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Amaralina Miranda de Souza, Leda Maria Rangearo Fiorentini e Maria Alexandra Milito Rodrigues

(Organizadoras)

EDUCAO SUPERIOR A DISTNCIAComunidade de Trabalho e Aprendizagem em Rede (CTAR)Amaralina Miranda de Souza Carlos Alberto Lopes de Sousa Carmensia Jacobina Aires Elicio Bezerra Pontes Elizabeth Danziato Rego Eva Waisros Pereira Larissa Medeiros Laura Maria Coutinho Leda Maria Rangearo Fiorentini Lcio Frana Teles Maria Alexandra Milito Rodrigues Maria Luiza Pereira Angelim Maria Rosa Abreu Raquel de Almeida Moraes Rogrio de Andrade Crdova Ruth Gonalves de Faria Lopes Wilsa Maria Ramos

BRASLIA, JUNHO DE 2009FACULDADE DE EDUCAO - UNIVERSIDADE DE BRASLIA UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL

Coordenao do IV Curso de Especializao em Educao Continuada e a Distncia - UAB/UnB Universidade de Braslia - Faculdade de Educao Edifcio FE-5, sala BT 09/13 Campus Universitrio Darcy Ribeiro Asa Norte- CEP 70910-900 Braslia/DF Brasil E-mail: [email protected] Tel. (55) (61) 3307 2068 Fax: (55) (61) 3307 3826 Preparao do original Amaralina Miranda de Souza, Leda Maria Rangearo Fiorentini e Maria Alexandra Milito Rodrigues Superviso editorial Leda Maria Rangearo Fiorentini Projeto e editorao eletrnica Rogrio Pinto Capa e ilustraes Rogrio Pinto Colaborao tcnica Carolina Pinto Reviso de portugus Snia Margarida Ribeiro Guedes da Rocha Impresso no Brasil Printed in Brazil A produo deste material didtico obteve financiamento no mbito do Programa Universidade Aberta do Brasil, Plano Anual de Capacitao PAC da CAPES/ FNDE/MEC referente ao ano 2008. Autoriza-se o uso e a reproduo da obra no mbito do Sistema UAB e da UnB desde que citada a fonte. vedado o uso desta obra para fins de comercializao. DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAO NA PUBLICAO (CIP) FICHA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL DA UnB, BRASLIA-DF, BRASILE24 Educao superior a distncia: Comunidade de Trabalho e Aprendizagem em Rede (CTAR) / Amaralina Miranda de Souza, Leda Maria Rangearo Fiorentini e Maria Alexandra Milito Rodrigues, organizadoras. Braslia: Universidade de Braslia, Faculdade de Educao, 2009. 260 p. ; 24 cm. ISBN 978-85-62810-00-8 1.Educao a distncia. 2. Educao Superior a Distncia. 3. Comunidade de trabalho e aprendizagem em rede. 4. Professores Formao. I. Souza, Amaralina Miranda de. II. Fiorentini, Leda Maria Rangearo. III. Rodrigues, Maria Alexandra Milito. IV. Ttulo. CDU 37.018.432

SOBRE OS AUTORES

Amaralina Miranda de SouzaDoutora em EducaoGraduao em Psicologia pelo Centro de Ensino Unificado de Braslia. Especializao em Educao a Distncia, pelo Instituto Universitrio de Educao a Distncia - IUED/UNED, Espanha. Mestrado em Educao Especial pela Universidad de Salamanca, na Espanha. Doutorado em Cincias da Educao pela Universidad Nacional de Educacin a Distancia-UNED. Professora Adjunta da Faculdade de Educao da UnB. Pesquisadora na rea de Pedagogia Hospitalar e Informtica educativa aplicada Educao Especial/Inclusiva, com produes e trabalho premiado. Coordenadora das Aes de Ensino a Distncia da FE junto s Coordenaes de Graduao e Ps-graduao. Coordenao do IV Curso de Especializao em Educao Continuada e a Distncia.

Carlos Alberto Lopes de SousaDoutor em EducaoGraduao em Pedagogia pela Universidade Federal do Piau (1990), mestrado em Educao pela Universidade Catlica de Braslia (1997) e doutorado em Sociologia pela PUC - So Paulo (2005). Professor adjunto da Universidade de Braslia (UnB) com lotao no Departamento de Teoria e Fundamentos da Faculdade de Educao (FE). Tem interesse pelo estudo e pesquisa de aspectos relacionados formao de professores(as), mediaes de saberes na diversidade, capital cultural e desigualdade educacional, educao e Ongs, com nfase nos aspectos pedaggicos, sociolgicos e polticos das tecnologias da informao e comunicao. Tem experincia com a elaborao e gesto de projetos pedaggicos. Participa do IV Curso de Especializao em EaD.

Carmensia Jacobina AiresDoutora em EducaoGraduao em Magistrio e Tecnologia Educacional e Mestrado em Planejamento Educacional, ambos pela UnB. Especializao em EaD e Doutorado em Filosofia e Cincias da Educao pela Universidad Nacional de Educacin a Distancia - UNED/Espanha. Professora Adjunta da UnB/FE. Membro

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do Grupo de Pesquisa Lattes CNPq - Aprendizagem, Tecnologia e Educao a Distncia - ATEaD. Desenvolve pesquisa na rea de Gesto da Educao Bsica, Tecnologias e Gesto de Sistemas de Educao a Distncia. Participa do IV Curso de Especializao em EaD.

Elicio Bezerra PontesDoutor em EducaoLicenciatura em Pedagogia, Faculdade de Educao, Universidade Federal do Cear. Especializao em Distance Education, London University, Londres, UK. Master in Education, University of Southern Califrnia, Los Angeles, Ca. EUA. Doutorado em Educao, Universidad Nacional de Educacin a Distancia, UNED, Madrid, Espanha. Professor da Faculdade de Educao, UnB, desde 1971. Coordenador do Curso de Pedagogia UAB/FE-UnB. Atua na rea de Tecnologias Educacionais, particularmente em Linguagens Audiovisuais de Educao, Rdio e TV em Educao, e Educao a Distncia. Dedica-se tambm Poesia. Participa do IV Curso de Especializao em EaD.

Elizabeth Danziato RegoMestre em EducaoGraduao em Pedagogia pela Universidade de Braslia e mestrado em Educao pela Universidade Catlica de Braslia (1997). Doutoranda em Filosofia e Cincias da Educao, na Universidad Nacional de Educacin a Distancia - UNED/Espanha. Atualmente professora convidada da Universidade de Braslia, atuando na rea de Educao, com nfase nas tecnologias de informao e comunicao na educao, em tecnologia educacional, e-learning, educao a distncia, pesquisa em educao a distncia, formao de professores, docncia do ensino superior e avaliao de programas sociais. Participa do IV Curso de Especializao em EaD.

Eva Waisros Pereira

Doutora em Educao

Graduao em Pedagogia, mestrado em Educao na Universidade de Braslia e doutorado em Cincias da Educao, na Universidade Aberta, em Portugal. Recentemente realizou estgio ps-doutoral na Universidade de Poitiers, na Frana. Educadora, tem exercido o magistrio h trinta e cinco anos, alm de cargos tcnicos e de direo no sistema pblico de ensino no Distrito Federal. Atualmente, na condio de professora-adjunta aposentada da Univer-

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Braslia/DF Faculdade de Educao - Universidade de Braslia Universidade Aberta do Brasil

sidade de Braslia, dedica-se pesquisa no campo da histria da educao, contribuindo, ainda, no desenvolvimento de atividades educacionais em carter voluntrio. Participa do IV Curso de Especializao em EaD.

Larissa Medeiros

Doutora em PsicologiaGraduao (1997) e licenciatura em Psicologia pela Universidade de Braslia (1998) e mestrado e doutorado em Psicologia pela Universidade de Braslia. Tem experincia na rea de Psicologia, com nfase em Psicologia do Desenvolvimento, atuando principalmente nos seguintes temas: adolescncia, escolha profissional, responsabilidade da criana, pares e direitos da criana. Professora pesquisadora e coordenadora de formao de professores e produo de material da UAB/UnB. Participa do IV Curso de Especializao em EaD.

Laura Maria CoutinhoDoutora em EducaoGraduao em Comunicao Social - cinema, rdio e televiso - pela Universidade de Braslia (1976), mestrado em Educao pela Universidade de Braslia (1988), doutorado em Educao, Conhecimento, Linguagem e Arte, pela Universidade Estadual de Campinas (2001). Professora adjunta IV, Faculdade de Educao, Universidade de Braslia. Coordenadora dos cursos de pedagogia a distncia para professores do Distrito Federal e para professores do Estado do Acre. Vice-diretora da Faculdade de Educao/Universidade de Braslia-gesto 2006/2010. Atua na rea de educao, cinema, arte e cultura na graduao e ps-graduao da FE/UnB. Participa do IV Curso de Especializao em EaD.

Leda Maria Rangearo FiorentiniMestre em EducaoGraduao em Pedagogia (USP). Mestrado em Educao (UFRJ). Doutoranda em Filosofia e Cincias da Educao na UNED, Espanha. Professora Assistente da Faculdade de Educao da Universidade de Braslia. Coordena a Ctedra UNESCO de Educao a Distncia da UnB. Integra os Grupos de Pesquisa Lattes CNPq HISTEDBR/DF e Aprendizagem, Tecnologia e Educao a Distncia ATEaD, com publicaes e produes sobre educao a distncia, aprendizagem em ambiente digital e incluso social, o

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pensamento do professor autor, autoria, planejamento de cursos e produo de textos didticos em diversas mdias, gnero textual mediacional, mapas conceituais e metacognio, formao inicial e continuada de professores, mediao pedaggica das tecnologias na educao. Participa do IV Curso de Especializao em EaD.

Lcio Frana Teles

Doutor em EducaoGraduao em Cincias Polticas, Universidade Johann Wolfgang Goethe, Frankfurt/M, na Alemanha. Doutorado pela Faculdade de Educao, Universidade de Toronto, na rea de Informtica na Educao. Foi professor da Faculdade de Educao, Universidade de Simon Fraser, em Vancouver, Canad. Professor Adjunto da Faculdade de Educao da UnB, na rea de educao, arte e cultura no ciberespao. Participa do IV Curso de Especializao em EaD.

Maria Alexandra Milito RodriguesDoutora em PsicologiaPsicloga pela Faculdade de Psicologia e Cincias da Educao da Universidade do Porto (Portugal). Mestre em Psicologia da Educao pelo Instituto de Psicologia da Universidade de Braslia (UnB) e doutora em Psicologia pela mesma instituio. Professora Adjunta da Faculdade de Educao da UnB. reas de interesse: escrita e subjetividade na formao docente, memria educativa e identidade do professor, psicognese da escrita e oficina da palavra. Dedica-se tambm Literatura. Participa da graduao da UAB e do IV Curso de Especializao em EaD.

