LIVRO - MANGA - 2004

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 I  Manga - Produção Integrada, Industrialização e Comercialização Editores: Danilo Eduardo Rozane Ricardo José Darezzo Ronilda Lana Aguiar George Hial Alberto Aguilera Laércio Zambolim Universidade Federal de Viçosa Viçosa - Minas Gerais 2004

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Manga - Produo Integrada, Industrializao e Comercializao

Manga - Produo Integrada, Industrializao e Comercializao

Editores: Danilo Eduardo Rozane Ricardo Jos Darezzo Ronilda Lana Aguiar George Hial Alberto Aguilera Larcio Zambolim

Universidade Federal de Viosa Viosa - Minas Gerais 2004 I

Manga - Produo Integrada, Industrializao e Comercializao 2004 by Danilo Eduardo Rozane - e-mail: [email protected] Ricardo Jos Darezzo - e-mail: [email protected] Ronilda Lana Aguiar - e-mail: [email protected] George Alberto Hial Aguilera - e-mail: [email protected] Larcio Zambolim - e-mail: [email protected] Direitos de edio reservados ao editor. CAPA: Alexandre Antnio da Silva - e-mail: [email protected] DIAGRAMAO: Hlder Alves dos Reis e-mail: [email protected] IMPRESSO: Suprema Grfica e Editora Ltda - e-mail: [email protected] REVISO LINGSTICA: Jos Tarcsio Barbosa - e-mail: [email protected] PEDIDOS PARA: Universidade Federal de Viosa Empresa Jnior de Agronomia Tel.: (031)3899-2163 Fax.: (031)3899-2614 www.ufv.br/eja e-mail: [email protected]

Ficha catalogrfica preparada pela Seo de Catalogao e Classificao da Biblioteca Central da UFVM277 2004 Manga-produo integrada, industrializao e comercializao / Editores: Danilo Eduardo Rozane... [et al.]. Viosa : UFV, 2004. x, 604p. : il. ; 22cm. Inclui bibliografia. 1. Manga. I. Rozane, Danilo Eduardo. II. Darezzo, Ricardo Jos. III. Aguiar, Ronilda Lana. IV. Aguilera, George Hial Alberto. V. Zambolim, Larcio.VI. Universidade Federal de Viosa. CDD 20.ed. 634.44No permitida a reproduo total ou parcial deste livro sem a autorizao expressa dos editores. Tiragem: 500 exemplares

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Aos produtores de manga, aos colegas engenheiros agrnomos, estudantes de graduao, ps-graduao e tcnicos agrcolas por atuarem no desenvolvimento da produo integrada, na industrializao e comercializao da mangicultura nacional,

Dedicamos Os editores.

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AGRADECIMENTOS

Universidade Federal de Viosa, ao Centro de Cincias Agrrias e aos Departamentos de Fitopatologia e Fitotecnia, pelo apoio. Fundao de Amparo Pesquisa do Estado de Minas Gerais FAPEMIG - pelo apoio na realizao do evento. Aos autores dos captulos, que dividiram conosco a responsabilidade de escrever este livro. Aos amigos Jos Cludio Torres, Tiago Cavalheiro Barbosa, Caetano de Carvalho Berlatto, Bruno Neves Ribeiro, Gervsio Chuiti Taniguchi e Pedro Henrique Rigoni Rodrigues, pela dedicao na realizao dos trabalhos e na organizao e execuo do evento. Um agradecimento especial a Elaine Maria Lima Totti, Raul Carvalho Crrea da Silva, Geraldo Loureno de Azevedo Jnior e Brbara Lambertucci, pela amizade, compreenso e ateno que nos dedicaram durante a execuo do evento e desta obra. A Jos Tarcsio Barbosa, pela reviso lingstica dos textos e pela seriedade no desempenho de seu trabalho. Ao senhor Mrcio Cerceau Alves, pela dedicao ao livro, nos trabalhos de grfica, para garantir a qualidade da obra. Aos funcionrios da Suprema Grfica e Editora, pela ajuda no preparo da capa do livro, na diagramao e na edio das imagens. Os editores

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIOSA

E m p re sa Jn ior d e A gr o no m iaG esto 2004

Diretor-Presidente Danilo Eduardo Rozane Diretor Vice-Peresidente George Alberto Hial Aguilera Diretor Financeiro e Administrativo Pedro Henrique Rigoni Rodrigues Diretor de Projetos Ricardo Jos Darezzo Diretor de Qualidade Caetano Carvalho Berlatto Diretor de Recurso Humanos Ronilda Lana Aguiar Diretor de Marketing David Elias Amalfi Moreira Diretor de Fisco-Curador Bruno Neves Ribeiro VI

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PREFCIO

O Brasil, com sua imensido territorial rene condies edafoclimticas para o cultivo de uma gama da plantas frutferas - indo desde aquelas fruteiras de clima temperado quelas de clima tropical e subtropical. Entre as frutferas mais importantes, situa-se a manga, sendo o Brasil um dos grandes produtores e exportadores mundiais. A manga brasileira entra no mercado na entressafra dos outros exportadores - uma vantagem competitiva mpar. Dada sua importncia socioeconmica, a manga vem merecendo a ateno de pesquisadores, extensionistas e tcnicos de empresas privadas. Estudos e trabalhos experimentais, abordando todos os aspectos da cultura da manga, vm sendo conduzidos em diversas regies do pas onde seu cultivo se faz presente. Uma ateno especial vem sendo dada nos ltimos tempos, ao controle de pragas e doenas, de uma forma tal que o meio ambiente no seja prejudicado. Esta publicao descreve o melhoramento gentico, produo de mudas, formao e implantao do pomar, tratos culturais, colheita, industrializao e comercializao da manga no Brasil, atravs de especialistas ligados pesquisa, extenso rural e empresas privadas. A forma clara, objetiva e precisa com que os diversos autores expuseram cada assunto tcnico, permite recomendar essa publicao a todos os interessados em ampliar seus conhecimentos sobre essa frutfera to importante em nossa pauta de exportao. Danilo Eduardo Rozane Diretor - Presidente da Empresa Jnior de Agronomia Universidade Federal de Viosa

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PRLOGO

J viste coisa mais bela Do que uma bela mangueira E a doce fruta amarela Sorrindo entre as folhas dela E a leve copa altaneira

Gonalves Dias

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SUMRIOPANORAMA ECONMICO DA CULTURA E COMERCIALIZAO DA MANGA Viviani Silva Lirio..............................................................................................................01 MELHORAMENTO GENTICO DA MANGA (Mangifera indica L.) NO BRASIL Eng. Agr. Ph.D. Alberto Carlos de Queiroz Pinto.........................................................17 PROPAGAO DA MANGUEIRA Jos Maria Moreira Dias, Rodrigo Sobreira Alexandre, Delcio de Castro Felismino e Dalmo Lopes de Siqueira.................................................................................................79 PRODUO INTEGRADA DE FRUTAS NA CULTURA DA MANGA Joo Yoshio Murakami ..................................................................................................135 PLANEJAMENTO, IMPLANTAO E TRATOS CULTURAIS NA CULTURA DA MANGUEIRA. Aparecida Conceio Boliani e Luiz de Souza Corra...............................................143 FERTILIDADE DO SOLO E NUTRIO DA MANGUEIRA Francisco Maximino Fernandes e Vincio Martins do Nascimento..........................179 NUTRIO E DESORDENS FISIOLGICAS NA CULTURA DA MANGA Renato de Mello Prado..................................................................................................199 IRRIGAO E FERTIRRIGAO NA CULTURA DA MANGUEIRA Antnio Humberto Simo, Everardo Chartuni Mantovani e Flvio Rodriguez Simo.....................................................................................................................................233 MANEJO DA PARTE AREA DA MANGUEIRA Ryosuke Kavati ..............................................................................................................303 INDUO FLORAL DA MANGUEIRA E PRINCPIOS DO CONTROLE FITOSSANITRIO Gilberto Jos Nogueira e Silva Andr Lus Gnaccarini Villela...................................321 MANEJO INTEGRADO DE PRAGAS NA CULTURA DA MANGA Miguel Francisco de Souza Filho, Valmir Antonio Costa e Wilson Carlos Pazini.................................................................................................................................339 MANEJO INTEGRADO DE DOENAS DA MANGUEIRA Larcio Zambolim e Nilton T. V. Junqueira..................................................................377 IX

Manga - Produo Integrada, Industrializao e Comercializao ATUANDO COM RESPONSABILIDADE USO CORRETO E SEGURO DE PRODUTOS FITOSSANITRIOS Maria de Lourdes Setten Fustaino, Shizuo Dodo e Danilo Eduardo Rozane.........409 EXPECTATIVA E UTILIZAO DE PRODUTOS NA CULTURA DA MANGA Joo Jorge Dezem............................................................................................................511 SEGURANA ALIMENTAR NA PRODUO DE MANGA Clia Alencar de Moraes e Andressa Pinheiro Gomes..............................................533 TECNOLOGIA PS-COLHEITA PARA A COMERCIALIZAO DE MANGA IN NATURA Jos Maria Monteiro Sigrist..........................................................................................553 TECNOLOGIA DA INDUSTRIALIZAO DA MANGA Afonso Mota Ramos, Paulo Henrique Machado de Sousa e Selene Daiha Benevides..........................................................................................................................571

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Panorama Econmico da Cultura e Comercializao da Manga

PANORAMA ECONMICO DA CULTURA E COMERCIALIZAO DA MANGAViviani Silva Lirio1

J viste coisa mais bela do que uma bela mangueira, E a doce fruta amarela, sorrindo entre as folhas dela, E a leve copa altaneira?. Gonalves Dias

1. INTRODUOO Brasil o maior produtor de frutas tropicais do mundo. Essa uma frase de impacto, e realstica. Todavia, muito ainda h que se aprimorar nas bases dessa atividade no Pas, para que essa perspectiva otimista se transforme em realidade sustentvel. Elementos estruturais no faltam a esse imenso celeiro agrcola solo, disponibilidade hdrica em vrias localidades, luminosidade e tecnologia - , sendo preciso trasladar esse vultoso conjunto de fatores positivos para uma realidade comercial, que se multiplique em ganhos econmicos e sociais, em gerao de emprego, renda e alavancagem regional. De fato, em anos recentes, a produo e o processamento de frutas vm se destacando como atividades de intenso dinamismo, tanto no nvel nacional quanto no internacional. Segundo pesquisa realizada pelo Banco de Desenvolvimento do Estado de Minas Gerais - BDMG (2002), as vantagens tecnolgicas e os mecanismos de compensao sazonal entre os hemisfrios, aliados ao desejo de uma alimentao mais saudvel e crescente desregulamentao comercial das naes, tm favorecido a expanso da fruticultura em diferentes pases.

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Professora da Universidade Federal de Viosa. [email protected]

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2. A PRODUO DE MANGA NO BRASIL E NO MUNDO.A manga uma das frutas mais procuradas no mundo, e esta demanda tem se mostrado crescente. De acordo com informaes da EMBRAPA, a procura tem aumentado bastante tanto no mercado interno quanto no externo, o que tem se refletido em preos compensadores. O mundo produziu no ano de 2003, 26.196.090 mil toneladas de manga, distribudas em cerca de 3.400 mil hectares, o que resulta em um rendimento mdio de 7,7 toneladas por hectare. Os principais pases produtores dessa fruta (dados de 2003) so ndia, China, Tailndia e Mxico (Tabela 1), sendo que o Brasil ocupa a nona colocao nesse ranking. Tabela 1 Principais pases produtores de manga - rea, produo e produtividade - 2003.

