Locação Comercial Dissertação Mestrado
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7/26/2019 Locao Comercial Dissertao Mestrado
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Outubro de 2012
Hugo de Sousa Oliveira
O incumprimento pelo locatrio do
contrato de locao de estabelecimento
comercial
Universidade do Minho
Escola de Direito
HugodeSou
saOliveira
Oincumprimentopelolocatriodocontratodelocaodeestabelecim
entocomercial
UMinho|2012
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Trabalho realizado sob a orientao do
Professor Doutor Fernando de Gravato Morais
Outubro de 2012
Hugo de Sousa Oliveira
Universidade do Minho
Escola de Direito
Dissertao de MestradoMestrado em Direito dos Contratos e da Empresa
O incumprimento pelo locatrio do
contrato de locao de estabelecimento
comercial
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AUTORIZADA A REPRODUO PARCIAL DESTA DISSERTAO APENAS PARA EFEITOS DEINVESTIGAO, MEDIANTE DECLARAO ESCRITA DO INTERESSADO, QUE A TAL SECOMPROMETE;
Universidade do Minho, ___/___/______
Assinatura: ________________________________________________
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minha me por todo o apoio que sempre me deu.
Manifesto o meu agradecimento ao Senhor Professor Doutor Fernando de Gravato
Morais, orientador desta dissertao, por todo o apoio e estimulo que sempre manifestou ao
longo deste percurso.
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H trs tipos de pessoas: as que vem, as que vem quando lhes mostrado, e as que
no vem. Leonardo da Vinci
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Resumo - O incumprimento pelo locatrio do contrato de locao de estabelecimento
comercial
O objecto da nossa dissertao incidir sobre o incumprimento pelo locatrio do contrato de locao
de estabelecimento comercial, sendo nosso propsito averiguar as modalidades e repercusses que talincumprimento poder acarretar para a relao jurdica complexa adveniente do contrato de locao de
estabelecimento comercial, parecendo-nos que inmeras questes e dvidas se podero levantar sobre esta
temtica. A presente dissertao est dividida em trs captulos. No primeiro captulo, intitulado de Contrato
de Locao de Estabelecimento Comercial, pretendemos analisar o conceito deste, caracterizando-o e
distinguindo-o de figuras afins, por forma a melhor compreendermos o tema deste estudo.
Em primeiro lugar pretendemos abordar o conceito de locao e sua relevncia, com especial
enfoque na locao adveniente de contrato, distinguindo-se a locao em geral do contrato de arrendamento.Procuramos caracterizar, ainda, o conceito de estabelecimento comercial, o qual pode variar conforme a
perspectiva de que visto, econmica ou jurdica, distinguindo-o tambm da mera soma das partes que o
compe, que, na prtica, tantas vezes gera confuso. Tratou-se tambm da anlise do estabelecimento
enquanto objecto de direitos e negcios, bem como a partir de que momento pode afirmar-se estar perante
um estabelecimento comercial. Averiguamos se o estabelecimento comercial , ou no, uma unidade jurdica
autnoma, assim como qual a natureza dos direitos que podem incidir sobre o estabelecimento comercial,
nomeadamente ser objecto de direitos reais. Seguidamente visamos esclarecer a distino do
estabelecimento face ao imvel em que eventualmente esteja instalado, assim como a diferenciao entre a
propriedade de um e de outro. Dentro dos negcios sobre o estabelecimento procuramos traar a linha
diferenciadora entre o contrato de locao de estabelecimento comercial e o contrato de trespasse. Por
ltimo, tentamos determinar a forma que o contrato de locao de estabelecimento comercial deve revestir, e
qual o regime jurdico aplicvel ao mesmo. No segundo captulo, denominado de Obrigaes do Locatrio,
debruamo-nos sobre as obrigaes contratuais advenientes para o locatrio, cujas principais encontram-se
enunciadas nas vrias alneas do artigo 1038 do CC, s quais acresce o implcito poder/dever de explorao
do estabelecimento comercial. Analismos os casos de incumprimento pelo locatrio de tais obrigaes, suas
consequncias e meios de tutela do locador, dando particular enfoque resoluo pelo locador. Por outro
lado estudamos a possibilidade do locatrio fazer caducar o direito de resoluo do locador em virtude da
mora no cumprimento da obrigao de pagamento do aluguer por parte daquele. No terceiro e ltimo
captulo, intitulado de Incumprimento pelo Locatrio, procuramos estudar alguns meios de tutela do locador
face ao incumprimento pelo locatrio, os quais foram subdivididos em realizao coactiva da prestao e na
possibilidade de reivindicao do estabelecimento comercial como um todo, como unidade jurdica.
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Abstract - The breach of lease of commercial establishment by the Lessee
The purpose of our dissertation will focus on the breach of lease of commercial
establishment by the Lessee, to ascertain the modalities and implications that such breach may
result for the complex legal relation existent on the lease of commercial establishment, looking usthat numerous questions and doubts may arise on this issue.
This dissertation is divided into three chapters. In the first chapter, titled Lease of
Commercial Establishment, we intend to analyze the legal concept of lease, characterizing and
distinguishing it from similar figures in order to better understand the subject of this study.
Firstly we intend to approach the concept of legal concept of lease and its relevance, with
special focus on the contract, distinguishing the general lease from the hire. We seek to
characterize also the concept of a commercial establishment, which may vary according to the
economic or legal perspective, distinguishing also the mere sum of the parts that compose it,
which often cause confusion. We also analyze the commercial establishment as subject of rights
and legal transactions, and set when we are facing a commercial establishment. Then we
examine if the commercial establishment it is or not an autonomous legal unit, as well as the
rights that may be related to it, namely property rights. Then we aim to clarify the distinction
between establishment and the property where it may be installed, as well as the differentiation
between ownership. Within the commercial establishment transactions we distinguished between
the lease of commercial contract and trespass. Finally, we try to determine the terms of the
contract, and what the applicable laws.
In the second chapter, called Obligations of the Lessee, we approach the contractual
obligations to the lessee, whose main are set out in the Article 1038 of the Civil Code, which
adds the implicit power/duty to exploit the commercial establishment. We analyzed the cases of
default by the lessee of such obligations, consequences and locators means of protection, giving
particular focus to the resolution. Moreover we study the possibility of locators right of resolution
due to late payment of rent be terminate by the lessee.
In the third and final chapter, titled Default by Lessee, we study some means of
protection of the locator, which were subdivided into coercive payment of the rent and the
possibility of claiming the commercial establishment as a whole, this is as a legal unit..
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ndice
Lista de Abreviaturas .................................................................................................... 1
Introduo.................................................................................................................... 2
Captulo I - Contrato de Locao de Estabelecimento Comercial .................................... 5
1.1.- Conceito de Locao ........................................................................................ 5
1.2.- Distino face ao Arrendamento ....................................................................... 9
1.3.- Conceito de Estabelecimento Comercial .......................................................... 10
1.4.- Distino do estabelecimento comercial face ao imvel ................................... 20
1.5.- Distino do Contrato de Locao de Estabelecimento Comercial face ao
Contrato de Trespasse ........................................................................................................ 22
1.6.- Forma ............................................................................................................ 26
1.7.- Regime aplicvel ao Contrato de Locao de Estabelecimento Comercial ........ 28
Captulo II - Obrigaes do Locatrio ........................................................................... 33
2.1. - Pagar o aluguer ............................................................................................. 33
2.1.1. - Vencimento - Tempo do pagamento ........................................................ 34
2.1.2. - Lugar do pagamento ............................................................................... 34
2.1.3. - Legitimidade para receber e para pagar o aluguer ................................... 34
2.1.4.- Mora do locatrio ..................................................................................... 35
2.1.5.- Indemnizao .......................................................................................... 37
2.1.6.- Juros de mora ......................................................................................... 39
2.1.7.- Prescrio da obrigao de pagamento da renda ou aluguer .................... 41
2.2.- Facultar ao locador o exame da coisa locada .................................................. 42
2.3.- No aplicar a coisa a fim diverso daqueles a que ela se destina ...................... 42
2.4.- No fazer dela uma utilizao imprudente ....................................................... 44
2.5.- Tolerar as reparaes urgentes, bem como quaisquer obras ordenadas pela
autoridade pblica .............................................................................................................. 44
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2.6.- No proporcionar a outrem o gozo total ou parcial da coisa por meio de cesso
onerosa ou gratuita da sua posio jurdica, sublocao ou comodato, excepto se a lei o
permitir ou o locador o autorizar ......................................................................................... 45
2.7.- Comunicar ao locador, dentro de quinze dias, a cedncia do gozo da coisa por
algum dos referidos ttulos, quando permitida ou autorizada ................................................ 47
2.8.- Avisar imediatamente o locador, sempre que tenha conhecimento de vcios na
coisa, ou saiba que a ameaa algum perigo ou que terceiros se arrogam de direitos em
relao a ela, desde que o facto seja ignorado pelo locador ................................................. 47
2.9.- Restituir a coisa findo o contrato ..................................................................... 48
2.10.- Poder/dever de explorao do estabelecimento comercial............................. 49
Captulo III - Incumprimento pelo Locatrio ................................................................. 51
3.1.- Consequncias do incumprimento .................................................................. 52
3.2.- Resoluo pelo Locador do Contrato de Locao de Estabelecimento Comercial
.......................................................................................................................................... 59
3.3.- Possibilidade de o Locatrio fazer caducar o direito de resoluo do Locador .. 67
3.4.- Meios de tutela do Locador ............................................................................. 71
3.4.1 - Realizao coactiva da prestao ............................................................. 72
3.4.2 - Reivindicao do estabelecimento comercial ............................................ 74
Concluso .................................................................................................................. 79
Bibliografia ................................................................................................................. 84
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Lista de Abreviaturas
CC Cdigo Civil
CDA Cdigo do Direito de Autor e dos Direitos Conexos
CIRE Cdigo da Insolvncia e da Recuperao de Empresas
CJ Colectnea de Jurisprudncia
CPI Cdigo da Propriedade Industrial
CSC Cdigo das Sociedades Comerciais
DL Decreto-Lei
NRAU Novo Regime do Arrendamento Urbano
p. - pgina
pp. - pginas
RAU Regime do Arrendamento Urbano
RNPC Registo Nacional de Pessoas Colectivas
ss. seguintes
STJ Supremo Tribunal de Justia
T. Tomo
TRL Tribunal da Relao de Lisboa
TRP Tribunal da Relao do Porto
v. g.- verbi gratia
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Introduo
Apesar dos imensos estudos que rodeiam o tema do estabelecimento comercial, ao que
sabemos, poucos h que versem especificamente sobre o tema que nos propomos tratar.O objecto da nossa dissertao incidir sobre o incumprimento pelo locatrio do contrato
de locao de estabelecimento comercial, sendo nosso propsito averiguar as modalidades e
repercusses que tal incumprimento poder acarretar para a relao jurdica complexa
adveniente do contrato de locao de estabelecimento comercial, parecendo-nos que inmeras
questes e dvidas se podero levantar sobre esta temtica.
