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FILM FESTIVAL

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10hCINEMA, MAR E MEMÓRIAVASCO BRANCOSol, suor e sal | 1958 | Vasco Branco | 10’O menino e o caranguejo | 1959 | Vasco Branco | 11’Eterno poema | 1959 | Vasco Branco | 7’O espelho da cidade | 1961 | Vasco Branco | 7’Gente trigueira | 1968 | Vasco Branco | 13’

10,50h Conferência "Vasco Branco e a memória marítima de Aveiro"Rita CapuchoCentro de Estudos Interdisciplinares do Século XXUniversidade de Coimbra

14,00hNOVAS VISTAS LUMIÈREPonto de fuga | 2017 | Isabel NevesComo o tempo passa… | 2017 | Sofia CruzTenacidade | 2017 | Clara MottaLimite | 2017 | Teresa Neves

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ficha técnica

Edição: Museu Marítimo de ÍlhavoTítulo: Mar Film FestivalCoordenação: Jorge SeabraDesign: Imperfetos

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mar film festival | 2017

Mar Film Festival. ApresentaçãoÁlvaro GarridoFaculdade de EconomiaUniversidade de CoimbraConsultor do Museu Marítimo de Ílhavo

Um festival, duas essênciasJorge SeabraCentro de Estudos Interdisciplinares do Século XXUniversidade de Coimbra Coordenação Mar Film Festival

Programa

O mar no cinema

Águas filmadas: lugar de morte ou espaço de liberdade?Abílio Hernandez CardosoUniversidade de Coimbra

Ama-SanCláudia VarejãoRealizadora

A mãe e o marGonçalo TochaRealizador

A um mar de distânciaPedro MaganoRealizador

Novas Vistas Lumière

Novas Vistas LumièreJorge SeabraCEIS20 | UCCoordenação Mar Film Festival

Obras a Concurso

Memórias de RiaMar

Pescando nas memórias de um dóriJorge SeabraCEIS20 | UCCoordenação Mar Film Festival

Agrupamento de Escolas da Gafanha da Encarnação, Nazaré e Ílhavo

Cinema, mar e memória

Cinema, mar e memóriaJorge SeabraCEIS20 | UCCoordenação Mar Film Festival

Vasco Branco e a memória marítima de AveiroRita CapuchoCentro de Estudos Interdisciplinares do Século XXUniversidade de Coimbra

Personalidades Convidadas

Agradecimentos

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MAR FILM FESTIVAL | APRESENTAÇÃO 1

Álvaro GarridoFaculdade de EconomiaUniversidade de Coimbra Consultor do Museu Marítimo de Ílhavo

Mar Film Festival é um projecto cultural de deliberada centralidade na programação comemorativa dos oitenta anos do Museu Marítimo de Ílhavo.

Embora se trate de uma primeira edição, a ideia deste Festival nasceu madura e audaz. Trazer ao museu uma ideia intensa e plural de abordagem do cinema como reportório memorial e identitário é um encontro afortunado. Sobretudo para este Museu, cuja biografia conta com inúmeras viagens à descoberta de um diálogo profícuo entre as artes e a maritimidade.

Importa lembrar que o Museu Marítimo de Ílhavo, nascido em 1937 como museu municipal de vocação etnográfica, surgiu num contexto de acesa disputa das elites locais, num tempo tão incerto quanto aquele que vivemos. A ideia de um “museu dos Ílhavos” manteve-se em agitada incubação de 1922 a 1937. Fez parte de um leque variado de melhoramentos materiais há muito sonhados e deu corpo ao espírito de ambição do eu colectivo local. Incitado pelo movimento regionalista que depressa se lançou nos braços da ditadura, o museu ilhavense nasceu de um manifesto antimoderno e cedo se acomodou num certo compromisso de reprodução das elites.

Do velho museu como “sala de espelhos” restam hoje, poucas memórias e uma outra expressão de nostalgia. Instituição relevante no mapa museológico nacional, não apenas porque era exemplo da desejada fusão entre localismos, regionalismo e o próprio imaginário nacional, mas também pela valia injuntiva das suas colecções, o actual Museu Marítimo tardou a soltar as amarras da velha etnografia e a fazer-se ao Mar-Oceano na intenção de descobrir novas topografias da maritimidade. Esse caminho foi iniciado nos anos noventa do século passado e ligou-se a um processo de maritimização do Museu que coincidiu com a activação patrimonial da lendária “faina maior” – a pesca do bacalhau no Atlântico Norte, uma saga local e nacional.

Mais recentemente, depois de 2003, o Museu Marítimo de Ílhavo centrou o seu projecto sociocultural na pluralização narrativa da vida marítima, em geral, e da grande pesca, em particular. Esse trabalho de democratização da memória social e de construção territorial de identidades traduziu-se em variados projectos expositivos e editoriais. As representações artísticas e memoriais dos colectivos marítimos e das pescarias passaram a ocupar um lugar de destaque no programa museológico. Da literatura às artes plásticas e visuais, do teatro ao cinema, muitas ideias têm chegado a bom porto num Museu feito de redes e parcerias, de desafios de embarque em projectos de comunidade e outros. A fotografia tem sido, de longe, a arte mais invocada como discurso da memória. Já o cinema tem tido uma presença mais intermitente num programa museológico centrado na metáfora da conservação memorial, inconsistência que Mar Film Festival ajudará a reparar.

As culturas marítimas são fortemente visuais. Compõem-se de imagens, de narrativas e imaginários. Esses discursos tendem para um registo essencialista que, na verdade, contrasta com a diversidade e contingência da vida marítima. Daí que seja importante abrir estes universos mitificados e compostos por diversas escalas e múltiplas subjectividades ao discurso e estética do cinema.

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Mar Film Festival é uma iniciativa intensa e mobilizadora, cuja concepção inclui uma forte dimensão educativa. Proposto e coordenado pelo historiador Jorge Seabra, este festival integra-se plenamente nos eixos de projecto do Museu Marítimo de Ílhavo e dirige apelos de participação às comunidades criativas cinéfilas, a escolas dos municípios de Ílhavo e Aveiro e ao público interessado em geral. O programa é inclusivo e não negligencia os trabalhos da memória.

Historiadores e críticos de cinema, realizadores e produtores, profissionais e amadores interessados em promover uma relação mais íntima entre o cinema e o mar serão protagonistas de Mar Film Festival.

O concurso Novas Vistas Lumière é chave num conceito de festival que vai muito além da exibição de filmes e do seu debate para deleite estético dos participantes. É uma ideia virtuosa que acontece num Museu que se pretende celebrar através da renovação incessante da sua relação com o território e com as comunidades marítimas portuguesas. É uma ideia fecunda porque acrescenta uma dimensão cultural e artística ao actual discurso de reenlace de Portugal com o mar, um apelo eminentemente tecnocrático e confinado às questões económicas.

De forma a alimentar a utopia construtiva das identidades e de uma cultura marítima plural, em boa hora o Museu Marítimo de Ílhavo acolheu este projecto. Ficamos gratos ao coordenador, às instituições que aceitaram levar por diante esta ideia e a todos os participantes no programa e no concurso. Ontem como hoje, o cinema é talvez a melhor forma de compor etnografias contemporâneas. Porque o cinema é do tempo e o tempo ainda é o do cinema.

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um festival, duas essências

Jorge SeabraCentro de Estudos Interdisciplinares do Século XXUniversidade de Coimbra Coordenação Mar Film Festival

Mar e Cinema são realidades pertencentes a esferas diferentes. O mar integra o domínio da água, considerado um dos elementos da natureza, como a terra, o ar e o fogo, e em torno dos quais alguns filósofos gregos construíram a teoria relativa à origem da matéria. O cinema é uma forma de expressão artística, e constitui-se simultaneamente como um dos segmentos mais poderosos das indústrias de lazer das sociedades contemporâneas. Porém, apesar das suas categorias distintas, mar e cinema comungam duas essências que justificam o desafio em organizar um festival de cinema sobre o tema.

A primeira afinidade está no movimento. Real num caso e aparente no outro, a capacidade de mover ou de gerar esse efeito é uma propriedade comum entre mar e cinema.

No caso do mar, mesmo que os nossos sentidos por vezes nos procurem convencer do contrário, ou por mais calmas e imóveis que as águas oceânicas se apresentem, estas estão sempre em movimento, mesmo que impercetível ao olhar. No cinema, a capacidade em simular a reprodução do movimento será para sempre a sua qualidade predominante e distintiva relativamente às outras expressões artísticas. Este malabarismo cronofotográfico desenvolvido em finais do século XIX, começou por ser um processo de decomposição do movimento em fotografias, ao serviço do estudo do voo das aves ou da deslocação dos planetas para, a partir do momento em que se desenvolveram as máquinas que reproduziam pela projeção, a ação anteriormente fragmentada fotograficamente, surgir uma realidade que Edison e os Lumière se encarregaram, embora de forma pouco convicta, de tornar uma das marcas irreversíveis da contemporaneidade. Portanto, a essência radicalmente diferenciadora do cinema relativamente às outras artes de finais do século XIX, era essa capacidade em desenvolver um procedimento que produzia a ilusão de que estávamos perante um movimento real quando, na verdade, observávamos apenas a justaposição de fotogramas a uma determinada cadência.

A segunda essência comum entre mar e cinema está na capacidade em produzir emoções. A contemplação de um oceano é sempre uma experiência que não deixa ninguém indiferente, sendo uma realidade com um poder gerador de sentimentos, que vão da melancolia à felicidade, prazer, medo ou força.

Relativamente ao cinema, a manipulação das emoções é também uma caraterística específica do ato cinéfilo. Qualquer espetador sabe e aceita que, quando se dispõe a sentar-se perante uma tela cinematográfica, ver um filme é igual a deixar-se conduzir pelos sentimentos que a narrativa lhe vai proporcionando. Apesar de hoje estarmos mais treinados e eventualmente menos condicionados por esse fator, o riso, o medo, o espanto, a dor, a identificação, continuam a ser, tal como nas primeiras exibições públicas dos Lumière, comportamentos expectáveis e indispensáveis para que se frua devidamente o rol de imagens que vai passando perante os nossos olhos.

Portanto, apesar dos distintos domínios a que mar e cinema pertencem, movimento e emoção são elementos que os aproximam, captados pelo olhar e pela audição, como se estes sentidos fossem o cais a partir do qual apreendemos aquelas afinidades referenciais e identificadoras, sempre que nos dispomos à contemplação que o espetáculo oceânico ou cinematográfico oferecem.

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Foram estes fatores de aproximação que estimularam o aparecimento de Mar Film

Festival. O mar é um referencial temático e narrativo demasiado poderoso para não ser explorado num festival de cinema. Numa só palavra reúnem-se todos os oceanos, espécies marinhas, culturas, imaginários e identidades que ao longo do tempo interagiram com um mundo que, de forma esmagadora, domina o planeta que habitamos, e que tem vindo a estimular progressivamente a criação fílmica em diversos países e culturas.

Para além disso, não existe nenhum festival de temática marítima em Portugal, apesar da função histórica, cultural e económica que a realidade oceânica tem para o contexto português. Inclusivamente, a nível internacional, as propostas existentes são setoriais, abordando o ambiente ou o terror, por isso, algo redutoras para a amplidão temática que o conceito mar proporciona.

Assim, o desenho do festival foi ganhando forma, ficando a ideia materializada em quatro secções.

1.O mar no cinema, sem restrições geográficas ou de outra ordem, destina-se a exibir obras onde o espaço oceânico surge como elemento nuclear à compreensão e desenvolvimento das narrativas;

2.Novas Vistas Lumière é uma competição que desafia os jovens a regressarem a uma das essências do cinema, à imagem em movimento, despida de toda a tecnologia que os dispositivosmodernos permitem, apresentando a concurso exercícios narrativos semelhantes aos filmes que os Lumière fizeram nos inícios do cinema, sobre o Mar e a Ria de Aveiro, constituídos por um só plano, sem som e movimentos de câmara;

3. Memórias de RiaMar é também um espaço onde os jovens se confrontam, dialogam e apresentam trabalhos em vídeo sobre o papel identitário que o mar desempenha na região;

4. Finalmente, em Cinema, mar e memória, o foco incide sobre os realizadores que têm utilizado o espaço marítimo da região de Aveiro como elemento criativo, cabendo a abertura da secção à evocação de Vasco Branco.

O desenho seccional proposto é seguramente limitado para o potencial que o mar como festival de cinema contém, mas será proventura o mais adequado a uma primeira edição, procurando uma implantação fundamentalmente local e regional, nomeadamente nos setores mais jovens. Outras e mais amplas possibilidades poderão seguir-se, nomeadamente, competições de âmbito internacional, procura que, casuisticamente ou não, já se verificou durante a organização desta edição, apesar de a competição Novas Vistas Lumière ter preferencialmente uma vocação geográfica nacional.

