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23.12.2010 LINHAS DE ORIENTAÇÃO sobre a INSTRUÇÃO DE PROCESSOS RELATIVOS À APLICAÇÃO DOS ARTIGOS 4.º, 6.º E 7.º DA LEI N.º 18/2003, DE 11 DE JUNHO

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23.12.2010

LINHAS DE ORIENTAÇÃO

sobre a

INSTRUÇÃO DE PROCESSOS RELATIVOS À APLICAÇÃO DOS ARTIGOS 4.º, 6.º E 7.º DA

LEI N.º 18/2003, DE 11 DE JUNHO

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LINHAS DE ORIENTAÇÃO sobre a

INSTRUÇÃO DE PROCESSOSRELATIVOS À APLICAÇÃO DOS ARTIGOS 4.º, 6.º E 7.º DA LEI N.º 18/2003, DE 11 DE JUNHO

Conteúdo I OBJECTO E FINALIDADE DAS LINHAS DE ORIENTAÇÃO 1 II A FASE DE INQUÉRITO 2 II.1 Notícia da infracção 2 II.2 Apreciação preliminar 3 II.3 Abertura de inquérito 4 II.3.1 Pedidos de elementos 4 II.3.2 Inquirições e interrogatório de arguido 5 II.3.3 Buscas 6 II.3.4 Comentários a denúncias e a outros elementos documentais 7 II.4 Medidas cautelares 8 II.5 Conclusão do inquérito 8 III A FASE DE INSTRUÇÃO 9 III.1 Nota de ilicitude 10 III.1.1 Conteúdo da nota de ilicitude 10 III.1.2 Diligências complementares de prova 10 III.1.3 Audição por escrito 11 III.1.4 Audição oral 11 III.1.5 Nota de ilicitude complementar e nota de ilicitude substitutiva 12 III.1.6 Medidas cautelares 12 III.1.7 Conclusão da instrução 12 IV DECISÃO CONDENATÓRIA 14 V APRESENTAÇÃO DE COMPROMISSOS 15 V.1 Direito da União Europeia 15 V.2 Direito nacional 16 V.3 Procedimento comum 17 VI PUBLICIDADE E ACESSO AO PROCESSO 18 VI.1 Segredo de justiça 18 VI.2 Segredo de negócio 19 VI.3 Sigilo profissional 20 VII PUBLICAÇÃO DE DECISÕES 22

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LINHAS DE ORIENTAÇÃO sobre a

INSTRUÇÃO DE PROCESSOS RELATIVOS À APLICAÇÃO DOS ARTIGOS 4.º, 6.º E 7.º DA LEI N.º 18/2003, DE 11 DE JUNHO

I OBJECTO E FINALIDADE DAS LINHAS DE ORIENTAÇÃO

1. As presentes Linhas de Orientação têm por objecto a exposição sintética da prática decisória desenvolvida, até à data, pela Autoridade da Concorrência (doravante, Autoridade), na instrução dos processos relativos à aplicação dos artigos 4.º, 6.º e 7.º da Lei n.º 18/2003, de 11 de Junho (doravante, Lei da Concorrência).

2. A finalidade principal das Linhas de Orientação é a divulgação, aos interessados, do modus operandi da Autoridade na instrução dos referidos processos, com vista a assegurar maior transparência e previsibilidade quanto aos mesmos e, consequentemente, aumentar a eficiência na análise e acompanhamento das práticas restritivas da concorrência.

3. As Linhas de Orientação são baseadas na experiência adquirida pela Autoridade até à data e referem-se à generalidade dos processos respeitantes à aplicação dos artigos 4.º, 6.º e 7.º da Lei da Concorrência. No entanto, poderão existir casos pontuais cujas particularidades justifiquem procedimentos distintos dos definidos nas presentes Linhas de Orientação.

4. Os processos relativos à aplicação do artigo 4.º da Lei da Concorrência a cartéis, por exemplo, poderão ser também disciplinados pelas regras estabelecidas na Lei n.º 39/2006, de 25 de Agosto, e no Regulamento n.º 214/2006, de 22 de Novembro, da Autoridade.

5. Na elaboração das presentes Linhas de Orientação, a Autoridade teve em conta o documento relativo às boas práticas a adoptar nos processos relativos aos artigos 101.º e 102.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE) [Best Pratices on the conduct of proceedings concerning Articles 101 and 102 TFEU], elaborado pela DG Competition da Comissão Europeia1.

6. As Linhas de Orientação encontram-se estruturadas da seguinte forma: a Secção I refere-se ao objecto e finalidade das Linhas de Orientação, a Secção II diz respeito ao procedimento adoptado pela Autoridade na fase de inquérito dos processos, a Secção III é relativa à fase de instrução destes, a Secção IV concerne à adopção de decisões condenatórias, a Secção V respeita à apresentação de compromissos junto da Autoridade, a Secção VI refere-se à publicidade e acesso ao processo e, finalmente, a Secção VII é relativa à publicação das decisões da Autoridade.

7. As Linhas de Orientação pretendem facilitar a compreensão dos procedimentos seguidos pela Autoridade, visando uma melhor cooperação com as partes envolvidas em processos relativos à violação dos artigos 4.º, 6.º e 7.º da Lei da Concorrência. No entanto, as presentes Linhas de Orientação não vinculam a Autoridade e não criam qualquer direito,

1 O texto final deste documento encontra-se ainda em fase de adopção, sendo que o prazo para apresentar comentários sobre o mesmo terminou no passado dia 3 de Março de 2010.

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nem modificam direitos ou obrigações que decorram da Lei da Concorrência, dos Estatutos da Autoridade2, ou de quaisquer outros dispositivos legais aplicáveis.

II A FASE DE INQUÉRITO

II.1 Notícia da infracção

8. A Autoridade pode tomar conhecimento de alegadas infracções às regras da concorrência por duas vias: oficiosamente ou por denúncia3.

9. A Autoridade pode ter conhecimento directo de presumíveis infracções no desenvolvimento da sua actividade de acompanhamento de mercados ou através de indícios contidos em notícias divulgadas pela comunicação social. A Autoridade pode ainda tomar conhecimento da existência de restrições à concorrência no contexto da troca de informações no âmbito da Rede Europeia de Concorrência [European Competition Network ou ECN]4. Da mesma forma, a apresentação de um pedido de dispensa ou de atenuação de coima (vulgo, clemência) por parte de uma ou mais empresas que tenham participado numa prática de cartel punível pelo artigo 4.º da Lei da Concorrência (e/ou, se aplicável, pelo artigo 101.º do TFUE), ou de um ou mais titulares de órgãos de administração daquelas, dá origem a um processo se contiver notícia de infracção. O requerimento vale como denúncia da infracção.

10. Os particulares e as empresas podem apresentar, junto da Autoridade, denúncias relativamente a eventuais práticas restritivas da concorrência. A apresentação de tais denúncias terá de ser feita por escrito, não sendo necessário o cumprimento de qualquer outra formalidade; ou seja, a denúncia poderá ser feita por qualquer particular ou qualquer empresa, através do envio de uma carta ou de uma mensagem de correio electrónico dirigidos à Autoridade. As denúncias podem, ainda, ser anónimas, sendo que, nesse caso, apenas podem determinar a abertura de inquérito se delas se retirarem indícios da prática de uma infracção.

11. No intuito de garantir uma melhor avaliação do enquadramento das práticas objecto de denúncia no âmbito das atribuições da Autoridade e assim melhorar o seu desempenho na análise e acompanhamento das práticas anti-concorrenciais, a Autoridade incentiva a

2 Anexos ao Decreto-Lei n.º 10/2003, de 18 de Janeiro.

3 De acordo com o n.º 1 do artigo 24.º da Lei da Concorrência, “[s]empre que a Autoridade tome

conhecimento, por qualquer via, de eventuais práticas proibidas pelos artigos 4.º, 6.º e 7.º, procede à abertura de inquérito, em cujo âmbito promoverá as diligências de investigação necessárias à identificação dessas práticas e dos respectivos agentes”. No que respeita ao Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas (RGCO), cuja aplicação subsidiária resulta do n.º 1 do artigo 22.º da Lei da Concorrência, o n.º 1 do artigo 54.º estatui que “o processo iniciar-se-á oficiosamente, mediante participação das autoridades policiais ou fiscalizadoras ou ainda mediante denúncia particular”, limitando-se a acrescentar, no n.º 2 do mesmo preceito, que “a autoridade administrativa procederá à sua investigação e instrução, finda a qual arquivará o processo ou aplicará uma coima”. 4 V. artigos 11.º e 12.º do Regulamento (CE) n.º 1/2003 do Conselho, JO L 1 de 4 de Janeiro de 2003, p. 1 e Secção 2.2. da Comunicação da Comissão sobre a cooperação no âmbito da rede de autoridades de concorrência, JO C 101 de 27 de Abril de 2003, p. 43.

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utilização do formulário de queixa que se encontra disponível no seu sítio oficial da Internet5.

12. Finalmente, resulta para as entidades públicas um dever geral de denúncia à Autoridade de todos os factos susceptíveis de serem qualificados como práticas restritivas da concorrência de que tomem conhecimento6.

II.2 Apreciação preliminar

13. Após ter tomado conhecimento de alegadas infracções às regras de concorrência, a Autoridade procede à sua apreciação preliminar.