A presente dissertao est dividida em trs captulos.
No primeiro captulo, intitulado de Contrato de Locao de Estabelecimento Comercial,pretendeu analisar-se o conceito de contrato de locao de estabelecimento comercial,
caracterizando-o e distinguindo-o de figuras afins, por forma a melhor compreendermos o tema
deste estudo. Tentou-se, ainda que sucintamente, analisar alguns conceitos essenciais para
melhor enquadramento e interiorizao do mesmo.
Em primeiro lugar pretendeu abordar-se o conceito de locao e sua relevncia, com
especial enfoque na locao adveniente de contrato, distinguindo-se a locao em geral do
contrato de arrendamento.
Procurou caracterizar-se, ainda, o conceito de estabelecimento comercial, o qual pode
variar conforme a perspectiva de que visto, econmica ou jurdica, distinguindo-o tambm da
mera soma das partes que o compe, que, na prtica, tantas vezes gera confuso.
Tratou-se tambm da anlise do estabelecimento enquanto objecto de direitos e
negcios, bem como a partir de que momento pode afirmar-se estar perante um
estabelecimento comercial. Pretendeu averiguar-se, igualmente, se estabelecimento comercial ,
ou no, uma unidade jurdica autnoma, bem como qual a natureza dos direitos que podem
incidir sobre o estabelecimento comercial, nomeadamente ser objecto de direitos reais.
Seguidamente visou-se esclarecer-se a distino do estabelecimento face ao imvel em
que eventualmente esteja instalado, bem como a diferenciao entre a propriedade de um e de
outro.
Dentro dos negcios sobre o estabelecimento procurou traar-se a linha diferenciadora
entre o contrato de locao de estabelecimento comercial e o contrato de trespasse.
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Por ltimo, tentou-se determinar a forma que o contrato de locao de estabelecimento
comercial deve revestir, bem como o regime jurdico aplicvel ao mesmo.
No segundo captulo, denominado de Obrigaes do Locatrio, debruamo-nos sobre as
obrigaes contratuais advenientes para o locatrio, cujas principais encontram-se enunciadasnas vrias alneas do artigo 1038 do CC., a saber: pagar a renda ou aluguer, dentro da qual
analisaremos o seu tempo e lugar de pagamento, a legitimidade para receber e para pagar o
aluguer, a constituio em mora do locatrio, a indemnizao devida pela mesma, os juros de
mora, a prescrio da obrigao de pagamento da renda ou aluguer, seguindo-se como
obrigaes principais constantes da referida norma a obrigao de facultar ao locador o exame
da coisa locada, no aplicar a coisa a fim diverso daquele a que ela se destina, no fazer da
mesma uma utilizao imprudente, tolerar as reparaes urgentes, bem como quaisquer obrasordenadas pela autoridade pblica, no proporcionar a outrem o gozo total ou parcial da coisa
por meio de cesso onerosa ou gratuita da sua posio jurdica, sublocao ou comodato,
excepto se a lei o permitir ou o locador o autorizar, comunicar ao locador, dentro de quinze dias,
a cedncia do gozo da coisa por algum dos referidos ttulos, quando permitida ou autorizada,
avisar imediatamente o locador, sempre que tenha conhecimento de vcios na coisa, ou saiba
que a ameaa algum perigo ou que terceiros se arrogam de direitos em relao a ela, desde que
o facto seja ignorado pelo locador, restituir a coisa findo o contrato e, embora no se
encontrando explicitamente prevista na lista do artigo 1038 do CC, mas decorrendo do regime
legal aplicvel, o poder/dever de explorao do estabelecimento comercial.
Por ltimo, desejamos analisar os casos de incumprimento pelo locatrio de tais
obrigaes, suas consequncias e meios de tutela do locador. Aqui distinguiu-se o cumprimento
do incumprimento pelo locatrio, bem como as consequncias deste ltimo. Dando particular
enfoque resoluo pelo locador do contrato de locao de estabelecimento comercial,
procurando analisar o seu regime e consequncias. Dentro desta pretendeu incidir-se
especialmente na resoluo do contrato de locao do estabelecimento comercial por falta de
pagamento do aluguer.
Por ltimo, visou analisar-se a possibilidade do locatrio fazer caducar o direito de
resoluo do locador em virtude da mora no cumprimento da obrigao de pagamento do
aluguer por parte daquele.
No terceiro e ltimo captulo, intitulado de Incumprimento pelo Locatrio, procurou
estudar-se alguns meios de tutela do locador face ao incumprimento pelo locatrio, os quais
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foram subdivididos em realizao coactiva da prestao e na possibilidade de reivindicao do
estabelecimento comercial como um todo, como unidade jurdica.
A dissertao termina com Concluses onde se pretendeu sintetizar as principais ideias
desenvolvidas ao longo deste trabalho.
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Captulo I - Contrato de Locao de Estabelecimento Comercial
Dadas as especificidades desta figura contratual, quer quanto ao seu objecto, quer
quanto ao regime legal aplicvel, para melhor compreendermos o tema deste estudo iremos,ainda que sucintamente, analisar alguns conceitos essenciais para melhor enquadramento e
interiorizao do mesmo.
1.1.- Conceito de Locao
A locao corresponde figura da locatio conductio rei do Direito Romano1.
locao pode atribuir-se um importante papel econmico e social na medida em que
permite um melhor aproveitamento e utilizao dos bens, seja pelo locador, seja pelo locatrio,
na medida em que permite ao titular de um direito de gozo sobre dada coisa, obter um
rendimento adveniente desta, sem contudo perder o direito sobre ela. Por seu turno, o locatrio,
seja por falta de condies econmicas, seja por qualquer outro motivo da sua convenincia,
pode gozar uma coisa mediante uma retribuio inferior que teria de despender para adquirir a
coisa. De outra forma, as coisas dadas em locao poderiam ficar inaproveitadas, no
satisfazendo qualquer necessidade prpria ou alheia ao titular do direito sobre ela.
O regime geral da locao vem regulado nos artigos 1022 a 1063 do CC, os quais se
inserem no Captulo IV, Ttulo II, Livro II do mesmo diploma, no mbito dos contratos em
especial. O artigo 1022 do CC d-nos a noo legal de locao. Assim, Locao o contrato
pelo qual uma das partes se obriga a proporcionar outra o gozo temporrio de uma coisa,
mediante retribuio.
Embora a supra citada norma se refira ao contrato de locao, a relao locatcia pode
advir de outras fontes que no o contrato. Assim, na lei actual admite-se a constituio da
relao de arrendamento atravs de sentena judicial, que o artigo 1793 prev para a hiptese
de divrcio (ou separao judicial de pessoas e bens artigo 1794) e que o artigo 4, n 4, da
Lei 135/99, de 28 de Agosto estendeu simples quebra da unio de facto (cfr. hoje o artigo 4,
n 4 da Lei 7/2001, de 11 de Maro). Prev-se ainda hipteses de arrendamentos impostos por
rgo pblicos, os quais por isso no se podero considerar como tendo a sua fonte em
1Cfr. Antnio Santos Justo, A locatio conductio rei (Direito Romano), in: BFD, 78, 2002, pp. 13 ss.
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contratos. tambm objecto de controvrsia na doutrina a possibilidade de constituio do
direito do locatrio por usucapio, tendo ainda havido nos anos conturbados de 1974-1975
situaes de ocupao de prdios, que a legislao posterior resolveu converter em contratos de
arrendamento2
.No que ao presente estudo importa, vamos ater-nos locao adveniente de contrato.
Da anlise da noo legal podemos dizer que a locao se caracteriza pelos seguintes
elementos essenciais: a obrigao de proporcionar a outrem o gozo de uma coisa, o seu
carcter temporrio, e a retribuio pelo gozo da coisa.
A obrigao de proporcionar a outrem o gozo de uma coisa constitui a prestao
caracterstica do contrato de locao. A esta obrigao, a alnea b), do artigo 1031 do CC, faz
corresponder a obrigao de contedo positivo do locador [e]ntregar ao locatrio a coisalocada3.
No entanto, esta obrigao, no implica que o locador esteja ininterruptamente a
assegurar o gozo da coisa ao locatrio. Aps a sua entrega, estando o locatrio na deteno da
mesma, ser desnecessrio qualquer acto do locador, sendo em regra suficiente que este se
abstenha de praticar actos que impeam ou diminuam o gozo da coisa locada nos termos do
artigo 1037 do CC, salvo casos excepcionais, como por exemplo a necessidade de reparaes
ou outras despesas urgentes conforme artigo 1036 do CC.
O carcter temporrio da locao outro dos elementos essenciais deste instituto
jurdico que podemos aferir da sua noo legal. Esta limitao temporal do gozo concedido ao
locatrio decorre tambm da norma do artigo 1025 do CC, onde podemos ler que [a] locao
no pode celebrar-se por mais de trinta anos; quando estipulada por tempo superior, ou como
contrato perptuo, considera-se reduzida aquele limite.4
Caso assim no fosse, podia gerar-se o absurdo da locao, mormente no
arrendamento, ter uma durao de sculos. Esta limitao revestia-se de maior importncia face
ao pretrito regime vinculstico do arrendamento, segundo o qual o senhorio no podia
2Lus Manuel Teles de Menezes Leito, Direito das Obrigaes, Vol. III, Contratos em Especial., 5 edio, Coimbra, Almedina, 2008, p. 299.
3Ao contrrio dos diplomas legais anteriores, que evitaram tomar posio quanto ao regresso ao Cdigo Civil do tratamento legal do contrato de
arrendamento urbano e a sua insero no Livro das Obrigaes apontam inequivocamente no sentido de que o legislador, confrontado com a
querela doutrinria existente em torno da natureza jurdica da posio do arrendatrio, adoptou o entendimento que v nesta um direito de raiz
estruturalmente obrigacional, in Laurinda Gemas; Albertina Pedroso; e Joo Caldeira Jorge, Arrendamento Urbano,Lisboa, Quid Juris, 2007 (2
Edio); sobre este tema cfr. ainda Lus Manuel Teles de Menezes Leito, Arrendamento Urbano, 1 edio, Coimbra, Almedina, Ano pp. 15 a
17.
