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     A CTIVIDADE  MILENAR   EM   PORTUGAL, as primeirasreferências à produção de sal remontam ao século VI II  a.n.E . – com a int rodução, pelos Fenícios, das conser-

     vas de peixe baseadas na salga em ta nques. Os Romanosintroduziram o reticulado em esquadrias nas faixas cos-

    teiras onde produziam o peixe salgado e o fa moso garum.

    Portugal foi um país produtor e exportador de sal, esta já

    foi uma das nossas principais activ idades económicas.

    Osal era, na Idade Média, produto de troca com todoo Norte da Europa e também com oNorte de África. A salicultura tradicional foiuma actividade estruturante do nosso lito-

    ral. O sector salineiro atravessou várias tem-

    pestades, motivadas por crises económicas

    internas e turbulências internacionais que

    levaram à falência das nossas indústrias con-

    serveiras. O abandono de muitas salinas tra-

    dicionais, a sua conversão em aquaculturas eem explorações mecanizadas desvirtuaram

    as paisagens da nossa costa marítima.

    Contudo, resistiu um pequeno núcleode velhos e novos produtores, movidospela paixão do sal, por um trabalho feito ao

    ritmo da Natureza, por uma economia sustentável. É do

    seu trabalho que fala esta publicação.

     Aos marnotos, que me fornecem o bril hante sal que está

    sempre à minha mesa, fica dedicado este livrinho. Elestêm de aguentar o calor seco do Verão, o sal que lhes seca

    a pele, condições de vida elementares, trabalho duro para

    rapar e colher o sal e o carregar para o armazém.

    Muito obrigado!

     Algarve, Janeiro de 2008 , Paulo Heitlinger 

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    Deve haver algosagrado no sal.

     Está nas nossas lágrimas e no oceano. 

    «Areia e E�uma», Gibran Khalil Gibran (1883-1931)

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    OSAL  É  ESSENCIAL para o ser humano viver. Sem sal, o organismo rapi-damente se desequilibra. É impossível

    passar sem ele, não só porque nos tem-

    pera a comida, mas porque nos assegura

    a saúde.

    Para muitos consumidores menos aten-tos, sal é sal. Mas a maioria do sal que se

     vende em lojas e supermercados desti-

    nado à alimentação humana, é simples

    cloreto de sódio, um «sal» não tem nada

    a ver com o sal tradicional marinho.

     Já o sal proveniente das salinas trad i-

    cionais não sofre a «purificação» do pro-duto químico «sal»; deste modo, chega à

    nossa mesa rico em sais minerais, com

    um sabor mais ... a mar. A estrutura cris-

    talina é diferente, pois não foi refinado,

    nem levou a adição de anti-congleme-

    rantes. Mais do que simples cloreto de

    sódio, este sal contem todas as riquezas

    naturais do mar.

    Do oceano ao talho, a água marinha

     vai concentra ndo a salinidade, aque-

    cida pelo sol abrasante e fustigada pelo

     vento atlâ ntico. O produto final são cr is-tais de sal marinho, que incluem vários

    minerais, necessários à saúde.

    Conserva-se assim a maior parte dos

    minerais (sódio, magnésio, cálcio e

    potássio) e oligo-elementos (ferro, zinco,

    manganésio, iodo e fluor) presentes na

    água do mar – uma fonte importantede elementos essenciais ao bom funcio-

    namento do organismo humano. O sal

    marinho é especialmente rico em mag-

    nésio, componente fundamental pa ra as

    reacções enzimáticas do metabolismo e

    Sal vital Em várias regiões dolitoral português retira-

    -se de novo o sal ao mar.Um ofício milenar foi preservado por algunsempreendedores quecompreenderamo valor da agricultura sustentável que é a salicultura tradicional.

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    mantém uma relação equilibrada entre a percentagem

    de sódio e de potá ssio.

     João Naval ho, gerente da Nec ton, empresa com sali nas

    tradicionais no Parque Natural da Ria Formosa, explica:

    «O sal marinho tradicional não tem qualquer tipo deaditivos químicos — e não é lavado. Por ser cuidado-

    samente recolhido à mão, apresenta-se naturalmente

    branco. Não é o branco baço da maioria dos sais vul-

    gares, mas um branco brilhante, revelador da forma e

    estrutura dos cristais. O sal marinho tradicional é natu-

    ralmente húmido; essa humidade revela a presença

    de magnésio. O magnésio é essencial para o funciona-mento do sistema nervoso e inexistente nos sais mari-

    nhos industriais».

    Este tempero é recolhido nas salinas típicas da costa

    portuguesa, que ao longo dos anos tinham sido aban-

    donadas e desprezadas. Em tempos históricos, Portu-

    gal foi um importante exportador de sal; hoje, de novo

    se exporta sal. O sal tradicional marin ho ou, ainda maisprecioso e mais bem paga, a flor de sal.

    Na zona de Aveiro e na costa sul do Algarve, quemchega a estas salinas tradicionais durante Julho, Agosto e Setembro, pode observar os marnotos  a jun-

    tar o sal nos tanques cristalizadores com longas pás de

    madeira. Pouco depois, já constroem pirâmides de salao lado das talhas, para depois armazená-lo. Nos estuá-

    rios do Mondego, do Tejo e do Sado, e, especialmente

    bem sucedidos na costa algarvia, afirma-se uma nova

    geração de produtores de sal.

     A geogra fia dos estuá rios do Mondego, do Tejo e do

    Sado permite a necessária protecção das salinas con-

    tra as ondas do mar, as chuvas e ventos do Inverno. Em

     A flor de sal é uma finíssima película de cristais de sal que seforma na superfície da água das salinas, e que é recolhida comuma pá que nunca toca o fundo. A flor de sal não sofreprocessamento posterior, seca ao sol e é depois embalada,mantendo o sabor e a humidade do mar. Foto: TradiSal.

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     Aveiro, Figueira da Foz, Alcochete, Alcácer do Sal, Tavira, Olhão/ Belama n-

    dil e Castro Marim (Na foz do Rio Guadiana), funcionam de novo as secula-

    res salinas portuguesas. No passado,  galeões carregados de sal percorriam o

    estuário do rio Sado, escoando o produto por via fluvial. Hoje, a maioria das

    salinas do Sado continuam desactivadas. A antiga actividade é relembradapor um  galeão do sal, bela embarcação tradicional, que proporciona passeios

    turíst icos/ecológicos (imagem). Mais informações: online em w ww.sal.pt.

     As sa linas do Tejo estavam, até aos anos 70, entre os princ ipais produtor de

    sal do país. Actualmente, apenas uma salina junto a Alcochete – a Salina do

    Brito – produz sal. O Núcleo do Sal, situado no Con-

    celho de Alcochete, é constituído pela Casa da Malta

    (ou da Marinha) e pelas suas salinas. Aberto aopúblico desde Agosto de 1990, o seu papel é a preser-

     vação e div ulgaçã o de uma das ma is antigas e i mpor-

    tantes actividades económicas do concelho – a sali-

    cultura. Situa-se na Estrada Municipal 501.

    Para o visita nte interessado em ver salinas em plena

    actividade, a costa algarv ia é a zona mais gratificante.

    Desde Castro Marim (imagem na página seguinte)até Belamandil poderá ver os marnotos em acção e

    comprar o sal t radicional directamente ao produtor.

    Paisagem de Outono: assalinas de Castro Marimem descanso.

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     A  TEMPORADA  DO SAL  segue o ritmo das estações. Inicia-se em

    Março/Abril e prolonga-se até Setembro, com a últimacolheita do sal. No Inverno, as salinas parecem desapareci-

    das; os tanques são inundados, para os proteger das chuvas,

    e dos temporais. Contudo, a água transparente mostra-nos

    perfeitamente a estrutura dos ta nques (foto em baixo).

     A preparação das marinhas  começa pela limpeza de lodo e

    lamas, e termina com a reparação dos desgastes provocados

    nos baixos muros pelas intempéries do Inverno. A prepara-

    O ciclo da salicultura tradicional ção das águas decorre de Março a Junho, para

    aumentar a concentração do sal diluído. A águado mar é primeiro depositada no tejo  (viveiro de

    águas frias), onde permanece algum tempo a fim

    de diminuir a taxa de elementos insolúveis.

     A próx ima etapa faz circu lar a água através dos

    viveiros  ligados entre si por comportas e canais,

    um fluxo controlado pelo marnoto. A água circula

    graças a ligeiras d iferenças de nível.Quanto maior o percurso percorrido pela água,

    maior será a sua concentração quando chegar aos

    tanques cristalizadores, e mais depressa será a cris-

    talização nas  peças  (ou talhos), rentabilizando a

    produção.

    Depois de limpa a marinha, o marnoto volta a

    encher os talhos de água com uma altura de cercade 8 cm. Controla a altura da água nos ta lhos, que

    deve manter constante, aumentando a saturação

    da água. Os talhos  são atestados de água de oito

    em oito dias. A água adicionada já tem concentra-

    ção elevada. Lav radores do mar, os marnotos têm,

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    sem cessar, de antecipar o tempo que vai fazer para

    governar as suas marinhas. A safra efectua-se de

     Junho a Setembro, quando a sal inidade atinge 200

    gramas por litro.

    Em meados de Junho, a primeira rasa está prestes

    a ser colheita. A evaporação da água dos ta lhos não

    deve ser completa, para ev itar a solidificação totaldos cristais, o que dificultaria a sua ex tracção. Em

    cada talho fica uma camada de sa l de quatro a cinco

    centímetros de espessura.

    Uma vez que a colheita do sal é manual, o mar-

    noto pode colher o sal levando o rodo até ao fundo

    do talho, porque este está limpo, colhendo assim uma maior

    quantidade de sal e com menor taxa de insolúveis. O marnoto

    utiliza o rodo de madeira, e uma técnica para extrai r o sal dos

    talhos e colocar nas barachas, permanecendo aqui cinco dias

    ao sol, para perder humidade. A partir deste momento, o salmarinho está pronto para ser transportado, armazenado e

    embalado. O processo repete-se existindo durante o Verão

    cerca de três a cinco rasas.

    Para colher a  flor de sal, o marnoto usa uma espécie de pá,

    com a qual recolhe a «nata» que flutua à superfície do tanque.

    Também este precioso sal ficará alguns dias a secar ao sol,

    antes de ser recolhido para o armazém.