PasIndia China Tailndia Mxico Paquisto Indonsia Filipinas Nigria Brasil

rea Hectares 1.500.000 298.700 290.000 173.837 99.000 162.000 138.000 125.000 68.000

Produo Toneladas 11.400.000 3.413.366 1.750.000 1.503.010 1.036.000 891.566 890.000 730.000 542.000

Produtividade Ton/hectare 7,60 11,43 6,03 8,65 10,46 5,50 6,45 5,84 7,97

Fonte: EMBRAPA, 2004. Dados bsicos obtidos em FAO (2003). Atualizado em 03/02/ 2004 e consultado em 16/04/2004.

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Como se pode observar, a produtividade mdia oscila muito entre os pases selecionados e a maior parte dos principais produtores mundiais tem rendimento mdio prximo mdia mundial, no sendo naturalmente, uma boa marca. Trata-se de uma medio superficial o Pas, tem rendimento mdio em So Paulo de 10 ton/ha e cerca de 25 ton/ha em Petrolina (PE). Todavia, observando o rendimento mdio de outros pases, menos expressivos do que os citados na Tabela 1, pode-se notar que ainda h muito por crescer nesse quesito. Os dados da Tabela 2 trazem o ranking por produtividade mdia, no ano de 2003. Tabela 2 Ranking dos pases produtores de manga selecionados por produtividade. 2003.

Hectares Toneladas

Ton/hectare Produtividade 45,00 40,00 27,00 26,75 24,22 20,53 20,09 18,84 17,24 16,84 16,00

PasCabo Verde Samoa Ilhas Cook Guatemala Palestina Sudo Porto Rico Venezuela Emirados rabes Repblica Dem. do Congo Israel

rea 100 100 100 6.990 23 9.500 865 4.540 530 11.771 1.500

Produo 4.500 4.000 2.700 187.000 557 195.000 17.375 85.549 9.137 198.226 24.000

Fonte: EMBRAPA, 2004. Dados bsicos obtidos em FAO (2003). Atualizado em 03/02/ 2004 e consultado em 16/04/2004.

Embora se possa argumentar que a rea plantada muito pequena Cabo Verde, Samoa e Ilhas Cook, por exemplo no sirva para parametrizao da realidade global, os dados do Sudo e Congo, destacam a possibilidade de avanos importantes nesse quesito, principalmente considerando as possibilidades de rendimento esperadas.3

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De acordo com VILAS (2003), a cultura da manga uma das mais rentveis Figura 1. Segundo o estudo realizado pelo citado autor, as expectativas de rendimento da cultura ficam atrs, somente da banana, limo e uva (considerada em duas safras anuais). Alm disso, vale considerar que a fruticultura, de um modo geral, possui poderoso elemento de alavancagem regional de emprego e renda. A quantidade de pessoas empregadas muito mais expressiva do que a utilizada em outras culturas (gros, por exemplo), e ainda h a questo da mo de obra feminina, pouco demandada em outras culturas, mas bastante requisitada na produo de frutas.35.000 30.000 25.000 20.000 15.000 10.000 5.000 0

Ba na na M an ga

*

Ac er ol a G oi ab a G ra vi ol a

Fonte: VILAS (2003).

Figura 1 Rendimento por hectare frutas selecionadas.* Valores mdios no Brasil, com uso de irrigao. **Margem de lucro entre 20% e 40% do rendimento bruto. *** Duas safras ao ano.

Ao se considerar o rendimento mdio dos gros (Figura 2), observam-se as vantagens comparativas da fruticultura. certo que se trata de duas atividades bastante diferenciadas e, portanto, tal comparao deve ser feita dentro dos limites cabveis, entretanto, as diferenas so muito expressivas. Alm disso, vale a j comentada diferena no uso de mo-de-obra agrcola. H um grande contingente de pessoas no meio rural que se vincu4

Ab ac ax i Ta ng er in a Ab ac at e

U

va

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la, diretamente, a atividades de produo, colheita e ps-colheita. No caso da fruticultura, a mdia, por hectare de 12 pessoas, contra 3 das culturas de gros.214000 12000 12000 10000 8000 6000 4000 2000 300 0 Manga Arroz Feijo*** Milho *** Soja Trigo 1.600 660 400 300

Fonte: VILAS (2003).

Figura 2 Rendimento por hectare gros selecionados.* Valores mdios no Brasil, com uso de irrigao. **Margem de lucro entre 20% e 40% do rendimento bruto. *** Duas safras ao ano.

Existem elementos adicionais que podem servir de referncia otimista para a produo e comercializao da manga. De acordo com FERNANDES et al (2004), o crescimento da manga no exterior foi muito expressivo no perodo 1998-2002, ficando atrs apenas da uva de mesa e, de acordo com projees realizadas pelo Instituto Brasileiro de Fruticultura IBRAF, as vantagens devem se manter nos prximos anos (Figura 3). De acordo com dados da EMBRAPA, em mdia, do total produzido de manga o Brasil exporta pouco mais de 20%. Os 80 % restantes da produo so para a comercializao e consumo no mercado interno brasileiro. A regio Nordeste a principal regio produtora de manga do pas2

Esses so valores mdios. Diversas pesquisas apontam para nmero muito mais expressivos em pocas de colheita, como o caso da goiabeira.

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com 65% da produo nacional, sendo o Vale do So Francisco, o eldorado brasileiro da produo e exportao de manga (Tabela 3).

Fonte: FERNANDES et al (2004)

Figura 3 Estimativas de crescimento do mercado internacional de frutas selecionadas (Mercado Internacional mdia, e exportaes brasileiras), nos perodos de 1998-2002 e 2003-2005 (projeo). Tabela 3 Participao doas regies brasileiras na produo brasileira de manga. 2002.

Regio

rea Quantidade Rendimento Participao colhida produzida mdio na produo (ha) (ton) (ton/ha) (%) Norte 1.450 18.670 12,88 2,22 Nordeste 37.191 551.764 14,84 65,50 Sudeste 25.528 249.948 9,79 29,67 Sul 813 9.132 11,23 1,08 Centro-Oeste 1.694 12.835 7,58 1,52 66.676 842.349 12,63 100,00 BRASILFonte: EMBRAPA, 2004. Dados bsicos do IBGE Produo Agrcola Municipal de 2002.

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Desagregando a produo por estado, as maiores produes encontram-se na Bahia, So Paulo, Pernambuco e Rio Grande do Norte, sendo que esses dois ltimos possuem rendimentos mdios bastante expressivos, se comparados mdia nacional (Tabela 4). Tabela 4 Principais estados brasileiros produtores de manga rea, produo e produtividade Brasil, 2002.

Estados Bahia So Paulo Pernambuco Rio Grande do Norte Cear Minas Gerais Paraba Sergipe Piau Tocantins

rea (ha) 16.213 19.705 6.623 2.986 4.515 5.058 2.370 1.144 1.849 564

Produo (ton) 252.952 208.947 136.488 50.982 38.247 29.949 24.464 18.725 17.979 10.382

Rendimento (ton/ha) 15,60 10,60 20,61 17,07 8,47 5,92 10,32 16,37 9,72 18,41

Fonte: EMBRAPA, 2004. Dados bsicos do IBGE Produo Agrcola Municipal de 2002.

Como possvel observar, o estado de Pernambuco o que possui as melhores mdias de produtividade, bastante acima das mdias nacionais e prximas das observadas pelos recordistas mundiais. De fato, o plo de produo do Vale do So Francisco tem congregado esforos, atravs dos seus empresrios locais, para o alcance de padres de qualidade compatveis com as exigncias internacionais, e esse esforo coordenado e em parceria com representantes de outras regies do Pas foi recentemente reconhecido. De acordo com notcia da Folha On-Line (Braslia), depois de 32 anos de negociaes, o governo do Japo assinou um decreto abrindo seu mercado para as mangas produzidas no Brasil. De acordo com a citada reportagem, o decreto do governo japons permite a exportao de um volume inicial de 5.200 toneladas por ano da variedade Tommy Atkins, pro7

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duzida principalmente no Nordeste (Vale do So Francisco e Livramento, Bahia) e em So Paulo. O assessor para Assuntos Internacionais da Secretaria de Defesa Agropecuria, Gilson Cosenza, disse que 90% das 820 mil toneladas de manga produzidas todo ano no Brasil so dessa variedade. Em 2003, o Brasil exportou 126 mil toneladas da fruta para Estados Unidos e Unio Europia, gerando US$ 71 milhes em divisas. As mangas destinadas ao mercado japons, ainda mais exigente que o norte-americano e o europeu, devem ser comercializadas a US$ 2 mil por tonelada. Nessa primeira etapa, as exportaes para o Japo devem render anualmente cerca de US$ 10,4 milhes ao pas. Essa breve referncia destaca o potencial de exportaes do Brasil e, simultaneamente, a necessidade de compreender e adaptar-se s regras internacionais. Ainda de acordo com o citado texto, os produtores de manga do Vale do So Francisco, na divisa da Bahia com Pernambuco, se preparam para comear a exportao da fruta para o Japo. Na realidade, os produtores do Vale do So Francisco j exportam manga para a Europa e os Estados Unidos em torno de nove milhes de caixas anuais. De acordo com a Folha On-Line , a previso da Associao dos Exportadores do Vale de que sejam vendidas tambm um milho de caixas para o Japo a cada ano. Mas, para que os negcios sejam efetivados, ser preciso fazer algumas modificaes nos galpes onde a fruta embalada para atender s exigncias do mercado japons. Por exemplo, para medir a temperatura dos tanques onde ficam as mangas que so vendidas para os mercados americano e europeu, so usados apenas quatro termmetros em cada um. O governo japons exige que sejam instalados 12 termmetros em cada tanque.

