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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO - MESTRADO ÁREA DE CONCENTRAÇÃO EM DIREITOS SOCIAIS E POLÍTICAS PÚBLICAS Luciana Blazejuk Saldanha ESTUDO DA TEORIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DE ALEXY E SUA APLICAÇÃO EM CASOS CONCRETOS Santa Cruz do Sul, abril de 2008

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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO - MESTRADO ÁREA DE CONCENTRAÇÃO EM DIREITOS SOCIAIS E

POLÍTICAS PÚBLICAS

Luciana Blazejuk Saldanha

ESTUDO DA TEORIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DE ALEXY E SUA

APLICAÇÃO EM CASOS CONCRETOS

Santa Cruz do Sul, abril de 2008

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Luciana Blazejuk Saldanha

ESTUDO DA TEORIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DE ALEXY E SUA

APLICAÇÃO EM CASOS CONCRETOS

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Direito – Mestrado, Área de Concentração - Direitos Sociais e Políticas Públicas, Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Direito.

Orientador: Prof. Dr. Rogério Gesta Leal

Santa Cruz do Sul, abril de 2008

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Esta Dissertação foi submetida ao Programa de Pós-Graduação em Direito –

Mestrado, na Área de Concentração em Direitos Sociais e Políticas Públicas, da

Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC, como requisito parcial para obtenção do

título de Mestre em Direito.

___________________

Prof. Dr. Rogério Gesta Leal

Professor Orientador

___________________

Prof. Dr. Inácio Helfer

___________________

Prof. Dr. José Alcebíades de Oliveira Júnior

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A todos aqueles que lutam pela concretização e fundamentação dos Direitos

Fundamentais, pois as leis, tão só pela existência no mundo jurídico, não têm o poder de

transformar a realidade social. Assim como, a todos aqueles que se importam com a situação

dos direitos fundamentais frente ao judiciário.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço, em primeiro lugar, ao professor, doutor Rogério Gesta Leal, meu orientador,

pela paciência e profissionalismo, imprescindíveis para a consecução deste trabalho, além da

sabedoria e encorajamento na realização deste trabalho.

Também agradeço ao professor Robert Alexy, pela sua paciência e disponibilidade em

responder meus e-mails e inclusive me enviar materiais (livros e cópias de textos).

Aproveito para agradecer a todos os professores e colegas do Programa de Pós-Graduação

em Direito – Mestrado, pelo ensinamento e amizade.

E, por fim, agradeço a todas as pessoas que de algum modo me auxiliaram e, que

compreenderam as ausências e silêncios da jornada. Em especial, aos meus pais e ao meu irmão,

pelo amor, incentivo, exemplo e aprendizado proporcionados, que possibilitaram que eu

alcançasse mais este objetivo.

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As condições para a conquista são sempre simples. Só devemos

trabalhar um tempo, suportar um tempo, crer sempre e retroceder,

jamais.

(SÊNECA)

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RESUMO Este trabalho tem como foco central a teoria dos direitos fundamentais de Alexy. Desta forma, a teoria de Robert Alexy é analisada – através de uma pesquisa bibliográfica - sendo estabelecidas as diretrizes da mesma, e usada como referencial teórico da dissertação. Como um contraponto, são expostas algumas críticas à referida teoria. A partir disto são analisados casos específicos em relação ao direito à saúde, no que pertine ao fornecimento de medicamentos e/ ou tratamento médico pelos Entes Federados, do Supremo Tribunal Federal do Brasil, bem como aqueles do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul desde primeiro de janeiro de 2000 até 31 de outubro de 2007. São analisados hard cases que dizem respeito ao direito à saúde, que têm relação com a linha de pesquisa de políticas públicas. Enfatiza-se que as decisões são trazidas como forma de exemplificar a aplicação da teoria de base da dissertação não tendo o intuito de exaurir o tema, por esta razão são analisados apenas alguns casos. Através do método de abordagem dedutivo se desenvolve uma pesquisa sob a perspectiva monográfica e crítica. Com isto se estuda e analisa a Teoria de Direitos Fundamentais de Robert Alexy, para verificar a possibilidade de sua aplicação a casos concretos no Brasil. Desta forma, e tendo em vista que a teoria tem sofrido muitas críticas, se verifica como a teoria de base do trabalho pode ser usada para se solucionar os referidos casos concretos que dizem respeito ao direito da saúde no Brasil, bem como de que forma pode ser operacionalizada tal teoria. Para tanto, se procura identificar a ferramenta de argumentação que possibilite a aplicação ao caso concreto. Dentre as hipóteses levantadas no início da pesquisa estão: que a utilização da teoria nos casos que envolvessem direitos fundamentais no Brasil poderia ter uma solução diferente do que vinha sendo feito; que se a teoria pudesse ser operacionalizada seria através do discurso jusfundamental, o que possibilitaria ao Judiciário tomar decisões melhor fundamentadas sob a perspectiva de uma argumentação jurídica. Também se expõe as críticas feitas à teoria de Robert Alexy, como forma de estabelecer um contraponto e demonstrar a validade e coerência da teoria. E por fim são analisados casos que tratam do fornecimento de medicamentos e tratamento médico no Supremo Tribunal Federal e no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, ou seja, decisões que obrigam a implementação e concretização de políticas públicas no âmbito do Direito à Saúde, consagrado na Constituição Federal de 1988 do Brasil. Portanto, a dissertação é dividida em três capítulos, nos quais são colocados a explicação da teoria de Robert Alexy; as críticas e perspectivas de seus críticos (Jürgen Habermas e Ronald Dworkin); e a análise de casos concretos no Supremo Tribunal Federal e Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Palavras-chave: Direitos Fundamentais; Robert Alexy; Judicialização de Políticas Públicas; Implementação Direito à Saúde.

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ABSTRACT

This work has as main focus Robert Alexy’s Constitutional Rights Theory. On this way, Robert Alexy’s theory is analyzed – throughout a bibliographical research – establishing, so, its bases, and using it as the theoretical reference. As a counterpoint, some critiques to the theory are explained. With these perspectives in mind, specific cases are analyzed, related to the right to health, mainly the one’s about the supplying of medicine and/ or health care by the Government, from Brazil’s Supreme Federal Court, as well as from the Court of Justice of Rio Grande do Sul, during the period of January the first 2000 and October the 31st 2007. The hard cases analyzed are about the right to health, what is related to the research scope of Public Policy of the Master in Law of UNISC. It must be made clear that the decisions used here are brought as examples of appliance to the base theory of the dissertation, for this reason the theme is not analyzed to the exhaustion and only some cases are mentioned. The research is developed through a deductive method of approach under a monographic and critical perspective. With this Robert Alexy’s Constitutional Rights Theory is studied and analyzed to verify the possibility of its appliance to real cases in Brazil. For this reason, bearing in mind that the Theory has had many critiques, it intends to verify how the Theory can be used to solve the referred real cases which concern the right to health in Brazil, as well as how it can be put into use. For this, it intends to identify the argumentation tool that can make its appliance to real cases possible. Among the hypotheses thought at the beginning of the research are: that the use of the theory on constitutional rights in Brazil could bring a different solution from what had been done; that if the theory could be put into use it would be done through the jusfundamental discourse, what would enable judges to better justify their decisions in a legal argumentation manner. As a way of establishing a counterpoint and demonstrating the theory’s validity and coherence the critiques to the theory are also explained. At last, the cases involving the supplying of medicine and/ or health care from Brazil’s Supreme Federal Court and the Court of Justice of Rio Grande do Sul are analyzed, that is, the decisions chosen compel the implementation and concretion of public policies on the right to health, which is guarantied at the Brazil’s Federal Constitution of 1988. Hence, the dissertation is divided into three chapters, in which are explained: Robert Alexy’s theory; the critiques and perspectives of its critics (Jürgen Habermas and Ronald Dworkin); and the analyzes of real cases from Brazil’s Supreme Federal Court and the Court of Justice of Rio Grande do Sul. Key-words: Constitutional Rights; Robert Alexy; Public Policies into Courts; Right to Health Implementation.

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LISTA DE ABREVIATURAS

AC Ação Cautelar

ADIN-MC Medida Cautelar em Ação Direta de Inconstitucionalidade

AI Agravo de Instrumento

AI-AgR Agravo Regimental no Agravo de Instrumento

L. Lei

RE Recurso Extraordinário

STA Suspensão de Tutela Antecipada

STF Supremo Tribunal Federal

TJ/RS Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 11

1 A TEORIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS EM ROBERT ALEXY ................... 16

1.1 A base da teoria ............................................................................................................ 19

1.2 O modelo adequado para os direitos fundamentais ..................................................... 48

2 ALGUMAS CRÍTICAS À TEORIA DE ROBERT ALEXY ........................................ 68

2.1 A perspectiva de Jürgen Habermas .............................................................................. 69

2.2 A perspectiva de Ronald Dworkin ............................................................................... 90

3 DIMENSÕES APLICATIVAS DA TEORIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

DE ROBERT ALEXY NO ÂMBITO DO DIREITO À SAÚDE: ESTUDOS DE

CASOS JURISPRUDENCIAIS NO BRASIL ..................................................................

113

3.1 Precedentes do Supremo Tribunal Federal .................................................................. 120

3.2 Julgamentos do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul ......................................... 136

CONCLUSÃO ................................................................................................................... 153

REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 169

ANEXO A – casos políticas públicas de saúde STF ......................................................... 181

ANEXO B – casos tratamento de saúde STF .................................................................... 182

ANEXO C – casos tratamento médico STF ...................................................................... 183

ANEXO D – casos fornecimento medicamento STF ........................................................ 184

ANEXO E – integra decisão RE 271286/RS STF ............................................................. 185

ANEXO F – íntegra decisão RE509569/SC STF .............................................................. 187

ANEXO G – íntegra decisão AI634282/PR STF .............................................................. 189

ANEXO H – íntegra decisão RE 400040/MT STF ........................................................... 191

ANEXO I – íntegra decisão RE411557/DF STF ............................................................... 193

ANEXO J – íntegra decisão AIAgR562703/RS STF ........................................................ 194

ANEXO K – íntegra decisão AI597141/RS STF .............................................................. 200

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ANEXO L – íntegra decisão AC 1827/RJ STF ................................................................. 202

ANEXO M – íntegra decisão RE 562630/ES STF ............................................................ 204

ANEXO N – íntegra decisão STA91/AL STF .................................................................. 206

ANEXO O – íntegra decisão AC 70019513431 TJ/RS ..................................................... 208

ANEXO P – casos tratamento de saúde TJ/RS .................................................................. 213

ANEXO Q - casos tratamento médico TJ/RS ................................................................... 214

ANEXO R – casos fornecimento medicamento TJ/RS ..................................................... 222

ANEXO S – íntegra decisão AC70020524856 TJ/RS ....................................................... 224

ANEXO T – íntegra decisão AI 70009343013 TJ/RS ....................................................... 229

ANEXO U – íntegra decisão AI 70007321847 TJ/RS ...................................................... 231

ANEXO V – íntegra decisão AI 70008313165 TJ/RS ...................................................... 233

ANEXO W – íntegra decisão AC 70016386815 TJ/RS .................................................... 236

ANEXO X – íntegra decisão AI 70018968008 TJ/RS ...................................................... 239

ANEXO Y – íntegra decisão AC70020870960 TJ/RS ...................................................... 241

ANEXO Z – íntegra decisão AI 70020884086 TJ/RS ....................................................... 247

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INTRODUÇÃO

Questões a respeito de quais direitos tem o indivíduo como pessoa e como cidadão de

uma comunidade, e a que princípio está sujeita a legislação estatal, assim como o que é

exigido para a realização da dignidade humana, a liberdade e a igualdade, são grandes temas

da filosofia prática e pontos polêmicos centrais de lutas políticas passadas e presentes.

Percebe-se que a polêmica sobre os direitos humanos fundamentais e direitos civis adquire um

novo caráter devido a sua positivação como direito de vigência imediata, não perdendo sua

profundidade e sutileza. Uma razão para isso está no significado vago das formulações do

catálogo de direitos fundamentais. Robert Alexy explica que a possibilidade dos direitos

possuírem um significado vago não é uma explicação suficiente da intensidade das discussões

sobre os direitos fundamentais. Uma norma, por mais vaga que seja, possui um amplo

consenso com respeito à matéria que regula, e não provoca maiores discussões. Mas se sua

vagueza gerar um dissenso sobre os objetos da regulação, ocorrerá uma grande polêmica. Isto

é o que geralmente acontece no caso dos direitos fundamentais.

O rol de direitos fundamentais regula de uma forma muito vaga questões muito

discutidas da estrutura normativa básica do Estado e da sociedade. Isto se percebe com

especial clareza no caso dos conceitos dos direitos fundamentais da dignidade, da liberdade, e

da igualdade. Se a eles são adicionados conceitos de fim do Estado e conceitos estruturais da

democracia, do Estado de direito e do Estado social, se obtém um sistema de conceitos que

compreende as fórmulas centrais do direito racional moderno.

Se a discussão sobre os direitos fundamentais não pudesse se apoiar mais no texto

constitucional e na sua gênese, teria que contar com um sem número de intermináveis e

ilimitados debates de opiniões. A vagueza das normas de direitos fundamentais causa a

vagueza da jurisprudência dos Tribunais. Robert Alexy defende que a jurisprudência tem

reduzido de certa forma a vagueza da norma de direitos fundamentais, mas de nenhuma forma

pode dizer que a eliminou.

Diante desta situação, a ciência dos direitos fundamentais se vê instigada a dar respostas

racionalmente fundamentadas para questões vinculadas com direitos fundamentais. Tendo

isso em vista Robert Alexy produziu a Teoria dos Direitos Fundamentais que, conforme o

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autor, tenta contribuir para o cumprimento da tarefa de dar respostas racionalmente

fundamentadas a questões vinculadas com direitos fundamentais.

Neste contexto, tendo em vista que a Teoria dos Direitos Fundamentais de Alexy vem

sofrendo muitas críticas, o presente estudo busca analizá-la e quer-se verificar em que medida

a teoria dos direitos fundamentais de Robert Alexy pode ser usada para a solução de casos

concretos envolvendo direitos fundamentais no Brasil. Também se quer verificar de que

forma se poderia operacionalizar tal teoria aos casos concretos no Brasil, principalmente no

que diz respeito ao direito à saúde.

Assim sendo, a pesquisa vai ao encontro da área de concentração do Mestrado em

Direito da UNISC, tendo em vista que com o estudo da tese de Robert Alexy se verifica de

que maneira a teoria pode servir para a solução de casos concretos, que dizem respeito tanto a

direitos sociais quanto a políticas públicas. O presente estudo tem relevância jurídica, uma vez

que os direitos fundamentais estão relacionados a todos e com a Teoria dos Direitos

Fundamentais de Alexy se pode compreender melhor em que medida esta teoria pode ser

usada para a solução de casos concretos envolvendo direitos fundamentais no Brasil. Desta

forma se contribui com uma visão da teoria dos direitos fundamentais para a prática no campo

jurídico. Outrossim, pessoalmente, o tema é de relevância, tendo em vista a trajetória de

estudos na qual sempre figuraram como pano de fundo os direitos humanos, bem como os

direitos fundamentais.

Deste modo, a Teoria dos Direitos Fundamentais de Robert Alexy é analisada - a partir

de uma pesquisa bibliográfica se estabelece o entendimento de Robert Alexy sobre a teoria

dos direitos fundamentais, o que é usado como referencial teórico da dissertação. Como um

contraponto, são expostas algumas críticas à referida teoria. A partir disto são analisados

casos específicos em relação ao direito à saúde, no que pertine ao fornecimento de

medicamentos e/ ou tratamento médico pelos Entes Federados, do Supremo Tribunal Federal

do Brasil, bem como aqueles do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul desde primeiro de

janeiro de 2000 até 31 de outubro de 2007. São analisados hard cases que dizem respeito ao

direito à saúde, que têm relação com a linha de pesquisa de políticas públicas. Enfatiza-se que

as decisões são trazidas como forma de exemplificar a aplicação da teoria de base da

dissertação, não tendo o intuito de exaurir o tema.

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Percebe-se que o judiciário vem sendo muito utilizado para a concretização de políticas

públicas no âmbito do direito à saúde. Este fenômeno tem sido chamado de a judicialização

das políticas públicas em relação ao direito à saúde. Com o estudo se levantaram as seguintes

hipóteses para a resolução do problema: com a utilização da teoria dos direitos fundamentais

de Alexy os casos que envolvem direitos fundamentais no Brasil podem ter uma resolução

diferente do que vem sendo feito; se a utilização da teoria de Alexy pode ser operacionalizada

ela o será pelo discurso jusfundamental, que é um procedimento argumentativo através do

qual se consegue obter resultados jusfundamentais corretos para a base apresentada; a teoria

dos direitos fundamentais de Alexy pode ser usada na solução de casos na medida em que

faria com que o Judiciário tomasse suas decisões com base em uma argumentação jurídica

mais fundamentada.

A pesquisa tem como objetivo geral analisar a teoria dos direitos fundamentais de

Robert Alexy, bem como as possibilidades de sua aplicação em decisões e casos concretos no

Brasil. Como objetivo específico se quer analisar a Teoria de Direitos Fundamentais de

Robert Alexy, e comparar o tratamento dado a matéria no âmbito do STF e TJ/RS, através de

decisões pertinentes relativas ao direito à saúde; expor as críticas feitas à teoria de Robert

Alexy; verificar de que forma se pode operacionalizar a Teoria dos Direitos Fundamentais de

Robert Alexy para a solução dos casos concretos no Brasil; e identificar qual o instrumento de

argumentação de Robert Alexy para aplicação ao caso concreto.

O método de abordagem a ser adotado no desenvolvimento da presente pesquisa será o

dedutivo, ou seja, do geral para o particular, numa perspectiva monográfica e crítica (método

de procedimento), procurando dar tratamento localizado no tempo à matéria objeto do estudo.

Em termos de fontes da investigação, vai-se contar com documentação indireta de

referência à pesquisa, utilizando-se documentos bibliográficos (de fontes secundárias):

publicações avulsas pertinentes à matéria; boletins, jornais, revistas, livros, etc. A pesquisa

envolve fontes bibliográficas, documentais (doutrina, leis e jurisprudências) e artigos de

estudiosos da área, uma vez que consiste em coleta de dados em livros, periódicos e links

jurídicos, além de consulta à legislação e decisões pertinentes, em língua portuguesa, inglesa,

francesa, espanhola ou italiana.

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Faz-se uma pesquisa bibliográfica assim como são estudados alguns casos pertinentes

do Supremo Tribunal Federal e Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Utiliza-se a Teoria

dos Direitos Fundamentais de Robert Alexy como referencial teórico, sendo dada uma

abordagem dedutiva, ou seja, partindo-se do geral para o particular, explicando-se a Teoria

dos Direitos Fundamentais de Robert Alexy minuciosamente, suas críticas e, por fim, são

analisados alguns casos pertinentes do STF e TJ/RS fazendo-se uma crítica de como teria sido

a decisão se a teoria fosse utilizada.

Neste contexto, a dissertação está dividida em três capítulos. Sendo que no primeiro a

teoria de base da dissertação é explicada. Neste capítulo se pode entender o que Robert Alexy

propõe e a partir do que a teoria é baseada. Explica-se o entendimento de Robert Alexy sobre

norma, regras e princípios, e como estes conceitos são usados no momento em que há colisão

de princípios ou conflitos de regras. A partir destes conceitos se explica também como é feita

a ponderação em relação a três princípios especificados na Constituição Alemã e que Robert

Alexy traz em suas explicações: liberdade, igualdade e direitos a ações positivas do Estado.

Em um segundo momento se mostra a fórmula que Robert Alexy cria para colocar a sua teoria

em prática e se traz argumentos contra as críticas e que solidificam cada vez mais a teoria

referida.

O segundo capítulo traz em um primeiro momento a crítica e a idéia de Jürgen

Habermas sobre a ponderação e otimização de princípios. Neste contexto se explica o

entendimento de Jürgen Habermas e no que ele baseia suas críticas à teoria de Robert Alexy.

Noutro ponto deste capítulo traz-se o entendimento de Ronald Dworkin sobre o tema em

questão e quais são suas concepções sobre regras e princípios, bem como sua ponderação.

Explica-se a perspectiva de Ronald Dworkin a respeito da interpretação e do papel do juiz

quando este se defronta com casos difíceis.

No terceiro capítulo busca-se aplicar a teoria, vista no primeiro, a casos concretos.

Introduzindo o capítulo se esclarece o entendimento da expressão políticas públicas e como se

dá e o que se entende por sua judicialização. Assim sendo, explicam-se alguns casos

escolhidos através de uma vasta pesquisa nos sites do Supremo Tribunal Federal do Brasil e

do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Os casos concretos escolhidos dizem

respeito ao direito à saúde, foram escolhidos principalmente os casos que se referem ao

fornecimento de medicamentos e tratamento médico, o que contribui para a implementação de

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políticas públicas pelos entes federados (Distrito Federal; União; Estados e Municípios). No

primeiro ponto são explicados casos pertinentes julgados no Supremo Tribunal Federal e por

fim são vistos os casos julgados no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Demonstram-se

os casos fazendo também um panorama sobre o que acontece em cada um dos referidos

tribunais. Após se verificar o tratamento dado a matéria em cada um dos órgãos citados, se

procede a análise sob o ponto de vista da teoria de base da dissertação.

Por fim, antecipando as conclusões, a teoria dos direitos fundamentais de Alexy traz

uma fórmula funcional para a argumentação jusfundamental – o que possibilita a vinculação

da ponderação com a argumentação jurídica racional. Em um contexto de crescentes

demandas judiciais1 onde os magistrados se vêem cada vez mais compelidos a decidirem

quanto à implementação de políticas públicas na área da saúde, assim como em outras áreas

aqui não abrangidas, referida teoria deve ser no mínimo estudada.

1 Ver notícia sobre o relatório do Banco Mundial que aponta sobrecarga de trabalho para juízes brasileiros.

Disponível em: <http://www.agenciabrasil.gov.br/noticias/2007/12/06/materia.2007-12-06.6246855393/view>. Acesso em: 7 dezembro 2007.

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1 A TEORIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS EM ROBERT ALEX Y

Um tema bastante polêmico na atualidade é o que diz respeito aos direitos

fundamentais, no que tange a vagueza de suas normas e das decisões acerca do mesmo. A

questão de direitos fundamentais está ligada às lutas políticas nas quais indivíduos

conquistaram direitos como pessoas e como cidadãos, entretanto o que se coloca é a que

princípios a legislação estatal está sujeita e o que é que exige a realização da dignidade

humana, da liberdade e da igualdade. Ainda o que se discute é quando a Constituição coloca,

frente a legislação infraconstitucional e aos poderes Executivo e Judiciário, as normas de

direitos fundamentais como direitos de vigência imediata e exerce seu controle através de um

Tribunal Constitucional. Este é o ponto principal que Robert Alexy2 traz em sua teoria –

Teoria dos Direitos Fundamentais, se referindo ao Tribunal Constitucional alemão, e que

nesta dissertação servirá de base ao trabalho como um exemplo ao Brasil. Também embasarão

a abordagem outros textos de Alexy3.

2 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. Quando se fizer menção ao autor na dissertação será mencionado seu sobrenome: Alexy.

3 ALEXY, Robert. Sistema jurídico, princípios jurídicos y razón práctica. IV Jornada Internacionales de Lógica e Informática Jurídicas, San Sebastián, p. 139-151, Sep. 1988. ___. On necessary relations between law and morality. Ratio Juris, Bologna, v. 2, n. 2, p. 167-183, Jul. 1989. ALEXY, R.; DREIER, R. The concept of jurisprudence. Ratio Juris, Bologna, v. 3, n. 1, p. 1-13, March 1990. ALEXY, R.; PECZENIK, A. The concept of coherence and its significance for discursive rationality. Ratio Juris, Bologna, v. 3, n. 1 – bis, p. 130-147, March 1990. ___. Rights, legal reasoning and rational discourse. Ratio Juris, Bologna, v. 5, n. 2, p. 143-152, jul 1992. ___. Justification and application of norms. Ratio Juris, Bologna, v. 6, n. 2, p. 157-170, July 1993. ___. Discourse theory and human rights. Ratio Juris, Bologna, v. 9, n. 3, p. 209-235, Sep. 1996. ___. Concetto e validità del diritto. Torino: Einaudi, 1997. Traduzione di Fabio Fiore. ___. El concepto y la validez del derecho. Tradução de Jorge M. Seña. 2 ed., Espanha: Gedisa, 1997. ___. Teoria dell’argomentazione giuridica: la teoria del discorso razionale come teoria della motivazione giuridica. Tradução de Cosimo Marco Mazzoni e Vincenzo Varano. Milano: A. Giuffre, 1998. ___. Derecho injusto, retroactividad y principio de legalidad penal: La doctrina del Tribunal Constitucional Federal Alemán sobre los homicídios cometidos por los centinelas del Muro de Berlin. Doxa, n. 23, p. 197-230, 2000. ___. On the structure of legal principles. Ratio Juris, Bologna, v. 13, n. 3, p. 294-304, Sep. 2000. ATIENZA, Manuel. Entrevista a Robert Alexy. Doxa - Cuadernos de filosofía del derecho, n. 24, Espanha: Universidad Alicante, p. 671-687, 2001. ___. Libertà fondamentali in John Rawls. Tradução de Fabrizio Sciacca. Milano: A. Giuffre, 2002. ___. The nature of arguments about the nature of law. Rights, Culture, and the Law. Oxford, p. 3-16, 2003. ___. La naturaleza de la filosofía del derecho. Associations, 7, 1, p. 63-75, 2003. ___. Justicia como corrección. Cuadernos de filosofia del derecho. Doxa, n. 26, p. 161-171, 2003. ___. La fundamentación de los derechos humanos em Carlos S. Nino. Cuadernos de filosofia del derecho. Doxa, n. 26, p. 173-201, 2003. ___. Tres escritos sobre los derechos fundamentales y la teoria de los princípios. Tradução de Carlos Bernal Pulido. Serie de Teoria jurídica y filosofia del derecho, n. 28, Colômbia: Universidad Externado de Colômbia, 2003. ___. Constitutional rights, balancing and rationality. Ratio Juris, Bologna, v. 16, n.2 p. 131-140, Jun. 2003. ___. On balancing and subsumption. A structural comparison. Ratio Juris, Bologna, v. 16, n. 4, p. 433-449, Dec. 2003. ___. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Tradução de Carlos Bernal Pulido. Madrid: Centro de Estúdios, 2004 e Revista Española de derecho constitucional, año 22, n. 66, p. 13-64, Sep – Dic. 2002. ___. Agreements and disagreements. Some introductory remarks. Anales de la cátedra Francisco Suarez. Universidad de Granada, n. 39, p. 737-742, 2005. ___. La formula per la quantificazione del peso nel bilanciamento. Annuario di ermeneutica giuridica: Valori, principî e regole. CEDAM, n. 10, p. 97-123, 2005. ___. Teoria del discurso y derechos constitucionales. Tradução de Pablo Larrañaga. México: Fontamara, 2005.

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17

Um dos problemas dos direitos fundamentais é a controvérsia de interpretação das

formulações de direito positivo, pois traz uma nova polêmica sobre a positivação como

direitos de vigência imediata. Frequentemente as formulações de direitos fundamentais são

vagas, o que conforme Alexy4 não seria uma explicação suficiente para tantas discussões a

respeito de tais direitos. O autor explica que os direitos fundamentais fazem parte de um

catálogo que regula de uma forma vaga questões discutidas da estrutura normativa básica do

Estado e da sociedade. Por exemplo, quando se fala em conceitos como dignidade, liberdade e

igualdade se agregam conceitos de Estado e conceitos estruturais de democracia, do Estado de

direito, do Estado Social, obtendo-se desta forma conceitos-chave para o direito racional

moderno.

O apoio dos direitos fundamentais no texto constitucional e assim na jurisprudência de

um Tribunal Constitucional é o que garante sua aplicação com um determinado padrão de

opiniões. Alexy sugere que a jurisprudência de um Tribunal Constitucional tem se convertido

em uma ciência da jurisprudência constitucional. Apesar disto, as decisões da jurisprudência

continuam sendo decisões vagas, ao que se soma a vagueza da norma em si. Desta forma, a

ciência dos direitos fundamentais tem a tarefa de dar respostas racionalmente fundamentadas

às questões que estejam atreladas aos direitos fundamentais.5 A Teoria dos Direitos

fundamentais de Alexy tem este objetivo, ou seja, dar respostas racionalmente fundamentadas

às questões vinculadas aos direitos fundamentais.

A Teoria dos Direitos Fundamentais de Alexy é uma teoria jurídica geral sobre os

direitos fundamentais da Lei Fundamental. Tem como base a teoria dos princípios e a teoria

das posições jurídicas. O que Alexy quer fazer é reabilitar a axiologia6 dos direitos

fundamentais, para demonstrar que não é possível uma prática adequada dos direitos

fundamentais sem uma teoria dos princípios. Em sua teoria Alexy traz alguns problemas

centrais da prática dos direitos fundamentais, como a teoria do pressuposto de fato, a teoria

___. Balancing, constitutional review, and representation. I-CON, v. 3, n. 4, p. 572-581, 2005. ___. Ponderación, control de constitucionalidad y representación. Teoría del discurso y derechos constitucionales. México: Fontamara, 2005. p. 89-103.

4 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002.

5 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002.

6 Ou seja, recuperar os valores dos direitos fundamentais.

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das restrições, o direito geral de liberdade7, assim como o de igualdade, os direitos a proteção

e a organização, o devido processo legal, os direitos sociais fundamentais e o efeito em

relação a terceiros ou efeito horizontal. Da mesma forma, o autor trabalha o papel dos direitos

fundamentais e das suas normas no sistema jurídico e a argumentação e decisão sobre tais

direitos. O que o autor quer demonstrar é que a positivação dos direitos fundamentais

constitui uma abertura do sistema jurídico em relação ao sistema da moral, o que é razoável e

pode ser colocado em prática com meios racionais.8

A teoria dos direitos fundamentais é uma teoria de determinados direitos fundamentais

positivamente válidos, ou seja, uma teoria prática, teoria do direito9 positivo de um

determinado ordenamento jurídico. O que o autor leva em consideração é primeiro entender o

que seja um direito válido, para em seguida falar do conhecimento deste direito positivamente

válido e da utilização de premissas empíricas na argumentação jurídica. Além disso, se

verifica a orientação e crítica da prática jurídica. Percebe-se que a dogmática jurídica é a

tentativa de dar uma resposta racionalmente fundamentada às questões valorativas que por

alguma razão ficaram com soluções pendentes.10

Alexy propõe, desta forma, uma teoria geral que integra, de maneira ampla, enunciados

gerais, verdadeiros e corretos que possam ser formulados nas dimensões analítica, empírica e

normativa e as vincule. Esta seria uma teoria ideal dos direitos fundamentais, ou seja, uma

teoria integrativa, que proporcionaria mais que uma enumeração de pontos de vista. Uma

teoria integrativa, pois se trata de uma teoria estrutural, na qual primeiro se investigam as

7 “Intendere la libertà come un diritto generale alla libertà ha dunque il ruolo fondamentale di affermare che il

primo posto spetta alla libertà non per tradizione o convenzione, non perché condividiamo la stessa storia, o addirittura gli stessi valori, ma per un’esigenza di imparzialità verso agenti morali che si riconoscono in quanto tali, ma che non condividono le stesse valutazioni morali.” ALEXY, Robert. Libertà fondamentali in John Rawls. Tradução de Fabrizio Sciacca. Milano: A. Giuffre, 2002. p. 89.

8 Alexy tem alguns artigos nos quais explica a relação entre Direito e Moral, ver: ALEXY, Robert. Sistema jurídico, princípios jurídicos y razón práctica. IV Jornada Internacionales de Lógica e Informática Jurídicas, San Sebastián, p. 139-151, Sep. 1988. ____. On necessary relations between law and morality. Ratio Juris, Bologna, v.2, n. 2, p. 167-183, July 1989. ____. The nature of arguments about the nature of law. Rights, Culture, and the Law. Oxford, p. 3-16, 2003. ___. La naturaleza de la filosofía del derecho. Associations, 7, 1, p. 63-75, 2003. ___. Agreements and disagreements. Some introductory remarks. Anales de la cátedra Francisco Suarez. Universidad de Granada, n. 39, p. 737-742, 2005.

9 Alexy explica os conceitos da jurisprudência a partir da relação da teoria do direito e da teoria da ciência do direito em: ALEXY, R.; DREIER, R. The concept of jurisprudence. Ratio Juris, Bologna, v. 3, n. 1, p. 1-13, March 1990.

10 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002.

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estruturas, tais como os conceitos dos direitos fundamentais, a influência dos direitos

fundamentais no sistema jurídico e a fundamentação dos direitos fundamentais, e sua matéria

mais importante é a jurisprudência do Tribunal Constitucional, sendo guiada pela pergunta

sobre qual a decisão correta. Entretanto, quando “no existe claridad acerca de la estructura

de los derechos fundamentales y de las normas sobre derechos fundamentales, no es posible

lograr claridad en la fundamentación iusfundamental.”11 Portanto, para que se possa fazer

uma fundamentação jusfundamental clara deve-se ter uma percepção clara da estrutura dos

direitos fundamentais e de suas normas. E o que a teoria estrutural pretende é verificar a

contínua tradição analítica da jurisprudência de conceitos.

1.1 A base da teoria

Neste sentido, para se poder fazer uma análise da base jurisprudencial brasileira

baseando-se na teoria dos Direitos Fundamentais de Alexy, se deve entender a estrutura da

mesma. A estrutura da teoria de Alexy é o que se expõe neste primeiro momento, para se

entender as estruturas, os conceitos dos direitos fundamentais, a influência dos direitos

fundamentais no sistema jurídico e a fundamentação dos direitos fundamentais, e como isto se

dá na jurisprudência do Tribunal Constitucional, sendo guiada pela pergunta sobre a decisão

correta.

Uma norma de direito fundamental não existe somente quando outorgue um direito

fundamental subjetivo a um indivíduo, isto porque uma norma de direito fundamental é um

conceito mais amplo que direito fundamental. Sempre quando se pensa sobre a existência de

um direito fundamental se pressupõe a vigência de uma norma de direito fundamental

correspondente.12

[...] la conveniencia de buscar un modelo de norma que, por una parte, sea lo suficientemente fuerte como para constituir la base de las ulteriores consideraciones, y por otra, lo suficientemente débil como para ser conciliable con el mayor número posible de decisiones en el indicado campo de problemas. Estas

11 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. p. 41.

12 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002.

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exigencias las satisface un modelo semántico, conciliable con las más diferentes tesis de la teoría de la validez.13

Desta forma, para se entender o conceito de norma de direito fundamental se deve ter

claramente o que se entende por norma para que se possa seguir na teoria. Alexy acredita que

se pode chegar a um conceito de norma através das modalidades deônticas14 - do mandato, da

proibição e da permissão. Com base nestes conceitos se pode elaborar uma teoria dos direitos

fundamentais. Pode-se dizer que toda norma pode ser expressa por um enunciado normativo.

A princípio o que se vê é o conceito de norma sem levar em consideração a validade15 da

mesma, ou seja, se verifica o conceito semântico de norma, que serve para verificar questões

como a de saber se duas normas são compatíveis, como deve ser interpretada e aplicada tal

norma, se é válida e quando deveria ser.16

O conceito semântico de norma17 é então um pressuposto para as teorias da validade, ou

seja, teorias que possuem critérios para saber quando uma norma é válida ou não. De forma

simples quando os critérios fossem satisfeitos a norma seria válida e quando não o fossem ela

seria considerada inválida. Alexy explica que o conceito semântico de norma não pressupõe

nenhuma das teorias da validez nem as exclui, mas para se verificar a validade ou não de uma

norma é necessário haver um entendimento do que é norma no sentido do conceito semântico

– isto quando se fala de normas em geral - para se verificar o que são normas de direito

fundamental. Uma resposta simples seria que normas de direito fundamental são aquelas

expressas por disposições jusfundamentais, que são enunciados contidos no texto da Lei

Fundamental. Isto, entretanto, causaria dois problemas: um, que nem todos os enunciados da

Lei fundamental expressam normas de direito fundamental – o que requereria um critério de

13 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. p. 49.

14 Através de princípios e sistemas de moral.

15 Em relação ao conceito de validade ver terceiro capítulo da obra: ALEXY, Robert. Concetto e validità del diritto. Torino: Einaudi, 1997. Traduzione di Fabio Fiore. “Un concetto di validità giuridica che prescinde dagli elementi della efficacia sociale e della giustezza materiale, è stato sopra classificato come concetto di validità in senso stretto. [...] Lo strumento piú importante per risolvere la circolarità del concetto di validità giuridica in senso stretto è la norma fondamentale. [...] Una norma fondamentale è una norma che fonda la validità di tutte le norme di un sistema giuridico all’infuori di se stessa.” p. 97 e 98.

16 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. p. 32.

17 Friedrich Muller critica este conceito de norma, tendo em vista que para ele esta maneira de conceber as normas jurídicas válidas como objetos lingüísticos identificados de acordo com critérios de validez formaria normas de decisão somente com a ajuda de dados lingüísticos. O que Alexy refuta. Ver em ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2002. p. 76 e 77.

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classificação dos enunciados da Lei fundamental; e outro se as normas de direito fundamental

realmente pertencem somente àquelas que são expressas diretamente por enunciados da Lei

fundamental. Deve-se ater ao conceito de enunciado da Lei fundamental – o que faz com que

um enunciado seja considerado uma disposição de direito fundamental. Alexy entende que

para responder a esta interrogação pode-se sustentar em critérios materiais, estruturais e/ ou

formais. O critério material define os direitos fundamentais como aqueles que são o

fundamento do Estado, ou seja, dizem respeito a esta matéria, e o critério da estrutura seria o

direito individual de liberdade. Entretanto, ambos os critérios vinculam o conceito de direito

fundamental a um determinado conceito de Estado. O critério estrutural só não vincularia a

um conceito de Estado se dissesse respeito somente a uma norma estatuída por uma

disposição da Lei fundamental que conferisse um direito subjetivo. Já o critério formal diz

respeito à forma da positivação, por exemplo, todos os enunciados de um capítulo da Lei

fundamental que estivessem sob o título Direitos Fundamentais seriam disposições de direito

fundamental independente do seu conteúdo. Estes critérios e definições são adequados para a

formulação de uma teoria dos direitos fundamentais.18

Assim, no entender de Alexy, normas de direito fundamental seriam normas

diretamente expressas pela Lei Fundamental. “Esto pone claramente de manifiesto a dónde

conduce la, a primera vista, tan plausible concepción según la cual normas de derecho

fundamental son sólo aquéllas expresadas directamente por el texto constitucional.”19 Alexy

explica que normas de direito fundamental podem ser divididas em dois grupos, em normas

de direito fundamental diretamente estabelecidas pela Constituição20 e normas de direito

fundamental a elas atribuídas. O que amplia muito a possibilidade de uma norma ser um

direito fundamental. Isto acarretaria uma dificuldade para se estabelecer as normas de direito

fundamental, o que seria eliminado somente se houvesse um critério que distinguisse as

normas de direito fundamental das outras.21

18 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. cap. 1, p. 27 – 34.

19 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. p. 69.

20 Um autor que explica a idéia de constituição como cultura, que abrange os conceitos de cultura constitucional e cultura dos direitos fundamentais é Peter Haberle na obra: HABERLE, Peter. Costituzione e identità culturale: tra Europa e stati nazionali. Tradução de Igino Schrafel. Milano: Giuffre, 2006.

21 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 1, p. 35 – 47.

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22

O próprio Alexy traz em seu livro dois critérios que possibilitam a distinção das normas

de direito fundamental das outras, um critério empírico e outro normativo. Conforme o

critério empírico as normas atribuídas seriam aquelas normas diretamente estatuídas como

sendo de direito fundamental, às quais a jurisprudência e a ciência do direito atribuem tal

status, mas para Alexy este não é um critério adequado. Para que uma norma atribuída seja ou

não uma norma de direito fundamental depende da argumentação jusfundamental para que a

torne possível. Mas uma fundamentação correta varia conforme a norma de direito

fundamental que se tem diante de si, direta ou indiretamente estatuída. Assim sendo, as

normas atribuídas estipulam que a argumentação jusfundamental tem um papel decisivo na

resposta à questão sobre o que vale do ponto de vista dos direitos fundamentais.22

O que se tratou até o momento foi o conceito de norma de direito fundamental, e para se

entender o raciocínio de Alexy se deve verificar a estrutura dos direitos fundamentais. Neste

caso, para Alexy o pleito mais importante é a distinção entre regras e princípios, tendo em

vista que constitui a base da fundamentação jusfundamental e a chave para soluções de

problemas centrais da dogmática de direitos fundamentais. Alexy entende que a distinção

entre regras e princípios é o marco de uma teoria normativo-material dos direitos

fundamentais, e desta forma, o ponto de partida para responder a pergunta sobre a

possibilidade e os limites da racionalidade em relação aos direitos fundamentais. Muitas

referências sobre a distinção entre regras e princípios já foram feitas23, entretanto, Alexy

argumenta que nunca uma distinção foi feita de forma precisa, e o que falta é justamente uma

distinção mais pontual e sua utilização sistemática.24

Alexy explica que regras e princípios são normas porque dizem o que deve ser, e a

distinção entre eles se dá em dois tipos de normas. O critério mais freqüente para a

diferenciação de regras e princípios é o critério da generalidade, que diz que “los principios

son normas de un grado de generalidad relativamente alto, y las reglas normas con un nivel

22 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. cap. 2, p. 48 e ss.

23 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução de Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

24 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 3, p. 81 e ss.

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relativamente bajo de generalidad.”25Além deste critério existem outros para se diferenciar

regras de princípios, pode-se diferenciar por exemplo se trata-se de regras ou de fundamentos

de regras, se trata-se de normas de argumentação ou de comportamento. Com base nestes

critérios Alexy explica que existem três teses sobre a distinção entre regras e princípios: o

modelo puro dos princípios; o modelo puro das regras; e o modelo de regras e princípios. A

tese escolhida por ele é o modelo combinado que diz que normas podem ser divididas em

regras e em princípios e que a diferença entre os dois seria gradual e qualitativa. Para

diferenciá-los haveria a necessidade de se aplicar um critério principal, que seria entender os

princípios como mandatos de otimização.26

Para Alexy os princípios são tidos como mandatos de otimização, ou seja, são normas

que determinam que algo seja realizado mais amplamente possível, dentro de possibilidades

jurídicas e reais existentes. Desta forma, eles podem ser cumpridos em diferentes graus

dependendo das possibilidades. Já as regras somente podem ser cumpridas quando elas forem

válidas e assim se faz o que dizem, ou seja, as regras são determinações no âmbito do

possível, fática e juridicamente.27

A diferença de regras e princípios é vista mais claramente nas colisões de princípios e

nos conflitos de regras. Quando a aplicação de duas normas conduz a dois juízos

contraditórios, a diferença se dá na forma de solução do conflito. O conflito de regras se

soluciona através de uma cláusula de exceção que eliminaria o conflito declarando uma das

regras como inválida e aplicando a outra. Quando não se pode introduzir uma cláusula de

exceção, os critérios utilizados para declarar uma regra inválida ou não são: a lei posterior

derroga a anterior; a lei especial derroga a geral, e assim por diante. A decisão é sempre

quanto à validez da regra. Por outro lado, a colisão de princípios deve ser solucionada de

maneira diversa. Ou seja, quando dois princípios entram em colisão, um deve ceder ao outro,

25 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. p. 83.

26 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 3, p. 115 e ss.

27 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 3, p. 88.

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em certas circunstâncias um dos princípios precede ao outro. Os princípios, quando aplicados

ao caso concreto, têm diferentes pesos e sempre o princípio com maior peso28 prevalece.29

A lei de colisão estabelece que os interesses opostos devem ser ponderados, e deve ser

verificado qual dos interesses possui maior peso no caso concreto. Desta forma, se estabelece

uma relação de precedência condicionada - onde se determinam condições para que um

princípio preceda ao outro; ou incondicionada - onde não se determinam condições para que

um princípio preceda ao outro. Pode-se mencionar também relações abstratas ou absolutas de

precedência. Mas o importante nas colisões de princípios é saber sob quais condições um

princípio tem precedência sobre o outro, e é aqui que o Tribunal mencionará as condições de

precedência e a fundamentação da tese, que sob estas condições um princípio precede ao

outro.30

Portanto, a lei de colisão, estabelece que: “Las condiciones bajo la cuales un principio

precede a otro constituyen el supuesto de hecho de una regla que expresa la consecuencia

jurídica del principio precedente.”31 Os princípios, assim, são considerados mandatos de

otimização, não havendo relações absolutas de precedência e nem se referindo às ações não

quantificáveis. Os objetos de ponderação podem ser caracterizados como valores

constitucionais. E a condição de precedência pode estabelecer exceções também de acordo

com a proposição de preferência estabelecida. As condições de precedência acabam se

tornando o que Alexy chama de uma regra jusfundamental atribuída (regla jusfundamental

adscripta). Como normas de direito fundamental atribuídas se entendem as normas com cuja

atribuição é possível uma fundamentação jusfundamental correta.32 É o que Alexy explica:

[...] como resultado de toda ponderación iusfundamental correcta, puede formularse una norma de derecho fundamental adscripta con carácter de regla bajo la cual

28 A dimensão do peso dos princípios é tratada também por Dworkin em DWORKIN, Ronald. Levando os

direitos a sério. São Paulo: Martins Fontes, 2002. cap. 2.

29 ALEXY, Robert. Sistema jurídico, princípios jurídicos y razón práctica. IV Jornada Internacionales de Lógica e Informática Jurídicas, San Sebastián, p. 139-151, Sep. 1988. e ___ Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 3.

30 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 3, p. 89 e ss.

31 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. p. 94.

32 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 3, p. 95.

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puede ser subsumido el caso. Por lo tanto, aun cuando todas las normas de derecho fundamental directamente dictadas tuvieran exclusivamente carácter de principios – algo que, como se mostrará, no es así – existirían entre las normas de derecho fundamental tanto algunas que son principios y otras que son reglas.33

Os princípios, desta forma, estabelecem que algo deve ser realizado em uma maior

medida possível. Mas não tem um caráter definitivo, já que dependendo da situação pode ser

substituído por outro princípio. Assim, o que falta a eles é um conteúdo de determinação em

relação aos princípios contrapostos e às possibilidades fáticas. As regras, por sua vez, contêm

uma determinação34, e só deixarão de ser aplicadas se forem consideradas inválidas, ou se

houver uma cláusula de exceção, e neste caso a regra perde seu caráter definitivo.35

Portanto, um princípio é deixado de lado se outro princípio tem um peso maior, mas

uma regra não é deixada de lado se um princípio oposto tem maior peso do que aquele

princípio que apóia a regra. Existem os princípios formais que estabelecem que regras

impostas por determinadas autoridades devam ser seguidas. E quanto mais peso o

ordenamento jurídico confere aos princípios formais maior será o caráter prima facie36 das

regras. Se não fosse dado nenhum peso aos princípios formais, as regras e os princípios teriam

o mesmo caráter prima facie. Este caráter prima facie dos princípios pode ser reforçado

introduzindo uma argumentação a favor de alguns princípios ou tipos de princípios. O que

quer dizer que quando existem razões boas ou em caso de dúvida se dá preferência a um

princípio em relação a outro.37

Entretanto, se verifica que regras e princípios possuem razões diferentes, os princípios

terão sempre razões prima facie e as regras, a menos que tenham sido estabelecidas exceções,

terão sempre razões definitivas. Isso acontece, portanto, quando uma regra é uma razão para

33 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. p. 98.

34 Para Dworkin as regras válidas seriam aplicáveis de uma maneira do tudo ou nada, enquanto os princípios somente indicariam uma direção para a decisão e não uma determinação. DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. São Paulo: Martins Fontes, 2002. cap.1 e 2.

35 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 3, p. 101 e ss.

36 Alexy explica o caráter prima facie de direitos constitucionais em seu artigo: ALEXY, Robert. Rights, legal reasoning and rational discourse. Ratio Juris, Bologna, v. 5, n. 2, p. 143-152, July 1992.

37 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 3. e ___. Rights, legal reasoning and rational discourse. Ratio Juris, Bologna, v. 5, n.2, p.143-152, July 1992.

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um juízo concreto do dever ser que tem que pronunciar e não admite exceção, então é uma

razão definitiva. E os princípios são sempre razões prima facie.38

Para Alexy quando se fala em decisões sobre direitos se pressupõe a aplicação de

direitos definitivos. E o caminho do direito prima facie até o direito definitivo, quando se tem

princípios, ocorre com a determinação da relação de preferência, que conforme a lei de

colisão é o estabelecimento de uma regra. Pode-se, desta forma, dizer que um princípio seria

em último caso uma razão básica para um juízo concreto, ou seja, uma razão para uma regra

que será a razão definitiva para o juízo concreto. Mas os princípios, em si, não serão nunca

razões definitivas.39

Isto porque, conforme Alexy, os princípios são e sempre serão enunciados gerais/

amplos que dispõem seu conteúdo valorativo mais facilmente que as regras. Podem ser

derivados de normas detalhadas e de decisões judiciais, e não precisam ser estabelecidos

explicitamente. O autor explica que há três objeções contra o conceito de princípio, a primeira

é que haveria colisões de princípios solucionáveis através da declaração de invalidez dos

princípios; a segunda, que existiriam princípios absolutos que não poderiam ser colocados na

relação de preferência; e a terceira, que o conceito de princípio seria amplo demais e inútil,

uma vez que abrangeria todos os interesses que podem ser levados em consideração pela

ponderação.40

Alexy concorda que quando, em um ordenamento, aparece um princípio que colida com

outros princípios ele deve ser declarado inválido, e explica que a possibilidade de existirem

princípios válidos ou inválidos não afeta a teoria da colisão, mas simplesmente revela um de

seus pressupostos. Em relação aos princípios absolutos, Alexy explica que estes seriam

princípios fortes que em caso de colisão não poderiam ser substituídos por outros, e neste caso

a teoria da colisão não seria aplicável. Quanto à amplitude do conceito de princípio, este pode

se referir tanto a direitos individuais quanto a bens coletivos. Quando estes princípios se

referem aos bens coletivos eles ordenam a criação ou manutenção de situações que os 38 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. cap. 3, p. 98 e ss.

39 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 3, p. 101 e ss.

40 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 3, p. 104 e ss.

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satisfaçam, de acordo com possibilidades jurídicas e fáticas. Pode-se, assim, estar diante da

proporcionalidade41 em sentido estrito, o que quer dizer que o mandato de ponderação,

relativiza as possibilidades jurídicas, e faz uma ponderação no sentido da lei de colisão.

Um modelo puro, ou de regras ou de princípios é insuficiente para a aplicação das

normas de direito fundamental. Desta forma Alexy42 sugere um modelo combinado de regras

e princípios – tal modelo seria a vinculação de um nível de princípios com um nível de regras.

A atribuição de princípios às disposições da Lei fundamental seria importante para a questão

da hierarquia constitucional. Um princípio tem hierarquia constitucional de primeiro grau

quando puder limitar um direito fundamental garantido sem reserva, e tem hierarquia de

segundo grau se somente, conjuntamente com uma norma de competência estatuída em uma

disposição de reserva puder limitar um direito fundamental. As colisões acontecem quando se

confrontam os mundos do dever ser ideal e o do dever ser real, e assim, é inevitável dar peso

aos princípios contrapostos e estabelecer preferências. Entre os níveis de princípios e de

regras não existem relações de precedência restrita, mas vale a regra de precedência conforme

a qual o nível das regras precede ao dos princípios, ao menos que as razões para

determinações diferentes às tomadas no nível das regras sejam tão fortes que também

desloquem o princípio de sujeição ao texto constitucional. A força destas razões é justamente

o objeto da argumentação jusfundamental.

Percebe-se, assim, que as disposições de direito fundamental, na visão de Alexy,

possuem um caráter duplo, pois podem ser regras ou princípios. Isto não quer dizer que as

normas de direito fundamental tenham um caráter duplo, elas podem ser regras ou princípios,

e se terá uma norma jusfundamental de caráter duplo somente se ela possuir os dois níveis

juntos, o de regras e o de princípios. Isto acontece quando a uma norma se inclui uma cláusula

restritiva que se refere a princípios, e desta forma tem que haver a ponderação.43

41 “[...] è necessario utilizzare il principio di proporzionalità nell’applicazione. In questo modo le direzioni della

libertà e della tutela dei diritti fondamentali, qualora non indirizzino più solo il rapporto diretto fra Stato e cittadino, vengono resi compatibili fra loro. Come esposto da Alexy, bisogna trovare un determinato rapporto di priorità per ogni caso concreto. E ciò porta alla proporcionalità.” BÖCKENFÖRDE, Ernst-Wolfgang. Stato, costituzione, democrazia: studi di teoria della costituzione e di diritto costituzionale. Tradução de Michele Nicoletti e Omar Brino. Milano: Giuffre, 2006. p.241

42 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 3, p. 129 e ss.

43 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 3, p. 135.

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No basta concebir a las normas de derecho fundamental sólo como reglas o sólo como principios. Un modelo adecuado al respecto se obtiene cuando a las disposiciones iusfundamentales se adscriben tanto reglas como principios. Ambas pueden reunirse en una norma de derecho fundamental con carácter doble.44

Assim, o autor acredita que as normas de direito fundamental devem ser compreendidas

tanto como regras e como princípios. O próprio Alexy esclarece que se pode sustentar que a

teoria dos princípios traria uma insegurança que não poderia ser sustentada, pois ela também

estaria vinculada a valores. Para ele os princípios e os valores se diferenciam somente pelo

seu caráter deontológico (âmbito do dever ser) e axiológico (âmbito do bom). Os valores e os

princípios não auto-regulam sua aplicação, ou seja, a ponderação dos mesmos está sujeita ao

arbítrio de quem a realiza. O resultado da ponderação é um enunciado de preferência

condicionado. Conforme a regra de colisão, a partir de enunciados de preferência

condicionados se seguem regras que, quando se dão as condições, dispõem sobre a

conseqüência jurídica do princípio que tem precedência.45

Alexy sustenta que a lei da ponderação é útil, pois diz o que é importante nas

ponderações, ou seja, o grau ou a intensidade da não satisfação ou afetação de um princípio,

assim como o grau de importância da satisfação de outro princípio. A ponderação se trata de

uma tarefa de otimização. O modelo de ponderação como um todo proporciona um critério ao

vincular a lei da ponderação à teoria da argumentação jurídica46. A teoria dos princípios e dos

valores dos direitos fundamentais se comporta de forma neutra frente a liberdade jurídica.47

Os direitos fundamentais são considerados direitos subjetivos, além da validade de um

ordenamento jurídico se pergunta por que os indivíduos têm direitos e quais direitos têm. O

tema de quando uma norma concede direitos subjetivos tem importância prática, e causa

problema quando a norma deixa aberta o assunto do direito subjetivo, por exemplo, quando

uma norma obriga o Estado a realizar uma ação, a não ser que o cidadão tenha o direito frente

44 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. p. 138.

45 ALEXY, Robert. La formula per la quantificazione del peso nel bilanciamento. Annuario di ermeneutica giuridica: Valori, principî e regole. CEDAM, n. 10, p. 97-123, 2005. e ___. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 3, p. 138 e ss.

46 Sobre a teoria da argumentação jurídica ver: ALEXY, Robert. Teoria dell’argomentazione giuridica: la teoria del discorso razionale come teoria della motivazione giuridica. Tradução de Cosimo Marco Mazzoni e Vincenzo Varano. Milano: A. Giuffre, 1998.

47 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 3, p. 141 e ss.

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ao Estado. E para saber se o indivíduo tem direito são requeridas premissas adicionais, o que

pede valorações independentes.48

Para Alexy, em uma teoria estrutural dos direitos fundamentais o que importa são

questões analíticas, ou seja, principalmente a distinção entre norma e posição. Uma norma é o

que é expresso por um enunciado normativo, que é geral. Já as posições são verificadas

quando se adequa à prática tal enunciado geral. Quando se compreendem os direitos

subjetivos como posições e relações jurídicas é possível diferenciar as razões para os direitos

subjetivos; os direitos subjetivos como posições e relações jurídicas; e a imposição jurídica

dos direitos subjetivos. Quando não se distinguem bem estes três pontos não se chega a um

conceito de direito subjetivo. Para se definir o direito subjetivo Alexy aconselha utilizar a

expressão direito subjetivo seguindo o uso existente como um conceito geral para posições

diferentes, e dentro deste conceito traçar distinções e fazer caracterizações terminológicas.49

A base da teoria analítica dos direitos se divide em três posições de direitos, os direitos

a algo, as liberdades e as competências. Em relação ao direito a algo o que interessa é seu

objeto, que é sempre uma ação do destinatário, e envolve um titular, um destinatário e um

objeto. Um indivíduo, quando tem direito a algo frente ao Estado, se depara com direitos a

ações negativas e direitos a ações positivas. No âmbito do direito às ações negativas estão

compreendidos os direitos ao não impedimento de ações; a não afetação de propriedades e

situações; e a não eliminação de posições jurídicas. No âmbito das ações positivas estão

compreendidos os direitos a ações positivas fáticas e a ações positivas normativas. Sempre

falando em relação ao seu objeto.50

Alexy faz uma análise deôntica da lógica do direito a algo e explica que para a teoria

dos direitos fundamentais o interesse maior recai sobre o conceito de permissão – que seria a

negação da proibição. Para ele, para se chegar a uma decisão em casos controvertidos são

necessárias valorações e conhecimento empírico, mas a análise deôntica constitui uma base

necessária para a argumentação jurídica racional que traz uma clareza. O autor se volta a 48 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. cap. 4, p. 173 – 246.

49 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 4, p. 173 – 177.

50 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 4, p. 186 e ss.

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outro grupo de posições jurídicas básicas que é a liberdade, o qual pode ser conceituado de

duas maneiras: como uma manifestação ampla de liberdade ou como um conceito

constitutivo, o da permissão jurídica. A criação de uma liberdade jurídica requer tão somente

uma omissão do Estado, uma ação negativa, e para garantir esta liberdade negativa o que se

requer é um direito de defesa. Para se evitar confusões se deve especificar que tipo de

liberdade as normas de direito fundamental devem assegurar.51

Neste contexto se deve dar atenção às liberdades jurídicas, e verificar as liberdades

protegidas e as não protegidas. A liberdade jurídica não protegida se reduz totalmente às

permissões, pode ser definida como a conjunção de uma permissão jurídica de fazer algo e

uma permissão jurídica de omitir. E quando se conquista um direito a liberdade não protegida

passa a ser uma liberdade protegida.52

O autor explica que as normas de direito fundamental são normas permissivas explícitas

na medida em que permitem algo através delas. As normas permissivas de direito

fundamental pertencem às normas de grau constitucional, normas de máxima hierarquia, já as

normas proibitivas e prescritivas são normas de caráter inferior. Assim, as normas

jusfundamentais permissivas tem uma função de fixar os limites do dever ser com respeito às

normas de grau inferior. Olhando através da perspectiva do titular do direito fundamental, as

normas jusfundamentais se apresentam como normas que conferem permissões. A liberdade

jurídica não protegida é uma permissão de fazer algo e de omiti-lo, não está assegurada

através de normas e direitos que protejam a liberdade. A proteção jusfundamental da

liberdade consiste em um catálogo de direitos a algo e também de normas objetivas que

asseguram ao titular do direito fundamental a possibilidade de realizar ações permitidas. Desta

maneira, se uma liberdade está vinculada a tais direitos ou normas é uma liberdade

protegida.53

Estas liberdades protegidas podem ser de quatro tipos: as liberdades diretamente

protegidas e as indiretamente protegidas, que podem ser protegidas com normas de direito 51 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. cap. 4, p. 210 e ss.

52 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 4, p. 219 e ss.

53 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 4, p. 222 e ss.

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subjetivo ou objetivo. As liberdades jusfundamentais são liberdades que envolvem relações

com o Estado, e esta relação está protegida direta e subjetivamente. Quando se fala em

direitos fundamentais como direitos de proteção se refere a direitos frente ao Estado, a ações

negativas que protegem liberdades jusfundamentais. Tais direitos estão vinculados com a

competência de fazer valer judicialmente suas violações. O conceito de competências é

indispensável para se compreender a estrutura dos direitos fundamentais, tanto as

competências dos cidadãos quanto as do Estado.54

Para se avaliar as competências dos cidadãos se tem que especificar sua relação com os

direitos a algo e com as liberdades. O direito a uma competência está vinculado com o

conceito de uma garantia institucional e com o conceito de liberdade. A garantia institucional

seria, então, à primeira vista, uma proibição dirigida ao legislador de não eliminar

determinadas competências do cidadão. Se a esta proibição não corresponde nenhum direito

do cidadão, a proteção é meramente objetiva, ao contrário, se em relação à proibição

correspondem direitos do cidadão, então a proteção é também subjetiva.55

Nas competências do Estado as normas jusfundamentais entram como normas de

competência negativa. Uma norma que limita uma norma de competência positiva. As normas

de competência negativa estabelecem cláusulas de exceção às normas de competências

positivas. Assim, colocam o Estado em posição de não-competência e os cidadãos na de não

sujeição. A não sujeição é uma proibição dirigida ao Estado de não intervir no âmbito de não-

competência definido por normas jusfundamentais.56

O direito fundamental como um todo é um catálogo de posições jusfudamentais. O que

fica em aberto é saber o que reúne as diferentes posições individuais jusfundamentais em um

direito fundamental. Uma resposta simples seria sua atribuição a uma disposição de direito

fundamental. Desta forma o titular do direito fundamental deve ter um direito a ações do

Estado que são indispensáveis para a proteção de seu âmbito de liberdade, assegurado por

disposições jusfudamentais, o que seria a proteção positiva de uma liberdade. O que se discute 54 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. cap. 4, p. 227 e ss.

55 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 4, p. 228 e ss.

56 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. caps. 4 e 5, p. 236 e ss.

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em relação aos direitos fundamentais é sobre suas garantias de procedimento, ou seja, a

incorporação de posições procedimentais ao direito fundamental como um todo, por uma

relação meio/fim. A relação de ponderação pode ser usada para fundamentar uma

determinação de significado, a seleção e exclusão de fins e a exclusão de meios. Alexy

defende então que a relação de ponderação é uma relação que corresponde à lei de colisão,

entre uma posição prima facie e uma posição definitiva.57

O direito fundamental como um todo pode ser entendido como quatro definições

diferentes, tais como: um catálogo de posições definitivas; um catálogo de posições

definitivas incluindo as relações existentes entre elas; um catálogo de posições definitivas e

prima facie; e um catálogo de posições definitivas e prima facie incluindo as relações

existentes entre elas. O direito fundamental como um todo é, então, um catálogo de posições

definitivas e prima facie, vinculadas reciprocamente nestas três formas descritas e atribuídas a

uma disposição jusfundamental. O direito fundamental como um todo é um objeto muito

complexo, composto por elementos com uma estrutura bem definida, com posições distintas

de cidadão e Estado e relações claramente determináveis, como as de precisão, as de meio e

fim e as de ponderação.58

Percebe-se, a partir de Alexy que o direito fundamental como um todo é um catálogo de

posições de diferentes conteúdo e estrutura. E posições totais concretas têm que ser

distinguidas de posições totalmente abstratas, Alexy faz esta distinção através da teoria do

status de Jellinek, pois ela serve como base para uma classificação dos direitos fundamentais.

Estes status caracterizam uma relação com o Estado que qualifica o indivíduo. Existe o status

passivo de um indivíduo, o qual permanece sendo o mesmo quando muda o número ou o

conteúdo das posições que constituem o catálogo. O conceito de status passivo é uma

abstração de determinadas posições descritíveis com a ajuda de modalidades e reduzíveis a

modalidades normativas. O conteúdo do status passivo está no âmbito das obrigações. O

status negativo consiste em uma esfera de liberdade individual, e assim seu conteúdo está no

âmbito das liberdades, ou seja, ações que não estejam nem ordenadas nem proibidas. O status

positivo diz respeito a pretensões jurídicas individualizadas formalmente reconhecidas, ou

57 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. cap. 4, p. 234 e ss.

58 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 4, p. 236 e ss.

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seja, a capacidade juridicamente protegida para exigir prestações positivas do Estado. E por

fim o status ativo, que lida com a competência. Este status está vinculado a outro status, pois

o exercício de uma competência está sempre ordenado ou proibido (status passivo), ou é livre

(status negativo).59 A citação a seguir ilustra este assunto:

Lo que para el status pasivo es el mandato o la prohibición que afecta al individuo, para el status negativo la liberación y para el status positivo el derecho a algo, es la competencia para el status activo o el status de la ciudadanía activa.60

Apesar das críticas por suas obscuridades e algumas deficiências, a teoria do status é

uma teoria analítica, no âmbito dos direitos fundamentais, muito reconhecida. Através de

normas de direito fundamental, o cidadão é colocado em status com certos conteúdos, entre

outros no status negativo jusfundamental. O objeto da teoria do status é a estrutura formal da

posição jurídica total do cidadão. Dentro da análise da teoria do status o que se introduziu foi

um conceito de espaço de liberdade, ou seja, uma classe de determinadas liberdades.61

Existem restrições aos direitos fundamentais, e como bem lembra Alexy, para a teoria

dos direitos fundamentais é importante especificá-las. Quando se parte do modelo dos

princípios se restringe não somente um bem protegido das normas de direito fundamental,

mas também um direito prima facie garantido por normas jusfundamentais. As restrições de

direitos fundamentais são normas que restringem posições jusfundamentais prima facie. E

uma norma somente pode ser uma restrição de direito fundamental se for constitucional. É

importante distinguir-se regras e princípios quanto às restrições. Uma regra (de acordo com a

Constituição) é uma restrição de um direito fundamental quando, com sua vigência, no lugar

de uma liberdade jusfundamental prima facie, aparece uma não liberdade definitiva ou um

não direito definitivo de igual conteúdo. Os princípios também podem restringir direitos

fundamentais quando direitos fundamentais de terceiros entrarem em colisão com outros

valores jurídicos do rol constitucional e limitarem direitos fundamentais. Para se chegar às

restrições causadas por princípios se deve fazer uma ponderação entre o princípio de direito

fundamental e os princípios que o restringem. Os princípios contrapostos restringem

59 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. cap. 5, p. 247 e ss.

60 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. p. 260.

61 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 5, p. 261 e ss.

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materialmente as possibilidades jurídicas de realização de princípios jusfundamentais. E,

portanto, um princípio é uma restrição de um direito fundamental quando há casos nos quais é

uma razão para que, no lugar de uma liberdade jusfundamental prima facie ou de um direito

fundamental prima facie, apareça uma não-liberdade definitiva ou um não direito definitivo

de igual conteúdo.62

As restrições aos direitos fundamentais podem acontecer, quando se trata de direitos de

categoria constitucional, como normas de categoria constitucional. Tais restrições são

diretamente constitucionais, e quando as restrições são de categoria inferior à Constituição são

indiretamente constitucionais. O conceito de restrição corresponde à perspectiva de direito e o

conceito de cláusula restritiva à perspectiva da norma. Uma cláusula restritiva, desta forma, é

a parte da norma completa de direito fundamental que diz como está restringido ou pode ser

restringido o que o pressuposto de fato de direito fundamental garante prima facie. As

cláusulas restritivas podem ser tácitas (restrições com caráter de princípio, direitos

fundamentais de terceiros que entram em colisão) ou expressas (diretamente constitucionais).

As restrições indiretamente constitucionais são aquelas autorizadas pela Constituição, a

competência para impor tais restrições é expressa nas cláusulas de reserva explícitas, ou seja,

disposições jusfundamentais que autorizam intervenções, restrições ou limitações.63

Uma restrição dos direitos fundamentais só seria admissível se no caso concreto com

princípios opostos eles correspondam a um peso maior do que do princípio jusfundamental.

Pode-se dizer, assim, que os direitos fundamentais são restrições a sua restrição e

restringibilidade. A Constituição Alemã tem a garantia do conteúdo essencial64 em um de seus

artigos, mas tal garantia não formula nenhuma restrição adicional à restringibilidade dos

direitos fundamentais em relação ao princípio da proporcionalidade. A garantia do conteúdo

essencial proíbe afetar os direitos fundamentais em seu conteúdo essencial. Entretanto, como

62 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. cap. 6, p. 267 e ss.

63 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 6, p. 272 e ss.

64 Para verificar a garantia do conteúdo essencial no Brasil ver: BIAGI, Cláudia Perotto. A garantia do conteúdo essencial dos direitos fundamentais na jurisprudência constitucional brasileira. Porto Alegre: Sérgio Fabris, 2006.

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é equivalente a uma parte do princípio da proporcionalidade é uma razão a mais a favor da

validade do princípio da proporcionalidade.65

Alexy explica que, além das restrições, se deve entender o lado positivo da garantia

fundamental, verificando o pressuposto de fato e seu âmbito de proteção. No caso de normas

jusfundamentais permissivas os conceitos de pressuposto de fato e âmbito de proteção não

causam dificuldades, e ambos coincidem. Já nos direitos de defesa não se pode fazer uma

conexão entre o pressuposto de fato e seu âmbito de proteção tão facilmente. O pressuposto

de fato nas normas permissivas descreve o bem protegido, e nas normas de defesa, descreve o

bem protegido e a intervenção. Os conceitos de bem protegido e de intervenção não precisam

necessariamente determinar os passos para um exame de direito fundamental. Assim, só se

sabe se um direito está ou não jusfundamentalmente proibido quando se recorre diretamente

ao respectivo princípio jusfundamental.66

Para que uma norma produza uma conseqüência jurídica ela deve cumprir todas suas

condições. Uma norma jusfundamental, para que produza uma conseqüência jurídica

jusfundamental definitiva tem que satisfazer o pressuposto de fato e não satisfazer a cláusula

restritiva. Deste modo, a conseqüência jurídica de uma norma se produz quando se cumprem

todas suas condições. Pode-se construir um conceito de pressuposto de fato de direito

fundamental que abranja a totalidade das condições de uma conseqüência jurídica

jusfundamental definitiva. Alexy entende que as teorias estreitas do pressuposto de fato são

fracas, pois não constroem a exclusão definitiva da proteção jusfundamental como um jogo de

razões e contra-razões. Ou seja, não atuam como o resultado de uma ponderação entre

princípios, mas ao contrário numa série de casos, como o resultado da aplicação de critérios

supostamente livres de ponderação. Estes critérios, quando conduzem a resultados

justificados, seriam o resultado de ponderações corretas. Isto pode ser generalizado. Os juízos

de direito fundamental seriam corretos somente se pudessem ser o resultado de uma

ponderação correta. Se forem fundamentados sem ponderação, sua correção depende de que o

65 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. cap. 6, p. 276 e ss.

66 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 6, p. 277 e ss.

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resultado fundamentado sem ponderação possa também ser o resultado de uma ponderação

correta.67

Quanto mais amplamente forem concebidos os pressupostos de fato, maior será o

número de casos nos quais tem relevância as normas jusfundamentais e, portanto, maior

também será o número de colisões de direitos fundamentais. Contra isto se opõe uma

jusfundamentação de todo o direito, uma expansão dos direitos fundamentais, que fecharia em

si mesma o perigo de uma excessiva expansão da competência do Tribunal Constitucional

Federal. Entretanto, uma teoria ampla do pressuposto de fato teria vantagens claras, pois de

um lado, poderia tratar os casos não duvidosos de não proteção jusfundamental como meros

casos potenciais de direitos fundamentais, nos quais, por certo, seria concebível uma

fundamentação jusfundamental, mas que seria totalmente supérflua. E evitar-se-ia, assim, o

perigo de uma desproporcionada superposição da argumentação jurídica ordinária com a

argumentação jusfundamental. De outro lado, cada vez que surgisse dúvida sobre a proteção

ou não proteção jusfundamental, a teoria ampla poderia partir de um caso atual de direito

fundamental, com o que se abriria a via até uma argumentação jusfundamental substancial,

orientada pelo princípio da proporcionalidade. Com isto se evitaria o perigo de um

deslocamento da argumentação jusfundamental por parte de uma argumentação de direito

ordinário.68

Para Alexy, ficaria, todavia, uma objeção de competência. A teoria do pressuposto de

fato seria afetada por ela quando conduzisse a um inadmissível aumento da competência do

Tribunal Constitucional, seja frente ao legislador, seja frente aos tribunais que julgam o caso.

Entretanto, uma conseqüência tal não estaria necessariamente vinculada com a teoria ampla

do pressuposto de fato. Pode-se duvidar também que conduziria a um aumento dos recursos

apresentados perante o Tribunal Constitucional Federal. Quem recorresse a ele estaria

interessado em uma proteção jusfundamental definitiva e não na determinação dogmático-

jusfundamental de que seu comportamento fosse enquadrado certamente sob um pressuposto

de fato, mas estaria abarcado por restrições. Entretanto, quando se apresenta um recurso

constitucional unilateralmente orientado pelo pressuposto de fato, sua aceitação pode ser

67 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. cap. 6, p. 282 e ss.

68 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 6, p. 286 e ss.

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rechaçada pela comissão de juízes, por não existirem suficientes probabilidades de êxito.

Outro filtro seria constituído pela decisão de aceitação do Senado. Quando a denegação da

aceitação fosse fundamentada, uma referência às restrições seria, pelo menos, tão convincente

como uma referência ao fato de que não estaria abrangido pelo pressuposto de fato.69

Alexy lembra que nem todas as normas de direito ordinário que têm como objeto uma

questão que é abrangida por um direito fundamental são restrições deste direito fundamental.

Para se saber quais normas são restritivas e quais não são, no âmbito dos direitos

fundamentais, se deve verificar a relação que a norma tem com o direito fundamental. E,

assim, entender estas restrições é importante para se constatar os efeitos de tais restrições.

Uma norma que não restringe um direito fundamental não tem que ser justificada como

restrição frente a este direito fundamental. Uma norma não restritiva no âmbito de um direito

fundamental é uma norma que tem algo a ver com o que abrange o direito fundamental, ou

seja, é uma norma que o configura.70

Cada vez que a eliminação de uma competência obstaculiza a realização de um

princípio fundamental se está frente a uma restrição que, como tal, deve ser justificada. O

critério da não obstaculização da realização de um princípio jusfundamental pode ser utilizado

em todos os casos para a delimitação da configuração e da restrição. A restrição é tratada

como limitação que deve ser solucionada dentro de uma ponderação entre princípio

jusfundamental que ela obstaculiza na sua realização, e os princípios de âmbito constitucional

opostos e relevantes para o caso. O critério da não obstaculização da realização do princípio

jusfundamental implica que sempre que seja necessário (caso de direito fundamental real) ou

meramente possível (caso de direito fundamental potencial) uma ponderação orientada pelo

princípio da proporcionalidade, não se deve supor uma configuração, mas sim uma restrição.

Desta forma, um conceito amplo de restrições cumpre com as exigências da racionalidade da

fundamentação jusfundamental. Todas as restrições devem ser fundamentadas, sendo um

pressuposto essencial para que somente se normatizem restrições permitidas.71

69 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. cap. 6, p. 292 e ss.

70 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 6, p. 298 e ss.

71 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 6, p. 321 e ss.

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Para se compreender a teoria, Alexy72 explica sua aplicação em relação aos direitos

garantidos na Constituição alemã, que podem servir aqui de exemplo, uma vez que também

são regulados pela Constituição Brasileira. A Constituição alemã confere direitos a

determinadas liberdades assim como direitos frente a determinadas restrições. Alexy

demonstra como toda a argumentação sobre a estrutura das normas jusfundamentais e dos

direitos fundamentais podem contribuir para a solução de alguns problemas, considerando o

direito geral de liberdade, e também considerando o mesmo como princípio marco na

interpretação. A liberdade geral de ação seria a liberdade de fazer e omitir o que o indivíduo

queira. Entende-se que cada um tenha prima facie, na medida em que não intervenham

restrições, um direito frente ao Estado que este não impeça suas ações e omissões. Abrange-

se, deste modo, todas as ações dos titulares de direito fundamental e todas as intervenções do

Estado nas ações dos titulares de direito fundamental. Ainda, com estes direitos se protegem

não somente ações como também situações e posições jurídicas do titular do direito

fundamental, isto porque, as intervenções em situações e posições jurídicas de um titular de

direito fundamental afetam indiretamente sua liberdade de ação.

Frente ao direito geral de liberdade, Alexy explica que se pode ponderar usando o

princípio da proporcionalidade, o que justifica sua não carência de substância. A lei da

ponderação exige, quando se aumenta a intensidade de uma afetação da liberdade, um peso

crescente das razões que justifiquem a afetação. Pode-se dizer que a proibição de uma ação

em todas as suas formas representa sempre prima facie uma afetação realmente intensa. Para

se poder justificar a liberdade geral se usa o princípio da dignidade da pessoa. Tal princípio é

tão vago como o conceito de dignidade da pessoa. Mas o Tribunal Constitucional Federal

Alemão define a concepção da pessoa como um ser ético-espiritual que aspira a se determinar

e se desenvolver em liberdade, e a Lei Fundamental entende esta liberdade como a de um

indivíduo vinculado e referido a uma comunidade. Percebe-se que esta liberdade não é

ilimitada, e assim se trata de uma liberdade negativa.73

[...] justamente esto es el contenido del principio de la libertad negativa ya que éste, en tanto principio, no otorga una permisión definitiva de hacer u omitir lo que se quiera, sino que tan sólo dice que cada cual puede hacer u omitir lo que quiera en la medida en que razones suficientes (derechos de terceros e intereses colectivos) no

72 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. cap.7, p. 331 – 380.

73 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 7, p. 335 e ss.

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justifiquen una restricción de la libertad negativa. Con ello, el principio de la libertad negativa puede tomar en cuenta, en toda su amplitud, la vinculación del individuo con la comunidad.74

Assim, o princípio da liberdade negativa limita as ações dos indivíduos nos direitos de

terceiros e dos interesses coletivos. Exigindo sempre uma razão para tal restrição. O princípio

da liberdade negativa tem outros princípios materiais que somados aparecem em ponderações

e determinam seu peso. Alexy menciona a teoria das esferas e a teoria das liberdades tácitas,

que indicam as esferas de proteção. Dentro destas esferas se diferenciam a intensidade de

proteção, existem as esferas: mais interna; privada ampla; e social. Tal teoria é o resultado de

ponderações do princípio de liberdade negativa com outros princípios e princípios opostos.

Na esfera mais interna prevalecem os princípios que dizem respeito à proteção, aplicando-se

assim a lei da ponderação. Existem circunstâncias sob as quais o resultado da ponderação é

tão seguro que se pode falar em regras asseguradas em alto grau, que protegem o âmbito mais

interno. No âmbito da esfera privada mais ampla e da esfera social a proteção jusfundamental

é tanto mais forte quanto maior peso tiverem os princípios que se aderem ao princípio da

liberdade geral de ação e que protejam a privacidade.75

A teoria dos direitos de liberdade tácitos se apóia na teoria das esferas, mas vai além.

Deve-se primeiro saber se o bem protegido é uma ação ou uma situação do titular do direito

fundamental. Em caso de ação pode-se formar uma norma permissiva, e em caso de situação

se pode formular proibições dirigidas aos destinatários de direitos fundamentais. A segunda

distinção se dá no âmbito dos direitos de liberdade tácitos abstratos e concretos. A terceira

distinção se refere à diferença entre posições prima facie e definitivas. Os direitos de

liberdade tácitos podem ser entendidos como reações da jurisprudência constitucional às

ameaças da liberdade consideradas como inquietantes.76

O pressuposto de fato do direito geral de liberdade inclui, por definição, os pressupostos

de fato de todos os direitos especiais de liberdade. Do fato que está permitido prima facie

fazer ou omitir o que se quiser, se segue logicamente que prima facie está permitido expressar

74 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. p. 347.

75 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 7, p. 349 e ss.

76 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 7, p. 358 e ss.

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ou não expressar a própria opinião, entre outras ações. O sistema é considerado fechado na

medida em que o direito geral de liberdade protege amplamente prima facie a liberdade

negativa. De outro lado é considerado aberto na medida em que a existência do direito geral

de liberdade mantém aberta a possibilidade de novos direitos definitivos, assim como novos

direitos tácitos.77

Alexy acredita que com a lei de ponderação, o direito geral de liberdade é introduzido

na situação total de liberdade de forma tal que a “referência da pessoa e a vinculação com a

comunidade” pode ser levada em consideração sem maiores problemas e se mantém os

elementos de liberdade necessários para a “independência da pessoa” na vida moderna.78

Toda norma de direito fundamental é uma norma constitucional material, e assim, toda

intervenção à liberdade negativa seria uma lesão ao artigo da Constituição alemã quando

violasse alguma norma de direito fundamental. Isto faz com que haja um problema circular de

interpretação. Para se solucionar este problema, Alexy explica que se deve ponderar os

princípios frente aos princípios que falam sobre a intervenção, os sub-princípios formais e

materiais devem ser examinados com um mesmo grau. Soluciona-se o problema da

argumentação circular com o exame do direito fundamental determinado dentro do marco

deste mesmo direito fundamental. Após isto se verifica se os direitos fundamentais são de um

mesmo titular ou de outros titulares, se são direitos de um mesmo titular se verifica se, dentro

do marco do direito geral de liberdade, se trata de direitos de liberdade ou não. No caso de

outros direitos de liberdade do mesmo titular é possível reduzir o problema fazendo referência

à subsidiariedade do marco de direito fundamental que se está examinando. Neste caso se

pode fazer isto, pois o pressuposto de fato do marco fundamental em discussão abrange

também os pressupostos de fato dos direitos especiais.79

Diferentemente, quando os direitos fundamentais são direitos de um mesmo titular,

porém de marcos diferentes, a análise deve ser feita em cada direito fundamental de acordo

com seu marco. Entretanto, se pode restringir os direitos fundamentais dentro de um só marco 77 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. cap. 7, 359 e ss.