Refira-se ainda que Mar Film Festival não é um festival estritamente cinematográfico. Por um lado, propõe o vetor da criação, da exibição e do concurso, e por outro, integra também a vertente da investigação sobre a imagem em movimento, convocando pesquisadores e professores que têm o cinema como objeto, sentando-os à mesma mesa com criadores, para dialogarem sobre o objeto fílmico a partir de diferentes perspetivas.

Ainda a propósito de mar, sabemos hoje que os oceanos tiveram uma função germinal na memória biológica da espécie humana, porque a génese que desencadeou a evolução da qual a humanidade resultou, começou em ambiente marinho. Reduzido à sua dimensão, Mar Film Festival é uma proposta com argumentos próprios, derivados das já referidas essências que o par mar —

cinema comungam. Dessa sintonia poderá nascer uma maré poderosa e única no conjunto dos festivais de cinema, singularidade que honraria também o caráter mátrio que o mar tem para a nossa espécie.

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21h Performance musicalEscola de Música Serenata

21,15H Abertura do festivalSessão de acolhimento

21,45hNOVAS VISTAS LUMIÈREArgus. O passado do presente | 2017 | João SantosRefugiados | 2017 | Pedro Marques - André Cruz Águas vivas | 2017 | Miguel Lobo

O MAR NO CINEMAA quietude da água | 2014 | Naomi Kawase 118’

Degustação de saborestradicionais da região

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2017

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CINEMA, MAR E MEMÓRIAVASCO BRANCO

Sol, suor e sal | 1958 | Vasco Branco | 10’O menino e o caranguejo | 1959 | Vasco Branco | 11’

Eterno poema | 1959 | Vasco Branco | 7’O espelho da cidade | 1961 | Vasco Branco | 7’

Gente trigueira | 1968 | Vasco Branco | 13’

10,50h Conferência

"Vasco Branco e a memória marítima de Aveiro"Rita Capucho

Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XXUniversidade de Coimbra

14,00h

NOVAS VISTAS LUMIÈREPonto de fuga | 2017 | Isabel Neves

Como o tempo passa… | 2017 | Sofia CruzTenacidade | 2017 | Clara Motta

Limite | 2017 | Teresa Neves

MEMÓRIAS DE RIAMARAgrupamento de Escolas de Ilhavo

Agrupamento de Escolas da Gafanha da EncarnaçãoAgrupamento de Escolas de Ilhavo

Agrupamento de Escolas da Gafanha da NazaréAgrupamento de Escolas de Ílhavo

15,30hPausa

15,45hMemórias de RiaMarConversa com as escolas

16,15hNOVAS VISTAS LUMIÈREHope to survive | 2017 | Simão CastroEsperança | 2017 | Tatiana PereiraOnda e anda | 2017 | Fábio LucindoÁguas paradas, areias movediças | 2017 | Francisco Lé – Rui Gonçalves

O MAR NO CINEMAWatermark | 2014 | Jenifer Baichwal - Edward Burtynsky | 92’Comentário Teresa Fidélis Universidade de Aveiro

18,35h NOVAS VISTAS LUMIÈREVida | 2017 | Leandro MonteiroPrecalços | 2017 | Maria AntóniaReflexão | 2017 | Orlando QuaresmaMar | 2017 | Fábio LucindoO momento que separa a água doce da salgada | 2017 | Ricardo Almeida

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O MAR NO CINEMAA mãe e o mar | 2014 | Gonçalo Tocha | 97’Conversa com Gonçalo Tocha

21,15h Performance musicalEscola Artística do Conservatório de Música Calouste Gulbenkian, Aveiro, Quarteto de saxofones

11h NOVAS VISTAS LUMIÈRE

Limpeza | 2017 | Luís AfonsoAdeus | 2017 | Sofia Palhina

Horizonte | 2017 | Teresa NevesÁgua a dá, agua a leva | 2017 |

Francisco Lé – Rui Gonçalves

O MAR NO CINEMABalaou | 2007 | Gonçalo Tocha | 77’

Conversa com Gonçalo Tocha

14hNOVAS VISTAS LUMIÈRE

Exibição de todas as obras a concurso

Performance musicalEscola Artística do Conservatório de Música Calouste

Gulbenkian, Aveiro, Combo de Jazz

17hDiplomas de participação

Mémórias de RiaMarPrémios Novas Vistas Lumière

Visionamento das obras premiadas

21h Performance musicalEscola Artística do Conservatório de Música Calouste Gulbenkian, Aveiro, Combo de Jazz

21,15h Conferênciade encerramento“Águas filmadas: lugar de morte ou espaço de liberdade?” Abílio Hernandez Cardoso | Universidade de Coimbra

22h O MAR NO CINEMAA um mar de distância | 2016 | Pedro Magano | 52’ Conversa com Abílio Hernandez Cardoso e Pedro Magano

Encerramento do festival

21,30h NOVAS VISTAS LUMIÈREConforto na angústia | 2017 | Eduardo JardimAtracado na tumba do esquecimento | 2017 | Tomás FerreiraAmarração. Após l’arrivé d’un train en gare de La Ciotat | 2017 | Filipa Rodrigues – João CoutinhoContraste | 2017 | Beatriz MeloAinda te esperamos | 2017 | Rafael Silva

O MAR NO CINEMAAma-san | 2016 | Cláudia Varejão | 112’Conversa com Cláudia Varejão (a confirmar)

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Não concebo o cinema sem água, disse Renoir (Renoir, 1979), para quem os rios e as suas margens foram instrumento de diálogo com a pintura impressionista e lugares de sedução, erotismo e prazer, mesmo que fugaz ou interdito. Um tema como o deste festival, tão vasto quanto o próprio mar, obriga a que me limite a um rasar de águas. Deixo por isso de lado quase todos os mares, rios e cursos de água com que o cinema tem banhado o meu olhar.

Deixo de lado, por exemplo, o lago do Aurora, de Murnau, a fronteira líquida que separa a beatitude idílica do campo e o prazer transgressor da cidade, em cujas margens se incendeia o desejo e mal se contém a loucura assassina, mas onde, no final, se resgata um amor renascido.

Deixo de lado o rio de Douro, Faina Fluvial, de Oliveira, sinfonia urbana que, num ritmo à beira da vertigem, celebra a gente pobre, que nas suas margens se esgota numa faina dura e mal paga, que quase não dá para sobreviver.

Deixo de parte a água da chuva que cai sobre as ruas desertas da cidade noir, impotente para varrer a corrupção e purificar o espaço urbano, símbolo não já do sonho americano mas do pesadelo que se abate sobre a América nos anos sombrios da Depressão, da Segunda Guerra Mundial e do macartismo. Mas recordo a água revolta que Bogart e Hepburn enfrentam, numa velha barcaça, em The African Queen, de John Huston, realizado em plena treva macartista. A água é aqui o território do perigo (os rápidos, os animais selvagens que a habitam, o navio de guerra alemão), mas também o lugar da aventura, da libertação dos constrangimentos sociais, do sentir-se pessoa e com isso sentir o corpo. Quando há perigo de morte, a água transforma-se em lodo e lama e a barcaça fica presa no pântano. Tudo parece perdido até sermos surpreendidos pelo plano belíssimo em que a câmara se eleva sobre o barco e sobre os corpos extenuados de Bogart e Hepburn e revela – a mim, espectador, antes que às personagens – o lago amplo que se abre de novo para a aventura, para a vida e para o improvável gesto heróico de um par de heróis igualmente improvável.

E deixo de lado o mar de O Sétimo Selo, de Bergman, sobrevoado ao romper do dia pelo voo silencioso de uma águia apocalítica saída de uma porta aberta no céu. Tudo já se anuncia: o cordeiro abriu o sétimo selo e fez-se no céu um silêncio de aproximadamente meia hora. O cavaleiro Antonios Block regressa das cruzadas e busca um Deus que lhe fale diretamente, sem intermediário. Na ausência de Deus surge a Morte, que Block desafia para um jogo de xadrez. Três lances bastam para o inevitável cheque mate. No final, quando o filme regressa ao mar, tudo está consumado, perante um Deus que permanece em silêncio e uma Morte que confessa nada saber. É deste silêncio – que o mar testemunha – e só dele, que Bergman nos fala com deslumbrante eloquência: do inelutável, definitivo e irreversível silêncio.

Deixo quase de lado o mar de Os 400 Golpes, de Truffaut, que num dos mais belos planos do cinema varre o ecrã de lado a lado, por detrás do rosto adolescente de Antoine Doinel, no final de uma longa corrida em direção à liberdade e a esse mar, que o rapazinho nunca conhecera, mas a que agora vira as costas. O derradeiro plano congela no olhar que Antoine fixa em nós. Como compreender este olhar? E aquele mar? Como símbolo da liberdade conquistada? Porquê, então, virar-lhe as costas? O mar como sinal de que a fuga terminara e nada mais resta a Antoine senão a

Águas filmadas: lugar de morte ou espaço de liberdade?

Abílio Hernandez CardosoUniversidade de Coimbra

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possibilidade de regressar ao mundo que o rejeitara e ele abandonara? No final, nada mais que esse olhar: para a câmara, para nós, para o mundo. Desafio? Cansaço? Desilusão? Apelo a um mundo que apenas devolve o olhar a uma criança e a abandona de novo, definitivamente sozinha, perante a barreira intransponível daquele mar?

Detenho-me agora mais no mar que um navio negro sulca em silêncio, transportando Nosferatu e com ele a peste e a morte, mas também a paixão e o desejo. É o mar que separa a jovem Ellen de Hutter, seu noivo, e a aproxima de Nosferatu, que ela espera na praia, com a inquietude de quem aguarda o desconhecido a quem, no silêncio absoluto da noite, se entregará com paixão. Do encontro de Ellen com a figura medonha de Nosferatu só pode resultar a morte ou o reconhecimento. Quem encontra Outrém apenas pode dirigir-se a ele pela

violência mortal ou pelo dom da palavra em seu acolhimento (Blanchot, 1968). O encontro de Ellen com o vampiro transforma ambos. Como a amada do Cântico dos Cânticos ao dirigir-se às mulheres de Jerusalém, também ela poderia dizer não estranheis eu ser

morena: foi o sol que me queimou. No final, é o corpo disforme de Nosferatu que o sol queimará sem remissão.

Só estranhará esta associação do filme de Murnau com o mais belo poema de amor quem nunca tenha visto o plano inesquecível em que a sombra da mão em garra de Nosferatu desce sobre o peito latejante de Ellen e nele permanece até ao fim da noite, até que o vampiro perca a noção do tempo e por amor se perca como o mais comum dos mortais. Grava-me como selo em teu

coração, diz a amada do poema bíblico, porque forte como a morte é o amor. Nem as

águas caudalosas conseguirão apagar o fogo do amor, nem as torrentes o

podem submergir. Ao primeiro raio de sol, a mesma mão em garra, que gravara esse selo no peito de Ellen, grava-o agora no seu próprio peito e esfuma-se no ar. Nosferatu dá a si mesmo a morte, morrendo de amor. Por isso não morre como um vampiro – estes são mortos com uma estaca no coração – mas como um homem que leva a mão ao coração e aceita a ferida fatal.

Como em O Cântico dos Cânticos, o amor é tão forte como a morte, mas não mais forte. O amor não a vence, porque isso seria conferir a uma perda um sentido que a tornasse

suportável (Levinas, 1993). E a morte não vence o amor. A morte de Nosferatu traz a destruição definitiva do seu corpo mas não é aniquilação absoluta, não é um puro nada, porque algo sobrevive: a afirmação do humano na morte de Nosferatu. As águas sulcadas pelo veleiro não transportavam apenas a peste e a morte, transportavam também a possibilidade do reconhecimento e da aceitação do Outro absoluto, exposto na medonha deformidade do corpo de Nosferatu.

On peut vider l’image cinématographique de toute realité, sauf d’une:

celle de l’espace, escreveu Bazin, sublinhando que o espaço não é mais uma categoria narrativa, mas a única sem a qual o cinema não poderia ganhar forma. E, na verdade, sem o gesto de dar a ver não existe cinema. É a partir dele que o cinema nos solicita um envolvimento simultaneamente racional e afetivo, que cada um de nós concretiza mergulhando numa forma de passeio imaginário pelos lugares que o cinema constrói. Ao mesmo tempo, porém, que dá a ver, instituindo um campo (visível), o cinema gera um fora-de-campo (invisível), e é na articulação entre ambos, entre aquilo que mostra e aquilo que oculta, que o espaço fílmico se constrói. Tudo se joga nesta fronteira móvel que se prolonga para lá dos limites do ecrã, para um espaço de não visibilidade que, apesar da sua condição, permanece inscrito na nossa memória por vezes de modo tão ou mais profundo que o visível.