Maria Luiza Pereira AngelimMestre em EducaoGraduao em Servio Social/Universidade Catlica de Salvador, 1965. Especializao em Ensino/Universidade Federal da Bahia, 1978. Mestrado em Educao Brasileira, Universidade de Braslia/UnB, 1988. Professora assistente da Faculdade de Educao da UnB, desde 1988. Membro do Grupo de Pesquisa Lattes CNPq - Aprendizagem, Tecnologia e Educao a distncia. rea de interesse: Educao de Jovens e Adultos, Comunidade de Trabalho/ Aprendizagem em rede, Autoformao e Histrias de vida. Coordenadora da

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equipe do Portal Fruns EJA do Brasil. Participa do IV Curso de Especializao em EaD.

Maria Rosa Abreu

Doutora em EducaoGraduao na Universidade de So Paulo/Universidade de Braslia. Especializao na Universidade de Londres. Mestrado e doutorado na Universidade de Paris no campo das Cincias da Educao e da Comunicao. Publicaes na esfera das tecnologias interativas na aprendizagem e temas transversais do currculo no mbito da incluso digital, mobilidade sustentvel, cidadania ativa, cidade verde. Direo do CEaD/UnB. Planejamento e Implementao do I Curso de Especializao em Educao Aberta, Continuada e a Distncia da UnB. Participao em Projetos de Lei para a Universidade Aberta e Educao Continuada. Participa do IV Curso de Especializao em EaD.

Raquel de Almeida MoraesDoutora em EducaoGraduada em Pedagogia pela Unicamp (1985), com mestrado (1991) e doutorado (1996) em Filosofia e Histria da Educao, tambm pela Unicamp. Fez estudos ps-doutorais em Filosofia da Educao pela Universidade de Haifa, Israel (2004). professora adjunta da Faculdade de Educao da UnB. Tem experincia na rea da Educao e Comunicao, com nfase no eixo Polticas, Histria e Filosofia da Educao, Tecnologias da Informao e Comunicao, atuando nos seguintes temas: democracia, educao a distncia, formao de professores, administrao da educao e informtica na educao. Participa do IV Curso de Especializao em EaD.

Rogrio de Andrade CrdovaDoutor em EducaoLicenciado em Filosofia pela UNIJU, mestre em Administrao de Sistemas Educacionais pelo IESAE/FGV - Rio de Janeiro, doutor em Educao: Histria e Filosofia pela PUC/So Paulo. Professor Adjunto do Departamento de Planejamento e Administrao da Faculdade de Educao da Universidade de Braslia. Suas reas de maior interesse tm sido Gesto do Cotidiano nas Organizaes Educativas, Pedagogia em Contextos no Escolares, Identidade e Epistemologia da Pedagogia. Foi Coordenador da Ctedra UNESCO de Edu-

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cao a Distncia da Universidade de Braslia no perodo 1999-2002. E desde essa data vem estudando e acompanhando as mudanas em educao a partir da emergncia das novas tecnologias da informao e da comunicao. Participa do IV Curso de Especializao em EaD.

Ruth Gonalves de Faria LopesMestre em EducaoPedagoga, mestre em Educao pela IESAE-FGV. Especialista em EaD e doutoranda em Cincias da Educao na Universidad Nacional de Educacin a Distncia - UNED, Espanha. Professora na Faculdade de Educao da UnB desde 1989, onde tambm desenvolveu funes de chefia e coordenao. Desenvolve pesquisa relacionada aos Processos Formativos na Educao Superior a Distncia e Gesto de Sistemas de EaD. Membro do grupo de pesquisa Lattes CNPq - Aprendizagem, Tecnologia e Educao a Distncia - ATEaD. Integra o grupo de pesquisa e formao em EaD - Comunidade de Trabalho-Aprendizagem em Rede CTAR, na FE-UnB. Participa do IV Curso de Especializao em EaD.

Wilsa Maria Ramos

Doutora em PsicologiaGraduao em Psicologia, bacharelado e licenciatura pela Fundao Mineira de Educao e Cultura (1984), Especializao em Recursos Humanos pela Unio de Negcios em Administrao (1986), mestrado em Administrao de Recursos Humanos pela Universidade Federal de Minas Gerais (1995) e doutorado em Psicologia pela Universidade de Braslia (UnB) (2005), em parte realizado na UNED-ES, com apoio do Programa Alban. Professora Adjunta do Instituto de Psicologia da UnB e Coordenadora Geral da Universidade Aberta do Brasil na UnB. Coordena o curso de Especializao em Educao a Distncia do CEaD/UnB. Atua na rea de educao a distncia, especificamente no planejamento e organizao da produo de materiais didticos para o ensino a distncia (Proformao e Gestar), estratgias de compreenso leitora na abordagem da psicologia da aprendizagem por meio do texto e formao continuada de professores no uso das tecnologias da informao e comunicao. Participa do IV Curso de Especializao em EaD.

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SUMRIO

PREFCIO

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CAP 01. A Comunidade de Trabalho e Aprendizagem em Rede . 17 (CTAR) na Faculdade de Educao da UnB Elicio Bezerra Pontes Ruth Gonalves Faria Lopes CAP 02. A Universidade Aberta do Brasil: desafios da . 37 construo do ensino e aprendizagem em ambientes virtuais Wilsa Maria Ramos e Larissa Medeiros CAP 03. Histria da educao a distncia e os desafios na . formao de professores no Brasil Eva Waisros Pereira e Raquel de Almeida Moraes CAP 04. Evoluindo e gerando conhecimento . Maria Luiza Pereira Angelim e Maria Alexandra Milito Rodrigues CAP 05. Linguagem audiovisual e educao a distncia . Elicio Bezerra Pontes, Carlos Alberto Lopes de Sousa e Laura Maria Coutinho 65

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CAP 06. Aprender e ensinar com tecnologias, a distncia e/ou em 137 . ambiente virtual de aprendizagem Leda Maria Rangearo Fiorentini CAP 07. Tecnologias interativas na aprendizagem em redes . sociais on-line, na ciberarte, cidadania Maria Rosa Abreu e Lcio Frana Teles CAP 08. Pesquisa em educao a distncia: desafios . e possibilidades Amaralina Miranda de Souza, Elizabeth Danziato Rego e Rogrio de Andrade Crdova CAP 09. Gesto na educao a distncia . Carmensia Jacobina Aires e Ruth Gonalves de Faria Lopes 169

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PREFCIO

ste livro nasceu da produo coletiva de um grupo interdepartamental e interdisciplinar de 17 professores, a grande maioria da Faculdade de Educao da UnB, todos engajados no desenvolvimento do IV Curso de Especializao em Educao Continuada e a Distncia. O Curso expressa o amadurecimento do Grupo CTAR ao longo de seus 15 anos de atuao com as tecnologias de informao e comunicao e com a EaD, com uma concepo de educao a distncia e de universidade aberta que objetiva consolidar os princpios e as prticas de um ensino de qualidade em ambiente virtual. Esse grupo introduz o conceito de Comunidade de Trabalho e Aprendizagem em Rede CTAR, que tem como princpio e diretriz fundamental a afirmao de que uma outra educao a distncia possvel. O grupo CTAR baseia-se em algumas premissas: a convico de que uma educao tecnolgica pode ser baseada no dilogo, em oposio mera transmisso verticalizada e assimtrica de contedos e conhecimentos; a ao cooperativa e colaborativa entre os sujeitos, que deve prevalecer sobre a competio individualizada; a aprendizagem que valoriza o trabalho reflexivo, em vez do simples acmulo de informaes; a comunicao em rede voltada para a convivncia, em vez de levar ao isolamento e ao individualismo; e, finalmente, a afirmao de uma educao a distncia direcionada para uma ao transformadora, em vez de atividade meramente reprodutora de conhecimentos sem compromisso com a mudana da realidade. O grupo CTAR desafiou-se num processo contnuo de aprendizado das possibilidades e limites das TICs colocadas a servio da construo coletiva do conhecimento entre sujeitos de saberes. Assumiu como propsito a criao de uma competncia institucional conjugada qualificao especializada de professores e outros profissionais, em Educao a Distncia. Nesse contexto, particularmente, destaca-se a participao do Grupo CTAR na formao dos professores de vrias instituies pertencentes ao Programa Universidade Aberta do Brasil (UAB). Paralelamente a esse processo vivenciado pela CTAR, as polticas pblicas educacionais dos ltimos 10 anos tm sido orientadas para a democratiza-

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o do acesso ao ensino superior, abrangendo a criao e interiorizao de novos campi e de universidades pblicas, a implantao de licenciaturas, a consolidao dos cursos noturnos presenciais e, especialmente, a oferta de ensino de graduao a distncia. no cerne dessas polticas que surge a Universidade Aberta do Brasil, UAB. O programa UAB tem como base a oferta de cursos a distncia, em centros de estudos mantidos pelos municpios, estados e Distrito Federal, ofertados por universidades pblicas. Entre as finalidades e prioridades do Programa destacam-se a ampliao do acesso e a formao universitria de professores de escolas pblicas. Esse programa imps uma nova agenda s universidades pblicas brasileiras, em geral, representando um momento singular de transformaes e metamorfoses ante o desafio multifacetado de expandir suas fronteiras geogrficas e territoriais, assegurando a qualidade do ensino e mantendo, simultaneamente, a oferta do ensino presencial regular. Diferentemente dos pases que optaram na dcada de 60 e 70 pela criao de Universidades exclusivamente para o ensino a distncia, as polticas pblicas brasileiras foram indutoras de aes gerenciais que imputaram s universidades a reorganizao de suas estruturas acadmico-administrativas para acolher esta misso. O desafio para as universidades pblicas a formao continuada de professores e a consubstanciao das matrizes curriculares e das metodologias e sistemas de ensino presenciais com as dimenses da mediao humana, instrumental, simblica e pragmtica imposta pelo uso da tecnologia da informao e comunicao, potencializando os objetivos e misso da Universidade. Nesse contexto, esta obra, germinada no mbito dos estudos e pesquisas do grupo CTAR e vinculada implantao do programa Universidade Aberta do Brasil, prope a discusso de questes emergentes, decorrentes da experincia do grupo de professores da Faculdade de Educao e da equipe da UAB na UnB. O livro tem como eixo articulador o conceito e prtica da construo colaborativa de conhecimentos, onde a CTAR est posta como foco principal das discusses e reflexes sobre todos os elementos inerentes ao Sistema de Educao a Distncia, pensado e praticado para favorecer a formao docente e a implantao e implementao de aes de EaD nos diversos contextos educacionais. A anlise crtica contida nos textos, aqui reunidos, expressa as bases tericas eleitas e discutidas ao longo desses anos num processo amadurecido de es-

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Prefcio

tudos e experincia, que resultou numa concepo particular sobre o uso de tecnologias na Educao e sobre a Educao a Distncia. Os temas abordados na obra travam uma intertextualidade sobre distintos processos tericos e prticos relativos a educao a distncia, oferecendo uma importante referncia para o aprimoramento da prtica docente. Ao congregar pontos de vista diferentes sob formas de problematizaes, s vezes, aparentemente contraditrias, a obra busca a compreenso sistmica e dialtica dos elementos constitutivos do universo da EaD, a partir de vrios olhares dos autores, admitindo a contradio como constitutiva, em primeira e ltima instncia, do sujeito epistmico e concreto e do campo da EaD, como objeto de pesquisa-ao e formao continuada em servio. Esse referencial apresenta-se como uma semente fecunda para o estudo da natureza hbrida dos universos culturais, sociais e histricos envoltos na dinmica do ensino a distncia sem fronteiras, assegurando que, de fato, uma outra EaD possvel.