14. O objectivo da apreciação preliminar é a obtenção de elementos adicionais que permitam, conjuntamente com os indícios existentes, fundamentar adequadamente uma decisão de abertura de inquérito.

15. No decurso da apreciação preliminar, a Autoridade pode proceder à inquirição das empresas ou associações de empresas envolvidas e/ou de outras empresas ou associações de empresas e quaisquer outras pessoas cujas declarações sejam consideradas pertinentes, bem como ao envio às mesmas de pedidos de elementos7.

16. Após a realização da apreciação preliminar, o serviço instrutor da Autoridade – Departamento de Práticas Restritivas (DPR) – elabora uma proposta de procedimento a adoptar, a qual é submetida à aprovação do Conselho da Autoridade.

17. A proposta de procedimento poderá resultar (i) no arquivamento do caso, (quando a Autoridade teve conhecimento oficioso da alegada infracção) ou no arquivamento da denúncia (quando o caso foi originado por uma denúncia8), por falta de indícios para fundamentar uma decisão de abertura de inquérito ou porque a matéria não é da competência da Autoridade, ou (ii) numa proposta de abertura de inquérito, no caso de existirem indícios que possam fundamentar uma decisão de abertura de inquérito.

18. Nos casos em que a matéria denunciada evidencie factos da competência de outra entidade pública, nacional ou comunitária, a Autoridade procederá, em princípio, à remessa da denúncia a tal entidade, dando conhecimento dessa diligência ao denunciante.

19. Sempre que a apreciação preliminar tiver sido originada por uma denúncia, o denunciante será informado da decisão tomada pelo Conselho da Autoridade na sequência da proposta de procedimento do serviço instrutor. Antes de proceder ao arquivamento da denúncia, será dado conhecimento ao denunciante da intenção da Autoridade de proceder ao arquivamento da mesma, o que acontece num prazo (indicativo) de cerca de 3 meses da recepção da denúncia, caso não tenham sido recolhidos indícios que fundamentem uma decisão de abertura de inquérito. Este prazo não vincula a Autoridade e o cumprimento do mesmo dependerá das circunstâncias do caso individual e, em especial, da eventual necessidade de solicitar informações complementares ao denunciante e/ou a terceiros.

5 http://www.concorrencia.pt/queixas.asp.

6 Como referido no n.º 2 do artigo 24.º da Lei da Concorrência, “*t+odos os serviços da administração

directa, indirecta ou autónoma do Estado, bem como as autoridades administrativas independentes, têm o dever de participar à Autoridade os factos de que tomem conhecimento susceptíveis de serem qualificados como práticas restritivas da concorrência”. 7 V. artigo 17.º da Lei da Concorrência. A Autoridade goza destas faculdades no exercício dos seus poderes

sancionatórios e de supervisão. 8

Os documentos facultados à Autoridade juntamente com a denúncia não são, normalmente, devolvidos ao denunciante.

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II.3 Abertura de inquérito

20. O inquérito tem por objectivo a realização, pela Autoridade, de diligências necessárias à investigação da existência de práticas proibidas pelos artigos 4.º, 6.º e 7.º da Lei da Concorrência, a determinação dos respectivos agentes e da responsabilidade destes, bem como a descoberta e recolha de prova, com vista à decisão final. Neste âmbito, a Autoridade dispõe dos poderes de investigação atribuídos pela Lei da Concorrência9.

21. A Autoridade, gozando dos mesmos direitos e faculdades e submetida aos mesmos deveres dos órgãos de polícia criminal, pode, no âmbito dos seus poderes sancionatórios10, tomar todas as medidas necessárias para impedir o desaparecimento das provas11.

II.3.1 Pedidos de elementos

22. A Autoridade pode solicitar às empresas ou associações de empresas envolvidas documentos e outros elementos de informação que considere convenientes ou necessários para o esclarecimento dos factos investigados12. Consideram-se convenientes ou necessários todos os elementos que permitam apurar, por parte da Autoridade, a existência ou inexistência de uma alegada infracção, os seus agentes e a respectiva responsabilidade, bem como outros elementos relevantes para a boa decisão do processo.

23. A Autoridade pode, também, solicitar documentos e outros elementos de informação que considere relevantes para a investigação a outras empresas ou associações de empresas e a quaisquer outras pessoas13.

24. O objecto do pedido de elementos e o suporte em que tais elementos devem ser fornecidos são definidos pela Autoridade. Em alguns casos, no interesse do apuramento dos factos investigados através da apresentação oportuna e completa da informação solicitada, a Autoridade poderá considerar útil discutir o objecto do pedido e o suporte técnico dos elementos a fornecer com o destinatário do pedido de elementos.

25. Do pedido da Autoridade consta necessariamente: a) a base jurídica e o objectivo do pedido; b) o prazo para a comunicação das informações ou o fornecimento dos documentos; c) as sanções a aplicar na hipótese de incumprimento do requerido14; d) a indicação de que as empresas deverão identificar, de maneira fundamentada, as informações que consideram confidenciais15, juntando, nesse caso, uma cópia não

9 V. artigo 17.º da Lei da Concorrência.

10 V. n.º 1 do artigo 17.º da Lei da Concorrência.

11 V. n.º 1 do artigo 48.º do RGCO.

12 V. alínea a) do artigo 17.º da Lei da Concorrência

13 V. alínea b) do artigo 17.º da Lei da Concorrência.

14 Resulta do disposto da alínea a) do n.º 1 do artigo 43.º da Lei da Concorrência que “constitui contra-

ordenação punível com coima que não pode exceder, para cada uma das empresas, 1% do volume de negócios do ano anterior *…+ a não prestação ou a prestação de informações falsas, inexactas ou incompletas em resposta a pedido da Autoridade, no uso dos poderes sancionatórios ou de supervisão”. 15

Caso a empresa não proceda à identificação dos elementos de informação que considere confidenciais, presumir-se-á a não confidencialidade dos mesmos, o que resultará na sua acessibilidade por parte das outras partes do processo. Quando o pedido de confidencialidade diz respeito a vários elementos de informação, a sua fundamentação deverá referir-se a cada um destes elementos. Este procedimento não

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confidencial dos documentos que contenham tais informações16. A base jurídica do pedido de elementos indica qual a qualidade em que o destinatário é solicitado à prestação de informações ou de elementos. O pedido refere a existência de procedimento sancionatório por práticas restritivas da concorrência.

26. A indicação, no pedido, das sanções aplicáveis no caso de incumprimento dos deveres de colaboração corresponde a uma exigência legal, não consubstanciando qualquer juízo prévio da Autoridade sobre o cumprimento dos mesmos.

27. A Autoridade respeita o direito de defesa reconhecido pela Constituição e pela lei às empresas, não podendo impor-lhes que forneçam respostas pelas quais sejam levadas a admitir a existência da infracção. Todavia, o respeito pelos direitos de defesa não prejudica o dever dos destinatários do pedido de prestar todas as informações relativas a factos de que tenham conhecimento e os documentos a eles respeitantes que estejam na sua posse, mesmo que estes últimos possam servir, em relação a eles ou a outras empresas, para comprovar a existência de uma prática restritiva da concorrência17.

28. O prazo geral para a prestação das informações e documentos solicitados pela Autoridade é de 30 dias18, salvo se, fundamentadamente, for por ela fixado um prazo diferente19. Caso o destinatário do pedido de elementos não consiga facultar à Autoridade a informação requerida no prazo previsto, poderá solicitar, por escrito, uma prorrogação do mesmo. O requerimento deverá ser apresentado antes do termo do prazo inicial e será devidamente fundamentado.

II.3.2 Inquirições e interrogatório de arguido

II.3.2.1 Inquirições de pessoas, empresas e associações de empresas não envolvidas

29. Os representantes legais de empresas ou associações de empresa não envolvidas e quaisquer outras pessoas cujas declarações sejam consideradas pertinentes podem ser inquiridos pela Autoridade, podendo fazer-se acompanhar de advogado20

30. As inquirições podem ter lugar nas instalações da Autoridade ou nas da empresa ou associação de empresas em causa; caso as referidas diligências se realizem no exterior da Autoridade, os funcionários da mesma serão portadores de credencial, da qual constará a finalidade da diligência21.

prejudica o dever da Autoridade de assegurar o segredo de negócio relativo a outras empresas, quanto a elementos que, em resposta a tal pedido, pudessem ser objecto de divulgação. 16

V. n.º 1 do artigo 18.º da Lei da Concorrência. 17

Relativamente aos pedidos de elementos, considera-se que a imposição de uma sanção para o desrespeito do dever de prestar as informações e/ou documentos solicitados não constitui uma violação do direito de defesa do destinatário do pedido, uma vez que o disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 61.º do Código do Processo Penal (CPP) não se aplica aos processos contra-ordenacionais no âmbito da Lei de Concorrência. Neste sentido, v. Sentença do Tribunal de Comércio de Lisboa (3.º Juízo), de 28 de Julho de 2006, Agepor - Associação dos Agentes de Navegação de Portugal, Processo n.º 261/06.1TYLSB confirmada pelo subsequente Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 15 de Março de 2007, Agepor - Associação dos Agentes de Navegação de Portugal, Processo n.º 172/07-9. 18

Trata-se de dias úteis, que são contados a partir da data de assinatura, por parte do destinatário, ou de alguém em sua representação, do aviso de recepção do pedido da Autoridade. 19 V. n.º 2 do artigo 18.º da Lei da Concorrência. 20

Cfr. as alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 17.º da Lei da Concorrência. 21 Cfr. a alínea a) do n.º 3 do artigo 17.º da Lei da Concorrência.