Bresson ensinou-me isso num dos seus filmes mais belos, Amor e morte. Mouchette, a protagonista, é uma adolescente que nunca conheceu carinho, amizade ou amor, apenas indiferença, abuso ou caridade hipócrita. Filha de pai alcoólico e mãe em fase terminal de doença, é

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agredida por professores e humilhada por usar uns tamancos desajeitados. O pouco dinheiro que ganha na taberna da aldeia fica para o pai. Mouchette não abdica dos tamancos, não se penteia, atira lama às companheiras de escola; a caminho da igreja, onde vai contrariada, salta para cima de uma poça de água e suja a roupa de ir à missa; com os sapatos cheios de lama pisa, propositadamente, o tapete de uma vizinha que lhe oferece roupa. Numa noite de tempestade, fica com Arsène, um caçador furtivo, que a viola. Regressa a casa e não conta o que sucedera, apesar de interrogada por um couteiro, interrompida pelas instruções da mãe agonizante e, finalmente, confrontada com a morte desta.

Quando a manhã chega, sai de casa e dirige-se ao rio. Leva nas mãos um tecido de tule branco, misto de vestido de noiva e de mortalha, frágil e transparente como ela. Envolve-se nele. Deixa-se rolar pelo declive da margem, uma vez e outra e outra, até se deixar cair no rio, num gesto puro, radical, inegociável, afirmando a sua irredutível identidade através da única experiência que ninguém pode nem sofrer nem enfrentar no meu lugar (…), que ninguém me

pode dar nem tomar nem retirar, porque ela é o lugar da minha singularidade, é da minha morte e da de mais ninguém que recebo a minha singular e plena identidade (Derrida, 2013).

Naquele momento, o rio já não é somente um rio, é um abismo, é a derradeira estação do calvário de Mouchette, o seu único refúgio de um mundo mesquinho. Naquele plano sublime que mostra a água do rio mas não o corpo que nela mergulhou, desprende-se uma transcendência que opõe o gesto de Mouchette à vulgaridade de uma sociedade marcada pela hipocrisia, pela humilhação do desajeitado, pela felicidade construída sobre a infelicidade dos outros, pela não aceitação do Outro. Recordo como um dos momentos inesquecíveis da minha memória de espectador o momento em que corpo de Mouchette, envolta no tule, mergulha nas águas do rio. E, no entanto, nunca vi o corpo de Mouchette mergulhar no rio. Bresson não mostra o instante em que o corpo entra na água. Mostra apenas o antes e o depois. Mas o momento que nunca vi permanecerá na minha memória, não como simples resíduo da imaginação, mas como consequência de um gesto admirável que o realizador propôs ao meu olhar de espectador. Bresson deu-me a ver o que ocultou, como se eu tivesse que fechar os olhos para ter acesso ao invisível.

Termino com um filme português: Glória, de Manuela Viegas, um filme intensamente banhado pela água, que enche a tela mesmo quando não se vê. É um filme que opõe o seu pudor formal ao olhar invasivo do espectador. Da história de Glória e de Ivan, dois adolescentes como Mouchette, ficam os restos, os afetos procurados ou negados, a violência inerente ao ato de crescer, o desejo, a perda, a solidão. A mise-en-scène austera e elítica faz de Glória uma obra que se cinge ao lado mais secreto das coisas, erradicando tudo o que está para além dessa fronteira interior. O seu despojamento conduz a momentos de uma beleza singular, como no plano em que Ivan desliza do seu esconderijo para o leito do rio, enquanto o nosso olhar, desarmado e ansioso, procura o corpo, que não voltaremos a ver, de Glória.

À semelhança de Mouchette, Glória vive como um corpo vazio, desenhado por gestos e imagens que o fixam, como se não existisse correspondência entre fora e dentro, entre a pele e a emoção. No plano em que Ivan desliza para o rio, a ausência de Glória sugere a sua morte. E, no entanto, não sabemos se o corpo de Glória, vivo ou morto, se encontra ao lado do de Ivan, entre a vegetação que cobre a superfície das águas. Não sabemos se a voz que entoa baixinho uma canção, enquanto um grupo de homens procura as crianças por entre as árvores, tem que ver com o que se passa no esconderijo. Não sabemos se há, de facto, uma criança que canta baixinho, se esse canto ocupa o pensamento de Ivan ou se ocorre simplesmente dentro da nossa própria imaginação.

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E não temos forma de saber, tal como, no final de Mouchette, não sabemos se as imagens do trator que passa na estrada correspondem a um evento real ou são imaginadas por Mouchette, antes de rolar pela margem do rio e mergulhar nas águas. Na cena da busca das crianças e no plano de Ivan no esconderijo, limitamo-nos a estabelecer a conexão entre a voz que canta baixinho e a ausência de Glória, sem podermos explicar em que consiste essa conexão. Ficam gestos a que se sucedem outros gestos, imagens a que se sucedem outras imagens. Um corpo presente, o de Ivan, um corpo ausente, o de Glória. E água, sempre a água, que os envolve e acolhe. Nada mais. Sabemos que Glória, que nasce das águas e nelas desaparece, não conhece afeto nem liberdade a não ser no esconderijo que partilha com Ivan. Mas, como em Mouchette, não há qualquer indício das causas dessa ausência de afeto. Tudo se concentra numa literalidade do corpo e na revelação, a partir do corpo e só dele, de um despertar para a vida e para o desejo, num mundo de terra em que ela é estranha, porque a sua casa natural é o mundo aquático, o único lugar onde consegue sentir-se livre e feliz. A água é mãe, origem da vida, mas também de morte, criadora e destruidora, fonte de promessas e de abismos. Imergir nas águas para delas regressar sem nelas se dissolver, como é o caso de Ivan, pode significar um regresso às fontes (é a mãe que o recolhe do barco-cápsula), à possibilidade de uma nova vida. Glória, porém, não regressa das águas.

O som da água, as vozes e os sons que se ouvem (de Glória, de homens e mulheres, da chuva) não estabelecem relações evidentes com o que a imagem mostra, e adquirem por isso um poder tão forte quanto o da imagem que vai buscar a sua respiração a esses sons, fazendo deles uma voz fora do campo visual que, à semelhança dos silêncios que a interrompem, dá a ver, como em Mouchette, o que o filme não mostra, abrindo uma relação de disjunção e conjunção entre ver e deixar de ver. É essa voz que transporta em si a imagem e que, por não ser atribuível a alguém, se torna a voz de todas as vozes, mesmo a da água, a voz que permite ver quando parece não haver nada para ver, que nos guia na descoberta das paisagens desertas, dos esconderijos, dos espaços apertados das casas, da vegetação rasteira, da água, da atmosfera crepuscular, da luz que só se liberta depois de Ivan ser resgatado do seu barco-cápsula e de Glória ter abandonado o filme, tornando-se uma não-imagem. É essa voz que nos diz que, afinal, as imagens que vemos nos falam, em toda a sua fragilidade, da história que não contam.

referências bibliográficas:Bazin, André (1951). Qu’est-ce que le cinéma? Paris, Cerf.

Blanchot, Maurice (1969). L´entretien infini. Paris, Gallimard.

Derrida, Jacques (2013). Dar a morte. Tradução de Fernanda Bernardo. Coimbra, Palimage.

Levinas, Emmanuel (1993). Dieu, la Mort et le Temps. Paris, Éditions Grasset & Fasquelle.

Renoir, Jean (1979). Entretiens et propos. Éditions de l’Étoile/ Cahiers du cinema, nº hors série.

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Ama-San

Cláudia VarejãoRealizadora

Se a Europa e a Ásia estiveram no passado em comunicação activa, compreende-se melhor que o Japão, ponto extremo da Ásia a leste, e Portugal, ponto extremo da Europa a oeste, possam ilustrar estados simétricos de uma série de transformações. O Japão surge antes de mais como um lugar de encontros e de misturas mas a sua posição geográfica na extremidade oriental do Velho Continente e o seu isolamento intermitente, permitiram-lhe também funcionar como um filtro subtil que retém as substâncias transportadas pelas correntes da história que aí vieram a combinar-se. É essa alternância de empréstimos e de sínteses que sempre definiu o seu lugar e papel no mundo. E talvez por isso, a cultura japonesa possui assim uma aptidão para oscilar entre posições extremas. No Japão, as dimensões do mito e da história não são entendidas como verdades separadas. Ao reconhecer uma essência espiritual a todos os seres do universo, ela une o natural e o sobrenatural, o mundo dos homens e o dos animais e das plantas, e mesmo a matéria e a vida.

Mas a ideia triunfalista da história marítima ocidental não representa por si só a singularidade da relação do homem com o mar ao longo dos tempos. Por exemplo, os aborígenes cedo cobriram o mar de um vigor espiritual; os monges peregrinos irlandeses, ainda que por submissão à vontade de Deus, bravamente exploraram o Atlântico Norte; os habitantes de Laut Bajau no Sudeste Asiático ainda hoje vivem sobre as águas e comem duas centenas de variedades de peixe e quarenta variedades de marisco; ou Melville, Jonathan Raban, Turner, Hokusai e tantos outros, foram capazes de lidar francamente com a imensidão do mar, sem terem uma visão mercenária ou territorial das suas profundezas e distâncias ilimitadas. E embora a história natural dos mares seja uma epifania cativante a todos os que a procuram conhecer, é a história do marinheiro explorador que espelha o mistério da vida marítima. As Ama-San não são mais do que viajantes do mar que com bravura, ao longo de séculos, mergulham no desconhecido.Os oceanos cobrem mais de 70% da superfície da Terra e são responsáveis por 95% da biosfera. Concreta e poeticamente a Terra vista do espaço tem a forma de um Planeta Azul. E embora o mar tenha capturado a imaginação dos exploradores, hoje em dia a grande maioria da população do mundo convive com a sua presença mas sem o seu conhecimento. As nossas economias locais e globais, meios de vida e bem-estar estão diretamente relacionados com o que o oceano nos oferece. Sem o mar, a vida como a conhecemos não seria possível. O movimento das marés e a sua força, as tempestades, a experiência de velejar e até mesmo os resíduos que dão à costa, podem ser tidos como contrapontos do desenvolvimento de uma relação tempestuosa em terra. A relação do homem com o mar é tão ancestral quanto a sua própria existência, uma relação interdependente de vitalidade como Baudelaire escreveu: Homme libre, toujours tu chériras la mer!�La

mer est ton miroir, tu contemples ton âme. No Ocidente, os estilos de vida e os modos de produção sucedem-se e a mim sempre me

pareceu que no Japão, coexistem. No Japão, um artesão trata com o mesmo cuidado o interior e o exterior, a frente e o verso, as partes visíveis e as invisíveis. Na cozinha, deixam predominantemente os produtos no seu estado mais puro e excluem as misturas de substâncias ou de sabores. Na música o mesmo sucede, não existe sistema harmónico, recusam-se por isso a misturar os sons. Esta procura constante de uma humanidade disponível, em que cada indivíduo, independentemente do seu grau e da sua condição, vê-se a si mesmo como um centro de dignidade,

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de sentido e de iniciativa. Esta singularidade de aproximação à vida encontra-se na ancestralidade do modo de vida das Ama-San. É sobre este gesto instintivo de mergulho pela sobrevivência e a candura humana que daí emerge, que se centra o meu olhar para este projecto.

