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Liquefação Estática em Depósitos de Rejeitos de Mineração Lorena Romã Penna Ministério da Integração Nacional, Brasília/DF, Brasil, [email protected] Waldyr Lopes de Oliveira Filho Universidade Federal de Ouro Preto, Ouro Preto/MG, Brasil, [email protected] Luiz Gonzaga de Araújo Universidade Federal de Ouro Preto, Ouro Preto/MG, Brasil, [email protected] Francisco Eduardo Almeida Samarco Mineração S.A., Mariana/MG, Brasil, [email protected] RESUMO: O potencial de liquefação estática de um depósito de rejeitos de mineração de ferro é examinada nesse artigo através de um estudo de caso por meios diretos, pelos métodos de Olson (2001) e de Robertson e Campanella (1985), como também pelo método observacional dos efeitos (sinais) do fenômeno, expresso por sand boils e trincas de alívio, ocorridos durante a construção de um aterro teste. PALAVRAS-CHAVE: Liquefação estática, rejeitos de mineração. 1 INTRODUÇÃO A demanda por bens minerais torna-se cada vez mais notável no mundo inteiro, acarretando um crescente aumento da quantidade de resíduos gerados por esta atividade, o que acaba por forçar a otimização dos processos construtivos dos depósitos, que inclui aumento nas dimensões dos reservatórios e maior velocidade de construção dos aterros. Aliado a esse cenário, rupturas envolvendo barragens de rejeitos vêm se sucedendo em todo o mundo, havendo registros de um grande acidente a cada ano (Ávila, 2007), inclusive no Brasil, provocando desastres ambientais de conseqüências inavaliáveis e, em muitos casos, até envolvendo perdas humanas. No Brasil temos exemplos de rupturas de Fernandinho (1986), Mineração Rio Verde (2001), Cataguazes (2003) e Miraí (2006 e 2007), algumas com fatalidades, mas todas causando grandes danos econômicos e ambientais, e porque não dizer gerando desconfiança e insegurança por parte da população, principalmente a que vive a jusante de barragens. Um agravante no que tange às rupturas com barragens de rejeitos refere-se ao fato de que os depósitos de rejeito de mineração apresentam, no geral, características de natureza e formação que o fazem um cenário bastante favorável à ocorrência do fenômeno da liquefação dos solos, o qual provoca uma redução substancial da resistência ao cisalhamento do solo, podendo o mesmo se comportar como um fluido denso, trazendo conseqüências ainda piores em termos do alcance do material liquefeito. Nesse contexto, o objetivo desse artigo é contribuir, a partir das análises/conclusões obtidas em um estudo de um aterro experimental (Penna, 2008), para que a questão da avaliação do potencial de liquefação em depósitos de rejeitos de mineração seja uma premissa básica de projeto, inclusive em países assísmicos como é o caso do Brasil, devendo ser o nível de avaliação apropriado à estrutura que se pretende construir. 2 LIQUEFAÇÃO ESTÁTICA EM DEPÓSITOS DE REJEITOS DE MINERAÇÃO O fenômeno da liquefação dos solos acontece quando depósitos granulares, de baixa COBRAMSEG 2010: ENGENHARIA GEOTÉCNICA PARA O DESENVOLVIMENTO, INOVAÇÃO E SUSTENTABILIDADE. © 2010 ABMS. 1

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Liquefação Estática em Depósitos de Rejeitos de Mineração Lorena Romã Penna Ministério da Integração Nacional, Brasília/DF, Brasil, [email protected] Waldyr Lopes de Oliveira Filho Universidade Federal de Ouro Preto, Ouro Preto/MG, Brasil, [email protected] Luiz Gonzaga de Araújo Universidade Federal de Ouro Preto, Ouro Preto/MG, Brasil, [email protected] Francisco Eduardo Almeida Samarco Mineração S.A., Mariana/MG, Brasil, [email protected] RESUMO: O potencial de liquefação estática de um depósito de rejeitos de mineração de ferro é examinada nesse artigo através de um estudo de caso por meios diretos, pelos métodos de Olson (2001) e de Robertson e Campanella (1985), como também pelo método observacional dos efeitos (sinais) do fenômeno, expresso por sand boils e trincas de alívio, ocorridos durante a construção de um aterro teste. PALAVRAS-CHAVE: Liquefação estática, rejeitos de mineração. 1 INTRODUÇÃO A demanda por bens minerais torna-se cada vez mais notável no mundo inteiro, acarretando um crescente aumento da quantidade de resíduos gerados por esta atividade, o que acaba por forçar a otimização dos processos construtivos dos depósitos, que inclui aumento nas dimensões dos reservatórios e maior velocidade de construção dos aterros. Aliado a esse cenário, rupturas envolvendo barragens de rejeitos vêm se sucedendo em todo o mundo, havendo registros de um grande acidente a cada ano (Ávila, 2007), inclusive no Brasil, provocando desastres ambientais de conseqüências inavaliáveis e, em muitos casos, até envolvendo perdas humanas.