78 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 7, p. 361 e ss.

79 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 7, p. 365 e ss.

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fazendo um exame total e sucessivo. Quanto ao exame de direitos fundamentais de terceiros

dentro de um marco de direitos fundamentais, no caso o direito geral de liberdade, o tribunal

faz um exame formal da intervenção sobre a base de normas de competência e faz um exame

de proporcionalidade dentro do marco de direito fundamental. As normas de competência têm

um caráter de proteção de liberdade com relação ao direito geral de cada um. A solução aqui

consiste na relativização do conceito de contrariedade jusfundamental. Ao indivíduo

correspondem direitos fundamentais referentes a ele, mas não um direito fundamental que não

afete a sua situação jusfundamental total, que incluiria um direito fundamental que não afete

os direitos fundamentais de terceiros. Ou seja, há uma diferença entre as normas de

competência e os direitos fundamentais de terceiros, o que justificaria não se examinar os

direitos fundamentais de terceiros dentro do marco de exame do direito fundamental.80

Outro direito conferido pela Constituição Alemã81 e tomado como princípio marco é o

direito geral de igualdade. Neste caso, como no do direito geral de liberdade é necessário

diferenciar o direito geral de igualdade dos direitos especiais de igualdade. Neste caso a idéia

é de que toda a norma jurídica seja aplicada a todo caso que estiver sob seu pressuposto de

fato e a nenhum caso que não esteja sob ele, o mandato de igualdade na aplicação do direito

exige o que vale se as normas são válidas. O direito geral de igualdade exige que todos sejam

tratados igualmente pelo legislador, mas esta igualdade é tida como tratar de forma igual os

iguais e de forma desigual os desiguais, em relação à matéria.82

Alexy explica que, para se solucionar o pleito da valoração vinculada com a máxima

material geral da igualdade, busca-se o conceito de arbitrariedade. Neste sentido, há duas

linhas de interpretação: uma que sustenta que a máxima geral de igualdade deve ter sempre

uma comparação; e a outra que reduz a máxima geral de igualdade a uma proibição geral de

arbitrariedade. O Tribunal Alemão usa como fio condutor o seguinte:

La máxima de la igualdad es violada cuando para la diferenciación legal o para el tratamiento legal igual no es posible encontrar una razón razonable, que surja de la

80 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. cap. 7, p. 370 e ss.

81 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. p. 381.

82 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 8, p. 380 – 418.

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naturaleza de la cosa o que, de alguna otra forma, sea concretamente comprensible, es decir, cuando la disposición tiene que ser calificada arbitraria.83

Desta forma, ocorre violação da máxima da igualdade quando o tratamento desigual for

arbitrário. Uma diferenciação é arbitrária quando não se pode encontrar uma razão qualificada

de um determinado modo, isto é, quando não há uma razão que permita um tratamento

desigual, pois se presume que não havendo razão para diferença, o tratamento deve ser igual.

Assim, a máxima geral de igualdade pode ser interpretada como um princípio de igualdade

que, prima facie, exige um tratamento igual e permite um tratamento desigual se houver

razões para tanto. Para se saber quais são razões suficientes que permitem um tratamento

desigual são necessárias valorações. Em relação a igualdade se fala sempre em ponderações.

Observa-se que o direito geral a igualdade pode ser entendido pelo princípio da igualdade de

iure, que é um direito prima facie à omissão de tratamentos desiguais; assim como pelo

princípio da liberdade fática, que é o direito prima facie a ações positivas do Estado. E a

interpretação do direito geral de igualdade não pode se dar somente no sentido de um direito

de status negativo, mas sim tem que atribuir um catálogo de direitos subjetivos com estrutura

diferente, e só isso pode definir o direito fundamental de igualdade.84

Alexy também menciona que os indivíduos têm frente ao Estado direitos a ações

positivas, que pressupõem um conceito amplo de prestação85, bem como direitos a ações

negativas. As questões que se colocam são quanto às prestações do Estado, se e em que

medida às disposições de direitos fundamentais devem ser atribuídas normas que conferem

direitos a prestações.86

Um direito prima facie se torna definitivo quando os princípios opostos a ele não

exigirem outra coisa. A capacidade do titular individual de um direito fundamental no sentido

de poder impor frente ao poder público a norma básica de decisão valorativa pertence ao

83 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. p. 391.

84 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 8, p. 398 e ss.

85 A questão do direito fundamental e Estado das prestações é tratada no terceiro capítulo da obra: HÄBERLE, Peter. Cultura dei diritti e diritti della cultura nello spazio costituzionale europeo. Traduzione a cura della cattedra del Prof. Häberle (Università di Bayereuth), revisione della traduzione a cura di Luca Pirozzi. Milano: Giuffre, 2003.

86 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 9, p. 419 – 502.

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conteúdo de direito fundamental individual, cuja efetividade fica reforçada. Se as normas que

conferem direitos prima facie têm cláusulas restritivas, elas assumem um caráter de normas

que devem ser concretizadas, mas que atribuem direitos definitivos.87

Alexy reforça a idéia de que em todos os casos de direitos baseados em princípios

devem ser avaliadas as possibilidades fáticas e jurídicas, e devem ser feitas distinções entre

posições prima facie e posições definitivas. Como existem diferentes graus de eficácia e

também de colisões é preciso refinar o modelo básico. Verificar os meios para o cumprimento

do dever de proteção e analisar com um princípio oposto quais meios são ineficazes e quais

são eficazes. Após esta etapa se deve avaliar se o princípio que se está seguindo tem um peso

maior que seu princípio oposto e, assim, se a utilização de determinados meios é justificada.

Se nenhuma das possibilidades puder se realizar então não se pode usar nenhum dos meios

para se realizar o dever de proteção prima facie. Entretanto, se pelo menos dois meios

puderem ser justificados através de um princípio frente a outro, então existe um campo de

ação de modelo básico. Mas isto pode não funcionar quando os dois meios são igualmente

eficazes com relação a um princípio e um dos meios afetar o princípio oposto mais

intensamente que o outro meio. A escolha do meio que afeta mais o princípio oposto seria

uma afetação não necessária, o que justificaria a escolha do outro meio, mas que por afetar

menos o princípio oposto não daria um campo de ação para a realização do princípio

norteador. Assim, o campo de ação não coloca problemas sobre o tema da justiciabilidade,

eles surgiriam devido a problemas de avaliação e efetividade. Tais problemas estão ligados à

questão normativa da ponderação e à questão empírica da efetividade. A ponderação do

problema da justiciabilidade dependeria do papel que tenham o problema da ponderação e o

do prognóstico, efetividade, dentro do marco dos direitos a proteção.88

Cuanto más afecte la intervención legal las formas elementales de expresión de la libertad de acción humana, con tanto mayor cuidado tienen que ponderarse las razones presentadas para su justificación frente a la pretensión fundamental de libertad del ciudadano.89

87 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. cap. 9, p. 426 e ss.

88 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 9, p. 435 e ss.

89 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. p. 453.

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Alexy fala também sobre as normas de organização e procedimento. Os procedimentos

são considerados sistemas de regras e/ ou princípios para a obtenção de um resultado. Se o

resultado é conseguido seguindo-se as regras e princípios então se tem um caráter positivo, de

acordo com a concepção e perspectiva do procedimento, e quando não é conseguido assim

tem uma característica negativa. A todo direito fundamental material são atribuídos direitos

procedimentais. No que diz respeito à teoria dos direitos fundamentais, Alexy demonstra a

ligação dos procedimentos a tais direitos em quatro âmbitos do direito - em relação: às

competências de direito privado; dos procedimentos judiciais e administrativos; à organização

em sentido estrito e à formação da vontade estatal. As competências de direito privado que

asseguram direitos fundamentais são normas de direito dos contratos, da propriedade, do

matrimônio, direito sucessório e de associação. Os procedimentos judiciais e administrativos

garantem que os direitos materiais de um titular de direitos resultem conforme direito

fundamental. A organização em sentido estrito, de determinadas exigências jusfundamentais e

matérias jurídicas, traz direitos do indivíduo frente ao legislador para que este dite normas de

organização conforme ao direito fundamental. A formação da vontade estatal diz respeito ao

direito de participar indiretamente da legislação através do direito ao voto, uma vez que os

direitos fundamentais garantiriam um processo democrático.90

Em relação aos direitos sociais fundamentais, Alexy explica que eles podem ser

vinculantes ou não vinculantes, subjetivos ou objetivos, definitivos ou prima facie. Não se

pode tratar o assunto como tudo-ou-nada91. O principal argumento a favor dos direitos

fundamentais sociais seria a liberdade. De acordo com a teoria dos princípios se deve

interpretar que o catálogo de direitos fundamentais expressa, entre outras coisas, princípios

que exigem que o indivíduo possa se desenvolver livre e dignamente na sociedade, o que

pressupõe uma liberdade. Para o autor os direitos fundamentais sociais são muito vagos, e

desta forma se partiria do argumento de que eles não seriam judiciáveis ou seriam em um

modo reduzido. Isto porque a competência para tais direitos seria do legislador, ou seja, os

tribunais só poderiam decidir sobre o que o legislador já houvesse decidido. Tudo devido ao

custo destes direitos92. Isto sob uma ótica formal.93

90 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. cap. 9, p. 482 e ss.

91 Como defende Dworkin.

92 A respeito do tema o custo dos direitos ver: HOLMES, Stephen; SUNSTEIN, Cass R. Il costo dei diritti: perché la libertà dipende dalle tasse. Bologna: il mulino, 2000. Traduzione di Elisabetta Caglieri.

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Sob um ponto de vista material, os direitos fundamentais sociais seriam incompatíveis

com normas constitucionais materiais. Neste caso, quando acontecesse uma colisão de direitos

fundamentais sociais com direitos fundamentais de liberdade, o Estado só poderia dar até

onde tivesse arrecadado para tanto, já que os direitos sociais fundamentais são bastante caros.

Para se saber quais direitos sociais fundamentais que um indivíduo possui de forma definitiva

se deve fazer uma ponderação entre princípios. Entre os princípios a serem ponderados

estariam o princípio da liberdade fática, os princípios formais de competência de decisão do

legislador democraticamente legitimado e o princípio da divisão de poderes, além dos

princípios materiais que se referem à liberdade jurídica de outros e a outros direitos

fundamentais sociais e bens coletivos. Uma prestação jurídica estaria garantida

jusfundamentalmente se o princípio da liberdade fática fosse exigido urgentemente e se os

demais princípios formais e materiais opostos fossem afetados de maneira reduzida, ou seja,

se o primeiro possuir maior peso que os últimos. Isto acontece, mais frequentemente, no caso

dos direitos fundamentais sociais mínimos.94

A competência do Tribunal termina, desta forma, nos limites do que é definitivamente

devido. Entretanto, vai além destes limites quando os princípios contêm exigências

normativas ao legislador, que cumpre princípios jusfundamentais além do âmbito do

definitivamente devido, cumprindo normas de direito fundamental. As normas

jusfundamentais são, desta forma, importantes para o sistema jurídico, pois vinculam a

legislação, o poder executivo e o poder jurídico. Quando uma constituição é mista (formal e

material) existem direitos possíveis, necessários e impossíveis. Os princípios jusfundamentais

influem no sistema jurídico como princípios objetivos. Os direitos fundamentais como normas

objetivas ou valores jusfundamentais também podem influir na interpretação do direito

privado, que pode trazer efeitos para terceiros através de direitos frente ao Estado.95

A abrangência das normas jusfundamentais em todos os âmbitos do direito teria alguns

efeitos quanto ao caráter do sistema jurídico. O primeiro seria a limitação dos conteúdos

possíveis do direito ordinário, ou seja, o conteúdo das normas jusfundamentais determina o 93 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. cap. 10, p. 503 e ss.

94 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 10, p. 506 e ss.

95 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 10, p. 510 e ss.

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sistema jurídico material pela Constituição. O segundo diz respeito ao caráter de princípios

que as normas jusfundamentais têm, o que implica em ponderações e que em cada caso a

solução será derivada de uma valoração diferente, deixando o sistema jurídico aberto. O

terceiro efeito diz respeito ao tipo de abertura, ou seja, é um sistema aberto frente a moral,

pois incorporou conceitos básicos jusfundamentais: dignidade, liberdade e igualdade.96

Um assunto problemático é o que diz respeito à competência de um Tribunal

Constitucional, principalmente em relação ao equilíbrio de competências entre um Tribunal

Constitucional e o legislador. Em um nível material a competência de controle em casos

concretos ou em determinados grupos de casos depende do peso dos princípios

jusfundamentais decisivos. Quanto ao nível funcional ou de competência depende do grau de

correição e maior aceitação de decisões do legislador e da imparcialidade do Tribunal. E

quanto ao nível metodológico se expõe argumentos a favor ou contra a possibilidade de

fundamentação racional de decisões jusfundamentais. A competência do controle do Tribunal

depende, assim, da segurança com que se possa fundamentar a existência de uma posição

jusfundamental.97

Para se ter uma posição jusfundamental correta, se parte da teoria da argumentação

jurídica. Para se compreender a argumentação jusfundamental o modelo de argumentação

jurídica deve ser complementado. O discurso98 jusfundamental não está sujeito às decisões

tomadas no procedimento legislativo, mas tem prioridade sobre ele. O que quer dizer que não

há a controvérsia da sujeição mais importante que existe para a argumentação jurídica geral,

que é a lei ordinária, e geralmente é concreta. A argumentação jusfundamental pode ser

caracterizada como a argumentação jurídica geral com termos de lei, precedente e

dogmática.99

96 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. cap. 10, p. 515 e ss.

97 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 10, p. 524 e ss.

98 A respeito da teoria do discurso e sua relação com direitos humanos ver: ALEXY, Robert. Discourse Theory and Human rights. Ratio Juris, Bologna, v. 9, n. 3, p. 209-235, September 1996.

99 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 10, p. 529 e ss.

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A argumentação jusfundamental sujeita à lei se entende como sujeição ao texto das

disposições jusfundamentais e à vontade do legislador constitucional. O texto das disposições

jusfundamentais vincula a argumentação jusfundamental porque existe a seu favor a carga da

argumentação. A sujeição da argumentação jusfundamental à lei seria limitada, as normas

jusfundamentais quando tomadas sob a forma de regras seriam vinculantes, ao menos que

existissem razões contra esta obrigatoriedade. Os precedentes constituiriam uma segunda peça

da argumentação jusfundamental. Pois os precedentes contribuiriam para a segurança da

argumentação jusfundamental, mas não seriam suficientes para o controle racional da

fundamentação jusfundamental. As teorias materiais de direitos fundamentais são a base da

argumentação jusfundamental, que, conforme Alexy, só seria possível sob a forma da teoria

dos princípios. Ou seja, quando em caso de colisão se requer uma ponderação na qual se

pergunta se a importância do cumprimento de um dos princípios justifica o não cumprimento

do outro. Com isto não se determina um resultado, mas sim se obtém uma fundamentação em

uma estrutura racional. Alexy argumenta que não se pode esperar muito de uma teoria

material dos direitos humanos, tendo em vista que é difícil uma teoria que estabeleça somente

uma resposta correta para cada caso. Isto porque as prioridades prima facie conduzem a uma

estruturação da argumentação apoiada nos princípios, mas não a uma ordem que estabeleça

para cada caso um único resultado. Fica estabelecida, desta forma, uma ordem através de

relações concretas de prioridade, que expressam o peso relativo dos princípios em

determinados casos ou grupos de casos.100

Uma teoria material de direitos fundamentais que estabelecesse um caráter obrigatório à

solução de cada caso de direito fundamental não seria possível, pois exigiria a criação de uma

lista completa e concreta de regras de prioridade para todo o caso de direito fundamental

concebível. Além disso, para cada solução da lista deveria haver também uma fundamentação,

e assim volta-se ao problema da teoria material dos direitos fundamentais, de que a lista

deveria ser uma solução.

Desta forma, pode-se conseguir a realização de uma decisão racionalmente

fundamentada dentro do marco de um sistema jurídico através da razão prática que vincula a

argumentação e a decisão de maneira racional. Assim, é razoável a institucionalização de uma

100 ALEXY, Robert. Sistema jurídico, princípios jurídicos y razón práctica. IV Jornada Internacionales de

Lógica e Informática Jurídicas, San Sebastián, p. 139-151, Sep. 1988. ___. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 10, p. 532 e ss.

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justiça constitucional cujas decisões podem e requerem ser justificadas e criticadas em um

discurso101 jusfundamental racional. Até aqui o que se viu foi a explicação da teoria dos

direitos fundamentais em Alexy, no próximo ponto será vista a resposta de Alexy a algumas

críticas.102

1.2 O modelo adequado para os direitos fundamentais

Neste sub-capítulo, serão tratadas melhor algumas observações publicadas por Alexy103

após ter recebido críticas principalmente de Jürgen Habermas104, que pensa que a construção

de Alexy enfraqueceria a noção de Direito Fundamental e deixaria um campo muito amplo à

liberdade do legislador, bem como a de Böckenförde que pensa que a teoria de Alexy anularia

a liberdade por inteiro e faria da Constituição algo que contivesse tudo e assim o legislador

ficaria a mercê do juiz.

En la práctica, lo decisivo en relación con los derechos fundamentales es la determinación de sus límites. En mi <<Teoría de los derechos fundamentales>>, he tratado de resolver el problema de las necesarias demarcaciones de los derechos fundamentales con una teoría de los principios, cuya base es la tesis de que los derechos fundamentales en cuanto normas tienen la estructura de mandatos de optimización. Eso lleva a poner al principio de proporcionalidad en el centro de la dogmática de los derechos fundamentales, lo que tiene la consecuencia práctica de que en muchos casos lo decisivo sobre el contenido definitivo de los derechos fundamentales es la ponderación.105

O centro da problemática sobre um modelo adequado para os direitos fundamentais é o

caráter de princípios que tais direitos têm, assim como o caráter de otimização dos próprios

101 Alexy explica a diferença entre um discurso de aplicação de normas e um discurso de justificação de normas

em: ALEXY, Robert. Justification and application of norms. Ratio Juris, Bologna, v. 6, n. 2, p. 157-170, July 1993. Alexy explica a estrutura do discurso moral em: ___. La fundamentación de los derechos humanos em Carlos S. Nino. Cuadernos de filosofia del derecho. Doxa, n. 26, p. 173-201, 2003. Alexy também comenta sobre o discurso para obter a justiça em: ___. Justicia como corrección. Cuadernos de filosofia del derecho. Doxa, n. 26, p. 161-171, 2003.

102 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. cap. 10, p. 553 e ss.

103 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. e ___. Balancing, constitutional review, and representation. I-CON, v. 3, n. 4, p. 572-581, 2005.

104 Alexy comenta também as críticas em: ___. Constitutional rights, balancing and rationality. Ratio Juris, Bologna, v. 16, n.2 p. 131-140, Jun. 2003.

105 ATIENZA, Manuel. Entrevista a Robert Alexy. Doxa - Cuadernos de filosofía del derecho, n. 24, Espanha: Universidad Alicante, p. 671-687, 2001, p. 675.

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princípios. A maior crítica é se os mandatos de otimização106 conduzem a um modelo

adequado dos direitos fundamentais, uma vez que, conforme os críticos107, poderiam diminuir

a força dos direitos fundamentais, pois perderiam sua firmeza que somente poderia ser

garantida pelo caráter de regras e não de princípios. O risco, ainda, de acordo com críticos,

seria a adoção de juízos irracionais, pois não haveria medidas racionais que pudessem

resolver a ponderação.108

Alguns autores109 vão contra este estabelecimento dos princípios exercerem mandatos

de otimização. Os princípios, como já abordado anteriormente, são mandatos de otimização

porque ordenam que algo se realize na maior medida possível, de acordo com as

possibilidades fáticas e jurídicas. Isto indicaria que o mandato possui na verdade um caráter

definitivo, pois somente pode ser cumprido ou descumprido, e quando é cumprido deve ser

plenamente. Desta forma os mandatos de otimização teriam uma estrutura de regras. “Con

todo, esto no significa en modo alguno que la teoría de los principios se desmorone cuando

adopta la forma de la tesis de la optimización. Más bien, lo que ocurre es que esta propiedad

atribuye a esta teoría una luz más aguda.”110Com esta sutileza atribuída pela otimização

deve-se ver a diferença entre os mandatos que se otimizam dos mandatos de otimização. Os

mandatos que se otimizam são objetos da ponderação, e podem ser denominados como um

“dever ser ideal” ou ideais. Este ideal deve ser otimizado e através da otimização se

transforma em um dever ser real, e se encontra no nível dos objetos em relação à otimização.

Já os mandatos de otimização se encontram em um meta-nível, no qual é estabelecido o que

se deve fazer com o que existe no nível dos objetos. Estes mandatos ordenam que seus objetos

sejam realizados na maior medida possível. Assim, como mandatos de otimização eles não se

otimizam mas se cumprem quando otimizam seus objetos.111

106 Alexy esclarece o que entende por mandatos de otimização: “[...] los principios entran en colisión con

frecuencia y, [...] la solución de colisiones entre principios no es posible sin ponderación. […] lo que defiendo es un concepto de optimización que pone en conexión dos ingredientes: las exigencias que derivan del óptimo de Pareto y el postulado de paridad.” ATIENZA, Manuel. Entrevista a Robert Alexy. Doxa - Cuadernos de filosofía del derecho, n. 24, Espanha: Universidad Alicante, p. 671-687, 2001, p. 677 e 678.

107 Habermas, Klaus Günther, Dworkin, Böckenförde.

108 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap. 1, p. 14 e ss.

109 Os mesmo citados na Nota de rodapé 106.

110 ALEXY, Robert. Tres escritos sobre los derechos fundamentales y la teoría de los princípios. Bogotá: Universidad Externado de Colombia, 2003. p. 108.

111 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap. 1, p. 16 e ss.

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Alexy explica que os princípios, como objetos da otimização, não são mandatos de

otimização, e sim mandatos que se otimizam, tendo, deste modo, um dever ser ideal. Todavia,

para o autor, chamar os princípios de mandatos de otimização é uma forma mais simples de se

referir a eles, expressando tudo aquilo que se relaciona com os princípios e que se torna

significativo do ponto de vista prático. Há uma relação entre o dever ser ideal, o princípio em

si, e o mandato de otimização, como regra, uma vez que o dever ser ideal requer o mandato de

otimização da mesma forma que o mandato de otimização requer o dever ser ideal.112

Todo aconseja entonces mantener la caracterización de los principios como “mandatos de optimización”, y sólo cuando el análisis lo exija, llevar a cabo diferenciaciones más refinadas. Bien podría defenderse la opinión de que aun con todo esto no se ha alcanzado suficiente claridad sobre la estructura de los principios. Ciertamente se sabría que ellos deben ser optimizados y que como consecuencia representan mandatos de optimización, pero todavía no se sabría cómo puede llevarse a cabo lo que pudiera ser la optimización.113

Outra crítica é que o papel dos direitos fundamentais no sistema jurídico mudaria, uma

vez que como direitos fundamentais clássicos tinham seu alcance à parte do sistema jurídico

que dizia respeito à relação entre Estado e cidadão, e em contrapartida entendidos como

princípios teriam efeitos em todo o ordenamento jurídico. Teriam uma eficácia horizontal, ou

seja, frente a terceiros. Além disso, se argumenta que o legislador perderia sua autonomia,

pois deveria somente decidir com base no já decidido pela Constituição.114

Com isso os críticos115 argumentam que só existiria uma alternativa: decidir-se pelos

direitos fundamentais como princípios e a favor de um Estado jurisdicional, ou decidir-se pela

redução dos direitos fundamentais aos direitos de defesa e a favor do Estado de legislação

parlamentar. Alexy acredita que se a teoria dos princípios fosse examinada a partir da posição

de que todos os princípios e possibilidades de equilíbrio já estivessem contidos na

Constituição seria uma vítima fácil, uma vez que o legislador seria forçado a declarar sob a

vigilância da jurisdição o que já teria sido decidido pela Constituição. Tal problema suscita a

112 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap.

1, p. 18 e ss.

113 ALEXY, Robert. Tres escritos sobre los derechos fundamentales y la teoría de los princípios. Bogotá: Universidad Externado de Colombia, 2003. p. 110.

114 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap.1, p. 20 e ss.

115 Principalmente Habermas e Böckenförde.

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dúvida de se a teoria dos princípios implicaria em uma ordem fundamental que eliminaria a

liberdade legislativa.116

Em resposta a isto Alexy explica conceitos de ordem marco e ordem fundamental, para

explicar que a teoria dos direitos fundamentais respeita o campo de ação do legislador.

Quando a Constituição é entendida como uma ordem marco se compreende que o que está

ordenado pela Constituição é constitucionalmente necessário, o que está proibido é

impossível, e o que é confiado à discricionariedade do legislador é constitucionalmente

possível. Neste caso se trata de considerar a existência de um âmbito constitucionalmente

possível. Para os opositores da teoria dos princípios, a idéia deste âmbito seria incompatível

com a otimização117. De outro lado, a Constituição vista como ordem fundamental, pode ser

entendida de duas maneiras, uma que para tudo tenha previsto um mandato ou uma proibição,

e outra quando através da Constituição se decidem assuntos fundamentais para a comunidade.

Esta segunda concepção é compatível com a definição de ordem marco.118 Neste sentido:

Una Constitución puede decidir asuntos fundamentales, y en ese sentido ser un orden fundamental, y, sin embargo, dejar muchas preguntas abiertas, y por tanto ser un orden marco. Según la teoría de los principios, una buena Constitución tiene que combinar estos dos aspectos; debe ser tanto un orden fundamental como un orden marco.119

Desta forma, uma constituição será uma ordem marco se ordenar e proibir algumas

coisas estabelecendo um marco e se dispor outras questões à discricionariedade do poder

público, deixando aberta uma margem ou um campo de ação. E, será uma ordem fundamental

se através de seus mandatos e proibições decidir questões fundamentais para a sociedade, que

podem e devem ser decididas por uma Constituição. O que se questiona é se tais postulados

podem ser atendidos, se os direitos fundamentais são aceitos com a estrutura de princípios.120

116 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap.

1, p. 20 e ss.

117 “The idea of optimization is necessary if we are to comprehend the dimension of weight in the case of a norm, in contrast to its validity. This has a great many consequences in legal dogmatics.” ALEXY, Robert. On the structure of legal principles. Ratio Juris, Bologna, v. 13, n. 3, p. 294 -304, September 2000. p. 299.

118 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap. 2, p. 22 e ss.

119 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. p. 30.

120 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap. 2, p. 24 e ss.

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Percebe-se que o problema surge quando a Constituição não ordena nem proíbe que o

legislador faça algo, pois deixa margem a um campo de ação do mesmo. “Los problemas de

la constitucionalización pueden resolverse mediante la construcción de una dogmática de los

márgenes de acción. Esta dogmática descansa sobre dos columnas.”121 Para se resolver as

questões impostas pela constitucionalização usam-se os campos de ação: existem o campo de

ação estrutural e o campo de ação epistemológico.122

Este margen de acción [estructural] está mucho más exento de problemas que el margen de acción epistémico. No necesita ninguna fundamentación afirmar que el Legislador es libre para actuar cuando la Constitución no lo ha obligado a nada. En cambio, no es un asunto evidente afirmar que el Legislador es libre para actuar cuando se presentan problemas para reconocer si en realidad es libre para actuar.123

O campo de ação estrutural124 possui três campos, o da fixação de fins; o da eleição de

meios e o da ponderação. O campo da fixação de fins se expressa quando o legislador pode

escolher por si os fins que justifiquem sua intervenção em um direito fundamental, geralmente

os fins dizem respeito a bens coletivos. “El margen para la fijación de fines no se refiere

únicamente a la elección de los fines, sino también a la determinación de la medida de su

realización.”125 O campo da eleição de meios acontece quando as normas de direito

fundamental proíbem algumas intervenções legislativas e também ordenam a execução de

121 ALEXY, Robert. Tres escritos sobre los derechos fundamentales y la teoría de los princípios. Bogotá:

Universidad Externado de Colombia, 2003. p. 87. e ___. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap. 2, p. p. 26 e ss.

122 Todos los márgenes de acción son o bien de tipo estructural o de tipo epistémico. El margen de acción estructural se forma a partir de los límites de aquello que la Constitución ordena y prohíbe. Dentro de este margen cae todo lo que ella no ordena ni prohíbe, sino que depara a la discrecionalidad de los poderes públicos. El margen de acción epistémico se forma a partir de los límites de la capacidad para reconocer lo que la Constitución por una parte, ordena y prohíbe, y por otra, no ordena ni prohíbe. ALEXY, Robert. Tres escritos sobre los derechos fundamentales y la teoría de los princípios. Bogotá: Universidad Externado de Colombia, 2003. p. 89.

123 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. p. 32.

124 “[...] “campo de acción estructural” no plantea problemas graves con respecto a la cuestión de la justiciabilidad. Estos surgen sólo debido a los problemas de evaluación y de efectividad estrechamente entrelazados con el campo de acción estructural. El campo de acción estructural está vinculado con otros campos de acción de un tipo totalmente distinto, es decir, con un campo de acción cognitivo con respecto al problema normativo de la ponderación y con un campo de acción cognitivo con respecto al problema empírico de la efectividad. En el problema de la efectividad se trata esencialmente del efecto de medidas actuales en el futuro, es decir, de problemas de pronósticos. Por lo tanto, la ponderación del problema de la justiciabilidad depende del papel que juegue el problema de la ponderación y el del pronóstico dentro del marco de los derechos a protección.” ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. p. 449.

125 ALEXY, Robert. Tres escritos sobre los derechos fundamentales y la teoría de los princípios. Bogotá: Universidad Externado de Colombia, 2003. p. 60.

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condutas positivas, e para tanto se devem eleger meios para alcançar tais objetivos. “Este

margen deriva de la estructura de los deberes positivos.”126 O campo da ponderação127 ocorre

quando a decisão depende de ponderações e da identificação de quais meios favorecem ou

prejudicam os princípios que entram em jogo. A crítica128 argumenta que na teoria dos

princípios o uso da otimização excluiria este campo de ação estrutural da ponderação, pois

como admitiriam soluções que proporcionassem a máxima realização possível de todos os

bens implicados, excluiria uma margem de decisão. Para se entender a otimização conforme a

teoria dos princípios se deve verificar a definição de princípio.129

Los principios son normas que ordenan que algo sea realizado en la mayor medida posible, de acuerdo con las posibilidades fácticas y jurídicas. Una de las tesis fundamentales expuestas en la Teoría de los derechos fundamentales, es que esa definición implica el principio de proporcionalidad con sus tres subprincipios: idoneidad, necesidad y proporcionalidad en sentido estricto, y viceversa: que el carácter de principios de los derechos fundamentales se sigue lógicamente del principio de proporcionalidad.130

Desta forma, a definição de princípio da Teoria dos Direitos Fundamentais implicaria na

definição dos três sub-princípios da proporcionalidade131, que definiriam o que se deve

126 ALEXY, Robert. Tres escritos sobre los derechos fundamentales y la teoría de los princípios. Bogotá:

Universidad Externado de Colombia, 2003. p. 61.

127 El margen para la ponderación se origina a partir de la circunstancia de que no todas las colisiones entre principios – aunque, bien es cierto, sí un buen número – pueden decidirse mediante la ponderación y con fundamento en la Constitución. Una colisión no puede resolverse de esta manera, y por lo tanto, se enmarca dentro del margen para la ponderación, cuando se presenta un empate en la ponderación. Esto sucede cuando la satisfacción de los principios que entran en colisión es igualmente importante a los dos lados de la balanza. El margen para la ponderación también comprende la elección entre los diferentes niveles de intervención y de protección de los principios respectivos, en que puede darse un empate. Ahora bien, sólo es posible establecer si algo cae dentro del margen para la ponderación o no, si es posible operar con escalas de rangos. Por lo tanto, los empates en la ponderación y, como consecuencia, los márgenes para la ponderación sólo tienen un significado práctico, si esas escalas son poco refinadas. Este tipo de escalas son correlativas a la naturaleza del derecho constitucional. Las escalas triádicas (leve, medio, grave) constituyen el mejor punto de partida para construir una escala poco refinada. Los empates en la ponderación y el carácter de marco de la Constitución. ALEXY, Robert. Tres escritos sobre los derechos fundamentales y la teoría de los princípios. Bogotá: Universidad Externado de Colombia, 2003. p. 90.

128 Habermas, Klaus Günther, Dworkin, Böckenförde.

129 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap.3. e ___. Tres escritos sobre los derechos fundamentales y la teoría de los princípios. Bogotá: Universidad Externado de Colombia, 2003.

130 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. p. 38.

131 “The implications of the proportionality principle turn on the definition of the concept of principle. Principles qua optimization commands demand realization as far as is possible relative to the actual and legal possibilities. A relativization in the direction of the actual possibilities leads to the principles of appropriateness and necessity. [...] The principles of appropriateness and necessity stem from the obligation of a realization as great as possible relative to the actual possibilities. They express the idea of Pareto-optimality. The principle of proportionality in a narrow sense stems from the obligation of a realization as far as possible

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entender por ponderação, conforme a teoria dos princípios. Conforme Alexy, para saber,

assim, se a otimização é incompatível com o caráter marco da constituição, se deve saber se o

princípio da proporcionalidade o é, e para tanto, devem ser verificados os sub-princípios da

adequação e da necessidade. Tais sub-princípios expressam as exigências para se atingir a

maior realização possível dependendo também das possibilidades fáticas.132

A idéia de otimização é a de que, quando se tem dois princípios em jogo, usar o sub-

princípio como a adequação e a necessidade para verificar se o meio adotado favorece ou

impede um ou outro princípio. Quando o meio adotado não favorece um princípio e impede o

outro, se pode omitir o meio e assim não serem causados custos nem para um nem para outro

princípio, ou adotar o meio e resultarem custos para um princípio. Quando se renuncia o meio

os dois princípios podem ser realizados em sua maior medida conforme possibilidades

fáticas.133

Bem entendida, a otimização é nada mais do que uma conseqüência natural da “possibilidade de cumprimento gradual” que emana da “dimensão de peso” dos princípios jurídicos, sendo útil e necessária para explicar a possibilidade de restrição de direitos fundamentais diante de possibilidades fáticas e jurídicas.134

O sub-princípio da adequação135 é um critério negativo através do qual se pode verificar

se os meios não são adequados, pois exige que o meio adotado esteja em condições de

promover o fim determinado por um princípio jurídico. O sub-princípio da necessidade136

relative to the legal possibilities, that is, relative most of all to the counter-vailing principles.” ALEXY, Robert. On the structure of legal principles. Ratio Juris, Bologna, v. 13, n. 3, p. 294-304, September 2000. p. 298.

132 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap. 3, p. 39 e ss.

133 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap.3, p. 48 e ss.

134 BUSTAMANTE, Thomas. Sobre a justificação e a aplicação de normas jurídicas. Análise das críticas de Klaus Günther e Jürgen Habermas à teoria dos princípios de Robert Alexy. Revista de informação legislativa, v.43, n.171, p.81-90, jul./set.2006. p. 87.

135 “[...] la deducción de la máxima de la adecuación. Si M1 no es adecuado para la promoción u obtención del fin F exigido por P1 o idéntico con P1, entonces M1 no es exigido por P1, es decir, para P1 es igual si se utiliza M1 o no. Si, bajo estas circunstancias, M1 afecta la realización de P2, entonces, por lo que respecta al aspecto de la optimización con relación a las posibilidades fácticas, M1 está prohibido por P2. Esto vale para todos los principios, fines y medios. Por lo tanto, también la máxima de la adecuación se sigue del carácter de principio de las normas de derecho fundamental.” ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. p. 114.

136 “Para mostrar como la máxima de la necesidad se infiere del carácter de principio, habrá de considerarse aquí la constelación más simple de un examen de necesidad. […] el Estado fundamenta la prosecución del fin F con el principio P1 o F é idéntico a P1. Existen, por lo menos, dos medios, M1 y M2, que son igualmente

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exige que dos dois meios adequados seja escolhido o mais benéfico ao direito fundamental

afetado, ou seja, que não provoque sacrifícios desnecessários ao direito fundamental afetado.

Desta forma, se selecionam meios através dos quais serão aplicados os princípios. Entretanto,

tal exame não traz sempre respostas tão fáceis, principalmente porque estes sub-princípios

trazem relações meio/ fim, e o ajuizamento supõe problemas de pareceres. “El reconocimiento

de la competencia del Legislador para la apreciación de fenómenos empíricos es equivalente,

en cuanto al resultado, al reconocimiento de la competencia para restringir los derechos

fundamentales.”137 A questão da interpretação se dá, desta forma, quanto a campos de ação

cognitivos ou epistemológicos.138

Também podem aparecer meios mais benéficos ao direito fundamental afetado, que

favoreçam o fim perseguido pelo legislador, mas isto traria o risco de se restringir um terceiro

princípio ou fim. Para se escolher o princípio mais adequado ao caso se deve perguntar se a

Constituição no caso específico admite uma intervenção intensa no direito fundamental, para

que um dos princípios não seja afetado demais, ou se exige uma afetação maior para que outro

princípio possa ser realizado com uma intervenção menor do direito fundamental. Assim, se

sairia do âmbito da otimização relativa para possibilidades fáticas, o que levaria à maior

realização possível em relação às possibilidades jurídicas. Verificar se dois princípios

justificam a intervenção em um princípio, que a proibição de determinado meio representa é

um problema de ponderação.139

Alexy explica que para se resolver esta discussão entraria em jogo outro sub-princípio

do princípio da proporcionalidade, que é o sub-princípio da proporcionalidade em sentido

estrito. Este sub-princípio expressa o que significa a otimização em relação aos princípios

adecuados para lograr o promover F. M2 afecta menos intensamente que M1, o no afecta en absoluto, la realización de aquello que exige una norma iusfundamental con carácter de principio, P2. Bajo estos presupuestos, para P1 es igual que se elija M1 o M2. P1 no exige que se elija M1 en lugar de M2 o M2 en lugar de M1. Para P2 no es igual el que se elija M1 o M2. En tanto principio, P2 impone una optimización tanto por lo que respecta a las posibilidades fácticas como jurídicas. Con respecto a las posibilidades fácticas, P2 puede ser realizado en una medida mayor si se elige M2 y no M1. Desde el punto de vista de la optimización con respecto a las posibilidades fácticas, bajo el presupuesto de la validez tanto de P1 como de P2, sólo M2 está permitido y M1 está prohibido. Lo dicho vale para cualesquiera principios, fines y medios.” ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y constitucionales, 2002. p. 113.

137 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. p. 45.

138 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap. 3, p. 46 e ss.

139 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap. 3, p. 48 e ss.

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opostos. A otimização que é feita com princípios opostos se trata igualmente de ponderação.

A ponderação pode ser dividida em três passos: primeiro se define o grau de não satisfação ou

de afetação de um dos princípios; depois se define a importância da satisfação do princípio

oposto; e então se define se a importância da satisfação do princípio contrário justifica a

afetação ou a não satisfação do outro.140

Com estes passos da ponderação é possível emitir juízos racionais sobre as intensidades

das intervenções nos direitos fundamentais, assim como sobre os graus de importância da

satisfação dos princípios, e sobre a relação que existe entre um e outro. E os direitos

fundamentais, entendidos como princípios, admitiriam tudo, com exceção de meios ilegítimos

através dos sub-princípios de adequação e necessidade. A ponderação não exige sempre uma

decisão exata do Legislador, e assim, existem campos estruturais para a mesma. A teoria dos

direitos fundamentais defende que a ponderação não é um procedimento que conduz cada

caso a um único resultado. Desta forma, com a ajuda da ponderação em alguns casos se pode

estabelecer um resultado de maneira racional, através de juízos racionais sobre as intensidades

das intervenções nos direitos fundamentais e sobre os graus de realização dos princípios.141

Para tanto, Alexy entende que se pode formular uma escala com graus de intensidade:

leve, médio e grave, e assim, ponderar o peso das razões que justificam uma intervenção ou

não. Quando as razões pesam intensamente seu peso é alto. Desta forma, se fixa a intensidade

de intervenção e o grau de importância da razão que justifica a intervenção e se chega a um

resultado. Se a razão para a intervenção pesa intensamente e justifica uma intervenção leve

como conseqüência o dever de fazer algo não prejudica o princípio de liberdade. O resultado a

que se chega com o exame de proporcionalidade em sentido estrito não é somente um

resultado plausível, mas sim um resultado evidente de acordo com os dados presentes no caso

(intensidade de intervenção e peso da razão que a justifique).142

As escalas de intensidade podem se relacionar perfeitamente para adotar uma decisão

em qualquer âmbito, até mesmo quando entram em jogo bens imateriais, trazendo direitos 140 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap.

3, p. 49 e ss.

141 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap. 3, p. 51 e ss.

142 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap. 3, p. 58 e ss.

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fundamentais, interpretados como princípios, que têm intensidades que estabelecem limites

dentro da estrutura da ponderação, tornando possíveis juízos racionais sobre os graus de

intensidade e de importância que são afetados os princípios e que estes juízos podem ser

relacionados entre si para fundamentar um resultado. Existem razões plausíveis que

respaldam os juízos de intensidade de intervenção no direito fundamental e do grau de

importância do princípio oposto. Como se trata de uma aplicação dentro de um marco de uma

argumentação ela não pode ser considerada não refletida, já que os argumentos é que

expressam e tornam visíveis as reflexões. Também podem ser estabelecidos limites à atuação

estatal com a lei da ponderação, de forma racional.143

Quanto ao âmbito de aplicação da lei da ponderação e seu campo de ação deve-se dar

atenção ao modelo triádico de classificação144, ou seja, a classificação em leve, médio e grave.

Na lei da ponderação o grau da não satisfação ou da afetação de um princípio, assim como a

importância da satisfação do outro são valorados com esta classificação. Além da expressão

do grau de satisfação ou da afetação se usa a intensidade da intervenção. O princípio cuja

vulnerabilidade se avalia é colocado como variável. As intervenções nos princípios são

sempre concretas, por isto a intensidade da intervenção também é concreta. Quando se faz a

ponderação é necessário especificar se se trata de algo abstrato ou concreto, colocando as

circunstâncias do caso que são relevantes à decisão, e que têm um papel central na lei de

colisão.145

Outro ponto sobre a lei da ponderação diz respeito à importância da satisfação de outro

princípio. Esta não precisa ser de forma concreta como a intensidade da intervenção, pois se

pode construir um conceito de importância integrando uma questão concreta, bem como uma

abstrata. Na ponderação os pesos abstratos146,147 têm um papel de influência na decisão, mas

143 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap.

3, p. 60 e ss.

144 “The three steps or classes of the triadic model represent a scale which attempts to systematize classifications which can be found both in everyday practice and legal argumentation. Such a three-class system is far removed from a metrification of intensities of interference and degrees of importance on a cardinal scale such as a scale from 0 to 1, and it has to be far removed, because intensities of interference and degrees of importance are not capable of metrification on such a scale.” ALEXY, Robert. On balancing and subsumption. A structural comparison. Ratio Juris, v. 16, n. 4, p. 433-449, December 2003. p. 443.

145 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap. 3, p. 61 e ss.

146 “Quanto maior for a contribuição de um dado princípio para a coerência do ordenamento jurídico, maior será a sua importância e, por conseguinte, o seu peso abstrato.” Em: BUSTAMANTE, Thomas. Princípios, regras e

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quando os pesos são iguais, a decisão depende dos pesos concretos, o que torna necessária a

elaboração de um conceito de importância concreto. A importância concreta do princípio

depende das circunstâncias do caso.148 Deste modo,

Los elementos del caso concreto que resultan esenciales para la decisión son la medida examinada y las consecuencias que su ejecución y su no ejecución tienen para los principios implicados. La no ejecución pertenece a estos elementos, porque con la decisión se trata de establecer si la medida está permitida o prohibida por los derechos fundamentales, y la prohibición es correlativa a la circunstancia de que la medida deba ser omitida.149

Assim, são os elementos do caso concreto que importam e vão fazer a diferença na

decisão, uma vez que especificarão a medida examinada e quais as conseqüências para os

princípios relacionados. Para se determinar a importância da satisfação de um princípio se

deve verificar seu sentido contrário, ou seja, o que significaria para um direito se a

intervenção no princípio fosse omitida ou não fosse executada. E com isso a importância

concreta do princípio se mede de acordo com o grau de intensidade da intervenção no

princípio que a não intervenção no princípio vulnerável produza.150

Alexy entende que a importância da satisfação do outro princípio quer dizer que a

contraposição da intensidade da intervenção no princípio vulnerável do caso concreto é a

importância do princípio contrário no caso concreto. Desta forma se estabelecem os objetos

que devem sofrer a valoração. Então se começa a ponderação, que tem três passos. O primeiro

é valorar a intensidade da intervenção, o segundo valorar a importância do princípio oposto e

o terceiro passo consiste em verificar qual das duas valorações relacionadas deve prevalecer.

O princípio vulnerável adquire precedência quando a intensidade for grave ou média e na

relação a importância for média ou leve, ou seja, o princípio vulnerável precede o princípio

oposto como uma forma condicionada. Por outro lado, acontece a precedência do princípio

a fórmula de ponderação de Alexy: um modelo funcional para a argumentação jurídica? Revista de direito constitucional e internacional, São Paulo, v. 14, n. 54, p. 76-107, jan./mar., 2006, p. 102.

147 Alexy explica os critérios da coerência e como mantê-la quando princípios colidem, ou seja, na ponderação, para aprofundamentos ver: ALEXY, R.; PECZENIK, A. The concept of coherence and its significance for discursive rationality. Ratio Juris, Bologna, v. 3, n. 1 – bis, p. 130-147, March 1990.

148 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap. 3, p. 62 e ss.

149 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. p. 62.

150 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap. 3, p. 64 e ss.

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oposto quando a intensidade for leve ou média e a importância for média ou grave, quando a

precedência condicionada será do princípio oposto em relação ao princípio vulnerável.151

Existem também casos de empate, nos quais a intensidade do princípio vulnerável tem o

mesmo valor que a importância do princípio oposto. Nestes casos se pode adotar outra

fórmula que ajuda a expressar o peso de um princípio sob circunstâncias do caso concreto, ou

seja, seu peso concreto. Esta é a fórmula do peso que complementa a lei de colisão e a lei da

ponderação.152

La fórmula del peso incluye sólo magnitudes concretas. Por consiguiente, esta fórmula representa la situación en que el peso depende únicamente de dichas magnitudes. Como ya se advirtió, esto ocurre cuando los pesos abstractos de los principios implicados son iguales. Si estos difieren entre sí, entonces también deben ser incluidos en la fórmula.153

Assim, chega-se ao peso concreto do princípio sob as circunstâncias do caso concreto

através da divisão da intensidade da intervenção em tal princípio pela importância dos

princípios contrários. Este peso concreto do princípio vulnerável é o peso concreto dele

relativo ao princípio oposto. Podem ser atribuídos números aos graus de valoração e assim

determinar o valor em números em uma escala de 1 para leve, 2 para médio e 4 para grave.

Portanto, um princípio tem um peso concreto elevado quando a intensidade da intervenção é

maior que a importância, mas os valores serão diferentes se a importância for média ou leve e

por isso o peso concreto é relativo. Sempre que o princípio vulnerável preceder ao princípio

oposto ele será maior que um e quando a relação de precedência for do princípio oposto os

valores serão menores que um. Nos casos de empate se apresentam equivalências, que

originam o campo estrutural para a ponderação. Este campo é um campo de ação no qual há

espaço para a discricionariedade em que se permite atuar ou não. “Como quiera que este

margen de acción se produce a causa de lo que tiene validez a partir de los derechos

fundamentales, entonces se trata de un margen de acción estructural.”154 Ou seja, o campo de

151 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap.

3, p. 66 e ss.

152 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap.3. e ___. ___. La formula per la quantificazione del peso nel bilanciamento. Annuario di ermeneutica giuridica: Valori, principî e regole. CEDAM, n. 10, p. 97-123, 2005.

153 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. p. 67.

154 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. p. 74.

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ação se torna estrutural quando sua validade é produzida por direitos fundamentais. O campo

de ação estrutural se desenvolve de acordo com a linha em que se apresentam os empates.155

Para a ponderação se devem diferenciar aspectos do campo estrutural, se as razões para

a intervenção são tão fortes como as razões contrárias a ela a intervenção não é

desproporcionada. Assim como as razões para que a proteção seja omitida são tão fortes como

as razões para outorgar a proteção, a omissão da proteção não é desproporcionada. Outro

aspecto do campo estrutural para a ponderação é a equivalência entre os empates que se

apresentam em diferentes graus. Verifica-se a idéia da igualdade no empate e da igualdade

entre os empates.156

Alguns críticos157 à teoria dos princípios dizem que a tese do empate na ponderação é

um truque, ou que se existissem seriam mínimos ou raros, e argumentam que seria possível a

criação de ordens mais refinadas que o modelo triádico158. É possível refinar a escala de

valoração, mas esta escala tem limites, uma vez que pode se tornar incompreensível. Isto

porque se colocariam mais três níveis em cada nível e seria difícil explicar o que se entenderia

por grave, ou medianamente leve, por exemplo. Entretanto, uma versão mais refinada da

escala poderia resolver alguns casos de empate, mas não os eliminaria. Questiona-se se seria

possível terminar com os empates através do peso das magnitudes do caso concreto sem usar

nenhum tipo de escala. Seriam admitidas as relações de primazia, as de inferioridade e as de

equivalência, nas quais os resultados em que houvesse empate seriam entendidos como

impossíveis.159 Mas isto não é algo que se possa aceitar e leva a perguntar se

155 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap.

3, p. 74 e ss.

156 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap. 3, p. 76 e ss.

157 Habermas, Klaus Günther, Dworkin, Böckenförde.

158 Em: ALEXY, Robert. Ponderación, control de constitucionalidad y representación. Teoría del discurso y derechos constitucionales. México: Fontamara, 2005. p. 89-103. Alexy explica que “La estructura de la escala triádica no es suficiente para mostrar que la ponderación es racional. Para ello, es necesario que se tenga en cuenta también que en la ponderación se encuentra implícito un sistema de inferencias; el cual, a su vez, está intrínsicamente conectado al concepto de corrección. En tanto que un sistema de inferencias, la subsunción en una regla puede expresarse mediante un esquema deductivo llamado “justificación interna”; el cual se construye con la ayuda de las lógicas proposicional, de predicados y deóntica. Es de central importancia para la teoría del discurso jurídico que en el caso de la ponderación de principios exista una contraparte de este esquema deductivo. Este esquema podría llamarse “fórmula del peso”.” p. 94.

159 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap. 3, p. 78 e ss.

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[...] los principios iusfundamentais y la argumentación iusfundamental que entra en juego cuando se aplican tienen una estructura tan precisa que siempre existirá una diferencia de grado que excluya la posibilidad del empate, es decir, que sería tan poco probable que se presentase un empate que esta categoría debería ser prácticamente eliminada. Esta circunstancia se verificaría en la práctica si las intensidades de la intervención, los grados de importancia y los pesos abstractos fueran realmente de tal forma que pudieran ensamblarse en una escala compuesta por un interminable número de rangos. 160

Para se ter uma estrutura tal que eliminasse a possibilidade de empate, seria necessária

uma estrutura com escalas compostas por diversos números de classes. O que seria quase

impossível existir de verdade. Pois é difícil dividir os direitos fundamentais em segmentos tão

finos que eliminassem a possibilidade de empates estruturais. E assim, se percebe que há um

campo para a ponderação.161

O que se tem é diferenciar os empates daqueles que são originados da estrutura

normativa dos direitos fundamentais, que fundamentam a existência do campo de ação

estrutural; e daqueles que aparecem como conseqüência de que as possibilidades do

conhecimento sejam limitadas, que são campos de ação epistemológicos. Para poder fazer

esta diferenciação deve ser visto o princípio formal162, pois o campo de ação epistemológica

pode ser solucionado com ponderações entre princípios formais e materiais. A polêmica sobre

a existência de campos epistemológicos aparece quando são incertos os conhecimentos sobre

o que está ordenado, proibido ou depositado à discricionariedade do legislador pelos direitos

fundamentais.163

Alexy explica que a incerteza pode se tornar um problema nas fundamentações

relevantes que são produzidas no âmbito dos direitos fundamentais. Esta incerteza tem um

papel especial quando se examina a adequação e necessidade. Pois, o Tribunal admite a

160 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. p. 79.

161 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap. 3, p. 80 e ss.

162 “Un principio formal central es la competencia de decisión del legislador legitimado democráticamente. Este principio excluye la concepción según la cual todo el sistema del derecho ordinario sólo tiene que ser el conocimiento correcto de aquello que exigen los principios constitucionales. Conjuntamente con otros principios procedimentales, procura una relativa independencia del derecho legislado ordinario y es una razón esencial de los numerosos márgenes de acción que el Tribunal Constitucional Federal deja al legislador.” ALEXY, Robert. El concepto y la validez del derecho. Tradução de Jorge M. Seña. 2 ed., Espanha: Gedisa, 1997. p. 169.

163 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap. 4, p. 82 e ss.

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intervenção nos direitos fundamentais quando se estabelece a veracidade das estimativas

empíricas, que dependem da adequação e necessidade. Quando não há certeza se admite a

intervenção no direito fundamental pelo legislador, que dispõe de um campo de ação com

respeito ao conhecimento de fatos relevantes.164

Trata-se de um campo de ação epistemológico de natureza normativa quando não se

sabe com certeza qual a maneira mais apropriada para dar peso aos direitos fundamentais que

estão em jogo, e se reconhece que o legislador tem um marco no qual pode adotar uma

decisão conforme sua própria valoração. Assim, para se solucionar uma colisão entre direitos

fundamentais o que a Constituição garante pode ser protegido em um grau mínimo ou

superior. A Constituição não fica prejudicada se se garantir pelo menos o mínimo exigido por

ela.165

Os campos de ação epistemológicos, como dito antes, têm uma proximidade muito

grande com os campos estruturais para a ponderação. Os campos de ação epistemológicos de

tipo empírico têm uma estrutura mais fácil. Os direitos fundamentais podem ficar sem

proteção uma vez que o Legislador está autorizado a basear sua intervenção em premissas

inseguras, o que faz pensar que os direitos fundamentais teriam uma maior proteção se não se

recorresse ao campo de ação cognitiva do Legislador. Como os direitos fundamentais

enquanto princípios exigem uma máxima realização possível, o reconhecimento deste campo

do legislador faria com que os direitos não fossem realizados no seu máximo, o que poderia

acarretar em uma não aceitação da existência deste campo de ação cognitiva pelo princípio

jusfundamental considerado como mandato de otimização.166

Neste caso, o que se deve ver é o princípio formal de competência do legislador para

decidir. Quando a decisão depende de apreciações empíricas, a competência decisória do

legislador, estabelecida pelo princípio formal, abrange também a competência para decidir em

condições de incerteza. E assim, pode haver uma colisão entre o princípio formal e princípio

jusfundamental material, um princípio daria competência e o outro excluiria a competência ao 164 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap.

4, p. 84 e ss.

165 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap. 4, p. 86 e ss.

166 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap. 4, p. 88 e ss.

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legislador. Para se resolver esta colisão, em que haveria uma tensão entre os direitos

fundamentais e a democracia, se poderia optar por duas soluções. A primeira seria dar

primazia ao princípio jusfundamental material nos casos de incerteza empírica e desta forma o

legislador somente poderia se basear em premissas sobre as quais tivesse certeza. A

conseqüência disto implicaria na eliminação da liberdade de ação do legislador em diversos

âmbitos da vida política – o que não seria compatível com os princípios da separação dos

poderes e com o princípio democrático. A segunda solução extrema seria a de permitir que o

legislador interviesse nos direitos fundamentais, mesmo estando baseados em avaliações

incertas. Contudo, para Alexy estas duas soluções seriam extremas e não poderiam ser aceitas,

para isto deveriam se formar soluções intermediárias, que exigissem um mesmo grau de

certeza para cada intervenção nos direitos fundamentais ou que as intervenções tivessem

diversos graus de certeza. Os direitos fundamentais enquanto princípios seriam compatíveis

com esta última solução.167

Esta solução leva a uma segunda lei da ponderação, que estabelece que quanto mais

intensa for uma intervenção em um direito fundamental, maior deve ser a certeza das

premissas que sustentam a intervenção. Esta lei atribui maior ênfase às razões sobre as quais

se baseia a intervenção. A primeira lei da ponderação se preocupa com a intensidade da

intervenção – o grau da não satisfação ou da afetação, enquanto esta última se refere ao peso

da intervenção.168

O peso da intervenção pode ser definido com a fórmula do peso através do produto da

intensidade da intervenção e do peso abstrato do princípio. Pode-se também excluir o peso

abstrato quando o que se quer observar é a relação entre a intensidade da intervenção e a

certeza das premissas que a sustentam. Também de um ponto de vista sistemático podem ser

incluídos elementos epistemológicos junto à razão material para a intervenção. Isto acontece

obedecendo a regra que diz que a importância concreta da satisfação do princípio oposto tem

uma menor capacidade para justificar a intensidade da intervenção no princípio vulnerável

quanto menor a certeza de conseguir a satisfação do princípio oposto. Assim, o peso concreto

167 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap.

4, p. 90 e ss.

168 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap. 4, p. 92 e ss.

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de um princípio aumenta proporcionalmente ao grau de certeza empírica que existe na

realização do princípio contrário.169

Tudo isto pressupõe a possibilidade de se falar validamente dos graus de segurança ou

certeza e insegurança ou incerteza das premissas empíricas do legislador. Se o grau de

importância da intensidade de intervenção alcança a classificação mais alta, uma certeza

média do princípio oposto não é suficiente para justificar com segurança o que se faz com a

intervenção. Uma certeza média existe quando as premissas são plausíveis ou estimáveis. E a

intervenção é permitida quando não existam evidências da falsidade das premissas empíricas.

E assim, se estabelece a relação entre princípios formais e materiais no marco do campo de

ação epistemológico de tipo empírico. Já em relação ao campo de ação epistemológica de tipo

normativo é diferente, pois tem a ver com o conceito de campo de ação normativo e também

com a relação entre os campos epistemológico e estrutural para a ponderação.170

Sin los márgenes de acción cognitivos de tipo empírico el Legislador perdería prácticamente su capacidad de acción, consecuencia que sería incompatible con el principio de división de poderes y el principio democrático. Los límites de los márgenes de acción cognitivos de tipo empírico debe establecerse mediante una ponderación, en la cual, a un lado de la balanza se encuentra únicamente el principio de derecho fundamental afectado negativamente y al otro lado el principio material que juega en sentido contrario, junto con el margen de acción que corresponde a los principios formales. Los márgenes de acción cognitivos de tipo empíricos afectan sólo indirectamente el contenido material de la Constitución. Los márgenes de acción cognitivos de tipo normativos afectan directamente el contenido material de la Constitución. Su existencia significa que los poderes directamente vinculados por la Constitución pueden decidir sobre el contenido de su vinculación, hasta los límites del margen de acción. El reconocimiento de la existencia de los márgenes de acción cognitivos de tipo normativo significa la transferencia de la jurisdicción constitucional a los tribunales ordinarios. La competencia para controlar el alcance de este margen de acción pertenece en todo caso a la Corte Constitucional Federal.171

O que é comum aos campos de ação é o enquadramento do que está permitido ao

legislador discricionariamente e este limite determina o que está proibido e ordenado ao

legislador. No campo de ação do tipo empírico existem razões plausíveis para que algo seja

do jeito que é. No de tipo normativo só se admite este campo quando exista insegurança

169 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap.

4, p. 94 e ss.

170 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap. 4, p. 96 e ss.

171 ALEXY, Robert. Tres escritos sobre los derechos fundamentales y la teoría de los principios. Bogotá: Universidad Externado de Colombia, 2003. p. 91.

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normativa, e principalmente insegurança para se fazer a ponderação. Alexy reconhece que a

competência de controle do Tribunal Constitucional é limitada, sem que seja necessário

acionar o campo de ação cognitiva do legislador, e termina no limite do que é prescrito pelos

direitos fundamentais. No fundo se percebe que os limites do campo estrutural para a

ponderação são os mesmos limites do campo epistemológico para a ponderação de tipo

normativo. A diferença está em que o conteúdo do campo de ação é preenchido com

diferentes possibilidades jurídicas.172

Os campos de ação epistemológicos estão vinculados à divergência entre o que os

direitos fundamentais ordenam, proíbem e atribuem à discricionariedade do legislador e o que

possa ser reconhecido como o que tais direitos ordenam, proíbem e permitem, o que faz com

que existam prejuízos aos direitos fundamentais que não poderiam ser reconhecidos. Há uma

divergência na fundamentação dos campos epistemológicos173 com os princípios formais, uma

vez que as normas de ação entram em conflito com as normas de controle, fazendo com que a

hierarquia jurídica se torne relativa.174

Os campos de ação epistemológicos, desta forma, fariam com que os princípios formais

fossem incompatíveis com a vinculação do legislador aos direitos fundamentais. Tanto no

campo de ação epistemológico normativo, quanto no empírico os princípios formais têm o

papel de contribuir com a divisão de competências para decidir que existem entre o Tribunal

Constitucional e o legislador quando existem incertezas sobre a relação existente entre os

princípios materiais. O campo de ação cognitivo de tipo empírico demonstra que os princípios

formais ameaçam os direitos fundamentais na mesma medida que fazem os princípios

materiais opostos. O papel destes na parte material corresponde aos princípios formais na lei

epistemológica da ponderação.175

172 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap.

4, p. 98 e ss.

173 Cada margen de acción epistémico da lugar a la posibilidad de que existan vulneraciones de los derechos fundamentales que no pueden ser establecidas y sancionadas por la Corte Constitucional Federal. Esto significa la divergencia entre normas de acción y normas de control. ALEXY, Robert. Tres escritos sobre los derechos fundamentales y la teoría de los principios. Bogotá: Universidad Externado de Colombia, 2003. p. 91.

174 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap. 4, p. 100 e ss.

175 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap. 4, p. 102 e ss.

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[...] es bien posible llevar a cabo determinaciones racionales acerca de las intensidades de la intervención y de los grados de importancia y, de este modo, que el conocimiento racional también opera en el ámbito de la ponderación. A esto sólo debe agregarse que a medida en que aumenta la intensidad de la intervención en los derechos fundamentales no sólo aumenta su fuerza de resistencia sustancial, sino también la posibilidad de reconocer las diferencias graduales. A la ley de la tasa marginal decreciente de sustitución corresponde algo así como una ley epistémico de la tasa marginal creciente de discriminación. Cuando se trata de problemas cotidianos frecuentemente no se sabe qué tan intensa es la intervención. Cuanto mayor sea ella, aumenta la posibilidad para diferenciar entre grados de intensidad.176

Percebe-se, desta maneira, que os princípios formais não interferem nos campos de ação

e assim tais campos permitem ponderações racionais. As constituições que possuem um

catálogo de direitos fundamentais representam uma tentativa de organizar a ação coletiva e

assegurar direitos individuais. Com este duplo caráter o legislador tem a atribuição de

restringir os direitos fundamentais, e para isso existem campos de ação que se somam às

restrições materiais que o legislador impõe aos direitos fundamentais. O campo de ação acaba

se integrando ao direito fundamental e se internalizando. A divergência permanece, desta

forma, impregnada no princípio jusfundamental material.177

O campo de ação estrutural define a competência de atuação do legislador, enquanto

que o campo de ação epistemológico ou cognitivo determina a liberdade de configuração da

Corte Constitucional. O legislativo e o executivo têm um campo de ação estrutural porque na

medida em que a Constituição não o define, tem a competência para decidir quais são os

meios politicamente mais convenientes para a satisfação dos direitos fundamentais, entre

todos os que cumpram com as exigências da proibição de proteção fraca. Isto se dá através da

adequação, necessidade e proporcionalidade. Reconhece-se ao legislador um campo de ação

cognitivo de tipo normativo quando exista uma insegurança normativa. E o campo de ação

cognitivo de tipo empírico entra em jogo quando não se tem certeza sobre premissas

empíricas que suportem a intervenção nos direitos fundamentais.178

Diante das informações sobre a otimização e ponderação, pode-se dizer que a teoria dos

direitos fundamentais de Alexy não enfraquece os direitos fundamentais. A construção teórica 176 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. p.

109.

177 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap. 4, p. 104 e ss.

178 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap. 4, p. 106 e ss.

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usada por Alexy, que entende os direitos fundamentais como princípios, tem uma

funcionalidade para a prática jurídica e traz a possibilidade de justificar os resultados da

ponderação a partir de parâmetros que vêm da racionalidade prática179. Sem a ponderação de

princípios a justificação jurídica se transforma em um tipo de decisionismo. O que a teoria

dos direitos fundamentais de Alexy vem trazer é um modelo de fundamentação e evitar um

mero decisionismo.180

A lei de colisão faz referência somente ao resultado das colisões, mas é a ponderação

dos princípios que resolve como as colisões devem ser resolvidas. Desta forma, através da

ponderação se solucionam os conflitos, afastando-se o princípio que diante das condições

fáticas e jurídicas do caso concreto tenha menor peso, levando em consideração o princípio

oposto. O modelo de ponderação com sua fórmula dos pesos não traz em si um método de

resolução definitivo de casos. Mas traz critérios que vinculam a ponderação e a argumentação

jurídica racional. Desta forma, o modelo estrutural de ponderação é importante, pois provoca

um avanço em relação à argumentação jurídica, uma vez que traz dados através dos quais se

pode fundamentar a argumentação jurídica.

O modelo de Alexy, assim, busca estabelecer estruturas para justificar as valorações e

para saber como trabalhar com elas, o que torna a fórmula adequada e funcional para a

argumentação jusfundamental. Se estabeleceu um modelo para classificar e relacionar as

variáveis relevantes para a ponderação jurídica – o cumprimento de cada princípio, a certeza

das premissas empíricas, e o peso abstrato dos princípios opostos.

No próximo capítulo serão vistas as opiniões de Jürgen Habermas e de Ronald Dworkin

sobre a teoria dos direitos fundamentais, trazendo suas visões, bem como os comentários de

Alexy sobre tais interpretações.

179 “El Estado constitucional democrático supone la mejor forma de conectar la argumentación con la decisión

desde la perspectiva de los ideales de libertad e igualdad fundamentados discursivamente. […] Ahí juega un papel esencial la ponderación en cuanto forma de aplicación de los derechos fundamentales. De esta manera, cabría llamar <<institucionalización de la razón>> a este sistema completo en formación.” ATIENZA, Manuel. Entrevista a Robert Alexy. Doxa - Cuadernos de filosofía del derecho, n. 24, Espanha: Universidad Alicante, p. 671-687, 2001, p. 685.

180 Alexy explica sobre a justificação das regras do discurso e dos direitos humanos em: ___. Discourse theory and human rights. Ratio Juris, Bologna, v. 9, n. 3, p. 209-235, Sep. 1996.

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2 ALGUMAS CRÍTICAS À TEORIA DE ROBERT ALEXY

No capítulo anterior a teoria dos direitos fundamentais de Alexy foi abordada e se pôde

entender a estrutura da teoria. Compreende-se, assim, que a distinção entre regras e princípios

é percebida mais claramente nas colisões de princípios e nos conflitos de regras. Os princípios

para Alexy são mandatos de otimização que devem ser realizados o mais amplamente

possível. A teoria de Alexy traz critérios para se resolver as questões quando ocorrem colisões

entre princípios. Tais critérios vêm englobados na ponderação de determinados princípios

através de peso que cada princípio fundamental pode ter.

Apesar de ter se mostrado a estrutura da teoria de Alexy e de ter-se entendido que a

fórmula proposta pelo autor é adequada e funcional para a argumentação jusfundamental, se

deve também explicar a discordância de alguns autores em relação à teoria de base deste

trabalho. Faz-se isso para, desta forma, dar uma visão mais ampla sobre o assunto, de maneira

a ter certeza de que a teoria deste trabalho é adequada para a argumentação jusfundamental,

apesar das críticas.

Com efeito, no contexto do Estado Democrático de Direito, as normas e diretrizes da política estatal encontram-se permeadas por conceitos fluídos ou imprecisos, tais como segurança jurídica, justiça social ou interesse público, de acentuado conteúdo axiológico, os quais terminam por gerar um padrão de decisões judiciais, quando do conflito de interesses gerados pela invocação de tais valores, baseado na ponderação desses mesmos valores conflitantes, configurando-se eles sob a forma de princípios constitucionais em colisão. [...] No que diz respeito ao tratamento jurídico dos princípios constitucionais, mereceram eles, [...] um tratamento específico no âmbito de teorias principiológicas, sendo que diversos autores tratam do tema tendo como afinidade o desenvolvimento de um padrão de ponderação e aplicação de tais princípios permeados de valores, que não comprometa o nível de racionalidade formal do direito.181

Em relação à argumentação jusfundamental existem diversas abordagens e dentre elas

se destacam as teorias de Alexy, Dworkin e Habermas. No capítulo anterior se viu a

concepção de Alexy, assim, nesta parte serão tratadas as concepções de Habermas e de

Dworkin com suas respectivas críticas ao trabalho de Alexy.

181 CADERMATORI, Luiz H. U. Hermenêutica principiológica e colisão de direitos fundamentais: teorias de

Aléxy e Dworkin e os aportes de Habermas. Novos Estudos Jurídicos. Vale do Itajaí, v. 11, n. 1, p. 135-141, março 2006. p. 136.

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A teoria de Alexy trouxe mecanismos racionais de ponderação, como visto no capítulo

anterior, com o objetivo de afastar a aplicação das teorias decisionistas do Direito e reduzir a

discricionariedade postulada pelo positivismo jurídico. Sua teoria demonstra também que o

conceito de princípio não se confunde com o conceito de valor. Apesar de sua consistência, a

teoria dos princípios como mandatos de otimização, defendida por Alexy, é objeto de críticas

pelos autores ligados à Teoria do Discurso e às análises pragmáticas da comunicação humana.

Tais críticas dão origem a uma outra teoria, que tem como maior expoente Habermas e

identifica os princípios como normas cujas condições de aplicação não são pré-determinadas,

mas que se desenvolvem ao longo e através do processo comunicativo.

Habermas, a partir de estudos e discussões de Dworkin, critica a inconsistência e os

problemas internos e externos da teoria de Alexy.182 Para Habermas, Alexy esvazia o caráter

normativo dos princípios, entrando em contradição com a compreensão deontológica do

Direito que pretende defender. Desta forma, no sub-capítulo a seguir a crítica de Habermas

será analisada e no seguinte o ponto de vista de Dworkin.

2.1 A perspectiva de Jürgen Habermas

Habermas tem sido um dos maiores críticos a respeito da teoria dos direitos

fundamentais de Alexy. A tese decisiva se refere aos limites desses direitos, pois como trazem

princípios como mandatos de otimização tirariam força dos direitos fundamentais.183 Alexy

resolve esta polêmica limitando tais direitos a partir de uma teoria dos princípios, cuja base é

a tese de que os direitos fundamentais, enquanto normas, possuem a estrutura de mandatos de

otimização, como já se expôs no primeiro capítulo, o que coloca a máxima da

proporcionalidade no centro da dogmática dos direitos fundamentais. A principal

conseqüência prática disto é a ponderação axiológica (através de critérios de adequação,

necessidade e de proporcionalidade em sentido estrito) na limitação de tais normas184.

182 Habermas também usa algumas concepções do autor Klaus Günther.

183 HABERMAS, Jürgen. On law and disagreement. Some comments on “interpretative pluralism”. Ratio Juris, Bologna, v. 16, n.2, p. 187-194, June 2003.

184 Como explicado no ponto anterior.

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If principles manifest a value that one should optimally realize, and if the norms themselves do not dictate the extent to which one must fulfill this optimizing prescription, then the application of such principles within the limits of what is factually possible makes a goal-oriented weighting necessary. Because no value can claim to have an inherently unconditional priority over the other values, this weighting operation transforms the interpretation of established law into the business of realizing values by giving them concrete shape in relation to specific cases.185

Com referida citação se percebe que Habermas não concorda com tal teoria, pois para

ele a ponderação orientada por objetivos pode fazer com que, caso as circunstâncias

exigissem, os indivíduos usassem os princípios como trunfos para defenderem suas pretensões

diante do risco de que seus direitos sejam tomados por fins coletivos,186 fazendo com que os

direitos fundamentais perdessem sua firmeza, que só poderia ser garantida por uma estrutura

com caráter de regras. Para Habermas a ponderação coloca em risco a força dos direitos

fundamentais porque os submete a juízos irracionais.187

Habermas188 entende que as leis de colisão e de ponderação, do modo como são

compreendidas por Alexy, levam a uma concepção axiológica do direito, uma vez que a

ponderação, de acordo com este último autor, só é possível porque se pode preferir um

princípio ao outro, o que só faz sentido se os mesmos são concebidos como valores. Aquele

autor acredita que se os princípios são aplicados através da ponderação, eles não podem ser

considerados como normas jurídicas, pois as normas se referem ao conceito de dever, como

pressupõe Alexy, e desta forma, somente poderiam ser cumpridas ou descumpridas, mas não

ponderadas.

Neste contexto, Habermas comenta sobre moralidade e direito. Para ele a opinião e

formação de opinião dependem de uma rede de discurso e negociação e não simplesmente de

discursos morais. Tampouco como a busca de validade normativa, focada em comandos

185 HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms. Tradução de William Rehg. Cambridge: Mit press. 1996. p.

254.

186 BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de. Sobre a justificação e a aplicação de normas jurídicas. Revista de informação legislativa. Brasília, ano 43, n. 171, p. 81-90, jul/set 2006.

187 ALEXY, Robert. La formula per la quantificazione del peso nel bilanciamento. Annuario di ermeneutica giuridica. Valori, principî e regole. Padova, n. 10/2005, p. 97-123, marzo 2006.

188 HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms. Tradução de William Rehg. Cambridge: Mit press. 1996. p. 218 e ss.

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morais, a busca pela legitimidade ou a própria prática da justificação é baseada em diferentes

tipos de razões.189

In summary, we can say that law has a more complex structure than morality because it (1) simultaneously unleashes and normatively limits individual freedom of action (with its orientation toward each individual’s own values and interests), and (2) incorporates collective goal-setting, so that its regulations are too concrete to be justifiable by moral considerations alone. […] Law, as it were, compensates for the functional weaknesses of a morality that, from the observer perspective, frequently delivers cognitively indeterminate and motivationally unstable results. […] Indeed, moral reasons enter into law by way of the legislative process. Even if moral considerations are not selective enough for the legitimation of legal programs, politics and law are still supposed to be compatible with morality – on a common postmetaphysical basis of justification.190

No entanto, o que Alexy defende é o uso de princípios baseados em direitos

constitucionais e não o uso de condições morais. Como contraponto ao modelo dos princípios

de Alexy, Habermas191 usa o modelo do discurso de justificação proposto por Klaus

Günther192,193, segundo o qual o discurso jurídico comporta dois níveis discursivos: discursos

de justificação194 e de aplicação195. A tese desenvolvida é que a justificação e a aplicação de

189 HABERMAS, Jürgen. Postscript to between facts and norms. p. 135-150. In: DEFLEM, Mathieu (ed.).

Habermas, modernity and law. London: Sage publications, 1996.

190 HABERMAS, Jürgen. Postscript to between facts and norms. p. 135-150. In: DEFLEM, Mathieu (ed.). Habermas, modernity and law. London: Sage publications, 1996. p. 139 e 140.

191 HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms. Tradução de William Rehg. Cambridge: Mit press. 1996.

192 Para ver mais a fundo o que Klaus Günther entende por estes discursos ver: GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Tradução de Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004.

193 Deve-se enfatizar que apesar de Habermas trazer este modelo de Günther os dois possuem algumas divergências entre suas teses: para Günther há a especificidade da moral e do direito entre a justificação e a aplicação; e para Habermas entre direito e moral há uma relação de co-originariedade normativa e de complementariedade funcional. Ver GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Tradução de Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004. p. 11

194 Alexy explica a diferença entre um discurso de aplicação de normas e um discurso de justificação de normas em: ALEXY, Robert. Justification and application of norms. Ratio Juris, Bologna, v. 6, n. 2, p. 157-170, July 1993. A estrutura do discurso moral é explicada em: ___. La fundamentación de los derechos humanos em Carlos S. Nino. Cuadernos de filosofia del derecho. Doxa, n. 26, p. 173-201, 2003. Alexy também comenta sobre o discurso para obter a justiça em: ___. Justicia como corrección. Cuadernos de filosofia del derecho. Doxa, n. 26, p. 161-171, 2003.

195 From Günther, Habermas has adopted the idea of a discourse of application. According to this idea, the decision of a case is correct, if it adequately considers all relevant norms and all features of the case. The perfect fulfillment of this task would require the construction of an “ideally coherent system of norms” This task, however, would overtax even a “professionalized administration of justice.” “In the place of the ideal we (therefore) find paradigms.” These are supposed to lighten the burden of the “hypercomplex task of taking an unordered set of prima facie principles and relating it – directly and with ´the naked eye´ - to the relevant features of a situation apprehended as fully as possible”. ALEXY, Robert. Basic rights and democracy in Jürgen Habermas´s procedural paradigm of the law. Ratio Juris, Bologna, v. 7, n. 2, p. 227-238, July 1994. p. 235.

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normas, sendo regras ou princípios, possuem objetivos diversos e são orientadas por

princípios norteadores específicos. Somente a fundamentação de normas seria orientada pelo

princípio da universalidade, idealizado por Habermas196 – e representado por Günther como U

– uma vez que a aplicação de normas já fundamentadas aos casos concretos exigiria uma

perspectiva distinta. Como objetivo, seria simplificar o momento da fundamentação tirando o

excesso de tarefas que tornariam as críticas sobre a inviabilidade prática do princípio da

Universalidade corretas. O próprio Habermas aceitou a necessidade de reformulação do

princípio da Universalidade nos termos em que Klaus Günther197 propõe. Como se pode notar

na citação a seguir:

As Klaus Günther has shown,73 contexts of justifying norms, practical reason comes into play through testing the universalizability of interests, in contexts of applying norms, through an adequate and sufficiently complete comprehension of relevant contexts in the light of competing rules. The legal procedures through which the impartiality of the administration of justice is supposed to be institutionalized must accord with this regulative idea.198

Habermas199 ao delimitar em um âmbito de justificação e um âmbito de aplicação das

normas quer, em realidade, distinguir entre dois tipos de discursos orientados por questões

diversas. O discurso de justificação diz respeito à elaboração de normas válidas, pautadas pelo

princípio universalista200 (U), que busca considerar os interesses de todos os possíveis

afetados pela norma em jogo. Este tipo de discurso acontece, especialmente, no momento de

justificação de uma norma moral. A legitimidade do discurso de justificação assim concebido

196 HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms. Tradução de William Rehg. Cambridge: Mit press. 1996. p.

109. “This investigation leads one to distinguish various types of discourse (and their corresponding sorts of reasons) according to the logic of the question at issue; it also leads to a distinction between discourse and procedurally regulated bargaining. Specifically, one must show for each type which rules would allow pragmatic, ethical and moral questions to be answered. We might say that these various rules of argumentation are so many of operationalizing the discourse principle. For the justification of moral norms, the discourse principle takes the form of a universalization principle.”

197 Como a tese de Günther sobre os discursos de aplicação e justificação é bastante questionada e traz uma postura metafísica pois não se constitui por juízos e argumentos racionais – voltando um ao outro. Não se utilizarão suas idéias aqui, somente se menciona para citar aos leitores que o referido autor também trata sobre estas questões.

198 HABERMAS, Jürgen. Law and morality (The Tanner lectures on human values). Tradução de Kenneth Baynes. p. 61. Disponível em: <http://www.tannerlectures.utah.edu/lectures/documents/habermas88.pdf>. Acesso em: jun. 2007.

199 HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms. Tradução de William Rehg. Cambridge: Mit press. 1996.

200 The idea that a norm deserves universal approval elucidates what it means for norms of action to be valid in terms of a rational acceptability that is not just local. This explication of normative validity pertains to the process of justification, not application, of norms. Thus the comparison with a maxim of judicial decision making is out of place. HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms. Tradução de William Rehg. Cambridge: Mit press. 1996. p. 565.

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vem do imperativo de se considerar todos os interesses dos afetados pela norma em questão.

Na polêmica da justificação de uma norma se verificam possíveis casos pertinentes, quanto a

aspectos gerais e exemplares. Vem à tona, desta forma, uma série de conseqüências

possíveis.201 A grande diferença em relação à teoria de Alexy é que neste caso a discussão

desses casos possíveis acontece na medida em que é possível generalizá-los, ou seja,

selecionam-se os fatos a partir do critério de características em comum com outras hipóteses

entendidas como relevantes e não a partir do aspecto particular de cada situação.

