pelo BCB, a partir de uma srie de informaes trimestrais

    e anuais. A partir desta estimativa mensal, calcula-se tambm o Produto Interno

    Bruto Acumulado (PIB Acumulado) nos doze meses anteriores, fornecendo,

    assim, um PIB anual de base mvel (baseado nos doze meses passados).

    As variveis mensais analisadas so apresentadas no quadro a seguir.

    Quadro 2 Variveis analisadas com o algoritmo k-NN

    32'(# 5-"%67#,82(-,

    29$#"7-:;#$ *!.

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    18/32

    Revista Outubro, n. 25, maro 2016158

    @SH

    D">"*M%. !*$%$>"*#%.ID">"*M%. S'M%*. 92T L

    5".P".%. !*$%$>"*#%.I5".P".%. S'M%*. 92T L

    N$>%#U'. S'M%*. &% 5OA*&%I5".P".%. S'M%*. 92T L

    N$&*A*&%7"$M' K'8*?*=#*'

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    19/32

    Gesto da dvida pblica e bloco no poder 159

    LucasMilanezdeLimaAlmeida;EricGilDa

    ntasePauloAntniodeFreitasBalanco

    Quadro 3 Classificao dos meses de governo por meio das despesas

    mensais com juros nominais e pelo resultado primrio em relao ao PIB:

    jan/95 a dez/14

    !"#$%'(#

    82(-,

    @#$#$

    A'-,%$-&2$

    8-9#,- B#1,-$$%C%1-:D2 &2 A,E2"%(42

    3F+ GH,- I%,4-

    !)- 3T FL BL 29

    ;,?% 3T BF FB 23

    5*?7% FV 92 2T 22

    S'M%? R?U'#*M7' 9F: 2:9 3T F9

    Fonte: elaborao prpria.

    Em cada clula da Tabela de Reclassificao do Algoritmo temos a

    classificao dos meses de governo de acordo com o algoritmo k-NN.

    Analisando cada linha, veem-se como os meses de mandatos se reclassificaram

    de acordo com os seus sete vizinhos mais prximos, ou seja, com qual classe

    (governo) aquela observao se assemelhou mais. J as colunas mostram a

    recomposio de cada classe segundo os critrios do algoritmo. Na diagonal

    principal da tabela de reclassificao tm-se os meses classificados

    corretamente, ou seja, a classe mais frequente dentre os sete vizinhos mais

    prximos corresponde mesma classe (ao mesmo governo) que o dado

    analisado.

    De acordo com o algoritmo, podemos observar que, da reclassificao dos

    96 meses de governo FHC, um total de 47 meses foram rotulados corretamente

    e 49 no. Isto significa que em 51% meses de governo Fernando Henrique, os

    valores dos juros nominais e do resultado primrio se assemelharam mais ao

    que ocorreu no perodo Lula (37 meses) e Dilma (12 meses) do que com oobservado no governo tucano (49%).

    No caso da classificao dos oito anos de governo Lula, 44,8% dos meses

    foram classificados corretamente, enquanto o erro de classificao foi de 55,2%.

    Assim, 53 meses de juros nominais e de resultado primrio do governo Lula

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    20/32

    Revista Outubro, n. 25, maro 2016160

    foram reclassificados, dadas as similaridades entre os valores, como FHC (34

    meses) ou Dilma (19 meses).

    No governo Dilma, por sua vez, a taxa de acerto foi ainda menor, o quedenota o elevado grau de semelhana dos juros nominais e do resultado

    primrio do seu mandato com o dos demais governos. Apenas 22,9% dos 48

    meses analisados (11 meses) foram reclassificados corretamente, enquanto

    43,8% da varivel em questo se assemelharam mais ao ocorrido durante os

    mandatos de FHC e 33,3% aos mandatos de Lula.

    Analisando as colunas, como foi dito, vemos como ficou cada classe de

    acordo com os critrios de reclassificao do algoritmo. Com isto, possvel

    observar que dos 102 meses de juros nominais e resultado primrio como

    proporo do PIB reclassificados como FHC, 47 (46,1%) de fato foram destepresidente, enquanto 34 (33,3%) meses correspondem a Lula e 21 (20,6%) a

    Dilma. Daqueles 96 rotulados como Lula, 37 (38,5%) foram de FHC, 43 (44,8%)

    de Lula e 16 (16,7%) de Dilma. J aqueles 42 meses que foram reclassificados

    como sendo de governo Dilma, 12 (28,6%) foram de FHC, 19 (45,2%) de Lula e

    11 (22,9%), de fato, dela.