No Brasil temos exemplos de rupturas de Fernandinho (1986), Mineração Rio Verde (2001), Cataguazes (2003) e Miraí (2006 e 2007), algumas com fatalidades, mas todas causando grandes danos econômicos e ambientais, e porque não dizer gerando desconfiança e insegurança por parte da população, principalmente a que vive a jusante de barragens. Um agravante no que tange às rupturas com barragens de rejeitos refere-se ao

fato de que os depósitos de rejeito de mineração apresentam, no geral, características de natureza e formação que o fazem um cenário bastante favorável à ocorrência do fenômeno da liquefação dos solos, o qual provoca uma redução substancial da resistência ao cisalhamento do solo, podendo o mesmo se comportar como um fluido denso, trazendo conseqüências ainda piores em termos do alcance do material liquefeito.

Nesse contexto, o objetivo desse artigo é contribuir, a partir das análises/conclusões obtidas em um estudo de um aterro experimental (Penna, 2008), para que a questão da avaliação do potencial de liquefação em depósitos de rejeitos de mineração seja uma premissa básica de projeto, inclusive em países assísmicos como é o caso do Brasil, devendo ser o nível de avaliação apropriado à estrutura que se pretende construir. 2 LIQUEFAÇÃO ESTÁTICA EM DEPÓSITOS DE REJEITOS DE MINERAÇÃO O fenômeno da liquefação dos solos acontece quando depósitos granulares, de baixa

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compacidade in situ, em condições saturadas, são solicitados por um esforço brusco suficientemente capaz de produzir uma situação não drenada, elevando as poropressões no meio a valores tais que a tensão efetiva do material caia consideravelmente, provocando uma redução substancial da sua resistência ao cisalhamento.

Pode-se designar o fenômeno da liquefação de solos pelos termos: liquefação dinâmica ou liquefação estática, a depender do tipo de evento causador da sua iniciação. A primeira situação é a mais conhecida, sendo ocasionada por eventos dinâmicos, em especial terremotos. Já na liquefação estática, trata-se de um fenômeno iniciado por carregamentos estáticos como: sobrecarga, aumento repentino da superfície freática, elevada precipitação pluviométrica, dentre outros.

Muitos relatos mostram a ocorrência da liquefação estática com instabilidades iniciais devidas a alteamentos, galgamentos, erosões internas, superfície freática elevada, dentre outros, atribuindo-se a rupturas convencionais o efeito disparador do fenômeno (Wagener, 1997; Olson, et. al, 2000, Fourie et. al, 2001, Olson e Stark, 2003). No entanto, devido à existência dessas rupturas iniciais, na maioria das vezes, atribui-se à liquefação estática um papel secundário nas rupturas, gerando muita controvérsia a esse respeito, o que é preocupante, pois apesar de precisar de uma instabilidade inicial para ser iniciada, é ela quem determina o potencial destruidor da ruptura. 3 AVALIAÇÃO DO FENÔMENO DA LIQUEFAÇÃO 3.1 Metodologias de Avaliação Os estudos de liquefação de solos contemplam em geral três etapas (questões) principais, a saber: a análise da susceptibilidade à liquefação do depósito; a avaliação do evento disparador do processo de liquefação (“triggering”), ou seja, do mecanismo capaz de causar a liquefação no meio; e a previsão do estado do material no período pós-liquefação, analisando

as conseqüências da ruptura em termos de recalques e deslocamentos laterais (Olson, 2001). Nesse trabalho apenas a análise da susceptibilidade é investigada.