A obra est organizada em nove captulos.No captulo 1, A Comunidade de Trabalho e Aprendizagem em Rede (CTAR) na Faculdade de Educao da UnB abordada como necessrio pano de fundo para os valores pedaggicos e variadas experincias docentes que levaram busca das possibilidades de uma educao tecnolgica baseada em prticas diferentes daquelas que se impem pela lgica de mercado, que v a educao, sobretudo, como um produto comercial atraente e rentvel. Nesse sentido, a CTAR adota como princpio e diretriz a afirmao de que uma outra educao a distncia possvel. O autor destaca aspectos histricos que permitem reconhecer o vnculo das aes atuais da educao a distncia com os ideais inovadores da Universidade de Braslia em sua origem, abordando principalmente a experincia do Grupo CTAR ao longo de seus 15 anos de atuao com as tecnologias de informao e comunicao e com a EaD. O captulo 2, A Universidade Aberta do Brasil: desafios da construo do ensino e aprendizagem em ambientes virtuais, traz subsdios filosficos e metodolgicos para a construo de ambientes de ensino e aprendizagem on-line visando formao de professores, a partir da discusso sobre as diretrizes e polticas, o papel do professor no sistema educao a distncia: transformaes e metamorfoses que envolvem o processo educativo e que repercutem na relao professor-aluno e construo de processos educativos on-line, em particular na realidade da UAB.

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O captulo 3, Histria da educao a distncia e os desafios na formao de professores no Brasil, focaliza aspectos histricos, especificidades e condies de implementao da educao a distncia em nosso pas, destacadamente a modalidade on-line, como instncia formadora do ser humano; enfatiza a perspectiva de capacitao de recursos humanos, alertando para os riscos da apropriao dos meios tecnolgicos para fins mercantis e propagandsticos, que ferem os princpios ticos veiculando cursos massificados, de baixa qualidade, alienantes, impeditivos da formao profissional e cidad; de modo a contribuir para as atuais necessidades materiais da populao, para a emancipao humana como um dos requisitos para o exerccio da cidadania, com consequente (re)organizao do trabalho docente, dos processos educativos realizados no mbito do ensino superior e das polticas pblicas de educao. No captulo 4, Evoluindo e gerando conhecimento, as autoras focalizam o ambiente virtual como rede telemtica interativa multimdia virtual, que exige seu uso apropriado natureza educativa do conhecimento gerado entre sujeitos de saberes, respeitando os nveis de conscincia possveis dos ciclos vitais, a servio da constituio de comunidades de trabalho/aprendizagem em redeCTAR, o que implica em reciprocidade e no em transferncia de saberes; a comunicao pedaggica assume, assim, um carter relacional que envolve a coparticipao dos sujeitos na reflexo e na ao transformadora. No captulo 5, Linguagem audiovisual e educao a distncia, ressaltamse os principais elementos da linguagem audiovisual, as perspectivas de integrao dessas linguagens no campo da educao a distncia, como elementos que se revelam e ocultam nas mltiplas narrativas que cada filme, cada programa de tev, cada vdeo, a seu gosto e a seu modo, apresentam. Discute-se a nossa condio de seres narrativos, capazes de construir uma percepo do mundo e de ns mesmos por meio de narrativas, de histrias que ouvimos, vemos e contamos de muitas formas, cada vez mais em meio a narrativas audiovisuais, sobretudo as do cinema, da televiso e, mais recentemente, as do computador. No captulo 6, Aprender e ensinar com tecnologias, a distncia e/ou em ambiente virtual de aprendizagem, so discutidas dinmicas de interao e comunicao a partir de mudanas nos cenrios socioculturais de atuao, nos processos formativos mediados por tecnologias, nas caractersticas e possibilidades de trabalho docente, no exerccio da condio ativa na aprendizagem, nas inter-relaes de professores, estudantes e organizao escolar. So destacadas questes pedaggicas na concepo do trabalho docente como trabalho interativo, com e sobre o outro, nas relaes de tempo

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Prefcio

e espao no trabalho curricular, nos efeitos que exerce sobre suas relaes, aes e identidade profissional. O captulo 7, Tecnologias interativas na aprendizagem em redes sociais on-line, na ciberarte, na cidadania, traz reflexo sobre o uso crescente das tecnologias interativas na sociedade, os novos formatos das ferramentas e sua experimentao na aprendizagem, sua importncia na democratizao do acesso ao conhecimento, destacando-se o conceito de cidades digitais e o papel fundamental das polticas pblicas para assegurar acesso livre s infovias municipais e a pontos digitais de acesso aberto junto comunidade, por meio de exemplos de aplicao das tecnologias no campo das competncias transversais, particularmente na ciberarte e na cidadania ativa. Os autores do captulo 8, Pesquisa em educao a distncia: desafios e possibilidades, abordam a natureza dos fenmenos educativos, a partir de duplo enfoque fatos e situaes os primeiros tratando dos aspectos estruturais e sistmicos e os segundos das interaes vividas na prtica pedaggica, introduzindo diferentes possibilidades metodolgicas de investigao das especificidades da educao a distncia, da questo da cientificidade, da prtica reflexiva e da formao do professor reflexivo. No captulo 9, Gesto na educao a distncia, focaliza-se a necessidade de se dimensionar a contribuio da Educao a Distncia - EaD como modalidade de oferta e o significado que assume a organizao de sistemas de EaD no atendimento s demandas de educao e formao da sociedade contempornea, crescentemente impulsionada pelos avanos tecnolgicos, pelo forte impacto sobre o mundo do trabalho, o que lhe confere novas possibilidades, o repensar da educao e das organizaes e, consequentemente, de gesto mais democrtica. Convidamos todos a se envolverem com este livro com o mesmo entusiasmo com que o elaboramos, situando-se no contexto poltico-educacional da EaD como sujeitos ativos em sua comunidade de trabalho e aprendizagem, desafiando-se a vivenciar a construo colaborativa e a germinar suas prprias descobertas e contribuies. Amaralina Miranda de SouzaCoordenadora do IV Curso de Especializao em Educao Continuada e a Distncia

Diretora de Ensino de Graduao a Distncia da UnB

Wilsa Maria Ramos

Braslia, junho de 2009.Educao Superior a Distncia: Comunidade de Trabalho e Aprendizagem em Rede (CTAR)

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CAPTULO 01

A Comunidade de Trabalho e Aprendizagem em Rede (CTAR) na Faculdade de Educao da UnB 1Elicio Bezerra Pontes

IntroduoUm novo tipo de sociedade e de mundo esto em vias de estruturao, tendo como caracterstica definidora a prevalncia de tecnologias num nvel jamais experimentado antes, em face de sua diversidade, complexidade e velocidade de disseminao. O homem no mais ocupa o centro da histria, esgotado o antropocentrismo pelo menos isso o que nos garantem os arautos dos novos tempos cedendo lugar tecnologia multiforme e onipresente numa nova sociedade tecnocntrica. A multiplicidade dos meios de comunicao pulveriza e banaliza os relatos histricos e os confunde com a fico, apresentando-nos uma realidade continuamente recriada, impessoal, etrea e distante. Essa nova maneira de fazer histria, em que o distanciamento crtico e a reflexo parecem ter-se tornado impossveis, coloca-nos a todos no centro de uma realidade que se constri a cada instante e na qual no temos suficientes referncias, orientaes, reconhecimento de suas estruturas. Neste mundo pleno de complexidades, de cuja construo o cidado comum parece no participar, mas apenas usufruir,1 Texto de autoria coletiva dos integrantes do Grupo CTAR, reelaborado e atualizado por Elicio Bezerra Pontes. [Texto original A Distance Education Alternative: Work Community / Online Learning. An Alternative Distance Education is Possible: Network Learning and Working Community (CTAR), in Litto, Fredric M. e Marthos, Beatriz Roma (orgs). Distance Education in Brazil:Best Practices. So Paulo: Pearson Prentice Hall, 2006. pp 11-19].

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Elicio Bezerra Pontes

quando possvel, o papel da educao adquire importncia cada vez maior. Porm, nos defrontamos com mltiplas incertezas e indefinies. Entre os desafios gerados no bojo da sociedade tecnolgica, destaca-se a necessidade de repensar os paradigmas que nos serviram de ncora at aqui, inclusive os que prevalecem no campo educacional. tarefa urgente entender o que h sob a superfcie das mudanas trazidas pelos avanos cientficos e tecnolgicos nas ltimas dcadas, especialmente as menos bvias e perceptveis que, no entanto, alteram nosso modo de conhecer o mundo, as formas de representar esse conhecimento e a transmisso dessas representaes atravs da linguagem. A prpria linguagem no mais singular, mas uma pluralidade de cdigos e de formas, s vezes virtuais: temos que falar de linguagens. Na medida em que as novas tecnologias de informao e de comunicao infiltram-se no tecido social, transformando o contedo, o ritmo e as modalidades da comunicao humana, urge examinar a natureza de sua interferncia ou contribuio na redefinio das organizaes, especialmente as sociais e educativas. As reformas hoje necessrias para melhorar os sistemas educacionais precisam ir alm das que ocorreram em tempos recentes. A apropriao das novas linguagens tecnolgicas no processo educativo vem desestabilizar (ou desestruturar) o modelo escolar essencialmente presencial, requalificando-o diante das novas possibilidades de acesso formao. Se a poltica, a esttica e a cultura esto rearticulando-se diante das transformaes sociais desencadeadas pelas novas tecnologias da comunicao, pelas redes telemediticas e pelos sistemas informacionais, hora de rever as repercusses de tudo isso sobre o modo de aprender e como as instituies de ensino em todos os nveis, esto ou no lidando com o novo quadro societal. As novas denominaes da educao a distncia educao virtual, ensino ou aprendizagem eletrnica, e-learning, entre outras caracterizam-se em primeiro lugar pelas tecnologias em si mesmas, os aparatos, as questes tcnicas e operacionais e esses elementos aparecem como paradigmas definidores dos sistemas educativos e dos prprios mtodos de ensino e aprendizagem. Nas discusses sobre a nova educao, a ateno tende a voltar-se para os aspectos ditados pelas leis do mercado global, em que se busca justificar um novo mercado educativo, tambm globalizado, no apenas possvel, mas visto como inevitvel no contexto da sociedade tecnolgica atual. Percebese a ausncia ou, no mnimo, o espao secundrio a que so relegadas as questes metodolgicas que dizem respeito aos sujeitos humanos e s rela-