4Quanto ao arrendamento florestal admite-se um prazo mximo de 70 anos, nos termos do artigo 7, do DL 394/88, de 8 de Novembro.
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denunciar imotivadamente o contrato de arrendamento nos termos hoje permitidos pelo artigo
1101, alnea c), do CC.
O prazo de 30 anos respeita apenas ao limite mximo do termo inicial do contrato, no
visando estabelecer um limite mximo de durao efectiva da locao. Pelo que, fruto desucessivas renovaes nos termos do artigo 1054 do CC - ou talvez seja prefervel a expresso
prorrogaes, por se tratar de um mesmo contrato cujo seu termo final alterado a relao
locatcia pode ter uma durao superior a 30 anos5.
Mesmo a permisso de celebrao de contratos de arrendamento de durao
indeterminada no faz perigar o carcter temporrio da locao, pois o mesmo pode ser extinto
mediante denncia por qualquer uma das partes conforme os artigos 1099 e seguintes do CC.
Por ltimo, temos a retribuio pelo gozo da coisa. O contrato de locao oneroso esinalagmtico, apresentando-se a retribuio como contrapartida da cedncia do gozo da coisa.
De facto, o artigo 1038 do CC, enumera a obrigao do locatrio pagar a renda ou aluguer no
topo da sua lista, constituindo a obrigao principal do locatrio.
Quanto locao em geral o artigo 1039 do CC, estipula que [o] pagamento da renda
ou aluguer deve ser efectuado no ltimo dia de vigncia do contrato ou do perodo a que
respeita, e no domiclio do locatrio data do vencimento, se as partes ou os usos no fixarem
outro regime. Em regra trata-se de uma obrigao que tem por objecto uma prestao
pecuniria de quantidade, duradoura e peridica. Contudo, podem as partes, ao abrigo da
liberdade contratual fixar o regime que entenderem6.
Por outro lado, podemos qualificar a locao como contrato nominado pois a lei atribui-
lhe um nome fazendo-o corresponder a uma categoria jurdica. tambm um contrato
legalmente tpico, pois o seu regime tem consagrao legal, tanto relativamente locao em
geral, regulada nos artigos 1022 e seguintes do CC, como quanto a diversas modalidades
especficas de locao, v. g. o arrendamento urbano7, o arrendamento rural 8e o arrendamento
florestal9.
5 Alguma doutrina minoritria entende que o limite de 30 anos se refere durao mxima da locao. Salvo o devido respeito por diferente
entendimento, tal posio no parece que seja de subscrever porquanto o teor dos artigos 1025 e 1054 do CC no parece apontar nesse
sentido, acrescendo ainda a realidade da vida quotidiana, sufragada pela jurisprudncia em geral, onde se constata com bastante frequncia a
existncia de contratos de locao, em regra de arrendamento, que se prolongam h mais de 30 anos.
6O artigo 1075, n 1, do CC estabelece para o arrendamento urbano que [a] renda corresponde a uma prestao pecuniria peridica,
parecendo estar, assim, afastada a liberdade contratual quanto a esta matria. Pode contudo a renda ser fixada em moeda especfica conforme
os artigos 552 e seguintes do CC ou em moeda estrangeira segundo o artigo 558 do CC.
7 Cfr. Novo Regime do Arrendamento Urbano, aprovado pela Lei 6/2006, de 27 de Fevereiro, bem como os diplomas que lhe so
complementares.
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O contrato de locao um contrato consensual10, pois a constituio do contrato no
implica, ou no fica dependente, da entrega da coisa dada em locao. A entrega da coisa
antes uma obrigao emergente do contrato nos termos do artigo 1031 alnea a)do CC.
Conforme consta do artigo 219 do CC, [a] validade da declarao negocial nodepende da observncia de forma especial, pelo que, uma vez que o regime geral da locao
no impe nenhuma forma especial, estamos perante um contrato no formal.
Contudo existem excepes liberdade de forma para a celebrao de contratos de
locao. Assim, o artigo 1069 do CC exige que o contrato de arrendamento urbano seja
celebrado por escrito desde que tenha durao superior a 6 meses11. H ainda que atender ao
que determinam os artigos 2, n 1, alnea m), 5, n 5, 6, n 1 e 7 do Cdigo do Registo
Predial12
. Consta da primeira norma referida que [o] arrendamento por mais de seis anos e assuas transmisses ou sublocaes, exceptuado o arrendamento rural esto sujeitos a registo.
De igual modo o artigo 6, n 1, do Decreto-Lei n 294/2009, de 13 de Outubro exige
que [o]s arrendamentos rurais[sejam] obrigatoriamente reduzidos a escrito.
Podemos assim constatar que, a maior parte dos contratos de arrendamento existentes,
estaro sujeitos forma escrita. Quando assim no seja vigorar o princpio da consensualidade
ou liberdade de forma.
O aluguer est igualmente abrangido pelo regime geral da locao e como tal ser um
contrato no formal. Existem, no entanto, excepes como, por exemplo, o aluguer de carros
sem condutor13.
Outra qualificao que se pode fazer do contrato de locao ser quanto natureza
jurdica do direito do locatrio. A doutrina clssica e maioritria entende que se trata de um
direito pessoal de gozo, no dando quaisquer direitos reais ao locatrio. Por outro lado, alguma
8Cfr. actualmente, o Decreto-Lei n 294/2009, de 13 de Outubro.
9Cfr. actualmente, o Decreto-Lei n 294/2009, de 13 de Outubro.
10Por oposio aos contratos reais quoadcontitutionem, que implicam a entrega da coisa para que o contrato se constitua.
11No Direito do pretrito, o artigo 1029, n 1, alneas a) e b), do CC, sujeitavam a escritura pblica os arrendamentos que estivessem sujeitos a
registo, bem como os arrendamentos para comrcio e indstria e exerccio de profisso liberal. Contudo o Decreto-Lei 64-A/2000, de 22 de Abril
veio, conforme consta do seu prembulo, simplificar a celebrao de contratos de arrendamento mediante dispensa de escritura pblica ()
projectado para os arrendamentos sujeitos a registo, os arrendamentos para o comrcio, indstria ou exerccio de profisso liberal, para o
trespasse, para a cesso de explorao e para a cesso da posio de arrendatrio.
12Aprovado pelo Decreto-Lei n 224/84, de 11 de Dezembro, cuja ltima alterao foi levada a cabo pelo Decreto-Lei n 185/2009, de 12 de
Agosto.
13Cfr. artigo 17 do Decreto-Lei n 354/86, de 23 de Outubro, onde se l [o]contrato de aluguer de veculos automveis sem condutor ser
obrigatoriamente numerado e reduzido a escrito, em triplicado, devendo o original ser arquivado pela empresa exploradora pelo perodo mnimo
de dois anos a partir do seu termo.
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doutrina entende que estamos perante um direito real quoad effectum. No desenvolveremos
mais esta temtica, j bastante tratada na doutrina14 . Concluiremos, apenas, pela adeso
doutrina que o configura como um direito de natureza obrigacional, quer pela sua localizao
sistemtica no CC, quer pela sua regulamentao, que confere direitos obrigacionais aolocatrio, e no reais, no obstante o artigo 1037, n 2, do CC, atribuir ao locatrio que for
privado da sua coisa ou perturbado no exerccio do seus direitos ()[os]meios facultados ao
possuidor nos artigos 1276 e seguintes.
O artigo 1022 do CC determina a onerosidade do contrato de locao. Ambas as partes
sofrem sacrifcios, pois o locador abdica do gozo da coisa, enquanto o locatrio abdica da
retribuio correspondente.
Na mesma linha de raciocnio verificamos que o contrato de locao sinalagmtico,gerando obrigaes para ambas as partes, na medida em que obrigao principal do locador
de proporcionar ao locatrio o gozo da coisa, corresponde a obrigao do locatrio pagar a renda
ou aluguer15.
Estas obrigaes so certas e no aleatrias, pelo que se trata de um contrato
comutativo.
Sendo a locao caracterizada pelo seu carcter temporrio, estamos perante um
contrato de execuo duradoura. As prestaes das partes prolongam-se no tempo. Quanto
obrigao do locador proporcionar o gozo da coisa ao locatrio, prevista no artigo 1031, alnea
a)do CC, podemos caracteriz-la como prestao contnua, pois esta obrigao ininterrupta.
Por seu turno, a obrigao a cargo do locatrio constante do artigo 1038, alnea a), isto , pagar
ao locador a renda ou aluguer16, constitui, em regra, uma prestao peridica, que se repete ao
longo do tempo.
1.2.- Distino face ao Arrendamento
14 Sobre esta temtica cfr. a bibliografia sugerida por Lus Manuel Teles de Menezes Leito, Direito das Obrigaes, Vol. III, Contratos em
Especial., 5 edio, Coimbra, Almedina, 2008, pp. 305 a 307, notas 649 a 653.
15Cfr. os artigos 1031, alnea b)e 1038, alnea a), ambos do CC.
16Dizemos em regra, por ser essa a situao mais frequente segundo a experincia comum. Mas quanto locao em geral, nada obriga que
assim seja. De facto, o artigo 1039, n 1, do CC diz que [o] pagamento da renda ou aluguer deve ser efectuado no ltimo dia de vigncia do
contrato().
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O artigo 1023 do CC refere que [a] locao diz-se arrendamento quando versa sobre
coisa imvel, aluguer quando incide sobre coisa mvel.
Da conjugao das disposies dos artigos 1022 e 1023 do CC, podemos dizer que o
contrato de arrendamento aquele mediante o qual uma das partes se obriga a proporcionar outra o gozo temporrio de uma coisa imvel1718, mediante retribuio.
assim um direito, como j referido quanto locao em geral, de natureza
obrigacional, que se funda no dever de o locador proporcionar ao locatrio, aqui senhorio e
arrendatrio respectivamente, o gozo temporrio da coisa para o fim a que esta se destina. No
h assim qualquer transmisso ou alienao da coisa dada e tomada de arrendamento. O titular
do direito real sobre a coisa no perde esse direito pelo facto de se obrigar a conceder o gozo
temporrio da coisa.
1.3.- Conceito de Estabelecimento Comercial
O conceito de estabelecimento comercial pode variar conforme a perspectiva de que
visto. Sob o ponto de vista econmico, estabelecimento comercial , num sentido amplo, a
organizao tcnica constituda por todos os factores que servem para o exerccio de uma
actividade comercial; num sentido restrito, pode designar uma loja, um armazm, uma fbrica,
uma oficina, um escritrio, etc.