A história das Ama teve início há cerca de um milénio e distingue-as como peregrinas da condição feminina. Enquanto os homens se dedicavam à caça ou à pesca em alto mar, geralmente por longos períodos de tempo, as mulheres para sustentar a família tiveram de encontrar um modo de subsistir. Durante o inverno dedicavam-se ao trabalho no campo e com a chegada do bom tempo e graças à proximidade da costa, reuníam-se em grupo, na praia, para apanhar marisco. O que colectavam no mar traduzia-se em negócio em terra. E sobretudo as pérolas dos haliotis que vendiam, associou-as a um símbolo de poder, beleza e espiritualidade. O mergulho das Ama-San tornou-as independentes e em muitas famílias, a mulher chegou a tornar-se no único elemento trabalhador. Este fenómeno, num país patriarcal e conservador como o Japão, jamais se voltou a repetir.As Ama, inexplicavelmente e sem conflitos ou feridas expostas, trilharam um percurso único e libertador em toda a história das mulheres no mundo. E este acto, arrisco dizer, heróico, tornou-se possível graças a um trabalho comunitário de séculos mas que apresenta-se agora em vias de extinção. A fragilidade do momento actual para estas mulheres - já muito poucas - e a imensa riqueza da tradição que as acompanha, revelou-se desde logo para mim num olhar urgente: fotografá-las e filmá-las no seu contexto e gesto diário; com elas deslizar entre as rochas e num mergulho redescobrir a singularidade das suas vidas; trabalhar para que pelo menos na nossa memória colectiva as Ama-San permaneçam activas, a cuidar do oceano que nos une. Quando

uma mulher põe as suas mãos mar adentro, fá-lo não no intuito de perturbar

mas sim para restaurar o equilíbrio. Um equilíbrio que se perdeu, que foi

esquecido (depoimento de uma Ama-San da vila de Wagu, no Japão).Não é só a fechada sociedade japonesa que vai mudando mas também o mar, que sendo o seu

território, corre perigo. As quantidades pescadas pelas Ama-San são cada vez menores. Este tipo de pesca sustentável e de acordo com os ritmos da natureza sofre com as abruptas mudanças dos ecossistemas causados pelas alterações climáticas e pela voragem do homem e da sua pesca sistemática e industrial. As Ama correm o risco de se transformar apenas na memória de tempos idos e a sua força diluída num imaginário deturpado de mulheres em biquini a mergulhar.

Um filme ou uma fotografia, propõe a construção de uma unidade a partir de um pensamento ou de um olhar. Aproximam-se as coisas que nunca foram aproximadas e que não pareciam predispostas a sê-lo. Cruzam-se tempos históricos, diferentes geografias, personagens, sentimentos, um mundo improvável de combinações. É investigação de um olhar, experiências postas à prova e, por isso mesmo, uma proposta pessoal que se deseja partilhável. No meu trabalho, não procuro narrativas que tendem a concluir uma tensão ou dar resposta a um problema. Mas desejo que cada imagem se espelhe nas imensas memórias de cada um e que nesse encontro, por certo íntimo, se construa um espaço que nos seja comum. Individualmente forjamos um elo com todo o mundo e até com toda a história humana. E num momento de constante risco de fractura em que a razão obscurece a fé e os males clamam aos céus, resta-nos cumprir cada impulso na esperança que o mundo se encontre na poesia, essa lucidez extrema e apaziguadora, que nos ilumina o real.

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Quando o Dario Oliveira (produtor do programa Estaleiro das Curtas Metragens Vila do Conde, programa de filmes sobre temas locais) me telefonou e convidou para o projeto Estaleiro, perguntei se já tinham pensado num sítio específico. Ele disse que tinha pensado em Vila Chã, uma comunidade piscatória muito emblemática no passado, a 8km a sul de Vila do Conde. O lugar era bem pensado e interessava-me, mas isso não bastava...

Nessa altura, o Salgueiro, uma pessoa de Vila Chã, entregou-me um livro: “Mulheres da Praia” da Sally Cole. Esse livro contava, bem pormenorizadamente, a história das mulheres do Lugar da Praia de Vila Chã. O livro é centrado em todas as actividades produtivas da tão falada comunidade piscatória feminina de Vila Chã (pesca de costa, apanha do sargaço, venda de peixe) comunidade essa que terá existido durante quase 100 anos mas sobre a qual existem muito poucos registos. Depois voltei em Junho e Agosto e foi nessa altura que conheci a Glória, a tal única mulher que ainda vai ao mar. Aí percebi que, ainda, haveria uma presença deste acontecimento e que talvez ainda existisse uma possibilidade de filme.

Trata-se de uma comunidade que desapareceu, que já não existe. E a Glória era, na verdade, a única possibilidade de haver um ponto de ligação. Ela e o mar desta costa rochosa, que seria o elo de ligação.

De início, ainda não pensava que o filme seria só sobre as mulheres do mar, mas também sobre o mar em si mesmo. Não gosto muito de fazer filmes fechados num só assunto ou numa só pessoa. Gosto de filmes em que possas ver o mundo todo a girar lá dentro.

Além disso, só porque a Glória era a última pescadeira não tinha de ser, obrigatoriamente, uma figura cinematográfica. Como ainda não a conhecia bem não poderia imaginar que ela tinha tanta força imagética. Fomos ganhando confiança um com o outro. E fiquei rendido perante a sua força e dedicação e paixão nas artes da pesca. Podia estender planos de 5 a 10 minutos só a vê-la a trabalhar. E não é qualquer pessoa que é capaz de aguentar um plano. Era maravilhoso.

Além disso a Glória tinha ideias para o filme, imaginava e sugeria cenas que poderíamos fazer.

Glória

A Glória também funcionava muitas vezes como um desbloqueador de conversas com os outros. Uma espécie de aliada, ainda que no início, não o tenhamos imaginado dessa maneira mas acabou por assim ser porque era ela que nos dizia onde estavam os descendentes das pescadeiras, os filhos ou filhas, os maridos... Ela ia indicando e começando a fazer uma cartografia dos descendentes. Estava bem consciente desse legado. E quando nos apresentou o primeiro, o Carlos Rajão – o marido da Maria da Chula - que tem noventa e tal anos, ela deixou-nos sozinhos com ele. Senti então que estava perdido, sozinho com ele... Não fazia sentido porque tinha sido ela a ligação, Então fui chamar a Glória para estar connosco, e de repente eles começaram a falar e era justo. Comecei a entender que era por ali que tínhamos que ir. Como se fosse a Glória a querer resgatar a memória das antepassadas, ela como a última pescadeira. E eu resgato através dela. Eu lanço o isco mas é ela quem pesca.

Simplesmente chamei-a para ao pé de nós e pedi-lhe para falar com o Rajão. E lá foram eles, pelo meio da tarde, como se tivéssemos ensaiado.

Notas de rodagem sobre A mãe e o mar

Gonçalo TochaRealizador

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Aí entendi que ela estava completamente consciente do que estávamos a fazer.Depois, com a filha da Inês da Chula, aconteceu o mesmo, e elas estavam em modo de controlo

absoluto, Nós estávamos a filmar com duas câmaras e nunca interviemos, deixámos falar. Começámos às 4 da tarde e acabámos às 7 e meia – foram 3 horas e meia em que nunca dissemos “corta” e foram elas que se viraram para a câmara quando o sol se pôs e dizem “bom, já está!”. Elas vêem o dia a acabar a conversar sozinhas... a luz vai desaparecendo.

O filme é também sobre essa tal memória, uma coisa que já não existe, que desapareceu, que está prestes a desaparecer mas que ainda existe na Glória, está fisicamente nela.

Equipa

Foi a primeira vez que fiz um filme com uma equipa de rodagem com mais do que duas pessoas. Tudo muda. E os filmes enformam-se dessas circunstâncias. O projecto Estaleiro incluía a integração de uma equipa de rodagem com alunos em fim de curso das escolas de cinema. Não nos conhecíamos antes e Vila Chã tornou-se o nosso ponto de encontro. Além de estarmos a fazer um filme, estávamo-nos a conhecer. Dois processos.

Éramos então 2 operadores de câmara, um técnico de som e uma directora de produção. 4 pessoas, o dobro do que eu sabia fazer. O limite, parece-me, para uma rodagem numa pequena comunidade ao longo de um ano.

É com este sentimento de estarmos a fazer tudo pela primeira vez, entre nós e para Vila Chã.

Arquivo

O início do filme, com os travellings sobre as prateleiras da biblioteca, impele-nos a procurar aquele local mítico onde se deu o caso raríssimo de uma comunidade de mulheres na pesca do Atlântico, caso que não está visível, caso que está escondido em três artigos de jornais entre os anos 50 e 80 do século passado.

Este caso não é especial pela razão de haver mulheres a fazer trabalho de homem, mas pela raridade com que isso acontece no mundo.

Essa história ainda pode ser materializada na Glória, e a sua cédula marítima é uma prova insofismável, assim como a cédula da sua mãe. É como uma marca que ninguém pode apagar.

Para além da cédula da Glória e a da mãe da Glória, há duas outras cédulas que pertenciam a duas irmãs que iam ao mar. Essas foram as últimas que filmei e só nos últimos dias de rodagem. Foi difícil lá chegar.

Nós conhecemos a filha de uma dessas pescadeiras, a Cila da Ramalheda, e ela não sabia onde estavam essas cédulas, porque nunca mais as tinha visto. Quando as filmei parecia que estávamos a encontrar ouro.

São cédulas de 1926, parece que se desfazem com o pó. E quando se abrem aquelas cédulas, entra-se num outro mundo, no mundo delas, da Maria e da Cila da Ramalheda, daquelas mulheres que já morreram.

Guilherme Piló

Falando no Guilherme, pode parecer estranho que ele tenha tanta importância no filme, não sendo ele obviamente uma mulher e já não sendo pescador.

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Mas é ele que faz a dedicatória ao mar. É ele que reflete sobre o elemento e por aí também passava a minha vontade para estar em Vila Chã: a paixão pelo mar. Há pescadores que olham para o mar como um ser vivo.

A visão do Guilherme é que este mar é tão fascinante e tão poderoso que até essas mulheres, que normalmente estariam arredadas do mar, foram para o mar. Esse ponto de partida é maravilhoso. Este mar chama!

Claro que esta é uma visão e explicação totalmente subjectiva, porque é possível construir muita coisa que ultrapassa a questão funcional, e de sobrevivência, de ir para o mar para alimentar a família.

Com apenas duas semanas de rodagem o Guilherme encontra-nos e pergunta-me: “Ó Gonçalo, que filme é que estás a fazer?” Eu nessa altura ainda não sabia bem como iria construir o filme e disse-lhe que havia a questão sobre as mulheres pescadeiras mas que também era sobre o mar. Ele ficou a pensar sobre aquilo e disse-me:

“Então, tenho uma coisa para vocês, vou dar-vos um presente.”Nós ficamos em suspenso porque ele não nos disse exatamente o que era, apenas mencionou a

ideia de uma dedicatória dele ao mar. Perguntou-me se queria aquele presente. Não havia como recusar. Acrescentou: “Eu vou ter convosco quando eu estiver pronto.”

Como ele só foi ter connosco, pronto para filmar o tal plano, quase no final do primeiro mês de rodagem, nós continuamos a filmar a Glória com aquele plano imaginário na cabeça, em suspenso. E tudo o que filmávamos era já pensando nesse plano do Guilherme, que não saberíamos bem como seria. Contudo, de alguma forma, já sabia que seria para o final do filme...

Num dia de neblina e mar de ressaca ele veio então ter connosco e disse que queria estar junto de umas rochas na praia. Nós começámos a preparar o plano numa rocha que nós tínhamos escolhido – fora da areia em cima do mar – mas não era ali que ele iria fazer porque, como nos disse, “um pescador não se põe aí nessa rocha em cima do mar. Um pescador está na areia e eu vou fazê-lo aqui”.

Recolocámos então as duas câmaras e ele sai-nos com aquele poema.. Um poema que ele talvez tenha preparado mentalmente, dito num único take e que foi uma bomba em cima das nossas mãos. A partir daí o filme cresceu...

Por vezes, no cinema, tudo aquilo que imaginamos fazer é mais fraco do que o que acontece como inesperado. Quase sempre. O que ele nos deu, nós nunca poderíamos ter imaginado. E claro que este plano final pode abrir o filme para um próximo.

Imprevisível

A humanidade das pessoas, quem filma e quem é filmado, é que faz o cinema. Para chegar a este filme é necessário criar uma intimidade com as pessoas, uma relação forte, de confiança mútua, sem existirem dúvidas do propósito do que estamos a fazer. Temos de gostar uns dos outros.

Eles dão-nos coisas que não dariam se não tivessem confiança. Para mim, o cinema vai muito para além de encenar e tentar controlar o mundo. Principalmente no que chamamos de documentário, onde a imprevisibilidade é um elemento a ter em conta. Temos de deixar que o mundo expluda à nossa frente, prevendo essa explosão, e tendo as ferramentas adequadas para o

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filmar. Há um caos no meio duma rodagem deste tipo que é o caos de viver. E depois existem as câmaras e os microfones que podem ajudar ou atrapalhar no meio da explosão de elementos à nossa frente.

Filmar o mar

A paixão e a obsessão de filmar o mar tem tanto a ver com o cinema como com a imprevisibilidade. Há quem diga que não se pode filmar o mar, que o mar não se filma. Ninguém sabe filmar o mar.

O mar interessa-me pelo imprevisível. O mar é a rebeldia que não se controla. A sageza dos pescadores é lidarem com o mar sabendo que o não dominam. Adaptam-se à sua rebeldia.

