livro cogumelos

download livro cogumelos

of 76

Transcript of livro cogumelos

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    1/76

    Instituto Brasileiro de Estudos Homeopticos - IBEHEOmar Geraldo Lopes Diniz

    USOS , BIOQUMICA E ATIVIDADE BIOLGICA DO PSILOCYBE SPP.

    Rio de Janeiro

    15 de junho de 1999

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    2/76

    II

    Instituto Brasileiro de Estudos Homeopticos - IBEHEOmar Geraldo Lopes Diniz

    USOS , BIOQUMICA E ATIVIDADE BIOLGICA DO PSILOCYBE SPP.

    Monografia para obteno do Ttulo de Especialista em Fitoterapia.Apresentada ao Instituto Brasileiro de Estudos Homeopticos - IBEHE (Ncleo

    Superior de Estudos Governamentais da Universidade do Estado do Riode Janeiro - NUSEG/UERJ)

    Rio de Janeiro

    15 de junho de 1999

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    3/76

    III

    m i n h a f a m l i a , p e l a

    p a c i n c i a e e s t m u l o q u e

    m e d e d i c a r a m p a r a a

    c o n f e c o d e s t e t r a b a l h o .

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    4/76

    IV

    A g r a d e c i m e n t o s :

    O a u t o r a g r a d e c e a t o d a a e q u i p e d e p r o f e s s o r e s d o C u r s o d e

    F i t o t e r a p i a d o I n s t i t u t o B r a s i l e i r o d e E s t u d o s H o m e o p t i c o s -

    I B E H E , e m e s p e c i a l a o P r o f e s s o r J a i r o K e n u p p B a s t o s , s e m

    c u j a i n e s t i m v e l a j u d a e e s t m u l o e s t e t r a b a l h o n o t e r i a s i d o

    p o s s v e l ; a t o d a a e q u i p e t c n i c a d o I B E H E e d o N c l e o

    S u p e r i o r d e E s t u d o s G o v e r n a m e n t a i s - N U S E G , d a

    U n i v e r s i d a d e d o E s t a d o d o R i o d e J a n e i r o - U E R J , p e l a

    a s s i s t n c i a d u r a n t e o C u r s o ; D o n a H e l o s a e s u a e q u i p e d a

    s e c r e t a r i a d a N U S E G p e l a f o r a e t o d a a a j u d a i n e s t i m v e l q u e

    p r e s t a r a m d u r a n t e t o d o o t e m p o ; a o s c o l e g a s d a t u r m a 9 6 d o

    C u r s o d e F i t o t e r a p i a , p e l o a p o i o e p e l o c o m p a r t i l h a m e n t o d o s

    p r o b l e m a s e s u a s s o l u e s ; e q u i p e t c n i c a d a N U S E G p o r

    t o d a a p a c i n c i a c o m o s p r o b l e m a s n e m s e m p r e i n e v i t v e i s ; a o

    p e s s o a l d a c a n t i n a d a N U S E G p e l o i n e s t i m v e l e s e m p r e b e m

    v i n d o c a f ; e q u i p e d e c i e n t i s t a s d o J a r d i m B o t n i c o d o R i o

    d e J a n e i r o p e l a a j u d a , c o n f i a n a e p a c i n c i a , e m e s p e c i a l

    D r a . A b i g a i l ; a o S r . M a n u e l e t o d a a e q u i p e d e m a n u t e n o e

    s e g u r a n a d o J B R J p o r t o d a a a j u d a d e s i n t e r e s s a d a q u e f o i

    p r o p o r c i o n a d a .

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    5/76

    V

    S u m r i o :

    p g i n a

    1 I n t r o du o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1

    2 R e v i s o d e L i t e ra t ur a . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1

    2 . 1 C la s s i f i ca o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1

    2 . 2 D i s t r i bu i o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4

    2 . 3 H a b i ta t . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4

    2 . 4 M or fo lo gi a . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6

    2 . 5 C ic lo V i t a l . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8

    2 . 6 B io qu m ic a . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1 3

    2 . 7 T ox ic ol og ia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1 6

    2 . 8 C o le ta /C ul t i vo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1 9

    2 . 9 U s os . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3 3

    2 . 9 . 1 P o pu l a r e s . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3 9

    2 . 9 . 1 . 1 Tr a d ic io na l . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3 9

    2 . 9 . 1 . 2 Re cr e a t i vo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4 2

    2 . 9 . 2 C ie nt f ic os . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4 6

    3 D i sc us s o e C on c lu s e s . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5 0

    4 R e fe r n c i a s e B i bl i og r af i a C o ns u l t ad a . . . . . . . . . . . . . . 5 3

    5 A ne xo s . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5 6

    5 . 1 A n ex o A - A n at o m ia d e u m c o gu m el o . . . . . . . . . 5 6

    5 . 2 A n e x o B - O u t r a s S u b s t n c i a s O r i g i n r i a s d a

    T r ip ta mi n a, e M es ca l in a . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5 8

    5 . 3 A n e x o C - T c n i c a d e Cu l t i v o d e O s s e O e r i c p a r a o

    P . c u b e n s i s , l a bo r a to r i a l o u d o m s t i c a . . . . . . 5 9

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    6/76

    VI

    n d i c e e C r d i t o s d a s I l u s t r a e s :

    p g i n a

    Figura 1.Psilocybe cubensis(de Guerrero e Homrich, op. cit.).......................... 2

    Figura 2. Algumas espcies e gneros aparentados (de Emboden, op. cit.).......... 3

    Figura 3.P. cubensis, crescendo no esterco (de The Lycaeum, ref. cit.).............. 5

    Figura 4.Psilocybe cubensismaduros, apresentando a colorao azul (de The Lycaeum, ref.

    cit.)............................................................................................................... 7

    Figura 5. Gallerina autumnalis(de The Lycaeum, ref. cit.)................................ 8

    Figura 6. Ciclo vital doP. cubensis(adaptado de Oss e Oeric, op. cit.).............. 9

    Figura 7. Exemplar jovem doP. cubensis, no momento em que rompe o vu parcial (de Oss

    e Oeric, op. cit.)............................................................................................ 11

    Figura 8. Fases do crescimento doP. cubensis(Oss e Oeric, op. cit.) ................ 12

    Figura 9. Psilocina (de The Lycaeum, ref. cit.)..................................................... 13

    Figura 10. Psilocibina (de The Lycaeum, ref. cit.)................................................ 13

    Figura 11. Sntese do triptofano (de Bastos, ref.cit.)............................................ 15

    Figura 12. Sntese da psilocina e da psilocibina (composta com imagens de The Lycaeum, ref.

    cit.)............................................................................................................... 16

    Figura 13. Disposio das lminas para impresso de esporada .......................... 21

    Figura 14. Amostra de cogumelos frescos, e secos prontos para congelamento (Oss e Oeric,

    op.cit.) .......................................................................................................... 32

    Figura 15. Reao da mudana de cor para azul em cogumelos secos no escuro e na

    presena de luz (de The Lycaeum, ref. cit.) .................................................... 33

    Figura 16. Cogumelo de Pedra (de Emboden, op. cit.)........................................ 37

    Figura 17.Psilocybe secos para consumo, e tabletes (de Las Setas Alucinogenicas, ref.

    cit.)............................................................................................................... 44

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    7/76

    VII

    Figura 18. Anatomia de corpo frutfero de fungo jovem (adaptada de Guerrero e Homrich,

    op. cit.)......................................................................................................... 57

    Figura 19. Anatomia de corpo frutfero de fungo adulto (adaptada de Guerrero e Homrich,

    op.cit.) .......................................................................................................... 57

    Figura 20. Outras substncias originrias da triptamina: dotadas de propriedades

    alucinognicas (de O Mundo dos Fungos, ref. cit.)......................................... 58

    Figura 21. Mescalina (de The Lycaeum, ref. cit.)................................................. 58

    Figura 22. Cultivo doP. cubensis(de Oss e Oeric, op. cit.) ............................... 59

    Figura 23. Cultivo doP. cubensis(continuao)................................................. 60

    Figura 24. Cultivo doP. cubensis(continuao)................................................. 61

    Figura 25. Cultivo doP. cubensis(continuao)................................................. 62

    Figura 26. Cultivo doP. cubensis(continuao)................................................. 63

    Figura 27. Cultivo doP. cubensis(continuao)................................................. 64

    Figura 28. Cultivo doP. cubensis(continuao)................................................. 65

    Figura 29. Cultivo doP. cubensis(continuao)................................................. 66

    Figura 30. Cultivo doP. cubensis(continuao)................................................. 67

    Figura 31. Cultivo doP. cubensis(continuao)................................................. 68

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    8/76

    VIII

    R E S U M O :

    O a u t o r d i s s e r t a s o b r e a b i o q u m i c a , a t i v i d a d e s

    b i o l g i c a s e u s o s p o p u l a r e s e c i e n t f i c o s , t a n t o a o n v e l

    n a c i o n a l q u a n t o a o i n t e r n a c i o n a l , d o s f u n g o s a l u c i n g e n o s d o

    g n e r o P s i l o c y b e , u s a n d o c o m o e s p c i e - t i p o o P . c u b e n s i s ,

    o b j e t i v a n d o c o m e s t a p e s q u i s a e x p l o r a t r i a p r e e n c h e r

    p a r c i a l m e n t e u m a l a c u n a i n f o r m a t i v a e m t r a b a l h o s n a c i o n a i s ,

    a l m d e t e n t a r d e m o n s t r a r a n e c e s s i d a d e d e e s t u d o c i e n t f i c o

    d o r e f e r i d o g n e r o e e s t i m u l a r t a l p r t i c a n o m e i o a c a d m i c o

    b r a s i l e i r o .

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    9/76

    1

    Usos, Bioqumica e Atividade Biolgica do

    Psilocybe spp.

    I ntroduo

    O gnero Psilocybe um dos mais difundidos pelo mundo. So conhecidas

    cerca de 70 espcies, sendo que a maioria natural do Mxico. Todas as espcies

    compartilham em grande parte todas as suas propriedades biolgicas e bioqumicas. O

    Psilocybe cubensis sem dvida alguma a espcie mais difundida em todo o planeta, razo

    pela qual foi escolhida como espcie-tipo para este estudo.

    Praticamente no existem informaes sobre este gnero e todas as suas

    possibilidades em lngua portuguesa, nem estudos esto sendo conduzidos neste pas a

    respeito dele por razes pfias, ficando tudo isso quase que exclusivamente restrito aos pases

    do chamado primeiro mundo, de modo que o resultado de tais pesquisas, referentes a um

    gnero cosmopolita, uma vez concludos, resultaro em benefcios apenas para os ditos

    pases, para nus daqueles que, por motivos absolutamente papalvos, alm de desconfiana

    em seus valores humanos na rea cientfica, no levarem adiante pesquisas no assunto. Por

    este motivo o autor considera importante a disponibilizao de dados, no intuito de fornecer

    um ponto de partida na correo deste erro.

