Livro de Romário sobre Doenças Raras

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Câmara dos Deputados ROMÁRIO Deputado Federal DIA MUNDIAL DAS DOENÇAS RARAS 2013 Ação do Deputado Federal Romário na Câmara Federal. Centro de Documentação e Informação Coordenação Edições Câmara Brasília – 2013 03345.indd 1 26/07/2013 09:29:34

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Câmara dos Deputados

ROMÁRIO Deputado Federal

Dia MunDial Das Doenças RaRas 2013

Ação do Deputado Federal Romário na Câmara Federal.

Centro de Documentação e InformaçãoCoordenação Edições Câmara

Brasília – 2013

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CÂMARA DOS DEPUTADOS54a Legislatura – 3a Sessão Legislativa

SÉRIESEPARATAS DE DISCURSOS, PARECERES E PROJETOS

No 21/2013

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suMáRio

apResentação 5

o RaRo eM uM Dia De conscientização MunDial 7

Questões Bioéticas soBRe Doenças Genéticas RaRas 17

paRa uM coMeço De Reflexão soBRe o cuiDaDo Das Doenças RaRas 25

notas taQuiGRáficas Do Dia Das Doenças RaRas 2013 29

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apResentação

Você recebe em suas mãos o resultado de um dia de ação que foi realizado na Câmara dos Deputados, em fevereiro de 2013.

Ao ler as notas taquigráficas poderá perceber o quanto o momento foi permeado de palavras fortes, incisivas e urgentes. Palavras que pos-suem esta característica são formuladas somente quando o sentimento de urgência e de abandono de toda e qualquer ajuda coexistem.

O tema que apresento, doenças raras, é novo para mim. E corro o risco de dizer, sem medo de errar, que o é para muitos de nós. Quando comecei a me interar sobre o assunto, devido a procura inicial do Sr. Rogério Lima Barbosa, percebi que a angústia desse pai não era uma exclusividade e mais de 15 milhões de famílias brasileiras poderiam sofrer do mesmo sentimento de abandono do Estado e descriminação da sociedade.

Por isso, comecei a dedicar-me a apoiar as pessoas com doenças raras. Em 2012 e 2013 fiz questão de promover o Dia das Doenças Raras no maior auditório da Câmara dos Deputados, o Nereu Ramos.

Ainda não temos a tecnologia para repassar os sentimentos mas ao ler as notas que serão apresentadas aqui, você poderá sentir um pouco da emoção que eu e mais de 700 pessoas sentimos no dia 28 de fevereiro de 2013, quando a voz do povo se fez presente em sua casa.

Além das notas taquigráficas, apresento três textos que buscam cla-rear a realidade de quem convive com as doenças raras.

O primeiro texto, escrito pelo amigo Rogério Lima Barbosa, divulga a origem do Dia das Doenças Raras, seus objetivos, avanços conseguidos em nosso país, embasa a necessidade de transformação do olhar para o paciente e, por fim, defende a criação de um programa para doenças

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raras, dentro do Ministério da Saúde, capaz de gerar as informações necessárias e suficientes para toda a população brasileira.

O prof. Dr. Natan Monsores, do departamento de saúde coletiva da Universidade de Brasília, centra sua discussão na importância da pes-soa e como são afetas a biociência. O professor ainda esclarece que as pessoas que convivem com alguma doença rara, na concepção do outro, acabam se tornando invisíveis às outras pessoas, intocáveis nas relações sociais e incapazes por precisarem de tecnologias assistivas. Por fim, aborda que a informação é o grande entrave das pessoas que convivem com essa realidade.

Dentro da perspectiva de um problema vivido nos mais diferentes países, a prof. Dra. Sílvia Portugal, da Universidade de Coimbra - Por-tugal, contribui com um texto que esmiúça o conceito de raro onde a pessoa ou o paciente deve se tornar agente ativo e ouvido por qualquer interessado na temática. Esclarece que o volume de ações que vem acon-tecendo em nosso país o coloca como referência na América Latina.

Ao conhecer os textos percebi que a geração de informação é a linha estrutural que os une. A publicação desses trabalhos é uma forma de gerar informação sobre as doenças raras. E, também, um mecanismo que utilizo para cumprir a minha função parlamentar de ouvir e atender as demandas que me chegam.

Com muito orgulho entrego esse material à toda sociedade brasi-leira que, até onde fui informado, é o primeiro a possuir o olhar especí-fico sobre o envolvimento social e as doenças raras em nosso país. Que ele seja a inspiração de muitas outras ações que virão pela frente que, com certeza, estarei disposto a defender e apoiar.

ROMÁRIODeputado Federal

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o RaRo eM uM Dia De conscientização MunDial

RoGéRio liMa BaRBosaMestrando em sociologia pela Universidade de Coimbra

Diretor Presidente da Associação [email protected]

O Dia das Doenças Raras (DDR), celebrado no último dia de feve-reiro, é uma iniciativa da Eurordis1 que desde 2008 promove uma ação de sensibilização nos mais variados países. Em sua primeira edição aconteceu em 18 países. Cinco anos após o seu início, em 2013, sob o tema “Doenças Raras sem Fronteiras”, o DDR chega em mais de 70 paí-ses e em todos os continentes. Seguramente, um crescimento de 394% somente pode acontecer nas mais variadas formas porque existe uma necessidade comum e, principalmente, um problema a ser resolvido por toda a sociedade.

O tema do DDR para 2013 leva à comunidade a importância do trabalho e atuação em rede para o atendimento a pessoa com alguma doença rara. Os seus organizadores consideram que por se tratar de poucas pessoas (em números relativos) e, principalmente, por haver pouco tratamento disponível, somente pelo esforço conjunto e inte-grado pode ser possível atender os pacientes e suas famílias2.

1 Europe Rare Disease, www.eurordis.org, associação de pacientes que atua no desen-volvimento de políticas públicas para Europa e realiza diversos estudos para conhecer as comunidades que convivem com alguma doença rara. Atualmente, se posiciona como uma fonte de dados estatísticos sobre esse tema, sendo reconhecida por associações de pacientes, pesquisadores e agentes públicos.

2 A Eurordis mantém um espaço contínuo na internet para divulgar o DDR. As in-formações sobre os temas, slogans, fotos, vídeos de sensibilização e todo material de divulgação podem ser encontrados em http://www.rarediseaseday.org/

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As ações promovidas pelo evento possuem grande foco na sensibili-zação e comunicação de uma realidade que, ainda como base os estudos da Eurordis, atinge de 6% a 8% de toda população. Trazendo as estatís-ticas para nossa realidade e considerando o censo de 2010 são 13 a 16 milhões de famílias brasileiras que sofrem com as restrições impostas pelas doenças raras.

Em busca de uma identidade visual comum, o DDR possui uma figura característica criada pela superposição de três mãos onde, no meio, percebe-se a figura de uma pessoa ou criança3. Desta maneira, a Eurordis incentiva a criação de banners, camisas, braceletes, bottons e todo o tipo de material de divulgação com essa figura. Importante res-saltar que não há qualquer forma de incentivo financeiro, por parte da Eurordis, para realização do evento.

Com o propósito de criar uma identidade específica para o DDR e considerando outras ações que a associação promove, como a proposi-ção de políticas públicas, realização de pesquisas, formação de parcerias e criação de redes de apoio, recorrendo a Boltanski quando aborda a cité de projetos4, a Eurordis atua como um mediador tanto na formação das redes como, também, no incentivo para que outras organizações se tornem mediadores em sua própria região.

“Esta cité apoia-se na atividade do mediador que lança as mãos na formação das redes, de maneira a dotar-lhe de um valor próprio, inde-pendente dos objetivos procurados e das propriedades fundamentais das entidades entre as quais a mediação se realiza. Nesta perspectiva, a media-ção é um valor em si mesmo, ou melhor uma grandeza específica da qual qualquer ator se pode fazer valer quando põe em relação, estabelece laços e contribui por seu intermédio para tecer redes.” (Boltanski, n.d.)

3 Considerando que 80% das doenças raras são de causa genética, há uma grande in-fluência da biotecnologia sobre esse ambiente. A criação da identidade promovida pela Eurordis somado, principalmente, a influência da biotecnologia faz com que, conforme abordado pelo prof. Dr. Arriscado Nunes, se crie “novas formas de divisão e classifi-cação social ou, mais precisamente, biosocial, em função da pertença a certos grupos caracterizados pelos seus perfis genéticos.”

4 O termo cité por projetos é uma analogia com a literatura dos anos 90 relacionado as organizações por projetos. Por analogia o autor conclui que existe uma organização geral da sociedade por projetos.

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Posta a grande influência da Eurordis na realização do DDR, sua articulação com as associações e interessados nos mais diferentes países e o incentivo para formação dos agentes mediadores locais, podendo até ser de maneira involuntária, voltamos o foco de nossa atenção para os acontecimentos em nosso país.

No Brasil, de acordo com o blog Deficiente Alerta5, a primeira ação relacionada ao DDR aconteceu em São Paulo, em 2010, por meio do evento 1º Caminhada de apoio aos pacientes com doenças raras. Con-forme as informações do blog a organização dessa atividade ficou ao cargo da Fundação GEISER, Grupo de Estudos de Doenças Raras , Ins-tituto Canguru, Aliança Brasileira de Genética e FOPPESP –Com apoio de Secretaria Municipal da Pessoa com Deficiência e Mobilidade Redu-zida e Subprefeitura Santana Tucuruvi.

A partir do final de 2010, em Brasília, inicia a execução de uma série de atividades realizadas pela Associação AMAVI, de atenção aos fami-liares e pacientes com doenças raras, que busca atingir a sociedade nos mesmos moldes da Eurordis.

Em 2011, como primeiro evento dessa associação, aconteceu no Clube da Associação dos Servidores do Banco Central, sob o slogan Porque Raro é ser IGUAL!!! - Nossa Ação Afirmativa!, o 1º Dia das Doenças Raras que contou com a participação de 300 pessoas dentre parlamentares, pesquisadores, pacientes e familiares de pessoas com alguma doença rara. Deste evento, foi formada a primeira diretoria da AMAVI com pessoas que tinham em comum apenas a convivência com a realidade das doenças raras por meio de um familiar, filho, pai ou a própria pessoa. A história de criação da AMAVI não faz parte do escopo desse trabalho sendo assunto de outro texto6. Aqui serão abordadas, não de maneira profunda, as questões no contexto do DDR, articulado

5 A primeira informação sobre realização do evento consta desse blog. O blog possui uma postagem que sinaliza ser o release do Dia das Doenças Raras. http://deficientealer-ta.blogspot.com.br/2010/02/primeira-caminhada-de-apoio-ao-paciente.html

6 As motivações que me levaram a criar a AMAVI, as ações realizadas para mobiliza-ção e análise das redes criadas a partir de sua criação podem ser encontradas no artigo Uma análise sobre a teoria das redes – O caso da AMAVI, publicado pela Universidade de Coimbra, na séria Oficina do CES sob o n. 386, em julho de 2012.

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e promovido pela associação, uma vez que reforçaram o processo de mudança no Brasil que, antes de 2012, era realizado de maneira local.

Em 2012 e 2013, com o apoio do Deputado Romário Farias e arti-culado pela AMAVI, o DDR aconteceu dentro do Congresso Nacional, no Auditório Nereu Ramos da Câmara dos Deputados, considerado o maior auditório do local, com aproximadamente 300 lugares. Esse evento foi motivador para o início de uma visão realmente efetiva para realidade das doenças raras em nosso país.

Pessoalmente esse tema é de extrema importância porque fui envol-vido por uma questão familiar e sou um dos fundadores da Associação AMAVI. O diagnóstico de Neurofibromatose mudou todo o meu enten-dimento sobre a vida e a associação foi a forma encontrada por mim, e por outros que passam pela mesma situação, de demonstrar à sociedade a realidade de exclusão que invade a nossa vida e que muitos ainda acre-ditam que nunca acontecerá em casa.

Devido a grande influência da maneira de pesquisar do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, esse texto tem o objetivo de divulgar a ação ainda quando faz sentido no contexto histórico que se encontra. Desta maneira se enquadra dentro da perspectiva do inves-tigador militante7.

O evento realizado em 2012, sob o tema um Dia Raro, aconteceu sob o apoio de muitos parlamentares e contou com a participação de, aproximadamente, 600 pessoas circulantes. Nesse evento, as Associa-ções de Pacientes com doenças raras organizaram um Manifesto8 que foi entregue nas mãos do Ministro da Saúde (MS), Sr. Dr. Alexandre Padilha. Dentre as diversas solicitações do Manifesto, houve um grande enfoque para geração de informação uma vez que definições básicas,

7 O investigador militante, conforme o prof. Dr. Boaventura Souza Santos em palestra proferida no III Colóquio dos Doutorandos do CES, em novembro de 2012, na Uni-versidade de Coimbra, deve atentar para não fazer da divulgação da prática social uma publicação de “jornal velho” uma vez que corre o risco de perder o seu potencial de apoiar os movimentos sociais com saberes relativos a realidade que se encontram dentro do espaço histórico que favoreça a mudança requerida pela sociedade.

8 O manifesto bem como o relatório de atividades do evento pode ser encontrado no site da AMAVI, www.amavi.org, ou encaminhado por email, [email protected]

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como o entendimento pelo MS sobre a identificação de doenças raras, não existia. Também foram listados os principais problemas que aco-metem as pessoas que convivem com alguma doença rara e, por isso, faz possível a convergência do diálogo entre as diversas associações de pacientes:

Falta de um diagnóstico preciso: É comum que as pessoas com suspeitas de alguma doença rara percorra longos caminhos em toda a rede de atendimento até conseguirem um diagnóstico conclusivo de sua condição;

Falta de tratamento: Devido à característica de acometer uma pequena parcela, em números relativos, muitas doenças não possuem o tratamento específico e tampouco a medicação. A discussão sobre a medicação será melhor abordada mais adiante;

Falta de informação: A informação não existe tanto para o profis-sional de saúde, que não consegue identificar as doenças e quando o faz tem grandes dificuldades de saber para onde encaminhar o paciente, quanto para o próprio paciente que não sabe onde encontrar os especia-listas para o acompanhar.

De acordo com pesquisa mantida pela AMAVI, em sua página ini-cial, 58% das pessoas que responderam a enquete: Em sua opinião, qual a situação que possui o maior impacto negativo para quem convive com alguma doença rara: A falta de informação ou a falta de tratamento?, até julho de 2013, indicaram que a primeira opção é o maior problema.

Informação precisa e acessível é um princípio básico de comunica-ção. A sua falta gera uma angústia que, no campo da saúde, gera uma pergunta individual que, muitas vezes, não há resposta: O que está acontecendo comigo ou com a pessoa que eu amo?

Em específico as doenças raras, o paciente e seus familiares, acabam assumindo a tarefa de conseguirem, sozinhos, as respostas das questões que lhes assolam. Um dado exemplar dessa tarefa pode ser observado na pesquisa realizada por Schneiders, em 2011, em uma das declarações de seus entrevistados: Assim que eu soube que meu filho tinha Neuro-fibromatose eu comecei a pesquisar e descobri que pouca gente sabia da doença e hoje em dia eu consigo saber mais do que alguns médicos.

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O paciente especialista, como abordado, dentre outros, por Made-laine Akrich, João Arriscado Nunes, Florence Paterson e Vololona Rabehariosa, faz parte da nova configuração que as associações de pacientes de doenças raras se apresentam. Esses pacientes assumem não só a responsabilidade de entender a doença e toda a nova realidade que se apresenta a sua frente como, também, iniciam o trabalho de movi-mentação social para criar políticas públicas que, efetivamente, modi-fiquem a estrutura equivocada, quando não ausente, que se encontra disponível para eles.

Atualmente existe o pensamento fincado no entendimento que a doença é sinônimo de falta de saúde e que o remédio é a sua única solu-ção. Longe de adentrarmos nos acalorados debates sobre o que é saúde, por agora, direcionamos o nosso entendimento somente para a conclu-são que o modelo atual, do ambiente de doenças raras, é centrado na medicação.

Contudo, o evento realizado em 2012 trouxe a necessidade de mudar essa percepção. Somente uma pequena parte das mais de 6 mil doenças raras – por volta de 3% a 8% - possuem algum tipo de medicação. Isso faz com que mais de 90% das outras doenças, muitas vezes menos raras que as que possuem medicação específica, deixem os seus pacientes mais distantes de um tratamento eficaz. Se de um lado as indústrias far-macêuticas primam pelo modelo econômico da garantia do lucro, com o discurso que o baixo número de potenciais vendas não justifica os custos envolvidos para o desenvolvimento das medicações, por outro, esse argumento naufraga quando percebe-se um grande esforço para o desenvolvimento das medições para as chamadas doenças ultra-raras. No mesmo sentido e com argumentos diferentes, o governo insiste em não desenvolver pesquisas que possam conhecer a realidade das pes-soas que convivem com alguma doença rara e, portanto, não consegue gerar dados e ferramentas suficientes que possam justificar o desenvol-vimento da medicação, quando necessária, e desenvolver políticas de atendimento para essa população.

Como o discurso, até dentro da academia, possui um grande viés mercantil, é importante haver uma mudança do modelo da medicação, onde o paciente é apenas um ponto dentro de tantos interesses, para o

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da qualidade de vida onde toda e qualquer ação para essa comunidade tem origem nas demandas do paciente e os resultados são direcionados para melhoria de sua qualidade de vida sob o forte envolvimento das associações de pacientes.

Ainda não é possível encontrar publicações robustas que envolvam as doenças raras no olhar social. Por isso, o modelo acima não tem mais que a intenção de ser apenas um ponto de partida na discussão sobre o que, hoje, sinaliza existir.

O resultado concreto do evento de 2012 foi a formalização, pelo Ministro da Saúde, de criar um Grupo de Trabalho dedicado as doenças raras.

Em 2013, o dia das doenças raras começa a delinear os contornos de controle social. Além de aumentar significativamente a quantidade de pessoas e ações envolvidas, o evento conseguiu mobilizar vários estra-tos da população e de diferentes locais de atuação. A participação de um maior número de palestrantes fora da área da saúde e o início da parce-ria da AMAVI com o Departamento de Saúde Coletiva e o da Cátedra UNESCO de Bioética da Universidade de Brasília, começam a levar a discussão para o campo social e não mais centrado na medicação, saúde e poder médico.

A ausência do Ministro da Saúde ou melhor, a sua participação por meio de representação, foi sentida por todos os presentes e fez com que o evento se tornasse, essencialmente, de cobrança.

Tanto os parlamentares quanto os representantes de associações, pacientes e comunidade em geral, lembraram ao Mistério da Saúde que, após um ano do compromisso assumido pelo Ministro Padilha, a reali-dade de atendimento aos pacientes não havia mudado e a portaria pro-

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metida para ser criada pelo grupo de trabalho ainda não estava publi-cada e, muito menos, disponível para consulta pública.

O evento de 2013 reforça o entendimento social sobre o tema e impulsiona o Brasil para um novo patamar de discussão sobre as doen-ças raras. Tanto que no Congresso Mundial para discussão sobre medi-camentos órfãos9, realizado nos EUA, houve a participação do Presi-dente do Conselho Federal de Medicina e dos parlamentares Senador Eduardo Suplicy e Jean Wyllys. Ainda, em março de 2013, a Interfarma, Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa, realiza o seminário: “Doenças Raras: a situação brasileira no contexto global e a necessidade de implantação de uma política nacional”. E, no mês seguinte, publica o documento Doenças Raras: Contribuições para uma política nacional10.

Outra alteração no cenário, inclusive das associações de pacientes, foi o perceptível aumento do volume de empresas e até associações de outros países em procurar as associações de pacientes brasileiras.

O grande volume de atividades no ambiente das doenças raras demonstra o aumento crescente do tema e de sua importância para comunidade. Ainda em 2013 como um dos resultados do DDR, a AMAVI realiza em Brasília, o I Congresso Iberoamericano de Doenças Raras que visa inserir o Brasil, definitivamente, como protagonista no campo das doenças raras e promover a mudança de percepção sobre as associações de pacientes: de carentes de atenção e cuidados para asso-ciações fortes e verdadeiras conhecedoras de sua realidade. É, no que diz o prof. Boaventura, respeitar a ecologia dos saberes.

Ainda previsto para outubro de 2013, o Ministério da Saúde vai publicar a portaria de atendimento aos pacientes de doenças raras.11

9 O congresso é voltado para o desenvolvimento de pesquisas e medicação. A propos-ta de participação brasileira era baseada em como poderia haver uma interação entre o governo e a indústria para criar um ato dos medicamentos órfãos, como no modelo estadunidense. O link para essas informações é http://www.terrapinn.com/conference/world-orphan-drug-congress-usa/index.stm

10 Informações disponíveis em http://www.interfarma.org.br/

11 A portaria foi em consulta pública no dia 11-4-2013 sob o número de consulta pública n. 7 e a reunião do Grupo de Trabalho para analisar as contribuições ocorreu no final do semestre.

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As ondas produzidas pelos dois eventos que aconteceram no Con-gresso Nacional ainda são sentidas e estão em formação. O fato é que seguimos para uma nova realidade de atuação e ação, onde os atores presentes no campo das doenças raras devem, como levantado por Mouffe e citado por Martins, reconhecer o opositor não mais como um inimigo mas como um adversário cuja existência é legítima.

O ano de 2014,diante de tanta ação em 2013, será de grande novi-dade para quem convive com as doenças raras, inclusive, para avaliar a implantação da portaria que está em elaboração no Ministério da Saúde. As associações, pacientes, familiares e todas as pessoas envolvidas com essa temática estarão realizando as ações necessárias para uma constru-ção efetiva e de real atendimento, porque como abordado por diversos autores, a longo prazo, as ações do governo acabam se alinhando com os interesse do próprio mercado.

O presente texto não foge da pretensão informada anteriormente de apenas contribuir para um olhar mais profundo e que promova o conhecimento de uma realidade que apesar de envolver 6% a 8% da população, contribuiu, não de maneira exclusiva, para o aumento do gasto federal com processos judiciais, entre 2007 e 2011, em mais de 1200%. Chegando a R$ 339,7 milhões de reais até outubro de 201212. E mesmo assim, continua a receber menos atenção e recursos que doen-ças que atingem até 700 mil brasileiros13, como é o caso do programa da Aids.

Logicamente, não é intenção promover a área que milito em detri-mento de outra. O dado somente é relevante se percebermos a importân-cia de se criar um programa que, como o da AIDS, comece a conhecer e entender a sua própria realidade para, quem sabe, chegar nos mesmos patamares de qualidade de atendimento e geração de informação que esse programa fornece para a sociedade.

12 http://portalsaude.saude.gov.br/portalsaude/noticia/8579/671/noticia-da-folha-de--s.-paulo-destaca-gasto-recorde-com-acoes-judiciais..html

13 De 1980 a 2012 foram registrados 656.701 casos registrados de AIDS. http://www.aids.gov.br/pagina/aids-no-brasil

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RefeRÊncias

BALANCO, P. e PINTO, E. C. Dimensões do capitalismo contemporâneo: alguns aspectos do debate acerca do Estado-nação e do “novo imperialismo”. XXXIII Encontro Nacional de Economia. 2005

BOLTANSKI, L. (n.d.). A moral da rede? críticas e justificações nas recentes evolvuções do capitalismo.pdf. Fórum Sociológico. Forum Sociológico, n.o 5/6 (2o Série).

MARTINS, P. H. O dom como fundamento de uma cultura democrática e associativa. In: PORTUGAL, Sílvia; MARTINS, Paulo Henrique (Eds.). Cida-dania, políticas públicas e redes sociais. Coimbra, Portugal: Imprensa da Uni-versidade de Coimbra, 2011. p. 13-28

NUNES, J. A., Matias M. e Filipe, A. M. As organizações de pacientes como atores emergentes no espaço da saúde: o caso de Portugal. Reciis. 2007. p. 107-110

NUNES, J. A. “A pesquisa em saúde nas ciências sociais e humanas: tendên-cias contemporâneas”, Oficina do CES, 253. 2006.

RABEHARISOA, V., Callon, M. Nunes, J. A. et al. The dynamics of causes and conditions : the rareness of diseases in French and Portuguese patients ’ orga-nizations ’ engagement in research. Centre de Sociologie de L’innovation. May, 2012.

SANTOS, B. S. É a Saúde. Estúpido!. Revista Visão. 14 de fevereiro de 2008.

SCHNEIDERS, J. (2011). Percepção dos pais sobre o filho portador de Neu-rofibromatose. Universidade Feevale.

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Questões Bioéticas soBRe Doenças Genéticas RaRas

prof. Dr. natan MonsoresDepartamento de Saúde Coletiva

Cátedra UNESCO de BioéticaUniversidade de Brasília

[email protected]

Como um campo agregador de reflexões sobre o impacto da biotec-nociência nos modos de vida, a bioética é um bom lugar de partida para se discutir questões relacionadas às doenças raras. Os temas da determi-nação e da manipulação genéticas têm sido amplamente debatidos por bioeticistas, tendo resultado em reflexões que podem lançar um pouco de luz à discussão dos direitos à saúde e aos dilemas do descobrir-se portador de uma doença genética rara. Em linhas gerais, a bioética pode ser compreendida como:

(...) um espaço de encontro, mais ou menos conflituoso, de ideologias, morais, religiões e filosofias, e de desafios para uma multidão de grupos de interesse e de poderes consti-tutivos da sociedade civil: associações de pacientes, corpo médico, defensores dos animais, associações paramédicas, agronegócios, indústria farmacêutica e de tecnologias médi-cas em geral, bioindústria em geral (1).

Essa definição de Hottois é concreta neste seminário, pois temos aqui pessoas com doenças raras, seus familiares, profissionais de saúde, políticos, juristas, representantes da indústria e mídia. Apesar da varie-dade de interesses e de perspectivas aqui reunidos, gostaria de ater-me ao elemento central de todo esse processo que, pelo cálculo atuarial de riscos e de impactos orçamentários ou pela litigiosidade em busca de garantias constitucionais de tratamento e acesso à saúde, tem saído do foco destas discussões – utilitaristas - de custos e benefícios: as pessoas.

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As pessoas com doenças raras precisam ser garantidas, pelo Estado Brasileiro, a igualdade de oportunidades, sem avaliações equivocadas de merecimento ou de responsabilidade pessoal, já que são vulneradas por eventos genéticos, aleatórios ou herdados, que originam uma per-versa equação de exclusão social, independente da classe social ou de local de nascimento: (a) se tornam invisíveis às outras pessoas, já que a deficiência resultante da doença é sobredeterminante ao seu status de pessoa ou indivíduo; (b) se tornam intocáveis, já que o estigma que portam, isto é, as mudanças em seus corpos, causam estranheza, pavor ou repulsa naqueles que fortuitamente atravessam seus caminhos; (c) são rotulados como incapazes por precisarem de tecnologias assistivas, por terem convalescença súbita ou longa e por terem limitações ao que é convencionado de “vida comum”. A resultante desta equação é uma incerteza social, sanitária e psicológica, já que são segregados em múlti-plos aspectos. Isto significa que direitos humanos são violados ou relati-vizados para estas pessoas que, depois de percorrerem longos itinerários diagnósticos e terapêuticos, começam a encarar a doença como destino, já que não podem contar com os aparelhos sociais de proteção.