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    Tavira A 

    S  MARÉS  DO   OCEANO, praticamente inexisten-

    tes no Mediterrâneo, permitiram instalar no Alga rve grandes áreas para a salic ultura. A zona

    hoje revitalizada pela apanha de sal tradicional vai

    de Belamandil, Olhão, até Vila Real de Santo Antó-

    nio. Já do lado espanhol, os andaluzes tratara m de

    revigorar toda uma sequência de salinas históricas.

    Nos concelhos de Olhão, Tavira e Castro Marim

    temos agora três núcleos de salina. Espaços de novoutilizados numa act ividade milenar, que aproveita

    a costa algarvia para produzir sal marinho de ele-

     vada qualidade, cuja pureza e valor nutrit ivo são

    reconhecidos internacionalmente.

    Um labirinto de canais por onde escorre a água

    do mar, que terminam em tanques pequenos e

    pouco profundos onde se produz o sal, forma assalinas localizadas na Reserva Natural do Sapal de

    Castro Marim, em Tavira e na Quinta do Ludo, em

    pleno Parque Natural da Ria Formosa. Viveiros mari-

    nhos que geram bom aproveitamento económico,

    ao mesmo tempo que proporcionam o equilíbrio

    ecológico e a preservação de espécies nas zonas de

    sapal dos Parques Naturais. A biodiversidade dassalinas, onde predomina uma vegetação caracte-

    rística de terrenos alagadiços, é importante para a

    propagação de diversas espécies de fauna aquática.

    Uma forma de revitalizar a produção tradicio-nal, colocando excelentes produtos no mer-cado internacional que merecem as mais altas dis-

    tinções. Em 2006, a  flor de sal de Tavira recebeu oSuperior Taste Award do International Taste & Qua-

    lity Institute, uma das mais prestigiadas entida-

    des mundiais de culinária, sedeada em Bruxelas.

    Com este galardão, a  flor de sal  produzida nas sali-

    nas de Tavira pelo empresário Rui Simeão tornou-

    se o único produto alimentar portug uês premiado

    pelo ITQI em 2006.Rui Simeão referiu que este prémio constitui

    «uma valiosa ajuda na expansão e exportação do

    produto e reforçará a imagem de prestígio que

    a Flor de Sal de Tavira já conquistou em todo o

    mundo.»

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    Castro Marim

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    O  EXTREMO  DO  A LGARVE, a poucos passos da

    fronteira com a vizinha Espanha, em Castro

    Marim, o rio Guadiana, o oceano e o Homem for-

    maram os sapais donde emergem as salinas.

    Uma teia de canais e pequenos espelhos de água

    espraia-se por mais de 300 hectares através de dois

    concelhos, Castro Mari m e Vila Real de Santo Antó-

    nio, sobre um solo argiloso compactado por séculos

    de labor humano, formando um verdadeiro pradomarinho, pontuado por «jardins de sal».Preserva-

    dos pelo saber tradicional, intemporais, os instru-

    mentos e gestos de recolha mantêm uma ligação

    harmoniosa com a Natureza. As marés, as brisas

    de levante, os diferentes viveiros e cristalizadores,

    a recolha manual quotidiana, a dimensão humana

    das explorações expressam a tradição milenar do

    sal. Num ponto de encontro entre o Atlântico e o

    Mediterrâneo, a qualidade ambiental da Reserva

    Natural e a sabedoria do salineiro conjugam-separa criar um produto natural de qualidade: o Sal

    de Castro Marim.

     A TradiSal – Assoc iação dos Produtores de Sal

    Marinho Tradicional do Sotavento Algarvio, foi

    fundada em 1999, com sede em Castro Marim, para

     valori zar a exploração trad icional das sali nas,

    melhorar a produção, certificar, divulgar e promo- ver, organizar e forma r os sali nicultores, recupera r

    as salinas t radicionais e as edificações adjacentes e

    implementar Ecoturismo na área de sali nas.

    Fotos: as salina s em descanso, no Outono; a montanha de sal

    concentra a produção de meses....

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    Sal aveirense ARIA  DE A  VEIRO, embora dita Ria, não o é. Mais é uma vasta regiã o lagunar, algo entre um estuário e u m

    delta, com paisagens que vão desde dunas e pinhais cos-

    teiros, que protegem a laguna das investidas de um mar

    quase sempre agitado, até aos prados e sebes das terras

    baixas do i nterior.

     As zonas da Ria – faixa costeira , sapais, juncais, salinas,

    matas ribeirinhas, campos de cultivo e caniçais, – moti-

     vara m a sua «promoção» para Zona de Protecção Espe-

    cial  no quadro da (pouco estimada) Rede Natura 2000.

     Aqui passam aves aquát icas no decurso das suas migra-

    ções, albergando também a Ria populações nidificantes

    muito significativas para algumas espécies.

    Uma boa parte de Aveiro terá nascido e crescido em

    função do sal. Ao evocar Aveiro evocam-se cromos de

    ontem: os moliceiros e as salinas geométricas, de com-

    parti mentos regulares e pirâmides de sal dispersas pelohorizonte. Pelos canais urbanos, as salinas permeavam

    a cidade.

     As sali nas que resta m hoje, avistam-se quando o visi-

    tante sai da cidade para tomar a direcção das praias. O

    Canal de São Roque atesta os tempos prósperos que a

    indústria do sal viveu na região. Mas os velhos palhei-

    ros de armazenamento já não cumprem o seu serviço;

    foram transformados em restaurantes e tascos. Antes, o

    mar circulava entre vários planos de água (algibés, caldei-

    ros, sobre-cabeceiras, talhos). A água salgada começava a

    evaporar-se nas cabeceiras das marinhas e a decantação

    afinava-se nos meios de cima, onde se forma a salmoura;

    enfim, o sal crista lizava nos meios de baixo.

    Em tempos idos, as marinhas de Aveiro eram das mais

    extensas e produtivas de Portugal. Hoje já poucas labo-

    ram. Em 2004, eram oito salinas que ainda produziam

    sal em Aveiro. Em 1975, eram 368 as marinhas que esta-

     vam a produzir sal. Para que a sali na Grã Caravela pro-

    duzisse com toda a capacidade, foi necessário investir

    cerca de 35 mil euros. A Grã Caravela é hoje a única que

    funciona com todos seus meios. Das restantes sete mar i-

    nhas, algumas funcionam só a 30 ou 40% da sua capaci-dade. Os aveirenses parecem não dominar o marketing  

    do seu sal. Na zona, só a Grã Caravela  produz  flor de sal ,

    que requer profissionais desta arte. Pelo menos, o «Sal

    d’Aveiro», marca da Grã Caravela, não leva qualquer tra-

    tamento.

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    O sal aveirense é a base do sabão de sal e dos sais de banho 

    que são confeccionados naquela salina. Outros produ-

    tos para cosmética e higiene corporal deverão ser inclu-

    ídos a curto prazo. O sabão de sal é um sabão com produ-

    tos químicos elaborados artesanalmente; 30% é sal de

     Aveiro, a que se adicionam aromas nat urais, azeite, vase -

    lina e leite.

     A saponificação faz-se à base de gl icerina. «É um sabão

    muito hidratante e bom para o ba nho», refere Eduardo

    Oliveira, afirmando que os sais de banho também são

    feitos com sal de Aveiro e que «são muito aromáticos e

    relaxantes». Os aromas são todos reti rados de plantas, e

    de essências naturais, sem álcool.

    Os produtos da Grã Caravela estão à venda nos barcos

    turíst icos que fazem passeios pela Ria, em casas de arte-

    sanato, casas de produtos naturais e er vanárias.

    «As marinhas de Aveiro precisam de ter bons marno-

    tos para “rer” o sal – o que tem de ser feito todos os dias

    para que ele não vá para o fundo e se mistu re com a areia

    e a lama, de modo a se fazer uma cama de sal», refere

    Eduardo Oliveira, recordando que o sal produzido no

    ano passado, na Grã Caravela, «foi vendido por preços

    mais elevados do que o das outras marinhas devido à

    sua qualidade». «Em vez de fazermos mais quantidade,

    fizemos menos sal, mas de melhor qualidade», justifica

    o responsável.

     A sali na Grã Caravela  está junto ao Ecomuseu da Mari-

    nha da Troncalhada, na estrada que segue junto ao canal,

    em direcção às instalações dos clubes náuticos, e que

    está identificada por uma «caravela» em madeira. Aqui

    funciona uma marinha de sal, sendo possível observar

    os antigos métodos de salicultura da região aveirense.

    Endereço: Cais das Pirâm ides, 3800-200 Aveiro.

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    Figueira da Foz

    N A  F IGUEIRA  DA  FOZ as salinas estão no estu-ário do Rio Mondego. O salgado  (conjuntodas salinas) reparte-se pelo braço sul do rio

    (Lavos) e pela Ilha da Morraceira – um mouchão

    situado no meio do rio – que constituía uma pla-

    nície aluvial ocupada por pastagens e juncais, a

    qual foi arroteada para marinhas desde a Idade

    Média. No braço norte existiram salinas, hoje

    desaparecidas.

    Durante séculos, a produção de sal foi utili-

    zada em grandes quantidades pela frota pisca-

    tória (Pesca do Bacalhau e da Sardinha). O sal

    subia o Mondego até aos entrepostos que o dis-

    tribuíam pelos confins da Beira, para a conser-

     vação de c arnes e queijos. Este sal saía também

    da barra e, em brigues e escu nas, chegava ao Bál-

    tico e à Nova Inglaterra.

     A partir da década de 1970, alteraç ões drást i-

    cas no mercado e na comercialização levaram

    a uma desvalorização progressiva do sal arte-

    sanal. Entretanto, algumas salinas tradicio-

    nais foram recuperadas. As salinas da Figueira

    são semelhantes às de Aveiro, pequenas unida-

    des com muitos compartimentos, ligados por

    uma intrincada rede de canais. Cada marinha  é

    uma unidade autónoma, de traço muito regu-

    lar e com u m engenhoso sistema hidráulico que

    até pode incluir sistemas subterrâneos de dre-

    nagens, destinados a canalizar as intrusões de

    água doce nos cristalizadores.

    Os típicos armazéns do sal  são construções em

    madeira que servem para armazenar entre 150

    a 200 toneladas de sal, servindo também de

    abrigo aos salineiros. Construções bem adapta-

    das ao meio, já que a sua sustentação não é feita

    por fundações ou alicerces, mas sim sobre plata-

    formas.

    Uma série de iniciativas locais incluem o Festi-

    val do Sal da Figueira da Foz, e o i nício do processo

    de certificação do sal.

    O Núcleo Museológico do Sal foi inaugurado em

    2007; fica situado em Armazéns de Lavos, fre-

    guesia de Lavos, na Salina do Corredor da Cobra.