Habermas argues, ‘at the post-traditional level of justification only those laws count as legitimate that could be accepted by all legal consociates in a discursive process of opinion – and will – formation. […] In the second stage, law is a means of social integration while at the same time one of legitimating political power. Thus, the state is allowed to make legally binding decisions which simultaneously organize society.202

A noção de norma universalmente válida traz uma problemática também sobre um

dilema moral. Para se solucionar este dilema deve-se distinguir entre discursos de justificação

e discursos de aplicação. Günther203 sustenta que todas as teorias que tentaram resolver a

discussão moral da seleção arbitrária dos fatos na decisão de um caso ignoraram a distinção

entre os discursos, pois subestimavam o problema da aplicação das normas que se vale de um

critério distinto, porém não incompatível com o princípio da universalidade. Para este autor o

estabelecimento de critérios racionais para a construção de uma decisão judicial adequada a

um determinado caso deve partir dessa distinção fundamental.

In my view the discourse principle must be situated at a level of abstraction that is still neutral vis-a-vis the distinction between morality and law. On the one hand, it is supposed to have a normative content sufficient for the impartial assessment of norms of action as such; on the other hand, it must not coincide with the moral principle, because it is only subsequently differentiated into the moral principle and the democratic principle. Therefore, it must be shown to what extent the discourse principle does not already exhaust the content of the discourse-ethical principle of universalization (U). Otherwise, the moral principle that was merely concealed in the discourse principle would once again – as in natural law – be the sole source of legitimation in law.204

201 HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms. Tradução de William Rehg. Cambridge: Mit press. 1996. E

GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Tradução de Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004.

202 RASMUSSEN, David. M. How is valid law possible? In: DEFLEM, Mathieu. Habermas, modernity and law: London: Sage publications, 1996. p. 30.

203 GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Tradução de Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004. p. 13.

204 HABERMAS, Jürgen. Postscript to between facts and norms. In: DEFLEM, Mathieu. Habermas, modernity and law: London: Sage publications, 1996, p. 146.

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A particularidade do caso não é antecipada pelos participantes do discurso de

justificação ou, mesmo sendo antecipado, ele pode ser considerado irrelevante para o debate

sobre a validade de uma norma geral e abstrata. Neste nível de argumentação, a escolha dos

fatos relevantes é feita para se testar a universalidade da norma. O que importa em um

discurso de justificação é a determinação do conteúdo semântico de uma norma para que ela

seja traduzida em "termos universais" que possam ter a aceitação de todos os interessados em

circunstâncias gerais e previsíveis.205

This formula does not specify the different ‘norms of action’ (and corresponding normative statements) or the different ‘rational discourse’ (on which, incidentally, bargaining depends insofar as its procedures must be discursively justified). This provides enough latitude, however, for deriving the democratic and moral principles by appropriately specifying the discourse principle. Whereas the democratic principle is applied only to norms that display the formal properties of legal norms, the moral principle – according to which valid norms are in the equal interest of all persons – signifies a restriction to the kind of discourse in which only moral reasons are decisive.206

Alexy não especifica formas de argumentação, mas estabelece passos a serem seguidos

que possibilitem uma melhor interpretação e consequentemente uma melhor justificação e

argumentação para a decisão. Para se considerar o interesse de todos, são necessárias

condições ideais de tempo e de conhecimento que, geralmente, não se confirmam na

realidade. É impossível prever todas as conseqüências decorrentes da aplicação de uma

norma.207 Mesmo que se dispusesse de conhecimento ilimitado quanto as possíveis

conseqüências, este não seria útil para se fazer uma norma geral e abstrata de caráter

universal. Há um problema de se determinar quais são os interesses dos participantes de um

processo de justificação de uma norma uma vez que os interesses das pessoas mudam e se

restringem a determinados horizontes históricos e sociais. Embora nesse processo as

205 HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms. Tradução de William Rehg. Cambridge: Mit press. 1996. p.

217 e 218.

206 HABERMAS, Jürgen. Postscript to between facts and norms. In: DEFLEM, Mathieu. Habermas, modernity and law: London: Sage publications, 1996, p. 146.

207 Poder prever todas as situações de aplicação de uma norma e todos os interesses envolvidos é por demais contrafático. Inexiste operacionalidade possível. Na verdade, essa impossibilidade é mesmo inevitável diante do estágio de evolução da consciência moral, na passagem do nível convencional para o pós-convencional, em que são numerosos os entrecruzamentos de perspectivas comuns. LEAL, Fernando. Klaus Günther, 1957. In: BARRETO, Vicente de Paulo (coord.). Dicionário de filosofia do direito. São Leopoldo/ Rio de Janeiro: Unisinos/ Renovar, 2006. p. 400.

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condições ideais de tempo e de conhecimento não sejam satisfeitas, o princípio não é

abandonado.208

The principle of universalization compels the participants in discourse to examine contested norms in view of foreseeably typical cases, in order to determine whether the norms could meet with the considered agreement of all those affected. Moral rules pass this test only if they are stated in a general, descontextualized form; hence they can be applied directly only to the standard situations that have already been considered in their antecedent clause.209

Deste modo, a exigência ideal da consideração de todos os interesses deve ser satisfeita,

na medida do possível. Assim, num primeiro momento, o discurso de justificação de uma

norma atenderia ao critério da universalização em sua "versão fraca", o qual significa que

“uma norma é válida se as conseqüências e os efeitos colaterais de sua observância puderem

ser aceitos por todos, sob as mesmas circunstâncias, conforme os interesses de cada um,

individualmente.”210 O que se verifica aqui é a concordância de todos os interessados sobre a

antecipação das conseqüências previsíveis dentro de certos limites de tempo e cognição. Em

um segundo momento, Günther211 procura compensar a "versão fraca" do princípio da

universalidade, através do discurso de aplicação de uma norma válida.

[...] the justification of a singular judgment must be based on the set of all appropriate normative reasons that happen to be relevant for the case at hand in view of a complete interpretation of the situation. Thus if the “collision” between norms being weighed in the interpretive process led one to infer a “contradiction” within the system of norms itself, then one would be confusing the norm’s “validity,” which it enjoys in general insofar as it is justified, with its “appropriateness” for application in particular cases. If instead one explains the indeterminacy of valid norms in terms of argumentation theory, then a contest of norms competing as prima facie candidates for application in a given case makes good methodological sense: “The collision of norms cannot be reconstructed as a conflict of validity claims because colliding norms or competing semantic variants enter a relation with one another only in a concrete situation. A discourse of justification would have to abstract from just this situational dependency of collision problems… What other norms or semantic variants are possibly applicable can only be known in the particular situation itself.212

208 GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Tradução de

Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004. p. 59-74 passim.

209 HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms. Tradução de William Rehg. Cambridge: Mit press. 1996. p. 162.

210 GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Tradução de Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004. p. 67.

211 GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Tradução de Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004. p. 69-74.

212 HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms. Tradução de William Rehg. Cambridge: Mit press. 1996. p. 218.

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Isto é, a justificação de cada decisão deve ser feita de acordo com cada caso, quando

acontece uma colisão e se acha uma contradição na verdade se confunde com a validade da

norma. E quando se faz esta justificação através da teoria da argumentação se pode de uma

melhor forma abstrair a melhor norma ou princípio a ser aplicado.213 Assim, deve-se enfatizar

que a aplicação de normas frente a casos singulares é, antes de tudo, uma forma de discurso, e

assim segue os critérios da ética do discurso, tal como formulados por Habermas214. No

processo de aplicação também prevalecem o princípio da não-contradição, da consistência

semântica, da veracidade, da simetria na participação dos sujeitos do discurso, entre outros. O

objetivo do discurso de aplicação também é o de garantir a prevalência do melhor

argumento.215

The idea that a norm deserves universal approval elucidates what it means for norms of action to be valid in terms of a rational acceptability that is not just local. This explication of normative validity pertains to the process of justification, not application, of norms. Thus the comparison with a maxim of judicial decision-making is out of place.216

Através do discurso de aplicação a norma válida pode ser complementada com

considerações sobre os efeitos colaterais não antecipados ou desconsiderados no discurso de

justificação, uma vez que somente diante da singularidade do caso é que se pode, e ainda

assim com reservas, determinar todos os possíveis efeitos de uma norma. Uma norma válida

descreve os fatos a partir de condições iguais e previsíveis. Tal concepção, entretanto, não é

garantia de sua aplicação sob quaisquer circunstâncias. Deste modo, a situação de aplicação,

verificada pela norma válida em condições normais, deve ser complementada por uma

213 “Habermas has recently sharpened this reservation and made it more precise: “This specific reservation with

which we consider well-substantiated norms of action only to be prima facie valid in a sense needing to be complemented, can also be explained by the limitedness o four actual knowledge, but not by its fallibility. The more far-reaching reservation of incompleteness can be explained… by the existential provinciality in view of the historic changes of the things themselves… (and) finally by the fact that the social world… is ontologically constructed in a different way”” Ver: ALEXY, Robert. Justification and application of norms. Ratio Juris, Bologna, v. 6, n. 2, p.157-170, July 1993. p. 158.

214 O papel que o princípio da universalização assume nos discursos de fundamentação é assumido pelo princípio da adequação nos discursos de aplicação. Só quando se toma estes dois princípios em conjunto é que se esgota a idéia de imparcialidade. HABERMAS, Jürgen. Comentários à ética do discurso. Tradução de Gilda Lopes Encarnação. Lisboa: Instituto Piaget, 1991. p. 138.

215 HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms. Tradução de William Rehg. Cambridge: Mit press. 1996. p. 172.

216 HABERMAS, Jürgen. Postscript to between facts and norms. In: DEFLEM, Mathieu. Habermas, modernity and law: London: Sage publications, 1996, p. 150.

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descrição minuciosa da situação que preveja também as circunstâncias variáveis não

abordadas pela descrição normativa.217

O discurso de aplicação trabalha com normas válidas e aplicáveis prima facie e o que se

verifica é a adequação das mesmas a um determinado caso. Uma norma aplicável prima facie

é aquela que verifica além dos fatos descritos na norma e a descrição do caso concreto e

singular considera os fatos não previstos. Faz-se a aplicação do princípio da imparcialidade no

âmbito do discurso. Há uma diferença sutil da imparcialidade no discurso de justificação e no

de aplicação. No discurso de justificação, a imparcialidade existe quando se consideram todos

os interesses envolvidos. No discurso de aplicação, entretanto, a imparcialidade é assegurada

pela consideração de todos os fatos relevantes do caso. A idéia de imparcialidade permite a

consideração do interesse do acusado, que pode encontrar respaldo em uma norma.218

Neste discurso de aplicação e justificação há também o princípio da universalidade, que

pode ser aceito em sua versão “forte” do ponto de vista da discussão de uma norma em dois

níveis, como: “Uma norma é válida e, em qualquer hipótese, adequada, se em cada situação

especial as conseqüências e os efeitos colaterais da observância geral desta norma puderem

ser aceitos por todos, e considerados os interesses de cada um individualmente.”219 Neste caso

não se retoma a discussão sobre a validade de uma norma, como ocorre no discurso de

justificação. Na aplicação de uma norma válida ela é aplicável prima facie, assim como junto

com outras normas igualmente válidas e possivelmente aplicáveis, o que quer dizer que a

adequação de uma norma ao caso individual também deve ser justificada.220

[...] Habermas ao formular “U”, combinara as fundamentações de validade de uma norma diretamente a partir da contraposição de normas e modos de agir. Por isso, a afirmação de que fundamentação e aplicação poderiam ser diferenciadas surge apenas da aparência de que, em determinadas situações, nós muitas vezes, por casualidade, referimo-nos a normas pressupostas, mas que, no entanto, se são

217 HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms. Tradução de William Rehg. Cambridge: Mit press. 1996. p.

229.

218 GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Tradução de Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004. p. 89.

219 GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Tradução de Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004. p. 65.

220 HABERMAS, Jürgen. Postscript to between facts and norms. In: DEFLEM, Mathieu. Habermas, modernity and law: London: Sage publications, 1996, p. 150. “For a norm to be valid, the consequences and side-effects that its general observance can be expected to have for the satisfaction of the particular interests of each person affected must be such that all affected can accept them freely.”

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relevantes e, em situações de conflito, possuem um caráter prima facie que temos de restringir por meio de exceções. Por esse motivo, não precisamos aplicar o princípio moral primeiro em discursos, como se houvesse uma norma pressuposta, e, em seguida, novamente em outros contextos. Contudo, uma vez que, desde o Iluminismo, livramo-nos deste “dogma do pressuposto”, a nossa tarefa moral propriamente dita consiste em “aplicar” o próprio princípio moral a fim de descobrirmos qual é a interpretação mais adequada a situação concreta. [...] Habermas propôs compreender “U” como uma regra de argumentação empregada em discursos práticos, de modo que o princípio moral se transforma assim em um procedimento da ética do discurso que permite a formação de um juízo imparcial a respeito da validade de uma norma moral. 221

A aplicação de uma norma, considerada como segundo nível deve atender a

“adequação” quando se determinar a norma aplicável a um caso específico, de maneira que

possa ser aceita como legítima por todos os interessados. Entretanto, a norma adequada ao

caso será estabelecida após o exame de todas as normas aplicáveis prima facie, bem como de

todos os fatos relevantes. Nesse processo acontece a reconstrução das normas aplicáveis

prima facie de maneira coerente com o caso, para se escapar do casuísmo na determinação

das normas aplicáveis. Para cada caso o processo é repetido. Desta forma um critério racional

de avaliação deveria vincular a questão da seleção dos fatos no processo de construção de

uma decisão normativa.

A idéia de adequação é apontada por Günther222 como forma de contornar o problema

da seleção arbitrária das características do fato no caso de aplicação. A princípio se argumenta

que não é possível resolver esse problema com critérios puramente formais ou metodológicos

de avaliação, ou seja, de critérios tomados independentemente do caso de aplicação. A

obrigatoriedade da descrição completa da situação de aplicação é a única regra formal

existente. A partir disto, o discurso de aplicação é regulado, de um lado, pela análise sintática

dos termos normativos universais referentes a um caso geral e abstrato. Pois assim se

verificam os possíveis significados das referências fáticas da norma prima facie aplicável.

Quanto aos discursos jurídicos, às regras de interpretação e a jurisprudência, estes ajudam a

cumprir o papel de delimitar os possíveis significados do caso descrito na norma. Por outro

lado, deve-se destacar os contornos do caso concreto de aplicação, realçando suas

características. Deste modo, se pode verificar semanticamente se o conjunto de peculiaridades

221 GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Tradução de

Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004. p.89 e 103

222 GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Tradução de Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004. p.283.

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do caso de aplicação coincide com o conjunto de características do caso geral e abstrato

descrito na norma prima facie aplicável.

Contudo, a conformidade entre a descrição normativa do fato e o conjunto de dados do

caso não é suficiente para se determinar a adequação da norma prima facie aplicável. Isso

pode ocorrer porque a descrição completa do caso concreto pode indicar outros traços

característicos que habilitem a aplicação de outras normas válidas. Deve-se evidenciar que a

completa descrição de uma situação de aplicação pode alterar ou mesmo afastar a aplicação

de uma determinada norma válida, tida como prima facie aplicável.223

Günther224 explica que algumas hipóteses podem criar dúvidas sobre a adequação de

uma norma, pois descaracterizam os pressupostos de fato que autorizam a sua aplicação, ou

seja, negam a existência de tal enquadramento. Pode haver também uma hipótese que não

negue o enquadramento na norma, mas que afirme a existência de um fato não previsto

normativamente que pode desautorizar a aplicação daquela norma. Assim, pode surgir um

dado novo que caracteriza o pressuposto de fato de uma outra norma aplicável prima facie. O

que gera uma colisão de normas aplicáveis prima facie.

Percebe-se que é com relação à colisão que ocorre uma discordância fundamental de

Habermas com as teses de Robert Alexy. Para este último, um conflito normativo deste

gênero se resolve por meio de uma ponderação de valores verificada através de ambos os

princípios colidentes. Já para o primeiro, contrariamente, não se trata de uma disputa entre

valores, mas da determinação de uma norma mais adequada ao caso concreto, cuja

determinação não passa pelo processo de ponderação de valores.

Habermas não acredita que a ponderação de valores seja um critério racionalmente

verificável para se determinar a norma adequada ao caso225. Nos casos de ponderação a

solução substitui a lógica da aplicação pelo seu resultado, reduzindo a discussão ao que é 223 HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms. Tradução de William Rehg. Cambridge: Mit press. 1996. E

GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Tradução de Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004.

224 GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Tradução de Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004. cap. 4.

225 HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms. Tradução de William Rehg. Cambridge: Mit press. 1996. E GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Tradução de Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004.

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melhor no caso e não ao que é normativamente devido. Com isso, o processo de

argumentação seria interrompido e critérios materiais seriam introduzidos, os quais, conforme

Habermas, não teriam uma justificação adequada. Para este autor, um discurso de aplicação

orientado pela imparcialidade deve rejeitar esse tipo de decisão. A devida solução do conflito

normativo deve ser buscada em um outro nível, que possibilite uma melhor fundamentação da

norma aplicável ao caso. Portanto, aqui a tese central é a coerência e não a opção valorativa

entre princípios. Embora Alexy concorde que na interpretação do direito a coerência seja

fundamental, ele entende também que não pode haver coerência sem ponderação.226 É

precisamente neste ponto em que emerge a discrepância entre Alexy, de um lado, e Habermas,

de outro lado.

Habermas227 acredita que a idéia de ponderação valorativa destrói a estrutura deôntica228

dos direitos fundamentais. A ponderação pressupõe graus de otimização dos princípios e, com

isto, afasta a estrutura binária (lícito/ilícito) que é constitutiva da validade das normas. Assim,

a teoria dos princípios de Alexy retiraria dos direitos fundamentais a sua estrutura

deontológica - do dever-ser, e lhes conferiria um sentido teleológico - da finalidade valorativa.

Esta discussão, por sua vez, remete ao problema da relação que deva ser estabelecida entre o

campo dos valores morais, de um lado, e o direito, de outro.

Neither rules nor principles have a teleological structure. Contrary to what legal methodologies tend to suggest when they refer to “weighing values” (Güterabwägung), principles must not be understood as optimizing prescriptions, because that would eradicate their deontological character. Rules and principles both serve as arguments in the justification of decisions, though each has a different status in the logic of argumentation.229

226 ALEXY, Robert; PECZENIK, Aleksander. The concept of coherence and its significance for discursive

rationality. Ratio Juris, Bologna, v. 3, n. 1 bis, p. 130-147, March 1990.

227 HABERMAS, Jürgen. Fatti e norme: contributi a una teoria discorsiva del diritto e della democrazia. Milano: Guerini e Associati, 1996. cap. 5.

228 As categorias deônticas correspondem às de proibição; obrigação e permissão, dentro de um quadro lógico que não admitiria, em princípio, intermediações ou graduações entre elas, vale dizer, o que é proibido não pode ser permitido e assim por diante. Disponível em: <http://sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/colisao>. Acesso em: set. 2007.

229 HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms. Tradução de William Rehg. Cambridge: Mit press. 1996. p. 208.

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Para Habermas230, a diferença entre princípio e regra não se avalia pela dimensão de

peso, tornando-se possível afirmar que não se trata de uma diferença morfológica. Para ele as

regras e princípios representam dois tipos diferentes de razões para se fundamentar a ação:

razões prima facie e razões comparativas. Princípios, ao contrário das regras, são gerais e

abstratos, e precisam ser especificados diante de um caso concreto, por intermédio de um

esforço discursivo-interpretativo, não sendo aplicáveis em qualquer situação que ocorram as

circunstâncias de aplicação. No momento de aplicação de um princípio é preciso levar em

conta a sua adequação à realidade material. Assim, podem-se entender os princípios como

pontos de partida da própria realidade em que serão posteriormente desenvolvidos pela

argumentação no processo interpretativo e judicial, não se deixando de lado a própria

realidade. Desta forma, este autor acredita que não se poderiam interpretar os princípios

transformando-os em valores e usando-os como mandatos de otimização.

If principles manifest a value that one should optimally realize, and if the norms themselves do not dictate the extent to which one must fulfill this optimizing prescription, then the application of such principles within the limits of what is factually possible makes a goal-oriented weighting necessary. Because no value can claim to have an inherently unconditional priority over other values, this weighting operation transforms the interpretation of established law into the business of realizing values by giving them concrete shape in relation to specific cases. 231

Pois, neste caso, para se concretizarem os valores seria necessário o preenchimento

criativo de algo determinado de acordo com ponderação dos princípios, precisando de uma

complementação que a transforme em uma norma que se possa executar. E o grande perigo

estaria na adaptação de princípios do direito a valores, tendo em vista que: “Principles or

higher-level norms, in the light of which other norms can be justified, have a deontological

sense, whereas values are teleological.” 232 Neste sentido, as normas, quando válidas, trazem

em si uma obrigação para os destinatários, ou seja, obrigam de igual maneira a um

comportamento que preencha as expectativas. De outra forma, os valores se tratam de

preferências subjetivas. “Shared values express the preferability of goods that, in specific

230 HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms. Tradução de William Rehg. Cambridge: Mit press. 1996.

cap. 5.

231 HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms. Tradução de William Rehg. Cambridge: Mit press. 1996. p. 254.

232 HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms. Tradução de William Rehg. Cambridge: Mit press. 1996. p. 255.

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collectivities, are considered worth striving for and can be acquired or realized through goal-

directed action.” 233

Quanto à doutrina dos valores Habermas acredita existir uma postura autoritária da

jurisprudência de valores:

[...] if the Constitutional Court can justify its role as one which depends on a doctrine of values, the assumption is that it can only do so authoritatively. The argument hinges on the distinction between norms and values, a distinction derived from the earlier discourse ethics. Values are conceived of as particular, historical and context-limited. Values are asserted against other values. They are not the same as norms. Habermas argues that the reconceptualization of norms as values relies on a certain conceptual confusion. Norms are obligatory while values are teleological. Above all, norms require rational justification while values refer to recommended behaviors.234

Conforme Habermas235 as normas tem uma validade binária, pois podem ser válidas ou

inválidas, em que a decisão pode ser somente de sim ou não. Enquanto que os valores trazem

em si relações de preferências, que impõem que determinado valor seja mais atrativo que

outro, podendo valorar algo com maior ou menor intensidade. O dever ser das normas traz um

sentido absoluto com uma obrigação incondicional e universal, ou seja, pretende ser bom para

todos. Por sua vez a ponderação de valores tem um sentido relativo, já que a apreciação é feita

no âmbito de uma cultura ou forma de vida, trazendo preferências. As normas também não

contradizem umas às outras, elas formam um sistema em um contexto coerente, e os valores,

ao contrário, concorrem entre si formando configurações flexíveis e tensas. Isto pode ser visto

na seguinte passagem:

Norms and values therefore differ, first, in their references to obligatory rule-following versus teleological action; second, in the binary versus graduated coding of their validity claims; third, in their absolute versus relative bindingness; and fourth, in the coherence criteria that systems of norms and systems of values must respectively satisfy. The fact that norms and values differ in these logical properties yields significant differences for their application as well.236

233 HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms. Tradução de William Rehg. Cambridge: Mit press. 1996. p.

255.

234 RASMUSSEN, David. M. How is valid law possible? In: DEFLEM, Mathieu. Habermas, modernity and law: London: Sage publications, 1996. p. 37.

235 ALEXY, Robert. Basic rights and democracy in Jürgen Habermas’s procedural paradigm of the law. Ratio Juris, Bologna, v. 7, n. 2, p. 277-238, July 1994.

236 HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms. Tradução de William Rehg. Cambridge: Mit press. 1996. p.. 255.

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Neste contexto, seguindo esta orientação, se verifica que a solução dada ao caso

concreto será diferente se orientada por normas ou valores. Partindo-se de normas se pode

decidir o que deve ser feito, e em relação aos valores se pode somente saber qual o

comportamento recomendável. Tanto em relação às normas quanto em relação aos valores o

que se quer é chegar à solução correta, no caso das normas o correto acontece quando a partir

de normas válidas, a solução é boa para todos; já no caso dos valores o correto se verifica

através do comportamento que, a longo prazo é considerado bom para a comunidade. Quando

se fala em princípios do direito ou bens jurídicos a diferença é desconsiderada, uma vez que o

direito positivado vale para certas áreas jurídicas e determinados destinatários.237 Os direitos

fundamentais enquanto normas regulam uma matéria do interesse de todos, e como valores

formam uma ordem simbólica expressando a identidade e a forma de vida de uma

comunidade jurídica particular.

No doubt values or teleological contents also find their way into law, but law defined through a system of rights domesticates, as it were, the policy goals and value orientations of the legislator through the strict priority of normative points of view. Anyone wanting to equate the constitution with a concrete order of values mistakes its specific legal character; as legal norms, basic rights are, like moral rules, modeled after obligatory norms of action – and not after attractive goods.238

Para Habermas239 aqueles que têm a mesma visão do direito proposta por Dworkin240 –

concessão deontológica do direito, e aceitam a teoria da argumentação desenvolvida por

Alexy241, deveriam concordar também com as teses de que o discurso jurídico não pode ser

auto-suficiente em um universo fechado, mas que deve permanecer aberto em relação a

argumentos de origem diversa (em particular os da razão prática, ética e moral que ocorrem

no processo legislativo e se fixam na pretensão de legitimidade das normas). Da mesma

forma, a correção das decisões jurídicas se mede em último caso pela satisfação das condições

de comunicação da argumentação que tornam possíveis um juízo imparcial. Entretanto, se

237 HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms. Tradução de William Rehg. Cambridge: Mit press. 1996.

cap. 6.

238 HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms. Tradução de William Rehg. Cambridge: Mit press. 1996. p. 256.

239HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms. Tradução de William Rehg. Cambridge: Mit press. 1996. cap. 6; BUSTAMANTE, Thomas. Sobre a justificação e a aplicação de normas jurídicas. Revista de informação legislativa, Brasília, ano 43, n. 171, p. 81-90, Julho/ setembro 2006.

240 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução de Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002. cap. 1.

241 ALEXY, Robert. Teoria dell’argomentazione giuridica: la teoria del discorso razionale come teoria della motivazione giuridica. Milano: A. Giuffre, 1998. Traduzioni di Cosimo Marco Mazzoni e Vincenzo Varano.

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poderia pensar na organização da teoria discursiva do direito conforme o modelo da ética do

discurso.242

O autor defende que desta prioridade do discurso prático-moral não implicaria que o

discurso jurídico fosse pensado como um conjunto de argumentos morais. Pois contra tal tese

houve diversas objeções. A princípio Alexy243 defendeu o discurso jurídico como caso

particular do discurso moral “tesi che Alexy ha dapprima ritenuto genericamente valida sia

per i discorsi fondativi che applicativi”244. Algumas objeções são as seguintes:

(a) Sembra che le specifiche limitazioni cui si sottopone in tribunale l’agire forense delle parti non consentano di ricondurre in generale l’andamento del processo ai criteri del discorso razionale. Le parti non sono obbligate alla ricerca cooperativa della verità. Interessate come sono a un esito favorevole del procedimento, esse possono anche <<spingere avanti – in maniera strategicamente scaltra – argomenti suscettibili di consenso>>. A ciò si può rispondere plausibilmente che tutte le persone coinvolte nel processo, da qualunque motivo siano guidate, portano il loro contributo a un discorso che nella prospettiva del giudice serve a individuare il giudizio imparziale. Però solo questa prospettiva del giudice è essenziale nella fondazione della decisione.245

A primeira grande objeção, como se percebe, diz respeito ao agir das partes no

processo, atitude esta que não aplicaria os critérios do discurso racional. Uma vez que as

partes procurariam favorecer sempre a sua ótica, o que serviria para contribuir com a

formação da opinião do juízo imparcial. Outra objeção seria:

(b) Più problematica sarebbe l’indeterminatezza del procedimento discorsivo: nelle argomentazioni in generale, le stesse condizioni procedurali non sarebbero mai abbastanza selettive per produrre infallibilmente le <<uniche decisioni giuste>>. Qui non vogliamo esaminare in che misura questa obiezione possa applicarsi anche alla teoria del discorso in generale. Limitiamoci alla critica rivolta alla indeterminatezza dei discorsi giuridici. Questi vengono caratterizzati da Alexy come il sottoinsieme di discorsi pratico-morali che sono collegati al diritto vigente. Di conseguenza, egli integra le regole generali del discorso con regole e forme argomentative particolari che riproducono sostanzialmente il canone della tradizionale prassi giuridica interpretativa. Per invalidare la tesi della indeterminatezza, Alexy dovrebbe dimostrare come questi principi procedurali e queste massime interpretative – desunti dalla prassi e sistematizzati nella dottrina

242 HABERMAS, Jürgen. Fatti e norme: contributi a una teoria discorsiva del diritto e della democrazia. Milano:

Guerini e Associati, 1996. A cura di Leonardo Ceppa.

243 ALEXY, Robert. Discourse theory and human rights. Ratio Juris, Bologna, v. 9, n. 3, p. 209-235, September, 1996.

244 HABERMAS, Jürgen. Fatti e norme: contributi a una teoria discorsiva del diritto e della democrazia. Milano: Guerini e Associati, 1996. A cura di Leonardo Ceppa. p. 274.

245 HABERMAS, Jürgen. Fatti e norme: contributi a una teoria discorsiva del diritto e della democrazia. Milano: Guerini e Associati, 1996. A cura di Leonardo Ceppa. p. 275.

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del metodo – si limitino semplicemente a specificare rispetto al diritto vigente le condizioni procedurali generali dei discorsi pratico-morali. Ma per soddisfare questa richiesta non basta certo ricordare fuggevolmente, come fa Alexy, le analogie strutturali caratterizzanti le regole e le forme argomentative di entrambi i tipi di discorso.246

Neste caso, Habermas argumenta sobre a indeterminação do procedimento do discurso

já que quando se argumenta de forma geral, as mesmas condições de procedimento não

bastariam para se obter uma única decisão justa. Para o autor, entretanto, não basta

simplesmente mencionar as similitudes entre regras e formas de argumentação. Habermas

quer que Alexy mostre que os princípios procedimentais e máximas de interpretação

simplesmente especificariam as exigências universais do discurso prático moral para

enquadrá-lo no direito existente.247

(c) Alexy sa bene che decisioni giuridiche discorsivamente fondate non possono essere <<giuste>> nello stesso senso dei giudizi morali validi. <<Nella misura in cui è circoscritta dalle leggi, la ragionevolezza dell’argomentazione giuridica è sempre relativa alla ragionevolezza della legislazione. Un’assoluta ragionevolezza della decisione giuridica presupporrebbe la ragionevolezza della legislazione>>. Nella misura in cui questa condizione non è soddisfatta, la consonanza presupposta anche da Alexy tra diritto e morale ha per spiacevole conseguenza quella non solo di relativizzare, ma di mettere interamente in questione la giustezza della decisione giuridica. Le pretese di validità hanno un codice binario e non tollerano un <<di più>> o un <<di meno>>. <<Infatti, la ragionevolezza di un’argomentazione riferita a una legge irragionevole non è qualcosa di meno, bensì qualcosa di qualitativamente altro dalla ragionevolezza materiale d’ogni decisione trovata seguendo le regole del discorso pratico-razionale>>. Per sfuggire a questa obiezione dobbiamo affrontare, come fa Dworkin, l’impresa di ricostruire razionalmente il diritto vigente. La decisione giuridica sul singolo caso può essere giusta solo se s’inserisce in un sistema giuridico coerente.248

Ou seja, Habermas249 acredita que Alexy entende que decisões com base em discurso

não têm o mesmo caráter de justiça que juízos morais válidos. Por esta razão Alexy escreve a

teoria dos direitos fundamentais, para estabelecer critérios racionais para aplicação de

princípios e juízos morais que tornem o discurso e a decisão justos. Para Habermas quando se

apóia em uma teoria procedimental se verifica a legalidade das normas jurídicas pela

246 HABERMAS, Jürgen. Fatti e norme: contributi a una teoria discorsiva del diritto e della democrazia. Milano:

Guerini e Associati, 1996. A cura di Leonardo Ceppa. p. 276

247 HABERMAS, Jürgen. Fatti e norme: contributi a una teoria discorsiva del diritto e della democrazia. Milano: Guerini e Associati, 1996. A cura di Leonardo Ceppa. Cap. 5.

248 HABERMAS, Jürgen. Fatti e norme: contributi a una teoria discorsiva del diritto e della democrazia. Milano: Guerini e Associati, 1996. A cura di Leonardo Ceppa. p. 277

249 HABERMAS, Jürgen. Fatti e norme: contributi a una teoria discorsiva del diritto e della democrazia. Milano: Guerini e Associati, 1996. A cura di Leonardo Ceppa. Cap. 6

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racionalidade do processo democrático da legislação política. Tal processo se torna complexo,

pois lida com diversas questões, tais como: a indisponibilidade, a relevância, a pertinência e a

escolha de informações, adequação das informações, entre outras questões. Ele enfatiza que

só se atingirá satisfatoriamente a interpretação e os princípios jurídicos por uma teoria do

discurso quando se analisar melhor todo o processo de legislação que envolve argumentação,

negociações e comunicações políticas. Toda esta argumentação envolve o tema de

competência de uma jurisdição, que deve satisfazer ao mesmo tempo critérios de certeza legal

e acertabilidade racional. Nesta passagem Habermas argumenta que

[...] Il trasferimento di questa competenza a una Corte costituzionale ha bisogno di una fondazione per lo meno complessa. Infatti, <<il discorso sui diritti fondamentali non dipende dalle decisioni del procedimento legislativo, ma è sovraordinato a quest’ultimo. Ciò significa che in quel discorso viene meno il più importante vincolo dell’argomentazione giuridica generale: la legge ordinaria, quasi sempre relativamente concreta. Al suo posto, troviamo le disposizioni dei diritti fondamentali che sono molto astratte, aperte e impregnate d’ideologia>>. Alexy attribuisce il <<discorso sui diritti fondamentali>> a tutti gli ambiti della giurisdizione costituzionale. Una deroga esplicita, anche se soltanto puntuale, alla validità delle leggi vigenti si ritrova nel caso del controllo astratto di legittimità.250

Este autor explica que na Alemanha o Tribunal Constitucional Federal tem qualificado

os direitos fundamentais como uma ordem jurídica geral e desta maneira tem ampliado sua

proteção uma vez que traz uma proteção dinâmica do direito fundamental, ligando conteúdo

objetivo e subjetivo. E desta forma, admite que há uma mudança na conceitualização dos

direitos fundamentais. Habermas usa também as idéias de outro crítico de Alexy,

Böckenförde, para reforçar suas idéias.251

In the name of giving the principles behind basic rights the force of law, it reaches the point where – in typological terms – parliament and constitutional court coordinate and converge in their development of law. The former is demoted from originary lawmaking to the provision of concrete specifications, the latter is promoted from the interpretative application of law to its creative, concrete specification…. To this extent the earlier qualitative difference between legislation and adjudication is leveled out. Both … carry on the development of law by making it more concrete, and they compete in doing so. The legislator has a [temporary] lead in this competition, but the constitutional court has [authoritative] priority…. The question this raises is that of the legitimation of the constitutional court.252

250 HABERMAS, Jürgen. Fatti e norme: contributi a una teoria discorsiva del diritto e della democrazia. Milano:

Guerini e Associati, 1996. A cura di Leonardo Ceppa. p. 289.

251 HABERMAS, Jürgen. Fatti e norme: contributi a una teoria discorsiva del diritto e della democrazia. Milano: Guerini e Associati, 1996. A cura di Leonardo Ceppa. Cap. 6.

252 HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms. Tradução de William Rehg. Cambridge: Mit press. 1996. p. 249. Ver também: BÖCKENFÖRDE, Ernst-Wolfgang. Stato, costituzione, democrazia: studi di teoria della

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[...] Nel caso di principi o beni giuridici questa differenza è spesso trascurata, perché il diritto positivo vale comunque solo per un determinato ambito territoriale e dunque per un cerchio ben definito di destinatari. Ma se prescindiamo da questa delimitazione fattuale dell’ambito di validità, noi vediamo che i diritti fondamentali acquistano senso diverso a seconda che li si intenda (alla maniera di Dworkin) come principi giuridici deontologici oppure (alla maniera di Alexy) come dei beni giuridici ottimizzabili. Come norme essi disciplinano una materia nell’eguale interesse di tutti; come valori essi configurano – insieme ad altri valori – un ordine simbolico esprimente identità e forma di vita di una particolare comunità giuridica. Certo nel diritto immigrano anche contenuti teleologici; ma, essendo definito dal sistema dei diritti, il diritto addomestica per così dire i programmi e gli orientamenti di valore del legislatore attraverso una supremazia rigorosa del punto di vista normativo. Perciò chi vuole identificare la costituzione con un ordine concreto di valori ne tradisce il carattere specificamente giuridico. Come norme giuridiche, i diritti fondamentali sono foggiati analogamente alle regole morali, vale a dire secondo il modello di norme d’azione obbligatorie e non secondo il modello di beni attraenti.253

O que Habermas enfatiza é que o que se critica é a forma como a jurisprudência de

valores decide, pois não esclarece as questões, apenas faz o que o autor chama de uma auto-

interpretação falsa, pois para ele direitos não podem ser assimilados a valores. Usando mais

uma vez Böckenförde, ele explica que o problema está na adaptação de princípios aos valores.

Habermas acredita que a otimização e a ponderação de valores é algo que continua sendo

aberto e precisa de algo que o complemente para ser exeqüível. Valores expressam

preferências, e são sempre relativos a uma apreciação dependendo da cultura. A aplicação de

normas e valores se dá de maneiras diferentes. Uma vez que os valores são mais subjetivos.

As normas e valores também têm papéis diferentes na argumentação. Para Habermas, e outros

nos quais ele se baseia, a controvérsia dos valores está vinculada com a legitimidade. O

Tribunal Constitucional se tornaria, assim, uma instância autoritária, pois conforme ele

quando houvesse uma colisão todas as razões assumiriam um papel como argumentos

orientando objetivos, o que tiraria a idéia do discurso jurídico e da sua compreensão

deontológica254 das normas e princípios.255

La teoria del discorso riconduce la legittimità del diritto a procedure e a presupposti comunicativi capaci di fondare – dopo che essi siano stati

costituzione e di diritto costituzionale. Milano: Giuffre, 2006. A cura di Michele Nicoletti e Omar Brino (tradutores).

253 HABERMAS, Jürgen. Fatti e norme: contributi a una teoria discorsiva del diritto e della democrazia. Milano: Guerini e Associati, 1996. A cura di Leonardo Ceppa. p. 304, 305.

254 Ver ELY, John. Democracy and distrust. A theory of judicial review. 13 ed. Cambridge: Harvard University Press, 2001. Para uma distinção entre a compreensão deontológica dos direitos fundamentais e a teoria dos valores.

255 HABERMAS, Jürgen. Fatti e norme: contributi a una teoria discorsiva del diritto e della democrazia. Milano: Guerini e Associati, 1996. A cura di Leonardo Ceppa. cap. 6.

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istituzionalizzati giuridicamente – la supposizione che i processi di produzione e di applicazione giuridica conducano a risultati razionali. Le norme licenziate dal legislatore politico e i diritti riconosciuti dal potere giudiziario comprovano la loro <<razionalità>> per il fatto che i destinatari sono tratati da liberi ed eguali associati di una comunità di soggetti giuridici, dunque, in altre parole, per il fatto che esiste una parità di trattamento tra persone giuridiche tutelate nella loro integrità. È ciò che sul piano giuridico viene espresso dall’imperativo di pari trattamento. Un imperativo che al di un’eguaglianza meramente applicativa del diritto – ossia dell’eguaglianza dei cittadini davanti alla legge -, include anche il ben più impegnativo principio di un’eguaglianza giuridica materiale (o di contenuto) affermante la necessità di trattare, sotto gli aspetti volta per volta rilevanti, in maniera eguale ciò che è eguale e in maniera diseguale ciò che è diseguale. Senonché, quali siano di volta in volta questi <<aspetti rilevanti>> è appunto ciò che ogni volta dev’essere fondato. Perciò alexy interpreta il principio di eguaglianza nel senso di una regola che distribuisce gli oneri argomentativi (sia nei discorsi di fondazione che in quelli di applicazione). Le ragioni o sono in sé immediatamente normative oppure poggiano su ragioni normative. Esse sono ragioni buone o imprescindibili nella misura in cui – nelle condizioni discorsive - <<contano>> per davvero, ossia riescono alla fine razionalmente accettabili al pubblico dei cittadini, cioè agli autori dell’ordinamento giuridico. Il diritto è legitimo quando, chiudendo il cerchio, fa coincidere l’autonomia privata dei suoi destinatari (assoggettati alla parità di trattamento) con l’autonomia pubblica di cittadini che devono giudicare sui criteri della parità (essendo essi gli autori giuridicamente equiparati dell’ordinamento).256

Habermas acredita que a teoria do discurso seria um método mais eficaz para

interpretação. Como visto na citação acima Habermas vê a ordem de valores como o perigo

para decisões irracionais e acredita que argumentos funcionalistas prevaleceriam sobre os

normativos. E os direitos fundamentais não poderiam ser analisados através de valores. Para

ele, estes direitos encontrariam a determinação evidente em um discurso de aplicação, ou seja,

se verificaria entre as normas aplicáveis prima facie a que se adaptasse melhor a situação de

aplicação.257

Così la concezione proceduralista del diritto privilegia quale unica fonte della legittimazione i presupposti di comunicazione e le condizioni procedurali d’una democratica formazione dell’opinione e della volontà. Il che risulta inconciliabile sia con l’idea platonica di un diritto positivo attingente legittimità da un diritto superiore sia con la negazione empiristica di qualsiasi legittimità oltrepassante la contingenza della decisioni del legislatore. Se vogliamo dimostrare l’interna connessione esistente tra Stato di diritto e democrazia, dobbiamo perciò chiarire come mai il diritto positivo non si lasci semplicemente subordinare alla morale (sezione 2), in che modo sovranità popolare e diritti umani si presuppongano a vicenda (sez. 3), e in che senso infine il principio democratico abbia radici sue proprie, indipendenti dal principio morale (sez. 4).258

256 HABERMAS, Jürgen. Fatti e norme: contributi a una teoria discorsiva del diritto e della democrazia. Milano:

Guerini e Associati, 1996. A cura di Leonardo Ceppa. p. 490.

257 ALEXY, Robert. Basic rights and democracy in Jürgen Habermas’s procedural paradigm of the law. Ratio Juris, v. 7, n. 2, p. 227-238, July 1994. e ALEXY, Robert. Constitutional rights, balancing and rationality. Ratio Juris, v. 16, n. 2, p. 131-140, June 2003.

258 HABERMAS, Jürgen. Fatti e norme: contributi a una teoria discorsiva del diritto e della democrazia. Milano: Guerini e Associati, 1996. A cura di Leonardo Ceppa. p. 532.

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Desta maneira, se percebe que Habermas defende que o direito não se subordina à moral

e que o princípio democrático tem raízes próprias independentes do princípio moral.

Entretanto, diz que os direitos humanos podem continuar a ser fundados como direitos

morais.

I diritti umani possono certo continuare ad essere fondati come diritti morali. Non appena però li pensiamo come parte del diritto positivo, diventa evidente che non li possiamo più far cadere paternalisticamente dall’altro sul legislatore sovrano. I destinatari cui il diritto si rivolge non potrebbero pensare d’esserne anche gli autori ove il legislatore reperisse i diritti umani come preesistenti <<dati di fatto>> morali che si tratterebbe solstanto di <<positivizzare>>. D’altro canto, nonostante tutta la sua autonomia, questo legislatore non deve poter decidere nulla che offenda i diritti umani. Tentando di risolvere questo dilemma, ci risulta ora di vantaggio il fatto che, caratterizzando il diritto come un medium <<sui generis>>, noi lo abbiamo prima distinto dalla morale per via delle sua quantità formali.259

Com tudo o visto neste sub-capítulo se percebe que para Habermas diante de um Estado

Democrático de Direito não é possível otimizar de modo absoluto os princípios

constitucionais, pois todos eles têm sua importância. Desta forma, o autor entende que seria o

conjunto deles, e não apenas um, que revelaria a identidade jurídica de uma dada sociedade,

através da teoria do discurso e da teoria da aplicação. A solução dos casos concretos, para este

autor, deveria ocorrer sem se descartar a priori qualquer dos princípios constitucionais e

gerais de Direito, apenas aplicando-os de modo relativo e dependente das necessidades do

caso concreto.

The judges obligation to decide the individual case in the light of a theory justifying valid law as a whole on the basis of principles reflects a prior obligation of citizens, attested by the act of founding the constitution to maintain the integrity of their life in common by following principles of justice and respecting each other as members of an association of free and equal persons.260

Usando a figura de Dworkin, do juiz Hércules, Habermas entende que a obrigação de

decidir cada caso com base em uma teoria que justifique o direito válido se reflete em uma

obrigação dos cidadãos em seguir princípios de justiça e respeitar os membros da sociedade.

Habermas baseia a democracia constitucional na motivação das decisões.261

259 HABERMAS, Jürgen. Fatti e norme: contributi a una teoria discorsiva del diritto e della democrazia. Milano:

Guerini e Associati, 1996. A cura di Leonardo Ceppa. p. 537.

260 RASMUSSEN, David. M. How is valid law possible? In: DEFLEM, Mathieu. Habermas, modernity and law: London: Sage publications, 1996. p. 35.

261 HABERMAS, Jürgen. Postscript to between facts and norms. In: DEFLEM, Mathieu. Habermas, modernity and law: London: Sage publications, 1996.

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[...] constitutional democracy depends on the motivations of a population accustomed to liberty, motivations that cannot be generated by administrative measures. This explains why, in the proceduralist paradigm of law, the structures of a vibrant civil society and an unsubverted political public sphere must bear a good portion of the normative expectations, especially the burden of a normatively expected democratic genesis of law. […] A reconstructive legal theory follows a methodology premised on the idea that the counter-factual self-understanding of constitutional democracy finds expression in unavoidable, yet factually efficacious idealizations that are presupposed by the relevant practices. The first act of a constitution-founding practice already inserts an expansive idea into societal complexity like a wedge. In the light of this idea of the self-constitution of a community of free and equal persons, established practices of making, applying and implementing law cannot avoid being exposed to critique and self-critique.262

Desta forma, se percebe que Habermas acredita que uma teoria deve seguir uma

metodologia e se basear na idéia de auto-compreensão da democracia constitucional

encontrando expressão em práticas relevantes. Ou seja, para ele a priori não se devem

destacar princípios constitucionais, mas devem ser aplicados de acordo com o caso concreto.

No sub-capítulo a seguir é verificada a perspectiva de Dworkin sobre a teoria de Alexy.

2.2 A perspectiva de Ronald Dworkin

Dworkin não fez propriamente uma crítica a Alexy, isto porque ele fez sua teoria antes

de Alexy e em um outro contexto, distinguindo em sua teoria regras, princípios e políticas e

também trabalhando com a hipótese da única resposta correta. Alexy de alguma forma utiliza

a teoria de Dworkin como base para sua construção teórica.263 Para Dworkin264 as decisões

judiciais principalmente em casos difíceis são baseadas em princípios e em outros padrões que

se adaptam a cada caso concreto trazendo uma resposta correta de acordo com cada caso. Este

autor pretende compreender o Direito através da interpretação da prática jurídica265, com a

262 HABERMAS, Jürgen. Postscript to between facts and norms. In: DEFLEM, Mathieu. Habermas, modernity

and law: London: Sage publications, 1996. p. 148.

263 CEZNE, Andréa Nárriman. A teoria dos direitos fundamentais uma análise comparativa das perspectivas de Ronald Dworkin e Robert Alexy. Revista de direito constitucional e internacional. N 52, ano 13, p. 51-67, jul/ set. 2005.

264 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução de Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002. p. 38.

265 “La piedra angular de su teoría del funcionamento y del cambio de las prácticas sociales es la “actitud interpretativa” que los participantes desarrollan sólo en ciertas circunstancias de su evolución. [...] La actitud interpretativa requiere la concurrencia de dos presupuestos básicos. El primero es la creencia de los participantes de que la práctica no sólo existe, sino que tiene un sentido o valor. El segundo, es la convicción de que las exigencias que se pueden derivar de la práctica dependen del sentido que se le asigne

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compreensão da argumentação jurídica como exercício de uma interpretação construtiva266.

Para Dworkin uma teoria da interpretação deve ser construída para o contexto específico no

qual será aplicada, pois desta forma pode servir para confrontar os problemas práticos da

interpretação.267

As principais teses defendidas por Dworkin podem ser, assim, elencadas: a tese dos direitos (the rights thesis), cuja ênfase está na discussão e distinção que o autor estabelece entre princípios (principles) e políticas (policies). [...] A tese da resposta certa (the right answer thesis) conduz à concepção do Direito como cadeia (the chain of law), a qual se constrói a partir da analogia do Direito com a narrativa literária e, conseqüentemente, do juiz com o autor/ crítico literário.268

Deste modo, Dworkin269 fez um estudo com a finalidade de fazer um ataque geral ao

positivismo, principalmente em relação ao modo aberto de argumentação permitido pela

aplicação do que ele definiu como princípios. Para ele, as regras são aplicadas do modo “tudo

ou nada” (all-or-nothing)270, no sentido de que se a hipótese de incidência de uma regra é

preenchida, ou a regra é válida e a conseqüência normativa deve ser aceita ou ela não é

considerada válida. Quando ocorre colisão entre regras, uma delas deve ser considerada

inválida. Os princípios, ao contrário, não determinam a vinculação da decisão, mas somente

contêm fundamentos, que devem ser usados com outros fundamentos vindos de outros

princípios. Se pode, através disto, dizer que os princípios, diferentemente das regras, possuem

a la misma.” Ver: BONORINO, Pablo Raúl. El imperio de la interpretación – Los fundamentos hermenéuticos de la teoría de Dworkin. Cuadernos Bartolomé de las casas. Madrid: Dykinson, 2003. p. 18 e 19.

266 “La interpretación de prácticas sociales constituye, según Dworkin, un claro ejemplo de contexto en el que la “interpretación constructiva” se presenta como una forma particular de conocimiento. Específicamente se refiere a la circunstancia en la que los miembros de una comunidad, que comparten ciertas prácticas y tradiciones, formulan y discuten afirmaciones sobre cuál es la conducta que cierta tradición o práctica les exige en una circunstancia particular. Dworkin afirma que en esos casos, lo que esta en juego, es la determinación de cuál es la mejor forma de interpretar esas prácticas y tradiciones.” BONORINO, Pablo Raúl. El imperio de la interpretación – Los fundamentos hermenéuticos de la teoría de Dworkin. Cuadernos Bartolomé de las casas. Madrid: Dykinson, 2003. p. 18.

267 BONORINO, Pablo Raúl. El imperio de la interpretación – Los fundamentos hermenéuticos de la teoría de Dworkin. Cuadernos Bartolomé de las casas. Madrid: Dykinson, 2003. p. 15.

268 CHUEIRI, Vera Karam de. Ronald Dworkin, 1931-. In: BARRETO, Vicente de Paulo (coord.). Dicionário de filosofia do direito. São Leopoldo/ Rio de Janeiro: Unisinos/ Renovar, 2006. p. 260.

269 Dworkin trata sobre este assunto indiretamente em seus livros: DWORKIN, Ronald. Uma questão de princípio. Tradução de Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2000. ____. Levando os direitos a sério. Tradução de Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002. ____. Virtù sovrana: teoria dell’uguaglianza. Tradução de Giovanna Bettini. Milano: Feltrinelli, 2002. ____. Justice in robes. Cambridge/ London: Harvard University Press, 2006.

270 ALEXY, Robert. Sistema jurídico, princípios jurídicos y razón práctica. IV Jornada Internacionales de Lógica e Informática Jurídicas, San Sebastián, p. 139-151, Sep. 1988.; DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução de Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002. p. 39.

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uma dimensão de peso, que se demonstra na hipótese de colisão entre os princípios, caso em

que o princípio com peso relativo maior em relação ao caso concreto será sobreposto ao outro,

sem que este perca sua validade271. Deste modo, a distinção trazida por Dworkin não se trata

de uma distinção de grau, mas sim de uma dissociação orientada por critérios classificatórios

em relação à estrutura lógica da norma-princípio, ao invés de adotar critérios comparativos

como os de Alexy.272

[...] los criterios de Dworkin para la distinción entre reglas y principios afectan ciertamente a puntos importantes, pero no al núcleo. Si se los analiza a fondo, queda claro que una teoría de los principios por sí sola no está en condiciones de sostener la tesis de la única respuesta correcta, lo que, sin embargo, no hace que disminuya su importancia para la filosofia jurídica, la metodología jurídica y la dogmática jurídica.273

Quando ocorre a colisão dos princípios, um deles tem que ceder perante o outro. Mas

isto não significa declarar inválido o princípio que não prevaleceu, nem que se deva colocar

no mesmo uma cláusula de exceção. Isso significa que o conflito de regras se dá na mesma

dimensão de validade e o de princípios na dimensão de peso. E essa idéia de peso expressa

que o conflito entre princípios será resolvido de acordo com uma hierarquização dos mesmos.

Quando os princípios são aplicáveis ao caso, eles não determinam necessariamente a decisão,

mas sim proporcionam razões a favor de uma ou outra decisão. Não se trata de hierarquização

absoluta, mas de uma hierarquização relativa que tem uma relação com o caso concreto,

realizada pelo procedimento de ponderação dos princípios envolvidos na solução, na qual esta

vai verificar qual princípio possui maior peso no caso concreto.274

271 “Of course constitutional principles often conflict with other important values.[…] The common law tradition

insists, however, that judges must respect the law's integrity in making those decisions; they must not recognize some particular principle as important and weighty in one case and then wholly ignore it or treat it as inconsequential in another, refusing to apply it even though no other, competing principle of comparable power is involved. That kind of incoherence is hypocrisy; someone who is unwilling to apply a principle consistently does not really accept it, and so has no genuine justification even for those decisions in which he claims to be following it. He cites the principle then only to disguise the fact that his decision has some other, less creditable, basis.” FRIED, Charles; DWORKIN, Ronald. Revolution in the court. V.38, n. 14. august 1991. Disponível em: <http://www.nybooks.com/articles/3177>. Acesso em: out. 2007.

272 ALEXY, Robert. Sistema jurídico, princípios jurídicos y razón práctica. IV Jornada Internacionales de Lógica e Informática Jurídicas, San Sebastián, p. 139-151, Sep. 1988.

273 ALEXY, Robert. Sistema jurídico, princípios jurídicos y razón práctica. IV Jornada Internacionales de Lógica e Informática Jurídicas, San Sebastián, p. 139-151, Sep. 1988. p. 140.

274 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução de Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

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Para Alexy275, a distinção entre princípios e regras não pode ser baseada no modo de

aplicação proposto como “tudo ou nada” por Dworkin, mas deve se resumir, sobretudo, a dois

fatores: diferença quanto à colisão, na medida em que os princípios que colidem apenas têm

sua realização normativa limitada reciprocamente, ao contrário das regras, cuja colisão é

solucionada com a declaração de invalidade de uma delas ou com a abertura de uma exceção

que exclua tal antinomia; e a diferença quanto à obrigação que instituem, uma vez que as

regras instituem obrigações absolutas, quando tais regras não forem superadas por normas

contrapostas, enquanto que os princípios instituem obrigações prima facie, na medida em que

podem ser superadas ou derrogadas em função de outros princípios colidentes.276

Já Dworkin277 acredita que os princípios não devem ser concebidos como contraditórios

no plano da justificação, mas devem ser vistos assim no plano da sua aplicação. Para tanto, o

conceito de integridade278 deve ser definido, o que na teoria de Dworkin é responsável pela

atribuição de legitimidade a um sistema jurídico. Assim, se verifica que a integridade se

conecta diretamente com os conceitos de justiça, imparcialidade e de igualdade279,280 , de

275 ALEXY, Robert. Sistema jurídico, princípios jurídicos y razón práctica. IV Jornada Internacionales de

Lógica e Informática Jurídicas, San Sebastián, p. 139-151, Sep. 1988. p. 141.

276 ALEXY, Robert. Sistema jurídico, princípios jurídicos y razón práctica. IV Jornada Internacionales de Lógica e Informática Jurídicas, San Sebastián, p. 139-151, Sep. 1988.

277 DWORKIN, Ronald. Justice in robes. Cambridge: Harvard University Press, 2006.

278 “Law as integrity” is Dworkin’s label for his particular conception of law. It is contrasted with conventionalism (legal positivism) on one side and with pragmatism (legal realism) on the other side. Political integrity is an ideal comparable to personal integrity. […] Political integrity is a collective version of this ideal of wholeness. The legal practices of a community show integrity to the extent that they can be portrayed as proceeding from a coherent set of principles to which the community is committed. This ideal of the integrity of the community serves as Dworkin’s general conception of law, within which particular legal systems are to be interpreted. p. 23. HEHLEY, Kenneth. Protestant Hermeneutics and the rule of law: Gadamer and Dworkin. Ratio Juris. Bologna, v. 3, n. 1, p. 14-28, March 1990.

279 [...] Ma, tuttavia, la nostra teoria si fonda su un concetto di eguaglianza inteso come eguaglianza nei diritti individuali anziché nei diritti dei gruppi. Non nel senso, ovviamente, che tutti avrebbero a loro disposizione una porzione di risorse da usare senza aver alcun interesse a quello che sarebbe degli altri. Al contrario la nostra teoria collega tra di loro le diverse sorti della gente mediante quegli strumenti a disposizione dell’ipotetico mercato. La nostra teoria deve essere, invece, interpretata nel senso che è volta a definire le relazioni tra cittadini individualizzandole, in modo da aver riguardo al punto di vista di ogni singola persona e, al contempo, di chiunque altro nella continuità. p. 81. DWORKIN, Ronald. Il mercato: diritti, etica ed economia. Torino: G. Giappichelli, 1999. Tradução de Simona C. Sagnotti.

280 Dworkin tem uma bela obra na qual fala sobre a teoria da igualdade: DWORKIN, Ronald. Virtù sovrana: teoria dell’uguaglianza. Milano: Feltrineli, 2002. “ In questo libro, la posizione di Dworkin si cartterizza per il rigore del suo argomentare contro la possibilità che un sistema di princìpi relativi ai diritti del singolo possa essere contradetto dall’applicazione di criteri dettati dalla preoccupazione per il benessere generale o l’interesse pubblico. Alla base di questa posizione è la teoria secondo la quale gli individui sono titolari di diritti fondati su princìpi – primo fra tutti l’“uguale considerazione e rispetto” – che vengono prima degli obiettivi espressi dalle decisioni politiche. In questo senso, Dworkin sostiene una versione del liberalismo che deriva valori e diritti non dalla nozione di libertà, ma da quella di uguaglianza. Ciò sulla base di un

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maneira que todo caso possui uma resposta correta, o que garante a integridade do sistema

jurídico. A idéia de integridade serve como uma justificação para as práticas jurídicas para os

juízes na dimensão política da interpretação281. A integridade impõe que tanto a legislação

quanto as decisões judiciais sejam moralmente coerentes.282

Denomino “princípio” um padrão que deve ser observado, não porque vá promover ou assegurar uma situação econômica, política ou social considerada desejável, mas porque é uma exigência de justiça ou eqüidade ou alguma outra dimensão da moralidade.283

Dworkin284 explica que a diferença entre princípios e regras é lógica, como já

mencionado, as regras são aplicadas de uma maneira tudo-ou-nada, ou seja, são aplicadas

quando forem válidas e do contrário não. Os princípios têm uma dimensão que as regras não,

ou seja, a dimensão do peso ou importância. A diferença é lógico-argumentativa, pois ambos

se dirigem às decisões particulares sobre a obrigação jurídica em situações específicas, mas

possuem uma orientação diversa. As regras têm outra característica a qual todas as exceções

podem ser relacionadas e quanto mais o forem mais completo será o enunciado da regra.285 Os

princípios por sua vez não estabelecem condições que tornam sua aplicação necessária, na

verdade eles conduzem à argumentos e a uma certa direção. Os princípios possuem

determinações de universalidade a partir de acordos intersubjetivos.286

“individualismo etico” informato da due concetti umanistici fondamentali: il concetto di pari importanza, per il quale ciascuno deve essere messo nelle condizioni di poter attuare pienamente le proprie aspirazioni, e il concetto di responsabilità particolare, per il quale ciascuno è responsabile delle scelte che compie a tal fine.”

281 “I do not mean myself to endorse the view that social justice depends on the best interpretation, even in the sense Hercules uses, of the past practices of the community. On the contrary the essential difference between the concepts of law and justice, I believe, is that while both invoke morality, justice is more radically independent of the past.” WALZER, Michael; DWORKIN, Ronald. Spheres of justice: an exchange. V. 30, n.12, July 1983. Disponível em: <http://www.nybooks.com/articles/6158>. Acesso em: out. 2007.

282 HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms. Tradução de William Rehg. Cambridge: The MIT Press, 1998. cap. 5.

283 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução de Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002. p. 36

284 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução de Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

285 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução de Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002. p. 40.

286 HEHLEY, Kenneth. Protestant Hermeneutics and the rule of law: Gadamer and Dworkin. Ratio Juris. Bologna, v. 3, n. 1, p. 14-28, March 1990.

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Este autor entende que os princípios não são espécies da norma jurídica, mas sim

proposições que descrevem direitos apesar de virem do campo da moral como padrões de

valores consagrados em uma comunidade de princípios287. Tais princípios se refeririam a

justiça e eqüidade, e diante de um hard case – caso controverso - quando as normas e

precedentes fossem insuficientes para a solução do caso interagiriam com o direito.288

Dworkin ainda diferencia princípios de política (policy), sendo que princípio é um

padrão que contém uma exigência de justiça, eqüidade, devido processo ou outra dimensão de

moralidade; já a política tenta estabelecer um objetivo a ser alcançado, que geralmente diz

respeito a melhoria de um aspecto econômico, político ou social de uma determinada

população, procurando assegurar ou promover uma situação exigida. Assim, as políticas

possuem uma vinculação a objetivos específicos, seguindo uma lógica conforme os fins a que

se propõe.289

Os juristas estão discutindo esse tema há décadas, não porque ignoram o tipo de decisões que os juízes tomam ou as razões em que as sustentam, mas porque não vêem com clareza o que realmente significa o conceito de seguir regras. Nos casos fáceis [...] parece correto dizer que o juiz está aplicando uma regra preexistente a um novo caso. Mas podemos dizer isso quando a Suprema Corte derruba um precedente e ordena que as escolas sejam dessegregadas ou declara ilegais procedimentos que, com a tolerância dos tribunais, a polícia vinha adotando há décadas? Nesses casos dramáticos a Suprema Corte apresenta razões – ela não cita leis escritas, mas apela para princípios de justiça e política pública.290

Para Dworkin os direitos derivam tanto da história quanto da moralidade, para

comprovar tal afirmação o autor entende que exista um juiz ideal, que ele chama de

287 Dworkin ha spesso riconosciuto la necessità di compiere un bilanciamento fra un diritto e l’altro; ha

riconosciuto altresì l’occasionale necessità di sacrificare diritti altrimenti rilevanti in nome di altri valori sociali in contrasto con essi, ma considerati prevalenti. Se non si può derogare a un diritto invocando genericamente la nozione di interesse generale, egli scrive, <<un ordinamento può essere legittimato a derogare o limitare la portata di un diritto sulla base di argomenti diversi>>: <<il più importante... di questi è la consapevolezza dell’esistenza di diritti concorrenti col primo la cui tutela sarebbe messa a repentaglio qualora il diritto in questione non venisse limitato>>. HOLMES, Stephen; SUNSTEIN, Cass R. Il costo dei diritti: perché la libertà dipende dalle tasse. Bologna: il mulino, 2000. Traduzione di Elisabetta Caglieri. Edizione italiana a cura di Carlo Fusaro. p. 106.

288 DWORKIN, Ronald. Law's empire. Cambridge: Harvard University, 1986.

289 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução de Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

290 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução de Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002. p. 8.

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“Hércules”291, que tem capacidades e paciência sobre humanas e competência para escolher as

hipóteses de interpretação dos casos concretos levando em consideração o filtro da

integridade.

The ideal judge I imagine—Hercules—interprets the immense variety of past judicial decisions in his jurisdiction so as to find the scheme of principle that "underlies" them, and then decides new cases that come before him by applying that scheme. The set of principles he deploys as the best interpretation may not fit all the past decisions; it may show some of these to have been "mistakes" which should now be eliminated to achieve integrity in the law as a whole.292

Entende que cada juiz deve interpretar o que foi escrito no passado tentando chegar a

uma opinião do que foi feito coletivamente, devendo interpretar o que foi feito, sempre com

base no melhor princípio ou política que possa justificar a prática adotada.293

Em minha argumentação, afirmarei que, mesmo quando nenhuma regra regula o caso, uma das partes pode, ainda assim, ter o direito de ganhar a causa. O juiz continua tendo o dever, mesmo nos casos difíceis, de descobrir quais são os direitos das partes, e não de inventar novos direitos retroativamente.294

Deste modo, no momento em que o intérprete percebe que existem regras positivas

vagas ou indeterminadas, cabe a ele, dentro das pretensões das partes, decidir de maneira a

não privá-las daquilo a que elas têm direito, ao invés de adotar o entendimento de que sua

decisão gerará um novo elemento de legislação. Para que o juiz consiga garantir os direitos

institucionais das partes, ou seja, aqueles que existem além dos direitos criados por uma

decisão judicial ou prática social expressa, deverá usar princípios, provenientes da norma

jurídica, que funcionarão por meio de um juízo de ponderação no sentido de reflexão,

diversamente do sentido que Alexy usa na sua teoria.295

291 The interpreter as hero – this aspect of modernity has never been better personified than in Dworkin’s

philosophical Judge Hercules, who struggles to encompass all in a coherent interpretation that fits and justifies our practices, and that settles the case at hand with certainty. HENLEY, Kenneth. Protestant hermeneutics and the rule of law: Gadamer and Dworkin. Ratio Juris, Bologna, v. 3, n. 1, p. 14 – 28, March 1990. p. 25.

292 WALZER, Michael; DWORKIN, Ronald. Spheres of justice: an exchange. V. 30, n.12, July 1983. Disponível em: <http://www.nybooks.com/articles/6158>. Acesso em: outubro 2007.

293 HENLEY, Kenneth. Protestant hermeneutics and the rule of law: Gadamer and Dworkin. Ratio Juris, Bologna, v. 3, n. 1, p. 14 – 28, March 1990.

294 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução de Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002. p. 127.

295 ALEXY, Robert. Sistema jurídico, princípios jurídicos y razón práctica. IV Jornada Internacionales de Lógica e Informática Jurídicas, San Sebastián, p. 139-151, Sep. 1988.

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I said that a principle underlies a body of rules if it provides the best available justification for those rules, and I emphasized that this is not simply a mechanical test of counting how many past decisions "fit" the proposed principle. I said that if different schemes of interpretation each fit a great many rules but are inconsistent with others then Hercules must choose, as the "correct" interpretation, that which in his view comes closest to what abstract justice would require.296

Assim, Dworkin propõe uma teoria dos direitos pragmática, entendendo que exista

somente uma resposta correta para cada caso concreto apresentado ao juiz. Esta resposta

correta, a ser empregada nos hard cases, deve estar fundada em princípios individuais, e o

juiz, assim, deve estabelecer o conteúdo moral de sua decisão, e não apenas aplicar a lei de

forma mecânica à hipótese de fato ou ainda ter a liberdade para selecionar a solução que

julgar mais certa dentre as diversas soluções ofertadas pelo ordenamento jurídico.297

Dworkin298 pressupõe a identificação de uma comunidade de princípios, isto é, uma

sociedade governada por princípios comuns, não somente por regras. Entende-se, desta forma,

o direito como um sistema de princípios estabelecidos a partir da interpretação das práticas

sociais299. Este autor distingue regras e princípios a partir de critérios lógico-argumentativos,

entendendo que, não se pode fazer uma distinção em um plano abstrato, somente diante de um

caso concreto. Ele lembra que algumas disposições podem funcionar como uma regra, do

ponto de vista lógico, e como princípio do ponto de vista substantivo.300

[...] Dworkin sostiene que no importa el grado de abstracción que tenga la cuestión interpretativa que se esté considerando, toda interpretación consiste en mostrar al material interpretado como lo mejor que puede ser. En el caso del derecho, para elegir entre diversas interpretaciones se debe apelar al conjunto de principios de moralidad política que justifiquen mejor al derecho como un todo. La distinción entre el derecho que es y el derecho que debe ser, de acuerdo a la mejor teoría de la moralidad política capaz de ajustarse a los principales hechos de la práctica jurídica, ya no puede ser establecida. La formulación de una teoría jurídica, en la

296 WALZER, Michael; DWORKIN, Ronald. Spheres of justice: an exchange. V. 30, n.12, July 1983. Disponível

em: <http://www.nybooks.com/articles/6158>. Acesso em: outubro 2007.

297 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução de Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002. ; PECES-BARBA, Gregório. Fundamental rights: between morals and politics. Ratio Juris, Bologna, v. 14, n. 1, p. 64-74, March 2001.

298 DWORKIN, Ronald. Uma questão de princípio. São Paulo: Martins Fontes, 2001.

299 “Dworkin sostiene, parafraseando a Rawls, que la interpretación de una práctica social puede ser entendida como la búsqueda de un equilibrio, a partir del contenido identificado en la perspectiva “preinterpretativa”, entre su justificación y las exigencias postinterpretativas que de ella se pueden derivar.” BONORINO, Pablo Raúl. El imperio de la interpretación – Los fundamentos hermenéuticos de la teoría de Dworkin. Cuadernos Bartolomé de las casas. Madrid: Dykinson, 2003. p. 25.

300 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução de Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

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medida en que este compuesta también por proposiciones interpretativas sólo diferenciables de las que emiten el resto de los participantes de la práctica por su alto nivel de abstracción, no puede ser concebida como una tarea de elucidación conceptual y valorativamente neutra.301

Para Dworkin a distinção lógica entre regras e princípios quer dizer que tanto um como

o outro são conjuntos de normas ou padrões (standards) que levam a decisões particulares

sobre obrigações jurídicas numa particular circunstância. Entretanto, se diferenciam no caráter

da direção que apontam. As regras, como já dito, são aplicáveis na forma do tudo-ou-nada, ou

seja, são independentes, aplicam-se ou não se aplicam ao caso. Por sua vez, os princípios,

embora muito se pareçam com as regras, não indicam uma conseqüência legal que deva ser

seguida automaticamente quando existem certas condições.302

Um princípio apresenta uma razão que leva a uma direção, porém, não exige uma

decisão específica naquele mesmo sentido apontado. Um princípio pode não prevalecer, no

entanto isso não significa que não seja um princípio do Direito. Trata-se de um dos princípios

que os operantes do sistema precisam levar em conta, se for relevante, como uma

consideração que leva para uma outra direção. Uma outra diferença é que princípios têm uma

dimensão de peso ou importância. Se duas regras estão em conflito, uma não poderá ser

válida, já em relação aos princípios, será aplicado aquele que tiver maior peso ou importância

naquela circunstância. Quando os princípios entram em colisão deve haver uma ponderação,

verifica-se qual princípio possui um peso maior no caso concreto, o de peso menor não é

declarado inválido, entretanto é deixado de lado.303

Alexy304 entende que Dworkin não esclarece de forma eficaz a diferença entre regras e

princípios. Para aquele autor os princípios devem ser entendidos como mandatos de

otimização. Isto aparece de forma mais clara em relação aos princípios constitucionais. A

tarefa de otimização tem uma base moral, deste modo a teoria dos princípios forneceria um

ponto de partida adequado para contrapor a tese positivista da separação entre Direito e moral.

301 BONORINO, Pablo Raúl. El imperio de la interpretación – Los fundamentos hermenéuticos de la teoría de

Dworkin. Cuadernos Bartolomé de las casas. Madrid: Dykinson, 2003. p. 31.

302 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução de Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

303 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução de Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

304 ALEXY, Robert. Sistema jurídico, princípios jurídicos y razón práctica. IV Jornada Internacionales de Lógica e Informática Jurídicas, San Sebastián, p. 139-151, Sep. 1988.

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O que vincularia a argumentação jurídica e a moral. Diante disto, se questiona se é possível

que uma teoria dos princípios determine para cada caso uma única resposta correta.305

Desta forma, Dworkin entende que uma variação da teoria dos princípios considerada

fraca seria aquela na qual se fizesse uma relação de prioridade entre os princípios, tornando-se

somente um catálog de pontos de vista. Em contrapartida, uma variação mais forte conteria

além de todos os princípios, todas as relações de prioridade abstratas e concretas entre os

princípios, determinando em sentido único a decisão em cada caso. Se fosse possível uma

teoria deste tipo, a teoria de uma única resposta correta de Dworkin funcionaria.306

O tema da única resposta correta depende em sua essência de se o discurso prático

conduz a uma única resposta correta para cada caso. Isto aconteceria se sua aplicação

garantisse um consenso. Entretanto, se percebe que em condições reais as exigências de uma

única resposta correta só podem ser cumpridas de maneira aproximada, sendo que uma única

resposta correta para cada caso somente poderia ser admitida se houvesse: tempo ilimitado;

informação ilimitada; clareza ilimitada em relação a conceitos; capacidade e disposição

ilimitados para troca de papéis e falta de prejulgamentos.307

O grande desafio, posto hoje aos direitos fundamentais, no meu modo de entender, continua a ser a descoberta de que o Direito moderno não regula nem a si mesmo. O direito moderno só se dá a conhecer por meio de textos e textos, por definição; são manipuláveis. [...] Dworkin, ao contrário, buscará responder a esse desafio, no contexto do atual conceito de ciência, optando pelo enfoque da hermenêutica filosófica. Se são possíveis várias leituras de um mesmo texto, para ela, a saída encontra-se na concretude e na singularidade dos eventos sociais que o Direito regula. A situação vivencial concreta levada ao Judiciário é única, irrepetível, por definição. No campo social, os eventos não se repetem e não se repetem em grau definitivo, porque se o fizerem já não são os mesmos, uma vez que nós que os vivenciamos somos pessoas diferentes do antes fôramos, já que aprendemos vivencialmente com eles. Somos pessoas mais vivenciadas, mais vividas, mais experientes e as nossas expectativas em relação a eles são distintas. É nesse sentido

305 “Daí não se segue, por certo, que a tese de que “não há resposta correta” esteja errada. Se alguma teoria

filosófica nos forçar a admitir que uma proposição só pode ser verdadeira se houver um critério consensual de verificação mediante o qual sua verdade possa ser demonstrada, tanto pior para a experiência comum, inclusive para a experiência jurídica comum. Felizmente, porém, a situação é totalmente outra. O argumento teórico comum não é tão imperioso que nos force a rejeitar a experiência comum. Ao contrário, nem fica claro o que significa a tese de que “não há resposta correta” tal como a interpreta o argumento teórico.” DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução de Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002. p. 434.

306 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução de Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

307 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução de Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

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que Ronald Dworkin pôde afirmar que há uma única decisão correta para cada caso, não é em termos de só seja possível uma única leitura de um texto legal.308

Diante disto, ficaria uma interrogação se frente a idealizações semelhantes seria possível

uma única resposta correta para cada caso ou se as diferenças antropológicas dos participantes

no discurso pesariam nas idealizações e poderiam existir casos que não fosse possível uma

única resposta correta. De qualquer forma, para Alexy309, não há um procedimento que

possibilite chegar, em cada caso, a uma única resposta correta com a segurança necessária. Já

que em um discurso jurídico o que deve ter pleno sentido e estar fundamentado é a pretensão

de que a resposta que uma parte pretende seja a única correta, independente de haver uma ou

não. A idéia de única resposta deve ser uma idéia regulativa, de tal forma que pressuponha

que em alguns casos há uma única resposta correta, mas não se sabe em que casos, e assim,

vale a pena tentar encontrar em cada caso a única resposta correta. As respostas que forem

encontradas em cada caso, sob esta tentativa, com base no nível da regra e dos princípios, bem

como critérios da argumentação jurídica racional, respondem as exigências da razão prática,

mesmo que não sejam consideradas as únicas respostas corretas.310

A exigência de uma única resposta ou decisão correta viria do próprio ideal de

integridade do Direito. Para ser realizado é preciso confirmar que o Direito é coerente e que

para cada caso há uma única resposta correta, que satisfaça os requisitos de certeza e

legitimidade do Direito. Para se alcançar tal resposta não há uma fórmula, e assim, aquele que

decide, o juiz, deve estar aberto e sensível ao caso.311

[...] el punto de partida de la teoría jurídica debe ser los discursos justificatorios de los jueces. De esta manera expresa una de sus creencias básicas respecto del derecho, una de las tesis que ha mantenido a lo largo de toda su producción

308 DE CARVALHO NETTO, Menelick. A hermenêutica constitucional e os desafios postos aos direitos

fundamentais. p. 159. In: SAMPAIO, José A. L. (org.) Jurisdição constitucional e direitos fundamentais. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 141-163.

309 ALEXY, Robert. Sistema jurídico, princípios jurídicos y razón práctica. IV Jornada Internacionales de Lógica e Informática Jurídicas, San Sebastián, p. 139-151, Sep. 1988.

310 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução de Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

311 Eppure, secondo Dworkin, il ragionamento giuridico consiste nel portare sui singoli problemi giuridici una vasta rete di principi di derivazione giuridica e di moralità politica: <<non si può pensare a una risposta corretta (correct) ai singoli problemi giuridici a meno che non si sia pronti [...] a pensare nei termini di un ampio avvolgente sistema teorico di complessi principi sulla natura della responsabilità civile per esempio, o della libertà di espressione in una democrazia, o della migliore comprensione del diritto alla libertà di coscienza e alle proprie personali moralli>>. PALOMBELLA, Gianluigi. L’autorità dei diritti: i diritti fondamentali tra istituzioni e norme. Roma-Bari: Laterza, 2002. p. 89.

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académica sin excepción: que la teoría jurídica no es más que el prólogo silencioso de la labor de aplicación judicial del derecho.312

Para tanto, Dworkin313 explica que se deve verificar como as convicções morais dos

juízes314 são colocadas nos seus julgamentos sobre o que é o direito. Para chegar a estas

informações o autor traz a idéia do conceito de direito diferenciando o conceito da doutrina e

o conceito sociológico de direito.

The doctrinal concept of law figures among the boundaries of the sociological concept in this way: nothing is a legal system in the sociological sense unless it makes sense to ask what rights and duties the system recognizes. That is an important interconnection between the two concepts. But that relation is not reciprocal: not every set of norms that deploys rights and duties is a case of law.315

Percebe-se que para este autor a questão importante é se e como a moralidade é

relevante quando se decide quais proposições da lei são verdadeiras, não como se rotula

quaisquer princípios morais que são entendidos como relevantes. Dworkin316 verifica um

pequeno catálogo de intersecções possíveis entre direito e moral – se perguntando se

considerações morais aparecem como condições verdadeiras em questões de direito e como

isto acontece. Ele enfatiza que se deve prestar atenção aos diferentes modos nos quais a

moralidade pode aparecer em decisões. A verdade sobre questões de direito podem depender

da verdade de reivindicações morais porque cada uma das intersecções entre direito e moral é

controvertida. Isto deve ser levado em consideração para se estar sempre atento aos diferentes

modos nos quais cada um pensa o direito.317

312 BONORINO, Pablo Raúl. El imperio de la interpretación – Los fundamentos hermenéuticos de la teoría de

Dworkin. Cuadernos Bartolomé de las casas. Madrid: Dykinson, 2003. p. 42.

313 DWORKIN, Ronald. Justice in robes. Cambridge/ London: Harvard University, 2006.

314 “Los jueces, al justificar sus decisiones, no entablan disputas sobre la verdad de ciertas proposiciones jurídicas (entendidas como proposiciones normativas), sino que utilizan dichas proposiciones jurídicas, esto es, para emitir otras normas. Aun cuando se aceptara, como señalamos anteriormente, que también cuando expresan normas dichas proposiciones pueden ser consideradas verdaderas o falsas, los razonamientos judiciales deberían ser considerados de manera diferente a los argumentos producidos en una disputa jurídica ordinaria.” BONORINO, Pablo Raúl. El imperio de la interpretación – Los fundamentos hermenéuticos de la teoría de Dworkin. Cuadernos Bartolomé de las casas. Madrid: Dykinson, 2003. p. 44.

315 DWORKIN, Ronald. Justice in robes. Cambridge/ London: Harvard University, 2006. p. 4.

316 DWORKIN, Ronald. Justice in robes. Cambridge/ London: Harvard University, 2006.

317 ALEXY, Robert. Sistema jurídico, princípios jurídicos y razón práctica. IV Jornada Internacionales de Lógica e Informática Jurídicas, San Sebastián, p. 139-151, Sep. 1988.