Parte da segregação ou invisibilidade, principalmente para o Estado Brasileiro, tem sua origem no paradoxo nosológico que são as doen-ças raras: elas têm baixa prevalência na população, isto é, atingem gru-pos familiares e minoritários, que no dimensionamento utilitarista das ações de bem-estar social (maior bem para o maior número possível de pessoas) ficam alijados de seus direitos. Por isso é importante frisar que, apesar de cada doença ter poucos casos na população, em conjunto constituem um grupo de mais de 5000 diferentes síndromes, em sua maioria de etiologia genética, que afetam um contingente populacional estimado em 6-8% na Europa e Estados Unidos (2-4), mas não há dados que confirmem esta prevalência no Brasil, salvo estudos pontuais sobre patologias específicas (5).

Esta última informação aponta uma fragilidade para a estruturação de qualquer política pública para doenças raras no Brasil: falta infor-mação epidemiológica qualificada, pois boa parte do conhecimento sobre estas doenças surge da congregação de relatos de caso, sem veri-ficação ampla, junto aos serviços médicos e sociedades científicas de

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especialidades, da frequência de ocorrência na população em geral. Para isso seria necessário um esforço coordenado, baseado na notificação e registro de casos, ou mesmo em um censo nacional inclusivo, o que demandaria um arranjo de ações entre o Governo Federal e os demais governos.

Para que a informação seja gerada, é necessário preparo técnico e científico (além de infraestrutura adequada) das equipes de saúde res-ponsáveis pelo reconhecimento inicial destas síndromes, geralmente crônicas e degenerativas (6). Um fator complicador é que, em função de sua origem genética ou cromossômica, uma mesma condição pode ter variadas manifestações clínicas (pleiotropia), configurando uma diversidade de subtipos que afetam, de forma diferenciada, capacidades físicas, habilidades mentais, comportamentos e percepção sensorial de seus portadores. Há situações em que muitas desabilidades e deficiên-cias coexistem em um só indivíduo (polyhandicap), o que leva a varia-ções em termos de gravidade e expectativa de vida que, na maioria dos casos, é reduzida (3, 7).

O impacto destas desordens sobre a qualidade de vida de seus por-tadores varia muito. Entre erros inatos de metabolismo até as doenças que afetam sistema motor ou mesmo aquelas desfigurantes e deforman-tes, os efeitos pleiotrópicos geralmente implicam em risco de vida ou em doenças degenerativas crônicas (8). Em algumas circunstâncias estas doenças podem ser desencadeadas por multifatores: infecções bacteria-nas ou virais, alergias ou exposição a produtos químicos ou radiações, mas na maioria dos casos as doenças são congênitas ou herdadas e afe-tam, predominantemente, crianças nos primeiros anos da infância.

Deve-se destacar também a grande carga psicossocial a que são sub-metidos cuidadores e familiares, que seguem de perto o desespero psi-cológico e falta de esperança terapêutica, bem como a escassez de estra-tégias inclusivas por parte do Estado ou de governos (3). Um percentual considerável de doenças raras acomete sistema nervoso e locomotor, criando um alto nível de dependência aos cuidadores, que sofrem com estresse e coping (9).

Apesar dos avanços na compreensão de mecanismos genéticos e gatilhos, menos de 10% dos doentes podem contar com medicamen-

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tos ou tratamentos específicos, tendo somente o aporte multidisciplinar paliativo. A escassez de pesquisa e de terapêutica se deve a heterogenei-dade de fisiopatologias, a história natural mal compreendida das doen-ças, a variação na progressão das doenças, pela baixa disponibilidade de voluntários para realização de ensaios clínicos, assim como pela falta de marcadores patognomônicos e indicadores epidemiológicos (8).

Terapias avançadas, tais como os tratamentos com células-tronco (10), os medicamentos biológicos e as terapias gênicas (11) têm sido tentados para estes pacientes, no entanto o progresso das pesquisas se dá em passos lentos e arriscados, não atendendo às curtas expectativas de vida destes indivíduos. O resultado deste quadro é que as pessoas com doenças raras e seus familiares, pela escassez de recursos médi-cos, acabam tornando-se especialistas em sua própria condição (12), gerando informações novas que são compartilhadas em comunidades de internet, blogs e até em congressos da área biomédica (13).

Iniciativas internacionais, como a EURODIS (3), têm identificado problemas recorrentes. Resumidamente, pode-se apontar:

(a) A falta de acesso a diagnóstico correto, com longos itinerários diagnósticos, muitas vezes equivocados e imprecisos;

(b) A falta de informação sobre a doença e sobre onde obter ajuda de profissionais de saúde;

(c) A falta de conhecimento científico com escassez de estratégias diagnósticas e terapêuticas;

(d) A falta de cuidados multiprofissionais de saúde após o diagnós-tico inicial;

(e) As consequências sociais das manifestações das doenças, já que muitos destes pacientes são pessoas com necessidades especiais, o que gera estigmatização, isolamento, exclusão e discrimina-ção, bem como redução das oportunidades profissionais;

(f) O alto custo dos poucos medicamentos disponíveis e o custo do cuidado continuado que, combinado com a falta de benefícios sociais e reembolso, causam a pauperização das famílias.

No Brasil este panorama é agravado pelo fenômeno de judicializa-ção da saúde (14, 15) em prol de uso compassivo de drogas ainda não aprovadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (16), levando a

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um intensivo assédio de multinacionais farmacêuticas às associações de pacientes e profissionais de saúde que lidam com este grupo de doenças, uma vez que os medicamentos são de alto custo. Outra variável nesta complexa equação é o turismo de saúde. Diversos pacientes e familiares têm buscado no exterior tratamento para suas doenças, alguns destes duvidosos e sem bases científicas (17). A consequência disso são even-tos iatrogênicos que fragilizam ainda mais os pacientes e oneram o Sis-tema Único de Saúde (SUS), que arca com o processo de recuperação dos indivíduos após estas incursões terapêuticas.

Em função destas situações, é fundamental que se estabeleçam nor-mas claras ou um código de ética que balize as relações entre as asso-ciações de pacientes, os centros de pesquisa e a indústria farmacêutica. Faz-se necessário também um sistema transparente de recrutamento para ensaios clínicos, além de esclarecimento à população sobre o que é tratamento e o que é pesquisa clínica, pois a confusão entre ambos fra-giliza a capacidade das pessoas de tomarem decisões autônomas, livres e esclarecidas sobre os procedimentos a que se submetem. O Estado bra-sileiro não pode permitir que uma parcela vulnerável de sua população seja alvo de oportunismos, como a venda de curas e tratamentos fictí-cios ou o aliciamento para tratamentos compassivos sem planejamento adequado, que podem acelerar a falência orgânica destas pessoas.

Hoje, os avanços para acompanhamento e tratamento de doenças raras no SUS vinculam-se, precariamente, à Política Nacional de Saúde da Pessoa com Deficiência, cujo foco é a reabilitação e a acessibilidade. As dificuldades da sociedade brasileira em dar equânime oportunidade de acesso às pessoas com necessidades especiais são de amplo conhe-cimento, restando ações estatais pontuais como o estabelecimento de cotas, por exemplo. Um estado que têm como marco a igualdade de direitos e o bem-star social, deve estender suas ações para políticas de equidade mais amplas.

Há outra iniciativa importante para as famílias com doenças raras, que se deu em 2001, com o estabelecimento do Programa Nacional de Triagem Neonatal (PNTN) que, através do “teste do pezinho”, identifica precocemente algumas doenças raras e permite, quando há celeridade

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no processo, o estabelecimento de ações precoces de cuidados para estas crianças.

Mais recentemente, em 2009, o Ministério da Saúde (MS) emitiu a Portaria 81, estabelecendo a Política Nacional de Atenção Integral em Genética Clínica, cuja meta é organizar a rede de serviços para realizar ações de promoção, prevenção, diagnóstico, aconselhamento e terapêu-tica para os casos identificados. Atualmente, há um grupo de traba-lho, estabelecido pelo MS, para elaborar normas de atenção e diretrizes para o atendimento de doenças raras no Sistema Único de Saúde – SUS, algo que torcemos para que se concretize. Mas deve-se destacar que o diagnóstico não é o único cuidado necessário, bem como o geneticista clínico não deve ser o único profissional de saúde envolvido nos cuida-dos às pessoas com doenças raras, o que geraria um enorme gargalo no atendimento e no segmento do diagnóstico. É preciso reforçar o papel das ações multiprofissionais, com valorização das outras profissões de saúde, bem como avançar na atenção básica e em domicílio das pes-soas com doenças raras, através de programas como o Saúde na Família, além da ampla veiculação de informação sobre centros de referências e sobre o segmento da atenção nos diversos níveis de complexidade do SUS.

A questão da informação é perene em todas as discussões sobre doenças raras: as pessoas com doenças raras precisam saber onde podem buscar ajuda, precisam saber quem são os profissionais que podem auxi-liá-las, sem que tenham o receio de ter sua saúde mais prejudicada por tratamentos errados ou por diagnóstico equivocados, precisam saber se têm direito a medicamento e tecnologias assistiva, se podem se aposen-tar ou receber benefício previdenciário por sua condição. Neste sentido, a Universidade de Brasília, pelo estabelecimento de um Observatório de Doenças Raras pretende contribuir com o que lhe cabe neste processo: a produção de informação técnico-científica para dar suporte à cons-trução de políticas e para redução das iniquidades para esta parcela da população brasileira. Enquanto Cátedra de Bioética e Núcleo de Saúde Pública, estendemos nosso apoio às associações de pacientes, por com-preendermos que as pessoas com síndromes raras não podem ter seu corpo ou sua vida transformado em espaços de disputas por interesses

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escusos a sua autonomia e bem-estar, tendo na mira a concepção de que nossa missão é cuidar das pessoas e não somente das doenças.

RefeRÊncias

1.Hottois G. Bioétique. In: Hottois G, Missa JN, editors. Nouvelle encyclo-pédie de bioéthique. Bruxelas: De Boeck; 2001. p. 125-6.

2.Wästfelt M, Fadeel B, Henter JI. A journey of hope: lessons learned from studies on rare diseases and orphan drugs. Journal of internal medicine. 2006;260(1):1-10.

3.EURORDIS. Rare Diseases: understanding this Public Health Priority. European Organisation for Rare Diseases; 2005 [cited 2013 06-maio]; Available from: http://www.eurordis.org/IMG/pdf/princeps_document-EN.pdf.

4.Denis A, Mergaert L, Fostier C, Cleemput I, Simoens S. A comparative study of European rare disease and orphan drug markets. Health policy (Amster-dam, Netherlands). 2010;97(2-3):173-9.

5.DIETRICH-NETO F, CALLEGARO D, DIAS-TOSTA E, SILVA HA, FERRAZ ME, LIMA JMBD, et al. Amyotrophic lateral sclerosis in Brazil: 1998 national survey. Arquivos de Neuro-Psiquiatria. 2000;58:607-15.

6.Maiella S, Rath A, Angin C, Mousson F, Kremp O. Orphanet and its con-sortium: where to find expert-validated information on rare diseases. Revue neu-rologique. 2013;169 Suppl 1:8.

7.Knight A, Senior T. The common problem of rare disease in general prac-tice. The Medical journal of Australia. 2006;185(2):82-3.

8.Melnikova I. Rare diseases and orphan drugs. Nat Rev Drug Discov. 2012;11(4):267-8.

9.Neves ET, Cabral IE. Empoderamento da mulher cuidadora de crian-ças com necessidades especiais de saúde. Texto & Contexto - Enfermagem. 2008;17:552-60.

10.Li S, Yin H, Loudon W, Weiss J. Cultivating stem cells for treating amyo-trophic lateral sclerosis. World journal of stem cells. 2012;4(12):117-9.

11.Wirth T, Ylä-Herttuala S. History of gene therapy. Gene. 2013.

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12.Kent A, Oosterwijk C. A patient and family perspective on gene therapy for rare diseases. The journal of gene medicine. 2007;9(10):922-3.

13.Aymé S, Kole A, Groft S. Empowerment of patients: lessons from the rare diseases community. Lancet. 2008;371(9629):2048-51.

14.Sartori Junior D, Leivas PGC, Souza MVd, Krug BC, Balbinotto G, Schwartz IVD. Judicialização do acesso ao tratamento de doenças genéticas raras: a doença de Fabry no Rio Grande do Sul. Ciência & Saúde Coletiva. 2012;17:2717-28.

15.Boy R, Schwartz I, Krug B, Santana-da-Silva L, Steiner C, Acosta A, et al. Ethical issues related to the access to orphan drugs in Brazil: the case of muco-polysaccharidosis type I. J Med Ethics. 2011;37(4):233-9.

16.Goldim JR. O uso de drogas ainda experimentais em assistência: extensão de pesquisa, uso compassivo e acesso expandido. Revista Panamericana de Salud Pública. 2008;23:198-206.

17.Master Z, Resnik D. Stem-cell tourism and scientific responsibility. Stem-cell researchers are in a unique position to curb the problem of stem-cell tourism. Embo Rep. 2011;12(10):992-5.

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paRa uM coMeço De Reflexão soBRe o cuiDaDo Das Doenças RaRas

sílvia portugalFaculdade de Economia e Centro de Estudos Sociais

Universidade de [email protected]

Quando recebi o convite do Rogério Lima para escrever este texto e li as notas taquigráficas do Seminário do Dia Mundial das Doenças Raras, celebrado na Câmara dos Deputados, não pude deixar de pensar que era um raro privilégio estar associada a este evento. Uma oportu-nidade para estabelecer pontes entre os dois lados do Atlântico, num domínio no qual elas não são comuns. A palavra “raro” impôs-se facil-mente como mote. Como tal, retomando um hábito em desuso, consul-tei um dicionário para verificar os significados da palavra, em busca de inspiração – o monumental Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Na página 3088 da edição portuguesa do Círculo de Leitores encontrei o que pretendia. Este texto segue as definições aí encontradas.

1. que não é comum; que poucas vezes se encontra

A existência de políticas públicas para as Doenças Raras não é comum, se olharmos para o panorama mundial. Na Europa, a França é uma excepção, na América Latina, o Brasil torna-se agora uma refe-rência. Poucas vezes se encontra uma atenção específica do Estado para este domínio e essa ausência é tanto mais problemática quanto é conhe-cida a gravidade dos problemas que enfrentam as pessoas com doenças raras e as suas famílias. A urgência da intervenção pública nesta matéria é enorme e a capacidade que o Estado brasileiro demonstra em lhe dar resposta é de louvar e de seguir com atenção, analisando os caminhos percorridos e os resultados obtidos.

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O universo das doenças raras é plural e complexo e, como tal, repre-senta um enorme desafio para a definição de políticas estatais e o aten-dimento público a esta população. A particularidade de cada caso não pode obscurecer a universalidade dos direitos. A implementação das políticas tem que atender à especificidade e singularidade das doenças raras e dos seus portadores, assumindo a difícil tarefa de uma contínua (re)configuração dos serviços e dos profissionais em função da integra-lidade do cuidado e das necessidades da pessoa e da sua família.

2. que ocorre de forma infrequente (doença rara)

A doença rara surge como primeiro exemplo do significado de “raro”. Ela é definida pelo número da sua ocorrência, pelo significado estatístico da sua incidência na população. A doença rara ocorre de forma infrequente. Foge, portanto, à norma. É o impacto do significado médico e social de estar fora da norma que marca a vida das pessoas com doenças raras e das suas famílias. Estar fora da norma implica que os diagnósticos tardam, os exames, as consultas e as opiniões se multi-plicam, as respostas não são adequadas, as necessidades não são aten-didas, a urgência do cuidado contrasta com o tempo longo da espera. Estar fora da norma revela-se no corpo, implica olhares furtivos, con-tatos evitados, oportunidades perdidas, gera estigma, cria vidas escon-didas, cotidianos que giram em volta da doença. A doença rara é infre-quente, a exclusão social que lhe está associada frequente.

3. em pequeno número

As pessoas com doenças raras são um pequeno número, um pequeno grupo, uma minoria. As minorias são facilmente ignoradas. A irrele-vância estatística é pretexto para o desinteresse e o desconhecimento: da população, dos governos, da ciência, da indústria farmacêutica. O conhecimento e a informação são cruciais para lutar contra a invisibi-lidade, para combater o estigma, para que o raro deixe de ser o outro. É preciso investigar, conhecer, investir, informar, divulgar. Conhecer as doenças: os sintomas, os diagnósticos, as pesquisas clínicas, as terapêu-ticas. Conhecer as pessoas: Quem são? Quantas são? Onde estão? Como

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lidam com a doença? Como vivem? Saber que elas são mais do que a doença.

4. de que poucos indivíduos são dotados; admirável; extraordinário

As histórias das vidas das pessoas com doenças raras, das suas famí-lias e de pessoas próximas são admiráveis pelo exemplo que oferecem de luta contra a adversidade. As suas biografias revelam trajetórias extra-ordinárias de conquista cotidiana de esperança e de vida, contra o des-conhecimento, o desinteresse, o preconceito, o desespero. À ausência de respostas e de apoios formais, à escassa garantia de direitos, ao incum-primento das obrigações societais, contrapõem-se percursos de vida assentes na solidariedade e na dádiva, que recusam a derrota. O cuidado das pessoas com doenças raras assenta essencialmente na dedicação e amor das suas famílias. Quando se reivindica apoio e assistência, muitas vezes, a primeira leitura orienta-se para a demissão das famílias. Ela não podia ser mais erronea. As famílias não querem ser substituídas no seu papel, no entanto, para poderem desempenha-lo da melhor forma, para não adoecerem conjuntamente com os seus familiares, necessitam de condições e de meios para a prestação do cuidado. É esse o desafio que as políticas públicas têm que assumir: tomar as famílias como parceiras.

5. advérbio: raramente

Raramente as pessoas com doenças raras e as suas famílias são ouvi-das. Raramente elas são consideradas sujeitos ativos e implicados. É preciso que elas se assumam/sejam assumidas como protagonistas do seu próprio destino, sujeitos de pleno direito e não objetos passivos de intervenção social e de tratamento médico.

As pessoas sabem mais sobre a sua doença do que os outros. Sentem o corpo, as dores, o sofrimento. Sabem o que está certo para elas e o que está errado. São agentes ativos do seu cuidado. Ouvem, conversam, pesquisam, fazem opções, definem estratégias, ministram medicação, desenham itinerários terapêuticos.

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As pessoas são mais do que a doença. Têm vidas para além da doença. Têm famílias, amigos, sociabilidades, prazeres, gostos e desgos-tos, crenças, confianças e desconfianças.

O desafio é escutar e dar voz: no consultório, na comunidade, no espaço público.

6. de raro em raro: uma vez ou outra

Uma vez ou outra faz-se a diferença. Um profissional interessa-se, um departamento dá seguimento, um tribunal despacha favoravel-mente, um diretor promove uma ação, uma instituição resolve o caso, uma comunidade envolve-se. No entanto, a vida das pessoas e das suas famílias não pode depender do raro da boa prática. A força das políticas públicas constroem-se no combate à discricionariedade das interven-ções. A garantia da existência da norma para quem sai dela, de iguais direitos para quem é diferente.

7. não raro: com frequência

Com frequência o desenho das políticas é excelente e a sua efeti-vidade limitada. No caso, as definições do objeto da política colocam inúmeros obstáculos à sua implementação. Construir o universal para responder ao singular é o desafio que se coloca. Pelo que ouvi na leitura destas falas só posso acreditar que se está no bom caminho.

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notas taQuiGRáficas Do Dia Das Doenças RaRas 2013

DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃONÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES

TEXTO COM REDAÇÃO FINALVersão para registro histórico

Não passível de alteração

seMináRio Dia MunDial De Doenças RaRas

EVENTO: Seminário N°: 0025/13 DATA: 27/02/2013

INÍCIO: 14h38min TÉRMINO: 18h37min DURAÇÃO: 03h59min

TEMPO DE GRAVAÇÃO: 03h59min PÁGINAS: 78 QUARTOS: 48

Depoente/conViDaDo - Qualificação

JOSÉ EDUARDO FOGOLIN PASSOS - Representante do Ministro da Saúde, Alexandre Padilha.DIRCEU BARBANO - Diretor-Presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária — Anvisa.GREYCE LOUSANA - Presidenta Executiva da Sociedade Brasileira de Profissionais em Pesquisa Clínica.NATAN MONSORES - Departamento de Saúde Coletiva da Universidade de Brasília — UnB.ROGÉRIO LIMA BARBOSA - Representante da Associação Maria Vitória — AMAV.CLAUDETE LEMOS RIBEIRO - Esposa de portador de Atrofia de Múltiplos Sistemas — AMS.ROBERTO SALES - Pai de portador de epidermólise bolhosa. CAROLINA CORDEIRO ALVARENGA - Diretora de Operações da América do Sul sobre a Síndrome de Aicardi-Goltieres. Coordenadora do Movimento Eu respeito as vagas. E você?PATRICK TEIXEIRA PIRES - Portador de Mucopolissacaridose.THIAGO FELIX MARQUES - Professor da Fundação Educacional do DF. Hemofílico grave.

suMáRio: Seminário Dia Mundial das Doenças Raras, celebrado em 29 de fevereiro, promovido pela Liderança do Partido Socialista Brasileiro na Câmara dos Deputados.

oBseRVações

Houve exibição de imagens.Houve intervenção fora do microfone. Inaudível.

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O SR. APRESENTADOR (David Rayol) - Srs. Parlamentares e autoridades presentes, especialistas da área médica, representantes de entidades ligadas às doenças raras, portadores dessas enfermidades, familiares, senhoras e senhores, boa tarde!

Inicia-se neste momento a cerimônia de abertura do Seminário Dia Mundial das Doenças Raras, celebrado em 29 de fevereiro, pro-movido pela Liderança do Partido Socialista Brasileiro na Câmara dos Deputados.

Senhoras e senhores, neste momento, abrindo os atos protocolares desta cerimônia, são convidadas a compor a Mesa as seguintes autori-dades: o Sr. Deputado Romário, idealizador deste seminário (palmas); o ator Luciano Szafir, irmão de Alexandra Szafir, portadora de esclerose lateral amiotrófica (ELA) (palmas); o Sr. José Eduardo Fogolin Passos, Coordenador-Geral de Média e Alta Complexidade do Ministério da Saúde, representando nesta oportunidade o Sr. Ministro Alexandre Padilha (palmas); o Sr. Deputado Maurício Quintella Lessa (palmas); a Sra. Deputada Mara Gabrilli (palmas); o Sr. Deputado Marçal Filho (palmas); o Sr. Senador Eduardo Suplicy (palmas); a Sra. Senadora Ana Amélia Lemos (palmas); o Sr. Senador Cássio Cunha Lima (palmas); o Sr. Deputado Distrital Joe Valle (palmas) e o Sr. Diretor-Presidente da Anvisa, Dirceu Barbano (palmas).

Senhoras e senhores, composta a Mesa de Abertura desta cerimônia, pedimos a todos que se coloquem em posição de respeito para, neste momento, ouvir o Hino Nacional.

(É executado o Hino Nacional.)O SR. APRESENTADOR (David Rayol) - Senhoras e senhores, este

seminário tem como objetivo chamar a atenção e ampliar o conheci-mento das autoridades e da sociedade para as doenças raras, que, na maioria das vezes, manifestam sintomas crônicos graves e incuráveis, sendo ainda, com frequência, degenerativas e progressivas, além de constituírem elevado risco de morte.

O Ministério da Saúde classifica como doenças raras aquelas que afetam, uma a cada 2 mil pessoas. Cerca de 80% dessas doenças têm ori-gem genética sendo que a maioria não possuí cura conhecida. Estima-se

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que de 6% a 8% da população mundial seja atingida por esse grupo de doenças.

Nós gostaríamos de informar a todos que este evento está sendo transmitido em tempo real pela internet e pela TV Câmara.

Neste momento, abrindo a sessão de pronunciamentos desta ceri-mônia de abertura, convidamos para fazer uso da palavra o Sr. Depu-tado Romário, idealizador deste seminário.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Romário) - Boa tarde, senhoras e senhores. É com muita honra que presido a Mesa deste Seminário sobre o Dia Mundial das Doenças Raras.

Antes de meu pronunciamento, gostaria de saudar as pessoas pre-sentes à Mesa: o ator e amigo Luciano Szafir — muito obrigado pela presença; o Dr. José Eduardo Fogolin Passos, representando o Minis-tério da Saúde; o Senador Eduardo Suplicy; o Senador Cássio Cunha Lima; o Deputado Maurício Quintella Lessa; a Deputada Mara Gabrilli; o Deputado Marçal Filho; a Senadora Ana Amélia; a Deputada Rosi-nha da Adefal, que acabou de chegar; o Deputado Distrital Joe Valle e o Diretor-Presidente da Anvisa, Sr. Dirceu Barbano.

Gostaria de aproveitar a oportunidade e convidar para a Mesa o Líder do Partido na Câmara, Deputado Beto Albuquerque, do PSB. (Palmas.)

Senhoras e senhores, hoje é um dia de reflexão e de conscientiza-ção o qual quero, antes de mais nada, compartilhar com os presentes a minha decepção pela ausência de uma pessoa que seria uma das mais importantes aqui: o Ministro da Saúde, Alexandre Padilha, que, infe-lizmente, não pôde estar presente. Tem o seu representante, mas, como no ano passado, acredito que a sua presença seria de suma importân-cia. E de frustração. Frustração por quê? Já enfrentei muitos desafios na minha vida e, com certeza, nunca me queixei de lutar por aquilo em que acredito. O que me cansa e me aborrece, e às vezes até me desanima, é ver que, apesar de todo o esforço meu e daqueles que lutam comigo, os avanços, em certos casos, demoram muito para acontecer.

No ano passado, nessa mesma data, realizamos na Câmara um evento memorável, podendo contar com a presença de ninguém menos

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do que a autoridade máxima da saúde pública do nosso País, o Ministro Alexandre Padilha.

O Ministro veio e falou muito bem. Ele disse que, em relação aos temas de doenças raras no Brasil, existem três questões fundamentais: a pesquisa, a informação e o atendimento. Sobre esse último item, o Ministro declarou que não basta construirmos prédios bonitos e bem equipados, mas que a alma do bom cuidado da saúde é o profissional bem qualificado e comprometido.

Porém, o aspecto que quero destacar na fala do Ministro Padilha é a importância que pareceu dar à questão da informação. Ele disse que existe um vácuo no nosso sistema de saúde em relação ao cuidado com as pessoas portadoras de doenças raras. E acrescentou que precisamos, em primeiro lugar, de dados, pois, sem os dados, é impossível se fazer política pública.

O Ministro admitiu que ainda não se sabe ao certo quantas pessoas possuem doenças raras no Brasil e, portanto, quantas famílias são atin-gidas pelo problema. Não se sabe também onde vivem e como vivem. E assumiu o compromisso de resolver essa situação.

Eu acho ótimo que o chefe da Pasta da Saúde tenha assumido esse compromisso justamente aqui, na Casa do povo. E quero acrescentar que precisamos, em primeiro lugar, saber com que definição de doença rara o governo trabalha. É difícil saber, e não adianta procurar no dicio-nário do SUS ou no site do Ministério: a informação, infelizmente, não existe.

Além disso, a sociedade precisa saber onde buscar informações e atendimento sobre essa questão. Todo pai e mãe sabem como é aflitivo não ter a quem recorrer, tenham certeza que isso é a pura verdade.

Mas o que mais eu gostaria de saber neste momento, como Depu-tado, como cidadão, é o porquê de nada efetivo ter sido realizado nos últimos anos, apesar de o Ministro Padilha ter tanta clareza sobre o que precisa ser feito. O Brasil tem o direito e o dever de saber.

Como eu disse aqui há exatamente um ano, um grande obstáculo que os portadores de doenças raras e suas famílias enfrentam é a falta de conhecimento sobre o tema, inclusive entre os médicos, o que dificulta

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bastante o diagnóstico, que, em muitos casos, acaba chegando dolorosa-mente tarde a algumas famílias.