    No quadro a seguir, est a classificao dos governos segundo dois

    indicadores que evidenciam a manuteno da dependncia do governo em

    relao ao setor financeiro, a saber, o percentual mensal das receitas e dasdespesas financeiras em relao s despesas e s receitas totais,10

    respectivamente.

    Quadro 4 Classificao dos meses de governo por meio das receitas e

    despesas financeiras como proporo das receitais e despesas totais: jan/97 a

    dez/14

    !"#$%'(#

    82(-,

    @#$#$

    A'-,%$-&2$

    8-9#,- B#1,-$$%C%1-:D2 &2 A,E2"%(42

    !)- ;,?% 5*?7%

    !)- L9 FT 99 F

    ;,?% 3T 9B 4F 23

    5*?7% FV B 23 9T

    82(-, A,E2"%(42 JKL MJ NO PN

    10Receitas (Despesas) Fiscais + Receitas (Despesas) Financeiras = Receitas (Despesas) Totais

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    21/32

    Gesto da dvida pblica e bloco no poder 161

    LucasMilanezdeLimaAlmeida;EricGilDa

    ntasePauloAntniodeFreitasBalanco

    Fonte: elaborao prpria.

    O quadro mostra que a reclassificao dos 72 meses de governo FHCdisponveis, resultou numa taxa de acerto de 63,9%, na medida em que 46 meses

    foram reclassificados corretamente. Por outro lado, 30,6% dos meses (22 meses)

    de receitas e despesas financeiras de FHC se assemelharam mais ao que se

    registrou no governo Lula e 5,6% (4 meses) ao ocorrido na Era Dilma.

    Analisando o governo Lula, percebe-se que 56,3% dos meses se

    reclassificaram de maneira correta (total de 54 meses). Porm, um total de 42

    meses de receitas e despesas financeiras se aproximou mais do registrado

    durante os perodos FHC e Dilma do que com o prprio perodo Lula, com 23 e

    19 meses, respectivamente.No caso de Dilma, a taxa de reclassificao correta foi de 54,2% (26 meses),

    enquanto o erro total, que significa a reclassificao dos meses como sendo de

    outros governos, foi de 43,8%. Destes 22 meses que se assemelharam mais ao

    ocorrido no perodo de outros presidentes, 3 se classificaram como FHC e 19

    como Lula.

    Pela nova composio das classes observada nas colunas, possvel ver que,

    dos 72 meses de receitas e despesas financeiras em relao s receitas e despesas

    totais classificados como FHC, 46 (63,9%) foram de fato deste presidente, 23(31,9%) foram meses de governo Lula e 3 (4,2%) de Dilma. Dos 95 meses

    reclassificados como Lula, 22 (23,2%) foram de FHC, 54 (56,8%) foram de Lula

    e 19 (20%) de Dilma. J do total de 49 meses classificados como desta ltima, 4

    (8,2%) foram meses de governo FHC, 19 (38,8%) de Lula e 26 (53,1%)

    realmente de Dilma.

    Outro indicador da relao entre o setor financeiro e o governo o

    chamado endividamento mobilirio interno lquido. No quadro abaixo est a

    classificao dos meses segundo este dado como proporo do PIB.

    Quadro 5 Classificao dos meses de governo por meio do endividamento

    mobilirio interno lquido como proporo do PIB: jan/97 a dez/14

    !"#$%'(#

    82(-,

    @#$#$

    A'-,%$-&2$

    8-9#,- B#1,-$$%C%1-:D2 &2 A,E2"%(42

    !)- ;,?% 5*?7%

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    22/32

    Revista Outubro, n. 25, maro 2016162

    !)- L9 9L 9L 2V

    ;,?% 3T BB FL 2T

    5*?7% FV 2V 23 22

    82(-, A,E2"%(42 JKL MQ NR PO

    Fonte: elaborao prpria.