     A Câma ra Municipa l adqui riu em 200 0 esta

    salina, para oferecer à comunidade a fruição

    deste legado cultural. Foto: CM Figueira da Foz.

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    POR  VEZES, O SAL-GEMA  aflora à superfície da terra por

    nascentes ou poços de água salgada. Para permitir

    a recolha do sal, a água salgada é levada à evaporação –

    por energia solar em tanques como nas salinas mar inas,

    ou em fornos a lenha.

    Em Rio Maior, no Ribatejo, próximo de Santarém,

    existe uma nascente de água salgada, cuja exploração

    artesanal parece datar dos tempos romanos. As  Mari-

    nhas de Sal, como são conhecidas, estão situadas num

     vale no sopé da Serra dos Candeeiros, a 5 km do c entro

    urbano de Rio Maior. As águas pluviais penetram pelas

    falhas da rocha calcária, formando cursos de água sub-

    terrâneos. Uma destas correntes, depois de atravessar

    uma jazida de sal-gema, alimenta o poço existente no

    centro das Salinas.

     As Salinas de R io M aior  rodeiam-se de uma minúscula

    aldeia de casotas de madeira à roda dos tanques de for-

    mas e dimensões irregulares. Na Primavera, os tan-

    ques enchem-se de água salgada, tirada do poço com

    uma bomba que a conduz para os oito tanques concen-

    tradores, com capacidade total de um milhão de litros

    de água. A água, já mais saturada de sal, segue para os

    talhos através de sete regueiras. A evaporação nos talhos

    dá-se em seis dias, cada talho produz sal semanalmente.

    O sal é rapado com pás de ferro (outrora, com rodos  de

    madeira) e posto na eira a secar durante três dias. F inal-

    mente é levado em sacas até à Cooperativa. Aí é p esado e

    armazenado.

    O direito à água obedece a regras que nunca foram

    escritas, e cujas origens se perdem no tempo. Lamen-

    tavelmente, o sal-gema de Rio Maior é vendido para

    rações animais, curtumes, têxteis, panificadoras, res-

    taurantes, refrigerantes e detergentes. Os produto-

    res ainda não compreenderam o potencial económico

    do mercado  gourmet , para obter melhores rendimen-

    tos deste excelente sal. O sistema proprietário é arcaico

    e impede o desenvolvimento vital das salinas. A maioria

    dos marnotos são agricultores, que se dedicam de Junho

    a Setembro à produção de sal, sendo os lucros obtidos

    divididos a meias entre o proprietário do tal ho e o mari-

    Sal nascente

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    L J

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    L EIRIA  E  A  SUA  JUNQUEIRA  A Junque ira (Monte Redondo -Lei ria) era , como em R io Maior, sal ina i nterior.

    Utilizava a água de uma nascente salgada, cuja presença se deve ao Diapi ro de

     Monte Real , uma estrutura te�ónica com um núcleo de sal-gema e gesso,

    reonsável por aquíferos subterrâneos com elevada salinidade. Porém, ao

    contrário do que sucede com as salinas de Rio Maior, divididas em dezenas de

    unidades, propriedade de vários marinheiros, a Junqueira foi uma única salina,

    com um traçado de marinha costeira (importado da Figueira da Foz). A salina

     produziu de 1922 a 19 80. José Rolo Júnior descobriu os depósitos salinos e

    construiu a salina, recorrendo às observações que realizou na Figueira da Foz e

    à contratação de marnotos locais. O sal da Junqueira foi comercializado sob a

    marca Império. Devido a obras hidráulicas, a partir de 1960 os teores de

    salinidade baixaram e a Junqueira entrou em declínio.

     A Junque ira te m um subst rato tu rfos o, com um solo movediço que mantém água

    mesmo em períodos de estiagem prolongada, onde se desenvolve uma vegetação

     palu stri na domi nada pe lo junco. Após o aba ndono da a� ividade a vege taçãocresceu rápida, não restando vestígios do traçado da marinha, à excepção de

    alguns planos de água. O Município de Leiria perpetuou a memória do local,

    dando-lhe condições de visitação através da construção de um passadiço

    sobrelevado e meios interpretativos. Foto: Município de Leiria.

    nheiro. Em 1979 foi criada a Cooperativa Ag rí-

    cola dos Produtores de Sal de R io Maior.

    Número de talhos: 470. Dimensão média de

    um talho: 35 a 50 m 2.  Área total: 22.0 00 m2.

    Produção anual: cerca de 1500 toneladas.

    Há referências às salinas de Rio Ma ior desde

    1177, em documentos que são os mais anti-

    gos sobre Rio Maior. Conta Casimiro Ferreira

    que, em 1177, Pero d’Aragão e a sua mulher

    Sancha Soares terão vendido uma parte do

    poço e das Salinas à Ordem dos Templários.

    Essa Ordem fez a compra e depois deverá ter

    doado a outras pessoas. Sabemos que o rei

     Afonso  V  era proprietário de cinco tal hos, no

    século XV , e que recebia um quarto de toda a

    produção, tendo o monopólio da sua venda. A

    importância económica das salinas está vin-

    cada nas duas pirâmides de sal retratadas no

    escudo da cidade de Rio Maior. As Marinhas

    de Sal de Rio Maior estão classificadas como

    Imóvel de Interesse Público, no contexto do

    património cultural português.

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    Pilhas de sal no Salar de

    Uyuni (Bolivia), a maior

    (e a mais alta) salina do

    mundo (12.000 km²).

    É o que resta de um lago

     pré-h istór ico; rodeado de

    montanhas, não escoa a sua

    água. O sal é colhido e

    amontoado em pequenas

     pil has para que se evapore

    a água ao sol. Por m é seco

    a fogo, e «enriquecido»

    com iodo. Foto de Luca

    Galuzzi - www.galuzzi.it

    O sal no mundoO Salar de Uyuni

    Éa maior planície salgada do mundo,

    localizada no Depart amento de Potosí,

    na Bolívia, no altiplano andino, a 3.650 m

    de altitude. Há cerca de 40.000 anos, era o

    Lago Michin, um giga ntesco lago pré-histó-

    rico. Quando este secou, deixou como rema-

    nescentes os actuais lagos Poopó  e Uru Uru,

    e dois desertos salgados, Coipasa e Uyuni.

    O Salar de Uyuni  tem uma área de 12.000

    km²; é maior que o lago Titicaca, na fron-

    teira Peru-Bolívia, com «apenas» 8.300 km².

    O Salar de Uyuni  contem 10 bilhões de

    toneladas de sal, das quais são extraídas

    25.000 anualmente. As condições de t raba-

    lho dos marnotos são desumanas, devido

    ao sol e à agressividade do a mbiente salino.

     Além da extra cção de sal, o Sala r também é

    um destino turístico, com a Ilha do Pescado,

    com formações de recifes e cactos de até 10

    metros de altura. Em Novembro, quando

    começa o verão, o Salar é habitat de três fla-

    mingos sul-americanos: o chileno, o andino

    e o Flamingo de James. Os flamingos apare-

    cem quando começa o período das chuvas

    e o descongelamento nos Andes, que deixa

    o Salar coberto de água, tornando-o um

    imenso lago com profundidade média de

    30 cm. Nesse período, parece um enorme

    espelho que se confunde no horizonte com

    o céu. Entre Abri l e Novembro, todo o Salar

    se transforma num imenso deserto seco –

    uma paisagem bizarra e exótica.

    O Salar é composto por 11 camadas com

    espessuras que variam entre 2 e 10 metros,

    sendo a mais externa de 10 metros. A pro-

    fundidade, estimada em 120 metros, é

    composta de uma mistura de salmoura e

    barro lacustre. O Salar é uma das maiores

    reservas de lítio do mundo, além de conter

    importantes quantidades de potássio, boro

    e magnésio.

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    Salina na Ilha de Lanzarote. Foto: Tony Hisge.

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    seu afluente, única fonte de água doce da reg ião, e

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    O Mar Morto

    QUEM  FAZ TURISMO EM  ISRAEL, costuma visitar

    este mar de água sa lgada, no meio do deserto.

    Invariavelmente, o visitante irá tomar banho nas

    suas águas viscosas e comprar um frasco de Sais

    do Mar Morto, para tomar um banho medicinal

    quando regressar a casa...

    Com uma superfície de 1050 km 2, o Mar Morto

    tem um comprimento máximo de 80 km e a uma

    largura de 18 k m. Ali mentado pelo bíblico Rio Jor-

    dão, está rodeado pela Jordânia, Israel e a Cisjor-

    dânia. Apesar de não ter escoamento, nos últimos

    50 anos perdeu um terço da sua superfície, em

    grande parte por causa da exploração excessiva de

    seu afluente, única fonte de água doce da reg ião, e

    devido à evaporação natural das suas águas. A

    perda das suas águas vai continuar a reduzir a

    sua área e a um contínuo afundamento. No ano de

    2004, o nível estava 417 metros abaixo do nível do

    Mediterrâneo, o que faz com que este mar seja a

    maior depressão em terra firme.

    O Mar Morto, o «sítio mais baixo do mundo», é

    realmente morto, porque a quantidade de sal que

    contém é quase 10 vezes superior à dos oceanos,

    o que torna impossível qualquer forma de vida

    – flora ou fauna – nas suas águas. A salinidade

    (página 98) tem uma va lor de 30 a 35 %.

     A sua água contem vários tipos de sais, alguns

    dos quais só se encontram nesta região do mundo;

    por isso, estes sais são comercializados por todo o

    mundo, já que têm a fama de «fazer bem à saúde».

     Antes de se chama r  Mar Morto, tinha outros

    nomes. Nos livros Génesis e Josué aparece o  Mar

    Salgado. Um  Mar de Arabá  aparece no Deuteronó-

    mio e em Reis. Já em Joel e Zacarias surge o  Mar

    Oriental. O Talmude designa-o por  Mar de Sodoma 

    e Mar de Lot . Como é sabido, as cidades pecamino -

    sas de Sodoma e Gomorra eram centros de diver-

    sões muito populares na Antiguidade.

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    l d l

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     A perfeitura brasile ira de Macau local iza- se na reg ião salineira ,a 180 km capital do E stado, sendo o maior produtor de sal do

    Brasil e um dos maiores do mundo. As monumentais pirâmides

    de sal marinho formam um cenário imponente. Macau possui

     prai as calmas e límpidas, f orma ndo um complexo paradi síaco.