    Reviso de Literatu ra

    Classificao

    Os cogumelos em questo so classificados modernamente como

    pertencendo ao Reino (ou Diviso) Fungi (Eumycophyta), Classe

    Basidiomycetes, Subclasse Holobasidiomycetidae (Holobasidiomycetes), Ordem

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    10/76

    2

    Hymenomycetales (Agaricales), Famlia Agaricaceae, Gnero Psilocybe, sendo

    nossa espcie-tipo oP. cubensis(Figura 1). Anteriormente, eram classificados

    como Gnero Stropharia, de modo que nossa espcie-tipo referida como S.

    cubensisEarle, e na antiga classificao, no Reino Vegetal (atual Plantae), de modo

    que em alguns trabalhos ainda pode ser encontrada classificada deste modo. Alguns

    autores referem-se a uma Famlia Strophareaceae, enquanto outros citam como

    nmina completa atual de nossa espcie tipo Psilocybe cubensis Earle ex. Singer,

    devido ao fato de a reclassificao no gnero Psilocybe ter sido feita na dcada de

    1970 pelo micologista Rolf Singer. Existem cerca de 40 espcies classificadas, das

    quais as mais conhecidas so: P. aztecorum, P. azurescens, P. baeocystis, P.

    caerulescens, P. caerulipes, P. coprophila, P. cordispora, P. crobulus, P.

    Figura 1 -Psilocybe cubensis

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    11/76

    3

    cubensis, P. cyanescens, P. cyanofibrillosa, P. hoogshageni, P. mexicana, P.

    mixaeensis, P. montana, P. muscorum, P. pelliculosa, P. pseudobullacea, P.

    quebecensis, P. semilanceata, P. semperviva, P. squamosa, P. stuntzii, P.

    sylvatica,P. wassonii,P. yungensis,P. zapotecorum. OP. caerulescens tem duas

    variedades conhecidas, mazatecorume nigripes. Os gneros aparentados so o

    Stropharia, Conocybe, Panaeoluse Copelandia, com descries e propriedades

    semelhantes (Figura 2).

    Os cogumelosPsilocybetm diversos nomes populares, dependendo da

    regio em que so encontrados. So conhecidos como Cogumelos Mgicos

    mundialmente, em diversos idiomas, mas localmente tm nomes como honguitos,

    hongos, humito, teonancatl, Carne de Deus. No Brasil, so conhecidos

    Figura 2 - Algumas espcies e gnerosaparentados ao P. cubensis, alm doprprio, com a nmina antiga.

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    12/76

    4

    principalmente apenas como cogumelos, ou cogumelo-do-estrume, ou ainda

    cogumelo-de-ch.

    Distribuio

    A grande maioria destas espcies tem por habitat a Amrica Central, em

    especial o Mxico; entretanto, algumas destas espcies podem ser encontradas em

    outros locais do mundo, e oPsilocybe cubensis cosmopolita.

    Ele pode ser visto frutificando em pastos nas pocas quentes e chuvosas

    do ano em regies to diversas como os Estados Unidos, o Camboja, a Austrlia, a

    Colmbia, o Brasil. Ao contrrio dos outros gnero que contm psilocibina, que com

    poucas excees so quase que estritamente endmicos, o P. cubensis facilmente

    encontrado em toda a regio equatorial e tropical do globo, e at alm. O essencial

    que haja uma estao chuvosa e quente, mesmo que no restante do ano o clima seja

    frio.

    Habitat

    O habitat preferido dos Psilocybe o esterco bovino, e sua distribuio

    global sem dvida foi estimulada pela indstria pecuria mundial. J se sups que essa

    distribuio tenha sido causada pela pecuria, mas os registros do cogumelo em

    regies da Europa e da Amrica na era pr-colombiana parecem sugerir que ele j

    existia nestes locais antes. A sua identificao com o soma Vdico demonstra isso

    claramente, assim como os registros histricos de cultos pr-colombianos muito

    antigos.

    OP. cubensis provavelmente o nico gnero que tem esta distribuio

    global, de modo que pode-se supor que ou ele a espcie original e os demais sovariantes, ou ele foi a espcie mais bem sucedida de todo o gnero, tomando o lugar

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    13/76

    5

    de espcies nativas, e mais estimulada ainda pela pecuria global. Esta associao

    ntima com os humanos atravs do gado domesticado provavelmente existe desde que

    a humanidade adquiriu tecnologia pastoral.

    No entanto, embora o habitat preferido seja o estrume bovino, estrume

    de qualquer animal, domstico ou selvagem, desenvolve perfeitamente o fungo,

    chegando frutificao sem problemas. J houve registro de frutificao sobre esterco

    humano. Alm do estrume, j tm sido registrados casos de frutificao em outros

    substratos, muito variados, e mesmo com locais que podem ter tido estrume em

    alguma poca anterior. O prprio autor j verificou sua presena em um velho vaso de

    plantas domstico no qual h mais de um ano no havia nada plantado, e cuja terra foi

    deixada sem rega durante todo este tempo: ao ser exposto a uma chuva casual,

    desenvolveu-se um corpo frutfero perfeitamente formado, atingindo a maturidade e

    dispersando esporos. Mas seu mais comum e confivel habitat sobre esterco de

    vaca, sempre em potreiros (Figura 3).

    Figura 3 - Psilocybe cubensis crescendo emesterco.

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    14/76

    6

    Morfologia

    O corpo frutfero doPsilocybe cubensis tem chapu cor de palha, de um

    amarelo plido, vscido, tornando-se azul por presso. Chapu 1,5 a 8 cm de largura,

    cnico, em forma de sino, tornando-se convexo com a idade, vscido, sem pelos, de

    esbranquiado a amarelo plido, comumente cor de palha, tendendo para o marrom

    com a idade, com manchas azuladas com o envelhecimento (Figura 4). Carne firme,

    branca, azul quando ferida. Lamelas adnatas (ligadas diretamente ao estpite) ou

    adnexas(separando-se imediatamente ao estpite), firmes e chanfradas, juntas, de cor

    cinza, tornando-se violeta-acinzentadas com a idade, com bordas brancas. Estpite (v.

    Anexo A) com anel membranceo persistente (restos do vu parcial), firme e tenaz,

    com altura mdia de 10 cm, com variaes de 4 a 15 cm, 4 a 14 mm de espessura,

    alargando-se um pouco prximo base ou volva, seco, sem pelos, branco,

    manchando-se de azul quando ferido. Vu universal branco, deixando um anel

    membranoso superior, sem deixar escamas. Esporos com medidas de 10-17 m por

    7-10 m, de formato elptico a oval em vista lateral, de paredes espessas, com um

    grande poro no pice. Impresso de esporada de cor variando de prpura a marrom.

    Cistdios (clulas vegetativas) nas bordas das lamelas em forma de basto com

    cabeas arredondadas.

    A carne destes cogumelos tem a caracterstica de se manchar de azul

    quando ferida ou quebrada. Esta reao aparentemente uma oxidao enzimtica de

    algum substrato indlico, como triptofano, 5-hidroxitriptamina ou psilocibina, e um

    indicador confivel da presena de psilocibina no s nos Psilocybe como tambm

    nos gneros relacionados; no entanto, no uma reao exclusiva, uma vez que

    outros gneros no relacionados, comoRussulaouBoletustambm a apresentam, s

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    15/76

    7

    que nestes casos essa reao no tem relao com a presena de substratos indlicos;

    entretanto estes outros gneros tm uma morfologia completamente diferente, de

    modo que no h como confundi-los.

    Por outro lado, existem fungos cujos corpos frutferos so muito similares,

    sendo at de maior beleza e que, portanto, chamam mais a ateno que os Psilocybe,

    e que podem ser venenosos, como o caso do Gallerina autumnalis (Figura 5);

    deste modo, deve-se ter cuidado na identificao. Por esta razo essencial verificar

    bem os detalhes da morfologia, e em especial o substrato onde crescem os corpos

    frutferos.

    Figura 4 - P. cubensis maduros, japresentando a colorao azulada.

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    16/76

    8

    Ciclo Vital

    Os Psilocybepertencem Classe Basidiomycetes, de modo que so

    chamados basidiomicetos, ou seja, so caracterizados pela produo de esporos em

    estruturas em forma de basto chamadas basdios, esporos estes que so chamados

    basidisporos. A maioria dos fungos macroscpicos que podemos encontrar so

    membros da SubclasseHolobasidiomicetidae. Os cogumelos lamelados pertencem

    Ordem Hymenomycetales. O ciclo vital do Psilocybe ocorre da seguinte forma

    (Figura 6): os basidisporos germinam para formar uma hifamonocaritica. A hifa

    um filamento tubular, e um agregado de hifas forma uma massa de filamentos qual

    chamamos de miclio. O miclio o corpo principal, ou talo, de um fungo. Este o

    fungo propriamente dito; o que chamamos de cogumelo , na verdade, apenas o

    chamado corpo frutfero, a estrutura reprodutora, que produz os esporos, e constitui

    Figura 5 - Galleri na autumnalis

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    17/76

    9

    apenas uma pequena poro da massa total do fungo; a grande maioria do corpo do

    organismo existe subterraneamente na forma de uma grande rede de miclio, que

    frutifica produzindo os cogumelos, quando sob condies apropriadas. Um nico

    fungo pode produzir vrios corpos frutferos, ou cogumelos.

    Com a continuao da produo das hifas monocariticas, elas acabam

    tornando-se um miclio monocaritico. Este miclio cresce at encontrar um outro

    Figura 6 - Ciclo vital doPsilocybe cubensis.

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    18/76

    10

    miclio monocaritico, germinado a partir de outro esporo, que seja um tipo

    compatvel para a reproduo. Se o miclio monocaritico no encontrar um outro

    compatvel, ele acaba morrendo, eventualmente. Quando dois miclios monocariticos

    compatveis entram em contato, ocorre um processo chamadosomatogamia, que a

    fuso de clulas somticas dos dois miclios. Entretanto, neste processo, no ocorre a

    fuso dos ncleos, ou seja, forma-se um miclio dicaritico, com dois ncleos por

    clula.

    O estgio de miclio dicaritico a fase mais prolongada do ciclo vital do

    fungo, e o estgio de maior assimilao de nutrientes. O miclio dicaritico pode

    continuar vivendo indefinidamente, crescendo apenas vegetativamente, sem entrar em

    um estgio de reproduo sexual e produo de esporos.

    Entretanto, havendo condies apropriadas, o miclio dicaritico pode

    ser induzido frutificao. O talo micelial indiferenciado comea a se modificar em

    uma estrutura produtora de esporos, o cogumelo. Ele continua a crescer e aflora no

    solo, incorporando mais e mais miclio ao mesmo tempo em que se expande por

    absoro de gua. Em um certo ponto do crescimento do cogumelo, ento chamado

    basidiocarpo, estruturas em forma de basto chamadas de basdios se formam na

    parte inferior da lamelas. Nestas estruturas ocorre a cariogamia, a fuso dos dois

    ncleos das clulas do miclio dicaritico, iniciando o nico estgio diplide do ciclo

    vital, que tambm o estgio mais fugaz, porque a meiose ocorre quase

    imediatamente, criando quatro ncleos haplides no interior do basdio, que ento so

    deslocados para fora do basdio e ficam cercados de bainhas que formam os

    basidisporos. Desta forma, cada basdio passa a apresentar quatro basidisporos na

    sua superfcie. Estes basidisporos eventualmente se destacam do basdio e reiniciam

    o ciclo vital outra vez, germinando para criar hifas monocariticas.

