LLÍÍNNGGUUAA PPOORRTTUUGGUUEESSAA · O que fez o apresen-tador? ... Tirar uma onda significa...

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U U F F S S C C a a r r - - J J a a n n e e i i r r o o / / 2 2 0 0 0 0 2 2 O O B B J J E E T T I I V V O O 1ª Parte – Questões de Múltipla Escolha Para responder às questões de números 01 a 03, leia o texto a seguir. Selinho, sim, mas só para poucos Primeiro, Hebe Camargo, toda animada, pediu a Sílvio Santos um “selinho” (beijinho). Não ganhou: “Nem selinho, nem selo, nem selão”, ouviu dele, categórico. Em seguida, Gilberto Gil entrou no palco, de mão estendida para cumprimentá-lo. O que fez o apresen- tador? Disse “selinho”, esticou os lábios e zás — tas- cou um beijinho na boca do músico. A cena foi ao ar de madrugada, no encerramento do Teleton, a Maratona beneficente exibida pelo SBT. Gil ficou surpreso. Hebe fingiu brabeza e Sílvio riu muito. “Tirei uma onda, foi só uma bicotinha”, diz ele. “Tudo tem uma primeira vez”. (Veja, 07.11.2001, pág. 101.) e O termo “selinho” é bastante utilizado na linguagem atual. O diminutivo no uso da palavra serve para enfati- zar que se trata de um beijo a) indiscreto. b) demorado. c) engraçado. d) indecente. e) breve. Resolução O diminutivo selinho, equivalente a “pequeno beijo”, sugere um beijo pouco envolvente e rápido. c O vocabulário do texto mostra que o jornalista optou por uma expressão mais à vontade e informal. Essa opção pode ser comprovada pelo emprego de a) “toda animada” e “categórico”. b) “categórico” e “tascou”. c) “esticou” e “tascou”. d) “beijinho” e “encerramento”. e) “encerramento” e “beneficente”. Resolução Tascar é um brasileirismo, próprio da linguagem colo- quial informal. Quanto a esticar, seu “timbre” coloquial se deve, no contexto, ao caráter algo disfemístico da expressão “esticar os lábios” (em situação mais for- mal, um verbo mais “delicado” seria escolhido para descrever o gesto). 2 1 L L Í Í N N G G U U A A P P O O R R T T U U G G U U E E S S A A

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1ª Parte – Questões de

Múltipla Escolha

Para responder às questões de números 01 a 03, leia otexto a seguir.

Selinho, sim, mas só para poucos

Primeiro, Hebe Camargo, toda animada, pediu a SílvioSantos um “selinho” (beijinho). Não ganhou: “Nemselinho, nem selo, nem selão”, ouviu dele, categórico.Em seguida, Gilberto Gil entrou no palco, de mãoestendida para cumprimentá-lo. O que fez o apresen-tador? Disse “selinho”, esticou os lábios e zás — tas-cou um beijinho na boca do músico. A cena foi ao ar demadrugada, no encerramento do Teleton, a Maratonabeneficente exibida pelo SBT. Gil ficou surpreso. Hebefingiu brabeza e Sílvio riu muito. “Tirei uma onda, foi sóuma bicotinha”, diz ele. “Tudo tem uma primeira vez”.

(Veja, 07.11.2001, pág. 101.)

eO termo “selinho” é bastante utilizado na linguagematual. O diminutivo no uso da palavra serve para enfati-zar que se trata de um beijoa) indiscreto. b) demorado.c) engraçado. d) indecente.e) breve.

Resolução

O diminutivo selinho, equivalente a “pequeno beijo”,sugere um beijo pouco envolvente e rápido.

cO vocabulário do texto mostra que o jornalista optoupor uma expressão mais à vontade e informal. Essaopção pode ser comprovada pelo emprego dea) “toda animada” e “categórico”.b) “categórico” e “tascou”.c) “esticou” e “tascou”.d) “beijinho” e “encerramento”.e) “encerramento” e “beneficente”.

Resolução

Tascar é um brasileirismo, próprio da linguagem colo-quial informal. Quanto a esticar, seu “timbre” coloquialse deve, no contexto, ao caráter algo disfemístico daexpressão “esticar os lábios” (em situação mais for-mal, um verbo mais “delicado” seria escolhido paradescrever o gesto).

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aConsiderando a situação em que a expressão “Tireiuma onda” foi dita pelo apresentador Sílvio Santos,pode-se entender que elea) fez uma brincadeira com o músico.b) ofendeu os artistas e o público.c) quis deixar o público horrorizado.d) pretendeu magoar Hebe Camargo.e) não teve idéia da repercussão da sua atitude.

Resolução

Tirar uma onda significa “zombar”, “brincar”, “divertir-se com algo ou alguém”, embora o Novo DicionárioAurélio não consigne tal acepção, que é a que seencontra no texto e no emprego mais freqüente daexpressão. (Encontram-se no Aurélio apenas asseguintes acepções, nenhuma das quais adequada aosentido da expressão no texto transcrito: “dar-se aresde valente, de culto, de inteligente, de bom, de impor-tante etc.”)

As questões de números 04 a 07 baseiam-se nos tex-tos a seguir.

Soneto de fidelidade(Vinicius de Moraes)

De tudo, ao meu amor serei atentoAntes, e com tal zelo, e sempre, e tantoQue mesmo em face do maior encantoDele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momentoE em seu louvor hei de espalhar meu cantoE rir meu riso e derramar meu prantoAo seu pesar ou seu contentamento.