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Outro tópico enfatizado pelo autor é que se deve também prestar atenção aos diferentes

pontos em uma teoria geral do direito nos quais o tema do papel da moralidade pode ser

levantado. Para tanto se deve verificar os diferentes estágios de uma teoria geral que possam

oferecer uma relação compreensível de quais questões de direito são verdadeiras no caso. Para

decidir qual dos métodos de decisão sobre o que o direito diz é o método correto se deve

desenvolver uma teoria geral do direito. Tal teoria seria uma consideração geral do conceito

doutrinário do direito que seria útil para responder tal questão.318

Para Dworkin319 não está claro como esta teoria seria construída, a grande polêmica

seria que práticas e hipóteses devem ser compartilhadas pelas pessoas para que elas partilhem

o conceito doutrinário e possam concordar ou não na sua aplicação. Desta forma, o autor

verifica como poderiam ser criados conceitos que ajudariam na teoria a partir de algumas

questões. Em relação à semântica o autor acredita que as pessoas compartilham conceitos

somente quando elas concordam com uma definição que estabeleça critérios para a correta

aplicação de determinado termo ou frase. Uma teoria útil deve ser uma interpretação da

prática na qual o conceito aparece. Conceitos são feitos designando-se valores e objetivos a

prática, e opiniões são formadas sobre as verdadeiras condições de exigências particulares que

as pessoas fazem na prática por seus objetivos e valores. Quanto à questão jurisprudencial se

pode construir uma teoria que seja apropriada dependendo do conceito na questão semântica,

assim, Dworkin320 interpreta a prática verificando uma relação de valores gerais que melhor

justificam esta prática e que deveriam servir de guias para que a prática continue. Dworkin

fala em hipótese valorativa e atribui a ela um caráter trivial, uma vez que é abstrata e

necessária para se reconhecer sobre o que diversas teorias estejam em desacordo.

[...] Dworkin cree que la hipótesis valorativa no es tan débil como parece, pues traeaparejadas diversas consecuencias de importancia. Primero, permite mostrar a las teorías sobre la interpretación no como ellas mismas se presentan, esto es como análisis alternativos de la idea misma de interpretación, sino como teorías sobre el valor en el dominio del que se trate. De esta manera, se puede entender que las diferentes teorías de la interpretación son concepciones rivales respecto del concepto de interpretación (tal como lo establece la hipótesis valorativa). Segundo, pone en evidencia que sólo existe una diferencia en el nivel de abstracción entre ofrecer una teoría de la interpretación y ofrecer una interpretación en particular.

318 ALEXY, Robert. Sistema jurídico, princípios jurídicos y razón práctica. IV Jornada Internacionales de

Lógica e Informática Jurídicas, San Sebastián, p. 139-151, Sep. 1988.

319 DWORKIN, Ronald. Reply to Paul Ricoeur. Ratio Juris, Bologna, v.7, n.3, p. 287-290, December 1994.

320 ALEXY, Robert. Sistema jurídico, princípios jurídicos y razón práctica. IV Jornada Internacionales de Lógica e Informática Jurídicas, San Sebastián, p. 139-151, Sep. 1988.

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Por último: niega que se pueda continuar defendiendo la distinción entre interpretar, entendido como el descubrimiento del significado real de un objeto, y criticar, concebida como la evaluación de su éxito o importancia. Las creencias valorativas respecto del dominio en el que se interpreta están presentes siempre que se interpreta algo o se defiende una determinada teoría de la interpretación.321

Já na questão doutrinária são construídas condições verdadeiras de afirmações de direito

com base nos valores identificados na jurisprudência. Uma interpretação legal é complexa,

pois busca princípios que justificariam as exigências substantivas quanto a direitos, deveres e

todo o resto que uma prática específica reconheça e reforce, mas ao mesmo tempo deve

justificar as práticas constitucionais e procedimentais nas quais as exigências substantivas

estão incrustadas. Em relação à figura da decisão, para Dworkin322, a maioria das pessoas

acredita que determinados tipos de decisões políticas deveriam ser tomadas somente de

acordo com o exigido e permitido por previsões do direito. Entretanto, é aceito que em alguns

casos juízes possam ter uma obrigação moral de ignorar o direito quando é muito injusto ou

insensato, e usar seu poder político para evitar injustiça ou uma grande falta de eficiência.

Assim para este autor a moralidade teria um papel essencial em uma teoria:

Morality plays a role in a legal theory within this new structure at two points: at the jurisprudential stage, when value is attributed to legal practice; and at the adjudicative stage, when judges are urged to do justice and told that justice requires market-share damages. But the two infusions of morality are distinct. In my own view, to the contrary, the value of integrity that we should attribute to legal practice flows through the doctrinal stage into the adjudicative stage because, I argue, integrity requires judges to look to morality in some cases […] to decide both what the law is and how to honor their responsibilities as judges. Once again, the difference is not between theories that include and those that exclude morality, but between theories that introduce morality at different stages of analysis with different consequences for the final political judgment in which a complete legal theory terminates.323

Todas estas questões levantadas servem como um esquema útil para identificar e

distinguir diversos tipos de teorias do direito. Dworkin324 esclarece algumas teorias para

distinguir algumas concepções e posições. Ele começa pelo que chama de pragmatismo

jurídico. Tal teoria é geralmente descrita como teoria da decisão judicial, e estabelece que

juízes sempre deveriam decidir os casos levando em consideração as conseqüências de suas

321 BONORINO, Pablo Raúl. El imperio de la interpretación – Los fundamentos hermenéuticos de la teoría de

Dworkin. Cuadernos Bartolomé de las casas. Madrid: Dykinson, 2003. p. 87.

322 DWORKIN, Ronald. Reply to Paul Ricoeur. Ratio Juris, Bologna, v.7, n.3, p. 287-290, December 1994.

323 DWORKIN, Ronald. Justice in robes. Cambridge/ London: Harvard University, 2006. p. 20.

324 ALEXY, Robert. Sistema jurídico, princípios jurídicos y razón práctica. IV Jornada Internacionales de Lógica e Informática Jurídicas, San Sebastián, p. 139-151, Sep. 1988.

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decisões no futuro, não importando as práticas passadas. Esta teoria é radical na história do

pensamento do direito, mas ao mesmo tempo uma teoria de muita importância na prática

jurídica contemporânea. Existem mais de uma corrente de pragmatismo, uma que é mais

influente na academia, por ser menos filosófica e mais prática, estabelece que qualquer um

com poderes políticos deveria usar seu poder para tentar melhorar as coisas de qualquer

maneira possível de acordo com sua posição política e o grau de seu poder. Outra teoria citada

por Dworkin é o pluralismo moral – uma teoria de conflito de valores morais que desafia o

ideal da integridade325 no seu nível mais básico. A relação interpretativa da prática jurídica de

Dworkin supõe que os valores que justificam a prática jurídica, mesmo sendo variados e

complexos, formam um conjunto integrado e podem guiar a integridade nas questões

doutrinárias e de decisão judicial. 326

O autor também cita o positivismo político doutrinário, que apesar de suas

controvérsias, pode ajudar na distinção de diferentes posições jurisprudenciais, que ele chama

de posições positivistas.327 Ele explica que uma versão atual do positivismo político enfatiza

que os juízes na atualidade não devem usar razões morais para interpretar a constituição não

porque por definição o direito não tem nada a ver com a moral, mas porque os melhores

argumentos da moral política exigem que os juízes contemporâneos sejam obrigados a seguir

opiniões morais de gerações antecedentes até que elas sejam substituídas não por eles e sim

pelas pessoas como um todo através das emendas a constituição. Em relação ao positivismo

doutrinário analítico o autor explica que esta teoria afirma que a independência do direito e da

moral não depende de qualquer interpretação política ou moral, ou justificação da prática

jurídica, ou qualquer doutrina política no estágio de decisão de uma teoria do direito, mas

segue diretamente de uma análise correta do conceito, idéia ou natureza do direito. A partir do

momento que se entende o conceito doutrinário do direito se verifica que fatos morais não

podem aparecer em condições verdadeiras de tal proposta. Quanto à filosofia do direito

Dworkin acredita que é a partir dela que surgiram questões sobre o papel da moral quando se

325 Dworkin reforça seu entendimento sobre o que ele quer dizer com ideal de integridade na seguinte passagem:

“judicial integrity does not ask judges to decide on political grounds which of their past decisions "must be extended to the limits of...its logic" and which to curtail by declaring "thus-far-and-no-further." Rather integrity asks them to find and apply the principles of constitutional morality that provide the best justification of their past decisions, not just one by one, but as a body of constitutional law.” ALLAN, J.; FRIED, C.; DWORKIN, R. The supreme court Phalanx: an exchange. v.54, n.19, December 2007. Disponível em: <http://www.nybooks.com/articles/20877>. Acesso em: dez. 2007.

326 DWORKIN, Ronald. Reply to Paul Ricoeur. Ratio Juris, Bologna, v.7, n.3, p. 287-290, December 1994.

327 DWORKIN, Ronald. Reply to Paul Ricoeur. Ratio Juris, Bologna, v.7, n.3, p. 287-290, December 1994.

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questionou se o positivismo jurídico ou o direito natural oferece um melhor entendimento a

natureza essencial do direito.328

Com este enfoque Dworkin329 instiga que questões jurisprudenciais sejam vistas como

questões morais quanto a quando, quão longe e por qual razão decisões impositivas e

coletivas e convenções especializadas deveriam dar a última palavra em nossas vidas. Por

isso, ele explica que não se teria dúvida que a justiça tem um papel importante em fixar o que

o direito é; e desta forma se deveria concentrar em especificar que papel que é este.

Quanto ao pragmatismo e o direito Dworkin330 explica que os pragmáticos são pessoas

práticas, mais interessadas em conseqüências reais de determinadas políticas e decisões

jurídicas do que em teoria abstrata. Para os pragmáticos os filósofos estão tentando uma nova,

diferente e metafísica realidade muito além do ordinário o que tornaria o nível do discurso

filosófico e sobrenatural. Mas Dworkin331 rebate dizendo que sua tese sobre respostas certas

em casos complexos (hard cases) é um assunto jurídico muito fraco e de senso comum, ou

seja, uma questão feita dentro da prática jurídica muito mais do que em um nível

supostamente distante, externo e filosófico. O modo mais natural de apoiar uma exigência

jurídica seria tentar mostrar qual seria a resposta correta em um determinado caso complexo.

Para Dworkin os pragmáticos inventam seus oponentes através de bizarras transformações

metafóricas de discursos ordinários, e então defendem aquela ação insistindo que estes

supostos oponentes não estariam conversando em um modo ordinário, mas sim tentando

ocupar algum nível especial e externo do discurso que o pragmático não conseguiria

descrever, mas insistiria que estivesse ali de qualquer maneira. Alguns pragmáticos supõem

que uma prática interpretativa não pode ser tímida e reflexiva, o que faz a prática

interpretativa parecer sem reflexão e automática. Os pragmáticos entendem que juízes pensam

dentro de uma prática e insistem que eles deveriam pensar com uma prática.332

328 ALEXY, Robert. Sistema jurídico, princípios jurídicos y razón práctica. IV Jornada Internacionales de

Lógica e Informática Jurídicas, San Sebastián, p. 139-151, Sep. 1988.

329 ALEXY, Robert. Sistema jurídico, princípios jurídicos y razón práctica. IV Jornada Internacionales de Lógica e Informática Jurídicas, San Sebastián, p. 139-151, Sep. 1988.

330 ALEXY, Robert. Sistema jurídico, princípios jurídicos y razón práctica. IV Jornada Internacionales de Lógica e Informática Jurídicas, San Sebastián, p. 139-151, Sep. 1988.

331 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução de Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

332 DWORKIN, Ronald. Justice in robes. Cambridge/ London: Harvard University, 2006.

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To think within a practice is to have one’s very perception and sense of possible and appropriate action issue “naturally” – without further reflection – from within one’s position as a deeply situated agent… To think with a practice – by self-consciously wielding some extrapolated model of its working – is to be ever calculating just what one’s obligations are, what procedures are “really” legitimate, what evidence is in fact evidence, and so on. It is to be a theoretician.333

O autor, entretanto, entende que na prática não exista diferença em pensar dentro de

uma prática ou com ela, e acredita que um bom juiz perceberá naturalmente que seu trabalho

exige que ele esteja atento e seja auto-crítico para se dar conta de quais são suas obrigações

reais, identificar as evidências e provas e assim por diante. O que não significa que eles façam

teoria o tempo todo, mas sim que eles reconhecem o caráter argumentativo até mesmo sob as

óticas que tem sem refletir muito e entendem que até mesmo estes pontos de vista são

vulneráveis a desafio teórico que eles devem satisfazer da maneira mais razoável possível.334

O autor também explica o papel da teoria no raciocínio e na prática jurídica. Uma visão

incrustada da teoria que o autor tenta explicar é uma causa do raciocínio jurídico de como se

argumenta propriamente quanto ao significado do que é o direito. E também é uma causa do

que a verdade consiste em tais questões. Para Dworkin o raciocínio jurídico significa

disseminar determinados problemas jurídicos distintos, uma ampla rede de princípios de

origem jurídica ou moralidade política. Na prática, para se pensar em respostas corretas

quanto a questões de direito deve-se operar através de um vasto sistema teórico de princípios

complexos sobre a natureza de alguns direitos e princípios. Dworkin acredita que uma decisão

judicial é uma ocasião política, e assim, advogados, juízes e todos os envolvidos deveriam

direcionar suas atenções para problemas práticos imediatos colocados por qualquer ocasião

política. Não é automaticamente um argumento sobre as responsabilidades de juízes em casos

comuns ou até mesmo casos constitucionais. O autor quer dizer que o direito é envolto em

teoria, mesmo que advogados que reflitam não concordem sobre em qual teoria ele esteja.

Mais do que isso, Dworkin esclarece que a prática jurídica possui princípios embutidos nela, o

que quer dizer que os princípios que servem de base as ações também oferecem a melhor

justificação na prática jurídica geral na área doutrinária na qual o caso surge.335

333 DWORKIN, Ronald. Justice in robes. Cambridge/ London: Harvard University, 2006. p. 47.

334 Pode-se verificar isto quando Dworkin analisa um caso concreto, ver em: DWORKIN, Ronald. Taking rights seriously in the abortion case. Ratio Juris, Bologna, v.3, n.1, p.68-80, March 1990.

335 DWORKIN, Ronald. Justice in robes. Cambridge/ London: Harvard University, 2006. p. 52.

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It is perfectly intelligible to insist that our judges should not be charged with final and authoritative interpretation of the Constitution. If you fear too great judicial power, that is what you should say. It is a serious confusion to disguise your dislike of judges having great power, which can be remedied, in theory, by changing their jurisdictional power, as a false theory of legal reasoning.336

O autor também traz algumas teorias as quais usam argumentos que autores têm contra

o uso da teoria moral ou abstrata na argumentação legal, para tanto Dworkin fala em algumas

objeções a abordagem incrustada de teoria: metafísica, pragmática e profissional. Dworkin

afirma que a forma do relativismo filosófico, que agora é popular fora da filosofia acadêmica,

é que a verdade sobre a moral política em geral e em particular é criada por nossas práticas, e

que não há verdade sobre estas questões que seja independente de uma cultura ou língua

específicas. Para este autor se defronta hoje em dia com uma revolta contra teoria. Dworkin

concorda que nem todos os juízes entendem de filosofia. Mas se deve fazer com que eles

enfrentem tais questões.

[...] So my last words hope to remind you of why integrity is so important. Every contemporary democracy is a divided nation, and our own democracy is particularly divided. We are divided culturally, ethnically, politically, and morally. We nevertheless aspire to live together as equals, and it seems absolutely crucial to that ambition that we also aspire that the principles under which we are governed treat us as equals.337

Para ele a integridade338 é muito importante e reforça que se deve garantir que deveres

soberanos se nós exigimos uma regra do direito que não seja apenas um instrumento para

conquistas econômicas e paz social, mas sejam um emblema e espelho de relação pública

igual que dê direito a se reivindicar por uma identidade.339

336 DWORKIN, Ronald. Justice in robes. Cambridge/ London: Harvard University, 2006. p. 57.

337 DWORKIN, Ronald. Justice in robes. Cambridge/ London: Harvard University, 2006. p. 73.

338 Dworkin comenta que a virtude do direito constitucional é a integridade: “The first, essential virtue of constitutional law is integrity: the law must allow all citizens the benefit of whatever constitutional principles protect some of them. That is what equal citizenship means and demands. Lower courts must sometimes respect superior court decisions that they cannot overrule but that have been isolated by intervening doctrine and should therefore be interpreted narrowly. But for the Supreme Court stare decisis—respect for precedent—means something deeper and more important. It means respect not for the narrow holding of earlier cases, one by one, but for the principles that justify those decisions.”. DWORKIN, Ronald. The supreme court Phalanx. V. 54, n. 14, September 2007. Disponível em: <http://www.nybooks.com/articles/20570>. Acesso em: out. 2007.

339 HENLEY, Kenneth. Protestant Hermeneutics and the rule of law: Gadamer and Dworkin. Ratio Juris. Bologna, v. 3, n. 1, p. 14-28, March 1990.

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Dworkin340 também se refere a argumentos de Richard Posner sobre a teoria da moral,

porque conforme o autor os argumentos de Posner341 ilustram um objeto filosófico

importante, porque apesar dele querer mostrar que pessoas comuns e juízes podem prescindir

de teoria moral, seus próprios argumentos voltam a tal teoria. Este autor falha em ver a sua

contradição porque falha em reconhecer a diferença crucial entre moral filosófica e moral

sociológica, antropológica, e psicológica. Para Dworkin os juízes não precisam escolher entre

pesar conseqüências em um modo pessoal e ignorar conseqüências completamente. Pois,

ninguém supõe que juízes poderiam ou deveriam decidir casos por um algoritmo com o

objetivo de levá-los por um processo lógico ou formal a uma decisão correta, utilizando

somente materiais canônicos da tomada de decisões judiciais, tais como estatutos ou textos

constitucionais e opiniões judiciais prévias. Sua opinião é que juízes deveriam levar em

consideração as conseqüências de suas decisões, mas eles poderiam somente fazê-lo dirigidos

por princípios envoltos no direito como um todo, princípios que julgariam que conseqüências

fossem relevantes e como estas deveriam ser pesadas, mais do que por suas próprias

preferências políticas ou pessoais.342

I should add – though I hope it goes without saying – that judges need not choose between weighing consequences in that personal way and ignoring consequences completely. No one supposes that judges could or should decide cases “by an algorithm intended to lead [them] by a logical or otherwise formal process to the One Correct Decision, utilizing only the canonical materials of judicial decision making, such as statutory or constitutional text and previous judicial opinions.” That account of adjudication is a straw man and always was. Of course judges must take the consequences of their decisions into account, but they may only do so as directed by principles embedded in the law as a whole, principles that adjudicate which consequences are relevant and how these should be weighed, rather than by their own political or personal preferences.343

Dworkin traz a tona o pluralismo moral para explicar e embasar sua tese sobre o juiz

Hércules e a resposta correta, para tanto, o autor fala sobre os argumentos de Isaiah Berlin,

que trata sobre valores e a colisão de valores. Os valores citados são liberdade, igualdade.

Para o autor o argumento necessário para defender o pluralismo deve ser longo e complexo, e

deve demonstrar, no caso de cada valor que leva em consideração, estar de algum modo em 340 DWORKIN, Ronald. Justice in robes. Cambridge/ London: Harvard University, 2006. cap. 3.

341 Os argumentos deste autor podem ser vistos também no artigo a seguir no qual ele analisa o caso concreto de Monica Lewinsky e Bill Clinton e depois Dworkin responde às críticas e análises. Ver: POSNER, R; DWORKIN, R. ‘An affair of state’: an exchange. V. 47, n. 7, april 2000. Disponível em: <http://www.nybooks.com/articles/135>. Acesso em: out. 2007.

342 DWORKIN, Ronald. Justice in robes. Cambridge/ London: Harvard University, 2006. cap. 3.

343 DWORKIN, Ronald. Justice in robes. Cambridge/ London: Harvard University, 2006. p. 104.

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conflito um com o outro, e porque o entendimento daquele valor que produz o conflito é o

mais adequado. Nada é mais fácil do que compor definições de liberdade, igualdade,

democracia, comunidade, e justiça que conflitem uma com a outra. Mas nada é mais duro, em

filosofia, do que demonstrar porque estas são definições que deveriam ser aceitas. Dworkin

acredita que isto não pode ser demonstrado por um atalho. Talvez, os conceitos mais atrativos

de principais valores liberais que ficariam juntos no modo correto, pelo menos é esta a

esperança do autor.344

O autor se utiliza de casos para ilustrar o tema da originalidade e da fidelidade. E

começa distinguindo o que ele entende por fidelidade ao texto constitucional e fidelidade à

prática constitucional passada, o que incluiria interpretação de decisões judiciais passadas e

aplicação da constituição. Para o autor fidelidade ao texto constitucional não esgota a

interpretação constitucional, e em algumas ocasiões a integridade constitucional pode exigir

um resultado que não poderia ser justificado, ou poderia até contradizer a melhor

interpretação do texto constitucional, se considerado sem levar em conta a história de sua

execução. Para o autor o pragmatismo legal sustenta que decisões judiciais deveriam ser

pequenas, cuidadosas e experimentais.

If the correct interpretation is the dated one, these questions would be out of place, at least as part of an exercise in textual fidelity, because the only questions a dated understanding would pose is the question of what the framers or their audience thought.345

Dworkin traz estes exemplos para mostrar sua opinião de que julgamentos morais

exigidos para se aplicar princípios morais abstratos da constituição são constringidos pela

história e precedentes, que por causa de comandos de integridade legal, não são adquiridos

por esta história.

I have already insisted that we must look to the author’s semantic intentions to discover what the clauses of the Constitution mean. […] In fact, however, taking that further step is a serious intellectual confusion and constitutional mistake. It is a fallacy to infer from the fact that the semantic intentions of historical statesmen inevitably fix what the document they made says that keeping faith with what they said means enforcing the document as they hoped or expected or assumed it would be enforced.346

344 DWORKIN, Ronald. Justice in robes. Cambridge/ London: Harvard University, 2006. cap. 4.

345 DWORKIN, Ronald. Justice in robes. Cambridge/ London: Harvard University, 2006. p. 121.

346 DWORKIN, Ronald. Justice in robes. Cambridge/ London: Harvard University, 2006. p. 124.

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Para Dworkin a contribuição mais fundamental para a moralidade política dos Estados

Unidos é a grande idéia triangular de que a democracia é uma parceria de auto governo, e que

a parceria é estruturada e tornada possível por uma constituição moral garantindo aos

indivíduos os pré-requisitos para se tornarem membros, e por fim que todos estejam

comprometidos com sua história a uma estratégia institucional pedindo a juízes que reforcem

as garantias de uma cidadania igualitária.347

O autor em seu raciocínio sobre o juiz Hércules e sua teoria também traz a crítica de

Hart a teoria deste autor sobre filosofia política, Dworkin argumentava que uma teoria geral

sobre como um direito válido deve ser identificado, como a própria teoria de Hart, não é uma

descrição neutra da prática legal, mas uma interpretação dela que tem como objetivo não só

descrevê-la, mas justificá-la – para mostrar por que a prática é valiosa e como deveria ser

conduzida para proteger e acentuar tal valor. Assim, uma teoria moral permaneceria em

convicções e julgamentos éticos e morais. Hart insiste que Dworkin estava errado em dizer

como juízes deveriam decidir casos difíceis no direito, pois sua opinião era de cunho moral e

comprometida, porque estava criticando e avaliando suas atividades.348

I have been emphasizing similarities between the concept of legality – as a foundation for legal philosophy – and other political concepts, and I shall close by noting an important difference. Legality is sensitive in its application, to a far greater degree than is liberty, equality, or democracy, to the history and standing practices of the community that aims to respect the value, because a political community displays legality, among other requirements, by keeping faith in certain ways with its past.349

Dworkin acredita que é necessário empregar e defender um conceito de legalidade

porque sem isso não se pode identificar a correção para decidir o que é o direito. A

jurisprudência se tornaria um exercício de moralidade política substantivo. Para se fazer uma

boa análise da legalidade ela deve ter relação com a prática analisando-se os valores

compartilhados. Dworkin critica o positivismo e sempre defendeu que o positivismo não era

fidedigno as práticas atuais de cidadãos, advogados, e juízes em comunidades políticas

complexas, ou seja, para ele pessoas que discutem sobre o conteúdo da lei são levadas por

considerações morais em um modo que o positivismo não pode explicar.350

347 DWORKIN, Ronald. Justice in robes. Cambridge/ London: Harvard University, 2006. cap. 5.

348 DWORKIN, Ronald. Justice in robes. Cambridge/ London: Harvard University, 2006. cap. 6.

349 DWORKIN, Ronald. Justice in robes. Cambridge/ London: Harvard University, 2006. p. 183.

350 DWORKIN, Ronald. Justice in robes. Cambridge/ London: Harvard University, 2006. cap. 7.

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Dworkin enfatiza a importância em distinguir entre os diferentes conceitos que as

pessoas usam para falar sobre direito: o conceito doutrinário, o conceito sociológico; o

conceito taxonômico; e o conceito aspiracional. Para o autor os conceitos servem para

diferentes tipos de função no pensamento e discurso de pessoas que os compartilham e os

usam. O autor também fala de problemas que acontecem quando filósofos do direito não

distinguem suficientemente conceitos do direito.351

[...] We must develop appropriate conceptions of equal concern and respect. But when we do, we must take into account that one dimension of an appropriate procedure is consequentialist in the broad sense: We must design procedures that, among other things, promote substantive justice. That assumption provides the best defense of constitutionalism, but I cannot begin upon that large claim now.352

Ou seja, para Dworkin devem ser estabelecidas e desenvolvidas concepções de igual

preocupação e respeito, desenvolvendo procedimentos adequados para obter uma justiça

substancial, que defenda corretamente o constitucionalismo.

[...] that the moral principles that judges often cite to justify their legal decisions [...] are also legal principles and that taxonomic positivists are therefore wrong to separate legal from moral principles in the way they do. […] My point was not that ‘the law’ contains a fixed number of standards some of which are rules and others principles. Indeed, I want to oppose the idea that ‘the law’ is a fixed set of standards of any sort. My point was rather that an accurate summary of the considerations lawyers must take into account, in deciding a particular issue of legal rights and duties, would include propositions having the form and force of principles, and that judges and lawyers themselves, when justifying their conclusions, often use propositions which must be understood in this way.353

Portanto, com toda esta discussão sobre conceitos, Dworkin quer dizer que valores

morais são levados em consideração e usados como justificação e embasamento para decisões

judiciais. Sua idéia é se opor a polêmica de que o direito seria um conjunto de padrões

estabelecidos de qualquer tipo, e trazer algumas considerações que deveriam ser levadas em

conta pelos operadores do direito. Ou seja, Dworkin não quis apenas dizer que o direito

possui regras e princípios.

351 DWORKIN, Ronald. Justice in robes. Cambridge/ London: Harvard University, 2006. cap. 8. e Law’s empire

352 DWORKIN, Ronald. Reply to Paul Ricoeur. Ratio Juris, Bologna, v.7, n.3, p. 287-290, December 1994. p. 289.

353 DWORKIN, Ronald. Justice in robes. Cambridge/ London: Harvard University, 2006. p. 234.

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Assim, verificando os argumentos dos dois críticos de Alexy se percebe que entre eles

não há uma homogeneidade em relação às críticas, enquanto Habermas entende que a

ponderação de princípios traz consigo interpretações falsas e deixa questões não esclarecidas;

Dworkin fala na fundamentação de decisões através de princípios, entretanto não esclarece

muito bem como seria feita a escolha entre um ou outro princípio. Habermas defende o uso da

teoria do discurso com a teoria da aplicação para se encontrar uma melhor solução para casos

concretos e Dworkin o uso de uma interpretação construtiva que leve a uma resposta correta

para cada caso, mantendo a integridade do texto constitucional bem como de seus princípios.

Percebe-se que, assim, Habermas e Dworkin possuem uma visão diversa sobre os

valores morais que um tribunal pode usar e como acontece a ponderação de princípios. Para

Habermas isto tornaria o tribunal autoritário e as decisões acabariam sendo relativizadas pela

cultura de uma comunidade, o que tornariam as decisões mais incertas. Para Dworkin é

possível a utilização de valores nas decisões – levando em conta as conseqüências das

mesmas e usando princípios.

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3 DIMENSÕES APLICATIVAS DA TEORIA DOS DIREITOS FUND AMENTAIS DE

ROBERT ALEXY NO ÂMBITO DO DIREITO À SAÚDE: ESTUDOS DE CASOS

JURISPRUDENCIAIS NO BRASIL

Neste contexto e depois de verificadas a teoria dos direitos fundamentais de Alexy e

suas críticas, neste terceiro e último capítulo são analisados casos pertinentes em relação ao

direito fundamental à saúde no Supremo Tribunal Federal e no Tribunal de Justiça do Rio

Grande do Sul. São analisados casos que digam respeito ao direito à saúde, como forma

exemplificativa, uma vez que não se exauri a questão. Os casos dizem respeito ao tema de

fornecimento de medicamentos e/ ou tratamento médico às pessoas que ingressam na justiça

para ter este direito à saúde atendido. Neste caso a implementação de políticas públicas pelo

judiciário está ligado a linha de pesquisa de políticas públicas.

Antes de se começar a análise dos casos, faz-se necessário lembrar o que são políticas

públicas. Pode-se dizer que políticas públicas são respostas do Estado às demandas vindas da

sociedade, e que são um compromisso público de atuação em determinada área, em longo

prazo.354

Dworkin define política como:

[...] aquele tipo de padrão que estabelece um objetivo a ser alcançado, em geral em melhoria em algum aspecto econômico, político ou social da comunidade (ainda que certos objetivos sejam negativos pelo fato de estipularem que algum estado atual deve ser protegido contra mudanças adversas).355

Pode-se afirmar que o desenvolvimento de um país vai depender de sua capacidade estratégica e administrativa para implementar políticas que ajudem no desenvolvimento da plena convivência social, política e econômica dos diversos atores que participam na formação de um Estado, ou seja, cidadãos, instituições, organizações e autoridades. Percebe-se, deste modo, que políticas públicas são a parte de execução e implementação de leis existentes.

Em termos conceituais mais gerais e absolutamente modernos, tenho que se possa definir uma política pública como ação estratégica (de instituições ou pessoas de direito público) que visa atingir fins previamente determinados por finalidades,

354 CUNHA, E.; CUNHA, E. Políticas públicas sociais. In: CARVALHO, A. et al. Políticas públicas. Belo

Horizonte: UFMG-PROEX, 2002, p. 11 - 25, passim.

355 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução e notas de Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 36.

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objetivos e princípios de natureza pública. Tal ação, inexoravelmente, vem marcada por altos níveis de racionalidade programática, caracterizada por medidas organizacionais e de planejamento.356,357

De qualquer modo, o tema das políticas públicas no Brasil parece passar despercebido

pelo menos para grande parte da população. De um lado, porque o próprio Estado nacional

não teve, ao longo de sua história, uma preocupação muito real com estas questões; e por

outro, porque a sociedade civil sempre ficou à margem destes assuntos, tidos como de

competência única das instituições estatais. O Estado Administrador brasileiro tem agido nos

últimos 50 anos como se tivesse domínio absoluto e exclusivo sobre os interesses públicos,

uma vez que institucionalizou as ações para definir e atender os interesses públicos. Tal

comportamento fez com que a sociedade civil ficasse limitada a passividade. Sem haver

interatividade entre poder público e sociedade civil a administração teve dificuldades em

formular mecanismos que atendessem às demandas sociais. O que se percebe é que o Estado

agia muito mais com ações curativas do que com ações preventivas.358,359

Foi a partir dos anos 80 que houve uma maior mobilização da sociedade civil, como

conseqüência foi editada a Carta Constitucional de 1988. Ocorreu de forma gradual uma certa

politização do social fazendo com que a separação entre o público e o privado ficasse cada

vez mais tênue. A conseqüência disto foi a mudança da mobilização e participação políticas,

que antes se davam a partir do Estado e que agora se inseriam também à partir da

sociedade.360 Desta forma, a análise de políticas públicas não se refere somente às políticas

geradas pelo Estado, mas também às políticas geradas por determinadas instituições não

estatais. Ou seja, o tema políticas públicas passa a ser um assunto multidisciplinar que se

refere à organização, planejamento, execução e avaliação constante de ações direcionadas ao

356 LEAL, Rogério G. O controle jurisdicional de políticas públicas no Brasil: possibilidades materiais. Revista

de derecho, v.9, p.53-66, 2006. p.58.

357 Neste sentido vai o texto de BOHMAN, James. Public Deliberation: Pluralism, Complexity and Democracy. Cambridge: MIT Press, 1996, pg.71 e seguintes.

358 LEAL, Rogério G. O controle jurisdicional de políticas públicas no Brasil: possibilidades materiais. Revista de derecho, v.9, p.53-66, 2006. e BUCCI, Maria Paula Dallari. Direito Administrativo e Políticas Públicas. São Paulo: Saraiva, 2002.

359 LIMA Jr., Olavo B. de; SANTOS, Wanderley G., Esquema geral para a análise de políticas públicas: uma proposta preliminar. Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas, v.10, n.2, p.241-256, abr/jun. 1976.

360 KLIKSBERG, Bernardo. Social Management: some strategic issues. New York: United Nations, 1998.

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atendimento das demandas sociais, sendo elas realizadas pelo Estado, por particulares ou pelo

próprio mercado.361,362

A Constituição traz em seu corpo, princípios, objetivos e finalidades da República que

vinculam tanto o Estado como a sociedade civil, ao menos em termos delimitadores do que se

pode chamar de mínimo existencial, ou seja: a soberania, a cidadania e a dignidade da pessoa

humana. A partir destes padrões o mínimo existencial toma configurações constitucionais, e a

dignidade da pessoa humana passa a configurar os princípios constitucionais estando explícito

ou implícito nos direitos e garantias individuais e coletivos, os direitos sociais e tantos

outros.363,364

Na verdade, é a própria compreensão de Constituição que se vê alterada aqui, ao menos em termos da historicidade brasileira, haja vista que passa a se outorgar a ela muito mais que um significado meramente dogmático-formal de norma posta, reconhecendo-a como pacto político-social instituidor da civilidade e das condições de sociabilidade e desenvolvimento das relações sociais, a partir de determinados postulados/premissas necessariamente vinculantes.365

Ou seja, a Constituição passa a ser um pacto político-social que estabelece as condições

para que a sociedade desenvolva as relações sociais. A constituição deixa de cuidar somente

da organização do Estado para também cuidar de determinadas matérias que vinculam as

relações da própria sociedade civil.366 No dia-a-dia os Poderes Estatais incitados a instituir

mecanismos que mantenham a civilidade e possam evitar ou minimizar a desobediência civil,

isto é feito através de projetos de leis; medidas judiciais compensatórias; ações

361 LEAL, Rogério G. O controle jurisdicional de políticas públicas no Brasil: possibilidades materiais. Revista

de derecho, v.9, p.53-66, 2006.

362 Para uma perspectiva mais ampliada da discussão: MORAND, Charles-Albert. Le Droit neo-moderne des politiques publiques. Paris: LGDJ, 2001; MARTINS, Ana Luiza. República: um outro olhar. São Paulo: Contexto, 1992; MOISÉS, José Alvaro. Cidade, povo e poder. Rio de Janeiro: Centro de Estudos de Cultura Contemporânea/Paz e Terra, 1982; MOURÃO, Cezar Roberto. A República e as repúblicas. São Paulo: Civilização Brasileira, 1972.

363 LEAL, Rogério Gesta. Perspectivas Hermenêuticas dos Direitos Humanos e Fundamentais no Brasil. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001; ___. Teoria do Estado: cidadania e poder político na modernidade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003.

364 SARLET, Ingo. O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002.

365 LEAL, Rogério G. O controle jurisdicional de políticas públicas no Brasil: possibilidades materiais. Revista de derecho, v.9, p.53-66, 2006. p.64.

366 A este respeito ver os textos: XESTA, Fernando y VAZQUEZ, Ernesto. La Orden Civil de la Republica. Ciudadania y distincion en el Estado Igualitario. Madrid: Civitas, 2001, p.92; ENTERRÍA, Eduardo García de. Democracia, Jueces y Control de la Administración. Madrid: Civitas, 2001.

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administrativas com foco na conseqüência ao invés de foco na causa; ou seja, medidas que

ajudam a gerir o caos no qual a cidadania se encontra.367

A Constituição traz consigo diretrizes para a garantia deste mínimo existencial por ela

mesmo estabelecido. Tais diretrizes se referem, em suma, à construção de uma Sociedade

livre, justa e solidária; à garantia do desenvolvimento nacional; à erradicação da pobreza e da

marginalização; à redução de desigualdades sociais e regionais; à promoção do bem de todos,

sem preconceito de qualquer natureza. O que pode ser garantido através do estabelecido ao

longo de todo o texto constitucional. E as políticas públicas, desta forma, tem o objetivo de

intermediar o sistema jurídico constitucional e o que se pretende instituir no país.368

Para cada garantia constitucional é preciso haver políticas públicas que as possam

concretizar. E quando não ocorrem tais políticas públicas o poder judiciário é acionado. Todas

as competências demandam, obrigatoriamente, ações estratégicas de todas as entidades

federativas, abrangendo um leque enorme de responsabilidades e campos de demandas.

Quando inexistentes tais políticas de atendimento, há interesse legítimo constitucional a ser

acionado às suas defesas. As garantias constitucionais dizem respeito – direta ou

indiretamente – à dignidade da pessoa humana e ao mínimo existencial já referido (saúde,

educação, moradia, pobreza).369

Não é da tradição do Estado Moderno e Contemporâneo ter o Poder Judiciário a incumbência de formular e implementar políticas públicas de outras esferas de Poder (como as legislativas e executivas), todavia, tal incumbência, embora em bases excepcionais, poderá atribuir-se ao Poder Judiciário, se e quando os órgãos estatais competentes, por descumprirem os encargos político-jurídicos que sobre eles incidem, vierem a comprometer, com tal comportamento, a eficácia e a integridade de direitos individuais e/ou coletivos impregnados de estatura constitucional, ainda que derivados de cláusulas revestidas de conteúdo programático.370

367 LEAL, Rogério G. O controle jurisdicional de políticas públicas no Brasil: possibilidades materiais. Revista

de derecho, v.9, p.53-66, 2006. Para refletir sobre as incoerências da operacionalidade do sistema capitalista, em economias demasiadamente dependentes, ver: UNGER, Roberto Mangabeira. Democracy Realized. New York: Verso. 1998.

368 LEAL, Rogério G. O controle jurisdicional de políticas públicas no Brasil: possibilidades materiais. Revista de derecho, v.9, p.53-66, 2006.

369 LEAL, Rogério G. O controle jurisdicional de políticas públicas no Brasil: possibilidades materiais. Revista de derecho, v.9, p.53-66, 2006.

370 BRASIL. Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental nº45, de 29/04/2004, rel. Min. Celso de Mello. Distrito Federal. Arguinte: PSDB; Argüido: Presidente da República, pg.02. Disponível em: <www.stf.gov.br/dj/>. Acesso em: out. 2007.

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O que tem se formado em alguns países mais desenvolvidos economicamente que o

Brasil são concepções reducionistas dos limites, cujos fundamentos têm razões de justificação

bastante fundamentadas, dentre as quais a norte-americana, quando assevera (por uma parte

de seus juristas, politólogos e sociólogos) que a intervenção do Poder Judiciário na vida

cotidiana da cidadania e dos Poderes Executivo e Legislativo, não pode descurar da

legitimidade matricial que identifica as ações destas instituições, oriundas de processos

normativos e eletivos democráticos, bem como de competências constitucionalmente

outorgadas pelos constitutional father- fundations.371

Há quem diga372 que a Constituição de 1988 no Brasil outorgou aos objetivos,

finalidades e direitos e garantias fundamentais eleitas à verdadeira condição de título

executivo extrajudicial de obrigação infungível de fazer do Estado em prol da comunidade. E

assim, o Estado deve, como espaço jurídico da processualidade, acolher na sua essência a

efetividade destes direitos líquidos, certos e exigíveis, e, se for preciso, pelo princípio da

substituibilidade judicial, o judiciário fazê-lo, mediante a aplicação de tutelas legais em

modalidades decisórias mandamentais, executivas (inibitórias) e supletivas (de

adimplemento).

Frente a isto, é crível que se reconheça a todos os Poderes instituídos, inclusive ao

Judiciário373, a competência e o dever institucional de se comprometerem com efetivação das

políticas públicas, protegendo quem efetivamente detém em última instância a soberania do

poder (o povo), não por desvio ou excesso ideológico de crença política, mas pautado pela

371 Como quer por exemplo ELY, John Ely. Democracy and Distrust. 13 reimp. Massachusetts: Harvard

University Press, 2001. Para este autor – e vários seguidores - Judicial review is necessary to safeguard minority rights, but democracy is the principle around which this nation's government was formed. p.16. Mais tarde, alerta o autor que […] we can reason about moral issues, but reasoning about ethical issues is not the same as discovering absolute ethical truth. So we’re where we were: our society does not, rightly does not, accept the notion of a discoverable and objectively valid set of moral principles, at least not a set that could plausibly serve to overturn the decision of our elected representatives. p.54.

372 LEAL, Rosemiro Pereira. Teoria Processual da Decisão Jurídica. São Paulo: Landy, 2002.

373 O autor Mauro Cappelletti fala o poder dos juízes e esta nova perspectiva da atuação dos mesmos: CAPPELLETTI, Mauro. Les pouvoir des juges: article choisis de droit judiciaire et constitutionnel compare. Paris: Econimica, 1990. Traduction per René David. « L’activité des juges doit prendre un aspect nouveau dans sa manière d’interpréter les lois, en vue de donner un contenu concret à la législation et aux droits sociaux. Une évaluation est déjà perceptible à ce sujet. On continue bien à dire qu’entre le rôle traditionnel des juges et celui qui leur est è présent demandé il n’y a qu’une différence de degré et non de substance : il est vrai en effet, comme nous l’avons déjà dir, que toute interprétation est, dans une certaine mesure création, un minimum de pouvoir discrétionnaire étant inévitable toujours dans l’activité du juge. » p. 45.

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obrigação de garantir a ordem republicana e democrática de desenvolvimento do Brasil, sob

pena de agravar ainda mais suas crises de identidade, eficácia e legitimidade social.374

Diante disto, pode-se dizer que questões judiciais sobre a saúde trazem incutidas nelas o

tema de políticas públicas, neste caso específico, são verificadas decisões que dizem respeito

à concessão de medicamentos e tratamentos de saúde pelo poder judiciário, e por esta razão se

entra no tema da judicialização das políticas públicas. Por judicialização da política375 pode-se

entender a utilização de procedimentos judiciais para a resolução de conflitos de ordem

política, tais como controvérsias a respeito de normas, resoluções e políticas públicas em

geral, adotadas/implementadas pelos Poderes Executivo e Legislativo.376 Como já

mencionado, há quem defenda a busca da eficácia de políticas públicas através do judiciário,

ou da judicialização da política.

A judicialização da política também pode estar centrada na interpretação da

Constituição, ou seja, no controle da Constituição exercido tanto pelo STF, na sua forma

concentrada, quanto no controle exercido pelos tribunais estaduais, na sua forma difusa. Desta

maneira o judiciário seria uma instância de implementação de direitos sociais e coletivos, e

isto ocorreria devido a perda da capacidade de promoção do bem estar social que o Estado

teve a partir do momento que adotou uma ideologia neoliberal. De certa forma isto ocorre

devido às diversas assertivas, tais como: a crise dos meios tradicionais de representação

política e a revalorização da sociedade civil; a globalização e seus efeitos sobre a produção e

implementação do Direito em suas diversas áreas; e o agravamento de problemas que colocam

em risco as instituições e a esfera pública de um modo geral (como a corrupção e o crime

organizado).377

O Poder Judiciário, ao interpretar a Constituição e declarar a constitucionalidade das

leis e atos normativos, interfere em decisões políticas que foram alcançadas por representantes 374 LEAL, Rogério G. O controle jurisdicional de políticas públicas no Brasil: possibilidades materiais. Revista

de derecho, v.9, p.53-66, 2006.

375 Sobre este tema ver também: VIANNA, Luiz Werneck et al. A judicialização da política e das relações sociais no Brasil. Rio de Janeiro: Revan, 1999.

376 OLIVEIRA, Vanessa E. de. Judiciário e privatizações no Brasil: Existe uma judicialização da política? Revista de Ciências Sociais, rio de Janeiro, v. 48, n. 3, p. 559-587, 2005

377 ARANTES, Rogério. Judiciário: entre a justiça e a política. In AVELAR, Lúcia; CINTRA, Antônio Octávio (organizadores). Sistema Político Brasileiro: uma introdução. Rio de janeiro/ São Paulo: Fundação Konrad Adenauer/ Unesp, Cap. 3, p. 79-108, 2004.

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eleitos. Todavia, isso não implica – ou ao menos não deveria implicar – que os juízes têm o

poder de legislar, podendo-se traduzir em criação de leis a sua função de intérpretes da

Constituição. Entretanto, não se pode dizer que há uma melhora da eficácia das políticas

públicas devido a judicialização da política, tendo em vista que quando acontece o controle

difuso, ou seja, de um caso específico pelos tribunais estaduais, somente a pessoa que entrou

com a ação é favorecida.378 Esta não é a melhor forma de implementação de políticas

públicas, pois acaba impondo ao cidadão, que precisa da política, que entre no judiciário e

demande pela política pública. E por causa do grande número de demandas frente ao

judiciário para que o mesmo implemente as políticas públicas não implementadas pelo

executivo é que o judiciário está abarrotado de processos causando morosidade para todos379.

Alguns autores380 entendem que significado da judicialização da política para a eficácia

das políticas públicas seria a democracia e a expansão do judiciário, entretanto, muitas vezes

parece mais uma incapacidade do executivo e legislativo em implementarem as políticas

públicas necessárias ao bem estar da população. Desta forma, a judicialização da política não

é a melhor forma de consolidação da democracia, pois implementa políticas para uns em

detrimento de outros. O melhor seria a implementação de uma democracia participativa, não

através do judiciário, mas através de conselhos municipais que possibilitassem a participação

de cidadãos para implementação de políticas públicas necessárias a comunidade como um

todo e não somente a determinadas pessoas que entram com ações no judiciário381.

378 ARANTES, Rogério. Judiciário: entre a justiça e a política. In AVELAR, Lúcia; CINTRA, Antônio Octávio

(organizadores). Sistema Político Brasileiro: uma introdução. Rio de janeiro/ São Paulo: Fundação Konrad Adenauer/ Unesp, Cap. 3, p. 79-108, 2004.

379 E relação a implementação de direitos sociais pelo judiciário ver o livro: DEMOCRATIZAÇÃO do Poder Judiciário brasileiro: ato público. Porto Alegre: AJURIS, 2002.

380 CARVALHO, Ernani R. de, A judicialização da política no Brasil: Apontamentos para uma nova abordagem. In: 4º. Encontro Nacional da ABCP – Painel 1 – Direitos, Justiça e Controle, 21 – 24 julho 2004, PUC – Rio de Janeiro.; FREY, Klaus, Políticas públicas: um debate conceitual e reflexões referentes à prática da análise de políticas públicas no Brasil. In: Planejamento e políticas públicas, n 21, p. 211-259, jun 2000.; FARAH, Maria F. S.. Parcerias, novos arranjos institucionais e políticas públicas locais. Cadernos gestão pública e cidadania, v. 18, p. 3-31, abr 2000.

381 Em número cada vez maior de ações judiciais, nossos juízes vêm ordenando aos serviços públicos de saúde, em todos os níveis da Federação, que financiem tratamentos originariamente não contemplados na política de saúde elaborada pelas respectivas secretarias e Ministério da Saúde. Esses tratamentos muitas vezes são de elevadíssimo custo, disponíveis apenas no exterior e, freqüentemente, tão ou menos eficazes que os disponíveis no sistema público de saúde. Diante da escassez de recursos, a conseqüência dessa interpretação não é, ao contrário do que se poderia imaginar, a ampliação do acesso a serviços de saúde a camadas da população anteriormente excluídas. O resultado inevitável é, na verdade, uma substituição parcial das prioridades de investimento estabelecidas pelos especialistas em saúde pública do Poder Executivo. Ou seja, puxa-se o cobertor da saúde pública para aqueles que conseguiram acessar o Judiciário e se descobre parte

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O propósito desta dissertação não é verificar se esta é uma boa opção ou não de

implementar políticas públicas e sim verificar se é possível operacionalizar a teoria dos

direitos fundamentais de Alexy para a solução de casos concretos no Brasil. Neste sentido são

analisados casos específicos em relação ao direito à saúde, mais especificamente casos que

dizem respeito ao fornecimento de medicamentos e tratamento médico no STF e no TJ/RS, no

período de janeiro de 2000 a outubro de 2007.

3.1 Precedentes do Supremo Tribunal Federal

O Supremo Tribunal Federal382 é a corte máxima existente no Brasil, ou seja, é o órgão

de cúpula do Poder Judiciário, e a ele compete, a guarda da Constituição, conforme definido

no art. 102 da Constituição Federal de 1988. É um órgão composto por onze Ministros,

brasileiros natos383, escolhidos dentre cidadãos com mais de 35 e menos de 65 anos de idade,

de notável saber jurídico e reputação ilibada384, e nomeados pelo Presidente da República,

após aprovação da escolha pela maioria absoluta do Senado Federal. Dentre suas funções está

a indicação de um de seus Ministros para compor o Conselho Nacional de Justiça385 e três

para compor o Tribunal Superior Eleitoral386.387

Entre suas principais atribuições está a de julgar a ação direta de inconstitucionalidade

de lei ou ato normativo federal ou estadual, a ação declaratória de constitucionalidade de lei

ou ato normativo federal, a argüição de descumprimento de preceito fundamental decorrente

da própria Constituição e a extradição solicitada por Estado estrangeiro. Na área penal,

daqueles que a política estatal havia originariamente decidido contemplar. FERRAZ, Octávio Luiz Motta. Direito à saúde, escassez e o Judiciário. In Folha de São Paulo. 10/08/07.

382 Para detalhes históricos deste o início até 2001 ver: LAGO, Laurenio. Supremo Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal Dados biográficos (1828-2001). Brasília: Supremo Tribunal Federal, 2001. Ver também: DALLARI, Dalmo de Abreu. O poder dos juízes. 2 ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 112-120.

383 BRASIL. Constituição Federal 1988. art. 12 § 3º, IV.

384 BRASIL. Constituição Federal 1988. art. 101.

385 BRASIL. Constituição Federal 1988. art. 103-B, I

386 BRASIL. Constituição Federal 1988. art. 119, I, a

387 CONHEÇA o STF. Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=sobreStfConhecaStfInstitucional>. Acesso em: set. 2007. e BRASIL. Congresso. Câmara dos deputados. O legislativo e a organização do Supremo Tribunal no Brasil. Brasília; Rio de Janeiro: Fundação Casa de rui Barbosa, 1978.

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destaca-se a competência para julgar, nas infrações penais comuns, o Presidente da República,

o Vice-Presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o

Procurador-Geral da República, entre outros. Em grau de recurso, sobressaem-se as

atribuições de julgar, em recurso ordinário, o habeas corpus, o mandado de segurança, o

habeas data e o mandado de injunção decididos em única instância pelos Tribunais

Superiores, se denegatória a decisão, e, em recurso extraordinário, as causas decididas em

única ou última instância, quando a decisão recorrida contrariar dispositivo da Constituição. A

partir da Emenda Constitucional n. 45/2004, foi introduzida a possibilidade de o Supremo

Tribunal Federal aprovar, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, súmula com

efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública

direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal388.389

O Plenário, as Turmas e o Presidente são os órgãos do Tribunal390. O Presidente e o

Vice-Presidente são eleitos pelo Plenário do Tribunal, dentre os Ministros, e têm mandato de

dois anos. Cada uma das duas Turmas é constituída por cinco Ministros e presidida pelo mais

antigo em sua composição391.

Neste contexto, a pesquisa foi feita no endereço eletrônico do Supremo Tribunal Federal

através do sistema de pesquisa de jurisprudência do próprio site392. Para verificar as decisões

pertinentes existentes neste tribunal foram usados como expressão de busca os argumentos:

“políticas públicas de saúde”, “tratamento de saúde”, “tratamento médico” e “fornecimento de

medicamento”. Além do argumento de busca se restringiu a pesquisa no tempo colocando

como data inicial primeiro de janeiro de 2000 e data final 31 de outubro de 2007.

388 BRASIL. Constituição Federal 1988. art. 103-A

389 Ver também BRASIL. Presidência da república. Gabinete civil. Os três poderes da República: legislativo, executivo, judiciário. Brasília: Secretaria de Imprensa e Divulgação, 1984.

390 BRASIL Supremo Tribunal Federal. Regimento interno no Supremo Tribunal Federal. Rio de Janeiro: Liber Juris, 1984. art.3º.

391 BRASIL Supremo Tribunal Federal. Regimento interno no Supremo Tribunal Federal. Rio de Janeiro: Liber Juris, 1984. art.4º, § 1º.

392 PESQUISA de jurisprudência. Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/pesquisarJurisprudencia.asp>. Acesso em: dez 2006 a nov 2007.

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Para o primeiro argumento, políticas públicas de saúde foram encontradas 99 decisões

distribuídas em: 1 acórdão393, 61 decisões monocráticas394 e 37 decisões da presidência395.

Nestas decisões encontra-se o termo saúde de forma genérica se referindo aos planos de

saúde, ao ministério da saúde e às políticas públicas de uma maneira geral, ou seja, à

efetivação de políticas públicas que alcancem a população como um todo e em diversas

matérias, não somente quanto ao fornecimento de medicamentos e tratamentos de saúde. Por

se tratar de um argumento muito genérico não condizia especificamente com o objeto desta

dissertação e por esta razão os que estão relacionados com a temática da dissertação estão

elencados nas notas explicativas.

Para o argumento tratamento de saúde foram encontradas 418 decisões, divididas em:

14 acórdãos396, 247 decisões monocráticas397 e 157 decisões da presidência398. Nestas

decisões encontra-se o termo saúde de forma genérica se referindo, principalmente no que

tange aos acórdãos, a tratamentos no sistema prisional. A maioria de tais decisões também

não tem relação com o assunto da dissertação e somente os pertinentes são mencionados em

nota explicativa para ilustrar os casos existentes em relação ao tema.

Quanto ao argumento tratamento médico foram verificadas 151 decisões, dentre as

quais: 16 acórdãos399, 106 decisões monocráticas400 e 29 decisões da presidência401. Como se

percebe pelo número de casos colocados nas notas explicativas, a maioria não tem relação

com o assunto em discussão. Já, quanto ao argumento fornecimento de medicamento foram

encontradas 141 decisões, entre elas: 12 acórdãos402, 97 decisões monocráticas403 e 32

decisões da presidência404. Destas, todas dizem respeito ao tema tratado nesta dissertação.

393 ADIN-MC 1931/DF, trata-se de uma ADIN, mas que não tem relação com o tema da dissertação, pois se

refere a planos de seguro privados de assistência à saúde.

394 Ver Anexo A.

395 Ver Anexo A.

396 Ver Anexo B.

397 Ver Anexo B.

398 Ver Anexo B.

399 Os acórdãos dizem respeito a assistência médica de preso, ou outro assunto que não diz respeito a concessão de medicamentos ou tratamento médico pelo judiciário.

400 Ver Anexo C.

401 Ver Anexo C.

402 Curiosamente a maioria das decisões é proveniente do Rio Grande do Sul: ver Anexo D.

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Depois desta introdução sobre as decisões se percebe que no período pesquisado não há

nenhum controle concentrado de constitucionalidade feito pelo STF, o que se verifica é que

dentro da matéria pesquisada existem recursos e suspensões de liminares. Como se trata de

decisões parecidas até por dizerem respeito a precedentes do STF, serão mencionadas apenas

algumas das decisões, lembrando que para verificar sua ementa ou inteiro teor, basta acessar o

endereço eletrônico do Supremo Tribunal Federal e colocar os dados das decisões (siglas e

números), bem como requerer o inteiro teor por email.

Foram selecionadas algumas decisões para ilustrar o pensamento do STF e de como

vêm sendo tomadas as decisões em relação ao tema de fornecimento de medicamentos e

tratamento de saúde às pessoas que demandam frente ao judiciário para terem garantidos seus

direitos fundamentais. Neste contexto, é possível notar através dos acórdãos das decisões que,

por reiteradas vezes, o que acontece é que nos Estados e Municípios, o poder público é

obrigado a fornecer os tratamentos necessários àqueles que buscam o poder judiciário.

Inconformados com tais decisões, Estados, Municípios e em alguns casos até a União

recorrem das decisões e são estes recursos que podem ser encontrados no site do STF.

EMENTA: AIDS/HIV. DISTRIBUIÇÃO GRATUITA DE MEDICAMENTOS EM FAVOR DE PESSOAS CARENTES. LEGISLAÇÃO COMPATÍVEL COM A TUTELA CONSTITUCIONAL DA SAÚDE (CF, ART. 196). PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. - A legislação que assegura, às pessoas carentes e portadoras do vírus HIV, a distribuição gratuita de medicamentos destinados ao tratamento da AIDS qualifica-se como ato concretizador do dever constitucional que impõe ao Poder Público a obrigação de garantir, aos cidadãos, o acesso universal e igualitário às ações e serviços de saúde. Precedentes (STF). - O direito à saúde - além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas - representa conseqüência constitucional indissociável do direito à vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por omissão, em censurável comportamento inconstitucional. O direito público subjetivo à saúde traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público (federal, estadual ou municipal), a quem incumbe formular - e implementar - políticas sociais e econômicas que visem a garantir a plena consecução dos objetivos proclamados no art. 196 da Constituição da República. (STF – RE271286/RS – Rel. Min. Celso de Mello – J. 02.08.2000).405

403 Ver Anexo D.

404 Ver Anexo D.

405 BRASIL. STF – RE271286/RS – Rel. Min. Celso de Mello – J. 02.08.2000. Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(271286.NUME.%20OU%20271286.DMS.)%20NAO%20S.PRES.&base=baseMonocraticas>. Acesso em: dez 2006. Ver íntegra no Anexo E.

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Esta decisão colacionada acima é bastante comentada em outros julgados e usada como

precedente nos mesmos.

EMENTA: PACIENTE PORTADOR DE HEPATITE "B" E "C". PESSOA DESTITUÍDA DE RECURSOS FINANCEIROS. DIREITO À VIDA E À SAÚDE. NECESSIDADE IMPERIOSA DE SE PRESERVAR, POR RAZÕES DE CARÁTER ÉTICO-JURÍDICO, A INTEGRIDADE DESSE DIREITO ESSENCIAL. FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS INDISPENSÁVEIS EM FAVOR DE PESSOAS CARENTES. DEVER CONSTITUCIONAL DO ESTADO (CF, ARTS. 5º, "CAPUT", E 196). PRECEDENTES (STF). RE CONHECIDO E PROVIDO. (STF – RE509569/SC – Rel. Min. Celso de Mello – J. 01.02.2007)406

Nestas duas decisões expostas acima, pode-se notar que apesar de terem sido julgadas a

primeira no ano 2000 e a segunda em 2007, as decisões seguem a mesma linha. Em ambos os

casos se trata de paciente acometido por doença grave, e sem recursos financeiros para

adquirir os medicamentos, o qual aciona o judiciário para ter seus direitos à vida e à saúde

respeitados pelo Estado. O primeiro caso vem sendo citado nos demais pesquisados como

exemplo de decisão. No primeiro caso em tela, tanto o município de Porto Alegre quanto o

Estado do Rio Grande do Sul recorrem da decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do

Sul que condenou os mesmos a fornecerem medicamentos ao paciente.

Sustenta-se, na presente sede recursal extraordinária, que o acórdão ora questionado teria desrespeitado o princípio da legalidade, circunstância essa que justificaria a reforma da decisão emanada do Tribunal a quo. Entendo não assistir razão aos ora recorrentes, eis que eventual interpretação desfavorável das leis não pode ser invocada pela parte sucumbente como ato caracterizador de ofensa ao postulado constitucional da legalidade (Ag 159.081-SP (AgRg), Rel. Min. CELSO DE MELLO). No caso, a alegação de ofensa ao princípio da legalidade não basta, só por si, para viabilizar o acesso à via recursal extraordinária. É que a interpretação judicial de normas legais - por situar-se e projetar-se no âmbito infraconstitucional - culmina por exaurir-se no plano estrito do contencioso de mera legalidade, desautorizando, em conseqüência, a utilização do apelo extremo, consoante adverte o magistério jurisprudencial desta Suprema Corte (Ag 192.995-PE (AgRg), Rel. Min. CARLOS VELLOSO). Na realidade, o Supremo Tribunal Federal, por mais de uma vez, já acentuou que o procedimento hermenêutico do Tribunal inferior - que, ao examinar o quadro normativo positivado pelo Estado, dele extrai a interpretação dos diversos diplomas legais que o compõem, para, em razão da inteligência e do sentido exegético que lhes der, obter os elementos necessários à exata composição da lide - não transgride, diretamente, o princípio da legalidade (Ag 161.396-SP (AgRg), Rel. Min. CELSO DE MELLO).407

406 BRASIL. STF – RE509569/SC – Rel. Min. Celso de Mello – J. 01.02.2007. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(509569.NUME.%20OU%20509569.DMS.)%20NAO%20S.PRES.&base=baseMonocraticas>. Acesso em: jul. 2007. Ver íntegra no Anexo F.

407 BRASIL. STF – RE271286/RS – Rel. Min. Celso de Mello – J. 02.08.2000. Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(271286.NUME.%20OU%20271286.DMS.)%20NAO%20S.PRES.&base=baseMonocraticas>. Acesso em: dez 2006. Ver íntegra Anexo E.

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O principal argumento dos recorrentes, como se verifica na citação acima, é de que a

decisão do tribunal de origem feria o princípio da legalidade. O relator do processo entende

que não basta tal alegação para o recurso, e explica que é entendimento acentuado do STF que

o procedimento hermenêutico do Tribunal inferior não transgride diretamente o princípio da

legalidade, pelo fato de examinar o quadro normativo positivado pelo Estado e extrair do

mesmo a interpretação das leis que o compõem, para então alcançar os elementos necessários

para a exata composição da lide. O relator ainda entende que o recurso é inadmissível tendo

em vista que os fundamentos da decisão recorrida se dão também por legislação

infraconstitucional o que lhe daria autonomia.

A legislação infraconstitucional referida na decisão se trata de legislação federal (L.

9.313/96) e estadual (L.9.908/93). As referidas legislações estabelecem, a primeira, que os

entes federados são solidários no tratamento de doentes de AIDS, e a segunda, que o Estado

do Rio Grande do Sul deve distribuir medicamentos de forma gratuita às pessoas que não

puderem prover as despesas dos medicamentos sem se privarem de recursos indispensáveis ao

provento de sua família.

Com efeito, basta examinar-se o acórdão ora recorrido, para confirmar-se tal asserção (fls. 371): "Por derradeiro, a licitação não se faz necessária para a aquisição dos medicamentos, pois ela é dispensada nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando caracterizada a urgência do atendimento de situação que possa causar prejuízo ou comprometer a segurança das pessoas. Também com estes argumentos afastam-se as assertivas de inexistência de previsão orçamentária." De qualquer maneira, no entanto, mesmo que tais aspectos formais pudessem ser afastados, ainda assim revelar-se-ia inacolhível a postulação recursal deduzida pelo Estado do Rio Grande do Sul e pelo Município de Porto Alegre, especialmente em face do mandamento constitucional inscrito no art. 196 da Constituição da República.408

No recurso os recorrentes alegam que o município não poderia ser compelido a fornecer

medicamento uma vez que este projeto não estaria incluído na lei orçamentária anual.

Argumento rejeitado pelo relator. O ministro esclarece que a norma constitucional do art. 196

é clara quando estabelece que:

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e

408 BRASIL. STF – RE271286/RS – Rel. Min. Celso de Mello – J. 02.08.2000. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(271286.NUME.%20OU%20271286.DMS.)%20NAO%20S.PRES.&base=baseMonocraticas>. Acesso em: dez 2006. Ver íntegra Anexo E.

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ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.409

Desta forma, é obrigação dos entes federados em garantir a proteção à saúde. E diante

de um caso concreto, quando se vê, o julgador, compelido a decidir entre de um lado a

proteção à vida e à saúde, um direito subjetivo inalienável assegurado pela Constituição, e de

outro a proteção de um interesse financeiro e secundário do Estado, o que ele escolhe é o

respeito à vida e à saúde, principalmente por estar consubstanciado por leis estaduais que

garantem a efetividade a preceitos fundamentais da Constituição Federal. Para o ministro o

direito à saúde representa um direito de prerrogativa indisponível, e o poder público deve

formular e implementar políticas sociais e econômicas para garantir tal assistência. Como reza

o art. 197410 da Constituição. E, assim, o ministro entende que o Ministério Público e o Poder

Judiciário são legitimados para na hipótese de não respeitado o mandamento constitucional

compelir o Poder Público a efetivar as ações e serviços de saúde.

O sentido de fundamentalidade do direito à saúde - que representa, no contexto da evolução histórica dos direitos básicos da pessoa humana, uma das expressões mais relevantes das liberdades reais ou concretas - impõe ao Poder Público um dever de prestação positiva que somente se terá por cumprido, pelas instâncias governamentais, quando estas adotarem providências destinadas a promover, em plenitude, a satisfação efetiva da determinação ordenada pelo texto constitucional.411

Neste contexto o STF não conhece do recurso. Os recorrentes inconformados agravam

da decisão. Desta vez argumentam que a decisão desrespeita regras constitucionais no sentido

de não haver verba para tal concessão e não estar em conformidade com a jurisprudência do

Supremo.

O sentido de fundamentalidade do direito à saúde – que representa, no contexto da evolução histórica dos direitos básicos da pessoa humana, uma das expressões mais relevantes das liberdades reais ou concretas – impõe ao Poder Público um dever de prestação positiva que somente se terá por cumprido, pelas instâncias

409 BRASIL. Constituição. Constituição Federal: 1988. São Paulo: Lex, 1988. Art. 196.

410 BRASIL. Constituição. Constituição Federal: 1988. São Paulo: Lex, 1988. Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado.

411 BRASIL. STF – RE271286/RS – Rel. Min. Celso de Mello – J. 02.08.2000. Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(271286.NUME.%20OU%20271286.DMS.)%20NAO%20S.PRES.&base=baseMonocraticas>. Acesso em: dez 2006. Ver íntegra Anexo E.

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governamentais, quando estas adotarem providências destinadas a promover, em plenitude, a satisfação efetiva de determinação ordenada pelo texto constitucional.412

Portanto, o egrégio Supremo Tribunal entende que é dever do poder público tornar

efetivas as prestações de saúde, não bastando somente a declaração do direito pelo seu

reconhecimento formal.

O sentido de fundamentalidade do direito à saúde – que representa, no contexto da evolução histórica dos direitos básicos da pessoa humana, uma das expressões mais relevantes das liberdades reais ou concretas – impõe ao Poder Público um dever de prestação positiva que somente se terá por cumprido, pelas instâncias governamentais, quando estas adotarem providências destinadas a promover, em plenitude, a satisfação efetiva da determinação ordenada pelo texto constitucional.413

Neste acórdão tanto o ministro relator quanto o ministro que avalia o caso entendem que

o objetivo do Estado é proporcionar uma vida segura com o conforto suficiente para atender a

preservação da dignidade do homem.

A segunda decisão citada é um recurso impetrado pelo Ministério Público do Estado de

Santa Catarina contra decisão que extinguiu a Ação Civil Pública que tinha por objetivo

compelir o Estado a fornecer medicamento a cidadão com moléstia grave. Nesta decisão o

julgador mais uma vez reconhece o dever do Estado em fornecer o medicamento e considera o

ministério público parte legítima para requerer tal prestação como fiscalizador da

implementação do texto constitucional.

O reconhecimento judicial da validade jurídica de- O reconhecimento judicial da validade jurídica de programas de distribuição gratuita de medicamentos a pessoas carentes, inclusive àquelas portadoras do vírus HIV/AIDS, dá efetividade a preceitos fundamentais da Constituição da República (arts. 5º, caput, e 196) e representa, na concreção do seu alcance, um gesto reverente e solidário de apreço à vida e à saúde das pessoas, especialmente daquelas que nada têm e nada possuem, a não ser a consciência de sua própria humanidade e de sua essencial dignidade.414

412 BRASIL. STF – RE271286 – AgR /RS – Rel. Min. Celso de Mello – J. 12.09.2000. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/portal/inteiroTeor/obterInteiroTeor.asp?id=335538&codigoClasse=539&numero=271286&siglaRecurso=AgR&classe=RE>. Acesso em: dez 2006. p.10. Ver íntegra Anexo E.

413 BRASIL. STF – RE271286 – AgR /RS – Rel. Min. Celso de Mello – J. 12.09.2000. Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/inteiroTeor/obterInteiroTeor.asp?id=335538&codigoClasse=539&numero=271286&siglaRecurso=AgR&classe=RE>. Acesso em: dez 2006. p. 10. Ver íntegra Anexo E.

414 BRASIL. STF – RE509569/SC – Rel. Min. Celso de Mello – J. 01.02.2007. Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(509569.NUME.%20OU%20509569.DMS.)%20NAO%20S.PRES.&base=baseMonocraticas>. Acesso em: jul. 2007. Ver íntegra Anexo F.

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Dá-se ênfase a jurisprudência desta Corte no sentido de que é obrigação do Estado

fornecer medicamentos para pacientes hipossuficientes. Para ilustrar tal jurisprudência se

colacionam mais decisões que esclarecem a matéria:

EMENTA: PACIENTE COM HIPERPROLACTINEMIA. PESSOA DESTITUÍDA DE RECURSOS FINANCEIROS. DIREITO À VIDA E À SAÚDE. FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS DE USO NECESSÁRIO, EM FAVOR DE PESSOA CARENTE. DEVER CONSTITUCIONAL DO ESTADO (CF, ARTS. 5º, "CAPUT", E 196). PRECEDENTES (STF). - O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República (art. 196). Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular - e implementar - políticas sociais e econômicas que visem a garantir, aos cidadãos, o acesso universal e igualitário à assistência médico-hospitalar. - O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política - que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro - não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado. Precedentes do STF. (STF – AI634282/PR – Rel. Min. Celso de Mello – J. 30.04.2007).415

Percebe-se que prevalece o direito à saúde que traz em seu íntimo o direito à vida,

mesmo sob o alegado caráter programático do art.196 da Constituição Federal.

DECISÃO: Trata-se de recurso extraordinário (art. 102, III, a, da Constituição) interposto de acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso cuja ementa tem o seguinte teor: "MANDADO DE SEGURANÇA - PRELIMINARES AFASTADAS - FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO DA SUBSTÂNCIA INTERFERON PEGUILADO PARA TRATAMENTO DE HEPATITE "C" - PESSOA SEM RECURSOS PARA SUA AQUISIÇÃO - DEVER DO ESTADO - DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAL E LEGAL QUE GARANTEM O DIREITO À VIDA - SEGURANÇA CONCEDIDA. Se o Secretário Estadual de Saúde é o Gestor do Sistema Único de Saúde no âmbito estadual e sua gestão é de natureza plena, não obstante subordinada às regras previamente estabelecidas pelo Ministério da Saúde (Gestor Nacional do Sistema), e nessa qualidade, nega o fornecimento de medicamento de alto custo a pessoa sem recurso para o adquirir, é ele a autoridade diretamente responsável pelo ato omissivo, sendo, portanto, parte legítima para figurar no pólo passivo de ação mandamental e competente será a Justiça Comum. A saúde é direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício, inclusive com a distribuição de medicamentos, quando a pessoa não dispuser dos recursos necessários. (Fls. 158) 2. Alega o recorrente que a decisão recorrida viola o disposto nos arts. 5o, LXIX, 196, 197, 198 e 200, I da Constituição, porque inexiste omissão do Estado no fornecimento de medicamentos aos pacientes que não possuem meios para adquiri-los, o que ocorre é que o medicamento solicitado não está na lista de compra estabelecida pelo Ministério da Saúde. Aduz, ainda, que seria dezarrazoado exigir

415 BRASIL. STF – AI634282/PR – Rel. Min. Celso de Mello – J. 30.04.2007. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(634282.NUME.%20OU%20634282.DMS.)%20NAO%20S.PRES.&base=baseMonocraticas>. Acesso em: jul. 2007. Ver íntegra Anexo G.

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que o estado fosse compelido a prestações não previstas no planejamento da Saúde do estado sem que exista a prévia dotação orçamentária para tais ações. 3. Sem razão a parte recorrente. O acórdão impugnado, ao garantir o acesso da recorrida, pessoa de insuficientes recursos financeiros, a tratamento médico condigno do quadro clínico apresentado, resguardando-lhe o direito à saúde, decidiu em consonância com o que ficou assentado no julgamento do RE 271.286-AgR [...] 4. No mesmo sentido, os seguintes precedentes: RE 411.557 (rel. min. Cezar Peluso, DJ 26.10.2004), AI 373.976 (rel. min. Sepúlveda Pertence, DJ 02.12.2004), RE 342.413 (rel. min. Ellen Gracie, DJ 09.11.2004) e AI 452.312 (rel. min. Celso de Mello, DJ 23.06.2004). 5. Incumbe ao Supremo Tribunal Federal, no exercício dos controles concentrado e difuso da constitucionalidade das leis, velar pela concretização da eficácia máxima da Constituição federal. Nesse sentido, devem ser rechaçadas técnicas interpretativas, como a de que se vale o ente público ora recorrente, as quais têm como conseqüência prática a inoperância de certos dispositivos da Constituição. 6. Do exposto, nego seguimento ao recurso extraordinário. (STF – RE 400040/MT – Rel. Min. Joaquim Barbosa – J. 06.06.2005).416

Mais uma vez fica evidente que diante de uma omissão do Estado o poder judiciário é

instado a se manifestar e como muito bem esclarece o ministro Joaquim Barbosa na decisão

acima, é dever do Supremo Tribunal Federal controlar difusa ou concentradamente a

constitucionalidade das leis para garantir a máxima eficácia da Constituição.

DECISÃO: 1. Trata-se de recurso extraordinário contra acórdão que condenou o Ministério da Saúde a custear tratamento médico de pacientes portadores de doença ocular progressiva, a ser realizado no exterior. 2. Inadmissível o recurso. A recusa do Estado em custear o tratamento médico coloca em risco a saúde do paciente e representa desrespeito ao disposto no art. 196 da Constituição Federal, que determina ser a saúde direito de todos e dever do Estado. Essa regra constitucional tem por destinatários todos os entes políticos que compõem a organização federativa do Estado brasileiro. [...] Ademais, verificar se o tratamento médico disponível no Brasil substituiria o que é realizado no exterior, dependeria de reexame de fatos e provas, ao que não se presta a via extraordinária (súmula 279). 3. Ante o exposto, nego seguimento ao recurso extraordinário. (STF – RE411557/DF – Rel. Min. Cezar Peluso – J. 24.09.2004).417

Fica evidenciado o comprometimento do STF em primar pelo respeito a norma

constitucional e sua real efetivação. Aqui primando pelos direitos à vida e à saúde.

Fazendo uma análise do que explica Alexy em sua teoria e do exposto no primeiro

capítulo desta dissertação se verifica que em todos os casos de direitos baseados em princípios

devem ser avaliadas as possibilidades fáticas e jurídicas – fazendo-se distinções entre

416 BRASIL. STF – RE 400040/MT – Rel. Min. Joaquim Barbosa – J. 06.06.2005. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(400040.NUME.%20OU%20400040.DMS.)%20NAO%20S.PRES.&base=baseMonocraticas>. Acesso em: jul. 2007. Ver íntegra Anexo H.

417 BRASIL. STF – RE411557/DF – Rel. Min. Cezar Peluso – J. 24.09.2004. Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(411557.NUME.%20OU%20411557.DMS.)%20NAO%20S.PRES.&base=baseMonocraticas>. Acesso em: jul. 2007. Ver íntegra Anexo I.

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posições prima facie e posições definitivas. Refinando-se o modelo básico são verificados os

meios para o cumprimento do dever de proteção e analisados com um princípio oposto quais

os meios são ineficazes e quais são eficazes. Depois disso se avalia se o princípio que se está

seguindo tem um peso maior que seu princípio oposto e assim se a utilização de determinados

meios são justificados. Se nenhuma das possibilidades puder se realizar então não se pode

usar nenhum dos meios para se realizar o dever de proteção prima facie. Entretanto, se pelo

menos dois meios puderem ser justificados através de um princípio frente a outro, então existe

um campo de ação de modelo básico. Mas isto pode não funcionar quando os dois meios são

igualmente eficazes com relação a um princípio e um dos meios afetar o princípio oposto mais

intensamente que o outro meio. A escolha do meio que afeta mais o princípio oposto seria

uma afetação não necessária, o que justificaria a escolha do outro meio, mas que por afetar

menos o princípio oposto não daria um campo de ação para a realização do princípio

norteador. Assim, o campo de ação não coloca problemas sobre o tema da justiciabilidade,

eles surgiriam devido a problemas de avaliação e efetividade. Tais problemas estão ligados à

questão normativa da ponderação e a questão empírica da efetividade. A ponderação do

problema da justiciabilidade dependeria do papel que tenham o problema da ponderação e o

do prognóstico, efetividade, dentro do marco dos direitos a proteção.418

De certa maneira o que o Supremo Tribunal Federal tem feito é uma ponderação de

princípios, como pôde ser verificado em todas as decisões os relatores comentam que tendo-se

que sopesar entre o direito à saúde que remete ao direito à vida e uma questão financeira do

Estado escolheria o primeiro. Nestes casos não há conflitos de direitos fundamentais, mas há

conflitos de princípios, e em certa medida o STF já vem fazendo uma otimização dos

mesmos. Entretanto, nos recursos analisados pelo STF o mesmo não faz análise dos fatos em

si. Pois, em grau de recurso o que o Tribunal faz é verificar se houve ou não violação a

Constituição.

Há um caso um pouco diferente dos já citados, que a aplicação da teoria de Alexy, no

que diz respeito à análise e otimização das possibilidades fáticas além das possibilidades

jurídicas, talvez fizesse com que a decisão tivesse resultado diverso do que aconteceu.

418 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de estudios políticos y

constitucionales, 2002. cap. 9.

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EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. CONTROVÉRSIA DECIDIDA PELO TRIBUNAL A QUO COM FUNDAMENTO NAS PROVAS DOS AUTOS. INCIDÊNCIA, NA ESPÉCIE, DA SÚMULA 279 DESTE SUPREMO TRIBUNAL. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.419

Na referida decisão, a recorrente agravou regimentalmente depois que teve seu recurso

extraordinário e agravo de instrumento não admitido e negado seguimento pelo STF. A

recorrente não se conformava com a decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que

entendeu não ser excepcional o medicamento pleiteado por ela. Sua sustentação é de que “o

Estado não pode se eximir da obrigação de fornecer medicamentos sob o fundamento de que

deve guardar recursos para os demais necessitados”420. E no caso a relatora entendeu que a

obrigação do Estado em fornecer medicamentos aos pacientes hipossuficientes não se dá de

maneira automática, pois a parte deve provar a excepcionalidade dos medicamentos e sua

indispensabilidade para a sobrevivência. Além disso, o que lhe havia sido negada era tutela

antecipada e estava informado no processo que a Secretaria da Saúde poderia incluí-la em um

programa específico para tratamento de seu problema de saúde. Ou seja, apesar de ser

diferente dos outros casos, nos quais os entes federados recorreriam com o intuito de não

serem forçados a prestação de medicamentos, neste caso também houve uma ponderação, na

qual, apesar de não poder otimizar as possibilidades fáticas já feitas pelo tribunal a quo, negou

seguimento ao recurso enfatizando que a recorrente poderia ter seu direito garantido através

de programa oferecido pela própria secretaria de saúde, já que, quando se faz a ponderação é

necessário especificar o caso concreto, colocando as circunstâncias do caso que são relevantes

à decisão, e que tem um papel central na lei de colisão. Assim, a importância concreta do

princípio depende das circunstâncias do caso. Ou seja, os elementos do caso concreto que

importam e fazem a diferença na decisão, uma vez que especificam a medida examinada e

quais as conseqüências para os princípios relacionados. Para se determinar a importância da

satisfação de um princípio se deve verificar seu sentido contrário, ou seja, o que significaria

para um direito se a intervenção no princípio fosse omitida ou não fosse executada.

419 BRASIL. STF – AI-AgR562703/RS – Rel. Min. Cármen Lúcia – DJ 20.04.2007. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(562703.NUME.%20OU%20562703.ACMS.)&base=baseAcordaos>. Acesso em: jul. 2007. Ver íntegra Anexo J.

420 BRASIL. STF – AI-AgR562703/RS – Rel. Min. Cármen Lúcia – DJ 20.04.2007. Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(562703.NUME.%20OU%20562703.ACMS.)&base=baseAcordaos>. Acesso em: jul. 2007. p. 2. Ver íntegra Anexo J.