    Novamente, ocorreu considervel semelhana entre os meses de governo

    dos trs presidentes. No caso de FHC, 27 meses (37,5% do total) foram

    reclassificados corretamente. Os 45 meses restantes, reclassificados como mais

    semelhantes aos observados no perodo dos demais presidentes, se dividiram

    entre 27 meses (37,5% do total de FHC) rotulados como de Lula e 18 (25%)

    como Dilma.

    No perodo dos mandatos Lula, 34,4% dos meses (33 meses) deendividamento interno lquido foram classificados, dada as semelhanas, como

    se fosse de FHC. Por outro lado, 49% se reclassificaram corretamente (47

    meses) e outros 16,7% foram classificados como de Dilma (16).

    Analisando os meses de Dilma Rousseff, v-se que apenas 22,9% (11 meses)

    se reclassificaram corretamente, 37,5% dos meses (18) se aproximaram mais

    daquilo que foi visto durante a Era FHC e 39,6% (19 meses) quilo visto durante

    os governos Lula.

    Avaliando as colunas da Tabela de Reclassificao do Algoritmo, v-se que,

    dos 78 meses de endividamento mobilirio interno lquido classificados como

    pertencentes ao governo FHC, 34,6% (27 meses) de fato foram de Fernando

    Henrique, sendo 42,3% (33) de governo Lula e 23,1% (18 meses) Dilma. Dos 93

    meses classificados como governo Lula, 50,5% (47 meses) foram do operrio,

    enquanto 29% (27) foram, na realidade, meses de mandato tucano e 20,5% (19)

    da presidente Dilma. No caso desta ltima, foi atribudo pelo algoritmo um

    total de 45 meses, sendo que apenas 24,4% (11 meses) de fato foram de dela,

    sendo 40% (18) de FHC e 35,6% (16) de Lula.

    Abaixo apresentada a classificao segundo as despesas com os encargostotais das dvidas mobiliria e contratual, interna e externa, em relao s

    despesas totais efetuadas a cada ms.

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    23/32

    Gesto da dvida pblica e bloco no poder 163

    LucasMilanezdeLimaAlmeida;EricGilDa

    ntasePauloAntniodeFreitasBalanco

    Quadro 6 Classificao dos meses de governo por meio dos encargos totais

    da dvida como proporo das despesas totais: jan/97 a dez/14

    !"#$%'(#

    82(-,

    @#$#$

    A'-,%$-&2$

    8-9#,- B#1,-$$%C%1-:D2 &2 A,E2"%(42

    !)- ;,?% 5*?7%

    !)- L9 23 F: 2B

    ;,?% 3T BV F4 2B

    5*?7% FV 22 2F 9B

    82(-, A,E2"%(42 JKL LQ NN PN

    Fonte: elaborao prpria.

    Observando os meses de encargos totais da dvida em relao aos gastos

    totais, novamente registrou-se grande semelhana entre os governos. Os 72

    meses de governos FHC, quando reclassificados, foram rotulados como: 26,4%

    (19 meses) de FHC, 55,6% (40) de Lula e 18,1% (13) de Dilma. J os 96 meses de

    governo Lula foram reclassificados da seguinte maneira: 39,6% (38 meses) como

    FHC, 46,9% (45) como Lula e 13,5% (13) como Dilma. Por sua vez, dada a

    vizinhana dos valores relativos dos encargos da dvida, os 48 meses de

    mandato de Dilma se reclassificaram da seguinte forma: 22,9% (11 meses) como

    FHC, 29,2% (14) como Lula e 47,9% (23) como Dilma.

    Analisando as colunas e as novas classes formadas pelo algoritmo, vemos

    que, dos 68 meses reclassificados como FHC, apenas 27,9% (19 meses) de fato

    foram de Fernando Henrique. Os demais 49 meses foram de Lula (38 meses ou

    55,9%) e Dilma (11 meses ou 16,2%). No caso da reclassificao de 99 meses

    como pertencentes ao governo Lula, 45,5% (45 meses) foram realmente deste

    presidente, enquanto 40,4% (40 meses) corresponderam ao perodo FHC e14,1% (14 meses) ao perodo Dilma. No tocante reclassificao dos 49 meses

    como sendo de Dilma Rousseff, 46,9% (23 meses) de fato pertencem a esta

    classe, enquanto 26,5% (13 meses) foram, igualmente, advindos de Lula e FHC.

