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Londrina 2015 PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO MESTRADO EM METODOLOGIAS PARA O ENSINO DE LINGUAGENS E SUAS TECNOLOGIAS ELIANA CRISTINA SCHEUER LITERATURA, ENSINO E TECNOLOGIA: possibilidades de aprendizagem em sala de aula

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  • Londrina 2015

    PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO MESTRADO EM METODOLOGIAS PARA O ENSINO DE LINGUAGENS E SUAS

    TECNOLOGIAS

    ELIANA CRISTINA SCHEUER

    LITERATURA, ENSINO E TECNOLOGIA: possibilidades de aprendizagem em sala de aula

  • ELIANA CRISTINA SCHEUER

    LITERATURA, ENSINO E TECNOLOGIA:

    possibilidades de aprendizagem em sala de aula

    Dissertação de Mestrado apresentada à UNOPAR, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Metodologias para o Ensino de Linguagens e suas Tecnologias. Orientador: Profa. Dra. Rosemari Bendlin Calzavara

    Londrina 2015

  • ELIANA CRISTINA SCHEUER

    MESTRADO EM METODOLOGIAS PARA O ENSINO DE

    LINGUAGENS E SUAS TECNOLOGIAS

    Dissertação de Mestrado apresentada à UNOPAR, como requisito parcial para a

    obtenção do título de Mestre em Metodologias para Ensino de Linguagens e suas

    Tecnologias conferida pela Banca Examinadora formada pelos professores:

    Profª. Drª. Rosemari Bendlin Calzavara

    Universidade Norte do Paraná – UNOPAR

    Prof. Dr. Anderson Teixeira Rolim

    Universidade Norte do Paraná - UNOPAR

    Prof. Dr. Givan José Ferreira dos Santos

    Universidade Federal tecnológica do Paraná - UTFPR

    Londrina, 15 de maio de 2015.

  • Agradeço a Deus por tudo, em tudo e com tudo. (1Tessalonicenses 5,18)

  • AGRADECIMENTOS

    À Prof.ª. Drª. Rosemari Bendlin Calzavara, por sua acolhida e acompanhamento imprescindível e constante na orientação e pelas palavras encorajadoras em todos os momentos deste percurso. À Prof.ª. Drª Samira Fayez Kfouri, coordenadora do curso, pelo apoio nos momentos necessários. Aos professores do Programa de Mestrado em Metodologias para o Ensino de Linguagens e suas Tecnologias. Aos professores: Dr. Anderson Teixeira Rolim e Dr. Givan José Ferreira dos Santos, que, juntamente com minha orientadora, contribuíram, valiosa e significativamente. Aos funcionários, pela atenção e colaboração diante de nossas necessidades. À Prof.ª Andrea Cristina e os alunos colaboradores desta pesquisa, por possibilitarem a coleta de dados, a participação em suas aulas e a partilha dos resultados. Aos colegas do mestrado e, em especial, a Ana Carla Barbosa Santi, Afife Fontanini e Adilson Fernandes da Cruz, amigos queridos com os quais pude partilhar aulas, trabalhos, congressos, choros e risos durante o curso. Aos colegas do Sindicato Rural de Londrina que se revezaram para agilizar os trabalhos em minha ausência, de modo especial, a Narciso Pissinati, pela liberação, e a Angelita e Michele, pelas responsabilidades assumidas. À minha mãe, pela oração frequente. Às sobrinhas, Bárbara e Beatriz, pelo bem-estar, bons papos, boa música, carinho, alegria e pela demonstração diária de preocupação com o trabalho. Ao meu cunhado, Ailton, pelo apoio constante. À Eliza, irmã amada, que sempre acreditou em minha capacidade e incentivou a constantes buscas, aguçando minha vontade de crescer e de viver. Obrigada pela companhia, pelos conselhos, pelo olhar crítico e pelo café. Amo você ainda. A Deus, Senhor de todas as coisas, pela presença constante em minha vida.

  • SCHEUER, Eliana Cristina. LITERATURA, ENSINO E TECNOLOGIA: possibilidades de aprendizagem na sala de aula 2015. 101 f. Dissertação (Mestrado em Metodologias para o Ensino de Linguagens e suas Tecnologias) – Universidade Norte do Paraná – UNOPAR, Londrina, 2015.

    RESUMO Este trabalho teve como objetivo geral investigar a visão dos alunos sobre literatura e o uso das tecnologias na escola, buscamos, por meio dos objetivos específicos (a) pesquisar os conhecimentos dos alunos sobre tecnologia, (b) mapear os instrumentos utilizados, no sentido de ver se os alunos identificam o gênero literário e sua importância para o ensino e (c) verificar, na visão do aluno, de que forma a tecnologia pode ser utilizada em sala de aula e qual a sua relevância. Para atingirmos tais objetivos, fomos a campo e realizamos uma pesquisa qualitativa, tendo como instrumento o questionário, na 1ª série do Ensino Médio, em uma escola pública localizada na região central da cidade de Londrina, Estado do Paraná. Para compreender e encontrar caminhos, respaldamo-nos em teóricos como Vygotsky (1999), Marcushi (2004), Santaella (2014), Rojo (2013), Lévy (2006, 2010), Chartier (1999), Silva, (2005), Zilbermann (1988, 1993), dentre outros, que através de suas reflexões e experiências nos proporcionam fundamentações que auxiliam tanto na compreensão do universo escolar como no processo de ensino e aprendizagem mediados pelas novas tecnologias. Para trilhar esse caminho, o desenvolvimento teórico deste trabalho parte de uma breve retrospectiva do ensino no Brasil com suas implicações diante da inserção das novas tecnologias e o ser professor diante desse novo contexto. A análise dos dados nos indicou que houve mudanças consideráveis na prática social do aluno e também nos apontou que elas, timidamente, adentram na escola. Isso demonstra que ainda temos uma lacuna entre o que ocorre na sociedade, junto às práticas sociais, e as ações desenvolvidas em sala de aula, enquanto mediações que visam ao desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem e a construção do saber. Assim, o desafio não se restringe ao aluno, mas, sobretudo, ao professor, pois é preciso compreender duas questões essenciais: as questões que envolvem o ensino da literatura estão presentes em nossa vida; a tecnologia não substitui o professor, ela é uma ferramenta que possibilita a construção não de um saber, mas dos saberes (LÉVY, 2006, 2010). Palavras-chave: Literatura. Ensino. Leitura. Tecnologia.

  • SCHEUER, Eliana Cristina. Literature, teaching and technology: learning possibilities in the classroom. 2015. 101 p. Dissertation (Master degree in Methodologies to the Languages Teaching and its Technologies) – North of Paraná University (UNOPAR), Londrina, 2015.

    ABSTRACT This work had aimed as general objective the students’ view about literature and the usage of technology at school. We have sought through the specific objectives (a) researching the students’ knowledge about technology, (b) mapping the used tools in order to check if the students are able to identify the literary genre and its teaching importance and (c) verifying, under the student’s point of view, what form of technology can be used in the classroom and what is its relevance. To reach these objectives we did a field, qualitative research, having a questionnaire as an instrument, answered by student from the first grade of high school of a public school located in the central area in the city of Londrina, State of Paraná. To understand and find ways, we were based on theorists like Vygotsky (1999), Marcushi (2004), Santaella (2014), Rojo (2013), Lévy (2006, 2010), Chartier (1999), Silva, (2005), Zilbermann (1988, 1993), among others that through their reflections and experiences provide us with foundations that assist both the understanding of the school universe and the teaching and learning process mediated by new technologies. To walk this path, the theoretical development of this paper presents a brief retrospective of education in Brazil with its implications on the integration of new technologies and being a teacher in this new context. The data analysis showed us that there were considerable changes in the student’s social practice and pointed us that they shyly entered the school. It shows yet a gap between what happens in the society, with the social practices, and the actions developed in the classroom, as mediations that aim to development of the teaching-learning process and the construction of knowledge. Therefore, the challenge is not restricted to the student, but, above all, to the teacher, since it is necessary to understand two essential points: the questions that involve the literature teaching are in our lives; the technology does not replace the teacher, it is a tool that enables the construction of not one learning aim, but of knowledge (LÉVY, 2006, 2010). Keywords: Literature. Teaching. Reading. Technology.

  • LISTA DE FIGURAS

    Figura 1 Foto da Praça São Pedro no Vaticano em 2005 e 2013............. 37

    Figura 2 Circulação da Informação........................................................... 38

  • LISTA DE IMAGENS

    Imagem 1 Quais são as gerações do Brasil................................................ 25

    Imagem 2 Representação do aluno A......................................................... 81

    Imagem 3 Representação do aluno B......................................................... 82

    Imagem 4 Representação do aluno B......................................................... 84

  • LISTA DE GRÁFICOS

    Gráfico 1 Idade dos alunos........................................................................ 52

    Gráfico 2 Sexo dos Alunos......................................................................... 53

    Gráfico 3 Tem acesso a computadores?................................................... 53

    Gráfico 4 Local em que tem acesso........................................................... 54

    Gráfico 5 Como é o acesso........................................................................ 55

    Gráfico 6 Acessa a internet através de ..................................................... 56

    Gráfico 7 Usa a internet com que frequência............................................. 58

    Gráfico 8 Usa o computador e a internet para........................................... 59

    Gráfico 9 Gosta de ler?.............................................................................. 60

    Gráfico 10 O que gosta de ler?.................................................................... 61

    Gráfico 11 O que lê com frequência? .......................................................... 62

    Gráfico 12 Onde você lê mais?.................................................................... 63

    Gráfico 13 Com que frequência lê os materiais assinalados?..................... 64

    Gráfico 14 Com que objetivo você lê?......................................................... 65

    Gráfico 15 Palavras que pertencem à família literária................................. 66

    Gráfico 16 Você acha que a escola deve fazer uso das novas tecnologias para ensinar? .............................................................................