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es interpessoais, geralmente mencionadas mais para atestar e confirmar a excelncia da tecnologia ou dos programas, e menos como aspectos fundamentais numa educao centrada na pessoa e no nos meios materiais ou tecnolgicos. indiscutvel a relao da Educao a Distncia - EaD com as tecnologias e meios de comunicao, inclusive no sentido de meios de transporte que possibilitaram, inicialmente, o ensino por correspondncia sem os quais no seria possvel realizar-se uma educao a distncia, ou seja, para alm dos limites do espao fsico da escola. No entanto, essa relao no se estabeleceu, historicamente, como dependncia ou subordinao aos meios. Nas origens da moderna EaD, a condio tecnolgica sempre esteve associada a dois objetivos fundamentais: a superao de limitaes geogrficas, espaciais e temporais, e a democratizao da educao, como bem pblico, viabilizando a incluso de parcelas socialmente marginalizadas do sistema de ensino convencional. Esses princpios continuam plenamente vlidos no atual cenrio das novas tecnologias de informao e comunicao. Do mesmo modo, as caractersticas tcnicas, a combinao e a convergncia de linguagens e meios significam a possibilidade de expandir e aprofundar muitos dos aspectos essenciais do processo de ensino e aprendizagem, mas no podem ser encaradas como paradigmas impostos pela natureza intrnseca das tecnologias.

1. A Comunidade de Trabalho e Aprendizagem em Rede (CTAR)A concepo de uma Comunidade de Trabalho e Aprendizagem em Rede (CTAR), na Faculdade de Educao da UnB (nota 1), somente seria possvel num contexto marcado pelas tecnologias de informao e comunicao, como o atual. Essa circunstncia, no entanto, representou apenas o necessrio pano de fundo para os valores pedaggicos e variadas experincias docentes que levaram busca das possibilidades de uma educao tecnolgica baseada em prticas diferentes daquelas que comeavam a se impor pela lgica de mercado que v a educao, sobretudo, como um produto comercial atraente e rentvel. Por isso, a CTAR adotou como princpio e diretriz a afirmao de que uma outra educao a distncia possvel. A referncia EaD no incidental, mas inevitvel. No se pode imaginar educao a distncia sem tecnologias de comunicao e informao, nos seus

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mais diferentes suportes, meios e linguagens que os caracterizam e que, atualmente, fundem-se ou complementam-se na constituio de redes de alcance mundial. nessa modalidade de educao que mais se investe no uso das TIC, pela prpria condio de distanciamento fsico entre quem ensina e quem aprende e pelas potencialidades intrnsecas ou agregadas a essas tecnologias. A busca de outras concepes e possibilidades de educao a distncia tambm no uma preocupao despropositada, mas motivada pela constatao de que, na esteira das novas tecnologias de informao e comunicao e da rede mundial de computadores a EaD adquiriu um grande impulso e atraiu nefitos interessados em sua explorao, inclusive entre pessoas e instituies que a desdenhavam como uma modalidade de educao de segunda categoria. Uma comunidade de trabalho e aprendizagem em rede, na concepo do grupo CTAR da FE - UnB, apoia-se em algumas premissas essenciais: 1 a convico em que uma educao tecnolgica pode ser baseada no dilogo, em oposio mera transmisso verticalizada e assimtrica de contedos e conhecimentos; 2 - a ao cooperativa e colaborativa entre os sujeitos deve prevalecer sobre a competio individualizada; 3 a aprendizagem deve valorizar o trabalho reflexivo, em vez do simples acmulo de informaes; 4 - a comunicao em rede deve voltar-se para a convivncia, em vez de levar ao isolamento no individualismo; 5 - e, finalmente, a afirmao de uma educao a distncia direcionada para uma ao transformadora, em vez de atividade meramente reprodutora de conhecimentos sem compromisso com a mudana da realidade dos educandos. As razes dessa proposta podem ser encontradas nas ideias que deram origem prpria Universidade de Braslia, pensada e criada como uma instituio comprometida com a realidade brasileira e com um projeto de pas, um pas que pretendia se afirmar entre as naes desenvolvidas. Uma universidade comprometida com o presente, mas com um olhar voltado para o futuro. Neste captulo, resgatamos alguns aspectos histricos que permitem reconhecer o vnculo das aes atuais da educao a distncia com os ideais inovadores da Universidade de Braslia em sua origem, abordando principalmente a experincia do Grupo CTAR ao longo de seus 15 anos de atuao com as tecnologias de informao e comunicao e com a EaD. Uma experincia que, a exemplo de outras iniciativas, tem contribudo para uma concepo de educao a distncia e de universidade aberta que objetiva consolidar os princpios e as prticas de um ensino de qualidade, compromisso que deve ser considerado inalienvel para uma universidade pblica.

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2. As tecnologias de comunicao nas origens da UnBNo diagnstico da educao superior do pas e nas solues propostas em seu projeto, os idealizadores da UnB tiveram a capacidade de antever o lugar das novas tecnologias nos processos acadmicos de ensino e aprendizagem e o seu papel como instrumento de vinculao da universidade com a sociedade. A UnB propunha-se a utilizar os meios de comunicao de massa tanto para integrar-se com a sociedade brasiliense e brasileira como para cumprir sua finalidade precpua de ensino e formao. Contaria com uma emissora de rdio meio que por trs dcadas vivera sua poca de ouro e uma de televiso, ainda em seus primeiros anos de existncia, mas j prenunciando aquilo que viria a ser em pouco tempo o mais importante meio de comunicao do sculo XX. A rdio e a TV universitrias deveriam desempenhar significativo papel no ensino, na formao de professores, na inovao pedaggica e no uso das tecnologias, o que era j contemplado no Plano Orientador, documento fundante da Universidade de Braslia.2 Por sua vez, o projeto da Faculdade de Educao, concebido sob a orientao do educador Ansio Teixeira, em 1963, indicava no s o compromisso orgnico com a formao do magistrio para com o sistema educacional da nova capital (escola-classe e escola-parque, principalmente) como uma relao direta com o previsto Centro de Teledifuso Educativa, que agregaria a Rdio e a Televiso universitrias. Assim como no mbito da universidade esse projeto no foi efetivado, em razo da interveno do governo militar na Fundao Universidade de Braslia, a criao da Faculdade de Educao somente ocorreu em 1966. A partir de 1974, a FE iniciou gestes para implantar a rea de Tecnologia Educacional, que vem sendo reestruturada luz das novas tecnologias de informao e comunicao, encaradas como desafios pesquisa de novos processos de aprendizagem numa sociedade tecnolgica em que o sistema educacional configura-se em novos espaos e linguagens. Nas suas iniciativas de abrir fronteiras na UnB na rea das tecnologias educativas, a Faculdade de Educao criou a habilitao em Tecnologia Educacional no Curso de Pedagogia (1975), contribuiu diretamente na criao do Centro de Produo Cultural e Educativa - CPCE (1986), do Centro de Educao2 A Rdio Universidade de Braslia ter como programa bsico a difuso cultural e artstica e [...] dever especializarse em cursos por correspondncia e radiodifuso para aperfeioamento do magistrio de nvel mdio. A Televiso Universidade de Braslia, alm dos objetivos locais de difuso cultural, dever elaborar e coordenar a difuso de programas de nvel mdio, atravs de redes nacionais de televiso. (Plano Orientador da UnB. Editora Universidade de Braslia, 1962).

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Aberta, Continuada e a Distncia CEAD (1988), e do Centro de Informtica Educativa no Ensino Superior CIES (1994). Alm disso, instituiu no Mestrado em Educao a rea de convergncia em Tecnologias na Educao (1996) e a rea de Educao e Comunicao, relacionada com a temtica das NTIC, no Doutorado, iniciado em 2004.

3. EducaoaDistncia:umdesafiohistricoda Faculdade de EducaoUm grupo interdepartamental e interdisciplinar de 14 professores, a grande maioria da Faculdade de Educao da UnB, identificado na prxis educativa pela influncia comum dos princpios poltico-pedaggicos do educador Paulo FREIRE (1997), pela constante defesa da educao pblica e, em diferentes tempos (desde 1963) e graus, pelas experincias acumuladas com as TIC, em particular, na chamada Educao a Distncia, constituiu-se como grupo-autor do conceito de Comunidade de Trabalho e Aprendizagem em Rede (CTAR), assim definida: Educao aberta, apoiada na pedagogia da autonomia, exercida numa comunidade de trabalho e aprendizagem em rede, utilizando com propriedade as tecnologias de informao e de comunicao. Referenciado por bases tericas, inicialmente eleitas, o grupo CTAR desafiouse num processo contnuo e atualizado de aprendizado das possibilidades e limites das TIC colocadas a servio da construo coletiva do conhecimento entre sujeitos de saberes. Assumiu como propsito a criao de uma competncia institucional conjugada qualificao especializada de professores e outros profissionais, em Educao a Distncia. Os referenciais tericos remetem, principalmente, ao educador Paulo Freire (1997) com a sua proposta de educao libertadora, de pedagogia da autonomia, de crculo de cultura, de dilogo entre sujeitos de saberes que enraizados em sua cultura podem recri-la. Outras contribuies complementares, no menos importantes, devem ser registradas como de Ubiratan DAmbrosio (1997) sobre o papel da educao na emergente era da conscincia; de Ren Barbier (1998) na abordagem transversal da educao de que, entre outros, resulta uma escuta sensvel; de Edgar Morin (1995) sobre a viso de totalidade, transdisciplinaridade e implicao da subjetividade na epistemologia da complexidade; de Jacques Ardoino (1998) sobre a multirreferencialidade na compreenso da22Braslia/DF Faculdade de Educao - Universidade de Braslia Universidade Aberta do Brasil

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prxis educativa instituinte; de Pierre Lvy (1998) na projeo da importncia da formao dirigida para as qualidades humanas na cosmopdia do perodo neoltico; de Humberto Maturana (1995) sobre as bases biolgicas do entendimento humano e o sentido da criatividade singular da autopoisis; de Manuel Castells(1999) sobre a compreenso dos desafios impostos pela sociedade em rede e, por fim, do Relatrio DELORS/UNESCO (1996) na explicitao dos quatro pilares da sociedade educativa do sculo XXI: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos ou com os outros, e aprender a ser. Figura 1. Comunidade de Trabalho e aprendizagem em rede (CTAR)

importante destacar que os referenciais tericos, preliminarmente conhecidos ou descobertos ainda se constituem em desafios na consolidao do que aqui est formulado como uma outra EaD possvel. Esse conceito implica na singularidade da educao mediada e no mediada pelas TIC, em que a distncia relativizada pela proximidade necessria na interao pedaggica entre sujeitos aprendizes de saberes, na qual o toque sutil complementar

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ao toque virtual. Na CTAR, a presena face a face e , tambm, condio necessria proximidade/distante entre os sujeitos aprendizes de saberes, evidenciada nos encontros presenciais e nos fruns de discusso ao longo dos trs primeiros cursos. Os atores envolvidos constituram-se numa equipe multidisciplinar de carter intra e interinstitucional, composta por professores dos trs departamentos da Faculdade de Educao, docentes de outras Universidades e professores convidados de Universidades estrangeiras (UNED/Espanha, e UA/Portugal), alm de tutores e equipe de apoio tcnico-administrativo. Essa dinmica de integrao dos distintos atores entre si e com os alunos permitiu o desenvolvimento da competncia de gesto institucional e acadmica do Programa.