Todos os materiais do depósito suscetíveis à liquefação devem ser identificados e, para isso, adicionalmente às informações preliminares para caracterização do solo, ensaios de laboratório em amostras não deformadas, métodos geofísicos e ensaios de campo de penetração podem ser usados. Muitos pesquisadores alertam para o fato de que questões importantes referentes ao estado in situ do solo sejam difíceis de se reproduzir em laboratório. Assim as técnicas de campo têm sido preferidas, e as propostas em uso há mais tempo correlacionam liquefação à resistência local obtida nos ensaios de penetração do tipo SPT ou de cone. Nesse sentido, vale destacar Olson (2001) que construiu uma base de dados com registros de casos de rupturas por liquefação e correlacionou com a fronteira proposta por Fear e Robertson (1995), recomendada a partir de análises com base nas teorias da mecânica dos solos e em ensaios laboratoriais, a qual delimita zonas susceptíveis (contrativas) e não susceptíveis à liquefação (dilatantes); bem como, Robertson e Campanella (1985) que desenvolveram uma proposta de avaliação de potencial de liquefação demarcando em um plano representado pelas variáveis FR(%) (resistência por atrito lateral normalizada) e qc (resistência de ponta corrigida) uma região onde os materiais são mais susceptíveis à liquefação, a qual chamaram de zona “A”. 3.2 Indicadores do Fenômeno da Liquefação Além das metodologias clássicas de avaliação do potencial de liquefação existe espaço para método observacional do fenômeno a partir de algumas manifestações típicas de liquefação encontradas em eventos de ruptura geral ou mesmo localizada como são os sand boils, as trincas de alívio e o encharcamento da área.

Sand boils são formações que surgem em vários pontos de um depósito, durante e após o início de um processo de liquefação. Assemelhando-se a mini-vulcões, eles expelem uma mistura de água e partículas arenosas e sua

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intensidade e duração depende do evento disparador do processo e das características do depósito, mas em geral os sand boils têm uma duração significativa, mesmo após o fim do processo de liquefação e são facilmente identificados visualmente (Yang e Elgamal, 2001 e 2002), sendo seu acontecimento associado à existência de camadas de materiais distintos no perfil de um terreno, o que predispõe a uma diferença de permeabilidade no perfil, principalmente na região mais superficial (Kokusho, 1999).

Assim como o surgimento dos sand boils, a formação das chamadas trincas de alívio também estão relacionadas com a ocorrência do fenômeno da liquefação em terrenos não homogêneos. E quando não existe um caminho (sand boil) ou uma linha preferencial de alívio (trinca), também são comuns as subidas d’água sob pressão de forma generalizada, abrangendo toda área no entorno de uma obra (área de carregamento). 4 ESTUDO DE CASO Uma área interna confinada do reservatório de rejeitos de mineração de ferro da Samarco Mineração S.A, Barragem de Germano, em Mariana/MG, Brasil, e denominada baia 2, é estudada nessa pesquisa quanto à sua potencialidade ao desenvolvimento do fenômeno da liquefação estática.

A motivação para o estudo de caso se deu pelo fato de a baia 2 apresentar características de natureza e formação que a fazem um cenário bastante propício à ocorrência do fenômeno da liquefação, bem como pela existência de relatos que dão registro de que o referido depósito exibe certa susceptibilidade à liquefação pela presença de sand boils, trincas de alívio no terreno e encharcamento associados a construções na área, todos aspectos inequívocos do fenômeno de liquefação. 4.1 Caracterização do Local de Estudo

A área da baia 2 analisada e o perfil estratigráfico da mesma podem ser vistos na Figura 1.

Figura 1. (a) Vista da área da Baia 2 e (b) Perfil Estratigráfico da Baia 2

O perfil acima mostra que a baia 2 é constituída de camadas de material fino silto-arenoso e silto-argiloso resultando num depósito estratificado e, vale destacar, algumas características que indicam a sua propensão ao fenômeno da liquefação, a saber:

- Método de disposição usado na forma de aterro hidráulico, onde os rejeitos são lançados misturados à água, portanto na condição saturada;

- Textura do rejeito variada, apresentando partículas finas em sua maioria, principalmente silte, com camadas típicas silto-arenosa ou silto-argilosa;

- Sem processo algum de densificação, o depósito de rejeitos apresenta baixa densidade relativa;

- A maioria dos alteamentos se dá pelo método de montante, onde os rejeitos fofos, muito compressíveis e saturados, funcionam como fundação dos novos diques; e 4.2 Avaliação do Potencial de Liquefação Uma avaliação formal do potencial de liquefação é feita com base em análise de ensaios de campo e estudos disponíveis em alguns relatórios internos da Samarco. Também

A maiores profundidades, perfil estratificado

Baia 2

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contribuiu para o estudo de liquefação observações de campo de obras realizadas no local, inclusive com a construção de um aterro teste instrumentado.