    67

  • LISTA DE TABELAS

    Tabela 1 Relação formação/docência dos anos finais do ensino fundamental.. 48

    Tabela 2 IDEB da escola.................................................................................... 49

    Tabela 3 Qual a importância da leitura para você?............................................ 68

    Tabela 4 Qual a importância, para você, do ensino de literatura na escola?..... 69

    Tabela 5 Na sua opinião, como a tecnologia pode auxiliar o ensino?............... 71

  • LISTA DE ABREVIATURAS OU SIGLAS

    ANATEL Agência Nacional de Telecomunicações

    CELEM Centro de Línguas Estrangeiras Modernas

    DITEC Diretoria de Tecnologia Educacional

    ENIAC Eletronica Numeral Integrator and Computer

    FGV Fundação Getúlio Vargas

    FUNDEB Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação

    FUNDEF Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério

    IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas

    IDEB Índice de Desenvolvimento do Ensino Básico

    LDB Lei de Diretrizes e Bases

    MEC Ministério da Educação

    PCN Parâmetros Curriculares Nacionais

    PNE Plano Nacional de Educação

    PPP Projeto Político Pedagógico

    PROINFO Programa Nacional de Informática na Escola

    PRONINFE Programa Nacional de Informática Educativa

    SEA Simpósio de Ensino e Aprendizagem

    SEaD Secretaria de Educação à Distância

    SEED Secretaria de Estado de Educação

    TIC Tecnologias da Informação e Comunicação

    UCA Um Computador por Aluno

    UIT União Internacional de Comunicação

    UNIR Universidade Federal de Rondônia

    UNOPAR Universidade Norte do Paraná

    UTFPR Universidade Tecnológica Federal do Paraná

  • SUMÁRIO

    1 INTRODUÇÃO............................................................................................ 13

    2 BREVE RETROSPECTIVA DO PROCESSO DE ENSINO NO BRASIL... 16

    2.1 PROCESSOS DE LEITURA NA ESCOLA............................................... 24

    2.2 O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA: NOVAS TECNOLOGIAS........ 32

    2.3 SER PROFESSOR DIANTE DO NOVO CONTEXTO TECNOLÓGICO. 35

    3 METODOLOGIA DA PESQUISA............................................................... 45

    3.1 CONTEXTUALIZAÇÃO DA PESQUISA.................................................. 46

    3.2 PERFIL DA PROFESSORA SUJEITO..................................................... 49

    3.3 PERFIL DOS ALUNOS............................................................................ 50

    4 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS........................................... 52

    4.1 A LEITURA DA LITERATURA NA ESCOLA VIA PORTIFÓLIO.............. 74

    4.2 O PORTIFÓLIO........................................................................................ 76

    4.4 PORTIFÓLIO LITERÁRIO MATERIALIZADO.......................................... 78

    5 CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................ 86

    REFERÊNCIAS.............................................................................................. 89

    APÊNDICES................................................................................................... 94

    APÊNDICE A – INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS.......................... 95

    ANEXOS......................................................................................................... 99

    ANEXO A – MATERIAL USADO PELOS JESUÍTAS PARA CATEQUIZAR

    OS ÍNDIOS.....................................................................................................

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  • 1 INTRODUÇÃO

    Em pleno século XXI, momento em que imperam a ciência e a tecnologia, é

    pertinente recordar que o ensino, no Brasil, começou por meio da utilização de

    ferramentas como lápis, papel, giz, lousa… Depois, vieram as máquinas de

    datilografar, os mimeógrafos, as máquinas de xerox e, por fim, os computadores.

    Imensos, no início (anos de 1940), o computador era denominado Electronica

    Numeral Integrator and Computer (ENIAC)1, pesava toneladas e chegava a ocupar

    um andar inteiro de um prédio. Ao longo dos anos, entretanto, eles foram sendo

    aprimorados e aperfeiçoados até chegarem aos modelos existentes hoje, que,

    praticamente, podem ser alocados no bolso (LÉVY, 2006).

    Essas asserções levam a uma reflexão sobre questões que envolvem a

    literatura, o ensino e a tecnologia em sala de aula, na atualidade, ou seja, são um

    convite à reflexão sobre as novas abordagens possíveis para o ensinar e o aprender

    (ROJO, 2013). Estas abordagens envolvem, sobretudo, a mediação do professor

    (VYGOTSKY, 1999).

    Assim, com base na pergunta investigativa motivadora deste trabalho, este

    estudo buscou descobrir qual a visão do aluno do ensino público sobre literatura e o

    uso das tecnologias na escola para o processo de ensino-aprendizagem?

    Para trilhar esse caminho na escola foco do estudo, optamos pela pesquisa

    qualitativa, e os instrumentos utilizados para tal foram um questionário e anotações,

    em diário, resultantes do contato com a professora responsável pela disciplina de

    literatura. Nesse cenário, focamos investigar a importância da literatura e da

    tecnologia na prática social do aluno. Desse modo, foi necessário estudar o papel

    atribuído ao professor no decorrer do processo educacional brasileiro, de seu início

    1 Considerado o primeiro computador a usar eletrônica digital, pesava 30 toneladas, media 25 metros

    e tinha 17.468 válvulas e o tamanho de uma sala com 180 m2. Seus inventores: John P. Eckert, John W. Mauchly e mais tarde completou a equipe, John von Neumann, juntos, demoraram três anos para construí-lo para fins militares. Funcionou pela primeira vez em 14 de fevereiro de 1946, na Universidade da Pensilvânia. Foi chamado pela imprensa da época de "Einstein Mecânico" e/ou de "Frankenstein Matemático". In: < http://www.fundacaobradesco.org.br/vv-apostilas/mic_pag2.htm> Acesso em 05 abril. 2015.

    http://www.fundacaobradesco.org.br/vv-

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    até a atualidade, momento em que se insere, de modo cada vez mais intenso, a

    tecnologia.

    Em busca de compreender melhor o tema em questão e de encontrar

    caminhos para responder a indagação proposta, este estudo respaldou-se em

    teóricos como Vygotsky (1999), Marcushi (2004), Santaella (2014), Rojo (2013),

    Lévy (2006, 2010), Chartier (1999), Silva, (2005), Zilbermann (1988, 1993), dentre

    outros, que, através de seus escritos e de suas reflexões e experiências,

    possibilitaram a investigação e a compreensão do universo escolar e do processo de

    ensino e aprendizagem mediados pelas novas tecnologias.

    Diante disso, foi delimitado o objeto de estudo e foram estabelecidas ações

    para investigar a visão dos alunos sobre a literatura e o uso das tecnologias na

    escola, além da mediação do professor nesse contexto, com base nos seguintes

    objetivos específicos: a) Mapear os conhecimentos dos alunos sobre tecnologia,

    bem como os instrumentos utilizados; b) Investigar se os alunos identificam o gênero

    literário e se reconhecem sua importância para o ensino; e c) Verificar, na visão do

    aluno, de que forma a tecnologia pode ser utilizada em sala de aula e sua

    relevância.

    Por uma questão didático-metodológica, o presente trabalho foi organizado

    em cinco seções. A primeira seção explicita os elementos essenciais da pesquisa.

    Na segunda seção, apresenta-se uma breve retrospectiva sobre o processo

    educacional brasileiro e, como desdobramento das leituras realizadas, discute-se

    questões relacionadas à leitura, ao ensino de língua portuguesa, à inserção das

    novas tecnologias e à postura do professor diante do contexto tecnológico vigente.

    Na terceira seção, discorre-se sobre o percurso metodológico adotado para a

    consecução dos objetivos almejados, já citados. Para tanto, nessa seção,

    apresentam-se a metodologia, o local da pesquisa e o perfil da professora-sujeito e

    dos alunos.

    Na quarta seção, são apresentados e analisados os dados da pesquisa. A

    validação dos dados teve como base o construto teórico pesquisado, que

    fundamentou a análise dos dados coletados (perfil e diagnóstico levantado através

    dos questionários e da observação da prática em sala de aula) e a leitura dos

    mesmos pela pesquisadora.

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    Por fim, a quinta seção compreende as considerações finais sobre os

    processos de leitura na escola, apresentando a síntese das discussões

    empreendidas para desvendar as relações entre leitura, literatura e tecnologia no

    espaço escolar.

  • 16

    2 BREVE RETROSPECTIVA DO PROCESSO DE ENSINO NO BRASIL

    Há várias formas de se dominar um povo, porém, em todas, observa-se a

    repetição de um ato: a imposição da língua e da crença do dominador. Com a

    história da educação brasileira não foi diferente. No Brasil, tudo começou com a

    questão do descobrimento, mais especificamente, com a chegada de europeus

    altamente motivados por fatores econômicos.

    No cenário do descobrimento de nosso país, segundo Romanelli (1986),

    dentre os europeus, destacam-se os portugueses, representados por Pedro Álvares

    Cabral que simbolizava a elite da nação dominadora. A relação da burguesia

    (Estado) com a Igreja, na época, era de parceria, visto que havia interesses

    financeiros mútuos envolvidos.

    Assim, com a chegada dos portugueses em solo brasileiro e com a decisão

    de que os nativos que nele viviam deveriam ser subjugados, ocorre um dos

    primeiros atos de dominação educacional, motivado por permissões e acordos feitos

    entre a corte portuguesa e a Igreja, cujo resultado foi a vinda de diversas ordens

    religiosas para a terra conquistada, com a finalidade de salvar2 os índios.

    No âmbito das ordens religiosas, observa-se que o ensino sempre foi

    prioridade. Embora a ordem dos jesuítas tenha se destacado (1549 a 1759), antes

    destes vieram os franciscanos (1500 a 1549), que foram os primeiros a aportarem

    no Brasil com a caravana de Pedro Álvares Cabral, quando foi rezada a primeira

    missa pelo Frei Henrique Soares de Coimbra. Depois, chegaram os beneditinos

    (1580), os carmelitas (1584), dentre outros3.

    Cada denominação, conforme seus preceitos e sua ótica, começou um

    trabalho com os índios habitantes das terras conquistadas, visando a impor sua

    língua e sua forma de pensar. Iniciam-se, então, as mudanças sócio-político-cultural-

    2 Usou-se o termo salvar porque o conhecimento que o indígena possuía, tanto sobre o espaço

    geográfico como sobre sua língua/crença, não era considerado, pois a Igreja defendia que, caso os nativos não tivessem acesso à língua e à crença dos portugueses, estariam destinados ao inferno, conforme ilustrado no anexo nº. 2.