E assim, quando mais tarde me procureQuem sabe a morte, angústia de quem viveQuem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive):Que não seja imortal, posto que é chamaMas que seja infinito enquanto dure.

Por enquanto(Renato Russo)

Mudaram as estaçõesNada mudouMas eu sei que alguma coisa aconteceuTá tudo assim, tão diferenteSe lembra quando a genteChegou um dia a acreditarQue tudo era pra sempreSem saberQue o pra sempreSempre acaba.

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dNos dois primeiros quartetos do soneto de Vinicius deMoraes, delineia-se a idéia de que o poeta a) não acredita no amor como entrega total entre duas

pessoas.b) acredita que, mesmo amando muito uma pessoa, é

possível apaixonar-se por outra e trocar de amor. c) entende que somente a morte é capaz de findar

com o amor de duas pessoas.d) concebe o amor como um sentimento intenso a ser

compartilhado, tanto na alegria quanto na tristeza.e) vê, na angústia causada pela idéia da morte, o

impedimento para as pessoas se entregarem aoamor.

Resolução

A idéia de que o amor deve ser compartilhado tanto naalegria como na tristeza depreende-se dos dois últimosversos da segunda estrofe: “E rir meu riso e derramarmeu pranto / Ao seu pesar ou seu contentamento”.

bNo segundo verso do poema, no qual o poeta mostracomo tratará o seu amor, as expressões “com tal ze-lo”, “sempre” e “tanto” dão, respectivamente, idéiadea) modo – intensidade – modo.b) modo – tempo – intensidade.c) tempo – tempo – modo.d) finalidade – tempo – modo.e) finalidade – modo – intensidade.

Resolução

Com tal zelo é equivalente a “de modo tão zeloso” ou“tão zelosamente”, indicando, pois, modo. Sempre éum advérbio de tempo e tanto um advérbio de inten-sidade.

Para responder à questão de número 06, leia os ver-sos:

“E rir meu riso e derramar meu prantoAo seu pesar ou seu contentamento.”“Mudaram as estaçõesNada mudou”

bÉ notória a oposição de idéias nos versos, o que sig-nifica que neles se encontra como principal figura delinguagem aa) metáfora. b) antítese. c) sinestesia.d) metonímia. e) catacrese.

Resolução

Antítese é a figura correspondente à aproximação deantônimos ou de idéias que se contrapõem.

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aEm “Por enquanto”, Renato Russo diz que “... o prasempre / sempre acaba”. Essa idéia, no poema deVinicius de Moraes, aparece no seguinte verso:a) “Mas que seja infinito enquanto dure”.b) “Quero vivê-lo em cada vão momento”.c) “Quem sabe a morte, angústia de quem vive”.d) “Quem sabe a solidão, fim de quem ama”.e) “Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto”.

Resolução

O verso “Mas que seja infinito enquanto dure” implicaa idéia de fim, de término (“enquanto dure” quer dizerque não durará sempre), e postula que, dentro de tallimite, o amor não conheça limites (“seja infinito”, istoé, não seja contido por nenhuma restrição). Os versosde Renato Russo – “o pra sempre / sempre acaba” –também afirmam a idéia de fim, em contraste com umprojeto sem limite, sem fim (“o pra sempre”). Tem-se,neste último caso, um oxímoro, o que não ocorre noverso de Vinícius de Moraes. O ponto comum entre osdois textos é, portanto, a idéia de que algo que se quersem limites também está destinado a terminar.

As questões de números 08 e 09 referem-se aos tex-tos a seguir.

Texto 1

Isto

(Fernando Pessoa)

Dizem que finjo ou mintoTudo que escrevo. Não.Eu simplesmente sintoCom a imaginaçãoNão uso o coração.

Texto 2

(Rachel de Queiroz)

E o trabalho, este nosso trabalho de escrever? MeuDeus, como às vezes chega a ser sórdido! Aqueleriscar, aquela grosseria do texto primitivo, aquele tatearatrás da palavra desejada e, ainda pior, da combinaçãode palavras desejada! A gaucherie do que sai escrito –tanta beleza que a gente sonhou, depois de posta nopapel como ficou inexpressiva, barata e normal! Jádizia tão bem o velho Bilac: “a palavra pesada abafa aidéia leve!” — e não é mesmo?

Vocabulário: gaucherie: falta de jeito. Do francês gauche: esquerdo, canhoto.

cOs textos têm assunto comum, pois discutema) a importância da crítica literária e do leitor para que

o escritor idealize e materialize seus textos, criandode forma produtiva e agradável.

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b) a questão da escrita literária como forma quedepende única e exclusivamente da inspiração dosgrandes escritores.

c) a própria linguagem na questão da criação artística,da forma como o escritor idealiza e materializa seutexto.

d) a questão da criação artística do escritor, que sofremuito com as imposições dos leitores a despeito deobras originais.

e) a dificuldade de expressão escrita comum a todosos escritores, que têm de idealizar um texto semsaber de que forma ele será entendido.