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3. CONSIDERAES ADICIONAIS SOBRE A COMERCIALIZAO E CONSUMO DE MANGA.A manga hoje, uma das mais importantes frutas tropicais que compem a dieta alimentar das classes mdia e alta brasileira, com um consumo mdio per capita da ordem de 1,2 kg/ano. No entanto, em algumas capitais, como So Paulo, o consumo de manga alcana 2,5 kg/per capita/ano (EMBRAPA, 2004). No interior do Pas, ainda se observa, largamente, o consumo informal da fruta. tpico encontrar, em pequenas cidades brasileiras, o discurso de que a boa manga a colhida no p, pintadinha e com fiapo, para chupar e no comer aos pedaos. Essa uma cultura alimentar que, com o passar dos anos, tem se atenuado, e importante que isso ocorra, pois a insero competitiva no mercado internacional ser bastante beneficiada com a criao de um mercado consumidor atento e exigente. Quanto melhor a qualidade demandada pelo consumidor domstico, melhor o padro de adequao da produo nacional. Desconsiderando esse consumo rudimentar, em termos comerciais constata-se que a comercializao de manga no mercado interno brasileiro centraliza-se, praticamente, em uma variedade - Tommy Atkins que representa quase 80% da rea plantada no Brasil. Essa escolha deve-se ao fato de tratar-se de variedade muito produtiva, com atrativa colorao de casca (avermelhada), apresentando-se pobre nos atributos de qualidade de polpa, como sabor e ausncia de fibras (TODAFRUTA, 2004). De acordo com QUEIROZ PINTO, 2004), a qualidade da manga exportada ou apresentada nos balces de atacadistas e varejistas no mercado interno representa o fator principal na escolha do consumidor. No entanto, h que se considerar que o termo qualidade , per si, bastante vago, podendo representar uma gama variada de elementos e caractersticas intrnsecas do produto, podendo, inclusive, variar entre regies. Em se tratando de um produto alimentar, destacam-se os atributos externos e a palatabilidade espera-se um fruto de bom tamanho (no exagerado), aparncia vistosa e sem machucados (defeitos), de bom sabor e baixa quantidade de fibras. Segundo o referido autor, em tese, o consumidor no se preocupa se a variedade de manga mais produtiva ou mais resistente a uma determina9

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da doena, ele est interessado na qualidade do fruto que ir consumir. O sabor, o rendimento e qualidade da polpa so qualidades muito importantes no grau de seletividade do consumidor. A despeito dessa realidade, no Brasil, ainda bastante comum que os representantes da cadeia produtiva (do produtor ao varejista) no se preocupem com a qualidade da fruta comercializada, principalmente no quesito aparncia. Como decorrncia, praticamente inexiste o zelo pelas caractersticas locais de consumo como dito - , as preferncias do consumidor variam espacialmente. Naturalmente, o contrrio acontece com os mercados externos de destino da produo nacional basicamente o europeu e norte-americano. A aparncia externa da fruta serve, apenas, como fator de aproximao inicial. A partir da, inicia-se o processo de investigao e descobrimento das qualidade do produto ofertado: sabor, doura, rendimento, maciez, so seqencialmente considerados no processo de escolha. Em relao aos preos, as sries indicam queda dos mesmos no atacado. Os dados disponveis na Figura 4 mostram o comportamento dos preos para cada categoria de produto (Variedades Tommy Atkins, Haden e Espada) no mercado domstico (e centros de comercializao selecionados).9 8 7 6 5 4 3 2 1 0 1 99 9 To m m y Atk in s Be lo H orizo nte 2 00 0 H ad e n B ras lia 2 00 1 H ad e n B elo H o riz on te 2 00 2 Es pa d a R e cife 2 00 3 Es pa d a R io d e Ja n eiro

Fonte: Agrianual, 2004. Dados bsicos coletados dos CEASAs locais e deflacionados segundo o IGP-DI (FGV).

Figura 4 Comportamento dos preos de mangas selecionadas em mercados d referncia. Mdias anuais (Reais/kg).

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Observa-se que a variedade Tommy a que tem mantido preos mais estveis, mesmo considerando o expansivo crescimento da oferta. De acordo com dados do Agrianual 2004, na CEAGESP, o volume comercializado dessa variedade passou de 55.375 toneladas para 75.533 toneladas entre 1999 e 2002, o que representa uma expanso de cerca de 36% - naturalmente, essa estabilidade relativa se manifesta em funo da demanda ascendente. Alis, no que se refere demanda, no se pode deixar de destacar o crescente desenvolvimento da indstria de sucos nacional. O que h alguns anos no era fato sequer em perspectiva encontrar sucos processados em praticamente todo o Pas hoje realidade tangvel. certo que o movimento em prol da boa sade ajudou nesse processo, mas tambm verdade que houve muito esforo do empresariado nacional. E existe espao para crescimento adicional. De acordo com NIERI (2004), em sucos, a produo mundial prxima de 20 bilhes de litros ao ano sendo que o Brasil exportou apenas 23 milhes de litros (praticamente apenas suco de laranja) o que , realmente, muito pouco. De acordo com o autor, preciso divulgar os sucos brasileiros no exterior [...], o caminho trilhado pela indstria de suco de laranja deve servir de exemplo, para que o Brasil possa um dia desfrutar a posio que merece ocupar no mercado internacional. Ademais, no que se refere manga, esse um fato claro: alm de saborosa e de possuir alto rendimento, a fruta se presta a uma imensa variedade de subprodutos, dos quais o suco apenas o mais expressivo representante. Com vistas a melhor compreender o comportamento da oferta de manga, principalmente no mercado externo, buscou-se relacionar, atravs de um modelo simplificado, os efeitos de variaes nos preos externos da manga sobre a oferta de exportaes do produto. Naturalmente, trata-se de um modelo simplificado, mas til compreenso dos mecanismos que norteiam a oferta do produto no mercado internacional, pelo menos sob o quesito mais direto: o preo.

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3.1. Oferta de exportaes da manga brasileira: uma estimativa da elasticidade-preo da oferta de manga brasileira no mercado internacional.Uma ferramenta simples, porm til, decorrente dos modelos tradicionais de entendimento do comportamento da oferta de um determinado bem, a estimativa do coeficiente de elasticidade-preo da oferta. Sua base conceitual discutida dentro da teoria da oferta, sendo definida como as vrias quantidades desta por unidade de tempo, que os produtores esto dispostos a colocar no mercado, a todos os preos alternativos, em determinada poca, quando os demais fatores relevantes permanecem constantes (VARIAN, 1999). De acordo com REIS et al. (2003), a oferta de exportao de um produto pode ser definida como: as quantidades deste produto, que os produtores colocam no mercado durante um perodo de tempo, a determinados preos, ceteris paribus. Assim, de acordo com a lei da oferta, tende a existir uma relao direta entre o preo e a quantidade ofertada do produto. Portanto, a curva de oferta ter uma inclinao positiva. Esta abordagem vlida para a quantidade exportada, uma vez que quanto maior o preo de exportao, maior tende a ser a quantidade exportada do produto. Assim sendo, utilizou-se como referncia o modelo descrito por REIS et al. (2003), em que se expressa matematicamente essa relao como: Qx S = f (PXt, PIt, RPt, TCt), em que Qx S = quantidade exportada da mercadoria X, por unidade de tempo; PXt = preo externo do bem X no tempo t (com defasagens); PIt = preo interno do bem X no tempo t (com defasagens); RPt = renda per capitano tempo t; TCt = taxa de cmbio no tempo t. Na especificao deste modelo de exportao que, como dito, deriva da descrio de REIS et al (2003), adota-se a hiptese de que o pas analisado pode ser considerado como um pas pequeno no contexto internaci12

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onal, de forma que as suas exportaes no sejam suficientemente expressivas para influenciar os preos do mercado externo. Essa uma hiptese bastante realstica, considerando que o Brasil no figura entre os principais exportadores de manga no mundo. Por simplificao, a oferta de exportaes da manga brasileira foi especificada na forma duplo logartmica, o que facilita a compreenso dos resultados. As sries (que congregam o perodo 1990-2003) foram obtidas a partir das bases de dados do AliceWeb (Ministrio do Desenvolvimento, Indstria e Comrcio), da Fundao Getlio Vargas (FGV Dados), FAO e Instituto de Economia Aplicada (IPEA Data). No foi possvel, dadas as limitaes do modelo bsico e mesmo dos objetivos do presente estudo, estimar os efeitos da imposio de barreiras tcnicas atualmente em vigor, o que se espera realizar futuramente. O resultado obtido para a elasticidade-preo da oferta de exportaes foi igual a 1,34, indicando um aumento na cotao da manga (j considerando a defasagem), que se reflete em uma oferta mais que proporcional: formalmente, um incremento percentual de 1% no preo estimula a quantidade ofertada em 1,34%. Esse resultado encontra-se dentro do esperado, uma vez que foi positivo (explicitando a relao direta em preo e quantidade ofertada) e maior do que a unidade (o que indica tratar-se de um bem no essencial). Os resultados tambm mostraram que h sensibilidade (significativos a 5%) s variaes dos preos domsticos. Esse tambm era um resultado esperado, uma vez que o produtor tende a considerar os preos internos no momento da deciso de venda. Esse , alis, um fator crtico nas exportaes nacionais. Salvo nos locais em que a produo j se adequa e se organiza em torno das exportaes, boa parte dos produtores considera a idia da venda externa como uma opo, no como regra. O problema que, ao fazer isso, a busca pela adequao aos exigentes padres internacionais fica subestimada e se deixa de formar um parque exportador coeso e uniforme.

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4. CONSIDERAES FINAISA primeira constatao ao se tomar contato com a magnitude das cifras que permeiam a estrutura de produo da manga no Brasil a de que se trata de uma atividade em expanso e de grande potencial de crescimento. A segunda constatao de que ainda h muito o que fazer, at que se chegue a um padro de excelncia. De fato, a no ser em algumas regies produtoras especficas, cuja produo tem destinao preferencialmente para o mercado externo, a maior parte da produo nacional tem rendimento bastante baixo, o que indica a inadequao de variedade e/ou, deficincia de tratos culturais. Embora no seja objeto dessa pesquisa analisar fatores relacionados tecnologia empregada na atividade que so de carter eminentemente tcnico, naturalmente fazem parte das preocupaes dessa pequena pesquisa, pois incidem, diretamente, no rendimento e sustentabilidade da atividade. Basicamente, necessrio que sejam observadas, na estrutura de produo: a colheita e ps-colheita; a qualidade e adequao das mudas; o cuidado na colheita manual, afim de que no sejam perdidos frutos potencialmente bons; uma seleo rigorosa das frutas de qualidade adequadas para o padro mesa e industrial; uma melhoria da capacidade de processamento e adequao crescente s normas internacionais (no apenas para insero direta, mas como forma de ampliao gradativa da qualidade do produto oferecido). Alm disso, preciso investir em campanhas que mostrem, dia a dia, aos consumidores principalmente os domsticos os benefcios do consumo da manga, destacando o fato de que uma fruta de qualidade, em benefcios, mais que compensa o valor nela investido. Em sntese, parafraseando o pesquisador Luciano Nieri se isso for feito o Brasil deixar de ser um exportador de pouca expresso, apesar da imensido de seu territrio e da sua alta produo de frutas. A trava comercial precisa ser superada e pode s-lo, como mostram os empresrios empreendedores dos principais plos de produo do Pas.

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BIBLIOGRAFIAAGRIANUAL. FNP Consultoria & Agroinformativos. So Paulo: FNP. 2004. EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECURIA EMBRAPA. www.cnpmf.embrapa.br (Acesso em outubro de 2004). FAO www.fao.org.br (acesso em setembro de 2004). FERNANDES, M.S., FERRAZ, M S e OLIVEIRA, V. Mais espao no mercado mundial de frutas. In: Agrianual 2004. So Paulo: FNP Consultoria & Agroinformativos. FOLHA ON-LINE. Disponvel em www.folhaonline.com.br (acesso em outubro de 2004). FUNDAO GETLIO VARGAS FGV www.fgv.br (FGVdados Acesso em setembro e outubro de 2004). INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATSTICA IBGE. www.ibge.gov.br (acessos em setembro e outubro de 2004). INSTITUTO DE PESQUISA ECONMICA APLICADA IPEA. www.ipea.gov.br (IPEAData acesso em setembro e outubro de 2004). NIERI, L. Para exportar mais sucos de frutas tropicais. In: Agrianual 2004. So Paulo: FNP Consultoria & Agroinformativos. PINTO, A C Q. Entrevista concedida ao site TODAFRUTA. Disponvel em www.todafruta.com.br (Acesso em outubro de 2004). VILAS A T. Panorama do agronegcio da fruta no Brasil e no mundo. (s/d sem referncia).