    Para os amantes da gastronomia, Macau possui uma rica e

    eclética culinária marinha a base de camarões, lagostas,sururus, ostras, búzios, caranguejos, siris e peixes para todos os

    gostos... O município tem uma vocação festiva, realizando o

    maior carnaval do Rio Grande do Norte. Realiza, ainda, a Festa

    do Sal e do Reencontro, comemorada em Setembro, juntamente

    com a emancipação política de Macau.

    Salinas do Brasil

    Um dos primeiros registos de que as salinas natu-rais do Nordeste brasileiro chamaram a aten-ção dos portugueses é o relato do capitão Pero Coe-

    lho, em 1627. Derrotado por piratas franceses, Coe-

    lho recuou para o litoral, onde encontrou – na região

    de Areia Branca – extensões de sal suficientes para

    abarrotar muitos navios.

    Em 1641, Gedeão Morritz, o chefe da guarnição

    batava no Ceará, chegou às mesmas salinas e, a par-

    tir daí, os holandeses, que em seus primeiros anos

    no Nordeste importavam sal, trazido pelos navios

    da Companhia das Índias Ocidentais, iniciaram a

    extracção local.

    Como Portugal possuía salinas, tratou de expor-

    tar o seu sal para as colónias e de proibir não apenas

    a extracção local, como o aproveitamento das sali-

    nas naturais. Os brasileiros, que tinham acesso a

    sal gratuito e abundante, foram obrigados, em 1655,

    a consumir o produto caro da metrópole. No final

    do século xvii, quando a expansão da pecuária e a

    mineração de ouro aumentaram demais a procura,

    a coroa, incapaz de garantir o abastecimento, permi-

    tiu o uso do sal brasileiro – desde que comercializado

    por contratadores.

     A pa rti r de 1808, quando o monarca João V I t rans-

    feriu para o Rio e Janeiro a sede do reino, a extracção

    e o comércio de sal foram permitidos, mas persistia

    ainda a importação. As primeiras salinas artificiais

    começaram a fu ncionar no Brasil depois da Indepen-

    dência. Vestígios do monopólio salineiro ainda per-

    duraram ao longo do século xix, e só foram extintos

    depois da proclamação da República. O sal do Rio

    Grande do Norte só começou a ser comercializado

    noutras províncias a partir de 1808, com a suspensão

    das proibições por João V I.

    Fotos: Gustavo Madico

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    Salineras de Maras

     Amenos de uma hora de Cuzco, a imponente capitaldo antigo reino dos Incas, o viajante depara-se comas salinas comunitárias de Maras, um múltitude de ter-

    raços criadas pelos índios na vertente de uma montanha

    andina, bem longe da costa do Pacifíco onde se explo-

    rava, e ainda se explora, o sal do mar. A montanha con-

    tem um núcleo salino e um manancial que o atravessa

    e que vai extraíndo o sal, depositado pelos terraços. É

    o método ancestral para a obter sal das águas que bro-

    tam do sub-solo. Os comunei-

    ros retêm a água para a evapo-

    rar e obter o sal. Cada família

    ou indivíduo em Maras é pro-

    prietário de um pequeno tan-

    que ou piscina. São cerca de

    4.000 tanques. A vista do con-

    junto das salinas onde ressalta

    o branco contra a montanha é,

    pelo menos, impressionante. À

    altura de 4.ooo metros, a força

    da luz do sol sobre o sal encan-

    deia, como a neve.

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    Hallstatt e oSalzkammergut

    Salzkam mergut é uma famosa região turística austrí-

    aca perto da famosa cidade Salzburg, estendendo--se pelos estados austríacos da Alta Áustria, Salzburgo,

    e Estíria. Foi classificado Património Mundial em 1997,

    porque «a actividade humana no magnífico cenário

    natual do Salzkammergut começou em tempos pré-

    históricos, com os depósitos de sa l sendo explorados já

    no segundo milénio a.n.E. Este recurso formou a base

    da prosperidade da área até meados do século xx, umaprosperidade que se reflete na bela arquitectura da

    cidade de Hallstatt.»

    O Salzberg (=Montanha de Sal) em Hallstatt é, a nível

    mundial, a mais antiga exploração mineira de sal. Assim

    sendo, a região do Salzkammergut é também a mais

    antiga região industria l do mundo.

    Hallstatt é hoje uma pitoresca vila de montanha, situ-

    ada na margem sul do lago do mesmo nome. A pequena

    povoação está agarrada às rochas de um contraforte do

    massivo do Dachstein, cujo pico se eleva a uma a ltura de

    3004 metros.

    No fim do século IX  a.n.E., a exploração mineira foi

    interrompida, para ser retomada por volta de 800 a .n.E.,

    noutra zona do Salzkam mergut. Em 1734 faz-se um sur-

    preendente descoberta: o Mann im Salz (Homem do Sal),

    o corpo perfeitamente conservado no sal, de um mi neiro

    pré-histórico. No século  VI n.E., os Bajuvares (antepassa-dos dos Bávaros) tomam posse da região do Salzkam-

    mergut. Em 1284, o duque Albrecht de Austria manda

    construir uma torre de protecção para defender os vales

    altos do Salzberg. Passados apenas poucos anos, este

    Rudolfsturm entra em funções na Guerra do Sal travada

    entre Albrecht e o A rcebispo de Salzburg, Konrad IV.

    No ano de 1595 começou a ser insta lada uma conduta desalmoura até à localidade de Ebensee, distante de 40 km,

    sítio onde havia maiores reservas de lenha para combus-

    tivel. Esta conduta é o ma is antigo pipeline do mundo.

    Em 1997, a UN ESCO incluiu as regiões Hal lstatt/Dach-

    stein/Salzkam mergut, assim como o centro histórico da

    cidade de Salzburgo na lista do World Heritage, subli-

    nhando o legado arqueológico, o significado histórico,

    cultural, paisagístico e ecológico desta região da Áus-

    tria, unindo o legado da Natureza à actividade econó-

    mica e cultural do Homem.

    G é d

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    GuérandeOnze massivas torres redondas guar-dam a v ila de Guérande, que foi umadas mais importantes praças-fortes dos

    duques da Bretanha. No século XV , armava-se aqui um quarto dos navios bretões. O

    comércio do sal foi um recurso precioso

    para a cidade que o exportava, e o sal ainda

    hoje garante o ritmo da sua vida.

    Guérande (Gwenrann, em bretão) con-

    tinua a vigiar o mosaico de salinas que se

    estendem a seus pés por mais de 1.800 hec-tares: um vasto golfo, o Traict de Croisic.

    Este mar interior, aberto para o oceano

     Atlâ ntico por uma passagem de algumas

    centenas de metros, bem abrigado e rico

    em crustáceos, divide-se, de seguida, em

    múltiplos espelhos rectangu lares.

     As prestigiosas sali nas bretãs da Gué-

    rande são referidas desde o século  IX, no

    cartulário de Redon, e a salina de Penfont

    estava já em exploração na época carolín-

    gia. Conquistadas a prados inundáveis,

    i h d l ti i fi

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    as marinhas de sal atingiram o seu apogeu no fim

    do século XVI, graças à pesca do Bacalhau na Terra

    Nova, para declinar a part ir de 1840.

    Hoje, o sal alimenta famílias nas vilas Batz-sur-

    Mer, Croisic, La Turballe e os marnotos de Kerval-

    let, Pradel, Sissé e Queniquen. A formação profis-sional, posta em prática desde 1979, permitiu a uma

    nova geração de marnotos dinamizar uma tradi-

    ção em vias de ext inção. O Label Rouge (rótulo ver-

    melho) alcançado em 1991, premeia um sal de alta

    gama reconhecido pelas suas qualidades gustati-

     vas. Quer o confessem, quer não, todos os produto-

    res de sal  gourmet , não importa de que país, devemo prestígio destes produtos aos salineiros da Gué-

    rande, os primeiros a fazer um marketing est ratégico do

    seu sel gris de Guérande vocacionado não ao mercado de

    massas, mas aos amantes da boa cozinha e dos requin-

    tes do paladar. Qualité, pas quantité .

     As técnicas, que não mudaram desde a Idade Média,

    definem um r igoroso sistema hidráulico (veja a fotogra-fia grande na página seguinte), ligando estreitos canais

    e reservatórios, que exigem manutenção permanente.

    Introduzida pelas marés, a água do mar é encaminhada

    por canais (esteiros) para reservatórios dispostos nos

    pontos mais elevados da marinha, onde começa a con-

    centração salina (nos viveiros). Depois, a água circula

    entre vários planos de água.

     A  flor do sal é colhida à superfície da água com uma

    rasoila – como em todo o mundo. Muito mais volumoso,

    o sal grosso é junto com um las, um rapão de madeiracom cabo flexível, com 5 m de comprido. A ar te está em

    fazer deslocar o utensílio e de deixar correr a mão sobre

    a sua superfície. Um trabalho exacto sobre uma água

    com pouca profundidade.

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    – 40 –Batz-sur-Mer, marais salants. Foto: Harrieta.

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    – 41 –    F   o    t   o   :    P   a   s   c   a    l    F   r   a   n   c   o

        i   s    /    L   e   s   s   a    l    i   n   e   s    d   e    G   u    é   r   a   n    d   e

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    Salinas de Sa n Pedro del Pinatar,perto de Lo Pagán, Murcia, Eanha.Foto: Juanra

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     Aig ues-Mortes – l iteral mente: Á guas mortas – é uma cid ademedieval francesa situada perto do delta do r io Ródano, nocentro de um das mais antigas reg iões salineiras. Fica perto deNîmes e Montpellier. O território comunal é constituído poruma parte da planície húmida e os açudes d a Petite Camargue.

     Aig ues-Mortes e stá liga da ao mar pelo cana l du Grau- du-Roi . Aig ues-Mortes, antigo porto med iterrâneo, conserva a s suasmagní�cas muralhas, constr uídas no século XII, à beira-mar.Do alto das suas torres vêem-se várias salinas. Luís de Françaconstruiu este porto para concentrar as tropas que embarcaramnas Sétima e Oitava Cruzadas.

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    Sal mortal

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    CHÃO   BOM   é uma aldeia na Ilha de Santiago, Cabo Verde. Fica per to do tristemente célebre ca mpo deconcentração onde foram encerrados os inimigos polí-ticos da ditadura de Salazar. À Colónia Penal do Tarra-

     fal  chegaram os primeiros 157 prisioneiros já em 1936,

    tendo lá falecido cerca de 40 detidos. Foi encerrada em

    1954, e reaberta em 1961, para presos polít icos africanos.