Resolução

Os dois textos, de natureza metalingüística, focalizamo ato de escrever, a escrita artística. O fragmento dopoema de Fernando Pessoa retoma a teoria estéticados antológicos “Autopsicografia” (“O poeta é um fin-gidor”) e “Ela canta, pobre ceifeira” (“Tudo o que emmim sente ‘sta’ pensando”). É comum a estes meta-poemas a noção da poesia como “representação”artística, a dessacralização da teoria romântica da“poesia de inspiração”.O texto de Rachel de Queiroz fala das dificuldades dotrabalho de escrever na mesma direção de “O luta-dor”, de Carlos Drummond de Andrade (“Lutar compalavras/ é luta mais vã”).As alternativas a, d e e são ineptas, pois envolvem arecepção da obra pelo leitor ou pela crítica, e os textosnão falam disso. A alternativa b é o oposto daquilo quedizem Fernando Pessoa e Rachel de Queiroz, poistraduz exatamente a concepção romântica da escritaliterária, tida como fruto da inspiração, como um“dom” do artista, obra do “gênio” criador.

dA leitura dos dois textos permite afirmar quea) os autores mostram a necessidade de se exprim-

irem os sentimentos reais vividos e sentidos peloescritor em seu coração.

b) o poeta, para Fernando Pessoa, deve buscar o sen-timento no coração e reproduzi-lo de forma maisintensa do que realmente ele é.

c) há diferença notável entre a escrita idealizada e arealizada, na concepção de Rachel de Queiroz, poissempre a idealizada sofre correções para que ossentimentos pareçam reais, o que a torna melhor.

d) a sensação de desapontamento é comum, segundoRachel de Queiroz, pois o texto produzido não cor-responde ao esforço despendido em sua produção.

e) o poeta, segundo Fernando Pessoa, deve exprimiros sentimentos como imaginários, embora sejamreais.

Resolução

A alternativa é explicitamente contemplada na pas-sagem: “— tanta beleza que a gente sonhou, depoisde posta no papel como ficou inexpressiva, barata enormal!”. O desapontamento é notório.

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Para responder à questão de número 10, compare osdois trechos a seguir.

Texto 1(Zé Rodrix e Tavito)

Eu quero uma casa no campodo tamanho idealpau-a-pique e sapêOnde eu possa plantar meus amigosmeus discosmeus livrose nada mais

Texto 2(Cláudio Manuel da Costa)

Se o bem desta choupana pode tanto,Que chega a ter mais preço, e mais valia,Que da cidade o lisonjeiro encanto;

Aqui descanse a louca fantasia;E o que té agora se tornava em pranto,Se converta em afetos de alegria.

eEmbora muito distantes entre si na linha do tempo, ostextos aproximam-se, pois o ideal que defendem é

a) o uso da emoção em detrimento da razão, pois estaretira do homem seus melhores sentimentos.

b) o desejo de enriquecer no campo, aproveitando asriquezas naturais.

c) a dedicação à produção poética junto à natureza,fonte de inspiração dos poetas.

d) o aproveitamento do dia presente – o carpe diem –,pois o tempo passa rapidamente.

e) o sonho de uma vida mais simples e natural, dis-tante dos centros urbanos.

Resolução

Quanto ao que se pergunta, e nos limites em que se ofaz, não há dúvida quanto à identificação da alternativaque o examinador consignou como a correta. Lamen-tável, contudo, a insistência em um equívoco reiteradoà exaustão nos manuais escolares: a aproximaçãoentre a poesia “frouxa” de “Casa de Campo” e a longatradição clássica da tópica do fugere urbem e da aureamediocritas. O “campo” tropicalista e equipado de ZéRodrix, com amigos, discos e livros, nem de longe tocaa universal e intemporal tensão entre o rústico e o civi-lizado, entre o natural, de um lado, e o urbano e artifi-cial, do outro.

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2ª Parte – Questões Discursivas

As questões de números 17 e 18 baseiam-se nos doistextos a seguir.

Texto 1

Até o fim

(Chico Buarque)

Quando eu nasci veio um anjo safadoO chato dum querubimE decretou que eu tava predestinadoA ser errado assimJá de saída a minha estrada entortouMas vou até o fim.

Texto 2

Poema de Sete Faces

(Carlos Drummond de Andrade)

Quando nasci, um anjo tortodesses que vivem na sombradisse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.(...)

Os dois textos não só se assemelham com relação aotema de que tratam, como também à estruturação. a) Que tema é desenvolvido em ambos os textosb) Qual a semelhança na estrutura entre eles? Dê um

exemplo.Resolução

a) O tema comum aos dois textos é a gaucherie dosujeito, ou seja, seu desajustamento na vida, seucaráter “errado”, entendido como um destino ouuma danação figurativamente decretada pelo “anjotorto” drummondiano, que Chico Buarque converteem “anjo safado”, “o chato dum querubim”.

b) O texto de Chico Buarque, apesar das diferenças, éestruturado à imitação dos versos de CarlosDrummond de Andrade que abrem o “Poema desete faces”. Com efeito, os dois textos são consti-tuídos de períodos iniciados por orações subordina-das adverbiais temporais quase idênticas (“Quandonasci...” / “Quando eu nasci...”), que introduzem acircunstância em que se dá a ação central – “a mal-dição do anjo”. Quanto a elementos de estruturaçãopoética, os dois textos apresentam tanto recursossemelhantes (versos livres, em ambos os casos,apesar de em Chico Buarque eles terem a extensãodeterminada pela linha melódica da canção) quantorecursos diferentes (versos brancos, em Drum-mond, e rimados, em Chico Buarque).

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O anjo é um elemento comum aos dois textos.a) De que forma são tratados os anjos nos textos?b) Nos versos de Chico Buarque, o querubim “de-

cretou”; nos de Drummond, o anjo “disse”. Qual adiferença desses verbos na caracterização do queru-bim e do anjo?