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    19/76

    11

    O cogumelo cresce em tamanho e rompe o vu universal ao aflorar do

    solo. Depois, com o crescimento, acaba por romper o vu parcial (Figura 7),

    formando o anel, e liberando os esporos (Figura 8).

    Figura 7 - Exemplar jovem doP. cubensis, no momento em que rompe o vu parcial

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    20/76

    12

    No caso doP. cubensise espcies relacionadas, e na verdade a maioria

    das espcies que produzem psilocibina, a compatibilidade entre os miclios

    monocariticos extremamente complexa geneticamente, porque eles so

    heterotlicos (que tem o talo separvel em duas ou mais cepas sexuais

    morfologicamente similares, com a conjugao ocorrendo apenas quando tipos

    compatveis so pareados) e tetrapolares (condio de compatibilidade sexual em

    que dois grupos de fatores esto envolvidos, tais comoAe a, e Be b), de modo que

    Figura 8 - Fases do crescimento do corpo frutfero doPsilocybe cubensis

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    21/76

    13

    os dois grupos de fatores genticos tm que ser diferentes nos dois exemplares para

    que ocorra a somatogamia. (Oss e Oeric, op. cit.; The Lycaeum, ref.cit.).

    Bioqumica

    Os alcalides dos cogumelos Psilocybe so a psilocina (Figura 9) e a

    psilocibina (Figura 10).

    A psilocibina um composto indlico derivado da triptamina, e tem a

    nomenclatura qumica de ster fosfato 3-[2-(Dimetilamino)etil]indol-4-ol di-hidrgnio,

    sendo ainda encontrada com a nomenclatura de O-fosforil-4-hidroxi-N,N-dimetil-

    triptamina. Tem a frmula C12H17N2O4P; com peso molecular de 284,27. A

    substncia pura descrita em sua monografia em The Merck Index (op.cit.) como

    cristais a partir de gua fervida, com ponto de derretimento a 220-228 C, e a partir

    de metanol fervido com ponto de derretimento a 185-195 C; com absoro mxima

    em metanol a 220, 267, 290 m(log 4,6, 3,8, 3,6); pH 5,2 em soluo de 50%

    gua-etanol; solvel em 20 partes de gua fervente, 120 partes de metanol fervente;

    dificilmente solvel em etanol; praticamente insolvel em clorofrmio ou benzeno. Foi

    isolada por Hofmann et alem 1958, que descreveu sua estrutura e fez sua primeira

    reviso no Primeiro Congresso Internacional de Neurofarmacologia, em Roma, em

    Figura 9 - Psilocina Figura 10 - Psilocibina

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    22/76

    14

    1958, e por Heim et alem 1959, tendo sido patenteada para a Alemanha em 1960,

    para os laboratrios Sandoz. Foi sintetizada por Hofmann e Troxler, tendo sido

    patenteada a forma sinttica para os Estados Unidos em 1963, tambm para os

    laboratrios Sandoz.

    A psilocibina tambm aparece com as nminas de Fosfato de 3(2-

    dimetilamina) etilindol-4-oldiidrognio e de 4-fosforiloxi-N,N-dimetiltriptamina. A

    psilocina, que tem a nomenclatura de 4-hidroxi-N,N-dimetiltriptamina, mais instvel

    e menos abundante, e precursora do componente anterior.

    A psilocibina resistente ao calor e ao ressecamento. liberada na gua

    de coco, que pode ser utilizada como bebida alucingena.

    Os cogumelos frescos tm ao menos pronunciada que os secos: cerca

    de 10 mg de psilocibina podem ser obtidos de cerca de 4 g de cogumelos secos ou

    de cerca de 25 g dos frescos.

    Aparentemente, estes alcalides so derivados do metabolismo primrio

    do fungo, uma vez que so encontrados em propores aproximadamente iguais em

    qualquer regio do mundo onde seja encontrado o fungo, o que parece indicar que

    sua produo no tem relao direta com estresses locais ou diferenas especficas no

    substrato em que ele cresce, naturalmente ou em cultivo. Esses alcalides so

    encontrados tanto nos corpos frutferos quanto no corpo vegetativo do fungo.

    Aparentemente o fungo sintetiza o triptofano a partir da glicose segundo o

    caminho de sntese no qual o cido antranlico fornece o anel benznico do ncleo

    indlico, a ribose os componentes C-2,3 e a serina a cadeia lateral de alanina. (Figura

    11). Este o caminho de sntese em bactrias, mas a evidncia disponvel atualmente,

    embora ainda fragmentria, sugere que um caminho similar seguido nos fungos, e

    mesmo nas plantas superiores.

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    23/76

    15

    A biossntese da psilocibina tem sido investigada provendo o Psilocybe

    cubensiscom precursores marcados. Utilizando marcadores como a psilocina-3H, a

    4-hidroxitriptamina-14C, a N,N-dimetiltriptamina-14C-3H, o DL triptofano-3H e

    outros, inclusive outros indis marcados por troca cida catalisada em gua tritiada,

    chegou-se a resultados experimentais que sugerem a seguinte seqncia: triptofano ->

    triptamina -> N-metiltriptamina -> N,N-dimetiltriptamina -> psilocina -> psilocibina.

    (Figura 12). O fungo tambm pode converter em psilocibina a 4-hidroxitriptamina por

    uma rota alternativa. Foram observadas grandes diferenas na taxa de absoro de

    diferentes precursores .

    A triptamina origina vrias outras substncias, todas dotadas com algum

    grau de atividade alucinognica (v. Anexo B). Todas as substncias da famlia da

    psilocibina tm estas propriedades. Elas contm a estrutura indlica bsica

    caracterstica da maioria dos alucingenos encontrados na Natureza, incluindo vrias

    amidas do cido lisrgico (das quais o LSD um representativo semi-sinttico), N,N-

    Figura 11 - Sntese do triptofano

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    24/76

    16

    dimetiltriptamina, harmina e seus anlogos e ibogana, sendo a mais notvel exceo a

    mescalina (3,4,5-trimetoxifeniletilamina), encontrada no peyotl (Lophophora

    williamsii, Cactaceae), portanto da mesma classe das anfetaminas (a-

    metilfeniletilaminas). (v. Anexo B).

    Toxicologia

    A psilocibina o mais importante alcalide ativo dos Psilocybe. A

    psilocina o outro alcalide ativo, mas encontra-se em proporo muito menor,

    porque um precursor instvel da primeira. Deste modo, a psilocibina o mais

    estudado dos alcalides deste fungo.

    Ela provoca experincias do tipo insight, animao, distoro dos

    sentidos.

    triptofano triptamina

    N-metiltriptamina N,N-dimetiltriptamina

    psilocina psilocibina

    Figura 12 - Sntese da psilocina e da psilocibina

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    25/76

    17

    A dose alucingena da psilocibina estimada em 4 a 10 mg. Doses

    menores produzem, em geral, alteraes de humor e sensao de bem-estar. Doses

    altas produzem intensos distrbios de percepo e efeitos visuais. A sintomatologia

    nos 30 minutos iniciais caracterizada por ansiedade, tenso, tontura, marcha ebriosa,

    nuseas, fraqueza muscular, dores musculares e entorpecimento dos lbios. Nos 30

    minutos seguintes aparecem os distrbios psquicos e sensoriais, que incluem: viso

    borrada, os objetos parecem mais iluminados e de formas mais agudas, com sombras

    maiores; comea-se a ver imagens com os olhos fechados; aumenta a acuidade

    auditiva e diminui a capacidade de concentrao, com raciocnio lento e uma sensao

    de irrealidade, com o indivduo sentindo-se isolado do mundo, estando consciente

    dele mas indiferente. Pode se apresentar incoordenao muscular, tremores, bocejos,

    lacrimejamento, sudorese e rubor da face. Uma a duas horas aps a ingesto as

    manifestaes acima tornam-se mais intensas, em especial os efeitos visuais.

    Superfcies planas parecem ondular e a percepo de distncias est comprometida.

    Esta sintomatologia dura aproximadamente 3 a 7 horas, podendo ser seguida por

    cefalia e fadiga. Foram relatados raros casos graves, com hipertermia, convulses e

    coma. No h registro de acidentes fatais. O tratamento em geral feito fora do

    hospital, com apenas manuteno e, caso se aplique, a abordagem usual para usurio

    de drogas. Nos casos graves, que so excepcionais, deve haver acompanhamento em

    Unidade de Tratamento Intensivo, com medidas sintomticas e de suporte.

    Os testes feitos at hoje demonstraram que o uso regular da psilocibina

    no produz sintomas a longo prazo, e que ela no tem potencial de dependncia fsica.

    Quanto a potencial de dependncia mental ou de dano fsico, at o presente momento

    no houve motivos para se suspeitar que tenha, mas isso ainda no foi definitivamente

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    26/76

    18

    provado. Houve um tempo em que se pressupunha que a experincia alucingena,

    inclusive a da psilocibina, poderia precipitar uma psicose latente em indivduo

    susceptvel, mas aparentemente a experincia est descartando esta suposio.

    Aparentemente, houve confuso do estado chamado de Flash-Back com uma psicose

    latente. Mas mesmo isso raro com a psilocibina.

    O uso da substncia extrada ou sintetizada provoca as manifestaes

    acima com mais intensidade e com algumas diferenas em relao ao uso dos

    cogumelos em si, que tendem a produzir uma experincia mais para o lado do

    numinoso do que para os simples efeitos visuais desconexos. No entanto isto no

    uma regra fixa, acredita-se que o tipo de experincia dependa muito da atitude mental

    com a qual o indivduo ingere os cogumelos. Por outro lado, o fato de o uso das

    substncias puras demonstrarem diferenas em relao ao uso do cogumelo, pode ser

    devido combinao entre os dois alcalides em propores mais ou menos fixas nos

    exemplares ou interao com outros componentes da prpria estrutura do fungo.

    Dependendo, de um modo geral, da atitude com que se faz uso dos

    cogumelos, podem ocorrer as chamadas ms viagens, que normalmente no duram

    muito tempo.

    Muito raramente, ocorre o fenmeno conhecido como "Flash-Back",

    onde a experincia original com toda a sintomatologia ocorre sem a ingesto da droga,

    num momento qualquer, sem nenhuma relao com nova ingesto, e de forma

    completamente paroxstica, ou seja, sem nenhuma relao com qualquer fator.

    Entretanto, embora isto seja comum com o a dietilamida do cido lisrgico (LSD),

    essa ocorrncia extremamente rara com este tipo de droga.