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Melhoramento Gentico da Manga (Mangifera Indica L.) No Brasil

MELHORAMENTO GENTICO DA MANGA (Mangifera indica L.) NO BRASILEng. Agr. Ph.D. Alberto Carlos de Queiroz Pinto Embrapa Cerrados DF e-mail: [email protected]

1. INTRODUOA manga (Mangifera indica L.) uma das principais frutas tropicais produzidas no Brasil. A projeo de demanda dessa fruta para o ano 2000, segundo dados da FAO (FAO Yearbook Production, 1998), foi de aproximadamente 25,1 milhes de toneladas, o que a torna um atraente investimento para o fruticultor. Embora a rea cultivada tenha crescido nos ltimos anos, a produo no tem acompanhado esse crescimento (Agrianual, 2000). A base comercial da mangicultura brasileira, no entanto, est alicerada apenas em algumas poucas cultivares, todas de origem americana e, dentre elas, a Tommy Atkins responsvel por cerca de 80% da rea plantada (Pinto, 1996; Pinto & Ferreira, 1999). Apesar das vrias caractersticas agronmicas positivas apresentadas por esta cultivar, como a excelente colorao do fruto, sua relativa resistncia a doenas e aceitvel vida de prateleira, sua elevada suscetibilidade malformao floral, o colapso interno da polpa e a m qualidade do fruto quanto ao sabor, tm sido bastante contestadas. Portanto, a grande responsabilidade do melhorista de manga aumentar a disponibilidade de variedades que renam as melhores caractersticas agronmicas e comerciais, diminuindo a vulnerabilidade, hoje existente, nessas grandes reas de cultivos monoclonais, os quais podem ser destrudos totalmente pelo ataque de uma praga ou doena especfica sobre essa variedade. Outras cultivares, como a Haden, a Keitt, a Kent, a Van Dyke e a Rosa, tambm tm sido plantadas, porm, em escala bem menor. Portanto, essa alta predominncia de uma nica cultivar deixa a cultura com um elevado grau de vulnerabilidade, principalmente em relao ao aparecimento de doenas e pragas de grande poder e destruio. Assim sendo, o melhorista tem, dentre outras atribuies, a grande responsabilida17

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de de mudar esse panorama, aumentando a disponibilidade de cultivares superiores (Pinto & Ferreira, 1999). Para tanto, fundamental a ampliao da atual base gentica existente, por meio, principalmente, da introduo de novos materiais genticos, da sua utilizao apropriada e da aplicao de mtodos eficientes de melhoramento, alm do emprego das modernas tcnicas em biotecnologia, para auxiliar no processo de identificao e seleo de gentipos superiores. O objetivo deste trabalho discorrer sobre o melhoramento gentico da mangueira, enfocando recursos genticos e sua utilizao, os mecanismos reprodutivos, os principais mtodos de melhoramento atualmente em uso, bem como outros mtodos de uso potencial e, ainda, os recentes progressos obtidos com a utilizao de cada mtodo. Finalmente, aborda-se o emprego de marcadores moleculares, tanto na identificao e caracterizao do germoplasma, como no melhoramento gentico propriamente dito.

2. A CITOGENTICA DA MANGUEIRAA mangueira considerada uma espcie alopoliplide, mais provavelmente um anfidiplide, ou seja, um poliplide constitudo por dois complementos somticos completos de duas espcies diferentes sendo, predominantemente, uma espcie algama. A Mangifera indica a espcie de maior estabilidade no nmero de cromossomos (2n = 40), embora Singh (1969) cite a ocorrncia de plantas tetraplides alto nmero mais alto de cromossomos (2n = 2x = 80). A variao existente em mangueira, mesmo entre as enxertadas, confirmada pelo polimorfismo detectado atravs de 4 enzimas isolados de tecidos de folhas de mangueira (Gan et al. 1981). O estudo citogentico proporcionou evidncias de que h um grande potencial no melhoramento da manga quando se usam outras espcies do gnero Mangfera, visando a obteno de hbridos interespecficos de importncia agronmica e comercial (Mukherjee, 1963). A Mangfera odorata pode ser usada como porta-enxertos ou como progenitor nos trabalhos de cruzamentos, visando obteno de hbridos interspecficos com excelente adaptao a climas muito midos que influenciam o ataque de doenas na manga comercial. A Mangifera caesia, cultivada no Sudeste da sia, produz fora da poca normal de colheita da espcie Mangfera indica utiliza18

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da comercialmente (Bompard, 1993). Com o uso desta espcie, podem-se obter prognies que produzam em pocas, cujos preos sejam mais vantajosos para o produtor.

3. RECURSOS GENTICOS 3.1. A Domesticao e Classificao da EspcieA mangueira uma planta que foi domesticada h milhares de anos e caracteriza-se por produzir frutos de tima qualidade, sendo considerada uma das mais importantes espcies frutferas de clima tropical. No obstante tenha se originado em locais de clima quente, ela se adapta bem s condies de clima subtropical, principalmente devido sua boa plasticidade fenotpica, a qual confere ampla facilidade de adaptao aos diferentes ambientes, a manga se dispersou por todos os continentes, sendo cultivada atualmente em todos os pases de clima tropical e subtropical. Mukherjee (1985), seguindo a classificao proposta por Vavilov (1950) para os centros de origem das plantas cultivadas, relata que a mangueira originria do segundo grande centro, o Indiano e do subcentro IndoMalaio. Essas regies distintas deram origem s duas raas de manga: a raa indiana, originria no centro Indo-Burma Tailands, que produz frutos de boa aparncia externa, cuja casca bem colorida, variando de rosa a vermelho intenso e sementes monoembrinicas; a raa filipnica ou indochinesa, originria no centro Filipinico Celeste Timor, a qual produz fruto de formato alongado, com casca verde-amarelada quando maduro e sementes poliembrinicas. A mangueira pertence famlia Anacardiaceae, na qual alm de Mangifera, so encontrados outros gneros importantes, tais como Anacardium, Pistachio e Spondias. No gnero Mangifera, Mukherjee (1985) descreve 39 espcies, enquanto Bompard (1993) relata a existncia de 69 espcies e as classifica em dois subgneros com diversas sees, baseados em caracteres morfolgicos. Dentre essas espcies, a Mangifera indica a mais importante, muito embora existam outras espcies que produzam frutos comestveis, como M. altissima, M. caesia, M. lagenifera, M. macrocarpa, M. odorata e M. sylvatica.19

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3.2. A Distribuio Fitogeogrfica, Raas e EspciesCom relao distribuio fitogeogrfica, a ocorrncia do maior nmero de espcies encontra-se na Pennsula Malaia, com cerca de 20 espcies, notadamente nas florestas de terras baixas. J as formas selvagens de M. indica, que so bastante prximas dos tipos cultivados, ocorrem com maior frequncia em Burma, Nordeste da ndia e Andamans, locais para onde devem ser direcionadas expedies de coleta de germoplasma. Dentre as espcies de Mangifera, a M. indica e M. foetida so as mais dispersas, ocorrendo respectivamente, em 100% e 67% das regies que constituem os centros de diversidade descritos acima (Singh, 1982; Mukherjee, 1985). Eiadthong et al. (1999) identificaram 13 espcies de Mangifera que ocorrem na Tailndia, dentre as quais, a M. indica, endmica no pas e uma das principais culturas da Tailndia e a M. foetida, conhecida localmente como horse mango, cultura relativamente importante no Sul da Tailndia. A M. sylvatica e a M. odorata so cultivadas apenas em pequena escala e em quintais. As outras nove espcies no so cultivadas. A ocorrncia das duas raas de M. indica, a indiana e a filipnica, tem proporcionado, atravs de cruzamentos naturais ou artificiais, a obteno de hbridos inter e intraraciais, que deram origem a centenas de variedades, com caractersticas bastante diversificadas. A biologia floral, aliada ao carter heterozigtico da planta, conduz a uma ampla diversidade de formas de copa, ramos, folhas, flores e principalmente de formas, coloraes e qualidades dos frutos. Isto podia ser observado nos pomares oriundos de material propagado por sementes (notadamente aquelas monoembrinicas), que predominavam no Brasil, h cerca de 2 a 3 dcadas. Da sia, a manga se dispersou por vrios pases, no obstante haver uma grande limitao com relao longevidade das sementes (altamente recalcitrantes), aliada ao tempo de durao das viagens, na poca em que ocorreu a disperso da espcie. Mukherjee (1985) relata que a distribuio da mangueira concentra-se entre os trpicos de Cncer e Capricrnio, nas latitudes de 20 Norte a 20 Sul, atingindo atualmente, quase 100 pases. A manga foi introduzida na Amrica, provavelmente pelos portugueses no Brasil, no sculo XVI. Logo em seguida, foi introduzida no Mxico20

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pelos espanhis. As primeiras introdues no Brasil, no entanto, referiamse as variedades da raa filipnica, que geralmente produzem frutos com polpa fibrosa e de baixa qualidade e com semente poliembrinica, com pequena variao gentica. Isso fez com que a cultura da manga ficasse limitada a pequenos pomares, sem muita expresso, especificamente para atender ao mercado interno de maneira bem regionalizada, por quase trs sculos. Na metade deste sculo, no entanto, foram realizadas introdues de variedades melhoradas da raa indiana, procedentes da Florida/USA, portadoras de melhor qualidade, com sementes monoembrinicas, que induzem grande variabilidade quando plantadas de p franco. Este fato modificou sensivelmente a indstria mangcola nacional, dando um novo alento cultura, pois essas variedades americanas, que produzem frutos com pouca fibra, bem coloridos e mais resistentes antracnose, so mais comercializveis, permitindo inicialmente ampliar o excelente mercado interno e, mais recentemente permitindo conquistar o mercado externo, notadamente dos Estados Unidos e Japo. A cultivar Haden foi introduzida no Brasil em 1931, mas s a partir da dcada de 60 foi plantada comercialmente. Apresenta uma srie de limitaes, principalmente com relao sua suscetibilidade seca da mangueira e alternncia de produo. Em 1970 foi introduzida a Tommy Atkins, junto com muitas outras variedades, que foram testadas e algumas recomendadas para as condies brasileiras. Com o aumento da demanda interna e o interesse crescente pelas exportaes a partir de 1980, a Tommy Atkins se mostrou bastante adequada, principalmente devido a sua maior tolerncia antracnose. A partir disso, juntamente com a Keitt tem sido as variedades mais plantadas no pas (Piza Jr., 1989; Donadio, 1996).