    Um destino deliberadamente escolhido para debilitar

    os presos. O clima fatal desta região deve-se à sua secura

    e ao ar sa loubro, impregnado da salmoura do mar.

    O DECRETO   LEI   26:539 de 1936 diz que esta autên-tica Colónia da Morte serviria para receber ospresos políticos e sociais, sobre os quais recai o dever de

    cumprir o desterro, aqueles que internados em outros

    estabelecimentos prisionais se mostram refractários à

    disciplina e a inda os elementos perniciosos para outros

    reclusos. O quotidiano dos reclusos no Tarrafal foi pau-tado pelos trabalhos forçados, pelas provocações e cast i-

    gos. O contacto com o exterior era escasso, pois era proi-

    bida frequentemente a correspondência com amigos e

    familiares.

    Sal mortal  A  ILHA   DO   S A L , também no arquipélago cabover-diano, deve o seu nome a uma mi na de sal-gema nalocalidade de Pedra de Lume, descoberta em 1833. O seu

    povoamento iniciou-se no século XIX. A ilha deserta só

    começou a ter actividade económica com a exploraçãodas suas salinas, expor tando sal até 1980.

    O Sal tem uma superfície de 216 km², uma ilha com

    cerca de 14.800 habitantes. Pertence ao grupo das três

    ilhas do Arquipélago de Cabo Verde próximas do con-

    tinente africano, o que as torna vulneráveis ao vento

    quente e seco do deserto que transporta a areia do Saara

    e causa um nevoeiro conhecido como bruma seca.São planura extremas, de origem vulcânica; a ine-

    xistência de montanhas que condensem a humidade

    atmosférica faz com sejam ilhas áridas, onde a vegeta-

    ção é escassa. As extensas praias de areia branca, que

    é transportada pelos ventos desde o deserto do Saara,

    revelam-se hoje de grande interesse turístico. Com a

    presença de salinas naturais e artificiais (que no casodo Sal deram o nome à ilh a). Com lindas piscinas rocho-

    sas naturais. Com muito, muito vento, para fazer surf.

    Com um sol africano ex tremo, apto a bronzear qualquer

    turista em dois dias...

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    Sal, um condimento

    de excelênciaFalando de sal para temperar, a  flor de sal   é o pro-duto salino de excelência. A alvíssima  flor de sal(no recipiente verde) deve a sua brancura ao facto de

    o marnoto nunca tocar no fundo da salina. A Natu-

    reza faz a cristalização da  flor de sal à superfície daágua das salinas. Resultam finos cristais de sal aglo-

    merados em delgadíssimas palhetas, que facilmente

    se desagregam por pressão entre os dedos.

     A  flor de sal  é ganha num processo paralelo à pro-

    dução de sal marinho tradicional. A água saturada, ao

    evaporar nos cristalizadores das salinas, produz

    cristais de sal que se formam, inicialmente, à super-fície da água e que se vão depositando, com o tempo,

    no fundo dos talhos.

    Os cristais formados à superfície transmitem um

    sabor mais delicado, que se prolonga no paladar e

    acentua, como nenhum outro sal, o sabor natural

    dos alimentos. É o produto ideal para a mesa, des-

    tinando-se ao tempero de saladas, pratos frios e de

    alimentos já confeccionados, tais como tapas e ace-

    pipes, carnes e peixes grelhados, legumes; dissolve-se facilmente. Em comidas secas, tais como batatas

    fritas, amêndoas, amendoins ou favas torradas, dá-

    lhes uma textu ra crocante e afina o gosto.

     A  flor de sal  que empresas portuguesas – como a

    salina algarvia Necton – exportam com grande

    sucesso para todo o mundo, era chamada nata  ou

    coalho de sal  – por ser recolhida à superfície dastalhas, tal como a nata do leite. Pouco apreciada, a

    nata do sal servia para pagar parte do ordenado do

    marnoto. Curiosamente, ainda hoje este produto

    obtem mais valorização dos  gourmet s na Alemanha,

    tradicional, que os cientistas tem vindo a estudar, con-

  • 8/16/2019 Livrinho Do Sal

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    – 50 –

    França, Reino Unido e Estados Unidos do que dos apre-

    ciadores em Portugal. Este produto excepcional valeu à

    Necton no ano de 2000 o Slow Food Award for the Defense

    of Biodiversity. Com este prémio internacional são dis-

    tinguidos esforços e iniciativas em prol da conserva-

    ção da Biodiversidade. A revista FOCUS, em Novembrode 2001, escreveu sob o título Um produto nacional volta

    às luzes da ribalta: «O sal industrial tomou conta do mer-

    cado português. Mas recentemente os consumidores

    redescobriram as vantagens da flor do sal, um produto

    cluindo que tem propriedades físico-químicas ún icas.»

    Sal marinho tradicional

    Osal marinho artesanal, que não é nem refinado

    nem «enriquecido» com aditivos, contem todasas riquezas naturais do mar. Do oceano ao talho, a água

    marinha conserva os seus minerais, úteis e necessários

    à saúde. Conserva o sódio, o mag nésio, o cálcio e o potás-

    sio; também os oligo-elementos como ferro, zinco, man-

    ganésio, iodo e fluor, revelando-se uma fonte de elemen-

    tos essenciais ao funcionamento do organismo. É rica

    em magnésio, fundamental para as reacções enzimáti-cas do metabolismo, e mantém uma relação equilibrada

    entre a percentagem de sódio e de potássio.

    Sujeito a controlo permanente, o sal marinho tradi-

    cional apresenta-se isento de metais pesados, resíduos

    de pesticidas e radioactividade, não necessitando de

    nenhum tratamento posterior, o que significa que não é

    sujeito a lavagens, não é refinado e não contém qualqueraditivo. As certificações de qualidade atribuída a este

    tipo de sal vem de organizações independentes como

    a associação francesa Nature et Progrés, a Certiplanet   ou

    a Natural Food Certifiers. Estas organizações atestam a

    pureza (no que diz respeito à composição química), a Entretanto, o mercado português oferece já produ-

  • 8/16/2019 Livrinho Do Sal

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    – 51 –

    qualidade ambiental, e eventualmente também o valor

    alimentar dos produtos.

    O sal marinho algarvio vem de pequenas produções

    que se situam nos estuários protegidos dos parques

    naturais da Ria Formosa e do Sapal do Castro Marim,ao longo da costa atlântica do Sotavento algarvio. O sal

    é sempre recolhido à mão, seco sem meios artificiais, só

    pela acção do sol e do vento.

    tos que, ainda há poucos anos, só se encontravam em

    outros países: sais com ervas ou com misturas aromáti-

    cas. Neste sector merecem especial relevo dois produtos

    topo-de-gama da empresa Necton: «Salgar», três mis-

    turas de sal com er vas aromáticas ou piri-piri, e «Coda»,por assim dizer «sal de autor»; são três surpreendentes

    misturas de flor de sal com especiarias exóticas, idealiza-

    das pelo chef  português Vitor Sobral.

    S l d i

  • 8/16/2019 Livrinho Do Sal

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    – 52 –

    Salga do peixe

     A  SALGA    É   UM   DOS   TRADICIONAIS   MÉTODOS   de pre-

    servação de alimentos. A sua aplicação a peixesremonta às civilizações do Antigo Egipto e da Meso-

    potâmia, há seis mil anos. Este processo continua a ter

    ampla aplicação, sendo o Canadá, a lslândia e Noruega

    os mais importantes produtores e expotadores de pes-

    cado salgado.

     A salga é um processo de preservação com sal, tendo iní-

    cio na lavagem e evisceração do peixe e fi nalizando coma embalagem do produto salgado. É um processo físico-

    químico no qual o sal impele a saída de humidade do

    músculo, conservando e secando, causando assim tam-

    bém uma perda de peso.

     A penetraç ão do sal e a saída de ág ua termi na quando

    se estabeleceu o equilíbrio osmótico do processo de salga.

    O período durante o qual o peixe perma nece no sal – emforma cristalina ou em solução salina – é o tempo de

    salga ou tempo de cura pelo sal. A matéria prima para a

    salga deve ser de boa qualidade, condição para um pro-

    duto adequado para o consumo huma no.

    Os Romanos eram perfeitos conhecedores deste

    processo. Foram eles que introduziram a técnica dasalga do peixe na Península Ibérica. Portugal e Espa-

    nha, com as suas extensas orlas marítimas, expostas

    a ventos fortes e com Verões de altas temperaturas,

    estavam predispostos a serem produtores de sal.

     A exploraçã o metódica do sa l nas costa s de Portugal

    remonta pois aos tempos da invasão romana. Vários

    sítios arqueológicos mostram unidades de produçãode sal e de salga de peixe – por exemplo as salgadei-

    ras de Cetóbriga, na Península de Tróia, em frente à

    cidade portuária de Setúbal.

    No Algarve conhecemos as salgadeiras romanas em

    Portimão e na Ria Formosa. Outro centro conserveiro

    foi Cerro da Vila (Vilamoura, Algarve). Estas unida-

    des de fabrico faziam parte de uma cadeia comercialque, centrada no Mar Mediterrâneo, o mare nostrum 

    dos Romanos, garantiu o fornecimento de produ-

    tos do mar a todos os g randes núcleos populacionais

    do Império, incluindo a própria cidade de Roma.

    Fiel amigo, fidelíssimo! Nunca os

    bdi d di i l

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    – 53 –

     portugueses abdi caram do tradiciona l

    bacalhau salgado. À Gomes de Sá.

     À Zé do Pipo. Com ou sem natas.

     À Moda da casa. Com grelos. Com

    batatas. Com grão de bico. No forno.Cozido. Assado. Frito. Às postas.

    Desfiado. Em pastéis.

    Este comerciante no mercado de

    Loulé nunca precisará de temer

    pelo futuro. Graças à Noruega...

    Métodos de salgaA salga praticada por métodos artesa

    fica a coagulação das proteí-

    nas; entretanto, a sua lenta

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    – 54 –

     A salga, praticada por métodos artesa-

    nais e industriais, pode ser salga seca,salga húmida (em salmoura) ou salgamista. Em qualquer destes processos,a salga termina quando se estabelece o

    equilíbrio osmótico, que poderá ocor-rer num período que vai de 2 a 20 dias.