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    27/76

    19

    No se conhece problemas maiores acarretados por esta droga. No

    ocorre dependncia ou sndrome de abstinncia. A tolerncia se desenvolve

    rapidamente, de modo que com uso continuado, logo necessrio um nmero cada

    vez maior de cogumelos para produzir os efeitos, o que desanima o uso prolongado

    deles, e portanto uma dependncia psicolgica.

    O maior perigo ocorre por parte de usurios no experimentados, que

    a coleta e uso de cogumelos venenosos por equvoco, como o caso da Gallerina

    autumnalis, (Figura 5) que por sua semelhana, e at pela beleza dos exemplares,

    atrai os inexperientes. Isso pode causar acidentes fatais.

    A psilocibina um dos menos txicos de todos os alucingenos:

    enquanto que uma dose totalmente efetiva de cerca de 10 mg, sua DL50no rato de

    280 mg/kg de peso corporal. A mescalina (v. Anexo B), por exemplo, tem uma dose

    mnima efetiva de 200 mg para um adulto mdio, e uma toxicidade 2,5 vezes maior

    que a da psilocibina (Oss e Oeric, op. cit., citando Schultes e Hofmann, 1973, e

    Aboul-Eneim, 1974).

    Coleta/Cultivo

    A coleta o meio mais comum de uso dos Psilocybe. Eles podem ser

    encontrados em qualquer local onde haja ou tenha havido esterco de animal, alm de

    outros locais; porm, por segurana, s so colhidos em esterco, pois isso um

    elemento essencial para sua identificao correta. Em qualquer local destes pode ser

    encontrado um Psilocybe, em especial em estaes chuvosas e quentes; porm a

    chuva o elemento essencial. As partes usadas do fungo so os corpos frutferos, ou

    cogumelos, que so colhidos inteiros e utilizados imediatamente, ou dentro de no

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    28/76

    20

    mximo 10 dias, sob refrigerao, mas no congelamento. O congelamento pode ser

    feito somente aps secagem prvia, seja em forno ou sob luz solar, mtodo

    tradicionalmente utilizado. A utilizao de todo o corpo frutfero, s vezes incluindo a

    volva, mas o mais comum ser utilizado apenas o estpite e o chapu, desprezando-se

    a volva, que usualmente est contaminada com o meio de crescimento, normalmente

    estrume.

    A tcnica de cultivo pode ser usada para a maioria das espcies de

    Psilocybe, mas o P. cubensis a mais fcil de cultivar, no s por ser um dos mais

    resistentes do gnero, mas tambm por sua distribuio cosmopolita, de modo que

    plenamente adaptado a qualquer rea e nutrientes locais. A tcnica descrita a seguir

    a desenvolvida por Oss e Oeric (op. cit.; The Lycaeum, ref. cit.). H outras tcnicas,

    mas nenhuma comparvel descrita em sua simplicidade e resultados favorveis.

    (Para ilustraes, v. Anexo C).

    A tcnica consiste em, aps identificar corretamente, coletar-se o corpo

    frutfero do fungo, necessitando-se apenas do estpite e do chapu de exemplares

    maduros, com os chapus totalmente abertos. Usando-se uma faca afiada, corta-se os

    estpites o mais prximo possvel das lamelas, e coloca-se os chapus sobre uma folha

    de papel limpo, onde deixa-se em repouso por 24 horas. Isso colher o que

    chamado impresso da esporada, que a marca deixada pelos esporos soltos das

    lamelas do cogumelo no papel. conveniente cobrir-se os chapus com uma pequena

    tigela enquanto colhe a impresso da esporada de modo a retardar a dessecao.

    Quando os chapus so removidos, pode-se ver a impresso da esporada, um

    depsito radialmente simtrico de esporos, de colorao usualmente prpura escuro

    no local onde os chapus estiveram em contato com o papel. O papel deve ento ser

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    29/76

    21

    dobrado e selado em um envelope para evitar contaminao posterior por esporos

    trazidos pelo ar de outras espcies de fungos inferiores. Uma simples impresso de

    esporada contm algumas dezenas de milhes de esporos e suficiente para centenas

    de germinaes de esporos.

    Para garantir a esterilizao, pode-se usar uma variante deste mtodo,

    substituindo o papel por quatro lminas de microscpio esterilizadas, utilizando uma

    bancada com a superfcie tambm esterilizada. Coloca-se as quatro lminas em um

    arranjo duas a duas, lado a lado e ponta a ponta (Figura 13), colocando-se o chapu

    no centro dos vrtices de modo que cada do chapu fique sobre cada lmina,

    deixando-se 24 horas em repouso, coberta por uma cuba. Quando o chapu for

    removido, a ponta de cada lmina estar coberta de esporos, e as lminas podem

    ento ser seladas, juntas ou separadas, em plstico ou papel.

    Uma vez que a impresso da esporada tenha sido recolhida, necessrio

    germinar alguns esporos. O miclio monocaritico pode ser facilmente obtido

    germinando os esporos em um nutriente slido apropriado, tal como gar-dextrose-

    batata ou gar-extrato de malte. Coloca-se os nutrientes em algumas placas de petri

    limpas e esterilizadas. Da, pega-se o papel ou as lminas com os esporos e, com uma

    Legenda: Lmina 1

    Lmina 2

    Lmina 3

    Lmina 4

    Chapu

    Figura 13 - Disposio das lminas para impresso de esporada

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    30/76

    22

    faca limpa ou anel de inoculao devidamente esterilizado por flambagem, raspa-se a

    impresso de esporada e coloca-se em diferentes pontos de cada placa, sobre o

    nutriente. Isso deve ser feito o mais rapidamente possvel, deixando-se o nutriente sem

    a tampa o menor tempo que se puder, para evitar contaminao por esporos do ar.

    Como uma variao, os esporos podem ser raspados diretamente para um tubo com

    cerca de 10 ml de gua esterilizada, depois agitando-se em crculo vigorosamente e

    diluindo-se at 100 ml por adio de mais gua esterilizada, e utilizando-se uma pipeta

    tambm esterilizada, fazendo-se inoculao em pontos com 2 a 3 ml da diluio no

    nutriente. Deixa-se as placas inoculadas ficarem em temperatura ambiente por 3 a 5

    dias. As placas devem ficar sem ser mexidas at que o miclio de dois esporos

    diferentes, ou dois diferentes pontos de inoculao tenham crescido e feito contato.

    Alguns dias aps o contato ter sido feito, h uma chance razovel de que a

    somatogamia tenha ocorrido. Como a cada frutificao esporos de vrios tipos de

    conjuno so formados, uma nica placa de petri pode conter vrias dezenas de

    cepas diferentes de miclios dicariticos. necessrio separar algumas das cepas de

    modo a cultivar cepas puras separadamente. Isso pode ser feito usando um bisturi,

    agulha de dissecao ou anel de inoculao esterilizados, transferindo-se rapidamente

    para uma nova placa de petri esterilizada com o meio nutriente slido. O miclio

    dicaritico assim transferido ir crescer em todas as direes a partir do ponto de

    inoculao na nova placa e dever cobrir toda a superfcie do meio nutriente dentro de

    8 a 12 dias. Pode-se classificar as diferentes placas dos novos inoculados com base

    em vigor do crescimento, falhas etc. Antes de se iniciar a fase seguinte,

    recomendvel ter um bom suprimento de miclio crescido no meio de gar estril,

    para o caso de algumas culturas sucumbirem contaminao.

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    31/76

    23

    Tanto o meio de gar-dextrose-batata quanto o gar-extrato de malte

    esto disponveis j preparados, bastando-se dissolver em gua destilada fervente,

    cerca de 15 a 20 g de meio de gar para cada litro de gua. No entanto, pode-se usar

    as receitas abaixo para produzir os meios de cultura artesanalmente:

    Meio de gar-dextrose-batata:

    250 g de batatas

    15 g de gar

    10 g de dextrose

    1,5 g de fermento nutricional ou extrato de levedura

    Corte as batatas em pedaos, sem descascar em uma peneira e

    enxage por 30 segundos em gua de torneira. Pese e misture o gar, a dextrose e o

    fermento e reserve. Ponha as batatas em um litro de gua e ferva em fogo brando por

    30 minutos. Filtre o caldo resultante e despreze as batatas. Ao litro de caldo de

    batatas adicione o gar, a dextrose e o fermento previamente preparados, mexendo

    gentilmente. Ponha em fogo brando por 10 minutos ou at que a soluo clareie.

    Cuidado para no deixar ferver. Acrescente gua bastante para retornar o volume total

    da soluo a 1 litro. Despeje a soluo ainda quente nas placas de petri, usando o

    bastante para cobrir o fundo da placa. Se estiver usando tubos de ensaio, encher at

    cerca de 25% do total. Essa soluo pode ser deixada esfriar ou ser esterilizada

    imediatamente.

    Meio de gar-extrato de malte:

    20 g de malte ou extrato de malte (p ou xarope)

    5 g ou 5 ml de xarope de milho (opcional)

    25 g de gar

    0,1 g de fosfato de potssio dibsico (K2HP O4)

    0,1 g de carbonato de clcio (CaCO 3) - (pode ser utilizado

    p de casca de ostra.)

    Pese e misture os ingredientes. Ponha gua em fogo brando e quando

    estiver quente mas no fervendo, adicione a mistura preparada. Depois que os

    ingredientes tiverem se dissolvido completamente na gua, despeje ainda quente nas

    placas de petri ou tubos de ensaio como descrito acima.

    O xarope de milho, que um ingrediente opcional, pode ser feito

    fervendo milho seco em gua, deixando o filtrado descansar por vrios dias, ento

    esterilizando-o em autoclave (ou panela de presso) e mantendo-o refrigerado.

    Pode-se acrescentar mistura acima 1,5 g de fermento, como no

    meio de gar-dextrose-batata. Isso fornece uma fonte adicional de protenas e vitaminas

    do complexo B.

    Este meio pode ser estocado em geladeira, e quando for necessrio,

    liqefeito outra vez com calor para ser utilizado.

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    32/76

    24

    Estes meios de cultura podem ser utilizados misturados, ou

    alternadamente entre as culturas, para que o fungo no fique acostumado com um

    meio s e seja forado a usar partes diferentes do seu genoma para se adaptar aos

    diferentes meios, evitando que as cepas percam vigor.

    Outros tipos de meios podem ser utilizados, mas estes so os mais fceis

    de fazer e j foram comprovadamente bem-sucedidos nesta cultura em particular.

    Uma vez que o meio de cultura esteja pronto e nas placas, necessrio

    esteriliz-lo para evitar contaminao. Uma autoclave deve ser usada para isto, ou

    uma panela de presso com cerca de um litro de gua no fundo, esterilizando por 45

    minutos a 1 hora. Depois disso, espera-se esfriar um pouco para evitar que a

    mudana de presso faa com que o meio de cultura ferva.

    Quando os receptculos estiverem temperatura ambiente e o meio

    solidificado, estaro prontos para a inoculao. Isso deve ser feito em um ambiente o

    mais estril possvel, de preferncia com o ar borrifado com algum esterilizante.