3.3. Colees e Bancos Ativos de GermoplasmaExiste um grande acervo de germoplasma de manga, catalogado nas diversas colees mundiais (Tabela 1). So quase 6 mil acessos, incluindo as repeties, dos quais aproximadamente 83% esto disponveis para intercmbio (Bettencourt et al., 1992). A maior coleo encontra-se no Instituto de Pesquisa Hortcola da India - IIHR, em Bangalore, com 1100 acessos.21

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No Brasil existem 6 bancos e/ou colees de germoplasma de manga. As principais colees de manga no Brasil so as seguintes: Embrapa/ CPATSA em Petrolina-PE com 105 acessos, IAC/EET/EEP em PiracicabaSP com 100 acessos, Embrapa/CPAC em Planaltina-DF com 72 acessos, UNESP/FACVJ em Jaboticabal-SP com 60 acessos, US/ESALQ em Tiet e Pindorama ambas em SP com 53 acessos e UFV em Viosa-MG com 17 acessos. Ao todo so conservados 208 acessos distintos. Porm, incluindo as duplicatas so 437 acessos, portanto mais de 50% so repeties entre as diversas colees catalogadas. Desse total, 105 acessos esto em apenas uma coleo, 44 acessos esto em duas colees, 28 acessos so catalogados em trs colees, 19 acessos esto presentes em quatro colees, oito acessos aparecem em cinco colees e oito acessos aparecem em todas as colees (Ferreira & Pinto, 1998), perfazendo um total de mais de 400 acessos, incluindo obviamente as duplicatas existentes entre as diversas colees. Todas as colees so mantidas no campo, com cerca de 3 a 5 plantas por acesso, na forma clonal e geralmente enxertadas sobre os portaenxertos Espada, Coquinho ou Rosinha, sendo conservadas a longo prazo para os trabalhos de caracterizao e avaliao. Devem-se buscar outras formas de conservao, pois a conservao a campo alm de onerosa e trabalhosa vulnervel, sujeita aos problemas de ordem bitica e abitica. Como a semente da manga recalcitrante, com longevidade bastante curta, uma forma eficiente de conservao de germoplasma pode ser a criopreservao. O banco ativo de germoplasma BAG de manga, amparado por projeto de pesquisa no programa 2 do Sistema Embrapa de Planejamento SEP, Conservao e Uso de Recursos Genticos, localiza-se na Embrapa Semi-rido, e est implantado no Campo Experimental de Mandacaru, no municpio de Juazeiro - BA. Neste BAG, alm da manuteno do germoplasma no campo, so realizados trabalhos de caracterizao e avaliao, notadamente parmetros de produo e caractersticas dos frutos. Na medida do possvel, procura-se seguir a metodologia preconizada pelo IBPGR (1989).

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Tabela 1- Principais colees de germoplasma de manga existentes no mundo.Pas Instituio M. indica Mangifera sp Avaliao Austrlia DPI 63 Parcial Bangladesh BARI 107 Em desenv. Brasil * Vrias 407 Em desenv. Chile INIA 3 No Colmbia Corpoica 59 1 Em desenv. Costa Rica Vrias 51 -0000 Costa Marfin IRFA 50 Cuba DICF 350 Parcial Equador INIAP 4 Fiji Vrias 143 Em desenv. Gualupe CIRAD 31 1 Reunio IRFA 50 Gabo CIMEV 25 ndia IIHR 1100 6 Em desenv. Indonsia Vrias 292 9 Em desenv. Jamaica RDD/MA 63 Parcial Kenia NGK 37 Madagascar DAGAP 36 Parcial Malawi BARS 32 Parcial Malsia MARDI 111 Em desenv. Mxico Vrias 143 Em desenv. Moambique INIA 119 Nicargua Vrias 54 Em desenv. Nigria NHRI 47 Em desenv. Nova Guin DPI 4 No Peru Vrias 81 Parcial Filipinas UPLB 343 9 Parcial Portugal DP/NARS 100 Parcial frica do Sul CSFRI 117 Em desenv. Espanha ICCRAT 59 Sudo HRS 30 Parcial Taiwan TARI 176 Parcial Tanznia TPRI 10 Tailndia Vrias 294 34 Parcial USA Vrias 461 4 Parcial Venezuela FONAIAP 140 Em desenv. Vietn ITFC 3 FONTE: Bettencourt et al, 1992. * Dados atualizados pelos autores. Disponibilidade Disponvel Parcial Disponvel Disponvel Disponvel Disponvel Disponvel Disponvel Disponvel Disponvel Disponvel Disponvel Disponvel Disponvel Disponivel Disponvel Disponvel Disponvel Disponvel Disponvel Disponvel Disponvel Disponvel Disponvel Disponvel Disponvel Disponvel Disponvel -

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As demais colees de germoplasma de manga so colees de trabalho ou apresentam interesse didtico. A coleo da Embrapa Cerrados sustenta um programa de melhoramento gentico por meio da hibridao intervarietal. A coleo da UNESP/FCAVJ se presta tanto ao melhoramento, com a seleo de materiais oriundos de polinizao aberta, como para atividades didticas. O material mantido na coleo da Embrapa Mandioca e Fruticultura tm sido utilizado para alimentar o BAG da Embrapa Semi rido e para seleo de material para propagao. A coleo do IAC tem sido usada para seleo de material, principalmente para utilizao como porta-enxerto, visando resistncia/tolerncia seca da mangueira. A pequena coleo mantida na UFV tem interesse didtico. Alm das colees citadas, existem outras colees menores, que geralmente apresentam materiais duplicados, ou seja, j representados nessas colees catalogadas, que tm interesse regional ou local. A coleo da extinta Empresa de Pesquisa Agropecuria do Cear-EPACE, por exemplo, apresenta 34 acessos, dos quais 85% so repeties das demais colees, apenas cinco acessos so distintos e devem ser remanejados para o BAG da Embrapa Semi rido. Alis, trabalho semelhante deve ser feito nas demais colees, reunindo todos os acessos distintos, numa grande coleo no BAG. Portanto, deve-se programar uma atividade de curto e/ou mdio prazos, para duplicar o nmero de acessos do BAG da Embrapa Semi rido, que atualmente conta com pouco mais de 100 acessos e passaria para mais de 200. Para viabilizar essa atividade, prope-se dinamizar o manejo do BAG, principalmente no que se refere ao adensamento das plantas. Pode-se estudar uma reduo de 50% ou at mesmo 25%, do espaamento utilizado atualmente. Alm disso, deve-se enfatizar a problemtica da identificao do material, indo desde a simples troca da etiqueta, quando da incorporao de um acesso ao banco de germoplasma, at os problemas de denominaes regionais de variedades, com nomes duplicados para o mesmo acesso ou nomes iguais para acessos diferentes. semelhana do que ocorre a nvel internacional, as colees brasileiras necessitam de enriquecimento da variabilidade gentica. Esse enriquecimento pode se dar, principalmente atravs de coleta e/ou introduo de germoplasma. No obstante a mangueira ser uma espcie extica, existem muitos tipos regionais de manga, geralmente propagadas via sementes, em pomares caseiros que devem ser coletados e incorporados aos bancos24

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de germoplasma. J a introduo de germoplasma do exterior deve ser um processo contnuo, visando ampliar a variabilidade gentica disponvel.

3.4. Potencial e Uso dos Recursos Genticos e seus ProblemasH uim grande potencial quanto ao uso dos recursos genticos da manga mas, a grande maioria desse germoplasma, ou seja 90%, a nvel internacional, refere-se espcie Mangifera indica (Pinto & Ferreira, 1999). Porm, existem muitas outras espcies de Mangifera com caractersticas genticas importantes, que ocorrem nas florestas tropicais do Sudeste Asitico, que esto sofrendo eroso gentica pela forte ao antrpica. Esse material deve ser explorado do ponto de vista de coleta de germoplasma e colocado disposio dos melhoristas, alm de ser mantido nos bancos de germoplasma. A seguir so descritas as principais espcies de Mangifera, de acordo com Mukherjee (1985), com algumas caractersticas importantes para uso como recurso gentico: M. altissima Os frutos medem de 5 a 8 cm de comprimento e a polpa quase livre de fibras. usada nas Filipinas para picles M. caesia - Esta espcie apresenta frutos de 18 a 19 cm de comprimento, com polpa de cor branca, rica em suco cido, de boa fragrncia e pouca fibra, porm com grande variao entre os diferentes tipos, sendo alguns mais doces do que outros. H variaes que apresentam sementes totalmente livres, soltas da polpa. M. cochinchinensis Os frutos desta espcie so bem pequenos, medindo em torno de 3 cm de comprimento, com pouca polpa, porem de fino aroma. M. decandra, M. gedebe, M. inocarpoides, M. griffithii e M. quadrifida Estas espcies apresentam plantas que se desenvolvem bem em reas encharcadas, podendo ser testadas como porta-enxerto para plantios em brejos ou em solos de difcil drenagem. M. foetida - Os frutos medem de 8 a 10 cm de comprimento, com pouca polpa com cerca de 2 cm de espessura e muita fibra. Esses frutos quando maduros, so muito consumidos pelos Malaios, pois a polpa doce, embora o flavor no seja muito agradvel. M. indica var. mekongensis As plantas produzem flores e frutos na mesma poca, florescendo e frutificando duas vezes ao ano, o que pos25

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sibilita seu uso na obteno de material gentico com elevada regularidade e produtividade. M. langenifera Os frutos desta espcie medem em torno de 10 a 12 cm, com polpa de colorao creme, com 2 cm de espessura, de sabor medocre. M. macrocarpa - Apresenta frutos grandes oblongos e globosos, com polpa amarela amargo-doce e no so muito saborosos. M. odorata Os furtos medem em torno de 10 cm de comprimento, com distinto sabor quando maduro. A polpa doce, mas tem muita fibra. M. pajang - Os frutos so grandes, com 15 a 17 cm de comprimento, tm casca fina e solta e podem ser descascados como banana. Esse material pode ser interessante para cruzamentos, na obteno de variedades com esta caracterstica de casca solta, com excelente qualidade comercial. A polpa amarelo-clara, doce e cida. M. pentandra As plantas desta espcie produzem frutos esfricos de bom sabor. M. zeylanica Os frutos medem em torno de 6 cm de comprimento aproximadamente e apresentam o mesmo tamanho e a mesma forma dos frutos de M. indica. No obstante ser um acervo respeitvel, o germoplasma de manga carece de dados de caracterizao e avaliao. A grande maioria desse patrimnio gentico no est devidamente caracterizada, embora alguns dados de avaliao dos principais acessos estejam disponveis nos programas de melhoramento da cultura. Esta uma das principais razes da baixa utilizao do germoplasma existente. Bompard (1993) descreve diversas espcies silvestres com enorme potencial para uso no melhoramento. A M. laurina uma espcie muito prxima da raa indiana e com grande adaptao a climas mido, permitindo uma resistncia aprecivel ao ataque de antracnose.. Em Borneo, as duas novas espcies M. rufocostata e M. swintonioides tm em comum uma excelente peculiaridade de produzirem completamente fora de estao. Um dos grandes problemas na maioria das colees e/ou referem-se s introdues feitas de maneira errnea quando da prpria coleta do propgulo na troca e perda da etiqueta do material gentico introduzido. Os26

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prprios curadores ou responsveis pela coleo no so melhoristas ou no tm conhecinento suficiente sobre manga, resultando em lanamento de novos nomes para uma variedade j existente ou mesmo, com a publicao de nomes de variedades totalmente errados. Este tipo de problema ocorreu com o lanamento da variedade Surpresa (Duncan, Alphonso ou Saigon?) e com Informaes Tcnicas sobre manga, mostrando fotos erradas das variedades Van Dyke e Keitt. Isto poderia ter sido evitado, se a aferio e descrio tivessem sido feitas pelo melhorista introdutor da mesma, descrevendo suas caractersticas obtidas junto Instituio de origem. Em uma segunda introduo, vale a descrio usada na primeira pelo melhorista e/ou pelo introdutor responsvel, pois, medida que novas etapas intermedirias de introduo ocorrem, os enganos e problemas ligados aos nomes das variedades aumentam grandemente. A nomenclatura da manga tem sido complicada em decorrncia da imensa sinonmia em termos de variedades entre pases e at mesmo de uma regio para outra no mesmo pas. A variedade Filipina parece ser um clone da Carabao, Manila ou Cecil, enquanto a Davis-Haden uma mutao da Haden. No Brasil, a variedade Jasmim e Coit, em Fortaleza-CE so, morfologicamente, a mesma Bacuri, em Mossor-RN, e Faf em Belm-PA, respectivamente.