Nesse meio tempo, enquanto dura aquilo que muitas famílias cha-mam de odisseia diagnóstica, as pessoas são vítimas de preconceitos e da desesperança, sem contar que têm que lidar com sintomas que poderiam, pelo menos, serem aliviados. E como se não bastasse, existe a dificuldade de se chegar a um diagnóstico, a um acesso ao tratamento adequado.

Infelizmente, essa é a realidade que vivemos hoje em nosso País. Falta pesquisa, mas não é pesquisa sobre medicamentos o principal problema, falta um trabalho social para identificar quantas são, onde e como vivem as pessoas com doenças raras no Brasil.

Estamos conhecendo essas pessoas hoje por meio das imagens que estão sendo projetadas — espero que estejam passando aí, acho que deu um probleminha, vamos tentar passar um pouco depois. Só assim o Brasil poderá ter, como tem de ter, uma rede eficaz de atendimento.

Talvez a gente possa chegar a isso por meio da criação de um pro-grama específico no Ministério, voltado para as doenças raras. O Bra-sil pode ser, com certeza, modelo para outros países em muitas áreas, inclusive em áreas da Saúde. O SUS e o programa de combate à Aids são exemplos do que pode ser feito quando o governo ouve a sociedade e ela se organiza para encaminhar soluções.

Por isso, eu ainda tenho esperanças. Hoje a situação no Brasil em relação ao atendimento às pessoas com doenças raras é vergonhosa. Estamos atrasados não apenas em relação aos países mais desenvol-vidos, mas em relação a muitos de nossos vizinhos. A Argentina saiu na frente, assim como a Colômbia e o Chile. Nós podemos trabalhar com eles, podemos criar uma rede regional de atendimento. mas antes precisamos fazer o nosso dever de casa, precisamos fazer pelo menos o mínimo. E isso, infelizmente, não estamos fazendo.

Acredito e espero que, mais uma vez, este evento, este seminário, possa fazer com que as nossas autoridades maiores, como ministros, e até mesmo a nossa Presidenta, possam começar a olhar diferente para esse tema, o qual muitas pessoas não têm noção do real sofrimento, da dor e da angústia que passam os portadores das doenças e seus familiares.

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É triste saber que somos um exemplo a ser seguido em várias situações referentes à própria saúde e, num tema dessa importância, no mundo moderno em que vivemos, infelizmente, estamos tão despreparados, tão desprotegidos e tão desinformados sobre o que é preciso para fazer uma política pública de mínima qualidade.

Está aberto hoje, aqui, este seminário. Agradeço a presença a todos vocês. Espero que saiam daqui hoje conscientes do que realmente nós, sociedade, podemos fazer em relação às pessoas com doenças raras e a seus familiares.

Muito obrigado. (Palmas.)O SR. APRESENTADOR (David Rayol) - O Cerimonial gostaria de

informar que o Sr. Deputado Maurício Quintella Lessa, que se encontra à Mesa, é o 3º Secretário da Mesa Diretora da Câmara dos Deputados e também Presidente da Frente em Defesa das Doenças Raras.

O cerimonial cumpre o dever de registrar e agradecer as ilustres presenças das seguintes autoridades e personalidades que se apresen-taram ao cerimonial: o Sr. Deputado Ruy Carneiro, o Sr. Deputado Isaias, a Sra. Deputada Keiko Ota, o Sr. Deputado Beto Albuquerque, que se encontra à Mesa de Honra, o Sr. Deputado Severino Ninho, o Sr. Deputado Dr. Ubiali, o Sr. Deputado Tiririca, a Sra. Deputada Carmen Zanotto, o Sr. Deputado Alexandre Roso, o Sr. Deputado Eurico Júnior, o Sr. Deputado Maurício Quintella Lessa, que se encontra à Mesa, o Sr. Deputado Onofre Santo Agostini e o Sr. Deputado estadual Ernani Polo.

Também queremos registrar e agradecer a honrosa presença do Sr. Deputado Darcísio Perondi, que prestigia este evento, assim como os demais presentes.

Concluída a fala do Sr. Deputado Romário, neste momento, anun-ciamos o pronunciamento do Sr. José Eduardo Fogolin Passos, repre-sentando, neste ato, o Sr. Ministro da Saúde Alexandre Padilha.

O Sr. José Eduardo Fogolin Passos - Boa tarde a todos os presentes nesta tarde do dia 27 de fevereiro de 2013.

Gostaria de cumprimentar a Senadora Ana Amélia e a todos os Srs. Senadores presentes, também cumprimento o ilustríssimo Deputado Federal Romário, Presidente da Mesa referente ao Dia Mundial das Doenças Raras, e a todos os Deputados no auditório. Gostaria, ainda,

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de cumprimentar o meu colega, Dr. Dirceu Barbano, Diretor-Presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária e, também, o ilustre ator Luciano Szafir, irmão de Alexandra Szafir, paciente com esclerose lateral amiotrófica.

Em especial, nesta tarde, quero deixar um grande abraço a todos os pacientes com doenças raras e a seus familiares.

Fiquei muito contente, Deputado Romário, com a fala de V.Exa. no início da reunião de hoje. E é com esse entusiasmo que eu trago a fala do Ministro Alexandre Padilha. Com grande satisfação, retornamos a esta Casa de Leis para anunciar as ações realizadas referentes à atenção às pessoas com doenças raras.

Posso dizer a todos os presentes que, durante o ano de 2012, parti-cularmente, coordenei um grupo técnico responsável pela elaboração de uma política específica de atenção às pessoas com doenças raras no Sistema Único de Saúde.

Desde abril de 2012, o Ministério da Saúde e, pela primeira vez, um grupo conjunto, participativo, com associações de usuários especialistas na área de doenças raras e doenças genéticas e um grupo de profissio-nais elaboraram uma política de atenção às pessoas com doenças raras.

Essa elaboração durante o ano de 2012 gerou dois documentos nor-teadores que já estão para ser publicizados e serão colocados em con-sulta pública na semana seguinte. E só não estão sendo colocados em consulta pública hoje porque, durante o mês de fevereiro, ocorreram vários eventos relacionados às doenças raras. Eu estarei, inclusive, pre-sente em todos os eventos para os quais fomos convidados pelo Ministé-rio da Saúde. Sábado estive em São Paulo, amanhã participarei de outro evento também em São Paulo, contemplando todas as associações de usuários. Na sequência da apresentação em todos os eventos, faremos a consulta pública dos dois documentos norteadores que plasmam no Sistema Único de Saúde a atenção integral aos pacientes com doenças raras e seus familiares.

É importante salientar que esses documentos geram uma portaria pactuada na Comissão Intergestora Tripartite, que é a lógica dentro do Sistema Único de Saúde, para que, verdadeiramente, consigamos imple-mentar, e não fiquemos apenas no contexto de portaria, uma política

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pública voltada não somente ao tratamento de doenças raras, mas que englobe uma linha de cuidado e uma rede de atenção às pessoas e fami-liares de pacientes com doenças raras.

Essa política traz, desde a promoção do contexto da saúde e pre-venção em algumas doenças raras, fundamentalmente, o diagnóstico precoce e referências para que os usuários e familiares de pacientes com doenças raras possam ser encaminhados para serviços e centros espe-cializados de doenças raras.

Terei oportunidade, ainda nesta tarde, de apresentar a todos os senhores e às senhoras o contexto da política, todos os seus pontos de atenção e rede de atendimento. Essa política traz a linha de cuidado, o fundamental da informação e o cuidar do paciente de doenças raras e seus familiares. Não se trata apenas de estabelecer tratamento, que é parte de todo um cuidado, mas, fundamentalmente, de acolher os usu-ários, pacientes e familiares.

Com essa política, gostaríamos de fazer com que todos os usuários e seus familiares tenham uma referência para o cuidado em relação às doenças raras.

É importante salientar que essa política construída é um ponto de partida e não de chegada na conclusão do cuidado em relação às doenças raras. Parte desse grupo técnico estabelecido vai acompanhar, como ator fundamental, o monitoramento e a informação aos usuários e pacientes com doenças raras no Sistema Único de Saúde.

Temos quase 8 mil doenças raras catalogadas especificamente em relação a esse cuidado. Em relação a tratamento, hoje é muito pouco. O que temos de ofertar e o que o Sistema Único de Saúde tem de fazer é garantir a informação e o cuidado. E posso garantir ao senhor, Depu-tado Romário, que essa política traz a garantia da informação para que crianças, como o Pedro aqui presente, possam ter um diagnóstico pre-coce e referência para cuidado mais organizado.

É importante salientar que, em relação às doenças raras, e eu não vou me furtar neste momento, existe hoje dentro do contexto, e isso impacta os gestores e familiares, um grande processo de judicialização dentro do contexto do tratamento lá na ponta em relação às doenças raras. E, infelizmente, inclusive os próprios magistrados, em qualquer

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nível, podem se pronunciar e tomar as decisões sem um especialista ou técnico adequado nesse processo. Se a solicitação não for adequada, inclusive dentro de uma demanda judicial, infelizmente não se avalia a positividade ou negatividade em relação ao cuidado a esses pacientes.

O universo de médicos que pode acionar a Justiça, e a grande maio-ria deles é desprovida desse conhecimento em relação às doenças raras, pode impactar inadequadamente a questão do contexto do cuidado.

Sem sombra de dúvida, é preciso organizar as doenças raras no con-texto, inclusive para deixar todo esse caminho e esse cuidado mais claro inclusive no contexto da judicialização.

Outro aspecto fundamental a ser considerado é que, embora na Europa existam algumas iniciativas em relação às doenças raras, com exceção da França, não existe nenhum país com política de Estado espe-cífica para doenças raras. E também na América Latina não há notí-cia de política de Estado universal e gratuita, como o Sistema Único de Saúde agora propõe, no contexto da atenção às doenças raras.

O Orphanet, portal que traz as informações do contexto em relação às doenças raras e como tratá-las, informa mas não traz o contexto de uma política, o contexto de uma linha de cuidado e de um acolhimento apropriado. A política que o Sistema Único de Saúde traz hoje aos senhores e às senhoras é a única política de maneira totalitária e pioneira no contexto das doenças raras.

Repetir o que estava no Orphanet não teria sentido para a nossa linha de cuidado e para o que é o Sistema Único de Saúde, pois seria fazer o que já está sendo feito.

O portal serve e vai servir de apoio à nossa rede de serviços como uma forma de consulta, no contexto das informações. Elas virão como um reflexo e não para repetir o mesmo que acontece fora do Brasil.

Nesse processo, para determinar o tratamento, o risco de recorrên-cia e a questão do risco específico em pessoa, nós traremos, nesse con-texto da política de atenção às doenças raras, o contexto de rede, de linha de cuidado, e não apenas de tratamento. Ofertaremos, sim, mais acesso a diagnóstico e, como comentou o Deputado Romário, mais qua-lidade. E qualidade é um ponto fundamental.

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Durante o ano foram realizadas mensalmente reuniões desse grupo técnico e durante todo o ano pensou-se qual seria a melhor forma carac-terística para acolher familiares e pacientes. E o ponto fundamental dessa política foi, neste Brasil continental e heterogêneo, de que forma, em cada região, nós poderemos, sim, ofertar qualidade e acesso às pes-soas com doenças raras e seus familiares.

Não podemos, em hipótese alguma, pautar-nos apenas no trata-mento, porque, no contexto de doenças raras, se nós tivéssemos de hoje para amanhã cem doenças tratadas, cem doenças com protocolos, sig-nificaria tratarmos apenas 1,25% das doenças raras. E dessa lógica o que importa no contexto da política pública é acolher e gerar uma rede de cuidados com serviços e centros de referências em doenças raras e gerar essa informação.

É essa política que trago aos senhores e às senhoras hoje. Foi em relação a esse trabalho que o Ministério da Saúde, no ano passado, esteve aqui e se comprometeu. E hoje esse trabalho se apresenta como produto e resultado para a saúde pública brasileira, para a população e para os pacientes com doenças raras e seus familiares.

Esse é o grande salto. E o SUS escreve hoje uma nova página em relação às doenças raras no mundo.

Muito obrigado. (Palmas.)O SR. APRESENTADOR (David Rayol) - Nós agradecemos a pre-

sença e participação nesta cerimônia de abertura do Sr. Deputado José Stédile.

Agora, com a palavra, o Sr. Senador Eduardo Suplicy.O SR. SENADOR EDUARDO SUPLICY - Querido Deputado

Federal Romário, é muito importante a iniciativa de V.Exa. Eu tenho me aproximado bastante da causa. Percebo que o auditório está bem mais lotado do que no ano passado. Isso quer dizer que as pessoas que têm contribuído para a conscientização do problema, inclusive V.Exa., estão conseguindo algo muito significativo.

Quero cumprimentar o Sr. José Eduardo Fogolin, os Senadores Cás-sio Cunha Lima e Ana Amélia, os Deputados Federais Maurício Quin-tella e Mara Gabrilli, que muito têm se empenhado, a Deputada Rosinha da Adefal e o Deputado Marçal Filho, o Sr. Dirceu Barbano, Diretor-Pre-

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sidente da Anvisa, que muito se tem interessado por este tema, e o caro ator Luciano Szafir, que, com sua irmã Alexandra Szafir, tem ajudado nesta causa, o Deputado Distrital Joe Valle, Deputado Beto Albuquer-que, Líder do PSB, e os queridos Deputados Federais aqui presentes.

Apresentei — sobretudo através de pessoas que me chamaram a atenção para as doenças raras, como aquelas do Instituto Baresi, coor-denado por Adriana de Abreu Magalhães Dias e Marcelo Seiko Higa, em Brasília, e no diálogo sobre essas questões com Rogério Lima Bar-bosa, Presidente da Associação MariaVitória, e fruto da sensibilização recebida no Instituto Baresi — três matérias legislativas sobre o tema.

A primeira é o Projeto de Lei nº 159, de abril de 2011, que institui o último dia do mês de fevereiro como o Dia Nacional de Doenças Raras. Essa proposição encontra-se na Comissão de Educação do Senado aguardando que se marque uma audiência pública para a instrução do projeto.

A segunda é o Projeto de Lei nº 711, de novembro de 2011, que ins-titui a Política Nacional de Proteção aos Direitos da Pessoa com Doença Rara. Foi distribuída para análise da Comissão de Assuntos Sociais e da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa, sendo termi-nativa nesta última. Depois poderá vir para a Câmara dos Deputados, se ali aprovado. O PLS 711, de 2011, encontra-se com o Relator designado pela Comissão de Assuntos Sociais, Senador Paulo Bauer, desde março de 2012.

A terceira matéria é o Projeto de Lei nº 231, do Senado, de agosto de 2011, que cria o Fundo Nacional de Pesquisas para Doenças Raras e Negligenciadas. Foi distribuída para a instrução de três Comissões do Senado: Ciência e Tecnologia, Assuntos Sociais e Assuntos Econômicos, sendo terminativa nesta última.

No momento, a propositura, que já teve parecer pela aprovação na forma de emenda substitutiva da Comissão de Ciência e Tecnologia, está na Comissão de

Assuntos Sociais aguardando designação do Relator.É interessante destacar que uma doença rara é uma patologia

que ocorre com pouca frequência, em geral, na população. Para ser considerada rara, cada doença específica não pode afetar mais de um

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número limitado de pessoas na população. Na Europa, a definição para doenças raras abarca as que atingem um em cada 2 mil cidadãos. Nos Estados Unidos, são consideradas raras as doenças que atingem menos de 200 mil indivíduos. No Japão, a definição jurídica de uma doença rara é a que afeta menos de 50 mil pacientes ou cerca de uma em 2.500 pessoas.

Individualmente, cada uma das patologias tidas como raras com-promete menos de uma em cada duas pessoas, mas é preciso salientar: há mais de 5 mil doenças raras identificadas. A etiologia das doenças raras é diversificada. A grande maioria delas é de origem genética, mas doenças degenerativas, autoimunes, infecciosas e oncológicas também podem originá-las. Apesar das dificuldades causadas pelas doenças raras, inúmeras pessoas com essas doenças prestaram e prestam gran-des contribuições para a humanidade. Como exemplo, cito o Presidente John Fitzgerald Kennedy, com a doença de Crohn; o físico Stephen Hawkings, com esclerose lateral amiotrófica; o músico Seal, com lúpus infantil; o ator Michael J. Fox, com a doença de Huntington; o meda-lhista olímpico Doug Herland, com osteogênese imperfeita; e a aviadora Jessica Cox, que, com uma doença congênita, nasceu sem os braços.

As sequelas causadas pelas doenças raras são responsáveis pelo sur-gimento de cerca de 30% das deficiências. A dificuldade no tratamento médico começa na falta de um mapeamento nacional dessas pessoas. A baixa incidência das doenças raras no Brasil, quando comparada com outros países, leva à suspeita de que muitos casos simplesmente não são diagnosticados, em especial em regiões historicamente não incluídas, relativamente mais pobres, como Norte e Nordeste.

Dados internacionais apontam que a mortalidade infantil entre pes-soas com doenças raras chega a 30% em países desenvolvidos. Este per-centual pode ser ainda mais alto no Brasil, uma vez que essas crianças não recebem o tratamento adequado.

Dados concretos embasariam o desenvolvimento de uma aborda-gem coerente das necessidades dessa parcela da população.

Estudos recentes da EURORDIS, organização que auxilia pessoas com doenças raras na União Europeia, compararam dados de oito doenças raras em 17 países europeus, num universo de 6 mil doentes e

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familiares, mostrando que 25% dos doentes inquiridos esperou de 5 a 30 anos entre o aparecimento dos sintomas iniciais e o diagnóstico defini-tivo. Estima-se que, no Brasil, a dificuldade de diagnóstico e tratamento seja ainda maior.

Eu vou respeitar o horário, Deputado Romário, e peço que depois seja considerado na íntegra o meu pronunciamento, que também farei da tribuna do Senado, em homenagem à sua inciativa. Passarei à última página.

Eu falo aqui das ações do Ministério da Saúde, com relação às doen-ças negligenciadas, lançadas em 2003, com o primeiro edital temático em tuberculose, seguido pelos editais de dengue, 2004, e hanseníase, 2005. Em 2006, o Ministério implantou o Programa de Pesquisa e Desenvolvimento em Doenças Negligenciadas e financiou 82 pesquisas, com um investimento total de 22,3 milhões de reais.

Em 2008, financiou 58 projetos, mediante investimento conjunto com o Ministério da Ciência e Tecnologia. Em 2012, anunciou a criação da Rede de Pesquisas em Doenças Negligenciadas, com financiamento de 20 milhões de reais.

No caso das doenças raras acontece situação parecida com o das doenças negligenciadas, pois a decisão das indústrias farmacêuticas de investir na pesquisa e na comercialização de produtos é largamente influenciada pela demanda e, principalmente, pelo mercado poten-cial. Com base nesse raciocínio, a indústria concentra a sua produção em determinadas linhas de produtos, retirando do mercado drogas de pouco consumo, utilizadas em doenças raras, de baixo retorno finan-ceiro ou de preço controlado pelo governo, por ser o maior comprador, tal como acontece com determinadas doenças endêmicas.

Drogas órfãs são medicamentos usados para o diagnóstico, pre-venção e tratamento das doenças raras. Para que um medicamento seja considerado órfão, são utilizados critérios epidemiológicos — baixa prevalência ou incidência da doença em uma determinada população — e econômicos — presunção de não rentabilidade do medicamento.

O incremento de investimentos em doenças negligenciadas no Bra-sil, em face dos sucessos já obtidos, exige, agora, a instituição de meca-nismos de financiamentos mais perenes, que também contemplem as

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doenças raras. Nesse sentido, a criação do Fundo Nacional de Pesquisas para Doenças Raras e Negligenciadas, proposto pelo projeto que citei, pode significar um importante avanço com vistas a ampliar o financia-mento e o escopo das ações de pesquisa nessa área.

O fundo proposto funcionará sob as formas de apoio a fundo per-dido ou de empréstimos reembolsáveis. As fontes de recursos incluem doações, sendo permitidas doações para pesquisa de doença específica; subvenções e auxílios de entidades de qualquer natureza, inclusive de organismos internacionais; e reembolso das operações de empréstimo realizadas por meio do fundo, a título de financiamento reembolsável. Ademais, contará com recursos orçamentários — essa é a minha pro-posta — anuais de 50 milhões de reais.

Com essas ideias, quero cumprimentar a Câmara dos Deputados e principalmente o Deputado Romário pela realização deste seminário em comemoração ao Dia Mundial das Doenças Raras e à Associação MariaVitória pelo apoio ao evento.

Devemos todos nós prosseguir nessa luta para fazer valer para as pessoas com doenças raras o princípo constitucional que assegura o direito à saúde para todos.

Muito obrigado. (Palmas.)O SR. APRESENTADOR (David Rayol) - Este cerimonial cum-

pre o dever de informar que a Sra. Deputada Rosinha da Adefal, que se encontra no dispositivo de autoridades, é Presidente da Frente Parla-mentar da Pessoa com Deficiência e fará uso da palavra após as palestras temáticas, conforme consta em nossa programação.

Neste momento tem a palavra o Sr. Diretor-Presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária — Anvisa, Dirceu Barbano.

O SR. SENADOR EDUARDO SUPLICY - Deputado Romário, gostaria de entregar aqui, da Patrícia Krug, o livreto Carinhos d’Alma — a Arte como Terapia. Ela é uma pessoa que tem doença rara mas que tem conseguido um desenvolvimento notável com a sua arte.

Eu tenho alguns exemplares desse livreto. Eu vou pedir que sejam distribuídos aqui para os membros da Mesa e para alguns da plateia, mas são tantos que não haverá para todos. Perdão.

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O SR. DIRCEU BARBANO - Boa tarde a todos. Cumprimento o Deputado Federal Romário. Parabenizo V.Exa. pela iniciativa de trazer esse tema para dentro do Congresso Nacional, fazendo com que as auto-ridades públicas de saúde possam — e devam — estar aqui presentes para dialogar diretamente com a sociedade.

Eu gostaria de cumprimentar o Senador Eduardo Suplicy, Senador do meu Estado, São Paulo, que no exercício diário do Parlamento con-tribui com questões importantes sempre. Esta é uma delas. Quero cum-primentar a Senadora Ana Amélia, em nome de quem cumprimento os demais Senadores e Senadoras aqui presentes. Quero cumprimentar a Deputada Federal Mara Gabrilli, que tive a oportunidade de conhecer há pouco tempo. Nós nos encontramos com a possibilidade de intera-ção entre os interesses do seu mandato e o trabalho que a Anvisa realiza. Cumprimento Luciano Szafir, os familiares, os parentes de todos os por-tadores de doenças raras e também os representantes de associações de portadores dessas doenças.

Deputado Romário, quero dizer a V.Exa. que o dia 27 de fevereiro é marcado na minha história, na minha vida, por duas coisas importan-tes, e esse é um dia de uma dupla reflexão: primeiro, porque, nas minhas atividades como gestor na área da saúde ao longo do tempo, no Minis-tério da Saúde e agora na Anvisa, e como professor na universidade, trabalhando com alunos, com pacientes, sempre convivi com o tema das doenças raras, com os desafios de oferecer tratamento às pessoas como algo do dia a dia; e, segundo, porque o dia 27 fevereiro é o dia em que minha filha nasceu — completa hoje 16 anos. E todos nós que somos pais, filhos, sabemos que nós temos muita dificuldade em lidar com a doença do pai, da mãe, com a doença do filho, da filha e muito mais dificuldade de lidar com aquelas doenças sobre as quais nós pouco sabemos e que nós de uma coisa temos certeza, de que são doenças cujo tratamento normalmente é difícil. É difícil, por vezes, porque nós não aprendemos a lidar com tais doenças; é difícil, por vezes, porque a ciên-cia ainda não ofereceu conhecimento suficiente sobre a doença para que nós tenhamos remédios para melhorar ou para amenizar a dor das pessoas; é difícil porque o sistema de saúde lida com um conjunto de demandas e, por vezes, não consegue acolher de forma apropriada as

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pessoas que sofrem essas doenças. Então, o dia 27 de fevereiro é mar-cado, para mim, sempre por essa dupla reflexão.

E acredito que se o projeto de lei do Senador Eduardo Suplicy for aprovado, criando aqui no Brasil a obrigação de pararmos no dia 27 fevereiro, menos para comemorar, mais para refletir sobre o significado e os desafios que essas doenças impõem, teremos certamente, daqui para frente, um momento sempre oportuno para isso.

A Anvisa executa uma atividade que, perante o público aqui pre-sente — Parlamentares, parentes de pessoas portadoras de doenças, representantes de associações — é sempre uma atividade muito difícil e muito complexa. Regular na área da saúde impõe decisões diárias, as mais complexas e as mais difíceis todos os dias. Não é fácil lidar com o conjunto de desafios impostos a todos nós e que implicam regulação.

De um lado, há a demanda por registros de medicamentos, muitos dos quais importantíssimos, usados para tratamento de doenças de difí-cil manejo, como essas doenças raras, produtos dos quais a ciência ainda não desvendou todas as suas características de eficácia e de segurança; há a responsabilidade de tomar a decisão de colocar ou não esses pro-dutos no mercado; há a responsabilidade de pensar, de um lado, com a cabeça de quem regula o mercado, mas, de outro lado, com a cabeça de quem tem de oferecer acesso das pessoas às tecnologias, com a preocu-pação de que essas tecnologias não gerem danos e, ainda mais, agravem a saúde de todo mundo. E a Anvisa vive esse contexto diariamente, os seus diretores, os seus gerentes, os seus técnicos.

Há desafios de se regularem questões complicadas. Há uma decisão, tomada pela direção da Anvisa, que gera impacto na vida de mais de 20 milhões de brasileiros que são fumantes, de acabar com os aditivos que atraem os jovens para o uso do cigarro. Houve uma primeira decisão na Justiça barrando a norma da Anvisa. Ontem à noite, essa liminar foi cassada e volta a valer a norma.

Nós sabemos que, aqui dentro do Congresso Nacional, há um pro-jeto de decreto legislativo para anular essa norma da Anvisa, e nós vamos continuar entendendo que a regulação na área do tabaco é importante porque protege a vida das pessoas, porque evita que novas pessoas pas-sem a ser viciadas em cigarro, principalmente os jovens do nosso País.

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Temos uma briga com a questão da propaganda de alimentos. Per-demos na Justiça essa semana a validade de uma norma que impunha obrigações às empresas de alimentos para informarem pais e mães sobre os elevados teores de sal e de açúcar nesses produtos. E a Justiça disse que a Anvisa não pode fazer isso. Então, regular não é algo simples, não é algo fácil.

No que se refere às doenças raras, eu trago, Deputado, primeiro uma mensagem clara, que foi orientação do Ministro da Saúde Alexandre Padilha: a Anvisa está e estará à disposição e tem trabalhado diaria-mente para que nós tenhamos um ambiente menos difícil no manejo e no tratamento dessas doenças.

Nós temos uma norma na Anvisa, de 2007, que está passando por revisão agora, que prevê prioridade máxima na análise de registros de produtos que são dirigidos a essas doenças. Isso é importante, porque nós sabemos que diariamente são demandados à Anvisa registros de milhares de produtos, e nós não podemos tratar coisas diferentes de forma igual. Produtos que são de interesse para a saúde pública, nota-damente aqueles que não têm disponibilidade de terapêuticas no mer-cado, precisam ser tratados com prioridades. Já havia uma norma de 2007, que está sendo mudada agora. Isso vai ficar ainda mais claro nessa norma, que concluiu a consulta pública agora. E, nas próximas semanas, no máximo no próximo mês, essa nova norma estará já vigendo, e nós vamos ter muito mais agilidade no registro de medicamentos para essas doenças.