Nós em terra temos a tendência de pensar que controlamos tudo. A terra pode ser controlável mas o mar não.

Isso forma pessoas com outra visão das coisas do mundo.Daí o Guilherme ser fascinante pela maneira como ele pensa o mar. É de uma rebeldia total em comparação com tudo o que fazemos em terra. E eu quero aprender

com quem trabalha o mar.É muito difícil filmar o mar...Lá está, como é tão fascinante, tão imponderável, e nunca mais

acaba, posso ser o homem que tenta a vida toda e nunca vai conseguir porque nunca ninguém conseguiu. É possível controlar melhor o nosso mundo filmando em terra. Mas como não quero controlar tudo o que me acontece quando estou a filmar, o mar é bom para continuar a tentar.

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Cresci a tropeçar em anzóis, a passear em barcos de pesca e a ouvir histórias de heróis que ousaram atravessar o Atlântico. Fiz-me gente a ouvir histórias com final feliz mas não só. Também ouvi histórias de dor, lágrimas e desespero. Histórias de mulheres como a minha avó, a minha mãe e outras que criaram os filhos sozinhas, que cuidaram da casa e dos seus enquanto os maridos rumavam durante longas temporadas à Terra Nova e aos mares gelados da Gronelândia em busca de sustento.

Senti o “fardo” de ser filho, sobrinho e neto de pescadores, de viver com o coração apertado, ora de saudade ora de receio de que chegasse uma má notícia. Aquela que ninguém queria ouvir, mas tão certa nas comunidades de pescadores habituadas ao luto.

A um mar de distância pretende retratar a história de um Portugal que, por sua vez, fez história no mundo. Retratar os pescadores que perderam a vida e ficaram “esquecidos” em terras longínquas. São pescadores que nunca tiveram uma homenagem dos seus, dado que as suas famílias, por falta de condições financeiras, não puderam fazer a trasladação dos corpos nem conseguiram deslocar-se a essas terras distantes.Até ao dealbar da década de 70, o Estado português nunca se preocupou em trazer estes homens “de volta” para casa. E num país tão conservador, profundamente católico, onde a homenagem fúnebre é sagrada, essa situação só aumentava a dor dos que recebiam a notícia da morte de um ente querido, mas nunca chegavam a ver um corpo.

A ideia de realizar este documentário surgiu quando descobri a impressionante história de Dionísio e da sua sorte retratada no documentário The White Ship (1966), do canadiano Hector Lemieux. A história deste jovem pescador levou-me a querer saber mais sobre os tripulantes deste navio português, durante essas filmagens.

À medida que a minha pesquisa avançava, fui descobrindo várias coincidências impressionantes que me levaram a querer fazer um documentário a partir dele. Descobri que as personagens que aparecem no documentário canadiano ainda estavam vivas e cheias de memórias, como o Celestino Ribeiro, o melhor amigo do Dionísio e pescador do Santa Maria Manuela nessa fatídica viagem. Conheci ainda Fernando Esteves que, antes de falecer, no início de 2015, sonhava em conseguir, uma última vez, visitar o túmulo do irmão Dionísio, e despedir-se dele.

Neste percurso tive ainda a sorte de conhecer o memorialista canadiano Jean-Pierre Andrieux, eterno fascinado pela pesca de bacalhau e pela presença dos portugueses na Terra Nova, que conseguiu realizar, em Outubro de 2015, uma homenagem aos pescadores enterrados em St. John’s e erguer uma estátua no túmulo de Dionísio; e Abel Coentrão, jornalista e autor de uma reportagem sobre este tema que nasceu nas Caxinas, terra que deu mais de mil homens à pesca do bacalhau e é ele próprio descendente de várias gerações de bacalhoeiros. Percebi que, depois de ter escrito a reportagem “As sepulturas Esquecidas”, Abel continuou a pesquisar histórias desses homens deixados para trás. E não demorou muito, por isso, a que passássemos a trabalhar juntos.

Eu, filmando, ele, escrevendo, e Jean-Pierre, com o seu memorial, estamos, na verdade, a perseguir um mesmo objetivo: possibilitar um reencontro, um tributo, àqueles pescadores. E é por eles, e pelos que lhes sobreviveram, que quero contar as suas histórias.

a um mar de distância

pedro maganoRealizador

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novas vistas lumière

Jorge SeabraCEIS20 | UC Coordenação Mar Film Festival

Novas Vistas Lumière é um concurso de curtas metragens, que integra a primeira edição de Mar Film Festival, com o objetivo de proporcionar aos jovens, entre os 12 e os 35 anos, a oportunidade de desenvolverem as suas capacidades criativas no domínio da imagem em movimento.

O nome atribuído ao concurso deve-se ao pioneirismo que os irmãos Lumière tiveram no desenvolvimento do olhar cinematográfico sobre o mundo que os rodeava, tendo-nos deixado um conjunto assinalável de pequenos filmes, as designadas Vistas Lumière, apesar de a sua grande maioria ter sido gravada por cinematografistas que para eles trabalhavam. Os Lumière

contratavam estes técnicos, que tinham por função deslocar-se a diversos países e continentes, com a finalidade de aí filmarem novas vistas e projetarem as que levavam na bagagem.

As Vistas Lumière tornaram-se um negócio desenvolvido depois do registo do Cinematógrafo em 1895. Atraídos pela pesquisa das “máquinas que escreviam o movimento”, viriam a criar o aparelho que iria resolver o último problema de uma série de invenções que começaram com a fotografia, a cronofotografia (máquinas que registavam fotografias em série), a película cinematográfica, restando o mecanismo de projeção pública, resolvido com o Cinematógrafo Lumière.

Contudo, a adesão dos Lumière não se enquadrava na ideia de utilizar o aparelho ao serviço da arte e indústria que hoje conhecemos. Digamos que eram bem mais modestos, colocando-se ainda na linha das pesquisas científicas que pretendiam estudar o movimento dos planetas ou o voo das aves, e ainda distantes da perceção sobre as capacidades narrativas da imagem em movimento, que anunciariam o futuro do cinema, e que viriam a ser explorados por Edwin Porter, Ferdinand Zecca ou Méliès, e que já encontramos de forma incipiente em alguns dos primeiros filmes de Edison.

Porém, depois de verificarem o entusiasmo que as primeiras projeções públicas suscitaram, e não obstante a convicção de que essa curiosidade popular seria efémera, optaram por aproveitar economicamente esse interesse, montando o já referido negócio das vistas, criando um catálogo que nos inícios do século XX rondava os mil títulos. As vistas, ou fotografias animadas como ficaram inicialmente conhecidas em Portugal, eram filmes de um só plano, normalmente sem movimentos físicos da câmara, rondando os trinta segundos de duração, e naturalmente sem som síncrono ainda, que apenas surgiria em 1927.

Estes quadros que os cinematografistas registaram em diferentes coordenadas geográficas para os Lumière, seriam os precursores dos filmes de atualidades, um género documental que terá forte desenvolvimento antes do aparecimento da televisão. Nesses pequenos filmes, para além das sempre atrativas vistas sobre lugares exóticos e distantes, aquilo que domina é a cidade e o urbanismo, o trabalho, o lazer e por vezes o burlesco.

Assim, é em função deste contexto histórico, e particularmente desta tipologia de filmes, que surge o concurso Novas Vistas Lumière. Trata-se de uma competição que aceita curtas metragens de um só plano, que mantém a maioria das caraterísticas dos filmes Lumière, com pequenos ajustamentos, nomeadamente a utilização de novos dispositivos de gravação que a

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tecnologia atual permite. Ao mesmo tempo, constitui um desafio criativo porque, de acordo com as normas do concurso, os jovens não puderam utilizar as possibilidades dos mecanismos atuais, obrigando-os a concentrar-se apenas na componente narrativa que o plano contém. É com estas premissas que o concurso pretende provocar e estimular a experimentação e a criatividade dos jovens no campo da imagem em movimento.

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OBRAS A

CO

NC

URSO

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novas vistas lumièrefilmes admitidos a concurso

prémio vista lumière jovem(12-15 anos)

Eduardo Jardim

Isabel Neves

João Santos

Leandro Monteiro

Luís Afonso

Simão Castro

prémio nova vista lumière (16-18 anos)

Beatriz Melo

Maria Antónia

Orlando Quaresma

Pedro Marques | André Cruz

Sofia Cruz

Sofia Palhinha

Tatiana Pereira

Tomás Ferreira

prémio lumière première vue (19-35 anos)

Clara Motta

Fábio Lucindo

Fábio Lucindo

Filipa Rodrigues | João Coutinho

Francisco Lé | Rui Gonçalves

Francisco Lé | Rui Gonçalves

Miguel Lobo

Rafael Silva

Ricardo Almeida

Teresa Neves

Teresa Neves

título

Conforto na angústia

Ponto de fuga

Argus. O passado do presente

Vida

Limpeza

Hope to survive

título

Contraste

Precalços

Reflexão

Refugiados

Como o tempo passa…

Adeus

Esperança

Atracado na tumba do esquecimento

título

Tenacidade

Onda e anda

Mar

Amarração. Após l’arrivée d’un train

en gare de La Ciotat

Água a dá, água a leva

Águas Paradas, Areias Movediças

Águas Vivas

Ainda te esperamos

O momento que separa a água doce da

salgada

Limite

Horizonte

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simão castro~hope to survive~

prémio vista lumière jovem(12-15 anos)

Eduardo Jardim~conforto na angústia~

isabel neves~ponto de fuga~

O vídeo mostra o canal de São Roque, em Aveiro, de frente para a ponte de Carcavelos. Este canal era onde antigamente os barcos saleiros descarre-gavam sal que depois era carregado para o caminho-de-ferro. Atualmente é um local muito movimentado.

joão santos~argus. o passado do presente~

leandro monteiro~vida~

luís afonso~limpeza~

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sofia cruz | 2017~como o tempo passa...~

beatriz melo | 2017~contraste~

Sequência de três planos de movimentos e escalas diversas. O lugre que oculta a partida do bacalhoeiro, e este que antecipa o regresso da bateira.Contraste de cores, dimensões e épocas.

maria antónia | 2017~precalços~

orlando quaresma | 2017~reflexão~

pedro marques | andré cruz | 2017~refugiados~O mar é o caminho esperançoso dos que procuram refúgio.O mar é a porta entreaberta de um mundo doce, seguro, perfeito.O mar é o muro intransponível isola os que fogem do terror dos que fogem dos refugiados.

prémio nova vista lumière (16-18 anos)

sofia palhinha | 2017~adeus~

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tatiana pereira | 2017~esperança~

tomás ferreira | 2017~atracado na tumba do

esquecimento ~A perda de sentido encarcerou-o no esquecimen-to, a um ambiente seco e à passagem inexorável do tempo. O barco dorme na sua tumba, fundido com a paisagem e admirando a réstia de vida que por vezes passa à sua beira, indiferente ao seu estado.

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fábio lucindo | 2017~onda e anda~

Onda e Anda é sobre impossibilidade e respeito, é sobre dois universos que coexistem, coabitam, mas se separam por questões �siológicas intransponíveis. É sobre simbiose, �uxo, troca. A esperança do pássaro é a angústia do mar. É puro movimento natural. É para Michelle Franco Redondo.

fábio lucindo | 2017~mar~Mar é sobre o homem e seus dejetos físicos e psicológicos. É sobre construção e descarte. É sobre o mar como caminho e �m. A angústia mora numa vontade de urinar iminente. A esperança vem do desejo de desaguar em lugar seguro.

filipa rodrigues | joão coutinho | 2017

~Amarração. Após l'arrivée d'un train en

gare de La Ciotat~Quisemos �lmar segundo o modelo de�nido pelos irmãos Lumière no século XIX; a documenta-ção crua de uma ação genérica no tempo. Trouxemo-lo para 2017 ao compor o �lme em 9:16, o formato de gravação da maior parte dos telemóveis.

francisco lé | rui gonçalves | 2017~água a dá, água a leva~A ria é fonte irrefutável de vida. O seu curso é efémero, e de montante carrega a esperança de uma paixão. Mas o seu caminho é inevitável e deixará angústia, levando, para jusante, a paixão que trouxe. Teremos braço para segurar o que a água dá?

prémio lumière première vue(19-35 anos)

clara motta | 2017~tenacidade~

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francisco lé | rui gonçalves | 2017

~águas paradas, areias movediças~

Diz-se que passa rápido, o que se faz por gosto. Diz-se que passa devagar, o que se faz obrigado. Mas eis que surge um curioso amigo, fruto da Natureza, professora do Homem, determinado a dar uma nova lição. Angustiado em areia, espera, ansioso, pela água da ria. Quer dizer... Será que espera?

miguel lobo | 2017~águas vivas~

rafael silva | 2017~ainda te esperamos~

Tu que foste ao mar. Deste lado ainda te esperamos.

ricardo almeida | 2017~o momento que separa a água doce da salgada~Esta terra separa a ria do mar, a água doce da salgada, é a língua de terra que toca os sabores opostos da água que se move em direções opostas, onde a esperança e a angústia se encontram e confundem noutro sentimento que é o seu. Este �lme é um olhar sobre esta terra, um olhar sereno sobre a inquietude desse momento que separa a água doce da salgada.

teresa neves | 2017~limite~

Este excerto foi �lmado na Praia da Barra em Aveiro, no local que agora é conhecido como Praia Velha, perto do farol. Ao �lmar as ondas a rebentar na areia, dois sujeitos praticantes de um desporto radical – kitesur�ng – que leva o corpo humano ao limite apareceram inesperadamente.