    3 Os Franciscanos preocupavam-se com a assistência espiritual dos moradores das vilas e seus escravos; os Carmelitas eram muito abertos ao recebimento de doações e terras/casas/gado/escravos; os Beneditinos eram proprietários de extensas fazendas; os Mercedários voltaram-se para a catequização dos indígenas da Amazônia e se transformaram em abastados fazendeiros; por fim, os Capuchinhos dedicavam-se ao Apostolado popular (ROMANELLI, 1986).

  • 17

    educacionais de um povo: andar nu4 é considerado pecado; os índios precisam

    aprender a língua dos colonizadores, mudar seus costumes e romper com toda

    crença, cultura e educação anteriormente recebidas de seus ancestrais

    (ROMANELLI, 1986).

    Entretanto, mudar um adulto, com sua história de vida, crenças, hábitos e

    costumes já internalizados, é muito difícil, assim, os jesuítas optaram por investir na

    educação infantil, pois os pequenos poderiam disseminar os conhecimentos

    adquiridos na escola jesuítica entre os membros de suas famílias (ROMANELLI,

    1986, p.34).

    O conteúdo ensinado na escola jesuítica tinha o objetivo de difundir a doutrina

    cristã e a cultura europeia, entretanto, não fazia uma ponte com a vivência do aluno

    e, consequentemente, não despertava o interesse das crianças para o aprendizado.

    Segundo Romanelli (1986), os conteúdos:

    [...] que os padres jesuítas ministravam eram completamente alheios à realidade da vida da colônia. Desinteressado, destinado a dar cultura geral básica, sem a preocupação de qualificar para o trabalho [...] não podia, por isso mesmo, contribuir para modificações estruturais na vida social e econômica do Brasil, na época (ROMANELLI, 1986, p.34).

    Essa primeira experiência educacional brasileira se deu em um contexto

    histórico e espacial específico, pois, para garantir a posse da terra e explorar, de

    forma mais eficiente, as riquezas locais, Portugal dividiu a colônia em capitanias

    hereditárias, cada qual com seu governo. O intuito principal era a extração de

    madeira, ouro, pedras preciosas e minérios, que seriam transportados para Portugal.

    (RIBEIRO, 1984).

    Percebe-se, assim, que a educação já começou atrelada à economia e aliada

    aos objetivos políticos dos governadores gerais, que podem ser sintetizados em

    dois: (i) extrair riquezas; e (ii) enviar todo produto extraído para fortalecer,

    economicamente, Portugal. Para que tal projeto fosse concretizado, um quesito era

    essencial: ter mão de obra.

    Para resolver o problema da falta de mão de obra, a primeira opção foi a

    4 Pero Vaz de Caminha relata em sua carta: “Eram pardos, todos nus, sem coisa alguma que lhes

    cobrisse suas vergonhas”. In: .

    http://objdigital.bn.br/Acervo_Digital/Livros_eletronicos/carta.pdf

  • 18

    exploração do trabalho indígena. Entretanto, os nativos não eram acostumados ao

    trabalho, pois, no contexto de sua cultura, não havia razões para produzir e

    armazenar mais do que o necessário para sobreviver, assim, por não terem esse

    tipo de ambição, foram considerados indolentes e preguiçosos (BARROS, 2000),

    quando, na verdade, não aceitavam, passivamente, a escravidão imposta, devido à

    sua natureza livre.

    Diante disso, a opção foi o trabalho escravo. Nesse momento, houve uma

    grande contradição histórica, visto que os padres queriam catequizar o povo com a

    alegação de que almejavam salvá-lo da ignorância, contudo, eram favoráveis ao

    trabalho escravo. Com isso, a mão de obra dos negros, oriundos da África, foi bem-

    vinda e explorada (ROMANELLI, 1986).

    Nesse momento histórico, houve o primeiro rompimento no que diz respeito à

    educação, pois foi imposto ao nativo um novo paradigma cultural, desrespeitando-se

    a educação própria dos povos primitivos que aqui habitavam. Esses povos tinham

    sua cultura e costumes, que foram expurgados em nome de uma nova educação à

    moda europeia (ROMANELLI, 1986).

    Ao longo da história da humanidade, embora o contexto seja outro em cada

    momento, essas rupturas continuaram acontecendo, e, atualmente, não é diferente.

    Elas se manifestam cada vez que um país é explorado por outro, que lhe impõe sua

    língua, crença e saber.

    Essa busca pelo passado ajuda a compreender o presente, ou seja, auxilia no

    entendimento de algumas das múltiplas e contraditórias variáveis que envolvem o

    ensino atual. Assim, com o objetivo de apresentar um contexto geral, investigou-se o

    surgimento das primeiras escolas brasileiras, pois a escola atual é fruto destas.

    As primeiras escolas surgiram com os jesuítas com o objetivo da conversão

    dos indígenas, por meio da catequese e da instrução5. A organização escolar estava

    estreitamente vinculada à política colonizadora dos portugueses (RIBEIRO, 1984;

    ROMANELLI, 1986). Nessa época, o plano legal e o plano real educacional já se

    distanciavam. Enquanto os índios eram apenas catequizados, os filhos dos

    colonizadores eram instruídos, preparados para o trabalho intelectual.

    A educação jesuítica, entretanto, tornou-se “um empecilho na conservação da

    5 No anexo 2, apresenta-se um exemplo do material didático utilizado pelos padres jesuítas para a

    catequização, material em que já havia a presença tanto da linguagem verbal como da não verbal.

  • 19

    unidade cristã e da sociedade civil porque era detentora de um poder econômico

    que deveria ser devolvido ao governo" (RIBEIRO, 1984, p. 37), pois, conforme

    regulamentava a Coroa, os padres educavam cristãos para “a Companhia e não

    para os interesses do país” (RIBEIRO, 1984, p. 37). Tal percepção fez com que o

    Marquês de Pombal decretasse a expulsão dos jesuítas da colônia. Segundo

    Romanelli (1986):

    Inúmeras foram as dificuldades daí decorrentes para o sistema educacional. Da expulsão até as primeiras providências para a substituição dos educadores e do sistema jesuítico transcorreu um lapso de 13 anos. Com a expulsão, desmantelou-se toda uma estrutura administrativa de ensino. A uniformidade da ação pedagógica, a perfeita transição de um nível escolar para outro, a graduação, foi substituída pela diversificação das disciplinas isoladas. Leigos começaram a ser introduzidos no ensino e os Estado assumiu, pela primeira vez, os encargos da educação (ROMANELLI, 1986, p.36).

    Com Pombal, houve a instituição do Estado laico, pois o poder público passou

    a ser responsável pela definição dos caminhos que deveriam tomar a educação.

    Nesse momento, conforme Ribeiro (1984, p. 37), houve a “instituição do ensino

    público no Brasil. ”

    Sob essa ótica, a educação tornou-se um negócio, e um negócio altamente

    lucrativo. Começou a Cobrança do Subsídio Literário6: taxas sobre a carne, o sal, a

    aguardente, o vinagre e outros produtos. Criou-se um novo imposto em 1772, que foi

    extinto em 1835, denominado Imposto Único, destinado à manutenção do ensino

    primário e secundário. No documento, consta que:

    O Alvará de 28-06-1759 criava o cargo de diretor geral dos estudos, determinava a prestação de exames para todos os professores, que passaram a gozar do direito de nobres, proibia o ensino público ou particular sem licença do diretor geral dos estudos e designava comissários para o levantamento sobre o estado das escolas e professores” (RIBEIRO, 1984, p. 37).

    Como se pode observar, o processo de formação do professor estava criado, 6 Subsídio Literário: um imposto que entrou em vigor em 1772 para pagar o salário dos professores

    régios da época. A cobrança incidia sobre a aguardente e o gado de corte e foi cobrado até 1831, quando a Educação passou a ser incluída em um planejamento administrativo e no orçamento público.

  • 20

    pois, pelo documento, havia o compromisso de acompanhamento deste profissional,

    sobretudo, no que diz respeito à garantia de que a pessoa que fosse ensinar

    estivesse apta para tal. Contudo, a formação docente é uma questão muito

    complexa que envolve vários segmentos, porém, é incontestável que é a política

    governamental, por meio da criação e da implantação de leis, que norteia, direciona

    e, por que não dizer, rege a educação, conforme seus interesses.

    Hoje, pode-se constatar que a educação brasileira continua baseada em

    pontos similares: (i) é responsabilidade do Estado; (ii) trata-se de um direito público,

    inquestionável; e (iii) esses direitos constam na lei maior do Brasil: a Constituição.

    Embora a Constituição tenha sofrido alterações ao longo da história, a Nova

    Constituição Brasileira, promulgada em 1988, em seu artigo 208, estabelece:

    O dever do Estado para com a educação será efetivado mediante a garantia de: I - ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria; II - progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio; III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino; IV - atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade; V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um; VI - oferta de ensino noturno regular, adequada às condições do educando; VII - atendimento ao educando, no ensino fundamental, através de programas suplementares de material didático escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde (BRASIL, 2008, p. 121).

    Além da Constituição Federal e das respectivas constituições estaduais e

    municipais (Leis Orgânicas dos Municípios), deve-se considerar, ainda, as

    referências ao direito à educação por parte de outros documentos oficiais, como o

    Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei Federal nº 8.069, de 13 de julho de 1990)

    e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, doravante LDB (Lei Federal nº

    9.394, de 20 de dezembro de 1996).

    No Estatuto da Criança e do Adolescente, há o detalhamento do conteúdo

    material do direito à educação escolar, já a LDB concentra-se em tratar da oferta,

    especialmente, pela regulação dos respectivos sistemas de ensino.

    Não é intenção deste estudo se aprofundar nesses temas, mas apenas trazê-

  • 21

    los à tona para fundamentar questões voltadas ao ensino da literatura e à formação

    do professor. Com base no pressuposto de que a educação é um direito de todos, é

    importante questionar quem vai formar esses 'todos' contemplados na Constituição

    da República do Brasil, em seu artigo 205: “A educação é um direito de todos e

    dever do Estado e da família.”

