Livro o Simbolo Indumentario

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    O Smbolo Indumentrio:distino e prestgio no Rio de Janeiro

    (1808-1821)

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    O Smbolo Indumentrio:distino e prestgio no

    Rio de Janeiro (1808-1821)

    Camila Borges da Silva

    Rio de Janeiro 2010

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    S586s Silva, Camila Borges da O smbolo indumentrio: distino e prestgio no Rio de Janeiro (1808-1821) / Camila Borges da Silva. Rio de Janeiro: Secretaria Municipal de Cultura: Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro, 2010. 216 p. : il.

    Prmio de Monografia Professor Afonso Carlos Marques dos Santos 2009.

    ISBN ????????????

    Comisso Julgadoracomposta pelos Profs. Drs.

    Andr Luiz Vieira Campos,Beatriz Kushnir,Ismnia de Lima Martins,Paulo Knauss eTnia Maria Bessone

    Prefeito da Cidade do Rio de JaneiroEduardo Paes

    Secretria Municipal de CulturaAna Luisa Lima

    Diretora do Arquivo Geralda Cidade do Rio de JaneiroBeatriz Kushnir

    Gerente de PesquisaSandra Horta

    RevisoClaudia Boccia

    Projeto Grfico e Diagramaowww.ideiad.com.br

    CapaJean Baptiste Debret. Estudo paradesembarque de D. Leopoldina no Brasil.1817. leo sobre tela, 44,50 x 69,50 cm.Coleo Museu Nacional de Belas Artes.Fotografado por Fernando Chaves.

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    Agradecimentos

    Este livro no teria sido possvel sem o apoio de muitaspessoas. Gostaria de destacar aqui meu profundo agradecimentoa algumas delas. Agradeo a minha orientadora, ProfaDraLciaMaria Bastos Pereira das Neves, que, sempre muito dedicada eatenciosa, me permitiu desenvolver o estudo e amadurecerpara o trabalho acadmico com suas incontveis contribuies,desde a redao do projeto at a correo final dste estudo. ProfaDraTnia Maria T. Bessone da Cruz Ferreira e ProfaDra

    Leila Mezan Algranti, cujas sugestes e crticas muito

    contriburam para o avano de minha pesquisa. Ao ArquivoGeral da Cidade do Rio de Janeiro e banca do Prmio AfonsoCarlos Marques dos Santos pela honra que me foi concedidacom a premiao de meu trabalho. minha famlia pelo apoioe incentivo sempre presente em toda a minha vida. s minhasamigas, primas-amigas e parceira(o)s de profisso, pessoas comas quais posso contar em todos os momentos. A Eduardo peloamor e companheirismo em nossa j longa estrada, sempre meapoiando e incentivando, e cujas contribuies e preciososachados bibliogrficos me ajudaram a realizar meu estudo.A todas essas pessoas meu sincero muito obrigada.

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    Sumrio

    Prefcio 9

    Introduo 13

    1 A Corte no Brasil uma nova moda? 311.1 Portugal no contexto europeu 31

    1.2 O impacto da chegada da corte 361.3 O mercado de moda na corte 39

    2 O Antigo Regime e a Cultura Indumentria 872.1 Os uniformes 912.2 As ordens militares 107

    3 O Luxo e as Insgnias Estratgias de Prestgio e Distino 147nos Cerimoniais da Corte3.1 O espao da rua 1473.2 Festejos reais 1593.3 As procisses religiosas 1873.4 O bando 1893.5 As cavalhadas 191Concluso 197

    Fontes Primrias 209

    Referncias Bibliogrficas 210

    Lista de TabelasEntradas martimas no Porto do Rio de Janeiro 52Sadas martimas do Porto do Rio de Janeiro 56Entrada de estrangeiros 61Quantitativo dos cavaleiros agraciados com as Ordens de Cristo, 112So Bento de Aviz e Santiago entre 1641 e 1777Quantitativo dos agraciados com a Ordem de Cristo 112Quantitativo dos agraciados com a Ordem de So Bento de Aviz 113Quantitativo dos agraciados com a Ordem de Santiago 114Quantitativo de comerciantes de grosso trato agraciados com a 116Ordem de CristoComerciantes matriculados na Junta do Comrcio da Praa do 116Rio de JaneiroConcentrao e diversificao dos negcios das quinze maiores 126empresas de longo curso estabelecidas na Praa Mercantil do

    Rio de Janeiro, 1800-1830

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    Lista de ImagensMadame Rcamier 45Uniforme dos ministros 97Aclamao de D.Joo VI 99Ministros e Senadores 102Uniforme dos desembargadores 105D. Joo VI 111Uniforme de gala dos Cavaleiros de Cristo 125Cavaleiro de Cristo exposto em seu atade 129Desembarque da Princesa Real Leopoldina 173Estudos para desembarque de D. Leopoldina no Brasil 174Vista do Largo do Pao no dia da aclamao de D. Joo VI 182Cortejo do batismo da princesa real 194

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    Enquanto as ltimas dcadas do sculo XX viam o aparecimento de museus

    da moda, que morre sempre jovem, os historiadores ainda se questionavam se

    no deveriam escrever sobre outra coisa que no a respeito desses fantasmas

    suntuosos e fugazes. Na histria das aparncias humanas, eles sempre ocupam

    o primeiro lugar, pois, sem o saberem, servem para exibir poder; a demonstrao

    exibicionista da frivolidade, vista como a expresso natural de uma arte deviver, inacessvel grande maioria, torna-se marca de suprema distino.

    Daniel Roche. A Cultura das aparncias: uma histria da indumentria

    (sculos XVII-XVIII).So Paulo: Editora Senac, 2007, p. 19.

    Indumentrias, adornos, trajes, joias, enfim, a moda, em seu sentido maisamplo, por muito tempo, fizeram parte do campo de anlise do socilogo e doantroplogo, cabendo ao historiador apenas uma pesquisa que lhe permitisseinvestigar como as modas se sucederam ao longo dos anos. Vislumbrava-se

    uma evoluo da moda, em que eram assinalados os pontos de ruptura,perceptveis em uma iconografia de determinada poca. Com o passar dos anos,novo olhar foi lanado sobre diferentes tipos de fontes, renovando oconhecimento histrico. Para alm do texto oficial e impresso, o documentoilustrado, transmitido pela imagem ou por qualquer outra forma de expresso,passou a fazer parte do campo do historiador. Nessa documentao, aindumentria transformou-se em objeto de interesse, pois ela tambm possuauma linguagem prpria capaz de transmitir um discurso cultural, poltico esocial de uma determinada poca. Desse modo, ampliava-se a curiosidade do

    historiador, que partia em busca de imensos setores adormecidos dadocumentao e que passava a utilizar ou explorar tais fontes, de maneira distinta,sendo investidas de nova significao. nessa perspectiva que se situa o livrode Camila Borges da Silva, originalmente sua dissertao de mestrado, defendidacom brilhantismo na ps-graduao em Histria da Universidade do Estado doRio de Janeiro.

    Entre a moda e a Histria, Camila Borges transformou-se em uma excelentepesquisadora que soube construir uma histria das indumentrias da sociedadede Corte do mundo luso-brasileiro, ao longo do perodo joanino. Comoresultado, o livro, que se oferece ao leitor, representa uma instigante anlise em

    que, dialogando com os conceitos de civilizao e de poder, demonstra como a

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    moda tornou-se, naquela ocasio, um instrumento intrnseco da dinmica daestruturao de uma nova sociedade no Rio de Janeiro.

    Alguns pontos so fundamentais em seu estudo: em primeiro lugar, examinara circulao da moda na Corte por meio no s de vestimentas, mas tambm dejoias e penteados que marcavam uma demonstrao da hierarquizao tpica deuma sociedade do Antigo Regime; em segundo, analisar como as formas devesturio, tais quais os uniformes e as insgnias, estavam relacionadas comdeterminadas funes ou cargos, e tambm investigar suas variaes, em virtudedos vrios grupos sociais e de seus respectivos nveis de fortuna; por fim, demonstrarque as vestimentas e seus smbolos indicavam, sobretudo, uma distino socialque algum membro daquela sociedade alcanara por meio de uma merc rgia.

    Original por sua temtica e sua abordagem, o livro recorre a inmeras fontes,desde algumas gravuras de poca, sobretudo as de Debret, at ao jornal da Corte a Gazeta do Rio de Janeiro e as crnicas e memrias escritas naquele perodo.Todas foram selecionadas com esmero e, embora nem sempre trouxessemimagens que representassem tais indumentrias, Camila, com cuidado eperspiccia, soube procurar pequenos indcios a fim de fazer falar osdocumentos. Desse modo, superou dificuldades e comprovou seus pressupostosessenciais, especialmente, compreender os aspectos simblicos dasindumentrias. Sua anlise, por conseguinte, leva o leitor a apreender mudanase permanncias na sociedade em tela, uma vez que tais anos iniciais do oitocentos,

    na Pennsula Ibrica e em suas colnias, vivenciavam uma oposio entre oAntigo Regime e as Luzes, que pode ser considerada como um sinal, talvez omais evidente, do surgimento daquilo que muitos autores denominaramModernidade.

    Apesar de muitos livros consagrados sobre o estudo das vestimentas noAntigo Regime do Imprio luso-brasileiro, Camila, sem abandon-los enquantoreferncia, mas completando-os e inovando-os, procura examinar com acuidadee inteligncia outras faces do processo, estabelecendo relaes com estes eenriquecendo seu contedo. Por meio de indagaes, que responde compropriedade em trs captulos, procura apreender traos essenciais e distintivosda sociedade do Rio de Janeiro, no perodo de D. Joo (1808-1821). Ao longo dotexto, como ela prpria afirma, sua inteno fundamental buscar a ligaoentre um objeto da cultura material, no caso a vestimenta, e suas imbricaescom as esferas, sobretudo do poltico, do cultural e do social. Desse modo, avestimenta em seu sentido e significado amplos transforma-se em uminstrumento capaz de possibilitar os movimentos e as tenses que subjazemnesta sociedade.

    Descreve a chegada da Corte e as novidades introduzidas na cultura daindumentria em funo de tal acontecimento, em especial, o novo mercado

    constitudo pela liberdade de comrcio e pela presena de ingleses e franceses.