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    24/32

    Revista Outubro, n. 25, maro 2016164

    Apesar das semelhanas constatadas at aqui, o quadro abaixo evidencia

    que a classificao dos meses de governo de acordo com a relao do estoque da

    dvida interna por indexador com PIB foi significativamente diferente.

    Quadro 7 Classificao dos meses de governo por meio do estoque da

    dvida por indexador* em relao ao PIB: jan/95 a dez/14

    PresidenteTotal deMesesAnalisados

    Tabela de Reclassificao do Algoritmo

    FHC Lula Dilma

    FHC 96 95 1 0Lula 96 1 92 3Dilma 48 0 2 46Total Algoritmo 240 96 95 49

    Fonte: elaborao prpria.

    * Cmbio, Taxa de Referncia (TR), Selic, Prefixados e ndices de Preos

    Tais informaes permitem afirmar que os governos adotaram estratgias

    distintas no que conhecido como gesto da dvida pblica. Isso visto pelo

    elevado grau de acerto na reclassificao dos meses feita pelo algoritmo.

    A taxa de acerto para o governo FHC foi de 99%, com apenas um ms

    reclassificado incorretamente como Lula. No caso deste ltimo presidente,

    95,8% dos meses foram corretamente rotulados e apenas 4 meses foram

    reclassificados como Dilma. Por sua vez, 95,8% dos meses de mandato dela

    classificaram-se corretamente como Dilma Rousseff. Os demais meses se

    aproximaram mais do observado no perodo Lula e como tais foram

    reclassificados.

    Para termos uma ideia do ocorrido com a composio da dvida nestes 20

    anos, a tabela a seguir mostra a participao mdia dos ttulos no total da dvidamobiliria em cada governo.

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    25/32

    Gesto da dvida pblica e bloco no poder 165

    LucasMilanezdeLimaAlmeida;EricGilDa

    ntasePauloAntniodeFreitasBalanco

    Tabela 1 Participao mdia dos ttulos por indexador no total da dvida

    mobiliria (%)

    -W78*' SD @"?*> J#"X'. J#"E*Q%&'.

    !)- 2VYB TY3 F9YT FY4 9LYB

    ;,?% BYT 9YF FTYT 9:Y: 9LYF

    5*?7% :YF :Y4 94YT BBYB F:Y9

    KZ&*% &' J"#O'&' VYV BYV F:YV 2TY4 93Y3

    Fonte: elaborao prpria.

    Baseando-se nas experincias internacionais, segundo Rocha (2009), no

    incio dos anos 2000 ocorreu uma srie de modificaes na estrutura dos rgos

    gestores da dvida brasileira. Com o objetivo de administrar um suposto trade-

    offentre os riscos e os custos, as diretrizes da gesto do endividamento seguiram

    a premissa de que prefervel a predominncia de ttulos indexados a fatores de

    menor volatilidade, porm, mais onerosos. Diante disto possvel perceber que,

    de fato, foi adotada a estratgia de trocar ttulos atrelados a indexadores

    flutuantes (cmbio e juros) por aqueles atrelados a taxas fixas ou a ndices depreos.

    Durante o perodo FHC, os ttulos atrelados Selic predominavam sobre os

    demais, seguido dos prefixados e dos indexados ao cmbio. Com o presidente

    Lula, os ttulos ligados Selic continuaram a ter a maior importncia em relao

    ao estoque total, seguido pelos prefixados e pelos atrelados aos ndices de

    preos. Seguindo a lgica da boa gesto da dvida, pode-se dizer que ocorreu

    uma mudana, visto que os ttulos com maior volatilidade, ligados ao cmbio,

    perderam importncia em relao aos demais. Por fim, com Dilma, pode-sedizer que a dvida mobiliria brasileira passou a se resumir a ttulos prefixados

    (40,2% do total), indexados aos preos (33,3%) e Selic (25,6%), sendo os

    demais responsveis por menos de 1% da dvida mobiliria total.