Outra questão importante é que nós temos uma discussão aberta, em fase de conclusão, sobre o que nós chamamos de uso compassivo. É uma metodologia e um modelo de regulação sanitária que permitem que pacientes possam se utilizar de medicamentos que são estudados para essas doenças raras ainda nas etapas mais preliminares dos estudos clínicos — estudos em Fase II — que indiquem alguma possibilidade de uso de produtos para doenças que não têm tratamento. A Anvisa vai ter uma norma que facilita a inserção desses pacientes nos programas de uso compassivo que as indústrias que pesquisam esses medicamentos disponibilizam.

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Por fim, Deputado, queria enaltecer e chamar atenção para a impor-tância do Projeto de Lei nº 4.411, de 2012, de sua autoria, que trata da importação de insumos para pesquisa no Brasil. De fato, nós temos já um modelo que tem sido trabalhado pelo CNPq, pela Anvisa, pela Receita Federal, com alguns resultados muito significativos para aquelas pesquisas que acontecem sob a égide do CNPq. Nesses casos, no ano de 2012, mais de 99% dos produtos importados para pesquisa foram libe-rados pela Anvisa em menos de 24 horas.

Nós temos o desafio de verificar como vamos fazer com as pesquisas que muitas vezes são feitas fora do sistema de financiamento do CNPq. E, aí, o seu projeto vai trazer para a lei algo que vimos produzindo ao longo do tempo, criando obrigações para os órgãos públicos. Isso é muito bom. E, mais do que isso — eu vi o projeto —, ele cria obrigações e responsabilidades para os pesquisadores, porque muitas vezes, aqui no Brasil, a necessidade de regulação ocorre porque nós nos acostumamos a colocar toda a responsabilidade na mão do Estado e a tirá-la da mão das pessoas que operam. Então, o projeto trata também de responsabi-lizar os pesquisadores. Isso é fundamental, porque compartilha o papel que o Estado tem de fazer, de evitar a entrada de produtos que possam colocar em risco a vida das pessoas, com a responsabilidade dos pesqui-sadores quando desenham o seu protocolo clínico e decidem incorporar e usar pacientes como voluntários para suas pesquisas.

Sei que a Deputada Mara Gabrilli é a Relatora do projeto e já me coloquei à disposição. Devemos ter uma reunião nos próximos dias para debater o tema, porque a Anvisa dá todo o apoio ao projeto de lei de sua autoria. Se precisar da Anvisa, nós estamos à disposição para facilitar a tramitação e a aprovação. Nós só não votamos, mas nós pode-mos ajudar.

Por isso é que eu estou aproveitando para chamar a atenção para estas duas questões importantes que, aí, sim, os senhores votam: o projeto de decreto legislativo que retira da Anvisa o poder de fazer a regulação dos aditivos do tabaco — nós entendemos que a Anvisa não extrapolou a sua competência legal e vamos ficar muito preocupados se esse projeto de decreto for aprovado, porque vai recolocar no mercado o cigarro com sabor de menta, sabor de canela, que mascara o gosto

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ruim do cigarro e atrai o jovem para o vício —; e os projetos de lei que tramitam aqui e que tratam de obrigar as empresas que fazem propa-gandas de alimentos com altos teores de sal e de açúcar a informar para nós, que somos pais e mães, que aqueles alimentos têm altos teores de sal e de açúcar, para que possam ser chamadas as atenções devidas para os problemas que esses produtos causam à saúde. Isto está nas mãos dos senhores.

No que nós pudermos apoiar, em relação à questão da pesquisa clí-nica, em relação a essas doenças, os senhores podem contar conosco.

Muito obrigado e parabéns pelo evento. (Palmas.)(Apresentação de flash mob.)(Palmas.)O SR. APRESENTADOR (David Rayol) - Senhoras e Senho-

res, após esses momentos de descontração, nós gostaríamos de dar prosseguimento ao evento, mais uma vez, pedindo aplausos ao Flash Mob., esse grupo que esteve aqui à frente (palmas.), enriquecendo e abrilhantando esse evento, assim como os demais presentes.

Vamos dar continuidade ao evento.Em cumprimento a nossa programação, teremos, a partir deste

momento, as palestras temáticas.Neste momento, convidamos a se dirigir a esta tribuna, para proferir

a palestra sobre As Particularidades da Pesquisa Clínica para Doenças Raras, a Dra. Greyce Lousana, Presidenta Executiva da Sociedade Brasi-leira de Profissionais em Pesquisa Clínica.

Esse cerimonial cumpre o dever de informar que o Senador Cás-sio Cunha Lima, devido ao cumprimento oficial da agenda de trabalho, precisou se retirar do recinto e nomeou para representá-lo à Mesa de honra o jovem Patrick Teixeira Pires, ele que é portador de mucopolis-sacaridose. Seja bem-vindo, Patrick. (Palmas.)

Senhoras e Senhores, com a palavra a Dra. Greyce Lousana.A SRA. GREYCE LOUSANA – Muito obrigada. Nós estivemos

aqui no ano passado e é um prazer voltar a esta Casa. Parabéns a todos os políticos da Mesa, Deputados e Senadores.

A ideia é que falemos um pouco de pesquisa e das particularidades em se fazer pesquisa clínica em doenças raras. Quando falamos em fazer

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pesquisa, a pesquisa clínica especificamente — estivemos há pouco com o Presidente da Anvisa —, e pela manhã parece que houve alguma dis-cussão nesse sentido, quero dizer que pesquisa clínica é uma coisa que se faz não só com medicamento. As pessoas têm insistido nisso, e nós insistimos bastante, ou seja, pesquisa clínica é uma coisa que se faz para medicamentos, para cosméticos, para procedimentos, para produtos para a saúde. Então, nós fazemos pesquisa com tudo aquilo que estará sujeito à vigilância, mas também com outras ações, por exemplo, na parte de comportamento, na parte de procedimentos.

Então, pesquisa clínica é uma coisa bastante ampla. Nesse sentido, além de fazer pesquisa com muitas coisas, o grande objetivo de todos é a qualidade de vida. Ninguém faz pesquisa porque quer fazer pesquisa para nada. Queremos fazer pesquisa porque de alguma forma queremos contribuir com a qualidade de vida das pessoas.

Um dado importante, quando falamos em doenças raras, mostra que o mundo hoje conduz 141 mil estudos. Dos 141 mil estudos que estão sendo conduzidos no mundo, o Brasil consegue fazer só 3.200 des-sas pesquisas. O Brasil faz muito pouca pesquisa frente ao potencial que nós teríamos para conduzir mais estudos.

Com relações às doenças raras, no Brasil nós temos hoje cadastra-dos, numa base de dados internacionais, só 16 estudos sendo conduzi-dos. Isso é muito pouco se imaginarmos o contingente de pessoas aco-metidas por doenças raras. Seguramente, o Brasil poderia fazer muito mais pesquisa do que fazemos hoje.

Nesse sentido, o que precisamos para fazer pesquisa? Primeiro, pre-cisamos de conhecimento. Não é fácil fazer pesquisa clínica. As pessoas imaginam... Inclusive, uns dos grandes problemas no Brasil, hoje, são as incubadoras financiadas muitas vezes por empresas privadas e pelo governo. Esses meninos que estão nessas incubadoras de grandes ins-tituições universitárias desenvolvem pesquisas durante 1 ano, 2 anos, 3 anos, 4 anos. No momento em que eles terminam suas pesquisas e tentam fazer o registro desses produtos originários nessas incubadoras, eles não conseguem registrar porque descobrem que não fizeram pes-quisa clínica ou não fizeram um planejamento adequado para conseguir registro para essas pesquisas.

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Temos tentado discutir com o pessoal das incubadoras que esses jovens precisam ser melhores orientados. Eles precisam conhecer as regras para não perder dinheiro que está sendo investido nessas incu-badoras e em muitas empresas, e depois esses estudos não conseguem seguir por falta de conhecimento.

Para fazer pesquisa, eu preciso de recurso, mas não é só de dinheiro. Sempre que falamos de recursos, as pessoas pensam: vocês querem dinheiro. Não necessariamente. Não queremos só prédio bonito. Que-remos equipe treinada. Treinamento é alguma coisa que não se faz em um dia, treinamento é uma coisa continuada. Demora muito para for-mar um pesquisador.

Às vezes, as pessoas não têm ideia do tempo que se leva não para formar um médico, mas um médico que saiba fazer pesquisa. Não são todos os médicos que são bons pesquisadores, assim como não são todos os farmacêuticos que são bons pesquisadores. Formar um pesquisador é alguma coisa que demanda muito tempo.

Evidente que precisamos de estrutura física, estrutura de equipa-mento. Hoje visitamos serviços que se dizem serviços que conduzem pesquisas em doenças raras que são, do ponto de vista sanitário, lamen-táveis, não teriam condições sequer de fazer assistência, quanto mais de conduzir pesquisa.

Do que mais precisamos? Precisamos de regulatório, precisamos da Anvisa, mas também precisamos de um ambiente ético. Há um ano estivemos nesta Casa, e uma coisa me preocupa: várias pessoas da Mesa, o representante do ilustríssimo Ministro da Saúde disse que durante o último ano trabalharam muito num grupo de discussão e que será colocada em consulta pública uma norma que seguramente vai fazer do Brasil um País diferente com relação às doenças raras. O Presidente da Anvisa disse que existe uma norma que deve ser colocada em prática, que fala sobre acesso expandido, sobre uso compassivo. O que me pre-ocupa é que existem consultas públicas, existem normas, mas elas ainda não estão funcionando.

Com relação a acesso expandido e uso compassivo, essa norma é uma consulta pública de 2011, foi amplamente discutida, mas até hoje não saiu do papel.

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Com relação ao grupo de trabalho que fala sobre doenças raras, o que nos preocupa é saber quanto tempo essa consulta pública vai ficar em discussão e, depois das discussões, em quanto tempo ela vai ser aplicada.

No ano passado, Deputado, nós estivemos nesta Casa e falamos seriamente sobre uma consulta pública do ponto de vista regulatório, das questões éticas que envolvem a condução de pesquisa no Brasil.

Talvez os senhores não imaginem a dificuldade que nós temos para começar a fazer uma pesquisa no País. Primeiro, eu passo essas pes-quisas por um sistema de avaliação ética, que chega a levar às vezes um ano para ser avaliado, e não necessariamente eu tenho pessoas que representam os senhores nesses Comitês de Ética ou mesmo na Comis-são Nacional de Ética em Pesquisa. Essa consulta pública ficou durante 60 dias para discussão, durante mais de um ano sendo avaliada e foi votada no dia 11 de dezembro do ano passado com um texto que não era do conhecimento de nenhuma das pessoas que havia discutido essa questão.

Essa norma foi aprovada pelo pleno do Conselho Nacional de Saúde. Ainda não está valendo, mas há questões extremamente complicadas e que sequer foram aqui levantadas.

Além disso, precisamos de uma relação permanente entre médicos, pacientes e governo. É fundamental que os médicos entendam do que os pacientes precisam. Não necessariamente quem está atrás de uma cadeira, dentro de um gabinete confortável, sabe do que um familiar ou um paciente precisa para fazer diagnóstico e um tratamento. Nós precisamos conversar mais e estar mais perto das pessoas acometidas pelas doenças.

O que nós temos hoje efetivamente no Brasil? Nós temos hoje médi-cos, com certeza. Hoje nós temos excelentes médicos no Brasil. Com certeza, temos muito médico no Brasil. Temos muitas equipes multidis-ciplinares. Ninguém faz pesquisa só com médico. Eu preciso de farma-cêutico, de enfermeiro, de fisioterapeuta, de advogados.

O Brasil tem carência de advogados que entendam de pesquisa clí-nica, o Brasil tem carência de entender seguro de pesquisa clínica. O Brasil tem muito paciente. Certamente, nós temos muitos pacientes

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acometidos por doenças raras. O Brasil tem um órgão regulador, no caso, a Anvisa, extremamente importante, mas ele precisa ser mais bem aparelhado. Uma instituição que tem um setor que regula toda a pes-quisa clínica do Brasil, que não consegue ter mais do que 20, 30 técnicos trabalhando não pode ser definitivamente capaz de avaliar o contin-gente de pesquisa que existe neste País.

É preciso ter mais técnico dentro da Anvisa! Enquanto a Anvisa, enquanto a Presidente da República não se preocuparem em abrir con-curso e colocar dentro da Anvisa técnicos capacitados para conduzir e avaliar processos de pesquisa, é impossível fazer pesquisa neste País.

Nós temos sistema de regulação ética. Nós temos mais de 600 comi-tês. Eu questiono a competência desses comitês de ética, a competência das pessoas que estão à frente dessas avalições, o quanto essas pessoas entendem, por exemplo, de doenças raras.

Existe hoje o Registro Brasileiro de Ensaios Clínicos – REBEC — talvez muitos dos senhores nem tenham ouvido falar dele. O REBEC é um registro mandatório para todas as pesquisas que existem no Brasil. Se os senhores avaliarem esse registro hoje, ele não é 100% funcional, e seguramente nós não temos todas as pesquisas cadastradas. No entanto, o governo gastou seguramente muito dinheiro para fazer esse sistema e até hoje ele também não funciona.

O Brasil, através do BNDES e FINEP, dá muito dinheiro para se fazer pesquisa. Existem programas, como o PROCIS e o PROFARMA, que também dão recursos financeiros para se fazer pesquisa. Não adianta só dinheiro. Eu preciso saber se os pesquisadores sabem fazer projeto e se eles sabem as regras para fazê-los.

Quais os desafios que hoje a gente enfrenta? Primeiro, os médicos e os demais profissionais precisam, no caso de doenças raras, permanecer em vários Estados. Não adianta concentrar médico só nas Regiões Sul e Sudeste. Nem 0,5% das pesquisas que existem no Brasil ocorrem nas Regiões Norte e Nordeste. Nós precisamos que os professionais se diri-jam às Regiões Norte e Nordeste.

Eu preciso de serviço capacitado para conduzir pesquisa. Não con-fundam serviço assistencial com serviço que sabe fazer pesquisa clínica.

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Os serviços podem ter um excelente atendimento, o que não quer dizer que eles saibam fazer pesquisa.

Eu preciso fazer estudo não só com medicamentos. Eu tenho doen-ças raras para as quais não existe medicamento. Eu preciso estudar alternativas para cuidar dessas pessoas com dignidade e não necessaria-mente fazer medicamento.

Eu preciso de mais envolvimento entre os pacientes, os familiares e o governo. É preciso perguntar o que a população quer. A gente tem que saber o que as pessoas querem.

É preciso menos burocracia. O Brasil não pode levar mais de 1 ano pra decidir se vai fazer pesquisa ou não. A gente precisa decidir rapi-damente se vai ou não fazer pesquisa. Eu não posso levar 1 ou 2 anos... A despeito da Consulta Pública nº 32, que é de 2011, nós estamos em 2013... Como o Brasil pode levar 2 anos para decidir se vai fazer uso compassivo e acesso expandido?

Eu preciso entender que doença rara tem política mais específica, e não é só doença rara. Nós temos várias outras situações no Brasil que exigem políticas mais pontuais, mas nós não podemos esperar tanto tempo para que as políticas sejam aplicadas. Nós temos que aprender a ser um País mais efetivo nas nossas ações e menos burocrático. O Brasil precisa menos de discurso e de mais ação.

Nós temos ainda como desafio projetos que sejam focados na reali-dade brasileira. O Brasil não é igual ao Canadá, aos Estados Unidos. O Brasil tem características distintas, e nós temos que saber o que o Brasil precisa. O Brasil é diferente nas Regiões Norte, Nordeste, Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Nós precisamos criar políticas que se adaptem às dife-renças de cada Região.

O governo precisa viabilizar ações a longo prazo. Nós não podemos ter ações do governo que sejam temporárias. Nós precisamos de políti-cos que promovam política pública a longo prazo.

Nós precisamos entender que todas as pessoas precisam ter voz. O Brasil é um País democrático. Nossa entidade já teve vários problemas com órgãos do governo porque se ouviu: “Vocês falam demais”. Foi o que a gente já ouviu de pessoas do Ministério da Saúde. Eu entendo que nós falamos demais. Seguramente, quando eu ouvi isso, entendi

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que eu estava correta, porque, se eles disseram que eu falava demais e seguramente disseram que eu não era uma pessoa muito bem-vinda, é porque eu deveria estar falando a verdade. Então, se eu estou dentro de uma democracia — Palmas prolongadas —, seguramente, todos nós temos que ter voz, de maneira organizada, sem dúvida. Por isso existem associações. Nós não queremos baderna. Queremos associações orga-nizadas, mas elas precisam ser ouvidas, independente do partido e das crenças que cada uma dessas associações tenha.

As pessoas estão no governo e não são do governo. O governo somos todos nós. O governo é feito por brasileiros. As pessoas que aqui estão hoje estão no governo, mas precisam criar políticas para todos nós, brasileiros.

Nós precisamos sensibilizar um pouco mais os políticos e a socie-dade sobre o que é pesquisa, sobre a dificuldade de se fazer pesquisa e que pesquisa clínica hoje não pode ser moeda de troca.

Acima de tudo, acho que precisamos de paixão, como, por exemplo, do Deputado Romário, que está aqui. Por quê? Por paixão. Eu acho que muita gente que está aqui hoje é por paixão. Eu tenho paixão pelo traba-lho, eu tenho paixão pela minha família. Essas pessoas que vieram aqui e dançaram têm paixão pelo que estão fazendo. Seguramente, muitos dos presentes têm paixão.

O Brasil é um País de pessoas apaixonadas. Nós somos apaixona-dos pelo Carnaval; somos apaixonados por religião; somos apaixona-dos por dança; somos apaixonados por muitas coisas. Nós precisamos nos apaixonar pela dignidade das pessoas. É disto que precisamos para fazer pesquisa, não só para doença rara. Nós precisamos de profissionais apaixonados, de políticos apaixonados, mas apaixonados pelo Brasil, especificamente pelos brasileiros. Eu acho que é disso que nós precisa-mos definitivamente.

Obrigada. (Palmas.) O SR. APRESENTADOR (David Rayol) - A pedido da organização

do evento, este cerimonial cumpre o dever, neste momento, de infor-mar aos presentes que estaria participando também como palestrante, nesta tarde, o Dr. Jairo Bisol, mas, devido a um problema de saúde, ele

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não pôde comparecer. Por intermédio deste cerimonial, S.Sa. apresenta escusas à organização do evento.

Portanto, neste instante, convidamos a se dirigir a esta tribuna, para proferir a palestra pelo tempo regulamentar de 10 minutos, o Prof. Dr. Natan Monsores, do Departamento de Saúde Coletiva da Universidade de Brasília, UnB, que estará abordando o tema A Bioética e as Questões das Doenças Raras. (Palmas.)

O SR. NATAN MONSORES - Senadores, Deputados e presentes, boa tarde.

É um prazer estar aqui, neste momento, falando para vocês de um tema que me é caro por ter um histórico familiar também relacionado às doenças raras, pois, na minha família, é frequente o aparecimento de algumas doenças por conta da origem étnica e por ser também a mili-tância, a camisa que a gente vestiu na universidade, que é a questão da bioética e dos direitos humanos, do direito das pessoas à saúde.

Então, estar aqui falando para vocês é um privilégio. É um privilégio também falar depois da Profa. Greyce Lousana, principalmente porque ela destaca alguns elementos que vão ser quase repetidos aqui, na minha fala.

É preciso localizar de onde eu venho para falar para vocês. Eu falo do campo da Bioética, uma área nova que surgiu na década de 70 com algumas características. Como característica fundamental, ela aproxima a ciência, a Ciência Biomédica, em particular, e as humanidades, esse senso de direitos humanos, essa percepção de que a ciência não tem respostas prontas para todos os problemas da humanidade, mas que nós precisamos encontrar, nos elementos humanos da nossa vivência, algo que complemente o conhecimento científico, que é frio e às vezes esva-ziado de sentimento de humanidade.

É preciso destacar também que eu falo a partir dessa perspectiva específica. Nós falamos aqui de doenças raras, mas não podemos perder de vista que uma pessoa não é a sua doença. As pessoas portam doenças, as pessoas desenvolvem doenças. A doença não é uma etiqueta, não é uma característica, não deve ser um elemento distintivo de qualquer ser humano.

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Nós, brasileiros, precisamos adquirir essa consciência de que o rótulo, de que a prescrição que nós fazemos, apontando para as pessoas deficiências, características raciais, escolhas de gênero, escolhas religio-sas, essas características não distinguem essas pessoas enquanto seres humanos. Nós partilhamos da mesma dignidade. Isso é fundamental para a compreensão de que elementos precisamos trazer para essa dis-cussão da questão das síndromes raras.

É fundamental também destacar a experiência de vida dos pacien-tes, dos portadores. Na verdade, nós usamos uma série de adjetivos para essas pessoas que vivem essas síndromes, para essas famílias que vivem essas síndromes.

A doença rara não é uma doença de um indivíduo, como já foi destacada aqui. Ela é uma doença de famílias, ela é uma doença de comunidades.

Ao contrário do que a maioria de nós, que não somos portadores de doenças raras ou de síndromes raras, na nossa vivência, somos ouvi-dos, somos vistos, essas pessoas vivem dentro de uma tríade perversa. Elas costumam ser invisíveis: elas passam despercebidas nas políticas públicas, elas passam despercebidas no nosso convívio porque elas são minoria, elas são exceção, elas são a raridade. Elas são pessoas, às vezes, consideradas intocáveis, porque portam um estigma no corpo. Essas doenças, em sua cronicidade, são deformantes, são estigmatizantes. Isso precisa ser levado em consideração também. Elas não são diferentes por portarem uma doença.

Essas doenças também são de um trato delicado, porque trazem a essas pessoas uma pecha da incapacidade, uma pecha da incapacidade de serem trabalhadores, de constituírem famílias, de se relacionarem de maneira normal, como qualquer pessoa. Isso fere a dignidade, isso fere o sentido de humanidade mais básico que essas pessoas têm. É nisso que temos que pensar, é isso que nós temos que tentar retomar quando vamos discutir políticas públicas, quando vamos discutir pes-quisa, quando vamos discutir qualquer tema relacionado à questão das doenças raras.

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Eu vou destacar, nos próximos eslaides, algumas questões que são caras ao campo da Bioética. O primeiro elemento é o da dignidade humana e dos diretos humanos.

Já foi falado aqui, e todos os brasileiros sabem, que a saúde é um direito fundamental. Se a saúde é um direito fundamental, é ela que deve estar em pauta, é ela que deve ser tratada com toda perícia, com toda prudência, com todo vigor, e não só o elemento da doença. Nós temos que trazer esse elemento de doença, que é distintivo, que traz um quê de preconceito, para um tratamento diferenciado, um tratamento humanizado.

Os aparelhos sociais de proteção às pessoas com doenças raras devem levar em consideração que elas são tratadas a partir daquela trí-ade: a tríade da exclusão, a tríade do estranho, a tríade do pária, do que não pertence àquilo que nós normalmente portamos.

É preciso levar em consideração também, ao estabelecer políticas públicas para tratamento, para acompanhamento, para inclusão de pes-soas que têm doenças raras, a questão da responsabilidade social: todos somos corresponsáveis pela vida, pela qualidade de vida e pela saúde uns dos outros e, particularmente, dessas pessoas que são vulneradas. Essas pessoas não escolhem nascer com essas doenças, essas pessoas não escolhem desenvolver essas doenças, essas pessoas nascem em con-dições biológicas que são desfavoráveis, na maioria das vezes, àquilo que a gente considera normal.

O que é esse conceito de normalidade senão uma estatística bruta, senão uma média populacional que talvez não faça nenhum sentido?

Nós temos que parar para pensar que essas pessoas, na sua raridade, raridade de número, raridade de características das doenças, precisam ser consideradas quando se faz, por exemplo, desenho de estudos na universidade ou desenhos de linhas de atenção dentro do nosso Sistema Único de Saúde.

Nós temos necessidades muito peculiares. Destaco aqui, por exem-plo, a necessidade de se envolver em ensaios clínicos de pequenos números.

Ora, algumas dessas doenças, contando em números, acometem 5, 10, 100, 200 pacientes talvez no mundo inteiro, e todo o nosso desenho

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utilitarista de pesquisa, que visa o maior bem para o maior número pos-sível de pessoas, talvez não atenda à especificidade desse grupo, que é um grupo pequeno, que é um grupo de minoria.

Então, as políticas públicas, os desenhos experimentais, os desenhos de estudos devem levar em consideração que a raridade talvez seja uma falácia. Os números escondem muitos dos aspectos de qualidade de vida e dignidade humana que essas pessoas têm.

Por fim, é importante destacar, neste elemento responsabilidade social, a necessidade que o Brasil tem de gerar informação epidemioló-gica qualificada.

Nós conhecemos algumas iniciativas muito pontuais, como de alguns centros de estudo da Universidade de São Paulo, como de alguns estudos conduzidos pela Sociedade Brasileira de Endocrinologia, de algumas associações de pacientes, mas esses números, esses valores, essas estatísticas a respeito do número de pacientes de cada doença, de cada grupo específico, não são compartilhados. Então, precisamos de um sistema qualificado de informação que reúna essas informações e que divulgue esses dados.

O Sistema Único de Saúde só vai funcionar, as políticas só podem funcionar, não pela presença do prédio bonito, como já foi citado aqui, mas se a gente tiver informação qualificada para direcionar essas políticas.

Outro elemento extremamente importante, quando a gente olha a partir do ponto de vista da Bioética a questão das doenças raras, é a questão da igualdade, da justiça e da equidade.

As pessoas com doenças raras, dentro do Sistema Único de Saúde, têm um itinerário terapêutico perverso.

Cito aqui o exemplo do caro amigo Rogério, que recebeu o primeiro diagnóstico da doença de sua filha por um telefonema, por um check-list de um serviço de saúde.

Ora, o check-list de um serviço de saúde não dá o amparo humano de que essas pessoas necessitam. Nós precisamos ser responsáveis e tra-tar dessas pessoas com a equidade que elas merecem, não meramente distribuir políticas públicas sem levar em consideração as diferenças, a justiça que essas políticas públicas devem atingir. Precisamos tratar

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dessas pessoas com equidade e não com a frieza da máquina estatal que estabelece políticas no papel, mas que não são traduzidas nas práticas do mundo concreto, do mundo real.

Bem, é preciso levar em conta que essas pessoas, o tempo inteiro, são estigmatizadas também. Elas sofrem preconceitos por conta das suas doenças.

Ora, os prontos-socorros do Brasil, os serviços de atendimento médico estão lotados com aquelas mazelas que consideramos doenças negligenciadas. A dengue, por exemplo, todo ano tem recidivas e tem aumento o número de casos.

Ora, se o nosso Sistema Único de Saúde não consegue dar amparo nem a essas doenças que são historicamente conhecidas, quiçá dará conta desses pacientes que têm características muito peculiares, muito limitadas.

Então, é importante que as pessoas com doenças raras, com síndro-mes raras, não sejam tratadas a partir desse ponto de vista da distinção, do lugar, da distribuição, em números grandes, em populações grandes. Elas precisam, de fato, ser tratadas como portadores de dignidade, ine-rente a cada cidadão brasileiro.

É preciso também ter em conta, para estabelecer políticas públicas para essas doenças, que o médico geneticista não é o único profissional de saúde responsável pela manutenção do cuidado dessas pessoas.