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    Apresenta, ento, os elementos essenciais dessa grande transformao da culturada indumentria na sociedade do Rio de Janeiro, possibilitando esta adquirir um

    ar civilizado. Em seguida, analisa os aspectos dessa cultura que ainda permanecemregulamentados pela tradio do Antigo Regime, demonstrando a hierarquizaoda sociedade e da cultura das aparncias. Identifica, assim, que a farda era umsmbolo representativo do Antigo Regime. No apenas as fardas militares, masem um sentido alargado, como o da poca. Roupas de gala vestidas nas cerimniasmais importantes da Corte eram denominadas fardas de gala ou fardas grandes.O termo era tambm empregado para as mulheres, como bem apontou MariaBeatriz Nizza da Silva, ao afirmar que na morte de uma infanta, ela foi enterradavestida de sua farda rica. Por conseguinte, a farda era o smbolo prprio de uma

    funo social, como tambm a cruz constitua-se em smbolo de uma instituio a Igreja Catlica. Elucida, tambm, os cdigos sociais e os imperativos morais davida quotidiana desta sociedade de Corte no Rio de Janeiro, ao analisar a totalidadedas convenes que regiam a aquisio e a propriedade das vestimentas, seu usoe sua fora demonstrativa de uma ostentao e de um luxo, capazes de distinguirnveis diversos de riqueza. Informa como aqueles, que eram agraciados por umapoltica de benesses do soberano, deveriam se vestir nas funes mais importantesdesta nova metrpole. Conclui, por conseguinte, que a cultura da indumentriarepresentava tanto um elemento de prestgio e distino quanto uma confirmaodo ordenamento social e poltico daquela poca.

    Dessa forma, ao longo de seu livro, Camila Borges aponta que a indumentria,tambm, capaz de oferecer informaes mltiplas sobre uma cultura, quepodem ser interligadas s representaes simblicas que emprestam consistnciaaos diversos segmentos da sociedade, em especial, aqueles que estavam inseridosna chamada boa sociedade. Das vestimentas ostentao, o texto confereinteligibilidade aos conflitos polticos e sociais do mundo do Antigo Regime,permitindo vislumbrar algumas das novas lgicas da sociedade liberal que iriamse impor, ainda que paulatinamente, aps os anos de 1820.

    Camila Borges da Silva demonstra por meio dessa sua anlise possuir asqualidades essenciais daquele que escreve e constri a Histria: uma curiosidadeindiscutvel, uma abertura para novas abordagens, uma clareza na exposio euma trama convincente que enreda o leitor e traz luz novas informaes.

    Por fim, cabe ressaltar que a experincia de trabalho de Camila transformou-se em grata satisfao para mim. Estabeleceu-se um amplo dilogo entreorientadora e orientanda, permanecendo agora, para alm das afinidadesintelectuais, uma amizade e uma nova relao, como companheiras de ummesmo ofcio.

    Rio de Janeiro, 24 de janeiro de 2010

    Lcia Maria Bastos P. Neves

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    Se me fosse dado escolher no amontoado dos livros que sero publicados cem

    anos aps a minha morte, sabe o que eu escolheria? [...] eu escolheria

    tranquilamente, meu amigo, uma revista de moda para ver como as mulheres

    estaro vestidas um sculo aps meu falecimento. E estes pedacinhos de

    tecido me diriam mais sobre a humanidade futura do que todos os filsofos,

    romancistas, pregadores e sbios.

    Anatole France (1844-1924)

    Este livro estuda a indumentria na sociedade de Corte joanina desde omomento da chegada da famlia real portuguesa, em 1808, at a volta de D. JooVI em 1821. Considera-se que o impacto da chegada da famlia real incidiu,principalmente, sobre a cidade do Rio de Janeiro, pois foi neste espao que oshabitantes da colnia conviveram diretamente com a Corte e com as modastrazidas da Europa. Juntamente com a famlia real, aportou em terras coloniais

    uma parte expressiva da nobreza portuguesa; os homens, com seus uniformes einsgnias demonstrativas de sua condio social, e as mulheres, vestindo asltimas modas europeias. A Corte e suas modas significavam o que havia demais prestigioso e luxuoso, especialmente numa Colnia cuja circulao damoda era dificultada pelo pacto colonial.

    O ar de civilizao e de poder, ostentado pela aristocracia portuguesachegada em 1808, seus rituais e sua indumentria fizeram com que as elites denegociantes fluminenses em especial, os chamados comerciantes de grossotrato coloniais1 quisessem se ligar Corte e aristocracia, adotando seusmodos e suas modas como forma de compartilhar as oportunidades de distinosocial, destacando-se dos demais habitantes da Colnia. Entretanto, essaimbricao com a aristocracia portuguesa tinha um limite e este passavanecessariamente pelas mercs rgias que abriam ou fechavam as portas dadistino. Isto porque eram as mercs rgias que permitiam a atuao em cargosprestigiosos que implicavam o uso de uniformes assim como a utilizao deinsgnias. Estes elementos constituam-se na cultura indumentria do AntigoRegime por demonstrar o lugar ocupado pelo seu portador na sociedade.Analisar-se- aqui como a indumentria atua como um elemento de demarcaoda posio que esses grupos ocupavam na sociedade, sobretudo, no que diz

    respeito s cerimnias de exibio pblica dessas elites.

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    O conceito de elite adotado aqui no plural, porque se entende que existia,no perodo analisado, uma srie de grupos marcados por caractersticas que os

    distinguem tanto das massas como de outros grupos de elites.2Os grupos,contudo, se constroem e se dissolvem dependendo das relaes estabelecidas, oque os caracterizam como flexveis e no como estticos. Tomando-se as anlisesde Pierre Bourdieu sobre as construes das classes sociais termo, entretanto,no utilizado nesse trabalho percebe-se que ele compreende que as classes, ouos grupos, so constitudos de maneira dinmica, de acordo com os espaossociais a que esto submetidos, onde estes agentes tomam certas posies que osunificam ou distanciam do grupo, podendo-se assim recortar classes, isto ,conjuntos de agentes que ocupam posies semelhantes e que, colocados em

    condies semelhantes e sujeitos a condicionamentos semelhantes, tm, comtoda a probabilidade, atitudes e interesses semelhantes, logo, prticas e tomadasde posio semelhantes.3Esses grupos, contudo, possuem apenas umaexistncia terica, ou seja, so construdos somente na teoria, como produtode uma classificao explicativa.4

    poca da chegada da Corte, s inmeras formas de nobres e no nobresvindos da Metrpole com a famlia real, somaram-se os nobres e no nobresexistentes no Rio de Janeiro e, com a permanncia de D. Joo at 1821, essequadro tornou-se ainda mais complexo. Juntamente com a famlia real, chegouao Rio de Janeiro a nobreza titulada (os chamados grandes), funcionrios da

    administrao, fidalgos da Casa Real, militares e oficiais de alta patente, entreoutros.5A nobreza civil ou poltica era a mais frequente na Colnia, pois ela eraalcanada atravs do exerccio de cargos na administrao.6 J a nobrezahereditria, ou de linhagem, dependia de trs geraes de nobres e dava direito utilizao de braso de armas, tendo aportado em grande nmero na Colniaapenas em 1808.7No Rio de Janeiro colonial do sculo XVII e primeira metadedo XVIII, existia uma nobreza composta por portugueses e coloniais queexerciam cargos na repblica - os chamados homens bons - em que a nobrezada terra era predominante.8

    Com a reforma do ministrio pombalino, em meados do sculo XVIII, osnegociantes comearam a ocupar cargos polticos considerados nobilitantes,ou seja, passveis de incutirem nobreza, embora, de fato, muito pouco tenhamconseguido. Os negociantes fluminenses acumularam uma grande fortuna desdeo sculo XVIII, mais vultosa do que as posses dos senhores da terra, apesar deno desfrutarem do mesmo prestgio que estes ltimos.9Por isso, nobreza efortuna no se coadunavam. Embora a riqueza de alguns indivduos lhes tenhapermitido o tratamento nobre, ou seja, viverem lei da nobreza, isso nosignificava que eles fossem, de fato, nobres, pois o tratamento nobre, s por si,no chegava para fazer um nobre; era preciso algo mais, um enquadramento

    nas graas honorficas existentes.10Somente com a instalao da Corte no Rio

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    de Janeiro e com a proximidade da famlia real, as chances de nobilitao dosnegociantes fluminenses ampliaram-se.11Assim, no que tange a este estudo,

    no se trabalhar com a clssica distino entre o ethos burgus e o ethosaristocrtico no Rio de Janeiro embora no se negue sua existncia pois aqui,analisar-se- em que medida estes tendiam a aproximar-se.

    Dois focos de anlise so objetivados: o primeiro a circulao da moda naCorte, bem como todos os aspectos a ela ligados (roupas, cortes, joias, penteadosetc.) que so entendidos como parte dessa dinmica de demonstrao de poder,uma vez que a minoria dos habitantes coloniais tinha condies de exibir-se deacordo com as modas europeias. No entanto, essa ostentao tomada comomodelo de poderio econmico das elites endinheiradas. Outra demarcao de

    objeto se faz presente no trabalho: a utilizao de uniformes e de insgniasdistintivas. Estes se caracterizam como a expresso maior da sociedade de AntigoRegime, ou seja, so esses elementos que apontavam para a distino que somentese poderia alcanar atravs da merc rgia. Tais elementos elevam os sujeitosque os ostentam a um patamar nico na sociedade, pois utilizam smbolos queos colocam na maior posio de destaque: a da distino por direito. Se o AntigoRegime caracterizou-se como o momento em que os homens se entediam comonaturalmente diferentes e, como tais, gozavam de privilgios exclusivos deacordo com o grupo a que pertenciam, essa distino era tornada visvel pelaindumentria, ou, mais especificamente, pelas insgnias e uniformes pois

    estes ltimos indicavam que se ocupava um cargo na administrao real.Entende-se que a indumentria da sociedade portuguesa desse perodo um

    elemento da cultura poltica, pois, ao mesmo tempo que um objeto da culturamaterial, ela permite que o ordenamento social, jurdico e poltico sejavislumbrado por seu intermdio. Em primeiro lugar, tratando-se das insgnias edos uniformes, eles dependem das mercs reais e, por isso, esto ligadas aomecanismo rgio. S era possvel utilizar determinadas insgnias aqueles queprestavam algum servio ao rei, tornando-se assim digno do recebimentodessas graas reais. Dessa maneira, o sistema poltico dependia do desejo dedistino via a utilizao dessas insgnias, pois isso permitia ao monarca apossibilidade da concretizao das aspiraes ao prestgio emanado pelaocupao de cargos e pela utilizao das insgnias. Para que o controle desseselementos no fugisse das mos do rei, eles foram sistematizados por meio deleis que constam das Ordenaes Manuelinas e Filipinas. Esse mecanismo rgiotornava-se visvel nas aparies reais, pois nestas toda a Corte, com suasrespectivas insgnias e uniformes que tambm contavam com o luxo , seexibia aos olhos daqueles que no tinham direito a ostentar esses elementos.Alm disso, a aristocracia presente nesses eventos simbolizava simultaneamenteo Estado com a exibio da hierarquia que se estruturava via insgnias mais ou

    menos prestigiosas e que se aglutinava ao redor da famlia real.