Sob o ponto de vista jurdico, que o que nos interessa especialmente aqui (se bem que
nunca possamos pr de lado as noes da cincia econmica), a expresso estabelecimento
comercial no tem, face da legislao portuguesa, um significado rigoroso e preciso, antes nos
aparece em vrias acepes19.
Podemos procurar definir o estabelecimento comercial 20 como a organizao do
empresrio mercantil, o conjunto de elementos reunido e organizado pelo empresrio para
17O legislador, no artigo 204 do CC, define o que se consideram coisas imveis. Contudo s os prdios rsticos e urbanos ou as guas podem
servir de objecto do contrato de arrendamento. Cfr. Isidro Matos, Arrendamento e Aluguer. Breve comentrio ao captulo IV do Ttulo II do Livro II
(arts. 1022 a 1120 do Cdigo Civil),Coimbra, 1968, pp. 24 e seguintes.
18 A distino entre coisas mveis e imveis respeita apenas s coisas corpreas. Contudo no so apenas estas as susceptveis de serem
locadas. Por exemplo, a locao do estabelecimento comercial prevista no artigo 1109 do CC, para aqueles que entendem tratar-se de coisa
incorprea.
19Barbosa de Magalhes, Do estabelecimento comercial, in: Estudos de Direito privado, 2 ed., Lisboa, Edies tica, 1964, p. 13.
20O conceito de estabelecimento comercial pode ser entendido como sinnimo de empresa quando abordada como empresa objecto. este o
sentido tido em conta na redaco do regime do estabelecimento individual de responsabilidade limitada, constante do DL n 248/86, de 25 de
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atravs dele exercer a sua actividade comercial, de produo ou circulao de bens ou prestao
de servios21.
Daqui podemos retirar que pressuposto da existncia de um estabelecimento
comercial um titular, que ser o empresrio, que rene esses diversos meios destinados prossecuo da sua actividade.
Assim, tem de haver um acervo patrimonial, mais ou menos amplo, que englobar um
conjunto organizado de coisas e direitos de diversa natureza e categoria.
O estabelecimento implica tambm um suporte humano. Pelo que, em regra, congrega
um conjunto de pessoas, mediante vnculos jurdicos de diversa natureza. Pode, contudo, este
suporte humano, cingir-se ao empresrio. O importante que este suporte humano, plural ou
no, prossiga a finalidade comum visada com o estabelecimento.Nestes termos, estes diversos elementos no so uma mera soma das partes, mas um
todo interligado pelo elemento organizacional, articulando-se estavelmente com vista
prossecuo do seu fim mercantil. Esta organizao funcional, pois atende actividade
econmica que o empresrio pretende prosseguir, a qual ser, ou visar ser, lucrativa.
Grosso modo, s perante estes factores poderemos considerar estar perante um
estabelecimento comercial. Constata-se, assim, que se trata de um bem jurdico complexo, o
qual integra vrios elementos. O estabelecimento tem qualidades prprias que fazem com que o
seu todo complexo seja mais que a soma das partes ou elementos que incorpora.
[A]lm de negocivel, o estabelecimento um valor ou bem econmico ou patrimonial,
transpessoal (cindvel ou isolvel da pessoa que o criou, ou da pessoa a quem pertena em dado
momento como se demonstra pelos casos de transmisso definitiva, inter vivos ou mortis
causa), duradouro (no s transfervel e assumvel, mas retrotransfervel e reassumvel facto
evidenciado nas transmisses temporrias), reconhecvel e irredutvel (algo que contra-distingue
os negcios como negcios sobre o estabelecimento, e que no se confunde com outros bens
a ele ou no ligados)22.
Se o estabelecimento pode ser negociado, ele objecto e no sujeito de direitos.
Agosto e nos artigos 5 e 162 do Cdigo da Insolvncia e Recuperao de Empresas. Cfr. Miguel Pupo Correia, Direito Comercial,11 edio,
revista e actualizada, Coimbra, 2009, p. 44; e Coutinho de Abreu,Da empresarialidade (As empresas no Direito),Coimbra, Almedina, 1996, pp.
41 e seguintes.
21Miguel Pupo Correia, op cit., p. 50.
22Coutinho de Abreu,Da empresarialidade, cit.., p. 42.
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Sendo um bem complexo, ele composto por diversos elementos, os quais no so
uniformes a todos os estabelecimentos, antes variando consoante a actividade desenvolvida.
Podemos enunciar alguns elementos que frequentemente compem o complexo que o
estabelecimento. Assim, temos, por um lado, as coisas corpreas, inter alia, imveis,maquinaria, matrias primas e mercadorias, coisas incorpreas, como sinais distintivos do
comrcio e proteco de inovaes, outros tipos de bens que no se possam considerar coisas,
por exemplo, as prestaes de trabalho e de servios, o saber-fazer e relaes com clientes e
fornecedores.
H ainda autores23 que consideram como elementos do estabelecimento comercial o
aviamento e a clientela24.
Podemos procurar caracterizar [a]clientela ()[como o equivalente],()ao conjunto,real ou potencial, de pessoas dispostas a contratar com o estabelecimento considerado, nele
adquirindo bens ou servios25.
Por outro lado, tratando-se de algo diverso, temos o aviamento. O qual, em traos largos,
diremos que a mais-valia que o estabelecimento enquanto organizao complexa representa
relativamente soma dos vrios elementos que o compe, o maior valor do todo organizado.
Traduz a aptido funcional e produtiva do estabelecimento26.
Estes dois elementos, para quem assim os considere, embora susceptveis de tutela,
no podem, enquanto tais, serem objectos de direitos subjectivos. So factores que valorizam o
estabelecimento, mas que nada garante que, transmitido este, o transmissrio consiga manter o
aviamento e a clientela nos precisos termos em que estes figuravam no estabelecimento
anteriormente ao negcio.
Para outros autores 27 o aviamento no um elemento, mas sim uma qualidade do
estabelecimento28. O aviamento no concebvel de forma autnoma do estabelecimento, pelo
que tutelado em funo deste, e no por ser susceptvel de ser objecto de direitos subjectivos
por si s.
23Cfr. a ttulo de exemplo Menezes Cordeiro, Manual de Direito Comercial, vol. I, Coimbra, Coimbra editora, 2001, pp. 288 e seguintes.
24Miguel Pupo Correia, op cit.., p. 53 e seguintes, quanto clientela.
25Menezes Cordeiro, op cit., p. 290.
26Menezes Cordeiro, op cit., p. 290.
27Cfr. a ttulo de exemplo Ferrer Correia, Lies de Direito Comercial, vol. I, Coimbra, Coimbra editora, 1973, pp. 117 e seguintes; Miguel Pupo
Correia, op cit., p. 55 e 56, quanto ao aviamento.
28H quem tenha comparado o aviamento da empresa fertilidade de um terreno: so qualidades de uma coisa, no coisas em si. inFerrer
Correia, ltima op cit., p. 119, nota 2.
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A questo que se coloca se para se poder afirmar estar perante um estabelecimento
comercial tm de verificar-se todos os elementos enunciados. E a resposta no unssona.
Para aqueles que fazem coincidir o estabelecimento comercial com a clientela ou que,
pelo menos, vem nesta o seu elemento preponderante, no caso de uma organizao que renatodos os elementos para iniciar a sua actividade, mas que ainda no iniciou, e como tal no
possui ainda clientela, concluiriam que no.
Igual afirmao fariam os que entendem que a tutela do estabelecimento se faz em
razo do seu aviamento, que no caso exemplificado no existiria.
Em sentido diverso tem-se pronunciado a maioria da doutrina portuguesa 29 .
Argumentando que se j existe uma organizao complexa apta a realizar o fim econmico
visado, que lhe permita vir a obter uma clientela poder-se- dizer que j estamos perante umestabelecimento comercial. Tratar-se- j de um novo bem jurdico no identificvel ou no
redutvel soma das partes que o compem.
Tal questo reveste-se da maior importncia nos casos de negociao do
estabelecimento comercial. Nomeadamente quando o mesmo se encontra instalado em prdio
arrendado. Pelo que a tutela do estabelecimento face posio do senhorio ir depender, antes
do mais, de estarmos ou no na presena de um estabelecimento comercial.
E se o estabelecimento ainda no se encontra em funcionamento, haver aviamento?
Pode-se entender que o estabelecimento nestas circunstncias j possui aviamento30, no
sentido de que se encontra j apto para produzir e gerar lucro. a organizao funcionalmente
apta a esse fim que gera o aviamento. A clientela efectiva no assim imprescindvel neste
momento. Uma vez iniciando o seu funcionamento a clientela, embora de crucial importncia,
um elemento, entre outros, que contribui para o aviamento. Assim, por exemplo, as relaes
com fornecedores, credores e trabalhadores.
Outros entendem que s se pode falar em aviamento aps o estabelecimento se
encontrar em funcionamento, sendo que antes deste momento nem estaremos perante um
estabelecimento, o qual s criar esse plus face soma das partes aps iniciar a sua
actividade31.
29Coutinho de Abreu, ltima op cit., pp. 46 e seguintes; Ferrer Correia, Reivindicao de estabelecimento comercial como unidade jurdica, in:
Estudos de Direito Civil, Comercial e Criminal, Coimbra, Coimbra editora, 2 edio, 1985, p. 255.
30Coutinho de Abreu, ltima op cit., pp. 48 e ss.
31 Neste sentido Oliveira Ascenso e Menezes Cordeiro, in Cesso de explorao de estabelecimento comercial, arrendamento e nulidade
formal, ROA, ano 47 (1987), pp. 883 e 884.
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Igual questo se pode levantar relativamente a saber se j existe estabelecimento
comercial quando este complexo de bens destinados a dada actividade, ainda no entrou em
funcionamento e lhe faltam um ou mais dos elementos essenciais para que este se inicie. E as
respostas e argumentos so semelhantes aos acima enunciados.Diremos que depende de saber se essa organizao produtiva se encontra apta a entrar
em funcionamento e transmite, j neste momento, uma imagem de um novo bem face soma
das partes que o compem.
Como referimos, a resposta a esta questo vai influir no regime a aplicar a um negcio
sobre aqueles bens. Por exemplo, ser de arrendamento a locao do imvel se se entender no
estarmos perante um estabelecimento. Ser de locao de estabelecimento se, sendo essa a
vontade das partes, se entender que existe j um estabelecimento.De igual modo pode questionar-se se um estabelecimento que j funcionou pode ser
transmitido despojado de algum ou alguns dos seus elementos. Se a vontade das partes
transmitir o estabelecimento como todo, mas lhe subtraem dados elementos por exemplo,
maquinaria numa unidade fabril esse negcio pode considerar-se incidir sobre o
estabelecimento e no sobre os singulares bens transmitidos?