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31. As declarações prestadas pelos inquiridos são registadas em auto, ao qual são anexos os documentos eventualmente fornecidos durante a inquirição; o auto é assinado pelos inquiridos e pelos funcionários da Autoridade presentes, sendo entregue uma cópia do mesmo, mencionando, se for o caso, a sujeição a segredo de justiça; a recusa de assinatura pelos inquiridos é confirmada por termo.

32. No decurso da inquirição, a Autoridade pode solicitar que lhe sejam facultados documentos ou outras informações relevantes; tais pedidos são formulados nos termos do artigo 17.º da Lei da Concorrência.

II.3.2.2 Interrogatório de arguido

33. A Autoridade pode proceder ao interrogatório dos representantes legais das empresas ou associações de empresas envolvidas, que serão, para o efeito, constituídas arguidas.

34. A constituição de arguido opera-se através de comunicação ao visado, na qual são indicados os respectivos direitos e deveres processuais, por referência ao artigo 61.º do Código de Processo Penal.

35. Relativamente aos representantes legais das empresas envolvidas, a Autoridade acautela os respectivos direitos de defesa, quando os mesmos possam ser punidos nos temos do disposto no n.º 3 do artigo 47.º da Lei da Concorrência.

II.3.3 Buscas

36. No exercício dos seus poderes sancionatórios e de supervisão, e com vista à recolha de elementos que permitam provar os factos em causa, a Autoridade pode proceder, nas instalações das empresas ou das associações de empresas envolvidas, a diligências de busca, exame, recolha e apreensão de cópias ou extractos da escrita e demais documentação, quer se encontre ou não em lugar reservado ou não livremente acessível ao público22.

37. Antes de iniciar as referidas diligências, os funcionários da Autoridade entregam à empresa visada cópia do despacho da autoridade judiciária que autoriza a sua realização, do qual constam o objecto da investigação e a descrição dos ilícitos em causa23. Os funcionários que realizem a diligência serão portadores de credencial, emitida pelo Conselho da Autoridade, da qual constará a finalidade da diligência, sendo esta credencial também apresentada antes do início da mesma.

38. Os documentos apreendidos em acto de busca, que apenas indirectamente se relacionem ou contribuam para o esclarecimento do objecto das mesmas, tal como fixado no mandado, estão cobertos pelo mandado ao abrigo do qual a apreensão é realizada, sem

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V. alínea c) do n.º 1 do artigo 17.º da Lei da Concorrência. De acordo com a jurisprudência nacional, não é necessária a prévia constituição formal como arguida da empresa objecto de diligência de buscas por parte da Autoridade (neste sentido v., entre outros, Sentença do Tribunal de Comércio de Lisboa (2.º Juízo), de 2 de Maio de 2007, Vatel – Companhia de Produtos Alimentares e outros, Processo n.º 965/06.9TYLS). 23 V. n.º 2 do artigo 17.º da Lei da Concorrência. O despacho da autoridade judiciária tem que ser solicitado previamente pela Autoridade, em requerimento devidamente fundamentado, devendo a decisão ser proferida no prazo de 48 horas. A autoridade judiciária competente relativamente às diligências efectuadas pela Autoridade é, por regra, o Ministério Público excepto quando se trate de matérias para as quais é necessária uma autorização do juiz. Salienta-se que as buscas realizadas nas sedes de pessoas colectivas não são buscas domiciliárias, pelo que a sua realização por parte da Autoridade apenas depende de autorização do Ministério Público.

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prejuízo de, nos autos em causa, os ali visados poderem, se assim o entenderem, prestar os esclarecimentos que queiram quanto ao seu concreto significado, no legítimo exercício dos seus direitos de defesa24.

39. Relativamente à apreensão de correspondência, importa realçar que a apreensão de correspondência aberta é admissível no âmbito do processo contra-ordenacional, sendo o despacho da autoridade judiciária suficiente para a sua realização25. Depois de aberta, a correspondência passa a ser um mero documento escrito, que pode, sem qualquer reserva, ser apreendido no decurso de uma busca26.

40. Quanto ao correio electrónico, a mensagem recebida pelo destinatário integra o conceito de correspondência e a sua apreensão rege-se pelas respectivas regras. Assim, as comunicações electrónicas que se encontrem já abertas e arquivadas, no sistema informático ou fora dele, são consideradas como correspondência aberta, sendo suficiente para a sua apreensão o despacho da autoridade judiciária.

41. Durante as buscas, e na medida estritamente necessária à realização das mesmas, a Autoridade pode proceder à selagem dos locais das instalações das empresas envolvidas onde se encontrem ou seja susceptível de se encontrarem elementos de escrita ou demais documentação relevantes27.

42. A violação dos selos por parte da empresa constitui um ilícito contra-ordenacional, punível com coima até 1% do volume de negócios da empresa em causa28, sem prejuízo das sanções penais eventualmente aplicáveis.

Se, no decurso de diligências de buscas e apreensões realizadas pela Autoridade, forem praticados actos que, no entendimento das entidades visadas, configurem nulidades e/ou irregularidades, tais alegados vícios podem ser arguidos em requerimento apresentado junto da Autoridade. A decisão da Autoridade que indeferir a arguição do vício é susceptível de impugnação jurisdicional, perante o Tribunal de Comércio de Lisboa29.

II.3.4 Comentários a denúncias e a outros elementos documentais

43. Sempre que tal seja considerado útil para o esclarecimento dos factos, a Autoridade pode dar às empresas envolvidas a oportunidade de analisar e comentar, por escrito ou em auto, uma versão não confidencial da denúncia ou de outros documentos relevantes, entregues pelo denunciante ou por terceiros, ou encontrados no âmbito de uma busca.

24 Neste sentido v. Sentença do Tribunal de Comércio de Lisboa (3.º Juízo), de 14 de Maio de 2007, Área Farmacêutica, Lda., Processo n.º 97/06.0TYLSB. 25

Sentença do Tribunal do Comércio de Lisboa (2º Juízo), de 02/05/2007, Vatel – Companhia de Produtos Alimentares e outros, Processo n.º 965/06.9TYLS, Sentença do Tribunal do Comércio de Lisboa (3º Juízo,) de 14/5/2007, Área Farmacêutica, Lda., Processo n.º 97/06.0TYLSB e Sentença do Tribunal do Comércio de Lisboa (2º Juízo), de 19/09/07, Fábrica de Papel do Ave, S.A., Processo n.º 598/07.2TYLSB. 26

Neste sentido v. Acórdão da Relação de Coimbra de 29 de Março de 2006 e Acórdão da Relação de Lisboa de 18 de Maio de 2006, ambos referidos na Sentença do Tribunal do Comércio de Lisboa (2.º Juízo), de 2 de Maio de 2007, Vatel – Companhia de Produtos Alimentares e outros, Processo n.º 965/06.9TYLS. Deste modo, apenas a correspondência fechada está abrangida pela proibição constitucional, podendo a sua apreensão ocorrer apenas nos casos previstos no artigo 179.º do CPP e sendo sujeita às respectivas condições e formalidades. 27 V. alínea d) do n.º 1 do artigo 17.º da Lei da Concorrência. 28

V. alínea c) do n.º 3 do artigo 43.º da Lei da Concorrência. 29 V. n.º 2 do artigo 50.º da Lei da Concorrência.

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II.4 Medidas cautelares

44. A Autoridade pode adoptar medidas cautelares quando a investigação em curso indicie que a prática objecto do processo é susceptível de causar um prejuízo (i) iminente, (ii) grave e (iii) irreparável ou de difícil reparação para a concorrência ou para os interesses de terceiros30. Os requisitos acima referidos são de verificação cumulativa.

45. As medidas cautelares podem ser adoptadas, oficiosamente ou a requerimento de qualquer interessado, pela Autoridade, em qualquer momento do inquérito31, podendo ter por objecto ordenar preventivamente a imediata suspensão da prática em causa ou quaisquer outras medidas provisórias necessárias à imediata reposição da concorrência ou indispensáveis ao efeito útil da decisão a proferir no termo do processo32, 33.

46. Uma vez adoptadas, as medidas cautelares vigoram até à sua revogação pela Autoridade, embora as mesmas não possam ter, excepto em caso de prorrogação devidamente fundamentada, uma vigência superior a 90 dias34. A decisão de prorrogação é notificada aos interessados.

47. A adopção de medidas cautelares é precedida da audição dos interessados, ou seja, do(s) destinatário(s) das mesmas e, caso aplicável, dos terceiros relativamente aos quais se verifique uma situação de impossibilidade ou de difícil reparação dos seus interesses, caso as medidas não sejam adoptadas. A audição prévia dos interessados só não terá lugar caso a urgência na adopção de medidas cautelares o justifique ou tal audição coloque em sério risco o objectivo ou a eficácia das providências35.