    A inoculao pode ser feita utilizando um bisturi ou um anel de

    inoculao. Deve-se selecionar uma cultura completamente no contaminada e com

    crescimento vigoroso; o miclio deve ser de um branco puro e de aparncia felpuda e,

    preferencialmente, ter menos de 10 dias de idade. Deve-se esterilizar as mos e usar

    luvas esterilizadas. Aps esterilizar o anel de inoculao, abre-se a tampa da placa de

    petri apenas o suficiente para o anel passar, pega-se um pedao da cultura e coloca-

    se rapidamente no novo meio esterilizado, tomando os mesmos cuidados tomados ao

    retir-lo da cultura; se se usar um bisturi, pode-se cortar um pedao quadrado de

    cerca de 1 mm de lado e transferir para o novo meio. Depois, deixa-se o novo meio

    inoculado temperatura ambiente por 3 a 5 dias. Durante este tempo o miclio vai se

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    33/76

    25

    espalhar no novo meio, cobrindo-o completamente em 7 a 20 dias. O crescimento do

    inoculado deve ser visvel a partir do quarto dia. Neste mesmo dia podero ser

    visveis os contaminantes que possam ter entrado em contato com o meio, usualmente

    como pequenos pontos brancos com centro azul ou verde, e que crescem muito mais

    rapidamente que o miclio; em geral os contaminantes mais comuns so fungos

    Penicillium, Aspergillus, Neurospora e outros. Pode-se distingi-los do miclio

    porque ele sempre de um branco puro, ocasionalmente com um leve toque de

    azulado, enquanto os contaminantes tm outras cores. Qualquer cultura contaminada

    deve ser descartada imediatamente. normal perder algumas.

    Depois de feito o inoculado, as placas devem ser guardadas em uma

    caixa esterilizada. Em climas muito midos, pode se formar condensao nas tampas

    das placas de petri. Deve-se tomar muito cuidado para que uma gota de condensao

    no caia no meio de cultura, pois provavelmente ir contamin-lo.

    O miclio crescido pode ser utilizado para obter psilocibina, pois j h

    quantidade adequada ali, e por meio de reinoculaes, pode-se conseguir a

    quantidade que se necessitar, indefinidamente. Mas se se desejar produzir cogumelos,

    deve-se, para obter frutificao vigorosa, primeiramente cultivar o miclio em centeio,

    trigo, cevada, aveia ou outro gro similar, esterilizado, de modo que uma massa de

    miclio pesando de 50 a 100 gramas seja obtida. O miclio cresce bem em quase

    qualquer tipo de gro, mas os melhores resultados foram conseguidos com centeio,

    embora possa ser conseguido um bom resultado com qualquer dos outros gros.

    Deve-se ter certeza de que o gro utilizado seja para consumo humano, pois os gros

    para alimentao de animais usualmente so tratados com fungicidas.

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    34/76

    26

    Neste ponto, pode ser til construir caixas com janelas no alto para

    poder cultivar os fungos em ambiente com umidade alta e temperatura constante, e

    poder visualiz-los. Para criar um ambiente perfeito para o crescimento, deve-se ter

    um timerregulado para que as caixas recebam luz pela janela em ciclos de mais ou

    menos 13 horas.

    Deve-se arrumar jarros com tampas de rosca com selo de anel de

    borracha para cultivar os cogumelos, preferencialmente.

    Para preparar o meio de centeio (ou outros gros), utiliza-se a seguinte

    receita, para cada jarro:

    112 g de gros inteiros de centeio (ou outro gro)

    2 g de carbonato de clcio (CaCO 3)

    0,2 g de fosfato de potssio (K2HP O4) (opcional)

    160 a 180 ml de gua destilada

    O fosfato de potssio, se no estiver disponvel, pode ser omitido. O carbonato

    de clcio no precisa ser de grande pureza, pode ser utilizado p de concha de ostra, ou mesmo

    giz modo.

    Quando os ingredientes tiverem sido colocados em cada jarro nas

    propores adequadas, as tampas devem ser atarraxadas frouxamente, e com os

    selos de borracha internos invertidos, de modo que eles no sejam selados durante a

    esterilizao.

    Deve-se, ento, esterilizar os jarros da mesma maneira que foram

    esterilizadas as placas de petri, anteriormente. Depois, retira-se cada jarro, aperta-se

    a tampa e agita-se vigorosamente, para misturar bem os ingredientes. Examina-se os

    jarros para ver se apresentam rachaduras e descartam-se todos os que as tiverem.

    Pode-se notar que o centeio ter absorvido gua e estar com um volume vrias vezes

    maior que o prvio. Depois que os jarros esfriarem completamente, deve-se guard-

    los em um local esterilizado.

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    35/76

    27

    Quando os jarros estiverem temperatura ambiente por cerca de duas

    horas, estaro prontos para serem inoculados.

    Usando um bisturi esterilizado, corta-se o miclio de uma das placas de

    petri em quadrados, formando uma rede, de modo que cada quadrado tenha cerca de

    1 a 1,5 cm2. Transfere-se cada quadrado para cada jarro, rapidamente, abrindo-se a

    tampa somente o necessrio para inserir o inoculado, tendo-se o cuidado de re-

    esterilizar o bisturi aps cada transferncia. Fecha-se a tampa do jarro e agita-se

    vigorosamente para espalhar a inoculao. Depois, afrouxa-se a tampa novamente.

    Tambm pode-se fazer a inoculao colocando-se com uma seringa cerca de 10 cm3

    de gua esterilizada na placa de petri, girando a placa em crculos rapidamente por

    alguns minutos, e depois recolocar na seringa e injetar cerca de 1 a 2 cm3 em cada

    jarro, sempre esterilizando a agulha da seringa entre cada inoculao, ou usando uma

    nova seringa.

    Depois que o meio de centeio tiver sido inoculado, ocorre um perodo de

    espera e cuidadosa observao. Os jarros devem ser mantidos a uma temperatura o

    mais constante possvel de 21 a 26 C e 95 % de umidade relativa. Durante os

    primeiros 3 dias o miclio vai crescer do gar para o centeio, e no quarto dia deve

    estar formando uma superfcie redonda sobre o centeio. Neste estgio, fecha-se

    firmemente a tampa e agita-se vigorosamente, para quebrar o miclio e redistribu-lo

    pelo centeio, e depois deve-se afrouxar as tampas novamente. Durante este processo,

    deve-se procurar por jarros contaminados; estes devem ser descartados. Depois de

    sacudir, deixa-se a cultura em repouso por mais 3 a 4 dias. Ao final deste tempo,

    deve ser notado crescimento do miclio em vrios pontos do centeio. Deve-se agitar

    os jarros da mesma maneira no quarto, sexto, oitavo e dcimo dia. Um crescimento

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    36/76

    28

    do miclio de um branco puro por todo o centeio deve ser observado entre o oitavo e

    o dcimo quarto dia. Se outra cor for observada, ou se o centeio estiver apenas com

    cobertura parcial pelo miclio, ou seja, com crescimento irregular, o jarro deve ser

    descartado. Estes tempos de crescimento podem variar grandemente; pode-se obter

    crescimento completo por todo o centeio desde o sexto dia at duas ou trs semanas.

    No se sabe exatamente que fatores governam o tempo deste crescimento, mas

    suspeita-se de algum controle ambiental externo, como variaes de temperatura,

    umidade ou presso parcial de oxignio. A agitao regular das culturas parece

    favorecer o crescimento por favorecer a aerao. Tambm pode-se acrescentar

    extrato de malte ao meio de centeio, o que pode acelerar o crescimento. importante

    que o miclio se distribua e cresa por todo o centeio o mais rapidamente possvel,

    porque quanto mais depressa o fungo tomar todo o meio de cultura, menores as

    chances para os contaminantes. A qualquer sinal de contaminao, fngica ou

    bacteriana, o jarro em questo deve ser descartado.

    Quando um ou mais jarros estiverem completamente permeados pelo

    miclio, deve-se retirar as tampas e cobrir a superfcie do centeio permeado com uma

    camada de 1,5 a 2 cm de solo esterilizado, que no pode ser aplicado seco, mas sim

    levemente umedecido com gua destilada. Uma vez no jarro, ele deve ser umidificado

    mais um pouco utilizando um spray comum de plantas de jardim. Deve ser um fino

    spray de umidade para evitar que a superfcie do solo colocado seja selada pela gua.

    Deve-se umidificar o solo o suficiente para que ele fique totalmente molhado, mas

    nenhuma gua passe do solo para o miclio; ou seja, evitando saturar o solo de gua.

    Depois de acrescentar o solo e umidific-lo, descarte as tampas dos

    jarros e mantenha as culturas em um ambiente de alta umidade. Deve-se aplicar o

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    37/76

    29

    spray de gua diariamente apenas para repor a umidade perdida pela evaporao.

    Cada jarro pode requerer 2 a 3 umidificadas por dia para manter frutificao

    constante.

    Durante as prximas duas a trs semanas o miclio comear a crescer

    para o solo que recobre o centeio, penetrando-o at logo abaixo da superfcie. O

    miclio pode ocasionalmente atravessar o solo e surgir na superfcie. Se se estiver

    regando pouco os jarros, o miclio da superfcie ficar azulado. medida que o

    miclio cresce dentro do solo, ele comear a fazer uma rede, que ganhar cada vez

    mais nodos de interseo, e por volta do 14o ao 20o dia, esses nodos se tero

    diferenciado em pequenos pontos brancos por todo o solo de cobertura. Estes pontos

    so os primrdios dos pequenos cogumelos; gradualmente eles aumentam e acumulam

    mais miclio, tomando a aparncia de cogumelos, com estpites grossas e chapus

    marrom escuros. Uma vez que os pequenos cogumelos tenham penetrado a superfcie

    do solo, outros 5 a 10 dias sero necessrios para o amadurecimento completo. Na

    maturidade, estes cogumelos tero o tamanho padro da espcie, com chapus que

    variaro entre 1 e vrios centmetros de dimetro, devido s condies de

    crescimento. Foi verificado que estes cogumelos respondem favoravelmente luz, e

    aquele ciclo de 13 horas far com que os cogumelos tenham estpites menores e

    chapus maiores do que aqueles crescidos sem iluminao especial. Alguns deles

    crescero at o tamanho total, outros crescero at a metade, e outros pararo de

    crescer. Entretanto, todos j tero toda a psilocibina que produziriam. O problema

    destes que param de crescer que so mais susceptveis a ataques de bactrias: se

    eles estiverem com cores ou aparncia muito estranha, no devero ser usados.

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    38/76

    30

    Depois que os cogumelinhos tiverem passado pelo solo, deve continuar a ter cuidado

    para que no sequem demais.