Na semana passada, houve a publicação de um dado do Cremesp de que o número de médicos geneticistas no Brasil é só de 200 profissionais para atender o Brasil inteiro. Esse número não é suficiente talvez para atender o próprio Estado de São Paulo, quiçá o Brasil inteiro. Então, essa é uma especialidade médica rara dentro do contexto da atenção às doenças raras. Nessa raridade que se estabelece da atenção, do número de profissionais, como depositar só nos ombros desse profissional todo cuidado, toda atenção? Não é possível.

Diagnosticar também não é suficiente. Nós precisamos de um segui-mento no cuidado. Os pacientes precisam, sim, do amparo de equipes multiprofissionais. Eles precisam, sim, de atendimento psicológico, e não só os pacientes, mas seus familiares. A família sofre junto com esse paciente. Muitas vezes, os pais, os cuidadores, precisam de cuidado,

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porque eles abandonam as suas vidas profissionais e as suas carreiras. Às vezes, os casamentos fracassam em função disso. As famílias entram em conflito por conta do aparecimento dessas doenças. E não há amparo, por parte do Estado, para esse sofrimento que se estabelece para pacien-tes e seus familiares.

Destaco que o medicamento e o tratamento medicamentoso não são a única estratégia possível para acompanhar esses pacientes. Trago um exemplo, tirado de um livro de genética clínica.

Temos hoje ene estratégias disponíveis no mercado para atender a esses pacientes. O Brasil tem sido pioneiro na área de genética molecu-lar, na área de genética de doenças humanas. No entanto, a pesquisa não se tem traduzido, de fato, em resultados finais, no acompanhamento das famílias, no acompanhamento clínico desses pacientes, no acompanha-mento social desses pacientes.

Como nós da academia podemos fazer essa correlação entre a pes-quisa que desenvolvemos e o cuidado necessário?

O Brasil tem algumas políticas que têm funcionado de maneira ade-quada. Nós temos, por exemplo, a política de triagem neonatal, que faz o diagnóstico precoce de algumas dessas doenças raras. Contudo, onde acontece a continuidade do tratamento e a continuidade do cuidado?

A informação não existe. As pessoas, às vezes, procuram a universi-dade ou as associações de pacientes porque não têm estas informações: quem é o médico que pode tratar da doença, qual é o centro de refe-rência, a quem recorrer. Se nós não traduzirmos em informação para o grande público as políticas públicas já existentes, as pessoas não vão ter acesso a esses cuidados.

O Brasil tem iniciativas muito interessantes, como as que já foram citadas pelo Diretor da Anvisa e pela palestrante que me antecedeu. Como exemplo, há uma série de dispositivos na Internet para registros de ensaios clínicos e registro de recrutamento de pacientes. No entanto, não há clareza sobre o papel desses registros.

Cito a questão da Conep e dos CEPs. A Conep é formada por um grupo de especialistas, mas funciona precariamente. Por exemplo, o grupo de assessores que trabalha apoiando os especialistas da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa é precarizado. Eles não têm contrato e

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trabalham em condições adversas de saúde. Muitos precisam de afasta-mento, por conta de questões psicológicas, questões osteomusculares e demandas excessivas de trabalho. E não há amparo por parte do Minis-tério da Saúde para resolver a condição desses trabalhadores.

Ora, vemos que a perversidade no sistema de produção de conheci-mento científico, principalmente na questão dos ensaios clínicos, atra-vessa todo o sistema. Atravessa a Conep, atravessa a pesquisa nas uni-versidades e atravessa também o atendimento nos hospitais.

Vou acelerar a apresentação, devido à exiguidade de tempo.Já se falou da questão do estabelecimento de rede de cuidado para

esses pacientes, para haver clareza nos itinerários terapêuticos. Há um modelo muito interessante, o da Eurordis, um modelo descentralizado. Ora, não é preciso estabelecer em cada Município do Brasil um centro de referência absoluto para tratamento de doenças raras. Se conseguís-semos articular a nossa rede de cuidados e o transporte de pacientes em diferentes centros, poderíamos muito bem ter, por exemplo, um grande centro em fibrose cística no Rio de Janeiro, um grande centro de pes-quisa em esclerose lateral em São Paulo, um grande centro de doenças hematológicas no Centro-Oeste. E poderia haver o trânsito de pacientes nessa rede. Seria muito fácil fazê-lo dentro do nosso sistema. Falta um pouco de vontade política.

À guisa de conclusão, nós temos que cuidar dessas pessoas levando em conta a vulnerabilidade que têm e sua integridade pessoal. São pes-soas, são seres humanos que necessitam do nosso cuidado. A questão da solidariedade e da cooperação entre os pares nesse processo é essencial. As pessoas com doenças raras não podem virar espaço de disputa de governo, de indústria farmacêutica, de interesses políticos. O corpo, a vida dessas pessoas não pode ser elemento de disputa econômica ou financeira. Estamos lidando com seres humanos! (Palmas.)

Vou adiantar a apresentação, porque a doutora que me antecedeu já falou sobre esse tópico.

Neste momento, quero fazer um alerta para os Senadores e Depu-tados em relação às pesquisas clínicas no Brasil. Há uma confusão deliberada — por parte da mídia ou da indústria farmacêutica, não sei — acerca do que seja tratamento e pesquisa clínica. Pesquisa clínica é

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experimento; pesquisa clínica é desenvolvimento de medicamento, desenvolvimento de terapia. Tratamento é aquilo que já está consagrado pelas sociedades médicas, pelas sociedades científicas, e que vai promo-ver um efeito positivo sobre as populações.

Trarei, a seguir, um exemplo muito pontual, mas deixo para a Mesa uma proposta. Quero que os senhores prestem atenção, pois estou diri-gindo à Mesa um pedido: há necessidade de clareza, por exemplo, na relação entre a indústria farmacêutica, as associações de pacientes e os centros de pesquisa, na questão do recrutamento, de que já falei, na questão da transparência no SUS e na atenção multiprofissional.

Mas quero partir para a minha denúncia. Por conta da falta de transparência nas terapias experimentais e nas pesquisas, por exemplo, com células tronco, crianças e cidadãos brasileiros têm buscado trata-mentos fora do Brasil. As crianças têm buscado tratamentos que são experimentais, tratamentos que não têm fundamento científico. Essas pessoas estão se sujeitando a um agravo maior da saúde quando vão, por exemplo, para a China, em busca desses tratamentos que não têm base científica. E o fazem porque não encontram amparo no Brasil, por parte do Sistema Único de Saúde, para resolver a situação dessas famílias que, com toda a força, vão buscar tratamentos.

Precisamos um sistema de informação claro aqui. Não basta ter, de fato, um prédio bonito. Precisamos ter informação clara. Esse é o meu pedido, Deputado Romário e demais Deputados e Senadores presentes. No Brasil, precisamos muito mais do que um sistema de amparo clínico somente: precisamos de um sistema claro de informação, para acolher essas pessoas dentro do nosso Sistema Único de Saúde.

Obrigado. (Palmas.)O SR. APRESENTADOR (David Rayol) - Queremos anunciar a

saída da Mesa de autoridades do Sr. Deputado Marçal Filho, devido a compromissos oficiais agendados.

Registramos as honrosas presenças do Sr. Deputado Leopoldo Meyer e da Sra. Deputada Janete Capiberibe, aos quais agradecemos a vinda.

Neste momento, tem a palavra a Sra. Deputada Mara Gabrilli. (Palmas.)

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A SRA. DEPUTADA MARA GABRILLI - Quero muito parabe-nizar as últimas falas — e manifesto todo o meu respeito à Sra. Greyce — porque foram muito esclarecedoras.

Sinto profundamente a ausência, neste momento, de todos os Depu-tados e Senadores que estavam aqui no princípio, porque para nós que estamos trabalhando pela causa é muito importante saber que, por mais que pareça que está tudo bem, não está tudo bem.

Pergunto-me se estamos falando de doenças raras. Estamos falando de 15 milhões de famílias no Brasil! O que será que o Ministro da Saúde tinha de mais importante para fazer? (Palmas prolongadas.)

E não marcamos este evento ontem! O Deputado Romário e o Sr. Rogério Lima Barbosa, da Amavi — e parabenizo-os pela iniciativa —, vimos trabalhando nisso há muito tempo.

Sr. José Eduardo Fogolin, agradeço-lhe a presença. Considero que V.Sa. não tem absolutamente nada a ver com isso, foi chamado para participar, mas o Ministro deveria estar aqui, porque no ano passado S.Exa. se comprometeu em criar uma portaria. Gostaríamos de saber o resultado disso. E digo mais, Sr. José Eduardo. Se o filho ou a filha do Ministro tivesse uma doença rara, eu queria ver se S.Exa. não faria parte da demanda judicial! (Palmas prolongadas.)

Nós só temos demandas judiciais porque não temos política pública. E não temos política pública! Estamos falando de 8 mil casos de doenças raras! Muitas vezes temos casos como o dos dois irmãos que têm epider-mólise bolhosa, em São Paulo, e têm que fazer cirurgias e tratamento em Campinas, mas não têm transporte adequado.

Quando falamos de política pública, falamos de todo o entorno. E falamos que 80% dessas doenças raras são genéticas. Sabemos o quão devastador é para uma família conseguir um diagnóstico. E, quando existe um tratamento, ele é complexo e custoso. O SUS deveria ofere-cer medicamento, deveria oferecer condição, deveria oferecer cirurgia e atendimento clínico adequado. É isso que queremos.

Há 18 anos, quebrei o meu pescoço. Tive condição de fazer reabili-tação fora do País. Fiquei muito mal, porque foi uma lesão muito severa. Durante muito tempo respirei por meio de aparelho. Por conta de uma traqueostomia, eu também não falava. Enquanto eu estava nos Estados

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Unidos, dentro de uma clínica de reabilitação, ouvi a paciente do meu lado chorando. Ela chorava e dizia para a enfermeira que tinha medo de morrer. Passou a noite inteira acordada, chorando. No dia seguinte, de manhã, como eu tinha uma lesão medular e pouco entendia disso, fui perguntar para a enfermeira se eu ia morrer também. Ela me falou: “Não, essa moça tem esclerose lateral amiotrófica.” Foi a primeira vez que ouvi falar da doença.(A oradora se emociona.)

Foi naquele momento — e me emociono — que ressignifiquei a minha vida, porque entendi o que acontece comigo: a cada dia, eu luto por mais vida. Hoje tenho saúde, sou a primeira Deputada Federal tetra-plégica deste País, mas muitas pessoas que têm uma doença rara lidam todos os dias contra a morte. Por isso, não temos tempo.

Luciano, sou muito amiga da sua irmã. Hoje não ouvimos a voz dela, mas ela grita pelas redes, ajuda pessoas e faz campanha. Ela agenda para mim palestras em presídios. Da mesma forma trabalham a Alexandra e o Antônio Jorge — ele está ali em cima. Incansável, às 6h da manhã, ele já está distribuindo e-mail para todos os lados. O professor está pre-sente, veio para cá com toda a dificuldade. O Sr. José também está pre-sente, com toda a dificuldade. E o Ministro não veio... Para mim, são as ações dessas pessoas — como as da sua irmã, Luciano — que dignificam a existência humana.

Precisamos, sim, de muitos Deputados e Senadores, porque precisa-mos trazer visibilidade, precisamos trazer velocidade, precisamos trazer dignidade para quem tem alguma doença rara!

Narrei o dia em que ressignifiquei a minha vida, que foi o dia em que ouvi dizer que há doenças que hoje não têm cura, sobre as quais há muito pouca pesquisa. E nosso País tem condição, nosso País tem profissionais de primeira.

Sou Relatora do projeto de lei do Deputado Romário que desbu-rocratiza a questão da pesquisa. Os pesquisadores que fazem pesquisa científica nos Estados Unidos encomendam o insumo de laboratório de manhã, e à tarde o insumo já está lá. No Brasil, o insumo demora meses para chegar, porque fica preso. Fica preso por causa da Receita Federal, fica preso na alfândega do aeroporto, fica preso por causa da Anvisa. Não chega. Nossos profissionais aguerridos, que estão trabalhando,

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querendo promover pesquisa científica, ficam parados, esperando. E as famílias que têm alguém com doença rara ficam paradas, esperando. Não podemos mais esperar!

Eu agradeço profundamente a todos pela presença, que dá a nós, Parlamentares, força para continuarmos a lutar pela pesquisa científica, a lutar por tratamentos e pelo transporte, pela capacitação dos profis-sionais, pela informação, pelo bom atendimento. É tudo de que precisa-mos. Para conseguirmos trabalhar, precisamos de vocês.

Por isso, agradeço a presença àqueles que vieram, mesmo com dificuldades.

Muito obrigada pela presença. (Palmas prolongadas.)O SR. APRESENTADOR (David Rayol) - Conforme nossa progra-

mação, anunciamos a palestra sobre política de atenção às pessoas com doenças raras.

Convidamos a esta tribuna, para abordar o tema, o Dr. José Eduardo Fogolin Passos, Coordenador-Geral de Média e Alta Complexidade do Ministério da Saúde.

O SR. JOSÉ EDUARDO FOGOLIN PASSOS - Novamente, boa tarde a todos e a todas.

Eu gostaria de agradecer a todos que me precederam, em relação a esta apresentação, aos colegas e à Sra. Deputada.

Quero dizer a todos, em especial àqueles que sabem o que estou dizendo, que o ano de 2012 foi marcante na minha vida profissional. Consegui chegar ao final de 2012 e olhar o que fizemos durante todo o ano, um trabalho realmente muito frutífero. A minha formação — acho que este é o momento não somente de falar como gestor, mas de abrir o coração — foi na área médica, mas posso dizer a todos que, no ano de 2012, com as associações, consegui aprender mais do que colocar na escrita da política.

Fazer política pública dentro do Sistema Único de Saúde é um grande desafio, e grande desafio é também para cada um dos familiares e pacientes. Eu soube aprender que a gente consegue, em cada ponto, crescer e avançar juntos.

Nesse processo, em que estamos juntos, eu gostaria que todos os que estamos aqui, Deputado Romário, lembrássemos o dia 27 de janeiro de

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2013, data que marcou o País, quando ocorreu o incêndio na boate Kiss, em Santa Maria. Estive presente, desde domingo, nessa boate. De 577 jovens e crianças que foram atendidas e dos mais de 80 pacientes gra-ves que estiverem presentes nas UTIs, infelizmente seis pacientes foram a óbito. Mas o que fez a grande diferença para aquele atendimento, Deputado Romário, foi a união de todos os profissionais fisioterapeutas, médicos e socorristas que fizeram o atendimento às vítimas.

Faço essa lembrança e essa comparação porque a política que venho mostrar a todos vocês foi fruto de uma união, não foi feita puramente pelo Ministério da Saúde, mas, principalmente, pelos atores que estão aqui e que apresentam esta política. São os atores representantes das associações de usuários e especialistas, dentro do contexto de uma polí-tica integral, de uma política realizada com todos os movimentos pre-sentes, para aqui apresentarmos uma política que é ponto de partida, Deputada, e não ponto de chegada, e para darmos qualidade ao Sistema Único de Saúde.

Fico muito entusiasmado com todo o diálogo. O Sistema Único de Saúde é belo pelo propósito do diálogo, da apresentação dos desafios, de críticas. É dessa forma que conseguimos avançar dentro do Sistema Único de Saúde, um sistema que tem que crescer e evoluir em vários pontos. Mas temos que lembrar também as suas virtudes, as suas virtu-des do Brasil de ser o único País com mais de 100 milhões de habitantes que ousou gerar uma política pública universal e gratuita. Mesmo com os vários pontos que precisamos aumentar, é um país que ainda conse-gue ofertar mais de 3,2 bilhões de procedimentos por ano e que tem o maior número de transplantes de órgãos em serviços públicos realiza-dos dentro do Sistema Único de Saúde.

Quero me referir à fala do Prof. Dr. Natan, ao dizer que, dentro desse contexto, realmente temos alguns desafios em algumas áreas, seja na infectologia, seja no controle de algumas doenças transmissíveis, mas nós temos, sim, grandes avanços. Como no transplante e no Pro-grama Nacional de Imunização nós avançamos, sem sombra de dúvida, no contexto de uma política de atenção de doenças raras, nós temos total capacidade de gerar maior cuidado aos pacientes e familiares.

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Todos pautaram, nas apresentações anteriores, que não é o trata-mento que traz qualidade assistencial no contexto de doenças raras. Vou mostrá-lo a vocês brevemente. Minha apresentação é longa, e eu gosta-ria de ficar durante um grande período apresentando-a. A política foi feita durante o ano todo, e não vou conseguir apresentar a todos vocês, em 15 minutos, todo o contexto que a gente desenvolveu.

A diretriz do Ministério da Saúde, desde o início de 2011, foi justa-mente prover ações em serviço de saúde, não apenas políticas pautadas em tratamento e procedimento, mas também através de organização e desenvolvimento de redes de atenção à saúde.

Eu faço este preâmbulo, inicialmente, porque é importante que todos aqui visualizem qual o caminho que as políticas públicas hoje no Brasil estão trilhando e qual o caminho que nós estamos percorrendo para que toda essa política chegue e dê acesso com melhor qualidade a toda a população. Hoje nenhuma política sai ou é gerada no Ministério da Saúde, se não for com base nesse conceito.

Eu quero trazer esse conceito para que todos vejam como foi gerada a Política de Atenção às Pessoas com Doenças Raras. Foi dentro de um conceito de arranjo organizativo que não era puramente uma política de doenças raras que apenas descrevia um tratamento, mas se utilizava todo o conceito do arranjo organizativo.

Eu quero deixar caracterizado aqui o que é essa rede de atenção, e vou me pautar nesse eslaide, já que a apresentação é longa, para explicar a todos vocês o que é a rede de atenção.

Essa rede de atenção é importante justamente por formar relações horizontais entre os pontos de atenção. Até então, quando a gente falava em atenção básica ou atenção em primário à saúde, e na questão secun-dária e terciária, a gente focava no contexto hospitalocêntrico do aten-dimento. O nível terciário, por ter mais complexidade, tinha até então a sua maior importância no contexto da atenção básica. Mas cada cidadão vive no Município, não no Estado, não na União.

O ponto mais próximo de acesso para esse cidadão é a atenção básica. Se tivéssemos pautado a atenção no contexto apenas da alta complexidade, ainda a política de atenção a doenças raras não daria acesso a toda essa população. Um dos pontos primeiros dessa política é

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empoderar a atenção básica, para que seja o primeiro acesso aos familia-res e pacientes com doenças raras e que possa, nesse ponto de atenção, indicar e dar o primeiro suporte a esses usurários do Sistema Único de Saúde, além disso, centrar na necessidade, e não pautar em cima daquilo que se oferta atualmente, mas, sim, na necessidade do usuário.

A oferta recorta a sua demanda. Se nós não nos pautássemos na necessidade do que temos em relação ao usuário, não conseguiríamos atingir a plenitude da sua essência da política.

A responsabilização continua e é integral. Não basta encaminhar, não basta fazer diagnóstico, não basta fazer uma referência como profis-sional médico, se a linha do cuidado não garantir ao usuário, ao paciente com doença rara, seja reabilitação, seja orientação, seja informação e até o tratamento. Nós não conseguiremos ser universais e equânimes no contexto da atenção e da política das doenças raras.

O cuidado multiprofissional e sair da lógica médica, centrada. O cui-dado por multiprofissional é que vai garantir, de fato, ao paciente a plena necessidade daquilo que precisa em relação a cada tipo de doença rara, a cada tipo de necessidade de reabilitação, a cada tipo e a cada momento em que ele precise, e não apenas numa prescrição médica. Além disso, é preciso compartilhar objetivos e compromissos com resultados sani-tários. Não basta publicar essa portaria. Ela não será publicada para que o gestor local apenas a execute. Ela vai ser monitorada. É por isso que não foi puramente o Ministério da Saúde que a construiu, mas, sim, um grupo de pessoas, um grupo de representantes de usuários e um grupo de especialistas. Eles se debruçaram durante o ano para fazer uma polí-tica de atenção a doenças raras.

(Segue-se exibição de imagens.)Aqui eu só mostro as evidências, o que é a rede. O Fogolin falou do

contexto de rede, mas as evidências comprovam a melhoria no contexto de se pautar política pública e rede.

A rede de atenção traz a necessidade de uma linha de cuidado. O que é essa linha de cuidado? Cada ponto de atenção, seja unidade básica de saúde, seja atenção especializada — eu vou comentar sobre os ser-viços e centros de atenção a pessoas com doenças raras —, cada ponto dessa rede de atenção tem que ter uma linha. O paciente e o familiar

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vão percorrer essa linha de cuidados. Desde o contexto de haver a hipó-tese de esse paciente ser acolhido dentro da rede, essa linha de cuidado visa coordenar o contínuo assistencial, e o financiamento será dentro do contexto dessa linha. Não basta fazer o diagnóstico. A linha de cuidados nas doenças raras pressupõe a resposta global dos profissionais e deve ser implementada a partir da atenção básica de saúde.

Ela tem duas funções fundamentais: ordenar o fluxo e orientar o fluxo do usuário dentro desse sistema. Não se trata de fazer a lógica de que o usuário procure através da sua necessidade, mas, sim, que ele seja orientado por essa rede.

O Ministério da Saúde já desenvolve diversas redes que foram imple-mentadas: a rede cegonha, no contexto de atenção obstétrica e neonatal; a rede de atenção às urgências e emergências; a rede de atenção psicos-social; a rede de atenção oncológica; a rede de atenção às pessoas com doenças crônicas; e, no ano passado, a rede de atenção às pessoas com deficiência.

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Cada uma dessas redes faz uma inter-relação, ou seja, a política de atenção às pessoas com doenças raras terá necessidades, no con-texto da reabilitação, e a rede de atenção às pessoas com deficiência, no Programa Viver sem Limites, através dos centros especializados de reabilitação, fará a complementaridade nesse cuidado. A política está plantada sobre uma base de redes assistenciais. A política de atenção às pessoas com doenças raras tem um contexto transversal de qualificação e educação permanente dos profissionais. Ela tem uma regulação e uma governança dentro desses processos no pacto interfederativo do Sistema Único de Saúde. Há uma pauta específica do contexto da informação, da incorporação tecnológica e da promoção de saúde.

(Segue-se exibição de imagens.)As doenças raras, como previamente mencionadas, caracterizam-

-se por diversos sinais e sintomas em cada paciente, variam de doença para doença, mas também de pessoa para pessoa acometida pela mesma condição. Há manifestações relativamente frequentes que podem simu-lar, em diversos pontos, numa porta de urgência ou numa atenção espe-cializada, ou com um neurologista avaliando, sintomas que a mascaram. Hoje não se consegue diagnosticar precocemente, e não apenas diag-nosticar naquele ponto, mas indicar aos pais e familiares desses usuários qual ponto ele deve seguir, para onde ele deve ir, qual o próximo passo dessa rede.

São doenças geralmente crônicas, progressivas, degenerativas e até incapacitantes, que afetam fundamentalmente a qualidade de vida des-sas pessoas e dos seus familiares.

As doenças raras foram definidas dentro da nossa política. O grupo definiu, sim, o contexto em relação ao que é doença rara, de acordo com a Organização Mundial de Saúde, e o documento sai com essa definição para o Sistema Único de Saúde. Ela afeta até 65 pessoas por 100 mil indi-víduos ou 1,3 a cada 2 mil. Essa é a definição que será utilizada dentro do contexto da política pública. Ela tem 80% de causas genéticas e 20% de causas que não são genéticas. Isso é importante para vocês visualiza-rem como nós dividimos os eixos de cuidados.

Nós temos um número que varia de 6 mil a 7 mil doenças raras que afetam até 8% da população. Individualmente, elas são raras, mas, como

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um grupo, são significativas nesse contexto, e há uma característica fun-damental: o pouco conhecimento médico, decorrente não somente do sistema hoje implementado, mas também da formação do profissional. Não estou falando só da formação médica, mas da formação da socie-dade como um todo. Essa informação não deve estar somente na área da saúde. Ela perpassa o contexto da área de saúde e avança no contexto da implementação da política, que é um contínuo ascendente para que se possa gerar mais informação.

(Segue-se exibição de imagens.)Nós não tínhamos, há certo tempo, informações sobre infarto agudo

do miocárdio, e hoje nós temos. Nós vamos fazer o mesmo processo em relação à atenção às pessoas com doenças raras, com algumas doenças. A informação é parte do processo de continuidade na implantação da política. Há poucos diagnósticos, o que cria dificuldades. Não se trata apenas do tratamento medicamentoso, mas do diagnóstico, para que se possa iniciar a reabilitação e orientar a família dentro desse contexto. São pouco tratadas, e há poucos investimentos até então nesse contexto.

No dia 26 de abril de 2012, foi instituído um grupo de trabalho coordenado pelo Ministério da Saúde, em especial pela Coordenação de Média e Alta Complexidade. Foram realizados encontros durante todo esse período, e nós tínhamos três prioridades dentro desse grupo de trabalho. Primeiramente, instituir a política nacional de atenção às pes-soas com doenças raras no âmbito do Sistema Único de Saúde; elaborar dois documentos norteadores e finalizá-los nesse período; e propor a inclusão de procedimentos e de exames na tabela do Sistema Único de Saúde, bem como revisar exames já existentes para que se possa fazer o diagnóstico precoce dessas doenças.

Esse grupo era constituído de representantes do Ministério da Saúde, de representantes de especialistas, com componentes titulares e suplentes, e de representantes de associações de entidades de usuários. Duas entidades, em especial, participaram. O Rogério, que estava fora do País, participou desse grupo de trabalho em algumas ações, por-que ele tinha sua representatividade. Ele estava fora, em estudo, mas participou desse grupo de trabalho. Além disso, havia os suplentes dos

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representantes. Quando esse grupo começou o trabalho, nós chegamos a algumas constatações.

A política em si não partia do zero, não partia do início de uma construção. Dentro da rede do Sistema Único de Saúde, nós temos pon-tos de atenção, hoje, seja em universidades, seja em ambulatórios, seja em alguns pontos de reabilitação, que fazem o cuidado às pessoas com doenças raras. Nós não criaríamos nada novo, porque, dentro do Sis-tema Único de Saúde, nós organizaríamos esse processo e criaríamos com base na necessidade, e não a partir do zero, como inicialmente começamos a avaliar a proposta, porque nós temos, em algumas regi-ões, estruturas que fazem o atendimento, e nós temos que qualificar essa assistência dentro do componente da rede.

Nós precisávamos de uma política abrangente, que não ficasse pau-tada apenas no diagnóstico e no tratamento. O passo inicial era que se começasse a implementar a política, mas que ela fosse um contínuo, que ela pudesse ter seus desdobramentos à medida que fosse implementada, que fosse encontrando dificuldades nas regiões, e que ela fosse se modi-ficando. Essa é a lógica do Sistema Único de Saúde.

A reforma sanitária e a implementação do SUS sempre se deram nessa lógica de transformação das suas políticas, e não vai ser diferente com a política de atenção às pessoas com doenças raras. No ano de 2013, ela será implementada e avaliada; no ano de 2014, ela precisará ser adequada, e assim sucessivamente, a depender da pesquisa clínica e do que precisar ser incorporado. Esse é o contínuo crescente de uma política pública.

Associar os serviços hoje existentes com as associações — e as asso-ciações têm papel fundamental não apenas em divulgar a informação, mas também em capitanear diversas informações – foi um trabalho extremamente gratificante. É muito gratificante ter esse reconheci-mento, ter as informações dessas entidades e desenhar uma política que sirva tanto para o contexto de doenças genéticas como para o contexto de doenças não genéticas.