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    Existem, desse modo, dois movimentos paralelos ocorrendo na Cortejoanina em termos de vesturio bem como de todos os outros elementos de

    ornamentao que o cercam. A Corte portuguesa, instaurada no Brasil, vivia jnuma conjuntura internacional de crise que a historiografia classicamentecompreende como a crise do Antigo Regime. A Revoluo Francesa trouxe certaruptura tambm no que concernia ao vesturio: ela rompeu com as tradicionaisleis sunturias. At ento, na Frana, da mesma maneira que em outrasmonarquias, das quais Portugal um exemplo a indumentria era reguladapor leis e pela tradio. Existiam roupas, cores, formas e signos que implicavamuma profisso ou uma posio social especfica e que eram reguladas mediantelegislao. Isso pertence lgica de sociedades marcadas pela ideia de

    desigualdade natural entre os homens. Cada um possua seu lugar na sociedadee deveria vestir-se de acordo com ele. A Revoluo Francesa, motivada peloideal de que todos os homens so iguais, aboliu os privilgios dos grupos situadosno topo da hierarquia e, como tal, as leis sunturias, pois estas representavam adesigualdade que queriam extinguir. Da mesma maneira, vestir-se luxuosamenteera proibido. Tal fato representava um rompimento com todo o mundo existenteanteriormente ou, pelo menos, com uma determinada maneira de conceber asociedade e de se imaginar nela.12Nas monarquias que ainda lutavam pela suaexistncia, entretanto, essas leis, se no caram, tiveram que conviver com ummundo mais aberto em termos de vestimenta. No Rio de Janeiro, aps a chegada

    da Corte, o dinheiro, se no implicava, automaticamente, o acesso a signosdistintivos regulados pela tradio, representava a possibilidade de exibio doluxo. O uniforme e as insgnias ainda eram proibidos de serem usados caso nocorrespondessem a alguma merc recebida, mas a indumentria feminina tinhamaior maleabilidade, embora tambm fosse alvo de regulao. Especialmentetomando-se a especificidade de uma Corte exilada no Novo Mundo, em que asmaiores riquezas pertenciam a negociantes de grosso trato, desejosos defrequentarem os crculos da Corte, e num contexto de abertura dos portoscoloniais, quando se observou no s a entrada de imensa quantidade deprodutos at ento escassos, mas tambm a chegada de profissionais quetrabalhavam com moda e que ofereciam seus servios e seus produtos nas ruasdo centro da cidade. Diante desse quadro, a proibio no poderia se fazer toseveramente. Assim, em um mundo de transio, a Colnia e, depois, ReinoUnido, viu coexistirem estes dois fenmenos: a moda13e as leis sunturias.

    A pesquisa aborda as relaes entre poltica e cultura, pois visa a compreenderas questes relativas aos aspectos simblicos presentes na indumentria. Toma-se a moda como um elemento que expressa as relaes de luta simblica entreagentes, no sentido de demarcar posies sociais que dependem justamente dedeterminadas ritualizaes ou liturgias polticas. Afinal, no espao pblico

    que a moda age como instrumento de comunicao de uma superioridade e de

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    uma distino ou desigualdade social diante de todos os agentes que so capazesde, mediante o conhecimento que adquiriram em seus respectivos habitus,

    reconhecer os smbolos expostos. As insgnias distintivas so aqui entendidascomo parte inexorvel do Antigo Regime enquanto sistema poltico quecompreende a desigualdade entre os homens como algo pertencente ao mundoda natureza. A indumentria, nesse sentido, contribui para a reafirmao dosistema monrquico e aristocrtico, constituindo-se na representao materialde todo um ordenamento social e poltico.

    O objetivo do trabalho entender como os hbitos indumentrios14daCorte joanina se relacionam com o todo cultural dessa sociedade. Em outraspalavras, como, atravs da indumentria, podemos perceber permanncias e

    mudanas na sociedade em questo. A Corte instalada no Rio de Janeirovivenciava o dilema de um Antigo Regime em crise, ameaado que estava pelaRevoluo Francesa no apenas pela presena fsica das tropas francesas emsolo portugus, mas tambm pela ameaa das ideias revolucionrias. Esse dilema perceptvel pela coexistncia de dois padres indumentrios distintos: de umlado, h o rpido avano das modas sobretudo aps 1815, com a invaso defranceses ligados ao comrcio de moda, e pela possibilidade econmica da elitemercantil enriquecida de copiar as modas da Corte portuguesa instalada nostrpicos; de outro, a restrio do acesso aos signos distintivos que emanavamprestgio nessa sociedade, ou seja, as insgnias das Ordens Militares. Nestes dois

    padres, so percebidos os conflitos de dois mundos diferentes: um lutandopela sobrevivncia o Antigo Regime e outro em rpida transformao.

    Visa-se, dessa maneira, a observar como a indumentria expressa a posiosocial e econmica de seus membros e como se deu a imbricao da elite mercantildo Rio de Janeiro com a aristocracia via o estudo de seus trajes de maneira atentar alcanar um quadro mais complexo acerca da sociedade joanina. Enfocar-se-o as relaes estabelecidas entre os agentes sociais para compreender comoestas se relacionam com o vesturio, sua suntuosidade e as insgnias utilizadasno perodo.

    O trabalho se insere num quadro de reflexes sobre a questo daindumentria, que se encontra relativamente negligenciada na historiografiabrasileira. Apesar do surgimento de trabalhos abordando a moda na dcada de1920, como no caso da obra de Joo Afonso, intitulada Trs sculos de moda noBrasil(1923), pode-se verificar uma escassez de pesquisas que abordem o objeto,sobretudo quando se tomam os estudos mais relevantes sobre o tema: GilbertoFreyre, Gilda de Mello e Souza, Maria Beatriz Nizza da Silva e Maria do CarmoTeixeira Rainho15. O livro de Gilberto Freyre utilizado nesse trabalho Sobradose Mucambos foi publicado pela primeira vez em 193616. Seguiram-se quatorzeanos entre esta e a tese de doutoramento de Gilda de Mello e Souza ento

    intituladaA Moda no sculo XIX, que foi publicada pela primeira vez em 1950,

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    naRevista do Museu Paulistae editada, na forma de livro, em 1987. Verifica-se ovcuo em termos de uma historiografia da moda brasileira no apenas pela

    distncia entre as datas das publicaes, mas tambm pelo fato de na bibliografiado livro de Gilda de Mello e Souza constar somente uma nica obra dahistoriografia brasileira a do prprio Gilberto Freyre, mencionada mais acima.J a pesquisa de Maria Beatriz Nizza da Silva foi publicada em 1978, portanto,dezoito anos aps a primeira publicao de Gilda de Mello e Souza. Por fim,Maria do Carmo Teixeira Rainho abordou novamente o objeto em sua dissertao,defendida em 1992 A Cidade e a Moda: novas pretenses, novas distines epublicada em 2002. Contabilizando quatorze anos entre esta e o livro de MariaBeatriz Nizza da Silva. A sequncia de dataes, embora possa parecer exaustiva,

    visa a demonstrar como o tema , em termos quantitativos, pouco trabalhadopelos historiadores brasileiros.Evidentemente, outros estudos, sobretudo os que abordam a questo das

    festas coloniais ou imperiais, tangenciaram o tema da moda, mas noaprofundaram o objeto, ou o transformaram em elemento de anlise maiscomplexa.17Recentemente, Slvia Hunold Lara escreveu artigo voltado para aanlise dos trajes das senhoras e escravas em Salvador e no Rio de Janeiro dosculo XVIII, introduzindo uma imagem da complexidade do objeto. Essa autoraindica que existia uma dificuldade, por parte da Coroa, de fiscalizar, na Colnia,a obedincia s leis sunturias que vigoravam na Metrpole. Trata-se de estudo

    interessante que mostra que o acesso a certos tecidos e joias por parte demulheres pertencentes s elites endinheiradas, e at de escravas, j era umprocesso em curso desde o sculo XVIII.18

    Os trs primeiros trabalhos mencionados Gilberto Freyre, Gilda de Melloe Souza e Maria Beatriz Nizza da Silva trazem contribuies fundamentaispara o estudo da indumentria do sculo XIX. Freyre aborda a moda naperspectiva de uma histria da cultura material, em que esta vista como umadas expresses do movimento histrico ocorrido no sculo XIX o da presenade grande nmero de estrangeiros aps a chegada da Corte portuguesa ao Brasil.Seu conceito de europeizao dos costumes ainda hoje fundamental para sepensar o fenmeno moda no sculo XIX. Gilda de Mello e Souza, por sua vez,traa uma brilhante e inovadora visto ser a primeira obra que toma a modacomo objeto em si histria da moda no sculo XIX. A autora analisa o objeto atravs de suas formas, tecidos e cores apontando para variadas abordagens.Assim, ela traa as relaes entre moda e arte, moda e gnero, moda e classessociais e ainda oferece um panorama relacionando festa, moda, gnero e classes.Gilda de Mello e Souza aponta, portanto, para um grande leque de possibilidadesde se analisar a moda enquanto fenmeno histrico, social e cultural. No casoda obra de Maria Beatriz Nizza da Silva, a moda entendida no quadro do que

    ela denomina cultura implcita. A autora apresenta as diferentes preocupaes

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    que um historiador do vesturio precisa ter ao tratar de um fenmenoextremamente complexo como a moda. Dentre as valiosas contribuies da

    autora est o alerta para que o historiador atente para as roupas que expressam umlugar no corpo social, em termos de classe ou de ocupao de determinadoscargos ou eventos que exigem indumentria especfica. A indumentria podesimbolizar, nesse caso, tanto uma posio quanto uma instituio. Alm disso, elaressalta uma espcie de internalizao da vestimenta, uma vez que certas roupasexigem o controle da postura e do gestual. Assim, demonstrando uma preocupaocom as pesquisas futuras sobre o tema, a autora esquematiza cuidados a seremtomados e fontes a serem utilizadas. O presente projeto insere-se na perspectivadessas trs obras basilares, buscando aprofundar suas formulaes e contribuir

    para a insero do objeto na prtica da pesquisa histrica.Observa-se que, em termos de escrita da histria, no h uma grandevariedade de obras que abordem o assunto, mesmo tomando a historiografiafrancesa sobre o tema. interessante notar que, somente nas dcadas de 1970 e1980, trabalhos, cujo objeto de anlise era a moda, passaram a ser escritos commaior intensidade. Podem ser citados historiadores, entretanto, que se voltarampara a histria cultural j no sculo XIX, como Jacob Burckhardt19, um dospioneiros nesse sentido, ao considerar que a moda seria uma forma derefinamento exterior da vida juntamente com as boas maneiras, o conforto eo asseio. No possvel esquecer, no entanto, que a escrita da histria no sculo

    XIX foi profundamente marcada pelo paradigma de uma histria poltica que,desconsiderando os aspectos culturais, deixou de lado uma srie de objetos,estando a cultura material entre os excludos dessa historiografia. A retomadadesses objetos, possibilitada pela elaborao de novas abordagens emetodologias, foi um processo que abarcou praticamente todo o sculo XX eocorreu na Frana, principalmente, com o desenvolvimento da chamada histrianovadesenvolvida pelaEscola dos Annales.20

    O primeiro historiador dosAnnalesa trabalhar com a moda como objeto foiFernand Braudel21. De acordo com esse autor, a moda um elemento da culturamaterial dos povos, associando-a tambm aos hbitos de cada sociedade comono caso das maneiras de andar, saudar e comer. Braudel elabora um painel dadifuso da moda entre os sculos XV e XVIII, entendendo-a como um fenmenoeuropeu somente significativo a partir de 1700. Da mesma maneira que ospensadores do sculo XIX, ele faz uma diferenciao entre costume e moda,apontando a maior estabilidade do primeiro como no caso das culturas orientais e o carter de mutabilidade da segunda. Esta diferenciao estendida questodas possibilidades de ascenso social. Enquanto nas sociedades mais estveissocialmente a moda alcanaria um baixo ndice de mutabilidade, nas sociedadesmais dinmicas a moda mudaria muito mais rapidamente. Assim, moda e

    costume tm, para ele, uma relao intrnseca com a temporalidade, apontadopara continuidades e rupturas.