    Para reduzir esse período, inventou-se

    a salga rápida, que dura 8 horas.Pelo processo de salga seca, o peixe

    é salgado na proporção de 30% de clo-

    reto de sódio em relação ao peso da

    matéria prima, espalmada em forma

    de filetes ou mantas. O sal é colocadosobre o peixe, onde se dissolve for-

    mando uma solução concentrada. Por

    osmose, a humidade do peixe exuda, e

    uma parte do sal penetra no seu mús-

    culo. Este processo tem um forte efeito

    desidratante; a velocidade de penetra-

    cão do sal é muito rápida, o que pro-

    tega o peixe da deterioração.Na salga húmida, a matéria prima é

    colocada em tanques, onde se acumula

    salmoura obtida a partir da humidade

    do músculo do peixe, devido à penetra-

    ção do sal. Durante o processo, a água

    flui para a salmoura, diluindo-a.

     A salga poderá ser influenciada por

    factores, relacionados ao sal, à matéria

    prima e ao clima. Quanto ao sal, temos

    a pureza, a concentração granulomé-trica e de microflora do sal. Para se

    produzir um peixe salgado de boa qua-

    lidade, é necessário que seja utilizado

    sal de boa qualidade. O sal fino, cons-

    tituído por pequenos cristais, tem uma

    penetração rápida no início, dimi-

    nuindo o seu poder penetrante face à

    concentração que ocasiona a coagu-lação das proteínas da superfície do

    músculo, contribuindo para uma con-

    servação deficiente do produto. O sal

    grosso actua lentamente, e não se veri-

    acção ao longo do processo

    de cura conduz à altera-

    ções, se a salga for proces-

    sada em dias quentes.

    Quando o sal entra emcontacto com o músculo do

    peixe em suficiente quanti-

    dade, paralisa a autólise e

    a decomposição. A sua acção preser-

    vativa deve-se à capacidade que tem o

    cloreto de sódio de produzir uma ele-

    vada pressão osmótica nas células bac-

    terianas, provocando como consequên-cia o seu rompimento ou plasmolise.

    O cloreto de sódio possui ação bac-

    teriostática e bactericida, ou seja, para-

    lisa o crescimento e causa a morte das

    bactérias. Sabe-se que o sal não apenas

    causa a plasmólise como também blo-

    queia o núcleo das proteínas, desnatu-

    rando as enzimas. A preservação mani-festa-se por alterações provocadas na

    estrutura das proteínas e enzimas, tor-

    nando estas substâncias inactivas.

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    – 55 –

    N

    ão há mesa portuguesa que não o apresente.

     Antes, era comida dos pobres e remediados;

    hoje, já não é tão diário como os apreciado-

    res desejariam, devido ao seu preço. Mas na época nata-lícia continua a ser indispensável: um certo peixe seco,

    para cuja elaboração o sal é imprescindível, o Bacalhau.

    Se bem que os portugueses se orgulhem de uma cozinha

    rica em torno do Bacalhau, e de que este faça parte da

    cultura popular, este peixe seco também é muito apre-

    ciado noutros países. É Bacalhau para portugueses e bra-

    sileiros; Stockfish para os alemães; baccalà para os italia-

    nos; bacalao para os espan hóis e sul-americanos e codfish para os ingleses. A história do Bacalhau começa com os

     vik ingues, os pioneiros na descoberta deste peixe, farto

    nos mares nórdicos que navegavam. Como não usa-

     vam sal, lim itavam-se a secar o peixe ao sol. Os primei-

    Bacalhau ...salgado

    gem do peixe nas rochas para sua melhor conservação,

    era utilizado nos barcos que part iam a conquistar novas

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    – 56 –

    era utilizado nos barcos que part iam a conquistar novas

    terras. O método de salgar e secar o alimento, além de

    garantir a sua conservação por semanas e meses, con-

    servava o paladar.

    Os Portugueses descobriram o Bacalhau no século XV ,na época das gra ndes viagens. Eram necessários produ-

    tos que aguentassem as longas viagens. Foram os por-

    tugueses os primeiros a ir pescar o Bacalhau na Terra

    Nova (costa do Canadá), que foi descoberta em 1497.

    Existem registos que em 1508 o bacalhau correspondia

    a 10% do pescado comercializado em Portugal. No rei-

    nado de Manuel I, em 1596, era cobrado o dízimo da pes-caria da Terra Nova nos portos de Entre Douro e Minho.

    Este imposto destinava-se a patrocinar expedições para

    a pesca do Bacalhau.

     As primeiras frotas pesqueiras de bacal hau eram per-

    tença do Reino e só em meados do século XIX, altura em

    que o imposto sobre a pescaria foi abolido, se autorizou

    a que part iculares explorassem este negócio. As primeiras embarcaç ões – os lugres – era m velei ros,

    feitos de madeira; a pesca fazia-se à linha. Os homens

    do mar chegavam a t rabalhar 20 horas por dia. Em 1510,

    Portugal e Inglaterra firma ram um contrato com França

    ros comerciantes deste peixe foram os Bascos, em redor

    do ano 1000. Já conhecedores do sal, comercializavam o

    peixe curado, salgado e seco, o que era feito ao ar livre.

    No século XV , na costa espanhola, depois da salga e seca-

    para a exploração do peixe. No

    ano de 1532 o controlo da pesca do e África o que transformou a

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    – 57 –

    ano de 1532, o controlo da pesca do

    Bacalhau na Islândia fez deflagrar

    um conflito entre ingleses e ale-

    mães que ficou conhecido como a

    Guerra do B acalhau.Em 1585 estalou outro conflito,

    este entre os Ingleses e os Espa-

    nhóis. Por essa razão, ao longo dos

    séculos, foram assinados vários acordos entre os países

    para regular os d ireitos de pesca do bacalhau. Contudo,

    a sua excessiva pesca levou quase ao completo desapare-

    cimento e os tratados internacionais actualmente assi-nados para a sua preservação

    protegem uma espécie já em

    perigo de extinção. Não admira

    que vários produtores de Baca-

    lhau tenham optado pela sua

    criação em viveiros.

     A primeira i ndústria de t rans-formação do bacalhau foi fun-

    dada na Noruega. A crescente

    procura logo levou à sua expor-

    tação para a Europa, América

    e África, o que transformou a

    Noruega no principal pólo mun-

    dial de pesca e exportação de

    Bacalhau.

    Hoje, a Noruega está a entrarem domínios comerciais que

    antes pertenciam aos Portugue-

    ses. Para além de ser o nosso princi-

    pal fornecedor de bacalhau, dominando já 55 por cento

    de um mercado de consumo que vale act ualmente 75 mil

    toneladas/ano, os noruegueses estão a investir na sua

    transformação em produto acabado, sendo já o princi-pal concorrente de Portugal na

    secagem e preparação do «fiel

    amigo». A Noruega coloca em

    Portugal 40 mil toneladas de

    Bacalhau, sendo que, metade

     vem já salgado e seco e outra

    metade é vendido da formatradicional, para ser seco e

    transformado pelos industri-

    ais nacionais • • •

     José Luis Gomes de Sá Junior foi cozinheiro

    no Restaurante Lisbonense. Aí criou a sua cé lebre

    receita, servida pela p rimeira vez em 1914.

    Viria a morrer em 1926.

     José Valentim , mais conheci do por Zé do Pipo ,

    viveu no Porto, onde era dono do restaurante como mesmo nome. Aí fez a confecção do seu prato,

    em que as postas de bacalhau eram cobertas por

    maionese e depois levadas ao forno a gratinar.

    O lugre Santa Isabel, Aveiro

    Belos mosaicos com representações de peixes.

     Villa romana de M ilreu, Estói, A lgar ve.

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    xes pequenos, crustáceos e moluscos esmagados; tudo

    isto era deixado em salmoura e ao sol durante cerca de

    dois meses. O produto, que pode ter tido um sabor seme-

    lhante ao molho de soja, era exportado para várias par-tes do Mediterrâneo. A ex istência de numerosas fábricas

    [usinas] detectados no litoral da Península Ibérica, pro-

     vam um nítido cresc imento desta indúst ria conser veira.

    Em 2006, arqueólogos espanhois fizeram uma des-

    coberta sensacional na costa mediterrânica de Cádiz:

    uma nave romana de 30 met ros, que levava cerca de 400

    toneladas (!) de carga. A bordo iam 1.500 ânforas, e partedelas levava  garum, conforme se comprovou pelas espi-

    nhas de pei xe encontradas nos recipientes de barro.

    Em Roma, o  garum era um produto culinário de luxo.

    O  garum  lusitano chegava a todos os pontos do Impé-

    rio, produzido sobretudo nos estuários

    dos rios Tejo e Sado. Na foz do Sado, em

    Tróia, uma fábrica de  garum estendia-sepor cerca de dois quilómetros. Na região

    atlântica conhecemos os restos desco-

    bertos em Alto de Mart im Vaz (Póvoa de

     Varzim) e na praia de Angeiras (Matosi-

    Era um molho gourmet , de luxo, por assimdizer, feito à base de peixes, sal e ervasaromáticas, muito apreciado em Roma eexportado para todo o Império. O garum era

    um condimento composto por sangue, vís-

    ceras e de outras partes seleccionadas do

     Atum ou da Cavala , misturada s com pei-

    Garum

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    – 59 –

    nhos). No estuário do rio Sado, em

    Creiro, Rasca, Comenda, Ponta da

     Areia, Moinho Novo e na Penín-

    sula de Tróia – um do mais impor-tantes centros conserveiros da His-

    pânia. As ruínas destas usinas mos-

    tram tanques [cetárias] destina-

    dos à salga de peixe e à prepara-

    ção de conservas, tanques normal-

    mente feitos de alvenaria . Em Caci-

    lhas, concelho de Almada, foramdescobertos vestígios de uma

    fábrica romana de salga de peixe

    no actual Largo Alfredo Diniz.

    Como as conservas de peixe desti-

    nadas à exportação eram embala-

    das em sólidas ânforas de cerâmica,

    foram também encontrados inú-meros destes containers. No litoral

    algarvio e na Andaluzia também

    se produzia  garum  em dezenas de

    sítios. Um exemplo é Cerro da Vila

    Tanques onde se salgava o peixe e confeccionava o

    garum em Cerro da Vila (Vilamoura). O cheiro a

     peix e devi a ser insupor tável , mas for amconstruídas habitações logo ao lado destas

    instalações fabris. O sal era um ingrediente

    essencial para o processamento de conservas de

     peix e e a elaboração do garum.