4. A formao de especialistas em Educao a DistnciaA experincia acumulada pela Faculdade de Educao, combinada ao intercmbio internacional com vrias universidades, s exigncias de contribuio no contexto histrico de elaborao da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional (LDB) e de execuo das polticas pblicas em educao a distncia ps 1988, conduziram proposta de criao do Consrcio Interuniversitrio de Educao Continuada e a Distncia BRASILEAD. Esse consrcio, implantado em 1994, resultou do esforo conjunto das Universidades Pblicas, em especial das Faculdades de Educao, para responder aos desafios impostos pela realidade educacional brasileira. Em setembro desse ano, professores da FE - UnB e especialistas do MEC, atendendo a solicitao desse Ministrio, elaboraram com a metodologia proposta pela UNESCO, o documento-referncia Educao a Distncia no contexto da educao fundamental para todos no Brasil - anlise das necessidades e estratgias/ perodo 1993-2003 da participao do Brasil no Grupo dos nove pases mais populosos e na 44 Conferncia Internacional da Educao, promovida pela UNESCO, em Genebra. Paralelamente ao esforo de institucionalizao do Consrcio BRASILEAD, a FE assumiu uma proposta de formao de especialistas em educao a distncia, desencadeada em 1994, com a oferta consecutiva de trs cursos com a progressiva insero e uso das TIC, resultando na criao e consolidao de uma Comunidade de Trabalho e Aprendizagem em Rede, CTAR.

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4.1. O 1o Curso de Especializao em EaDO 1o Curso de Especializao em Educao Continuada e a Distncia (19941996) atendeu a uma demanda do MEC e foi dirigido aos Coordenadores Estaduais do Programa de Formao Continuada de Professores do Ensino Fundamental, via satlite - Um Salto para o Futuro. Nessa primeira experincia, a Faculdade de Educao contou com a cooperao da Frana, em especial da Universit de Poitiers e CNED (Centre National dEnseignement Distance). Ainda que predominantemente baseado em materiais impressos, no primeiro curso realizou-se um experimento preliminar de uso da tecnologia em rede (Lotus Notes) e do Minitel3 , graas ao apoio da Universidade de Poitiers / Embaixada da Frana. Ressalte-se que naquele momento a internet mal se iniciava no Brasil, e ainda no havia acesso rede na FE/UnB.

4.2. O 2o Curso: novas bases tecnolgicasA experincia do primeiro curso constituiu a base referencial para o programa do segundo, oferecido no mbito do BRASILEAD, (1997-1998), com apoio da Secretaria de Educao a Distncia do Ministrio de Educao e Desporto, enriquecida com a cooperao da Espanha, especialmente da Universidad Nacional de Educacin a Distncia (UNED), de Portugal, atravs de convnio com a Universidade Aberta de Portugal e do Canad, com a Simon Fraser University. Como resultado, iniciou-se o processo de consolidao da Comunidade de Aprendizagem em Rede (on-line) de professores universitrios brasileiros, estrangeiros e alunos engajados em projetos institucionais de educao continuada e a distncia, principalmente, no setor pblico (SEED-MEC, universidades federais, estaduais e Secretarias estaduais de Educao), gerando conhecimento com solues inovadoras na rea, a exemplo da Oficina de Pesquisa em rede, em mbito nacional. No 2o Curso, j dispondo da Internet e com a rede local instalada, incluindo o laboratrio ligado a um servidor web prprio, experimentou-se pela primeira vez, nessa Faculdade, um frum de discusso. A experincia estimulou o desenvolvimento de uma hiperpesquisa on-line com um grupo de alunos interessados, possvel graas Simon Fraser University do Canad, que disponibilizou o seu ambiente de aprendizagem colaborativa, permitindo a presena3 Minitel, um servio on-line de texto criado em 1982, na Frana, e considerado um dos mais bem-sucedidos servios desse tipo pr-World Wide Web. Era um empreendimento conjunto de France Telcom e British Telecom, disponibilizado aos usurios em terminais gratuitos.

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de um membro do seu corpo docente que compartilhou com professores e alunos os experimentos de educao on-line. Essa proposta inovadora foi viabilizada pela conjugao de vrios fatores favorveis: o exerccio colaborativo da Comunidade de Aprendizagem ao longo do Curso; o desenvolvimento da disciplina Metodologia da Pesquisa em Educao a Distncia, sobretudo a tutoria a distncia; a efetividade da disciplina Utilizao Pedaggica de Tecnologias Interativas - Internet na Educao, sobretudo na home page, frum de discusso e a oficina presencial; o envolvimento direto de alunos das Secretarias de Educao Estaduais na Coordenao do Programa TV Escola da SEED-MEC e a prtica de ensino e pesquisa de alunos professores de Universidades e Instituies Pblicas, e a pesquisa referencial disponibilizada, gratuitamente, pela autora professora e tutora da disciplina.

4.3. O 3o Curso de Especializao: Ambiente on-line VIRTUAL-UAps anlises das experincias precedentes, o grupo decidiu que o terceiro curso (1999-2000) seria desenvolvido com base na comunicao mediada pela Internet. Assim, a partir da avaliao das ofertas de produtos existentes no mercado, foi selecionado o Virtual-U, software cedido pela Simon Fraser University do Canad (traduzido, pela equipe, para o portugus brasileiro). Essa opo pautou-se em sua estrutura flexvel e aberta, que permitiu um fecundo e instigante exerccio de autonomia da equipe de profissionais responsveis pelo curso. A concepo de EaD, os referenciais tericos adotados e a experincia no uso desse software permitiram que, aos poucos, a equipe adquirisse novos conhecimentos. Isso possibilitou a criao de um Sistema de Acompanhamento Acadmico com Banco de Dados e, por outro lado, o desenvolvimento de um software livre destinado elaborao colaborativa do Projeto Institucional PI, eixo orientador do Curso e trabalho final a ser apresentado pelos alunos participantes. O desenvolvimento desse software constituiu uma opo tecnolgica de fundamental importncia para a elaborao do Projeto de Interveno Institucional a partir do momento em que foi disponibilizado aos alunos, professores e tutores para elaborao, tanto individual como coletiva, de suas propostas. Igual importncia ficou evidenciada nas formas de acompanhamento e avaliao do processo possibilitado pelo VU equipe de professores e tutores, assim como os dilogos e trocas de saberes entre alunos, professores e tutores.

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4.3.1. Espao curricular e pblico do 3o curso O eixo norteador do terceiro curso seria a construo de um Projeto de Interveno Institucional (PI). Essa proposta, apresentada no incio e exigida no ato de inscrio, foi reelaborada pelo participante ao longo de todo o curso, com o aporte terico-metodolgico das disciplinas, organizadas em uma estrutura curricular integrada, voltada para as reas do conhecimento em Fundamentos Histricos da Educao a Distncia, Fundamentos da Comunicao e da Aprendizagem, Metodologia de Pesquisa em Educao a Distncia, Gesto de Sistemas Educacionais a Distncia, Meios de Comunicao Audiovisuais em Educao a Distncia, Utilizao Pedaggica das Tecnologias Interativas On-line. Para a orientao e desenvolvimento da proposta final do PI foram realizados dois Encontros Presenciais como importncia estratgica de integrao e intercmbio. Um encontro, no incio do Curso, teve como objetivo a reflexo inicial sobre as bases tericas, a preparao dos alunos para uso do Virtual U e atividades de vivncia integrativa. No outro, desenvolveu-se a avaliao parcial, com apresentao e anlise dos Projetos Institucionais. O curso centrou sua proposta no adulto trabalhador comprometido com a reviso das suas prticas de formao, considerando os referenciais tericos em debate na atualidade e as novas tecnologias de informao e comunicao. O pblico-alvo constituiu-se de 234 alunos, professores e outros profissionais envolvidos em programas de EaD, oriundos de uma variada gama de instituies: Universidades Pblicas e Particulares (47%), Secretarias Estaduais e Municipais de Educao (15%), Ministrio da Educao (10%), rgos Pblicos (14%), Empresas (10%) ONGs - Organizaes nogovernamentais (03%) e Movimentos Sociais (01%), localizados nas diversas regies brasileiras. Atentos ao planejamento e desenvolvimento curricular do curso alguns aspectos foram considerados na caracterizao do perfil do pblico, especialmente a formao e uso da Internet. Quanto formao, possuam nvel de Graduao (31%), Especializao (26%), e, mesmo em se tratando de um curso de especializao, 32% dos alunos tinham Mestrado e 11% tinham o nvel de Doutorado. Sobre uso da Internet, apesar de ainda incipiente na maioria das instituies, foram aferidos e categorizados no ato de inscrio: Algum uso

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(de chat, videoconferncia, frum, e-mail, insero de imagem, de som e produo de home page). (88%); e Nenhum uso (12%). 4.3.2. Gesto do Sistema de EaD O Programa de formao apoiado no uso pedaggico das TIC implicou na reviso dos processos organizacionais e de gesto. Foram criadas e implementadas formas de organizao inovadoras, compatveis com as mudanas em curso no mundo contemporneo. Como resultado, promoveu-se uma gesto assentada em processos democrticos (LVY, 1998), desenvolvida em um ambiente configurado em rede, que, em funo da presena das TIC inter-relaciona inovaes tcnicas, organizativas e de gesto (CASTELLS, 1997). A figura 2 a seguir permite visualizar essa concepo, em que todos os atores so caracterizados como sujeitos de saberes, em consonncia com os princpios acima definidos, exercitando uma coordenao coletiva no-centralizada. Figura 2. Coordenao coletiva descentralizada: os atores como sujeitos de saberes

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Assim, uma rede aberta, flexvel e dialgica foi aos poucos sendo configurada no mbito do 3o. Curso, conjugada proposta pedaggica, organicamente integrada com as TIC. Esse ambiente potencializou as condies de interao entre os integrantes da CTAR, promovendo o desenvolvimento de aes e aprendizagens compartilhadas. Destaca-se a tutoria como ao imprescindvel ao acompanhamento e componente fundamental no processo de aprendizagem que, na experincia, foi marcada por intensa dialogicidade. O ambiente assim constitudo promoveu, de um lado, modificao no enfoque de aprendizagem e, de outro, refletiu-se na autossustentao da equipe, constituda por profissionais de diversas origens institucionais e de distintas reas e nveis de formao, favorecendo um alargamento da compreenso, valorizao de competncias, da criatividade e da inovao. Figura 3. Interaes entre os sujeitos

P = Professor; TA, TB, TC = Tutores dos grupos A, B, C.