    De acordo com Saviani (2004), o século XX proporcionou avanços

    educacionais significativos, entre eles: conquistas tecnológicas; democratização e

    universalização do conhecimento; implantação progressiva, nos estados, de escolas

    primárias e formação de professores pelas escolas normais; regulamentação das

    escolas superiores; e promulgação da Lei n. 9.394/96, atualmente, em vigor. Para o

    autor “o longo século XX brasileiro deixou como legado para a educação escolar o

    equilíbrio dialético entre o positivo e o negativo, o que pode apontar caminhos para

    os tempos em devir.” (SAVIANI, 2004, p. 5).

    Dos documentos oficiais à realidade em sala de aula há um longo caminho a

    ser trilhado. Desse modo, é evidente que não dá para viver de marketing, de

    campanhas miraculosas. Não é possível que se continue cantando que para

    aprender a ler não tem hora7 ou, ainda, como na Campanha Brasil Presente (2009),

    cujo slogan dizia que cuidar da educação é cuidar do futuro. Cuidar da educação é

    cuidar da sociedade, e um agente central para o desenvolvimento desta, mais

    especificamente, para o preparo das pessoas que vão viver nessa sociedade, é o

    professor.

    Apesar dos problemas que a escola ainda tem, é ela que se volta para a

    preparação do indivíduo e, para isso, procura debater questões centrais para sua

    formação: a ética, a política, enfim, a vida coletiva (NÓVOA, 1999).

    Mello (1996) já preconizava que uma das opções para mudanças da

    educação brasileira está no contato direto do aluno com o professor, na sala de aula,

    mas, para isso, é preciso encontrar formas que convençam o professor a

    permanecer em sala, com qualidade.

    Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população

    brasileira passou dos 200 milhões de pessoas em 2014.8 Não são mais os “90

    7 Slogan da letra da música de incentivo à leitura do Programa Brasil Alfabetizado. 8 Projeção da População do Brasil < http://www.ibge.gov.br/apps/populacao/projecao/> Acesso 23 jan.

    2015.

    http://www.ibge.gov.br/apps/populacao/projecao/

  • 22

    milhões em ação, pra frente Brasil”9, a população dobrou. O mesmo informativo

    relata que “o déficit de professores é de 170 mil nas áreas de matemática, física e

    química”, mas a situação ainda pode ser agravada diante dos números publicados

    pelo Ministério da Educação (MEC):

    De 2006 a 2011, o número de alunos que entraram em Licenciatura e Pedagogia caiu 7,5%. Em 2011, último ano em que os dados estão disponíveis, foi registrado o menor volume de pessoas que ingressaram nesses cursos desde 2004. Foram 662 mil matriculados em cursos presenciais e na modalidade a distância em todo País. O total de diplomados interrompeu crescimento registrado entre 2000 e 2009. Desde então, já apresentou queda de 11%. Em 2011, 358 mil pessoas formaram-se em Licenciatura ou Pedagogia, formação padrão para atuação na educação básica (do ensino infantil ao médio). Apesar de desaceleração no ritmo de formação, o número de professores no País tem aumentado nos últimos três anos. Em 2012, existiam 2,1 milhões de docentes de educação básica. (SALDAÑA, 2013).

    Diante dessa realidade, é necessário que haja investimento do Estado na

    valorização do professor, em relação a questões de formação, remuneração - que

    tiveram avanços positivos com a implementação do Fundo de Manutenção e

    Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF),

    do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização

    dos Profissionais da Educação (FUNDEB), e com a regulamentação do piso salarial

    do professor, apesar de alguns municípios ainda não o terem implantado -, melhoria

    das condições de trabalho e carreira. Essas ações foram prometidas e se espera

    que sejam implementadas de forma integral e em âmbito nacional, o que pode

    melhorar, significativamente, o panorama atual.

    Essas questões que afligem os atores educacionais vêm sendo discutidas há

    muitos anos, entretanto, muitos dos problemas ainda não foram solucionados.

    Nesse sentido, Geraldi (1993), há mais de duas décadas, logo na introdução de seu

    livro Portos de Passagem, já mapeava o sistema escolar e afirmava que:

    [...] o sistema escolar, em suas unidades de ensino, não possibilita condições de trabalho a seus profissionais que lhe permitam, no trabalho, desenvolver-se e, de outro lado, a existência continuada de programas especiais para

    9 Campanha da Copa do Mundo de 1970.

  • 23

    formação contínua de professores, retirando-os do trabalho para cursos esporádicos que acabam atendendo, aparentemente, a uma minoria e, por isso, não alteram concretamente a ação global do sistema de ensino. (GERALDI, 1993, p. xix)

    Como se pode observar, Geraldi (1993) aponta questões relevantes que

    precisam ser alteradas para que o sistema escolar possa ser eficaz, pois somente

    uma formação concebida com base em outra lente, de esporádica para contínua,

    poderá produzir os efeitos esperados. Essa situação requer ousadia e investimento

    no profissional da educação para que não se corra riscos similares aos que hoje se

    assiste na área da saúde.

    Na área da saúde brasileira, atualmente, o Governo Federal está importando

    médicos para atuar na saúde básica. Essa ação foi necessária devido a três fatores:

    (i) falta de médicos; (ii) baixos salários pagos na rede pública; (iii) falta de

    profissionais dispostos a atuar em regiões de periferia ou de difícil acesso.

    Na educação, a realidade não é diferente. Assim, é preciso encontrar

    caminhos para que não haja falta de professores e de escolas nas regiões mais

    carentes do país. Não dá para imaginar uma ação como a implementada pela área

    da saúde, ou seja, a importação de professores, pois teríamos que lidar com

    barreiras significativas, como a da língua e da cultura, por exemplo. Um dos

    caminhos percorridos pelo Governo foi a criação de cursos profissionalizantes.

    Entretanto, mesmo que se transforme todas as escolas em ensino profissionalizante,

    pensando tão somente no desenvolvimento econômico da nação, o básico, que é

    aprender a ler e escrever, não pode ser uma tarefa terceirizada, como acontece em

    outros segmentos educacionais. Para exemplificar, pode-se citar a prefeitura do

    município de São Leopoldo, no Estado do Rio Grande do Sul, que propôs a

    terceirização da educação infantil no município, e a Secretaria de Educação do

    Estado de Goiás, que anunciou um novo modelo de gestão, por meio de

    organizações sociais.10

    Mediante o exposto, a situação mostra-se mais grave ainda quando se reflete

    sobre os percalços que o profissional da educação enfrenta constantemente, pois a

    sociedade sofreu alterações consideráveis, sobretudo na área tecnológica, e a

    10 Ver: e < http://www.

    jornalvs.com.br/_conteudo/2015/03/noticias/regiao/143067-educacao-pode-ser-terceirizada.html >. Acesso em: 27 abr. 2015.

    http://diariodegoias.com.br/blogs/altair-tavares/9816-os-s-na-educacaohttp://www.

  • 24

    escola não acompanhou esse desenvolvimento. O aluno de hoje tem acesso a um

    aparato tecnológico que o da década anterior não teve. Assim, há a demanda de

    uma nova geração que tem fácil acesso à tecnologia sendo formada por professores

    que não tiveram esse saber. Este fator, muitas vezes, é responsável pelo fato de o

    professor trabalhar com saberes diferenciados das práticas sociais do aluno (ROJO,

    2009).

    Rolim (2015) relata alguns resultados pertinentes sobre a relação e a

    concepção de professores de literatura acerca da tecnologia no ensino:

    Os indicadores da pesquisa “Concepções dos professores sobre o ensino de Literatura: a perspectiva docente” reafirmam o otimismo com as TIC, ao indicar que a imensa maioria dos professores entrevistados crê que a tecnologia pode ter uma influência positiva no ensino de Literatura. Somem-se aí os 90% dos professores que acreditam que a Internet pode colaborar para que os alunos tornem-se leitores frequentes (ROLIM, 2015, p. 24).

    Diante de alunos nativos digitais, cercados por aparelhos tecnológicos e

    professores que têm a percepção de que tecnologia e ensino literário podem

    conversar harmonicamente em sala de aula, é preciso retomar que estratégias estão

    sendo desenvolvidas para aproximar tecnologia e leitura na escola diante de

    algumas dificuldades físicas que permeiam as escolas como: difícil acesso à

    internet, computadores com acesso reduzido, proibição de uso de celular, dentre

    outras.

    2.1 PROCESSOS DE LEITURA NA ESCOLA

    Inúmeros trabalhos já foram realizados com a intenção de desvendar as

    relações entre leitura e literatura no espaço escolar. Dentre eles, destacam-se os de:

    Silva (2005), Dalvi, Rezende e Jover-Faleiros (2013); Jouve (2012); Saches Neto

    (2013); Yunes (2009); e Brait (2010).

    Muitas discussões já foram empreendidas, mas ainda não há um consenso

    sobre a relação: leitura, literatura e escola. O discurso tem sido sempre o mesmo: “o

    mito de que a leitura literária é difícil, complexa e inacessível para os alunos”

    (SILVA, 2005, p.19). Se, subitamente, alguém pedir a uma pessoa que pertence à

  • 25

    “geração X”11 que descreva a primeira imagem que lhe vem à mente quando se fala

    em leitura, possivelmente, esta dirá: a figura estilizada de um adulto com um livro,

    contanto uma estória a uma criança em seu colo ou sentada próximo a ele. Esse

    quadro era constante nos livros didáticos e permanece, praticamente, estanque há

    mais de três décadas.

    A geração Y - pessoas nascidas entre os anos 1980 e meados de 1990 - é

    considerada a geração do computador, das facilidades e da globalização. São

    jovens que consomem tudo o que é eletrônico e, desse modo, a tecnologia acabou

    por afetar, diretamente, as formas de interação dessa geração (VEJA, 2001).

    É importante destacar, entretanto, que não foi somente a geração Y que

    sofreu o impacto motivado pelo desenvolvimento da informática. Com o advento da

    tecnologia, a vida de todos sofreu inúmeras transformações, em todas as gerações.

    Neste contexto, uma das preocupações que têm sido constantes no ensino é como

    formar leitores diante dos avanços tecnológicos e das transformações

    comportamentais dos jovens antenados com as mídias sociais. Eles são, inclusive,

    ditadores de novas formas de comunicação, e o desafio, hoje, é buscar caminhos

    para o novo leitor. Na imagem que segue, estão representadas, numericamente,

    essas gerações no Brasil.