    Porm, no por acaso, esta mudana na estrutura do estoque da dvida foi

    acompanhada pela mudana nos indexadores a ela atrelados. A tabela a seguir

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    26/32

    Revista Outubro, n. 25, maro 2016166

    mostra um ndice no paramtrico de correlao entre a proporo dos ttulos

    em relao ao total da dvida e a evoluo dos indexadores aos quais esto

    atrelados os respectivos papis.

    Tabela 2 ndice de correlao de Spearman entre participao no total da

    dvida mobiliria e respectivo ndice do indexador: jan/1995 a dez/2014

    +S49%2 8B T#,%1 !"#:2$

    :Y:FF :YLVF[ :YB:T[ :Y393[

    Fonte: elaborao prpria.

    * Significativo a 5%.

    Todos os indexadores apresentaram correlao positiva entre a participao

    do ttulo no estoque total de dvida e o respectivo ndice que representa sua

    evoluo. Assim, quanto maior o valor do indexador, maior o estoque de ttulos

    atrelado a ele e vice e versa. Isto nos permite afirmar que, ao longo do tempo, a

    dvida tende a ser dominada pelos papeis que do maiores rendimentos aos seus

    detentores, tendo em vista que, quando caiu o ndice (fator determinante para o

    custo), caiu a participao no total da dvida, enquanto que, com a elevao do

    ndice, aumentou a participao na dvida total. A exceo so os ttulos

    atrelados ao cmbio, pois, dado o baixo nvel de significncia estatstica, no

    necessariamente o aumento do cmbio est correlacionado com um aumento

    na participao relativa dos ttulos a ele atrelado. Tais indcios nos levam a

    afirmar que, de fato, a estratgia de gesto tendeu a dirimir os riscos ligados a

    este ltimo indexador.

    A poltica econmica e a preservao do capital financeiro como a

    frao de classe hegemnica dentro do bloco no poder

    A hiptese inicial deste artigo era a de que o segmento da economia

    representado pelo capital financeiro ocupa, h pelo menos duas dcadas, a

    posio de frao dominante dentro do Bloco do Poder em vigncia no Brasil. A

    finalidade deste estudo foi demonstrar que a poltica econmica adotada

    durante os mandatos presidenciais no perodo de 1995 a 2014, particularmente

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    27/32

    Gesto da dvida pblica e bloco no poder 167

    LucasMilanezdeLimaAlmeida;EricGilDa

    ntasePauloAntniodeFreitasBalanco

    no que diz respeito gesto da dvida pblica, no sofreu significativas

    alteraes e esteve em sintonia com a preservao da posio daquela frao de

    classe.Por essa razo, procurou-se constatar a existncia de semelhanas acerca

    dos resultados das medidas de poltica de gesto do endividamento adotadas

    durante os 5 mandatos presidenciais exercidos por 3 diferentes presidentes, que

    lideraram coalizes partidrias formalmente distintas. Tratava-se de comprovar

    se governos, em tese, programtica e ideologicamente distintos, convergiam no

    que tange a esta questo econmica fundamental e que tem desdobramentos no

    plano das relaes entre as classes sociais.

    Para isso, utilizou-se a Anlise Discriminante, que objetiva rotular os dados

    em classes de acordo com as semelhanas apresentadas por eles. Os resultadosmostraram que, em grande medida, tendo em vista as variveis inerentes

    gesto da dvida pblica apresentadas no Quadro 2, as decises do Banco

    Central e do Tesouro Nacional convergiram para uma posio qualitativamente

    indistinguvel entre os mandatos presidenciais de Fernando Henrique Cardoso,

    Luiz Incio Lula da Silva e Dilma Rousseff. A nica exceo foi o estoque da

    dvida por indexador, que diferiu significativamente entre os governos,

    denotando as diferenas nas diretrizes da efetivao do endividamento.

    As informaes agrupadas pelo critrio de vizinhana entre os dadosmostram uma tendncia acentuada para a homogeneizao das decises

    relativas gesto da dvida pblica, as quais contriburam decisivamente para a

    preservao, sem nunca ameaar, da posio hegemnica da frao da classe

    dominante associada ao capital financeiro. Nota-se, portanto, que, apesar do

    discurso de repulso ao neoliberalismo e de combate predominncia do

    capital financeiro sobre os demais setores da economia, os mandatos dos

    presidentes ligados ao PT (Lula e Dilma), no perodo em questo, pouco

    diferiram dos mandatos exercidos por um presidente (FHC) vinculado ao PSDB

    no que concerne ao tratamento dado, entre outros aspectos, s seguintesvariveis: Juros Nominais, Resultado Primrio, Receitas e Despesas Financeiras,

    Endividamento Mobilirio Interno Lquido e Encargos Totais da Dvida.