    Vrios tipos de solo para cobrir o centeio foram testados e efetivamente

    produziram frutificao, mas a seguinte mistura produz o melhor tipo de solo:

    Medidas de volume:

    7,5 litros de musgo batido

    3,5 litros de vermiculite fino

    4 litros de areia fina lavada

    2 litros de carbonato de clcio (pode ser utilizado p de conchas de ostras modo bem

    fino)

    Entretanto, at mesmo um rico solo de jardim mostrou-se bastante

    aceitvel, embora as condies no esterilizadas deste tornem a contaminao muito

    provvel. Pode-se tambm tentar esterco de cavalo ou boi com terra comum. Pode-

    se tentar esterilizar em autoclave antes de usar.

    Aps dois crescimentos de cogumelos, o solo e o bloco coberto de

    miclio tendem a encolher um pouco, deixando um espao entre o miclio e as

    paredes do jarro. Quando isso acontecer, uma nova cobertura com solo novo pode

    aumentar o nmero de frutificaes do jarro. Com um simples garfo para cada jarro,

    para evitar contaminao de um para o outro, pode-se recolher o mximo possvel do

    solo usado da primeira vez, e ento basta colocar uma nova camada de solo, pr-

    umedecida, como antes, usando o garfo para jogar terra tambm nos espaos

    deixados entre o miclio e as paredes do jarro. Levar cerca de duas semanas para o

    jarro se recuperar deste tratamento, mas a segunda leva de colheitas ser de

    cogumelos mais resistentes a contaminao. Isso pode ser repetido por algumas

    vezes.

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    39/76

    31

    medida que os cogumelos amadurecem para seu tamanho total, o

    chapu aumentar e tomar uma forma mais globular. medida que o chapu alarga-

    se, o vu parcial se rasgar, formando o anel do estpite. Os cogumelos podem ser

    colhidos assim que ocorra a ruptura do vu parcial. Se se for recolher uma nova

    impresso da esporada, entretanto, deve-se esperar que o chapu assuma um formato

    mais achatado, como um guarda-chuva, para poder ser colhido com esporos

    maduros.

    Cogumelos frescos podem ser comidos ou preparados imediatamente, ou

    ento podem ser secos em forno com calor baixo de cerca de 60 C ou menos por 6

    a 10 horas, ou sob uma lmpada quente, ou ainda sobre uma grelha sobre um

    aquecedor de ar. Eles estaro totalmente secos quando estiverem duros ao tato, como

    uma torrada, sem nenhum ponto macio. Para preservar a potncia mxima, os

    cogumelos secos devem ser selados em sacos de plstico de tamanho adequado a

    eles (sacos de 5 g serviro) dos quais todo o ar tenha sido retirado, utilizando uma

    seladora eltrica, ou em outro tipo de compartimento com vedao (Figura 14), e

    depois congelados. Cogumelos secos deixados ao ar livre perdem potncia

    rapidamente.

    Os cogumelos frescos no devem ser congelados sem que sejam secos

    primeiro, pois isso degrada totalmente os cogumelos; entretanto, eles podem ser

    mantidos em um saco plstico em uma gaveta de vegetais de um refrigerador por um

    perodo de uma semana a 10 dias, no mximo.

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    40/76

    32

    Os cogumelos secos contm cerca de 0,2 a 0,4 % do peso de

    psilocibina, embora j tenha sido relatado que algumas cepas cheguem a nveis de 0,5

    %. A psilocina encontrada apenas em nvel de traos. Uma dose de cerca de 10 a

    12 mg de psilocibina, ou cerca de 5 g de cogumelos secos, ou 50 g de cogumelos

    frescos suficiente para manifestar o espectro total de efeitos alucinognicos em um

    adulto de 75 kg. Estes efeitos incluem alucinaes auditivas e visuais, hilaridade

    extrema, distores da percepo de tempo e espao e um senso de desligamento

    emocional do ambiente. Efeitos menos marcados podem ser detectados com doses

    to baixas quanto 4 mg, o que significa cerca de 2 ou 3 cogumelos secos. Os

    cogumelos frescos parecem ser de algum modo mais potentes do que os secos.

    No foi observada diferena significativa entre a quantidade de

    psilocibina entre cogumelos secos no escuro ou na presena de luz, apenas a reao

    Figura 14 - Cogumelos frescos, esecos prontos para congelamento

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    41/76

    33

    visual da colorao azul torna-se um pouco diferente, provavelmente devido a alguma

    mediao da luz no processo (Figura 15).

    Usos

    O uso de cogumelos como alimento provavelmente remonta origem da

    humanidade, ou talvez at antes, pois diversos animais, inclusive vrios antropides j

    foram registrados alimentando-se de fungos. O uso dos cogumelos alucingenos

    sistematicamente vem provavelmente dos primrdios da humanidade, mas de acordo

    com o que se tem de estudos feitos, pelo menos h 10.000 anos j se fazia tal uso

    deles, comprovadamente, e acredita-se que o Xamanismo, a tradio de cura e

    contato com o divino da qual eles fazem parte, tenha pelo menos de 20.000 a 30.000

    anos.

    Quanto a estes fungos dotados de propriedades alucinognicas, cabe

    dizer que a descoberta de populaes ainda praticantes de cultos fngicos, existentes

    Figura 15 - Reao da mudana de colorao para azul entrecogumelos secos no escuro e na presena de luz.

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    42/76

    34

    no Mxico desde poca anterior conquista pelos espanhis abriu novo e amplo

    setor nas pesquisas cientficas de carter micolgico, arqueolgico, fisiolgico,

    etnolgico, qumico e teraputico.

    Foi verificada, no sul do Mxico, a persistncia de ritos, cujo culto teria

    por finalidade a venerao sob a ao dos cogumelos sagrados capazes de transmitir

    o poder divinatrio. Foram recolhidos e cultivados em laboratrios uma srie de

    fungos e, aps a obteno de culturas semi-industriais dos referidos fungos, foi

    possvel o isolamento dos seus alcalides, pertencentes ao grupo das substncias

    indlicas, a psilocibina e a psilocina, cuja atividade foi verificada experimentalmente e

    cuja sntese foi obtida pelos qumicos. Tais substncias, experimentadas em doentes

    mentais e em indivduos sos, permitiram estabelecer a possibilidade de seu

    aproveitamento no tratamento da esquizofrenia.

    Em O Grande Mundo dos Fungos(op. cit., pgs. 168,166), temos que

    oPsilocybe usado no Mxico pelos ndios Mijes, Zapotecas, Mazatecas (no estado

    de Oaxaca) e Nahuas (no estado do Mxico), dentre outros. Foram comprovados o

    uso das seguintes espcies, por estas tribos, do gnero Psilocybe: mexicana,

    semperviva, caerulescens var. mazatecorum, caerulescens var. nigripes,

    yungensis, aztecorum, wassonii, zapotecorum, hoogshageni, cordispora,

    mixaeensis; alm, claro, doPsilocybe cubensis.

    As sensaes provocadas pela ingesto dos cogumelos so parecidas s

    observadas aps ingesto da raiz dopeyotl(Lophophora williamsii,Cactaceae).

    O estado mental induzido por uma dose completa de cogumelos de

    euforia e lucidez calma, sem perda de coerncia ou clareza de pensamento. As

    alucinaes vistas com olhos fechados so cheias de cor, bem definidas e altamente

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    43/76

    35

    articuladas, e podem variar de formas geomtricas abstratas a vises de paisagens

    fantsticas e vises arquiteturais. Essas alucinaes so mais intensas quando os

    cogumelos so tomados dentro de um prdio, noite, na escurido completa; esta a

    forma preferida pelos rituais dos ndios Mazatecas. Outras culturas, entretanto,

    preferem faz-lo em seus rituais ao ar livre, em ambiente natural, direcionando seus

    sentidos para fora e observando que seus sentidos parecem ligados ao mais alto nvel

    de receptividade, ouvindo, cheirando e vendo as coisas com uma clareza dificilmente

    experimentada antes.

    Vrias culturas indgenas utilizaram-se e ainda o fazem destes cogumelos

    como parte de seus rituais religiosos, em todas as partes do mundo, seja em misturas

    com outros cogumelos, como o Amanita muscaria, ou com plantas diversas, outras

    vezes at com animais, como o Bufo rana, ou somente eles. O objetivo de todas

    estas culturas o mesmo em todos os lugares: atingir um estado de conscincia que

    permita contato com os seus deuses e/ou espritos auxiliares. No Brasil, tem-se muito

    poucos estudos em relao a isso, mas supe-se que diversas tribos os possam ter

    utilizado em rituais, dada sua farta distribuio, mas nada h de estudado em relao

    aos cogumelos, a grande maioria dos estudos disponveis sendo relacionada cultura

    doAyauasca, de conhecimento relativamente recente. A grande maioria dos estudos

    com os cogumelos foi feita a partir de culturas indgenas na regio da Amrica

    Central., sendo quase certo que culturas como a dos Aztecas e Maias, e mesmo dos

    Incas da Amrica do Sul o conheciam. Mais estudos so necessrios neste ponto, no

    s no Brasil como nos diversos outros pases da Amrica do Sul. Entretanto parece

    claro concluir que uma vez que os Incas os tenham conhecido, os demais povos da

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    44/76

    36

    Amrica do Sul que j foram conquistados por eles tenham tido no mnimo um contato

    com este tipo de cultura religiosa.

    Entretanto, sabe-se que os cogumelos tambm eram usados pelo ndios

    de forma recreativa; por exemplo, na coroao de Montezuma, foram servidos aos

    convidados e ao povo em geral como quitutes. Ao que se sabe, o uso destes

    cogumelos com fim religioso implicava em um conhecimento especial de como e at

    que ponto utiliz-los mantido apenas pelos sacerdotes, em culturas como esta.

    Entretanto, em culturas menos desenvolvidas neste aspecto de civilizao, o uso com

    este fim era o nico feito, e era restrito aos xams, juntamente com outras tcnicas.

    Entretanto fica muito claro que o uso remonta a pocas muito antigas. A

    suspeita de que esses cogumelos eram a parte principal dos ingredientes do soma

    utilizado pelos antigos hindus e relatados em seus hinos picos de mais de 3.000 anos

    de idade, os Vedas, demonstra a importncia deles nessa cultura.

    OsPsilocybeesto representados no novo mundo, em esculturas muito

    antigas, os chamados cogumelos de pedra, por toda a Amrica Central, a maioria

    datada do perodo entre 1400 e 1600 (Figura 16), mas tendo sido encontrados

    exemplares datados de cerca de 300 a 500 A. C.

    No entanto, modernamente, foi somente em 1936 que um no-ndio,

    Roberto J. Weitlaner, presenciou os cultos sagrados envolvendo os Psilocybe. Em

    1938 e 1939, Richard Evan Schultes, fazendo trabalho de campo em Oaxaca,

    Mxico, conseguiu alguns exemplares e os enviou para Harvard. No entanto, eles

    chegaram l em estado muito degradado, o que impossibilitou a identificao.

    Somente muitos anos depois que eles foram identificados, por outras fontes.