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teresa neves | 2017~horizonte~Este vídeo foi gravado em Aveiro, na Praia da Barra, perto do paredão, um local onde é comum passearem pessoas. O título deve-se não só ao objeto de foco se localizar na linha de horizonte do plano mas também ao dia ventoso que se vivia, estando o vento a soprar praticamente na horizontal perto da costa.

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Pescando nas memórias de um dóri

Jorge SeabraCEIS20 | UC Coordenação Mar Film Festival

A memória é um instrumento fundamental na construção das identidades pessoais e coletivas. Através daquilo que retemos, vamos aprendendo a situar-nos perante o que nos rodeia, desenvolvendo mecanismos de identificação, pertença e diferenciação relativamente ao espaço cultural em que vivemos. Estes três elementos permitem, sempre que necessitamos, perceber o que nos define culturalmente, interiorizar sentimentos de segurança por nos sentirmos incluídos num conjunto de valores e ideias que comungamos e, finalmente, o que nos identifica e confere conforto pela pertença a um meio socio-cultural é, simultaneamente, aquilo que nos diferencia de outras culturas, povos ou países.

De uma forma simples, memórias de RiaMar é um projeto experimental onde estas ideias estão presentes. Colocar algumas turmas do 8º ano do concelho de Ílhavo perante a memória marítima e bacalhoeira que os rodeia, estimulá-los a refletir e produzir um discurso sobre esse contexto, colocando-os em diálogo direto com pescadores da faina maior para, a partir daí, registarem uma entrevista sobre como era pescar num dóri. No final desse percurso de interação geracional, a expetativa é fazer com que as memórias guardadas pelos pescadores sejam exteriorizadas, ganhem dinamismo junto dos “jovens jornalistas”, permitindo que estes se situem perante uma memória que também faz parte do espaço em que vivem, compreendendo um pouco do que foi a pesca do bacalhau nos anos sessenta do século passado e, dessa forma, realizarem os referidos exercícios de identificação, pertença e diferenciação atrás aludidos.

Hoje já não há dóris nos mares do norte. Hoje apenas os encontramos em museus ou abandonados porque a sua vida útil terminou. Estes pequenos barcos que carregavam bacalhau e eram movidos com força de braços ou do vento, são objetos inertes e silenciosos sobre como era pescar bacalhau nessas pequenas embarcações. Daí que hoje, a memória desses tempos povoados de coragem, força, medo ou aventura apenas esteja na lembrança dos pescadores que, por diferentes razões, partiram para esses mares longínquos, vivendo tempos duros e sobretudo épicos, não no sentido que o Estado Novo lhes quis conferir, para através deles se projetar, como se fizessem renascer os navegadores do século XVI, mas no sentido em que Bernardo Santareno brilhantemente os caraterizou.

A concretização deste projeto não seria possível sem a disponibilidade e o profissionalismo dos docentes que coordenaram em cada escola as turmas envolvidas, acompanhando os alunos e orientando-os na execução das entrevistas. A organização de Mar Film Festival quer, por isso, deixar expresso o seu agradecimento a António Neves, Isabel Arribança e Maria de Fátima Godinho, do Agrupamento de Escolas de Ílhavo, a Maria Amélia Pinheiro e Maria Paula Reis, do Agrupamento de Escolas da Gafanha da Nazaré e a Isabel Ançã e Ana Lúcia Gonçalves, do Agrupamento de Escolas da Gafanha da Encarnação.

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alunos

8ºaAna Rodrigues Andreia Moitas Beatriz Rebelo Constança Ribeiro David Frei Diogo Beltrão Eva Pinto Francisco Oliveira Inês Silva João Almeida Margarida Teco Mariana RibauRodrigo Caçador Tomás Viola

8ºBBeatriz OitavenFrancisca AlmeidaInês Gramata Inês Bela

8ºCAna Filipe Bárbara Ribeiro Bernardo CarvalhoGuilherme Cova João Vieira José Rocha Lara Pata Maria Malaquias Maria Caçoilo Nicole Prata Tiago Parracho

8ºDAndré BaltazarBeatriz AlmeidaGonçalo LopesJoana AmarantePedro CasqueiraRafael CasqueiraDuarte CucoMariana Ruela

Entrevistas Alfredo GramataAntónio GraçaFernando FidalgoJoão PíncaroJoaquim dos SantosJosé Prior Moço

Agrupamento de Escolas da Gafanha da Encarnação

CoordenaçãoAna Gonçalves

Isabel Ançã

A zona de residência dos alunos da Escola Básica da Gafanha da Encarnação encontra-se repleta de memórias de ria e de mar.

Em pleno. Pelo que, rapidamente entraram na dinâmica do projeto proposto. Eles próprios contam histórias que, para nosso espanto, fazem calar a ouvir os seus colegas: “fiz uma entrevista ao meu tio. No barco dele havia o maduro e o verde, perdeu o amigo maduro, era aquele que sabia mais, era mais experiente. Desapareceu no nevoeiro. O meu tio ficou muito triste.”

Tomam consciência das realidades, as condições são diferentes, dizem que aprenderam coisas que não sabiam, por exemplo como eram as refeições – “a bordo não se comia tão bem mas o bacalhau era todo comido” (diz a sobrinha recordando as palavras do tio), “ficámos a saber mais sobre a Pesca à Linha e podemos comparar a nossa vida com a vida dos nossos familiares mais antigos”.

Este grupo de alunos realizou as entrevistas aos senhores: Alfredo Gramata, António Graça, Fernando Fidalgo; João Píncaro; Joaquim dos Santos, e José Prior Moço. A quem muito agradecemos, não apenas a sua disponibilidade para a entrevista mas, muito especialmente, a riquíssima partilha de experiências de vida que completam o arquivo das nossas memórias. Gafanha da Encarnação, 23 de março, de 2017.

Ana Gonçalves | Isabel Ançã

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Agrupamento de Escolas da Gafanha da nazaré

CoordenaçãoMaria Amélia Pinheiro

Maria Paula Reis

No início, este projeto parecia-nos demasiado desafiante, pois nem os alunos nem as coordenadoras conheciam, especificamente, a atividade piscatória dos dóris.

Contudo, ao longo do desenvolvimento do trabalho, reparámos que os alunos se sentiam muito motivados e interessados, tanto que foram os próprios que contactaram com as pessoas que foram entrevistadas.

Para além disso, entregaram-se, também, à pesquisa fotográfica, documental e das músicas que serviram de suporte ao trabalho apresentado.

Tarefas que exijam a saída da escola e o conhecimento da comunidade envolvente representam uma mais valia para o crescimento e para a interação dos alunos com o meio sociocultural em que se inserem.

Relativamente aos entrevistados e a outros colaboradores, temos muito a agradecer, pela presença, pelo empenho e pelo entusiamo.

Maria Amélia Pinheiro | Maria Paula Reis

alunos

8ªeAlexandra FontouraAlicia CoquimAna LemosAna SilvaAna MartinsAntónio LucasBeatriz MartinhoBenedita FernandesCarolina OliveiraCarolina EstanqueiroCarolina MerendeiroCatarina CostaFilipa OliveiraGuilherme Cruz

João VieiraLeonor SantosLuís PereiraMarco RodriguesMargarida PatoiloMaria Inês Monteiro

Entrevistas Capitão Valdemar AveiroMestre Manuel MarquesSr. Luís EstanqueiroD. Júlia NunesD. Cristina MirandaEngª Rita Portas

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Agrupamento de Escolas de ílhavo

CoordenaçãoAntónio Neves

Isabel Arribança Maria de Fátima Soares Godinho

Perante a proposta que nos fora feita pelos responsáveis do Mar Film Festival, a professora do Agrupamento de Escolas de Ílhavo do 8º ano, Isabel Arribança, apresentou a ideia aos seus alunos - realizar entrevistas a familiares ou conhecidos destes ligados à Pesca do Bacalhau. Assim, no 8º B, o pai da Sónia Santos e no 8º C, o tio da Rita Cartaxo disponibilizaram-se para colaborar neste evento.

Primeiro os alunos fizeram questões individualmente, depois seleccionaram as melhores em pequenos grupos e finalmente, com base nestas, compilou-se uma entrevista única por turma. A entrevista é composta por várias partes: a vida pessoal, a vida profissional, os momentos de lazer e algumas curiosidades.

Os entrevistados são o Sr. Santos e o Sr. Augusto. O primeiro ainda no ativo e o segundo já aposentado há algum tempo.

A entrevista do 8º B foi realizada na biblioteca da escola e a do 8º C junto ao aquário dos bacalhaus. Esta última será legendada no sentido de ser mais orientada para a unidade de surdos.

Foi um gosto realizar esta atividade e poder observar o envolvimento da maioria dos alunos.Isabel Arribança

A pesquisa na vida do mar incidiu em testemunhos reais como os familiares dos alunos.O entusiasmo experienciou o culto de uma vida de gerações que olham o mar com respeito,

saudade e esperança de uma vida melhor.A entrevista realizada pelos alunos permitiu perscrutar um desabafo intergeracional, que se

torna numa narrativa de história social e numa memória coletiva.O homem segue as brumas do mar no intuito de criar um sustento digno. A mulher torna-se mãe

e pai, que lidera o lar com valores morais e humanos.Na hora da partida, os lenços brancos dizem adeus… O tempo distante conhece o frio gélido, as

tempestades, a sensibilidade anestesiada pela esperança do regresso. Os aniversários distantes são um marco, que brota saudade e amor. Mas, há que olhar o mar, o vaivém das águas ensina muito… O silêncio mergulha nos rostos de família que parecem espelhar nas águas…

Esta força de alma lusitana e ilhavense é perpetuada nos olhares entre a família. E, já agora, também senti esse olhar ao construirmos esta aprendizagem cooperativa como matriz educacional na história local com o Museu Marítimo de Ílhavo.

Como afirma o povo ilhavense “a mulher vai abuzacar-se na areia e atafegada ouve o fagone”. A “lideira traz a mulher numa corriola”.

Com o tempo a obra nasce… Os filhos crescem e seguem caminhos que emergem a dignidade sonhada.

Este trabalho tornou-se aliciante e não tem fim, tal como o mar…A mensagem é gravada – a confiança, persistência, coragem – estilhaçam nas águas como

pétalas que brilham como cristais que sussurram… Vale a pena, tudo vale a pena, se a alma não é pequena…

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alunos

8ºBAna PedroÂngela CunhaDaniela RéÉrica SilvaInês AlvesJoão LadeiraJoão SantosLara VinagreMaria CassildaPedro MarcelinoSónia SantosTomás Pinto

8ºCAlexandre AlmeidaCarina MarabutoCatarina LopesDiogo FerreiraGonçalo NetoHugo PomboInês MenezesJoão AndradeLeonardo Ascensão

Heitor FerreiraHelena VieiraHugo MartinhoJoão RamalhoJoão FigueiredoJosé BastosLeonilde FernandesMarisa SimõesSamuel VerdadeMicael Rocha

EntrevistasJoão Carlos FradinhoJoão Pedro FradinhoSr. SantosSr. Augusto

Miguel CoutinhoNatália RibauPedro RafeiroRafael SeixasRita CartaxoSara FragosoSérgio SilvaSérgio MonteiroTânia CanteiroTomás RatoVasco RamosVítor Monteiro

8ºEAndré MonteiroCatarina CastroDaniel CarlosDaniela RodriguesFilipa GriloGabriel SilvaGabriela TavaresGonçalo TavaresGuilherme Fradinho

Agrupamento de Escolas de ílhavo

CoordenaçãoAntónio Neves

Isabel Arribança Maria de Fátima Soares Godinho

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Cinema, mar e memória

Jorge SeabraCoordenação Mar Film FestivalCEIS20 | UC

Pode o cinema constituir-se como memória do mar da região de Aveiro? É esta a questão fundamental a que a secção cinema, mar e memória procura responder, na qual, naturalmente e por inerência, a Ria de Aveiro está incluída. É necessário em primeiro lugar que haja um conjunto de realizadores cujo olhar cinematográfico se tenha já debruçado sobre o assunto, que existam simultaneamente obras em número significativo para, dessa forma, justificar numa secção uma mostra e reflexão sobre esses diferentes olhares.