4. O MECANISMO DE REPRODUOPara se iniciar um estudo de melhoramento de qualquer a fruteira, h necessidade de se conhecer a biologia floral e o mecanismo de reproduo da planta. Tipo de inflorescncia e de flor existente, nmero e proporo de flores, suas caractersticas morfolgicas, perodo de abertura (antese), a polinizao e os fatores responsveis pela sua ocorrncia natural, como vento e insetos so alguns dos fatores mais importantes no estudo do mecanismo de reproduo.

4.1. A Biologia Floral e os Fatores AmbientaisA mangueira possui inflorescncia tipo pancula de forma cnica a piramidal que se desenvolve, sob condies normais, de gemas terminais de ramos maduros entre 6 e 9 meses de idade, nos quais encontram-se flores perfeitas e masculinas. O nmero de panculas por planta varia de 600 a27

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6000 e as flores por pancula variam de 200 a 4000. As flores iniciam a antese antes mesmo que as panculas atinjam o total comprimento e a maior concentrao na abertura das flores ocorre entre 9 e 11 horas embora ocorra uma certa variao, dependendo das condies climticas da regio. A receptividade do estigma dura cerca de 72 horas aps a antese, embora esteja receptivo antes da antese (Mukherjee, 1985). O nmero de plen por antera varia de 271 a 648, havendo variao entre variedades. A biologia floral da mangueira totalmente adaptada para polinizao a ser feita por trips e vrios tipos de moscas. Embora muitos insetos visitem as flores de mangueira, aqueles pertencentes ordem dptera (moscas) tm a mais alta freqncia (51,6%), vindo a ordem lepidptera (33%) como a segunda de maior freqncia (Jison & Hedstron, 1985). Alm da luminosidade, a temperatura outro fator ambiental de grande influncia na expresso sexual em mangueira. Baixas temperaturas durante o desenvolvimento da inflorescncia contribuem para a reduo no nmero de flores perfeitas na pancula. As panculas que emergem na metade e no final da estao de florescimento possuem duas a sete vezes mais flores hermafroditas que aquelas que emergem no incio (Singh et al., 1966). Temperaturas abaixo de 16 C e/ou acima de 34 C podem inibir a germinao do tubo polnico, resultando na no fertilizao. Algumas cultivares monoembrinicas como a Haden no vingam nenhum fruto quando as condies ambientais, principalmente temperaturas acima de 35 C, inibem o desenvolvimento do embrio zigtico ou causam sua degenerao, ocorrendo a queda de flores perfeitas e de frutinhos (Mukherjee, 1953; Sturrock, 1968). Este fenmeno no acontece com cultivares poliembrinicas, uma vez que embries nucelares desenvolvem-se naturalmente favorecendo o vingamento de frutos.

4.2. A Expresso SexualA relao sexual em mangueira a proporo entre flores hermafroditas e estaminadas, sendo bastante varivel dentro da pancula, da planta e entre cultivares. A variedade Edward em condies de Cerrados chega a alcanar uma proporo superior a 75% de flores masculinas, sendo bem superior a Tommy Atkins com 52-62% de flores masculinas, considerando tanto a posio da flor na raquis quanto a posio da pancula28

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na planta (Pinto et al., 1987). Resultado superior foi obtido nas mesmas condies dos Cerrados na cultivar Mallika, a qual apresentou uma mdia de 82,5% de flores estaminadas nas trs pores basal, mdia e apical na pancula, enquanto a Amrapali apresentou 65,8% desse tipo de flor. Em ambas as variedades, a concentrao de flores hermafroditas aumentou da base para a poro apical da pancula, variando de 8,4% para 28,7% na Mallika e de 30,1% para 43,6% na Amrapali. Alm de fatores ambientais, vrias condicionantes fisiolgicas esto envolvidas na expresso e na relao sexual entre flores estaminadas e hermafroditas. A observao de que variedades de mangueira adaptadas a climas tropicais geralmente tm rendimento baixo quando exploradas em climas subtropicais, deve-se possivelmente devido baixa proporo de flores hermafroditas (Singh et al., 1965). Esta hiptese de que a maior proporo de flores hermafroditas na pancula da mangueira esteja correlacionada com um maior vingamento e produtividade da planta bastante controvertida e pouca aceita. Alguns estudos tm demonstrado que uma maior relao entre flores perfeitas e estamindas no influencia uma maior produtividade, se a proporo de flores hermafroditas for inferior a 4% ( Singh, 1964).

4.3. A Polinizao e a IncompatibilidadeA polinizao em mangueira, principalmente aquelas monoembrionicas, considerada um fator limitante, j que o grande nmero de flores no corresponde ao muito pequeno nmero de frutos vingados. As plantas poliembrinicas produzem embries nucelares no sendo, necessariamente, obrigadas polinizao para ocorrer a fecundao e vingamento de frutos. A ocorrncia de incompatibilidade evidenciada com a degenerao dos tecidos embrinicos e nucelares e excessiva queda e perda de frutinhos. A auto-incompatibilidade parcial ou completa em mangueira tem sido citada por vrios autores (Sharma & Singh, 1970; Ram et al. 1976, Pinto et al., 2002). A auto-incompatibilidade foi claramente evidenciada na cultivar Dashehari (Singh el at. 1962). Estudos embriolgicos tm mostrado que, embora a fertilizao resultante do cruzamento entre pais incompatveis ocorra logo aps a polinizao, a degenerao do endosperma verifica-se 15 dias depois, o que demonstra ser a auto-incompatibilidade do tipo29

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esporofitica (Mukherjee et al., 1968). Testes sobre a habilidade de combinao e compatibilidade em autocruzamentos e cruzamentos recprocos foram realizados nos Cerrados brasileiros, usando-se trs variedades de mangueira: Mallika, Amrapali e Tommy Atkins. A variedade Mallika demonstrou uma elevada auto-incompatibilidade (96%), enquanto a Amrapali demonstrou uma excelente capacidade de combinao com as outras variedades (Pinto et al., 2002). A Tommy Atkins apresentou aceitvel compatibilidade com a Amrapali porm, muito baixa capacidade de combinao (< 5%) com a cultivar Mallika, demonstrando que existe incompatibilidade no cruzamento entre variedades de mangueira.

4.4. O Vingamento e a Reteno de FrutosO fenmeno do baixo vingamento de frutos muito comum em mangueira, uma vez que, no mximo, 35% do total de flores da mangueira so polinizadas, resultando em cerca de 0,01% o nmero de frutos no stand final (Singh, 1954). Vrios fatores so responsveis pelo baixo vingamento de frutos como, o grande nmero de flores perfeitas que no so polinizadas e o alto nmero de flores masculinas na pancula. Alm do pequeno nmero de plen por antera que um fator gentico (variedade), os fatores nutricional (deficincia de B) e ambiental, como a temperatura abaixo de 16C, tambm afetam a produo e a viabilidade do plen, causando um baixo vingamento de frutos (Sharma & Singh, 1970). A absciso de flores e frutos de mangueira ocorre ao acaso em qualquer posio da pancula, embora um maior nmero de frutos se estabelea ou ocorra o vingamento na poro terminal da pancula. No perodo de cruzamentos intervarietais de mangueiras, cultivadas sob regime de sequeiro nos Cerrados do Brasil Central, a umidade relativa do ar muito baixa (< 30%) e provoca uma grande queda dos frutinhos vingados. O maior percentual de queda (67%) ocorre dentro de uma semana aps a fecundao, quando os frutos atingem o tamanho cabea-de-alfinete. Ao alcanarem o tamanho bola-de-gude, a queda declina para uma mdia de 22% dos frutos vingados inicialmente e, praticamente, param de cair quando atingem o tamanho bola-de-bilhar com percentual de queda inferior a 1%. Duas pulverizaes semanais com gua fria sobre as panculas, cujas flores foram recm utilizadas nos cruzamentos, contriburam com o aumen30

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to mdio de 1,5% para 6,4%.no vingamento de frutos, com isso aumentando a populao de prognies hbridas. O uso de reguladores de crescimento como o cido naftaleno actico (ANA), aplicado no estgio pr-antese e na dose de 40 a 50 ppm, tem contribudo para o aumento de 300 a 400% no vingamento e reteno de frutinhos de manga (Ram, 1983).

4.5. A Embrionia e a EstenospermocarpiaA mangueira classificada em dois grupos de acordo com o modo de reproduo das sementes: o grupo monoembrinico e o grupo majoritariamente poliembrinico. As mangas monoembrinicas tm somente um embrio zigtico sendo, provavelmente, de origem hbrida, portanto, diferentes da planta-me. As sementes de mangas majoritariamente poliembrionicas podem conter um ou mais embries e um dos quais pode ser, mas nem sempre, zigtico. Os embries nucelares, tambm denominados de embries adventcios, formam plantas similares planta-me, sendo recomendados para o uso como porta-enxertos, devido possibilidade de se estabelecer um pomar de aceitvel uniformidade. O carter de poliembrionia manifestado pela ao de um ou mais genes recessivos, portanto, o cruzamento de mangas monoembrinicas com poliembrionicas resulta em prognies monoembrinicas (Leroy, 1947, citado por Iyer & Degani, 1997; Sturrock, 1968). Trabalhos de cruzamento controlado entre variedades mono e poliembrinicas esto sendo realizados pela Embrapa Cerrados, visando checar esse tipo de herana quanto ao carter poliembrionia. Na prtica, o viveirista comumente elimina a (s) plntula (s) mais raqutica (s) quanto ao dimetro do caule e altura, considerando-a (s) como material zigtico, e enxerta a mais vigorosa que considerada, empiricamente, como sendo de origem nucelar. Esta relao no totalmente verdadeira pois, uma semente poliembrinica com 5 embries, a competio entre os 4 embries nucelares pela reserva nutricional da nucela/ cotildone muito grande. Portanto, possvel que a plntula de origem zigtica manifeste um vigor similar ou superior quele da plntula nucelar mais vigorosa. Alm do mais, o fenmeno do policaulismo (Figura 1) pode interferir na deciso do viveirista quanto escolha pelo vigor, uma vez que o31

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material emergente (plntula) monoembrinico (zigtico), porm, com inmeros caules emergidos sob a camada de solo que cobre a amndoa que, primeira vista, parecem ser plntulas de origem nucelar (semente poliembrinica). Nas condies dos Cerrados brasileiros, a embrionia em variedades e hbridos de cruzamentos controlados foi estudada e a Edward, Tommy Atkins, Extrema, Okrong, Amrapali e Mallika mostraram ser monoembrinicas porm, com grau de policaulismo que variou entre 30 a 90% das sementes. O policaulismo manifestou-se tambm em 41% das prognies monoembrinicas resultantes de cruzamentos controlados. A manga no apresenta com freqncia o fenmeno de partenocarpia como muitos acreditam e sim, a estenospermocarpia. Na partenocarpia, no h fecundao e a formao do fruto origina-se de um vulo no fecundado, resultando em manga completamente sem semente. Na estenospermocarpia, ocorre uma falha ou aborto do embrio sem que houvesse falha na fecundao (Ram et al., 1976). A estenospermocarpia cultivar dependente e geralmente ocorre devido mudana de temperatura, durante os primeiros dias aps o vingamento do fruto. Existem controvrsias na literatura quanto causa da estenospermocarpia ser devido temperatura baixa (Lakshminarayana & Aguilar, 1975; Whiley, 1988) ou temperatura alta (Davenport & Nez Elisea, 1997), durante o vingamento dos frutos. Nas condies do Nordeste e Centro Oeste brasileiro, o fenmeno ocorre com mais freqncia entre maio e julho, quando a temperatura atinge os menores valores (< 15 C), principalmente durante o perodo noturno. O fruto estenospermocrpico apresenta-se de pequeno tamanho e de forma irregular. A cultivar Haden produz frutos estenospermocrpico com grande freqncia, os quais so vendidos no mercado varejista por preos vantajosos com a denominao de mini-Haden.