48. Caso esteja em causa um mercado objecto de regulação sectorial, a adopção das medidas cautelares deve ser precedida de parecer prévio da autoridade reguladora. O referido parecer deve ser emitido no prazo máximo de 5 dias úteis. Caso a urgência na adopção de medidas indispensáveis ao restabelecimento ou manutenção de uma concorrência efectiva36 não se compadeça com uma tal dilação, a Autoridade pode determinar, provisoriamente, as medidas necessárias e aguardar pelo parecer da autoridade reguladora37.

49. O desrespeito por uma decisão que decrete medidas cautelares constitui uma contra-ordenação, punível nos termos do disposto da alínea c) do n.º 1 do artigo 43.º da Lei da Concorrência. A Autoridade pode ainda decidir aplicar uma sanção pecuniária compulsória, nos termos da alínea a) do artigo 46.º da Lei da Concorrência.

II.5 Conclusão do inquérito

50. A conclusão do inquérito pode dar lugar (i) à decisão de proceder ao arquivamento do processo, se a Autoridade entender que não existem indícios suficientes de infracção, ou (ii) à decisão de dar início à instrução do processo, através de notificação dirigida às empresas

30

V. n.º 1 do artigo 27.º da Lei da Concorrência. 31

Ou da instrução (v. infra). 32

V. n.º 1 do artigo 27.º da Lei da Concorrência. 33 A determinação de medidas provisórias é objecto de processamento autónomo relativamente ao processo principal, cujo objecto é uma prática anticoncorrencial. 34

V. n.º 2 do artigo 27.º da Lei da Concorrência. 35

V. n.º 3 e o n.º 5 do artigo 27.º da Lei da Concorrência. 36 Nesta situação, atende-se apenas ao interesse da concorrência e não aos eventuais interesses de terceiros. 37 V. n.º 4 e n.º 5 do artigo 27.º da Lei da Concorrência.

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ou associações de empresas arguidas, sempre que a Autoridade conclua, com base nas investigações levadas a cabo, que existem indícios suficientes de infracção às regras de concorrência38.

51. Caso o inquérito tenha sido instaurado com base em denúncia e a Autoridade pretenda proceder ao arquivamento do processo, será dado conhecimento dessa intenção ao denunciante, bem como da sua fundamentação, sendo-lhe concedido um prazo razoável para que se pronuncie39.

52. Tendo concluído pela inexistência de indícios suficientes de infracção, a Autoridade poderá proceder ao arquivamento do processo, caso o denunciante, após notificado da intenção da Autoridade, deixe decorrer o prazo sem se pronunciar ou apenas se pronuncie depois do fim do mesmo. De igual modo, a Autoridade poderá proceder ao arquivamento do processo quando o denunciante não se oponha (por exemplo, tratando-se de uma decisão de arquivamento com compromissos, caso o denunciante considere que os compromissos apresentados restabelecem a concorrência efectiva no mercado) ou, na sua resposta à comunicação da intenção de arquivamento, não forneça elementos que permitam à Autoridade estabelecer uma conclusão diferente relativamente ao caso considerado

53. Uma decisão de arquivamento põe termo ao processo, concluindo sobre a não verificação dos pressupostos necessários para que o inquérito prossiga. Deste modo, uma decisão de arquivamento não impedirá um novo inquérito (ou a reabertura do mesmo), caso surjam factos ou elementos de prova novos, que contradigam os fundamentos da decisão anterior de arquivamento, sem que questões atinentes ao princípio ne bis in idem a tanto impeçam.

54. Da decisão de arquivamento é dado conhecimento ao denunciado40 e, caso o inquérito tenha sido promovido com base em denúncia, ao denunciante.

III A FASE DE INSTRUÇÃO

55. A fase de instrução destina-se principalmente a assegurar e dar cumprimento ao direito de audiência e de defesa do visado. Este momento processual inicia-se com a notificação da nota de ilicitude às empresas arguidas, dando-lhes a oportunidade de se pronunciarem, querendo, sobre os factos, as provas produzidas, a qualificação jurídica da contra-ordenação que lhes é imputada e a moldura sancionatória aplicável, bem como de apresentarem os seus meios de prova e/ou requererem as diligências complementares de prova que considerem oportunas41.

38

V. n.º 1 do artigo 25.º da Lei da Concorrência. Nos termos do n.º 2 do artigo 282.º do CPP, “consideram-se suficientes os indícios sempre que deles resultar uma possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, por força deles, em julgamento, uma pena ou medida de segurança”. Adaptando o sentido desta disposição ao procedimento contra-ordenacional quanto à aplicação dos artigos 4.º, 6.º e 7.º da Lei da Concorrência, tal significa que serão suficientes os indícios quando deles resulte uma possibilidade razoável de à(s) arguida(s) vir a ser aplicada, por força deles, em decisão do Conselho da Autoridade, uma coima ou outra sanção aplicável em processo contra-ordenacional. 39

V. n.º 2 do artigo 25.º da Lei da Concorrência. 40

Em particular, quando este tenha tido conhecimento de que um processo decorreu contra ele (por exemplo, através de uma notificação da Autoridade relativa a um pedido de elementos). 41

Assim se dando cumprimento às exigências da Constituição (artigo 32.º, n.º 10, da CRP) e da Lei (artigo 26.º, n.º 1, da Lei da Concorrência e artigo 50.º do RGCO).

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III.1 Nota de ilicitude

56. Nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 25.º da Lei da Concorrência, a Autoridade dá início à instrução do processo, através de notificação dirigida às empresas ou associações de empresas arguidas, sempre que conclua, com base nas investigações levadas a cabo, que existem indícios suficientes de infracção às regras de concorrência42.

III.1.1 Conteúdo da nota de ilicitude

57. Através da nota de ilicitude é dado conhecimento às arguidas de todos os elementos, de facto e de direito (incluindo elementos probatórios), relevantes para a decisão final. Estes consistem em todos os elementos que permitem preencher os requisitos do tipo contra-ordenacional imputado às arguidas, bem como a respectiva fundamentação jurídica43.

58. Na nota de ilicitude é efectuada a identificação das arguidas e a descrição dos factos que lhes são imputados, com indicação das provas obtidas, bem como a indicação das normas que se consideram infringidas e da coima e demais sanções abstractamente aplicáveis (artigos 43.º, 45.º e 46.º da Lei da Concorrência), com exposição das circunstâncias que podem influir na sua determinação concreta (artigo 44.º da Lei da Concorrência e artigo 18.º do RGCO)44.

59. A notificação da nota de ilicitude não condiciona o sentido final da decisão que porá termo ao processo, sendo que tal decisão tanto poderá ser condenatória como de arquivamento.

III.1.2 Diligências complementares de prova

60. Após a notificação da nota de ilicitude, a arguida pode, no prazo que lhe for indicado para pronúncia, requerer as diligências complementares de prova que considere convenientes, fundamentando o respectivo pedido45.

61. A Autoridade recusará a realização de diligências complementares de prova quando for manifesta a irrelevância das provas requeridas ou o seu intuito meramente dilatório46. Da decisão de indeferimento das diligências probatórias propostas constam os fundamentos da recusa47.

42 A notificação da nota de ilicitude obedece ao disposto no artigo 23.º da Lei da Concorrência, sendo geralmente efectuada através de carta registada com aviso de recepção ou por notificação pessoal. 43

Não se trata, porém, de uma comunicação integral do conteúdo do processo, até porque a arguida poderá consultar o processo se assim o entender (v. infra, VI.2). Relativamente ao acesso ao processo, importa sublinhar que a indicação do dia e da hora em que o processo pode ser consultado não consta da nota de ilicitude. Esta informação é geralmente fornecida no momento em que as partes manifestem a sua intenção de consultar o processo. 44

A nota de ilicitude não deve ser, porém, acompanhada por cópia dos documentos citados nas peças processuais (v. Despacho do Tribunal de Comércio de Lisboa (2.º Juízo), de 30 de Outubro de 2007, Lutamar - Prestação de Serviços À Navegação, Lda. et al. / Autoridade da Concorrência, Processo n.º 662/07.8TYLSB). 45

V. n.º 1 do artigo 26.º da Lei da Concorrência. 46

V. n.º 3 do artigo 26.º da Lei da Concorrência. 47 A decisão de indeferimento das diligências probatórias propostas pela arguida é passível de recurso jurisdicional, nos termos previstos no n.º 2 do artigo 50.º da Lei da Concorrência (n.º 3, na redacção da Lei n.º 52/2008, de 28 de Agosto) e no artigo 55.º do RGCO.

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III.1.3 Audição por escrito

62. De acordo com o n.º 1.º do artigo 26.º da Lei da Concorrência, na notificação da nota de ilicitude, a Autoridade fixa à arguida um prazo razoável para que se pronuncie por escrito sobre as imputações que lhe são feitas e sobre as demais questões que possam interessar à decisão do processo, bem como sobre as provas produzidas.

63. O prazo para apresentação da resposta escrita à nota de ilicitude é fixado atendendo à complexidade e extensão do processo, de modo a assegurar a efectividade do direito de audição e de defesa do arguido48. Geralmente, este prazo é de 30 dias úteis, podendo fixar-se um prazo inferior quando a urgência do caso o justifique49.

64. A arguida poderá requerer, por escrito, à Autoridade uma prorrogação do prazo. O referido requerimento deverá ser apresentado antes do fim do prazo inicial e deverá ser fundamentado.

III.1.4 Audição oral

65. As empresas ou associações de empresas arguidas podem, mediante requerimento apresentado à Autoridade, no prazo de cinco dias contados a partir da notificação da nota de ilicitude, solicitar uma audição oral em complemento ou substituição da audição escrita50.