    Imagem 1. Quais são as gerações do Brasil

    Fonte: http://www4.ibope.com.br/download/geracoes%20_y_e_z_divulgacao.pdf

    11 Até pouco tempo atrás, livros e filmes ainda falavam da Geração X, aquela que substituiu os

    yuppies dos anos 80. Os que preferiam o bermudão e a camisa de flanela à gravata colorida e ao relógio Rolex, ícones de seus antecessores. Isso foi no início dos anos 90. Acesso 04 maio. 2014

    http://www4.ibope.com.br/download/geracoes%20_y_e_z_divulgacao.pdfhttp://veja.abril.com.br/idade/exclusivo/jovens/

  • 26

    A própria forma como as avaliações escolares são direcionadas já impulsiona

    para um (re)pensar sobre o ensinar e o aprender. É muito comum constar, em

    provas diversas, textos que remetem à leitura e à literatura no contexto atual. Isso

    aponta que mecanismos de poder, tais como provas e concursos, têm indicado que

    é preciso inovar, rever, repensar as práticas pedagógicas, pois há, ao dispor do

    professor, múltiplas possibilidades metodológicas que visam a atingir uma geração

    de jovens identificados, agora, como geração “Z” ou “geração internética”.

    Conforme artigo da Revista Veja (2001), a geração Z nasceu no século XXI,

    em um mundo globalizado e altamente tecnológico, assim, desde cedo, familiarizou-

    se com as diferentes mídias. O Z que classifica a geração vem de zapear, pois

    esses jovens passam, constantemente, de um canal de televisão para outro e usam

    o celular para inúmeras atividades, pois já nasceram em um mundo onde este era a

    ferramenta principal de comunicação. Assim, a tecnologia da comunicação é algo

    normal para eles, diferente do que foi para gerações mais velhas, que tiveram que

    se acostumar e se adaptar a ela ou se deslumbraram com ela, como a Geração Y.

    Além disso, usam, ao mesmo tempo, diversas ferramentas de comunicação e, como

    recebem uma quantidade altíssima de informação, necessitam selecionar o que lhes

    interessa, o que aprendem com facilidade. Outro fator importante é que,

    naturalmente, devido à globalização da informação, concebem o mundo como um

    espaço sem fronteiras.

    Nesse contexto de excesso de informação, Hannigan (2010, s/n) investigou o

    motivo do desinteresse dos jovens pela leitura em livros, e testemunhou que:

    Parte do meu completo desinteresse (pelos livros) vem do fato de que, no segundo em que um livro é publicado hoje, já está obsoleto. Desde que eu estava na quinta série, era capaz de acessar qualquer informação na internet de forma mais rápida e precisa do que conseguiria fazer em um livro. Além disso, a informação online é gratuita (e se não for, você vai procurar em outro site até encontrar “de graça”). Com um orçamento restrito e recursos grátis ilimitados, existe algum tipo de livro que poderia atrair meu interesse? (HANNIGAN, 2010, s/n).

    Os motivos expostos por Hannigan (2010) constituem características

    relacionadas à geração “Z”, ou seja, aos adolescentes de hoje, que são atentos às

    mudanças tecnológicas e possuidores de certo poder aquisitivo, fruto de uma

  • 27

    atividade laboral que começa cedo, visando à própria independência financeira, pois

    esta possibilita a aquisição de objetos de desejo, tais como smartphones, notebooks,

    tablets, ipod, ipad, entre outros.

    Nas últimas décadas, estes objetos estão se tornando descartáveis,

    devido à forma acelerada com que têm sido aperfeiçoados. Assim, há uma nova

    necessidade a todo momento: a troca. A justificativa dessa ação sedimenta-se em

    uma questão sócio-econômica-afetiva: acompanhar e adquirir as mesmas

    tecnologias utilizadas pelo grupo ao qual o jovem pertence, para que haja maior

    identificação social.

    Nesses grupos sociais, a comunicação torna-se cada dia mais intensa e

    constante, motivada pelas facilidades proporcionadas por aparelhos sofisticados e

    por diversos programas de troca de mensagens que se renovam e se remodelam

    constantemente, tais como o Facebook12, o WhatsApp13 e o Instagram14, que

    possibilitam ainda mais interação entre as pessoas, sem que estas precisem sair de

    casa (ROJO & MOURA, 2012).

    Segundo Rojo (2013), essa é uma geração de adolescentes que se conectam

    24 horas por dia nas redes sociais, por conseguinte, as notícias dos grupos sociais

    nos quais estão inseridos chegam até eles em tempo real. A rapidez na

    comunicação os deixa extasiados, pois podem criar espaços imaginários e

    simbólicos de ter, ser e poder. Como consequência, essas novas mídias

    transformaram os hábitos de leitura dessa geração. Conforme Rojo:

    Não basta mais a escola enfatizar os letramentos da letra e os gêneros discursivos15 da tradição e do cânone. É urgente enfocar os

    12 Facebook: é um site e serviço de rede social que foi lançado em 4 de fevereiro de 2004, operado e

    de propriedade privada da Facebook Inc. 13 WatsApp: é um aplicativo de mensagens multiplataforma que permite a troca mensagens pelo

    celular sem pagar por SMS. 14 Instagram: é uma rede social on-line de compartilhamento de foto e vídeo que permite aos seus

    usuários tirar fotos e gravar vídeos, aplicar filtros digitais e compartilhá-los em uma variedade de serviços de redes sociais.

    15 A diferenciação terminológica entre gêneros textuais e gêneros discursivos é estabelecida por Rojo (2005), devidamente sedimentada em estudos nacionais e internacionais. A estudiosa observou que, embora o trabalho com gêneros seja o ponto assonante, o dissonante está relacionado às categorias analíticas, pois estas são distintas. Antes, porém, destacamos que seguidores do Círculo Bakhtiniano, adotam a terminologia “gêneros discursivos”. Já os pesquisadores que seguem os estudos do Grupo de Genebra, dos quais destacamos Bronckart (1999) e Dolz e Schneuwly (1996), usam a terminologia “gêneros textuais”. Informamos que a primeira nomenclatura é nossa opção, devido à afinidade teórico-metodológica.

  • 28

    multiletramentos e os novos letramentos que circulam na vida contemporânea de nossos alunos. [...] Os “cenários futuros” (ou presentes) para as escolas devem incluir a leitura e a escrita de gêneros de texto multissemióticos ou multimodais (compostos por todas as linguagens, para significar e funcionar) e os multiletramentos e novos letramentos requeridos pelas práticas em que estão inseridos (ROJO, 2013, p. 19).

    De acordo com Rojo (2013, p. 9), da mesma forma que a escola alfabetizava

    para ensinar a assinar o nome, ler pequenos textos (no século XIX) e, depois, textos

    mais complexos (século XX), agora, é preciso “letrar para esses novos textos que se

    valem de várias linguagens. ” É preciso observar que, em função do avanço

    tecnológico, ocorrem mudanças na sociedade e estas impulsionam as

    transformações nos gêneros textuais.

    Assim, da mera linguagem verbal e não verbal, passa-se para a multimodal,

    que recebe influência direta das práticas sociais e, dentro dessas práticas, estão,

    intrinsecamente, ligados aspectos que interferem no gênero, tais como: o suporte, o

    destinatário, o objetivo, o tema, o estilo, entre outros.

    Essas transformações dos gêneros eclodem no espaço escolar, em sala de

    aula e, mais especificamente, no professor, pois cada aluno traz para a escola um

    saber, assim, em seu cotidiano, o educador se defronta com múltiplas culturas e

    com formas diversificadas de leitura, pois, enquanto um gosta de ler na internet,

    outro busca a leitura do clássico no papel. Nesse contexto, para Rojo:

    Com as novas tecnologias, os textos sofreram mudanças significativas. Agora, imagem e som também devem ser considerados nas leituras e a escola necessita incorporar práticas relacionadas a um conceito nascido há mais de 15 anos: o de multiletramentos. Assim, tratar os textos, compreendê-los e produzi-los passa a levar em conta linguagens como a fotografia, o áudio e o vídeo (ROJO, 2013, p. 7).

    As reflexões de Rojo (2013) corroboram estudos realizados por Hannigan

    (2010), que, no final de seu livro, questiona a si mesma, dizendo: “existe algum tipo

    de livro que poderia atrair meu interesse? ” Em sua resposta, relata:

    [...] sim. Em uma aula de marketing de nível superior, foram indicados três livros [...]. Eu pedi esses livros online, porque a livraria não tinha em

  • 29

    estoque e enquanto eu esperava a encomenda, economizava para pagar, porque queria todos novos. [...] li esses livros de capa a capa [...] Todos eles oferecem informações abrangentes sobre as estratégias de marketing inovadoras, o que me mantém focado e me faz sentir como uma fonte. Quando leio esses livros, eu me sinto inteligente [...] (HANNIGAN, 2010, p. s/n).

    Pelas asserções acima, depreende-se que ler é uma prática social, é um

    comportamento adquirido, inicialmente, na cultura familiar, e, depois, ao longo de

    aprendizagens felizes. Marinho & Silva (1998, p. 64) afirmam que o leitor

    apresentado por Proust: “é leitor antes mesmo de abrir o livro”, pois a leitura se inicia

    pela interpretação da capa, do título, e pelo conhecimento do autor e do gênero

    literário, facilitado pelo texto das orelhas, da capa e da contracapa, e se completa

    pela identificação de cada parte do livro, o que possibilita a associações do mesmo

    com outros e o enamorar-se pela obra.

    A partir das reflexões anteriores, infere-se que, para ser um leitor, é preciso

    ter a curiosidade aguçada. É neste momento que entra o professor-mediador, que

    deve se utilizar de diferentes técnicas para aproximar o aluno da leitura

    (VYGOTSKY, 1999). O educador deve procurar livros com apelos visuais, temas que

    aproximem o aluno de suas vivências e obras com linguagem atrativa, e considerar

    que “ser leitor é uma questão de postura e de hábito” (MARINHO & SILVA 1998, p.

    68).