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E é isso o que o Supremo Tribunal Federal tem feito diante das decisões que dizem

respeito ao fornecimento de medicamentos aos pacientes hipossuficientes. Os julgadores

ponderam se devem atender ao direito à saúde e não o fazendo quais as conseqüências que

aconteceriam. Desta maneira, usando o modelo estabelecido por Alexy se verifica o caso

concreto e os princípios que estão em jogo em cada caso. Depois de verificados os princípios

são analisados e a cada um é atribuído um peso ou importância em relação ao caso concreto

para que possibilite a escolha. Então se chega ao grau de intervenção no princípio que a não

intervenção produz no princípio vulnerável. Os três passos acontecem um seguido do outro e

de forma quase simultânea, depois de verificada a intensidade de intervenção se verifica a

importância do princípio oposto e o terceiro passo é determinar qual das duas valorações deve

prevalecer. Nos casos analisados se verifica que o direito à saúde teve valoração maior que o

princípio financeiro do Estado.

Como já dito anteriormente, os princípios formais não interferem nos campos de ação e

assim tais campos permitem ponderações racionais. As constituições que possuem um

catálogo de direitos fundamentais representam uma tentativa de organizar a ação coletiva e

assegurar direitos individuais. Com este duplo caráter o legislador tem a atribuição de

restringir os direitos fundamentais, para isso existem campos de ação que se somam as

restrições materiais que o legislador impõe aos direitos fundamentais. O campo de ação acaba

se integrando ao direito fundamental e se internalizando. A divergência permanece, desta

forma, impregnada no princípio jusfundamental material. 421

Diante do exposto, pode-se dizer que a teoria dos direitos fundamentais de Alexy não

enfraquece os direitos fundamentais, e pode ser usada nos tribunais para resolução de casos,

tal teoria não traz resultados prontos, o que é bom porque cada caso tem sua peculiaridade.

Como já dito a teoria de Alexy tem uma funcionalidade para a prática jurídica, pois traz a

possibilidade de justificar os resultados da ponderação a partir de parâmetros racionais.

Através da ponderação se solucionam os conflitos, afastando-se o princípio que diante das

condições fáticas e jurídicas do caso concreto tenha menor peso, levando em consideração o

princípio oposto. O modelo de ponderação com sua fórmula dos pesos não traz em si um

método de resolução definitivo de casos. Mas traz critérios que vinculam a ponderação e a

argumentação jurídica racional. Desta forma, o modelo estrutural de ponderação é importante, 421 ALEXY, Robert. Epílogo a la teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios, 2004. cap.

4.

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pois provoca um avanço em relação à argumentação jurídica, uma vez que traz dados através

dos quais se pode fundamentar a argumentação jurídica.

Com a pesquisa e verificando as decisões pesquisadas, conforme anexos, se encontra

uma decisão na qual se verifica que a teoria dos direitos fundamentais de Alexy pode ser

usada na prática, pois traz mecanismos perfeitamente plausíveis para tanto. Nesta decisão,

quem argumenta sobre a otimização de princípios e ponderação dos mesmos é o agravante.

3. O Município alega que o acórdão recorrido teria contrariado os arts. 2º, 23, inc. II, 196, e 198, da Constituição da República. Afirma que "os princípios fundamentais - nos quais se enquadra o direito à saúde - são mandados de otimização, isto é, podem ser cumpridos em diferentes graus, sendo a intensidade de seu cumprimento adstrita às possibilidades fáticas ou jurídicas. Ordenam, portanto, a realização de algo (ou permitem ou proíbem) na maior medida do possível, dentro das possibilidades jurídicas e fáticas existentes. Trata-se de um juízo de ponderação e não de validade e que surge diante de um caso concreto." (fl. 25) Sustenta, também, que "no presente caso, a pretensão é de fornecimento de medicamento de competência exclusiva do Estado do Rio Grande do Sul, tendo em vista constar na listagem de medicamentos excepcionais, de responsabilidade daquele ente público, conforme organização estabelecida para o Sistema..." (fl. 26). E ainda, que a Constituição da República estabelece competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (inc. II do art. 23) para o fornecimento de medicamentos, a qual não se confunde com responsabilidade solidária Apreciada a matéria trazida na espécie.422

O recorrente alega a ponderação para que os princípios aplicados ao caso sejam

empregados na maior medida possível e sua intensidade deveria ser medida de acordo com o

caso concreto. Os princípios que o agravante alega são os princípios fundamentais de uma

maneira geral, nos quais o direito à saúde se enquadra. Na apreciação do caso concreto a

Ministra utiliza os princípios da dignidade da pessoa humana – princípio do viver digno, além

do princípio da igualdade:

5. Ademais, o direito à vida compreende o direito à saúde, para que seja possível dar concretude ao princípio do viver digno. A Constituição da República assegura o direito à dignidade da pessoa humana (art. 1º, inc. III) e, em sua esteira, todos os meios de acesso aos fatores e condições que permitam a sua efetivação. Esse princípio constitui, no sistema constitucional vigente, um dos fundamentos mais expressivos sobre o qual se institui o Estado Democrático de Direito (CF, art. 1º, III). O direito de todos à saúde, "O direito de todos à saúde, "garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação", conforme se contém no art. 196 da Constituição da República, compatibiliza-se, ainda, com o princípio constitucional da igualdade, daí

422 BRASIL. STF – AI597141/RS – Rel. Min. Cármen Lúcia – DJ 29.06.2007. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(597141.NUME.%20OU%20597141.DMS.)%20NAO%20S.PRES.&base=baseMonocraticas>. Acesso em: ago. 2007. Ver íntegra Anexo K.

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a norma constitucional assecuratória do acesso universal e igualitário a todos os recursos disponíveis para garantia de condições de saúde.423

Ou seja, foram usados, para justificar a decisão, princípios que protegem os cidadãos,

como o princípio da dignidade da pessoa humana e o princípio da igualdade, que mesmo

tratando sobre um direito social à prestação, neste caso de medicamentos – direito à saúde

vincula-se ao princípio da igualdade. Isto é, se considera o direito à saúde como um objetivo

do Estado que adquire condição de norma programática e que impõe políticas públicas. Desta

forma, no caso concreto se deu mais importância a dignidade da pessoa que para ser efetivada

deve possibilitar que o indivíduo tenha acesso a fatores e condições que permitam sua

efetivação. E também o princípio da igualdade o qual estabelece que todos devem ter acesso

de igual forma aos recursos disponíveis para o tratamento que necessitem. Neste contexto o

fornecimento a esta pessoa do medicamento, garantiria a aplicação do princípio.

Nas decisões os princípios mais frequentemente utilizados são o da independência dos

poderes; da igualdade; do viver digno; da inafastabilidade do poder judiciário; e da

solidariedade.

[...] a entrega, pelo Município, da medicação excepcional relacionada à Hepatite C, em total arrepio ao Convênio firmado entre os 3 Entes da Federação e o Ministério da Saúde...." (fl. 8). Assevera que o "fornecimento a todos os pacientes portadores de hepatite C crônica, fora dos parâmetros estabelecidos no programa do Ministério da Saúde inviabilizaria [o] orçamento financeiro do Município, já que esses pacientes encontram-se sob a responsabilidade político-financeira do Estado, pelo método do [Sistema Único de Saúde]..." (fl. 9). Argumenta que "o Judiciário não pode editar norma genérica e impessoal que substitui o documento do Ministério da Saúde, sob pena de invasão de competência do Poder Executivo, o que não [seria] permitido pelo artigo 2º da [Constituição da República], que encerra o princípio da independência dos poderes."424

Neste caso, o princípio da independência dos poderes é alegado pelo município que

recorre da decisão que o forçou a fornecer medicamento. No entanto, o STF não acolhe tal

argumento entendendo que esta medida não infringiria o princípio e ainda explicita que o

poder judiciário tem o poder e dever de reparar uma lesão a direito. Neste contexto de

ponderação o STF deu maior peso ao princípio do viver digno e da dignidade da pessoa

423 BRASIL. STF – AI597141/RS – Rel. Min. Cármen Lúcia – DJ 29.06.2007. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(597141.NUME.%20OU%20597141.DMS.)%20NAO%20S.PRES.&base=baseMonocraticas>. Acesso em: ago. 2007. Ver íntegra Anexo K.

424 BRASIL. STF – AC1827/RJ – Rel. Min. Cármen Lúcia – DJ 29.10.2007. Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(1827.NUME.%20OU%201827.DMS.)%20NAO%20S.PRES.&base=baseMonocraticas>. Acesso em: nov. 2007. Ver íntegra Anexo L.

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humana para negar seguimento ao recurso e manter decisão anterior que privilegia o cidadão

que requereu medicamento.

A alegação do Município de que essa decisão teria gerado grave prejuízo ao erário e, ainda, que teria desequilibrado o orçamento não se mostra suficiente a demonstrar o fumus boni iuris e a viabilidade do recurso extraordinário quando contraposto à saúde do cidadão, conforme o que por mim já decidido: "o direito à vida compreende o direito à saúde, para que seja possível dar concretude ao princípio do viver digno. A Constituição da República assegura o direito à dignidade da pessoa humana (art. 1º, inc. III) e, em sua esteira, todos os meios de acesso aos fatores e condições que permitam a sua efetivação. Esse princípio constitui, no sistema constitucional vigente, um dos fundamentos mais expressivos sobre o qual se institui o Estado Democrático de Direito ([Constituição da República], art. 1º, III).425

Já a respeito do princípio da inafastabilidade do poder judiciário a argumentação é

quanto à necessidade de o indivíduo entrar primeiro pela via administrativa contra o

município, entretanto, o entendimento do STF é de que há interesse processual e se baseia

neste princípio.426

O princípio da solidariedade é referido e ponderado com o princípio da dignidade da

pessoa humana, no sentido de que os Entes Federados são solidários na prestação de

medicamentos sendo regulado por portarias específicas a competência de cada um. Neste

acórdão é interessante notar que a argumentação do STF se estabelece no sentido de que o

fornecimento de medicamento a um grupo que acionou o poder judiciário não pode prejudicar

todo o sistema público de saúde.

[...] reconheço que a controvérsia instaurada no mandado de segurança em apreço evidencia a existência de matéria constitucional: alegação de ofensa aos arts. 23, inc. II e 198, inc. I da Constituição da República e aos princípios da dignidade da pessoa humana e da solidariedade. [...] A Lei 8.437/92, em seu art. 4º, autoriza o deferimento do pedido de suspensão de execução de liminar para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas. Verifico estar devidamente configurada a lesão à ordem pública, considerada em termos de ordem administrativa, porquanto a execução de decisões como a ora impugnada afeta o já abalado sistema público de saúde. Com efeito, a gestão da política nacional de saúde, que é feita de forma regionalizada, busca uma maior racionalização entre o custo e o benefício dos tratamentos que devem ser fornecidos gratuitamente, a fim de atingir o maior número possível de beneficiários. Entendo que a norma do art. 196 da Constituição da República, que assegura o direito à saúde, refere-se, em

425 BRASIL. STF – AC1827/RJ – Rel. Min. Cármen Lúcia – DJ 29.10.2007. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(1827.NUME.%20OU%201827.DMS.)%20NAO%20S.PRES.&base=baseMonocraticas>. Acesso em: nov. 2007. Ver íntegra Anexo L.

426 BRASIL. STF – RE562630/ES – Rel. Min. Cezar Peluso – DJ 11.10.2007. Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(562630.NUME.%20OU%20562630.DMS.)%20NAO%20S.PRES.&base=baseMonocraticas>. Acesso em: nov. 2007. Ver íntegra Anexo M.

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princípio, à efetivação de políticas públicas que alcancem a população como um todo, assegurando-lhe acesso universal e igualitário, e não a situações individualizadas. A responsabilidade do Estado em fornecer os recursos necessários à reabilitação da saúde de seus cidadãos não pode vir a inviabilizar o sistema público de saúde. No presente caso, ao se conceder os efeitos da antecipação da tutela para determinar que o Estado forneça os medicamentos relacionados "(...) e outros medicamentos necessários para o tratamento (...)" (fl. 26) dos associados, está-se diminuindo a possibilidade de serem oferecidos serviços de saúde básicos ao restante da coletividade.427

Deste modo, se pôde verificar que a linha de raciocínio do STF vem sendo no sentido de

ponderar entre o melhor princípio que se adecue ao caso, entretanto, nem todas as decisões

dispuseram em seu corpo sobre os princípios explicitamente, somente ocorrendo isto com

algumas. No próximo ponto são analisados casos do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

e como pode ser aplicada a teoria de Alexy a eles.

3.2 Julgamentos do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

No Rio Grande do Sul, a história do Judiciário tem início no dia 03 de fevereiro de

1874. Quando foi instalado o Tribunal da Relação de Porto Alegre – que tinha jurisdição

sobre as Províncias de São Pedro do Rio Grande do Sul e Santa Catarina. A Corte era

composta por sete Desembargadores, e teve como primeiro Presidente o Desembargador João

Baptista Gonçalves Campos. Esse foi o berço do atual Tribunal de Justiça do Estado.428

Com a promulgação da Constituição Federal em 24 de fevereiro de 1891, foram

formados os Estados Brasileiros, e coube a eles a competência para legislar sobre Direito

Processual e para organizar suas Justiças. A Constituição do Estado foi promulgada em 14 de

julho de 1891, e nela se dispôs que as funções judiciais seriam exercidas por um Superior

Tribunal, cuja sede seria a Capital do Estado, por Juízes de comarca, pelo Júri e por Juízes

Distritais. Assim, em 1891, 1º de outubro, com a instalação do Supremo Tribunal de Santa

427 BRASIL. STF – STA91/AL – Rel. Min. Ellen Gracie – DJ 05.03.2007. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(91.NUME.%20OU%2091.DMS.)%20E%20S.PRES.&base=basePresidencia>. Acesso em: nov. 2007. Ver íntegra Anexo N.

428 HISTÓRIA do Tribunal de Justiça Rio Grande do Sul. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/institu/tj/historia.php>. Acesso em: set. 2007.

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Catarina, Tribunal da Relação de Porto Alegre teve sua jurisdição sobre o território do vizinho

Estado interrompida.429

A primeira medida do Governo do Estado foi a extinção do Tribunal da Relação, através

de decreto de 17 de fevereiro de 1892, assinado pelo Governador Provisório. Dez dias após

sua extinção, a Corte foi reativada através de decreto, e, em junho de 1892, teve novas

alterações, mas somente em 1893, foi instalado o Tribunal Superior do Rio Grande do Sul,

conforme determinava a Constituição. Em 19 de novembro de 1949, o prédio do Tribunal foi

destruído por um incêndio criminoso. O sinistro teve conseqüências que atualmente ainda se

fazem sentir, pois que foram reduzidos a cinzas os arquivos e a preciosa biblioteca, em cujas

estantes se alinhavam raridades de renomados juristas.430

Em 1930 houve a dissolução de todos os órgãos legislativos do País. Entretanto, o Poder

Judiciário Federal e dos Estados continuaram a ser exercidos de acordo com as leis em vigor,

ressalvadas algumas restrições, dentre elas a da exclusão da apreciação pelo Judiciário dos

decretos e atos do Governo Provisório e dos interventores federais. Com a nova Constituição

Federal de 1934 se dispôs que competia aos Estados, com observância dos princípios nela

estabelecidos, legislar sobre sua divisão e organização judiciárias. Quanto à Magistratura, a

investidura nos primeiros graus efetuar-se-ia mediante concurso organizado pela Corte de

Apelação, denominação que veio a ser atribuída ao então Superior Tribunal do Estado. Foi

nessa Constituição que se veio a estabelecer que, na composição dos Tribunais Superiores,

seriam reservados lugares correspondentes a um quinto do número total para que fossem

preenchidos por advogados e por membros do Ministério Público. Foi, também, a Carta de 34

que dispôs ser, ao Juiz, vedada atividade político-partidária.431

Em 1937, com a Constituição desta data, a Corte Suprema voltou a ter a denominação

de Supremo Tribunal Federal, e os Tribunais dos Estados passaram a serem chamados de

Tribunais de Apelação. Com a queda do Estado Novo, e promulgada a nova Constituição 429 HISTÓRIA do Tribunal de Justiça Rio Grande do Sul. Disponível em:

<http://www.tj.rs.gov.br/institu/tj/historia.php>. Acesso em: set. 2007.

430 HISTÓRIA do Tribunal de Justiça Rio Grande do Sul. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/institu/tj/historia.php>. Acesso em: set. 2007.

431 HISTÓRIA do Tribunal de Justiça Rio Grande do Sul. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/institu/tj/historia.php>. Acesso em: set. 2007. Para mais detalhes sobre a magistratura na formação do direito brasileiro ver: LENZA, Vítor Barboza. Magistratura ativa. Goiânia: AB, 2000.

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Federal em 18 de setembro de 1946, o Tribunal de Apelação passou a ter a denominação que

permanece até hoje, Tribunal de Justiça. A principal inovação introduzida por essa

Constituição, no que dizia respeito à Justiça dos Estados, foi a faculdade da criação de

Tribunais de Alçada, que no Rio Grande do Sul foi instalado somente em 1971.432

Foi com a Constituição do Estado do Rio Grande do Sul, promulgada em 1989, que o

Tribunal de Justiça passou a ter autonomia para prover os cargos de Juiz de Carreira da

Magistratura Estadual, sob sua jurisdição, o que até então era prerrogativa do Poder

Executivo. E em 1997, aconteceu a unificação do Tribunal de Justiça e Tribunal de Alçada.

No mesmo ano o Diário Oficial do Estado publicou a Emenda Constitucional nº 22, que

unificou as duas Cortes. Quanto à unificação, de fato, das duas Cortes de 2º grau, ocorreu em

sessão solene realizada no Teatro do Sesi, em 25 maio de 1998, quando 60 magistrados, todos

procedentes do Tribunal de Alçada, foram empossados Desembargadores do Tribunal de

Justiça do Estado do Rio Grande do Sul.433

Neste contexto, a pesquisa foi feita no endereço eletrônico do Tribunal de Justiça do Rio

Grande do Sul através do sistema de pesquisa de jurisprudência do próprio site434. Para

verificar as decisões pertinentes existentes neste tribunal foram usados como expressão de

busca os mesmos critérios usados na pesquisa junto ao Supremo Tribunal Federal: “políticas

públicas de saúde”, “tratamento de saúde”, “tratamento médico” e “fornecimento de

medicamento”. Além do argumento de busca, se restringiu a pesquisa no tempo colocando

como data inicial primeiro de janeiro de 2000 e data final 31 de outubro de 2007 quanto a data

de julgamento.

Para o primeiro argumento, políticas públicas de saúde foi encontrado um único

acórdão435. Para o argumento tratamento de saúde, foram encontrados quinze acórdãos436. Em

432 HISTÓRIA do Tribunal de Justiça Rio Grande do Sul. Disponível em:

<http://www.tj.rs.gov.br/institu/tj/historia.php>. Acesso em: set. 2007.

433 HISTÓRIA do Tribunal de Justiça Rio Grande do Sul. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/institu/tj/historia.php>. Acesso em: set. 2007.

434 PESQUISA de jurisprudência. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/index.php>. Acesso em: dez 2006 a nov 2007.

435 BRASIL. TRIBUNAL DE JUSTIÇA RS. Apelação Cível Nº 70019513431, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Mara Larsen Chechi, Julgado em 27/09/2007. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/ementa.php>. Acesso em: out. 2007. Ver íntegra Anexo O.

436 Ver Anexo P.

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relação ao argumento tratamento médico foram encontrados centenas de acórdãos, tendo em

vista que a página eletrônica do Tribunal somente disponibiliza cem acórdãos por vez se

percebe que o número de decisões com esta matéria equivale a milhares, fez-se então a

pesquisa por ano, na qual em 2000 foram encontradas 45 ocorrências do critério

pesquisado437, em 2001 foram encontrados 16 acórdãos438, no ano de 2002 foram encontrados

22 acórdãos439, no ano de 2003 foram encontrados 100 acórdãos440. No ano de 2004 foram

encontradas 206 decisões441; no ano de 2005 foram verificadas 278 decisões442, em 2006

foram encontrados 536 acórdãos443 e de janeiro a outubro de 2007 foram verificados 515

acórdãos444.

E quanto ao argumento sobre fornecimento de medicamento foram encontrados 4.240

acórdãos445. De todos os argumentos pesquisados o tema fornecimento de medicamento é o

que mais apareceu nas decisões, deve-se frisar que muitas apesar de conterem tal expressão

não diziam respeito exatamente ao tema aqui tratado, por esta razão que nas notas explicativas

só constam a identificação das decisões que tenham relação com a dissertação e os casos

analisados. O tema tratamento médico também se verifica em diversos acórdãos e muitas

vezes ambas as expressões aparecem no mesmo acórdão. Como a análise de todas estas

decisões tornaria o trabalho muito extenso e uma vez que a análise de todas as decisões não se

faz necessária já que as decisões têm um padrão, aqui são analisadas somente algumas

decisões de forma a exemplificar a maneira de como as decisões estão sendo tomadas no

TJ/RS e como seria através da aplicação da Teoria de Alexy.

O único caso em que consta a expressão políticas públicas de saúde é o seguinte:

437 Das quais somente as estão no Anexo Q dizem respeito ao assunto da dissertação.

438 Dentre estes também somente o seguinte está de acordo com o assunto da dissertação: Apelação e Reexame Necessário Nº 70003442274.

439 Dentre os quais, somente estes se enquadram na pesquisa: Apelação e Reexame Necessário Nº 70005152384; Agravo de Instrumento Nº 70003655412; Apelação e Reexame Necessário Nº 70002975829.

440 Dentre os quais somente os que estão no Anexo Q estão entre os pertinentes.

441 Das quais somente as do Anexo Q estão de acordo com o tema da dissertação.

442 Dentre as quais as do Anexo Q tem relação com o tema.

443 Dos quais os do Anexo Q dizem respeito ao tema da pesquisa.

444 Dentre os quais os do Anexo Q tem relação com o tema da pesquisa.

445 Ver Anexo R.

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CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. PROVA. PERÍCIA. IRRELEVÂNCIA. DISPENSA. A dispensa de prova sem pertinência ou relevância não caracteriza violação a nenhum princípio ou regra constitucional ou infraconstitucional. INTERESSE DE AGIR. COMPREENSÃO. O interesse de agir decorre da necessidade de acesso ao judiciário para obtenção do bem da vida, que não pressupõe prévio recurso ou esgotamento da via administrativa. SAÚDE PÚBLICA. MEDICAMENTOS. DISPENSAÇÃO. ESTADO. RESPONSABILIDADE. LIMITES. PRINCÍPIOS DA DESCENTRALIZAÇÃO E HIERARQUIZAÇÃO. DESTINATÁRIOS. POPULAÇÃO CARENTE. À luz dos princípios da descentralização e hierarquização que presidiram a partilha de competências para ações e serviços da saúde entre os aparelhamentos administrativos das diferentes unidades da Federação, ao Estado incumbe a aquisição e dispensação de fármacos constantes das Portarias nº 2.577, de 27 de outubro de 2006 (medicamentos excepcionais), e nº 238, de 17 de maio de 2006 (medicamentos especiais). As políticas públicas de saúde visam assegurar assistência àqueles que não dispõem de recursos próprios para esse fim, em conformidade com os princípios consagrados nos artigos 3º, inciso IV, e 196 da Constituição Federal, e artigo 7º, inciso IV da Lei nº 8.080/90. GRATUIDADE JUDICIÁRIA. DECLARAÇÃO DE POBREZA. PRESUNÇÃO DE CARÁTER RELATIVO. MOSTRAS DE SITUAÇÃO DIVERSA. REVOGAÇÃO DO BENEFÍCIO. A presunção conferida no art. 4º, § 1º, da Lei nº 1.060/50, cede ante a presença de sinais ou mostras de situação diferente da afirmada pelo interessado. APELAÇÕES PROVIDAS.446

Neste caso, se comenta principalmente o princípio da solidariedade explicando que

compete a cada gestor algumas ações no âmbito da saúde, não sendo todos os órgãos

totalmente ou permanentemente responsáveis. Em relação aos acórdãos nos quais a expressão

tratamento de saúde aparece cita-se o seguinte que se refere aos princípios na decisão:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. CID: K 21.0, I 10 E I 20.0. VERAPAMIL 80mg, CLORTALIDONA 50mg, OMEPRAZOL 20 mg e SUSTRATE 10mg. DIREITO À SAUDE. OBRIGAÇÃO DO ESTADO. GARANTIA CONSTITUCIONAL. ART. 196 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. IDOSO. LEI 10.741/2003. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. O art. 196, Constituição Federal, dispõe que a saúde é direito de todos e dever do Estado, devendo serem fornecidos gratuitamente às pessoas desprovidas de recursos financeiros a medicação necessária para o seu tratamento de saúde. Demonstrados os requisitos do art. 1º e 2º, da Lei Estadual nº 9.908/93, necessidade de uso continuado do medicamento requerido, indispensável à vida da autora, assim como falta de condições financeiras para aquisição do fármaco. Negaram provimento ao apelo. Unânime.447

446 BRASIL. TRIBUNAL DE JUSTIÇA RS. Apelação Cível Nº 70019513431, Vigésima Segunda Câmara

Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Mara Larsen Chechi, Julgado em 27/09/2007. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/ementa.php>. Acesso em: out. 2007. Ver íntegra Anexo O.

447 BRASIL, TJ/RS. Apelação Cível Nº 70020524856, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Alexandre Mussoi Moreira, Julgado em 12/09/2007. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/ementa.php>. Acesso em: out. 2007. Ver íntegra Anexo S.

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Nesta decisão são comentados os princípios da legalidade e da interdependência dos

poderes, e se explica que não há violação de nenhum deles, uma vez que se segue o disposto

na Constituição Federal e em leis infraconstitucionais.

Também não há violação ao princípio da independência dos poderes, ante o dever que tem a autoridade judiciária de reparar uma lesão de direito (art. 5º, XXXVI da Constituição Federal). A impossibilidade de ser postergado o dever constitucional de assegurar a saúde (CF, art. 196) e a impossibilidade de dispensar assistência aos desamparados constituem fatores, que, associados à solidariedade humana, enfraquecem e desmerecem os obstáculos levantados pelo Estado do Rio Grande do Sul.448

Outra decisão sobre tratamento de saúde é a seguinte, que não contém os mesmos

argumentos em relação a princípios, mas serve para se verificar como tem acontecido as

decisões sobre este tema, uma vez que a decisão a seguir é de 2004.

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. FORNECIMENTO DE TRATAMENTO. SAÚDE DO CIDADÃO. O fornecimento gratuito de medicamentos (tratamentos) constitui responsabilidade do Estado e do Município. A demora do tratamento/cirurgia por via administrativa põe em risco a vida do agravante, não podendo ele aguardar os entraves burocráticos para ver atendida a sua necessidade. Conheceram do agravo de instrumento e deram-lhe provimento. Unânime.449

Esta decisão diz respeito a cidadão portador de problemas no joelho que procurou a

Secretaria Municipal de sua cidade e foi encaminhado a capital do Estado e depois de dois

anos e 10 meses nada havia sido feito em relação a sua saúde. O agravante explica que não

havia nem mesmo sido examinado.

O relator do processo entende que não há como o agravante esperar pelos entraves

burocráticos para ter seu pedido atendido na via administrativa. E que apesar de nesta via

administrativa não ter tido o pedido negado a inércia pode causar graves danos à saúde do

agravante. Para o relator a obrigação do Estado em auxiliar no tratamento de saúde do

448 BRASIL, TJ/RS. Apelação Cível Nº 70020524856, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator:

Alexandre Mussoi Moreira, Julgado em 12/09/2007. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/ementa.php>. Acesso em: out. 2007. Ver íntegra Anexo S.

449 BRASIL, TJ/RS. Agravo de Instrumento Nº 70009343013, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sergio Luiz Grassi Beck, Julgado em 21/12/2004. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/ementa.php>. Acesso em: out 2007. Ver íntegra Anexo T.

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agravante está garantida pelo exposto nos artigos 196450 e 198451 da Constituição Federal de

1988, bem como no artigo 1º da Lei 9.908/93452.

Desta maneira, se percebe que o Estado e o município devem agir de forma solidária e a

obrigatoriedade ao atendimento dessa política em relação a saúde pública é inegável. A

responsabilidade é, assim, do Estado e do município, que devem garantir saúde aos seus

cidadãos com os meios necessários para tanto.

450 BRASIL. Constituição. Constituição Federal: 1988. São Paulo: Lex, 1988. Art. 196: Art. 196. A saúde é

direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

451 Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes: I - descentralização, com direção única em cada esfera de governo; II - atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais; III - participação da comunidade. § 1º. O sistema único de saúde será financiado, nos termos do art. 195, com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes. (Parágrafo único renumerado para § 1º pela Emenda Constitucional nº 29, de 2000) § 2º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios aplicarão, anualmente, em ações e serviços públicos de saúde recursos mínimos derivados da aplicação de percentuais calculados sobre: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 29, de 2000) I - no caso da União, na forma definida nos termos da lei complementar prevista no § 3º; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 29, de 2000) II - no caso dos Estados e do Distrito Federal, o produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 155 e dos recursos de que tratam os arts. 157 e 159, inciso I, alínea a, e inciso II, deduzidas as parcelas que forem transferidas aos respectivos Municípios; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 29, de 2000) III - no caso dos Municípios e do Distrito Federal, o produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 156 e dos recursos de que tratam os arts. 158 e 159, inciso I, alínea b e § 3º.(Incluído pela Emenda Constitucional nº 29, de 2000) § 3º Lei complementar, que será reavaliada pelo menos a cada cinco anos, estabelecerá:(Incluído pela Emenda Constitucional nº 29, de 2000) I - os percentuais de que trata o § 2º; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 29, de 2000) II - os critérios de rateio dos recursos da União vinculados à saúde destinados aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, e dos Estados destinados a seus respectivos Municípios, objetivando a progressiva redução das disparidades regionais; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 29, de 2000) III - as normas de fiscalização, avaliação e controle das despesas com saúde nas esferas federal, estadual, distrital e municipal; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 29, de 2000) IV - as normas de cálculo do montante a ser aplicado pela União.(Incluído pela Emenda Constitucional nº 29, de 2000)§ 4º Os gestores locais do sistema único de saúde poderão admitir agentes comunitários de saúde e agentes de combate às endemias por meio de processo seletivo público, de acordo com a natureza e complexidade de suas atribuições e requisitos específicos para sua atuação. .(Incluído pela Emenda Constitucional nº 51, de 2006)§ 5º Lei federal disporá sobre o regime jurídico e a regulamentação das atividades de agente comunitário de saúde e agente de combate às endemias. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 51, de 2006) (Vide Medida provisória nº 297. de 2006) Regulamento § 6º Além das hipóteses previstas no § 1º do art. 41 e no § 4º do art. 169 da Constituição Federal, o servidor que exerça funções equivalentes às de agente comunitário de saúde ou de agente de combate às endemias poderá perder o cargo em caso de descumprimento dos requisitos específicos, fixados em lei, para o seu exercício. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 51, de 2006) In: BRASIL. Constituição. Constituição Federal: 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm>. Acesso em: setembro 2007.

452 Art. 1º. O estado deve fornecer, de forma gratuita, medicamentos excepcionais para pessoas que não puderem prover as despesas com os referidos medicamentos, sem privarem-se dos recursos indispensáveis ao próprio sustento e de sua família. Parágrafo único – Consideram-se medicamentos excepcionais aqueles que devem ser usados com freqüência e de forma permanente, sendo indispensáveis à vida do paciente. In: RIO GRANDE DO SUL. Lei ordinário 9.908/93. Disponível em: <http://www.al.rs.gov.br/legis/>. Acesso em: out. 2007.

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Outros casos encontrados foram as decisões que continham a expressão fornecimento de

medicamento.

EMENTA: DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. ANTECIPAÇÃO DA TUTELA DEFERIDA PARA O FORNECIMENTO MEDICAMENTO A PACIENTE PORTADORA DE HEPATITE ¿C¿. IMPOSSIBILIDADE DE AQUISIÇÃO EM FACE DA PROVA DAS DESPESAS NECESSÁRIAS À SUBSISTÊNCIA FAMILIAR. DIREITO À SAÚDE QUE DETÉM PROTEÇÃO ESPECIAL NA CARTA POLÍTICA. LEGISLAÇÃO ESTADUAL SUFICIENTE PARA CONDUZIR AO DEFERIMENTO DA TUTELA ANTECIPADA PERSEGUIDA PELA AGRAVADA. AGRAVO IMPROVIDO.453

Neste caso, se trata de um agravo de instrumento no qual o Estado do Rio Grande do

Sul argumenta que o fornecimento de medicamentos pela Administração não pode ser

indiscriminado. Para o Estado deve haver um controle de técnicos de saúde do Poder Público,

e não de um médico particular - como o que aconteceu no caso em tela. O relator do caso

entende que não é o judiciário que deve desconsiderar o que foi dito por médico particular

somente pelo fato de o médico não ser técnico do poder público.

O entendimento pacífico é de que existe um conjunto de regras que asseguram a cada

indivíduo o acesso à prevenção, proteção e defesa da saúde sob responsabilidade dos Entes

Federados. No caso em tela é citada a lei Estadual (9.908/93) na qual o Estado se compromete

a fornecer remédios excepcionais às pessoas carentes, também são citadas a Lei no.

10.529/95-RS e o art. 24, IV da Lei 8.666/93 – que tratam uma sobre recursos e outra sobre

dispensa de licitação; e finalmente o relator entende que não há ofensa ao princípio da

separação dos poderes.

Há outros casos parecidos como se verifica na decisão à seguir:

EMENTA: DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. FORNECIMENTO DE MEDICAÇÃO A PACIENTE CARENTE E PORTADOR DE GRAVES MOLÉSTIAS. DEVER DO ESTADO REAFIRMADO. Cabível a antecipação da tutela deferida para o fornecimento medicamento Interferon Peguilado e Ribavirina a paciente portador dos vírus do HIV e da Hepatite ¿C¿. Impossibilidade de aquisição por parte do agravado que sequer foi controvertida. Direito à saúde que detém proteção especial na Carta Política. Portaria-MS nº 863/02 que não pode ser utilizada para rejeitar o pedido de fornecimento do medicamento prescrito pelo

453 BRASIL. TJRS. AI Nº 70007321847, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Nelson

Antônio Monteiro Pacheco, Julgado em 12/02/2004. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/resultado.php >. Acesso em: out. 2007. Ver íntegra Anexo U.

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médico do agravado. Legislação estadual suficiente para conduzir ao deferimento da tutela antecipada perseguida pelo agravado. AGRAVO IMPROVIDO.454

O relator no caso em tela se refere expressamente aos artigos 196 e 198 da Constituição

Federal para justificar que se trata de uma discussão de direito fundamental em espécie, que

se sobrepõe a qualquer outro. Neste caso cita-se a portaria no. 863/2002 que define os casos

nos quais deve ser utilizado o medicamento requisitado na demanda – o relator, entretanto,

entende que não deve ser acolhido tal argumento, pois deve-se analisar o caso particular e

verificar as situações do mesmo e avaliações do médico particular. E mais uma vez lança os

mesmos argumentos da decisão anterior455.

No caso a seguir, julgado pela oitava câmara cível o caso ocorre com criança:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. ECA. SAÚDE. FORNECIMENTO MEDICAMENTO. LEGITIMIDADE ATIVA. PEDIDO ADMINISTRAT IVO. SEPARAÇÃO DE PODERES. Legitimidade Ativa. O Ministério Público é parte legítima ativa para propor ação em prol de criança e adolescente. Jurisprudência majoritária, com base na Constituição da República e no Estatuto da Criança e do Adolescente. Pedido Administrativo A inafastabilidade do controle jurisdicional, afirmada no inciso XXXV, do artigo 5º, da Constituição da República, assegura o acesso à justiça, independentemente de esgotamento ou provocação da via administrativa, salvo exceção do § 1º, do artigo 217, da mesma Constituição. Medicamento A condenação do Poder Público para que forneça medicamento ao adolescente, encontra respaldo na Constituição da República e no Estatuto da Criança e do Adolescente. Prequestionamento Pronta indicação de dispositivos legais e constitucionais que visa evitar embargo de declaração com fito de pré-questionamento. NEGARAM PROVIMENTO Á AMBOS OS RECURSOS.456

Percebe-se que o Estado não concordando com a imposição do judiciário em ter que

fornecer medicamentos aos menores apela alegando a ilegitimidade do Ministério Público e

também a impossibilidade financeira do Estado, a interferência na esfera administrativa do

Poder Executivo e a não necessidade de se buscar o judiciário, uma vez que a apelada havia

buscado a via administrativa que seria suficiente. O relator esclarece que apesar de haver o

454 BRASIL. TJRS. A I Nº 70008313165, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Nelson

Antônio Monteiro Pacheco, Julgado em 01/07/2004. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/resultado.php >. Acesso em: out. 2007. Ver íntegra Anexo V.

455 O mesmo ocorre em outros casos decididos pelo mesmo desembargador: Apelação e Reexame Necessário Nº 70008157109; Apelação Cível Nº 70009775503

456 BRASIL. TJRS. Apelação Cível Nº 70016386815, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rui Portanova, Julgado em 05/10/2006. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/resultado.php>. Acesso em nov. 2007. Ver íntegra Anexo W. No mesmo sentido vem a decisão: Apelação Cível Nº 70017598129, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Ari Azambuja Ramos, Julgado em 14/12/2006.

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acionamento da via administrativa a apelada tem o direito assegurado na Constituição ao

acesso à justiça.

Nota-se que o relator se preocupa em referir que o Judiciário está atento aos problemas

financeiros que os Entes Federativos possuem, e que não cabe a este poder discutir a

implementação ou não de políticas públicas, ou até mesmo impor programas ou direcionar

recursos financeiros para um ou outro fim457. O relator enfatiza que o poder judiciário deve

dar efetividade à lei e, assim, quando ela não é observada ou até mesmo desrespeitada o

Judiciário intervém458. A jurisprudência do Tribunal é no sentido da aplicação plena das

normas constitucionais que dizem respeito ao direito à saúde, e que independente de o

beneficiário ser o indivíduo se trata de um direito público.

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO MONOCRÁTICA (ART. 557, CAPUT DO CPC). DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. SAÚDE PÚBLICA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. ILEGITIMIDADE ATIVA. MATÉRIA NÃO ENFRENTADA PELO JUÍZO A QUO. NÃO CONHECIMENTO. ILEGITIMIDADE PASSIVA E CHAMAMENTO AO PROCESSO DO ESTADO. PRECLUSÃO. 1. Não havendo manifestação do Magistrado a quo acerca da preliminar de ilegitimidade ativa suscitada na contestação, deveria o agravante ter se insurgido mediante o recurso cabível (embargos de declaração) no prazo de lei, sendo descabida sua análise em sede de agravo de instrumento, sob pena de indevida supressão de um grau de jurisdição. 2. Quanto à invocada ilegitimidade passiva e chamamento do Estado ao processo merece ser confirmada a decisão recorrida, porquanto, o fundamento do agravo de instrumento nº 70017485442 foi exatamente a ausência de responsabilidade do Município para o fornecimento medicamento que não faz parte da gestão básica de atendimento à saúde de sua responsabilidade, o que equivale à pretensão de ver reconhecida sua ilegitimidade passiva e a necessidade de chamamento do Estado ao

457 Quanto a esta questão há autores com a preocupação de que o acesso ao judiciário só é garantido a poucos, e

há uma diferença quanto aos meios disponíveis para atender as necessidades. Neste sentido ver: AMARAL, Gustavo Direito, Escassez & Escolha. Rio de Janeiro. Renovar. 2001. Assim como: FERRAZ, Octávio Luiz Motta. Direito à saúde, escassez e o Judiciário. In Folha de São Paulo. 10/08/07. e HOLMES, Stephen; SUNSTEIN, Cass R. Il costo dei diritti: perché la libertà dipende dalle tasse. Bologna: il mulino, 2000. Traduzione di Elisabetta Caglieri. Edizione italiana a cura di Carlo Fusaro.

458 Neste sentido: “a justiça distributiva no Brasil. (...) Se até agora sua formação intelectual, ideológica, profissional habilitou-o, com tantas e tantas insuficiências, claro está, a exercer suas funções em casos marcados por disputas de trocas justas ou injustas, hoje o problema principal é o de distribuir justamente as vantagens e desvantagens aos cidadãos todos. Com a devida atenção ao fato de que o Judiciário subordina-se à lei de um lado, e de outro precisa estar preparado para reconhecer os limites e os avanços legais no que diz respeito aos direitos subjetivos à distribuição dos recursos sociais, e com a devida atenção ao que já se pode saber dos efeitos perversos que decisões judiciais podem trazer, seja negando reiteradamente a justiça distributiva, seja reforçando as posições adquiridas sob um regime iníquo econômica e politicamente, há um papel problemático na sua função tradicional”. Em: FARIA, José E. (org.) Direitos humanos, direitos sociais e justiça. 1 ed. 2 tiragem. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 154.

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processo, ora em apreço. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO EM PARTE E, NESTA, DESPROVIDO.459

Na decisão acima se percebe que o entendimento do Tribunal continua no mesmo

sentido, trata-se de um julgamento recente no qual o município agrava da decisão de

antecipação de tutela alegando que é ilegítimo e que o Estado deve ser chamado ao processo,

uma vez que o remédio requerido não está no rol de medicamentos de competência do

município, e assim, violaria o princípio da legalidade e das finanças municipais. Contudo, o

entendimento do tribunal é de que os Entes Federados são co-responsáveis pela assistência à

saúde e é uma obrigação do Poder Público imposta pela Constituição. Desta forma, cabe tanto

ao Estado como ao Município atender a demanda não havendo necessidade de acionamento

de mais de um Ente no processo.

Nota-se que diante de todas as decisões pesquisadas as decisões de uma câmara

chamam a atenção por sua posição, ou melhor, pelo fato do relator da câmara utilizar em sua

posição quanto a tomada de decisões a ponderação demonstrada por Alexy. Trata-se da

Terceira Câmara Cível, da qual foram retiradas duas decisões em que o relator é o professor

Dr. Rogério Gesta Leal. Uma das decisões diz respeito a uma apelação na qual o município de

Caxias do Sul recorre da decisão que estabeleceu o fornecimento de medicamentos a um

paciente.

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO (DIREITO À SAÚDE). AÇÃO ORDINÁRIA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. ILEGITIMIDADE PASSIVA AFASTADA. 1. A promoção da saúde constitui-se em dever do Estado, em todas as suas esferas de Poder, caracterizando-se a solidariedade entre União, Estados e Municípios. Exegese dos arts. 5º, XXXV e 196, ambos da Constituição Federal. Precedentes desta Corte. 2. Comprovadas a enfermidade e a necessidade do tratamento médico, bem como a insuficiência financeira do postulante a arcar com tal despesa, sem prejuízo do próprio sustento, é de ser acolhida a pretensão. PRELIMINAR REJEITADA. NEGADO PROVIMENTO À APELAÇÃO. SENTENÇA CONFIRMADA EM REEXAME NECESSÁRIO.460

Nesta decisão se destaca o princípio da dignidade da pessoa humana e do mínimo

existencial.

459 BRASIL. TJRS. Agravo de Instrumento Nº 70018968008, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS,

Relator: Arno Werlang, Julgado em 21/03/2007. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/resultado.php>. Acesso em: nov. 2007. Ver íntegra Anexo X.

460 BRASIL. TJRS. Apelação e Reexame Necessário Nº 70020870960, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rogerio Gesta Leal, Julgado em 11/10/2007. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/resultado.php>. Acesso em: nov. 2007. Ver íntegra Anexo Y.

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O que está em debate aqui, pelos termos do prisma constitucional, é o que posso chamar de mínimo existencial à dignidade da vida humana: a saúde. Enquanto princípio fundante de todo o sistema jurídico – a iniciar pelo constitucional -, tenho que a vida humana digna espelha e se vincula ao ideário político, social e jurídico predominante no país, ao mesmo tempo em que, na condição de princípio fundamental, em face de sua característica de aderência, ele opera sobre os comportamentos estatais ou particulares de forma cogente e necessária. Por tais razões tenho sustentado que: (a) todas as normas do sistema jurídico devem ser interpretadas no sentido mais concordante com este princípio; (b) as normas de direito ordinárias desconformes à constituição e seus princípios fundacionais (dentre os quais destaco o sob comento), não são válidas.461

A partir desta perspectiva se entende que os Entes Federados devem buscar os meios

necessários para preservar a saúde de seus cidadãos, através de critérios para verificar aqueles

que efetivamente precisam de ajuda para ter suas demandas atendidas. Desta forma, quando se

verifica que há a necessidade e a falta de recursos para o requerente conseguir manter sua

saúde por conta própria a justiça deve atender o pedido. Deste modo, o que se verifica aqui é a

utilização do princípio da proporcionalidade explicado por Alexy.

Na outra decisão, há a mesma ponderação, porém com uma argumentação que vai em

outro sentido, uma vez que neste caso se verifica que a agravante não comprova que sua

família não tem condições de arcar com as despesas dos medicamentos que requer ao Estado.

O desembargador enfatiza que está revendo sua posição do “dever absoluto e exclusivo do

Estado arcar com o fornecimento de medicamentos à população”462.

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO (DIREITO À SAÚDE). AÇÃO ORDINÁRIA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. 1. A promoção da saúde constitui-se em dever do Estado, em todas as suas esferas de Poder, caracterizando-se a solidariedade entre União, Estados e Municípios. Exegese do artigo 196, da Constituição Federal. Precedentes desta Corte. 2. Inexistindo oportunidade prévia para que fosse demonstrado que a família da paciente tem capacidade econômica para custear o tratamento médico, é de ser mantida, no caso concreto, a ordem judicial para que o Estado forneça os remédios pleiteados pela demandante-agravada. 3. Comprovadas a enfermidade e a necessidade dos medicamentos, bem como a insuficiência financeira da postulante para arcar com tal despesa, sem prejuízo do próprio sustento, é de ser acolhida a pretensão. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO.463

461 BRASIL. TJRS. Apelação e Reexame Necessário Nº 70020870960, Terceira Câmara Cível, Tribunal de

Justiça do RS, Relator: Rogerio Gesta Leal, Julgado em 11/10/2007. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/resultado.php>. Acesso em: nov. 2007. Ver íntegra Anexo Y.

462 BRASIL. TJRS. Apelação e Reexame Necessário Nº 70020870960, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rogerio Gesta Leal, Julgado em 11/10/2007. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/resultado.php>. Acesso em: nov. 2007. Ver íntegra Anexo Y.

463 BRASIL. TJRS. Agravo de Instrumento Nº 70020884086, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rogerio Gesta Leal, Julgado em 25/10/2007. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/resultado.php>. Acesso em: nov. 2007. Ver íntegra Anexo Z.

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Neste caso, o município agrava da decisão que concede liminar de fornecimento de

medicamentos e alimentos à totalmente incapaz representada por seus pais. Novamente se

verificam os princípios do mínimo existencial e da dignidade da pessoa humana. No entanto,

se enfatiza a necessidade de verificar a demanda social e universal que existe, ou seja, não se

deve somente atender aqueles que demandam frente ao judiciário, pois se corre o risco de não

se atender os que não entraram na justiça por falta de recursos.

Se a Administração Pública não construiu critérios razoáveis e ponderados para escalonar minimamente o atendimento cada vez mais massivo de perquirições envolvendo o oferecimento de medicamentos, internações hospitalares, tratamentos médico-ambulatorias e cirurgias à população carente, então isto deverá ser feito na esfera da judicialização do debate, ao menos naqueles casos em que a periclitação da vida é tal que se impõe esta intervenção, pois, caso contrário, a satisfação de um problema imediato poderá inviabilizar centenas de outros tão importantes e legítimos quanto este, haja vista que os recursos financeiros e materiais para tanto, é inexorável, são finitos – e ainda sem falar dos demais responsáveis por tal mister.464

A partir disto, se questiona se o Estado é ou deve ser o único garantidor destas

prerrogativas. Deste modo, se estabelece primeiramente o entendimento sobre direito à saúde

utilizado nas cortes brasileiras – ou seja, um direito subjetivo a todos garantido, com

possibilidade de justificar o direito de prestações e que não tem obrigação de resultado a uma

decisão individual. A materialização destas questões depende de diversos fatores, dentre os

quais políticas públicas e orçamento. Assim se chega ao pleito de que a garantia de um

mínimo de segurança social não pode afetar outros princípios ou interesses.

É por esta razão que doutrinadores como Ingo Sarlet são incisivos ao afirmar que o Estado dispõe apenas de limitada capacidade de dispor sobre o objeto das prestações reconhecidas pelas normas definidoras de direitos fundamentais sociais, de tal sorte que a questão da limitação dos recursos constitui um certo limite fático à efetivação desses direitos. De outro lado, o Estado também deve ter a capacidade de dispor destes recursos para o cumprimento daqueles direitos.465

Deste modo, o que o relator sugere é que haja uma ponderação para se verificar de que

forma e até que ponto deve existir esta reciprocidade do Estado quanto aos direitos sociais,

tendo em vista o custo da saúde aos cofres públicos, contudo este argumento não basta para

justificar a não aplicação de recursos e a não implementação de políticas públicas em relação 464 BRASIL. TJRS. Agravo de Instrumento Nº 70020884086, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS,

Relator: Rogerio Gesta Leal, Julgado em 25/10/2007. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/resultado.php>. Acesso em: nov. 2007. Ver íntegra Anexo Z.

465 BRASIL. TJRS. Agravo de Instrumento Nº 70020884086, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rogerio Gesta Leal, Julgado em 25/10/2007. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/resultado.php>. Acesso em: nov. 2007. Ver íntegra Anexo Z.

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à saúde. A saída seria “fazer uma leitura integrada do dever estatal para com o universo que

ele alcança”466, isto é, analisar o caso e verificar as co-responsabilidades societais – o dever da

família, da sociedade e do Estado. A Constituição Estadual do Rio Grande do Sul estabelece

que o indivíduo e sua família devem participar no custeio da saúde pública, há também uma

lei-RS 9.908/93 que estabelece ainda o fornecimento de medicamentos especiais ou

excepcionais aos cidadãos que comprovem estado de carência e também de sua família.

Penso que a Constituição Estadual do Rio Grande do Sul precisa ser interpretada conforme à Constituição Federal, no sentido de ratificar este sentido solidarístico que chama à responsabilidade a família para contribuir na mantença do sistema republicano e federativo de saúde, dando sua quota-parte, seja ela qual for, na medida de sua possibilidade e diante da necessidade do parente enfermo.467

Ou seja, há um liame de solidariedade não só entre os Entes federados como também

em relação a família e aos indivíduos. Se tornando incumbência de todos encontrar um modo

de transigir sobre os desafios da saúde. No entanto, neste caso concreto como não havia

ordem anterior quanto à comprovação de capacidade econômica da família o agravo foi

desprovido, para a manutenção da liminar.

Em face do exposto, se percebe que na maior parte das decisões pesquisadas já não se

discute a responsabilidade do Estado pelo fornecimento de medicamentos ou tratamentos,

tampouco se exclui a responsabilidade do Poder Público pelas alegações de prejuízo ao

orçamento; ofensa à independência dos Poderes; ou ofensa à lei de licitações. No entanto, as

decisões também mostram que o Judiciário se preocupa em atuar através de dois guias: o

princípio da reserva do possível468 e os critérios de repartição das competências. 469 O que se

466 BRASIL. TJRS. Agravo de Instrumento Nº 70020884086, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS,

Relator: Rogerio Gesta Leal, Julgado em 25/10/2007. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/resultado.php>. Acesso em: nov. 2007. Ver íntegra Anexo Z.

467 BRASIL. TJRS. Agravo de Instrumento Nº 70020884086, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rogerio Gesta Leal, Julgado em 25/10/2007. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/resultado.php>. Acesso em: nov. 2007. Ver íntegra Anexo Z.

468 Em relação à reserva do possível e sua aplicação no Brasil ver: KRELL, Andreas J. Direitos sociais e controle judicial no Brasil e na Alemanha: os (des)caminhos de um direito constitucional "comparado". Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris, 2002. p. 51 a 57.

469 “Na prática, sucede que os limites da reserva do possível não são tão cristalinos, exigindo da autoridade judiciária uma análise que dê á questão um certo grau de objetividade, de modo a que se estabeleça um critério “justo”. Destarte, inclino-me pelo entendimento de que o Estado (gênero), não é responsável por todo e qualquer serviço relativo à saúde, mas apenas por aqueles a que ele, por meio da legislação infraconstitucional e normas administrativas, expressamente se obrigou, com base em opções políticas daqueles a quem cabe a elaboração, aprovação e execução das políticas orçamentárias (Poder Legislativo e Poder Executivo), a respeito das quais não cabe ao Judiciário se manifestar, sob pena de invadir, sem motivo,

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vê, como no caso desta última decisão analisada é que se começa a questionar esta

responsabilidade absoluta do Estado em fazer prestações no âmbito da saúde. No entanto, se

frisa que em cada uma das decisões sempre se atém a real necessidade do demandante.

Ou seja, o judiciário se preocupa em não ofender aos outros poderes com suas decisões

sempre prezando pela melhor satisfação dos direitos dos demandantes, sem ofender as

disponibilidades dos outros poderes. Mais do que se basear em princípios constitucionais o

Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul se baseia em leis infraconstitucionais bem como em

portarias que estabelecem, por exemplo, uma lista de medicamentos que cabe ao Estado ou ao

Município prestar a população – evitando a responsabilização de um Ente enquanto cabe à

outro fazê-lo. E em relação à assistência médica existem normas que estabelecem uma

responsabilidade provisória do Estado, enquanto o Município não possuir a gestão do sistema

municipal.

Desta forma, pode-se dizer que a utilização da Teoria dos Direitos Fundamentais de

Alexy viria para complementar a justificação dos acórdãos no Tribunal de Justiça. Sendo um

modo adicional para justificar a proteção a um princípio de direito fundamental. As decisões

não mudariam, pois todas analisam as especificidades do caso concreto e ponderam sobre as

situações que ali aparecem. Percebe-se que o princípio fundamental do direito à saúde

prevalece nas mesmas e a proteção do direito à vida é mais importante quando confrontado

com as questões financeiras do Estado.

Alexy traz passos da ponderação tornando possível emitir juízos racionais sobre as

intensidades das intervenções nos direitos fundamentais, assim como sobre os graus de

o mérito do ato administrativo discricionário e, conseqüentemente, ferir o princípio da separação dos Poderes, previsto pelo artigo 2º da Constituição Federal. Sabidamente, é dever do Poder Judiciário analisar minuciosamente toda exigência que despenda recursos econômicos do Poder Público. O Poder Judiciário, diante da carência de recursos para atender a todos os direitos fundamentais constitucionais, os quais em sua maioria implicam em prestações positivas, deve procurar preservar, sempre que possível, a vontade do Administrador Público, sob pena de prejudicar, ou até mesmo inviabilizar, o sistema público de saúde, educação etc.” [...] “Se por um lado os limites da reserva do possível não são tão cristalinos, por outro, definir-se os limites da competências de cada entre público no âmbito da saúde não é tarefa complexa. [...]Ocorre, entretanto, que há em nosso ordenamento jurídico normas infraconstitucionais que regulamentam o sistema público de saúde, versando sobre a repartição de competências e atribuições, com o objetivo de descentralizar os serviços, garantindo, assim, uma maior efetividade às políticas públicas destinadas ao atendimento das necessidades de saúde da população. Veja-se, nesse sentido, a Lei 8.080/90, em âmbito Federal, e a Lei 9.908/93, em âmbito Estadual, sem falar nas inúmeras normas de caráter administrativo.” BRASIL. TJRS. Apelação Cível Nº 70020354171, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ricardo Raupp Ruschel, Julgado em 24/10/2007. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/ementa.php>. Acesso em: nov. 2007.

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importância da satisfação dos princípios, e sobre a relação que existe entre um e outro. E os

direitos fundamentais, entendidos como princípios, admitiriam tudo, com exceção de meios

ilegítimos através dos sub-princípios de adequação e necessidade. A teoria dos direitos

fundamentais defende que a ponderação não é um procedimento que conduz cada caso a um

único resultado. Desta forma, com a ajuda da ponderação em alguns casos se pode estabelecer

um resultado de maneira racional, através de juízos racionais sobre as intensidades das

intervenções nos direitos fundamentais e sobre os graus de realização dos princípios. A

ponderação deve ser vista do ponto de vista dos princípios da proporcionalidade: verificando a

adequação, necessidade (ou exigibilidade) e a proporcionalidade em sentido estrito.

Ou seja, o Tribunal de Justiça cumpre os passos da ponderação, pois quando se utiliza

dela é necessário especificar o caso concreto, colocando as circunstâncias do caso que são

relevantes à decisão, e que têm um papel central na lei de colisão, tendo em vista que a

importância concreta do princípio depende das circunstâncias do caso. Isto é, os elementos do

caso concreto que importam e fazem a diferença na decisão, uma vez que especificam a

medida examinada e quais as conseqüências para os princípios relacionados. Para se

determinar a importância da satisfação de um princípio se deve verificar seu sentido contrário,

ou seja, o que significaria para um direito se a intervenção no princípio fosse omitida ou não

fosse executada.

Com este ferramental hermenêutico ao menos se pode aferir com maior fundamentação e argumentação públicas – que se submetem à interlocução entre as partes envolvidas no feito, inclusive para fins decisionais e recursais – quais as razões de justificação da intervenção judicial no âmbito da saúde.470

Apesar de, na sua maioria, não o fazerem explicitamente, se percebe que a ponderação

ocorre implicitamente nos julgados. A Teoria dos Direitos Fundamentais de Alexy traz

critérios que vinculam a ponderação e a argumentação jurídica racional. Assim o modelo

estrutural de ponderação é importante, pois provoca um avanço em relação à argumentação

jurídica uma vez que traz dados através dos quais se pode fundamentar a argumentação

jurídica. E coloca nas decisões argumentos no sentido de justificar a utilização de um

princípio ou outro. O modelo de Alexy, assim, estabelece estruturas para justificar as

valorações e para saber como trabalhar com elas, o que torna a fórmula adequada e funcional

470 LEAL, Rogério Gesta. A efetivação do direito à saúde por uma jurisdição serafim: limites e possibilidades.

Revista do Direito, Santa Cruz do Sul, n.25 , p.89-104, jan./jun. 2006.

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para a argumentação jusfundamental. Haja vista que se estabeleceu um modelo para

classificar e relacionar as variáveis relevantes para a ponderação jurídica – o cumprimento de

cada princípio, a certeza das premissas empíricas, e o peso abstrato dos princípios opostos.

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CONCLUSÃO

A partir da pesquisa se percebe que a Teoria dos Direitos Fundamentais de Robert

Alexy é uma teoria que procura dar respostas racionalmente fundamentadas a questões que

dizem respeito aos direitos fundamentais. Esta teoria tem o objetivo de ser um instrumento de

ajuda aos tribunais para deixar as decisões mais concretas e melhor fundamentadas. Para

Alexy, uma vez que a positivação dos direitos fundamentais fez com que houvesse uma

abertura do sistema jurídico em relação ao sistema moral, este pode ser colocado em prática

com meios racionais, que Alexy traz através de sua teoria.

O estudo possibilita, deste modo, a verificação do que se entende por direito válido e

como se dá a utilização de premissas empíricas na argumentação jurídica. Com esta teoria se

pode expor melhor os pontos de vista. Através dela se tem uma melhor compreensão de toda

estrutura dos direitos fundamentais, ou seja, os conceitos, a influência dos mesmos e sua

fundamentação, pois para conseguir uma fundamentação clara deve-se ter um entendimento

objetivo de toda a estrutura dos direitos fundamentais e de suas normas.

Desta maneira, a teoria de Alexy também se preocupa em esclarecer a estrutura dos

direitos fundamentais para então demonstrar como é feita sua aplicação. Alexy trabalha, com

base na estrutura dos direitos fundamentais, o conceito de norma, e como ela pode ser

considerada válida ou inválida. Isto é, conforme a explicação de Alexy, normas de direito

fundamental são aquelas expressamente ditadas pela constituição ou por ela atribuídas como

tal. Tendo em mente o que é uma norma de direito fundamental Alexy passa então a

diferenciar regras de princípios para se entender melhor a estrutura dos referidos direitos.

A diferença entre regras e princípios é gradual e qualitativa e para diferenciá-los os

princípios devem ser entendidos como mandatos de otimização. Ou seja, são normas mais

gerais que dependem das possibilidades e circunstâncias para sua aplicação, enquanto as

regras devem ser aplicadas quando são válidas. A diferença entre regras e princípios é vista

com mais freqüência quando existe um conflito ou colisão. Em caso de conflito de regras há

dados específicos que possibilitam a escolha de uma em detrimento de outra, enquanto que

em relação aos princípios se deve fazer uma ponderação para verificar qual é o melhor no

caso concreto. Estes princípios, então, podem ser considerados como valores constitucionais.

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Os princípios, diferentemente das regras, não possuem só conseqüências normativas ou

possuem uma hipótese de incidência aberta. Ou seja, os princípios também possuem uma

conseqüência normativa, esta que é a finalidade à qual o princípio se refere e que deve ser

julgada relevante diante do caso concreto. Além disso, quando se entende como verdadeira a

afirmação segundo a qual tanto as regras quanto os princípios não regulam a sua própria

aplicação, como sustenta Alexy, então se percebe que não são os princípios que possuem uma

dimensão de peso, mas sim suas razões e fins aos quais eles fazem referência. A maioria dos

princípios não diz nada sobre o peso das razões, mas é a decisão que lhes atribui um peso em

função das circunstâncias do caso concreto. Assim, a dimensão de peso não é atributo abstrato

dos princípios, mas sim qualidade das razões e dos fins a que eles fazem referência, cuja

importância concreta é atribuída pelo aplicador. A dimensão de peso não é um atributo

empírico dos princípios, justificador de uma diferença lógica relativamente às regras, mas

resultado do juízo valorativo do aplicador.

No que diz respeito à diferença entre o conflito entre princípios e aquele entre regras se

tem presente que a solução de um conflito entre princípios consiste em atribuir prioridade a

um deles, sem que o outro seja considerado inválido, ou melhor, a eliminação da

inconsistência normativa ocorre sem a declaração de nulidade de uma das normas envolvidas.

Entretanto, esta característica dos princípios é válida somente na hipótese de os princípios

estabelecerem fins excludentes. Nas situações em que eles se dirigem para a uma mesma

relação, apontando para o mesmo fim, mas com a implementação de meios diversos, se deve,

então, declarar a prioridade de um princípio sobre outro com a conseqüente não-aplicação de

um deles para aquele caso concreto. A solução é idêntica à dada para o conflito entre regras

com determinação de uma exceção, hipótese em que as duas normas ultrapassam o conflito

mantendo sua validade.

Os princípios podem se referir tanto a direitos individuais quanto a direitos coletivos.

Alexy sugere então um modelo combinado entre regras e princípios, uma vez que a maioria

das disposições de direitos fundamentais possui um caráter duplo, principalmente quando uma

norma possui uma cláusula restritiva que se refere a princípios. A ponderação dos princípios

está sujeita ao arbítrio daqueles que a realizam. Através da ponderação se tem critérios que a

vinculam com a argumentação jurídica. Pois se pode compreender pela valoração melhor o

direito outorgado aos cidadãos, principalmente quando uma norma deixa aberta margem a

questões de direito subjetivo, por exemplo, quando obriga o Estado a realizar uma ação.

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O direito fundamental é visto, por Alexy, como um catálogo de posições com diferentes

conteúdo e forma. E o autor acredita que é importante especificar o status deste catálogo para

identificar suas restrições. Para se verificar quais as normas são restritivas ou não, é preciso

verificar a relação desta norma com o direito fundamental. Isto é feito através da ponderação,

orientada pelo princípio da proporcionalidade. Sempre que há a necessidade deve ser usado

referido princípio para melhor fundamentar as restrições que possam existir frente ao direito

fundamental.

Percebe-se que o tribunal possui um limite de atuação de que está conforme ao que é

devido pelo Estado e fixado no direito fundamental, podendo influir inclusive na interpretação

do direito privado. Uma posição jusfundamental correta depende de uma argumentação

jusfundamental, que pode ser caracterizada como uma argumentação jurídica geral com

termos de lei, precedente e dogmática. Ou seja, a argumentação deve se sujeitar à lei, uma vez

que as disposições jusfundamentais vinculam a argumentação jusfundamental; os precedentes

atuam como um controle racional da fundamentação jusfundamental; e as teorias são a base

para a argumentação jusfundamental, sendo possibilitada pela teoria dos princípios – ou seja,

pela ponderação, na qual se verifica e justifica o cumprimento de um e o não cumprimento de

outro.

Alexy entende que não há como formular uma resposta correta para cada caso, pois esta

teoria possibilita o estabelecimento de uma ordem de relações concretas de prioridade que

expressam o peso dos princípios em determinado caso. Isto porque criar uma teoria que

trouxesse uma solução de cada caso exigiria a criação de uma lista completa e concreta de

regras para todo e qualquer caso que se pudesse imaginar – o que seria impossível, tendo em

vista a mudança contínua de comportamentos e evolução da sociedade.

Esta teoria, por ser geral e trazer critérios de ponderação, garante a fundamentação de

decisões através da razão prática vinculando a argumentação e a decisão de uma forma

racional. Para tanto, Alexy estabelece critérios de como utilizar os mandatos de otimização.

Tais critérios servem para justificar a tomada de decisões pelos tribunais, fazendo então que

os princípios se otimizem. Alexy acredita que a constituição pode ser compreendida como

ordem marco e ordem fundamental e o problema surge quando a própria constituição não

proíbe nem ordena que o legislador faça algo. Para resolver tal polêmica se usam os campos

de ação, sendo que Alexy explica o campo de ação estrutural e o epistemológico.

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No campo de ação estrutural se verificam os campos da fixação de fins, da eleição de

meios e o da ponderação. Ou seja, o primeiro ocorre quando o próprio legislador pode

escolher os fins que justifiquem sua intervenção em um direito fundamental – geralmente os

que têm relação com bens coletivos. O segundo caso acontece quando as normas de direito

fundamental proíbem uma intervenção e ordenam condutas positivas. E, por fim, o campo da

ponderação se dá quando a decisão depende então da ponderação e escolha de quais meios

favorecem ou prejudicam os princípios que estão sendo analisados.

A teoria dos princípios estabelece como se deve entender a ponderação, que é melhor

entendida através dos sub-princípios da proporcionalidade, ou seja, a adequação, a

necessidade e a proporcionalidade em sentido estrito. Isto é, o sub-princípio da adequação é

um critério negativo através do qual se pode estabelecer que meios não são adequados para

chegar ao fim determinado por um princípio jurídico. O sub-princípio da necessidade faz com

que se escolha, entre os meios adequados, o meio mais benéfico ao direito fundamental em

questão. E como estes dois sub-princípios não trazem respostas fáceis, entra em jogo o

terceiro sub-princípio, que é o da proporcionalidade em sentido estrito e que explica melhor

como fazer otimização na ponderação. Neste contexto, primeiro se define o grau de não

satisfação ou de afetação de um dos princípios; então se define a importância de satisfação de

um princípio oposto; e assim se verifica e se define se a importância da satisfação do princípio

contrário justifica a afetação ou a não satisfação do outro.

Desta forma, se pode emitir juízos racionais sobre a intensidade das intervenções nos

direitos fundamentais. Com isso, Alexy entende que através da formulação de uma escala com

graus de intensidade se pode ponderar melhor sobre as razões de justificação para uma

intervenção ou não. A aplicação dentro de um marco de argumentação possibilita a criação de

limites à atuação do Estado de forma racional. A importância do princípio depende de cada

caso concreto. A partir disto, então, se pode verificar a intensidade de intervenção; a

importância do princípio oposto e qual das duas posições deve prevalecer no caso concreto.

Portanto, o peso concreto do princípio deve ser verificado em cada caso concreto.

Outra especificidade da lei da ponderação é que quanto mais intensa é a intervenção em

um direito fundamental, maior deve ser a certeza das premissas que sustentam esta

intervenção. O peso da intervenção é constatado com a fórmula que Alexy traz em suas

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explicações, ou seja, o resultado da divisão da intensidade da intervenção e do peso abstrato

do princípio.

Assim, Alexy entende que as Constituições que têm um catálogo de direitos

fundamentais têm o escopo de garantir uma organização da ação coletiva e assegurar direitos

individuais, possibilitando que o legislador restrinja os direitos fundamentais, dentro de seu

campo de ação. Ele atua principalmente quando há uma insegurança normativa. Percebe-se

desta forma que a teoria de Alexy tem uma funcionalidade prática, pois traz a possibilidade de

justificação dos resultados da ponderação através de disposições decorrentes da racionalidade

prática. Através desta ponderação se pode resolver conflitos baseando-se em uma

argumentação jurídica racional. Ou seja, é um modelo que classifica e relaciona variáveis

relevantes para a ponderação jurídica.

Como um contraponto à teoria de Alexy se expõe as críticas e perspectivas de Habermas

e Dworkin. O ponto forte da crítica de Habermas é quanto à perda da força dos direitos

fundamentais, que seria acarretada pela otimização feita através dos princípios. Este autor

defende que os direitos fundamentais acabam perdendo sua firmeza, e a ponderação coloca

em risco esta força que tais direitos têm porque submete-os a juízos por ele considerados

irracionais.

Habermas acredita que a formação de opinião depende de discurso e negociação e não

somente de discursos morais. Mas o que Alexy defende é o uso de princípios baseados em

direitos constitucionais e ponderados de acordo com cada caso e não o uso de condições

morais. Para Habermas, para haver a justificação e a aplicação de normas há a necessidade de

haver a orientação por princípios específicos. Ou seja, em relação à justificação se buscaria a

elaboração de normas válidas – e se considera todos os interesses dos afetados por

determinada norma. A diferença com o que trata Alexy é que neste caso se selecionam fatos a

partir de uma característica comum com outras hipóteses compreendidas como relevantes e

não a partir de um aspecto particular de cada situação. O caso específico aqui não traz

contribuições para a verificação da validade de uma norma geral e abstrata. E quanto ao

discurso de aplicação é nele que a norma válida é complementada com o caso concreto

verificando suas circunstâncias do caso concreto. No discurso da aplicação Habermas usa

também o conceito de adequação quando a norma deve se adequar ao caso específico e ser

aceita como legítima por todos os interessados.

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A discordância principal entre Habermas e Alexy acontece em relação à colisão de

princípios e a ponderação dos mesmos. Para Habermas a determinação de uma norma

adequada a um caso não passaria pelo processo de ponderação de valores, enquanto que para

Alexy a colisão entre princípios é resolvida através da ponderação, que de certa forma utiliza

valores para ser solucionada. Para Habermas, a utilização de determinados critérios para

resolver esta colisão não traria uma justificação adequada. Este autor defende a solução do

conflito através de uma melhor fundamentação da norma aplicada ao caso. Habermas fala em

coerência e não de opção valorativa entre princípios. E Alexy vai além e diz que não há

ponderação de princípios sem coerência.

Para Habermas o problema da ponderação e consequentemente da otimização dos

princípios é o afastamento da estrutura binária de validade das normas, o que acarretaria na

retirada da estrutura de dever-ser que os direitos fundamentais possuem. Habermas entende

que os princípios devem ser levados em consideração quanto à adequação a uma realidade

material, ou seja, seriam pontos de partida da realidade que são desenvolvidos pela

argumentação no processo de interpretação, e assim não podem ser interpretados como

valores em mandatos de otimização.

Para Habermas o apoio em valores torna o Tribunal autoritário, pois valores são,

conforme sua concepção, teleológicos, se referindo a comportamentos recomendados

enquanto as normas exigem uma justificação mais racional. A ponderação de valores traz o

problema da relativização da decisão, que dependerá da cultura estabelecida em uma

comunidade. E a decisão a partir de valores leva a uma solução recomendável e não a algo

mais certo, se fossem usadas somente as normas. Este autor acredita, então, que só se pode

atingir satisfatoriamente a interpretação e os princípios jurídicos por uma teoria do discurso

quando todo o processo de legislação for analisado.

A jurisprudência, oriunda de ponderação de princípios e que utiliza valores traz para

Habermas o problema de que as questões não são esclarecidas, são feitas somente

interpretações falsas. Habermas entende que a otimização e ponderação de valores é uma

concepção aberta que precisa de uma complementação para possibilitar sua execução. E o que

seria um método mais eficaz para a interpretação seria a teoria do discurso. Através da teoria

do discurso e da teoria da aplicação se poderia encontrar melhor a solução para casos

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concretos, não se destacando qualquer princípio constitucional ou geral do Direito, mas

aplicando-os de modo relativo e dependendo das necessidades de cada caso concreto.

Dworkin, por sua vez, não traz uma crítica propriamente à teoria de Alexy, entretanto

estabelece alguns pontos que devem ser considerados. Deste modo se verifica que Dworkin

procura em sua teoria trabalhar a partir de uma interpretação construtiva. Com ênfase no

momento no qual se aplica a teoria. O primeiro aspecto que se percebe é que Dworkin faz

uma crítica forte ao positivismo usando os princípios como sistema de aplicação da

argumentação.

Dworkin se preocupa em especificar a diferença entre regras e princípios, para

possibilitar a melhor decisão em caso de colisão de regras e conflito de princípios. Alexy se

baseia em Dworkin para elaborar sua teoria. Isto é, para Dworkin as regras são aplicadas de

forma “tudo-ou-nada”, ou seja, ela é válida ou inválida. Por outro lado, os princípios são

considerados fundamentos para a decisão, tendo uma dimensão de peso. Dworkin utiliza

critérios de interpretação construtiva, que ajusta melhor os princípios ao sistema jurídico. Ou

seja, os princípios servem para fundamentar a decisão.

A partir desta diferenciação entre regras e princípios Dworkin se baseia no conceito de

integridade para atribuir legitimidade ao sistema jurídico. Ou seja, a integridade do direito

deve ser preservada e os princípios que serão reconhecidos dependerão da manutenção desta

integridade – através de justiça, imparcialidade e igualdade. Desta forma, se chegará a uma

resposta correta para o caso. A integridade é aplicada como justificação dando uma coerência

tanto à legislação quanto às decisões judiciais.

Continuando no assunto da diferença entre regras e princípios, os princípios são

proposições que descrevem direitos vindos de padrões de valores. Os princípios seriam

usados então para fundamentar decisões e principalmente quando normas e precedentes não

fossem suficientes para a solução do caso concreto. Em sua teoria Dworkin também trabalha o

tema da política, que teria relação com o estabelecimento de objetivos a serem alcançados,

tendo vinculação com fins específicos aos quais se propõe.

Neste contexto, os direitos são provenientes tanto da história quanto da moralidade.

Para aplicação de sua teoria e o autor explica que acredita na existência de um juiz que tenha

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capacidades e competências para escolher a interpretação de cada caso concreto de acordo

com o filtro da integridade, usando as decisões do passado e se baseando no melhor princípio

para justificar o que escolher. Para cada caso concreto existe somente uma resposta correta, e

esta resposta correta deve ser aplicada principalmente em hard cases, fazendo uma

fundamentação através de princípios individualizados e estabelecendo o conteúdo moral de

sua decisão.

Para Dworkin o sistema de princípios é estabelecido com a interpretação das práticas

sociais. A diferença entre regras e princípios está fundada na interpretação e principalmente

na direção à qual levam. As regras ou são aplicadas ou não são e os princípios exigem uma

aplicação ou não. Entretanto, Alexy argumenta que Dworkin não esclarece muito bem como

ocorre esta ponderação, e questiona como seria possível a determinação de uma única

resposta correta através desta teoria. Assim, Dworkin esclarece que existem variações da

teoria dos princípios, isto é, uma considerada fraca, que forneceria relação de prioridade entre

os princípios e outra forte que, além dos princípios, traria prioridades abstratas e concretas

entre eles.

A idéia de única resposta correta é uma idéia regulativa, que se pode entender quando,

em alguns casos, possa existir uma única resposta correta, não se sabendo em quais, o que

estimula a procura pela única resposta correta em cada caso. À resposta correta se chegaria

através da integridade do direito, devendo o juiz se manter aberto e sensível ao caso. Dworkin

faz uma análise de como as convicções morais dos juízes podem influenciar esta tomada de

decisão. Também se deve ater em quais pontos de uma teoria que a questão da moralidade e

de seu papel pode ser levantada – verificando os estágios de uma teoria que possam oferecer

uma relação compreensível de quais questões são verdadeiras no caso. Para Dworkin não é

bem claro como poderia ser criada esta teoria. No entanto, ele acredita que a partir da criação

de conceitos que fossem compartilhados por algumas pessoas se poderia estabelecer critérios

para a correta aplicação de determinado termo.

Dworkin interpreta a prática a partir de valores que melhor justificam tal prática. Para

este autor a hipótese valorativa possuiria um caráter trivial e seria necessária para verificar em

que as teorias entram em desacordo. Explicando um pouco como acontece a interpretação o

autor fala do debate doutrinário que constrói condições verdadeiras através de valores

identificados na jurisprudência. Sem dúvida a interpretação é complexa, e precisa ser

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justificada através de práticas e procedimentos. A moralidade, para Dworkin, teria um papel

essencial na teoria, porque apesar de as decisões deverem ser tomadas através de regras, há

momentos nos quais se aceita que o juiz decida para evitar uma injustiça ou ineficácia com

base em uma obrigação moral.

Dworkin comenta diversos tipos de teorias existentes: pragmatismo jurídico; pluralismo

moral; e positivismo político doutrinário. O pragmatismo jurídico defende a solução de casos

em consideração com as conseqüências que a decisão acarreta no futuro, não importando as

práticas passadas. E a partir destas teorias, sendo que as outras duas negam a utilização da

moral nas decisões, Dworkin explica que a jurisprudência deve ser vista como questões

morais em relação ao sentido e que elas deveriam dar a última palavra em nossas vidas.

Para esclarecer suas idéias sobre a resposta correta o juiz Hércules Dworkin traz

argumentos de como os pragmáticos atuam, e também qual o papel de uma teoria no

raciocínio e na prática jurídica. O autor também demonstra algumas opiniões contra o uso da

teoria moral na argumentação jurídica. Sempre reforçando a idéia do conceito de integridade

,que para ele é muito importante. Dworkin acredita que os juízes não deveriam decidir através

de um algoritmo ou processo lógico ou formal que levaria a uma decisão correta, mas sim

deveriam levar em conta as conseqüências de suas decisões, sendo guiados por princípios

mais do que por suas preferências pessoais ou políticas.

Para tanto, é necessário manter a integridade do texto constitucional, no entanto isto não

quer dizer que esta fidelidade esgote a interpretação constitucional. Os princípios morais estão

vinculados à história e precedentes. Nos Estados Unidos Dworkin acredita que o que contribui

para a moralidade política é a parceria de auto-governo possibilitada por uma constituição

moral que admite que indivíduos se tornem membros e requeiram a juízes o reforço das

garantias de cidadania igualitária e todos estejam comprometidos com uma estratégia

institucional.

Portanto, Dworkin entende que se deva fazer uma análise do caso de forma que tenha

relação com a prática e valores e princípios morais compartilhados pelos atores envolvidos

nos casos. Uma forma de saber quais são os valores compartilhados por determinados agentes

é verificar e distinguir diferentes conceitos sobre o direito. Dworkin explica que os conceitos

são importantes para se verificar a função do pensamento e do discurso daqueles que atuam

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nesta área, pois, se estabelecendo concepções que sejam usadas por todos e de igual forma

possibilita-se o desenvolvimento de procedimentos adequados para se obter uma justiça

substancial.

Portanto, com toda esta discussão sobre conceitos, Dworkin quer dizer que valores

morais são levados em consideração e usados como justificação e embasamento para decisões

judiciais. Sua idéia é se opor à idéia de que o direito seria um conjunto de padrões

estabelecidos de qualquer tipo, e trazer algumas considerações que deveriam ser levadas em

conta pelos operadores do direito. Ou seja, Dworkin não quis apenas dizer que o direito

possui regras e princípios.

Depois de analisada a teoria de Robert Alexy, bem como as críticas e perspectivas de

Jürgen Habermas e Ronald Dworkin, se passa à aplicação da teoria de Alexy no âmbito do

direito à saúde trazendo como forma exemplificativa o estudo de alguns casos

jurisprudenciais das cortes brasileiras, isto é do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal de

Justiça do Rio Grande do Sul.

No terceiro capítulo se verificaram as dimensões aplicativas da teoria dos direitos

fundamentais de Alexy no âmbito do direito à saúde. Para se chegar ao estudo de casos

especificamente se fez uma introdução sobre o que se entende por políticas públicas no direito

brasileiro, assim como se expôs um pouco sobre o fenômeno da judicialização da política. As

políticas públicas são, assim, respostas do Estado às demandas sociais. Tais respostas se dão

através da execução e implementação de leis no âmbito das necessidades da população. As

políticas públicas podem ser geradas tanto pelo Estado como também por outras instituições

não estatais. A Constituição estabelece alguns princípios segundo os quais as políticas

públicas devem ser norteadas, tais como o mínimo existencial e a dignidade humana.

Quando não há a implementação de políticas públicas os cidadãos atingidos acionam o

poder judiciário. E chega-se a expressão judicialização das políticas públicas quando se

utilizam procedimentos judiciais para serem resolvidos conflitos de ordem política. Este

termo também pode se referir ao controle da Constituição, exercido tanto de forma

concentrada, pelo STF, quanto de forma difusa, pelos Tribunais de Justiça dos Estados. Pois

quando se faz este controle há a interferência em decisões políticas, o que não quer dizer que

o Juiz tenha o poder de legislar.