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    Contudo, somente na terceira gerao dosAnnales, a multiplicao dos objetospermitiu que a moda fosse de fato includa de maneira mais sistemtica, juntamente

    com outras temticas, no leque de assuntos dos historiadores. Como expoentedessa gerao, podemos citar a obra de Daniel Roche22que, entre outros assuntos,analisou profundamente e de forma inovadora o fenmeno moda. Roche toma aindumentria como um elemento que representa um fato social total23, poispor meio dela podemos dialogar com todas as esferas do mundo social, ou seja, aestrutura das relaes sociais, suas crenas, representaes e moral, o perfil dacirculao econmica nico vis que at ento havia sido trabalhado maissistematicamente e at as relaes polticas. Nessa ltima, podemos incluir,segundo ele, at mesmo o estudo da questo nacional pela anlise das resistncias

    ou permeabilidades do traje regional para o traje dominante da capital, porexemplo. Ele procura ligar uma histria da cultura material ao estudo doscomportamentos e das mentalidades da Frana do Antigo Regime at o perodorevolucionrio. Roche demonstra como as mudanas de mentalidade e posturaimpostas pela Revoluo se exprimiram tambm nos trajes da poca, queabandonaram a ostentao luxuosa do traje aristocrtico que chegou a serproibido por lei , para uma simplificao e uniformizao na roupa. No entanto,afirma que, mesmo com essas medidas expressas sobretudo na padronizao daroupa branca a distino ainda se fazia possvel. A transio de uma sociedadede tipo aristocrtico para uma de tipo burgus explicada atravs da indumentria.

    Roche mostra que as chamadas leis sunturias dialogaram com uma srie deoutros tipos de discurso o religioso, o mdico etc. que visavam a discutir aquesto da indumentria. O assunto foi extremamente importante e debatido noperodo pr e ps-revolucionrio porque a roupa expressava na sociedadearistocrtica um forte elemento demarcador dos trs estados e deveria adquiriroutro sentido aps a Revoluo. por isso que os grandes pensadores dos sculosXVIII e XIX trataram do tema, at mesmo, Jean Jacques Rousseau (1712-1778).24

    O ornamental para Roche aparece como um elemento simultaneamenteidentitrio e diferenciador atuando espacial, sexual ou socialmente. Para analisaro que denomina cultura da aparncia, o autor utiliza o conceito de sistemaindumentrio, que adquire um contedo especfico em cada sociedade etemporalidade trabalhada. Assim, o sistema indumentrio do Antigo Regimecaracteriza-se pela inrcia e imobilidade, sobretudo nas classes baixas, por umaconvergncia da roupa com a posio social, pelo desejo de controle que seexpressa nas leis sunturias , pelas normas de etiqueta e pelo conformismo.Por sua vez, esse sistema foi diludo em virtude do crescimento da economiaurbana e da moda. Como explicao para esse fenmeno, o autor lana duashipteses: ou o modelo aristocrtico acelerou a mutao dos signos de prestgioda indumentria, provocando o colapso do cdigo indumentrio em vigor e

    fazendo prevalecer a temporalidade da moda, ou um outro sistema indumentrio

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    o burgus desafiou o sistema aristocrtico, deixando de imit-lo e criandoum novo, em contraposio a ele. Nessa segunda hiptese, o autor refuta as

    correntes de pensamento, at ento instauradas, que seguiam a teoria da imitaode Tarde25. Desse modo, o sistema indumentrio representa a convergnciaentre a vestimenta e as representaes sociais, culturais, mentais, polticas oueconmicas de uma determinada sociedade e cabe ao historiador estabeleceresse vnculo. Para realizar seu estudo, Roche utiliza uma vasta documentaoque inclui textos mdicos, jornais de moda, memrias, enciclopdias,inventrios, textos literrios e pensadores da sociedade.

    Os autores analisados provam que possvel, atravs da indumentria,vislumbrar o mundo das permanncias e rupturas, seja no campo econmico,

    social, cultural, mental ou poltico. A vestimenta torna-se uma linguagem passvelde ser lida socialmente tanto por aqueles que a vivenciam, quanto por aquelesque a estudam. Ela d acesso a outras esferas do mundo social e, por isso, umimportante objeto de pesquisa que foi, por muitos anos, negligenciado e vistocomo frvolo e suprfluo.

    No sculo XIX, ocorreu uma diversificao das publicaes de socilogos efilsofos que tiveram como tema a moda, demonstrando um aumento dointeresse e mesmo da importncia da temtica embora o filsofo GillesLipovetsky26aponte que, desde Plato, passando por Polbio, Epicuro, SantoAgostinho, Rousseau e Voltaire, o suprfluo e a aparncia nunca tenham deixado

    de suscitar o pensamento. A moda torna a ser objeto de estudo para essespensadores no quadro da modernidade quando as preocupaes com o novo seexacerbam. Alm disso, com a acelerao das mudanas na roupa, esse novofenmeno se impe e passa a ser perceptvel e questionado, sobretudo poraqueles que se propem a falar sobre a sociedade. Esses estudiosos do sculoXIX apontaram para a dimenso social da roupa, preocupando-se em indicar asdiferenas entre moda e costume e discorrendo sobre as questes da distino eda imitao. Ainda hoje suas contribuies fornecem base ao que se pensasobre a moda. Dentre esses autores, podem ser indicados: Gabriel Tarde,Thorstein Veblen e Georg Simmel27, que atuaram nos seus respectivos pases Frana, Estados Unidos e Alemanha.

    Gabriel Tarde formulou sua teoria da imitao no quadro de constituio dasociologia como disciplina autnoma. Suas teorias se opem s de mileDurkheim o pai mais conhecido dessa disciplina. Tarde entendia que asociedade formada por indivduos que imitam uns aos outros. Mais do queindivduos seriam as classes mais baixas que tentariam imitar os costumes onde se engloba a moda das classes mais favorecidas.

    Thorstein Veblen, por sua vez, afirma que existe uma classe que ostenta suaposio favorecida atravs do consumo conspcuo, ou seja, do consumo

    ostentatrio. dele a formulao de que as roupas com formas incmodas

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    chapus muito grandes, saias muito compridas ou muito largas, espartilhosapertados etc. serviriam para mostrar que aquele que as utiliza no est sujeito

    a nenhum tipo de trabalho produtivo.Georg Simmel retoma a teoria da imitao de Tarde, adicionando um

    elemento: a distino. Ele afirma que o objetivo da imitao seria compartilharos lucros da distino, enquanto que as classes mais altas, na tentativa depreservarem seu statusatravs da indumentria, mudariam a moda como umamaneira de manterem seu prestgio. Sua teoria uma tentativa de explicaopara as mudanas incessantes do vesturio no fim do sculo XIX.

    As teorias desenvolvidas por esses autores visavam a explicar o que aconteciaem termos de vesturio no fim do sculo XIX, quando as caractersticas do

    mercado da moda j haviam se alterado bastante em relao ao incio do sculo,temporalidade abordada nessa pesquisa. Evidentemente, as teorias de Tarde eSimmel trazem elementos importantssimos, pois, neste livro, considera-se queas elites econmicas ou, mais especificamente, os comerciantes de grosso trato,tentaram alcanar a distino e o prestgio que almejavam. Atm-se aqui,entretanto, ao estudo das elites do perodo e, portanto, os comerciantes degrosso trato no representavam as classes baixas como nas teorias de Tarde eSimmel. Muito pelo contrrio, caracterizavam-se como grupo de elite, s queuma elite econmica que no usufrua do prestgio aristocrtico daquela queaportara em terras coloniais, em 1808. Em segundo lugar, a ideia de que a roupa

    mudaria em virtude tentativa de imitao procede apenas em parte, no objetoanalisado, pois, naquele momento, a mudana da moda ainda era muito lenta ea indumentria aristocrtica estava amparada em uma legislao prpria quevisava a regular a utilizao de certos elementos.

    Contemporaneamente, na dcada de 1980, o filsofo Gilles Lipovetskytambm analisou o fenmeno da moda. Ele, contudo, preocupa-se em solucionaro desenvolvimento do vesturio enquanto objeto histrico e social que teriatido seu incio no fim da Idade Mdia e se desenvolvido at os dias atuais. Comisso, o autor traa uma evoluo da moda desde a sua emergncia at a [sua]ascenso (...) ao poder nas sociedades contemporneas, [a]o lugar central, indito,que ocupa nas democracias engajadas no caminho do consumo e dacomunicao de massa.28 Lipovetsky divide seu livro em duas partes: naprimeira, analisa o objeto moda e, na segunda, as relaes deste com a sociedadecontempornea o mundo da publicidade, da mdia e da indstria, indo, portanto,da produo, passando pelo consumo e chegando informao-moda,concluindo que a moda no mais enfeite esttico, um acessrio decorativoda vida coletiva; sua pedra angular e que terminou estruturalmente seucurso histrico, chegou ao topo de seu poder (...) era perifrica, agora hegemnica.29O autor adota uma perspectiva evolucionista do objeto que no

    a mesma deste livro, pois considera-se que a indumentria do perodo analisado

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    tem especificidades que remetem s caractersticas da sociedade do AntigoRegime e que no pode ser entendida como uma etapa de seu desenvolvimento

    at atingir a contemporaneidade. A Revoluo Francesa, tomada como umconjunto de ideias calcadas na liberdade e igualdade entre homens e mulheres,representou uma rupturacom o perodo anterior e no uma continuidade. Defato, na Frana essa ruptura teve inmeras idas e vindas e conviveu, aindadurante muitos anos, com a cultura indumentria do perodo anterior. Na Cortedo Rio de Janeiro manteve-se e conviveu com um mundo em transformaodurante quase todo o sculo XIX. Em 2003, o filsofo retorna a anlise de umelemento que caro moda: o luxo. Prope-se a realizar uma histria do luxo ea refletir sobre seu papel nas sociedades contemporneas.30

    A teoria do socilogo Pierre Bourdieu, que estudou os aspectos simblicosda cultura, embasa esse trabalho. Ele retoma o aspecto da distino e atenta parao papel representacional dos smbolos. Baseada nesse autor, a vestimenta aquientendida como um elemento simblico que possui a funo de distinosocial.31Por isso, ao analisar-se as questes simblicas, tem-se sempre em menteo papel social da indumentria. O smbolo indumentrio se transforma numalinguagem que, como tal, pode ser lido pelos diversos membros de uma sociedade,pois possui uma srie de signos tais como um tecido, uma joia, uma insgnia,uma forma que remetem automaticamente a determinadas formas de poder,seja ele social e/ou econmico, ao mesmo tempo que distinguem ou agrupam

    os agentes que mais se paream entre si e que sejam to diferentes quantopossvel dos integrantes de outras classes, vizinhas ou distantes32.