    Nesse contexto, pode-se perguntar: Como fica a questão da tecnologia?

    Neste estudo, entende-se a tecnologia como uma ferramenta altamente atrativa que

    pode auxiliar na construção do conhecimento. As mídias sociais tendem a ser

    grandes aliadas na formação do ser leitor, pois podem colaborar para a construção

    de uma nova geração de leitores. Rojo (2013, p. 21) confirma tal ideia, pois ressalta

    que “é urgente enfocar os multiletramentos e os novos letramentos que circulam na

    vida contemporânea de nossos alunos. ”

    Sobre essa temática, os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1997;

    1998), doravante PCN, afirmam que a escola deve se organizar em torno de uma

    política de formação de leitores. Para tal, todos os professores devem trabalhar com

    a leitura (BRASIL, 1998), independentemente da área específica do conhecimento.

    Nesse patamar, um desafio que se estabelece é considerar, no ato de ler,

    novas possibilidades de leitura, visto que o jovem da geração Z pode não ter a

    leitura como prioridade, contudo, é preciso desmistificar ideias cristalizadas,

  • 30

    sobretudo, quando se enuncia que a geração atual não lê. Ao contrário, estudos

    apontam que nunca se leu tanto, em virtude das novas tecnologias, e que esse

    contato assíduo tende a gerar um leitor voraz, visto que este passa grande parte de

    seu tempo lendo, porém, suas leituras se dão de formas diferentes.

    Em 2014, 720 mil pessoas participaram da Bienal do Livro em São Paulo. No

    primeiro dia da feira, o público era, predominantemente, jovem. Em relação a esse

    fato:

    O escritor e jornalista Zuenir Ventura disse que já procurou entender, mas não chegou a uma conclusão sobre o crescimento do interesse dos jovens pela leitura. [...] ele acrescentou que a explicação pode estar na evolução da literatura de entretenimento, por meio da qual os adolescentes começam a se interessar pela literatura (BRASIL, 2013, s/n).

    Para Lévy (2003), o leitor de hipertexto16 é mais ativo do que o leitor de

    impressos, pois, antes de efetivar a leitura em tela, precisa interpretar as ações e os

    comandos a serem enviados ao computador, para que, dessa forma, haja a projeção

    do texto. Dados da Pesquisa Brasileira de Mídia 201417, que revelam os Hábitos de

    Consumo de Mídia da População Brasileira, apontam:

    A internet como o meio de comunicação que mais cresce entre os brasileiros; um quarto da população já acessa a rede diariamente, com uma intensidade média de 3h39 minutos por dia; crise da mídia impressa é total: 75% dos entrevistados afirmaram que não leem mais jornais; mídia mudou de forma veloz, radical e irreversível. (BRASIL, 2014, s/n)

    A nova geração demonstra um potencial muito grande relacionado ao fator

    curiosidade e à procura por informações, geralmente, através de ferramentas mais

    ágeis, como a internet, o que possibilita uma busca com certa autonomia, e nisso a

    geração mais jovem tem demonstrado ser boa aprendiz e autodidata. Contudo, isso

    16 Para Lévy (2003, p.44), um hipertexto é um conjunto de nós ligados por conexões. Os nós podem

    ser palavras, páginas, imagens, gráficos ou partes de gráficos, sequências musicais, documentos complexos que podem eles mesmos ser hipertextos. “É uma coleção de informações multimodais disposta em rede para a navegação rápida e intuitiva”.

    17 A pesquisa é um levantamento nacional realizado pela Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, e está disponível em: Acesso em 2 fev. 2014.

    http://www.secom.gov.br.

  • 31

    não é suficiente para tornar os jovens leitores literários. É preciso que eles

    descubram o texto literário quando buscam informações sobre filmes, games e

    jogos, pois é este encontro que pode seduzi-los. Assim, a apresentação do texto

    literário para o aluno, mesmo que de forma compacta, tem como resultado a

    contribuição para a leitura, o que pode ser potencializado com a mediação do

    professor. Para Moran (2012):

    Ensinar com as novas mídias será uma revolução se mudarmos simultaneamente os paradigmas convencionais do ensino, [...] A internet é um novo meio de comunicação [...]que pode ajudar a rever, a ampliar e a modificar muitas das formas atuais de ensinar e aprender (MORAN, 2012, p. 63).

    Para Zilberman & Silva (2008, p. 25), “a leitura deve vir na frente como um

    carro chefe", de modo a despertar "o desejo de reconstruir, de recriar, [...] o real

    inusitado informado pelo escritor”, logo, o conhecimento brota da interação

    leitor/texto literário. Assim, não é possível ensinar literatura sem essa relação, sem

    esse encontro, sem essa busca de sentidos que vai construindo significados e os

    tornando compreensíveis diante da realidade do leitor. Os autores afirmam que:

    [...]em termos sociais amplos, o sujeito necessariamente se educa ao fruir ou experimentar textos literários diversos. [...], pois nem todo ensino – principalmente o de cunho formal, escolarizado – facilita a fruição pelo aluno-leitor, de aspectos educativos que podem emanar ou resultar da leitura de textos literários (ZILBERMAN & SILVA, 2008. p.55).

    Diante disso, o leitor literário deve saber escolher suas leituras, e a formação

    desse saber passa pela escola. Assim, segundo a autora, “o ensino de literatura se

    dá através da reintrodução da leitura da obra literária no contexto da sala de aula"

    (ZILBERMAN, 1993, p. 21). Todavia, surge uma questão: Como é possível tal

    processo quando não há contato com o texto? Como já citado anteriormente, o

    contato e a familiarização com o texto em sala de aula podem ser proporcionados

    pela mediação do professor, que precisa se apresentar como um leitor, diferente dos

    alunos, por já ter uma caminhada, por já dominar um saber literário constituído que

  • 32

    lhe assegura o papel de professor-mediador que promove a intenção, a intervenção,

    a ação e a reflexão sobre leitura, instigando a curiosidade, de modo a contribuir para

    a formação de alunos leitores e leitores literários (ZILBERMAN, 1993).

    Paulino e Cosson (2009) corroboram as asserções de Zilberman (1993) ao

    afirmarem que o professor-mediador precisa ir além do ensino da história e do

    gênero literário, ou seja, precisa compreender, aprender, significar e ressignificar o

    ser leitor aluno e aventurar-se, desejosa e corajosamente, em leituras mais

    complexas, que proporcionem, a cada novo texto, uma ampliação de sua visão de

    mundo.

    Para Jouve (2012, p. 163), “os estudos literários também favorecem o espírito

    crítico", pois, "em uma obra, as ideias, os valores, a visão de mundo são objeto de

    uma leitura [...]". Desse modo, a mediação do professor tem papel único e é

    fundamental para a definição do que é literatura e da criação literária “em cada

    época", pois textos produzidos em diferentes momentos históricos testemunham que

    o ser humano continua sendo um universo com vasta extensão a explorar (JOUVE,

    2012, p. 165).

    Diante do exposto, considera-se premente a utilização das novas tecnologias

    na aprendizagem do educando, para que se possa explorar, em sala de aula, as

    diferentes formas de ler. Nesse contexto, a seguir, serão abordados o ensino da

    língua portuguesa e as novas tecnologias.

    2.2 O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA: NOVAS TECNOLOGIAS

    Na década de 1970, no Brasil, começou-se a pensar sobre tecnologia e

    educação, todavia, somente em 1984 foi implantado, pelo Ministério da Educação e

    Cultura, o Educom18, em cinco universidades públicas. Os objetivos, resumidamente,

    eram: a criação de centros-piloto para o desenvolvimento de pesquisas sobre o uso

    do computador; a formação de professores do magistério da rede pública de ensino;

    e a produção de software educativo e, consequentemente, o Projeto FORMAR19,

    18 EDUCOM – O primeiro projeto público a tratar da informática educacional, implantado nas

    universidades federais do Rio de Janeiro, Minas Gerais, Pernambuco, Rio Grande do Sul e na UNICAMP.

    19 FORMAR – Implementado em 1997, tinha como objetivo a formação de profissionais para atuarem

  • 33

    para preparar professores multiplicadores (ANDRADE, LIMA, 1993).

    Em 1989, surgiu o primeiro Programa Nacional de Informática Educativa

    (PRONINFE); em 1996, criou-se a Secretaria de Educação à Distância (SEaD) e o

    Programa TV Escola; em 2005, foram criados o Programa Nacional de Informática

    na Escola (ProInfo) e o Mídia e Educação; em 2012, o Ministério da Educação

    repassou recursos aos 24 estados e ao Distrito Federal para a compra de tablets a

    serem utilizados pelos professores e, recentemente, lançou o Programa “Um

    Computador por Aluno”. Segundo Gomes:

    [...] o início da popularização dos laptops de baixo custo foi feito através do projeto conhecido por Um Computador por Aluno (UCA), que tem como objetivo ser um projeto educacional utilizando tecnologia, inclusão digital e adensamento da cadeia produtiva (GOMES, 2015, p. 108).

    Da teoria à prática, verifica-se que o Governo Brasileiro se mostrou atento à

    utilização de novas tecnologias no ensino, apesar de esse esforço esbarrar, muitas

    vezes, em questões como infraestrutura, subutilização e falta de fiscalização na

    aplicação do dinheiro público. As intenções são boas, porém, há grandes

    dificuldades no momento de se colocar em prática as ações definidas. Como

    exemplo, pode-se citar o fato de o ProInfo20 ainda não ter chegado a muitas escolas

    e, em outras, os computadores continuarem em caixas lacradas por falta de

    estrutura física, elétrica e técnica para seu funcionamento.

    Proporcionar mudanças, através do uso das novas tecnologias na educação,

    é uma obrigação dos governantes deste país. As gerações que hoje frequentam as

    escolas nasceram na era digital, assim, a escola e os professores precisam

    acompanhar essa evolução tecnológica, de modo a contribuir para a formação de

    cidadãos críticos e criativos, conduzindo-os na construção do conhecimento. O

    papel fundamental do professor é o de um orientador/mediador. Nesse sentido,

    Moran (2012) afirma:

    nos diversos centros de informática educativa dos sistemas públicos de educação,

    20 PROINFO - É um programa educacional com o objetivo de promover o uso pedagógico da informática na rede pública de educação básica. http://portal.mec.gov.br/index.php?Itemid=462

    http://portal.mec.gov.br/index.php?Itemid=462

  • 34

    O professor é um pesquisador em serviço. Aprende com a prática a pesquisa e ensina a partir do que aprende, realiza-se aprendendo-pesquisando-ensinando-aprendendo. O seu papel é fundamentalmente o de um orientador/mediador (MORAN, 2012, p. 30).