Grosso modo diremos que o estabelecimento que j est em actividade ter valores de
explorao, afirmando-se como tal junto da clientela, fornecedores, credores e seus
trabalhadores ou colaboradores. Como tal, para esse estabelecimento ser identificvel por tais
pessoas, mormente pelo pblico, depende agora menos dos seus elementos ostensivos. Por
exemplo, a transmisso de um restaurante, no deixa de o ser, se se exclurem do negcio as
moblias.
H contudo que respeitar o denominado mbito mnimo de entrega sem o qual no
poderemos afirmar estar perante o mesmo estabelecimento comercial. E como tal no merecer
o favor da lei relativamente aos negcios sobre o estabelecimento, nomeadamente, no se
subtrair ao regime do arrendamento quando tal esteja implicado.
Como poderemos determinar se se esto a transmitir os elementos necessrios para
que se respeite esse mbito mnimo?
No possvel enumerar em abstracto os elementos do mbito mnimo do
estabelecimento enquanto objecto negocivel. Pode dizer-se, em termos genricos, que esse
mbito h-de envolver os bens com possibilidade de aprisionarem () a imagem do todo e
espelharem essa imagem aos olhos do pblico. O pblico acredita, em presena desses bens,
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que ali est () determinado estabelecimento; eles ho-de ser aptos a exprimir a organizao
no seu conjunto32.
Apesar de ser verdade que a clientela se pode fixar pessoa titular do estabelecimento,
no se pode confundir este com aquele. No suficiente, para se caracterizar uma organizaocomo um e mesmo estabelecimento comercial, o facto de um dos seus elementos, ainda que de
peso, acompanhe alguns bens. Por exemplo, a firma, uma marca, ou a pessoa do titular,
ainda que por si sejam capazes de atrair a clientela.
Temos de estar perante a mesma organizao complexa capaz de conjuntamente
captar a clientela e gerar aviamento.
Tal raciocnio no obsta a que possam ser celebrados negcios sobre partes de
estabelecimentos que se revistam de autonomia. Pense-se num estabelecimento hoteleiro comum restaurante. Pode celebrar-se negcio sobre o estabelecimento restaurante, permanecendo o
hotel com o anterior titular. Ainda assim o restaurante, se outros factores a isso no obstarem,
continua a ser o mesmo estabelecimento.
Aqui chegados, cumpre averiguar se o estabelecimento comercial , ou no, uma
unidade jurdica autnoma33? Isto , ele regulado como um todo, ou a disciplina que se lhe
aplica determinada pela singularidade dos elementos que o compem?
Entendemos ser de subscrever o entendimento segundo o qual o estabelecimento
comercial deve ser entendido como uma unidade jurdica 34 , e no somente como unidade
econmica.
Do supra exposto resulta que o estabelecimento deve ser encarado como um todo
organizado que supera a soma das partes. De igual modo deve o direito encarar o
estabelecimento no seu conjunto.
Assim sendo, o estabelecimento unitariamente objecto de direitos, podendo ser
reivindicada a sua propriedade, ou a sua posse, sem necessidade de reagir face a cada um dos
singulares elementos que o compem.
32Coutinho de Abreu, ltima op cit., p. 54.
33No iremos aqui percorrer o caminho da anlise da natureza jurdica do estabelecimento comercial. Sobre este tema, e a ttulo de resumo
exemplificativo, vide Miguel Pupo Correia, op cit., pp. 56 e ss; e Nuno Aureliano, A obrigao de no concorrncia do trespassante de
estabelecimento comercial no Direito portugus, in: Estudos em homenagem ao Professor Doutor Inocncio Galvo Telles, vol. IV, Coimbra,
Coimbra editora, 2003, pp. 728 e ss, nota n 43.
34Ferrer Correia, Reivindicao de estabelecimento comercial, cit., pp. 262 e ss.
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Esta universalidade no compreende s as mercadorias, matrias primas, mquinas,
os instrumentos produtivos, mas abrange ainda bens imateriais (crditos, marcas, patentes de
inveno, o nome comercial, etc.) e certas situaes ou relaes de facto com relevo econmico
(o crdito de que goza o estabelecimento, a clientela que possui) enfim, o aviamento daempresa. () O estabelecimento no est nas prprias coisas, est na organizao delas para
os fins da produo: uma unidade de fim. Ver s as coisas em si, abstrair do conjunto, da
fora de coeso que as prende ver as arvores e no ver a floresta35.
Em apoio deste entendimento podemos avanar o teor de vrias normas legais. Desde
logo o artigo 1112, n 1, alnea a) (correspondente ao anterior artigo 115 do RAU), sob a
epgrafe Transmisso da posio do arrendatrio diz o seguinte []permitida a transmisso
por acto entre vivos da posio do arrendatrio, sem dependncia da autorizao do senhorio:[n]o caso de trespasse de estabelecimento comercial ou industrial. Acrescenta a alnea a), do
n 2 do mesmo artigo que [n]o h trespasse: [q]uando a transmisso no seja acompanhada
de transferncia, em conjunto, das instalaes, utenslios, mercadorias ou outros elementos que
integram o estabelecimento. Tal norma versa sobre a transmisso, unitria e globalmente
considerada, do estabelecimento comercial e cria uma excepo face s normas constantes dos
artigos 1059, n 2 e 1038, alnea f), ambos do Cdigo Civil, que regulam o regime da locao
em geral, criando um regime de favor para a transmisso do estabelecimento comercial
enquanto unidade.
Semelhante proteco da negociabilidade do estabelecimento comercial nos d o artigo
1109 do Cdigo Civil (correspondente ao anterior artigo 111 do RAU), o qual sob a epgrafe
Locao de estabelecimento nos diz que 1. [a]transferncia temporria e onerosa do gozo de
um prdio ou de parte dele, em conjunto com a explorao de um estabelecimento comercial ou
industrial nele instalado, rege-se pelas regras da presente subseco, com as necessrias
adaptaes.36 2. A transferncia temporria e onerosa de estabelecimento instalado em local
arrendado no carece de autorizao do senhorio, mas deve ser-lhe comunicada no prazo de um
ms.
Daqui se depreende que o estabelecimento visto por estas normas como unidade,
sendo negociado como um todo, sem haver autonomizao do prdio no caso, arrendado
em que se encontra instalado.
35Ferrer Correia, ltima op cit., p. 263.
36O que parece remeter para o anteriormente referido artigo 1112.
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Esta realidade unitria depreende-se tambm de algumas normas do Cdigo da
Propriedade Industrial37, nomeadamente o artigo 304-P, referente ao logtipo, que, nos seus
nmeros 2 e 3 refere o seguinte: 2. [q]uando seja usado num estabelecimento, os direitos
emergentes do pedido de registo ou do registo de logtipo s podem transmitir-se, a ttulogratuito ou oneroso, com o estabelecimento, ou parte do estabelecimento, a que esto ligados. 3.
Sem prejuzo do disposto no n. 5 do artigo 31., a transmisso do estabelecimento envolve o
respectivo logtipo, que pode continuar tal como est registado, salvo se o transmitente o
reservar para outro estabelecimento, presente ou futuro. a considerao do estabelecimento
como um todo que faz com que este sinal distintivo do comrcio faa parte do mbito natural
de transmisso no negcio sobre o estabelecimento.
Como universalidade o estabelecimento considerado tambm pelo legislador doCdigo de Processo Civil 38 . Desde logo o artigo 823., sob a epgrafe Bens relativamente
impenhorveis, no seu nmero 2, alnea c), diz que [e]sto tambm isentos de penhora os
instrumentos de trabalho e os objectos indispensveis ao exerccio da actividade ou formao
profissional do executado, salvo se: [f]orem penhorados como elementos corpreos de um
estabelecimento comercial, o que implica o seu reconhecimento como unidade, sendo aqueles
elementos corpreos apenas parte daquele todo uno. O artigo 834, n 2 do mesmo normativo
admite a penhora de estabelecimento comercial como um todo. Da mesma forma o artigo 862-
A refere que 1 [a] penhora do estabelecimento comercial faz-se por auto, no qual se
relacionam os bens que essencialmente o integram, aplicando-se ainda o disposto para a
penhora de crditos, se do estabelecimento fizerem parte bens dessa natureza, incluindo o
direito ao arrendamento. () 5 - A penhora do direito ao estabelecimento comercial no afecta a
penhora anteriormente realizada sobre bens que o integrem, mas impede a penhora posterior
sobre bens nele compreendidos.
Este artigo parece ir no sentido em exposio, porquanto trata da penhora do
estabelecimento como um todo, estabelecendo a relao com eventuais penhoras que tenham
incidido sobre um mero elemento que o integre.
Tambm o artigo 901-A do mesmo diploma prev a venda do estabelecimento
comercial como um todo, e no dos vrios elementos singulares que o compem.
37Aprovado pelo Decreto-Lei n 36/2003, de 5 de Maro, e j sucessivamente alterado.
38 Aprovado pelo DL n. 329-A/95, de 12 de Dezembro, e sucessivamente alterado, sendo a verso mais recente a introduzida pelo DL n.
52/2011, de 13 de Abril.
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Embora seja controversa a qualificao do estabelecimento comercial como
universalidade 39 , [t]alvez seja legtimo pensar que este vocbulo, tendo em conta certa
significao geral atribuvel s diversas espcies de universalidades, sempre contribuir para
acalentar a tese da unidade jurdica do estabelecimento mercantil40
.
Relacionado com esta temtica, e de particular importncia prtica, est a questo de
saber qual a natureza dos direitos que podem incidir sobre o estabelecimento comercial,
nomeadamente ser objecto de direitos reais.
A doutrina maioritria tem subscrito o entendimento segundo o qual o estabelecimento
comercial, enquanto unidade jurdica, pode ser objecto de propriedade, e como tal, inter alia, de
posse, usucapio, de aces de reivindicao e possessrias, de usufruto e de penhor.41
Apesar da redaco do artigo 1302 do Cdigo Civil referir que [s] as coisas
corpreas, mveis ou imveis, podem ser objecto do direito de propriedade regulado neste
cdigo, o mesmo cdigo, no seu artigo 1303, reconhece outros direitos de propriedade sobre
bens de natureza imaterial. Assim, a norma por ltimo referida, sob a epgrafe propriedade
intelectual, diz no seu nmero 1 que [o]s direitos de autor e a propriedade industrial esto
sujeitos a legislao especial. Pelo que no se colocam entraves de maior ao reconhecimento
de direitos reais sobre bens incorpreos.