    Ao estudar os smbolos, Bourdieu critica o que acredita ser um economicismo,ou seja, ele entende que os valores simblicos no podem ser medidos pelosvalores econmicos propriamente ditos, mas sim pelos seus valoresrepresentacionais. O que um smbolo representa para uma sociedade foge lgica do seu valor material e est associado ao imaginrio33que o permeia.Contudo, ele reproduz a lgica de um estudo econmico em termos analticos,para falar dos aspectos simblicos34. Assim, o autor chega a termos como capitalsimblico, por exemplo, que exprime a valorao dada pela sociedade a umdeterminado smbolo que pode adquirir um sentido de statuse ser valoradopositivamente, ou, ao contrrio, ser estigmatizado e valorado negativamente.

    Utilizam-se tambm outros conceitos de Bourdieu, pois se entende que ovesturio atua na sua plenitude nas redes de interdependncia, nos campos, nasrepresentaes sociais dos indivduos, como instrumento simultaneamenteaglutinador e desaglutinador, pois demarca posies sociais e,consequentemente, propicia as oportunidades de distino, de obteno deprestgio e reconhecimento. Dessa forma, compreendendo a indumentria comoum smbolo, ela propicia aos agentes sociais a possibilidade de exercer um poder

    social relativamente instvel que advm do poder simbolizado que ostentam.35

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    Segundo Bourdieu, os smbolos so instrumentos de conhecimento e decomunicao entre os sujeitos histricos. Justifica-se tal ideia porque somente

    os sujeitos so capazes de internalizar os smbolos do mundo social e, destemodo, apreender este mundo , sendo estes smbolos estruturadosem cada sujeito,podendo os mesmos se tornar estruturantes, ou seja, exercendo uma funoreprodutiva do mundo social. Aqueles que exercem opoder simblicoso capazesde impor uma determinada construo/percepo ou viso da realidade, umdeterminado modo de apreenso legitimado da mesma. Os sentidos que ossujeitos atribuem ao mundo so assim uniformizados, homogeneizados fazendocom que se verifiquem certas construes acerca do mundo social como naturais,irremediveis, justas em razo dessa convergncia de pensamento.36

    H, portanto, uma dialtica entre as estruturas estruturantes que o autordesigna como instrumentos de conhecimento e de construo do mundoobjetivo, produzidos por meio de uma imposio de um determinado grupode sujeitos, considerando que os homens so os produtores do mundo social e as estruturas estruturadas, que so o prprio mundo j produzido e objetivado,onde os sujeitos apenas utilizaro os conhecimentos absorvidos para estaremno mundo e se comunicarem.37 Percebe-se, assim, que o sujeito simultaneamente ativo e passivo, produzindo o mundo simbolicamente e sendoproduzido simbolicamente por ele. Por isso, o autor aponta a relao entre ahistria objetivada, coletiva (histria transformada em objeto, materializada) e

    a histria incorporada, ou seja, aquela que cada sujeito histrico assimilamediante o seu habitus, incorporando as categorias do seu grupo especfico. Ohabitus faz com que o sujeito apreenda todo o conhecimento simbliconecessrio sua sociedade, pela incorporao dos mecanismos sociais dereconhecimento, de prestgio, por meio da vivncia cotidiana que faz aassimilao quase automtica e no racionalizada dos smbolos sociais.

    A legitimidade da dominao e da distino posta prova nos atos deexibio cotidianos, na qual obter o efeito simblico esperado, almejado e bem-sucedido obter o reconhecimento dos demais pela personificao da distinoem cada membro representante de um grupo dominante. Aqueles que nopertenam a este grupo se tornam ento desapossados dos meios de obterreconhecimento e poder simblico numa dada sociedade. Segundo o autor, opoder simblico e a distino no so alcanados pelas propriedades intrnsecasdo smbolo, mas pela autoridade e legitimidade do seu possuidor. O que est emjogo nas lutas pelo poder simblico o poder sobre um uso particular de umacategoria particular de sinais e, deste modo, sobre a viso e o sentido do mundonatural e social38, que acabam por se constiturem na realidade dada.

    Este livro se divide em trs captulos, organizados da seguinte maneira: oprimeiro traa o panorama geral da chegada da Corte ao Brasil, bem como o

    contexto da circulao de mercadorias e pessoas ligadas ao mercado de moda na

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    capital do Imprio. O objetivo do captulo verificar as novidades em termos deuma cultura indumentria na cidade do Rio de Janeiro afetada pela chegada da

    Corte portuguesa e pela liberdade de comrcio instaurada com a sua presena,bem como a constituio do comrcio de moda com a presena de ingleses efranceses. O segundo, analisa o que se entende por cultura indumentria doAntigo Regime, ou seja, os elementos da indumentria que eram mais severamenteregulados pela tradio, no quadro do ordenamento social e poltico do AntigoRegime. O captulo parte da hiptese de que existe uma relao intrnseca entre oAntigo Regime e a hierarquizao da sociedade e desta com a indumentria. Paraisso, traa-se o quadro da organizao social da Corte instalada no Rio de Janeirosegundo a poltica de concesso de mercs. O terceiro e ltimo captulo investiga

    como o espao pblico foi apropriado pela Corte portuguesa e permitiu acristalizao da hierarquizao social por intermdio da indumentria. Analisar-se-, portanto, algumas das principais cerimnias ocorridas na Corte, com vistasa demonstrar que a indumentria possua dois papis diferentes nesses eventos:caracterizava-se tanto como um elemento prestigioso e distintivo, quanto comouma confirmao do ordenamento social e poltico.

    Por fim, cabem algumas explicaes adicionais. A inteno deste livro no realizar uma histria da moda no sentido da descrio de tudo o que era usadoe por quem era usado, mas sim de apreender certos traos da sociedade joaninano Rio de Janeiro, entre 1808 e 1821. Notadamente, muitas vezes, necessrio

    que se descreva o objeto para compreend-lo em suas relaes mais amplas comas esferas social, poltica, econmica e cultural, mas este no o foco do estudo.Em vrios momentos, a roupa propriamente dita se esconde por trs das anlisestecidas sobre a circulao de bens, as mercs, os cerimoniais etc.39Assim, oobjetivo maior fazer justamente a relao entre um objeto da cultura materiale suas imbricaes com essas esferas, compreendendo-o como um objetohistrico e um instrumento que permite a compreenso daquela sociedade e deseus movimentos subjacentes. Evidentemente, trata-se de um objeto bastantecomplexo de ser analisado, sobretudo na temporalidade escolhida, pois noexistem imagens em abundncia e nem mesmo os j tradicionais jornais demodas para senhoras da Europa. Estes surgem na cidade do Rio de Janeiro aolongo do sculo XIX. Mesmo o jornal da Corte do Rio de Janeiro, a Gazeta do Riode Janeiro, editada entre 1808 e 1821, no contm imagens e seus annciosapenas descrevem os produtos. Os inventrios fornecem alguns vestgiosinteressantes dessa indumentria, mas tambm estes no contm descriesmuito profundas da roupa que permitam represent-la tal como uma imagem ofaria.40Contudo, colhendo-se pistas atravs das documentaes, sobretudoescritas, foi possvel superar estas e outras dificuldades.

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    NOTAS

    1 necessrio sublinhar que se toma no trabalho a delimitao desse grupo feita por Joo Fragosoe Manolo Florentino. Joo Fragoso e Manolo Florentino. O Arcasmo como projeto: mercado atlntico,sociedade agrria e elite mercantil em uma economia colonial tardia. Rio de Janeiro, c. 1790 c. 1840.Rio de Janeiro: Civilizao Brasileira, 2001. Sobretudo no quarto captulo.

    2Jos Murilo de Carvalho.A Construo da Ordem: a elite poltica imperial. Teatro de sombras: apoltica imperial. Rio de Janeiro: Civilizao Brasileira, 2003, p. 20.

    3O autor tem uma viso relacional das classes, afirmando que necessrio estabelecer uma rupturacom a tendncia para privilegiar as substncias (...) em detrimento das relaese com a ilusointelectualista que leva a considerar a classe terica, construda pelo cientista, como classe real, umgrupo efetivamente mobilizado; ruptura com o economicismo que leva a reduzir o campo social,espao multidimensional, unicamente ao campo econmico, s relaes de produo econmicaconstitudas assim em coordenadas de posio social (...) que leva a ignorar as lutas simblicasdesenvolvidas nos diferentes campos (...). Os agentes e grupos so assim definidos pelas suas

    posies relativasneste espao (...) A posio de um determinado agente no espao social pode assimser definida pela posio que ele ocupa nos diferentes campos, quer dizer, na distribuio dos poderesque actuam em cada um deles, seja, sobretudo, o capital econmico nas suas diferentes espcies o capital cultural e o capital social e tambm o capital simblico, geralmente chamado prestgio,reputao, fama, etc. que a forma percebida e reconhecida como legtima das diferentes espciesde capital. (...) A forma de que se reveste em cada momento e em cada campo social, o conjunto dasdistribuies das diferentes espcies de capital (incorporado ou materializado) (...) define o estadodas relaes de fora institucionalizadas em estatutos sociais duradoiros, socialmente reconhecidosou juridicamente garantidos , entre agentes objetivamente definidos pela sua posio nestasrelaes. Ele completa afirmando que o espao social e as diferenas que nele se desenhamespontaneamente tendem a funcionar simbolicamente como espao dos estilos de vida(...), isto ,de grupos caracterizados por estilos de vida diferentes. Pierre Bourdieu. O poder simblico. Rio de

    Janeiro: Bertrand, 2003, p. 133, 134, 135, 136 e 144. Grifos do autor.4Pierre Bourdieu. O poder simblico..., p. 136. Grifos do autor.