    Na prática, em sala de aula, nota-se que as mudanças esperadas, em relação

    à multimodalidade21 no ensino, caminham vagarosamente, pois o aluno ainda

    permanece muito tempo ouvindo, copiando e olhando, sempre centrado no

    professor. Segundo Lévy (1999, p. 159), entretanto, “a maioria das competências

    adquiridas por uma pessoa no início do seu percurso profissional estarão obsoletas

    no fim de sua carreira.” Se esse texto fosse reeditado hoje, possivelmente, esse

    tempo diminuiria consideravelmente. Um Smartfhone adquirido no início de um ano

    tem sido substituído antes de completar 12 meses de uso. Os acontecimentos na

    área tecnológica têm ocorrido em uma velocidade considerável. A prática reflexiva

    na educação, baseada no tripé ação/reflexão/ação, exige que o professor dinamize e

    ressignifique sua práxis em sala de aula. Na sociedade da informação, a

    comunicação tende a ser interativa, permitindo os hyperlinks e a hipertextualidade

    na relação com os alunos, na sala de aula, com base em uma prática criativa.

    Em busca de agilizar esse cenário, no novo Plano Nacional de Educação

    (PNE 2014/2020), o Governo Federal definiu as ações a serem realizadas no

    planejamento da próxima década para a execução de um trabalho educacional

    articulado com os estados e municípios. Dentre as 20 metas definidas, destaca-se a

    16ª, que diz respeito ao compromisso do governo de retomar a proposta de

    formação de professores, destinada, especifica e principalmente, aos profissionais

    da educação básica. Conforme o texto, a intenção é “formar em nível de pós-

    graduação, 50% dos professores da educação básica, até o último ano de vigência

    deste PNE, e garantir a todos (as) os (as) profissionais da educação básica

    formação continuada" (BRASIL, 2014, p. 17).

    No que tange à Estratégia 5.4, com referência à Meta 5, ainda destaca:

    “fomentar o desenvolvimento de tecnologias educacionais e de inovação das

    práticas pedagógicas” (BRASIL, 2014 p. 7).

    Apesar de adiar, por mais dez anos, o governo brasileiro cria uma expectativa

    de mudança que pode proporcionar novos caminhos para o ensino, com a inclusão 21 Multimodalidade: é o uso de mais de um modo de representação do gênero discursivo. Por

    exemplo: palavras e gestos, palavras e imagens, palavras e jogos, palavras e animações etc.

  • 35

    das novas tecnologias e multimodalidades. Para Moran (2012 p. 171), isto é de

    fundamental importância “se quisermos ser eficientes e eficazes no processo

    educacional. ”

    2.3 SER PROFESSOR DIANTE DO NOVO CONTEXTO TECNOLÓGICO

    Ao se centralizar o enfoque do estudo na questão do uso da tecnologia por

    parte da nova geração, fica evidente que o aluno parece ter mais facilidade de

    interação com o aparato tecnológico existente do que o próprio docente.

    Diante disso, além dos conteúdos pedagógicos que o professor deve dominar,

    ele também precisa conhecer e dominar outro saber, que se localiza além de sua

    área específica de atuação: o saber tecnológico.

    Na atualidade, no contexto educacional, conhecer, dominar e fazer uso da

    tecnologia, enquanto um instrumento mediador, é muito importante para o professor

    (MARCUSHI, 2004).

    No Brasil, a internet foi introduzida, no meio acadêmico, em 1988, pelo

    professor da Universidade de São Paulo, Oscar Sala, que teve a ideia de

    estabelecer contato com instituições de outros países para compartilhar dados por

    meio de uma rede de computadores. A internet foi liberada para uso em outros

    computadores em 1991 e, para o uso comercial, em 1995. Explicitadas estas datas,

    pode-se destacar o quanto foi rápida sua expansão.22

    Hoje, o acesso à internet mudou, praticamente, a vida das pessoas, pois

    estas podem se comunicar, ver filmes, jogar, fazer compras, movimentações

    bancárias, pesquisas etc., por esse meio. Contudo, para que se possa ter acesso à

    internet, são necessários dois elementos essenciais: (i) o computador (e aqui

    incluímos outros meios que permitem o acesso como o tablet, celular, etc); e (ii) o

    acesso à rede. Talvez, por esse motivo, a exclusão digital ainda é considerável.

    22 A trajetória da internet no Brasil pode lida no trabalho de Marcelo Carvalho disponível em

  • 36

    No ano de 2003, a Fundação Getúlio Vargas (FGV) apresentou o Mapa da

    Exclusão Digital23 e apontou que, no ano de 2001, 8,31% dos brasileiros tinham

    acesso à internet.

    Em maio de 2012, a Fundação Getúlio Vargas (FGV) alterou o enfoque da

    pesquisa, ou seja, voltou-se para o Mapa da Inclusão Digital e não mais para a

    exclusão. Mesmo assim, os números são assustadores, pois se constatou que a “6ª

    maior economia do planeta, o 5º maior mercado de celulares e o 3º de

    computadores continua com um imenso fosso digital” (GROSSMANN, 2012, p. s/n).

    Conforme o autor (GROSSMANN, 2012, p. s/n), enquanto 90% das residências da

    classe A têm computador com conexão à internet, na classe E são 2,5%, ou seja,

    “de cada 100 brasileiros, 65 desconhecem a internet. ” Diante desse contexto, a

    pergunta que surge é: Como ser professor na era digital?

    No século XXI não basta ser professor. Necessariamente, deve-se estar

    preparado para trabalhar com os chamados alunos da geração Y, ou seja, com os

    jovens que sentam para fazer seus trabalhos/lição de casa com a televisão, a

    internet, o celular, todos ligados ao mesmo tempo, com suas multi-informações que

    são captadas e transformadas em conhecimento.

    Os pais, geralmente, ao se depararem com essa situação em casa,

    recriminam o jovem ou acabam desligando alguns equipamentos, sem a

    compreensão de que todos eles podem estar, de uma forma ou de outra,

    contribuindo para o aprendizado. Além disso, um aluno que estuda em uma escola

    que explora os recursos tecnológicos consegue, mais facilmente, integrar-se na

    sociedade atual. É claro que sempre há exceções.

    Borges (2013) afirma que o uso das tecnologias em sala de aula tem sido

    considerado um caminho sem volta, mas o sucesso deste depende, essencialmente,

    dos professores, que parecem ser cidadãos de dois mundos: fora da escola usam as

    tecnologias, criam blogs, estão nas redes sociais, mas, na escola, não sabem como

    usar, didaticamente, as ferramentas.

    Nesse contexto, uma nova indagação surge: Será que o professor está sendo

    preparado ou está se preparando para atuar na educação desses jovens? Como se

    trata de uma educação intermediada pelas novas tecnologias, alterações ocorrem

    constantemente, com a velocidade da luz. Essa afirmação pode ser atestada na

    23 Disponível em Acesso em 12 mar. 2015

    https://www.google.com.br/?gws_rd=ssl#q=mapa+da+exclus%C3%A3o+digital+

  • 37

    Figura 1, que mostra o uso do celular. Em 2005, na Praça São Pedro, em

    Roma/Itália, aparece um número muito restrito de celulares sendo usados para

    fotografar, mais especificamente, somente um; já em 2013, num intervalo de apenas

    8 anos, no mesmo local, o contexto é outro, pois há um número incontável.

    Figura 1 – Foto da Praça São Pedro no Vaticano em 2005 e em 2013

    Fonte://blogs.estadao.com.br/estadao-urgente/celulares-mudam-cenario-da-praca-sao-pedro/

    De acordo com dados de uma pesquisa divulgada pela União Internacional

    das Telecomunicações (UIT)24, no final do ano de 2014, o número de celulares no

    24 UIT (União Internacional de Telecomunicações) é a agência especializada das Nações Unidas

    - ONU - para as Tecnologias de Informação e Comunicação - TIC. A pesquisa “Mensurando a Sociedade da Informação” pode ser encontrada em http://www.itu.int/en/ITU-

    http://www.itu.int/en/ITU-

  • 38

    mundo já era igual ao número de habitantes no planeta. Nesse mesmo prazo,

    segundo a UIT, cerca de 3 bilhões de habitantes estariam usando a internet. Além

    disso, dois terços desses usuários de internet estão em países em desenvolvimento.

    Atualmente, o Brasil é o 65º país mais conectado do mundo e, quando se fala em

    continente americano, está na 10ª colocação. Estes números indicam que, de fato, o

    Brasil é um país conectado, embora ainda haja exclusão.

    Para exemplificar a velocidade com que as informações mudam, estes

    números já estão ultrapassados, pois, ao se acessar o site www.worldometers.info e

    copiar os dados disponíveis na tela, pode-se acompanhar as alterações dos

    mesmos, em tempo real, e fazer as comparações. Os dados da Figura 2 são de

    março de 2015 e diferem dos apresentados pelo relatório da UIT (parágrafo

    anterior).

    Figura 2 – Circulação da informação

    Fonte: www.worldometers.info/pt

    O site worldometers atualiza, constantemente, suas informações e pode ser

    acompanhado por qualquer pessoa diante de uma tela de computador. Quando o

    relatório da UIT afirma que, no final de 2014, três bilhões de pessoas estariam

    D/Statistics/Documents/publications/mis2014/MIS2014_without_Annex_4.pdf

    http://www.worldometers.infohttp://www.worldometers.info/pt

  • 39

    utilizando a internet no mundo, o painel eletrônico apresenta um número exato de

    3.090.579,158 pessoas que acessam a internet.