    Obviamente, no possvel afirmar a inexistncia de medidas distintas

    colocadas em prtica pelos governantes aqui avaliados. De fato, elas ocorreram;

    mas, podemos argumentar que as mesmas procederam muito mais de aspectos

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    28/32

    Revista Outubro, n. 25, maro 2016168

    inerentes a conjunturas particulares do que a inflexes relativamente

    tendncia geral constatada de homogeneizao dos referidos mandatos em

    torno da questo da dvida pblica. Por exemplo, ao invs de protruso com omodelo implementado nos governos FHC, o estudo aqui empreendido mostrou

    que as diferenas entre as gestes econmicas petistas e tucanas podem ser

    classificadas como pouco relevantes, de tal forma que, pode-se afirmar, ao

    contrrio da ruptura, ocorreu uma sedimentao da orientao neoliberal

    consolidadora da posio privilegiada do segmento financeiro.

    Evidentemente, as concluses aqui exaradas podem estar sujeitas a crticas

    se consideradas a partir de uma base metodolgica cujo contedo seja aderente

    ao escopo da teoria econmica dominante (a teoria neoclssica em geral, ou o

    mainstream econmico). Contudo, a anlise e crtica aqui desenvolvidas acercado objeto selecionado foram pautadas, como anunciamos previamente, na

    noo de Economia Poltica, o que implica que a leitura dos acontecimentos

    deve necessariamente resultar em concluses distintas, posto que os recortes e

    abstraes so, no apenas de forma, mas, sobretudo, de contedo diferentes.

    Por um lado, a teoria econmica ideologicamente sustentadora do

    capitalismo afirma que conceitos tais como plano de ajuste econmico(o Plano

    Real), ncora cambial, cmbio flutuante, metas de inflaoe supervit primrio,

    transformados em medidas prticas durante as gestes presidenciais tucanas epreservadas, com certas atenuaes, durante os mandatos petistas, possuem um

    carter virtuoso e benfico para toda a sociedade. Por outro, a Economia

    Poltica nos indica que as consequncias das mesmas representaram uma

    determinada configurao no plano das relaes entre as classes (e suas fraes)

    com consequncias socioeconmicas substantivamente desiguais, no apenas

    para as classes dominantes, como tambm para as classes dominadas. Assim,

    afirmamos que no h uma teoria econmica neutra.

    Enfim, sem esgotar o tema, acredita-se ter comprovado que, no que tange

    gesto da dvida pblica, os mandatos presidenciais inscritos no perodo entre1995 e 2014 atuaram, no geral, de maneira uniforme. Isto significa que este

    aspecto da poltica econmica refora a tese da predominncia da frao

    financeira da classe burguesa, ou do setor financeiro, no espectro do bloco do

    poder em vigncia no Brasil.

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    29/32

    Gesto da dvida pblica e bloco no poder 169

    LucasMilanezdeLimaAlmeida;EricGilDa

    ntasePauloAntniodeFreitasBalanco

    Referncias Bibliogrficas

    ADOLPH, C. Bankers, Bureaucrates, and Central Bank Politics: The myth ofneutrality. New York: Cambridge Press, 2013.

    ALMEIDA, L. M. L. Polticas pblicas e LOA de 2014: comparando os gastosligados gesto da dvida pblica federal com os das reas sociais.Observatorio de la Economa Latinoamericana, v. 12, p. 1-24, dez. 2015.

    ALTMAN, E. I.; MARCO, G.; VARETTO, F. Corporate distress diagnosis:Comparisons using linear discriminant analysis and neural networks (theItalian experience).Journal of Banking & Finance, v. 18, n. 3, p. 505-529,1994.

    BIN, D. Dvida Pblica, Classes e Democracia no Brasil Ps-Real. 2010. Tese

    (Tese em Sociologia) Universidade de Braslia, Braslia, 2010.BISHOP, C. M. Pattern recognition and machine learning. New York: Springer,

    2006.