5. OBJETIVOS DO MELHORAMENTOContrariamente ao que ocorria no passado, quando o melhorista formulava os objetivos de seu programa de melhoramento e os conduzia, normalmente, sem considerar o mercado, nos dias atuais, este mercado e a necessidade de competitividade no mesmo so os fatores que ditam o qu e como deve ser desenvolvido o produto final do melhoramento. Isto se aplica no somente manga, mas tambm maioria das espcies de valor econ32

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mico. No caso especfico da manga, muitos dos objetivos do melhoramento, tanto no Brasil como em outros pases, no so muito diferentes (Iyer & Degani, 1997; Lavi et al., 1996; Pinto, 1996, 1999; Pinto & Ferreira, 1999). As cultivares desenvolvidas em programas de melhoramento precisam atender aos trs principais segmentos de uma cadeia produtiva: produtores, distribuidores e consumidores. Os produtores anseiam por cultivares que apresentem maior produtividade e estabilidade de produo, sejam de fcil manejo nos tratos culturais e adaptadas s condies climticas adversas da regio para onde foi desenvolvida. Os distribuidores desejam cultivares que resistam ao manuseio e ao transporte e, finalmente, os consumidores exigem manga de melhor qualidade. Portanto, novas cultivares somente sero aceitas se apresentarem, para os diversos segmentos da cadeia produtiva, alguma(s) vantagem (ns) em relao s j existentes no mercado. Em geral, ao idealizar um programa de melhoramento de manga, o melhorista deve ter em mente aquelas caractersticas bsicas para a nova cultivar, que seja comercialmente bem sucedida e atenda os trs segmentos da cadeia acima descritos. Assim, caractersticas como plantas de porte baixo; produo precoce e regular, alta produtividade, resistente s principais pragas e doenas; frutos com tamanho padro requerido pelo mercado, de colorao atrativa, de boas qualidades organolpticas (sabor, odor, textura) livres de desordens fisiolgicas, longa vida de prateleira (shelf-life) e resistncia ao transporte, alm de outras caractersticas ps-colheita, so necessrias e obrigatrias na maioria dos programas de melhoramento (Singh, 1978; Iyer, 1991; Lavi et al., 1996; Tomer et al., 1996; Cilliers et al., 1996; Iyer & Dinesh, 1996; Pinto, 1996, 1999; Iyer & Degani, 1997; Pinto & Ferreira, 1999). Com relao ao melhoramento de material para porta-enxerto, as principais caractersticas requeridas so: poliembrionia; porte ano; tolerncia s condies adversas do solo; resistncia a doenas e boa compatibilidade com a variedade copa. Obviamente, combinar todas essas caractersticas em uma nica cultivar muito difcil, embora todas sejam fundamentais para a manter a competitividade e o sucesso comercial dessa cultivar. Para que as chances do melhorista aumentem na difcil tarefa de desenvolver uma cultivar com todas as caractersticas desejveis, ser necessrio que ele tenha sua disposio: variabilidade gentica, conhecimentos sobre a biologia floral, modo de reproduo, nveis e comportamento33

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cromossmico do germoplasma disponvel, da herdabilidade dos caracteres perseguidos, correlao entre caracteres. A deciso do melhorista quanto ao trabalho a longo ou mdio prazo depende do estgio em que se encontra quanto ao seu conhecimento e disponibilidade de recursos materiais e humanos. Portanto, o objetivo pode passar por fases mais longas se no existem cultivares comerciais j adaptadas e de alto valor comercial. Neste caso a introduo, avaliao e seleo so fases muito importantes e obrigatrias, embora sejam dinmicas e aceitas em qualquer fase do melhoramento. Se j existem cultivares comerciais de alto valor em uso, o que se busca corrigir algumas deficincias j identificadas sem perder os atributos positivos j existentes. Neste caso, realiza-se o melhoramento gentico no sentido especfico.

6. PRINCIPAIS MTODOS E ESTRATGIAS PARA O MELHORAMENTONo melhoramento da mangueira pode-se dispor de vrios mtodos, procedimentos e estratgias os quais podem ser usados isoladamente ou em conjunto, complementando uns aos outros possibilitando uma maior eficincia nos trabalhos. A seguir sero descritos e discutidos mtodos e estratgias que esto sendo usados ou com potencial de uso no melhoramento da mangueira.

6.1. A Introduo, Avaliao e Seleo de Cultivares (Progenitores)A importncia da introduo de cultivares no melhoramento gentico bem conhecida (Fehr, 1987) e, no caso da manga, tem sido bem documentada, especialmente, em relao ao desenvolvimento de novos cultivares na Flrida (Iyer & Dinesh, 1996; Bompard & Schnell, 1997). O grande nmero de gentipos de origens diversas introduzidos com subseqente melhoramento e adaptao levou a Flrida a se constituir em um importante centro secundrio de diversidade da mangueira, habilitando aquele estado americano a dar uma contribuio nica indstria de frutas (Knight & Schnell, 1994). Ressalta-se, contudo, que experincias recentes tm mostrado que precaues precisam ser tomadas quando se vai introduzir uma cultivar de uma regio para outra e, especialmente, de um pas para outro, em funo34

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da possibilidade real da introduo conjunta de patgenos que podem constituir-se em problemas srios para a cultura (Iyer & Dinesh, 1996). Portanto, importante que o melhorista tenha conscincia desse risco e no tente ganhar tempo em seu programa e burlar a legislao brasileira, a qual determina que todo e qualquer material introduzido de outro pas tem que passar por um perodo de quarentena na Embrapa Recursos Genticos e Biotecnologia, com o objetivo de evitar a entrada de doenas e/ou pragas ainda no existentes no pas. A introduo um mtodo bastante antigo e ainda continua sendo praticado at hoje como fonte para enriquecimento da variabilidade gentica (Fehr, 1987; Borm, 1997; Mukherjee, 1985; Bompard & Schnell, 1997; Mukherjee, 1997). Porm, como mtodo de melhoramento para a obteno de novas cultivares muito limitado. A metodologia consiste basicamente em se introduzir materiais genticos diversos (cultivares, selees avanadas), que so diretamente avaliados e aqueles que demonstram melhor adaptao s condies da regio alvo e apresentam as caractersticas desejadas pelo mercado, so lanados como novas cultivares (Poehlman & Sleper, 1995; Borm, 1997). O lanamento ou recomendao de introdues de plantas como novas cultivares ocorre, principalmente, em reas onde a espcie ou a cultura est sendo introduzida (Fehr, 1987). Na mangueira, a introduo tem sido bastante utilizada, no propriamente como mtodo de melhoramento e sim, para a formao de colees de trabalho para o estabelecimento de programas de melhoramento (Donadio, 1996; Mukherjee, 1985, 1997; Bompard & Schnell, 1997; Iyer & Degani, 1997; Pinto, 1996; Pinto & Ferreira, 1999). No Brasil, no entanto, provvel que muitas das cultivares brasileiras, como por exemplo, Espada, Imperial, Rosa, Surpresa (Donadio, 1996) e outras, tenham sido originadas atravs desse procedimento.

6.2. Melhoramento da PopulaoUma das vantagens do melhoramento da mangueira a facilidade com que indivduos superiores avaliados e selecionados na prpria coleo de trabalho podem ser clonados e multiplicados por meio da enxertia (Cilliers et al., 1996; Tomer et al., 1996; Iyer & Dinesh, 1996; Iyer & Degani, 1997). Os indivduos selecionados podero formar uma coleo elite ou core35

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collection, cujo objetivo maior aumentar a freqncia de genes favorveis, melhorando a populao que servir de base para os futuros cruzamentos. Esse mtodo muito importante tanto para a mangueira, como para qualquer outra frutfera que se reproduza por alogamia, embora seja pouco empregado. Para o sucesso no melhoramento de populaes, fundamental a existncia de uma aceitvel variabilidade gentica na populao original ou coleo elite (Fehr, 1987; Falconer, 1989; Borm, 1997). Outros fatores, como mtodo e intensidade de seleo a serem utilizados, precisam de avaliaes, interpretao apropriada dos efeitos ambientais, interao gentipo x local e gentipo x ano, identificao de efeitos pleiotrpicos e de correlaes genotpicas e fenotpicas entre caracteres (Falconer, 1989), tambm afetam a eficincia do melhoramento de populaes e devem ser observados.

6.3. Mtodo da Seleo Recorrente tambm conhecido na literatura por seleo de plantas individuais a partir de populaes de polinizao aberta ou seleo massal baseada em um s sexo. Esse mtodo tem sido o mais intensamente utilizado, pela sua facilidade, simplicidade e baixo custo operacional, embora no figure entre os mais recomendados em termos de eficincia (Cilliers et al., 1996; Tomer et al., 1996; Iyer & Dinesh, 1996; Iyer & Degani, 1997; Mukherjee, 1997). Para caractersticas de alta herdabilidade, este procedimento to eficiente quanto qualquer outro (Hansche, 1983; Falconer, 1989). Contudo, sua eficincia em discriminar indivduos superiores diminui medida em que a herdabilidade dos caracteres reduzida, tornando-se bastante ineficiente para baixos valores de herdabilidade (Dudley & Moll, 1969; Hansche, 1983; Falconer, 1989). Em sua verso mais simples, esse mtodo consiste basicamente em se selecionarem plantas em reas de produo ou no, coletar frutos e avaliar as prognies resultantes de polinizao aberta. Portanto, neste procedimento, a cultivar resultante tem apenas um dos progenitores conhecido. Na sua verso aperfeioada, os progenitores da populao melhorada so cuidadosamente selecionados e, desses, um nmero relativamente elevado de indivduos plantado e avaliado, sendo a seleo relativamente simples e36