Nas constatações, como se mencionou, o Governo Federal, através do plano Viver sem Limites, vem implementando uma rede de atenção às pessoas com deficiências, e, nesse contexto, a política de atenção às

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pessoas com doenças raras não cria novas redes de atenção às pessoas com deficiências. Ela utiliza essa rede que está sendo implementada para também fazer o seu contínuo de integralidade do cuidado.

O Programa de Alimentação e Nutrição do Governo Federal se dá por meio de fórmulas alimentares que desenvolvam os protocolos clí-nicos para atender a algumas necessidades de algumas doenças raras. Além disso, toda incorporação tecnológica, tudo que for necessário para o diagnóstico, para o tratamento, dentro da Comissão Nacional de Incorporação Tecnológica, tem prioridade na atenção às pessoas com doenças raras, para atender ao que essa política demandar. A política envolve esses pontos de atenção.

Esta é a estrutura da política: a atenção básica, como ordenadora de todo esse sistema; a atenção domiciliar, um novo programa do Governo em que os pacientes que necessitam de cuidados domiciliares têm uma equipe específica para esse cuidado; a atenção especializada, hospitalar ou ambulatorial; e os centros especializados de reabilitação e aconse-lhamento genético. Essa é a estrutura base dos pontos de atenção dessa política.

A política foi-se desenvolvendo dentro do grupo de trabalho depois de várias reuniões, até definir quais eixos seriam seguidos, conside-rando-se que existem 8 mil doenças. Por onde começaríamos? Pauta-mos o seguinte: vamos dividir essa política no contexto da atenção em dois grupos. Nós temos um grupo de doenças genéticas e um grupo de doenças raras de origem não genética. Nessa lógica, cada um dos grupos teria alguns eixos estruturantes. Em relação à doença genética, há um eixo que se relaciona a anomalias congênitas, um eixo de deficiência intelectual e um eixo de erro inato do metabolismo. Em relação às doen-ças não genéticas, há um eixo de doenças raras de origem infecciosa, outro de autoimunes e outro de inflamatórias.

A política tem, dentro da atenção básica, funções, critérios de enca-minhamento e interfaces recomendadas. Na atenção especializada, também há alguns critérios de encaminhamento, tanto para a atenção básica quanto para outro serviço de especialidade, procedimentos espe-cíficos e fundamentalmente o apoio e o diagnóstico.

(Segue-se exibição de imagens.)

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A atenção especializada vai ser responsável, na sua estruturação, por ações diagnósticas e terapêuticas de indivíduos com ou sob o risco de doenças raras. Aí, sim, cria-se o serviço de atenção especializada em doenças raras e o centro de referências em doenças raras. Como disse também o Prof. Natan, não existe a necessidade de haver um centro ou um serviço por município, mas, sim, centros e serviços referência no estado ou referência na região, dependendo da doença específica e do seu processo regulatório.

Em relação ao conjunto gestor, a política deverá, em conjunto com os gestores do SUS e as associações civis, promover educação pública aos profissionais de saúde, alcançar a compreensão da diversidade humana, a extinção do preconceito e garantir o acolhimento e o enca-minhamento. Esse é o pressuposto do que está dentro do contexto da política, e o documento norteador traz essa prerrogativa.

O fluxo dentro dessa política tem as suas portas de entrada, que podem se dar a partir do momento em que o familiar encaminha o seu paciente para qualquer ponto de atenção, unidade básica ou para as unidades ambulatoriais. A porta de entrada pode ser a unidade básica de saúde ou de serviço especializado, e até de um serviço que atenda doenças raras. Se determinado serviço atende doença rara, ele acolhe o paciente que não faz o acompanhamento dessa doença e o encaminha para outro serviço que o faça. Então, no serviço de atenção especiali-zada, seja serviço, seja centro de referência, faz-se o rol do diagnóstico, o acompanhamento, a avaliação e a evolução, que é o pressuposto da obrigatoriedade desses serviços e centros.

Dois documentos norteadores foram finalizados. A consulta pública dura 30 dias. A consulta pública tem o papel fundamental de ouvir a sociedade, que não participou desse grupo técnico, sobre a política. Ela ficará em consulta pública no mês de março, para que em abril ela seja finalizada e levada para um grupo de trabalho ampliado. Eu vou expli-car o passo a passo para que os senhores possam acompanhar a publica-ção dessa política pública.

Para habilitar serviço de atenção especializada, esse serviço, ou os serviços ou centros, precisa de uma necessidade dentro do rol de habi-litação dos serviços, para que tenha o financiamento do Sistema Único

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de Saúde. É preciso um planejamento gestor local, um processo de habi-litação que a gente otimiza dentro do contexto das doenças raras, uma estrutura assistencial, uma equipe de profissionais e uma estrutura física instalada.

Os serviços de atenção especializada ofertarão atenção diagnóstico--terapêutica para uma ou mais doenças raras. A equipe mínima que tem de compor um serviço perpassa pelo profissional enfermeiro, o técnico de enfermagem e o médico responsável do serviço de atenção à pessoa com doença rara, mas ele deve ter complementar...

Estão pedindo que eu conclua, mas eu gostaria de terminar, depu-tado, para que a gente possa apresentar a própria política que vem sendo desenvolvida.

A equipe complementar deve ter acesso a todos esses outros compo-nentes dentro da rede. Então, o gestor que encaminhar para o Ministé-rio da Saúde para habilitar o serviço de referência em atenção às pessoas com doenças raras tem de apontar a equipe mínima necessária para ter o seu financiamento específico e, também, a equipe complementar den-tro da rede de atenção.

O centro de referência vai ser um estabelecimento de saúde apto também a firmar o diagnóstico e o tratamento, mas ele vai ter um acom-panhamento clínico multidisciplinar, apoiar a elaboração de protocolo em doenças raras, ter estrutura de ensino e pesquisa organizados e apoiar, no processo formativo da doença rara, o gestor competente que está habilitando aquele serviço. Isso gera o processo de informação e captação de toda a rede.

Ele tem de atender minimamente a dois eixos do grupo de doenças de origem genética ou, no mínimo, a dois eixos entre as duas raras gené-ticas e não genéticas, ou um eixo do grupo de doenças raras genéticas e um grupo de doenças não genéticas. Isso vai estar explicitado dentro do componente de habilitação. Ele tem uma equipe mínima assistencial. Além disso, uma equipe complementar de acesso para dar continuidade e integralidade ao cuidado, seja em cirurgia que seja demandada por determinada doença rara, seja pela garantia de acesso a outras catego-rias profissionais, para também ter a integralidade desse cuidado.

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Dentro das diretrizes da atenção integral de doenças raras, tem de se discutir o acesso ao recurso diagnóstico e clínico, essa é a diretriz fun-damental. Então, o primeiro documento norteador vai pautar como que se estrutura essa rede e como se habilita essa rede para o funcionamento dentro do Sistema Único de Saúde.

O segundo documento norteador traz as diretrizes da atenção inte-gral em doenças raras, que tem, dentro da atenção integral, todas essas características que o documento norteador traz, explicitando em rela-ção à própria consulta.

Eu posso afirmar a todos vocês que, com a consulta pública e a implementação dessa política, nós teremos uma política de atenção às pessoas com doenças raras. Não se trata apenas de divulgar as doen-ças raras, não se trata apenas de informar à comunidade a saúde dos seus pacientes, não se trata apenas de alertar os profissionais de saúde sobre como atender, não se trata apenas de lutar contras os preconcei-tos. Trata-se de acolher e atender de maneira integral as pessoas com doenças raras.

Essa política vai promover tanto a divulgação quanto a informação e chamar a atenção para as doenças raras no Sistema Único de Saúde.

Só para pautar os marcos, deputado, a consulta pública é lançada agora em março — na primeira semana de março ela vai para a consulta pública. Amanhã nós temos outro evento e, na semana seguinte, essa proposta vai para a consulta pública. O dia eu não posso afirmar aqui, porque sai do jurídico, e é o trâmite interno, mas ela já está consoli-dada, e o grupo de trabalho tem ciência disso. O grupo de trabalho está acompanhando.

Foi uma definição do grupo, não uma definição do Ministério da Saúde, mas do grupo de associações ou de especialistas. Quem geren-ciou não foi o ministério, foi o grupo técnico que definiu que a con-sulta pública fosse após a finalização desses eventos de fevereiro. Os dois documentos norteadores serão colocados em consulta pública. Toda a sociedade vai criticar, apontar suas necessidades, e essa consulta pública retorna. E, em abril, fica 30 dias em consulta.

O grupo técnico — as associações que participaram — consolida as informações e realizaremos um GT ampliado dentro de um coletivo,

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para que possamos afinar e ouvir outras entidades e associações. Daí ela vai, dentro da lógica do Sistema Único de Saúde, para a pactuação tri-partite, que é o colegiado intergestor tripartite, onde todos os gestores, secretários municipais e estaduais, aprovam a política para ser imple-mentada no Sistema Único de Saúde.

Para que essa política seja implementada, o Ministério da Saúde não tem autonomia de publicar portaria sem pactuar com gestores. Caso contrário, ela não tem efetividade, precisa pactuar no colegiado inter-gestor tripartite para ser implementada. Finalizando, todo esse contexto traz a necessidade de que, criada a portaria, nós a acompanhemos para que ela seja realmente implementada dentro do contexto de gestão. Além disso, criar unidade entre as diversas associações, para que pos-samos acompanhar todo esse processo, perseverança dentro desse con-texto como até agora e, como contexto de uma política, possamos virar o contexto da página do Sistema Único de Saúde.

Com a conclusão, o Sistema Único de Saúde vai implementar uma política que servirá de modelo para o mundo. Não vai ser uma política apenas de informação, mas vai ser a primeira política que organizará a rede do cuidado. E aí traz, como foi dito pelos profissionais anteriores, não apenas o tratamento e diagnóstico, mas também o acolhimento e o acompanhamento dos familiares.

Foi uma grande experiência durante 2012, Deputado Romário. E o Ministério da Saúde, após o evento do ano passado nesta Casa de Leis, realizou, implementou, discutiu entre as associações e trouxe para esse evento... Eu fico muito contente de estar aqui representando o Ministro da Saúde, porque acompanhei e participei desse grupo pessoalmente na discussão da política. Após um ano, estamos apresentando nesta Casa de Leis uma política pública que tem o contexto do financiamento e contexto principal, que é o de acolher os pacientes com doenças raras e seus familiares.

O Sistema Único de Saúde obteve vários avanços durante esse perí-odo. Essa política do Sistema Único de Saúde, sem sombra de dúvida, marcou minha vida profissional.

Obrigado a todos. (Palmas.)

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O SR. APRESENTADOR (David Rayol) – Queremos registrar as honrosas presenças do Sr. Deputado Jean Wyllys e da Sra. Deputada Erika Kokay, que, logo após a última palestra a seguir, farão uso da palavra.

Agora chamamos à frente para proferir a última palestra o Sr. Rogério Lima Barbosa, representante da Associação Maria Vitória — AMAVI, que abordará o tema “A necessidade de um programa para doenças raras”, pelo tempo regulamentar de 1 minuto.

O SR. ROGÉRIO LIMA BARBOSA – Boa tarde a todos. Eu quero começar primeiro agradecendo a todos pela presença e me desculpar pelo uso da minha mochila aqui à frente, porque à época em que eu usava terno e gravata, eu era um consultor, eu achava o terno um prote-tor e hoje a minha proteção é a mochila e o tênis.

Isso é para lembrarmos que nós não estamos aqui sozinhos. Eu quero lembrar algumas pessoas que estão comigo desde o início e, por algum motivo, não estão aqui hoje ou podem estar e eu não as vi.

A Dra. Cecília Micheletti, de São Paulo, esteve comigo desde o início, a Simone está aqui, conversou comigo desde o início também, a Marlene, a Magda, a Marta, a Regina, a Adriana Dias. Enfim, todas essas pessoas estão não só comigo, mas fazendo um trabalho, há muito tempo, que está culminando aqui hoje. Todas elas são mulheres.

E volto a lembrar o porquê da mochila. Eu não estou aqui porque eu quero. Eu não estou aqui porque um dia eu pensei em ser presidente da associação. Eu estou aqui por necessidade. Eu estou aqui porque uma doença rara entrou na minha vida e aí eu decidi ir para frente. Muito obrigada, deputada, pelas suas palavras. Elas são muito relevantes.

O que me trouxe aqui hoje... Voltando às mulheres, outra mulher a quem eu devo muito é a Profa. Tânia Mara, da UnB, quando eu fiz mestrado como aluno especial de Sociologia. Ela me deu o impulso para criar uma associação e realmente fazer um envolvimento social com as mães que têm os seus filhos, que estão com eles, precisam deles, e, como todas as outras mães, têm que trabalhar, para lhes dar uma boa escola, um bom plano de saúde. E, por escolha, por opção, por necessidade foi criada essa associação. Essas mães que sofrem com doenças raras são

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as esposas que veem seus maridos e filhos, de alguma forma, longe de suas casas.

Desde o início, Fogolin, a Amavi esteve muito presente no grupo de trabalho, mas nunca deixou de falar o que ela pensa. E eu fico muito feliz de saber que isso não é novidade, porque o nosso emailing passa para todas as associações e para o Ministério de Saúde. E, como mexemos com tanta coisa, de vez em quando para pensar: “Será que eu deixei de falar com tal pessoa? Será que eu deixei de falar com o Ministério da Saúde?” Não, não deixei, porque esta semana o Dr. Helvécio me mandou um e-mail justamente sobre o informativo que nós enviamos, e falou assim: “Rogério, bom encontro para vocês.”

Então, o Ministério da Saúde sabe que ele é o coordenador do GT e sabe que nós sempre teremos uma parceria, desde que a independência do diálogo seja respeitada.

Para eu me acalmar um pouco, eu quero pedir uma salva de palmas para todo mundo que está aqui hoje, porque foram os senhores que defi-niram a minha vinda aqui. (Palmas.)

Peço desculpa também porque eu não vou fazer a apresentação que eu havia programado. Às vezes, somos colocados numa situação que não queremos, mas não podemos recusar pela responsabilidade que criamos.

O GT está funcionando, tem que ser apoiado, e temos que lembrar que ele é uma demanda social. Não foi uma imposição ou um evento que veio do Ministério da Saúde, como a Portaria nº 81, que foi por ele criada, mas não foi implementada.

O GT que está sendo criado pela sociedade vai ser realmente imple-mentado? Por que o Prof. Natan, do Departamento de Saúde Coletiva da UnB, não conseguiu encontrar nenhuma informação do GT na rede? Por que ele teve que me ligar para saber o que estava aconte-cendo no GT? Por que os profissionais da comunicação não encontra-ram nenhuma informação? O que está acontecendo? Por que o GT não anda para frente? Por que o horário das passagens era muito cedo, de madrugada, para as pessoas virem? Por que tudo isso acontece? Temos que perceber isso e que dentro do contexto que o Ministério da Saúde utiliza... E, na academia, quando falam que não existe plano implantado

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nessas áreas, eu vou ter que rever tudo o que leio, porque os índices de 6%, 8% citados pelo Fogolin são da Eurordis. E a Eurordis fala que tem plano de saúde implantado na França e outros planos de saúde em implantação na Europa.

Então, nós perguntamos: o que está acontecendo? Onde é que está o erro? O que eu estou fazendo? E dentro desse contexto das doenças raras, vindo para o contexto somente acordar para enxergar, há vários interessados nesse meio. O governo é muito interessado, e eu parabe-nizo o Ministério da Saúde por não só proteger o diálogo aberto, mas também por incentivá-lo. O governo também conversa com o mercado. O mercado desenvolve as medicações.

Mas por que há medicação para 3% a 5% das doenças raras? Por que as associações mais raras às vezes são mais estruturadas que as associa-ções menos raras. A neurofibromatose é a doença que eu vivo. A neu-rofibromatose, dentro daquele conceito, é de 1 a 2 mil. Por que não tem nada?

Eu quero fazer uma pergunta, tirando a Simone, a Regina e a Lilian, de São Paulo. Existe alguém que convive com a neurofibromatose fora de Brasília? Por que isso acontece? Por que, se é a doença mais comum das doenças raras? E também tem a academia. Eu, como acadêmico, pergunto: por que falamos que tem que empoderar as associações desde que seja da forma que queremos? Quem disse que as associações não sabem o que elas querem?

A Eurordis hoje coloca que quem sabe o que acontece, quem pode contribuir muito são as associações de pacientes. Hoje, Fogolin, criou-se a necessidade da rede, Canadá, Estados Unidos, Japão, Rússia. Monta-ram uma rede de atendimento para pacientes com doenças raras. O que é simbólico nessa rede de atendimento? O que ela diz? Que nenhum país pode querer tratar todas as doenças raras, nenhum país pode que-rer ser o suprassumo das doenças raras. E o Brasil tem o SUS. Eu uso o SUS. Minha filha é hoje atendida pelo hospital de apoio. Já faz algum tempo, há um ano ela está sendo atendida pelo SUS.

No Ministério da Saúde, realmente, será que todos lá utilizam o SUS, veem ele na prática? As pessoas com doenças raras muitas vezes conhecem sua doença pelo hospital universitário, ou seja, pelo SUS.

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Então, queremos o SUS, acreditamos no SUS, acreditamos mais ainda num SUS democrático, acreditamos mais ainda num Ministério da Saúde democrático, que incentive o diálogo.

Não tenho dúvida de que, a partir do dia em que as doenças raras realmente forem encampadas pelo movimento social, pelo Ministé-rio da Saúde e por todos os interessados, nós poderemos até mudar a nomenclatura de doenças raras. Porque doenças raras nem todos enten-dem o que é. Então, por que não mudar? Por que não mudar o que nós temos hoje em vez de só consolidar o que existe hoje na rede? Por que não pensarmos grande e sermos exemplo? Por que o que está fora não é para ser usado aqui dentro. Todo mundo sabe. O Brasil é aquilo tudo que o Fogolin mostrou. O que está fora é só um balizamento. Nós temos certeza de que quando assumirmos e entendermos o que está aconte-cendo, conseguiremos fazer uma coisa melhor.

É por esse entendimento que a Amavi fala tanto em informação. Nós não sabemos nada hoje. Nós não sabemos o que está acontecendo. Nós não sabemos quem são os pacientes. Nós não sabemos quais são as associações. Hoje, se eu conseguir montar uma associação, falar que represento um monte de gente, e for para o Twitter, para o Facebook, e disser que sou a associação mais representativa do mundo, é muito provável que as pessoas acreditem.

Como podemos conhecer isso? Quem são esses pacientes? Onde eles estão? A definição usada pela OMS... Um dia vamos chegar — Fogolin, antes de tudo, eu tenho que falar que tenho muito apreço por você — e dizer: “Olha, pessoal, o que entendemos, nós Ministério da Saúde, não nós OMS, é isso como doenças raras.” Não precisa ser em índice. Pode ser em índice, lógico, porque tem a incidência. Mas só que não pode no início, como é confuso, nós encontrarmos no site do governo que é 1% em 2000, e depois falar que é 1,3% em 2000.

Então, há essa série de nuanças. O governo tem o seu interesse, o mercado tem o seu interesse, a academia tem o seu interesse, e a socie-dade tem o seu interesse. E eu tenho, eu tenho o meu problema, eu tenho o que eu faço.

A sociedade e principalmente as associações têm que entender e saber que a voz é delas, a voz não é de outro, têm que saber o que é tratar

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e o que é fazer com informação, têm que saber o que é instrumentali-zação do governo na associação, do mercado na associação, têm que entender que tudo o que nós falamos é para o paciente.

Então, há o enxergar, o acordar para enxergar. E aí eu devo lembrar que estou há um pouco de tempo aqui na Câmara e que hoje, quarta--feira, é o dia mais tumultuado. Agradeço aos parlamentares que estão aqui o tempo inteiro. Temos que enxergar que hoje, em Brasília, depois de um pé d’água — todo mundo viu o pé d’água —, conseguimos encher este auditório. Ministério da Saúde, Legislativo — Judiciário não pode vir, mas de alguma forma foi convidado —, sociedade organizada e cidadãos estão presentes. Se isso não é demonstração de um problema social, eu não sei mais o que podemos fazer, eu não sei mais o que temos que falar. O problema social realmente existe e está aqui, aqui dentro.

É uma pena o ministro não ter vindo. Há todos os problemas dele, é uma pena. Mas e os meus problemas, os nossos problemas? Como a deputada falou, se tivesse sido com ele, será que ele estaria aqui? Será que isso não seria tão importante? Se tivesse sido com ele, será que terí-amos maior efetividade nas ações do SUS, um SUS melhor, um SUS realmente funcionando?

O que eu tinha para falar é por aí, principalmente a questão de enxer-gar. Chega, chega de demagogia, chega de hipocrisia, chega de falta de esperança! Simplesmente, a única coisa que eu tenho para falar é chega!

Obrigado. (Palmas.)O SR. APRESENTADOR (David Rayol) – Agora, como parte inte-

grante da programação deste seminário, ouviremos o depoimento do ator Luciano Szafir, irmão de Alexandra Szafir, portadora de esclerose lateral amiotrófica. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Romário) – Luciano, só para que-brar um pouco o protocolo, antes do seu depoimento, que com certeza será um dos mais importantes do dia de hoje, gostaríamos de passar um filme para vermos a cara do Brasil, das pessoas que realmente sofrem com as doenças raras. É uma oportunidade talvez rara e única.

Gostaria que vocês prestassem bastante atenção, por favor.(Exibição de vídeo.) (Palmas.)

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Romário) – Antes da fala do nosso grande Luciano, quero dizer que essas imagens reproduzem, na minha opinião, uma coisa que é muito interessante e importante para quem não tem doença: a vontade de viver. (O orador se emociona.) Por favor, Luciano. (Palmas.)

O SR. LUCIANO SZAFIR – Boa tarde a todos. Antes de mais nada, eu me sinto na obrigação de agradecê-lo pelo convite para estar aqui. Mais do que deputado, você é um grande amigo e faz a diferença. Agra-deço por mim e por todas as pessoas que têm problema na família ou não e que são solidárias às doenças raras. Quero agradecer também a todos da Mesa. Muito obrigado a todos vocês.

Bom, eu não vou falar de números, não vou falar de outras coisas ou da doença em si, da ELA, porque não tenho a capacidade nem o conhe-cimento para isso. Vou falar da minha irmã.

Eu tive a sorte de nascer na mesma família que ela. A minha irmã sempre foi uma pessoa brilhante, sempre foi genial, sempre foi doce, sempre foi linda. Um dia ela sentiu uma dor no joelho, uma forte dor no joelho, na perna direita. Ela foi a um ortopedista e depois a outros médicos. A dor passou para a outra perna. Enfim, foi diagnosticada, meses depois. Nós temos condições, procuramos os melhores médicos em São Paulo, mas demorou muito o diagnóstico. Hoje vejo casos mais próximos de ELA, a doença de que eu tenho mais conhecimento, mas, naquela época, eu nunca tinha ouvido falar dela.

Uma semana antes de ela ser diagnosticada, sei lá se pelo destino, por Deus, eu não sei como é que eu falo, acho que Deus, eu li um livro chamando “Tuesdays with Morrie”, em português, “A última grande lição”, de Mitch Albom, que contava exatamente a história de um profes-sor de Filosofia — acho que era de Filosofia, se não me engano — com um aluno. Eles eram muito amigos.

Na realidade, ele contraiu essa doença, ele pegou essa doença e pas-sou a ir a um programa de TV nos Estados Unidos, porque ele era ame-ricano, para mostrar a evolução dessa doença, o que acontecia com o indivíduo. Com a minha irmã aconteceu exatamente tudo o que ocor-reu com ele. Quer dizer, não tudo, graças a Deus, porque ele já se foi.

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Pelo o que eu vi ali, você tem dois caminhos: ou vai embora logo ou se espiritualiza e ganha uma força nessa doença que é inacreditável, e é o que aconteceu com minha irmã. Quem a conhece, pela internet ou pes-soalmente, a admira muito. Ela tem uma força que não sei de onde tira.

Eu sinto a dor de irmão e fico imaginando — quer dizer, não dá para imaginar — os meus pais. A minha irmã já não fala. É muito doloroso para a gente, mas, de vez em quando, eu procuro um vídeo — naquela época, a gente não gravava tanto — para escutar a voz dela, porque eu já não lembro mais. Ela já não se mexe. Hoje em dia, ela fica na cama o tempo todo. Ela respira por aparelhos, alimenta-se por sonda. E eu fico imaginando que eu não seguraria isso, se eu tivesse essa doença, apesar de que eu trocaria de lugar com ela hoje, se fosse preciso. Fico imaginando os meus pais e até ela. Como ela aguenta, por exemplo, não abraçar um filho, uma filha? É muito duro.

Mesmo assim, ela me manda e-mails quase que diariamente, sempre de brincadeira, sempre falando bem. Eu acho que, nesses oito anos da doença, eu cheguei à casa dela e em um, dois ou três dias talvez eu não fui recebido, porque ela não estava bem ou porque estava deprimida. Ela está sempre melhor do que a gente.

Agora, essa doença é devastadora, como provavelmente as outras que vocês ou algum familiar passam também. Ela vem sem o manual do que acontece com a gente. Ela se espiritualizou, está sempre bem, mas a gente fica destruída. É muito difícil!

Ela escreveu esse livro que vocês viram na mão dela com um sof-tware que foi feito. Aliás, essa é mais uma ação dela. Está sempre fazendo ações, ajudando as pessoas. Um software desses deve custar cerca de 20 a 25 mil reais. Em um dia ela conseguiu captar, pela internet, e a gente arrumou dinheiro para comprar três ou quatro. Ela escreveu o livro com os olhos. É muito demorado. Hoje em dia ela já escreve, e a gente se comunica mais rapidamente. Eu chego à casa dela, eu me deito na cama, ela olha para o computador, mexe os olhos, a frase sai no computador e eu respondo. É muito difícil!

Acredito que todos vocês passam por essa mesma dor, mas é uma grande lição de vida. É dura, mas... No nosso caso, destruiu muito a nossa família e ao mesmo tempo a uniu. A gente vive em constante

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medo, porque essa é uma doença que não tem cura. A expectativa de vida geralmente é de cinco anos. Ela já está há oito anos.

Quando a Mara falou (O orador se emociona.) (Palmas.) da com-panheira que estava no mesmo quarto, tocou-me bastante, porque na semana passada mesmo, minha irmã teve que ir ao hospital numa madrugada. Eram quase 4 horas da manhã. Ela desmarcou de medo, porque ela tem medo de... enfim.

É isso aí, gente. Ficou um pouco difícil agora. (O orador se emo-ciona.) Obrigado. (Palmas.)

O SR. APRESENTADOR (David Rayol) – Nós gostaríamos de registrar a honrosa presença neste seminário do Sr. Deputado João Bacelar e do Sr. Deputado Valtenir Pereira.

Vamos convidar neste momento para fazer uso da palavra o Sr. Deputado Jean Wyllys. (Palmas.)

O SR. DEPUTADO JEAN WYLLYS – Boa tarde a todos vocês. Boa tarde, Presidente Romário e demais membros da Mesa. Eu fiquei muito feliz de ver o Ministério da Saúde apresentar aqui o desenho de uma política pública para as doenças raras. Eu digo que eu fiquei feliz, hones-tamente, porque um dos caminhos que o tema das doenças raras fez para chegar à minha vida foi através justamente da denúncia de que o Ministério da Saúde não tinha uma política pública para atender as pes-soas com doenças raras e que o serviço prestado às pessoas com doenças raras era sempre conseguido mediante judicialização. Então, eu fico feliz de hoje o ministério ter apresentado o desenho de uma política.