66. Quando tempestivamente solicitada, a Autoridade fixa a data para a realização da audição oral, a qual terá lugar após o termo do prazo inicialmente fixado para a audição por escrito51.

67. A audição oral permite o exercício do direito de defesa por parte das empresas que a solicitaram, oferecendo-lhes a oportunidade de apresentarem oralmente os seus argumentos. Através da audição oral também é dada às empresas arguidas a possibilidade de aduzir elementos de prova complementares ou adicionais, designadamente documentos ou relatórios de peritos, podendo fazer-se acompanhar destes52.

68. A audição oral não é pública e tem lugar nas instalações da Autoridade53. Da audição oral é elaborado um auto, que é junto ao processo.

48 Circunstâncias especiais como, por exemplo, o facto de se encontrar a decorrer um período de férias judiciais, serão devidamente tidas em conta pela Autoridade. 49

Contudo, o prazo não poderá ser inferior a 10 dias úteis. Neste sentido, v. Assento do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) n.º 1/2003. 50

V. n.º 2 do artigo 26.º da Lei da Concorrência. 51

V. n.º 2 do artigo 26.º da Lei da Concorrência. De acordo com o n.º 4 do artigo 43.º da Lei da Concorrência, em caso de falta de comparência injustificada à audição oral, a Autoridade pode aplicar aos representantes das empresas infractoras uma coima, no valor máximo de dez unidades de conta. 52 A natureza da audição oral é distinta da natureza das inquirições ordenadas pela Autoridade em cumprimento do n.º 4 do artigo 26.º da Lei da Concorrência, sendo estas últimas diligências complementares de prova. 53

As empresas arguidas não participam nas audições orais das co-arguidas nem são informadas da realização das mesmas. Contudo, o direito de defesa das co-arguidas é assegurado através do acesso ao auto da audição e aos documentos apresentados no decurso da mesma. Neste sentido, v. Sentença do Tribunal de Comércio de Lisboa (2.º Juízo), de 24 de Julho de 2009, Sodexo v. Autoridade da Concorrência.

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III.1.5 Nota de ilicitude complementar e nota de ilicitude substitutiva

69. Se, após a notificação da nota de ilicitude às arguidas, forem realizadas diligências probatórias complementares das quais resultem factos novos que a Autoridade entenda serem relevantes para a investigação, proceder-se-á à notificação às arguidas de uma nota de ilicitude complementar, no intuito de permitir que as mesmas se pronunciem sobre os factos novos e os respectivos elementos de prova, assim assegurando o respeito pelo princípio do contraditório. A nota de ilicitude complementar poderá assumir a forma de uma única nota de ilicitude consolidada, se a complexidade dos factos o aconselhar para o melhor exercício do direito de defesa.

70. A Autoridade fixa um prazo para a apresentação da resposta escrita à nota de ilicitude complementar54. A arguida poderá requerer, por escrito e antes do fim do prazo inicial, uma prorrogação do prazo, devendo tal solicitação ser devidamente fundamentada.

71. Quando das diligências complementares de prova resulte um diferente enquadramento jurídico dos factos, proceder-se-á à notificação, às arguidas, de uma nova nota de ilicitude, substitutiva da inicial, sendo assegurado o pleno exercício dos direitos de audição e de defesa55.

72. Após a notificação da nota de ilicitude complementar bem como da nota de ilicitude substitutiva, as empresas arguidas podem, mediante requerimento apresentado à Autoridade no prazo de cinco dias contados a partir daquela notificação, solicitar uma audição oral em complemento ou substituição da audição escrita.

73. Quando a Autoridade entenda servir-se de novos elementos de prova que apenas confirmem os factos previamente expostos na nota de ilicitude inicial, comunica os elementos de prova em causa às arguidas através de ofício, no qual é fixado um prazo para que as mesmas se pronunciem, por escrito, especificamente sobre esses novos meios de prova. As arguidas poderão requerer, por escrito e antes do fim do prazo inicial, uma prorrogação do prazo, devendo tal solicitação ser devidamente fundamentada.

III.1.6 Medidas cautelares

74. Se, durante a fase de instrução, se verificarem os pressupostos necessários à adopção de medidas cautelares, tal como já exposto a propósito da fase de inquérito, (supra, 44 a 49), a Autoridade poderá adoptá-las, nos termos do disposto no artigo 27.º da Lei da Concorrência.

III.1.7 Conclusão da instrução

75. A fase de instrução encerra-se com a adopção, por parte do Conselho da Autoridade56, com base no relatório elaborado pelo serviço instrutor (DPR), de uma decisão final, na qual o mesmo pode: a) ordenar o arquivamento do processo, quer por ter sido recolhida prova suficiente de não haver sido praticada qualquer infracção57, de o arguido em causa não a

54 Tal como para a nota de ilicitude inicial, na fixação do prazo serão consideradas a complexidade e extensão do caso concreto. Contudo, no que respeita à nota de ilicitude complementar, o prazo será geralmente inferior. 55

Isto sem prejuízo de a decisão final reflectir todo o processado. 56 V. a alínea a) do n.º1 do artigo 17.º dos Estatutos. 57

Nos termos do n.º 2 do artigo 282.º do CPP, “consideram-se suficientes os indícios sempre que deles resultar uma possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, por força deles, em julgamento, uma

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ter praticado ou de ser legalmente inadmissível o procedimento58, quer por não ter sido possível obter prova suficiente da prática de uma infracção ou de quem tenham sido os seus autores ou por estes últimos terem assumido compromissos considerados adequados para resolver os problemas concorrenciais identificados59; b) declarar a existência de uma prática restritiva da concorrência e, se for caso disso, ordenar ao infractor que adopte as providências indispensáveis à cessação dessa prática ou dos seus efeitos no prazo que lhe for fixado; c) aplicar as coimas e demais sanções previstas na Lei da Concorrência; d) autorizar um acordo, uma prática concertada ou decisão de associação de empresas nos termos e condições previstos no artigo 5.º da Lei da Concorrência60.

76. Em aplicação do disposto no artigo 127.º do Código do Processo Penal (CPP), “a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente”, ou seja, quanto à aplicação dos artigos 4.º, 6.º e 7.º da Lei da Concorrência, em conformidade com as regras de experiência associadas às relações da vida social e económica que constituam o objecto das regras de concorrência61.

77. Sempre que estejam em causa práticas com incidência num mercado objecto de regulação sectorial, a adopção de uma decisão em que i) se declara a existência de uma prática restritiva da concorrência e, sendo o caso, se ordena ao infractor a adopção das providências indispensáveis à cessação da prática ou dos seus efeitos, ii) se aplicam as coimas e demais sanções previstas na lei ou iii) se autoriza um acordo nos termos e condições previstos no artigo 5.º da Lei da Concorrência, é precedida de parecer prévio da respectiva autoridade reguladora sectorial. A Autoridade fixa, para o efeito, um prazo que, geralmente, será de 20 dias úteis (n.º 4 do artigo 29.º da Lei da Concorrência)62.

pena ou medida de segurança”. Contrariamente ao que sucede no âmbito do Processo Penal, em processo contra-ordenacional, caso haja lugar à fase de instrução, tal suficiência tem de ser novamente avaliada tendo agora por base a prova produzida durante toda a fase administrativa do processo. Assim, adaptando o sentido desta disposição ao procedimento contra-ordenacional quanto à aplicação dos artigos 4.º, 6.º e 7.º da Lei da Concorrência, tal significa que as provas produzidas serão suficientes quando, consideradas no âmbito do princípio da livre apreciação da prova (artigo 127.º do CPP), delas resulte uma possibilidade razoável de à(s) arguida(s) vir a ser aplicada, por força deles, na decisão final do Conselho da Autoridade, uma coima ou outra sanção aplicável em processo contra-ordenacional. 58

Por exemplo, por decurso do prazo prescricional. 59

Nos termos melhor desenvolvidos infra. 60

V. n.º 1 do artigo 28.º da Lei da Concorrência. 61

Tais regras de experiência permitem que sejam tidos em conta os aspectos específicos resultantes da natureza e contexto das práticas em apreço, designadamente a dificuldade de obtenção de prova directa quanto a certas infracções, como as práticas concertadas, e a necessidade de ponderar elementos de prova circunstancial. Neste sentido, v., no âmbito do Direito da União Europeia, as conclusões do Advogado-Geral Sir Gordon Slynn no processo Musique Diffusion, Acórdão de 7 de Junho de 1983, SA Musique Diffusion Française e al. /Comissão (Procs. Apensos 100 a 103/80) do Tribunal de Justiça. O recurso a prova dita “circunstancial” tem apoio na jurisprudência do STJ em matéria penal: “um juízo de acertamento da matéria de facto pertinente para a decisão releva de um conjunto de meios de prova, que pode inclusivamente ser indiciária, contanto que os indícios sejam graves, precisos e concordantes” (Acórdão do STJ de 8 de Novembro de 1995, Processo n.º 48.149, Boletim do Ministério da Justiça 452, 81, p. 90). 62 O parecer da autoridade reguladora sectorial não tem carácter vinculativo para a Autoridade.