Existem j no nosso ordenamento jurdico disposies que parecem ir neste sentido:
A L. n 68/78, de 6.10, permite expressamente, no art. 40, que os proprietrios das
empresas ou estabelecimentos em auto-gesto os reivindiquem ou peam a restituio da sua
posse;
O art. 181 do CIRE expressamente admite a alienao da empresa (expresso para a
qual o art. 5 do mesmo cdigo adopta um significado objectivo) ou de estabelecimentos
(decerto no sentido de unidades tcnicas de produo) do devedor insolvente; alis em
consonncia com o art. 862 - A do CPC (introduzido pelo DL n 329 - A/95, de 12.12), que
expressamente prev e disciplina a penhora do estabelecimento comercial, distinguindo-a com
nitidez da penhora dos bens que o integram (cfr. os ns 6 e 7 deste artigo);
39Cfr. Coutinho de Abreu, ltima op cit., pp. 72 e ss.
40Coutinho de Abreu, ltima op cit.,p. 75.
41 Ferrer Correia, Reivindicao de estabelecimento comercial; Orlando de Carvalho, Critrio e estrutura do estabelecimento comercial. O
problema da empresa como objecto de negcios, Coimbra, 1967; Miguel Pupo Correia, Direito Comercial, 11 edio, revista e actualizada,
Coimbra, 2009; contra (aps a entrada em vigor do actual Cdigo Civil) Pires de Lima e Antunes Varela, Cdigo Civil Anotado, Coimbra Editora,
Coimbra, volume III, 1972, pp. 75 e ss.
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O art. 21 do DL n 248/86 permite que o estabelecimento individual de
responsabilidade limitada seja transmitido por acto gratuito ou oneroso, ou dado em locao;
O art. 44 do Reg-RNPC () claramente prev a transmissibilidade entre vivos do
estabelecimento comercial.42
.Sendo possvel o estabelecimento constituir objecto do direito de propriedade, ser
tambm de admitir a posse sobre o mesmo, porquanto, nos termos do artigo 1251 do Cdigo
Civil [p]osse o poder que se manifesta quando algum actua por forma correspondente ao
exerccio do direito de propriedade ou de outro direito real. De igual modo se deve admitir a
possibilidade de constituio de usufruto e de penhor sobre o estabelecimento.
Consequentemente o estabelecimento deve ser susceptvel de aces de reivindicao e
demais meios de defesa da propriedade e da posse.Pelo que de admitir a defesa do estabelecimento mediante a deduo de embargos de
terceiro. Assim parece apontar a letra do artigo 351 do CPC, o qual determina que [s]e a
penhora, ou qualquer acto judicialmente ordenado de apreenso ou entrega de bens, ofender a
posse ou qualquer direito incompatvel com a realizao ou o mbito da diligncia, de que seja
titular quem no parte na causa, pode o lesado faz-lo valer, deduzindo embargos de terceiro.
Permite-se assim a defesa da posse ou qualquer outro direito sobre estabelecimento comercial
que possa ser ofendido pela diligncia. Esta aco incidir sobre o todo unitrio e no sobre os
diversos elementos singularmente considerados que compem o estabelecimento, o que seria,
na realidade, impraticvel.
De igual modo, cumpridos que estejam os requisitos gerais dos artigos 1287 a 1292 e
os especiais dos artigos 1298 a 1301, todos do CC, ser de admitir a aquisio do
estabelecimento comercial por usucapio.
O mesmo se diga quanto constituio de usufruto sobre o estabelecimento, sendo que
o gozo temporrio e pleno do estabelecimento alheio sem alterar a sua forma ou substncia,
conforme previsto no artigo 1439 do Cdigo Civil, deve ser entendido no sentido de o
usufruturio do estabelecimento manter um funcionamento regular deste por ordem a manter o
seu aviamento. A admissibilidade deste direito real de gozo expressamente consagrada quanto
ao estabelecimento individual de responsabilidade limitada. Igualmente se admite o penhor
sobre o estabelecimento43.
42Miguel Pupo Correia, ltima op cit., p. 66.
43Cfr. artigo 21, n 1, do DL 248/86.
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A violao dos direitos que incidam sobre o estabelecimento so susceptveis de gerar
responsabilidade civil, nos termos gerais do artigo 483 do Cdigo Civil44.
Quando essa conduta afecte o todo unitrio, e tal conduta seja praticada por outro
comerciante, entraremos no campo dos actos de concorrncia desleal45
.Quando no se tratem de actos de concorrncia, mas de quaisquer condutas ilcitas e
que no estejam previstas em nenhuma norma especial, ser de lanar mo do regime geral,
podendo gerar a obrigao do infractor indemnizar o titular do estabelecimento.
1.4.- Distino do estabelecimento comercial face ao imvel
Para melhor compreenso da negociao do estabelecimento comercial, ser
conveniente abordar a relao deste com o imvel onde se encontre instalado.
Ressalve-se, desde j, que nem todos os estabelecimentos carecem deste elemento.
Pense-se nos estabelecimentos de venda ambulante. Desta forma a abordagem que agora nos
ocupa incidir sobre a situao maioritria de estabelecimento instalado em imvel.
Estas duas realidades estabelecimento e imvel surgem muitas vezes, pelo menos
aos olhos do leigo, como sinnimos. O pressuposto de que o estabelecimento mercantil
uma espcie de epifenmeno do prdio (ou do direito utilizao do prdio) em que se exerce a
actividade comercial, por muito ingnuo e obsoleto que surja aos olhos de qualquer jurista
medianamente instrudo, no deixa de emergir e influir em mltiplas solues da nossa
magistratura contempornea46.
H que distinguir, desde logo a propriedade, ou outro direito real, sobre o prdio, da
propriedade, ou outro direito real, sobre o estabelecimento comercial. Um no implica o outro.
Assim, o titular do prdio pode ser o titular do estabelecimento, ou no. Pode o estabelecimento
estar instalado em prdio arrendado. Pode at o estabelecimento ser locado, e aqui, quem
explora o estabelecimento um sujeito, o proprietrio deste outro, e o proprietrio do prdio
um terceiro. O imvel pode estar na organizao mercantil a diversos ttulos, como sejam, a
ttulo de exemplo, a propriedade, o usufruto, o arrendamento, a mera disponibilidade simples e
44 E claro, se se tratar da violao do direito sobre concretos elementos que componham o estabelecimento, pode o titular reagir contra essa
violao, no carecendo aqui de alegar o seu direito sobre o todo unitrio o estabelecimento.
45Cfr., exemplificativamente, o artigo 317 do CPI.
46Orlando de Carvalho, Alguns aspectos da negociao do estabelecimento, RLJ, Ano 114, n 3693, p. 360.
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comodato. Nada se altera tambm no estabelecimento se o imvel era detido a um ttulo e
passou a ser detido por outro. Pense-se, como mero exemplo, no caso de o imvel ser
arrendado e posteriormente adquirida a sua propriedade pelo titular do estabelecimento, ou vice
versa. Pelo que no se confundem estas qualidades, as quais apresentam particular relevo nasrelaes entre prdio e estabelecimento e sua negociao.
Embora o prdio com os seus apetrechos tenha um peso absorvente nessa organizao
mercantil, esta suplanta esse elemento fundirio, abrangendo o complexo da explorao
constituda, com os seus elementos corpreos e incorpreos, a sua fama, a sua clientela, as
relaes com os fornecedores e o pblico, etc., elementos que podem faltar eventualmente, em
maior ou menor nmero, numa negociao em concreto, sem que desaparea por isso a
organizao a que respeitam: basta que os elementos restantes tenham fora para conter ouexprimir em si para aprisionar e ostentar, se quisermos a realidade da organizao no seu
conjunto47.
Pode assim, haver alienao ou locao do estabelecimento sem que o elemento
prdio o acompanhe. E no se encontrando o estabelecimento absolutamente vinculado a
este, no deixa de haver um negcio sobre aquele mesmo estabelecimento, que manter a sua
identidade e organizao tal como anteriormente ao negcio.
Nestes termos 48 , estando um estabelecimento comercial instalado em imvel alheio,
arrendado pelo proprietrio do estabelecimento, dado este em locao a terceiro, tal no
configura uma sublocao49do prdio ao locatrio do estabelecimento, porquanto o locatrio do
estabelecimento recebe a disponibilidade do prdio como um, entre muitos, dos elementos que
compem o todo global e unitrio correspondente ao estabelecimento. O proprietrio do
estabelecimento e arrendatrio do prdio continua a ser o mesmo. Ele cedeu apenas o gozo ou
explorao do seu estabelecimento como um todo, do qual faz parte o uso do prdio para esse
fim, no se alterando a sua posio face ao estabelecimento, pelo menos quanto propriedade,
nem a sua posio de arrendatrio do prdio.
47Orlando de Carvalho, ltima op cit., p. 363.
48Cfr. a situao prtica e os argumentos aduzidos por Orlando de Carvalho, in Alguns aspectos, ltima op cit., pp. 9 ss., n 3699, pp. 164
ss., n 3701, pp 231 ss.
49Pode ocorrer, paralelamente ao negcio sobre o estabelecimento, um negcio sobre o prdio, seja sublocao, arrendamento, ou mesmo
venda. Contudo no a situao que se visa retratar.
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1.5.- Distino do Contrato de Locao de Estabelecimento Comercial face
ao Contrato de Trespasse
Conforme temos vindo a analisar, o estabelecimento comercial composto por umconjunto de elementos, os quais se enquadram numa organizao, no se cingindo soma das
partes individualmente consideradas.
uma unidade econmica e jurdica que, como tal, pode ser unitariamente objecto de
negcios, no obstante a diferente natureza dos elementos que compe o estabelecimento.
Dentro da multiplicidade dos negcios sobre o estabelecimento, vamos procurar
distinguir o contrato de locao do estabelecimento comercial, do contrato de trespasse do
mesmo.O trespasse uma figura que abarca vrias realidades com especificidades diversas.
Vrias normas legais aludem a esta figura sem contudo a definirem. To pouco resulta dessas
normas uma disciplina legal que regule globalmente estes negcios. Surge assim a necessidade
de, face a cada uma dessas normas, se interpretar o sentido em que a expresso usada para
se poder determinar o fim visado pela norma.