Resolução

a) Bem de acordo com os gêneros diversos que prati-cam (lírica culta, em Drummond; canção popular, emChico Buarque), o “anjo torto” tem traços diferentesnos dois autores. Em Drummond ele é, ao mesmotempo, grave, sombrio (vive “na sombra”) e afron-tador das convenções do decoro lingüístico tal comoestabelecido pela tradição literária anterior ao Mo-dernismo perfilhado pelo poeta, já que sua sentençaduramente condenatória vem expressa em francês(o que, no momento em que se publicou o poema –1930 – tinha um claro sentido de desafio galhofeiroao Parnasianismo). Em Chico Buarque, o anjo é“safado”, “chato” e menos culto, ligando-se, peloprimeiro predicado, à galeria de malandros que des-filam nas composições do autor.

b) Em Drummond, a sentença do anjo parece menosperemptória que em Chico Buarque, devendo-seisso à diferença que vai de dizer – de sentido neutro,no contexto – a decretar, que significa “ordenar ouestabelecer de maneira categórica, impositiva”.

Considere os textos de Aníbal Machado e Cecília Mei-reles para responder às questões de números 19 e 20.

Texto 1

O grande clandestino

(Aníbal Machado)

Eu me distraio muito com a passagem do tempo.Chego às vezes a dormir. O tempo então aproveita e

[passa escondido.Mas com que velocidade!Basta ver o estado das coisas depois que desperto:

[quase todas fora do lugar, ou desaparecidas; outras[com uma prole imensa;

O que é preciso é nunca dormir, e ficar vigilante, para [obrigá-lo ao menos a disfarçar a evidência de suas

[metamorfoses.(...)Contudo, não se deve ligar demasiada importância ao

[tempo. Ele corre de qualquer maneira.É até possível que não exista.Seu propósito evidente é envelhecer o mundo.Mas a resposta do mundo é renascer sempre para o

[tempo.

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Texto 2

O tempo e os relógios

(Cecília Meireles)

Creia-se ou não, todo mundo sente que o tempopassa. Não precisamos olhar para o espelho nem paranenhum relógio: o tempo está em nosso coração, eouve-se; o tempo está em nosso pensamento, e lem-bra-se. “Vou matando o tempo, enquanto o tempo nãome mata” — respondia-me na Índia um grandehomem amigo meu, cada vez que perguntava como iapassando.(...)Em todo caso, esses são os tempos grandes. O tempopequeno é o dos nossos relógios.

Ambos os textos tratam da questão do tempo, daforma como ele age sobre as pessoas e como elas osentem.a) No texto 1, o autor deixa claro que é impossível fugir

à ação do tempo. Transcreva o trecho que comprovaessa idéia.

b) Que relação há entre “olhar para o espelho” e otempo, no texto de Cecília Meireles? A que verso dotexto 1 essa relação pode ser associada?

Resolução

a) A frase do texto I em que está implicada a idéia deque não se pode fugir à ação do tempo é “Ele (otempo) corre de qualquer maneira”. Outro mo-mento do texto em que a mesma idéia é sugeridaé: “O que é preciso é nunca dormir, e ficar vigilante,para obrigá-lo ao menos a disfarçar a evidência desuas metamorfoses”.

b) “Olhar para o espelho” é uma forma de identificar apassagem do tempo, pelas marcas de envelhe-cimento que ela deixa em nós, pois o que o tempoparece querer com sua passagem é “envelhecer omundo”, conforme a expressão do texto I.

Muitos recursos lingüísticos garantem ao texto a suacoesão e expressividade.a) No texto de Aníbal Machado, os termos “mas” (3º

verso) e “contudo” (6º verso) têm a mesma funçãocoesiva e expressiva? Justifique a sua resposta.

b) No trecho do texto 2 “Não precisamos olhar para oespelho nem para nenhum relógio: o tempo está emnosso coração, e ouve-se...”, os dois pontos poderi-am ser substituídos por um conectivo para ligar asorações. Reescreva o trecho, explicitando esse ele-mento de ligação das orações.

Resolução

a) Os termos mas e contudo são conjunções coor-denativas adversativas, que estabelecem umarelação de oposição ao que está sendo dito antes.

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b) “Não precisamos olhar para o espelho nem paranenhum relógio, pois o tempo está em nossocoração, e ouve-se…”

Para responder às questões de números 21 a 23,tenha como referência o texto “Romance de umaCaveira”.

Romance de uma Caveira

(Alvarenga e Ranchinho)

Eram duas caveiras que se amavamE à meia-noite se encontravamPelo cemitério os dois passeavamE juras de amor então trocavam.Sentados os dois em riba da lousa friaA caveira apaixonada assim diziaQue pelo caveiro de amor morriaE ele de amores por ela vivia.(...)Mas um dia chegou de pé juntoUm cadáver, um vudu, um defunto.E a caveira por ele se apaixonouE o caveiro antigo abandonou.O caveiro tomou uma bebedeiraE matou-se de um modo romanescoPor causa dessa ingrata caveiraQue trocou ele por um defunto fresco.

Muitos recursos lingüísticos garantem ao texto a suacoesão e expressividade.a) No texto de Aníbal Machado, os termos “mas” (3º

verso) e “contudo” (6º verso) têm a mesma funçãocoesiva e expressiva? Justifique a sua resposta.

b) No trecho do texto 2 “Não precisamos olhar para oespelho nem para nenhum relógio: o tempo está emnosso coração, e ouve-se...”, os dois pontos poderi-am ser substituídos por um conectivo para ligar asorações. Reescreva o trecho, explicitando esse ele-mento de ligação das orações.