    (Vilamoura, Algarve) e a cidade

    de Baelo Claudio, equipadas coma infraestrutura para a salga de

    peixe e a preparação do apreciado

     garum  • • •

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    – 60 –

    Ecossistema salinaD

    esempenham um papel importante na conserva-ção da Natureza. Ao longo do ano, inúmeras aves

    utilizam os tanques e as imediações das salinas como

    local de refúgio, de ali mentação – e até mesmo de nidifi-

    cação. Na costa marítima portuguesa, nos meses de

    Outono e Inverno, a diversidade aumenta. Patos, Gar-ças, Cegonhas, Flamingos, Colhereiros e aves limíco-

    las, sendo estas o grupo dominante. Pilritos, Maçaricos,

    Borrelhos, Andorinhas-do-mar, Perna-longas (com a

    sua plumagem branca e preta e as longas pernas encar-

    nadas) e Alfaiates são apenas algumas espécies que

    partilham, juntamente com o Homem, o habitat  cha-

     Ao interesse económico das sal inas, acresce a sua biodiver-

    sidade, permitindo a coexistência, numa área confinada, de

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    – 61 –

    mado «salina tradicional».

    Não admira que diversas salinas se encontrem situ-

    adas em Parques Naturais. É o caso das salinas da

    Necton, em pleno Parque Natural da Ria Formosa, e é ocaso das salinas de Castro Mar im, que fazem parte da

    Reserva Natural do Sapal de Castro Marim e Vila Real de

    Santo António. No último, 60% correspondem a zonas

    húmidas, sendo 30% sapais e 28% salinas.

    Osapal é uma vasta planície de solos de aluvião,dominada por vegetação halófita que suportacondições extremas de salinidade e as marés do

     Atlâ ntico. Os sapais encontra m-se

    junto aos estuários dos grandes

    rios, sistemas intermédios entre o

    meio aquático e terrestre. São os

    biótopos de maior produtividade

    do planeta. A biomassa produzida

    no sapal e transferida para a cadeiaalimentar é elevada; várias espécies

    faunísticas encontram aqui condi-

    ções para o seu desenvolvimento.

    grande variedade de organismos da base da cadeia trófica.

    Nestas áreas encontramos uma grande diversidade de espé-

    cies. No final da Primavera e início do Verão, a abundância

    de aves nas salinas diminui significativamente, mas a suaimportância é então acrescida por albergar populações de

    espécies que dependem quase exclusivamente deste habitat  

    para nidificar. É o caso da Andorinha-do-mar anã e de aves

    limícolas como o Perna-longa, o Borrelho-de-coleira-inter-

    rompida e o A lfaiate. Esta última é uma espécie de estatuto

     vulnerável que tem nas sali nas algarv ias o único núcleo

    reprodutor regular a nível nacional • • •

    Aparentemente tais voos são involuntários, sendo as aves car-

    regadas pelos ventos sobre o Atlântico meridional. Os ralíde-

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    Fang-’água zul  A família Rallidae é uma família de aves Gruiformes que in-clui as Saracuras, Sanãs, Galinhas-d’água, Pintos-d’água,

    Frangos-d’água e Carquejas. O grupo habita regiões panta-

    nosas, margens de rios ou lagos em zonas de vegetação den-

    sa. Observa-se, por exemplo, na costa do Algarve.

    Várias espécies tem distribuição ampla, sendo que mui-

    tos tem registos fragmentados, reflexo dos seus comporta-mentos crípticos. Há espécies migratórias, como Gallinula,

    Porphyrio martinica e as Fulica. Porphyrio martinica é a única

    espécie que sabidamente realiza migrações transatlânticas.

    os têm em geral pés longos terminando em dedos muito com-

    pridos que facilitam a locomoção em terrenos semi-submer-

    sos ou sobre vegetação flutuante.

    As asas são curtas e arredondadas; estas aves deslocam-sesobretudo em terra, mas muitas sabem nadar. Apesar disso,

    voam bem, mas tendem a não fazê-lo. Em geral deixam os pés

    pendentes ao voar (curtas distâncias). São aves de índole in-

    quieta, comportamento reflectido no quase constante movi-

    mento das caudas, que são levantadas verticalmente. Muitas

    espécies apresen-

    tam hábitos crepus-culares, passando o

    dia escondidas na

    vegetação. Tais es-

    pécies saem, em ge-

    ral, à tarde, para se

    alimentar. 

    São aves

    tímidas e reclusas,traindo-se apenas

    pela voz. Foto: John

    Mosesso, Jr.

    Faming-omum Phoenicopterus ruber. Esta inconfundível espécie utiliza mui-

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    – 63 –

    to os tanques das salinas, onde pode ser observada a alimen-

    tar-se ou a descansar.

    Os flamingos são aves pernaltas, de bico encurvado. A sua

    plumagem pode ser colorida em tons claros ou de rosa vivo.São aves gregárias, que vivem em bandos numerosos junto a

    zonas aquáticas. Algumas espécies conseguem inclusivamen-

    te habitar zonas de salinidade extrema, como os lagos africa-

    nos do Rift.

    Durante o primeiro ano, os juvenis apresentam uma cor cas-

    tanho-acizentado na cabeça, pescoço e escapulares; as par-

    tes inferiores ficam brancas. A sua cor típica – o belo cor-de-rosa da plumagem do adulto – é devida à sua alimentação; o

    pigmento vem da Dunaliella, uma microalga comum nas sali-

    nas (página70). Esta cor rosa da plumagem vai ficando mais

    intensa ao longo dos anos. Em Portugal, o flamingo é resi-

    dente e invernan-

    te; embora não ni-

    difique no país, al-guns indivíduos –

    sobretudo imatu-

    ros – permanecem entre nós durante todo o ano, como o pe-

    queno flamingo (em baixo), que não sai da salina da Necton,

    em Belamandil. São animais que se alimentam de algas e pe-

    quenos crustáceos, moluscos, anelídeos, insectos e suas lar-

    vas; consome também sementes, algas e diatomáceas. A re-

    produção do belo Flamingo-comum ocorre na Primavera.

    Comprimento: 125-145 cm; envergadura: 145 a 160 cm. Fotos:em cima, Aaron Logan; ao lado, PH.

     Gaça-a

  • 8/16/2019 Livrinho Do Sal

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    – 64 – Garças. Foto: Tomás Castelazo

    G Ardea cinerea. Garça de grandes di-

    mensões, com plumagem em vários

    tons de cinzento, desde o branco ao ne-

    gro. Pode ser observada em descansonos muros das salinas ao longo de todo

    o dia. É uma espécie invernante e esti-

    val regular; pouco abundante. Nidifica

    principalmente no Alto Alentejo, e é

    mais abundante no Inverno, devendo

    a população nidificante ser residente

    ou migradora parcial. A população en-contra-se em recuperação e expansão

    para o Sul. Durante a época reproduti-

    va, apresenta penas longas na cabeça e

    peito. Alimenta-se sobretudo de peixe,

    mas a dieta varia consoante o habitat  e

    as épocas do ano. A reprodução ocorre

    na Primavera. Comprimento: 90 a 98cm; envergadura: 150 a 175 cm.

     Gaça-anc Egretta garzetta. Podem ser observadas ao longo de todo o ano e em toda a

    É

  • 8/16/2019 Livrinho Do Sal

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    – 65 –

    extensão de sapais e salinas: descansando ou procurando alimento. É uma

    ave invernante e nidificante regular abundante. Parte da população nidi-

    ficante pode migrar e atingir a costa mediterrânea e o Norte de África. A

    plumagem é branca e as patas amarelo-verde contrastam com o negro daspernas.

    Durante a época reprodutiva apresenta penas longas na cabeça, pei-

    to e dorso e as patas podem apresentar uma cor avermelhada. A Garça-

    branca alimenta-se de insectos aquáticos, crustáceos e pequenos peixes.

    Reprodução na Primavera. Comprimento: 55 a 65 cm; envergadura: 88 a

    95 cm. Foto: Isidro Vila Verde, ave fotografada em Afurada, Gaia.

    Prna-ongHimantopus himantopus. Parece uma cegonha em minia-

    tura: patas longas e vermelhas, bico fino e preto. Em vôo

    (foto em cima), as patas prolongam-se para além do cor-

    po. É uma espécie típica das salinas, zonas que utiliza qua-

    se em exclusividade durante todo o ano. Ave limícola, in-

    vernante regular e abundante, assim como nidificante re-gular e abundante. Ave carnívora, alimentando-se de uma

    grande variedade de invertebrados, sobretudo aquáticos.

    A reprodução acontece de Abril a Junho. Comprimento:

    35-40 cm; envergadura: 67-93 cm. Fotos: Isidro Vila Verde.

  • 8/16/2019 Livrinho Do Sal

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    Parque Natural da Ria Formosa A Ria Formosa é um longo sapal situado no Alga rve, quese estende pelos concelhos de Loulé, Faro, Olhão, Tavira

    e Vila Real de Santo António, abrangendo 18.400 hect a-

    res ao longo de 60 km – desde o rio Ancão até à praia da

    Manta Rota. Trata-se de uma área protegida pelo esta-tuto de Parque Natural. A sul é protegida do Atlântico

    por um cordão dunar paralelo à orla continental, for-

    mado por duas penínsulas (Faro e Cacela) e cinco ilhas

    barreira arenosas (Ilha da Barreta, Ilha da Culatra, Ilha

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    Plantas halófitas: peritasem sobrevivência, capital do futuro

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     Vverd-os-apis Suaeda vera. Arbusto comum em solos salgados, alturas de 0,5 a

    1 metro. Muito ramicado, com os ramos superiores cobertos

    de pequenas folhas lineares, cilíndricas e carnudas, de cor

     verde -escuro. O c aule é esbranqu içado, ou averme lhado.

    Floração: Pr imavera-Verão. Flores muito pequenas, de cor

     verde -ama relad o e reunidas em grupos de 3 a 5.

    Fotos das plantas: A. Sykes, S .Prévot, J.P. Prévot.

     A vegetação do sapal e da salina adaptou-se a estes meioscom elevados teores de sal. As halófitas (halos=sal, phy-ton=planta) são plantas caracterizadas por adaptações morfo -

    lógicas ou fisiológicas: redução das folhas, grande massa radi-

    cular, protecção dos órgãos aéreos por espessa cutícula, den-

    so revestimento de pêlos secretores de sal, suculência de fo-

    lhas e caules. Os sais absorvidos podem ser expelidos pelas

    raizes, ou segregado por glândulas nas folhas.

    As plantas halófitas também «vingam» sobre rochas da costa

    marítima, em costas arenosas, nas margens de lagunas, nosaluviais dos grandes deltas. De modo geral, as halófitas cres-

    cem em todos os cantos da Natureza onde o resto da flora

    capitula. Para 99% das cerca de 2.500 plantas halófitas conhe-

    cidas, os seus habitats são tão mortíferos como para os seres

    humanos o é uma atmosfera sem oxigénio.