    BOITO JR., A., BERRINGER, T. Brasil: classes sociais, neodesenvolvimentismo epoltica externa nos governos Lula e Dilma.Revista de Sociologia e Poltica,v. 21, n. 47, p. 31-38, 2013.

    BOITOJR., A. Governos Lula: a nova burguesia nacional no poder. In: BOITOJr.,A; GALVO, A. (orgs.). Poltica e classes sociais no Brasil dos anos 2000.Alameda Casa Editorial: So Paulo, 2012.

    CARCANHOLO, M. D. Insero externa e vulnerabilidade da economia brasileirano governo Lula. In: Os anos Lula: contribuies para um balano crtico2003-2010. Rio de Janeiro: Garamond, 2010.

    CODATO, A. N.; CAVALIERI, M.; PERISSINOTTO, R.; DANTAS, E. G. MainstreamEconmico e Poder: Uma Anlise do Perfil dos Diretores do Banco Centraldo Brasil nos Governos do PT e do PSDB. Nova Economia, No prelo, 2016.

    CODATO, A. N.; PERISSINOTTO, R. M. O estado como instituio. Uma leituradas obras histricas de Marx. Crtica Marxista, n. 13, p. 9-28, 2001.

    DUDA, R. O.; HART, P. E.; STORK, D. G. Pattern classification. 2 ed. New York:

    Wiley-Interscience, 2001.ENAS, G. G.; CHOI, S. C. Choice of the smoothing parameter and efficiency of k-

    nearest neighbor classification. Computers and Mathematics withApplications, n. 12A, p. 235-244, 1986.

    FERREIRA, A. C. Os donos da dvida: um enfoque sociopoltico da dvida pblicainterna durante o Governo FHC. 2005. Dissertao (Mestrado em SociologiaPoltica) Universidade Federal de Santa Catarina, Florianpolis, 2005.

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    30/32

    Revista Outubro, n. 25, maro 2016170

    FILGUEIRAS, L. O Neoliberalismo no Brasil: estrutura, dinmica e ajuste domodelo econmico. In: Basualdo, E. M.; Arceo, E. (orgs.). Neoliberalismo ysectores dominantes: tendencias globales y experiencias nacionales. 1ed.

    Buenos Aires: CLACSO, 2006.FILGUEIRAS, L.; PINHEIRO, B.; PHILIGRET, C. M. B.; BALANCO, P. Modelo liberal-

    perifrico e bloco de poder: poltica e dinmica macroeconmica nosGovernos Lula. In: Os anos Lula: contribuies para um balano crtico2003-2010. Rio de Janeiro: Garamond, 2010.

    GUILLN, A. Claves para el anlisis del capitalismo contemporneo. Revista OlaFinanciera, v. 4, n. 8, p. 46-54, jan.-abr. 2011.

    HASTIE, T.; TIBSHIRANI, R.; FRIEDMAN, J. The Elements of Statistical Learning:Data Mining, Inference, and Prediction. 2 ed. New York: Springer Series inStatistics, 2009.

    HILFERDING, R. O capital financeiro. So Paulo: Nova Cultural (OsEconomistas), 1985.

    LEI, Z.; LIAO, S.; JAIN, A. K.; LI, S. Z. Coupled discriminant analysis forheterogeneous face recognition. Information Forensics and Security, IEEETransactions on, v. 7, n. 6, p. 1707-1716, 2012.

    LNIN, V. I. Uma grande iniciativa. In: Obras Escolhidas. So Paulo: Alfamega, 1980, v. 3

    _______. O Imperialismo, Fase Superior do Capitalismo. In: Obras Escolhidasem seis tomos. Lisboa: Avante; Progresso, 1984, v. 2.

    LIANG, L.; WU, D. An application of pattern recognition on scoring Chinesecorporations financial conditions based on backpropagation neuralnetwork. Computers & Operations Research, v. 32, n. 5, p. 1115-1129, 2005.

    LIN, F. Y.; MCCLEAN, S. A data mining approach to the prediction of corporatefailure. Knowledge-based systems, v. 14, n. 3, p. 189-195, 2001.