Resolução

a) O texto de Alvarenga e Ranchinho é uma paródiahumorística de um dos mais populares poemas doultra-romantismo português, “O Noivado no Sepul-cro”, de Soares Passos (“Vai alta a lua na mansão damorte, / já meia-noite com vagar soou, / que paztranqüila dos vaivéns da sorte!/ só tem descansoquem ali baixou”). A dupla sertaneja retoma, peloavesso, o gosto romântico por ambientes fúnebres,paisagens noturnas além da imaginação delirante,muitas vezes atraída pela morte, por seus ritos epelas sugestões escapistas e sobrenaturais.

b) Entre os elementos humorísticos que parodiam osentimentalismo mórbido dos românticos, um dosmais eficazes é a flexão de gênero do sobrecomum“caveira”, flexionado no masculino como “caveiro”.

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Outro efeito humorístico é o jogo antitético “deamor morria” e “de amores por ela vivia”. Tambéma utilização do “dialeto caipira” (“em riba”, “chegoude pé junto”) modula o humor com que os artistaspopulares prolongam, além-túmulo, o tema doamante rejeitado, do “caveiro” preterido que seembriaga e se mata.

Para alcançar certos efeitos expressivos, os autoresservem-se de vários recursos, entre eles, a manipu-lação da gramática. Com base nessa informação,responda:a) Por uma questão de ritmo ou estilo, os autores da

música podem ter optado pelo uso do verbo “ser”no trecho “Eram duas caveiras que se amavam”.Reescreva esse trecho, substituindo o verbo “ser”pelo verbo “haver”.

b) Como é sabido, a palavra “caveira” pertence ao gê-nero feminino. Todavia, no texto, encontra-se a for-ma “o caveiro”. Qual é a função desse uso notexto?

Resolução

a) “Havia duas caveiras que se amavam”. O verbo “haver”, no sentido de existir, é impessoale fica na 3ª pessoa do singular.

b) Como já foi observado na resposta da questão 21, ouso da forma o caveiro, no lugar de a caveira, con-fere maior comicidade ao texto e quebra o próprioespírito do romantismo.

O emprego de pronomes, além de garantir a coesãotextual, pois organiza as informações, permite que seentendam as referências, o que é um auxílio na com-preensão do texto.a) Explique a diferença de uso do pronome “se” em

cada um dos versos:

“Eram duas caveiras que se amavam”“E matou-se de um modo romanesco”

b) No verso “Que trocou ele por um defunto fresco”,o referente do pronome é facilmente identificável.Contudo, nota-se que o emprego do pronome fogeà norma padrão. Reescreva o verso segundo as con-venções da linguagem culta.

Resolução

a) No primeiro verso “Eram duas caveiras que seamavam”, o se é empregado com valor depronome reflexivo recíproco, ou seja, “amavam-seuma à outra”. Já no segundo verso “E matou-se deum modo romanesco”, o pronome se é apenasreflexivo, equivalendo a “matou a si mesmo”.

b) “Que o trocou por um defunto fresco.” De acordo com a norma gramatical padrão, umpronome pessoal reto não pode ser empregado com

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a função de objeto direto. Assim, o pronome reto eledeve ser substituído pelo pronome oblíquo o, quefunciona como complemento verbal.

A questão de número 24 baseia-se no texto a seguir,de Machado de Assis.

Começo a arrepender-me deste livro. Não que ele mecanse; eu não tenho que fazer; e, realmente, expediralguns magros capítulos para esse mundo sempre étarefa que distrai um pouco da eternidade. Mas o livroé enfadonho, cheira a sepulcro, traz certa contraçãocadavérica; vício grave, e aliás ínfimo, porque o maiordefeito deste livro és tu, leitor. Tu tens pressa de envel-hecer, e o livro anda devagar; tu amas a narração dire-ita e nutrida, o estilo regular e fluente, e este livro e omeu estilo são como os ébrios, guinam à direita e àesquerda, andam e param, resmungam, urram, gargal-ham, ameaçam o céu, escorregam e caem...

O trecho apresentado faz parte de Memórias póstu-mas de Brás Cubas, obra que tem como narrador ofalecido Brás Cubas. Daí poder-se entender que escr-ever distrai um pouco da eternidade. a) O narrador tem toda a eternidade para escrever. O

leitor, porém, tem um tempo diferente. Essaoposição estabelece que tipo de relação entre a obrae o leitor, segundo o narrador?

b) O narrador compara seu estilo aos ébrios (bêbados),usando orações coordenadas e curtas. O que essasorações sugerem?

Resolução

a) O “defunto-autor”, Brás Cubas, narra as suas“memórias”, “do outro lado do mistério”, em po-sição transtemporal. Dentro da tradição clássica dasátira menipéia, que funde o fantástico, o cômico eo filosófico, Machado inventa um narrador que apósa morte, escreve para distrair-se da eternidade. Oleitor, ao contrário de Brás Cubas, está sujeito àsinjunções do tempo e, como “filho de Cronos”, estásubmetido à linearidade temporal (começo-meio-fim) que o narrador, desde o início, subverte. Daí ainvectiva irônica: “porque o maior defeito deste livroés tu, leitor”.

b) A superposição de períodos curtos, justapostos porcoordenação assindética, sugere, pela descontinui-dade, exatamente o que o narrador enfatiza: a rup-tura com a linearidade do discurso narrativo — olivro e o estilo que “são como os ébrios…”,imprevisíveis.