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Enfatiza-se que a judicialização da política não é a melhor forma de implementar

políticas públicas, tendo em vista que há sempre neste caso a escolha de uns em detrimento de

outros. O intuito desta dissertação não foi verificar se a implementação de políticas públicas

pelo judiciário é boa ou não, por isso não se entra no mérito da polêmica. O que se quer é

verificar como é feita a solução de casos em relação ao direito da saúde e neste contexto

verificar em que medida a teoria dos direitos fundamentais de Alexy pode ser usada para a

solução de casos específicos.

O Supremo Tribunal Federal é a corte máxima no Brasil, cúpula do poder judiciário,

que tem como competência guardar a Constituição. A pesquisa foi feita através do endereço

eletrônico do Supremo Tribunal Federal, a partir de argumentos de busca, entre eles: políticas

públicas de saúde, tratamento de saúde, tratamento médico e fornecimento de medicamento.

Para se restringir um pouco mais a pesquisa se colocou como data inicial de busca primeiro de

janeiro de 2000 e como data final 31 de outubro de 2007.

Foram encontradas no total 809 decisões entre os termos de busca e dentro da data

mencionada. Algumas destas decisões, apesar de conterem os termos de buscas, não têm

relação com o tema proposto a ser analisado nesta dissertação, as decisões que têm relação

com a dissertação podem ser verificadas nos anexos. Uma vez que a análise de todas as

decisões tornaria o trabalho demasiadamente extenso foram escolhidos somente alguns casos

como forma de exemplificar o tratamento dado à matéria no âmbito do direito à saúde

principalmente em relação ao fornecimento de medicamento e/ ou tratamento de saúde. Desta

forma se coloca em anexo somente a íntegra dos casos que foram analisados, os demais

constam em lista nos anexos e podem ser consultados diretamente no endereço eletrônico do

Supremo Tribunal Federal.

No período analisado não ocorreu nenhum controle concentrado de constitucionalidade

que contivessem os termos de busca utilizados. Através da análise dos casos, se pôde notar

que o que acontece nos casos perante o STF é que os Entes Federados, não concordando com

as imposições de fornecimento de medicamento ou tratamento médico impostas pelos

Tribunais de primeira instância recorrem das decisões para suspender liminares ou mesmo

modificarem as decisões anteriores. Os recorrentes se atêm às questões referentes ao

orçamento exíguo e falta de previsão orçamentária, assim como se baseiam no princípio da

solidariedade entre os Entes para se eximir e chamar outro ente ao processo.

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No entanto, o STF, quando faz a ponderação entre a proteção à saúde e à vida do

cidadão e um interesse financeiro do Estado, tem escolhido garantir a proteção à saúde e à

vida. Ou seja, o direito à saúde é considerado um direito de prerrogativa indisponível, tendo o

poder público o dever de formular e implementar políticas que garantam esta assistência. O

Supremo entende que o Estado tem o dever de fornecer medicamentos a pessoas

hipossuficientes. Diante destes aspectos e se analisando através da teoria de Alexy se verifica

que os casos são analisados de acordo com as possibilidades fáticas e jurídicas. A maioria das

decisões não dispõe explicitamente de princípios em seu corpo, mas as que utilizam avaliam

qual princípio possui peso maior, comparando-o com o princípio oposto.

De certa forma, o STF faz uma otimização entre princípios, entretanto não analisa fatos

em si já que em fase recursal seu papel é verificar a ocorrência ou não de violação da

Constituição. Outro caso analisado demonstra o entendimento do STF de que a obrigação do

Estado em fornecer medicamento a pacientes hipossuficientes não é um pleito que ocorre de

maneira automática, pois se deve provar além da hipossuficiência a excepcionalidade dos

medicamentos e sua indispensabilidade. Neste caso em específico foi feita ponderação do que

seria melhor faticamente com os dados que havia no caso.

Encontrou-se uma decisão na qual os recorrentes argumentam que os princípios

fundamentais são mandatos de otimização, que podem ser cumpridos em diferentes graus

dependendo das possibilidades fáticas e jurídicas. Levando isso em consideração o ministro

usa os princípios da dignidade da pessoa humana, do viver digno e da igualdade para justificar

a decisão, protegendo, desta maneira, os interesses do cidadão.

Outros princípios utilizados nas decisões foram o da independência dos poderes, da

inafastabilidade do judiciário e da solidariedade. O princípio da independência dos poderes

não foi acolhido pelo STF sendo que o mesmo escolheu pelos princípios do viver digno e da

dignidade da pessoa humana, alegando que o poder judiciário tem o dever de reparar lesão a

direito. A inafastabilidade do judiciário é aplicada quando os Entes Federados argumentam

que haveria a necessidade do requerimento ser feito por via administrativa. E o princípio da

solidariedade é ponderado com o princípio da dignidade da pessoa humana, ou seja, os Entes

Federados são solidários na medida em que cada um tem sua competência no fornecimento de

medicamentos. Neste sentido, entende que a dignidade da pessoa deve ser entendida em

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sentido amplo para a coletividade, pois o fornecimento de medicamentos para tratamento de

alguns não pode prejudicar o oferecimento de serviços básicos ao restante da coletividade.

Desta forma se verifica que o STF tem agido no sentido de ponderar o melhor princípio,

de acordo com cada caso. E se percebe, assim, que a teoria dos direitos fundamentais de

Alexy não enfraquece os direitos fundamentais, podendo ser usada para a solução de casos. A

teoria não traz uma solução pronta, o que é visto de forma positiva, pois cada caso deve ser

avaliado de acordo com as possibilidades fáticas e jurídicas. Através da teoria de Alexy se

pode justificar melhor os resultados da ponderação. Assim, o modelo estrutural de ponderação

é importante, pois provoca um avanço em relação à argumentação jurídica, uma vez que traz

dados através dos quais se pode fundamentar a argumentação jurídica.

No último ponto do terceiro capítulo foram analisadas as decisões do Tribunal de

Justiça do Rio Grande do Sul, Tribunal este instalado em Porto Alegre em 1874, mas que

passou a ter autonomia somente em 1989 com a Constituição Estadual do Rio Grande do Sul.

A pesquisa foi feita seguindo a metodologia usada na pesquisa do Supremo Tribunal Federal,

isto é, no endereço eletrônico do Tribunal de Justiça do Estado com o objetivo de verificar o

tratamento dado à matéria e como se pode aplicar a teoria dos direitos fundamentais aos casos

concretos. Também foram utilizados os mesmos termos de busca usados na pesquisa no STF,

ou seja, políticas públicas de saúde, tratamento de saúde, tratamento médico, e fornecimento

de medicamento, restringindo da mesma forma o período de julgamento entre primeiro de

janeiro de 2000 e 31 de outubro de 2007.

Diante dos argumentos pesquisados foram encontradas um total de 5.974 decisões, nas

quais a maior parte dizia respeito ao argumento fornecimento de medicamento, no entanto,

nem todas as decisões, apesar de conterem tal expressão, tinham relação com o tema. Da

mesma forma como feito anteriormente só se comentam alguns casos de maneira

exemplificativa e nos anexos só são colocadas as íntegras dos casos citados. Citam-se

também somente o número das outras decisões em anexo, o que facilita a procura pela íntegra

das mesmas no site do Tribunal.

Percebe-se que os argumentos utilizados no Tribunal seguem a mesma esteira dos

utilizados pelo Supremo. Além dos princípios utilizados pelo STF usa-se também a questão

do princípio da legalidade. Nos casos perante o Tribunal de Justiça do Estado se verifica que

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há a ponderação de acordo com as possibilidades fáticas e jurídicas. Há uma prevalência no

entendimento de que os Entes Federados são responsáveis de forma solidária para o

atendimento de políticas em relação à saúde, e de que existem regras que asseguram aos

indivíduos o acesso à proteção, prevenção e defesa da saúde sob responsabilidade dos Entes

Federados.

Desta forma, se constata que o judiciário, se preocupa também com as questões

orçamentárias dos Entes Federados, pois enfatizam nas decisões que não cabe ao judiciário

implementar políticas públicas ou impor programas e direcionar recursos financeiros, no

entanto esclarece que o papel do poder judiciário é dar efetividade à lei e intervir quando ela

não for observada, aplicando de forma plena as normas constitucionais.

Há uma câmara do tribunal que se refere especificamente à ponderação e à teoria de

Alexy, se trata da Terceira Câmara Cível. Foram analisadas duas decisões desta câmara nas

quais foi relator o Desembargador Rogério Gesta Leal. Na primeira decisão se manteve a

posição de que com base nos princípios da dignidade da pessoa humana e do mínimo

existencial os Entes Federados deveriam buscar os meios necessários para preservar a saúde

de seus cidadãos, e quando se verifica a falta de recursos e a necessidade o pedido deve ser

atendido, utilizando o princípio da proporcionalidade de Alexy, ou seja, verificando a

adequação, necessidade e proporção em sentido estrito.

Na outra decisão o relator esclarece que está revendo sua posição em relação ao dever

absoluto e exclusivo de o Estado arcar com o fornecimento de medicamentos à população.

Novamente se argumenta com os princípios do mínimo existencial e da dignidade da pessoa

humana, entretanto também se enfatiza a necessidade de verificar as possibilidades fáticas e

jurídicas para não correr o risco de prejudicar a sociedade como um todo na tentativa de

atender à demanda de uma única pessoa. Para tanto, se deve fazer uma ponderação sobre até

que ponto deva existir a reciprocidade do Estado em relação aos direitos sociais e analisando

o caso verificar as co-responsabilidades societais, isto é, o dever da família, da sociedade e do

Estado.

Deste modo, se percebe que no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul não se discute

a responsabilidade do Estado em fornecer medicamentos ou tratamentos de saúde, o que se

faz é analisar a partir do princípio da reserva do possível e dos critérios de repartição das

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competências o caso em espécie. É recente a idéia de se questionar a responsabilidade

absoluta do Estado quanto às prestações de saúde, e sempre se verifica a situação fática e

jurídica.

Portanto, se percebe que a Teoria dos Direitos Fundamentais de Robert Alexy serve de

complemento à argumentação e justificação para os acórdãos no Tribunal de Justiça. Utilizar

a teoria não mudaria as decisões, uma vez que elas analisam os casos concretos e ponderam

sobre as situações específicas de cada caso, prevalecendo o direito à vida e o princípio da

dignidade da pessoa humana e do mínimo existencial.

Diante de tudo o visto se verifica que a Teoria dos Direitos Fundamentais de Robert

Alexy, apesar de suas críticas, pode ser utilizada para a solução de casos concretos que

envolvam direitos fundamentais, neste trabalho em específico o direito è saúde, na medida em

que esta teoria torna possível a emissão de juízos racionais quanto às intensidades de

intervenções nos direitos fundamentais, assim como o grau de satisfação dos princípios. Com

os juízos racionais a respeito das intensidades das intervenções e dos graus de realização dos

princípios se pode formar um resultado racional. Usar os sub-princípios da proporcionalidade,

como a adequação, a necessidade e a proporcionalidade em sentido estrito facilita a

ponderação e a escolha do melhor princípio para a decisão.

Assim, com os critérios da Teoria dos Direitos Fundamentais se pode vincular a

ponderação e a argumentação jurídica racional – facilitando a fundamentação e argumentação

jurídicas. Com isto se pode justificar melhor as valorações, podendo classificar e relacionar os

critérios para a ponderação. A teoria pode desta forma, ser operacionalizada nos casos

concretos através da argumentação jurídica e da colocação em prática das fórmulas

estabelecidas por Alexy.

Os objetivos deste trabalho foram atingidos uma vez que se analisou a Teoria dos

Direitos Fundamentais, assim como sua possibilidade de aplicação nos casos concretos em

relação ao direito à saúde. Os objetivos específicos também foram atingidos, porque se

analisou a teoria, assim como tratamento dado a matéria no âmbito do STF e TJ/RS através

das decisões pertinentes relativas ao direito à saúde. Expuseram-se as críticas à teoria e se

verificou de que forma a teoria poderia ser operacionalizada. Por fim, se identificou como a

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teoria poderia ser aplicada aos casos concretos e que inclusive em alguns casos já tinha sido

aplicada.

Em face do exposto se verifica que algumas hipóteses pensadas no começo do trabalho

não foram confirmadas. Isto porque se pensava que com a utilização da Teoria dos Direitos

Fundamentais de Robert Alexy os casos que envolvem direitos fundamentais no Brasil teriam

uma solução diferente do que vem sendo aplicado. No entanto, estes casos nem sempre teriam

uma solução diferente do que vem sendo aplicado, já que de certa forma tanto o STF quanto o

TJ/RS já vem ponderando entre situação e usando as possibilidades fáticas. O que seria

diferente é que se poderia fundamentar melhor as decisões. Mas se comprovou que a teoria de

Alexy pode ser operacionalizada pelo discurso jusfundamental que traz um procedimento

argumentativo e possibilita obter resultados jusfundamentais corretos para o caso apresentado,

assim como a teoria pode ser usada nos casos pois possibilitaria que o Judiciário tomasse

decisões com base em uma argumentação jurídica melhor fundamentada.

Por fim, se entende que a pesquisa veio ao encontro da área de concentração do

Mestrado em Direito da UNISC, pois tratou de uma teoria que pode ser aplicada tanto em

relação a direitos sociais quanto em relação às políticas públicas, como no caso em que se

utilizou da ponderação em relação à judicialização das mesmas. Através da teoria estudada se

pode delimitar as possibilidades para melhor gestão dos interesses levados ao judiciário,

assim como facilitar a compreensão da consolidação das garantias constitucionais.

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ANEXO – A – casos políticas públicas de saúde STF

Termo de pesquisa Políticas Públicas de Saúde

Tipo de decisão Decisões monocráticas AI676926/RJ; RE547808/RS; AI676044/PE; AI634282/PR; AI635766/RS; RE509569/SC; AI626570/RS; AI507072/MG; RE393175/RS; AI570455/RS; AI564978/RS; AI547758/RS; AI452312/RS; AI468961/MG; AI457544/RS; AI396973/RS; RE248304/RS; RE198265/RS; RE241630/RS; RE273834/RS; RE271286/RS; RE267612/RS; RE232335/RS maioria se não a totalidade impetrado pelo estado ou municípios e tiveram seguimento negado ou recurso não foi conhecido.

Tipo de decisão Decisões da presidência SS 3274/GO; SS 3201/GO; SS 3193/RN; SS 3205/AM; SS 3145/RN; STA 91/AL; SS 3073/RN; STA 69/SP; STA 36/CE Tais decisões dizem respeito às suspensões de segurança e suspensões de tutelas antecipadas que concediam tratamentos e medicamentos custosos à pessoas isoladas. Algumas foram consideradas procedentes e outras não. Disponíveis em: <http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/pesquisarJurisprudencia.asp>. Acesso em: dez 2006 a nov 2007.

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ANEXO – B – casos tratamento de saúde STF

Termo de pesquisa Tratamento de saúde

Tipo de decisão Acórdãos

AI-AgR486816/RJ; RE-AgR255627/RS; e RE-AgR271286/RS

Tipo de decisão Decisões monocráticas AI676926/RJ; AI676044/PE; RE549122/MT; RE399664/SP; AI559055/RS; AI575832/PR; AI634282/PR; AI622703/RS; RE509569/SC; AI626570/RS; RE498567/DF; AI471658/RS; AI588257/RS; RE425974/GO; AI574618/RS; RE393175/RS; AI570455/RS; RE458927/DF; AI554582/MG; AI564978/RS; AI564356/PE; RE459175/CE; AI 522579/GO; AI547758/RS; RE400040/MT; RE431150/ES; RE394820/SP; RE269272/RJ; AI537636/RS; AI525576/RS; RE353336/RS; AI462563/RS; RE342413/PR; RE297276/SP; RE411557/DF; AI452312/RS; AI468961/MG; RE310031/SP; AI457544/RS; AI455986/RS; AI474623/RS; AI418320/RS; AI396973/RS; AI423402/RS; RE293379/RS; RE334356/RS; RE252767/RS; RE259128/PR; RE241630/RS; RE253454/RS; RE234016/RS; RE280642/RS; RE273834/RS; RE273042/RS; RE271286/RS; RE267612/RS; RE232335/RS.

Tipo de decisão Decisões da presidência SS3201/GO; SL166/RJ; SS3193/RN; SS3205/AM; SS3158/RN; SS3231/RN; SS3145/RN; STA91/AL; SS3073/RN; SL114/SP; SS2880/RN; SL91/MG; SS2842/MT; STA36/CE; STA46/SC; SS2719/RN; STA34/SP; SL56/DF Disponíveis em: <http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/pesquisarJurisprudencia.asp>. Acesso em: dez 2006 a nov 2007.

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ANEXO – C – casos tratamento médico STF

Termo de pesquisa Tratamento médico

Tipo de decisão Decisões monocráticas AI559055/RS; RE498567/DF; AI564978/RS; RE400040/MT; RE394820/SP; RE269272/RJ; AI527135/MG; AI537636/RS; AI525576/RS; RE411557/DF; AI452312/RS; AI463532/RS; AI455986/RS; AI26995/SP.

Tipo de decisão Decisões da presidência SS3274/GO; SL166/RJ; SS3193/RN; SS3183/SC; SS3205/AM; SS3231/RN; SS3145/RN; SS3073/RN; SS2842/MT; STA50/PA; STA46/SC. Disponíveis em: <http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/pesquisarJurisprudencia.asp>. Acesso em: dez 2006 a nov 2007.

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ANEXO – D – casos fornecimento de medicamento STF

Termo de pesquisa Fornecimento Medicamento

Tipo de decisão Acórdãos

AI-AgR648971/RS; AI-AgR562703/RS; RE-AgR393175/RS; AI-AgR604949/RS; AI-AgR597182/RS; AI-AgR486816/RJ; RE-AgR273042/RS; RE-AgR255627/RS; RE-AgR271286/RS; RE-AgR257109/RS; RE195192/RS

Tipo de decisão Decisões monocráticas AI676926/RJ; RE547808/RS; RE560369/ES; AI676044/PE; RE549122/MT; RE399664/SP; AI597141/RS; AI559055/RS; AI636525/RS; AI661810/RS; AI575832/PR; AI634282/PR; AI588169/RJ; AI624561/RS; AI633455/RS; Rcl5064RC2/PR; AI642796/PR; AI 622703/RS; AI600112ED/RJ; RE509569/SC; AI626570/RS; AI507072/MG; AI 605529/RS; AI588257/RS; AI599675/RS; RE474224/MT; AI589255/RS; AI574618/RS; AI 572782/RS; RE393175/RS; AI570455/RS; AI564978/RS; AI417792/RS; AI565098/RS; AI564356/PE; RE459175/CE; AI547758/RS; RE400040/MT; AI540853/MG; RE 431150/ES; AI492437/RS; AI537237/PE; RE269272/RJ; AI527135/MG; AI537636/RS; AI529573/RS; AI525576/RS; RE353336/RS; AI462563/RS; RE297276/SP; RE411557/DF; AI491555/MG; AI452312/RS; AI503242/RS; AI468961/MG; AI463532/RS; AI457544/RS; AI455986/RS; AI474623/RS; RE370959/RS; SS2207/GO; AI418320/RS; AI396973/RS; RE259415AgR/RS; RE244571/RS; RE293379/RS; RE248304/RS; RE198265/RS; RE241630/RS; RE198263/RS; RE280642/RS; RE279519/RS; RE278402/SP; RE277573/RJ; RE276640/RS; RE273834/RS; RE273042/RS; RE271286/RS; RE267612/RS; RE232335/RS; RE270890/RS; RE264645/RS

Tipo de decisão Decisões da presidência STA139/RN; SS3350/GO; SS3274/GO; STA121/MG; SS3263/GO; SS3201/GO; SL166/RJ; SS3193/RN; SS3183/SC; SS3205/AM; SS3158/RN; SS3231/RN; SS3145/RN; SS3154/RS; STA91/AL; SS3073/RN; SL2880/RN; SL91/MG; SS2793/MT; STA46/SC; SS2719/RN; SS2708/RS; STA35/RS; SL64/SP; STA34/SP; SS2719/RN Disponíveis em: <http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/pesquisarJurisprudencia.asp>. Acesso em: dez 2006 a nov 2007.

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ANEXO E – íntegra decisão RE271286/RS STF

RE 271286 / RS - RIO GRANDE DO SUL RECURSO EXTRAORDINÁRIO

Relator(a)

Min. CELSO DE MELLO

Partes

RECTE. : MUNICÍPIO DE PORTO ALEGRE ADVDA. : CANDIDA SILVEIRA SAIBERT RECTE. : ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL ADVDOS. : PGE-RS - YASSODARA CAMOZZATO E OUTROS RECDA. : DINÁ ROSA VIEIRA ADVDOS. : EDUARDO VON MÜHLEN E OUTROS

Julgamento

02/08/2000

Publicação

DJ 23/08/2000 P - 00052

Despacho

EMENTA: AIDS/HIV. DISTRIBUIÇÃO GRATUITA DE MEDICAMENTOS EM FAVOR DE PESSOAS CARENTES. LEGISLAÇÃO COMPATÍVEL COM A TUTELA CONSTITUCIONAL DA SAÚDE (CF, ART. 196). PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. - A legislação que assegura, às pessoas carentes e portadoras do vírus HIV, a distribuição gratuita de medicamentos destinados ao tratamento da AIDS qualifica-se como ato concretizador do dever constitucional que impõe ao Poder Público a obrigação de garantir, aos cidadãos, o acesso universal e igualitário às ações e serviços de saúde. Precedentes (STF). - O direito à saúde - além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas - representa conseqüência constitucional indissociável do direito à vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por omissão, em censurável comportamento inconstitucional. O direito público subjetivo à saúde traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público (federal, estadual ou municipal), a quem incumbe formular - e implementar - políticas sociais e econômicas que visem a garantir a plena consecução dos objetivos proclamados no art. 196 da Constituição da República. DECISÃO: Trata-se de recursos extraordinários, que, interpostos pelo Estado do Rio Grande do Sul e pelo Município de Porto Alegre, buscam reformar decisão proferida pelo Tribunal de Justiça local (fls. 369/372), consubstanciada em acórdão que reconheceu incumbir, a essas unidades federadas, com fundamento no art. 196 da Constituição da República, a obrigação de fornecerem, gratuitamente, medicamentos necessários ao tratamento da AIDS, nos casos que envolverem pacientes destituídos de recursos financeiros e que sejam portadores do vírus HIV. Sustenta-se, na presente sede recursal extraordinária, que o acórdão ora questionado teria desrespeitado o princípio da legalidade, circunstância essa que justificaria a reforma da decisão emanada do Tribunal a quo. Entendo não assistir razão aos ora recorrentes, eis que eventual interpretação desfavorável das leis não pode ser invocada pela parte sucumbente como ato caracterizador de ofensa ao postulado constitucional da legalidade (Ag 159.081-SP (AgRg), Rel. Min. CELSO DE MELLO). No caso, a alegação de ofensa ao princípio da legalidade não basta, só por si, para viabilizar o acesso à via recursal extraordinária. É que a interpretação judicial de normas legais - por situar-se e projetar-se no âmbito infraconstitucional - culmina por exaurir-se no plano estrito do contencioso de mera legalidade, desautorizando, em conseqüência, a utilização do apelo extremo, consoante adverte o magistério jurisprudencial desta Suprema Corte (Ag 192.995-PE (AgRg), Rel. Min. CARLOS VELLOSO). Na realidade, o Supremo Tribunal Federal, por mais de uma vez, já acentuou que o procedimento hermenêutico do Tribunal inferior - que, ao examinar o quadro normativo positivado pelo Estado, dele extrai a interpretação dos diversos diplomas legais que o compõem, para, em razão da inteligência e do sentido exegético que lhes der, obter os elementos necessários à exata composição da lide - não transgride, diretamente, o princípio da legalidade (Ag 161.396-SP (AgRg), Rel. Min. CELSO DE MELLO). É por essa razão - ausência de conflito imediato com o texto da Constituição - que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal vem enfatizando que "A boa ou má interpretação de norma infraconstitucional não enseja o recurso extraordinário, sob color de ofensa ao princípio da legalidade (CF, art. 5º, II)" (RTJ 144/962, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - grifei). Há, ainda, a incidir na presente causa, como obstáculo insuperável ao conhecimento do recurso extraordinário interposto pelo Estado do Rio Grande do Sul, o enunciado inscrito na Súmula 283/STF, cujo teor revela ser inadmissível o apelo extremo, quando a decisão recorrida - como no caso - assentar-se em mais de um fundamento suficiente, apto, por si só, a conferir, a tal ato decisório, existência autônoma. Com efeito, o acórdão emanado do Tribunal local, como assinalado, também possui fundamento de caráter infraconstitucional (fls. 370/371), pois o julgamento nele consubstanciado encontra suporte em legislação ordinária editada pela União Federal (Lei nº 9.313/96) e pelo Estado do Rio Grande do Sul (Lei nº 9.908/93): "O direito à saúde é direito fundamental do ser humano, corolário do direito à vida. As disposições constitucionais neste sentido são auto-aplicáveis, dado a importância dos referidos direitos. Não há como afastar a responsabilidade dos entes públicos para com o problema da saúde. A responsabilidade do Estado em fornecer os medicamentos excepcionais às pessoas carentes está por demais clara, tendo em vista o disposto na Lei-RS 9.908/93. Esta Lei, não é demais ressaltar, impõe ao Estado a distribuição dos medicamentos de forma gratuita às pessoas que não puderem prover as despesas dos referidos medicamentos, sem privarem-se dos recursos indispensáveis ao próprio sustento de sua família. O estabelecimento, pela Lei 9.313/96, de solidariedade passiva entre a União, Estados, Distrito Federal e Municípios pelo tratamento dos doentes de AIDS e portadores do HIV não tirou a responsabilidade do Estado. O que esta Lei fez foi determinar que estes entes são solidários na resolução do problema em questão, permitindo que os doentes possam optar entre um ou todos os integrantes do SUS. Por via de conseqüência, o Município de Porto Alegre também é parte legítima. Os convênios celebrados implementam o Sistema Único de Saúde, permitindo que o Estado repasse as verbas recebidas ao Município, o que não significa que o administrador estadual possa se eximir de suas obrigações para com a saúde da população, estando incluídos nesta os pacientes HIV/AIDS. A responsabilidade de um órgão público não exime a de outro." (grifei) Ressalte-se, por necessário, que o Estado do Rio Grande do Sul, embora podendo questionar, em sede de recurso especial, esse fundamento de índole meramente ordinária, deixou de fazê-lo, viabilizando, desse modo, em função da própria ausência de impugnação recursal específica, a subsistência autônoma do acórdão emanado do Tribunal local. Cabe destacar, ainda, que a alegação de desrespeito ao art. 37, XXI e ao art. 167, I e VI, ambos da Constituição Federal, não basta, só por si, para legitimar o acesso à via recursal extraordinária, pois, acaso configurada a suposta transgressão, esta importaria, quando muito, em situação caracterizadora de conflito indireto com o texto da Carta Política, insuficiente para justificar a utilização do apelo extremo (RTJ 105/704 - RTJ 127/758 - RTJ 132/455). Com efeito, basta examinar-se o acórdão ora recorrido, para confirmar-se tal asserção (fls. 371): "Por derradeiro, a licitação não se faz necessária para a aquisição dos medicamentos, pois ela é

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dispensada nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando caracterizada a urgência do atendimento de situação que possa causar prejuízo ou comprometer a segurança das pessoas. Também com estes argumentos afastam-se as assertivas de inexistência de previsão orçamentária." De qualquer maneira, no entanto, mesmo que tais aspectos formais pudessem ser afastados, ainda assim revelar-se-ia inacolhível a postulação recursal deduzida pelo Estado do Rio Grande do Sul e pelo Município de Porto Alegre, especialmente em face do mandamento constitucional inscrito no art. 196 da Constituição da República, que assim dispõe: "Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação." (grifei) Na realidade, o cumprimento do dever político-constitucional consagrado no art. 196 da Lei Fundamental do Estado, consistente na obrigação de assegurar, a todos, a proteção à saúde, representa fator, que, associado a um imperativo de solidariedade social, impõe-se ao Poder Público, qualquer que seja a dimensão institucional em que este atue no plano de nossa organização federativa. A impostergabilidade da efetivação desse dever constitucional desautoriza o acolhimento dos pleitos recursais ora deduzidos na presente causa. Tal como pude enfatizar, em decisão por mim proferida no exercício da Presidência do Supremo Tribunal Federal, em contexto assemelhado ao da presente causa (Pet 1.246-SC), entre proteger a inviolabilidade do direito à vida e à saúde, que se qualifica como direito subjetivo inalienável assegurado a todos pela própria Constituição da República (art. 5º, caput e art. 196), ou fazer prevalecer, contra essa prerrogativa fundamental, um interesse financeiro e secundário do Estado, entendo - uma vez configurado esse dilema - que razões de ordem ético-jurídica impõem ao julgador uma só e possível opção: aquela que privilegia o respeito indeclinável à vida e à saúde humana, notadamente daqueles que têm acesso, por força de legislação local, ao programa de distribuição gratuita de medicamentos, instituído em favor de pessoas carentes. A legislação gaúcha - consubstanciada nas Leis nºs 9.908/93, 9.828/93 e 10.529/95 -, ao instituir esse programa de caráter marcadamente social, dá efetividade a preceitos fundamentais da Constituição da República (arts. 5º, caput, e 196) e representa, na concreção do seu alcance, um gesto reverente e solidário de apreço à vida e à saúde das pessoas, especialmente daquelas que nada têm e nada possuem, a não ser a consciência de sua própria humanidade e de sua essencial dignidade. Cumpre não perder de perspectiva que o direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República. Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular - e implementar - políticas sociais e econômicas que visem a garantir, aos cidadãos, o acesso universal e igualitário à assistência médico-hospitalar. O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política - que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro (JOSÉ CRETELLA JÚNIOR, "Comentários à Constituição de 1988", vol. VIII/4332-4334, item n. 181, 1993, Forense Universitária) - não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado. Nesse contexto, incide, sobre o Poder Público, a gravíssima obrigação de tornar efetivas as prestações de saúde, incumbindo-lhe promover, em favor das pessoas e das comunidades, medidas - preventivas e de recuperação -, que, fundadas em políticas públicas idôneas, tenham por finalidade viabilizar e dar concreção ao que prescreve, em seu art. 196, a Constituição da República. O sentido de fundamentalidade do direito à saúde - que representa, no contexto da evolução histórica dos direitos básicos da pessoa humana, uma das expressões mais relevantes das liberdades reais ou concretas - impõe ao Poder Público um dever de prestação positiva que somente se terá por cumprido, pelas instâncias governamentais, quando estas adotarem providências destinadas a promover, em plenitude, a satisfação efetiva da determinação ordenada pelo texto constitucional. Vê-se, desse modo, que, mais do que a simples positivação dos direitos sociais - que traduz estágio necessário ao processo de sua afirmação constitucional e que atua como pressuposto indispensável à sua eficácia jurídica (JOSÉ AFONSO DA SILVA, "Poder Constituinte e Poder Popular", p. 199, itens ns. 20/21, 2000, Malheiros) -, recai, sobre o Estado, inafastável vínculo institucional consistente em conferir real efetividade a tais prerrogativas básicas, em ordem a permitir, às pessoas, nos casos de injustificável inadimplemento da obrigação estatal, que tenham elas acesso a um sistema organizado de garantias instrumentalmente vinculado à realização, por parte das entidades governamentais, da tarefa que lhes impôs a própria Constituição. Não basta, portanto, que o Estado meramente proclame o reconhecimento formal de um direito. Torna-se essencial que, para além da simples declaração constitucional desse direito, seja ele integralmente respeitado e plenamente garantido, especialmente naqueles casos em que o direito - como o direito à saúde - se qualifica como prerrogativa jurídica de que decorre o poder do cidadão de exigir, do Estado, a implementação de prestações positivas impostas pelo próprio ordenamento constitucional. Cumpre assinalar, finalmente, que a essencialidade do direito à saúde fez com que o legislador constituinte qualificasse, como prestações de relevância pública, as ações e serviços de saúde (CF, art. 197), em ordem a legitimar a atuação do Ministério Público e do Poder Judiciário naquelas hipóteses em que os órgãos estatais, anomalamente, deixassem de respeitar o mandamento constitucional, frustrando-lhe, arbitrariamente, a eficácia jurídico-social, seja por intolerável omissão, seja por qualquer outra inaceitável modalidade de comportamento governamental desviante. Todas essas considerações - que ressaltam o caráter incensurável da decisão emanada do Tribunal local - levam-me a repelir, por inacolhível, a pretensão recursal deduzida pelo Estado do Rio Grande do Sul e pelo Município de Porto Alegre, especialmente se se considerar a relevantíssima circunstância de que o acórdão ora questionado ajusta-se à orientação jurisprudencial firmada no âmbito do Supremo Tribunal Federal no exame da matéria (RE 236.200-RS, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA - RE 247.900-RS, Rel. Min. MARCO AURÉLIO - RE 264.269-RS, Rel. Min. MOREIRA ALVES, v.g.): "ADMINISTRATIVO. ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. DOENTE PORTADORA DO VÍRUS HIV, CARENTE DE RECURSOS INDISPENSÁVEIS À AQUISIÇÃO DOS MEDICAMENTOS DE QUE NECESSITA PARA SEU TRATAMENTO. OBRIGAÇÃO IMPOSTA PELO ACÓRDÃO AO ESTADO. ALEGADA OFENSA AOS ARTS. 5º, I, E 196 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Decisão que teve por fundamento central dispositivo de lei (art. 1º da Lei 9.908/93) por meio da qual o próprio Estado do Rio Grande do Sul, regulamentando a norma do art. 196 da Constituição Federal, vinculou-se a um programa de distribuição de medicamentos a pessoas carentes, não havendo, por isso, que se falar em ofensa aos dispositivos constitucionais apontados. Recurso não conhecido." (RE 242.859-RS, Rel. Min. ILMAR GALVÃO - grifei) "PACIENTE COM HIV/AIDS. PESSOA DESTITUÍDA DE RECURSOS FINANCEIROS. DIREITO À VIDA E À SAÚDE. FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS. DEVER CONSTITUCIONAL DO ESTADO (CF, ARTS. 5º, CAPUT, E 196). PRECEDENTES (STF). - O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República (art. 196). Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular - e implementar - políticas sociais e econômicas que visem a garantir, aos cidadãos, o acesso universal e igualitário à assistência médico-hospitalar. - O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política - que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro - não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado. - A legislação editada pelo Estado do Rio Grande do Sul (consubstanciada nas Leis nºs 9.908/93, 9.828/93 e 10.529/95), ao instituir programa de distribuição gratuita de medicamentos a pessoas carentes, dá efetividade a preceitos fundamentais da Constituição da República (arts. 5º, caput, e 196) e representa, na concreção do seu alcance, um gesto reverente e solidário de apreço à vida e à saúde das pessoas, especialmente daquelas que nada têm e nada possuem, a não ser a consciência de sua própria humanidade e de sua essencial dignidade. Precedentes do STF." (RE 232.335-RS, Rel. Min. CELSO DE MELLO - grifei) Sendo assim, pelas razões expostas, e considerando, ainda, os precedentes mencionados, não conheço dos presentes recursos extraordinários. Publique-se. Brasília, 02 de agosto de 2000. Ministro CELSO DE MELLO Relator 8

fim do documento

Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(271286.NUME.%20OU%20271286.DMS.)%20NAO%20S.PRES.&base=baseMonocraticas>. Acesso em: dez 2006.

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ANEXO F – íntegra decisão RE509569/SC STF

RE 509569 / SC - SANTA CATARINA RECURSO EXTRAORDINÁRIO

Relator(a)

Min. CELSO DE MELLO

Partes

RECTE.(S): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CA TARINA RECDO.(A/S): ESTADO DE SANTA CATARINA ADV.(A/S): PGE-SC - OSNI ALVES DA SILVA

Julgamento

01/02/2007

Publicação

DJ 14/03/2007 PP-00074

Despacho

EMENTA: PACIENTE PORTADOR DE HEPATITE "B" E "C". PESSOA DESTITUÍDA DE RECURSOS FINANCEIROS. DIREITO À VIDA E À SAÚDE. NECESSIDADE IMPERIOSA DE SE PRESERVAR, POR RAZÕES DE CARÁTER ÉTICO-JURÍDICO, A INTEGRIDADE DESSE DIREITO ESSENCIAL. FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS INDISPENSÁVEIS EM FAVOR DE PESSOAS CARENTES. DEVER CONSTITUCIONAL DO ESTADO (CF, ARTS. 5º, "CAPUT", E 196). PRECEDENTES (STF). RE CONHECIDO E PROVIDO. DECISÃO: O presente recurso extraordinário busca reformar decisão proferida pelo E. Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, consubstanciada em acórdão assim ementado (fls. 98): "APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA INTENTADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO COM O OBJETIVO DE COMPELIR O ESTADO DE SANTA CATARINA A FORNECER O MEDICAMENTO INTERFERON PEGUILADO A CIDADÃO PORTADOR DE HEPATITE DOS TIPOS 'B' E 'C'. ILEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO - RECURSO PROVIDO - EXTINÇÃO DO FEITO. Em que pese o fato de se tratar a saúde de direito indisponível, não se vislumbra na presente demanda, proposta para resguardar o direito à saúde de apenas um cidadão, o caráter de homogeneidade, necessário para se possa reconhecer a legitimidade ativa 'ad causam' ao MinistEm que pese o fato de se tratar a saúde de direito indisponível, não se vislumbra na presente demanda, proposta para resguardar o direito à saúde de apenas um cidadão, o caráter de homogeneidade, necessário para se possa reconhecer a legitimidade ativa 'ad causam' ao Ministério Público. CUSTAS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - ISENÇÃO." Entendo assistir plena razão ao Ministério Público do Estado de Santa Catarina, pois o desacolhimento de sua pretensão recursal poderá gerar resultado inaceitável sob a perspectiva constitucional do direito à vida e à saúde. É que - considerada a irreversibilidade, no momento presente, dos efeitos danosos provocados pela patologia que afeta o paciente Lindolfo Gomes (que é portador de hepatite "B" e "C") - a ausência de capacidade financeira que o aflige impede-lhe, injustamente, o acesso ao tratamento inadiável e ao fornecimento do medicamento a que tem direito e que se revela essencial à preservação de sua própria vida. Na realidade, o cumprimento do dever político-constitucional consagrado no art. 196 da Lei Fundamental do Estado, consistente na obrigação de assegurar, a todos, a proteção à saúde, representa fator, que, associado a um imperativo de solidariedade social, impõe-se ao Poder Público, qualquer que seja a dimensão institucional em que atue no plano de nossa organização federativa. A impostergabilidade da efetivação desse dever constitucional autoriza o acolhimento do pleito recursal ora deduzido na presente causa. Tal como pude enfatizar em decisão por mim proferida no exercício da Presidência do Supremo Tribunal Federal, em contexto assemelhado ao da presente causa (Pet 1.246/SC), entre proteger a inviolabilidade do direito à vida e à saúde, que se qualifica como direito subjetivo inalienável assegurado a todos pela própria Constituição da República (art. 5º, "caput" e art. 196), ou fazer prevalecer, contra essa prerrogativa fundamental, um interesse financeiro e secundário do Estado, entendo - uma vez configurado esse dilema - que razões de ordem ético-jurídica impõem ao julgador uma só e possível opção: aquela que privilegia o respeito indeclinável à vida e à saúde humanas. Cumpre não perder de perspectiva que o direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República. Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular - e implementar - políticas sociais e econômicas que visem a garantir, aos cidadãos, o acesso universal e igualitário à assistência médico-hospitalar. O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política - que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro (JOSÉ CRETELLA JÚNIOR, "Comentários à Constituição de 1988", vol. VIII/4332-4334, item n. 181, 1993, Forense Universitária) - não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado. Nesse contexto, incide, sobre o Poder Público, a gravíssima obrigação de tornar efetivas as prestações de saúde, incumbindo-lhe promover, em favor das pessoas e das comunidades, medidas - preventivas e de recuperação -, que, fundadas em políticas públicas idôneas, tenham por finalidade viabilizar e dar concreção ao que prescreve, em seu art. 196, a Constituição da República. O O sentido de fundamentalidade do direito à saúde - que representa, no contexto da evolução histórica dos direitos básicos da pessoa humana, uma das expressões mais relevantes das liberdades reais ou concretas - impõe ao Poder Público um dever de prestação positiva que somente se terá por cumprido, pelas instâncias governamentais, quando estas adotarem providências destinadas a promover, em plenitude, a satisfação efetiva da determinação ordenada pelo texto constitucional. Vê-se, desse modo, que, mais do que a simples positivação dos direitos sociais - que traduz estágio necessário ao processo de sua afirmação constitucional e que atua como pressuposto indispensável à sua

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eficácia jurídica (JOSÉ AFONSO DA SILVA, "Poder Constituinte e Poder Popular", p. 199, itens ns. 20/21, 2000, Malheiros) -, recai, sobre o Estado, inafastável vínculo institucional consistente em conferir real efetividade a tais prerrogativas básicas, em ordem a permitir, às pessoas, nos casos de injustificável inadimplemento da obrigação estatal, que tenham elas acesso a um sistema organizado de garantias instrumentalmente vinculadas à realização, por parte das entidades governamentais, da tarefa que lhes impôs a própria Constituição. Não basta, portanto, que o Estado meramente proclame o reconhecimento formal de um direito. Torna-se essencial que, para além da simples declaração constitucional desse direito, seja ele integralmente respeitado e plenamente garantido, especialmente naqueles casos em que o direito - como o direito à saúde - se qualifica como prerrogativa jurídica de que decorre o poder do cidadão de exigir, do Estado, a implementação de prestações positivas impostas pelo próprio ordenamento constitucional. Cumpre assinalar, finalmente, que a essencialidade do direito à saúde fez com que o legislador constituinte qualificasse, como prestações de relevância pública, as ações e serviços de saúde (CF, art. 197), em ordem a legitimar a atuação do Ministério Público e do Poder Judiciário naquelas hipóteses em que os órgãos estatais, anomalamente, deixassem de respeitar o mandamento constitucional, frustrando-lhe, arbitrariamente, a eficácia jurídico-social, seja por intolerável omissão, seja por qualquer outra inaceitável modalidade de comportamento governamental desviante. Todas essas razões levam-me a acolher a pretensão recursal deduzida nos presentes autos, ainda mais se se considerar que o acórdão ora recorrido diverge, frontalmente, da orientação jurisprudencial que o Supremo Tribunal Federal firmou no exame da matéria em causa (RTJ 171/326-327, Rel. Min. ILMAR GALVÃO - AI 462.563/RS, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - AI 486.816-AgR/RJ, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - AI 532.687/MG, Rel. Min. EROS GRAU - AI 537.237/PE, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE - RE 195.192/RS, Rel. Min. MARCO AURÉLIO - RE 198.263/RS, Rel. Min. SYDNEY SANCHES - RE 237.367/RS, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA - RE 242.859/RS, Rel. Min. ILMAR GALVÃO - RE 246.242/RS, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA - RE 279.519/RS, Rel. Min. NELSON JOBIM - RE 297.276/SP, Rel. Min. CEZAR PELUSO - RE 342.413/PR, Rel. Min. ELLEN GRACIE - RE 353.336/RS, Rel. Min. CARLOS BRITTO - AI 570.455/RS, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.): "PACIENTE COM HIV/AIDS - PESSOA DESTITUÍDA DE RECURSOS FINANCEIROS - DIREITO À VIDA E À SAÚDE - FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS - DEVER CONSTITUCIONAL DO PODER PÚBLICO (CF, ARTS. 5º, CAPUT, E 196) - PRECEDENTES (STF) - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. O DIREITO À SAÚDE REPRESENTA CONSEQÜÊNCIA CONSTITUCIONAL INDISSOCIÁVEL DO DIREITO À VIDA. - - O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República (art. 196). Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular - e implementar - políticas sociais e econômicas idôneas que visem a garantir, aos cidadãos, inclusive àqueles portadores do vírus HIV, o acesso universal e igualitário à assistência farmacêutica e médico-hospitalar. - O direito à saúde - além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas - representa conseqüência constitucional indissociável do direito à vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional. A INTERPRETAÇÃO DA NORMA PROGRAMÁTICA NÃO PODE TRANSFORMÁ-LA EM PROMESSA CONSTITUCIONAL INCONSEQÜENTE. - O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política - que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro - não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado. DISTRIBUIÇÃO GRATUITA DE MEDICAMENTOS A PESSOAS CARENTES. - O reconhecimento judicial da validade jurídica de- O reconhecimento judicial da validade jurídica de programas de distribuição gratuita de medicamentos a pessoas carentes, inclusive àquelas portadoras do vírus HIV/AIDS, dá efetividade a preceitos fundamentais da Constituição da República (arts. 5º, caput, e 196) e representa, na concreção do seu alcance, um gesto reverente e solidário de apreço à vida e à saúde das pessoas, especialmente daquelas que nada têm e nada possuem, a não ser a consciência de sua própria humanidade e de sua essencial dignidade. Precedentes do STF." (RTJ 175/1212-1213, Rel. Min. CELSO DE MELLO) Sendo assim, pelas razões expostas, conheço e dou provimento ao presente recurso extraordinário (CPC, art. 557, § 1º - A), em ordem a restabelecer a r. sentença proferida pela magistrada estadual de primeira instância (fls. 49/52). Publique-se. Brasília, 1º de fevereiro de 2007. Ministro CELSO DE MELLO Relator 1

Legislação

LEG-FED CF ANO-1988 ART-00005 "CAPUT" ART-00196 ART-00197 ****** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL LEG-FED LEI-005869 ANO-1973 ART-00557 PAR-0001A ****** CPC-1973 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL Observação Legislação feita por:(SFP).

fim do documento

Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(509569.NUME.%20OU%20509569.DMS.)%20NAO%20S.PRES.&base=baseMonocraticas>. Acesso em: jul. 2007.

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ANEXO G – íntegra decisão AI634282/PR STF

AI 634282 / PR - PARANÁ AGRAVO DE INSTRUMENTO

Relator(a)

Min. CELSO DE MELLO

Partes

AGTE.(S): ESTADO DO PARANÁ ADV.(A/S): PGE-PR - CÉSAR AUGUSTO BINDER E OUTRO(A/ S) AGDO.(A/S): TRANQUILA SEMPREBOM DE AZEVEDO ADV.(A/S): WAGNER DE OLIVEIRA BARROS E OUTRO(A/S)

Julgamento

30/04/2007

Publicação

DJ 24/05/2007 PP-00096

Despacho

EMENTA: PACIENTE COM HIPERPROLACTINEMIA. PESSOA DESTITUÍDA DE RECURSOS FINANCEIROS. DIREITO À VIDA E À SAÚDE. FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS DE USO NECESSÁRIO, EM FAVOR DE PESSOA CARENTE. DEVER CONSTITUCIONAL DO ESTADO (CF, ARTS. 5º, "CAPUT", E 196). PRECEDENTES (STF). - O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República (art. 196). Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular - e implementar - políticas sociais e econômicas que visem a garantir, aos cidadãos, o acesso universal e igualitário à assistência médico-hospitalar. - O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política - que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro - não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado. Precedentes do STF. DECISÃO: O recurso extraordinário, a que se refere o presente agravo de instrumento, busca reformar decisão proferida pelo E. Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, consubstanciada em acórdão assim ementado (fls. 45): "REEXAME NECESSÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO PELO ESTADO. DIREITO À SAÚDE CONSAGRADO CONSTITUCIONALMENTE (ART. 196, CF), ASSEGURANDO-SE AO JURISDICIONADO OS MEIOS NECESSÁRIOS PARA A FRUIÇÃO DESSE DIREITO DE FORMA PLENA E GRATUITA. SENTENÇA QUE, CONFIRMANDOA LIMINAR, CONCEDEU A SEGURANÇA A FIM DE GARANTIR O RECEBIMENTO DO MEDICAMENTO ENQUANTO DURAR O TRATAMENTO. DECISÃO CONFIRMADA EM REEXAME NECESSÁRIO." Entendo não assistir razãoEntendo não assistir razão ao Estado do Paraná, pois o eventual acolhimento de sua pretensão recursal certamente conduziria a resultado inaceitável sob a perspectiva constitucional do direito à vida e à saúde. É que essa postulação - considerada a irreversibilidade, no momento presente, dos efeitos gerados pela patologia que afeta a ora agravada (que é portadora de hiperprolactinemia) - impediria, se aceita, que a paciente, pessoa destituída de qualquer capacidade financeira, merecesse o tratamento inadiável a que tem direito e que se revela essencial à preservação de sua própria vida. Na realidade, o cumprimento do dever político-constitucional consagrado no art. 196 da Lei Fundamental do Estado, consistente na obrigação de assegurar, a todos, a proteção à saúde, representa fator, que, associado a um imperativo de solidariedade social, impõe-se ao Poder Público, qualquer que seja a dimensão institucional em que atue no plano de nossa organização federativa. A impostergabilidade da efetivação desse dever constitucional desautoriza o acolhimento do pleito recursal ora deduzido na presente causa. Tal como pude enfatizar, em decisão por mim proferida no exercício da Presidência do Supremo Tribunal Federal, em contexto assemelhado ao da presente causa (Pet 1.246/SC), entre proteger a inviolabilidade do direito à vida e à saúde, que se qualifica como direito subjetivo inalienável assegurado a todos pela própria Constituição da República (art. 5º, "caput" e art. 196), ou fazer prevalecer, contra essa prerrogativa fundamental, um interesse financeiro e secundário do Estado, entendo - uma vez configurado esse dilema - que razões de ordem ético-jurídica impõem ao julgador uma só e possível opção: aquela que privilegia o respeito indeclinável à vida e à saúde humanas. Cumpre não perder de perspectiva que o direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República. Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular - e implementar - políticas sociais e econômicas que visem a garantir, aos cidadãos, o acesso universal e igualitário à assistência médico-hospitalar. O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política - que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro (JOSÉ CRETELLA JÚNIOR, "Comentários à Constituição de 1988", vol. VIII/4332-4334, item n. 181, 1993, Forense Universitária) - não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado. Nesse contexto, Nesse contexto, incide, sobre o Poder Público, a gravíssima obrigação de tornar efetivas as prestações de saúde, incumbindo-lhe promover, em favor das pessoas e das comunidades, medidas - preventivas e de recuperação -, que, fundadas em políticas públicas idôneas, tenham por finalidade viabilizar e dar concreção ao que prescreve, em seu art. 196, a Constituição da República. O sentido de fundamentalidade do direito à saúde - que representa, no contexto da evolução histórica dos

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direitos básicos da pessoa humana, uma das expressões mais relevantes das liberdades reais ou concretas - impõe ao Poder Público um dever de prestação positiva que somente se terá por cumprido, pelas instâncias governamentais, quando estas adotarem providências destinadas a promover, em plenitude, a satisfação efetiva da determinação ordenada pelo texto constitucional. Vê-se, desse modo, que, mais do que a simples positivação dos direitos sociais - que traduz estágio necessário ao processo de sua afirmação constitucional e que atua como pressuposto indispensável à sua eficácia jurídica (JOSÉ AFONSO DA SILVA, "Poder Constituinte e Poder Popular", p. 199, itens ns. 20/21, 2000, Malheiros) -, recai, sobre o Estado, inafastável vínculo institucional consistente em conferir real efetividade a tais prerrogativas básicas, em ordem a permitir, às pessoas, nos casos de injustificável inadimplemento da obrigação estatal, que tenham elas acesso a um sistema organizado de garantias instrumentalmente vinculado à realização, por parte das entidades governamentais, da tarefa que lhes impôs a própria Constituição. Não basta, portanto, que o Estado meramente proclame o reconhecimento formal de um direito. Torna-se essencial que, para além da simples declaração constitucional desse direito, seja ele integralmente respeitado e plenamente garantido, especialmente naqueles casos em que o direito - como o direito à saúde - se qualifica como prerrogativa jurídica de que decorre o poder do cidadão de exigir, do Estado, a implementação de prestações positivas impostas pelo próprio ordenamento constitucional. Cumpre assinalar, finalmente, que a essencialidade do direito à saúde fez com que o legislador constituinte qualificasse, como prestações de relevância pública, as ações e serviços de saúde (CF, art. 197), em ordem a legitimar a atuação do Ministério Público e do Poder Judiciário naquelas hipóteses em que os órgãos estatais, anomalamente, deixassem de respeitar o mandamento constitucional, frustrando-lhe, arbitrariamente, a eficácia jurídico-social, seja por intolerável omissão, seja por qualquer outra inaceitável modalidade de comportamento governamental desviante. Todas essas considerações - que ressaltam o caráter incensurável da decisão emanada do E. Tribunal de Justiça do Estado do Paraná - levam-me a repelir, por inacolhível, a pretensão recursal deduzida pela parte agravante, especialmente se se considerar a relevantíssima circunstância de que o acórdão ora questionado ajusta-se à orientação jurisprudencial firmada no âmbito do Supremo Tribunal Federal, no exame da matéria (RTJ 171/326-327, Rel. Min. ILMAR GALVÃO - RE 195.192/RS, Rel. Min. MARCO AURÉLIO - RE 198.263/RS, Rel. Min. SYDNEY SANCHES - RE 237.367/RS, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA - RE 242.859/RS, Rel. Min. ILMAR GALVÃO - RE 246.242/RS, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA - RE 279.519/RS, Rel. Min. NELSON JOBIM, v.g.): "PACIENTE COM HIV/AIDS - PESSOA DESTITUÍDA DE RECURSOS FINANCEIROS - DIREITO À VIDA E À SAÚDE - FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS - DEVER CONSTITUCIONAL DO PODER PÚBLICO (CF, ARTS. 5º, CAPUT, E 196) - PRECEDENTES (STF) - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. O DIREITO À SAÚDE REPRESENTA CONSEQÜÊNCIA CONSTITUCIONAL INDISSOCIÁVEL DO DIREITO À VIDA. - O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República (art. 196). Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular - e implementar - políticas sociais e econômicas idôneas que visem a garantir, aos cidadãos, inclusive àqueles portadores do vírus HIV, o acesso universal e igualitário à assistência farmacêutica e médico-hospitalar. - O direito à saúde - além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas - representa conseqüência constitucional indissociável do direito à vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional. A INTERPRETAÇÃO DA NORMA PROGRAMÁTICA NÃO PODE TRANSFORMÁ-LA EM PROMESSA CONSTITUCIONAL INCONSEQÜENTE. - O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política - que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro - não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado. DISTRIBUIÇÃO GRATUITA DE MEDICAMENTOS A PESSOAS CARENTES. - O reconhecimento judicial da validade jurídica de programas de distribuição gratuita de medicamentos a pessoas carentes, inclusive àquelas portadoras do vírus HIV/AIDS, dá efetividade a preceitos fundamentais da Constituição da República (arts. 5º, caput, e 196) e representa, na concreção do seu alcance, um gesto reverente e solidário de apreço à vida e à saúde das pessoas, especialmente daquelas que nada têm e nada possuem, a não ser a consciência de sua própria humanidade e de sua essencial dignidade. Precedentes do STF." (RTJ 175/1212-1213, Rel. Min. CELSO DE MELLO) Sendo assim, e pelas razões expostas, nego provimento ao presente agravo de instrumento, eis que se revela inviável o recurso extraordinário a que ele se refere. Publique-se. Brasília, 30 de abril de 2007. Ministro CELSO DE MELLO Relator 1

Legislação

LEG-FED CF ANO-1988 ART-00005 "CAPUT" ART-00196 ART-00197 ****** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL

Observação

Legislação feita por:(MGC).

fim do documento

Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(634282.NUME.%20OU%20634282.DMS.)%20NAO%20S.PRES.&base=baseMonocraticas>. Acesso em: jul. 2007.

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ANEXO H – íntegra decisão RE400040/MT STF

RE 400040 / MT - MATO GROSSO RECURSO EXTRAORDINÁRIO

Relator(a)

Min. JOAQUIM BARBOSA

Partes

RECURSO EXTRAORDINÁRIO N. 400.040-7 PROCED.: MATO GROSSO RELATOR : MIN. JOAQUIM BARBOSA RECTE.(S): ESTADO DE MATO GROSSO ADV.(A/S): PGE-MT - ADERZIO RAMIRES DE MESQUITA RECDO.(A/S): MARINA DE ALMEIDA ANDRADE ADV.(A/S): JANDIRA BRITO DA SILVA BROSSI

Julgamento

06/06/2005

Publicação

DJ 20/06/2005 PP-00031

Despacho

DECISÃO: Trata-se de recurso extraordinário (art. 102, III, a, da Constituição) interposto de acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso cuja ementa tem o seguinte teor: "MANDADO DE SEGURANÇA - PRELIMINARES AFASTADAS - FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO DA SUBSTÂNCIA INTERFERON PEGUILADO PARA TRATAMENTO DE HEPATITE "C" - PESSOA SEM RECURSOS PARA SUA AQUISIÇÃO - DEVER DO ESTADO - DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAL E LEGAL QUE GARANTEM O DIREITO À VIDA - SEGURANÇA CONCEDIDA. Se o Secretário Estadual de Saúde é o Gestor do Sistema Único de Saúde no âmbito estadual e sua gestão é de natureza plena, não obstante subordinada às regras previamente estabelecidas pelo Ministério da Saúde (Gestor Nacional do Sistema), e nessa qualidade, nega o fornecimento de medicamento de alto custo a pessoa sem recurso para o adquirir, é ele a autoridade diretamente responsável pelo ato omissivo, sendo, portanto, parte legítima para figurar no pólo passivo de ação mandamental e competente será a Justiça Comum. A saúde é direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício, inclusive com a distribuição de medicamentos, quando a pessoa não dispuser dos recursos necessários. (Fls. 158) 2. Alega o recorrente que a decisão recorrida viola o disposto nos arts. 5o, LXIX, 196, 197, 198 e 200, I da Constituição, porque inexiste omissão do Estado no fornecimento de medicamentos aos pacientes que não possuem meios para adquiri-los, o que ocorre é que o medicamento solicitado não está na lista de compra estabelecida pelo Ministério da Saúde. Aduz, ainda, que seria dezarrazoado exigir que o estado fosse compelido a prestações não previstas no planejamento da Saúde do estado sem que exista a prévia dotação orçamentária para tais ações. 3. Sem razão a parte recorrente. O acórdão impugnado, ao garantir o acesso da recorrida, pessoa de insuficientes recursos financeiros, a tratamento médico condigno do quadro clínico apresentado, resguardando-lhe o direito à saúde, decidiu em consonância com o que ficou assentado no julgamento do RE 271.286-AgR (rel. min. Celso de Mello), cuja ementa tem o seguinte teor: "PACIENTE COM HIV/AIDS - PESSOA DESTITUÍDA DE RECURSOS FINANCEIROS - DIREITO À VIDA E À SAÚDE - FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS - DEVER CONSTITUCIONAL DO PODER PÚBLICO (CF, ARTS. 5º, CAPUT, E 196) - PRECEDENTES (STF) - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. O DIREITO À SAÚDE REPRESENTA CONSEQÜÊNCIA CONSTITUCIONAL INDISSOCIÁVEL DO DIREITO À VIDA. - O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República (art. 196). Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular - e implementar - políticas sociais e econômicas idôneas que visem a garantir, aos cidadãos, inclusive àqueles portadores do vírus HIV, o acesso universal e igualitário à assistência farmacêutica e médico-hospitalar. - O direito à saúde - além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas - representa conseqüência constitucional indissociável do direito à vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional. A INTERPRETAÇÃO DA NORMA PROGRAMÁTICA NÃO PODE TRANSFORMÁ-LA EM PROMESSA CONSTITUCIONAL INCONSEQÜENTE. - O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política - que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro - não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado. DISTRIBUIÇÃO GRATUITA DE MEDICAMENTOS A PESSOAS CARENTES. - O reconhecimento judicial da validade jurídica de programas de distribuição gratuita de medicamentos a pessoas carentes, inclusive àquelas portadoras do vírus HIV/AIDS, dá

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efetividade a preceitos fundamentais da Constituição da República (arts. 5º, caput, e 196) e representa, na concreção do seu alcance, um gesto reverente e solidário de apreço à vida e à saúde das pessoas, especialmente daquelas que nada têm e nada possuem, a não ser a consciência de sua própria humanidade e de sua essencial dignidade. Precedentes do STF." (Grifos originais) 4. No mesmo sentido, os seguintes precedentes: RE 411.557 (rel. min. Cezar Peluso, DJ 26.10.2004), AI 373.976 (rel. min. Sepúlveda Pertence, DJ 02.12.2004), RE 342.413 (rel. min. Ellen Gracie, DJ 09.11.2004) e AI 452.312 (rel. min. Celso de Mello, DJ 23.06.2004). 5. Incumbe ao Supremo Tribunal Federal, no exercício dos controles concentrado e difuso da constitucionalidade das leis, velar pela concretização da eficácia máxima da Constituição federal. Nesse sentido, devem ser rechaçadas técnicas interpretativas, como a de que se vale o ente público ora recorrente, as quais têm como conseqüência prática a inoperância de certos dispositivos da Constituição. 6. Do exposto, nego seguimento ao recurso extraordinário. Publique-se. Brasília, 06 de junho de 2005. Ministro JOAQUIM BARBOSA Relator

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Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(400040.NUME.%20OU%20400040.DMS.)%20NAO%20S.PRES.&base=baseMonocraticas>. Acesso em: jul. 2007.

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ANEXO I – íntegra decisão RE411557/DF STF

RE 411557 / DF - DISTRITO FEDERAL RECURSO EXTRAORDINÁRIO

Relator(a)

Min. CEZAR PELUSO

Partes

RECURSO EXTRAORDINÁRIO N. 411.557-3 PROCED.: DISTRITO FEDERAL RELATOR : MIN. CEZAR PELUSO RECTE.(S): UNIÃO ADV.(A/S): ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO RECDO.(A/S): JOSÉ FLÁVIO HERMENEGILDO GONÇALVES E O UTRO(A/S) ADV.(A/S): FRANCISCO CELSO NOGUEIRA RODRIGUES E OUT RO(A/S)

Julgamento

24/09/2004

Publicação

DJ 26/10/2004 P - 00054

Despacho

DECISÃO: 1. Trata-se de recurso extraordinário contra acórdão que condenou o Ministério da Saúde a custear tratamento médico de pacientes portadores de doença ocular progressiva, a ser realizado no exterior. 2. Inadmissível o recurso. A recusa do Estado em custear o tratamento médico coloca em risco a saúde do paciente e representa desrespeito ao disposto no art. 196 da Constituição Federal, que determina ser a saúde direito de todos e dever do Estado. Essa regra constitucional tem por destinatários todos os entes políticos que compõem a organização federativa do Estado brasileiro. O acórdão impugnado decidiu em estrita conformidade com a jurisprudência assentada da Corte sobre o tema, como se pode ver à seguinte ementa exemplar: "EMENTA: PACIENTE COM HIV/AIDS - PESSOA DESTITUÍDA DE RECURSOS FINANCEIROS - DIREITO À VIDA E À SAÚDE - FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS - DEVER CONSTITUCIONAL DO PODER PÚBLICO (CF, ARTS. 5º, CAPUT, E 196) - PRECEDENTES (STF) - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. O DIREITO À SAÚDE REPRESENTA CONSEQÜÊNCIA CONSTITUCIONAL INDISSOCIÁVEL DO DIREITO À VIDA. - O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República (art. 196). Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular - e implementar - políticas sociais e econômicas idôneas que visem a garantir, aos cidadãos, inclusive àqueles portadores do vírus HIV, o acesso universal e igualitário à assistência farmacêutica e médico-hospitalar. - O direito à saúde - além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas - representa conseqüência constitucional indissociável do direito à vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional. A INTERPRETAÇÃO DA NORMA PROGRAMÁTICA NÃO PODE TRANSFORMÁ-LA EM PROMESSA CONSTITUCIONAL INCONSEQÜENTE. - O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política - que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro - não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado. DISTRIBUIÇÃO GRATUITA DE MEDICAMENTOS A PESSOAS CARENTES. - O reconhecimento judicial da validade jurídica de programas de distribuição gratuita de medicamentos a pessoas carentes, inclusive àquelas portadoras do vírus HIV/AIDS, dá efetividade a preceitos fundamentais da Constituição da República (arts. 5º, caput, e 196) e representa, na concreção do seu alcance, um gesto reverente e solidário de apreço à vida e à saúde das pessoas, especialmente daquelas que nada têm e nada possuem, a não ser a consciência de sua própria humanidade e de sua essencial dignidade. Precedentes do STF" (RE nº 271.286-AgR, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJ de 24.11.2000. No mesmo sentido, cf. AI nº 418.320, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, DJ de 11.06.2003; RE nº 259.415, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, DJ de 10.03.2003; RE nº 198.263, Rel. Min. SYDNEY SANCHES, DJ de 30.03.2001; RE nº 242.859, Rel Min. ILMAR GALVÃO, DJ de 17.09.1999). Ademais, verificar se o tratamento médico disponível no Brasil substituiria o que é realizado no exterior, dependeria de reexame de fatos e provas, ao que não se presta a via extraordinária (súmula 279). 3. Ante o exposto, nego seguimento ao recurso extraordinário (art. 21, § 1º, do RISTF, art. 38 da Lei nº 8.038, de 28.05.90, e art. 557 do CPC). Publique-se. Int.. Brasília, 24 de setembro de 2004. Ministro CEZAR PELUSO Relator. fim do documento

Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(411557.NUME.%20OU%20411557.DMS.)%20NAO%20S.PRES.&base=baseMonocraticas>. Acesso em: jul. 2007.

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ANEXO J – íntegra decisão AIAgR562703/RS

STF

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Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/inteiroTeor/obterInteiroTeor.asp?numero=562703&classe=AI-AgR>. Acesso em: jul. 2007.

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ANEXO K – íntegra decisão AI597141/RS STF

AI 597141 / RS - RIO GRANDE DO SUL AGRAVO DE INSTRUMENTO

Relator(a)

Min. CÁRMEN LÚCIA

Partes

AGTE.(S): MUNICÍPIO DE PORTO ALEGRE ADV.(A/S): CLÁUDIA PADARATZ AGDO.(A/S): TEREZA PORCIUNCULA DE AZEVEDO ADV.(A/S): FABRICIO SOUZA DA CUNHA E OUTRO(A/S) INTDO.(A/S): ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL ADV.(A/S): PGE-RS - KARINA DA SILVA BRUM

Julgamento

11/06/2007

Publicação

DJ 29/06/2007 PP-00174

Despacho

DECISÃO AGRAVO DE INSTRUMENTO. FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS A PORTADOR DE DOENÇA GRAVE. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS. DIREITO À VIDA E À SAÚDE. DEVER CONSTITUCIONAL DO ESTADO. AGRAVO AO QUAL SE NEGA SEGUIMENTO. Relatório 1. Agravo de instrumento contra decisão que não admitiu o recurso extraordinário, interposto com base no art. 102, inc. III, alínea a, da Constituição da República. 2. O recurso inadmitido tem como objeto o seguinte julgado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul: "APELAÇÃO CÍVEL. REEXAME NECESSÁRIO. CONSTITUCIONAL. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. PRELIMINAR DE CARÊNCIA DE AÇÃO. AUSÊNCIA DE LEGITIMIDADE. Em razão da responsabilidade prevista no artigo 196 da Constituição Federal, a legitimidade passiva para a causa consiste na coincidência entre a pessoa do réu e a pessoa de qualquer um dos vários entes federativos. A presença de um dos vários legitimados no pólo passivo da relação processual decorre da escolha do demandante, já que todos e qualquer um deles tem o dever de 'cuidar da saúde e assistência pública' na forma do inciso II do artigo 23 da Constituição Federal. Preliminar rejeitada. MÉRITO. O fornecimento de medicação é excepcional a pacientes sem meios econômicos para a aquisição com recursos próprios. Trata-se de direito MÉRITO. O fornecimento de medicação é excepcional a pacientes sem meios econômicos para a aquisição com recursos próprios. Trata-se de direito à vida e à saúde, garantia constitucional e dever do Estado. O direito à saúde é assegurado a todos, devendo os necessitados receberem do ente público os medicamentos necessários. Preliminar rejeitada. Apelo desprovido. Sentença confirmada em reexame necessário" (fl. 13). 3. O Município alega que o acórdão recorrido teria contrariado os arts. 2º, 23, inc. II, 196, e 198, da Constituição da República. Afirma que "os princípios fundamentais - nos quais se enquadra o direito à saúde - são mandados de otimização, isto é, podem ser cumpridos em diferentes graus, sendo a intensidade de seu cumprimento adstrita às possibilidades fáticas ou jurídicas. Ordenam, portanto, a realização de algo (ou permitem ou proíbem) na maior medida do possível, dentro das possibilidades jurídicas e fáticas existentes. Trata-se de um juízo de ponderação e não de validade e que surge diante de um caso concreto." (fl. 25) Sustenta, também, que "no presente caso, a pretensão é de fornecimento de medicamento de competência exclusiva do Estado do Rio Grande do Sul, tendo em vista constar na listagem de medicamentos excepcionais, de responsabilidade daquele ente público, conforme organização estabelecida para o Sistema..." (fl. 26). E ainda, que a Constituição da República estabelece competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (inc. II do art. 23) para o fornecimento de medicamentos, a qual não se confunde com responsabilidade solidária Apreciada a matéria trazida na espécie, Apreciada a matéria trazida na espécie, DECIDO. 4. Não tem razão o Agravante. No recurso interposto não se demonstra qualquer contrariedade da decisão recorrida com a jurisprudência predominante no Supremo Tribunal Federal. O entendimento adotado pelo Tribunal de origem não diverge da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal quanto à obrigatoriedade de o Poder Público (União, Estados e Municípios) fornecer, gratuitamente, a pessoas carentes, portadoras de doenças graves, medicamentos destinados a assegurar condições do direito à continuidade da vida digna e a preservação da saúde. Nesse sentido: "E M E N T A: PACIENTES COM ESQUIZOFRENIA PARANÓIDE E DOENÇA MANÍACO-DEPRESSIVA CRÔNICA, COM EPISÓDIOS DE TENTATIVA DE SUICÍDIO - PESSOAS DESTITUÍDAS DE RECURSOS FINANCEIROS - DIREITO À VIDA E À SAÚDE - NECESSIDADE IMPERIOSA DE SE PRESERVAR, POR RAZÕES DE CARÁTER ÉTICO-JURÍDICO, A INTEGRIDADE DESSE DIREITO ESSENCIAL - FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS INDISPENSÁVEIS EM FAVOR DE PESSOAS CARENTES - DEVER CONSTITUCIONAL DO ESTADO (CF, ARTS. 5º, "CAPUT", E 196) - PRECEDENTES (STF) - ABUSO DO DIREITO DE RECORRER - IMPOSIÇÃO DE MULTA - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. O DIREITO À SAÚDE REPRESENTA CONSEQÜÊNCIA CONSTITUCIONAL INDISSOCIÁVEL DO DIREITO À VIDA. - O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa

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jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República (art. 196). Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular - e implementar - políticas sociais e econômicas idôneas que visem a garantir, aos cidadãos, o acesso universal e igualitário à assistência farmacêutica e médico-hospitalar. - O direito à saúde - além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas - representa conseqüência constitucional indissociável do direito à vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional. A INTERPRETAÇÃO DA NORMA PROGRAMÁTICA NÃO PODE TRANSFORMÁ-LA EM PROMESSA CONSTITUCIONAL INCONSEQÜENTE. - O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política - que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro - não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado. DISTRIBUIÇÃO GRATUITA, A PESSOAS CARENTES, DE MEDICAMENTOS ESSENCIAIS À PRESERVAÇÃO DE SUA VIDA E/OU DE SUA SAÚDE: UM DEVER CONSTITUCIONAL QUE O ESTADO NÃO PODE DEIXAR DE CUMPRIR. - O reconhecimento judicial da validade jurídica de programas de distribuição gratuita de medicamentos a pessoas carentes dá efetividade a preceitos fundamentais da Constituição da República (arts. 5º, "caput", e 196) e representa, na concreção do seu alcance, um gesto reverente e solidário de apreço à vida e à saúde das pessoas, especialmente daquelas que nada têm e nada possuem, a não ser a consciência de sua própria humanidade e de sua essencial dignidade. Precedentes do STF. MULTA E EXERCÍCIO ABUSIVO DO DIREITO DE RECORRER. - O abuso do direito de recorrer - por qualificar-se como prática incompatível com o postulado ético-jurídico da lealdade processual - constitui ato de litigância maliciosa repelido pelo ordenamento positivo, especialmente nos casos em que a parte interpõe recurso com intuito evidentemente protelatório, hipótese em que se legitima a imposição de multa. A multa a que se refere o art. 557, § 2º, do CPC possui função inibitória, pois visa a impedir o exercício abusivo do direito de recorrer e a obstar a indevida utilização do processo como instrumento de retardamento da solução jurisdicional do conflito de interesses. Precedentes" (RE 393.195-AgR, Rel. Min. Celso de Mello, Segunda Turma, DJ 2.2.2007). E ainda: AI 604.949-AgR, Rel. Min. Eros Grau, DJ 24.11.2006; AI 486.816-AgR, Rel. Min. Carlos Velloso, Segunda Turma, DJ 6.5.2005; RE 242.859-AgR, Rel. Min. Ilmar Galvão, Primeira Turma, DJ 17.9.1999; e RE 509.569, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 14.3.2007. 5. Ademais, o direito à vida compreende o direito à saúde, para que seja possível dar concretude ao princípio do viver digno. A Constituição da República assegura o direito à dignidade da pessoa humana (art. 1º, inc. III) e, em sua esteira, todos os meios de acesso aos fatores e condições que permitam a sua efetivação. Esse princípio constitui, no sistema constitucional vigente, um dos fundamentos mais expressivos sobre o qual se institui o Estado Democrático de Direito (CF, art. 1º, III). O direito de todos à saúde, "O direito de todos à saúde, "garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação", conforme se contém no art. 196 da Constituição da República, compatibiliza-se, ainda, com o princípio constitucional da igualdade, daí a norma constitucional assecuratória do acesso universal e igualitário a todos os recursos disponíveis para garantia de condições de saúde. 6. Pelo exposto, não havendo divergência da decisão agravada com o quanto firmado como jurisprudência pelo Supremo Tribunal, nego seguimento a este agravo (art. 557, caput, do Código de Processo Civil e art. 21, § 1º, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal). Publique-se. Brasília, 11 de junho de 2007. Ministra CÁRMEN LÚCIA Relatora

Legislação

LEG-FED CF ANO-1988 ART-00001 INC-00003 ART-00005 "CAPUT" ART-00023 INC-00002 ART-00102 INC-00003 LET-A ART-00196 ART-00198 CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL LEG-FED LEI-005869 ANO-1973 ART-00557 PAR-00002 CPC-1973 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL LEG-FED RGI ANO-1980 ART-00021 PAR-00001 RISTF-1980 REGIMENTO INTERNO DO SUPREMO T RIBUNAL FEDERAL

Observação

Legislação feita por:(MGC).

fim do documento

Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(597141.NUME.%20OU%20597141.DMS.)%20NAO%20S.PRES.&base=baseMonocraticas>. Acesso em: ago. 2007.