    LOUREIRO, M. R. Os economistas no governo. Rio de Janeiro: Editora FundaoGetlio Vargas, 1997.

    NAKANO, Y. O regime monetrio, a dvida pblica e a alta taxa de juros. Revista

    Conjuntura Econmica, v. 59, n. 11, p. 10-12, 2005.MILANEZ, K. D. T. M.; Pontes, M. J. C. Classification of edible vegetable oil

    using digital image and pattern recognition techniques.MicrochemicalJournal, v. 113, p. 10-16, 2014.

    MINELLA, A. Banqueiros: Organizao e poder poltico no Brasil. Rio de Janeiro;So Paulo: Anpocs; Espao e Tempo, 1988.

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    31/32

    Gesto da dvida pblica e bloco no poder 171

    LucasMilanezdeLimaAlmeida;EricGilDa

    ntasePauloAntniodeFreitasBalanco

    _______. Representao de classe do empresariado financeiro na AmricaLatina: A rede transassociativa no ano de 2006. Revista de Sociologia ePoltica, Curitiba, n. 29, p. 31-56, jun. 2007.

    _______. Grupos financeiros e organizao da burguesia financeira no Brasil.Ensaios FEE, Porto Alegre, v. 17, n. 2, p. 80-94, 1996.

    NOVELLI, J. M. N. Burocracia, dirigentes estatais e ideias econmicas: um estudode caso sobre o Banco Central do Brasil (1965 1998). 1999. Dissertao(Mestrado em Cincia Poltica) Universidade Estadual de Campinas,Campinas, 1999.

    OLIVIERI, C. Poltica, burocracia e redes sociais: as nomeaes para o altoescalo do Banco Central do Brasil. Revista de Sociologia e Poltica, n. 29, p.147168, nov. 2007.

    PINTO, E. C.; BALANCO, P. Estado, bloco no poder e acumulao capitalista: umaabordagem terica. Revista de Economia Poltica, v. 34, n. 1, 2014, p. 39-60,2014.

    POULANTZAS, N. As classes sociais. Estudos CEBRAP, n. 3, p. 6-39, s./d.

    _______. O Estado, o poder, o socialismo. Rio de Janeiro/RJ: Graal, 1980.

    _______. Poder poltico e classes sociais. So Paulo: Martins Fontes, 1977.

    OLIVEIRA, N. Neocorporativismo e poltica pblica: um estudo das novasconfiguraes assumidas pelo Estado. So Paulo: Edies Loyola/CEAS,2004.

    RENCHER, A. C. Multivariate Statistical Inference and Applications. New York:Wiley, 1998

    _______.Methods of Multivariate Analysis. 2 ed. New York: Wiley, 2002.

    ROCHA, K. L. Estrutura institucional e eventos recentes na administrao dadvida pblica federal. In: SILVA A.; CARVALHO L.; MEDEIROS, O(Orgs.). Dvida pblica: a experincia brasileira. Braslia: STN/BancoMundial, 2009.

    SABADINI, M. S. Sobre o conceito de capital financeiro (I). Anais do XVIIEncontro Nacional de Economia Poltica. Rio de Janeiro: SEP, 2012.

    SILVA, A. C.; CARVALHO, L. O.; MEDEIROS, O. L. Dvida pblica: a experinciabrasileira. Braslia: STN/Banco Mundial, 2009.

    STN (Secretaria do Tesouro Nacional). Ttulos da Dvida Interna. 2015.Disponvel em: , acesso em: 05 set. 2015.

  • 7/25/2019 LIMA, Lucas Milanez de. Gesto Da Dvida Pblica e Bloco No Poder Uma Anlise Comparativa Entre Os Governos

    32/32

    Revista Outubro, n. 25, maro 2016172

    TEIXEIRA, R. A.; PINTO, E. C. A economia poltica dos governos FHC, Lula eDilma: dominncia financeira, bloco no poder e desenvolvimentoeconmico. Economia e Sociedade, v. 21, p. 909-941, 2012.

    WU, D.; LIANG, L.; YANG, Z. Analyzing the financial distress of Chinese publiccompanies using probabilistic neural networks and multivariatediscriminate analysis. Socio-Economic Planning Sciences, v. 42, n. 3, p. 206-220, 2008.