Quanto aos realizadores, desde meados do século XX que cineastas como Paulo Rocha, Alfredo Tropa, Vasco Branco, Manuel Paula Dias ou Manuel Matos Barbosa colocaram no centro das objetivas o mar e a ria. Mais recentemente, mas no mesmo lastro dos anteriores, André Valentim de Almeida ou Pedro Magano continuam a gerar novas perspetivas sobre este referente.

Na esteira desta linha autoral, a produção de interpretações sobre esses olhares, materializada em diferentes trabalhos de investigação, é também um dado a salientar e que, por outra via, reforça a pertinência da secção, quer no sentido de permitir que o nosso tempo compreenda o olhar registado pelas lentes cinematográficas há algumas décadas, ou ainda, que a contemporaneidade dê também futuro a este passado que se foi registando, neste ciclo contínuo que carateriza o devir do tempo.

A edição cinema, mar e memória de 2017 centra-se em Vasco Branco (1919-2014). Cineasta amador aveirense, produziu uma obra notável que, embora ainda não esteja inteiramente fixada, rondará a meia centena de filmes, a maioria deles realizados em super8, dos quais O

espelho da cidade (1961) será porventura a película mais icónica. Esta vasta obra, ainda à espera de um estudo sistemático que clarifique os grandes vetores do seu pensamento cinematográfico, viria também a proporcionar-lhe reconhecimento internacional, onde a menção especial do júri de cinema amador do Festival de Cannes em 1963 é uma evidência.

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Vasco Branco e a memória marítima de aveiro

Rita CapuchoCentro de Estudos Interdisciplinares do Século XXUniversidade de Coimbra

Vasco Branco surge-nos como uma figura ímpar da cultura aveirense, um artista multifacetado que foi pintor, ceramista, escritor e cineasta.

Como ceramista tem uma vasta obra pública em Aveiro, além de ter várias obras espalhadas pelo mundo, quer como ceramista, quer como pintor. Na literatura, publicou 14 livros, tendo obtido em 1979 um prémio da Associação Portuguesa de Escritores com o romance Os generosos

delírios da burguesia. Artista muito produtivo e multifacetado, era ainda um homem bastante ativo do ponto de vista

cultural e associativo. Em 1955, funda com outros aveirenses o Cine – Clube de Aveiro e, em 1971, a Aveiroarte – Associação de Artistas Plástico de Aveiro.

A sua filmografia conta com 49 filmes, produzidos entre 1958 e 1984, nos géneros de animação, documentário, enredo e fantasia, segundo a categorização usada pelo cinema amador português. Com a sua obra conquistou prémios um pouco por todo o mundo nos festivais de cinema amador.Vasco Branco, o cineasta de Aveiro, rodou muitos dos seus filmes na sua cidade. As paisagens, a arquitetura e as gentes foram a escolha do autor, que sempre revelou paixão pela sua terra. No conjunto da sua obra existe um número significativo de filmes sobre a faina e atividades em torno do mar, da ria e das suas gentes.

Nesta mostra foram exibidos alguns desses filmes, tais como: Sol, suor e sal (1958), O

menino e o caranguejo (1959), Eterno poema (1959), O espelho da cidade (1961) e Gente trigueira (1968).

Esta é uma sessão relativa ao mar. Na maioria dos filmes desta seleção, o mar em si não está presente, mas é uma linguagem, uma forma de expressão que contamina o autor e a sua obra. O mar, ou o que lhe respeita, faz-se linguagem da dualidade, passado e futuro, ausência e presença, interior e exterior, submerso e emerso, visível e invisível, vida e morte, beleza e dureza.

O mar invade a sua cidade, pelos braços da ria. Dizem que esta sua ria de Aveiro nasce de um acidente. A ria surge paralela ao mar, lado a lado, comungam a salinidade, as águas.

O mar rodeia a filmografia de Vasco Branco, ou a obra de Vasco Branco rodeia o mar, por vezes com uma presença feita de ausência. E se o mar simboliza o mundo e o coração dos homens, a sede das paixões humanas, então o mar será toda a obra de Vasco Branco, feita de paixão pelas artes e pela sua terra. A ria e o mar são o seu coração, a sua casa.

Existe nos portugueses e, em particular, nas gentes de Aveiro uma memória coletiva do mar. Este faz parte da sua identidade, transformou o território, e expandiu-se em descobrimentos e em pesca de bacalhau. No livro O Dori número treze, Vasco Branco, retrata a vida de um pescador que se arrisca na pesca do bacalhau no seu pequeno dori. Na obra, o mar é duro, cruel, por vezes representa a morte, o homem surge indefeso perante este mar. Em Náufrago, o mar também é símbolo de morte, neste caso de uma estrada perigosa. O realizador diz que é um “filme simbólico contado sob a forma de parábola. O náufrago é o grito de angústia de todos aqueles que, todos os dias nas estradas, esperam baldamente por socorros. Muitos carros passam mas não param”. O mar simboliza uma vez mais a morte, a estrada que dá os “náufragos”. Vasco Branco utiliza o cenário natural da praia como espaço de reflexão para uma problemática que queria abordar. A praia é o cenário ideal para a parábola, vimos os veraneantes a usufruir de momentos de relaxe na praia, indiferentes ao homem que agoniza e pede socorro.

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No filme Eterno poema, vimos uma mulher que caminha na praia, deambula, vimos as pegadas na areia e o mar ao fundo, que se mostra como um espaço de introspeção. Ela vai ao encontro do mar para lidar com o suicídio do seu amado. A vida é um estado transitório, assim como são as águas do oceano, a vida e morte estão presentes na imagética do mar.

Em O menino e o caranguejo, o seu primeiro filme de enredo, as águas são vida, amor. Uma história simples, que se baseia na afeição que as crianças nutrem pelos animais. Um menino com o desejo de ter um animal, apanha um caranguejo, o seu pai descobre e no fim este acaba por devolver o caranguejo ao seu habitat. Por amor devolve-o às águas, à vida.

Nesta sessão temos três filmes do realizador filmados em Aveiro, que abordam especificamente o tema da ria, imagem de marca da cidade. Vasco Branco e os seus amigos cineastas da região eram conhecidos no meio do cinema amador como o Grupo de Aveiro. No concurso de cinema do Clube Português de Cinema de Amadores de Lisboa, depois da exibição do filme Gente trigueira, de Vasco Branco, foram acusados de que se não houvesse ria não havia cinema amador em Aveiro. Diz Vasco Branco que naquele momento apeteceu-lhe responder, mas, após ponderação, efetivamente a acusação tinha a sua razão.

Em Sol, suor e sal, o primeiro documentário do realizador de 1959, podemos observar a safra do sal, a dureza do trabalho dos marnotos e o questionamento sobre esse esforço e o futuro da atividade. Diz o realizador sobre a sua obra que “(…) pretende informar-nos sobre a gesta do sal: o esforço desumano, o sol inclemente, em cenário belo e grandioso.” O autor apresenta um olhar neorrealista sobre a faina e as gentes da sua cidade. O cenário como diz é belo, mas o trabalho é de uma dureza desumana.

Sol, suor e sal, os três elementos do título da obra são centrais no filme e os planos que nos remetem para eles pontuam e provocam um crescendo ao longo da safra, marcando a passagem do tempo e o intensificar do trabalho, imprimindo o ritmo da safra na narrativa do filme. Estes três elementos complementam-se e relacionam-se de uma maneira unificadora ao longo do filme, têm a sua ação sobre estes homens e a sua natureza é dual. Se por um lado são necessários, benéficos ao homem, por outro, intensificam e atestam a dureza deste tipo de faina.

No filme Gente trigueira, de 1968, o realizador mostra a vida das pessoas que trabalhavam na ria, fazendo o seguinte comentário: “é a gente queimada pelo sol rasando a superfície das águas da Ria, da gente encardida pelo ar salino da laguna. Esforço titânico, mas compensação miserável para quem labuta nas fainas do sal, do moliço, do junco, do berbigão. Gente trigueira é, em suma, a paisagem humana da minha terra.” No seguimento do seu primeiro documentário, este filme é outro que mais uma vez nos vem dar a sentir o olhar humanista e solidário com que Vasco Branco vê as pessoas que trabalham na ria.

A paisagem humana cria contraste na natureza, mostrando de novo a dualidade entre a beleza dos moliceiros que poisam na ria e os homens que surgem de rosto marcado, sofrido pela dureza do trabalho. Nos dois filmes o cenário da ria é espaço de reflexão para a vida das pessoas, para a situação do país que vivia na ditadura, e para o futuro deste tipo de atividade.

No sua obra mais icónica, O espelho da cidade, de 1961, este celebra a sua cidade. A ria é a alma de Aveiro, é a sua maior identidade, que a distingue das demais, tornando-a única e especial. Nesta obra, o realizador mostra a cidade através do espelho que são as águas da ria. O espetador conhece a cidade pelo seu reflexo.

Em O espelho da cidade, o realizador constrói a emotividade a cada plano com a luz, a cor e a música. A técnica de mostrar a cidade através do reflexo nas águas da ria, tanto quando surge invertida ou com o truque que transforma a cidade em arte, o seu reflexo é uma pintura em movimento, uma cidade líquida que flui nos canais. Com este efeito Vasco Branco eleva o espaço para um outro patamar de beleza e de entendimento.

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O modo de filmar conduz-nos ao espelho e ao simbolismo que este poderá assumir nesta obra. É um símbolo de pureza, verdade e sinceridade. Podemos entender que o autor nos quer mostrar a verdade e a pureza da cidade, por isso, recorre ao reflexo das águas que funcionam como espelho revelando a essência da região. Com o seu espelho a ria ilumina a cidade, traz-lhe o conhecimento e encerra em si a sabedoria.

Se pensarmos na personagem de Narciso, também podemos concluir que a ria é o corpo da cidade, reflete e dá-lhe a beleza. Vasco Branco diz: “… muitas horas da minha vida que com ela esbanjei — e tantas foram — gastei-as imaginando uma mulher à saída do banho, fresca, delicada de olhos azulados, de pele muito clara e cabelo solto caindo ao longo do corpo salpicado de gotículas (quanto a mim é esta a imagem que mais se assemelha) E sabem? Essa mulher, quem sempre imagino, nunca envelhece!”

A Ria/A cidade é uma mulher, símbolo de beleza e vida. O autor é apaixonado por ela e procura a cada plano elevar a sua musa. As águas da ria foram a tela que transformaram a cidade em obra de arte.

Nos três filmes sobre a ria, existe um ciclo, o ciclo da vida, do dia, das estações, da safra. A Ria é uma das personagens, a figura central, a alma, a tela que representa o mundo. É uma bela mulher sedutora que encanta, mas é também trabalho e dureza, um cenário cruel para qualquer um que dependa de si para sobreviver.Vasco Branco quer que as águas, da ria ou do mar, sejam um espaço de reflexão, de espelhamento do mundo. Alguns dos seus filmes preservam, efetivamente, a memória da região de Aveiro, a paisagem, as gentes, as tradições, os modos de vida, que ficam para sempre gravados enquanto tivermos estes filmes. O olhar sensível e humano de Vasco Branco dá-nos assim a ver a beleza do espaço e revela o lado menos bonito, esse que é sinónimo de esforço desumano das gentes que nele habitam.

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Abílio Hernandez CardosoUniversidade de Coimbra

Professor associado aposentado da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Doutorado em Literatura Inglesa pela Universidade de Coimbra com a dissertação sobre James Joyce, intitulada De Ítaca a Dublin: Ulysses ou a odisseia da palavra. É membro da Comissão de Avaliação Externa da Agência de Acreditação e Avaliação do Ensino Superior em Portugal, na área de Estudos Fílmicos. Faz parte do Conselho Consultivo da AIM – Associação dos Investigadores da Imagem em Movimento, da Comissão Científica da Conferência Internacional Avanca Cinema e do Conselho Geral da Fundação Inês de Castro.