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    45/76

    37

    O verdadeiro incio dos estudos sistematizados dos cogumelos Psilocybe

    se deve ao casal Wasson. Robert Gordon Wasson e sua esposa Valentina Pavlovna

    foram os precursores, e esto entre os primeiros, modernamente, a terem contato

    direto com os cogumelos sagrados, no Mxico, onde se localiza a grande maioria dos

    cultos conhecidos que ainda os utilizam. Valentina Pavlovna muito influenciou Wasson

    a estes estudos, uma vez que ele era do tipo que tinha medo dos cogumelos, por no

    saber diferenciar os venenosos dos comestveis; no entanto ela, de origem russa, local

    onde vivem muitos dos mais vorazes consumidores de cogumelos existentes, conhecia

    empiricamente as diferenas. Ao se casar com Wasson, que era banqueiro, ela,

    Figura 16 - Cogumelo de Pedra

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    46/76

    38

    mdica, convenceu-o a pesquisar sobre eles e seus usos. Durante muito tempo

    reuniram dados sobre o papel dos cogumelos nas sociedades primitivas da Europa e

    sia. Em 1957, tiveram sua ateno voltada aos cogumelos mexicanos. Receberam

    muitas informaes de Weitlaner, prosseguindo sua pesquisa a partir da. Em 1957

    escreveram um livro, alm de vrios artigos, que originaram um novo ramo da

    etnobotnica, a etnomicologia. Wasson foi que identificou o soma, alimento sagrado

    dos hinos Vdicos da ndia e regies, ao qual os deuses e os mortais recorriam

    para ter revelaes que os ajudavam a resolver seus problemas, ao Amanita

    muscaria(recentemente, esse papel tem, cada vez mais, sido atribudo aoPsilocybe).

    Os Wasson trabalharam com Albert Hofmann e Roger Heim, os descobridores dos

    princpios ativos psilocibina e psilocina, levados a trabalhar com estes fungos por eles.

    Quanto identificao do Psilocybe como o soma Vdico, h vrias

    publicaes que desafiam a idia de Robert Gordon Wasson de identific-lo com o

    cogumelo psicoativo Amanita muscaria (agrico-de-mosca). Alguns artigos que

    revisam cartas no publicadas de Wasson revelam que ele considerou e rejeitou

    outras plantas psicoativas como candidatas, inclusive as sementes de Lagochilus

    inebrians, Convolvulaceae(morning glory), o fungo parasita Claviceps purpurea

    (ergot), e em especial o Psilocybe cubensis. Alm de seu interesse histrico, estas

    cartas da Coleo Etnomicolgica de Tina e Gordon Wasson no Museu Botnico

    de Harvard demonstram que Wasson permaneceu aberto a refinamentos sua

    teoria. Atualmente, muitas fontes citam osPsilocybecomo os melhores candidatos.

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    47/76

    39

    Populares

    Tradicional

    O uso tradicional, como foi visto acima, principalmente

    com fins religiosos.

    O cogumelo coletado sempre na Natureza, isto um

    ponto essencial do xamanismo. H at uma tcnica em que se deve

    chegar a um local especificado, geralmente revelado em estado de

    conscincia alterado pela droga, e andar em uma direo especfica,

    somente coletando os cogumelos que estiverem nesta direo em uma

    reta, tcnica esta utilizada por algumas culturas. Em geral eles so

    engolidos frescos, mas outras culturas os secam ao sol para uso

    posterior, fora das pocas de colheita. Nessas culturas ele em geral

    fumado em um cachimbo especialmente destinado a isso. Em outras

    formas de ritual, eles so ainda engolidos secos, ou mascados, ou

    chupados.

    Os sacerdotes de muitas culturas, primitivas ou no,

    modernamente chamados xams, palavra cuja origem vem do nome

    dado aos sacerdotes ou curandeiros da Sibria que primeiramente

    foram seriamente estudados, por Eliade (op. cit.) e outros, sempre

    utilizaram formas de obter um estado alterado de conscincia no qual

    pudessem ter contato com entidades de outros nveis de existncia, em

    geral com finalidade curativa, mas tambm por todos os outros

    aspectos da vida. Estes cogumelos provavelmente foram alguns dentre

    os primeiros tipos de modificadores de estado de conscincia

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    48/76

    40

    utilizados, tendo em vista sua distribuio e facilidade de ser

    encontrados. Com eles, os xams faziam o que se conhece por

    jornada xamnica.

    Durante uma jornada xamnica, o xam entra em um

    estado alterado de conscincia atualmente referenciado pelos

    modernos xams como Estado Xamnico de Conscincia. A

    filosofia do xamanismo postula que h trs reinos de existncia

    diferentes, mas que se interpenetram: o Mundo Mdio, que

    corresponde mais proximamente realidade fsica, oMundo Inferior,

    e o Mundo Superior. Estes reinos so experimentados como reais,

    embora eles tambm sejam claramente diferentes da realidade comum

    que a maioria das pessoas compartilha. Os xams acreditam que estes

    mundos so povoados por espritos que so acessveis s pessoas na

    morte ou em um estado alterado de conscincia. O xam entra em um

    estado alterado de conscincia, usando portanto sua mente para

    ganhar acesso, passando pela porta para outra realidade que existe

    independentemente desta mente. Ele se torna um participante ativo

    desenvolvendo e mantendo relacionamentos com os espritos, pedindo

    sua ajuda e instrues sobre como ajudar a cuidar da vida das

    pessoas a quem eles orientam. Atravs de repetidas jornadas, o xam

    torna-se familiar tanto geografia como aos habitantes desses

    diferentes reinos. Enquanto fazem isso, ele ou ela recebem ajuda de

    espritos auxiliares, muitas vezes sobre a forma de animais, que ajudam

    o xam a aprender vrios mtodos de curar doenas e outras

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    49/76

    41

    situaes da vida. Estes espritos so chamados animais de poder.

    Os xams tambm adquirem um professor, muitas vezes referenciado

    como esprito tutelar, que age como um verdadeiro professor

    durante suas jornadas. Da perspectiva xamnica, todas as coisas so

    dotadas de esprito: animais, plantas, mesmo minerais possuem uma

    essncia espiritual, e o xam quem tem a habilidade de comunicar-se

    diretamente com essas entidades espirituais. (Green, J. T., op.cit.).

    Essas prticas tm sido executadas h dezenas de milhares de anos,

    com resultados suficientemente satisfatrios para continuar sendo

    praticadas at nossos dias. Com efeito, segundo considerao de

    Harner (1997, p.17, op. cit.):

    Infelizmente, quando a cincia comeou, parcialmente como uma

    reao Igreja na Europa, ela dogmatizou que almas e espritos no

    tm nenhuma realidade e portanto no poderiam ser considerados em

    teoria cientfica. Agora, isso umaposio a priori; em outras

    palavras, ironicamente, uma declarao de f enunciada no Sculo

    XVIII. Na verdade, a cincia nunca provou a inexistncia de espritos.

    Eu colocaria que agora, no limiar do Sculo XXI, tempo de deixar de

    ter uma cincia que baseada em f (a f de que no existem

    espritos) e faz-la uma cincia verdadeira, o que significa uma cincia

    que no dogmatiza a priori que certos tipos de fenmenos e causas

    no podem possivelmente existir.

    Indubitavelmente, o papel da cincia provar o simou o

    no, mas no provar osimno implica automaticamente que o no

    verdadeiro.

    O xamanismo tido como o primeiro tipo de contato com

    o divino que a humanidade provavelmente teve, a origem de qualquer

    tipo de religio posterior. Todas as culturas tiveram a sua fase

    xamnica, e ainda se pode ver os vestgios disso em qualquer uma.

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    50/76

    42

    Na tradio xamnica de qualquer cultura, claro o

    modo inicial de conseguir um estado alterado de conscincia:

    utilizando drogas vegetais capazes de tal coisa. Eram as chamadas

    plantas de poder, que tinham tal capacidade, e por isso at chegaram

    a ser divinizadas em algumas culturas. O Psilocybe mexicana

    conhecido como teonanacatl, que significa a carne de Deus, at

    hoje. Nas tradies mais desenvolvidas neste aspecto, os xams

    referem que na verdade as drogas no so absolutamente necessrias

    para conseguir chegar a este estado alterado de conscincia, que pode

    e deve ser atingido com um simples ato de vontade; no entanto,

    reconhecem que estas drogas so um meio mais rpido, especialmente

    ao iniciante, de ter contato com aquelas realidades, e que til iniciar

    utilizando-as, para depois, com o desenvolvimento, deixar de faz-lo,

    porque na verdade essas drogas podem at fazer mal a longo prazo,

    mas so inestimveis para dar uma sacudida nas idias

    preconcebidas do indivduo. Outras culturas no chegaram a este

    ponto, em especial as que usam osPsilocybe, uma vez que eles no

    so causadores de males como outras drogas vegetais.

    Recreativo

    O uso recreativo dos cogumelos, embora difundido na

    Amrica Central na antigidade, s teve novo recrudescimento na

    dcada de 1960, com o clima de psicodelismo e buscas interiores que

    reinava naquele tempo. Muito do que se sabe deve-se quele tempo,

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    51/76

    43

    em especial com as pesquisas de Timothy Leary, o grande divulgador

    do psicodelismo.

    At 30 cogumelos secos podem vir a ser necessrios para

    ter uma experincia alucingena, mas isso pode variar de indivduo

    para indivduo. Costumam ser manufaturadas bolas de psilocibina

    pelos traficantes de alguns pases, um tipo de tabletes que tm o odor

    e a aparncia dos tabletes comerciais de levedura, e so fabricados

    ilegalmente a partir de um material composto praticamente por

    cogumelos secos. Cada tablete tem aproximadamente 10 mm de

    dimetro por 5 mm de espessura, com um peso aproximado de 4 a 5

    gramas. (Figura 17) Os cogumelos podem ser consumidos crus,

    cozidos, convertidos em uma bebida, engolidos ou fumados, ou secos

    para consumo posterior. No Brasil, costumeiro o uso em infuso ou

    decocto, o famoso ch-de-cogumelo. H registros ainda de ser

    utilizado juntamente com outras bebidas, como no chimarro, no sul.

    Podem vir a ser necessrios pelo menos 30 cogumelos

    para produzir uma experincia alucingena comparvel de uma

    pequena dose de LSD, embora sempre contextualmente diferente das

    deste ltimo. Estes tabletes eram utilizados principalmente na Europa.

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    52/76

    44

    A legislao de controle varia muito de pas para pas,

    mas de modo geral, na maioria dos pases a posse dos cogumelos no

    , em si, contrria lei, a no ser que tenham sido tratados e

    preparados para seu uso ilegal. Cozinh-los, cort-los ou tritur-los

    para seu comrcio provavelmente seria um delito. Os tabletes ilegais

    feitos na Europa e em alguns outros pases fabricados com os

    cogumelos secos so claramente um preparado ou produto, destinado

    Figura 17 - Psilocybesecos, e os tabletes utilizados na Europa

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    53/76

    45

    ao narcotrfico, contendo uma droga controlada e, portanto, proibido

    por lei. No entanto, como j foi dito, esta tipo de droga no faz muito

    sucesso com o toxicmano regular, devido a suas caractersticas

    especficas, de modo que o narcotrfico, em si, tem pouco interesse

    nela, alm de outros fatores que acabaram por encerrar o seu trfico

    em grande parte.