As aprendizagens ocorridas no decorrer do curso, de forma interativa, dialgica e cooperativa, coerentes com os princpios preconizados, seriam inviveis

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sem que se adotassem processos democrticos de gesto. A gesto entendida como meio para a construo da aprendizagem, na qual os meios tecnolgicos foram utilizados de modo a no deslocar a centralidade do processo dos sujeitos aprendizes, mas servindo construo de relaes peculiarmente interativas, desprovidas das tradicionais assimetrias na construo do conhecimento. Desse modo, embora se reconhecendo a espacialidade como uma das caractersticas fundantes da EaD, na prtica enfatizou-se, sobretudo, o espao comunicativo do sistema (ALMARAZ, 2000). Os resultados dessa experincia e de sua repercusso na consolidao da EaD no pas podem ser dimensionados pela abrangncia e diversidade das 58 instituies envolvidas, localizadas nas diferentes regies do territrio brasileiro, bem como pelo significativo nmero e pela qualidade dos 66 Projetos Institucionais elaborados. Esses Projetos, expressos nas diversificadas reas temticas e desenvolvidos por meio do exerccio de elaborao colaborativa on-line, foram orientados e acompanhados pelos professores e tutores. Grande parte deles, implementados nas instituies sob a responsabilidade dos especialistas formados no 3o Curso, tem reconhecimento acadmico no cenrio educacional brasileiro, inclusive em instituies universitrias credenciadas pelo Ministrio da Educao para a oferta de programas de EaD, tal como a prpria UnB. Esses resultados, verificados pela equipe do Curso em um processo de avaliao sistemtica ao longo de sua implementao, evidenciam a consolidao da Proposta Pedaggica da Comunidade de Trabalho e Aprendizagem em Rede - CTAR, fortalecendo o referencial terico do grupo e a tese de que outra educao a distncia possvel. A atitude investigativa, tendo por referncia a intencionalidade educativa e os referenciais tericos do grupo CTAR, criou condies de interatividade e dilogo entre professores, tutores e estudantes. Igualmente contribuiu para (re) significao e (re)construo de conceitos, teorias, princpios, procedimentos, valores e atitudes, ao desvelar os processos e sua natureza, as dificuldades, os obstculos epistemolgicos, atitudinais e valorativos, alm do aperfeioamento contnuo do processo educativo e do ambiente tecnolgico de trabalho e aprendizagem em rede. Do conjunto das conquistas da equipe no tocante s questes educativas no relacionamento com os distintos sujeitos participantes do curso, uma linha de atuao sobressai como promissora para os processos formativos a distncia, mediados pelas tecnologias da comunicao e da informao. Destaca-

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se particularmente, a superao da tica do professor como mero executor de rotinas didticas, da mera transmisso de informaes para a construo da autoria, da interlocuo compromissada, apoiada na interatividade, no dilogo e na reflexo a partir da prtica e sobre a prtica durante o processo, entre todos os participantes. Figura 4. Acompanhamento tutorial

4.4. O 4o Curso no contexto da Universidade Aberta do Brasil UABReconhecendo que a Educao a Distncia exige dos docentes saberes que extrapolam o processo didtico a que esto habituados no ensino presencial convencional, e dentro das propostas polticas de formao suscitadas pelo Sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB), implementado por iniciativa do MEC, a FE e o Grupo CTAR propuseram um curso de capacitao em nvel de Especializao para os professores das disciplinas dos cursos da UAB.

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O 4o Curso, iniciado em 2008, tem como objetivo propiciar a vivncia de novas formas de comunicao, a utilizao das interaes mediadas pelas tecnologias de informao e de comunicao (TICs), implicando em uma nova ambincia pedaggica e a construo de um modelo de Universidade Aberta pautado em um novo paradigma de EaD. Figura 5. Etapas de desenvolvimento curricular do 4 Curso de Especializao em Educao Continuada a Distncia4

4 Legenda das siglas que constam da Figura 5: CEAVA: Construo do ensino e aprendizagem em ambientes online; CCMAP: Construindo Cursos em Moodle - Ambiente na Plataforma; MGEAD: Meios na Educao a Distncia; GSEAD: Gesto na Educao a Distncia; PEAD: Metodologia da Pesquisa em Educao a Distncia; MESTDE: Metodologia do Ensino Superior e Textos Didticos Escritos; FCEAD: Fundamentos da Comunicao e da Aprendizagem a Distncia; LAEAD: Linguagem Audiovisual e Educao a Distncia; TI-ON-LINE: Tecnologias Interativas On-line; FHEAD: Fundamentos Histricos da Educao a Distncia; MONOGRAFIA: Trabalho de concluso de curso.

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A Comunidade de Trabalho e Aprendizagem em Rede (CTAR) na Faculdade de Educao da UnB

O pblico-alvo constitudo, prioritariamente, por professores e tutores das universidades pblicas que aderiram ao sistema UAB e professores dos Centros Federais de Educao Tecnolgica (CEFETs), e ainda por tcnicos da CAPES, da Secretaria de Tecnologia do Distrito Federal, da Escola de Governo do DF, atendendo a solicitaes especficas dessas instncias governamentais. Na estrutura proposta para essa capacitao optamos pela ateno acessibilidade de TODOS os alunos ao curso, favorecendo a aplicao de tecnologias voltadas para a pessoa com deficincia j que parte da legislao brasileira. O Decreto n. 5.296 de 02/12/2004 consolidou as leis. Os decretos 10.048 e 10.098 estabelecem o prazo de 02/12/2006 para que todos os sites pblicos e de interesse pblico na internet acessibilidade sejam acessveis para esse pblico. Para oferecer a possibilidade de acesso com igualdade de oportunidade em todas as esferas da sociedade a acessibilidade digital uma das formas de tornar a tecnologia fcil de ser usada por qualquer pessoa independentemente da sua condio fsica,sensorial,cognitiva ou condio de trabalho.Nesse sentido o acesso digital pode ser facilitado por meio de tecnologias assistivas ou ajudas tcnicas que permitam a pessoa com diversos tipos de necessidades especiais tenha acesso ao computador e possam utiliz-las valendo-se dos benefcios que eles oferecem, colocando-o assim em condio de se sentirem includas e terem acesso aos conhecimentos fundamentais para viverem como cidado. Sintonizados com estes preceitos a Universidade de Braslia conta com um programa de apoio pessoa com necessidades educacionais especiais, cujas normas aprovadas pelo CEPE lhes facilitam o apoio necessrio para terem acesso e conclurem os seus cursos. A UAB, em consonncia com esta poltica da UnB, que responde s orientaes legais dos vrios dispositivos de ateno diversidade esperada em sua comunidade. A UnB prope aes e apoios especializados para que, qualquer aluno que se integre ao sistema da UAB, possa contar com o apoio de tutoria especializada para bem realiz-lo e tambm possa contar com o mesmo recurso e condies para a oferta da sua disciplina. Almeja-se uma estrutura geral de acessibilidade do ambiente, no s da ferramenta Moodle mas de todas as aes, atividades com condies de desenvolvimento do trabalho de capacitao e da oferta das disciplinas, que permita o acesso a todos que dela desejem participar.

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Elicio Bezerra Pontes

Propomos duas aes estratgicas: desenvolvimento de recursos e ferramentas para promoo da acessibilidade na WEB para assessoria e apoio adequao do ambiente de aprendizagem do curso (Moodle); tutoria especializada para apoio aos aspectos da acessibilidade da WEB para viabilizar a participao de todos os alunos.

O 4o Curso de Especializao ofertado pela Faculdade de Educao da UnB, no mbito do Sistema UAB, visa o fortalecimento da implantao da graduao a distncia na UnB por meio de uma comunidade de trabalho e aprendizagem em rede. Coerente com a trajetria que vem sendo trilhada desde o primeiro curso de especializao em EaD, esta experincia reflete os avanos no uso das novas tecnologias de informao e comunicao que a Universidade de Braslia e a Faculdade de Educao vm incorporando sua estrutura. Assim como as disciplinas das diversas licenciaturas no mbito da UAB, o 4o curso de especializao e o curso de extenso, voltados para a formao de docentes envolvidos com a educao a distncia, realizam-se essencialmente dentro da plataforma on-line Moodle, um software livre compartilhado e adaptado por inmeras instituies educativas aos seus prprios objetivos. Mais do que a atualizao tecnolgica, esse percurso traduz uma busca constante de renovao e inovao pedaggica, possibilitada pelos novos meios e linguagens e exigida pelo compromisso com uma educao de qualidade que indissocivel dos objetivos da universidade pblica.

ConsideraesfinaisNeste captulo, resgatamos alguns aspectos histricos que permitem reconhecer o vnculo das aes atuais da educao a distncia com os ideais inovadores da Universidade de Braslia em sua origem, abordando principalmente a experincia do Grupo CTAR ao longo de seus 15 anos de atuao com as tecnologias de informao e comunicao e com a EaD. Uma experincia que, a exemplo de outras iniciativas, tem contribudo para uma concepo de educao a distncia e de universidade aberta que objetiva consolidar os princpios e as prticas de um ensino de qualidade, compromisso que deve ser considerado inalienvel para uma universidade pblica.