    5Fidalguia no igual a nobreza hereditria, pois o rei podia tornar fidalgo quem muito bementendesse, enquanto, por outro lado, se podia herdar durante vrias geraes a condio de nobresem por isso ser fidalgo. Maria Beatriz Nizza da Silva. Ser nobre na Colnia. So Paulo: EditoraUnesp, 2005, p. 17.

    6Maria Beatriz Nizza da Silva. Ser nobre na Colnia..., p. 18.

    7Maria Beatriz Nizza da Silva. Ser nobre na Colnia..., p. 16.

    8Maria Beatriz Nizza da Silva. Ser nobre na Colnia..., p. 138 a 148.

    9Joo Fragoso e Manolo Florentino detectam uma tendncia das elites mercantis de, ao passar das

    geraes, converterem seus negcios para a economia agrria, embora ela significasse, de fato, umamenor rentabilidade. Joo Fragoso e Manolo Florentino. O Arcasmo como projeto: mercado atlntico,sociedade agrria e elite mercantil em uma economia colonial tardia. Rio de Janeiro, c. 1790 c.

    1840..., p. 228 e 231.

    10Maria Beatriz Nizza da Silva. Ser nobre na Colnia..., p. 132.

    11A concesso de hbitos das Ordens Militares, analisada no captulo dois, era um dos instrumentosde nobilitao, embora no implicasse uma titulao (conde, marqus, visconde etc.).

    12Frdric Monneyron.La Sociologie de la Mode. Paris: Presses Universitaires de France, 2006.

    13Monneyron aponta a existncia da moda, como fenmeno social, com suas instituies e seusrituais, apenas no fim do sculo XIX. Frdric Monneyron.La Sociologie de la Mode..., p.8.

    14Daniel Roche.A cultura das aparncias : uma histria da indumentria (sculos XVII-XVIII). So

    Paulo: Editora Senac, 2007.

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    Introduo

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    15Gilberto Freyre. Sobrados e Mucambos. 6aedio. Rio de Janeiro: Jos Olympio Editora, 1981; Gildade Mello e Souza. O esprito das roupas: a moda no sculo XIX. So Paulo: Companhia das Letras,2005; Maria Beatriz Nizza da Silva. Cultura e sociedade no Rio de Janeiro (1808-1821). So Paulo:Brasiliana, 1978 e Maria do Carmo Teixeira Rainho.A Cidade e a Moda: novas pretenses, novasdistines Rio de Janeiro, sculo XIX. Braslia: Editora Universidade de Braslia, 2002.

    16No esquecendo que Freyre possui uma outra contribuio para o assunto publicada na dcadade 1980 a obraModos de homem e modas de mulher.17Oliveira Lima. D. Joo VI no Brasil (18081821). Rio de Janeiro: Topbooks, 1996; JurandirMalerba.A Corte no Exlio. Civilizao e poder no Brasil s vsperas da Independncia (1808 a 1821).So Paulo: Companhia das Letras, 2000; Lilia Moritz Schwarcz. O Imprio em procisso: ritos esmbolos do Segundo Reinado. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001; Wanderley Pinho. Sales edamas no Segundo Reinado. So Paulo: Livraria Martins Editora, 1970, entre outros.18Slvia Hunold Lara. Seda, Panos e Balangands: o traje de senhoras e escravas nas cidades do Riode Janeiro e de Salvador (sculo XVIII). In Maria Beatriz Nizza da Silva (org.).Brasil: Colonizao e

    Escravido. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, pp.177-191, 2000.19Jacob Burckhardt.A cultura do Renascimento na Itlia. So Paulo: Companhia das Letras, 1991.

    20 Peter Burke.A Escola dos Annales (1929-1989): a Revoluo Francesa da historiografia. So Paulo:Fundao Editora da UNESP, 1997; Jacques Le Goff.A Histria Nova. So Paulo: Martins Fontes,2001.

    21Fernand Braudel. Civilizao material, economia e capitalismo: sculos XV-XVIII. So Paulo:Martins Fontes, 1996. (Tomo I: As Estruturas do Cotidiano)

    22Daniel Roche. A cultura das aparncias: uma histria da indumentria (sculos XVII-XVIII)...Embora a moda tambm tenha sido abordada em outras duas obras suasHistria das coisas banais- o nascimento do consumo sculos XVII e XIX. Rio de Janeiro: Editora Rocco, 2000 e O povo de Paris.So Paulo: EdUSP, 2007.

    23Conceito que ele retira de Marcel Mauss. Marcel Mauss.Ensaios de sociologia. So Paulo: Perspectiva,2000.

    24Daniel Roche.A cultura das aparncias: uma histria da indumentria (sculos XVII-XVIII)..., p.405, 416 e 417.

    25Gabriel Tarde.Les Lois de limitation. Paris: ditions du Seuil, 2001(1 edio: 1890).26Gilles Lipovetsky e Elyette Roux. O luxo eterno.Da idade do sagrado ao tempo das marcas. SoPaulo: Companhia das Letras, 2005, p. 13.

    27Gabriel Tarde.Les Lois de limitation...; Thorstein Veblen.A teoria da classe ociosa. Um estudoeconmico das instituies. So Paulo: Livraria Pioneira, 1968 (1 edio de 1899) e Georg Simmel.La mode In: La tragdie de la culture et autres essais. Paris: Editions Rivages, 1988 (1 edio1895), p. 88-126.

    28Gilles Lipovetsky. O imprio do efmero: a moda e seu destino nas sociedades modernas. So Paulo:Companhia das Letras, 2004, p. 12.29Gilles Lipovetsky. O imprio do efmero: a moda e seu destino nas sociedades modernas..., p.12.

    30Gilles Lipovetsky e Elyette Roux. O luxo eterno: da idade do sagrado ao tempo das marcas...Algunsoutros trabalhos abordaram o objeto, como, por exemplo: Roland Barthes. Sistema da moda. SoPaulo: Cia. Editora Nacional, 1979; Diane Crane. A moda e seu papel social: classe, gnero eidentidade das roupas. So Paulo: Editora Senac So Paulo, 2006, entre outros.

    31Pierre Bourdieu.A distino: crtica social do julgamento. So Paulo: EdUSP; Porto Alegre: Zouk,2007.

    32Pierre Bordieu.Razes prticas: sobre uma teoria da ao. Campinas: Papirus, 1994, p. 24.

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    Embora o autor no trabalhe com esse termo.

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    34Pierre Bourdieu.A economia das trocas simblicas. So Paulo: Perspectiva, 1974.

    35Pierre Bourdieu. O poder simblico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003.

    36Conceito de conformismo lgico que o autor retira de Durkheim.37Pierre Bourdieu. O poder simblico..., p. 16.

    38Pierre Bourdieu. O poder simblico..., p. 72.

    39A cena ou o contexto em que circulam os bens servem ao entendimento dos significados dessesbens e da construo do sentido social que se d por meio deles. Segundo Mary Douglas e BaronIsherwood, todos os bens so portadores de significados, mas nenhum o por si mesmo. (...)assim como uma palavra de um poema usada em outro contexto no tem poesia, assim tambmum objeto fsico no tem significado em si mesmo (...). O significado est nas relaes entre todosos bens, assim como a msica est nas relaes marcadas pelos sons e no em qualquer nota.Mary Douglas e Baron Isherwood. O mundo dos bens: para uma antropologia do consumo. Rio de

    Janeiro: Editora UFRJ, 2006, p. 121.

    40O socilogo Roland Barthes distingue a moda-escrita da moda-imagem. Roland Barthes. Sistemada moda...

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    C A P T U L O 1

    A Corte no Brasil uma nova moda?

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    Captulo 1 A Corte no Brasil uma nova moda?

    1.1 Portugal no contexto europeu

    A invaso de Portugal pelas tropas napolenicas acarretou a transfernciada famlia real portuguesa, bem como de um extenso squito da nobreza lusitana,para a ento Colnia da Amrica. Embora a vinda da famlia real no tenha sidouma ideia nova, como salienta a historiografia1 , refutando as hipteses mais

    antigas de uma fuga atabalhoada, a deciso da partida foi adiada at o ltimomomento. A indeciso do prncipe regente D. Joo, entre optar pelo exlio noBrasil ou manter a poltica de neutralidade no continente europeu com aspotncias inglesa e francesa2 , em guerra, fez com que o embarque acabasse poracontecer s pressas, proporcionando a falsa impresso de uma fuga noplanejada. Em virtude dos acontecimentos, que giraram em torno da figura deD. Joo e que deslancharam a sorte de Portugal e Brasil, no incio do sculo XIX,a imagem do monarca, construda rela historiografia, foi marcada pelacontradio, variando de acordo com as interpretaes histricas dadas para

    aquele momento. Assim, visto por uns como supersticioso, indeciso e fantochenas mos dos ingleses; por outros percebido como homem bondoso e hbilestadista que soube preservar a integridade da Casa de Bragana.3 A deciso dapartida foi aventada como a ltima alternativa da Coroa e somente em caso deconcretizao da invaso das tropas francesas. O embarque foi ainda retardadoem razo do mau tempo, ocorrendo apenas um dia antes da entrada em soloportugus das tropas de Junot.4 O embarque, no ltimo momento, instaurou aconfuso no cais de Belm, com muitos tentando subir a bordo e uma enormequantidade de bagagens e caixas, muitas das quais deixadas para trs no meio daconfuso.5

    A vinda para o Brasil significava um claro alinhamento Inglaterra. Oministro ingls, William Pitt, chegou a afirmar que, com o trono portugus noBrasil, a Gr-Bretanha aumentaria tambm o seu Imprio.6 Optar peloalinhamento Frana, alm da incerteza acarretada pelas aes de Napoleo,poderia significar a perda da Colnia americana para a Inglaterra, pois, j em1806, quando as ameaas francesas tornaram-se evidentes, a Gr-Bretanhaenviou um representante a Portugal Lord Rosslyn oferecendo auxlio militare econmico e sugerindo tambm a mudana para o Brasil. A recusa portuguesalevaria a Inglaterra a agir pela fora, entendendo Portugal como inimigo.7 De

    fato, pelo tratado secreto de Fontainebleau, de 1807, assinado entre Frana e

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    Espanha, j estava decidido que se dividiria Portugal em trs partes e que serepartiriam as colnias portuguesas entre a Frana e a Espanha, assumindo o rei

    da Espanha o ttulo de imperador das duas Amricas.8 Rosslyn, contudo, noobteve xito, mesmo tentando convencer Portugal de que uma invaso francesaj havia sido anunciada em Paris. A postura portuguesa era de cautela, optandopela neutralidade.9

    D. Rodrigo de Souza Coutinho, membro dopartido ingls, tinha conscinciada vulnerabilidade de Portugal no contexto europeu. Alm disso, conheciatambm a dependncia econmica portuguesa da produo colonial10 , quepoderia perder, caso no se colocasse contra a Frana, pois a Inglaterra, senhorados mares desde a batalha de Trafalgar, em 1805 quando a esquadra comandada

    pelo Almirante Nelson imps uma grande derrota aos franceses no mar , tinhacondies e planos11 de se apossar da Colnia portuguesa na Amrica. Por isso,sabia ele da necessidade de partir, numa tentativa de preservar as colnias, para,de longe, tentar salvar o Reino.12 Na realidade, esta era a concretizao de suatese, elaborada em 1803, sobre a criao de um grande imprio no Brasil.