    A Psilocibina e a Psilocina, sendo empregadas na

    psiquiatria ocasionalmente, esto catalogadas como drogas, em

    praticamente todos os pases. Nos Estados Unidos, apenas em 1965

    e 1966 foram criadas leis contra a venda, manufatura e posse de LSD,

    mescalina e psilocibina, mais por presso da imprensa que por

    motivos cientficos. Por outro lado, a pesquisa cientfica no foi

    proibida. Entretanto, o narcotrfico da psilocibina em particular foi de

    curta durao.

    O desenvolvimento de tcnicas simples de cultivo do P.

    cubensispor Oss e Oeric (op. cit.) em 1975, e sua popularizao a

    partir de ento, atravs de livros e outro meios e, mais recentemente,

    atravs da Internet (The Lycaeum, ref. cit., e outros), foi um dos

    fatores responsveis pela quase total paralisao do comrcio ilegal de

    alucinognicos ao nvel mundial, substitudo pelo cultivo domstico por

    parte dos usurios. Atualmente, podem at ser conseguidos esporos

    para compra on-linea baixo custo via Internet. Essas prticas tambm

    contribuem para aumentar ainda mais a disseminao do P. cubensis,

    aliadas disseminao com a pecuria.

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    54/76

    46

    Cientficos

    O uso cientfico dos cogumelos, em experimentao, feito ou

    com os cogumelos frescos ou secos, ou com a psilocibina oura, ou na forma

    de decocto, mais raramente.

    Grof (op. cit.), embora utilizando principalmente o LSD para suas

    pesquisas, aps 31 anos de pesquisa tem um respeitvel acervo de dados

    demonstrando dezenas de tratamentos bem sucedidos de casos to variados

    como inverso de homo para heterossexualidade, alcoolismo grave,

    tendncias suicidas, sadomasoquismo, doenas psicossomticas variadas, de

    asma a psorase, alm de um considervel nmero de psicoses.

    Ele define a experincia transpessoal como a expanso ou a

    extenso da conscincia alm das limitaes usuais do ego e das limitaes do

    tempo e espao.

    Tart (op. cit.), dentre outros, considera a terapia transpessoal,

    que no s leva em conta mas tambm muitas vezes se utiliza abertamente

    desta experincia transpessoal, atravs de estados alterados de conscincia,

    uma nova e profcua forma de tratamento que capaz de atingir toda uma

    nova gama de patologias, alm de ser um novo mtodo de lidar com as j

    bem conhecidas de uma forma totalmente capaz de adentrar o mundo

    subjetivo de cada um e reajustar personalidades que de outra forma no

    teriam mais que um tratamento paliativo, ou mesmo um tratamento errneo,

    tendo certas destas experincias taxadas como esquizofrnicas ou histricas

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    55/76

    47

    por puro desconhecimento, uma vez que a psicologia ocidental repeliu o lado

    chamado de espiritual da criatura humana, considerando-o patolgico.

    Tambm na cincia consenso de que para conseguir estes

    estados alterados no absolutamente necessrio utilizar a droga, o mesmo

    pode ser conseguido por treinamento, mas como no xamanismo, tal

    treinamento levaria tempo para tornar a experincia to regular ao ponto de

    poder ser conseguida para um tratamento em tempo hbil, especialmente em

    indivduos doentes. Deste modo, a droga surge como um meio rpido e

    eficiente de levar o indivduo a uma situao de tratamento e cura.

    O princpio bsico da pesquisa cientfica de que, a no ser que

    a Natureza ou Deus, como queira tenha imaginado ou desejado ou

    planejado que um dia os seres humanos viessem a gostar de se drogar com

    alucingenos por puro prazer, no haveria nenhuma razo para que estes

    tivessem no mago da sua membrana celular neuronal receptores especficos

    para a psilocibina e outros. A nica explicao possvel que estes princpios

    so ativos para ns porque existe alguma substncia dentro de ns que tenha

    funo semelhante deles, e que essa substncia hipottica tenha alguma

    funo na nossa homeostase, e ainda, como qualquer das substncias que tm

    tais funes, podem sofrer desequilbrio: a doena mental. Este campo de

    estudos, entretanto, bloqueado em todos os pases exceto aqueles nos quais

    a hipocrisia superada pela nsia de ajudar a humanidade segundo o princpio

    scientia pecunia est, razo pela qual existe uma presso para manter tais

    pesquisas proibidas nos demais pases. Isto o processo, amplamente

    controlado pelos primeiros, chamado de competio. O mal tais presses

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    56/76

    48

    serem acatadas. Isto conhecido como submisso. De qualquer modo, os

    estudos em andamento trazem a promessa do alvio de alguns dos males que

    afligem h muito os humanos, estudos estes realizados em cima de mtodos

    primevos de tratamento, como os do nosso caso.

    Segundo os recentes trabalhos de Vollenweider (op. cit.) na

    pesquisa psiquitrica, especialmente em esquizofrenia, no Departamento de

    Pesquisa do Hospital Universitrio de Zurique, Sua, pesquisas recentes no

    mecanismo farmacolgico dos alucingenos (em especial, LSD e psilocibina)

    e anestsicos dissociativos (principalmente PCP e cetamina) sugerem que

    mltiplos sistemas neurotransmissores esto envolvidos nas psicoses induzidas

    por drogas (a experincia alucingena) e possivelmente tambm em psicoses

    que ocorrem naturalmente. Especificamente, modelos animais sugerem que um

    desequilbrio entre serotonina, glutamato e dopamina no circuito lmbico

    crtico-estriado-talmico pode ser crtico para a formao do sintoma

    psictico. Para testar esta hiptese, mensuraes psicomtricas e

    investigaes metablicas foram levadas a efeito para elucidar o substrato

    neuronal comum dos diferentes alucinognicos com ligaes a receptores

    celulares antes e depois de pr-tratamento com antagonistas a receptores

    especficos para explorar as interaes dos alucingenos com vrios sistemas

    neurotransmissores. Os dados recolhidos demonstraram que o substrato

    neuronal do pensamento e comportamento normais e anormais est associado

    com uma rede neuronal distribuda e com mltiplos sistemas

    neurotransmissores interativos. Os dados tambm apoiam o ponto de vista de

    que o desafio de estudar os alucingenos e todos os paradigmas que eles

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    57/76

    49

    desafiam constituem uma ferramenta poderosa para a elucidao da

    patofisiologia dos distrbios neuropsiquitricos. Estes estudos ainda esto em

    andamento, mas prometem muito contribuir para o futuro. No entanto, aos

    pases em que de modo ftuo proibido sequer pensar em pesquisar tais

    drogas por serem relacionadas com algum tipo de juzo final poltico e social,

    nada resta alm de esperar pelos resultados finais e ento comprar a duras

    penas os medicamentos ou mesmo tcnicas outras que da resultem.

    Em homeopatia tambm o Psilocybe tem sido utilizado. Flores

    Toledo (op. cit.) publicou j h mais de 10 anos a primeira patogenesia, onde

    utilizou uma variedade de P. caerulescens tanto in natura como nas

    dinamizaes D5, C6, C12, C30 e VI/50M, alm do placebo para o controle

    duplo-cego, obtendo 461 sintomas, 30 % deles na esfera mental. O

    medicamento no pode ser utilizado naqueles pases j referidos

    anteriormente, a no ser em altas diluies, e tambm a matria prima s pode

    ser comprada de outros pases, j diluda, j que o fungo no pode ser

    cultivado ou utilizado. Isso, pelo menos, j um consolo para os pacientes. E,

    no entanto, no Mxico, est em estudos e tendo bom resultado para

    depresso mental, distrao, alucinaes, delrios, riso involuntrio, e dezenas

    de sintomas mentais e fsicos, sendo importante arma teraputica para vrias

    patologias, mormente mentais. Ainda estando em estudos, no chegou ao

    ponto de ser identificado como osimillimumde alguma patologia, mas j

    utilizado com sucesso no sentido organotrpico.

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    58/76

    50

    Discusso e Concluses

    Parece ser caracterstico da condio humana o desejo de contato com o divino,

    o sagrado, o numinoso, uma vez que isso aconteceu e ainda acontece com qualquer cultura

    humana, em qualquer ambiente onde ela exista. A prpria histria do homem, em quase todas

    as suas obras, nas artes, filosofias, religies, na sua prpria civilizao, em grande parte um

    relato da busca por este contato com o sagrado, com o mistrio que existe no simples fato de

    ser. H evidncias de que os humanos possuam conscincia religiosa desde o Paleoltico,

    talvez antes. Parece razovel supor que, nos primrdios da aventura humana neste planeta, em

    seu af de suprir as necessidades mnimas de sobrevivncia, procurando por novas formas de

    alimentao, os humanos entrassem em contato com plantas e animais que possussem em

    suas estruturas compostos capazes de afetar o sistema nervoso central de alguma forma e, em

    algum momento, uma substncia capaz de alterar o estado de conscincia para algo

    semelhante ao nico estado de conscincia modificado conhecido at ento, o sonho.

    Antroplogos e etnlogos j sugeriram que em algum momento algum, procurando se

    alimentar de certos cogumelos que at hoje so usados, tenha acidentalmente ingerido um dos

    Psilocybeou aparentados, e a partir da, aps centenas de anos de experimentaes, tenha se

    formado toda uma cultura religiosa em funo disso. Evidncias recentemente obtidas

    demonstraram um culto plenamente desenvolvido nestes termos na Amrica Central h

    aproximadamente 10.000 anos, embora se acredite que a tradio xamnica tenha pelo

    menos 20.000 a 30.000 anos, possivelmente ultrapassando os 50.000 anos. Desde ento, de

    numerosas formas, os estados alterados de conscincia fazem parte, e uma parte importante

    da cultura humana, seja atravs de beberagens baseadas em lcool, seja atravs da inalao

    deNicotiana rustica e similares, hbito tradicional religioso que sobrevive como rliqua no

    consumo da N. tabacum, seja na queima de raminhos na Europa pelos religiosos nos

  • 7/26/2019 livro cogumelos

    59/76

    51

    Domingos de Ramos, seja pela busca um tanto desesperada e desorientada de um duvidoso

    alvio em virtude da ausncia de propsito ritual atravs de uma infinidade de substncias,

    naturais ou sintticas, por parte dos desvalidos. No se trata, em nenhum dos casos,

    simplesmente de uma fuga, mas sim de uma tentativa, talvez as mais das vezes inconsciente, de

    obter um propsito, de alcanar alguma coisa realmente importante, qui dentro de ns

    mesmos, que parece vaga e perdida nesta civilizao de valores superficiais.

    Aps tantas geraes de tradies, revelia das instituies governamentais, as

    pessoas continuam a buscar algo, mas justamente devido a essas mesmas instituies, sem a