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ANEXO L – íntegra decisão AC1827/RJ STF

AC 1827 / RJ - RIO DE JANEIRO AÇÃO CAUTELAR

Relator(a)

Min. CÁRMEN LÚCIA

Partes

REQTE.(S): MUNICÍPIO DE ARMAÇÃO DE BÚZIOS ADV.(A/S): NATALINO GOMES DE SOUZA FILHO E OUTRO(A/ S) REQDO.(A/S): TERCEIRA VICE-PRESIDENTE DO TRIBUNAL D E JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO INTDO.(A/S): ROBERTO CARVALHAL DE MOURA

Julgamento

19/10/2007

Publicação

DJE-132 DIVULG 26/10/2007 PUBLIC 29/10/2007 DJ 29/10/2007 PP-00024

Despacho

DECISÃO AÇÃO CAUTELAR. FORNECIMENTO DE MEDICAÇÃO. DESTRANCAMENTO DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO RETIDO NA ORIGEM. SEGUIMENTO NEGADO. Relatório 1. Ação Cautelar, com pedido de tutela antecipada, ajuizada neste Supremo Tribunal Federal, pelo Município de Armação dos Búzios, em 2.10.2007, com fundamento nos arts. 34, inc. V, e 288 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça (sic), e 796 e seguintes do Código de Processo Civil, pela qual se busca a antecipação dos efeitos da tutela recursal para "destrancar o Recurso Extraordinário [n. 2007.134.07779] ... retido pela Terceira Vice-Presidente do Tribunal de Justiça" do Rio de Janeiro e a concessão de efeito suspensivo a ele (fl. 2). 2. Roberto Carvalhal de Moura, ora interessado, ajuizou ação ordinária, com pedido de tutela antecipada, para que o Município de Armação dos Búzios fornecesse medicamentos que lhe foram prescritos. Em 16.11.2006, o juiz da Comarca de Armação dos Búzios deferiu a antecipação da tutela e determinou que aquele Município fornecesse, gratuitamente, os medicamentos receitados (Processo n. 2006.078.001974-0, Petição Avulsa STF n. 162770/2007). Em 19.6.2007, o Município de Armação dos Búzios interpôs agravo de instrumento com pedido de "concessão de efeito suspensivo ativo ... com o fim de suspender liminarmente a eficácia da decisão de primeira instância, até o julgamento" do agravo (Agravo n. 15.703/2007, Petição Avulsa STF n. 162770/2007). Em 26.6.2007, a Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro negou seguimento ao recurso de agravo e, interposto agravo regimental, a ele negou provimento, em 25.7.2007, ao fundamento de que "Não há que se limitar a responsabilidade do Agravante à validade da lista da farmácia básica" (Petição Avulsa STF n. 162.770/2007). Em 3.9.2007, o Município de Armação dos Búzios interpôs recurso extraordinário e requereu "a concessão do efeito suspensivo ao presente recurso, até o julgamento final do mesmo, e ... a reforma integral do acórdão que ora se recorre" (Petição Avulsa STF n. 162.770/2007). Em 11.9.2007, a Terceira Vice-Presidência do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro determinou que ficasse retido o recurso extraordinário do Município (art. 542, § 3º, do Código de Processo Civil, Petição Avulsa STF n. 160585/2007). 3. Contra essa decisão o Município de Armação dos Búzios ajuíza a presente ação cautelar para "destrancar Recurso Extraordinário proposto diante do não provimento do Recurso de Agravo de Instrumento [n. 15.703/2007] que manteve a decisão de Primeira Instância da Comarca de Armação dos Búzios que determinou, liminarmente, [nos autos da Ação Ordinária n. 2006.078.001974-0], (...), a entrega, pelo Município, da medicação excepcional relacionada à Hepatite C, em total arrepio ao Convênio firmado entre os 3 Entes da Federação e o Ministério da Saúde...." (fl. 8). Assevera que o "fornecimento a todos os pacientes portadores de hepatite C crônica, fora dos parâmetros estabelecidos no programa do Ministério da Saúde inviabilizaria [o] orçamento financeiro do Município, já que esses pacientes encontram-se sob a responsabilidade político-financeira do Estado, pelo método do [Sistema Único de Saúde]..." (fl. 9). Argumenta que "o Judiciário não pode editar norma genérica e impessoal que substitui o documento do Ministério da Saúde, sob pena de invasão de competência do Poder Executivo, o que não [seria] permitido pelo artigo 2º da [Constituição da República], que encerra o princípio da independência dos poderes" (fl. 10, grifos no original). Insiste que "a competência para fornecimento de medicamentos excepcionais é exclusiva do Estado, restando ao Município apenas a competência para fornecimento de medicamentos de atenção básica segundo a Política Nacional de medicamentos" (fl. 15, grifos no original). Sustenta ser necessário dar efeito suspensivo ao recurso, "sob pena de gerar grave prejuízo ao Erário Público, e a quebra do equilíbrio orçamentário-financeiro do Município de Armação dos Búzios ..." (fl. 5, grifos no original). Requer "seja a presente Medida Cautelar recebida e, conseqüentemente acolhida, com a concessão de tutela antecipada, com a finalidade precípua de destrancar o Recurso Extraordinário admitido e retido pela Douta Terceira Vice-Presidente do Tribunal de Justiça do [Rio de Janeiro], e a concessão de efeito suspensivo ao Recurso, uma vez que a demora no julgamento do recurso causar[ia] danos irreparáveis à Administração Pública...." (fl. 21). Analisados os elementos havidos nos autos, DECIDO. 4. Este Supremo Tribunal Federal tem admitido as ações cautelares ajuizadas para o fim de destrancar o recurso extraordinário retido, quando o Recorrente se insurge contra a aplicação do art. 542, § 3º, do Código de Processo Civil. No julgamento da Questão de Ordem na Petição n. 2.222-PR, a Primeira Turma deste Supremo Tribunal Federal decidiu: "EMENTA: 1. Medida cautelar em recurso extraordinário: competência do Supremo Tribunal Federal para o julgamento de medidas cautelares de [Recurso Extraordinário], quando nela se oponha o recorrente à aplicação do art. 542, § 3º, do [Código de Processo Civil]: incidência do disposto no parágrafo único do art. 800 do [Código de Processo Civil] (''interposto o recurso, a medida cautelar será requerida diretamente ao tribunal''): hipótese de medida cautelar que visa a afastar óbice ao processamento do recurso na instância a quo, diversa do problema do início da jurisdição cautelar do Supremo para conceder efeito suspensivo ao [Recurso Extraordinário]. 2. Medida cautelar: indeferimento: ausência de fumus boni juris: caso de recurso extraordinário contra decisão concessiva de tutela antecipada em ação civil pública, não cabível, por não se tratar de decisão definitiva: [Código de Processo Civil], art. 273, § 4º" (Relator Ministro Sepúlveda Pertence, DJ 12.3.2004). Em seu voto, o Relator Ministro Sepúlveda Pertence consignou: "no julgamento da PET 2.151 (DJ 7.12.00), também relator o Ministro Octavio Gallotti, decidimos que seria aplicável às medidas cautelares ajuizadas para afastar a incidência do disposto no art. 542, § 3º, [Código de Processo Civil], a orientação adotada pelo Tribunal a propósito das medidas cautelares objetivando a concessão de efeito suspensivo a recurso extraordinário. Lê-se no voto condutor do acórdão: ''Ao negar provimento ao Agravo

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Regimental na Petição nº 1.903, relator o eminente Ministro NÉRI DA SILVEIRA, definiu o Plenário do Supremo Tribunal a competência do Presidente da Corte de origem para conceder, ou não, a medida cautelar (art. 800 do Código de Processo Civil), entre a interposição do recurso e a prolação do seu juízo de admissibilidade. Razão não há para excluir desse critério a hipótese da retenção do recurso extraordinário (art. 542, § 3º, do Código de Processo Civil), que só faz alongar o interregno do seu processamento, sem falar na inevitável prejudicialidade a resultar do julgamento concomitante do outro recurso extraordinário que vier a ser interposto, por qualquer das partes, contra a decisão definitiva. Isto posto, e sendo a competência para apreciá-lo, não do Supremo Tribunal, mas do Presidente, ou Vice-Presidente, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, não conheço do pedido.'' Reexaminando a matéria, tenho como acertada a afirmação da competência do Tribunal para o julgamento de medidas cautelares de [Recurso Extraordinário], quando nela se oponha o recorrente à aplicação do art. 542, § 3º, [do Código de Processo Civil]. De fato, não se cuidará aí da atribuição de efeito suspensivo a recurso extraordinário pendente de apreciação na instância de origem, mas simplesmente de determinar o processamento do recurso nessa instância - isto é, a intimação da parte contrária para o oferecimento de contra-razões e a prolação do juízo de admissibilidade: logo, não há razão para afastar-se a incidência do disposto no parágrafo único do art. 800 [do Código de Processo Civil], segundo o qual ''interposto o recurso, a medida cautelar será requerida diretamente ao tribunal''. Nessas hipóteses, com efeito, a concessão da medida liminar não interfere minimamente na competência do Presidente do tribunal a quo para decidir sobre a admissibilidade do [Recurso Extraordinário], ao contrário do que ocorreria se o Tribunal concedesse efeito suspensivo a [Recurso Extraordinário] ainda não submetido a juízo de admissibilidade, caso em que, segundo se tem frisado, o Presidente do tribunal a quo estaria compelido a admitir o recurso, qual acentuado pelo em. Min. Moreira Alves na PET(QO) 1.863. Conheço, pois, da presente medida cautelar". 5. Embora o disposto no § 3º do art. 542 do Código de Processo Civil seja taxativo quanto às hipóteses de retenção do recurso extraordinário interposto contra decisão interlocutória, nos processos de conhecimento, cautelar ou embargos à execução, o Ministro deste Supremo Tribunal Federal poderá determinar o processamento do recurso extraordinário quando entender que exista plausibilidade jurídica do pedido a justificar que este seja destrancado. Nesse sentido, ao decidir a Ação Cautelar n. 1.764-MG, o Relator, Ministro Gilmar Mendes, explicou que a norma do § 3º do art. 542 do Código de Processo Civil "deve ser interpretada com temperamentos, pois não deve incidir indiscriminadamente sobre qualquer decisão interlocutória, que muitas vezes podem causar prejuízos irreparáveis às partes. Assim, a regra do art. 542, § 3º, do Código de Processo Civil, poderá ser afastada nas hipóteses em que esteja comprovada a possibilidade de ocorrência de danos irreparáveis ou de difícil reparação às partes e demonstradas a viabilidade processual do recurso extraordinário e a plausibilidade das razões alegadas" (decisão monocrática, DJ 20.9.2007). À unanimidade, esse entendimento foi confirmado pela Segunda Turma deste Supremo Tribunal Federal, que, no julgamento do Agravo Regimental na Ação Cautelar n. 133-RS, decidiu que "Não basta a existência do periculum in mora, para justificar o excepcional destrancamento do recurso extraordinário. É também necessária a configuração da viabilidade do recurso" (Relatora Ministra Ellen Gracie, DJ 7.5.2004). 6. No presente caso, entendo que o Autor não tem razão de direito quanto à sua pretensão. A decisão proferida nos autos da Ação Ordinária n. 2006.078.001974-0 contra a qual se insurge, na origem, o Município de Armação dos Búzios tem o seguinte fundamento: "...DETERMINO que o município de Armação dos Búzios, por seu SECRETÁRIO MUNICIPAL DE SAÚDE, disponibilize imediatamente ao autor [ora Interessado] os medicamentos Pegasys 180 mgc - Interferon Peguilato Alfa - 2 A e Ribavirina 250 mg., observando a quantidade necessária para as vinte e quatro semanas de prolongamento do tratamento e os prazos para a entrega. Diante das insistentes e inaceitáveis resistências e recusas da autoridade municipal, fica o Secretário Municipal de Saúde advertido de que não será tolerada nova manifestação de desobediência. Os medicamentos deverão estar disponibilizados para o autor até as 11:00 horas do dia 30 de maio de 2007, sob pena de prisão e da instauração do competente processo penal..." (fl. 8 e sítio do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro). A alegação do Município de que essa decisão teria gerado grave prejuízo ao erário e, ainda, que teria desequilibrado o orçamento não se mostra suficiente a demonstrar o fumus boni iuris e a viabilidade do recurso extraordinário quando contraposto à saúde do cidadão, conforme o que por mim já decidido: "o direito à vida compreende o direito à saúde, para que seja possível dar concretude ao princípio do viver digno. A Constituição da República assegura o direito à dignidade da pessoa humana (art. 1º, inc. III) e, em sua esteira, todos os meios de acesso aos fatores e condições que permitam a sua efetivação. Esse princípio constitui, no sistema constitucional vigente, um dos fundamentos mais expressivos sobre o qual se institui o Estado Democrático de Direito ([Constituição da República], art. 1º, III). O direito de todos à saúde, ''garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação'', conforme se contém no art. 196 da Constituição da República, compatibiliza-se, ainda, com o princípio constitucional da igualdade, daí a norma constitucional assecuratória do acesso universal e igualitário a todos os recursos disponíveis para garantia de condições de saúde" (RE 399.664, DJ 16.8.2007). Ademais, a assente jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal " já está consolidada no sentido de que não cabe recurso extraordinário contra acórdão que defere medida liminar ou que mantém liminar concedida em primeira instância (Súmula n° 735 do [Supremo Tribunal Federal]), decisão que, baseada meramente na ocorrência dos pressupostos do fumus boni iuris e do periculum in mora, não representa pronunciamento definitivo sobre os fundamentos constitucionais da ação (RE 232.387, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 17.5.2002; AI-AgR 439.613, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 17.10.2003; RE-Agr 398315/AP, Rel. Min. Carlos Britto, DJ 20.4.2006; RE-AgR 337.739/DF, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ 31.10.2002, dentre outros)" (Ação Cautelar n. 1.642-RJ, Relator Ministro Gilmar Mendes, DJ 26.6.2007). 7. Pelo exposto, diante da ausência da fumaça do bom direito e do periculum in mora inverso, nego seguimento à presente Ação Cautelar (art. 21, § 1º, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal). Junte-se a Petição Avulsa STF n. 162.770/2007. Publique-se. Brasília, 19 de outubro de 2007. Ministra CÁRMEN LÚCIA Relatora

Legislação LEG-FED CF ANO-1988 ART-00001 INC-00003 ART-00003 ART-000196 CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL LEG-FED LEI-005869 ANO-1973 ART-00273 PAR-00004 ART-00542 PAR-00003 ART-00800 PAR-ÚNICO ****** CPC-1973 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL LEG-FED LEI-010406 ANO-2002 ART-00796 CC-2002 CÓDIGO CIVIL LEG-FED RGI ANO-1980 ART-00021 PAR-00001 RISTF-1980 REGIMENTO INTERNO DO SUPREMO T RIBUNAL FEDERAL LEG-FED RGI ANO-1989 ART-00034 INC-00005 ART-000288 REGIMENTO INTERNO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - STJ LEG-FED SUM-000735 SÚMULA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - STF Observação Legislação feita por:(AAS). fim do documento Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(1827.NUME.%20OU%201827.DMS.)%20NAO%20S.PRES.&base=baseMonocraticas>. Acesso em: nov. 2007.

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ANEXO M – íntegra decisão RE562630/ES STF

RE 562630 / ES - ESPÍRITO SANTO RECURSO EXTRAORDINÁRIO

Relator(a)

Min. CEZAR PELUSO

Partes

RECTE.(S): UNIÃO ADV.(A/S): ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO RECDO.(A/S): SUELY MENDES DE OLIVEIRA ADV.(A/S): DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO

Julgamento

26/09/2007

Publicação

DJE-121 DIVULG 10/10/2007 PUBLIC 11/10/2007 DJ 11/10/2007 PP-00127

Despacho

DECISÃO: 1. Trata-se de recurso extraordinário interposto contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 2ª Região e assim ementado: "CONSTITUCIONAL. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO ZOLADEX 10,8 mg. LEGITIMIDADE DOS 3 ENTES DA FEDERAÇÃO. 1. Ilegitimidade passiva rejeitada, posto que a saúde é direito de todos e dever do Estado, na forma do art. 196 da CR/88, entendendo-se por Estado as 3 esferas de governo, na forma do art. 9º da Lei 8.080/90. 2. Interesse processual inequívoco. Alegação de necessidade de recurso prévio à esfera administrativa rejeitada ante o princípio da inafastabilidade do Poder Judiciário. 3. Incompetência alegada pelo Estado do Espírito Santo também rejeitada, posto que o litisconsórcio passivo com outros entes além dos mencionados no art. 6º, II, da Lei 10.259/01. Aplicação analógica do Enunciado nº 4 das Turmas Recursais do Rio de Janeiro, integrante desta 2ª Região. 4. Recursos da União, do Estado do Espírito Santo e do Município de Vitória improvidos, condenando-se cada em honorários advocatícios fixados em R$ 500,00 (quinhentos reais). Sentença mantida na íntegra." ( fl. 203) A recorrente, com fundamento no art. 102, III, a, alega violação ao disposto nos arts. 37, caput, e 198, I, da Constituição Federal. 2. Inconsistente o recurso. O acórdão impugnado decidiu a causa com base só na interpretação da legislação infraconstitucional, de modo que eventual ofensa à Constituição Federal seria, aqui, apenas indireta. Ora, é pacífica a jurisprudência desta Corte, no sentido de não tolerar, em recurso extraordinário, alegação de ofensa que, irradiando-se de má interpretação, aplicação, ou, até, de inobservância de normas infraconstitucionais, seria apenas indireta à Constituição da República. Ainda que assim não fosse, a recusa do Estado em fornecer o medicamento coloca em risco a saúde de paciente necessitado e representa desrespeito ao disposto no art. 196 da Constituição Federal, que determina ser a saúde direito de todos e dever do Estado. Essa regra constitucional tem por destinatários todos os entes políticos que compõem a organização federativa do Estado brasileiro. Em caso análogo, decidiu a Segunda Turma no julgamento do RE nº 271.286-AgR, rel. Min. CELSO DE MELLO. Da ementa do acórdão consta: "EMENTA: PACIENTE COM HIV/AIDS - PESSOA DESTITUÍDA DE RECURSOS FINANCEIROS - DIREITO À VIDA E À SAÚDE - FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS - DEVER CONSTITUCIONAL DO PODER PÚBLICO (CF, ARTS. 5º, CAPUT, E 196) - PRECEDENTES (STF) - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. O DIREITO À SAÚDE REPRESENTA CONSEQÜÊNCIA CONSTITUCIONAL INDISSOCIÁVEL DO DIREITO À VIDA. - O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República (art. 196) . Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular - e implementar - políticas sociais e econômicas idôneas que visem a garantir, aos cidadãos, inclusive àqueles portadores do vírus HIV, o acesso universal e igualitário à assistência farmacêutica e médico-hospitalar. - O direito à saúde - além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas - representa conseqüência constitucional indissociável do direito à vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional. A INTERPRETAÇÃO DA NORMA PROGRAMÁTICA NÃO PODE TRANSFORMÁ-LA EM PROMESSA CONSTITUCIONAL INCONSEQÜENTE. - O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política - que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro - não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado. DISTRIBUIÇÃO GRATUITA DE MEDICAMENTOS A PESSOAS CARENTES. - O reconhecimento judicial da validade jurídica de programas de distribuição gratuita de medicamentos a pessoas carentes, inclusive àquelas portadoras do vírus HIV/AIDS, dá efetividade a preceitos fundamentais da Constituição da República (arts. 5º, caput, e 196) e representa, na concreção do seu alcance, um gesto reverente e solidário de apreço à vida e à saúde das pessoas, especialmente daquelas que nada têm e nada possuem, a não ser a consciência de sua própria

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humanidade e de sua essencial dignidade. Precedentes do STF." No mesmo sentido, confiram-se: AI nº 418.320, rel. Min. CARLOS VELLOSO; RE nº 259.415, rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE; RE nº 198.263, rel. Min. SYDNEY SANCHES; RE nº 242.859, rel Min. ILMAR GALVÃO. Por outro lado, dissentir do julgado, exigiria, pois, como é óbvio, reexame de provas, a cuja luz foi à causa decidida, o que é vedado na instância extraordinária (súmula 279). 3. Ante o exposto, nego seguimento ao recurso (art. 21, § 1º, do RISTF, art. 38 da Lei nº 8.038, de 28.05.90, e art. 557 do CPC). Publique-se. Int.. Brasília, 26 de setembro de 2007. Ministro CEZAR PELUSO Relator

Legislação

LEG-FED CF ANO-1988 ART-00005 "CAPUT" ART-00037 "CAPUT" ART-00102 INC-00003 LET-A ART-00196 ART-00198 INC-00001 CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL LEG-FED LEI-005869 ANO-1973 ART-00557 CPC-1973 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL LEG-FED LEI-010259 ANO-2001 ART-00006 INC-00002 LJEF-2001 LEI DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVE IS E CRIMINAIS NA JUSTIÇA FEDERAL LEG-FED LEI-008080 ANO-1990 ART-00009 ART-00038 LEI ORDINÁRIA LEG-FED RGI ANO-1980 ART-00021 PAR-00001 RISTF-1980 REGIMENTO INTERNO DO SUPREMO T RIBUNAL FEDERAL LEG-FED SUM-000279 SÚMULA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - STF LEG-FED SUM-000004 SÚMULA DAS TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DO RIO DE JANEIRO, RJ

Observação

Legislação feita por:(RSB).

fim do documento

Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(562630.NUME.%20OU%20562630.DMS.)%20NAO%20S.PRES.&base=baseMonocraticas>. Acesso em: nov. 2007.

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ANEXO N – íntegra decisão STA91/AL STF

STA 91 / AL - ALAGOAS SUSPENSÃO DE TUTELA ANTECIPADA

Relator(a)

Min. PRESIDENTE

Presidente

Min. ELLEN GRACIE

Partes

REQTE.(S): ESTADO DE ALAGOAS ADV.(A/S): PGE-AL - GERMANA GALVÃO CAVALCANTI LAURE ANO REQDO.(A/S): PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO E STADO DE ALAGOAS (AGRAVO REGIMENTAL EM PEDIDO DE SUSPENSÃO DE EFE TIVAÇÃO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA Nº 2006.002444-8) INTDO.(A/S): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE ALAGOA S

Julgamento

26/02/2007

Publicação

DJ 05/03/2007 PP-00023 RDDP n. 50, 2007, p. 165-167

Despacho

1. O Estado do de Alagoas, com fundamento no art. 4º da Lei 8.437/92 e no art. 1.° da Lei 9.494/97, requer a suspensão da execução da tutela antecipada concedida na Ação Civil Pública n.° 001.06.014309-7 (fls. 27/47), que determinou àquele ente federado o fornecimento de medicamentos necessários para o tratamento de pacientes renais crônicos em hemodiálise e pacientes transplantados (fls. 23/26) . O requerente sustenta, em síntese: a) cabimento do presente pedido de suspensão, visto que o Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas indeferiu o pedido de suspensão de tutela antecipada ajuizada perante aquela Corte estadual (fls. 88/94), negando seguimento ao agravo regimental intempestivamente interposto (fls. 110/112) e, posteriormente, ao próprio pedido de reconsideração (fls. 116/118); b) ocorrência de grave lesão à economia pública, porquanto a liminar impugnada é genérica ao determinar que o Estado forneça todo e qualquer medicamento necessário ao tratamento dos transplantados renais e pacientes renais crônicos, impondo-lhe a entrega de "(...) medicamentos cujo fornecimento não compete ao Estado dentro do sistema que regulamenta o serviço, (...)" (fl. 08). Nesse contexto, ressalta que ao Estado de Alagoas compete o fornecimento de medicamentos relacionados no Programa de Medicamentos Excepcionais e de alto custo, em conformidade com a Lei n.° 8.080/90 e pela Portaria n.° 1.318 do Ministério da Saúde. c) existência de grave lesão à ordem pública, vista aqui no âmbito da ordem jurídico-administrativa, porquanto o fornecimento de medicamentos, além daqueles relacionados na Portaria n.° 1.318 do Ministério da Saúde e sem o necessário cadastramento dos pacientes, inviabiliza a programação do Poder Público, o que compromete o adequado cumprimento do Programa de fornecimento de medicamentos excepcionais. 2. O Presidente do Superior Tribunal de Justiça, Ministro Barros Monteiro, ao afirmar que a causa de pedir, na ação ordinária, ostenta índole constitucional, porque envolve a interpretação e aplicação dos arts. 23, inc. II e 198, inc. I da Constituição Federal negou seguimento ao pedido e determinou o envio dos presentes autos ao Supremo Tribunal Federal (fls. 121/122). 3. A Procuradoria-Geral da República opinou pelo deferimento do pedido (fls. 128/134). 4. Inicialmente, reconheço que a controvérsia instaurada no mandado de segurança em apreço evidencia a existência de matéria constitucional: alegação de ofensa aos arts. 23, inc. II e 198, inc. I da Constituição da República e aos princípios da dignidade da pessoa humana e da solidariedade. Dessa forma, cumpre ter presente que a Presidência do Supremo Tribunal Federal dispõe de competência para examinar questão cujo fundamento jurídico é de natureza constitucional (art. 297 do RISTF, c/c art. 25 da Lei 8.038/90), conforme firme jurisprudência desta Corte, destacando-se os seguintes julgados: Rcl 475/DF, rel. Ministro Octavio Gallotti, Plenário, DJ 22.4.1994; Rcl 497-AgR/RS, rel. Ministro Carlos Velloso, Plenário, DJ 06.4.2001; SS 2.187-AgR/SC, rel. Ministro Maurício Corrêa, DJ 21.10.2003; e SS 2.465/SC, rel. Min. Nelson Jobim, DJ 20.10.2004. 5. A Lei 8.437/92, em seu art. 4º, autoriza o deferimento do pedido de suspensão de execução de liminar para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas. Verifico estar devidamente configurada a lesão à ordem pública, considerada em termos de ordem administrativa, porquanto a execução de decisões como a ora impugnada afeta o já abalado sistema público de saúde. Com efeito, a gestão da política nacional de saúde, que é feita de forma regionalizada, busca uma maior racionalização entre o custo e o benefício dos tratamentos que devem ser fornecidos gratuitamente, a fim de atingir o maior número possível de beneficiários. Entendo que a norma do art. 196 da Constituição da República, que assegura o

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direito à saúde, refere-se, em princípio, à efetivação de políticas públicas que alcancem a população como um todo, assegurando-lhe acesso universal e igualitário, e não a situações individualizadas. A responsabilidade do Estado em fornecer os recursos necessários à reabilitação da saúde de seus cidadãos não pode vir a inviabilizar o sistema público de saúde. No presente caso, ao se conceder os efeitos da antecipação da tutela para determinar que o Estado forneça os medicamentos relacionados "(...) e outros medicamentos necessários para o tratamento (...)" (fl. 26) dos associados, está-se diminuindo a possibilidade de serem oferecidos serviços de saúde básicos ao restante da coletividade. Ademais, a tutela concedida atinge, por sua amplitude, esferas de competência distintas, sem observar a repartição de atribuições decorrentes da descentralização do Sistema Único de Saúde, nos termos do art. 198 da Constituição Federal. Finalmente, verifico que o Estado de Alagoas não está se recusando a fornecer tratamento aos associados (fl. 59). É que, conforme asseverou em suas razões, Finalmente, verifico que o Estado de Alagoas não está se recusando a fornecer tratamento aos associados (fl. 59). É que, conforme asseverou em suas razões, "(...) a ação contempla medicamentos que estão fora da Portaria n.° 1.318 e, portanto, não são da responsabilidade do Estado, mas do Município de Maceió, (...)" (fl. 07), razão pela qual seu pedido é para que se suspenda a "(...) execução da antecipação de tutela, no que se refere aos medicamentos não constantes na Portaria n.° 1.318 do Ministério da Saúde, ou subsidiariamente, restringindo a execução aos medicamentos especificamente indicados na inicial, (...)" (fl. 11). 6. Ante o exposto, defiro parcialmente o pedido para suspender a execução da antecipação de tutela, tão somente para limitar a responsabilidade da Secretaria Executiva de Saúde do Estado de Alagoas ao fornecimento dos medicamentos contemplados na Portaria n.° 1.318 do Ministério da Saúde. Comunique-se, com urgência. Publique-se. Brasília, 26 de fevereiro de 2007. Ministra Ellen Gracie Presidente 1

Legislação

LEG-FED CF ANO-1988 ART-00023 INC-00002 ART-00196 ART-00198 INC-00001 ****** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL LEG-FED LEI-008038 ANO-1990 ART-00025 LEI ORDINÁRIA LEG-FED LEI-008080 ANO-1990 LEI ORDINÁRIA LEG-FED LEI-008437 ANO-1992 ART-00004 LEI ORDINÁRIA LEG-FED LEI-009494 ANO-1997 ART-00001 LEI ORDINÁRIA LEG-FED PRT-001318 ANO-2002 PORTARIA DO MINISTÉRIO DA SAÚDE - MS LEG-FED RGI ANO-1980 ART-00297 ****** RISTF-1980 REGIMENTO INTERNO DO SU PREMO TRIBUNAL FEDERAL

Observação

Legislação feita por:(TCR).

fim do documento

Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(91.NUME.%20OU%2091.DMS.)%20E%20S.PRES.&base=basePresidencia>. Acesso em: nov. 2007.

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ANEXO O – ÍNTEGRA DECISÃO AC 70019513431 TJ/RS

CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL.

PROVA. PERÍCIA. IRRELEVÂNCIA. DISPENSA.

A dispensa de prova sem pertinência ou relevância não caracteriza violação a nenhum princípio ou regra constitucional ou infraconstitucional.

INTERESSE DE AGIR. COMPREENSÃO.

O interesse de agir decorre da necessidade de acesso ao judiciário para obtenção do bem da vida, que não pressupõe prévio recurso ou esgotamento da via administrativa.

SAÚDE PÚBLICA. MEDICAMENTOS. DISPENSAÇÃO. ESTADO. R ESPONSABILIDADE. LIMITES. PRINCÍPIOS DA DESCENTRALIZAÇÃO E HIERARQUIZAÇÃO. DE STINATÁRIOS. POPULAÇÃO CARENTE.

À luz dos princípios da descentralização e hierarquização que presidiram a partilha de competências para ações e serviços da saúde entre os aparelhamentos administrativos das diferentes unidades da Federação, ao Estado incumbe a aquisição e dispensação de fármacos constantes das Portarias nº 2.577, de 27 de outubro de 2006 (medicamentos excepcionais), e nº 238, de 17 de maio de 2006 (medicamentos especiais). As políticas públicas de saúde visam assegurar assistência àqueles que não dispõem de recursos próprios para esse fim, em conformidade com os princípios consagrados nos artigos 3º, inciso IV, e 196 da Constituição Federal, e artigo 7º, inciso IV da Lei nº 8.080/90. GRATUIDADE JUDICIÁRIA. DECLARAÇÃO DE POBREZA. PRESU NÇÃO DE CARÁTER RELATIVO. MOSTRAS DE SITUAÇÃO DIVERSA. REVOGAÇÃO DO BENEFÍCIO. A presunção conferida no art. 4º, § 1º, da Lei nº 1.060/50, cede ante a presença de sinais ou mostras de situação diferente da afirmada pelo interessado. APELAÇÕES PROVIDAS.

APELAÇÃO CÍVEL

VIGÉSIMA SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Nº 70019513431

COMARCA DE MARAU

MUNICIPIO DE MARAU

APELANTE

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

APELANTE

MORGIANA GAVIOLI

APELADO

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam as Desembargadoras integrantes da Vigésima Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à

unanimidade, dar provimento aos recursos.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além da signatária, as eminentes Senhoras DES.ª MARIA ISABEL DE AZEVEDO SOUZA

(PRESIDENTE E REVISORA) E DES.ª REJANE MARIA DIAS D E CASTRO BINS .

Porto Alegre, 27 de setembro de 2007.

DES.ª MARA LARSEN CHECHI, Relatora.

R E L A T Ó R I O

DES.ª MARA LARSEN CHECHI (RELATORA)

MORGIANA GAVIOLI ajuizou ação objetivando compelir o ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL e o MUNICÍPIO DE

MARAU ao fornecimento gratuito de “IMUNOGLOBULINA HUMANA 12g ou ENDOBULIN”, para tratamento de “alteração imunológica com

conseqüente aborto de repetição”.

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

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Ao relatório da r. sentença (fls. 160-169), do qual se parte, acrescenta-se que a ação foi julgada procedente, ao efeito de “CONDENAR

os réus (...) solidariamente a fornecer o medicamento imunoglobulina humana 12mg, na quantidade buscada na inicial e CONCEDO A ANTECIPAÇÃO DE

TUTELA DOS EFEITOS DA SENTENÇA, devendo os entes públicos comprovar o fornecimento do medicamento, no prazo de cinco dias, sob pena de

bloqueio de valores”. No capítulo acessório, dispôs: “Condeno os réus no pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, os quais fixo no valor de

R$ 1.000,00 face ao trabalho desenvolvido”.

Inconformados, os réus apelam.

O MUNICÍPIO DE MARAU argúi nulidade da sentença, relacionando-a com supressão da oportunidade de produzir provas,

especialmente pericial, a seu juízo, indispensável à demonstração da necessidade do produto, bem como da existência de fármacos similares

disponibilizados pela rede pública, e adequados ao tratamento. Ainda, reafirma sua ilegitimidade para a causa. Sucessivamente, torna a

controverter sua legitimidade para a causa, considerando, com fundamento na “Portaria 22/2003” e na “Lei Estadual nº 9.908/93”, que ao Estado

do Rio Grande do Sul incumbe a dispensação da droga postulada. Sustenta que o “fornecimento dos medicamentos, da forma como se apresentou,

provocará a utilização de verbas escassas, coloca em risco a saúde da comunidade, ofendendo o programa global”. Argumenta, por fim: “ante a carência de

recursos financeiros dos entes públicos como um todo, faz-se necessária a aplicação do Princípio da Reserva do Possível, no âmbito da análise, pelo Poder

Judiciário, dos Direitos e Garantias Fundamentais pleiteados”. Requer “fixação” de verba honorária “nos termos do art. 20, §4º, do CPC” (fls. 176-188).

O ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, por sua vez, reedita preliminar de carência de ação, que situa na falta de interesse

de agir, extraída da possibilidade de atendimento do pedido na via administrativa. Insurge-se contra a ordem de “bloqueio de valores” em sua

conta bancária. Denuncia violação aos artigos 2º, 5º, II, 100, §§ 2º, 167, II, VII, VIII, e 168 da Constituição Federal e 461, §§ 4º e 5º, 461-A e

731 do CPC. Lembra que os bens públicos estão protegidos pela “inalienabilidade, imprescritibilidade, impenhorabilidade e impossibilidade de

oneração”. Controverte a condenação “a desembolsar valores a título de honorários advocatícios com profissionais de atividade privada, quando tem quadro

próprio remunerado para essa finalidade”, postulando a “redução do valor fixado pela sentença”. Transcreve precedentes (fls. 193-205).

Com a resposta (211-271), os recursos vieram a esta Corte.

A douta Procuradoria de Justiça emitiu parecer no sentido do parcial provimento do apelo do Estado e desprovimento do

recurso do Município (fls. 223-253).

É o relatório.

V O T O S

DES.ª MARA LARSEN CHECHI (RELATORA)

DA VALIDADE DA SENTENÇA

A despeito da pertinência entre os fatos a provar (necessidade do fármaco e existência de similares disponibilizados pela rede pública) e

aquele constitutivo do direito alegado pela autora (adequação da Imunoglobulina Humana ou Endobulin, para tratamento de alteração imunológica com

conseqüente aborto de repetição), não se vê relevância na elucidação desta questão para a solução de mérito da demanda, porquanto o diagnóstico da moléstia

e a indicação terapêutica do fármaco, amparados em prova técnica (fls.13 a 15), não foram controvertidos pelos réus. Ademais, a Imunoglobulina Humana está

listada no Anexo II da Portaria nº 2.577 do Ministério da Saúde, de 27 de outubro de 2006, entre os “IMUNOTERÁPICOS” de dispensação excepcional.

Destarte, a supressão da oportunidade de prova pericial, porque desnecessária471, apenas cumpriu a regra do art. 130 do CPC, não

incidindo em nenhuma ofensa a princípio ou regra constitucional ou infraconstitucional.

DO INTERESSE PROCESSUAL

Também inconsistente a preliminar de carência de ação, argüida pelo Estado.

O interesse de agir decorre da necessidade de acesso ao judiciário para obtenção do bem da vida, o qual não pressupõe

prévio recurso ou esgotamento da via administrativa.

DA LEGITIMAÇÃO PARA A CAUSA

A pertinência da obrigação, que o Município controverte no plano da legitimidade, diz com o mérito da causa, segundo

entendimento que se vitoriou no Col. Décimo Primeiro Grupo Cível da Corte local, e assim será examinada a seguir.

471 “Diante de um fato controvertido, o primeiro cuidado do julgador deve ser examinar sua pertinência; subseqüentemente, sua relevância, se acaso admitido como pertinente; por último, a pertinência e a relevância não mais do fato em si mesmo, sim da prova que sobre esse fato a parte pretende produzir. (...) O juízo sobre a pertinência não é de dificuldade apreciável. Para esse fim, cumpre atentar-se na relação existente entre o fato a provar e os fatos constitutivos do pedido do autor ou da objeção do réu (art. 333) ou representativos da exceção ou objeção do réu” (JOSÉ JOAQUIM CALMON DE PASSOS. Comentários ao CPC. 6ª ed. Rio: Forense, 3º vol., 1989, p. 496).

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DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE

A Constituição Federal de 1988 consagrou, entre outros direitos sociais, o “relativo à saúde” (paralelamente aos direitos relativos à

previdência e à assistência social), consolidou o sentido da seguridade social (art. 194472), como um conjunto de ações (e, implicitamente, serviços), voltados à

promoção, proteção e recuperação deste direito, impondo ao poder público o correlato dever de garanti-lo através de políticas sociais e econômicas, a serem

implementadas com observância dos princípios da igualdade e da universalidade (art. 196473), através de um sistema público único, descentralizado e

hierarquizado (art. 23, II,474 e 198475).

Efetivamente, num país pobre, de dimensões continentais, a justa distribuição de recurso nesta, como em outras áreas, exige

planejamento técnico, que tenha em conta a economicidade das ações e o custo-benefício dos tratamentos, sob pena de prejuízo à assistência de um grande

contingente da população carente476.

Visando adequar a assistência farmacêutica a tais diretrizes, o Ministério da Saúde estabeleceu, através da Portaria nº

2.577, de 27 de outubro de 2006, parâmetros para seleção/aquisição/dispensação de medicamentos excepcionais ; e da Portaria nº 2.475, de

13 de outubro de 2006, para aquisição/dispensação de medicamentos essenciais (definidos na Portaria 3.916/98 como “aqueles produtos

472 “Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social. Parágrafo único. Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, com base nos seguintes objetivos: I - universalidade da cobertura e do atendimento; II - uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais; III - seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços; IV - irredutibilidade do valor dos benefícios; V - eqüidade na forma de participação no custeio; VI - diversidade da base de financiamento; VII - caráter democrático e descentralizado da administração, mediante gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e do Governo nos órgãos colegiados”. 473 “Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”. 474 “Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: (...) II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência;”. 475 “Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes: I - descentralização, com direção única em cada esfera de governo; II - atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais; III - participação da comunidade. § 1º. O sistema único de saúde será financiado, nos termos do art. 195, com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes. § 2º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios aplicarão, anualmente, em ações e serviços públicos de saúde recursos mínimos derivados da aplicação de percentuais calculados sobre: I - no caso da União, na forma definida nos termos da lei complementar prevista no § 3º; II - no caso dos Estados e do Distrito Federal, o produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 155 e dos recursos de que tratam os arts. 157 e 159, inciso I, alínea a, e inciso II, deduzidas as parcelas que forem transferidas aos respectivos Municípios; III - no caso dos Municípios e do Distrito Federal, o produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 156 e dos recursos de que tratam os arts. 158 e 159, inciso I, alínea b e § 3º. § 3º Lei complementar, que será reavaliada pelo menos a cada cinco anos, estabelecerá: I - os percentuais de que trata o § 2º; II - os critérios de rateio dos recursos da União vinculados à saúde destinados aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, e dos Estados destinados a seus respectivos Municípios, objetivando a progressiva redução das disparidades regionais; III - as normas de fiscalização, avaliação e controle das despesas com saúde nas esferas federal, estadual, distrital e municipal; IV - as normas de cálculo do montante a ser aplicado pela União”. 476 “a gestão da política nacional de saúde, que é feita de forma regionalizada, busca uma maior racionalização entre o custo e o benefício dos tratamentos que devem ser fornecidos gratuitamente, a fim de atingir o maior número possível de beneficiários. ... a norma do art. 196 da Constituição da República, que assegura o direito à saúde, refere-se, em princípio, à efetivação de políticas públicas que alcancem a população como um todo, assegurando-lhe acesso universal e igualitário, e não situações individualizadas.” (STF. Suspensão de Tutela Antecipada – STA 91/AL, relatora a Senhora Ministra ELLEN GRACIE, j. em 26.02.2007).

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considerados básicos e indispensáveis para atender a maioria dos problemas de saúde da população, e compõem uma relação nacional de referência que servirá

de base para o direcionamento da produção farmacêutica e para o desenvolvimento científico e tecnológico, bem como para definição de listas de

medicamentos essenciais nos âmbitos estadual e municipal, que deverão ser estabelecidas com apoio do gestor federal e segundo a situação epidemiológica

respectiva”).

No âmbito do Estado do Rio Grande do Sul, foram editadas a Lei Estadual nº 9.908, de 16 de junho de 1993 (que dispõe

sobre o fornecimento de medicamentos excepcionais para pessoas carentes e dá outras providências), o Decreto Estadual nº 35.056, de 07 de

janeiro de 1994 (regulamentando a Lei nº 9.908, de 16 de junho de 1993, que dispõe sobre o fornecimento de medicamentos e dá outras

providências), e a Portaria nº 238, de 17 de maio de 2006, da Secretaria da Saúde (que define medicamentos especiais a serem dispensados

pelo Estado).

A regra orçamentária das ações e serviços públicos de saúde encontra-se nos artigos 195 e 198, ambos da Constituição

Federal.

Outrossim, conforme deflui das disposições do Capítulo III da Lei nº 8.080/90, que regula a gestão financeira, os recursos

serão depositados em contas específicas e repassados para estados e municípios. Cada aparelhamento administrativo das diferentes

unidades terá responsabilidade pela correta gestão destes recursos.

Em resumo: a proclamada solidariedade, que presidiu a consolidação do sistema público único de saúde no plano

constitucional, não importa responsabilidade solidária total e permanente de todos os órgãos da cadeia hierarquizada. A cada gestor compete

um conjunto de ações e serviços de assistência e proteção à saúde no âmbito de sua atuação (Federal, Estadual ou Municipal).

DA IMPUTABILIDADE DA OBRIGAÇÃO

De acordo com esse entendimento, não pode prevalecer a condenação do Município ao fornecimento de “IMUNOGLOBULINA

HUMANA”, listada no Anexo II da Portaria nº 2.577, do Ministério da Saúde, de 27 de outubro de 2006 (entre os IMUNOTERÁPICOS, de dispensação

excepcional).

Logo, o comando da sentença não poderia atingir o Município.

DA HIPOSSUFICIÊNCIA

Em relação ao Estado, o pleito da autora carece de outro requisito: prova da incapacidade para suportar os custos do tratamento.

Diante da afirmação de que é “sócia proprietária de renomada joalheria, além de sócia de não menos renomado curso de inglês

(CCAA)”, e proprietária de “automóvel, cujo valor de mercado supera R$ 30.000,00” (fls.75-76), a autora alegou que a “joalheria mencionada é de

propriedade de seu pai ... trabalha [ali] como funcionária ... é casada, e vem enfrentando sérios problemas financeiros no custeio do tratamento, que só está

sendo realizado graças à boa vontade de seus familiares ... a escola de idiomas constitui-se na principal fonte de renda da autora e seu marido ... não garante

rendimentos superiores a R$ 2.300,00 (valor de cada dose)”. Mas não apresentou o mínimo substrato probatório, indispensável a respaldar tais afirmações.

Imprestáveis, por óbvio, a esse efeito, os recibos de pro labore e salário, passados a “CASSIANO LONGO” e “MORGIANA GAVIOLI” por “COM. DE

MATERIAIS DIDATICOS”, relativos à “FOLHA MENSAL DE 30/06/2006” e “FOLHA MENSAL DE 31/05/2006”, respectivamente (fls.145-146).

E não há a mínima dúvida que o conjunto de ações e serviços mantido pelo SUS, em rede regionalizada e hierarquizada, visa assegurar

assistência à saúde daqueles que não dispõem de recursos próprios para esse fim, em conformidade com os princípios consagrados nos artigos 3º, inciso IV, e

196 da Constituição Federal, e artigo 7º, inciso IV da Lei nº 8.080/90.

DA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA

Diante da solução final de mérito aqui proposta, ficam suprimidos os efeitos antecipados na r. sentença.

DA GRATUIDADE JUDICIÁRIA

A presença de sinais indicativos de situação diversa da afirmada pela autora, para obtenção da gratuidade (fl.42)477, milita contra a

presunção conferida no artigo 4º, § 1º, da Lei nº 1.060/50, impondo-se a revogação do benefício.

DA SUCUMBÊNCIA

Sucumbente, a autora suportará as custas do processo e honorários arbitrados em R$ 450,00 (quatrocentos e cinqüenta

reais), de acordo com a regra da eqüidade.

477 Trata-se daqueles sinais externos, que, segundo o conceito de GUASP, invocado por LORENA BACHMAIER, ‘estarían constituidos por cualquier manifestación o muestras que sirva para indicar el estado y condición económica de una persona.’ (La Asistencia Jurídica Gratuita. Granda: Editorial Comares, 1997, p. 82).

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Ante o exposto, encaminho o voto no sentido de dar provimento às apelações.

DES.ª MARIA ISABEL DE AZEVEDO SOUZA (PRESIDENTE E R EVISORA) - De acordo.

DES.ª REJANE MARIA DIAS DE CASTRO BINS - De acordo.

DES.ª MARIA ISABEL DE AZEVEDO SOUZA - Presidente - Apelação Cível nº 70019513431, Comarca de Marau: "DERAM PROVIMENTO.

UNÂNIME."

Julgador(a) de 1º Grau: Drª. MARGOT CRISTINA AGOSTINI

Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/ementa.php>. Acesso em: out. 2007.

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ANEXO P – casos tratamento saúde TJ/RS

Termo de pesquisa Tratamento saúde Tipo de ação Número Agravo de Instrumento Nº 70021639158; Agravo Nº 70021634282; Apelação Cível Nº 70021418629; Embargos de Declaração Nº 70021747936; Agravo Interno Nº 70021652425; Apelação Cível Nº 70020839031; Apelação Cível Nº 70020638888; Agravo Interno Nº 70021486303; Agravo de Instrumento Nº 70020769998; Agravo de Instrumento Nº 70021213160; Agravo de Instrumento Nº 70021455357; Agravo de Instrumento Nº 70020899332; Agravo de Instrumento Nº 70020918116; Apelação Cível Nº 70020524856; Agravo de Instrumento Nº 70009343013, Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/>. Acesso em: out. 2007.

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ANEXO Q – casos tratamento médico TJ/RS Termo de pesquisa Tratamento Médico Tipo de ação Número Agravo de Instrumento Nº 70001328202 Apelação e Reex. Necessário Nº 70001474824 Apelação e Reex. Necessário Nº 70001447283 Reexame Necessário Nº 70001431394 Agravo de Instrumento Nº 70001380740 Reexame Necessário Nº 70001415397 Agravo de Instrumento Nº 70001105675 Apelação Cível Nº 70001117670 Agravo de Instrumento Nº 70000398263 Reexame Necessário Nº 70000996629 Apelação e Reex. Necessário Nº 70001104454 Apelação Cível Nº 70001083096 Reexame Necessário Nº 70001067479 Apelação e Reex. Necessário Nº 70000905075 Reexame Necessário Nº 70001001395 Agravo de Instrumento Nº 70000824284 Apelação Cível Nº 70000587394 Agravo de Instrumento Nº 70000707190 Apelação Cível Nº 70000503714 Apelação Cível Nº 70000481036 Apelação Cível Nº 70000505578 Agravo de Instrumento Nº 70000367193 Apelação Cível Nº 70000359653 Apelação e Reex. Necessário Nº 70000188946 Apelação Cível Nº 70000276717 Apelação Cível Nº 70000503482 Apelação Cível Nº 70000498782 Apelação Cível Nº 70000356972 Reexame Necessário Nº 70000347948 Apelação Cível Nº 70001370394 Apelação e Reex. Necessário Nº 70001063932 Apelação Cível Nº 70000156067 Agravo de Instrumento Nº 70001328202 Apelação e Reexame Necessário Nº 70001474824 Apelação Cível Nº 70000926642 Apelação e Reexame Necessário Nº 70001447283 Reexame Necessário Nº 70001431394 Agravo de Instrumento Nº 70001380740 Agravo de Instrumento Nº 70001306323 Reexame Necessário Nº 70001415397 Agravo de Instrumento Nº 70001105675 Apelação Crime Nº 70001018795 Apelação Cível Nº 70001095595 Apelação Crime Nº 70001112580 Apelação Cível Nº 70000890442 Apelação Cível Nº 599439023 Apelação Cível Nº 70001117670 Agravo de Instrumento Nº 70000398263 Reexame Necessário Nº 70000996629

Habeas Corpus Nº 70001214790

Apelação e Reexame Necessário Nº 70001104454

Apelação Cível Nº 70001083096 Reexame Necessário Nº 70001067479 Apelação e Reexame Necessário Nº 70000905075 Apelação Cível Nº 599206315 Reexame Necessário Nº 70001001395 Agravo de Instrumento Nº 70000824284 Apelação Cível Nº 70000682096 Agravo de Instrumento Nº 70000849521 Apelação Cível Nº 70000587394 Agravo de Instrumento Nº 70000707190 Apelação Cível Nº 198073173 Apelação Cível Nº 70000503714 Apelação Cível Nº 70000481036 Apelação Cível Nº 70000505578 Agravo de Instrumento Nº 70000367193 Apelação Cível Nº 70000359653 Apelação e Reexame Necessário Nº 70000188946 Apelação Cível Nº 70000276717 Apelação Cível Nº 70000503482 Apelação Cível Nº 70000498782 Apelação Cível Nº 70000356972 Reexame Necessário Nº 70000347948 Apelação Crime Nº 70000006130 Apelação e Reexame Necessário Nº 70003442274 Apelação Cível Nº 70003181427 Apelação e Reexame Necessário Nº 70005152384 Apelação Cível Nº 70003730876 Agravo de Instrumento Nº 70003655412 Apelação e Reexame Necessário Nº 70002975829 Apelação Cível Nº 70003726791 Embargos de Declaração Nº 70005910062 Agravo de Instrumento Nº 70006010276 Agravo de Instrumento Nº 70006011241 Agravo de Instrumento Nº 70006127120 Agravo de Instrumento Nº 70006162689 Apelação Cível Nº 70005725486 Agravo de Instrumento Nº 70006220164 Apelação e Reexame Necessário Nº 70006023030 Apelação e Reexame Necessário Nº 70006073407 Apelação e Reexame Necessário Nº 70006076947 Agravo de Instrumento Nº 70006234959 Agravo de Instrumento Nº 70006262406 Agravo de Instrumento Nº 70006266779 Agravo de Instrumento Nº 70006066674 Apelação e Reexame Necessário Nº 70006236228 Apelação e Reexame Necessário Nº 70006190094 Apelação e Reexame Necessário Nº 70006012686 Agravo de Instrumento Nº 70006477269 Agravo de Instrumento Nº 70006220156 Apelação e Reexame Necessário Nº 70006437750 Agravo de Instrumento Nº 70006289219 Apelação e Reexame Necessário Nº 70006464689

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Apelação e Reexame Necessário Nº 70006044200 Apelação e Reexame Necessário Nº 70006269260 Agravo de Instrumento Nº 70006362404 Reexame Necessário Nº 70006854343 Apelação Cível Nº 70002863744 Apelação e Reexame Necessário Nº 70003809571 Agravo de Instrumento Nº 70006842280 Agravo Nº 70006971352 Apelação e Reexame Necessário Nº 70006004865 Apelação e Reexame Necessário Nº 70006449490 Apelação e Reexame Necessário Nº 70006461248 Agravo de Instrumento Nº 70006645329 Agravo de Instrumento Nº 70007277890 Apelação e Reexame Necessário Nº 70006276166 Apelação e Reexame Necessário Nº 70006550990 Apelação e Reexame Necessário Nº 70006934277 Apelação Cível Nº 70006962310 Apelação Cível Nº 70006982029 Apelação Cível Nº 70007046626 Apelação e Reexame Necessário Nº 70007038599 Apelação Cível Nº 70006798425 Apelação Cível Nº 70007030372 Apelação e Reexame Necessário Nº 70007173024 Apelação e Reexame Necessário Nº 70007280266 Apelação e Reexame Necessário Nº 70007394778 Agravo de Instrumento Nº 70006864581 Agravo de Instrumento Nº 70006848949 Agravo de Instrumento Nº 70006089841 Apelação e Reex. Necessário Nº 70007038599 Apelação Cível Nº 70006798425 Agravo de Instrumento Nº 70007558786 Apelação Cível Nº 70007478159 Embargos de Declaração Nº 70007746886 Apelação Cível Nº 70009345513 Apelação e Reex. Necessário Nº 70009244450 Agravo de Instrumento Nº 70010331957 Apelação e Reex. Necessário Nº 70009685066 Apelação Cível Nº 70009657594 Apelação Cível Nº 70009619172 Apelação Cível Nº 70009615279 Apelação Cível Nº 70009604885 Apelação e Reex. Necessário Nº 70009461807 Reexame Necessário Nº 70008135311 Apelação e Reex. Necessário Nº 70009474321 Agravo de Instrumento Nº 70009895772 Apelação Cível Nº 70009393547 Apelação Cível Nº 70009393315 Apelação Cível Nº 70009391830 Apelação e Reex. Necessário Nº 70009498460 Apelação Cível Nº 70009487927 Apelação Cível Nº 70009433616 Apelação e Reex. Necessário Nº 70009359670 Agravo de Instrumento Nº 70009246257 Agravo de Instrumento Nº 70009592114 Agravo Nº 70009312380 Agravo de Instrumento Nº 70010080273 Apelação Cível Nº 70009500075 Apelação e Reex. Necessário Nº 70009487208

Apelação Cível Nº 70009486317 Apelação Cível Nº 70009479346 Apelação Cível Nº 70009459330 Apelação e Reexame Necessário Nº 70009141102 Apelação Cível Nº 70009114554 Apelação Cível Nº 70009101726 Apelação Cível Nº 70009850041 Apelação e Reexame Necessário Nº 70009557000 Reexame Necessário Nº 70009405598 Apelação Cível Nº 70009374570 Apelação Cível Nº 70009272436 Agravo de Instrumento Nº 70009136680 Agravo de Instrumento Nº 70009119777 Agravo de Instrumento Nº 70009089608 Agravo de Instrumento Nº 70009066200 Agravo de Instrumento Nº 70009058322 Agravo de Instrumento Nº 70009040973 Reexame Necessário Nº 70007481807 Apelação e Reexame Necessário Nº 70009271305 Apelação Cível Nº 70009255845 Apelação Cível Nº 70009488024 Apelação Cível Nº 70009594334 Apelação Cível Nº 70009516311 Apelação Cível Nº 70009784091 Apelação Cível Nº 70009399742 Apelação Cível Nº 70009335969 Apelação Cível Nº 70009304932 Apelação e Reexame Necessário Nº 70009223843 Apelação Cível Nº 70009173915 Apelação Cível Nº 70008939183 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008877078 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008824187 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008109647 Apelação Cível Nº 70009351164 Apelação e Reexame Necessário Nº 70009226937 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008449506 Apelação e Reexame Necessário Nº 70009289539 Apelação Cível Nº 70008393365 Agravo de Instrumento Nº 70008960908 Agravo de Instrumento Nº 70008123358 Agravo de Instrumento Nº 70008527269 Agravo de Instrumento Nº 70008394744 Agravo Nº 70008727463 Agravo de Instrumento Nº 70008808420 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008185910 Apelação Cível Nº 70008168007 Apelação Cível Nº 70008155269 Agravo de Instrumento Nº 70009096496 Agravo Nº 70008704918 Reexame Necessário Nº 70008399438 Agravo Nº 70008705428 Agravo de Instrumento Nº 70008214397 Agravo de Instrumento Nº 70008208571 Agravo de Instrumento Nº 70007620289 Agravo de Instrumento Nº 70007432776 Agravo de Instrumento Nº 70008962797 Agravo de Instrumento Nº 70008879462 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008716706 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008694838

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Apelação e Reexame Necessário Nº 70008671133 Apelação Cível Nº 70008644734 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008634248 Apelação Cível Nº 70008622458 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008618530 Reexame Necessário Nº 70008614505 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008580979 Agravo de Instrumento Nº 70008196867 Agravo Nº 70008714305 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008596850 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008553216 Apelação Cível Nº 70008543324 Apelação Cível Nº 70008467318 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008347643 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008309262 Apelação Cível Nº 70008271736 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008136830 Agravo Nº 70008498917 Agravo de Instrumento Nº 70008189870 Apelação e Reexame Necessário Nº 70006770655 Agravo de Instrumento Nº 70008797029 Reexame Necessário Nº 70008230450 Agravo de Instrumento Nº 70008693665 Agravo de Instrumento Nº 70008654808 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008490146 Reexame Necessário Nº 70008185167 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008138414 Apelação Cível Nº 70008229593 Agravo Nº 70008430639 Agravo de Instrumento Nº 70008527509 Agravo de Instrumento Nº 70008526154 Agravo de Instrumento Nº 70008067175 Agravo de Instrumento Nº 70008435497 Agravo Nº 70008335499 Agravo de Instrumento Nº 70008105777 Agravo Nº 70008343733 Apelação e Reexame Necessário Nº 70007402399 Apelação e Reexame Necessário Nº 70007376429 Apelação e Reexame Necessário Nº 70007346117 Apelação e Reexame Necessário Nº 70007204225 Apelação e Reexame Necessário Nº 70007141369 Apelação e Reexame Necessário Nº 70007427107 Apelação e Reexame Necessário Nº 70007139298 Agravo de Instrumento Nº 70008256893 Agravo de Instrumento Nº 70008042095 Apelação e Reexame Necessário Nº 70007399512 Apelação e Reexame Necessário Nº 70007135296 Apelação e Reexame Necessário Nº 70007253446 Agravo de Instrumento Nº 70008234338 Agravo de Instrumento Nº 70008192809 Apelação Cível Nº 70007748817 Agravo de Instrumento Nº 70008126773 Agravo de Instrumento Nº 70007403884 Apelação e Reexame Necessário Nº 70007295884 Agravo de Instrumento Nº 70007705148 Agravo de Instrumento Nº 70009197302 Agravo de Instrumento Nº 70010651941 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010367795 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010167104

Agravo de Instrumento Nº 70010080885 Apelação e Reexame Necessário Nº 70009902495 Agravo de Instrumento Nº 70009740226 Agravo de Instrumento Nº 70009358698 Agravo de Instrumento Nº 70009348806 Apelação Cível Nº 70010244234 Apelação Cível Nº 70010004752 Habeas Corpus Nº 70009702416 Apelação Cível Nº 70009374372 Apelação e Reexame Necessário Nº 70009251638 Apelação Cível Nº 70009722703 Agravo Nº 70009720947 Apelação Cível Nº 70009617473

Agravo de Instrumento Nº 70011507472 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011375961 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011136249 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010964617 Apelação Cível Nº 70011038320 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011410271 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011044898 Apelação Cível Nº 70010847358 Apelação Cível Nº 70009263930 Apelação Cível Nº 70011925195 Apelação Cível Nº 70011905221 Apelação Cível Nº 70011317658 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011262524 Apelação Cível Nº 70011196854 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011071982 Agravo de Instrumento Nº 70012120598 Reexame Necessário Nº 70011714300 Agravo de Instrumento Nº 70011541745 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011392875 Reexame Necessário Nº 70011261583 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011244936 Apelação Cível Nº 70011132545 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011117264 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011116597 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010963759 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010652998 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010593580 Apelação Cível Nº 70011647427 Apelação Cível Nº 70010843639 Apelação Cível Nº 70011893955 Agravo de Instrumento Nº 70011705043 Reexame Necessário Nº 70011414711 Agravo de Instrumento Nº 70011299922 Agravo de Instrumento Nº 70011244357 Agravo de Instrumento Nº 70011228277 Agravo de Instrumento Nº 70010879013 Apelação Cível Nº 70011460441 Agravo de Instrumento Nº 70010645489 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011674801 Apelação Cível Nº 70011560968 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011426921 Apelação Cível Nº 70011294774 Apelação Cível Nº 70010825909 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011835923

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Apelação Cível Nº 70009304932 Apelação e Reexame Necessário Nº 70009223843 Apelação Cível Nº 70009173915 Apelação Cível Nº 70008939183 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008877078 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008824187 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008109647 Apelação Cível Nº 70009351164 Apelação e Reexame Necessário Nº 70009226937

Agravo de Instrumento Nº 70012735452 Apelação Cível Nº 70012494134 Apelação Cível Nº 70012437877 Apelação Cível Nº 70013123286 Agravo de Instrumento Nº 70012923728 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012169256 Agravo de Instrumento Nº 70013057872 Agravo de Instrumento Nº 70013004585 Agravo de Instrumento Nº 70012963781 Agravo de Instrumento Nº 70012634341 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012494639 Agravo de Instrumento Nº 70012482840 Agravo de Instrumento Nº 70012444337 Apelação Cível Nº 70012262200 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012979225 Apelação Cível Nº 70012968863 Apelação Cível Nº 70012886313 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012873253 Apelação Cível Nº 70011842788 Agravo de Instrumento Nº 70013447198 Apelação Cível Nº 70013079439 Apelação Cível Nº 70012930426 Reexame Necessário Nº 70012716551 Agravo de Instrumento Nº 70012637690 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012243556 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012201026 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012190138 Apelação Cível Nº 70012097184 Apelação Cível Nº 70011970985 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011697117 Apelação Cível Nº 70011694767 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011590098 Agravo de Instrumento Nº 70011584109 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011373933 Apelação e Reexame Necessário Nº 70013132659 Agravo Nº 70013124318 Apelação Cível Nº 70013089537 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011540184 Apelação Cível Nº 70011122025 Agravo de Instrumento Nº 70010999084 Agravo de Instrumento Nº 70010999043 Agravo de Instrumento Nº 70010998920 Agravo de Instrumento Nº 70010998243 Agravo de Instrumento Nº 70010998193 Agravo de Instrumento Nº 70010768927 Agravo de Instrumento Nº 70010725588 Apelação Cível Nº 70011225760 Apelação Cível Nº 70010797710 Agravo de Instrumento Nº 70010751428 Agravo de Instrumento Nº 70010740280 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010727550 Agravo de Instrumento Nº 70010417004 Reexame Necessário Nº 70011016474 Agravo de Instrumento Nº 70010820611 Apelação Cível Nº 70010797231 Agravo Interno Nº 70010710127 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010998813 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010655629

Apelação Cível Nº 70010421345 Apelação Cível Nº 70010386274 Apelação e Reexame Necessário Nº 70009962275

Apelação Cível Nº 70010421345 Apelação Cível Nº 70010386274 Apelação e Reexame Necessário Nº 70009962275 Apelação Cível Nº 70010990224 Agravo de Instrumento Nº 70011333796 Habeas Corpus Nº 70010697068 Apelação Cível Nº 70010704765 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010671964 Apelação Cível Nº 70010035277 Agravo de Instrumento Nº 70011212727 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010844785 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010793495 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010212793 Apelação Cível Nº 70009326497 Apelação Cível Nº 70009725888 Apelação Cível Nº 70010815579 Apelação Cível Nº 70010806149 Apelação Cível Nº 70010579134 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010164291 Apelação Cível Nº 70010432128 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010307635 Apelação Cível Nº 70010294569 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010246635 Apelação Cível Nº 70009578337 Apelação e Reexame Necessário Nº 70009488404 Apelação Cível Nº 70010773976 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010764280 Apelação Cível Nº 70010707107 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010648806 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010640167 Apelação Cível Nº 70010215796 Apelação Cível Nº 70010194082 Apelação Cível Nº 70010187748 Apelação Cível Nº 70010162840 Agravo de Instrumento Nº 70011044575 Apelação Cível Nº 70010766129 Apelação Cível Nº 70010742294 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010709285 Apelação Cível Nº 70010708493 Apelação Cível Nº 70010701555 Apelação Cível Nº 70010699783 Apelação Cível Nº 70010062693 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010692168 Apelação Cível Nº 70010498103 Agravo de Instrumento Nº 70010928984 Apelação Cível Nº 70010123511 Agravo de Instrumento Nº 70009884735 Agravo de Instrumento Nº 70011903374 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011586864 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011096161 Apelação Cível Nº 70011618444 Apelação Cível Nº 70009345513 Apelação e Reexame Necessário Nº 70009244450 Agravo de Instrumento Nº 70010331957 Apelação e Reexame Necessário Nº 70009685066 Apelação Cível Nº 70009657594

Apelação Cível Nº 70009619172 Apelação Cível Nº 70009615279 Apelação Cível Nº 70009604885 Apelação e Reexame Necessário Nº 70009461807 Reexame Necessário Nº 70008135311 Apelação e Reexame Necessário Nº 70009474321 Agravo de Instrumento Nº 70009895772 Apelação Cível Nº 70009393547 Apelação Cível Nº 70009393315 Apelação Cível Nº 70009391830 Apelação e Reexame Necessário Nº 70009498460 Apelação Cível Nº 70009487927 Apelação Cível Nº 70009433616 Apelação e Reexame Necessário Nº 70009359670 Agravo de Instrumento Nº 70009246257 Agravo Nº 70009312380 Agravo de Instrumento Nº 70010080273 Apelação Cível Nº 70009500075 Apelação e Reexame Necessário Nº 70009487208 Apelação Cível Nº 70009486317 Apelação Cível Nº 70009479346 Apelação Cível Nº 70009459330 Apelação e Reexame Necessário Nº 70009141102 Apelação Cível Nº 70009114554 Apelação Cível Nº 70009101726 Apelação Cível Nº 70009850041 Apelação e Reexame Necessário Nº 70009557000 Reexame Necessário Nº 70009405598 Apelação Cível Nº 70009374570 Apelação Cível Nº 70009272436 Agravo de Instrumento Nº 70009136680 Agravo de Instrumento Nº 70009119777 Agravo de Instrumento Nº 70009089608 Agravo de Instrumento Nº 70009066200 Agravo de Instrumento Nº 70009058322 Agravo de Instrumento Nº 70009040973 Reexame Necessário Nº 70007481807 Apelação e Reexame Necessário Nº 70009271305 Apelação Cível Nº 70009255845 Apelação Cível Nº 70009488024 Apelação Cível Nº 70009594334 Apelação Cível Nº 70009516311 Apelação Cível Nº 70009784091 Apelação Cível Nº 70009399742 Apelação Cível Nº 70009335969

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Apelação e Reexame Necessário Nº 70008449506 Apelação e Reexame Necessário Nº 70009289539 Apelação Cível Nº 70008393365 Agravo de Instrumento Nº 70008960908 Agravo de Instrumento Nº 70008123358 Agravo de Instrumento Nº 70008527269 Agravo de Instrumento Nº 70008394744 Agravo Nº 70008727463 Agravo de Instrumento Nº 70008808420 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008185910 Apelação Cível Nº 70008168007 Apelação Cível Nº 70008155269 Agravo de Instrumento Nº 70009096496 Agravo Nº 70008704918 Reexame Necessário Nº 70008399438 Agravo Nº 70008705428 Agravo de Instrumento Nº 70008214397 Agravo de Instrumento Nº 70008208571 Agravo de Instrumento Nº 70007620289 Agravo de Instrumento Nº 70007432776 Agravo de Instrumento Nº 70008962797 Agravo de Instrumento Nº 70008879462 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008716706 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008694838 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008671133 Apelação Cível Nº 70008644734 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008634248 Apelação Cível Nº 70008622458 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008618530 Reexame Necessário Nº 70008614505 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008580979 Agravo de Instrumento Nº 70008196867 Agravo Nº 70008714305 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008596850 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008553216 Apelação Cível Nº 70008543324 Apelação Cível Nº 70008467318 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008347643 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008309262 Apelação Cível Nº 70008271736 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008136830 Agravo Nº 70008498917 Agravo de Instrumento Nº 70008189870 Apelação e Reexame Necessário Nº 70006770655 Agravo de Instrumento Nº 70008797029 Reexame Necessário Nº 70008230450 Agravo de Instrumento Nº 70008693665 Agravo de Instrumento Nº 70008654808 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008490146 Reexame Necessário Nº 70008185167 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008138414 Apelação Cível Nº 70008229593 Agravo Nº 70008430639 Agravo de Instrumento Nº 70008527509 Agravo de Instrumento Nº 70008526154 Agravo de Instrumento Nº 70008067175 Agravo de Instrumento Nº 70008435497 Agravo Nº 70008335499 Agravo de Instrumento Nº 70008105777

Agravo Nº 70008343733 Apelação e Reexame Necessário Nº 70007402399 Apelação e Reexame Necessário Nº 70007376429 Apelação e Reexame Necessário Nº 70007346117 Apelação e Reexame Necessário Nº 70007204225 Apelação e Reexame Necessário Nº 70007141369 Apelação e Reexame Necessário Nº 70007427107 Apelação e Reexame Necessário Nº 70007139298 Agravo de Instrumento Nº 70008256893 Agravo de Instrumento Nº 70008042095 Apelação e Reexame Necessário Nº 70007399512 Apelação e Reexame Necessário Nº 70007135296 Apelação e Reexame Necessário Nº 70007253446 Agravo de Instrumento Nº 70008234338 Agravo de Instrumento Nº 70008192809 Apelação Cível Nº 70007748817 Agravo de Instrumento Nº 70008126773 Agravo de Instrumento Nº 70007403884 Apelação e Reexame Necessário Nº 70007295884 Agravo de Instrumento Nº 70007705148 Agravo de Instrumento Nº 70009197302 Agravo de Instrumento Nº 70010651941 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010367795 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010167104 Agravo de Instrumento Nº 70010080885 Apelação e Reexame Necessário Nº 70009902495 Agravo de Instrumento Nº 70009740226 Agravo de Instrumento Nº 70009358698 Agravo de Instrumento Nº 70009348806 Apelação Cível Nº 70010244234 Apelação Cível Nº 70010004752 Habeas Corpus Nº 70009702416 Apelação Cível Nº 70009374372 Apelação e Reexame Necessário Nº 70009251638 Apelação Cível Nº 70009722703 Agravo Nº 70009720947 Apelação Cível Nº 70009617473 Agravo de Instrumento Nº 70010999118 Agravo de Instrumento Nº 70010997955 Agravo de Instrumento Nº 70011641040 Apelação Cível Nº 70011124922 Agravo de Instrumento Nº 70010865715 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010823300 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010577302 Agravo de Instrumento Nº 70010576437 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010543262 Agravo de Instrumento Nº 70011181112 Apelação e Reexame Necessário Nº 70013167556 Agravo de Instrumento Nº 70013059654 Agravo de Instrumento Nº 70013055165 Agravo de Instrumento Nº 70012991162 Agravo de Instrumento Nº 70012394151 Apelação Cível Nº 70013548912 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012401782 Apelação Cível Nº 70012353587 Apelação Cível Nº 70012349346 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012323028

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Apelação e Reexame Necessário Nº 70012305041 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012221685 Agravo de Instrumento Nº 70011509163 Agravo de Instrumento Nº 70013310297 Agravo de Instrumento Nº 70013298021 Apelação Cível Nº 70013234612 Apelação e Reexame Necessário Nº 70013144449 Agravo de Instrumento Nº 70013762695 Apelação Cível Nº 70013326194 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012323002 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012318721 Apelação Cível Nº 70011850385 Agravo Nº 70013393996 Agravo de Instrumento Nº 70012991261 Apelação Cível Nº 70011905221 Apelação Cível Nº 70011317658 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011262524 Apelação Cível Nº 70011196854 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011071982 Agravo de Instrumento Nº 70012120598 Reexame Necessário Nº 70011714300 Agravo de Instrumento Nº 70011541745 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011392875 Reexame Necessário Nº 70011261583 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011244936 Apelação Cível Nº 70011132545 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011117264 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011116597 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010963759 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010652998 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010593580 Apelação Cível Nº 70011647427 Apelação Cível Nº 70010843639 Apelação Cível Nº 70011893955 Agravo de Instrumento Nº 70011705043 Reexame Necessário Nº 70011414711 Agravo de Instrumento Nº 70011299922 Agravo de Instrumento Nº 70011244357 Agravo de Instrumento Nº 70011228277 Agravo de Instrumento Nº 70010879013 Apelação Cível Nº 70011460441 Agravo de Instrumento Nº 70010645489 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011674801 Apelação Cível Nº 70011560968 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011426921 Apelação Cível Nº 70011294774 Apelação Cível Nº 70010825909 Agravo de Instrumento Nº 70020973004 Apelação e Reexame Necessário Nº 70020715314 Agravo de Instrumento Nº 70021639562 Agravo de Instrumento Nº 70021621966 Apelação Cível Nº 70020285136 Agravo de Instrumento Nº 70021567730 Agravo de Instrumento Nº 70019159532

Agravo de Instrumento Nº 70012870788 Agravo de Instrumento Nº 70012735452 Apelação Cível Nº 70012494134 Apelação Cível Nº 70012437877 Apelação Cível Nº 70013123286 Agravo de Instrumento Nº 70012923728 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012169256 Agravo de Instrumento Nº 70013057872 Agravo de Instrumento Nº 70013004585 Agravo de Instrumento Nº 70012963781 Agravo de Instrumento Nº 70012634341 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012494639 Agravo de Instrumento Nº 70012482840 Agravo de Instrumento Nº 70012444337 Apelação Cível Nº 70012262200 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012979225 Apelação Cível Nº 70012968863 Apelação Cível Nº 70012886313 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012873253 Apelação Cível Nº 70011842788 Agravo de Instrumento Nº 70013447198 Apelação Cível Nº 70013079439 Apelação Cível Nº 70012930426 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011835923 Apelação Cível Nº 70010796720 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011752201 Apelação Cível Nº 70011096765 Reexame Necessário Nº 70011035177 Agravo de Instrumento Nº 70010998839 Apelação Cível Nº 70010980100 Apelação Cível Nº 70010950848 Agravo de Instrumento Nº 70010929719 Agravo de Instrumento Nº 70010889566 Apelação Cível Nº 70010865517 Apelação Cível Nº 70010849701 Apelação Cível Nº 70010849214 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010848034 Apelação Cível Nº 70010221091 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010194561 Reexame Necessário Nº 70010834745 Reexame Necessário Nº 70010823771 Agravo de Instrumento Nº 70010813244 Apelação Cível Nº 70010759843 Agravo de Instrumento Nº 70010751147 Apelação Cível Nº 70010737666 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010726586 Agravo de Instrumento Nº 70010999258 Apelação Cível Nº 70020955472 Apelação e Reexame Necessário Nº 70020909677 Apelação e Reexame Necessário Nº 70020870960 Apelação e Reexame Necessário Nº 70020339966 Apelação e Reexame Necessário Nº 70021388988 Reexame Necessário Nº 70021273040 Apelação Cível Nº 70021200027 Apelação Cível Nº 70021174339 Apelação Cível Nº 70021167218 Apelação Cível Nº 70020991410

Apelação Cível Nº 70014238901 Apelação Cível Nº 70014129290 Apelação Cível Nº 70013960331 Agravo de Instrumento Nº 70013877576 Agravo de Instrumento Nº 70013877139 Agravo de Instrumento Nº 70013833140 Agravo de Instrumento Nº 70013731484 Agravo de Instrumento Nº 70013643168 Agravo de Instrumento Nº 70013550884 Agravo de Instrumento Nº 70013506118 Agravo de Instrumento Nº 70013459185 Agravo de Instrumento Nº 70013384730 Agravo de Instrumento Nº 70014688071 Agravo de Instrumento Nº 70014105381 Apelação Cível Nº 70014014849 Apelação e Reexame Necessário Nº 70013678990 Agravo Nº 70014365001 Agravo Nº 70014198329 Agravo Nº 70014142905 Agravo Nº 70014142889 Agravo Nº 70014077515 Agravo de Instrumento Nº 70014028286 Apelação Cível Nº 70014022883 Apelação Cível Nº 70013975065 Agravo Nº 70013838339 Mandado de Segurança Nº 70013970603 Apelação Cível Nº 70014158885 Agravo de Instrumento Nº 70014476733 Apelação Cível Nº 70014178404 Apelação e Reexame Necessário Nº 70014542096 Recurso Cível Nº 71000833939 Agravo de Instrumento Nº 70014922587 Agravo de Instrumento Nº 70014432769 Agravo de Instrumento Nº 70014131346 Apelação Cível Nº 70014548754 Mandado de Segurança Nº 70013095393 Agravo de Instrumento Nº 70014798359 Agravo de Instrumento Nº 70014226112 Agravo de Instrumento Nº 70014190144 Agravo de Instrumento Nº 70014174999 Agravo de Instrumento Nº 70014118699 Agravo de Instrumento Nº 70014081822 Agravo de Instrumento Nº 70014060875 Agravo de Instrumento Nº 70014057533 Agravo de Instrumento Nº 70014033955 Agravo de Instrumento Nº 70014030548 Agravo de Instrumento Nº 70014029029, Agravo de Instrumento Nº 70014001762 Agravo de Instrumento Nº 70013978739 Agravo de Instrumento Nº 70013971502 Agravo de Instrumento Nº 70013958020 Apelação Cível Nº 70014479570 Apelação Cível Nº 70014476691 Agravo de Instrumento Nº 70014272173 Agravo de Instrumento Nº 70014175921 Agravo de Instrumento Nº 70014519318 Agravo de Instrumento Nº 70014187801 Agravo de Instrumento Nº 70014105837

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Reexame Necessário Nº 70012716551 Agravo de Instrumento Nº 70012637690 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012243556 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012201026 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012190138 Apelação Cível Nº 70012097184 Apelação Cível Nº 70011970985 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011697117 Apelação Cível Nº 70011694767 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011590098 Agravo de Instrumento Nº 70011584109 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011373933 Apelação e Reexame Necessário Nº 70013132659 Agravo Nº 70013124318 Apelação Cível Nº 70013089537 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011540184 Apelação Cível Nº 70013862446 Agravo de Instrumento Nº 70013460514 Agravo de Instrumento Nº 70013434287 Apelação Cível Nº 70012919320 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012820288 Apelação Cível Nº 70012781688 Apelação Cível Nº 70012757092 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012724951 Agravo de Instrumento Nº 70012720785 Reexame Necessário Nº 70012696050 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012640249 Apelação Cível Nº 70013781539 Agravo Nº 70013938394 Agravo Nº 70013925615 Agravo Nº 70013909676 Agravo Nº 70013773189 Agravo de Instrumento Nº 70013438189 Apelação Cível Nº 70012409512 Agravo de Instrumento Nº 70013493242 Agravo de Instrumento Nº 70013289178 Apelação Cível Nº 70012817722 Agravo de Instrumento Nº 70013968797 Agravo de Instrumento Nº 70013948849 Apelação Cível Nº 70012840955 Apelação Cível Nº 70013055793 Apelação e Reexame Necessário Nº 70013035712 Apelação Cível Nº 70013021688 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012920542 Apelação Cível Nº 70012704326 Agravo Nº 70014050140, Agravo Nº 70014011720 Agravo Nº 70014011712 Apelação Cível Nº 70013931902 Apelação Cível Nº 70013800313 Agravo de Instrumento Nº 70013508346 Agravo de Instrumento Nº 70013495007 Agravo de Instrumento Nº 70013446406 Apelação Cível Nº 70012633756 Agravo de Instrumento Nº 70012800181 Apelação Cível Nº 70012785481 Agravo de Instrumento Nº 70014247183 Apelação Cível Nº 70013862446

Agravo de Instrumento Nº 70014071377 Apelação e Reexame Necessário Nº 70013932025 Agravo de Instrumento Nº 70013492905 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012647095 Agravo de Instrumento Nº 70015512486 Apelação e Reexame Necessário Nº 70014805600 Apelação Cível Nº 70014690010 Apelação Cível Nº 70014597280 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011802998 Agravo de Instrumento Nº 70015390982 Agravo de Instrumento Nº 70015350994 Apelação Cível Nº 70014800510 Apelação Cível Nº 70014671275 Apelação Cível Nº 70014493761 Apelação e Reexame Necessário Nº 70014460315 Apelação Cível Nº 70014350607 Agravo de Instrumento Nº 70013864129 Agravo de Instrumento Nº 70013824578 Agravo de Instrumento Nº 70013819966 Apelação e Reexame Necessário Nº 70013751250 Apelação Cível Nº 70013712427 Reexame Necessário Nº 70013710587 Agravo de Instrumento Nº 70013670591 Reexame Necessário Nº 70013641436 Apelação e Reexame Necessário Nº 70013613492 Agravo de Instrumento Nº 70013597349 Apelação Cível Nº 70013591854 Reexame Necessário Nº 70013541396 Apelação e Reexame Necessário Nº 70013484043 Apelação e Reexame Necessário Nº 70013452685 Reexame Necessário Nº 70013363486 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012447116 Apelação Cível Nº 70012438685 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012259859 Reexame Necessário Nº 70014694004 Agravo de Instrumento Nº 70014629661 Apelação e Reexame Necessário Nº 70014608814 Embargos Infringentes Nº 70012788162 Agravo de Instrumento Nº 70015235195 Apelação Cível Nº 70014567127 Reexame Necessário Nº 70013773445 Apelação Cível Nº 70013619069 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012090700 Agravo de Instrumento Nº 70012926440 Apelação Cível Nº 70014733570 Agravo de Instrumento Nº 70014103014 Agravo de Instrumento Nº 70014778252 Apelação Cível Nº 70014125629 Reexame Necessário Nº 70014528012 Reexame Necessário Nº 70014145759 Agravo de Instrumento Nº 70015817208 Agravo de Instrumento Nº 70015753908 Agravo de Instrumento Nº 70014718910 Agravo de Instrumento Nº 70014386726 Agravo de Instrumento Nº 70014334411 Agravo de Instrumento Nº 70014247068 Apelação e Reexame Necessário Nº 70013940945 Apelação Cível Nº 70013895743

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Reexame Necessário Nº 70013832027 Apelação Cível Nº 70013763644 Apelação Cível Nº 70013744867 Apelação Cível Nº 70013726302 Apelação e Reexame Necessário Nº 70013678214 Agravo de Instrumento Nº 70013555339 Apelação Cível Nº 70012905550 Embargos de Declaração Nº 70015603715 Apelação Cível Nº 70015584857 Reexame Necessário Nº 70014469514 Apelação Cível Nº 70014142251 Reexame Necessário Nº 70013906136 Apelação e Reexame Necessário Nº 70013883632 Recurso Cível Nº 71000902981 Agravo Nº 70015484751 Apelação Cível Nº 70015082803 Apelação Cível Nº 70015017478 Apelação Cível Nº 70012608832 Apelação e Reexame Necessário Nº 70014642458 Agravo de Instrumento Nº 70015551443 Agravo de Instrumento Nº 70014177091 Agravo de Instrumento Nº 70014150627 Agravo de Instrumento Nº 70014133706 Apelação e Reexame Necessário Nº 70013931688 Apelação e Reexame Necessário Nº 70013914825 Reexame Necessário Nº 70013811831 Apelação Cível Nº 70014927701 Apelação e Reexame Necessário Nº 70014696249 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012822748 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012819470 Apelação Cível Nº 70012450755 Apelação Cível Nº 70012395646 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011738341 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011318862 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011307899 Apelação e Reexame Necessário Nº 70011082542 Agravo de Instrumento Nº 70015555618 Agravo de Instrumento Nº 70014446330 Agravo de Instrumento Nº 70014519318 Agravo de Instrumento Nº 70014187801 Agravo de Instrumento Nº 70014175921 Agravo de Instrumento Nº 70014105837 Agravo de Instrumento Nº 70014071377 Apelação e Reexame Necessário Nº 70013932025 Agravo de Instrumento Nº 70013492905 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012647095 De 01/07/06 a 01/08/06 51 casos De 01/08/06 a 01/09/06 61 casos De 01/09/06 a 01/10/06 20 casos De 01/10/06 a 01/11/06 65 casos De 01/11/06 a 01/12/06 64 casos De 01/12/06 a 01/01/07 44 casos De 01/01/07 a 01/02/07 22 casos De 01/02/07 a 01/03/07 37 casos De 01/03/07 a 01/04/07 61 casos De 01/04/07 a 01/05/07 47 casos De 01/05/07 a 01/06/07 54 casos

De 01/06/07 a 01/07/07 51 casos De 01/07/07 a 01/08/07 66 casos De 01/08/07 a 01/09/07 89 casos De 01/09/07 a 01/10/07 56 casos Apelação Cível Nº 70021228812 Apelação Cível Nº 70021079264 Apelação Cível Nº 70019656123 Apelação Cível Nº 70021084207 Apelação e Reexame Necessário Nº 70020966230 Agravo de Instrumento Nº 70021866934 Apelação Cível Nº 70020480828 Apelação Cível Nº 70021156328 Apelação e Reexame Necessário Nº 70021531462 Apelação Cível Nº 70021220355 Apelação e Reexame Necessário Nº 70021061023 Agravo de Instrumento Nº 70020884086 Agravo de Instrumento Nº 70020875803 Apelação Cível Nº 70020638045 Apelação Cível Nº 70020436689 Apelação Cível Nº 70020181269 Agravo de Instrumento Nº 70021914130 Apelação e Reexame Necessário Nº 70021228135 Apelação Cível Nº 70021200092 Apelação e Reexame Necessário Nº 70021135017 Apelação Cível Nº 70020707550 Apelação Cível Nº 70020621777 Apelação Cível Nº 70019852870 Apelação Cível Nº 70019220433 Agravo de Instrumento Nº 70021878608 Agravo de Instrumento Nº 70021847777 Agravo de Instrumento Nº 70021815832 Agravo de Instrumento Nº 70021770292 Apelação Cível Nº 70021516869 Apelação Cível Nº 70020486031 Agravo de Instrumento Nº 70021828660 Embargos Infringentes Nº 70021259452 Apelação e Reexame Necessário Nº 70020713475 Embargos de Declaração Nº 70021442132 Apelação Cível Nº 70021155379 Apelação Cível Nº 70021102470 Apelação Cível Nº 70021036975 Agravo de Instrumento Nº 70020903951 Agravo de Instrumento Nº 70020898250 Agravo de Instrumento Nº 70020860078 Apelação Cível Nº 70020366738 Agravo de Instrumento Nº 70020361176 Agravo de Instrumento Nº 70020059325 Apelação Cível Nº 70021364997 Apelação e Reexame Necessário Nº 70020952701 Agravo de Instrumento Nº 70020850293 Apelação e Reexame Necessário Nº 70020732657 Agravo de Instrumento Nº 70019680685 Agravo de Instrumento Nº 70018967208 Apelação e Reexame Necessário Nº 70020317129 Apelação Cível Nº 70020256459 Agravo de Instrumento Nº 70021763297 Apelação Cível Nº 70021126909

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ANEXO R – casos fornecimento medicamento TJ/RS Termo de pesquisa Fornecimento medicamento Tipo de ação Número Agravo de Instrumento Nº 70007321847 Agravo de Instrumento Nº 70008313165 Apelação e Reexame Necessário Nº 70008157109 Apelação Cível Nº 70009775503 Apelação Cível Nº 70016386815 Apelação Cível Nº 70017598129 Agravo de Instrumento Nº 70018968008 De 01/01/00 a 01/01/01 85 casos De 01/01/01 a 01/01/02 56 casos De 01/01/02 a 01/01/03 86 casos De 01/01/03 a 01/01/04 378 casos De 01/01/04 a 01/01/05 616 casos De 01/01/05 a 01/01/06 946 casos De 01/01/06 a 01/01/07 1123 casos De 01/01/07 a 31/10/07 950 casos Apelação Cível Nº 70017270042 Embargos de Declaração Nº 70017969361 Agravo de Instrumento Nº 70017594771 Agravo de Instrumento Nº 70017397415 Agravo de Instrumento Nº 70017373309 Agravo de Instrumento Nº 70017338054 Agravo de Instrumento Nº 70017302423 Agravo de Instrumento Nº 70017245259 Reexame Necessário Nº 70017756941 Reexame Necessário Nº 70017714981 Agravo Nº 70018190447 Agravo Nº 70018058834 Apelação Cível Nº 70017964990 Apelação Cível Nº 70018110353 Agravo Nº 70017939679 Embargos de Declaração Nº 70017936899 Apelação Cível Nº 70017906983 Agravo Nº 70017838905 Agravo de Instrumento Nº 70017820630 Apelação e Reexame Necessário Nº 70017738923 Agravo Nº 70017663980 Apelação Cível Nº 70018363267 Apelação Cível Nº 70018313528 Apelação e Reexame Necessário Nº 70018362087 Apelação Cível Nº 70018344325 Apelação Cível Nº 70018335174 Agravo de Instrumento Nº 70017533712 Agravo de Instrumento Nº 70017400821 Agravo de Instrumento Nº 70017398470 Agravo de Instrumento Nº 70017336280 Apelação Cível Nº 70017306218 Agravo de Instrumento Nº 70017282799 Agravo de Instrumento Nº 70017252974 Agravo de Instrumento Nº 70017203514 Agravo de Instrumento Nº 70016803520 Embargos de Declaração Nº 70016768665 Embargos de Declaração Nº 70016768632 Apelação Cível Nº 70014797138

Apelação e Reexame Necessário Nº 70018336685 Reexame Necessário Nº 70018320200 Agravo de Instrumento Nº 70018051243 Apelação Cível Nº 70016951147 Apelação Cível Nº 70018281550 Apelação e Reexame Necessário Nº 70018280172 Apelação Cível Nº 70018272567 Reexame Necessário Nº 70018273631 Apelação Cível Nº 70018062760 Agravo de Instrumento Nº 70017768557 Agravo de Instrumento Nº 70017674292 Agravo de Instrumento Nº 70011001401 Agravo Nº 70010966646 Apelação Cível Nº 70010515674 Agravo de Instrumento Nº 70010449437 Agravo de Instrumento Nº 70010389641 Reexame Necessário Nº 70010384071 Agravo de Instrumento Nº 70010372977 Agravo de Instrumento Nº 70010250751 Agravo de Instrumento Nº 70010017333 Apelação e Reexame Necessário Nº 70009831546 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010629699 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010603439 Apelação Cível Nº 70010517829 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010447852 Agravo de Instrumento Nº 70010443760 Apelação Cível Nº 70010369650 Agravo de Instrumento Nº 70010364016 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010336675 Apelação Cível Nº 70010321024 Agravo de Instrumento Nº 70010291615 Agravo de Instrumento Nº 70010237808 Agravo de Instrumento Nº 70010237055 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010215846 Agravo de Instrumento Nº 70010182160 Apelação Cível Nº 70009651134 Agravo de Instrumento Nº 70009543356 Agravo de Instrumento Nº 70008722860 Agravo de Instrumento Nº 70010933158 Agravo de Instrumento Nº 70010930352 Agravo de Instrumento Nº 70010391506 Agravo de Instrumento Nº 70009999699 Apelação Cível Nº 70009419243 Agravo de Instrumento Nº 70010886331 Agravo de Instrumento Nº 70010883528 Agravo de Instrumento Nº 70010880680 Apelação Cível Nº 70010463180 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010451474 Agravo de Instrumento Nº 70010443505 Apelação Cível Nº 70010442275 Agravo de Instrumento Nº 70010412161 Agravo de Instrumento Nº 70010362689 Agravo de Instrumento Nº 70010352516 Agravo de Instrumento Nº 70010350700

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Agravo de Instrumento Nº 70010258036 Agravo de Instrumento Nº 70010244069 Agravo de Instrumento Nº 70010237816 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010463073 Agravo de Instrumento Nº 70010433316 Agravo de Instrumento Nº 70010812246 Agravo de Instrumento Nº 70014395651 Agravo Nº 70014364947 Agravo Nº 70014121610 Apelação e Reexame Necessário Nº 70013819172 Apelação e Reexame Necessário Nº 70013818034 Embargos de Declaração Nº 70013175914 Agravo Nº 70014312177 Agravo de Instrumento Nº 70013687983 Agravo de Instrumento Nº 70013267042 Apelação Cível Nº 70012438529 Agravo de Instrumento Nº 70013866124 Apelação e Reexame Necessário Nº 70013035712 Apelação Cível Nº 70012704326 Agravo Nº 70014050108 Agravo Nº 70013988704 Agravo Nº 70013988498 Agravo Nº 70013938279 Agravo de Instrumento Nº 70013780085 Agravo de Instrumento Nº 70013720164 Apelação Cível Nº 70013680541 Apelação Cível Nº 70013653548 Agravo de Instrumento Nº 70013368170 Agravo de Instrumento Nº 70014300859 Agravo de Instrumento Nº 70014300727 Agravo de Instrumento Nº 70014220404 Apelação Cível Nº 70014184212 Agravo de Instrumento Nº 70014306674 Agravo de Instrumento Nº 70014304612 Apelação e Reexame Necessário Nº 70013856562 Apelação Cível Nº 70013800313 Apelação Cível Nº 70013778659 Apelação e Reexame Necessário Nº 70013727730 Apelação Cível Nº 70013725965 Apelação Cível Nº 70013725908 Agravo de Instrumento Nº 70013520093 Agravo de Instrumento Nº 70013508346 Agravo de Instrumento Nº 70013446406 Apelação e Reexame Necessário Nº 70013440672 Agravo de Instrumento Nº 70013123112 Agravo de Instrumento Nº 70012870523 Agravo de Instrumento Nº 70012762266 Agravo de Instrumento Nº 70012535944 Agravo de Instrumento Nº 70012509055 Agravo de Instrumento Nº 70012265385 Agravo de Instrumento Nº 70014209597 Agravo de Instrumento Nº 70014142467 Agravo de Instrumento Nº 70014177042 Agravo de Instrumento Nº 70014143069 Apelação Cível Nº 70014023097 Agravo de Instrumento Nº 70013633938 Embargos de Declaração Nº 70013570304 Agravo de Instrumento Nº 70013460514 Agravo de Instrumento Nº 70013434287

Apelação e Reexame Necessário Nº 70012820288 Agravo de Instrumento Nº 70012720785 Apelação Cível Nº 70012653168 Apelação e Reexame Necessário Nº 70012235180 Apelação Cível Nº 70012068557 Apelação e Reexame Necessário Nº 70010138923 Agravo de Instrumento Nº 70014132229 Agravo Nº 70014049860 Apelação Cível Nº 70013700299 Agravo de Instrumento Nº 70013686316 Agravo de Instrumento Nº 70013672266 Apelação Cível Nº 70013646773 Agravo de Instrumento Nº 70013581335 Agravo de Instrumento Nº 70014069330 Apelação Cível Nº 70013781539 Apelação Cível Nº 70013680509 Agravo de Instrumento Nº 70014133482 Agravo de Instrumento Nº 70014119291 Agravo de Instrumento Nº 70014084016 Agravo de Instrumento Nº 70014040935 Agravo de Instrumento Nº 70013702154 Embargos de Declaração Nº 70013663224 Agravo de Instrumento Nº 70012631867 Agravo de Instrumento Nº 70014060792 Apelação Cível Nº 70013587472 Agravo de Instrumento Nº 70014039895 Agravo de Instrumento Nº 70014033971 Embargos de Declaração Nº 70013928155 Agravo Nº 70013845144 Apelação Cível Nº 70013761820 Apelação Cível Nº 70013712963 Apelação Cível Nº 70013702840 Apelação e Reexame Necessário Nº 70013681424 Apelação Cível Nº 70013622576 Apelação e Reexame Necessário Nº 70013599402 Apelação Cível Nº 70013584610 Apelação e Reexame Necessário Nº 70013530605 Apelação Cível Nº 70013456090 Agravo de Instrumento Nº 70013407242 Agravo de Instrumento Nº 70014029250 Agravo Nº 70013938568 Agravo Nº 70013938410 Agravo Nº 70013923552 Apelação Cível Nº 70013694997 Apelação e Reexame Necessário Nº 70013670633 Agravo Nº 70013615125 Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/ementa.php>. Acesso em: dez. 2006 a nov. 2007.