    Portugal, contudo, optou pela neutralidade durante um bom tempo, enquantoos partidos ingls e francs discutiam o alinhamento a uma ou a outra potncia.A deciso de se manter ao lado da Inglaterra ou de se aliar Frana foi analisadaem inmeros momentos, mas, em razo da desconfiana que esta ltimasuscitava, concretizao do avano dos exrcitos franceses e ao medo de que

    a tomada de Portugal pela Frana ocasionasse, alm da perda das colnias paraInglaterra, a deposio da famlia real, como havia ocorrido na Espanha, naPrssia e em alguns reinos da pennsula itlica, levaram a balana portuguesa apender para a aliana inglesa.13

    A transferncia da Corte se deu mediante escolta inglesa, que no sacompanhou os navios portugueses, como a transportou em alguns de seusnavios. Lord Strangford acompanhou a frota at a altura entre Madeira e Aores,voltando para a Inglaterra, de onde viajaria diretamente para a Colnia. Aviagem, como no poderia deixar de ser, foi marcada pelo desconforto emvirtude do balano dos navios, s privaes em termos alimentares, ao excessode passageiros e falta de higiene.14 Esta ltima ocorria tanto fora quanto dentrodos navios. No primeiro caso, pela acumulao dos detritos que eramdespejados diretamente no mar ao redor dos navios, em perodos de calmaria,que produziam um grande mau cheiro, sobretudo quando o tempo esquentava.No segundo, pela famosa infestao de piolhos que acarretou o corte dos cabelosfemininos e a utilizao de turbantes que viraram moda no Rio de Janeiro coma chegada da Corte portuguesa.15

    Evidentemente, com uma guerra em curso em solo portugus, tudo que erafrancs passou a ser rigidamente vigiado no Brasil. Qualquer mercadoria ou

    objeto de origem francesa passava por severa vigilncia e a presena de franceses

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    era rigorosamente controlada. Os partidaristas ingleses ganharam,inegavelmente, prestgio, prova disso foi o cargo de ministro da Guerra e dos

    Negcios Estrangeiros dado a D. Rodrigo de Souza Coutinho, ainda em 1808,bem como a titulao de conde de Linhares, recebida pelo mesmo. Este passoua ser figura de destaque na poltica luso-brasileira at a sua morte, em 1812.

    NoAlmanaque de 1811, percebe-se a extenso da unio entre Portugal eInglaterra, marcada, no campo da retrica, pelo engrandecimento do prncipeD. Joo e pelas juras de proteo por parte da Coroa Britnica:

    Jura S. Majestade Britnica, e Jura o Parlamento pela Nao, que defendero,

    e livraro o Prncipe Regente N. S. da orgulhosa Nao, que horroriza o

    Universo, e sacrificaro todas as suas foras Navais, e Nacionais, para exaltar

    um Prncipe, que deixando a Ptria, Tesouros, e Bens, e o primeiro, que

    atravessa o Oceano alm dos Trpicos, s para estreitar cada vez mais os

    Sagrados Vnculos de amizade com a Gr-Bretanha, por cujo Herosmo manda

    considerar livre a Bandeira Portuguesa em todos os Mares, do seu Domnio, e

    que se lhe dem todos os socorros necessrioscom maior eficcia, do que se

    fossem Nacionais (...). 16

    [...]

    Convida S. M. El-Rei da Gr-Bretanha todas as Potncias do Continente,

    para que unidas vinguem o Herico Prncipe de Portugal: e o tornem a pr de

    posse daquilo que to gloriosamente ganharam Seus Antepassados, efinalmente convida a Posteridade a ver um Heri, que por conservar uma

    amizade abandonou a Ptria, e os Bens: e um Amigo agradecido, que se

    prope a perder a vida ou a imortalizar seu nome (...). 17

    O crescente acirramento dos conflitos entre Inglaterra e Frana no perodoNapolenico foi creditado ao embate econmico entre as duas potncias. Asesferas de influncia poltica serviriam, nesse sentido, como mercados ampliadospara os produtos de ambas. De fato, o bloqueio continental decretado porNapoleo, em 1806, contra os produtos ingleses visava a assegurar o predomnio

    comercial francs na Europa continental e a enfraquecer o poderio ingls pelavia econmica18 . Essas disputas de cunho econmico entre os dois pases nose iniciaram, contudo, no governo de Napoleo. Elas podem ser remontadas aoincio do sculo XVIII, e, at mesmo, ao sculo XVII, com a disputa pelopredomnio militar que servia de base para a disputa pelas rotas comerciais dandia. De qualquer modo, o pice desse processo foi o advento da industrializaoinglesa, dando destaque vantajoso Inglaterra na produo de tecidos e outrasmanufaturas. A supremacia naval inglesa a alaria primeira posio comercialem termos de produo e distribuio de manufaturas para a Europa e, qui,

    para o mundo.19 Esse foi o contexto econmico mais amplo no qual surgiu o

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    Bloqueio Continental. Por seu intermdio, a Inglaterra, asfixiada pela guerra nocontinente, via nas colnias portuguesas o alvio para suas contas20 , j que

    Portugal se constitua em um grande parceiro comercial desde pelo menos oTratado de Methuen, de 1703. Alm de vislumbrar no mundo colonial umgrande mercado consumidor - casas de comrcio inglesas desejavam penetrarno Brasil21 , a Inglaterra tambm cobiava o algodo produzido no Maranhoe em Pernambuco, uma valiosa matria-prima que servia de alimento para suaindstria txtil22 . Tudo isso fez com que as presses inglesas sobre Portugal seintensificassem no incio do sculo XIX. A possvel aliana de Portugal com aFrana seria economicamente catastrfica para a Inglaterra.

    A dinmica da guerra na Europa, bem como as polticas de aproximao e

    distanciamento entre Portugal, Inglaterra e Frana estavam intimamenteassociadas circulao comercial e ao mercado de moda estabelecido na Cortedo Rio de Janeiro. O cerceamento do comrcio com a Frana, entre 1808 e1814, e a abertura dos portos s naes amigas, em 1808 que, na prtica, eramrepresentadas pela Inglaterra com a posterior assinatura dos Tratados de 1810entre as Coroas portuguesa e britnica, ditaram o ritmo do comrcio luso-brasileiro e afetaram a moda do perodo; bem como o fim da guerra no continenteeuropeu e a Restaurao dos Bourbons na Frana, proporcionaram umrevigoramento do comrcio de moda na Corte, marcado pela retomada dapresena francesa.

    A deciso de abertura dos portos coloniais foi tomada ainda em soloportugus, pois a Inglaterra, por meio de seu enviado, somente consentiria noembarque se o prncipe regente prometesse que o faria. E o fez assim que chegou Bahia, antes mesmo de completar todo o percurso, mediante uma Carta Rgiadatada de 28 de janeiro de 1808. Antes disso, os gneros importados eramextremamente dispendiosos. Alguns autores, contudo, sustentam que a aberturados portos no se deu somente em razo de uma imposio inglesa e sim poruma necessidade da Coroa que, sediada em terras coloniais, e com a ento sededo Reino em guerra, tornava-se indispensvel a abertura de novos entrepostosde comrcio para circulao tanto dos gneros coloniais, quanto das mercadoriasestrangeiras. Sem isso, estaria condenada a uma paralisia comercial, que, por sis, asfixiaria a economia.23

    Apesar da abertura dos portos em 1808 ser vista como o fim do pactocolonial24 , a historiografia, de um modo geral, enfatizou as imensas vantagensconcedidas Inglaterra com a abertura e os Tratados de 1810, vistos comosinnimo da capitulao portuguesa diante desse pas e como uma heranamalfica do Brasil, j que a validade dos tratados estendeu-se para o perodo ps-Independncia.25 Ao princpio da inevitabilidade dessa capitulao, RubensRicupero e Valentim Alexandre afirmam que, dentro dos espaos de negociao,

    a Inglaterra acabou por levar mais do que imaginava ser possvel. Desde a

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    abertura at a cristalizao da chamada preeminncia inglesa com os Tratadosde 1810 existiram margens de negociao dentro das diretrizes fornecidas pelo

    Foreign Office26 aos seus negociadores. As expectativas dos ingleses foram,contudo, mais do que atendidas, ultrapassadas, nos dois casos, conseguindomuito mais do que se almejava.

    A abertura dos portos deu-se em contexto nebuloso. No h muitosdocumentos que permitam uma interpretao aprofundada do que ocorreu esuas circunstncias. Uma das polmicas sobre o assunto o papel de Jos daSilva Lisboa27 na deciso da abertura. Como um liberal defensor dos princpiosde Adam Smith, Silva Lisboa apontado como um dos mentores da abertura -visto a ausncia dos principais conselheiros de D. Joo no momento da assinatura

    da Carta Rgia de 28 de janeiro de 1808, ocorrida na Bahia - Antnio Arajo deAzevedo estava no Recife e D. Rodrigo de Sousa Coutinho no Rio de Janeiro. Adeliberao inglesa na conveno de 22 de outubro de 1807 previa apenas aliberao do porto de Santa Catarina para as mercadorias ento exportadas paraPortugal. O que se sucedeu, contudo, foi a abertura dos principais portos coloniaise a permisso para a exportao de quaisquer manufaturas mediante o pagamentoda tarifa de 24%, se transportadas em navios britnicos, e de 16%, em naviosluso-brasileiros. Rubens Ricupero afirma que se trata de um anacronismohistrico atribuir Inglaterra, protecionista e exclusivista de 1807-1808, aposio de advogada do irrestrito livre comrcio internacional, que se tornaria

    quase meio sculo depois28 , defendendo o papel de destaque exercido porSilva Lisboa no processo de elaborao da Carta de abertura dos portos.

    Se, naquele momento especfico, a expresso naes amigas significava,sobretudo, a Inglaterra, com o fim das guerras no continente europeu, esta seriaameaada pelos demais pases, que voltariam a exportar. A expresso teria sidouma maneira encontrada pela Coroa portuguesa de contornar a visvelpreponderncia inglesa na elaborao da Carta de 1808, e apontada por algunsautores29 como exemplo do predomnio de um pensamento de cunho liberal,expresso na figura de Silva Lisboa. Outro problema para os ingleses era o fato dea abertura ter sido deliberada por Carta Rgia e unilateralmente, e, portanto,facilmente revogvel. Por isso, era de vital importncia para a Coroa britnicaassegurar vantagens preferenciais de maneira mais concreta e bilateral. Advm,da, a presso pelos tratados de aliana e comrcio, previstos desde a convenode 1807.