Desempenhou as funções de Presidente de Coimbra Capital Nacional da Cultura, Pró-Reitor da Cultura da Universidade de Coimbra, Diretor do Colégio das Artes da Universidade de Coimbra, Diretor do Teatro Académico de Gil Vicente, Prof. Titular da “Cátedra Manoel de Oliveira” da Universidade Portucalense, Presidente da Associação Portuguesa de Programadores Culturais, Membro da Comissão Nacional para as Comemorações do Centenário do Cinema, Jurado do Instituto do Cinema e do Audiovisual nos concursos de atribuição de apoio à Produção Cinematográfica Portuguesa, Membro do Conselho Científico do Centro de Estudos Ibéricos (Universidades de Coimbra e Salamanca), Diretor da revista SENSO, Presidente da Assembleia Geral da Associação Portuguesa de Estudos Anglo-Americanos, Diretor do Instituto de Estudos Ingleses da Faculdade de Letras de Coimbra, Presidente da Comissão Científica do Grupo de Estudos Anglo-Americanos, Coordenador do Doutoramento em Arte Contemporânea do Colégio das Artes, membro dos júris do Prémio Universidade de Coimbra e do Prémio Eduardo Lourenço.

Anabela OliveiraUniversidade de Trás-os-Montes e Alto Douro

(membro do júri novas vistas lumière)

Professora auxiliar na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro e investigadora no Labcom. Doutorada em Literatura Comparada, orienta a sua investigação científica no âmbito dos estudos interartes, nomeadamente nas relações entre literatura e cinema, literatura e arquitetura e também na cinematografia de Manoel de Oliveira, Fellini e Jacques Tati. Leciona vários seminários no âmbito da análise do discurso fílmico e das relações dialógicas entre o cinema e outras artes. Autora do curso “Cinema: Alquimia das Artes” na Fundação de Serralves (Porto, 2009). Tem comunicações apresentadas em múltiplos colóquios e publicações em revistas nacionais e internacionais. Conferências convidadas nas universidades de Paris III, Paris Ouest Nanterre La Défense, Utrecht, Varsóvia e Lublin sobre o romance português contemporâneo (anos 60-90) e cinema português. Participações em júris e workshops em festivais e mostras de escolas de cinema (Avanca, MIFEC, Festival de Cinema de Ourense, Festfilm-Montpellier, Cinanima, São Tomé Fest Film. Arroios Film Festival) e nos júris nacionais do ICA (2014 e 2016). Diretora do RIOS – Festival Internacional de Cinema Documental e Transmedia. Pertence ao conselho editorial das revistas online International Journal of Cinema, Estrema, Plural/Pluriel, Persona e Cygne

Noir, revue d'exploration sémiotique (Université du Québec à Montréal).

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André Valentim Almeida | Realizador(membro do júri novas vistas lumière)

André Valentim Almeida é um realizador português. Os seus filmes têm sido exibidos em diversos Festivais de Cinema nacionais e internacionais, nomeadamente no Doclisboa, IndieLisboa, Visions du Réel, FIDMarseille, Jihlava, DOK Leipzig, CPH: DOX, DMZDocs, MoMA, Carpenter Center for Visual Arts, TEDx Brooklyn, entre outros, e ganhou recentemente o prémio Europeu da Doc Alliance atribuído ao seu filme A Campanha do Creoula. Realizou também as longas metragens From

New York with Love (prémio melhor Filme no Figueira Film Art), Uma na Bravo Outra na

Ditadura, e as médias metragens A Propósito de Leixões e Gigantes do Douro, uma encomenda do Museu do Douro que figura na sua exposição permanente.

Foi docente na Universidade do Porto e Aveiro e coordenador científico de um programa de formação de vídeo para jornalistas na Agência Lusa. Foi fellow no UnionDocs Collaborative Studio (2009/2010), em Brooklyn, Nova Iorque, onde se viria a tornar o coordenador do mesmo programa em 2011/2012. Tem vindo a participar em diversas palestras e acções de formação, como é o caso do TEDx Aveiro.

Cláudia Varejão | Realizadora

Nasceu no Porto e estudou cinema no Programa de Criação e Criatividade Artística oferecido pela Fundação Calouste Gulbenkian. Adquiriu também formação cinematográfica na Academia Alemã de Cinema e Televisão de Berlim e ainda na Academia Internacional de Cinema de S. Paulo. Também aprendeu fotografia da AR.CO em Lisboa.

Realizou Wanting, uma curta-metragem documental e uma trilogia ficcional de curta-metragem, Weekend, Cold day e Morning light.

A sua primeira experiência em realização foi In the darkness of the theater I take

off my shoes. Ama-san é o seu filme mais recente, datado de 2016. Para além de realizadora tem também alguns trabalhos em fotografia.

Francisco Cardoso Lima Professor | Artista plástico

Doutor em Estudos de Arte pela Universidade de Aveiro (tese de doutoramento: “O Artista pelo Artista na voz do Próprio”- 2013). Mestre em Criação Artística Contemporânea pela Universidade de Aveiro (dissertação de mestrado: “O Atelier Enquanto Lugar e Processo de Criação Artística”-2007). Licenciado em Artes Plásticas pela Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto (1996). Entre 2001 e 2006, artista da Galeira Pedro Oliveira. Atualmente, artista independente a residir em Ílhavo. Experiência pedagógica no campo do ensino da arte. Experiência científica no campo da produção artística.

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Gonçalo Tocha | Realizador

Nasceu em Lisboa em 1979. Viveu entre o subúrbio de Sacavém e o mar da Costa de Caparica e dos Açores. Começa na música com 14 anos ainda em Sacavém, na cena Punk dos anos 90. Licenciado e pós-graduado em Língua e Cultura Portuguesa pela Faculdade Letras Lisboa. Na mesma Faculdade funda o Núcleo de Cinema Video, no qual se inicia no cinema e forma a banda Lupanar em 2001 com Ana Bacalhau e Dídio Pestana. Viajante e realizador/produtor de documentários auto-biográficos, os seus filmes, extremamente pessoais, são o registo criativo de uma deriva pelo mundo, tendo no mar o eixo central do seu trabalho.

A sua primeira longa-metragem Balaou (2007), filme de homenagem à sua mãe, rodada em São Miguel, foi vencedor do Melhor Filme Português e Melhor Fotografia no Indielisboa 2007, passou por mais de 20 festivais internacionais e foi exibido na RTP2 e no canal franco-alemão ARTE. A sua segunda longa-metragem É Na Terra Não É Na Lua (2011), rodado na integra na Ilha do Corvo, teve estreia mundial no Festival de Locarno 2011, onde obteve uma menção especial do júri. Obteve mais 4 primeiros prémios internacionais no Doclisboa, BAFICI, San Francisco Int. Film Festival e DocumentaMadrid 2012. Teve estreia comercial em Portugal (Porto e Lisboa) e em Nova Iorque no Anthology Film Archives.

Em 2012 foi convidado a realizar mais dois filmes, um para a Capital Europeia da Cultura – Guimarães 2012, Torres & Cometas e outro para o programa Estaleiro do Festival de Vila do Conde, A Mãe e o Mar sobre as mulheres pescadeiras de Vila Chã, a estrear em Julho de 2013. Trabalhou como videasta para teatro (Truta, Grupo Teatro de Letras) e música (Deolinda, Bandarra e MEDEIROS/LUCAS). Na música é compositor (letra e música) cantor, tocador de bandolim e de guitarra, recuperador de vinis. Mantém o super duo musical TOCHAPESTANA, com Dídio Pestana e é DJ/entertainer com a sua colecção de discos, enquanto DJ Rubi Tocha Dábaile.

Pedro Magano | Realizador

Estudou Tecnologias da Comunicação Audiovisual no Porto, na ESMAE, acabando a licenciatura em 2007. No entanto, desde 2003 já colaborava com a RTP como operador de câmara, especializando-se posteriormente na direção de fotografia e fundou, em 2008, a Pixbee.

Como Diretor de Fotografia participou nos documentários O Vício da Liberdade (2011), e Manuel António Pina - Um sítio onde pousar a cabeça (2012), da Terra Liquida Filmes. Em 2014 colaborou no projeto “ArtMénia”, da Fundação Gulbenkian, e em 2015 nas suas duas primeiras longas-metragens como realizador, Irmãos e A um mar de distância.Como realizador estreou-se em 2007, com a curta-metragem Logo hoje, obtendo o Prémio Competição de Avanca, no Festival Internacional de Cinema de Avanca. Seguiu-se a média-metragem documental Era Uma Vez no Iraque (2014) sobre o atentado à base militar em Nassíria, em 2003. Irmãos

foi a sua primeira longa-metragem, um documentário sobre as romarias de São Miguel, que obteve o Grande Prémio do Festival Caminhos do Cinema Português (2015) e o Prémio de Melhor Montagem. Posteriormente, arrecadou o Lince de Ouro de Melhor Documentário no Fest – New Directors Film Festival (2016), foi selecionado, entre outros, no Festival Filmes do Homem (2016) e no Festival Internacional de Cinema Documental de México, iniciando assim o seu percurso internacional.

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Recentemente estreou o documentário, A um mar de distância, que obteve uma Menção Honrosa na última edição do Festival Caminhos do Cinema Português (2016). Atualmente, o realizador está a preparar a sua segunda curta-metragem de ficção, Inverno, para 2017.

Rita Capucho | Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XX da UC

Ana Rita Capucho é doutoranda em Estudos Artísticos, especialização em Estudos Fílmicos e da Imagem na Universidade de Coimbra. Licenciada e mestre em Estudos Artísticos pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Pertence à Comissão Organizadora da AVANCA | CINEMA – Conferência Internacional Cinema – Arte, Tecnologia, Comunicação, integrando ainda a direcção da Debatevolution – Associação e produtora editorial do International Journal of Cinema. É membro do grupo de trabalho Correntes Artísticas e Movimentos Intelectuais do CEIS20 (Centro de Estudos Interdisciplinares do Séc. XX da Universidade de Coimbra) e filiada na AIM (Associação de Investigadores da Imagem em Movimento). Integrou vários júris em festivais de cinema e pertence também à organização do São Tomé Festfilm. Pertence ao Grupo Poético de Aveiro, organiza o Poetry Slam Aveiro, assim como outros eventos ligados à poesia. Atualmente desempenha funções de produtora e programadora no Cineclube de Avanca.

Teresa Fidélis | Universidade de Aveiro

Doutorada em Ciências Aplicadas ao Ambiente (Universidade de Aveiro), "Master of

Philosophy in Town and Country Planning" (Universidade de Manchester) e Licenciada em Planeamento Regional e Urbano (Universidade de Aveiro). É Professora Auxiliar no Departamento de Ambiente e Ordenamento e Investigadora Integrada no Centro de Investigação em Governação, Competitividade e Políticas Públicas (GOVCOPP) da Universidade de Aveiro. É docente em cursos de licenciatura, mestrado e doutoramento nas áreas do Planeamento, Avaliação e Governação Ambiental. No seu trabalho científico bem como na orientação de doutoramentos e mestrados, tem-se dedicado à avaliação da implementação de instrumentos de política de ambiente como o planeamento e a avaliação ambiental, em especial no modo como incorporam os recursos hídricos e a biodiversidade. Integrou várias equipas de projetos internacionais dos domínios da água e do território e é autora de inúmeras publicações científicas no seu domínio. Tem experiência de governação dos recursos hídricos na qualidade de Presidente da Administração da Região Hidrográfica entre 2008 e 2012 e do Polis Litoral da Ria de Aveiro entre 2009 e 2012. No seu trabalho de investigação e extensão universitária tem dedicado especial atenção à Ria de Aveiro. É coordenadora do Grupo “uariadeaveiro” dinamizado pela Reitoria da Universidade de Aveiro.

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Abílio Hernandez Cardoso

Ana Caiado

Ana Lúcia Gonçalves

Ana Martelo

Anabela Oliveira

André Pinto

André Valentim Almeida

António Neves

Arminda Oliveira

Carla Carvalho

Carlos Marques

Delfim Rodrigues

Filipa Carvalho

Francisco Cardoso Lima

Gonçalo Tocha

Helena Libório

Helmer Oliveira

Henrique Teixeira

Irene Ribau

Isabel Ançã

Isabel Arribança

Joana Ribeiro

Lúcia Rodrigues

Maria Amélia Pinheiro

Maria de Fátima Godinho

Maria Paula Reis

Nazaré Matos

Pedro Magano

Rafaela Martelo

Rita Capucho

Rogério Fernandes

Teresa Fidélis

Agrupamento de Escolas da Gafanha da Encarnação

Agrupamento de Escolas da Gafanha da Nazaré

Agrupamento de Escolas de Ílhavo

Agrupamento de Escolas José Estêvão

Agrupamento de Escolas de Esgueira

Escola Artística do Conservatório de Música Calouste

Gulbenkian, Aveiro

Escola de Música Serenata

PixBee

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