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Prova de RedaçãoFreqüentemente se lê sobre falar e escrever

como necessidades do ser humano. Do ponto de vistaacadêmico e profissional, por exemplo, são competên-cias que podem garantir sucesso a muitas pessoas.

O que é importante para falar e escrever comcompetência, ou seja, de forma que as intenções decomunicação dos indivíduos sejam plenamente satis-feitas de acordo com a situação com que se defron-tam?

Leia os textos a seguir e, depois, a proposta deredação.

Texto 1

No grupo escolar

Eu vou agora descrever o jeito como se ensi-nava “linguagem”. Era o jeito como se aprendia a ler,a escrever e a redigir na escola pública e na particular.

Já podemos falar de um “era uma vez” ummundo em que a professora primária era levada asério, por isso ela não media esforços em ensinar seusalunos. Nesse tempo, nos boletins, além da nota delinguagem, aritmética e conteúdos, existia nota deordem, aplicação e comportamento. Só por aí já vemosque capricho, atenção e modos respeitosos já foramvalores a merecer menção. (...)

No ensino de linguagem, a escrita se fazia pormeio de cópia, ditado, descrição e composição. Emgeral, a professora escrevia no quadro-negro, e osalunos copiavam, e essa cópia era depois religiosa-mente corrigida pela professora. Copiar é ver e repetiro que se viu. (...) Essa é uma etapa importante, em quese mistura o ler com o escrever.

Já o ditado, pavor das criancinhas recém-alfa-betizadas, pede outras aptidões. Escuta-se e transfor-ma-se o som em símbolos gráficos da escrita de que acópia nos dá o domínio. Automatizar esse processoexige mais tarefas de nosso sistema nervoso. E osditados também eram corrigidos um a um.

Já sabemos escrever o que vemos (cópia) esabemos escrever o que ouvimos (ditado). É chegadaa hora de escrever o que percebemos. Agora já cabe aquem escreve fazer o ritmo e a respiração, isto é, criaro texto que, na cópia e no ditado, vinham prontos.Cada sala de aula tinha um caderno enorme comdesenhos que os alunos tinham de colocar empalavras. Só depois vinham as composições. Paratanto, precisávamos ser capazes de realizar todas asaptidões desenvolvidas nas outras etapas. Por termospraticado a transposição de vários estímulos para aescrita, podíamos, finalmente, transpor também de-sejos, esperanças e fantasias. Isto é, sentimentos ou,sendo mais específica, subjetividade. Se faremos issopobremente ou genialmente, depende em parte doexercitar-se e, em parte, das quantidades de que dis-pomos de cada uma dessas aptidões, da importânciaque o comunicar-se tem no meio social em que acriatura vive etc. etc. (...) E depois das composições

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praticávamos cartas, relatórios, tudo lá no cursoprimário do grupo escolar onde as professoras erammuitíssimo respeitadas e corrigiam, reviam, ensinavam.

Ainda bem que o computador trouxe de voltaa importância da escrita, e por isso vale a pena lembrarcomo se fazia no tempo em que mal-e-mal em algunsescritórios algumas pessoas escreviam a máquina,mas todos tinham de ter uma letra legível. A caligrafiaparece, de momento, fora do campo das utilidades aescrita não. Mas ela voltará.

(...) Não é porque sabemos escrever com-plexos relatos que deixamos de precisar saber fazercópia, ditado e descrição. Como passar um procedi-mento se não soubermos descrever, por exemplo? Aescrita está em todos os lugares do nosso cotidianomoderno. E seu ensino ficou precário ao privilegiar acriação em detrimento da precisão.

(“Equilíbrio”, Folha de S. Paulo, 20.09.2001.)

Texto 2

A dificuldade com a clareza é um traço culturalno Brasil. “Num país com tantas carências educacionais,falar de maneira rebuscada é indicador de status,mesmo que o falante não esteja dizendo coisa comcoisa”, afirma o professor Francisco Platão Savioli, daUniversidade de São Paulo. Esse amor pelas palavrasdifíceis tem origem na época da transição do Impériopara a República, no fim do século XIX. Conforme expli-ca Sérgio Buarque de Holanda, em seu clássico Raízesdo Brasil, com o advento da República o curso superiorpassou a ser o principal parâmetro de reconhecimentosocial. Na época, estavam em voga as escolas de dire-ito. Assim, para ser alguém na sociedade daqueletempo, era necessário não apenas ser advogado, mastambém falar como advogado. É daí que surge, segundoSérgio Buarque, a linguagem bacharelesca. Esse estilofloresceu no começo do século XX e, a partir do mod-ernismo, seu prestígio foi decaindo. O português empo-lado persiste, no entanto, até hoje, em formas degener-adas. Uma delas é o chamado “burocratês”, a lin-guagem dos memorandos das empresas, nos quaismesmo para solicitar uma caixa de clipes sãonecessárias várias saudações e salamaleques. Outra é aretórica de parte dos políticos. O linguajar pomposo tam-bém sobrevive nas teses acadêmicas e, como era deesperar, no discurso dos advogados.

(...)A dificuldade do brasileiro em falar e escrever

de forma a se fazer entender não é apenas conse-qüência da tradição bacharelesca. Há outros fatores.Para começar, lê-se pouco no Brasil. A Câmara Brasi-leira do Livro divulgou recentemente um estudo quemostra que, na verdade, os brasileiros lêem em médiaapenas 1,2 livro por ano. Não cultivar a leitura é umdesastre para quem deseja expressar-se bem. Ela écondição essencial para melhorar a linguagem oral eescrita. Quem lê interioriza as regras gramaticais bási-cas e aprende a organizar o pensamento.