E quem me trouxe essa denúncia foi o Rogério, da Amavi, e a Cris. E por que eles trouxeram essa denúncia para mim? Porque, entre as mui-tas manifestações e impactos da doença rara, está muitas vezes o estigma sobre o corpo. No caso da Cris, ela tem um estigma que se apresenta na pele. E a Cris e o Rogério sabem que eu, como membro da Comissão de Direitos Humanos, faço o enfrentamento público das discriminações por diferentes motivações — a discriminação étnica, pela cor da pele, a discriminação por origem, a discriminação por deficiências e a discri-minação por orientação sexual.

Sabendo dessa luta, eles me apresentaram o tema das doenças raras nessa perspectiva, porque, noutra perspectiva, o tema já tinha entrado

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na minha vida durante a campanha, quando eu conheci, em Volta Redonda, um garoto com uma doença rara de origem genética que o levava — que o leva, na verdade, porque ele não faleceu — a um tipo de autocanibalismo. Ele vai se devorando, e os pais tiveram que arrancar os dentes do filho. E ele tem que viver com as mãos presas. A vida desse casal ficou inviável, porque a mãe não pode trabalhar para cuidar do filho. Ela fica exausta, e o pai tem que revezar com ela. Então, ele tem que fazer um trabalho de meio turno.

Depois desse contato e da chegada da Cris e do Rogério na minha vida, eu fui para São Paulo e conheci a Adriana e o Maurício, que mili-tam numa outra frente nesse movimento em torno das doenças raras que é muito plural. Com isso, eu me engajei nessa luta também, por-que eu acho que a luta pelos direitos humanos tem que necessariamente contemplar as pessoas com doenças raras e incapacitantes.

Com isso, eu apresentei um projeto de lei que, na verdade, tenta dar força de lei a uma política pública para as pessoas com doenças raras e seus familiares. Junto com o Deputado Romário e o Deputado Quin-tella, nós criamos essa Frente Parlamentar, em defesa das pessoas com doenças raras e seus familiares.

Atualmente, eu e a Deputada Erika Kokay, sensíveis a outro aspecto da doença rara, que é o cuidador familiar, a pessoa que precisa parar a sua vida para cuidar de seu familiar, ou seja, tem que parar de traba-lhar, e isso tem um impacto na economia da família, toda uma dificul-dade econômica que se desdobra, de pobreza que se desdobra a partir daí, estamos elaborando um projeto para atender os cuidadores com renda mínima e com formação, para poder atacar esse outro aspecto da doença.

Dito isso, eu passo a palavra para a Deputada Erika, para falar melhor sobre isso. Muito obrigado. (Palmas.)

A SRA. DEPUTADA ERIKA KOKAY – Desejando uma boa tarde para cada uma e cada um de vocês, quero saudar os componentes da Mesa e dizer da importância de estarmos aqui, mais uma vez, fazendo essa discussão acerca das doenças raras, para tirá-las da invisibilidade e também para dialogar com a dor, uma dor muitas vezes desnecessária.

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Nesse sentido, nós estamos trabalhando para que tenhamos uma política que envolva o caráter multidisciplinar do atendimento e inter-setorial, porque nós temos que ter o caráter multidisciplinar, no que diz respeito à política pública de saúde, mas é preciso que tenhamos tam-bém políticas relativas à educação, políticas relativas à cultura, enfim, que nós possamos ter um conjunto de políticas públicas que dialoguem entre si e que possamos assegurar direitos.

Penso eu que os direitos do ser humano são direitos indivisíveis e são enganchados um no outro. Portanto, as políticas públicas têm que dialogar entre si.

Nesse sentido, se está trabalhando — e existe um projeto de auto-ria do Deputado Jean Wyllys — na perspectiva de que tenhamos essa política para atendimento das pessoas que têm doença rara. Mas nós achamos que é preciso avançar. E, como disse o deputado, avançar no que diz respeito a assegurar condições para que o cuidador e a cuida-dora familiar possam fazer a atenção, que é insubstituível, insubstituível.

Lembro-me da fala de uma pessoa com doença rara que dizia o seguinte: “Se não fosse o apoio da minha família, se não fosse o apoio de quem cuida de mim dentro da família, eu teria um vazio que nada conseguiria superar. Nada conseguiria preencher esse vazio se não fosse a estrutura que eu tenho na família”.

É preciso, portanto, que o Estado dê condições para que o cuida-dor e a cuidadora possam exercer a função de cuidar. Penso que o ser humano não sobrevive se não for cuidado, nenhum de nós. E temos que ser cuidados a vida inteira, porque nós carregamos essa coisa de sermos seres faltantes, seres que precisam do outro ou que precisam se sentir pertencentes a algo maior do que nós mesmos. Isso envolve não apenas uma política de renda mínima, mas envolve também o licenciamento. O trabalhador ou a trabalhadora que tem a função de cuidar da pessoa com doença rara tem que estar à disposição do cuidado. O Estado é para cuidar. O Estado é para cuidar. E nós precisamos nos sentir cuidados.

Por isso eu diria — e encerro com isso — que, ao fazermos esta discussão, ao enfrentarmos tudo isso, a demora do diagnóstico, a verda-deira odisseia que existe, a verdadeira odisseia até que se tenha um diag-nóstico ao qual muitas vezes se poderia chegar antes, nós precisamos

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dar respostas a isso, respostas a uma demora no diagnóstico, que muitas vezes determina os passos seguintes.

Nós precisamos assegurar a medicação, assegurar que haja o atendi-mento interdisciplinar, assegurar que haja espaços de fala para a família, porque a família toda se envolve com isso. É preciso que haja espaço de fala para que se possa falar, para que se possa ter resiliência e, a partir daí, para que se possa fazer com que pessoas sejam tratadas enquanto pessoas.

Penso que o grande desafio desta etapa da humanidade, em que temos tanta “coisificação”, é dizer que toda pessoa é pessoa. Nada é mais importante, nada é mais visível e nada é maior do que a nossa condi-ção e a nossa natureza humana. Nenhuma doença, nenhuma doença é maior do que a pessoa. Nenhuma doença pode invisibilizar a pessoa.

Por isso, para que todas as pessoas sejam vistas como pessoas, sejam cuidadas como pessoas, nós estamos elaborando essas proposições legislativas. Afinal, temos isto que é, como falou a música do Gonzagui-nha que aqui escutamos, um amor imenso pela vida; a vida inteira que todo ser humano tem o direito de exercer.

Parabéns a vocês. (Palmas.)O SR. APRESENTADOR (David Rayol) – Nós agradecemos ao Sr.

Deputado Jean Wyllys e à Sra. Deputada Erika Kokay pela rica contri-buição trazida a este seminário.

Neste momento, anunciamos o pronunciamento do Sr. Deputado Maurício Quintella Lessa, 3o Secretário da Mesa Diretora da Câmara dos Deputados e Presidente da Frente Parlamentar de Combate às Doenças Raras. (Palmas.)

O SR. DEPUTADO MAURÍCIO QUINTELLA LESSA – Boa tarde a todos os presentes. Eu quero dar as boas-vindas, mesmo já estando perto do encerramento, a todos que estão presentes hoje, em nome da Frente Parlamentar de Combate às Doenças Raras.

Quero também já anunciar que vamos mudar o nome da Frente, a pedido das entidades, e discutir qual é o melhor nome para adotarmos na Frente Parlamentar.

Quero saudar algumas pessoas aqui: o Jorge; o Rogério; a Regina, em nome das entidades; o Patrick, em nome dos pacientes; o Luciano

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Szafir, em nome dos seus familiares — é um prazer muito grande e uma honra estar com você nesta Mesa —; a Sandra, esposa do José, em nome dos cuidadores. Quero saudar os parlamentares aqui presentes.

Você, meu querido, por estar aqui representando o Ministério da Saúde. Quero dizer que todo mundo que está aqui agradece a sua pre-sença. Rogério gosta muito de você, já o conhece. Eu nem o conheço e já o adoro. Quero você e o ministro como aliados nossos nessa luta aqui. É claro que, obviamente, nós não vamos passar a mão, não podemos nem vamos mais admitir — não é, Romário? — essa falta de atenção para com todos que estão envolvidos nessa luta e para com o Parlamento.

Eu quero dizer que a Frente Parlamentar está criada há um ano mais ou menos. Nós já enviamos ao Ministério da Saúde inúmeros ofí-cios pedindo não só esclarecimento sobre diversos temas, mas pedindo uma coisa que é mais simples: uma audiência para definirmos o nosso roteiro. Nem isso o Ministério da Saúde, Deputado Valtenir, atendeu. Ao contrário do Ministério da Previdência, que já nos atendeu diver-sas vezes. Então, eu quero deixar isso aqui registrado porque é um caso muito sério. Nós estamos levando isso muito a sério dentro da Câmara Federal.

Quero dizer, Deputado Romário, que hoje tivemos uma tarde de muitas emoções, de dramas familiares, de dramas sociais que foram relatados aqui, de dramas inclusive públicos, como a dificuldade que temos em avançar nos órgãos estatais, nos ministérios, nas secretarias de saúde dos estados, nas prefeituras, mas também de muitas alegrias, como, por exemplo, a dança das crianças, o ritmo, acompanhado pelo desritmado Senador, tão importante, Suplicy, para a nossa causa tam-bém, o que foi tão importante. Temos o que comemorar também.

Quero dizer, Szafir, que sou um deputado sensibilizado. Eu fui sen-sibilizado pela causa. Eu não tenho nenhum caso na família. Eu tive um amigo de infância que era meu assessor no gabinete e que foi diagnosti-cado com ELA. Ele nos deixou ano passado, mas sobreviveu e lutou por oito anos. O caso dele é muito parecido com o da sua irmã. A força que ele tinha... Ele me abastecia de informação. Foi ele quem me apresentou a Jorge Maurício, que é filho de uma paciente com ELA, em São Paulo, e a tantas outras entidades que estão presentes aqui hoje, que lutam e luta-

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vam, há quatro ou cinco anos, pela oportunidade de vir ao Congresso Nacional falar.

O primeiro discurso no meu mandato anterior talvez tenha sido o primeiro sobre ELA realizado no Congresso.

Eu e nós todos aqui tivemos a felicidade de o Romário ter sido eleito pelo Rio de Janeiro e ter vindo parar aqui na Câmara Federal. É uma felicidade ter o Romário aqui. (Palmas.) Foi ele que, com sua sensibili-dade, deu dimensão a essa luta.

Eu me lembro de, no primeiro semestre deste mandato, as entida-des que trabalham com a questão da ELA quererem fazer, no Dia de Luta Nacional ou Mundial contra ELA, uma atividade no Engenhão; levar umas faixas ao Engenhão, como símbolo; fazer uma homenagem ao Washington, jogador do Fluminense.

Nós procuramos o Romário. O Romário abriu as portas do Enge-nhão, e não só do Engenhão, na realidade, abriu as portas do Congresso Nacional para que pudéssemos estar aqui hoje com uma Frente Parla-mentar criada, fazendo o nosso terceiro evento, com a presença maciça de parlamentares, como estamos vendo aqui hoje. Acho que três deze-nas de deputados e senadores passaram por aqui hoje.

Em nosso primeiro evento, no início de 2011, tivemos que esperar uma hora para haver gente num auditório deste tamaninho. Essa era a realidade que tínhamos aqui. E hoje esta é a realidade que nós temos.

Nós aqui somos o Parlamento. O nosso maior objetivo neste tra-balho é amplificar a voz de todos os que estão aqui. É fazer com que a sociedade brasileira, com que o ministério, enfim, com que todos os agentes saibam que existe um movimento que vai exigir dos governos uma atenção maior contra a ELA, contra as doenças raras como um todo.

Quero dizer, Fogolin, que você é um parceiro, o ministério vai ser um parceiro, mas é fundamental, se avançamos tanto – como você disse na sua palestra, quando mostrou que o grupo de trabalho avançou tanto este ano –, continuar cobrando. Queremos que esses avanços que estão no painel ou no papel efetivamente se tornem realidade e virem uma forma de atenção a todos esses pacientes, familiares, cuidadores e a todo

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mundo que se preocupa com quem tem uma doença rara nesse contexto todo.

No mais, para mim, tem sido uma honra presidir esta frente. Pre-ciso, Romário, muito do seu apoio e do apoio dos outros parlamenta-res para que a gente tenha os objetivos e metas da frente cumpridos e executados.

Hoje nos reunimos com as associações de manhã. Vai sair um docu-mento dessas associações com todas as metas: as legislativas; os pro-cessos a que precisamos dar encaminhamento aqui para fazer com que andem nas comissões e para que cheguem ao plenário para serem vota-dos; as questões orçamentárias, na Comissão de Orçamento; os recursos para pesquisa; os recursos para fazer o mapeamento de doenças raras, o que não existe hoje no Brasil. Enfim, tudo aquilo que a frente puder fazer, ela vai fazer com o apoio das entidades e com o apoio do Con-gresso Nacional.

Parabéns a todos pelo evento, um evento belíssimo. Queria agrade-cer à assessoria pelo trabalho maravilhoso que tem feito aqui e, princi-palmente, Romário, a você, pela importância e pela dimensão que o seu mandato tem dado a esta causa das doenças raras.

Boa tarde. Obrigado. Foi um prazer muito grande estar aqui hoje. (Palmas.)O SR. ROGÉRIO LIMA BARBOSA – (Intervenção fora do micro-

fone. Inaudível.)O SR. APRESENTADOR (David Rayol) – A sugestão é que a inter-

venção seja feita no microfone, com a devida permissão da Presidência da Mesa, por favor.

Obrigado.O SR. ROGÉRIO LIMA BARBOSA – Desculpe-me, foi a emoção. Mas eu queria fazer uma proposta. Para não sair do evento sem

nenhuma coisa concreta, eu gostaria de sugerir que, no próximo evento de ELA, que vai ser dia 20 de junho, não saíssemos daqui com uma pro-posta esvaziada, mas com alguma coisa concreta.

Gostaria de sugerir ao pessoal da Cátedra de Bioética, que está aqui presente, a criação de um Código de Ética para esse setor e pedir que ele seja apresentado no dia do ELA.

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É uma proposta. Obrigado. (Palmas.)O SR. APRESENTADOR (David Rayol) – Nós teremos a seguir

mais dois depoimentos de familiares de portadores de doenças raras.Neste momento, nós convidamos à tribuna a Sra. Claudete Lemos

Ribeiro, esposa do Sr. José Ribeiro Machado, in memoriam, portador de Atrofia de Múltiplos Sistemas, AMS. (Palmas.)

A SRA. CLAUDETE LEMOS RIBEIRO – Eu saúdo a Mesa, em nome do Deputado Romário, a quem agradeço a oportunidade de estar aqui nesta hora, apesar de já ter perdido a batalha. (A oradora se emociona.)

Os primeiros passos para o que está acontecendo aqui hoje aconte-ceram em 2010, cinco dias após o diagnóstico do meu marido, quando abri o jornal e encontrei: “Encontro de doenças raras na Asbac”. Obri-gado, Rogério, por essa iniciativa. Foi lá que eu vi que ninguém sabia nada sobre Atrofia de Múltiplos Sistemas.

A partir daí, minha gente, a doença rara, que para muita gente era vista como rara nas estatísticas, nos estudos, nas portarias do Ministério da Saúde, ela não era mais rara porque estava dentro da nossa casa. E a doença só é rara quando ela é rara porque ninguém a conhece. Mas nós passamos a conhecê-la.

Eu criei um tema para esta fala. É o seguinte: “Na saúde e na doença até que a morte nos separe”. Podemos entender essa frase como algo que fala de amor, mas, muito além dos afetos que selam um casamento, essa frase diz algo muito além.

Iniciamos aqui em que aparentemente o fim da frase presume um fato consumado, um relato. Ele deve ser entendido não como uma lamentação de perda, mas como uma tentativa de fazer dessa experiên-cia com a doença, Atrofia de Múltiplos Sistemas, AMS, algo positivo em prol dos portadores e também de seus familiares.

A minha fala homenageia José Ribeiro Machado Neto, pai de meus quatro filhos, bancário aposentado, professor universitário, pesquisador, que teve os primeiros sintomas cinco anos antes da sua morte; home-nageia também o Dr. Márcio Peter de Souza Leite, médico psiquiatra e psicanalista, que viveu em São Paulo e conviveu por 12 anos com a Atro-fia de Múltiplos Sistemas; e também homenageia a D. Dayse Pautillas

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Tuttis, moradora de Macaé, Estado do Rio de Janeiro, que foi diagnosti-cada em setembro de 2012 e faleceu em janeiro de 2013. (Choro.)

São essas pessoas que nos fazem estar aqui hoje falando desse assunto. A Atrofia de Múltiplos Sistemas é uma doença degenerativa, incapacitante, progressiva, que leva o portador a não ter capacidade de engolir a sua própria saliva. E é isso que, muitas vezes, o leva à morte. E a gente não pode fazer absolutamente nada! O que podemos fazer hoje é falar em nome desses que se foram. Eles começaram falando rouco, depois falando nada. Começaram com dificuldade de andar, depois não andavam mais. O simples fato de se virar na cama era impossível, mas o cognitivo estava atuante, perfeito, entendendo tudo, vendo tudo; vendo os dias serem acabados. Os dias vão se acabando, vão se acabando, e a família está ali vendo o seu ente querido morrer todo dia!

A cada incapacidade que se apresentava, era mais um dia que se passava e menos um dia naquele cronômetro que foi ligado em algum momento, que não sabemos quando, porque o diagnóstico, como foi dito aqui por muitas pessoas, é difícil. Muitos profissionais pergunta-vam: “Por que isso? Por que aquilo? Por que aquilo? Não dorme direito, não fala, não anda mais; a pressão abaixa ou aumenta”. Mas e aí?

Até que encontramos alguém que disse: “Tem alguma coisa errada aqui nesta bexiga. Vamos pesquisar”. E, a partir daí, fomos para o neuro-logista, que foi nosso parceiro. Junto com ele nós fizemos o diagnóstico. Porque, a partir da análise de vários sintomas, nós fomos para o Google: “O que é isso?”

E depois de umas madrugadas chorando, vendo o que era, vamos falar com quem? Vamos procurar quem? Buscar apoio de quem? E nós não o tivemos. Ninguém sabe o que é isso, só sabe que ela existe! Mas, como todas as coisas contribuem para o bem daqueles que amam a Deus e à sua família, foi-nos colocado no caminho um americano, chamado Bob Summers, que nos indicou como fazer, como agir. A cada novo sin-toma, a gente mandava-lhe um e-mail: “Agora, você faça assim; cuidado com isso; diga para o seu médico o que está acontecendo; tenha uma lista de tudo o que o seu paciente tem; informe ao médico que ele pode ser portador dessa doença.” Em agosto de 2011, tivemos o diagnóstico definitivo. Mas foi uma luta!

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A luta é muito grande, porque aquele nosso ente está indo embora. O prognóstico de vida desses pacientes é de oito anos. Mas quando começou? Ninguém sabe. Quando foi o primeiro sintoma? Ninguém sabe. O que nós precisamos hoje é falar sobre isso. Que todo o mundo saiba que ela existe. Quantas pessoas estão sendo mal diagnosticadas? Quantas pessoas existem aí que são portadoras dessa doença e estão sendo tratadas como parkinsonianas. É um parkinsonismo atípico. Por que aparece?

Hoje, o meu trabalho e o da minha família é divulgar, é falar, é pro-curar as pessoas que estão vivendo esse problema. Fizemos uma página no Facebook. Após a morte do meu marido, já temos 30 pessoas que nos procuraram: “O que eu faço? Como eu vou agir?”

O único livro que existe no Brasil sobre Atrofia de Múltiplos Siste-mas foi lançado em novembro de 2012. Ainda não conseguimos este livro, mas, tenho certeza, tem alguém fazendo alguma coisa. E se nós não falarmos sobre isso, menos pessoas vão se interessar para saber o que é.

O Dr. Márcio produziu até à sua morte. O meu marido produziu até à sua morte. Cada um na sua especialidade: o Dr. Márcio tentando entender o que estava acontecendo com ele, para deixar escrito para alguém que pudesse continuar o seu trabalho; o meu marido continuou cuidando da sua especialidade, que era Ciências Sociais. Ele leu até o dia em que foi hospitalizado e veio à morte. Ele queria viver! E é isto que os portadores de doenças raras querem: viver! As famílias param as suas vidas. Nós não podemos deixar um portador de doença rara sozinho, nunca! Ele pode engasgar-se com sua própria saliva e morrer, sem ninguém ao lado. Mas nós temos que dar dignidade a essas pessoas. Respeitar o que eles querem. Não podemos fazer coisas invasivas, que só façam a sua vida se prorrogar sem a menor chance.

A nossa decisão, muitas vezes, pode ser dura, mas a nossa decisão faz a diferença. A família nesse momento é a coisa mais importante. Quando todas as pessoas se afastam, porque não conseguem ver aquele amigo com todas aquelas limitações, é a família que está ali. Mas a famí-lia também precisa que esta pessoa tenha dignidade, que ela consiga ser um ser no meio da sociedade, que ela consiga conviver.

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Nós tivemos o apoio da Rede Sarah Kubitschek de Brasília, que nos ajudou a conviver com essa doença durante três anos. Mas quantas pes-soas têm acesso a essa informação? Quantas pessoas conseguem chegar a esse ponto? É nisso que eu fico pensando, quando vejo iniciativas muito bem montadas, grupos de trabalho que querem fazer uma rede mara-vilhosa, mas as pessoas têm urgência, o cronômetro delas está quase parando. Na Atrofia de Múltiplos Sistemas, o cronômetro para porque a pessoa para de respirar. Ela tem pneumonias sucessivas, por aspiração da própria saliva. Em algum momento, o organismo não reage, e a famí-lia está ali vendo aquilo.

O salmista Davi dizia: “Ensina-nos a contar os nossos dias, de tal maneira que alcancemos corações sábios”. Se o nosso paciente não teve essa oportunidade, resta a nós, familiares, termos a sabedoria de divul-gar aquilo que vivemos, todos os momentos que passamos, demonstrar e multiplicar a nossa experiência, porque é isso que hoje nos resta.

Márcio já se foi; Machado já se foi; e nós estamos aqui, somos a voz. Em vez de fazermos o nosso luto, nos vitimizarmos com o nosso luto, estamos aqui para lutar.

Ao concluir o meu escrito — acabei não lendo absolutamente nada —, eu fico feliz de ouvir que algumas coisas que estão escritas já têm resposta. Antes, só quero citar Fernando Pessoa:

A mágoa dos outros?... Tens remorso adiantado

De que te chorem?

Descansa: pouco te chorarão...

O impulso vital apaga as lágrimas pouco a pouco,  

Quando não são de coisas nossas,  

Quando são do que acontece aos outros, sobretudo a morte,

Porque é coisa depois da qual nada acontece aos outros.

Eu tenho certeza de que algumas dessas coisas que eu disse aqui já têm resposta. Nós pedimos que médicos neurologistas, fonoaudiólo-gos, fisioterapeutas, técnicos, enfermeiros e cuidadores possam cuidar mais dessa especificidade da doença, porque os pacientes precisam de

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tratamento multidisciplinar. Que programas de rede pública de saúde estejam disponíveis para utilização. Nós tivemos condição de tratar os nossos pacientes, mas sabemos que muitas pessoas que estão aí na rede pública não têm todo o conforto e toda a disponibilidade que o meu paciente teve; e que haja diagnóstico sistêmico, porque com cada um cuidando de uma pequena parte da doença não chegaremos a nada.

Eu os agradeço pela oportunidade de falar. Quero ver muitas coi-sas acontecendo neste País de agora em diante para que valha a pena a nossa luta. E que a doença do Machado e do Dr. Márcio não tenha sido em vão!

Muito obrigada! (Palmas.)O SR. APRESENTADOR (David Rayol) – Agradecemos à Sra.

Claudete Lemos Ribeiro pela rica contribuição trazida a este evento. Queremos anunciar a saída deste recinto do Sr. Luciano Szafir,

devido ao horário de saída do seu avião. Queremos agradecê-lo pela presença, participação e contribuição, engrandecendo certamente este seminário.

Nós vamos convidar, neste momento, para o seu depoimento, o Sr. Roberto Sales, pai do jovem Lucas, portador de epidermólise bolhosa. (Palmas.)

O SR. ROBERTO SALES – Boa tarde a todos! Quero saudar a Mesa; o Fogolin, mais uma vez aqui presente; e o Deputado Romário.

Quero falar ao Luciano Szafir que entendo o que ele passa, porque nós temos aqui um garoto que é especial. Falaram um dia para mim assim: “Roberto, só tem filhos especiais quem é pai especial”. E, antes de eu falar qualquer coisa, eu queria que falasse este jovem que venceu a morte por nove anos — porque ele já tem 11 anos. Mas ele venceu a morte por 9 anos. Recebi o seguinte diagnóstico de uma pessoa total-mente desinformada: “Curta o seu filho por dois anos, porque depois de dois anos você não vai mais tê-lo”. Eu disse o seguinte: “Eu não aceito este relatório”. Hoje, ele está aqui para provar que venceu a morte por nove anos. (Palmas.)

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LUCAS – Boa tarde!Eu tenho epidermólise bolhosa, uma doença rara, e nem por isso eu

sou triste. Eu sou superfeliz! Eu tenho as minhas brincadeiras, eu brinco muito, mas chega uma hora em que eu tenho os meus limites.

Eu sou grato a Deus por isso: eu ia viver até dois anos mais, mas eu não vivi só isso. Eu já tenho 11 anos e sou superfeliz! (Palmas.)

O SR. ROBERTO SALES – Eu quero parabenizar o ministério, parabenizar o Deputado Romário; quero parabenizar todos que estão aqui; e quero dizer: o Brasil não precisa mais de homens com discurso, precisa de homens de atitude; precisa de homens que não venham aqui colocar um papel e dizer que vão fazer, mas que façam.

Eu queria convidar o ministro da Saúde para passar um dia lá em casa para ver como é a nossa rotina, e ele vai ver como é. Quando se olha para o Lucas, vê-se um jovem em que, aparentemente, a EB não aparece. Mas quando ele vai fazer suas necessidades fisiológicas — após alguns dias sem conseguir fazer —, a pele do ânus sai toda. Imagine só a pele do ânus sair todinha! Imagine só uma criança dizer para você: “Papai, eu sei que Jesus vai me curar. Mas quando?” E você anula a sua vida porque você vai dar vida a ele.

Eu quero dizer a vocês que não é porque eu tenho um filho assim que deixei de lutar. Eu creio, com a ajuda dos deputados e dos senado-res... Nesta semana, eu vi o reboliço que uma blogueira fez ao chegar ao Brasil. Mas eu também queria que estes deputados e senadores que pegaram essa mulher no carro, lá fora, pegassem todos os portadores de doenças raras e trouxessem para cá (palmas) e mostrassem: “Nós esta-mos com vocês. Nós estamos com vocês, vamos fazer e isso vai aconte-cer.” (Palmas.)

Há uma burocracia neste País, e nós vamos vencê-la. Eu quero con-tar com vocês.

Quero deixar aqui o meu muito obrigado. (Palmas.) Ele está dizendo aqui: “Pai, não deixe de falar para o Fogolin das

dificuldades que eu tenho de encontrar tratamento para essa doença; de acordar às 5h da manhã e ir para um hospital e lutar, lutar, lutar, e sair de lá. Mas, em nome de Jesus, nós vamos vencer”. (Palmas.)