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IV DECISÃO CONDENATÓRIA

78. Quando, após a instrução do processo, seja confirmada a verificação de uma infracção às regras de concorrência, a Autoridade adopta uma decisão condenatória em que declara a existência de uma prática restritiva da concorrência e ordena ao autor da mesma, caso a prática ainda não tenha cessado ou não seja possível comprovar a sua cessação, a adopção das providências indispensáveis à cessação da prática ou dos seus efeitos.

79. No intuito de garantir o exercício dos direitos de defesa do arguido, a decisão contém todos os elementos, de facto e de direito, respeitantes à imputação à arguida dos ilícitos contra-ordenacionais em causa.

80. Tratando-se de decisão condenatória que aplique uma coima ou determine a aplicação de sanções acessórias, de acordo com o artigo 58.º do RGCO, constarão da mesma a identificação dos arguidos, a descrição dos factos imputados com indicação das provas obtidas, a indicação das normas segundo as quais se pune e a fundamentação da decisão63.

81. A fixação da medida concreta da coima [artigo 43.º, alínea a), da Lei da Concorrência] é da exclusiva competência do Conselho da Autoridade da Concorrência, devendo o relatório de instrução (supra, 75) conter a informação relevante para efeitos do artigo 44.º da Lei da Concorrência, considerando os seguintes parâmetros na referida fixação:

a) A coima que não pode exceder, para cada uma das empresas partes na infracção, 10% do volume de negócios no último ano64;

b) O ano a considerar, nos termos da alínea antecedente, corresponde àquele em que cessou a prática ilícita;

c) O volume de negócios a considerar é o volume total de negócios realizado em Portugal por cada empresa parte na infracção65.

82. Na fixação da medida concreta da coima serão consideradas as circunstâncias expressamente

elencadas no artigo 44.º da Lei da Concorrência66 e, bem assim, e tendo em conta que a enumeração legal é meramente exemplificativa, a natureza da infracção, a sua duração, o seu âmbito geográfico, a situação económica do autor da infracção67, o efeito

63 Da decisão constará ainda a informação de que a condenação se torna definitiva e exequível se não for judicialmente impugnada nos termos dos artigos 59.º do RGCO e 50.º da Lei da Concorrência, e de que, em caso de impugnação judicial, o tribunal pode decidir mediante audiência ou, caso o arguido, o Ministério Público ou a AdC, não se oponham, mediante simples despacho (cf. n.º 3 do artigo 51.º da Lei da Concorrência). Finalmente a decisão conterá a ordem de pagamento da coima no prazo máximo de dez dias após o trânsito em julgado da decisão e a indicação de que, em caso de impossibilidade de pagamento tempestivo, deve comunicar o facto por escrito à Autoridade. 64

No caso de associações de empresas, o n. º 2 do artigo 43.º dispõe que a coima não excederá 10% do volume de negócios agregado anual das empresas associadas que hajam participado no comportamento ilícito. 65

Neste sentido, v. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa (3.º secção), Vatel – Companhia de Produtos Alimentares e outros/Autoridade da Concorrência, Processo n.º 7251/07. 66 Contudo não é exigida uma quantificação do valor de cada factor relevante para a determinação da sanção sendo apenas suficiente, para o cumprimento do dever de fundamentação, a sua individualização e a indicação do sentido da sua relevância em sede de culpa e/ou prevenção. Neste sentido, v. jurisprudência do Tribunal da Relação de Lisboa (3.º secção), Vatel – Companhia de Produtos Alimentares e outros/Autoridade da Concorrência, Processo n.º 7251/07. 67 V. n.º 1 do artigo 18.º do RGCO.

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dissuasivo/preventivo da coima, ou o facto de o comportamento anti-concorrencial ter sido autorizado ou incentivado por entidades públicas.

83. Em caso de concurso de contra-ordenações, e como resulta dos números 1 e 3 do artigo 19.º do RGCO, a coima aplicável tem como limite máximo a soma das coimas concretamente aplicadas às infracções em concurso, não podendo, de acordo com o n.º 2 do mesmo artigo, a coima a aplicar ser superior ao dobro do limite máximo mais elevado das contra-ordenações em concurso.

V APRESENTAÇÃO DE COMPROMISSOS

84. No âmbito de um processo de contra-ordenação por uma prática restritiva da concorrência, as empresas envolvidas podem apresentar, junto da Autoridade, compromissos voluntários, no intuito de resolver os problemas de natureza concorrencial pela mesma detectados68.

85. A Autoridade efectuará uma ponderação, face a cada caso concreto, entre o interesse em dissuadir comportamentos anticoncorrenciais através da imposição de coimas e o interesse em melhorar o funcionamento de um mercado através da eliminação de um problema concorrencial para o futuro.

V.1 Direito da União Europeia

86. A competência da Autoridade relativamente à aceitação de compromissos é expressamente reconhecida, para os processos que digam respeito à aplicação dos artigos 101.º e 102.º do TFUE, pelo artigo 5.º do Regulamento n.º 1/2003.

87. Nestes casos, a Autoridade, sempre que considere os compromissos apresentados como aptos a eliminar os problemas concorrenciais identificados, pode adoptar uma decisão que obrigue as empresas a cumprir esses compromissos (artigo 9.º do Regulamento n.º 1/2003).

88. A decisão relativa a compromissos conclui pela inexistência de fundamento para que a Autoridade imponha sanções e/ou decrete providências nos termos do art. 28.º da Lei da Concorrência, sem daí se poder inferir que tenha, ou não, ocorrido, ou ainda que possa ocorrer, uma infracção às regras da concorrência.

89. A adopção de uma decisão de compromissos não obsta à reabertura do processo, caso as empresas em causa não cumpram os compromissos ou ocorra uma alteração substancial da situação de facto ou dos pressupostos em que a decisão se fundou. Por outro lado, poderá haver ainda reabertura do processo quando a decisão relativa a compromissos se tiver baseado em informações falsas, inexactas ou incompletas.

68

Possibilidade que, por natureza, é afastada nos casos de cartéis, uma vez que a única medida susceptível de resolver os problemas concorrenciais é a cessação da prática, além de que a máxima gravidade da infracção desaconselha, do ponto de vista dos critérios de prevenção geral e especial, a aceitação de compromissos.

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V.2 Direito nacional

90. A possibilidade de aceitação de compromissos prevista no art. 5.º do Regulamento n.º 1/2003 não se aplica no âmbito de processos de contra-ordenação que digam exclusivamente respeito aos artigos 4.º, 6.º ou 7.º da Lei da Concorrência.

91. Acresce que as soluções processuais constantes do artigo 9.º daquele Regulamento não encontram base legal no ordenamento jurídico português, pelo que não podem ser adoptadas nos processos referidos no parágrafo anterior. Tal significa que a Autoridade não pode emitir uma decisão que obrigue as empresas a cumprir os compromissos apresentados, o que impede que os mesmos se tornem vinculativos e priva a Autoridade de mecanismos de reacção perante um eventual incumprimento.

92. É conveniente, contudo, que a Autoridade tenha o poder de aceitar compromissos propostos pelas empresas, não só porque se trata de um mecanismo com várias virtualidades ao nível da eliminação dos problemas concorrenciais detectados, mas porque tal possibilidade evita a existência de grandes assimetrias entre os processos instruídos pela Autoridade com base nos artigos 101.º e 102.º do TFUE, por um lado, e nos artigos 4.º, 6.º ou 7.º da Lei da Concorrência, por outro.

93. Apesar de não ser possível transpor para o ordenamento jurídico nacional o procedimento de aceitação de compromissos constante do artigo 9.º do Regulamento n.º 1/2003, é possível a obtenção de resultados semelhantes através do recurso a diversas normas de direito nacional, embora nem todas tenham como resultado o arquivamento do processo.

94. Assim, se as empresas ou associações de empresas envolvidas num processo de contra-ordenação por práticas proibidas pelos artigos 4.º, 6.º ou 7.º da Lei da Concorrência apresentarem compromissos voluntários, a Autoridade, caso considere que os mesmos são susceptíveis de eliminar os problemas concorrenciais por si detectados, pode: a) emitir uma decisão condenatória sem aplicação de coima (art. 28.º, n.º 1, al. b) da Lei da Concorrência); b) emitir uma decisão condenatória sem aplicação de coima mas com decretamento das providências indispensáveis à cessação da prática, acompanhada, ou não, da previsão de uma sanção pecuniária compulsória (artigos 28.º, n.º 1, al. b) e 46.º da Lei da Concorrência); c) suspender provisoriamente o processo (artigos 281.º e ss. do Código de Processo Penal, aplicável subsidiariamente e com as devidas adaptações).

95. A simples decisão condenatória sem aplicação de coima é especialmente indicada para os casos em que a execução dos compromissos é instantânea ou, em qualquer caso, já ocorreu.

96. A decisão condenatória com decretamento de providências destinadas à cessação da prática é mais adequada a situações em que os compromissos são de execução futura. Apenas deve ser emitida, contudo, nos casos em que é claro que as medidas a adoptar permitirão resolver os problemas concorrenciais detectados.

97. A suspensão provisória do processo é aplicável a qualquer tipo de compromissos, mas apenas deve ser decretada em casos de restrições à concorrência que não sejam muito graves e em que o grau de culpa do(s) arguido(s) não seja elevado.