    Diante disso, observa-se que, atualmente, as informações estão em todos os

    lugares e aparecem de todas as formas, mas não basta tê-las, é preciso saber como

    utilizá-las de forma correta e criativa. Pelo enfoque deste estudo, é necessário

    utilizá-las como ferramentas eficazes e mediadoras que facilitam a aprendizagem do

    aluno (MARCUSHI, 2004).

    Muitas vezes, há a ilusão de que as ferramentas tecnológicas são

    extremamente recentes, porém não é bem assim. Ferrero afirma:

    Parece que as novas tecnologias começaram ontem. E não! A tecnologia começou com a caneta; antes da caneta havia o lápis; e antes dele tinha a pena... Tecnologia da escrita existe desde o início e a máquina de escrever foi uma tecnologia superinteressante que também foi rejeitada pelas educadoras, porque isso era trabalho para as secretárias. [...] Se tivessem trabalhado na máquina de escrever antes do computador, seria mais fácil porque o teclado é o mesmo (FERRERO, 2013, p. 9).

    Desse modo, ao longo da história da civilização, o homem alterou os

    instrumentos mediadores conforme sua necessidade e a capacidade produtiva da

    época (VYGOSTKI, 1999). A escola, a educação e os professores precisam

    acompanhar as transformações do aprender, diante do novo contexto apresentado

    pela atualidade.

    Esse novo olhar muda as relações, pois, na teoria, não há mais quem ensina

    e quem aprende, pois a aprendizagem é uma caminhada que se faz em uma via de

    mão dupla. Ora eu ensino, ora eu aprendo, mas o mais importante é que ambos

    despertem para o aprender a aprender juntos.

    Ferrero (2013) relata que, diante do computador, os alunos se transformam

    em estudantes autônomos, mesmo quando trabalham em duplas ou em grupos, pois

    essa convivência possibilita que, juntos, descubram soluções gráficas, opinem sobre

    o que deve ser negritado ou sublinhado; que letra deve ser aumentada ou diminuída;

    e que título merece ser selecionado, mas, sobretudo, troquem experiências sobre o

    conteúdo. Nesse momento, segundo a autora (FERRERO, 2013), o professor “só vai

    intervir quando há um impasse”. Contudo, nesse contexto, como fica a escola?

  • 40

    Em busca de novos caminhos, o Estado do Paraná, em 2010, após debates

    com equipes da Diretoria de Tecnologia Educacional (DITEC) e outros

    Departamentos da Secretaria de Estado de Educação, e com a participação de

    professores, publicou um documento de referência para a rede pública estadual,

    intitulado “Diretrizes para o Uso de Tecnologias Educacionais”.

    O documento, além de apresentar as diretrizes e um histórico sobre a

    introdução das tecnologias no contexto escolar do Estado do Paraná, trata

    também da mediação do professor. Sobre essa temática muito importante,

    Libâneo (2009) assinala que:

    A mediação do professor consiste em problematizar, perguntar, dialogar, ouvir os alunos, ensiná-los a argumentar, abrir-lhes espaço para expressar seus pensamentos, sentimentos, desejos, de modo que tragam para a aula sua realidade vivida. (LIBÂNEO, 2009, p. 13).

    Como se pode observar, o papel do professor é o de mediador, pois é ele que

    deve abrir espaços para a problematização e possibilitar que o educando reflita e

    ouse se expressar. Esse papel docente independe da modalidade em que atua, seja

    na educação presencial, seja na educação mediada pela tecnologia. A essência é a

    mesma: a aprendizagem. A forma e os instrumentos que serão usados dependerão

    de inúmeros fatores, tais como: objetivo, ferramentas disponíveis, nível de

    conhecimentos prévios do aluno sobre a temática, dentre outros (VYGOTSKY, 1999).

    Com o ensino à distância (EaD), a TV pendrive e os tablets, o professor deve

    ir se familiarizando e caminhar na tentativa de acomodar esses novos saberes.

    Ocorre que, nesse percurso, às vezes, pode-se encontrar situações inusitadas, por

    exemplo, um professor, após ganhar um tablet, devolvê-lo. Antes de se julgar o

    docente, é preciso ouvi-lo e compreender o porquê de sua ação:

    Na sala, o tablet não funciona. A internet é lenta, ele é lento, não conseguimos baixar os aplicativos. O que ganhei está guardado, porque já tenho notebook. Não conheço ninguém que está usando em sala”, afirma a professora Ana Lúcia Bontempo, do Centro de Ensino Médio de Taguatinga Norte (CEMTN).25

    25 Depoimento retirado da reportagem “Professor é chave para o sucesso no uso da tecnologia em

  • 41

    Quando se dá voz ao professor, passa-se a ampliar a compreensão sobre

    uma determinada ação. Por outro lado, resta saber se o notebook é usado em

    contexto de ensino-aprendizagem. Ter um equipamento não é sinônimo das

    seguintes ações: (i) conhecê-lo; e (ii) saber como usá-lo em um contexto de

    aprendizagem.

    Independente da disciplina ou do conteúdo programático, o papel do

    professor é ser mediador da aprendizagem. De acordo com Rolim, (2015):

    A travessia literária do professor não é a mesma travessia do aluno. Contudo, a leitura literária permite que esses dois personagens do processo de ensino estabeleçam um forte elo através do alargamento do horizonte de expectativa que apenas a Arte é capaz de atingir. E o resultado dessa conexão será, finalmente, traduzido em perspicácia e sensibilidade no ato de ler e interpretar o mundo (ROLIM, 2015, p. 26).

    Em qualquer metodologia pedagógica envolvida com o ensino e diante das

    novas tecnologias educacionais, a relação professor-aluno não desaparece, mesmo

    que o aluno tenha se tornado autodidata, pois é o professor que vai desatando os

    nós que são encontrados no caminho da navegação.

    O que significa navegação? Como a própria palavra diz: navegar + ação.

    Navegar é o ato de conduzir de um lado para outro. Contudo, para que lado o aluno

    deve andar? Qual deve ser sua direção? Essas decisões/ações devem ser

    apontadas pelo professor-mediador e, novamente, aparece, aqui, um jogo de

    palavras interessante. Seria, então, o professor-mediador aquele que conduz por

    mares desconhecidos e cuida da dor do prazer de (re)aprender e, em determinados

    momentos, do desprazer, conduzindo e reconduzindo o aluno em uma jornada e, se

    necessário, fazendo-o voltar ou (re)fazer determinado trecho? Essas questões

    podem ser respondidas quando se analisa as ações do professor que desabrocham

    no cotidiano escolar.

    O cotidiano escolar nem sempre permite ao educador ser/agir como professor

    sala de aula” que pode ser acessada em http://ultimosegundo.ig.com.br/educacao/2013-08-22/professor-e-chave-para-o-sucesso-no-uso-de-tecnologia-na-sala-de-aula.html.

    http://ultimosegundo.ig.com.br/educacao/2013-08-

  • 42

    mediador, pois, muitas vezes, dependendo das forças políticas presentes no

    complexo ambiente que é a escola, o docente pode ter seu trabalho podado

    (NÒVOA, 1999). Contudo, muitos professores creem na utopia e, com teimosia,

    acreditam que, na mediação escola–saber-mundo, pode surgir um espaço para a

    ação emancipatória que conduz aluno e professor a um novo voo rumo à descoberta

    do conhecimento, sem a reprodução de ideologias e/ou valores que possam ser

    classificatórios e/ou excludentes.

    Fala-se, aqui, de um professor fruto de uma formação que aponta para um

    novo tempo e “reafirmam a intensificação da presença das Tecnologias da

    Informação e Comunicação na vida escolar e, em específico, na vida do professor”

    (ROLIM, 2015, p. 27).

    Nesse contexto, ao acordar pela manhã, muitos professores já não caminham

    mais até a porta ou portão para pegar o objeto de desejo diário: o jornal. Hoje,

    busca-se no computador, no tablet e, até mesmo, no celular as informações

    jornalísticas e, rapidamente, são conhecidas as manchetes do dia. Como isso é

    possível? Com o acesso às novas tecnologias, o que Lévy (2010) chama de

    Cibercultura.

    As redes sociais tornaram-se parte da rotina e podem ser excelentes aliadas

    na formação de leitores, desde que bem utilizadas. Através do Facebook, por

    exemplo, o professor pode sugerir leituras de jornais, livros, artigos, revistas etc.

    Pode, ainda, agendar um horário para que todos comecem a publicar seus

    comentários e tirar dúvidas sobre as leituras efetivadas, promovendo, assim, a

    socialização/partilha da discussão. Além disso, outra ferramenta eficaz para a leitura

    são os e-books26, que utilizam ferramentas leves, portáveis e de fácil acesso, tais

    como os iPad27, Kindle28 e outros.

    As novas tecnologias estão incorporadas ao dia a dia, assim como a leitura.

    Adaptar-se às novas formas de ler, por meio de aparatos tecnológicos, é natural.

    Todavia, independente das transformações tecnológicas, este estudo defende

    princípios inquestionáveis: apesar do enorme avanço tecnológico, o livro ainda é o

    26 E-books: São livros em formato digital que podem ser lidos na tela de computador, tablet, leitores

    de e-book, celulares. In: < http://pt.wikipedia.org/> Acesso em 24 abr. 2015. 27 IPad: é um dispositivo em formato tablete (tablet) produzido pela Apple Inc. <

    http://pt.wikipedia.org/> Acesso em 24 abr. 2015. 28 Kindle: é um leitor de livros digitais desenvolvido pela subsidiária da Amazon, a Lab126, que

    permite aos usuários comprar, baixar, pesquisar e, principalmente, ler livros digitais, jornais, revistas, e outras mídias digitais. < http://pt.wikipedia.org/> Acesso em 24 abr. 2015.

    http://pt.wikipedia.org/http://pt.wikipedia.org/http://pt.wikipedia.org/

  • 43

    primeiro contato da criança com a leitura, e o professor ainda é o principal mediador

    da leitura na escola. Esse pensamento é respaldado em Freire (2006, p.20), quando

    afirma:

    [...] a leitura do mundo precede sempre a leitura da palavra, daí que a posterior leitura desta implica a continuidade da leitura daquele. [...] De alguma maneira, porém podemos ir mais longe e dizer que a leitura da palavra não é apenas precedida pela leitura do mundo mas por uma certa forma d