(Veja, 07.11.2001, pág. 108-9.)

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Texto 3

Quatro ou cinco grupos diferentes de alunosdo Farroupilhas estiveram lá em casa numa mesmamissão, designada por seu professor de Português:saber se eu considerava o estudo da Gramática indis-pensável para aprender e usar a nossa ou qualqueroutra língua.

(...)Respondi que a linguagem, qualquer lingua-

gem, é um meio de comunicação e que deve ser jul-gada exclusivamente como tal. Respeitadas algumasregras básicas da Gramática, para evitar os vexamesmais gritantes, as outras são dispensáveis. A sintaxe éuma questão de uso, não de princípios. Escrever bemé escrever claro, não necessariamente certo.

(...)E adverti que minha implicância com a Gra-

mática na certa se devia à minha pouca intimidade comela. Sempre fui péssimo em Português. Mas — isso eudisse — vejam vocês, a intimidade com a Gramática étão indispensável que eu ganho a vida escrevendo,apesar da minha total inocência na matéria.

(Luís Fernando Veríssimo. O gigolô das palavras.)

Baseando-se nos textos apresentados e valen-do-se de outras informações de seu domínio, elaboreum texto dissertativo em que seja analisada a questão:

OS PRINCÍPIOS BÁSICOS QUE DEFINEM

O BOM USO DA LÍNGUA.

Comentário de RedaçãoPropôs-se como objeto de análise o tema “Os

princípios básicos que definem o bom uso da língua”.Ofereceram-se, como ponto de partida para a dis-cussão do tema, três textos: o primeiro descreveu o“jeito como se ensinava a linguagem”, a saber, pormeio de “cópia, ditado, descrição e composição”,métodos comprovadamente eficazes, porém pratica-mente extintos na atualidade. Já o segundo textoaponta algumas razões para a alegada dificuldade deexpressão do brasileiro: além da “tradição bacha-relesca” — que associa o rebuscamento lingüístico aostatus social — o escasso contato com a leitura(condição essencial para melhorar a linguagem oral eescrita) constituíria um forte obstáculo à clareza noprocesso de comunicação. Quanto ao terceiro frag-mento, embora reconhecendo as normas gramaticaiscomo indispensáveis ao ofício de escrever, o escritorLuís Fernando Veríssimo questiona a obediênciairrestrita a tais regras, privilegiando em vez disso aclareza.

Após considerar o conteúdo desses textos, evalendo-se de outras informações que julgasse perti-nentes, o candidato deveria expor o próprio ponto devista acerca do que seria essencial à comunicação.Caberia indicar, nesse caso, a importância tanto da lín-gua culta quanto da coloquial, ambas úteis quando

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adaptadas às circunstâncias. Um conteúdo importantea ser depreendido dos textos apresentados dizrespeito ao fato de o aprendizado da língua se dar, nãoatravés de teoria — a gramática —, mas sim através daprática da leitura e da redação.

Louve-se a iniciativa da Banca Examinadoraem propor questão das mais relevantes ao universoacadêmico do qual o candidato deseja fazer parte.

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1ª Parte – Questões de

Múltipla Escolha

INSTRUÇÃO: as questões de números 11 a 16 refe-rem-se ao texto seguinte.

THE FRAGILE CHARM OF CITIES

1. New Yorkers know as well as anyone that greatcities are works in progress, but disturbed by disas-ters provoked by avarice, ideology and politics. Now,New York has seen firsthand how acts of terrorism– a variation of such factors – can affect a great city.

2. But every great city rests, in part, on the brokenstones, walls, and foundations of its own past.These foundations are strong enough to recover, likethe inhabitants themselves. Leveled with theground, cities rise again, building on what camebefore.

3. As New Yorkers set about designing and buildingwhatever will stand in the place of the Twin Towers,they would do well to consult Anthony M. Tung’sPreserving the World’s Great Cities. He wrote it aftervisiting 22 cities, from Amsterdam to Vienna, fromCairo to Kyoto.

4. This wonderful book mixes well-told tales of urbandestruction and renewal, using preservation andplanning as the prism through which history isviewed.

5. For example, Tung examines Warsaw’s painstakingpostwar restoration of its 17th century Old Town,itself a reconstruction of an older neighborhooddestroyed by fire.

6. He also looks at how religious conflict has devastat-ed Jerusalem, and how Berlin recovered from WorldWar II and three decades of being split by the Wall.

7. In each chapter, Tung evaluates varying approachesto preservation, seeking solutions that might concil-iate the destruction and loss of historical treasureswith development.

8. The earliest attempts at preservation, he tells us,date from the seventh century B. C. in Mesopo-tamia. Anyone who dared to damage the appear-ance of the Royal Road of Nineveh was hanged fromthe roof of his own house.

9. By the fifth century A. D., punishments had eased:in Rome workmen found stripping marble fromimperial monuments had their hands cut off.Regardless of these draconian measures, Rome’sphysical deterioration was far from being halted.

10. Modern sanctions – some would say because theyare not so strict – were not able to prevent the

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attack on New York either. But New Yorkers willsurely rebuild – it does not matter how – what theylost last year.

(Adaptado de “The Fragile Charm of Cities” de David Rocks, in Business Week,

22 de outubro de 2001.)