98. A suspensão provisória permite que, durante um período que pode ir até 2 anos, a Autoridade monitorize o cumprimento dos compromissos; pode inclusivamente ser usada nas situações em que não é claro se os compromissos surtirão os efeitos desejados, servindo o período de suspensão também como um teste à eficácia dos mesmos.

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99. A suspensão termina, mesmo antes de decorrido o período fixado, prosseguindo o processo, se os compromissos não forem cumpridos (por exemplo, porque consistiam numa obrigação de abstenção que foi violada ou porque não foram executadas medidas que o deviam ter sido num determinado prazo), se se tornar evidente que os mesmos não surtirão os efeitos desejados ou se a(s) empresa(s) em causa cometer(em) uma infracção do mesmo tipo. Nestes casos, a Autoridade emitirá uma decisão nos termos do art. 28.º da Lei da Concorrência.

100. Decorrido o período de suspensão fixado pela Autoridade, esta arquiva o processo se concluir que os compromissos foram devidamente cumpridos. Neste caso, o processo não pode ser reaberto com base nos mesmos factos, embora possa vir a ser instaurado um novo processo por factos semelhantes que tenham sido ou venham a ser praticados pela(s) mesma(s) empresa(s).

101. A Autoridade não aceitará compromissos nas situações em que, cumulativamente, se verifiquem as seguintes condições: i) a infracção é muito grave ou o grau de culpa do infractor é elevado (caso em que não é possível o recurso à suspensão provisória do processo); ii) a eficácia das medidas propostas na eliminação do problema concorrencial em causa não pode ser antecipadamente aferida por depender de factores de mercado de verificação incerta, sendo necessária, por isso, a fixação de um período de teste [caso em que não é adequado o decretamento das providências a que se refere o art. 28.º, n.º 1, al. b) da Lei da Concorrência].

V.3 Procedimento comum

102. As empresas podem contactar a Autoridade com vista à apresentação de compromissos em qualquer uma das fases do processo organicamente administrativo. Contudo, a Autoridade considera conveniente que as empresas manifestem a sua intenção de apresentar compromissos o mais rapidamente possível. O facto de a Autoridade já ter notificado a abertura de instrução não obsta à apresentação de compromissos por parte das empresas arguidas.

103. Os compromissos podem ser de natureza comportamental ou estrutural. Para que a Autoridade possa aferir da eficácia dos compromissos assumidos, o envio periódico de um relatório relativo à sua implementação poderá ser exigido. A nomeação de um mandatário para auxiliar a Autoridade poderá também ser decidida. Quando os compromissos não possam ser implementados sem o acordo de terceiros, deverá ser fornecida pelas partes interessadas prova da existência do mesmo.

104. Antes da aceitação dos compromissos, e na medida em que a Autoridade o considere necessário, terceiros interessados poderão ser admitidos a apresentar as suas observações sobre os compromissos, para que seja confirmada a sua aptidão para restabelecer uma concorrência efectiva no mercado em causa. De igual modo, os compromissos apresentados poderão ser comunicados ao denunciante para que este se pronuncie sobre os mesmos.

105. Quando os comentários recebidos por parte de terceiros e/ou do denunciante indicarem a inaptidão dos compromissos apresentados para resolver os problemas identificados ou a necessidade de proceder a alterações dos mesmos, a Autoridade notificará tais conclusões às empresas envolvidas para que estas apresentem, caso seja possível e as empresas nisso consintam, uma versão alterada dos compromissos. Quando o problema não possa ser resolvido ou as empresas não pretendam modificar os compromissos, a Autoridade

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prosseguirá o processo, com vista à adopção de uma decisão nos termos do n.º 1 do artigo 28.º da Lei da Concorrência.

106. A Autoridade e as empresas envolvidas poderão decidir, em qualquer momento, suspender as discussões relativas aos compromissos. Neste caso, a Autoridade prosseguirá o processo com vista à adopção de uma decisão nos termos do n.º 1 do artigo 28.º da Lei da Concorrência.

VI PUBLICIDADE E ACESSO AO PROCESSO

VI.1 Segredo de justiça

107. O inquérito é sujeito ao princípio da publicidade, ou seja, quer a empresa arguida quer terceiros podem, mediante requerimento, consultar o processo ou os elementos dele constantes, bem como obter os correspondentes extractos, cópias ou certidões69.

108. O acesso ao processo e às provas nele constantes constitui parte integrante dos direitos de defesa do arguido, tendo como objectivo permitir que este se possa pronunciar sobre as imputações feitas pela Autoridade (artigo 50.º do RGCO)70.

109. O acesso aos autos por terceiros apenas pode ser efectuado por pessoa que, para tal, revele interesse legítimo (isto é, um interesse atendível, que justifique, razoavelmente, conceder-se ao requerente o acesso ao processo).

110. O direito de acesso ao processo não abrange, porém, o conhecimento de segredos de negócio e outras informações confidenciais de entidades terceiras (supra, 120 a 126), como resulta do disposto no n.º 5 do artigo 26.º da Lei da Concorrência71.

111. O acesso ao processo, bem como a obtenção dos correspondentes extractos, cópias ou certidões, tem lugar nas instalações da Autoridade, mediante prévio requerimento escrito por parte dos interessados.

112. Os documentos ou outras informações reputados como confidenciais são retirados do processo e identificados através de uma listagem, que é junta ao processo, da qual também constam as razões da confidencialidade72. Desta forma, assegura-se o conhecimento, embora sumário, de quais os elementos de informação considerados confidenciais, bem como das razões que levaram a Autoridade a conferir-lhes esse tratamento.

113. A arguida que pretenda ter acesso a um elemento de informação que tenha sido qualificado como confidencial pela Autoridade deverá apresentar um requerimento

69

V. n.º 1 do artigo 89.º do Código do Processo Penal (CPP), que se aplica subsidiariamente no que se refere ao regime processual, ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO, aplicável aos processos relativos aos processos por infracção aos artigos 4.º, 6.º e 7.º da Lei da Concorrência por força do disposto no artigo 22.º, n.º 1 da Lei da Concorrência. 70

V. neste sentido, quanto ao âmbito das competências da Comissão Europeia, Acórdãos de 29 de Junho de 1995, Solvay et Compagnie SA/Comissão (T-30/91), e de 29 de Junho de 1995, ICI/Comissão (T-36/91). 71 Acrescenta-se que, por força do disposto no artigo 36.º dos Estatutos da Autoridade, os titulares dos órgãos da Autoridade, bem como o seu pessoal estão obrigados ao sigilo profissional. 72 V. Sentença do Tribunal de Comércio de Lisboa no Processo n.º 766/06.4TYLSB.

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fundamentado, junto desta, a solicitar a consulta do mesmo73. Tal requerimento será objecto de despacho por parte da Autoridade que, fundadamente e à luz do caso concreto, apreciará e decidirá o pedido de levantamento da confidencialidade74.

114. O princípio da publicidade do inquérito pode sofrer excepções quando os interesses da investigação ou do arguido justifiquem a aplicação do regime do segredo de justiça resultante dos n.os 2 e 3 do artigo 86.º do Código de Processo Penal (CPP)75.

115. A decisão de sujeição do processo ao regime de segredo de justiça é proferida pelo Conselho da Autoridade, oficiosamente ou a requerimento do arguido.

116. Caso o processo seja sujeito ao regime de segredo de justiça, essa situação mantém-se, na sua dimensão externa, isto é, relativamente a terceiros, até à decisão final da Autoridade, se não cessar antes, por se ter esgotado o seu fundamento, a requerimento ou oficiosamente.

117. A sujeição do processo a segredo de justiça não impede o acesso ao mesmo por parte do arguido, salvo se, tendo esta requerido esse acesso, a Autoridade a isso se opuser por considerar, fundadamente, que o mesmo pode prejudicar a investigação76.

118. As restrições de acesso ao processo em segredo de justiça por parte do arguido cessam com a notificação da nota de ilicitude por parte da Autoridade.

119. A decisão do Conselho da Autoridade que decrete ou indefira a sujeição do processo a segredo de justiça, ou impeça o acesso ao processo com fundamento na sua sujeição ao regime de segredo de justiça, é susceptível de recurso junto do Tribunal de Comércio de Lisboa, nos termos da lei.

VI.2 Segredo de negócio

120. O direito do arguido de acesso ao processo não abrange o conhecimento de segredos de negócio e outras informações confidenciais de entidades terceiras, como resulta do disposto no n.º 5 do artigo 26.º da Lei da Concorrência77.

121. Constituem segredos de negócio as informações acerca da actividade de uma empresa cuja divulgação é susceptível de a lesar gravemente78. Como exemplos deste tipo de informações podem citar-se: informações técnicas e/ou financeiras relativas ao saber-fazer, métodos de cálculo dos custos, segredos e processos de produção, fontes de abastecimento, quantidades produzidas e vendidas, quotas de mercado, listagens de

73 De acordo com a Sentença do Tribunal de Comércio de Lisboa no Processo n.º 766/06.4TYLSB, cabe à arguida pedir a consulta de documentos confidenciais que possam ser usados na sua defesa. 74

V. Sentença do Tribunal de Comércio de Lisboa no Processo n.º 766/06.4TYLSB. Contra a decisão da Autoridade que indeferir um pedido de consulta a um elemento confidencial, é possível recorrer para tribunal, nos termos previstos no n.º 2 do artigo 50.º da Lei da Concorrência e no artigo 55.º do RGCO. 75

Relativamente à aplicação do segredo de justiça em processo contra-ordenacional, v. Parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República n.º 84/2007, publicado no Diário da República, 2ª Série, n.º 68, de 7 de Abril de 2008, p. 15223. 76 Artigo 89.º, n.º 1, 2.ª parte. 77 Acrescenta-se que, por força do disposto no artigo 36.º dos Estatutos da Autoridade, os titulares dos órgãos da Autoridade, bem como o seu pessoal estão obrigados ao sigilo profissional. 78

V. Comunicação da Comissão relativa às regras de acesso ao processo nos casos de aplicação dos artigos 81.º e 82.º do Tratado CE, artigos 53.º, 54.º e 57.º do Acordo EEE e do Regulamento (CE) n.º 139/2004 do Conselho (“Comunicação da Comissão relativa às regras de acesso ao processo”), JO nº C 325 de 22 de Dezembro de 2005 p.7-15.