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A Comunidade de Trabalho e Aprendizagem em Rede (CTAR) na Faculdade de Educao da UnB

O percurso descrito neste captulo permite situar a CTAR e o programa Universidade Aberta como partes de um continuum de pensamento e ao em sintonia com algumas ideias essenciais que permeiam a histria da Universidade de Braslia, mesmo considerado o perodo em que seu projeto original foi abandonado ou distorcido em vrios aspectos. Por um lado, a concretizao em outro contexto histrico e tecnolgico do uso das tecnologias e meios de comunicao e informao na educao e no ensino, stricto sensu, como aspecto essencial da funo da universidade; e, por outro, a realizao de uma educao crtica e propositiva num ambiente tecnolgico e virtual, tanto quanto nas formas tradicionais. imperativa a construo de uma nova Comunidade de Aprendizagem, na qual todos tenham voz ativa na busca de uma viso comum, o que implica em conceber e implementar novas metodologias, novas prticas de ensino e aprendizagem, superando os modelos organizacionais hierarquizados e autoritrios. Alm de resgatar as especificidades dos ambientes de aprendizagem cada vez mais abrangentes e diferenciados, necessrio tambm investir em um novo desenho do sistema educacional reconsiderando, entre outros aspectos, os seus parmetros de gesto e polticas de formao de professores capazes de trabalhar com a nova infraestrutura tecnolgica disponvel. Nesse contexto, indispensvel uma redefinio dos papis da universidade e, particularmente, das Faculdades de Educao, dotando-as de infraestrutura tecnolgica orientada para o processo de aprendizagem, requalificando o ensino presencial e permitindo que as novas tecnologias sejam inseridas no trabalho pedaggico e no ato de aprender no ambiente escolar convencional ou a distncia. A tecnologia tem que ser compreendida como resultado da inteligncia humana, e, portanto, h que se colocar a seu servio. Essa a conscincia que se espera do educador crtico.

NotasNota 1: Os integrantes do Grupo Comunidade de Trabalho e Aprendizagem em Rede (CTAR), poca da sua constituio na FE/UnB, eram: Amaralina Miranda de Souza, Carmensia Jacobina Aires, Elicio Bezerra Pontes, Elizabeth Danziato Rego, Eva Waisros Pereira, Laura Maria Coutinho, Leda Maria Rangearo Fiorentini, Lucia Maria Franca Rocha, Maria Luiza Pereira Angelim, Maria Rosa Abreu, Raquel de Almeida Moraes, Rogrio de Andrade Crdova, Ruth Gonalves de Faria Lopes.

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RefernciasbibliogrficasALMARAZ, J. (2000). Alguns prerrequisitos funcionales de los sistemas de educacin a distancia. UNED, Espanha. Texto no publicado; utilizao no 3 Curso de EAD 1999/2000, autorizada pelo autor. ARDOINO, J. (1998). Abordagem multirreferencial (plural) das situaes educativas e formativas. In: BARBOSA, J.G. (coord) Multirreferencialidade nas cincias e na educao. Reviso da traduo Sidney Barbosa. So Carlos: EdUFSCar. BARBIER, Ren. (1998) A escuta sensvel na abordagem transversal. In: Brasil. Ministrio da Educao e Cultura. (1996) Relatrio Delors Educao - um tesouro a descobrir. Braslia, DF: UNESCO. CASTELLS, M. (1999) A sociedade em rede. Traduo de Roneide Venncio Majer.v.1. So Paulo: Paz e Terra. DAMBROSIO, Ubiratan. (1997) A era da conscincia. So Paulo: Ed. Fundao Peirpolis. FREIRE, Paulo. (1997) Pedagogia da autonomia saberes necessrios prtica educativa. So Paulo: Paz e Terra. GARRISON, D. R. et SHALE, D.(Eds.) (1990): Education at a Distance: Form Issues to Practice. Malabar,Fla., Malabar,Fla.,R. E. Krieger. LVY, Pierre. (1998) A inteligncia coletiva uma antropologia do ciberespao. Traduo de Luiz Paulo Rouanet. So Paulo: Loyola. MARTN RODRGUEZ, E. (org.) (1999): Educacin a distancia: nuevas generaciones, viejos conflictos. Madrid: De la Torre. MATURANA R. H. & VARELA G., F. (1995) A rvore do conhecimento - As bases biolgicas do entendimento humano. Traduo de Jonas Pereira dos Santos. So Paulo: Ed. Psy II. MORIN, Edgar. (1995) Introduo ao pensamento complexo. Traduo de Dulce Matos. Lisboa. Instituto Piaget. Disponvel em: . Plano Orientador da Universidade de Braslia. Braslia: Editora UnB, 1962. Relatrio DELORS / UNESCO. (1996). Educao: um tesouro a descobrir. Brasil, Ministrio da Educao e Cultura / UNESCO.

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CAPTULO 02

AUniversidadeAbertadoBrasil:desafiosda construo do ensino e aprendizagem em ambientes virtuaisWilsa Maria Ramos e Larissa Medeiros

IntroduoEste captulo traz subsdios filosficos e metodolgicos para a construo de ambientes de ensino e aprendizagem on-line visando formao de professores. Optamos por um recorte terico-metodolgico que, a partir da discusso sobre as diretrizes e polticas que sustentam o Programa Universidade Aberta do Brasil, apresenta um conjunto de metodologias voltadas construo de ambientes colaborativos para os cursos de licenciaturas. Inclumos o tema da formao docente destacando o papel do professor no sistema educao a distncia: transformaes e metamorfoses que envolvem o processo educativo e que repercutem na relao bidirecional professor-aluno e construo de processos educativos on-line. Adotamos o eixo transversal: o papel essencial do professor na Educao a Distncia e no processo educativo on-line; interpondo o papel ativo e decisivo do professor frente s escolhas estratgicas na construo dos ambientes de aprendizagem. Portanto, este captulo tem como foco a formao do professor formador que ir preparar e construir cenrios de aprendizagem para futuros professores. Devido a isso, propomos um dilogo reflexivo, em

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forma de assistncia para a realizao de uma atividade ou resoluo de problemas, ou seja, um dilogo que intervm na zona de desenvolvimento proximal (VYGOTSKY, 1991), situada na esfera de atuao do formador. Para tanto, discutiremos as dimenses tcnicas, tecnolgicas e psicolgicas da formao do professor na construo de entornos educativos on-line. Assim, esperamos dar assistncia ao processo de formao docente por meio do dilogo reflexivo e discursivo e do aporte de instrumentos metodolgicos. Lembramos que a didtica do ensino a distncia retoma a didtica geral, contextualizando-a no novo cenrio das tecnologias da informao e da comunicao. Outro tema abordado foi a especificidade do desenho educacional de um projeto de disciplina conformado a um ambiente de aprendizagem on-line. Isso implica no repensar como transpor conceitos, pressupostos e princpios de uma prtica presencial para o virtual. As duas modalidades de ensino tm concepes, recursos, formas mediacionais de construo de saberes, sistemas interativos distintos, organizados numa lgica metodolgica que exigem conhecimentos gerais de didtica e especficos do uso da tecnologia. O professor que concebe ambientes de aprendizagem precisa ser coerente com suas concepes e, por meio da interao (comunicao) e ao pedaggica mediadas pela linguagem (signo), pelas ferramentas de construo do objeto do conhecimento (a coisa a ser interpretada) e pelo interpretante (sujeitos da aprendizagem), poder planejar entornos educativos numa rede aberta, flexvel e dialgica de aprendizagem. Dessa forma, os docentes participantes de projetos dessa natureza devem compreender as caractersticas do ambiente de aprendizagem para se apropriarem de novas formas de ensino. Ressaltamos que cada recurso disponvel nos ambientes de aprendizagem contm funes, propriedades e atributos que o torna especfico para determinadas prticas educativas, por isso dizemos que possuem linguagens diversas que impactaro de forma diferenciada demandando determinadas funes psquicas do sujeito aprendente. Um problema evidenciado na literatura a descontextualizao dos elementos de formao dos professores (GIMBERT e ZEMBAL-SAUL, 2002), ora coloca o peso na tecnologia ora somente na pedagogia. Por essa razo, desde o incio deste captulo, enfatizamos que no iremos trabalhar a tecnologia como uma disciplina separada, mas organicamente integrada proposta pedaggica da formao docente. As pesquisas demonstram que neces-

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srio integrar o uso da tecnologia na preparao docente para que os professores se apropriem desse recurso de forma efetiva, a fim de introduzi-los na prxis docente. Aprender a ensinar com tecnologia e qualidade possvel desde que cuidemos das duas pontas, do processo de ensino e do uso da tecnologia. Em vista do exposto, enfatizamos que o centro de nossa discusso no ser as formas de instalao, configurao, criao e administrao de aplicativos tecnolgicos de apoio ao ensino, mas sim a construo do planejamento do uso da tecnologia integrada proposta curricular dos cursos e das disciplinas, alinhados aos princpios de cooperao, respeito mtuo e confiana, voltados para o desenvolvimento da proposta da Universidade Aberta do Brasil/UAB.

1. A concepo da UAB, leis, diretrizes e estrutura de implementaoNos ltimos anos, as polticas pblicas educacionais adotadas pelo Governo Federal tm um papel fundamental no enfrentamento s prticas discriminatrias e de excluso social a servio da democratizao do acesso educao superior. Estas polticas abrangem programas de criao e interiorizao de campi e de universidades pblicas, implantao de licenciaturas, cursos noturnos presenciais e, especialmente, a oferta de ensino de graduao a distncia. Entre os programas, destacamos o Programa Universidade Aberta do Brasil (UAB). (RAMOS e MELO, 2008, p. 1). O programa UAB foi criado pelos Decretos n. 5800/2006 e n. 11.502/2007, que definem as competncias e a estrutura organizacional da Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior (CAPES), a qual abriga a estrutura administrativo-financeira e de recursos humanos da Diretoria de Educao a Distncia/CAPES para a implementao do programa Universidade Aberta do Brasil na parceria com as instituies pblicas de ensino superior. So objetivos nacionais do programa: I - oferecer, prioritariamente, cursos de licenciatura e de formao inicial e continuada de professores da educao bsica; II - oferecer cursos superiores para capacitao de dirigentes, gestores e trabalhadores em educao bsica dos Estados, do Distrito Federal e dos Municpios; III - oferecer cursos superiores nas diferentes reas do conhecimento; IV - ampliar o