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O SR. APRESENTADOR (David Rayol) – Convidamos agora a Sra. Carolina Cordeiro Alvarenga, geógrafa, Diretora de Operações da Amé-rica do Sul sobre a Síndrome de Aicardi-Goltieres; e coordenadora do movimento Eu respeito as vagas. E você?

A SRA. CAROLINA CORDEIRO ALVARENGA – Boa tarde, quase boa noite.

Eu estou muito emocionada por estar aqui hoje — quero agradecer ao Deputado Romário —, porque tenho um filho com uma síndrome rara. Com isso, é você ter medo e se sentir sozinha. Medo de perdê-lo, porque você não sabe até quando ele vai viver; sozinha, porque não sabe que tratamento, que sintoma. É você buscar um tratamento, precisar de um código e não ter; é você ir para o Google e achar um geneticista em outro País. E lutar, largar a profissão, largar a família, o restante da família, os filhos menores para ir atrás de tratamento.

O Pedro tem uma síndrome que se chama Aicardi-Goltieres. Há pouco mais de 90 casos no mundo. Ele é o único brasileiro a partici-par das pesquisas. É uma doença autoimune genética. Foi difícil o diag-nóstico, porque ele fez mais de 2 mil tipos de exames. Mas o Pedro é um lutador, porque a médica que identificou que ele poderia ter essa síndrome disse-me que ele ia viver até os 2 anos. Então, foi uma busca sozinha. Eu sou uma mãe lutadora que todo dia vai atrás de melhor condição de vida para ele.

Depois disso, eu fui atrás no Google, porque eu não tinha suporte. Então, uma mãe que tem um filho com síndrome rara sente-se despro-tegida, sem amparo: “Para onde correr? Em que posso estimulá-lo?” Eu ficava durante madrugadas acordada, tentando ler. Eu sou péssima em inglês, e o que fazia: ficava lendo, e achei o nome do geneticista. Fui para os Estados Unidos, e ele colheu sangue. Ele está no estudo. Não há bibliografia, é tudo novo, e não se sabe o que pode acontecer.

E uma das coisas que mais me deixava triste era quando eu saía para lutar e encontrava entraves burocráticos. Eram formulários que não chegavam a nada. Ele precisou... Eu consegui ir à conferência, para ele tirar sangue, agora, em outubro, e o médico de lá disse para eu mandar uma amostra anterior, para poder comparar com o sangue dele, quando eu estivesse lá. Com muito custo eu fui. Então, eu fico pensando: e as

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outras mães, que não tem condições mínimas? Porque eu tive o mínimo para ir.

E eu peguei essa amostra. Ela ficou em Campinas, no aeroporto, mas ela se perdeu, porque o formulário precisava de um código. Como a síndrome dele era rara, não tinha o código. Eu olhava para ele deses-perada, porque ele precisava fazer parte da pesquisa. (Choro.) Então, assim, é muita luta, é muito sofrimento.

Todos os dias, quando a gente vai parar numa vaga especial, há uma pessoa ocupando essa vaga, de maneira irracional. E quando você vai explicar, ela fala: “Eu paro e vou continuar parando”. Então, eu tenho um movimento de vagas, de conscientização. Eu corro com ele. A minha corrida é uma forma de grito: Nós existimos, nós estamos aqui, nós somos amados. Eu falo para o Pedro: “Você é raro! É pelo seu amor que você transmite”, quando ele treme, tentando me abraçar. Isso é que é amor. Então, a genética... Ele não é uma genética. Só que quando a gente, com essa luta, encontra tanto entrave, sente-se fraca, desprotegida.

Então, hoje é um dia muito feliz por estar aqui. Eu fico muito emo-cionada quando vejo o site do Deputado Romário, quando o leio, por-que ele exprime todas as mães. Eu hoje represento todas as mães de crianças... É o grito. Ele faz o que nós queríamos, que é dizer: Nós exis-timos, nós estamos aqui, nós precisamos de amparo. Porque nós, mães, sozinhas, não conseguimos. Eu fui muito longe sozinha, mas a gente precisa de uma proteção, de uma segurança burocrática para dar conti-nuidade. Eu nem sei como consegui ir tão longe.

Então, estou muito feliz em estar aqui. Quero dizer que o Pedro utiliza o computador, ele mexe o mouse com os olhos, faz pesquisas no via CAN, que se baixa no Google. Ele está se alfabetizando.

Em várias reabilitações, as fisioterapeutas me perguntavam: qual é o prognóstico, o que dizem sobre ele?

Há estudos. Então, eu falava: “falam que ele vai ficar ótimo.”O que eu ia falar? Que ele iria morrer com dois anos? Eu criei um

mundo para ele, para ele acreditar que iria conseguir. E ele só tem melhorado. Então, todos os dias eu falo: “meu filho, você vai à escola, você vai conseguir, você vai ser tudo o que você quiser”. Por quê? Porque não temos apoio, é o amor e nada mais.

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Então, essa paixão pelo Romário, de estar aqui lutando para mudar as leis, fazer políticas públicas, digo que atrás disso há famílias, há muito amor, antes de política, antes de slide, antes de falar “nós vamos fazer”, há famílias que sofrem, há irmãos que ficam sozinhos para as mães cui-darem desses filhos. Eu tenho mais duas filhas que não têm a síndrome. Então, é uma dor muito grande.

O Pedro está nesse estudo de 17 famílias. Há canadenses, há ame-ricanos e eu sou a única brasileira. Então, as mães se organizam e nós tentamos divulgar, tentamos fazer pulseirinha para angariar fundo para mandar ao geneticista da Inglaterra para o estudo. Muitos riem e dizem: “ah, impossível”. Mas quando eu olho para o Pedro e imagino que ele tinha uma expectativa de vida tão baixa, eu não acho mais nada impos-sível. Então, eu corro por ele, luto por ele.

Quero deixar o meu abraço neste dia das Doenças Raras, porque raro é quando eles nos escolhem para sermos mãe e pai deles, raro é poder ter o privilégio de um filho escolher vir raro e dizer: “ela vai lutar por mim.” (Palmas.)

Hoje ele está aqui representando essa luta. Quero agradecer imensa-mente a oportunidade de estar dando este depoimento. O Pedro é muito guerreiro. Então, ele já ultrapassou todos os limites que deram a ele. Muito obrigada. (Palmas.)

O SR. APRESENTADOR (David Rayol) – Agradecemos a presença e a contribuição da Sra. Carolina.

O Sr. Senador Cássio Cunha Lima designou para representá-lo neste evento à Mesa o jovem Patrick Teixeira Pires, portador de mucopolissa-caridose, o qual convidamos neste momento para fazer uso da palavra. (Palmas.)

O SR. PATRICK TEIXEIRA PIRES – Boa tarde. Meu nome é Patrick Teixeira Dorneles Pires, sou portador de mucopolissacaridose. No ano passado, cheguei aqui e tive que dar toda a volta com a cadeira porque não aguentava ir andando. Graças a Deus e aos anjos enviados por Ele, que são o Deputado Federal Ruy Carneiro e o Senador Cás-sio Cunha Lima, hoje eu faço parte de uma pesquisa junto com 20 portadores que testam um medicamento MPS tipo 4A. Hoje, já estou

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conseguindo andar mais, a minha respiração está melhor, estou conse-guindo crescer.

Mas não vim falar de mim. Obrigado, Romário, por este evento tão bonito. Achei muito importantes as várias colocações, mas digo que está muito cansativo, porque queremos ver isso na prática. (Palmas.)

Semana passada, um amigo da minha mãe levou um caso e pediu ajuda para a neta dele, que sofre de hidrocefalia e mais uma síndrome que não foi diagnosticada, porque a família não tem condições. O exame que aponta a doença custa 5 mil reais, e o SUS não o cobre. Então, como a gente vai conseguir o diagnóstico precoce se exames como esse o SUS não cobre? Muitas crianças estão sofrendo sem ter diagnóstico, sem ter tratamento.

Estou cansado também de, todo ano, ir a Porto Alegre... Eu conto nos dedos quem estava lá no ano passado e conseguiu ir neste ano, por exemplo. Eu fico me perguntando onde é que estão aqueles meus ami-gos que estavam lá no ano passado, mas que não estão hoje. Muitos já faleceram, e eu não aguento mais isso.

Então, eu peço que não fique só no papel, a gente quer ver a prática.Obrigada. (Palmas.)O SR. APRESENTADOR (Rayol) – Nós ouviremos agora o depoi-

mento do Prof. Thiago Félix Marques, da Secretaria de Educação do Distrito Federal, que é hemofílico grave. (Palmas.)

O SR. THIAGO FÉLIX MARQUES – Boa tarde, senhores da plateia. Boa tarde à Mesa. Deputado Romário, estou muito grato pela oportunidade.

Como já foi anunciado, meu nome é Thiago Félix Marques. Tenho hemofilia A grave, diagnosticada mais ou menos quando eu tinha 6 meses de idade. Naquele tempo, hemofilia ainda tinha um tratamento bem difícil, bem precário, comparado a quanto já avançou.

Como foi já relatado aqui, em vários depoimentos, uma deficiência, uma doença rara afeta a família toda. Realmente vi meus pais, desde cedo, lutando para que eu não tivesse o prognóstico que era apresentado na época. Eu vi como isso afetou meus irmãos e todos os que estavam à minha volta. Por isso eu fico grato de estar aqui hoje, para agradecer a luta dos meus familiares para que eu não seguisse esse prognóstico.

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Muita gente pensa que, para o portador de hemofilia, por ser uma deficiência da coagulação do sangue, o maior problema são os cortes, porque a gente pode sangrar e morrer por causa de um corte externo. O problema maior não é esse. Nas atividades diárias e corriqueiras da nossa vida, a gente tem sangramentos internos, principalmente nas arti-culações. E o sangue fora das veias é corrosivo. Então, se o tratamento não for feito de forma correta, pode gerar um processo de degenera-ção das cartilagens. E o mais grave: se ocorrer um sangramento interno, em algum órgão, a pessoa pode vir a óbito. Antigamente, era até bem comum isso acontecer com os hemofílicos.

Mas não é só isso que eu tenho em comum aqui com a luta de todos vocês e com a luta do Deputado Romário. Eu também compartilho com ele a gratidão pelo esporte, porque, quando eu fui diagnosticado com hemofilia, fazer natação era o mais distante que eu poderia alcançar. Na época, nem isso a maioria dos médicos aceitava, embora seja um esporte de baixo impacto. Pois eu consegui fazer natação e, depois, outros espor-tes. Inclusive consegui, durante um tempo, até praticar artes marciais.

Com o apoio da minha família, com o apoio de um centro de tra-tamento e de uma equipe multidisciplinar e com o suporte de todos os que estavam à minha volta, hoje posso devolver isso àquelas pessoas que não tiveram esse acesso.

Na escola em que eu dou aula hoje também há um aluno hemofí-lico. Agora eu vejo que ele tem um futuro ainda mais promissor do que a geração com a qual convivi, que teve também avanço em relação à geração anterior.

Apesar de muitos desafios, eu tenho esperança de que o futuro seja melhor para as próximas gerações.

Estava aqui agora há pouco uma criança hemofílica, que teve muito menos sequelas do que eu. Ela pratica esportes e já vê isso como natu-ral. Para ela, sempre vai ser natural praticar esportes, ter uma vida feliz. Todos os portadores de doenças raras têm que ser lembrados como uma pessoa que quer fazer todas as atividades normais, e não apenas ser tra-tados como estatística, como número.

Por isso eu agradeço muito a oportunidade de estar aqui. Agradeço também a oportunidade de ter convivido com diversos profissionais que

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tornaram essa luta possível. No campo do esporte, eu agradeço muito ao Prof. Luis Beltrame, que não se encontra aqui hoje. Nesta semana, ele concluiu seu mestrado em educação física e hemofilia. Apesar de todos os entraves que a Dra. Greyce muito bem colocou aqui, apesar de todos os desafios de fazer pesquisa no Brasil, o Prof. Luis Beltrame conseguiu concluir o seu mestrado, mostrando que é possível, sim, uma pessoa com hemofilia ter uma vida saudável, ativa e feliz.

Eu gostaria que este momento servisse também como união de todos aqueles que têm o desafio de conviver com doenças raras. Que a gente possa superar tudo aquilo que nos é apresentado como obstáculo, porque, juntos, com certeza, vamos ficar bem mais fortes.

Muito grato pela oportunidade. (Palmas.)O SR. APRESENTADOR (David Rayol) – Já estamos nos encami-

nhando para o encerramento deste evento, mas, antes dos pronuncia-mentos finais, gostaríamos de convidar a todos para prestigiarem, logo mais, a abertura da exposição fotográfica Crescer como Iguais, que vai acontecer ali no Espaço do Servidor. Uma equipe do receptivo vai orien-tar a todos até a chegada neste recinto. Portanto, queremos contar com a presença de todos nesse evento, após o encerramento, onde acontecerá um coquetel de confraternização.

Neste momento, anunciamos o pronunciamento da Sra. Deputada Rosinha da Adefal, Presidente da Frente Parlamentar da Pessoa com Deficiência.

Após seu pronunciamento, solicitamos as considerações finais do Dr. Fogolin e, em seguida, do Deputado Romário, Presidente do evento e da Mesa, que fará o encerramento oficial do evento.

A SRA. DEPUTADA ROSINHA DA ADEFAL – Boa noite a todos.Cumprimento todos os que já passaram por aqui e os que ainda

estão aqui, o Fogolin, ainda lamentando a ausência do ministro, mas, graças a Deus, agradecendo a sua permanência até o final do evento. Isso mostra que há um comprometimento, sim, do ministério em que-rer mudar a realidade.

É com alegria e, com certeza, com muita emoção que eu entrei aqui, logo cedo, e participei do momento da abertura. Eu me retirei para ir à CPI contra a exploração de crianças e adolescentes, da qual faço parte,

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e também à reunião da bancada feminina e consegui retornar ainda a tempo de ver como o rosto de vocês está modificado em relação ao pri-meiro momento em que estive aqui. Vejo nariz vermelho, olhos cheios de lágrima. Complementando a minha fala, é uma alegria, mas, com certeza, uma emoção. É uma emoção boa ver que o evento hoje não é só para emocionar, mas, sim, para ver que o mais importante, ou tão importante, já está acontecendo.

Parabenizo a organização do evento, o Deputado Romário, que, de forma atenciosa, convidou-me para compor esta Mesa, o que aceitei com muita alegria. O convite muito me honra, e eu posso dizer que o Romário é meu amigo. Eu já falei isso a ele pessoalmente, eu queria pedir a permissão de falar em público. Quando ele foi eleito, acho que como muitos brasileiros, fiquei pensando assim: “O que o Romário vai fazer lá? O cara entende de jogar futebol.” Não é verdade, Deputado Maurício? E ele tem dado um show, um show de competência, de envolvimento com várias causas importantes neste País, entre elas a da pessoa com deficiência e a das doenças raras. Esse deputado também é o vice-presidente da Frente Parlamentar do Congresso Nacional em Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência, um querido amigo, um grande apoiador das ações em prol das pessoas com deficiência e que também se dedica à causa das doenças raras.

Este seminário já marcou o Dia Mundial das Doenças Raras, com sensibilização e informação, que são as duas armas mais importantes contra a invisibilidade que, infelizmente, esse tema ainda tem para o País — a invisibilidade. E a realização deste evento consegue vencer esse obstáculo.

Hoje, são consideradas raras entre 5 mil e 8 mil doenças diferen-tes, que afetam cerca de 6% da população. Essas doenças quase sempre são crônicas — vocês ouviram várias palestras e depoimentos que con-firmam tudo isso —, são degenerativas, incapacitantes, causam dor e sofrimento elevados no indivíduo e em sua família, comprometendo a qualidade de vida e o nível de autonomia.

Deficiência não é doença, nunca é demais lembrar. Mas não há como negar que muitas doenças levam a deficiências. Por essas razões, muitas das nossas reivindicações do Movimento de Pessoas com Deficiência

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e do Movimento das Doenças Raras fazem com que esses dois grupos se apoiem e se irmanem nessas lutas. Penso que a maior luta para o Movimento de Pessoas com Doenças Raras, o qual a frente apoia irres-tritamente — e a maior prova disso é o envolvimento do nosso vice--presidente, não só na Frente Parlamentar nas Doenças Raras, mas na realização desse evento —, é tornar visível esse tema para o País.

Sensibilizar o governo para o estímulo à pesquisa, vencer a invisibi-lidade por meio da informação à população, e a criação de apoios neces-sários para minimizar os efeitos dessas doenças são ações que devem compor os programas de governo e as políticas de saúde pública. As doenças são raras, é um fato. Mas as ações em prol das pessoas com essas doenças não podem ser raras e têm que integrar as políticas em saúde pública, a única forma de apoiar as pessoas afetadas por essas doenças e seus familiares.

Eu me coloco à disposição do Movimento das Pessoas com Doenças Raras e me comprometo a apoiar e defender suas demandas frente a este Poder Legislativo Federal.

Eu queria dizer que também saio daqui muito tocada, principal-mente com a fala da Carolina, porque me fez lembrar a fala da minha mãe. (A oradora se emociona.) Se hoje eu estou aqui, se o colega Patrick está aqui e tantos outros que vieram aqui para dar o depoimento é por-que a gente tem, com certeza, a bênção de Deus em primeiro lugar e uma família que nos apoiou para chegar até aqui, que muitas vezes se anulou e nos permitiu chegar aonde chegamos. É com esse orgulho do apoio da minha família que eu digo, Romário: sua filha é abençoada por ter você como pai, assim como eu sou abençoada por ter a família que tenho.

(A oradora se emociona.) Então, eu queria agradecer e dizer que o envolvimento das famílias

é mais importante, na maioria das vezes, do que todas essas políticas públicas. Que o nosso mandato nesta Casa possa ser usado em prol da melhoria da qualidade de vida, do respeito às diferenças que realmente nos tornam iguais em todos os sentidos, o meu mandato, o da Depu-tada Mara, do Deputado Walter e o de todos os deputados envolvidos com esses temas. As pessoas costumam dizer “com esses problemas”, e

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eu tenho certeza de que a minha vida e a de todos os que estão aqui e têm uma doença rara não é um problema, mas é uma vida que precisa, sim, do envolvimento da população e, principalmente, do governo para que se consigam efetivar políticas públicas, respeitando as diferenças, promovendo a igualdade, vendo-nos como cidadãos e como pessoas detentoras de direitos.

Então, meus parabéns a todos vocês que são heróis da resistência e ficaram aqui até agora. Parabéns ao Deputado Romário, pela amizade e dedicação a esse tema, a todos que fazem parte da frente. Parabéns ao Deputado Maurício, meu colega e companheiro de bancada alagoana, enfim, a todos vocês que estão aqui. Que Deus continue os abençoando e, principalmente, as famílias, Carolina. Que as famílias continuem nos dando apoio para que possamos mostrar o valor de pessoa que nós temos.

Muito obrigada. (Palmas.)O SR. PRESIDENTE (Deputado Romário) – Antes da minha fala

final, o Dr. Fogolin gostaria de fazer algumas considerações. Por favor, doutor.

O SR. JOSÉ EDUARDO FOGOLIN – Deputado Romário, Depu-tado Maurício, Deputada Rosinha, mais uma vez eu fico muito agrade-cido pelo convite para estar aqui com todos vocês durante o dia de hoje.

Diante de todas as informações, as verdades e histórias aqui relata-das, eu quero dizer que, antes de um gestor, está sentada aqui uma pessoa que se comove e que se envolve. Neste momento, Deputado Romário, eu saio daqui muito feliz. E saio daqui muito feliz por vários motivos. Primeiro, porque aprendi mais uma vez, como aprendi durante todo o ano de 2012. Na minha história, com a possibilidade que eu tive de ter contato com amigos e familiares com doenças raras, eu posso dizer, Deputado Romário e Deputado Maurício, que hoje saímos daqui com grandes avanços. E saímos daqui mais do que com uma apresentação.

O nosso colega Thiago Félix é portador de hemofilia grave e, algum tempo atrás, a hemofilia não tinha tratamento, como ele mesmo comen-tou. Os pacientes com hemofilia tinham sangramento de difícil controle e, infelizmente, a evolução e as complicações eram muito graves. Hoje, através das políticas públicas — e aqui estamos falando do Sistema

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Único de Saúde —, como foi mencionado em sua própria declaração, hoje o paciente consegue ter uma qualidade de vida bem melhor do que antes. E essa é a realidade e a qualidade que queremos levar a todos aqui presentes. Não somente aos que estão aqui, mas também a todos que não tiveram a oportunidade de estar aqui. E temos a certeza de que cada associação, de que cada uma das pessoas que saírem daqui vai replicar – e não somente nas redes sociais – que hoje nós começamos a viver uma nova realidade no Sistema Único de Saúde.

Toda essa construção, Deputado Romário e Deputado Maurício, foi realizada durante o ano de 2012. E é uma construção desse grande louvor que é o diálogo, a discussão e as críticas. Hoje, eu fiquei muito confortável aqui, Deputado Romário, em relação aos apontamentos, aos questionamentos, e saio muito contente.

Hoje, nós não vivemos apenas um discurso. Hoje, nós temos uma política, deputado, e uma política específica para atenção às pessoas com doenças raras. Vai ser fácil? Não vai ser fácil, porque vamos lutar ainda, vamos implementar e cada um de vocês aqui presentes vai acom-panhar a implementação em cada uma das regiões, em cada vida dos seus familiares, porque queremos reduzir os choros que ouvimos hoje, reduzir as dores das famílias, reduzir a incerteza de para onde ir.

Eu falo a todos vocês, a todas as senhoras e senhores que estão aqui presentes: o Ministério da Saúde, no ano de 2012, priorizou desenvol-ver uma política de atenção às pessoas com doenças raras. Priorizou, fundamentalmente porque nós sabemos, e todos os discursos e todos os questionamentos que tivemos é porque hoje nós abrimos essa porta. Infelizmente, antes, nós não tínhamos esse acesso nas discussões e na implementação de uma política do Sistema Único de Saúde.

Então, nós saímos daqui hoje durante a noite, Deputado Romário, Deputado Maurício, com a certeza de que o trabalho e as discussões que foram realizados foram levados ao Ministro Alexandre Padilha no ano de 2012. Eu tenho a tranquilidade de que aqui nós estamos apre-sentando aos Srs. deputados o comprometimento de uma política de atenção às pessoas com doenças raras.

É um ponto de partida, porque o Ministério da Saúde não considera a política publicada, a portaria publicada como fim dos trabalhos.

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Começa agora. E foi um trabalho realizado com as entidades, com a participação dos usuários. Nós teremos, sim, uma nova realidade a longo prazo dentro desse contexto, porém, a gente quer, cada vez mais, gerar essa informação.

Que a família do Pedro possa, e as de outros Pedros do Brasil, ter referência para onde ir. E a política pública, Deputado Maurício, que neste ano de 2012 nós trabalhamos, é fundamentalmente para que a gente consiga fazer com que esses familiares e esses pacientes tenham uma referência.

Tratamento medicamentoso para todos é o que não necessaria-mente a gente precisa, a gente precisa acolher, e o Sistema Único de Saúde oferta, a partir de agora, a partir dessa discussão, a política de atenção às pessoas com doenças raras.

Saímos daqui com uma nova realidade, saímos daqui com o com-promisso que não finda com este discurso, não finda com essa apresen-tação. Mais do que a apresentação, eu estou muito contente de ter tra-balhado com todos os colegas e estou muito contente de ter tido vários apontamentos e várias críticas. E gostaria que todos acompanhassem a implementação dessa política, que é uma batalha não somente do Ministério da Saúde, mas de todos os gestores e parlamentares envolvi-dos nesse contexto.

O Ministério da Saúde oferta uma política de saúde trabalhada, rea-lizada e discutida com várias frentes, e a gente vai acompanhar a imple-mentação para diminuir o sofrimento e ampliar o acesso com qualidade.

Eu agradeço, do fundo do meu coração, a oportunidade de estar aqui com vocês.

Obrigado. (Palmas.)O SR. PRESIDENTE (Deputado Romário) – Eu só gostaria de

pedir ao Dr. Fogolin, não só em nome dos parlamentares da Casa, do Congresso em geral, Câmara e Senado, e acredito que em nome da sociedade, em nome das associações, em nome daqueles que são porta-dores de doenças raras, em nome também dos familiares, dos amigos, daquelas pessoas mais próximas, que o Ministério da Saúde, realmente, tenha comprometimento, como o senhor está tendo até agora ao ficar aqui e dar esse último depoimento.

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Que o ministério tenha realmente atitude naquilo que foi dito aqui para todos e, principalmente, o que é mais importante para essas pes-soas portadoras dessas doenças e para esses familiares e para a gente que convive no dia a dia com isso, uns mais e outros menos, é que realmente tudo aquilo que foi discutido aqui seja colocado na prática, porque eu tenho certeza de que esse dia de hoje será inesquecível, como aconteceu aqui em outras oportunidades, em outros eventos.

Nós aqui do parlamento, principalmente deputados e senadores, sabemos das dificuldades para fazer uma lei, implementar uma lei ou modificá-la, mas vocês, do Executivo, e acredito que também têm difi-culdades, só que diferenciadas da nossa, podem realmente, e devem, e têm, na verdade, a obrigação de começar a colocar as coisas realmente na prática para que essas pessoas que portam algum tipo de doença rara possam ter uma qualidade de vida melhor.

Eu comecei dando boa-tarde, encerro dando boa-noite e agrade-cendo de coração tudo que foi vivido aqui hoje, todas essas emoções que vivemos, todos esses depoimentos de mães, pais, parentes, porta-dores. Eu tenho certeza de que Papai do Céu esteve todo esse tempo com a gente e daqui hoje vão sair muitas coisas positivas. Que o Jorge, que o Rogério e outras pessoas presentes, de que agora não lembro o nome, continuem sempre cobrando a nós parlamentares e ao Ministério da Saúde e a outros ministérios também que estejam envolvidos nesse tema para que definitivamente as coisas que são faladas, que são apre-sentadas, principalmente nos slides e nas telas, se tornem realidade e se transformem realmente na prática e que possam salvar muitas vidas.

Muito obrigado a todos vocês.Agradeço imensamente ao presidente da frente, meu colega e hoje

amigo Deputado Maurício Quintella, que tem sido também não só um parlamentar, mas uma pessoa bastante envolvida neste tema. Não pre-ciso nem dizer aqui o nome da minha amiga em particular, Deputada Rosinha da Adefal, minha musa nesta Casa que tanto me inspira nessas ações. Todos sabemos que ela é uma pessoa totalmente envolvida não só nas causas de doenças raras, não só na causa das pessoas com defici-ência, mas em todas as causas que são positivas e que se referem a uma qualidade de vida melhor para o povo brasileiro.

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Então, mais uma vez, muito obrigado a todos pela presença.Agradeço o apoio de todos que participaram deste evento, a Lide-

rança do meu partido, o PSB. E, em nome da Magda, gostaria de agra-decer mais uma vez por essa imensa contribuição e ajuda. Já sou eterna-mente grato a vocês e cada vez me torno mais. Tenho certeza de que, se não fosse a ajuda de vocês e de todos desta Casa, este evento não poderia ter ocorrido da forma como foi, com tanto êxito.

Muito obrigado. Fiquem todos com Deus. (Palmas.)O SR. APRESENTADOR (David Rayol) – Renovamos o convite a

todos para agora se dirigirem ao Espaço do Servidor, a fim de prestigia-rem a abertura da exposição fotográfica Crescer como Iguais.

Muito obrigado a todos pela companhia.Boa noite.

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Secretaria de Editoração_e Publicações SEGRAF

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