Tal no impede que se procure definir o trespasse, mas qualquer definio deve ser
suficientemente ampla para permitir abranger todas as realidades visadas.
Cumpre assim analisar as caractersticas do trespasse. Desde logo este s pode ter
como objecto a transmisso da propriedade sobre um estabelecimento comercial.
Por outro lado, a ele apenas se subsumem as transmisses definitivas da organizao,
excluindo-se todas as outras. O que est em causa , portanto, a transferncia do direito de
propriedade sobre o estabelecimento.
Acresce que nele s cabem os negcios celebrados entre vivos. Com efeito, a aluso ao
trespasse feita sempre por referncia a actos inter vivos (art. 115, n 1 RAU50, art. 11, n 1,
1 parte, do DL 149/95, de 25 de Junho). Na verdade, no h qualquer normativo atinente
matria sucessria que ao trespasse se reporte. Alis, no caso de sucesso por morte, a lei
demarca-se da locuo (art. 11, n 1, 2 parte do ltimo diploma citado e art. 44, n 3 RNPC),
criando-se at, nalguns casos, um regime paralelo, diverso daquele outro (no homogneo)
inerente ao trespasse.
50Actualmente artigo 1112, n 1 do Cdigo Civil.
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Por fim, realce-se que o trespasse reveste frequentemente carcter oneroso sendo
assim entendido nalguns preceitos (art. 116, n 1 RAU51, e art. 152, n 2, al. d) CSC) mas
no foroso que tal suceda. Nele cabem ainda os negcios gratuitos. A lei consagra-o, umas
vezes, de modo expresso (v.g., no art. 100, n 1 CDA), enquanto que noutras dele decorretacitamente.52
Vejamos, sucintamente, quais as realidades que se enquadram na figura do trespasse.
Desde logo, e a mais frequente, a celebrao voluntria de contrato de compra e
venda, transmitindo-se a propriedade do estabelecimento, mediante um preo53.
Outras modalidades de venda, que no a voluntria, incidindo sobre o estabelecimento
comercial, configuram tambm um trespasse54. Assim, trespasse a venda do estabelecimento
no mbito de aco executiva, podendo este ser penhorado, conforme previsto no artigo 862-Ado CPC, e posteriormente vendido. Sendo que [a] venda em execuo transfere para o
adquirente os direitos do executado sobre a coisa vendida55.
De igual modo, a venda de um estabelecimento em sede de liquidao da massa
insolvente configura um trespasse56. Contudo, se no interesse dos credores ou por outro motivo
atendvel, como seja a falta de propostas para a aquisio do estabelecimento, forem vendidos
bens individualmente considerados, que antes compunham o estabelecimento, uma vez que j
no se trata de transmisso do estabelecimento, no se configurar, aqui, um trespasse.
Outros negcios que transmitam a ttulo definitivo a propriedade sobre o
estabelecimento comercial, para alm da venda, configuram, de igual sorte, um trespasse.
Assim ser no caso da dao em cumprimento prevista nos artigos 837 e seguintes do Cdigo
Civil, da troca nos termos do artigo 939 do mesmo diploma e a doao prevista nos artigos
940 e seguintes do mesmo cdigo.
No mbito de operaes societrias tambm se pode igualmente verificar um trespasse.
51Hodiernamente artigo 1112, n 4 do Cdigo Civil.
52Fernando De Gravato Morais, Alienao e onerao, ltima op cit., pp. 79 80.
53Cfr. artigo 874 do Cdigo Civil.
54Cfr. Fernando De Gravato Morais, ltima op cit., pp. 80 84.
55Cfr. artigo 824 do Cdigo Civil.
56 a seguinte a redaco do artigo 162 do CIRE, o qual tem como epgrafe alienao de empresa (o que se deve entender em sentido
objectivo, como se referindo ao estabelecimento comercial): 1 [a]empresa compreendida na massa insolvente alienada como um todo, a
no ser que no haja proposta satisfatria ou se reconhea vantagem na liquidao ou na alienao separada de certas partes. 2 - Iniciadas as
suas funes, o administrador da insolvncia efectua imediatamente diligncias para a alienao da empresa do devedor ou dos seus
estabelecimentos.
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Ser o caso da entrada numa sociedade ser constituda por um estabelecimento
comercial57, aplicando-se o regime das entradas em espcie.
Tambm trespasse a transmisso de um ou vrios estabelecimentos para o patrimnio
de um ou vrios scios no mbito de liquidao do patrimnio social em sede de dissoluo dasociedade58.
Ainda no mbito da liquidao da sociedade, podem os scios optar por alienar o
estabelecimento, com o propsito de ter um resultado mais benfico para estes, o que ser um
trespasse59.
Tambm pode ocorrer um trespasse no quadro da fuso e/ou ciso de sociedades. De
facto o artigo 97 do CSC d-nos a noo e determina as modalidades de fuso de sociedades.
O seu n 1 determina que [d]uas ou mais sociedades, ainda que de tipo diverso, podem fundir-se mediante a sua reunio numa s. J o n 4 refere que [a] fuso pode realizar-se: a)
[m]ediante a transferncia global do patrimnio de uma ou mais sociedades para outra e a
atribuio aos scios daquelas de partes, aces ou quotas desta; b)[m]ediante a constituio
de uma nova sociedade, para a qual se transferem globalmente os patrimnios das sociedades
fundidas, sendo aos scios destas atribudas partes, aces ou quotas da nova sociedade.
O artigo 112 do mesmo normativo prescreve na sua alnea a)que [c]om a inscrio da
fuso no registo comercial () [e]xtinguem-se as sociedades incorporadas ou, no caso de
constituio de nova sociedade, todas as sociedades fundidas, transmitindo-se os seus direitos e
obrigaes para a sociedade incorporante ou para a nova sociedade.
Se neste patrimnio que se transfere definitivamente se incluir um ou mais
estabelecimentos comerciais, tal acto constituir um trespasse.
O mesmo se diga da ciso de sociedades quando no patrimnio a destacar se inclua um
ou mais estabelecimentos comerciais60.
57De facto o artigo 19, n 1, alnea b)do CSC, sob a epgrafe Assuno pela sociedade de negcios anteriores ao registo diz que [c]om o
registo definitivo do contrato, a sociedade assume de pleno direito: [o]s direitos e obrigaes resultantes da explorao normal de um
estabelecimento que constitua objecto de uma entrada em espcie ou que tenha sido adquirido por conta da sociedade, no cumprimento de
estipulao do contrato social.
58Cfr. artigos 141 e seguintes do CSC, em especial o artigo 148.
59Cfr. artigo 152, n 2, alnea d)do CSC.
60Cfr. o n 1 do artigo 118 do CSC, o qual referindo-se ciso de sociedades, sob a epgrafe noo e modalidades nos diz que []permitido
a uma sociedade: a) [d]estacar parte do seu patrimnio para com ela constituir outra sociedade; b) [d]issolver-se e dividir o seu patrimnio,
sendo cada uma das partes resultantes destinada a constituir uma nova sociedade; c) [d]estacar partes do seu patrimnio, ou dissolver-se,
dividindo o seu patrimnio em duas ou mais partes, para as fundir com sociedades j existentes ou com partes do patrimnio de outras
sociedades, separadas por idnticos processos e com igual finalidade.
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Por outro lado, temos o contrato de locao de estabelecimento comercial. Tambm
muitas vezes designado por cesso de explorao de estabelecimento comercial.
Trata-se, tal como no trespasse, de um negcio sobre o estabelecimento, contudo no
se d a sua transmisso definitiva, mas sim uma cedncia temporria do gozo ou explorao doestabelecimento. Nos termos do artigo 1025 do Cdigo Civil, o prazo mximo de durao inicial
do contrato de 30 anos.
A locao implica retribuio, segundo o artigo 1022 do CC, pelo que dado o seu
carcter necessariamente oneroso, se excluem as transferncias gratuitas. Essa retribuio
embora, em regra, seja pecuniria, fixa e regular, pode tambm ser prestada em espcie ou ter
cariz misto. A sua nomenclatura legal actualmente varivel. Enquanto o artigo 111 do
revogado RAU a designava por cesso de explorao do estabelecimento comercial, a normaque lhe veio suceder, isto , o artigo 1109 do CC, designa de locao de estabelecimento. O
artigo 269, alnea e) do CIRE, semelhana do RAU, refere-se cesso da explorao de
estabelecimentos da empresa. Por seu turno, os artigos 1682-A, n 1, alnea b), do CC e o
artigo 246, n 2, alnea c)do CSC designam por locao de estabelecimento. Esta variao
de nomenclatura verifica-se, de igual modo, na doutrina e na jurisprudncia.
Embora designem a mesma realidade parece prefervel o nomen juris locao de
estabelecimento, hoje consagrado no referido artigo 1109 do CC. Pois [d]o que se trata aqui
de um verdadeiro contrato de locao (de uma coisa mvel sui generis). Nele esto presentes
os elementos essenciais deste tipo negocial, a saber: a obrigao de proporcionar o gozo de uma
coisa, de modo temporrio e mediante retribuio (art. 1022 CC). O seu carcter especfico
reside na singularidade do bem em causa, justamente o estabelecimento comercial.
Assim um dos contraentes, o locador, mantendo-se proprietrio da organizao
mercantil, transfere para outrem a sua explorao. O locatrio do estabelecimento exerce a
actividade, em seu nome e por sua conta e risco, pagando como contrapartida um determinado
montante. Expressa-se, deste modo, a sinalagmaticidade deste negcio, bem como o seu
carcter continuado (em relao ao locador) e peridico (em relao ao locatrio)61.
Tal como para a transmisso definitiva trespasse como para a locao, no
condio essencial que a actividade do estabelecimento se tenha j iniciado, ou que no esteja
interrompida. sim indispensvel, para que exista um destes negcios, que haja uma
organizao apta a funcionar.
61Fernando De Gravato Morais, ltima op cit., pp. 136 138.
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A locao de estabelecimento comercial ser legalmente tpica, pois existe
regulamentao legal, embora de forma ampla, dispersa e incompleta.
1.6.- Forma
O revogado artigo 80, n 2, alnea m)do Cdigo do Notariado, sob a epgrafe Exigncia
de escritura impunha a celebrao do contrato de locao de estabelecimento comercial e
industrial mediante escritura pblica.
O DL 64-A/2000, de 22 de Abril, veio revogar a referida norma e alterar o RAU,
passando o artigo 111, n 3 deste a determinar que [a] cesso de explorao do
estabelecimento comercial deve constar de documento escrito, sob pena de nulidade.