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acesso educao superior pblica; V - reduzir as desigualdades de oferta de ensino superior entre as diferentes regies do Pas; VI - estabelecer amplo sistema nacional de educao superior a distncia; e VII - fomentar o desenvolvimento institucional para a modalidade de educao a distncia, bem como a pesquisa em metodologias inovadoras de ensino superior apoiadas em tecnologias de informao e comunicao. (Decreto 5800, de 8 de junho de 2006). Em sua concepo, o referido Decreto parte de uma poltica de expanso do ensino universitrio que incentiva a incluso social por meio da educao a distncia (EaD). Assim, tem como base a oferta de cursos a distncia executados por instituies pblicas de ensino superior, em plos de estudos mantidos pelos municpios ou governos estaduais, com a finalidade de ampliar e democratizar o acesso, priorizando a formao universitria de professores de escolas pblicas e jovens trabalhadores. No contexto da legislao de educao a distncia no Brasil, as instituies de ensino superior devem obter autorizao do MEC para ofertar cursos a distncia. No caso das Instituies Pblicas de Ensino Superior que obtiverem aprovao de seus projetos no Edital Pblico da UAB, recebem uma autorizao, em carter experimental, para a oferta de cursos superiores a distncia. No primeiro ano de funcionamento do Programa UAB, 2007, participaram aproximadamente 290 municpios, propiciando a abertura de 40.000 novas vagas no ensino superior. No ano de 2008, o MEC/CAPEs reorientou as polticas da UAB dando prioridade formao de professores da escola bsica e sua articulao dentro do programa denominado Plano de Aes Articuladas (PAR). Os resultados do primeiro ano da UAB demonstram que as instituies pblicas de ensino superior tm buscado consolidar em suas estruturas novas modalidades de ensino, especialmente, mesclando o uso de recursos tecnolgicos com encontros e metodologias presenciais. Com isso, visam ampliar a oferta de vagas e dar cobertura a regies distantes e fora do circuito territorial de amplas ofertas do ensino universitrio. A ao programtica oramentria da UAB prev o financiamento das seguintes atividades: gesto do projeto, produo do material didtico, infraestrutura para as instituies de ensino, formao docente e custeio da oferta. Incentiva a pesquisa e o desenvolvimento de aes e metodologias inovadoras e inte-

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gradoras das vrias instituies participantes, inclusive estimulando a produo e uso de materiais didticos de forma compartilhada pelos participantes do programa. Esses recursos esto previstos no Decreto-Lei n. 11.273, de 6 de fevereiro de 2006, na Resoluo/ FNDE n. 044, de 29 de dezembro de 2006 e na Lei n. 11.502, de 11 de julho de 2007. A maior parcela desse financiamento (em torno de 60%) se destina realizao de atividades de docncia para a criao e oferta dos cursos. Dessa forma, as atividades docentes so gratificadas monetariamente por meio do recebimento de uma bolsa para professor-pesquisador, nos conformes da legislao citada acima, com a finalidade de que construam, a partir de sua experincias no ensino superior, projetos e metodologias educacionais na modalidade educao a distncia. A anlise da concepo da UAB e suas leis e diretrizes de criao revelam que diferentemente, dos pases que optaram na dcada de 60 e 70 pela criao de Universidades exclusivamente para o ensino a distncia, o Brasil optou pela reorganizao das estruturas atuais das instituies pblicas de ensino, revendo a organizao administrativa, tcnica e acadmica, e apropriando-a para a educao a distncia. A definio conceitual sobre o programa da UAB fomenta uma discusso acadmica mais ampla e aprofundada sobre as concepes e estratgias implicadas no processo de criao e implementao desse sistema de ensino. Baseando nos modelos e contextos de criao e expanso do ensino superior em pases com larga experincia e tradio com educao a distncia, consideramos que, a implantao da UAB carrega uma fora potencial para transformar as estruturas organizativas do ensino superior pblico a partir do uso intensivo das tecnologias, resultando no surgimento de novas configuraes universitrias. Almaraz (1999), ao analisar o cenrio mundial da educao a distncia, evidencia diversas configuraes e tipos de parcerias entre Universidades, vejamos algumas delas: Universidades abertas: que se estabeleceram na Europa entre os anos 60 e 70. Distinguem-se por serem grandes, por dirigirem-se inicial e principalmente a adultos, por seu ensino no presencial, por seu carter nacional e por sua abertura inovadora; Instituies de modalidade dual:

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a) um tipo de universidade que mantm ensino presencial em seu campus e ensino a distncia para estudantes que residem longe, de modo que ambos os tipos de estudantes sigam o mesmo curso; b) outros tipos de universidades so as que tm um departamento especfico de ensino a distncia independente, tanto a nvel acadmico quanto organizacional, dos demais programas presenciais. Consrcios: so modalidades de cooperao entre universidades convencionais que: a) Compartilham recursos e expertises entre todas, mas apenas uma governa; b) Uma universidade assume o papel de desenvolver e ofertar programas a distncia, apoiando-se na especializao e recursos de outras universidades; c) Produo de materiais centralizada e funes tutoriais descentralizadas; d) Uma universidade desenvolve materiais para uso de outras universidades e mantm funes tutoriais dos alunos de outras universidades; e) Esforos compartilhados por todos. Essas configuraes demonstram que a unio de esforos entre instituies pode inclusive, representar o reconhecimento mtuo de crditos e qualificaes (ALMARAZ, 1999), podendo uma ou mais instituio realizar a certificao do mesmo curso. No Brasil, decorrentes dos programas ministeriais e do investimento da iniciativa privada no setor educacional, vrias formas de configurar a produo e a oferta de cursos de ensino superior tm surgido, para alm do programa UAB. Para ilustrar podemos citar na esfera pblica o exemplo do Consrcio Setentrional do Programa Pro-licenciatura em Biologia e o consrcio do curso de Administrao da UAB, projeto Piloto. Na esfera privada, seguindo as leis do mercado global, tambm aparecem parcerias entre instituies educacionais e outras empresas denominadas de Agentes Educacionais ou Unidades Pedaggicas que representam os tentculos da instituio-me (sentido de provedora do conjunto de materiais didticos e acadmicos, detentora do corpo docente, etc.) nos Estados e Municpios.

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Naturalmente que no sistema pblico de ensino superior, a UAB no representa a total converso dos sistemas presenciais em sistemas a distncia, e sim o incentivo a oferta de sistemas bimodais, preservando o presencial, e incentivando a criao de cursos a distncia destinados a locais que no possuem centros de ensino superior pblicos. Entretanto, so inmeros os desafios e conflitos referentes a articulao de estruturas institucionais, corpo docente e metodologias especficas do presencial para o atendimento das demandas oriundas do ensino a distncia. Se por um lado as instituies mantm os seus objetivos, misso e modus operandi do presencial (RAMOS e LAZARTE, 2007), por outro, sofrem constantes e urgentes demandas por uma nova agenda de atividades e um conjunto estrutural acadmico-administrativo especficos para a oferta de cursos a distncia. Ainda, alertamos que a natureza plstica, configurvel e malevel das tecnologias da informao e da comunicao possibilita vrios tipos de modelao do sistema de ensino superior em geral e, do processo de ensino, em particular. Entretanto, ns professores, cabe o processo decisrio sobre o tipo de configurao necessrio e indispensvel para dar prioritariamente as respostas educativas orientadas para o desenvolvimento humano e a formao da pessoa completa, do cidado crtico e socialmente referenciado. Consideramos que a partir das experincias acumuladas na implementao do projeto pedaggico institucional e do modelo gerador do sistema UAB teremos como consequncias educacionais e institucionais o repensar dos modelos acadmicos tradicionais e elitistas e o surgimento de um novo modelo de ensino superior aberto e a distncia construdos no seio de cada Universidade, resultado de um conjunto de influncias do contexto socioeconmico e histrico-cultural da sociedade brasileira.

2. O papel do professor na Educao a Distncia: o processo educativo na formao on-lineHoje, os professores so convocados a atuar nos dois sistemas de ensino, presencial e a distncia. Alguns possuem muitos anos de experincia docente, segurana na conduo de suas aulas e ao se depararem com o desafio do ensino a distncia vivem momentos de angstia por no dominar a tecnologia. No incio da formao docente para uso da tecnologia, por vezes, se observa por parte dos professores cursistas uma sensao de ameaa por estarem

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diante de uma nova possibilidade de organizao escolar diferente do presencial, que est fortemente introjetada, inclusive nas concepes, prticas e experincias que obteve na sua prpria formao. Os professores calouros que esto iniciando as prticas no ambiente virtual, ainda carregam os elementos da prtica presencial e, no raro, a forma como configuram as aulas revela que os princpios interativos e construtivistas dos ambientes on-line no foram incorporados no planejamento e no roteiro de construo do ambiente on-line. Refletimos sobre os obstculos epistemolgicos que dificultam a criao de um outro olhar sobre os ambientes de aprendizagem e trabalho que no o da formao bancria, a qual lana mo de textos de estudos, provas, testes e questionrios, cobrando as informaes contidas na memria e menosprezando o sujeito como construtor de significados e sentidos. Dessa forma, valorizamos os projetos de formao continuada em que o sujeito assume a posio de coautor e articulador de conhecimentos, conforme destaca Sardelich (2006, p.220) a cultura da aprendizagem demanda uma atitude curiosa e aberta para capturar, agarrar, apanhar, apoderarse da oportunidade de participar de uma ampla e diversificada gama de experincias. Perguntamos: O que tem nos impedido de romper com essa tradio transmissiva e avanarmos na melhoria contnua dos processos educativos? Quais os modelos mentais que introjetamos sobre o processo educativo presencial e que de forma arraigada transferimos para o ensino a distncia? Como atuar na formao docente de forma a valorizar centralmente a construo de conhecimentos e no o domnio da tecnologia? Existem vrios desafios a serem vencidos. A incurso docente na modalidade de ensino a distncia necessita permanentemente resgatar os princpios da educao e fazer-se compreender que o domnio da tecnologia no se d somente pela tecnologia como se fosse um fim em si mesmo, mas atrelada ao currculo, ao projeto pedaggico e as prticas de ensino que se pretende implementar. Nesse sentido, a tecnologia deve ser vista como um meio, um recurso, um artefato cultural que facilita a implementao de uma nova proposta e no como um fim em si mesma.

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Apresentamos alguns princpios de como coordenar os conhecimentos sobre as tecnologias articulando com as exigncias e demandas curriculares e metodolgicas. Um primeiro aspecto a considerar que a aquisio de conhecimentos para essa rea est conectada a experimentao como aluno de sistemas EaD, colocar-se na pele do outro fundamental para os professores migrantes digitais, diferentemente dos professores nativos digitais. No programa UAB, o MEC financia a formao de docentes para atuar nesse novo contexto: professores que iro formar professores licenciados nas mais variadas reas com a utilizao de um mtodo e uma didtica completamente diferentes da utilizada no presencial. Como nos lembra a professora Neder (2006, p. 80)[...] apesar da potencialidade do uso da EaD para a formao de professores no Brasil, importante no vincular a educao a distncia apenas possibilidade de se obter uma maior democratizao do acesso ao nvel superior, mas, sobretudo para a formao de professores que ainda no possuem uma formao neste nvel.

Ainda temos um gra