No primeiro caso aplicam-se metodologias consagradas para a avaliação da susceptibilidade à liquefação do depósito, Olson (2001) e Robertson e Campanella (1985), e, no segundo, a abordagem é mais empírica com o método observacional, através de instrumentos (medidas de poropressão e deslocamento) e observação visual (fotos, filmes e relatórios de obra). 4.2.1 Metodologias Baseadas em Ensaios de

Campo Para avaliação das camadas mais profundas do da baia 2 (abaixo dos 2m), utilizaram-se as metodologias de Olson (2001) e de Robertson e Campanella (1985), as quais se baseiam em resultados de ensaios de cone, tendo sido obtidos os seguintes gráficos da Figura 2 de análise de susceptibilidade para testes no local do depósito (Deltageo, 2006).

Figura 2. (a) Metodologia de Olson (2001) e (b) Metodologia de Robertson e Campanella (1985).

Os resultados mostram claramente que todos os materiais do perfil do depósito da baia 2 se posicionam na zona liquefável do gráfico de Olson. A essa constatação geral é necessário que se recorde que a metodologia de Olson (2001) é aplicável apenas aos solos siltoarenosos ou arenosos (solos grossos) do perfil. O gráfico referente à proposta de Robertson e Campanella (1985) também mostra que muitos pontos do perfil apresentam susceptibilidade à liquefação (areias, silte-arenosos e siltes), constatando-se alguns resultados plotados fora do espaço possível, embora se tratando de material aparentemente fino argiloso (interpretação textural), que não se enquadra na discussão sobre susceptibilidade. 4.2 Método Observacional O método observacional foi usado na avaliação do fenômeno da liquefação do deposito na eventualidade da construção de um aterro teste na forma de um pontão com 5m de altura, 28m largura de base e 56m de comprimento. O acompanhamento do procedimento construtivo e do desempenho do aterro teste foi feito com auxílio de instrumentação e observação de campo. Esse trabalho de monitoramento com o

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acompanhamento da obra foi fundamental para que correlações pudessem ser feitas com os dados obtidos pela instrumentação de campo.

A instrumentação utilizada teve por objetivo medir poropressões e deslocamentos (verticais e horizontais) nas condições antes, durante e após a construção do aterro, e consistiu de 6 medidores contínuos de poropressão, 2 placas de recalque, vários marcos superficiais e outras ferramentas topográficas. O posicionamento das sondas piezométricas se deu em regiões mais superficiais, até cerca de 2,0 m de profundidade, uma vez que a intenção do estudo era observar as mudanças no terreno a cada novo estágio da fase construtiva, profundidade limitada de influência. Alguns medidores de pressão foram utilizados, inclusive, como ferramentas de monitoramento em tempo real. Algumas constatações importantes obtidas a partir de métodos observacionais aplicados à obra do aterro teste foram as seguintes: - Poropressões muito elevadas nas camadas superiores do depósito foram registradas durante a construção do aterro teste com medidores posicionados até cerca de 2 m de profundidade tal como mostrado na Figura 3;

Figura 3. Leitura de medidor de poropressão antes, durante e após a construção, e elevação do nível d’água do depósito

- Muitas ocorrências de mecanismos de alívio de poropressão tipo sand boils e trincas de alívio foram observadas em diversos

momentos da construção como indicados na Figura 4;

Figura 4. Manifestações de Sand Boils na Baia 2

- Surgências de água (encharcamento) foram observadas nos arredores do aterro teste durante a construção do forro numa área onde o NA original estava a 70 cm de profundidade. Essa subida do NA mostrada na Figura 5 deve estar associada aos altos valores de poropressão gerados pela obra (Figura 3), uma vez que não estava sendo lançado material na área há tempos e a sobrecarga imposta ao terreno (baixa) isoladamente não produziria este efeito de tamanha magnitude;

Figura 5. Surgências de água na superfície da Baia 2

- Deslocamentos verticais e horizontais das placas de recalque significativos, considerando-se a escala que eles representavam; e

(a)

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- Quanto à movimentação dos marcos superficiais instalados nos taludes e offsets do aterro teste, o que é relevante deste últimos além do deslocamento horizontal é o levantamento do terreno, que variou de 6 a 28 cm.