A ltima parte do artigo, ainda que dele no constasse, sempre seria o efeito do vcio de
forma, atendendo redaco do artigo 220 do Cdigo Civil.
Passou, assim, a forma legalmente exigida a ser simples documento escrito.
Tal exigncia de forma manteve-se com a entrada em vigor do NRAU, o qual veio regular
esta matria introduzindo nova redaco (no que ora importa) nos artigos 1109 e 1112 do
Cdigo Civil. Nestes termos o artigo 1109, no seu n 1, ltima parte diz que a locao de
estabelecimento rege-se pelas regras da presente subseco 62 , com as necessrias
adaptaes. Atendendo remisso legal, de aplicar a exigncia de forma prevista no artigo
1112, referente ao trespasse, onde no seu n 3 se l [a]transmisso deve ser celebrada por
escrito e comunicada ao senhorio.
Conforme resulta do artigo 220, o desrespeito pela forma legalmente exigida gera a
nulidade do contrato.
Esta nulidade do contrato de locao, quando o estabelecimento esteja instalado em
imvel arrendado, pode repercutir-se na sorte deste contrato, porquanto o artigo 1083, n 2,
alnea e), do Cdigo Civil permite ao senhorio resolver o contrato de arrendamento quando
ocorra [a] cesso, total ou parcial, temporria ou permanente e onerosa ou gratuita, quando
ilcita, invlida ou ineficaz perante o senhorio.
Contudo, quando seja vlida, a locao de estabelecimento comercial instalado em
imvel arrendado no carece de autorizao do senhorio, mas deve ser comunicada a este no
62Subseco VII, referente s [d]isposies especiais do arrendamento para fins no habitacionais.
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prazo de um ms, conforme resulta do artigo 1109, n 2 do Cdigo Civil. Esta soluo legal faz
prevalecer os interesses de proteco do estabelecimento comercial e a sua negociabilidade,
sobre os interesses do senhorio. No faria, de igual modo, sentido, no carecer de
consentimento do senhorio o trespasse, e j haver essa necessidade na locao doestabelecimento, em que nem sequer h alterao da pessoa do arrendatrio do imvel, nem do
proprietrio do estabelecimento.
H ainda que atender a normas relativas comunho conjugal no caso de comerciante
casado em qualquer um destes regimes. Resulta do artigo 1682-A, n 1, alnea b), do Cdigo
Civil, referente [a]lienao ou onerao de imveis e de estabelecimento, que carece do
consentimento de ambos os cnjuges a locao de estabelecimento comercial, prprio ou
comum.O consentimento deve revestir a mesma forma exigida para o negcio, o que no
presente caso ser simples escrito63.
A falta de consentimento no importa j a nulidade do acto mas a sua anulabilidade.
Esta pode ser invocada pelo cnjuge que no prestou o seu consentimento ou pelos seus
herdeiros64.
Ainda que formalmente se cumpram todos os requisitos exigidos legalmente, a locao
do estabelecimento s oponvel ao senhorio do imvel se aquela realmente existir, isto , se
no se tratar de um negcio simulado, e como tal nulo, que visava no a locao do
estabelecimento, mas antes um subarrendamento do imvel.
Por fora da remisso do artigo 1109, n 1, parte final, ser de aplicar a norma do
artigo 1112, n 2. Assim, quando se entenda no haver efectivamente locao do
estabelecimento, por este no ser o verdadeiro objecto do negcio, a locao simulada ser nula
por fora do artigo 240 do CC, sendo que o negcio dissimulado de sublocao do imvel no
consentida pelo senhorio ser igualmente nulo, nos termos do artigo 241, gerando o direito de
resoluo pelo senhorio do contrato de arrendamento do imvel, nos termos dos artigos 1038,
alnea f), e 1083, n 2, alnea e), todos do Cdigo Civil.
Por fora do disposto no artigo 1109, n 2 do Cdigo Civil, a locao do
estabelecimento no carece de consentimento do senhorio, mas dever ser-lhe comunicada no
prazo de um ms. Tal obrigao parece dever-se ao facto de [e]mbora no se mostre
63Cfr. artigos 262, n 2 e 1684, n 2 do CC.
64Cfr. artigo 1687 do CC.
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necessrio que o senhorio conhea o locatrio do estabelecimento, pois este no arrendatrio,
no lhe cabendo o pagamento da renda, ele tem todo o interesse, alis legtimo, em fiscalizar o
negcio efectuado, no sentido de conhecer o que efectivamente se transmitiu em que termos foi
efectuada tal transferncia. Se o locador do imvel conclui que no existe qualquer negciosobre o estabelecimento, mas sim uma sublocao do prdio (para a qual necessria a sua
aquiescncia), a lei permite-lhe resolver, como vimos, o contrato de arrendamento comercial65.
1.7.- Regime aplicvel ao Contrato de Locao de Estabelecimento
Comercial
Apesar de disperso, incompleto e insuficiente, existe um regime legal que regula o
contrato em anlise, o que significa que estamos perante um negcio tpico66.
Assim, este contrato reger-se- pela disciplina da locao em geral, prevista nos artigos
1022 a 1063 do Cdigo Civil, bem como por outras normas dispersas que regulam questes
especficas. Assim, por exemplo, o artigo 1109 do mesmo cdigo no caso de estabelecimento
instalado em prdio arrendado.
Veja-se o artigo 11 do DL 149/95, de 24 de Junho, no tocante locao financeira de
bens de equipamento, o qual determina que [t]ratando-se de bens de equipamento, permitida
a transmisso entre vivos, da posio do locatrio, nas condies previstas pelo artigo 115 do
Decreto-Lei n 321-B/90, de 15 de Outubro67, (). Norma esta que deve ser aplicada por
interpretao extensiva, locao de estabelecimento.
H que ter em conta que no se transmite na locao de estabelecimento a propriedade
deste, pelo que no caso de aluguer de bens o locatrio desses bens continua a ser o proprietrio
do estabelecimento e locador do mesmo.
No caso de editor, o artigo 100 do Cdigo de Direitos de Autor e Direitos Conexos,
determina, no seu n 1 que [o] editor no pode, sem consentimento do autor, transferir para
terceiros, a ttulo gratuito ou oneroso, direitos seus emergentes do contrato de edio, salvo se a
transferncia resultar de trespasse do seu estabelecimento. Esta desnecessidade de
65Fernando De Gravato Morais, Alienao e onerao,cit., p. 145.
66Neste sentido, Fernando De Gravato Morais, ltima op cit., pp. 137 138, Coutinho de Abreu, Curso de Direito Comercial, vol. I, Coimbra,
Coimbra editora, 4 edio, 2003, p. 307. Em sentido contrrio, considerando tratar-se de negcio atpico, Menezes Cordeiro, Manual de Direito
Comercial, vol. I, Coimbra, Coimbra editora, 2001, p. 303.
67Remisso que hoje se deve entender como feita para o artigo 1112 do Cdigo Civil.
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aquiescncia do autor deve entender-se extensvel ao contrato de locao do estabelecimento.
Soluo paralela apontada pelo artigo 145 do mesmo normativo, para o produtor.
No que aos contratos de trabalho respeita a matria da transmisso da empresa ou
estabelecimento vem regulada nos artigos 285 a 287 do Cdigo do Trabalho actual,decorrente da redaco dada pela Lei n 7/2009, de 12 de Fevereiro.
Assim, sob a epgrafe [e]feitos de transmisso de empresa ou estabelecimento
determina o artigo 285, no seu n 1, o seguinte: [e]m caso de transmisso, por qualquer ttulo,
da titularidade de empresa ou estabelecimento ou ainda de parte de empresa ou
estabelecimento que constitua uma unidade econmica, transmitem-se para o adquirente a
posio do empregador nos contratos de trabalho dos respectivos trabalhadores, bem como a
responsabilidade pelo pagamento de coima aplicada pela prtica de contra-ordenao laboral..Nos termos do n 3 do mesmo artigo, tal soluo expressamente aplicada locao de
estabelecimento, o qual determina que [o] disposto nos nmeros anteriores igualmente
aplicvel transmisso, cesso ou reverso da explorao de empresa, estabelecimento ou
unidade econmica, sendo solidariamente responsvel, em caso de cesso ou reverso, quem
imediatamente antes tenha exercido a explorao.
Quanto aos crditos, mantm-se a regra da no transmissibilidade. No resta
alternativa s partes cujos crditos pretendem ceder que dispor sobre essa matria.
O mesmo se pode afirmar em relao aos dbitos do locador. Ressalvam-se, porm, os
casos previstos nos arts. () [285 do] CT e 20, n 2 DL 411/9168, dos quais resulta uma
responsabilidade solidria do transmitente e do exercente69.
Durante a explorao do estabelecimento a regra geral ser a de o locatrio do
estabelecimento ser o responsvel pelos dbitos contrados nesse perodo, assim como titular
dos crditos do exerccio respectivo.
Por sua vez, o uso da firma do locador pelo exercente deve entender-se envolvida na
cesso do gozo do estabelecimento. com efeito um dos elementos transferidos, sem
necessidade de conveno nesse sentido.
No se suscita quanto ao () logtipo nenhum problema de transmisso, pois o
estabelecimento no se transfere definitivamente. Na locao engloba-se, porm, a faculdade de
usar aqueles direitos para os seus fins especficos.
68Cuja redaco a seguinte: [e]m caso de trespasse, cesso de explorao ou de posio contratual o cessionrio responde solidariamente
com o cedente pelas contribuies e juros de mora em dvida data da celebrao do negcio, sendo nula qualquer clusula em contrrio.
69Fernando De Gravato Morais, ltima op cit., p. 147.
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Relativamente marca, a locao importa tambm, ex silentio, a faculdade da sua
utilizao. No plano externo, a marca continua a distinguir a mesma origem dos produtos ou
servios, no se suscitando qualquer problema no cumprimento do princpio da verdade da
marca70
.
Diremos, por ltimo, algumas palavras referentes ao impacto do contrato de locao do
estabelecimento nas normas do arrendamento, no caso de estabelecimento instalado em prdio
arrendado, decorrente do regime transitrio introduzido pelo NRAU.
Nos termos do artigo 59, n 1, do NRAU, sob a epgrafe [a]plicao no tempo, [o]
NRAU aplica-se aos contratos celebrados aps a sua entrada em vigor, bem como s relaes
contratuais constitudas que subsistam nessa data, sem prejuzo do previsto nas normastransitrias, acrescentando o n 3 do mesmo artigo que [a]s normas supletivas co