As questões 11 a 16 referem-se ao texto cujo vocab-ulário se segue:• as well as = bem como• firsthand = em primeira mão• to rest on = situar-se em• broken stones = pedras despedaçadas• walls = muros• own = próprio• strong enough = suficientemente fortes• to recover = recuperar-se• like = como• inhabitants = habitantes• leveled with = nivelado com• ground = chão• to rise = erguer-se• again = novamente• to build = construir• to set about = começar a• whatever = o que quer que• to stand = ficar• in the place of = no lugar de• well-told = bem contados• tales = contos• renewal = renovação• planning = planejamento• through which = através do qual• to view = encarar• Warsaw = Varsóvia• painstaking = meticuloso• postwar = pós-guerra• neighborhood = vizinhança• to split = separar• Wall = Muro (de Berlim)• each chapter = cada capítulo• to evaluate = avaliar• varying approaches = diferentes abordagens• to seek = procurar• loss = perda• treasures = tesouros• development = desenvolvimento• the earliest attempts = as primeiras tentativas• to date = datar, remontar• B.C. (= Before Christ) = antes de Cristo• to dare = ousar• to damage = danificar, estragar• appearance = aparência• to hang = enforcar• roof = teto• A.D. (= Anno Domini) = depois de Cristo• punishments = penalidades• to ease = aliviar, abrandar

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• to strip = roubar• marble = mármore• to cut off = cortar• regardless of = independentemente de• measures = medidas• far from = longe de• to halt = parar• strict = severo, rígido• to prevent = impedir• (not) either = também não• surely = certamente• it does not matter how = não importa como• to lose = perder

cSegundo o texto, a cidade de Nova Iorquea) foi atingida por um desastre de causa totalmente

inédita.b) sofreu as conseqüências de um mal que teve ori-

gem na avidez dos políticos locais.c) conheceu um desastre que, na verdade, é uma outra

forma de males já conhecidos pelas grandes cida-des.

d) viu seu progresso prejudicado por um desastre quejamais ocorrera em outra grande cidade.

e) progride graças a uma combinação de avidez, ideo-logia e política.

aNos diferentes capítulos de seu livro, Anthony M. Tunga) avalia diversos procedimentos que buscam conciliar

a preservação do passado com o progresso.b) analisa a situação de diferentes cidades que foram

devastadas pelas mesmas causas e com as mes-mas conseqüências.

c) usa diferentes relatos de cidades devastadas paraexplicar a causa dessa devastação.

d) lista todos os tesouros históricos que as grandescidades do mundo já perderam devido ao progresso.

e) afirma que a divisão física foi a causa da devastaçãode cidades como Jerusalém e Berlim.

eA parte de Varsóvia conhecida como Cidade Velhaa) teve que ser reconstruída após um recente incêndio.b) foi destruída pelo fogo durante uma guerra.c) passou por total restauração após uma guerra no

século XVII.d) constitui exemplo de devastação dolorosa e irrecu-

perável.e) é a reconstrução de algo que já existia anterior-

mente.

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aAnthony M. Tung escreveu seu livroa) depois de visitar mais de 20 diferentes cidades do

mundo.b) enquanto visitava 22 cidades situadas na África e na

Ásia.c) enquanto viajava de Quioto para o Cairo.d) enquanto visitava Amsterdã e Viena.e) depois de visitar 22 vezes Quioto e o Cairo.

dNo parágrafo 2, a expressão “leveled with the ground”equivale aa) “slightly destroyed”.b) “totally rebuilt”.c) “thoroughly restored”. d) “completely destroyed”.e) “partially rebuilt”.

bNo parágrafo 9, a expressão “had eased” tem umcarátera) inquisitivo.b) irônico.c) argumentativo.d) especulativo.e) ambíguo.

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2ª Parte – Questões Discursivas

INSTRUÇÃO: Leia novamente o texto The FragileCharm of Cities, e responda em português àsquestões de números 25 a 28.

Segundo o texto,a) qual é a descrição que se aplica às grandes cidades?b) o que os nova-iorquinos vão construir no lugar das

Torres Gêmeas?

Resolução

a) As grandes cidades são obras que estão progre-dindo, mas perturbadas pelos desastres provocadospela avidez, pela ideologia e pela política.

b) Os nova-iorquinos vão construir no lugar das TorresGêmeas qualquer coisa que se sustente no lugardas torres.

Releia o parágrafo 4 e expliquea) como está organizado o livro Preserving the World’s

Great Cities.b) a referência feita à história.

Resolução

a) O livro mistura histórias bem contadas de destruiçãoe renovação urbanas, usando a preservação e oplanejamento como prisma através do qual a históriaé vista.

b) O autor examina a restauração de Varsóvia após aguerra; o conflito religioso que devastou Jerusaléme a recuperação de Berlim depois da guerra e daqueda do Muro.

Com relação aos esforços de preservação de monu-mentos,a) onde e quando eles tiveram início?b) qual era o castigo aplicado a quem desobedecia à lei

de preservação nesse local?

Resolução

a) Tiveram início no século VII a.C., na Mesopotâmia.b) Quem desobedecia à lei de preservação na Mesopo-

tâmia era enforcado no teto de sua própria casa.

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No parágrafo 10 do texto, o que se afirma com relaçãoa) ao ataque terrorista a Nova Iorque que destruiu as

Torres Gêmeas?b) aos nova-iorquinos?

Resolução

a) As sanções modernas – talvez por não serem tãorígidas – não foram capazes de impedir o ataque emNova York.

b) Os nova-iorquinos, certamente, reconstruirão o queperderam no ano passado, não importa como.

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