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fcil de ser realizada (Cilliers, et al., 1996). No entanto, esses autores relatam que o progresso gentico desse mtodo lento devido: (1) ao grande nmero de caractersticas de qualidade de frutos e produo envolvidas; (2) ao pouco conhecimento da herdabilidade das principais caractersticas de importncia econmica e das correlaes genticas entre elas; e (3) ao longo perodo de juvenilidade. Assumindo como verdadeiros os pressupostos da gentica quantitativa, de que em uma populao algama e em equilbrio de Hardy-Weinberg, o plen de qualquer indivduo tem a mesma probabilidade de fecundar o vulo de qualquer outro indivduo (Falconer, 1989), pode-se afirmar que qualquer planta de manga originada de semente tomada ao acaso seja um hbrido. Assim, as prognies originadas de sementes a partir de populaes de polinizao aberta so consideradas todas hbridas meias-irms, sendo apenas o progenitor feminino conhecido (Fehr, 1987; Falconer, 1989; Borm, 1997, Pinto, 1999). Conseqentemente, a eficincia deste mtodo, em termos de ganho gentico ao final de um ciclo de seleo, bem menor que o de cruzamentos controlados (Hansche, 1983; Falconer, 1989; Bruckner, 1999). Contudo, como a propagao vegetativa permite a perpetuao de qualquer gentipo, superior, hbrido ou no, to logo este seja identificado, essa menor eficincia em parte compensada pela simplicidade e pelo menor custo, especialmente de mo-de-obra, desse mtodo (Hansche, 1983; Poehlman & Sleper, 1995; Iyer & Degani, 1997; Mukherjee, 1997; Bruckner, 1999). A eliminao precoce de gentipos indesejveis uma estratgia cada vez mais utilizada para aumentar a eficincia da seleo, uma vez que a mangueira, pela facilidade da reproduo assexuada, uma espcie apropriada ao manuseio da seleo recorrente, tambm denominada de seleo fenotpica individual (Cilliers et al., 1996). Tambm a seleo precoce de gentipos desejveis pode tornar esse mtodo mais eficiente, sendo a biotecnologia uma importante ferramenta de auxlio. A quase totalidade das mais de mil cultivares existentes atualmente na ndia e todas as cultivares desenvolvidas na Flrida foram criadas/desenvolvidas atravs deste procedimento (Iyer & Degani, 1997; Mukherjee, 1997). A cultivar Haden, por exemplo, lanada na Flrida, em 1910, originou-se de uma planta de sementes da cultivar Mulgoba. A planta selecionada tinha frutos de colorao vermelha altamente atrativa e apresentava pro37

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dutividade superior de seu progenitor (Campbell & Campbell, 1993). A Haden, por sua vez, tambm atravs de polinizao aberta, deu origem s seguintes cultivares: Eldon, Glenn, Lippens, Osteen, Parvin, Smith, Springfels, Tommy Atkins e Zill (Mukherjee, 1997). Na frica do Sul, as cultivares Heidi, Neldica, Cerise e Neldawn tambm foram originadas por meio desse mtodo (Cilliers et al., 1996). O mesmo ocorreu no Brasil, com as cultivares Amarelinha, Ametista, Augusta, Brasil, Itamarati, Oliveira Neto e Pavo, dentre outras (Donadio, 1996), e as cultivares IAC 104 Dura, IAC 109 Votupa, IAC 105 Palmera e AC 103 Espada Vermelha, todas desenvolvidas pelo IAC. As cultivares IAC 104 Dura (poliembrinica) e IAC 109 Votupa (monoembrinica) originaram-se da Tommy Atkins; a IAC 105 Palmera (poliembrinica) da Palmer e a IAC 103 Espada Vermelha (tambm poliembrinica), da Carabao (Rosseto et al., 1996, 1997). Mesmo depois da elaborao de programas mais bem planejados e fundamentados, a seleo a partir de populaes de polinizao aberta ainda continua sendo o mtodo predominante na maioria dos pases que trabalham com manga (Mathew & Dhandar, 1996; Cilliers et al., 1996; Iyer & Dinesh, 1996; Rosseto et al., 1996, 1997). De acordo com Iyer & Dinesh (1996), com exceo de umas poucas cultivares resultantes de programas de melhoramento por hibridao planejada, a grande maioria tem sido resultado de seleo individual de plantas originadas de polinizao aberta. No entanto, resultados na obteno de hbridos superiores no sujeitos sorte (aleatoriedade), devem-se ao cruzamento controlado, embora possa ser aprimorado com o aperfeioamento dos cruzamentos abertos. Apesar do baixo custo do mtodo, a seleo simples de sementes de plantas instaladas em colees de cultivares, sem nenhum controle parental ou uso de marcadores moleculares, pode apresentar baixa eficincia gentica e resultados inseguros da prognie hbrida. Algumas vezes, as sementes so pouco controladas, portanto, nem a planta-pai nem a planta-me so conhecidas. Cilliers et al. (1996) descreveram algumas estratgias que tm sido adotadas em muitos programas que utilizam a seleo fenotpica individual, visando aumentar a sua eficincia. A primeira o estabelecimento de pomares para a produo de prognies de polinizao aberta para avaliao e seleo. A segunda a eliminao, nesses pomares fontes, de cultivares com caractersticas indesejveis em termos de tamanho, colorao e sabor38

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de frutos e a incluso de novos gentipos, visando sempre melhorar a qualidade mdia do plen que ir originar as prognies de meio-irmos para avaliao e seleo. E, finalmente, a terceira a seleo, a multiplicao vegetativa e a avaliao de prognies superiores a partir desses pomares fontes em diferentes condies ambientais. Esse processo de seleo pode originar, diretamente, novas cultivares ou prognies superiores para o estabelecimento de novos pomares fontes para produo de prognies superiores. Exemplos desses tipos de estratgias so encontrados em Israel, onde o pomar fonte constitudo de 55 gentipos, sendo 35 cultivares e 20 selees avanadas (Tomer et al., 1996), e na frica do Sul, onde o pomar fonte de prognies conta tambm com 55 cultivares selecionadas previamente (chamadas pliades) e de onde 100 prognies de cada cultivar so originadas anualmente (Cilliers et al., 1996). Cultivares como Heidi, Nldica, Joa e Chen, alm de selees promissoras, foram originadas desse programa.

6.4. Teste de PrognieO teste de prognie torna a seleo mais eficiente em comparao com aquela realizada com base somente na performance do prprio indivduo, como no caso da seleo massal ou fenotpica, pelo fato de a avaliao ser feita sobre dois indivduos: o progenitor e suas prognies. Portanto, a seleo individual com teste de prognie parece ser, aparentemente, o mtodo ideal de seleo de indivduos superiores porque, alm da avaliao no prprio indivduo, o valor genotpico mdio desse indivduo pode ser diretamente medido na sua prognie (Falconer, 1989). Na prtica, contudo, esse mtodo apresenta a desvantagem de aumentar o tempo da gerao de seleo, especialmente, em se tratando de espcies perenes, j que um indivduo no pode ser selecionado at que sua prognie seja avaliada (Hansche, 1983; Falconer, 1989). Geralmente, a seleo inicial dos progenitores baseia-se na performance fenotpica dos mesmos, porm, a deciso posterior de manter ou eliminar um determinado progenitor no programa de melhoramento depende da habilidade desse progenitor em produzir prognies superiores (Whiley et al., 1993; Souza, 1998). No caso especfico do melhoramento da mangueira, o teste de prognie tem sido empregado de alguma forma no programa de melhoramento da39

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Embrapa Cerrados, especialmente antes e aps hibridao intervarietal. Porm, assim como no caso de outras fruteiras perenes, a seleo daqueles progenitores que iro ser usados em novos cruzamentos feita levando-se em considerao a capacidade desses progenitores em originar prognies superiores. Um exemplo prtico disso est no programa de melhoramento da Australia, onde as cultivares Kensington e Sensation tm se mostrado excelentes parentais nesse aspecto (Whiley et al., 1993). A seleo individual seguida do teste de prognie, conforme preconizada, pode, pelo menos em teoria, ser aplicada sem maiores problemas no melhoramento da manga. A natureza algama dessa espcie, associada possibilidade de obteno de muitos descendentes por gerao, favorvel sua implementao, embora o tempo requerido para que se tenha um ciclo de seleo completo seja um fator limitante e determinante na introduo de variantes para a viabilizao da metodologia. Associado a isto, a facilidade com que uma planta pode ser propagada vegetativamente, permitindo que os melhores indivduos, uma vez identificados, sejam multiplicados em qualquer etapa do programa de melhoramento, faz com que os procedimentos de seleo adotados para a espcie sejam apenas adaptaes das metodologias conhecidas. Ainda no caso especfico da manga, a recombinao ou o intercruzamento entre os indivduos selecionados deve ser anual, com a vantagem de a seleo poder ser realizada em ambos os sexos, bastando para isso eliminar os indivduos indesejveis antes do florescimento, na segunda frutificao. Outra vantagem a disponibilidade, anualmente, de sementes recombinadas para o incio de novos ciclos de seleo, uma vez que a populao de indivduos selecionados pode ser mantida no campo por um longo perodo (Mathew & Dhandar, 1996; Cilliers et al., 1996; Iyer & Dinesh, 1996).

6.5. Mtodo da HibridaoA hibridao o processo pelo qual as caractersticas de interesse econmico so combinadas ou transferidas para as variedades cultivadas ou entre elas, servindo, tambm, para ampliar a base gentica dentro de determinada espcie (Fehr, 1987; Poehlman & Sleper, 1995; Borm, 1997; Bruckner, 1999). Posterior ao processo de hibridao, a seleo e a clonagem40

Melhoramento Gentico da Manga (Mangifera Indica L.) No Brasil

(propagao vegetativa) das melhores combinaes, seguidas de avaliao clonal, podem resultar em novas cultivares de forma bastante rpida. Em fruteiras, uma das limitaes deste procedimento, quando comparado s espcies anuais propagadas sexuadamente, so o nmero de combinaes hbridas que podem ser avaliadas, a inadequao da maioria das metodologias de predio do valor gentico dos parentais (Hansche, 1983; Souza, 1998), o nmero limitado de indivduos que podem ser avaliados por ciclo, a baixa previsibilidade dos resultados dos cruzamentos devido alta heterozigosidade dos progenitores, alm do tempo requerido para se completar um ciclo de seleo e do espao fsico requerido (Hansche, 1983; Cilliers et al., 1996; Iyer & Dinesh, 1996; Tomer et al., 1996; Bruckner, 1999). Na mangueira, alm das dificuldades supramencionadas e da ocorrncia de poliembrionia em muitas cultivares, os trabalhos de emasculao, polinizao manual e cuidados ps-polinizao, que so requeridos para o sucesso da hibrizao, so tambm bastante tediosos e de baixa eficincia em termos de pegamento de frutos (Pinto & Sharma, 1993; Pinto & Byrne, 1993; Cilliers et al., 1996; Iyer & Dinesh, 1996; Tomer et al., 1996; Pinto, 1996, 1999; Pinto & Ferreira, 1999). Contudo, estudos tm sido realizados visando simplificar esses procedimentos e aumentar sua eficincia (Iyer & Dinesh, 1996). Singh et al. (1980) comentam que no h necessidade de se proteger as panculas aps a polinizao, pois a germinao do plen e a fertilizao so rpidas e com isso, os riscos de contaminao por plen estranho praticamente no existem. A cobertura do estigma com uma cpsula gelatinosa logo aps a polinizao um procedimento simples e efetivo para evitar a contaminao por plen estranho (Iyer & Dinesh, 1996). Outras alternativas so o plantio intercalado dos progenitores que se deseja cruzar (Whiley el al., 1993) e o isolamento, atravs de telado, de plantas de cultivares estabelecidas lado a lado ou enxertando diferentes cultivares em uma mesma rvore (Pinto & Sharma, 1993; Pinto & Byrne, 1993; Cilliers et al., 1996; Tomer et al., 1996; Pinto, 1996, 1999; Pinto & Ferreira, 1999). Nesse ltimo procedimento, importante usar plantas com porte reduzido (Pinto, 1994b) e colocar no telado, moscas ou abelhas para funcionarem como agentes polinizadores. Apesar dessas dificuldades, a ndia tem lanado excelentes variedades hbridas como Mallika e Amrapali (Sharma et al., 1972),41

Manga - Produo Integrada, Industrializa