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clientes e de distribuidores, estratégia comercial, estruturas de custos e de preços e política de vendas de uma empresa79.

122. Para além dos segredos de negócio, são consideradas confidenciais as informações cuja divulgação seja susceptível de lesar gravemente uma pessoa ou empresa80.

123. As informações são consideradas confidenciais e o acesso às mesmas é interdito quando a protecção da confidencialidade seja pedida, de forma fundamentada e para cada um dos elementos em causa, pelas empresas que as submetem, e na medida em que o pedido seja considerado justificado pela Autoridade81. A decisão da Autoridade relativa à confidencialidade inclui os fundamentos que a sustentam.

124. A Autoridade não considerará como confidenciais as informações relativas a uma empresa quando estas já sejam conhecidas fora da empresa (no caso de um grupo económico, fora do grupo) ou fora da associação a que foram comunicadas por essa empresa82. Igualmente, não poderão continuar a ser consideradas confidenciais as informações que perderam importância comercial, por exemplo devido ao decurso do tempo. Por regra, presume-se que as informações relativas ao volume de negócios, às vendas e às quotas de mercado das partes e outras informações semelhantes deixaram de ser confidenciais quando datam de há mais de cinco anos83.

125. A qualificação de um elemento de informação como confidencial não constitui um impedimento para a sua divulgação, se o mesmo for considerado necessário para provar uma infracção ou para justificar a prática da mesma. Nestes casos, a Autoridade procederá a uma ponderação sobre a prevalência, por um lado, do interesse na não divulgação dos segredos de negócio e, por outro, da garantia dos direitos de defesa do arguido, em face do caso concreto84.

126. Após a notificação da nova nota de ilicitude, ou da nota de ilicitude complementar e/ou do ofício relativo aos novos elementos de prova (v. supra III.1.5.), as arguidas terão direito à consulta do processo, incluindo as novas provas recolhidas pela Autoridade.

VI.3 Sigilo profissional

127. De acordo com o regime de protecção legal aplicável ao sigilo profissional do advogado, não pode ser apreendida a correspondência, seja qual for o suporte utilizado, respeitante ao exercício da profissão de advogado85.

128. O sigilo profissional do advogado abrange toda e qualquer correspondência profissional, quer ela se encontre no escritório do advogado, quer em qualquer outro lugar86.

79

V. Comunicação da Comissão relativa às regras de acesso ao processo, ponto18. 80

V. Comunicação da Comissão relativa às regras de acesso ao processo, ponto19. 81

Artigo 18.º da Lei da Concorrência. Neste sentido, v. Sentença do Tribunal de Comércio de Lisboa no Processo n.º 766/06.4TYLSB. 82

V. Comunicação da Comissão relativa às regras de acesso ao processo, ponto 23. Contudo, os segredos de negócio ou outras informações confidenciais fornecidos a uma associação comercial ou profissional pelos seus membros não perdem a sua natureza confidencial em relação a terceiros. 83 V. Comunicação da Comissão relativa às regras de acesso ao processo, ponto 23. 84 V. Sentença do Tribunal de Comércio de Lisboa no Processo n.º 766/06.4TYLSB. 85

V. n.º 2 do artigo 180.º do CPP e o n.º 1 do artigo 71.º do Estatuto da Ordem dos Advogados (EOA). Neste sentido v. também Sentença do Tribunal de Comércio de Lisboa (3.º Juízo), de 17 de Janeiro de 2008, Unilever Jerónimo Martins, Ldª. Processo n.º 572/07.9TYLSB. A única excepção a esta proibição é o caso de a correspondência ser relativa a facto criminoso pelo qual o próprio advogado tenha sido constituído arguido.

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129. Esta proibição estende-se à “correspondência” aberta trocada entre o advogado e aquele que lhe tenha cometido ou pretendido cometer mandato e lhe tenha solicitado parecer, ainda que não dado ou já recusado87.

130. De igual modo, as buscas e diligências equivalentes, a aposição de selos e o arrolamento no escritório de advogados ou em qualquer outro lugar onde façam arquivo88, assim como o recurso a meios de prova excluídos do processo contra-ordenacional, como a intercepção e gravação de conversações ou comunicações efectuadas através do telefone ou do endereço electrónico, utilizados pelo advogado no exercício da profissão, constantes do registo da Ordem dos Advogados89, só podem ser decretados e presididos por juiz, devendo ser convocados para estarem presentes o advogado e um representante da Ordem dos Advogados90.

131. Tem sido defendido que, em procedimentos sancionatórios de direito português91, como é o caso dos procedimentos relativos à aplicação dos artigos 4.º, 6.º e 7.º da Lei da Concorrência, o dever de sigilo profissional do advogado e as regras que visam salvaguardar e possibilitar o exercício desse dever por parte do advogado abrangem quer os advogados independentes quer os advogados que exercem a sua actividade em regime de subordinação (advogados de empresa ou in-house lawyers)92. Trata-se, contudo, de uma matéria que exige maior clarificação no ordenamento jurídico nacional.

132. A apreensão de correspondência, ainda que aberta, bem como a realização de buscas e outras diligências equivalentes em violação das normas que disciplinam o sigilo profissional do advogado infringem uma proibição de prova, tendo por consequência a nulidade dos meios de prova assim obtidos e a proibição da sua valoração93.

133. Em caso de dúvida em relação à sujeição de documentos concretos à protecção conferida pelo regime do segredo profissional do advogado, a Autoridade procede a sua apreensão, catalogando-os e colocando-os em envelope fechado e lacrado, para posterior avaliação pelo Tribunal competente.

86 Neste sentido, v. Despacho do Tribunal de Comércio de Lisboa (3.º Juízo), de 23 de Abril de 2008, que complementa a sentença proferida por este mesmo tribunal em 17 de Janeiro de 2008, Unilever Jerónimo Martins, Ldª., Processo n.º 572/07.9TYLSB. 87 V. n.º 2 do artigo 71.º do EOA. 88 A existência de arquivo noutro local tem que ser invocada pelo advogado visado pela diligência. Neste sentido, v. Sentença do Tribunal de Comércio de Lisboa (3º Juízo), de 17 de Janeiro de 2008, Unilever Jerónimo Martins, Ldª. Processo n.º 572/07.9TYLSB. 89

Equiparam-se aos advogados inscritos na Ordem dos Advogados os advogados estrangeiros inscritos em organismos equivalentes de outros países. Neste sentido, v. Sentença do Tribunal de Comércio de Lisboa (3º Juízo), de 17 de Janeiro de 2008, Unilever Jerónimo Martins, Ldª. Processo n.º 572/07.9TYLSB. 90

V. artigo 177.º do CPP e o artigo 70.º do EOA. A presença do representante da Ordem dos Advogados é imprescindível e a sua substituição está prevista apenas em caso de urgência e na sua ausência apenas se podem tomar diligências para evitar descaminho ou destruição. 91

E contrariamente ao que acontece no âmbito Direito da União Europeia. V. Acórdão de 18 de Maio de 1982, AM&S Europe Limited / Comissão (155/79); Acórdão de 12 de Dezembro de 1991, Hilti AG / Comissão (T- 30/89); e, recentemente, Acórdão de 14 de Setembro de 2010, Akzo Nobel Chemicals Ltd, Akcros Chemicals Ltd / Comissão (C-550/07 P). 92

Neste sentido, v. Sentença do Tribunal de Comércio de Lisboa (3º Juízo), de 17 de Janeiro de 2008, Unilever Jerónimo Martins, Ldª. Processo n.º 572/07.9TYLSB. De acordo com a referida sentença, apenas beneficiam da protecção do sigilo profissional os advogados inscritos na Ordem dos Advogados. 93 V. o disposto nos artigos n.os 177 e 180 do CPP.

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VII PUBLICAÇÃO DE DECISÕES

134. Após a adopção de uma decisão, nos termos do n.º 1 do artigo 28.º da Lei da Concorrência, por regra, é publicado no sítio oficial da Internet da Autoridade um comunicado de imprensa. Este comunicado inclui uma descrição sintética do processo, a identificação das arguidas, a natureza da infracção e, se for caso disso, o teor e o montante das sanções aplicadas.

135. A divulgação da decisão final da Autoridade no seu sítio oficial da Internet apenas ocorrerá quando a mesma tiver transitado em julgado e depois de expurgada de elementos que sejam abrangidos pela protecção conferida aos segredos de negócio e demais confidencialidades previstas na lei.