    Com base nos Tratados de 1810, as taxas alfandegrias para produtosimportados foram mantidas em 24% para as demais naes e em 16% para osnavios luso-brasileiros, enquanto a Inglaterra passaria a pagar apenas 15%, oque produzia uma larga vantagem para os produtos ingleses, se se somar starifas mais baixas o prprio processo de produo ingls, mais adiantado

    qualitativa e quantitativamente, se comparado a qualquer outro. Com essa

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    medida, a alfndega sofreu um aumento de circulao, pois foi facilitada apresena de mercadorias, sobretudo inglesas, por conta dos benefcios tributrios

    oferecidos. De fato, o Tratado de Comrcio e Navegao, ratificado por D. Joo,em fevereiro de 1810, impunha o fim da liberdade de comrcio instauradaem 1808, na medida em que estabelecia o privilgio Inglaterra de pagar umatarifa menor nos portos coloniais 15%. Pela Carta de 1808, todas as naespagariam a mesma tarifa de 24% , com exceo dos navios luso-brasileiros,podendo, teoricamente, concorrer igualmente no mercado. Estipulava tambmuma assimetria, pois Portugal permanecia pagando a taxa de 16% da CartaRgia de 1808, erro que somente foi corrigido alguns meses mais tarde, com odecreto de 18 de outubro de 1809, por meio do qual a Coroa equiparava as taxas

    pagas por portugueses e ingleses. A instruo para o ministro ingls Strangfordera de negociar um tratado provisrio, mas, ao contrrio, conseguiu um tratadoilimitado que poderia ser revisto apenas em quinze anos, ficando explcito quenem mesmo o retorno da Corte para Portugal alteraria sua vigncia.

    A existncia desse tratado justificou a larga vantagem obtida pela Inglaterraem termos comerciais. A partir de 1815, entretanto, ela passou a competirdiretamente com os produtos franceses que, com o avanar do sculo, atingirampatamares elevados de entrada no pas.

    1.2 O impacto da chegada da CorteO impacto da chegada da famlia real ao Brasil, que desembarcou em maro

    de 1808 no Rio de Janeiro, incidiu principalmente sobre essa cidade, pois foineste espao que os habitantes da Colnia conviveram diretamente com aCorte e com as polticas reais, razo que justifica o recorte geogrfico adotado.

    A Corte foi recebida com extremo entusiasmo pelos habitantes coloniais doRio de Janeiro30 e as modificaes resultantes dessa presena podem ser medidaspelo comportamento, pela prpria arquitetura urbana e pela composio dapopulao. Com relao arquitetura, cronistas como Jean Baptiste Debret e o

    padre Luiz Gonalves dos Santos31

    mostraram que a chegada da Corte exigiu areformulao de uma srie de edifcios pblicos e particulares para abrig-la. Osmoradores, obrigados a deixar suas casas e a ced-las a algum membro da Corte32 ,mudavam-se para outras reas da cidade, produzindo uma expanso da mesma.Os recm-chegados habitavam chcaras mais distantes do centro da cidade,como nos casos dos bairros conhecidos como Laranjeiras, Cosme Velho, Gvea,Lagoa, Tijuca etc. A especulao imobiliria, por conta do aumento da procura dehabitaes, gerou a elevao dos preos, acarretando um alto custo de vida noRio de Janeiro. A intensidade de compra e venda de imveis, bem como ascaractersticas dos mesmos, perceptvel pelos inmeros anncios no nico

    peridico da Corte naquela poca a Gazeta do Rio de Janeiro.33

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    Captulo 1 A Corte no Brasil uma nova moda?

    Alm do aumento da procura por parte de novos habitantes, D. Joo trouxeconsigo todo o aparato estatal que existia em Portugal, e que deveria ser alocado

    na nova Corte e sede do Reino, sendo necessrio acomodar novos edifciospblicos que correspondessem aos originais da Metrpole. Podem-se citar, dentreas instituies criadas na nova Corte, o Conselho Supremo Militar e de Justia,o Tribunal da Mesa do Desembargo do Pao, a Mesa de Conscincia e Ordens,a Casa de Suplicao, a Intendncia de Polcia, o Errio Rgio, o Conselho daFazenda, o Tribunal Real da Junta do Comrcio, Agricultura, Fbricas e Navegao,a Imprensa Rgia, a Academia Real Militar, a Real Biblioteca e at a criao deum teatro, denominado Real Teatro de So Joo.34

    A cidade passou tambm por uma srie de obras para que se tornasse mais

    aprazvel para a Corte, como, por exemplo, a poltica de higienizao eembelezamento urbano. As reformas sofridas pela cidade do Rio de Janeiro,aps a chegada da Corte, obedeciam a um modo de conceber a cidade do sculoXVIII, advindo da Ilustrao, que pensava em termos de uma racionalizao doespao urbano, visando a ordem e o bem-estar que acarretariam o progresso e acivilizao dos povos.35 Este foi o motivo da criao da Intendncia Geral dePolcia, em maio de 1808 portanto, dois meses aps o desembarque da famliareal , cujo objetivo era cuidar da cidade, no apenas em termos de contenoda violncia, mas tambm organizando obras e cuidando de toda a parte de

    infraestrutura e embelezamento urbano, como no caso da limpeza e dailuminao das ruas. Atuava, dessa maneira, tanto na represso criminalidade,quanto ao polimento dos costumes, asseando e adornando as vias pblicas, ecivilizando as classes inferiores.36 Essa instituio era vital, pois o Rio deJaneiro inverteu sua posio, passando de Colnia a Metrpole, mesmo queno oficialmente, e a aristocracia portuguesa no s habitava a Corte, masprecisava tambm de um espao pblico que pudesse frequentar, quando dasinmeras celebraes reais ocorridas durante a permanncia de D. Joo nacidade.37 Alm disso, o fato de o Rio de Janeiro contar com uma populao, emsua maioria de escravos, tornava necessrio que se assegurassem as boas maneiras

    destes ltimos e a segurana dos novos habitantes ilustres.Paulo Fernandes Viana foi nomeado o primeiro intendente de Polcia,

    ocupando o cargo desde a criao do rgo at fevereiro de 1821. Dentre suasatividades mais importantes encontram-se a pavimentao das principais ruase vias de acesso que interligavam as diversas partes da cidade, a construo deaquedutos e fontes pblicas para melhorar o abastecimento de gua, e a primeirainstalao regular e em grande escala de lampies a leo de baleia para ailuminao noturna.38 Alm disso, foi ele quem colocou em prtica as famosasdeliberaes para o fim das rtulas ou gelosias nas janelas das casas39 , a

    reorganizao habitacional e a sobredita poltica de confisco de habitaes,

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    O Smbolo Indumentrio: distino e prestgio no Rio de Janeiro (1808-1821)

    conhecidas como aposentadorias.40 Era dele tambm a funo de organizar acidade todas as vezes em que ocorriam festejos pblicos.

    Pode-se imaginar o impacto sofrido pela cidade em razo da chegada deuma Corte completa em seu aparato burocrtico, bem como a contnua presenade estrangeiros por causa da abertura dos portos. Luiz Gonalves dos Santosapontou, na poca da transferncia da Corte, uma populao de 60.000 pessoas,da qual quase a metade era de escravos. Oliveira Lima estimou uma populaoflutuante de estrangeiros de 16.000 pessoas, depois da chegada da Corte.Flutuante pelo fato de no possurem domiclio fixo, tratando-se de pessoasque chegavam e partiam incessantemente da cidade. Joo Fragoso e ManoloFlorentino apontaram um crescimento populacional de 160%, de 1799 a 1821,

    taxa que obviamente foi possibilitada pela transferncia da Corte e pelo impactoda presena de estrangeiros, pois os mesmos autores apontam uma taxa decrescimento de apenas 29%, entre 1760 e 178041 . Isso sem contar o progressivoaumento do nmero de escravos trazidos da frica, que representavam a maiorparcela da populao.

    Em relao ao nmero de pessoas que chegaram juntamente com a famliareal, existe uma vigorosa polmica. Nireu Cavalcanti afirma que o nmero de15.000 pessoas falso e que seria alimentado pelo relato do tenente inglsThomas ONeil este indicava, contudo, terem embarcado de 16.000 a 18.000pessoas que se encontrava distante da costa, a bordo de outro navio, no

    momento do embarque e teria fantasiado o nmero. Para ele, pode-se falarapenas em 420 pessoas. J Kenneth Ligth afirmou que o nmero foi subestimadopor Nireu Cavalcanti e que, analisando as naus utilizadas na transplantao daCorte, chega-se facilmente a um nmero entre 12.000 e 15.000 pessoas.42 Dequalquer maneira, no mbito desse estudo, o mais significativo a prpriapresena da Corte portuguesa em solo colonial, a despeito do nmero que possaser apresentado. Isto porque a visibilidade alcanada pelos membros da Cortena sociedade colonial era enorme, no obstante seu nmero. A deferncia geradafoi independente deste. Alm disso, tratando-se da quantidade de nobres nacomitiva, eles eram, de todo modo, poucos, pois a estimativa de 15.000 pessoaslevava em conta a tripulao dos navios como um todo, e no apenas os cortesosque aqui chegaram e se instalaram.

    No squito que acompanhou a famlia real destacou-se o nome de algunsmembros da aristocracia, tais como: duque de Cadaval e famlia, marqus deVagos, marqus de Angeja, marqus de Torres Novas com dois irmos, conde deCaparica, marqus de Lavradio e famlia, marqus de Bellas e famlia, conde deBelmonte e famlia, conde de Redondo e filho, marqus de Pombal e esposa,visconde de Barbacena e famlia, marqus de Alegrete, visconde de Anadia,conde de Cavaleiros e esposa, alm de alguns ilustres nomes como D. Fernando

    Jos de Portugal futuro marqus e conde de Aguiar , D. Rodrigo de Souza

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    Captulo 1 A Corte no Brasil uma nova moda?

    Coutinho e esposa futuros conde e condessa de Linhares e irmo, D. Joo deAlmeida e esposa, entre outros.43 Destes, nem todos vieram acompanhados de

    toda a famlia, pois a expectativa era de retornar a Portugal e, por isso, tornava-se necessrio que algum parente ficasse do outro lado do Atlntico para cuidardos negcios da famlia.

    No Almanaque de 1811, registraram-se 29 Casas Titulares presentes na Corte,tendo sido 11 (onze) os ttulos criados ou renovados.44 Estes, contudo, tratavam-se, majoritariamente, de renovaes de ttulos de aristocratas portugueses queacompanharam a Corte. No Almanaque de 1816, h a indicao de 35 CasasTitulares, o que apontava seis novas concesses de ttulos.45 J no Almanaquede 1817, registrou-se a existncia de 88 Casas Titulares46 , o que caracteriza a

    incurso de 53 pessoas no rol dos titulados, se comparado ao ano anterior, e de59, se comparado a