Por todos esses pontos parece conclusivo que o horizonte mais superficial da baia 2 apresenta camadas com real potencial de liquefação . 4 MEDIDAS PREVENTIVAS PARA CONSTRUÇÃO EM SOLOS SUSCEPTÍVEIS À LIQUEFAÇÃO Pelas considerações expostas nos itens anteriores, é notório que os rejeitos armazenados na baia 2 apresentam características que os tornam susceptíveis à liquefação. No entanto, é importante ressaltar que o fato de um terreno ser potencialmente susceptível à liquefação não implica que o fenômeno acontecerá. Para que isso não ocorra, algumas recomendações sobre construções neste tipo de depósito são feitas a seguir:

- Realizar um acompanhamento contínuo das obras, registrando todas as informações relevantes na forma de um histórico ou diário de obra, de modo que os responsáveis atuais ou qualquer um interessado possam ter acesso a esse conhecimento sobre a estrutura e o depósito onde ela está assente; - Prestar atenção em indicadores do fenômeno da liquefação, ou seja, no surgimento de sand boils ou trincas de alívio de poropressão na superfície do terreno no entorno das obras, pois esses mecanismos indicam que poropressões consideráveis estão sendo geradas; - Ter como prática a instrumentação das obras a fim de conhecer o limite prático da mesma, acompanhando variáveis como: poropressão, deslocamentos e elevação do nível d’água local; - Mudar as características do estado in situ do rejeito de forma a atenuar os problemas com liquefação. Exemplos incluem: rebaixar o nível d’agua subterrâneo e melhorar o escoamento superficial com bombas e drenos;

densificar as camadas de rejeito granular por compactação dinâmica ou vibração, ressecar os rejeitos finos (lamas) e, até mesmo, aumentar a densidade do rejeito na fase de beneficiamento (espessamento); - Ter cuidados de projeto de forma a prevenir rupturas iniciais do tipo: erosão interna, galgamento e/ou desconfinamento, ruptura de talude de jusante as quais podem ser suficientes para um “triggering” de liquefação. Ajuda nesse sentido projetar estruturas de contenção com taludes gerais bastante suaves e eventualmente lançando mão de obras de contenção (reforço) no caso de prevenir instabilidades. Ainda para evitar galgamentos, grande atenção deve ser dada ao dimensionamento hidráulico de extravasores, borda livre e volumes de espera do reservatório. - Introduzir elementos filtrantes verticais no depósito (“wick drains”, colunas de areia ou brita, etc.) de modo a aliviar poropressões associadas a métodos construtivos tipo ponta de aterro geradas antes ou após a construção. 3 CONCLUSÕES As metodologias existentes de avaliação do potencial de liquefação com base em ensaios de cone mostraram-se consistentes na análise de um deposito de rejeitos e indicaram sua susceptibilidade. A mesma conclusão foi também alcançado por método observacional a partir da ocorrência de indicadores de liquefação quando da construção de um aterro teste sobre o depósito. Foram registrados o surgimento de muitos sand boils, trincas de alívio e uma subida do nível d’água no entorno do aterro teste (encharcamento). Apesar de demonstrado o potencial de liquefação, foi indicado no trabalho claramente que medidas preventivas podem inibir a deflagração do fenômeno da liquefação, evento de uma natureza por demais perigosa para estruturas de reservação como barragens de rejeitos. AGRADECIMENTOS

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Os autores agradecem o papel essencial da empresa mineradora Samarco S. A. que possibilitou a realização do experimento do aterro teste e também permitiu a divulgação deste trabalho. Esse agradecimento também deve ser estendido à FAPEMIG pelo seu suporte financeiro também empregado nesta pesquisa através da TEC APQ-3507-5.07/07. O primeiro autor também agradece ao CNPq a bolsa de mestrado. REFERÊNCIAS Ávila, J. P de (2007). Seminário Interno de Geotecnia e

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