    Na maioria das plantas, as funções vitais das células param,

    tão logo haja sal em excesso. Sobe a salinidade (pág. 98) aci-ma de um valor crítico, a célula sente-se carente de água – o

    que leva a uma redução drástica da foto-síntese. Mas as plan-

    tas halófitas lidam com o sal de maneira diferente. Para po-

    der absorver a água salgada, elevam a pressão osmótica das

    células até que a concentração de sal dentro da planta seja

    mais elevada que a do solo. Deste modo, as raizes podem as-

    pirar. Mas o sal admitido com a água põe em perigo o equilí-

    brio químico dentro da planta. Por isso, as halófitas dispõemde vacuolas (cavidades cheias de líquido) aumentadas. Estas

    vacuolas podem inchar – deste modo, a planta vai dispor de

    maior volume: o sal é diluído, a concentração de sal nas célu-

    las diminui. Se este processo não logra estabelecer novo equi-

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     Sia  Limon iastr um mono petal um. A sapei ra é um arbusto com cerca d e 1

    metro de altura, bem ramicado e denso. As suas folhas são largas e

    encontram-se dio stas em torno do caule. Tem a sua oração na

    Primavera. As ores são de uma cor roxa intensa, apresentando uma

    coroa soldada em uma só pétala. O nome cientí co provém desta

    cara�erística: mono=um e petal um=pétala. Na foto: uma sapeira

    (com ores roxas) entre duas sarcocórnias.

     ScocóniSarcocornia . Pequeno arbusto lenhoso, com ra mos gordos e

    suculentos, articulados, formados por segmentos de cor verde.

     As pequenas folhas parec em esca mas, soldada s ao caule, uni das

    em volta deste. De Agosto a Setembro aparecem ores pouco

     visívei s, em gr upos de três, em que duas late rais cam como

    soldadas à do meio, maior. Localizadas nas extremidades dos

    caules, estas ores cam vermelhas ou castanhas.

    líbrio, a planta halófita pode ainda recorrer a outros mecanis-

    mos para se livrar do sal em excesso. Por exemplo: usa pêlos

    secretores nas folhas, ou segrega o sal por glândulas especiais,

    situadas nas folhas. Como último expediente, a planta desem-baraça-se de partes envenenadas pelo sal por auto-amputa-

    ção. Algumas halófitas armazenam o sal nas folhas, que caem

    no final da estação, e assim expulsam sal em excesso. Outros

    recursos de exitosa adaptação a meios salinos são: redução

    do tamanho das folhas (como na Salicórnia, em detalhe a par-

    tir da página 83), grande massa radicular, órgãos aéreos pro-

    tegidos por cutícula espessa, denso revestimento, suculência

    de folhas e caules. Estas capacidades de adaptação a meiosextremamente agrestes tem vindo a atrair a atenção de biólo-

    gos e ecólogos – e dos investores orientados para a saltwater

    agriculture. As plantas salgadas já são consideradas o «capi-

    tal do futuro».

    Dunaliella salina

    A POPULAÇÃO   DE   MICROALGAS   na água de umasalina varia segundo a salinidade (página 98) Conhecida pelas suas virtudes antioxidantes, é muito

    utilizada na cosmética e nos suplementos dietéticos.

    Fora das salinas os bio engenheiros estão a cultivar

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     A  salina varia segundo a salinidade (página 98). Até uma concentração de 130 g/l, as Diatomá-ceas e as Cianobactérias predominam. Com mais sal,

    as Diatomáceas desaparecem, e até à marca de 180 g/l, a

    salina é dominada por Cianobactérias que formam tape-

    tes escuros no fundo das mesmas; tapetes com foto-sín-

    tese muito intensa, que contribuem para a purificação

    das águas, e eleva m a sua temperatura – devido à sua cor

    escura.

     A partir de 180 g/l é a microalga Dunaliella salina  que

    predomina na salina . Esta confere a cor rosa intensa, por vezes vermelha, que as salinas apresenta m no Verão. É

    uma alga unicelular, microscópica, presente em todas as

    marinha s do mundo.

     A Dunaliella salina é uma a lga verde halófita; a sua resis-

    tência ao sal deriva da alta concentração de betacarotina 

    no seu organismo – pigmento natural que a protege da

    luz solar e das altas acumulações de glicerol. Estas condi-ções desfavoráveis provocam uma pressão osmótica ele-

     vada, que a alga consegue compensar. Dentro das sali-

    nas, a Dunaliella faz parte da cadeia alimentar; serve de

    alimento, por exemplo, à Artémia (pági na 73).

    Fora das salinas, os bio-engenheiros estão a cultivar

    novas estirpes de Dunaliella,  pois a sua betacarotina é

    usada como pigmento natural pela indústria cosmética,

    entre outras aplicações. Não só institutos de pesquisa,

    como também um crescente número de empresas comer-

    ciais produzem quantidades industriais desta micro-

    alga. É fácil criá-la, já que, sendo um organismo que faz

    foto-síntese como qualquer outra planta, só precisa de

    água (salgada) e de sol para crescer.

    Plínio, o Antigo, menciona que a flos salis, sendo a melhor

     variante de flor de sal, produz uma espéc ie de óleo, umaespécie de gordura no sal. A cor que ele descreve leva a

    pensar numa flor de sal contendo Dunaliella salina.

    Plínio acrescenta que nos recipientes, podia ser obser-

     vada uma brancura à superf ície quando o interior estava

    húmido. Uma mistura de glicerol e de salmoura saturada

    pode depositar uma ca mada de sal no recipiente, quando

    a água se evapora. Flos salis era um produto muito usadona fabricação de perfumes da Roma antiga. Segundo Plí-

    nio, esta preferência devia-se em parte à bela cor; mas o

    glicerol que agia como di luente seria a componente mais

    interessante para as perfumarias.

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    Microalgas Dunaliella. Foto:Instituto Tecnológico de Canárias.

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    Bicha do sal

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    Bicha-do-sal Já ouviu falar de fósseis vivos? De diapausa? De partenogénese? De cistos e nauplios? Uma Arthropoda AntennataCrustacea Branchiopoda, vulgo«bicha-do-sal», faz tudo isto, emais. Não só o ciclo de vida,

    como a própria morfologia da Artémia salina adapta-se com exibilidade às variações domeio salino. Algunssurpreendentes fa�os sobreo minúsculo crustáceo que

    sobreviveu os dinosáurios– sempre metido dentro de águabem salgada...

     Desde há 300 milhões de anos

    que a temos entre nós – sem

    ter sofrido qualquer alteração

    significante, sem grande muta-

    ção. A arcaica Artémia existe há

    200 vezes mais tempo que a espé-

    cie humana, que apareceu há

    ridículos 1,5 milhões de anos. Até

    há poucos decénios, ninguém se

    preocupou com este «fóssil v ivo»;

    mas desde 1970, parece não haver

     Artémias suficientes para satis-

    fazer a desenfreada exploração

    comercial deste crustáceo. Des-

    cobriu-se que é um pasto ideal

    para muitas pisciculturas.

    Não admira que este minús-

    culo crustáceo primitivo exista

    há tanto tempo; a  Art emia salina,

    assim se chama em meios cientí-

    ficos a bicha-do-sal (ou: camarão-

    da-salina), apresenta comporta-

    mentos surpreendentes, que lhe

    merecem o título de verdadeira

    campeã de sobrevivência.

    Para sobreviver à concorrência

    e aos seus predadores, a pequena

     Artémia adaptou-se já no Terciá-

    rio a meios ambientes hiper-sal-

    gados, onde hoje encontra uma

    série de aves esfaimadas, mas em

    regra geral, muitos menos preda-

    dores do que no mar aberto. É por

    isso que, hoje como antes, pre-

    fere viver em águas com teores de

    salinidade de pelo menos 0,4%, e

    até 23%. A água do mar tem uma

    salinidade média de 3,3 a 3,5%. As

    gada que é o Great Salt Lake no estado norte-americano

    de Utah.

    Foi estudada por legiões de biólogos, foi detectada em

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    – 74 –

    condições ecológicas dos biótopos ocupados pela Arté-

    mia são extremas (a salinidade pode exceder os 300 gra-

    mas/litro de água!), e assim só um reduzido número de

    espécies de bactérias e a lgas ai consegue sobreviver. Em

    consequência, podem ocorrer blooms (explosões popula-

    cionais) de monoculturas de específicas algas, tingindo

    a água de vermelho, azul ou verde. Um dos raríssimos

    invertebrados que puderam adaptar-se a estes ext remos

    habitats é a Artémia.

     Vive em todas as sali nas portuguesa s, espan holas e

    mediterrâneas, além de frequentar outras célebres,

    como as salinas da Guérande, na Bretanha. E abunda em

    quantidades astronómicas na imensa área de água sal-

    p g g ,

    mais de 300 lagos de água salgada; onde a Artémia não

    ocorre é nos mares e oceanos, pois aí os seus predadores –

    peixes, larvas, crustá ceos, etc. – acabariam rapidamente

    com a sua raça. A Artémia nada mal, não possuiu quais-

    quer mecanismos activos de defesa, nem sequer tácticas

    passivas (a camuflagem, por exemplo). A Artémia pro-

    tege-se... no sal.

    Os habitats preferidos pela Artémia são biótopos de refú-

     gio, como os lagos salgados e as zonas costeiras de sapal.

     Aí, sem ter que temer predadores ou concorrentes, a

     Artémia desenvolve-se em água sali na com altas con-

    centrações. Nas salinas resiste até temperaturas extre-

    mas de 36 ou mesmo 40 ºC. Ademais, se esta espécie se

    extinguisse num determinado lago, sobreviveria nou-

    tro. A Artémia é um espantoso sucesso de sobrevivência

    a nível universal; encontramo-lo em todos os cinco con-

    tinentes.

    Explica-se esta presença mundial pela dissemina-

    ção dos cistos (ovos secos, protegidos por uma casca rija)

    que tem ido viajar pelo mundo fora, colados às patas e à

    plumagem daquelas aves migratórias que fazem anu-

    almente longuíssimos vôos intercontinentais. Mas

    os cistos também viajam dentro das aves. Os cistos da

     Artémia , me smo depois de ingeridos por aves aquát i-

  • 8/16/2019 Livrinho Do Sal

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    – 75 –

    cas, sobrevivem vários dias no aparelho digestivo das

    aves; quando são expelidos nas fezes, continuam viá-

     veis...

    Este transporte aéreo de o