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ANEXO S – ÍNTEGRA DECISÃO AC70020524856 TJ/RS AMM Nº 70020524856 2007/Cível

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. CID: K 21.0, I 10 E I 20.0. VERAPAMIL 80mg, CLORTALIDONA 50mg, OMEPRAZOL 20 mg e SUSTRATE 10mg. DIREITO À SAUDE. OBRIGAÇÃO DO ESTADO. GARANTIA CONSTITUCIONAL. ART. 196 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. IDOSO. LEI 10.741/2003. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. O art. 196, Constituição Federal, dispõe que a saúde é direito de todos e dever do Estado, devendo serem fornecidos gratuitamente às pessoas desprovidas de recursos financeiros a medicação necessária para o seu tratamento de saúde. Demonstrados os requisitos do art. 1º e 2º, da Lei Estadual nº 9.908/93, necessidade de uso continuado do medicamento requerido, indispensável à vida da autora, assim como falta de condições financeiras para aquisição do fármaco. Negaram provimento ao apelo. Unânime.

APELAÇÃO CÍVEL

QUARTA CÂMARA CÍVEL

Nº 70020524856

COMARCA DE RESTINGA SECA

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

APELANTE E

OTILES GUEDES DOS SANTOS

APELADO.

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao apelo.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores DES. JOÃO CARLOS BRANCO CARDOSO (PRESIDENTE E REVISOR) E

DES. WELLINGTON PACHECO BARROS.

Porto Alegre, 12 de setembro de 2007.

DES. ALEXANDRE MUSSOI MOREIRA,

Relator.

R E L A T Ó R I O

DES. ALEXANDRE MUSSOI MOREIRA (RELATOR)

Trata-se de apelação cível interposta pelo ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, nos autos da ação ordinária movida por OTILES GUEDES DOS

SANTOS, da sentença de fls. 89/96, que julgou procedente o pedido, para condenar o demandado a fornecer para a autora os medicamentos (Verapamil 89mg, Clortalidona

50mg, Omeprazol 20mg e Sustrate 10mg) que necessita para tratamento das patologias de CID K 21.0, I 10 e I.20.0. Sem condenação de custas e honorários advocatícios.

O demandado, em suas razões de apelo (fls. 100/105), aduz que a norma constante do art. 196, da Constituição Federal, não é auto-aplicável, não

havendo direito público subjetivo de a parte autora pretender obter gratuitamente determinado tratamento, tendo em vista que a norma constitucional é no sentido de que seja

propiciado o acesso universal e igualitário às ações e serviços de saúde. Sustenta que ausente previsão orçamentária para custear as despesas médico-hospitalares da

autora, sob pena de violação ao disposto nos artigos 165, parágrafo único, e 167, I e IV, da Constituição Federal, uma vez que não há prévia autorização legislativa. Alega que

não pode o judiciário se imiscuir em tarefa típica do Executivo, impondo a destinação de recursos a situações individualizadas, abandonando os planos e metas

administrativas traçadas pelo Estado, uma vez que tal atitude implica em infringência ao art. 2º e 37, da Constituição Federal.

Recebido o recurso, intimadas as partes e apresentadas as contra-razões.

Com parecer pela Procuradoria de Justiça (fls. 123/132), no sentido de que seja negado provimento ao apelo, vieram os autos, conclusos, para

julgamento.

É o relatório.

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

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V O T O S

DES. ALEXANDRE MUSSOI MOREIRA (RELATOR)

Tem-se apelo da sentença de fls. 89/96, que julgou procedente o pedido, para condenar o demandado a fornecer para a autora os medicamentos

(Verapamil 89mg, Clortalidona 50mg, Omeprazol 20mg e Sustrate 10mg) que necessita para tratamento das patologias de CID K 21.0, I 10 e I.20.0. Sem condenação de

custas e honorários advocatícios.

O Estado alega, em suma, que o art. 196 da Constituição Federal é norma programática, não sendo possível a destinação de recursos para situações

individualizadas, uma vez que a garantia ao direito à saúde deve ser realizada mediante políticas sociais e econômicas, vinculadas a planos orçamentários prévios, ante à

ausência dos recursos previstos na Lei Estadual nº 9.908/03, não podendo, assim, o Poder Judiciário imiscuir-se nas tarefas típicas do Poder Executivo.

Resta evidenciado, do contido nos autos, que a autora é portadora de patologias codificadas respectivamente com CID: K 21.0, I 10 e I 20.0,

necessitando de uso contínuo dos fármacos Verapamil 89mg, Clortalidona 50mg, Omeprazol 20mg e Sustrate 10mg, nos termos da prescrição (fls. 14/13) exarada por médico

que atua no Serviço Ambulatorial, da Secretaria Municipal de Saúde, do Município de Restinga Seca, bem como conforme encaminhamento realizado pelo Serviço Social

daquele Município (fl. 17), não possuindo condições financeiras para a compra destes, conforme documento de fl. 10, que demonstra o recebimento de pensão mensal de R$

351,33, uma vez que o custo mensal para a aquisição de tais medicamentos importa em R$ R$ 46,00. Demonstrado, assim, os fatos constitutivos do seu direito (art. 333, I, do

CPC). Comprovada a necessidade do fornecimento da medicação postulada pela autora,

De outro lado, não há nos autos qualquer prova em contrário quanto aos fatos narrados e demonstrados pela demandante, não tendo, assim, o

demandado se desincumbido, a contento, do ônus imposto pelo art. 333, II, do CPC.

A Constituição Federal, em seu art. 5º, caput, dispõe sobre as garantias fundamentais, assegurando o direito à vida, em seu art. 6º, no que diz

respeito aos direitos sociais, garante o direito à saúde, sendo que em seu art. 196 estabelece que a saúde é um direito de todos e um dever do Estado, devendo sua

promoção ser realizada mediante políticas sociais e econômicas que busquem a redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações

e serviços.

A Lei nº 8.080/90, em consonância com o preceito constitucional transcrito dispõe, em seus artigos 2º, 4º e 7º, que:

"Art. 2º. A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício. § 1º O dever do Estado de garantir a saúde consiste na formulação e execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação ..." “Art. 4º. O conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da Administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público, constitui o Sistema Único de Saúde (SUS). “ "Art. 7º. As ações e serviços públicos de saúde e os serviços privados contratados ou conveniados que integram o Sistema Único de Saúde (SUS), são desenvolvidos de acordo com as diretrizes previstas no art. 198 da Constituição Federal, obedecendo ainda aos seguintes princípios: I - universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência; II - integralidade de assistência, entendida como conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos,individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema; ..."

Depreende-se, da conjugação dos dispositivos constitucionais mencionados com a legislação infraconstitucional transcrita, que o Sistema Único de

Saúde - SUS visa a integralidade da assistência à saúde, seja individual ou coletiva, devendo atender aos que dela necessitem em qualquer grau de complexidade.

Assim, estando devidamente comprovadas as doenças de que está acometida a requerente, a necessidade de uso contínuo dos fármacos Verapamil

89mg, Clortalidona 50mg, Omeprazol 20mg e Sustrate 10mg, para tratá-las, bem como a sua impossibilidade financeira para a aquisição deste, deve o medicamento ser

fornecido pelo Estado, a fim de que seja atendido um princípio maior, que é a garantia à vida digna, à qual é fundamental o direito à saúde.

Salienta-se,ainda, que a hipótese dos autos preenche os requisitos dos artigos 1º e 2º, da Lei Estadual nº 9.908/93, sendo que o fato de que

eventualmente os medicamentos descritos na inicial não estejam arrolados no Decreto 35.056/94, alterado pelo Decreto 35.220/94, que relaciona os medicamentos

excepcionais, não importa para o deslinde da causa, porquanto não se cuida de rol exaustivo, bem como por se estar frente ao direito à vida, garantido constitucionalmente.

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Configurada a necessidade da autora ver atendida a sua pretensão, uma vez que legítima e constitucionalmente garantida, deve ser assegurado o

direito à saúde e, em última instância, à vida, uma vez que a saúde é direito de todos e dever do Estado.

Assim já se posicionou esta Câmara, conforme se infere das ementas que ora se transcreve:

“APELAÇÃO. CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS PELO MUNICÍPIO. LEGITIMIDADE. O direito à saúde é assegurado a todos, devendo os necessitados receberem do ente público os medicamentos necessários ao tratamento (art. 196, CF). Legitima-se o Município de Santo Ângelo, passivamente, em ação em que pessoa sem meios econômicos para arcar com o tratamento, pleiteia o fornecimento de medicamentos. APELAÇÃO DESPROVIDA.” (Apelação Cível Nº 70019864594, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jaime Piterman, Julgado em 04/07/2007) “APELAÇÃO CÍVEL. CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO ORDINÁRIA C/C TUTELA ANTECIPADA. SAÚDE PÚBLICA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. DOENÇA DE ALZHEIMER EM ESTÁGIO AVANÇADO. PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. GARANTIA CONSTITUCIONAL NA FORMA DO ART. 196 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. PRECEDENTES DO STF E DESTA CORTE. PRELIMINAR REJEITADA. PARCIAL PROVIMENTO A APELAÇÃO. 1. Ilegitimidade Passiva ad causam. A União, Estado e Município são solidariamente responsáveis pela prestação do direito à vida, que é obrigação do Estado, em abstrato, desimportando qual a esfera de poder estatal que a realiza. Não-acolhimento. 2. Mérito. É consabido que a Saúde Pública é obrigação do Estado em abstrato, desimportando qual a esfera de poder que, efetivamente, a cumpre, pois a sociedade que contribui e tudo paga, indistintamente, ao ente público que lhe exige tributos cada vez mais crescentes, em todas e quaisquer esferas de poder estatal, sem que a cada qual seja especificada a destinação desses recursos. Nesse contexto, o direito à vida e o direito à saúde são direitos subjetivos inalienáveis, constitucionalmente consagrados, cujo ¿primado supera restrições legais¿. Não provimento. 3. Honorários Advocatícios à conta do Estado do Rio Grande do Sul. É de ser reduzida a verba honorária, consoante posicionamento reiterado deste Órgão recursal. Provimento. PRELIMINAR REJEITADA. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.” (Apelação Cível Nº 70017752668, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Wellington Pacheco Barros, Julgado em 21/03/2007) “FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS - DETERMINAÇÃO DE BLOQUEIO DE VALORES NAS CONTAS DO ESTADO AFASTADA - PARTE AUTORA REPRESENTADA POR DEFENSOR PÚBLICO - INCABÍVEL CONDENAÇÃO DO ESTADO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EM FAVOR DA DEFENSORIA PÚBLICA ¿ PRECEDENTES DO STJ - DIREITO À SAÚDE GARANTIDO PELOS ARTIGOS 5º E 196 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Apelo parcialmente provido.” (Apelação Cível Nº 70014169510, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: João Carlos Branco Cardoso, Julgado em 01/11/2006

Não há falar em ausência de previsão orçamentária, mero quadro organizatório, e de valor constitucional de menor densidade em comparação com o

direito a saúde, objeto da presente demanda.

Não há nos autos prova da impossibilidade financeira do demandado em fornecerem o medicamento pretendido pela autora, sendo que o art. 1°, da

Lei Estadual 9.908/93 assegura o direito da apelada, que logrou provar os requisitos da Lei Estadual, que dizem com a incapacidade financeira, necessidade do medicamento

e continuidade do uso

Mostra-se aplicável ao caso dos autos o princípio da legalidade (art. 37, caput, da Constituição Federal), sem que haja qualquer violação ao princípio

da independência dos Poderes (art. 2° da Constituição Federal), tendo em vista que os recursos para o custeio do medicamento fornecidos, nos termos do art. 5° da Lei

9.908/93, correrão por conta dos recursos destinados no inciso IV, do artigo 2º, da Lei 9.828/93 (revogado pelo art. 13 da Lei 10.529/95), não havendo, assim, violação ao

disposto no art. 167 e 168, da Constituição Federal,

Há que se ter presente, ainda, que o art. 24, IV, da Lei 8.666/93, dispensa licitação em casos de urgência e do comprometimento à segurança das

pessoas, como é o caso dos autos.

No sentido de que desnecessidade de prévia dotação orçamentária para o fornecimento de medicamento essencial à vida, já decidiu esta Corte, em

especial às Câmara que compõe 2º Grupo Cível deste Tribunal, v.g.:

“CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO - FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS - SUPREMACIA DO DIREITO À VIDA E À SAÚDE, TUTELADO PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL SOBRE O DIREITO PATRIMONIAL DOS ENTES PÚBLICOS ESTADUAL E MUNICIPAL, DISPOSTO EM NORMAS INFERIORES - DIREITO À SAÚDE GARANTIDO PELO ARTIGO 198 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL - AUSÊNCIA DE PRÉVIA DOTAÇÃO ORÇAMENTÁRIA QUE NÃO AFASTA A

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DETERMINAÇÃO LEGAL (...). Apelo parcialmente provido.” (Apelação Cível Nº 70019487123, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: João Carlos Branco Cardoso, Julgado em 20/06/2007) “ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. CANOAS. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS A NECESSITADO. DIREITO À PERCEPÇÃO GRATUITA PELO ESTADO. ART. 196 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ART. 1º DA LEI ESTADUAL Nº 9.908/93. DESNECESSÁRIA PREVISÃO ORÇAMENTÁRIA OU LICITAÇÃO PARA A AQUISIÇÃO DOS MEDICAMENTOS. DIREITO À SAÚDE E À VIDA QUE SE SOBREPÕEM. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA. IMPOSSIBILIDADE. 1 - A Carta Federal é expressa ao assegurar o direito à vida e o direito à saúde como garantias fundamentais, instituídas em norma de caráter imperativo, auto-aplicáveis, de acordo com a responsabilidade solidária dos entes federativos (art. 196 da CF/88). Assim, sendo normas asseguradoras de direitos que se sobrepõem a quaisquer outros, desnecessária a previsão orçamentária ou a licitação para a aquisição dos medicamentos pleiteados, sob pena de colocar-se em risco a saúde e a vida do demandante. 2- PRELIMINAR REJEITADA. APELO DESPROVIDO.” (Apelação Cível Nº 70011706900, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Vasco Della Giustina, Julgado em 22/06/2005) “DECISÃO MONOCRÁTICA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. DOENÇA DE PARKINSON. - Aos Entes da Federação cabe o dever de fornecer gratuitamente tratamento médico a pacientes necessitados (artigos 6º e 196 da Constituição Federal). - Vedação à concessão de antecipação de tutela contra a Fazenda Pública afastada frente ao dever constitucional de garantir a saúde dos cidadãos. - Necessidade de previsão orçamentária afastada frente ao dever constitucional de garantir a saúde dos cidadãos. (...). NEGO SEGUIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO.” (Agravo de Instrumento Nº 70020639233, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Pedro Luiz Pozza, Julgado em 24/07/2007) “APELAÇÃO CÍVEL. ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. AVC - TRATAMENTO. TRATAMENTO MÉDICO. ESTATUTO DO IDOSO. (...). Desnecessidade de previsão orçamentária para fornecimento dos fármacos diante dos bens em liça. Limites Objetivos da Sentença: A despeito da solidariedade entre os réus (Estado e Município), houve a individuação dos pedidos da petição inicial, sendo postulada a condenação de prestações específicas contra cada um dos entes federativos. (...). APELAÇÃO DO MUNICÍPIO DESPROVIDO. APELAÇAÕ DO ESTADO PARCIALMENTE PROVIDA.” (Apelação Cível Nº 70019216084, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, Julgado em 31/05/2007) “APELAÇÃO CÍVEL. REEXAME NECESSÁRIO. AÇÃO ORDINÁRIA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. DEVER DO ESTADO. (...). Previsão orçamentária. Necessidade de previsão orçamentária afastada frente ao dever constitucional de garantir a saúde dos cidadãos. (...). DERAM PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO, MANTIDA A SENTENÇA, NO MAIS, EM REEXAME NECESSÁRIO.” (Apelação e Reexame Necessário Nº 70014528293, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Matilde Chabar Maia, Julgado em 26/10/2006)

O direito da autora está fulcrado em preceitos constitucionais, na Lei federal nº 8.080/90 e na Lei estadual nº 9.908/93, sendo irrelevante que se traga

à baila discussão acerca de verbas ou de previsão orçamentária, tendo em vista que a saúde e a vida se constituem a fonte fundamental e primeira de todos os outros bens

jurídicos, sendo obrigação do Poder Público assegurar sua realização, não podendo ser invocada a vontade da Administração Pública no sentido de promover a efetiva e

suficiente previsão orçamentária para o atendimento de deveres constitucionais

Também não há violação ao princípio da independência dos poderes, ante o dever que tem a autoridade judiciária de reparar uma lesão de direito (art.

5º, XXXVI da Constituição Federal). A impossibilidade de ser postergado o dever constitucional de assegurar a saúde (CF, art. 196) e a impossibilidade de dispensar

assistência aos desamparados constituem fatores, que, associados à solidariedade humana, enfraquecem e desmerecem os obstáculos levantados pelo Estado do Rio

Grande do Sul.

Ademais, a possibilidade de o Judiciário intervir na esfera da Administração, já foi objeto de análise pelo STF, conforme se infere da decisão proferida

nos autos do AI nº. 570455/RS, da relatoria do Ministro CELSO DE MELLO, julgamento em 1º/02/2006, DJ de 15/02/2006, p. 00111, a seguir transcrita, em parte:

“... Na realidade, o cumprimento do dever político-constitucional consagrado no art. 196 da lei Fundamental do Estado, consistente na obrigação de assegurar, a todos, a proteção à saúde, representa fator, que, associado a um imperativo de solidariedade social, impõe-se ao Poder Público, qualquer que seja a dimensão institucional em que atue no plano de nossa organização federativa. A impostergabilidade da efetivação desse dever constitucional autoriza o acolhimento do pleito recursal ora deduzido na presente causa. Tal como pude enfatizar em decisão por mim proferida no exercício da Presidência do Supremo Tribunal Federal, em contexto assemelhado ao da presente causa (Pet 1.246/SC), entre proteger a inviolabilidade do direito à vida e à saúde, que se qualifica como direito subjetivo inalienável assegurado a todos pela própria Constituição da República (art. 5º, ‘caput’ e art. 196), ou fazer prevalecer, contra essa prerrogativa fundamental, um interesse financeiro e secundário do Estado, entendo – uma vez configurado esse dilema – que razões de ordem ético-jurídica impõem ao julgador uma só e possível opção: aquela que privilegia o respeito indeclinável à vida e à saúde humanas. Cumpre não perder de perspectiva que o direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República. Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular – e implementar – políticas sociais e econômicas que visem a garantir, aos cidadãos, o acesso universal e igualitário à assistência médico-hospitalar. O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política – que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro (JOSÉ CRETELLA JÚNIOR, ‘Comentários à Constituição de 1988’, vol. VIII/4332-4334, item n. 181, 1993, Forense Universitária) – não pode converter-se em promessa constitucional

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inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado. (...) Cumpre assinalar, finalmente, que a essencialidade do direito à saúde fez com que o legislador constituinte qualificasse, como prestações de relevância pública, as ações e serviços de saúde (CF, art. 197), em ordem a legitimar a atuação do Ministério Público e do Poder Judiciário naquelas hipóteses em que os órgãos estatais, anomalamente, deixassem de respeitar o mandamento constitucional, frustrando-lhe, arbitrariamente, a eficácia jurídico-social, seja por intolerável omissão, seja por qualquer outra inaceitável modalidade de comportamento governamental desviante...”

Há que se ter presente, ainda, que incide, na hipótese dos autos, a Lei 10.741/2003, tendo em vista que a autora possui mais de 60 ano de idade,

demandando especial atenção. Sendo que a referida Lei, dispõe em seu art. 15, § 2º, que incumbe “ao Poder Público fornecer aos idosos, gratuitamente, medicamentos,

especialmente os de uso continuado, assim como próteses, órteses e outros recursos relativos ao tratamento, habilitação ou reabilitação”.

Sendo assim, é o voto para negar provimento ao apelo.

DES. JOÃO CARLOS BRANCO CARDOSO (PRESIDENTE E REVIS OR) - De acordo.

DES. WELLINGTON PACHECO BARROS - De acordo.

DES. JOÃO CARLOS BRANCO CARDOSO - Presidente - Apelação Cível nº 70020524856, Comarca de Restinga Seca: "NEGARAM

PROVIMENTO AO APELO. UNÂNIME."

Julgador(a) de 1º Grau: EDUARDO GIOVELLI Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/consulta/download/exibe_docuemnto.php?ano=2007&codigo=1161560>. Acesso em: out. 2007.

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ANEXO t – ÍNTEGRA DECISÃO AI 70009343013 TJ/RS SLGB Nº 70009343013 2004/Cível

AGRAVO DE INSTRUMENTO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. FORNE CIMENTO DE TRATAMENTO. SAÚDE DO CIDADÃO. O fornecimento gratuito de medicamentos (tratamentos) constitui responsabilidade do Estado e do Município. A demora do tratamento/cirurgia por via administrativa põe em risco a vida do agravante, não podendo ele aguardar os entraves burocráticos para ver atendida a sua necessidade. Conheceram do agravo de instrumento e deram-lhe pr ovimento. Unânime.

AGRAVO DE INSTRUMENTO

VIGÉSIMA PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL EM REGIME DE EXCEÇÃO

Nº 70009343013

COMARCA DE PORTO ALEGRE

SÉRGIO LUIZ DE SOUZA

AGRAVANTE

MUNICÍPIO DE CACHOEIRINHA

AGRAVADO

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

AGRAVADO

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Magistrados integrantes da Vigésima Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade,

em dar provimento ao agravo de instrumento .

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores DES. MARCO AURÉLIO HEINZ (PRESIDENTE)

E DESA. LISELENA SCHIFINO ROBLES RIBEIRO .

Porto Alegre, 21 de dezembro de 2004.

DR. SÉRGIO LUIZ GRASSI BECK,

Relator.

R E L A T Ó R I O

DR. SÉRGIO LUIZ GRASSI BECK (RELATOR) - Cuida-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, manejado por

SÉRGIO LUIZ DE SOUZA, em face da decisão que indeferiu a antecipação de tutela pleiteada por ele.

Sustentou o agravante que: (1) é portador de ruptura meniscal do joelho direito, sofrendo fortes dores; (2) procurou a

secretaria Municipal de Saúde de Cachoeirinha e que foi encaminhado para Porto Alegre em 05/02/2002 e até o presente momento nada foi

feito e, (3) o Departamento Médico Judiciário apenas analisou os documentos acostados aos autos, sem sequer examinar o agravante.

Requereu a concessão do efeito suspensivo e o provimento do recurso.

É o relatório.

V O T O S

DR. SÉRGIO LUIZ GRASSI BECK (RELATOR) - Conheço do recurso, uma vez presentes os pressupostos de admissibilidade.

Efetivamente, não pode o agravante aguardar todos os entraves burocráticos para ter seu pedido atendido na via

administrativa, na medida em que seu estado de saúde precisa de proteção imediata, que até pode não lhe ter sido negado

administrativamente, mas pelo perigo da demora e frente ao descaso, poderá lhe causar danos irreversíveis, sendo de considerar-se que o

Município de Cachoeirinha encaminhou o agravante para tratamento médico, junto a Clínica Sultrauma, em 05/02/2002, tendo sido dito-lhe

então, que aguardasse vaga para a realização da artroscopia, estando no aguardo desde então, num período que já vai para três anos,

sofrendo dores e correndo risco de ter a saúde agravada.

Por outro lado, ainda que se considere que a cirurgia não era de urgência, certamente é indispensável para a recuperação

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

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da saúde do recorrente, que não pode ter o seu atendimento relegado para as calendas gregas.

Ocorre que a obrigação do Estado é depreendida do art. 198 e art. 196 da Constituição Federal e do art. 1º da Lei

9.908/93, que reza:

“Art. 1º - O estado deve fornecer, de forma gratuita, mediamentos excepcionais para pessoas que não puderem prover as despesas com os referidos medicamentos, sem privarem-se dos recursos indispensáveis ao próprio sustento e de sua família.

Parágrafo único – Consideram-se medicamentos excepcionais aqueles que devem ser usados com freqüência e de forma permanente, sendo indispensáveis à vida do paciente.

Tenho como irrefutável a obrigatoriedade do Estado pelo atendimento dessa política na área da saúde pública, alcançando

aos carentes aquela medicação excepcional e de difícil acesso a quem não pode adquiri-la, já que, existe no caso em tela a necessidade de se

correr contra o tempo.

Neste sentido, as jurisprudências que se transcrevem, a saber:

CONSTITUCIONAL. FORNECIMENTO DE REMEDIOS A NECESSITADO. LEGITIMACAO CONCORRENTE PASSIVA DO ESTADO. O ESTADO TEM LEGITIMIDADE PASSIVA NA DEMANDA VISANDO AO FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS A NECESSITADO. APLICACAO DA LEI 9908/93. O DIREITO A SAUDE E ASSEGURADO A TODOS, DEVENDO OS NECESSITADOS RECEBEREM DO ENTE PUBLICO OS MEDICAMENTOS NECESSARIOS. APLICACAO DO ARTIGO 196 DA CONSTITUICAO FEDERAL. PRECEDENTES DO TRIBUNAL DE JUSTICA DO ESTADO. VERBA HONORARIA. APLICACAO DO ART. 20, § 4º, DO CPC. TRATANDO-SE DE MATERIA REPETITIVA, POSSIVEL A APLICACAO DA VERBA HONORARIA NOS MOLDES DO ART. 20, § 4º, DO CPC, SEM A NECESSIDADE DE OBSERVANCIA DO § 3º DO ART. 20 DO CPC. APELACOES DESPROVIDAS. CONFIRMADA A SENTENCA EM REEXAME NECESSARIO. (APELAÇÃO E REEXAME NECESSÁRIO Nº 70004732913, PRIMEIRA CÂMARA ESPECIAL CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: CARLOS EDUARDO ZIETLOW DURO, JULGADO EM 25/09/2002) FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS EMERGENCIAIS. LEI ESTADUAL (LEI N. 9908/93) INSTITUIDORA DO DEVER DE FORNECIMENTO DE MEDICACAO. LEGITIMACAO PASSIVA DO ESTADO. CONCEDERAM A SEGURANCA. (4FLS) (MANDADO DE SEGURANÇA Nº 70002710671, PRIMEIRO GRUPO DE CÂMARAS CÍVEIS, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: LISELENA SCHIFINO ROBLES RIBEIRO, JULGADO EM 05/10/2001)

Ainda no mesmo sentido, RE nº 264.269-0, 1ª Turma do STF, Rel. Min. Moreira Alves, decisão de 11.04.2000, conforme a seguir

transcrita:

-Recurso Extraordinário. Doente portador do vírus HIV. Lei 9.908/93 do Estado do Rio Grande do Sul. “ADMINISTRATIVO. ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. DOENTE PORTADORA DO VÍRUS HIV, CARENTE DE RECURSOS INDISPENSÁVEIS A AQUISIÇÃO DOS MEDICAMENTOS DE QUE NECESSITA PARA SEU TRATAMENTO. OBRIGAÇÃO IMPOSTA PELO ACÓRDÃO DO ESTADO. ALEGADA OFENSA AOS ARTS. 5º, I, E 196 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Decisão que teve por fundamento central dispositivo de lei (art. 1º da Lei 9.908/93) por meio da qual o próprio Estado do Rio Grande do Sul, regulamentando a norma do art. 196 da Constituição Federal, vinculou-se a um programa de distribuição de medicamentos a pessoas carentes, não havendo, por isso, que se falar em ofensa aos dispositivos constitucionais apontados. Recurso não conhecido. Dessa orientação não divergiu o acórdão recorrido. Recurso extraordinário não conhecido. Em face de tal situação, fica clara a responsabilidade do Estado e do Município de Cachoeirinha em arcar com os meios

necessários para garantir saúde aos seus cidadãos, já que este é um direito fundamental, garantido no art. 2º da Carta Magna.

POSTO ISSO, conheço do agravo de instrumento e DOU-LHE PROVIMENTO.

DES. MARCO AURÉLIO HEINZ (PRESIDENTE) - De acordo.

DESA. LISELENA SCHIFINO ROBLES RIBEIRO - De acordo.

Agravo de instrumento nº 70009343013, de porto Alegre - Conheceram do agravo de instrumento e deram-lhe provimento. Unânime.

Julgador(a) de 1º Grau: VANESSA GASTAL DE MAGALHAES

Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/consulta/download/exibe_documento.php?ano=2004&codigo=772849>.

Acesso em: out 2007

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ANEXO u – ÍNTEGRA DECISÃO AI 70007321847 TJ/RS NAMP Nº 70007321847 2003/Cível

DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. ANTECIPAÇÃO DA TU TELA DEFERIDA PARA O FORNECIMENTO MEDICAMENTO A PACIENTE PORTADORA DE HEPATITE “C”. IMPOSSIBILIDADE DE AQUISIÇÃO EM FACE DA PROVA DAS D ESPESAS NECESSÁRIAS À SUBSISTÊNCIA FAMILIAR. DIREITO À SAÚDE QUE DETÉM PR OTEÇÃO ESPECIAL NA CARTA POLÍTICA. LEGISLAÇÃO ESTADUAL SUFICIENTE PARA CONDU ZIR AO DEFERIMENTO DA TUTELA ANTECIPADA PERSEGUIDA PELA AGRAVADA. AGRAVO IMPROVIDO.

AGRAVO DE INSTRUMENTO

TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

Nº 70007321847

PORTO ALEGRE

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

AGRAVANTE

NEUZA CAMBOIM DA SILVA

AGRAVADA

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do

Estado, à unanimidade, em negar provimento ao agravo .

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Desembargadores PAULO DE TARSO

VIEIRA SANSEVERINO e MATILDE CHABAR MAIA.

Porto Alegre, 12 de fevereiro de 2004.

NELSON ANTONIO MONTEIRO PACHECO, Relator.

R E L A T Ó R I O

Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL diante da

decisão lançada nos autos da ação que lhe move NEUZA CAMBOIM DA SILVA, que deferiu pedido de tutela

antecipada concernente ao fornecimento de medicação especial (INTERFERON PEGUILADO) à agravada (fl. 29 ).

Em suas razões, sustentou que não há estudos cientí ficos dando conta da eficácia do

tratamento pretendido pela agravada, fornecimento d e medicamentos pela Administração que não pode ser

indiscriminado. Asseverou que um dos requisitos à p rescrição da droga postulada é a presença do vírus da

Hepatite “C” do genótipo 1, conforme normas do Mini stério da Saúde, não sendo esse o caso da agravada.

Assinalou, por fim, que o pedido veio instruído por receita médica particular, que não pode prevalecer

frente às manifestações dos técnicos em saúde do Po der Público. Propugnou fosse agregado efeito suspen sivo

ao recurso e seu final provimento, cassando-se a de cisão interlocutória vergastada.

O recurso foi recebido e negado o efeito suspensivo (fls. 42 e vº).

Após a resposta da agravada (fls. 45-48), os autos foram com vista ao Procurador de

Justiça, seu parecer pelo conhecimento e improvimen to do agravo (fls. 50-3).

É o relatório.

V O T O

NELSON ANTONIO MONTEIRO PACHECO (RELATOR)

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

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Encaminho voto pelo improvimento do agravo de instr umento.

Ressalto, inicialmente, que a agravada é portadora de “Hepatite Crônica, pelo vírus “C” -

HCV, de genótipo 2”, conforme faz certo o relatório médico do Dr. Hugo Cheinquer, acostado na fl. 17 d os

autos, necessitando do medicamento Interferon Pegui lado, tratamento que não está a seu alcance em funç ão

da sua situação financeira (fls. 23-4).

Dito isso, lembro que se lida com direito fundament al na espécie, corretamente tutelado na

Carta Política da República como superdireito (art. 196) que se sobrepõe a qualquer outro, consoante

decidiu o egrégio Tribunal de Justiça, no REsp nº 1 27.604-RS, atribuída a sua responsabilidade

genericamente ao Estado, assim compreendidas as pes soas jurídicas de direito público dos três níveis e m

que a Federação está organizada. De outro lado, o t exto constitucional, ao falar genericamente em Esta do,

tem cunho geral, preconizando que o custeio do Sist ema Único de Saúde se dê por meio de recursos

orçamentários da seguridade social comum a todos os entes federados (art. 198, parágrafo único, da CF- 88),

regionalização e hierarquização nele referidas que devem ser compreendidas sempre como intenção de

descentralizar e garantir sua efetividade.

De outro lado, não é no agravo de instrumento que o relatório fornecido pelo Dr. Cheinquer

vai ser discutido. Aquele profissional é bastante c onhecido e sua qualificação não foi posta em dúvida em

momento algum pelo agravante. Se receitou a medicaç ão, dizendo-a adequada ao caso da agravada, mesmo n ão

sendo o vírus correspondente ao genótipo 1, não é o Poder Judiciário, sem prova robusta em sentido

contrário, que vai desconsiderar o que foi dito com tamanha clareza (fl. 17).

De qualquer forma, cumpre realçar novamente que est á na legislação um conjunto de regras

que asseguram ao indivíduo o acesso aos mecanismos de prevenção, proteção e defesa da saúde, sob

responsabilidade do Estado. Exatamente por isso é q ue foi concedida a tutela antecipada e negado o efe ito

suspensivo preconizado pelo agravante, sendo de se destacar os quatro argumentos centrais que sempre s ão

examinados nos casos que aqui chegam, pois o Estado deve mesmo fornecer a medicação, a uma, porque ass umiu

deliberadamente o encargo por sua legislação, não p odendo simples decreto contrariar o texto expresso da

Lei-RS nº 9.908/93, de 16JUN93, devendo ser buscada s outras fontes de custeio, pois os recursos retira dos

por força da Lei-RS nº 10.529/95 não são empecilho para o integral cumprimento da obrigação posta na l ei;

a duas, porque a sua responsabilidade decorre das r elações jurídicas de direito público regularmente

mantidas com os pacientes portadores de graves molé stias, que necessitam de medicação e não tem recurs os

para adquiri-la, tudo como aconteceu no caso concre to; a três, porque na hipótese se dispensa licitaçã o

(art. 24, IV, da Lei nº 8.666/93); e, a quatro, por que não há ofensa alguma ao princípio da separação dos

poderes, mas antes imposição do cumprimento de deve r que os entes públicos insistem em desatender.

Em vista do exposto, como adiantei, voto pelo impro vimento do agravo de instrumento.

DES. PAULO DE TARSO VIEIRA SANSEVERINO – De acordo. DESª MATILDE CHABAR MAIA – De acordo. Julgador de 1º Grau: MURILO MAGALHAES CASTRO FILHO

Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/consulta/download/exibe_documento.php?ano=2004&codigo=23503>. Acesso em: out. 2007.

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ANEXO V – ÍNTEGRA DECISÃO AI70008313165 TJ/RS NAMP Nº 70008313165 2004/Cível

DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. FORNECIMENTO DE M EDICAÇÃO A PACIENTE CARENTE E PORTADOR DE GRAVES MOLÉSTIAS. DEVER DO ESTADO REAFIRMADO. Cabível a antecipação da tutela deferida para o for necimento medicamento Interferon Peguilado e Ribavirina a paciente portador dos vírus do HIV e da Hepatite “C”. Impossibilidade de aquisição por part e do agravado que sequer foi controvertida. Direito à saúde que detém proteç ão especial na Carta Política. Portaria-MS nº 863/02 que não pode ser ut ilizada para rejeitar o pedido de fornecimento do medicamento prescrito pel o médico do agravado. Legislação estadual suficiente para conduzir ao def erimento da tutela antecipada perseguida pelo agravado. AGRAVO IMPROVIDO.

AGRAVO DE INSTRUMENTO

TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

Nº 70008313165

PORTO ALEGRE

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

AGRAVANTE

ANTONIO CARLOS CARVALHO

AGRAVADO

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do

Estado, à unanimidade, em negar provimento ao recurso .

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Desembargadores LUIZ ARI

AZAMBUJA RAMOS, Presidente sem voto, PAULO DE TARSO VIEIRA SANSEVERINO e MATILDE CHABAR MAIA.

Porto Alegre, 1º de julho de 2004.

NELSON ANTONIO MONTEIRO PACHECO,

Relator.

R E L A T Ó R I O

Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL em face da

decisão de fls. 45-6, que deferiu a antecipação de tutela ao efeito de determinar o fornecimento dos

medicamentos Interferon Peguilado e Ribavirina, pleiteados nos autos ação movida por ANTÔNIO CARLOS

CARVALHO.

Nas razões, o agravante argüiu que a decisão objurg ada não considerou a norma médica-

técnica, ou seja, a Portaria nº 863/02, ao deferir o medicamento Interferon Peguilado, cuja eficácia n ão é

comprovadamente melhor do que a do Interferon tradi cional, fornecido pelo Estado. Afirmou que a referi da

portaria resulta de consenso científico acerca do u so do medicamento requerido em pacientes com hepati te

viral inicial, e por isso o indeferimento do pleito na via administrativa. Acrescentou ainda, que o

Interferon Peguilado, ao contrário do Interferon co nvencional, possuiu efeito colaterais que não

justificam sua utilização indiscriminada.

É o relatório.

V O T O

NELSON ANTONIO MONTEIRO PACHECO (RELATOR)

Encaminho voto pelo improvimento do agravo de instr umento.

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

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Recordo que se trata de agravo de instrumento manej ado pelo ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL em

face da decisão de fls. 45-6, que deferiu a tutela antecipada para determinar o fornecimento dos

medicamentos Interferon Peguilado e Ribavarina ao agravado ANTÔNIO CARLOS CARVALHO, portador do vírus da

Hepatite C e também da AIDS.

Com efeito, não merece modificação a decisão profer ida na origem.

Digo isso, porque a condição de saúde do agravado i mpõe a concessão da tutela antecipada.

Antônio Carlos Carvalho é portador do vírus HIV, o que já torna seu estado de saúde delicado. Após,

descobriu-se portador do vírus da Hepatite C, vindo a utilizar os medicamentos Interferon Alfa

Recombinante e Ribaverina, não logrando sucesso nos resultados da terapia. F oi-lhe prescrito assim, o uso

do Interferon Peguilado como única opção para evitar o agravamento da doen ça (Hepatite C).

Além disso, o agravado afirmou na inicial que não p ossuiu condições de arcar com os custos

da medicação, fato não contestado pelo agravante.

Dito isso, lembro que se lida com direito fundament al na espécie, corretamente tutelado na

Carta Política da República como superdireito (art. 196) que se sobrepõe a qualquer outro, consoante

decidiu o egrégio Tribunal de Justiça, no REsp nº 1 27.604-RS, atribuída a sua responsabilidade

genericamente ao Estado, assim compreendidas as pes soas jurídicas de direito público dos três níveis e m

que a Federação está organizada. De outro lado, o t exto constitucional, ao falar genericamente em Esta do,

tem cunho geral, preconizando que o custeio do Sist ema Único de Saúde se dê por meio de recursos

orçamentários da seguridade social comum a todos os entes federados (art. 198, parágrafo único, da CF- 88),

regionalização e hierarquização nele referidas que devem ser compreendidas sempre como intenção de

descentralizar e garantir sua efetividade.

Outrossim, não há que acolher o argumento do agrava nte quanto a Portaria nº 863/2002, que

define os casos em que deve ser utilizado o Interferon Peguilado. Ainda que os estudos médicos realizados

para a conclusão da mencionada pesquisa pública ace rca da utilização do medicamento sejam científicos, não

há que se afastar a análise do caso particular, con fiando-se o tratamento do paciente ao médico

responsável pelo tratamento do agravado. Conforme a firmado na inicial, o paciente não logrou êxito

utilizando o Interferon tradicional, sendo-lhe indicado o uso do medicamen to Interferon Peguilado,

situação que não pode ser ignorada ante a norma gen érica. Os efeitos colaterais e a eficácia do

medicamento requerido são de responsabilidade do mé dico que subscreveu a medicação, não cabendo ao Pod er

Judiciário arcar com o peso desta decisão.

Reforço a tese, consubstanciada na Jurisprudência d esta Corte que assim vem decidindo em

casos idênticos:

AGRAVO INTERNO. DECISÃO MONOCRÁTICA (APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO. CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. SAÚDE PÚBLICA. HEPATITE CRÔNICA TIPO C. MEDICAMENTOS EXCEPCIONAIS. (INTERFE RON PEGUILADO ALFA 2 A E RIBAVIRINA). LIMINAR CONCEDIDA NA ORIGEM. OBRIGAÇÃO DO ESTADO. CONCESSÃO DA ORDEM NA ORIGEM. GARANTIA CONSTITUCIONAL NA FORMA DO ART. 196 DA CF-1988. PRECEDENTE DO STF. NÃO-PROVIMENTO. SENTENÇA QUE SE CONFIRMA). INTELIGÊNCIA E APLICAÇÃO DO ARTIGO 557 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (COM A ALTERAÇÃO DA LEI N.º 9.756, DE 17.12.1998). JULGAMENTO QUE SE MANTÉM . AGRAVO NÃO PROVIDO. (AgInst nº 70006524102, 4ª Câmara Cível, rel. Des. Wellington Pacheco Barros, j. em 06AGO03). CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. PROVA. DIREITO CERTO. PRESCINDIBILIDADE. CABIMENTO DA AÇÃO. FORNEC IMENTO DE MEDICAMENTOS. HEPATITE C. INTERFERON PEGUILADO E RIBAVIRINA. SE A S QUESTÕES DE FATO RELACIONADAS COM O DIREITO A SER PROTEGIDO NA VIA D O MANDADO DE SEGURANÇA PRESCINDEM DE INVESTIGAÇÃO PROBATÓRIA, NÃO CABE PROCLAMAR A INADEQUAÇÃO DA VIA PROCESSUAL ELEITA PELO IMPETRANTE. SEGURANÇA CONCEDIDA. (MS nº 70006142822, 11º Grupo Cível, redatora a Des ª Mara Larsen Chechi, j. em 27JUN2003).

De qualquer forma, cumpre realçar novamente que est á na legislação um conjunto de regras

que asseguram ao indivíduo o acesso aos mecanismos de prevenção, proteção e defesa da saúde, sob

responsabilidade do Estado. Exatamente por isso é q ue foi concedida a tutela antecipada e negado o efe ito

suspensivo preconizado pelo agravante, sendo de se destacar os quatro argumentos centrais que sempre s ão

examinados nos casos que aqui chegam, pois o Estado deve mesmo fornecer a medicação, a uma, porque ass umiu

deliberadamente o encargo por sua legislação, não p odendo simples decreto contrariar o texto expresso da

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Lei-RS nº 9.908/93, de 16JUN93, devendo ser buscada s outras fontes de custeio, pois os recursos retira dos

por força da Lei-RS nº 10.529/95 não são empecilho para o integral cumprimento da obrigação posta na l ei;

a duas, porque a sua responsabilidade decorre das r elações jurídicas de direito público regularmente

mantidas com os pacientes portadores de graves molé stias, que necessitam de medicação e não tem recurs os

para adquiri-la, tudo como aconteceu no caso concre to; a três, porque na hipótese se dispensa licitaçã o

(art. 24, IV, da Lei nº 8.666/93); e, a quatro, por que não há ofensa alguma ao princípio da separação dos

poderes, mas antes imposição do cumprimento de deve r que os entes públicos insistem em desatender.

Em vista do exposto, como adiantei, voto pelo impro vimento do agravo de instrumento.

DES. PAULO DE TARSO VIEIRA SANSEVERINO - De acordo.

DESA. MATILDE CHABAR MAIA - De acordo.

Julgadora de 1º Grau: ROSANA BROGLIO GARBIN. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/consulta/download/exibe_documento.php?ano=2004&codigo=341549>. Acesso em: out. 2007.

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ANEXO W – ÍNTEGRA DECISÃO AC70016386815 TJ/RS RP Nº 70016386815 2006/Cível

APELAÇÃO CÍVEL. ECA. SAÚDE. FORNECIMENTO MEDICAMENT O. LEGITIMIDADE ATIVA. PEDIDO ADMINISTRATIVO. SEPARAÇÃO DE PODERES. Legitimidade Ativa. O Ministério Público é parte legítima ativa para pr opor ação em prol de criança e adolescente. Jurisprudência majoritária, com base na Constituiçã o da República e no Estatuto da Criança e do Adolescente. Pedido Administrativo A inafastabilidade do controle jurisdicional, afirm ada no inciso XXXV, do artigo 5º, da Constituição da República, assegura o acesso à just iça, independentemente de esgotamento ou provocação da via administrativa, salvo exceção do § 1º, do artigo 217, da mesma Constituição. Medicamento A condenação do Poder Público para que forneça medi camento ao adolescente, encontra respaldo na Constituição da República e no Estatuto da Criança e do Adolescente. Prequestionamento Pronta indicação de dispositivos legais e constituc ionais que visa evitar embargo de declaração com fito de pré-questionamento. NEGARAM PROVIMENTO Á AMBOS OS RECURSOS.

APELAÇÃO CÍVEL OITAVA CÂMARA CÍVEL Nº 70016386815 COMARCA DE PANAMBI E.R.G.S. APELANTE M.P. APELADO

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos os autos. Acordam os Desembargadores integrantes da Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento a ambos os recursos. Custas na forma da lei. Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores DES. LUIZ ARI AZAMBUJA RAMOS (PRESIDENTE) E DES. CL AUDIR FIDÉLIS FACCENDA .

Porto Alegre, 05 de outubro de 2006.

DES. RUI PORTANOVA, Relator.

R E L A T Ó R I O

DES. RUI PORTANOVA (RELATOR)

Ação civil pública proposta pelo MINISTÉRI PÚBLICO em favor de PALOMA, menor, representada por sua mãe, ROSÂNGELA. A sentença condenou o ESTADO ao fornecimento de um par de próteses auditivas no prazo de 30 dias. Apela o ESTADO. Alega: a) preliminarmente, a ilegitimidade ativa do Ministério Público por se tratar de direito individual; b) a impossibilidade financeira do ESTADO para suprir a necessidade; c) que a decisão interfere na esfera administrativa do Poder Executivo e; d) que a apelada já efetuou o pedido pela via administrativo não havendo necessidade de buscar as vias judiciais. Pede o provimento do agravo retido para declarar a ilegitimidade do Ministério Público e o provimento do apelo para julgar improcedente a ação. O Ministério Público neste grau de jurisdição manifestou-se pelo improvimento de ambos os recursos. É o relatório.

V O T O S

DES. RUI PORTANOVA (RELATOR)

O AGRAVO RETIDO

Legitimidade Ativa.

A orientação dessa Corte é tranqüila no sentido do Ministério Público ter legitimidade ativa para postular direito de criança e/ou adolescente. São exemplos os julgados nº 70010049690, 70009491218, 70002062057.

Logo, de se negar provimento ao agravo retido.

A APELAÇÃO

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

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Pedido Administrativo

A alegação do apelante de que já foi formulado pedido administrativo está ligada à possível carência de ação por ausência de interesse processual.

Mas não lhe assiste razão. Um dos princípios que regem a jurisdição é o da inafastabilidade do controle jurisdicional, assegurado pelo inciso XXXV, do artigo 5º, da Constituição da República.

Por este princípio se garante ao cidadão o acesso à Justiça independentemente de prévio esgotamento, ou provocação, da via administrativa, somente exigível na hipótese do § 1º, do artigo 217, da Constituição da República, e em causas de índole previdenciária, por orientação jurisprudencial.

Desse modo, o pedido administrativo não afasta o interesse em provocar o Judiciário.

Direito, Política e separação de Poderes

Convém salientar que o Judiciário não é insensível aos graves e agudos problemas financeiros por que passam os entes federativos, notadamente na tarefa executiva, de administrar e gerir os recursos públicos.

Contudo, não cabe ao Judiciário discutir a implementação ou não de políticas públicas, ou impor programas políticos, ou direcionar recursos financeiros para estes ou aqueles fins por ele determinados.

Esse juízo – discricionário – efetivamente não cabe ao Judiciário, mas à Administração.

Entretanto, ao Judiciário cabe dar efetividade à lei. Ou seja, se a lei não for observada, ou for desrespeitada pelo poderes públicos, o Judiciário é chamado a intervir e dar resposta efetiva às pretensões das partes.

Note-se, da mesma forma que o sistema constitucional brasileiro veda a ingerência absoluta do Judiciário nos assuntos legislativos e nos executivos, veda também, através do próprio ordenamento processual civil, que o Judiciário se esquive de julgar (vedação ao non liquet, previsto no artigo 126 do Código de Processo Civil, cabendo “aplicar as normas legais”).

No caso concreto, há desrespeito da Administração em cumprir a Lei n.º 8.069/90 e a Constituição da República. E é por isso que o Judiciário é provocado a decidir, para fazer cumprir a lei que se alega desrespeitada.

Direito à Saúde

PALOMA tem atuaLmente 08 anos. É portadora de deficiência auditiva severa. A enfermidade compromete seu

desenvolvimento e está devidamente comprovada pelos atestados médicos de fls. 27/34 e 148/157.

Os pais de PALOMA não têm condições econômicas para adquirir o aparelho, pois tem renda familiar por volta de R$

560,00 (fl. 19). O valor do aparelho está em torno de R$ 4.600,00.

Logo, tanto a necessidade no fornecimento do aparelho quanto a impossibilidade da autora de adquiri-lo está devidamente

comprovada.

Aqui, o ESTADO alega impossibilidade financeira para atender à necessidade de PALOMA.

Contudo, nesse particular, a jurisprudência dessa Corte é no sentido de aplicabilidade plena das normas constitucionais

que tratam do direito à saúde. São exemplos os julgados 70011124328 e 70010483238.

A saúde é direito social e, portanto, seu atendimento pelo Poder Público firma o interesse público da ação. Ou seja, não se

trata de direito individual, mas de direito público, social, ainda que o beneficiário seja o indivíduo.

É tamanha a garantia do direito à saúde na ordem constitucional, que o não atendimento a aplicação orçamentária na área

da saúde dá ensejo à intervenção federal ou estadual, respectivamente, consoante letra “e”, inciso VII, do artigo 34, e inciso III, do artigo 35 da

Constituição da República:

E é a própria Constituição da República, no artigo 227, que lança a prioridade devida à criança e ao adolescente, a qual é

esmiuçada pela legislação infraconstitucional, por intermédio a Lei n.º 8.069/90:

Logo, na esteira da Constituição da República vem o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n.º 8.069/90), que deixa

explícita a especificidade e prioridade do direito à saúde em relação à criança e o adolescente.

Nesse passo, cabe ao Estado, na administração dos seus recursos, atender da melhor maneira possível ás necessidades

na área da saúde. Por tal razão, é completamente infundada a alegação de inexistência de previsão orçamentária para o atendimento á

necessidade da menina.

Prequestionamento e Embargos de Declaração

Em processos como o presente temos presenciado situações que se repetem desnecessariamente. Estou me referindo ao

fato de o Estado sempre opor embargos de declaração após a decisão do recurso.

Por isso, para evitar o pedido embargatório com a finalidade única de pré-questionamento, declaro desde logo que a

presente decisão não está negando vigência aos artigos 2º; 5º, II; 100, §§ 2º e 5º; 167, II e VII; e 168, todos da Constituição da República; e

aos artigos 461, 461-A, 730 e 731, todos do CPC.

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ANTE O EXPOSTO, nego provimento a ambos os recursos. DES. CLAUDIR FIDÉLIS FACCENDA (REVISOR) - De acordo.

DES. LUIZ ARI AZAMBUJA RAMOS (PRESIDENTE) - De acordo.

DES. LUIZ ARI AZAMBUJA RAMOS - Presidente - Apelação Cível nº 70016386815, Comarca de Panambi: "NEGARAM PROVIMENTO A

AMBOS OS RECURSOS. UNÂNIME."

Julgador(a) de 1º Grau: JOCELAINE TEIXEIRA Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/consulta/download/exibe_documento.php?ano=2006&codigo=1060914>. Acesso em nov. 2007.

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ANEXO X – ÍNTEGRA DECISÃO AI70018968008 TJ/RS AW Nº 70018968008 2007/Cível

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO MONOCRÁTICA (ART. 55 7, CAPUT DO CPC). DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. SAÚDE PÚBLICA. FORNECIMEN TO DE MEDICAMENTO. ILEGITIMIDADE ATIVA. MATÉRIA NÃO ENFRENTADA PELO JU ÍZO A QUO. NÃO CONHECIMENTO. ILEGITIMIDADE PASSIVA E CHAMAMENTO AO PROCESSO DO ESTADO. PRECLUSÃO. 1. Não havendo manifestação do Magistrado a quo acerca da preliminar de ilegitimidade ativa suscitada na contestação, deveria o agravante ter s e insurgido mediante o recurso cabível (embargos de declaração) no prazo de lei, sendo des cabida sua análise em sede de agravo de instrumento, sob pena de indevida supressão de um g rau de jurisdição. 2. Quanto à invocada ilegitimidade passiva e chamamento do Estado ao pro cesso merece ser confirmada a decisão recorrida, porquanto, o fundamento do agravo de ins trumento nº 70017485442 foi exatamente a ausência de responsabilidade do Município para o fo rnecimento medicamento que não faz parte da gestão básica de atendimento à saúde de sua resp onsabilidade, o que equivale à pretensão de ver reconhecida sua ilegitimidade passiva e a ne cessidade de chamamento do Estado ao processo, ora em apreço. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO EM PARTE E, NESTA, DESPROVIDO.

AGRAVO DE INSTRUMENTO

SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Nº 70018968008

COMARCA DE CANELA

MUNICIPIO DE CANELA

AGRAVANTE

ORACINA ROSA DOS SANTOS AGRAVADO

D E C I S Ã O M O N O C R Á T I C A

Vistos.

1. Trata-se de agravo de instrumento com pedido de efeito suspensivo interposto pelo MUNICÍPIO DE CANELA nos autos

da ação de rito ordinário com vistas ao fornecimento de medicamento que lhe move ORACINA ROSA DOS SANTOS , em face da decisão de

fl. 83 que rejeitou as preliminares de ilegitimidade passiva e chamamento ao processo do Estado do Rio Grande do Sul, por já ter havido

decisão do Tribunal de Justiça a respeito.

Alegou o agravante, que o julgamento referido pelo Juízo a quo diz respeito ao agravo de instrumento interposto contra a

decisão que deferiu a antecipação de tutela, que nada tem a ver com preliminares suscitadas posteriormente na contestação relativas à

ilegitimidade ativa, passiva e necessidade de chamamento do Estado ao processo. Neste sentido, sustentou a nulidade da decisão recorrida

por não ter se manifestado quanto à preliminar de ilegitimidade ativa, a qual entende restar caracterizada nos autos, tendo em vista que a

agravada instruiu a inicial com receita prescrita por médico particular, contrariamente ao que dispõe o artigo 4º da Lei nº 8.080/90. Asseverou,

em razão do que dispõe o artigo 196 da CF, art. 77do CPC e a Lei nº 8.080/90 (art. 15), que o Estado também deve figurar no pólo passivo da

demanda, porque é co-responsável solidário do Município na prestação dos serviços de proteção à saúde, principalmente quando o

medicamento requerido for complexo e não está presente na lista de medicamentos de competência do Município. Ressaltou que determinar

ao agravante o fornecimento da medicação de que necessita a agravada, viola o princípio da legalidade e onera as finanças municipais.

Postulou o provimento do recurso.

É o relatório.

2. Primeiramente, não merece ser conhecida a irresignação relativa à ilegitimidade ativa, porquanto, não havendo

manifestação do Magistrado a quo a respeito, deveria o agravante ter se utilizado do recurso cabível (embargos de declaração) no prazo de lei,

sendo descabida sua análise em sede de agravo de instrumento, sob pena de indevida supressão de um grau de jurisdição.

Quanto à invocada ilegitimidade passiva e chamamento do Estado ao processo merece ser confirmada a decisão recorrida,

porquanto, embora o agravo de instrumento nº 70017485442 tenha sido interposto contra decisão que indeferiu a antecipação de tutela

pleiteada para determinar ao agravante o fornecimento do medicamento Manivasc 10mg, o fundamento daquela irresignação foi exatamente a

ausência de responsabilidade do Município para o fornecimento medicamento que não faz parte da gestão básica de atendimento à saúde de

sua responsabilidade, o que equivale à pretensão de ver reconhecida sua ilegitimidade passiva, ora em apreço. Desta forma, com o julgamento

do agravo de instrumento nº 70017485442 operou-se a preclusão a respeito de tal matéria e, inclusive, sobre o pedido de chamamento ao

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

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processo do Estado, porque aquela decisão foi suficientemente clara ao referir que “a responsabilidade para cuidar da saúde e da assistência

pública é compartilhada entre a União, os Estados e os Municípios (CF, art. 23, II), sendo o sistema de saúde, instituído pelo SUS,

administrado sob a forma de co-gestão, portanto, nada impede que o cidadão exija o cumprimento da obrigação de qualquer dos entes

públicos. Ademais, a responsabilidade pela saúde pública, imposta pela Constituição Federal, é uma obrigação do Poder Público, qualquer que

seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira (AgRg no RE 259.508-0-RS, 2ª Turma, STF, RT

788/194), assim, no caso, tanto cabe ao Estado como ao Município, indistintamente o fornecimento do medicamento solicitado, não se fazendo

necessário acionar ou chamar ao processo os demais entes, bastando que se acione um deles”.

Diante do exposto, na forma do artigo 557, caput, do CPC, conheço em parte do recurso e, nesta, nego provimento.

Porto Alegre, 21 de março de 2007.

DES. ARNO WERLANG, Relator.

Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/consulta/download/exibe_documento.php?ano=2007&codigo=274699>. Acesso em: nov. 2007.

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ANEXO Y – ÍNTEGRA DECISÃO AC70020870960 TJ/RS RGL Nº 70020870960 2007/Cível

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO ( DIREITO À SAÚDE). AÇÃO ORDINÁRIA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. ILEGITIMIDADE PASSIVA AFASTADA. 1. A promoção da saúde constitui-se em dever do Estado, em todas as suas esferas de Poder, caracterizando-se a solidariedade entre União, Estados e Municípios. Exegese dos arts. 5º, XXXV e 196, ambos da Constituição Federal. Precedentes desta Corte. 2. Comprovadas a enfermidade e a necessidade do tratamento médico, bem como a insuficiência financeira do postulante a arcar com tal despesa, sem prejuízo do próprio sustento, é de ser acolhida a pretensão.

PRELIMINAR REJEITADA. NEGADO PROVIMENTO À APELAÇÃO. SENTENÇA CONFIRMADA EM REEXAME NECESSÁRIO.

APELAÇÃO REEXAME NECESSÁRIO

TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

Nº 70020870960

COMARCA DE CAXIAS DO SUL

MUNICIPIO DE CAXIAS DO SUL

APELANTE

ALEXANDRO JUNIOR BOTONE

APELADO

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Magistrados integrantes da Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em

rejeitar as preliminares, negar provimento à apelação e confirmar a sentença em reexame necessário.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores DES. PAULO DE TARSO VIEIRA

SANSEVERINO (PRESIDENTE) E DR. MÁRIO CRESPO BRUM .

Porto Alegre, 11 de outubro de 2007.

DES. ROGÉRIO GESTA LEAL, Relator.

R E L A T Ó R I O

DES. ROGÉRIO GESTA LEAL (RELATOR)

ROGÉRIO GESTA LEAL (RELATOR)

Trata-se de Reexame Necessário e Apelação Cível interposta pelo MUNICÍPIO DE CAXIAS DO SUL , em face da sentença

que julgou procedente a ação ordinária manejada por ALEXANDRE JUNIOR BOTONE, em que o demandante postulava a condenação do

requerido ao fornecimento dos medicamentos INSULINA GLARGINA (LANTUS) e NOVORAPID, bem como das canetas e agulhas para a

aplicação do fármaco, de utilização de forma contínua e permanente. Por fim, condenou o réu ao pagamento das custas processuais e

honorários advocatícios arbitrados em R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais).

Em suas razões de apelação (fls. 141/153), o Município de Caxias do Sul argüiu a sua ilegitimidade passiva para figurar no

feito, referindo que o medicamento pleiteado é fornecido pelo Estado. No mérito, destacou que o Município possui prioridades que se

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

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constituem na assistência de um numero expressivo de pessoas e não apenas de casos isolados que consomem a verba que seria destinada

para toda comunidade.

Foram apresentadas as contra razões (fls. 156/161).

Subiram os autos.

Em Parecer Ministerial (fls. 167/181), o Procurador de Justiça, Dr. Luiz Fernando Calil de Freitas, opinou pelo

desprovimento da apelação.

É o relatório.

V O T O S

DES. ROGÉRIO GESTA LEAL (RELATOR)

Avaliados, preliminarmente, os pressupostos processuais subjetivos e objetivos da pretensão deduzida pelo apelante,

tenho-os como regularmente constituídos, bem como os atinentes à constituição regular do feito até aqui, conhecendo do recurso em termos

de propriedade e tempestividade.

I. Da legitimidade passiva:

Em primeiro plano, não há que se falar em ilegitimidade passiva ad causam do Município de Caxias do Sul.

Consoante determina o artigo 196, da Constituição Federal, a saúde é direito de todos e dever do Estado, em todas as

esferas de governo, cumprindo igualmente à União, aos Estados e aos Municípios, de forma solidária, a elaboração de políticas públicas

voltadas a sua promoção e preservação.

Desta forma a jurisprudência desta Corte:

DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO À PACIENTE IDOSO QUE PADECE DE SEQÜELA DE AVC ISQUÊMICO E TRAQUEOSTORNIA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO MUNICÍPIO DE PASSO FUNDO E DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. FALTA DE INTERSSE DE AGIR ARGÜIDA PELO MUNICÍPIO AFASTADA. DESACOLHIMENTO DAS PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE PASSIVA SUSCITADAS PELOS ENTES PÚBLICOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. FADEP. IMPOSSIBILIDADE QUANTO AO ESTADO. 1. Direito à saúde que detém proteção especial na Cart a Política. Responsabilidade solidária de todos os entes gestores do SUS em nível nacional, regional e munic ipal. Pretensão que pode ser deduzida contra qualqu er deles. Fontes de custeio e questões orçamentárias e fiscai s que não devem embaraçar o direito à vida e saúde. (...) NEGARAM PROVIMENTO ÀS APELAÇÕES DO AUTOR E DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL E DERAM PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO MUNICÍPIO (Apelação Cível n. 70011615390, 3ª Câmara Cível, Rel. Des. Nelson Antonio Monteiro Pacheco, j. 04.08.2005).

De igual sorte: Apelação Cível n. 70012292587, 3ª Câmara Cível, Rel. Des. Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, j.

25.08.2005; Apelação e Reexame Necessário n. 70011852548, 22ª Câmara Cível, Rel. Desa. Rejane Maria Dias de Castro Bins, j. 25.08.2005;

e Agravo de Instrumento n. 70012092680, 4ª Câmara Cível, Rel. Des. João Carlos Branco Cardoso, j. 24.08.2005.

A Constituição Federal, em seus artigos 6º e 196, dispõe:

“Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.” “Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.”

O conceito a saúde é amplo, assim considerados, desde o atendimento médico, hospitalar e cirúrgico, até o fornecimento

de medicamentos ou similares, sendo indispensável, no entanto, que sejam necessários à manutenção ou recuperação da saúde e vida do

postulante.

De outra parte, no que diz respeito às alegações do apelante no sentido da necessidade de denunciação da lide do Estado

do Rio Grande do Sul, tenho que melhor sorte não lhe socorre.

Veja-se que mesmo sendo incidente o artigo 77, III, do CPC à espécie, entendo que tal proceder neste momento

processual somente retardaria a solução da lide, bem como o alcance do bem pretendido, qual seja, a saúde da postulante.

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Ademais, conforme já referido acima, a responsabilidade entre os entes públicos é solidária, podendo o credor escolher

contra quem demandar, garantido, contudo, eventual direito de regresso contra os demais entes devedores solidários.

Nesse sentido há precedentes desta Corte de Justiça:

“APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO. CONSTITUCIONAL. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. ESTADO E MUNICÍPIO. ASMA E BRONQUITE OBSTRUTIVA CRÔNICA. Preliminar de Carência de Ação por Falta de Interesse de Agir: Ausência de interesse de agir não configurado. Desnecessidade do esgotamento das vias administrativas como condição para propositura da ação judicial. O direito constitucional de ação não possui qualquer restrição desta natureza (art. 5º, XXXV, da CF). Afastada a preliminar de carência de ação por falta de interesse de agir. Denunciação da Lide à União: Tendo havido o devido enfrentamento do pedido de chamamento ao processo e restando corretamente afastado pela sentença, não há nulidade a ser reconhecida. Prevalente o interesse de uma rápida solução da lide, ante os direito envolvidos na demanda, o que não ocorreria acaso acatado o pedido de chamamento ao processo. Correto o comando sentencial. Fornecimento de Medicamentos e Legitimidade do Estado e do Município: O fornecimento gratuito de medicamentos constitui responsabilidade solidária do Estado e do Município derivada do artigo 196 da Constituição Federal. Precedentes do STJ e desta Câmara. Honorários Advocatícios: Arbitramento em honorários advocatícios a serem suportados pelo Estado e pelo Município em conformidade com o Ato nº 14/03 do Presidente do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e com a Tabela de Honorários dos Defensores Dativos em atuação no âmbito da Justiça Estadual, que se mostra dúplice na sentença, devendo ser excluída uma das condenações e esclarecido o valor que cabe a cada réu arcar. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO PARA ESCLARECER ACERCA DA CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA, NO MAIS, EM REEXAME NECESSÁRIO. (Apelação e Reexame Necessário Nº 70010311553, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, Julgado em 23/12/2004) “ grifei

“APELAÇÃO CÍVEL. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. COMPETÊNCIA CONCORRENTE DO ESTADO E DO MUNICÍPIO. ART. 196 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL C/C O ART. 241 DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL. CHAMAMENTO AO PROCESSO. DESCABIMENTO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS AO DEFENSOR PÚBLICO. 1. O fornecimento gratuito de medicamentos e demais serviços de saúde constitui responsabilidade solidária da União, do Estado e do Município, derivada do artigo 196 da Constituição Federal c/c o art. 241 da Constituição Estadual, permitindo ao cidadão exigir, em conjunto ou separadamente, o cumprimento da obrigação de qualquer dos entes públicos. Desnecessário o chamamento ao processo da União e do Município de Santa Maria. É dever do Estado fornecer medicamentos a pessoas carentes, demonstrados os pressupostos constantes da Lei n.º 9.908/93. 2. O defensor público organizado em quadro de carreira, exerce exclusivamente a advocacia vinculada à função, nos termos do art. 29 da Lei n.º 8.906/94. Sendo já remunerado pela Fazenda Pública por esses serviços, não pode exigir os honorários da sucumbência desta mesma Fazenda, sob pena de se constituir em duplo pagamento. Inaplicável, no caso, o princípio da sucumbência estatuído no art. 20 do CPC. Apelação parcialmente provida. (Apelação Cível Nº 70008762601, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Aurélio Heinz, Julgado em 18/08/2004) “ grifei

Ademais, entendo que se faz necessário o exame a respeito do dever dos entes públicos em fornecer os meios

necessários para manutenção da saúde de seus administrados, razão pela qual passo a tecer considerações sobre o tema.

Assim, é de ser rejeitada as preliminares.

II. Do fornecimento de medicamentos.

Em primeiro plano, cumpre destacar que o tema da saúde pública constitucionalmente vem definido como direito de todos

e dever do Estado (aqui entendido em todas as suas dimensões federativas, ou seja, União Federal, Estados Membros, Municípios, etc.) – art.

196 –, devendo ser garantida mediante políticas públicas sociais e econômicas comprometidas à redução do risco de doença e de outros

agravos.

O que está em debate aqui, pelos termos do prisma constitucional, é o que posso chamar de mínimo existencial à dignidade da vida

humana: a saúde. Enquanto princípio fundante de todo o sistema jurídico – a iniciar pelo constitucional -, tenho que a vida humana digna espelha e se vincula

ao ideário político, social e jurídico predominante no país, ao mesmo tempo em que, na condição de princípio fundamental, em face de sua característica de

aderência, ele opera sobre os comportamentos estatais ou particulares de forma cogente e necessária. Por tais razões tenho sustentado que: (a) todas as normas

do sistema jurídico devem ser interpretadas no sentido mais concordante com este princípio; (b) as normas de direito ordinárias desconformes à constituição e

seus princípios fundacionais (dentre os quais destaco o sob comento), não são válidas.478

478 Neste sentido ver o texto de HESSE, Konrad. A força normativa da constituição. Porto Alegre: Fabris, 1991, pág. 39.

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Justifica-se tal postura em face de que a saúde como condição de possibilidade da dignidade da pessoa humana, em verdade, passa a

constituir o que chamo de indicador constitucional parametrizante do mínimo existencial479, porque se afigura como uma das condições indispensáveis à

construção de uma Sociedade livre, justa e solidária; à garantia o desenvolvimento nacional; à erradicação da pobreza e da marginalização, bem como à

redução das desigualdades sociais e regionais; à promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de

discriminação.

Na verdade, estes postulados estão dispersos ao longo de todo o Texto Político, consubstanciando-se nos direitos e garantias

fundamentais, individuais e coletivos, nos direitos sociais, nos direitos à educação, à saúde, à previdência, etc. Por sua vez, os Poderes Estatais e a própria

Sociedade Civil (através da cidadania ou mesmo de representações institucionais dela) estão vinculados a estes indicadores norteadores da República, eis que

eles vinculam todos os atos praticados pelos agentes públicos e pela comunidade, no sentido de vê-los comprometidos efetivamente com a implementação

daquelas garantias.

Se isto é verdade, quero sustentar que qualquer política pública no Brasil tem como função nuclear a de servir como esfera de

intermediação entre o sistema jurídico constitucional (e infraconstitucional) e o mundo da vida Republicano, Democrático e Social que se pretende instituir no

país. Em outras palavras, é através de ações estatais absolutamente vinculadas/comprometidas com os indicadores parametrizantes de mínimo existencial

previamente delimitados, que vai se tentar diminuir a tensão entre validade e faticidade que envolve o Estado e a Sociedade Constitucional e o Estado e a

Sociedade Real no Brasil.480

Isto me leva a crer na existência daquilo que vou chamar de políticas públicas constitucionais vinculantes, aqui entendidas como aquelas

ações que o Texto Político atribui aos Poderes Estatais como efetivadoras de direitos e garantias fundamentais, e todas as decorrentes delas, haja vista os níveis

compartidos de responsabilidades entre as entidades federativas brasileiras e a cidadania envolvendo a matéria. Considerando ainda crer, no particular, não

existirem normas constitucionais despossuidas de concreção no sistema jurídico pátrio481, resulta claro que a responsabilidade de que estamos falando aqui é,

diferenciadamente, pró-ativa dos poderes instituídos, merecendo imediata implementação.

No caso concreto, é a vida humana que está periclitando em termos de seu mínimo existencial (mantença da saúde),

razão pela qual se impõe medidas de eficácia objetiva a resguardar e promover tal interesse público indisponível, tal como a de determinar que

o Estado preste imediatamente a pretensão deduzida, quando for o caso efetivamente.

De outro lado, as ações públicas voltadas à densificação material deste direito de todos integram um sistema único em

todo o país (art.198, CF/88), financiado com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos

Municípios, bem como de outras fontes.

Esta Corte tem reconhecido, de forma reiterada, o dever do Estado, independente da esfera de poder, em garantir ao

cidadão o direito à saúde, insculpido no artigo 196, da Constituição Federal.

No âmbito do dever público para em alcançar os meios necessários a preservação da saúde, o que temos de ter em conta

são os critérios utilizados para determinar quem efetivamente necessita do auxílio do Estado para prover suas demandas a este título e quem

não precisa, o que de plano se sabe não existir ao menos em numerus clausulus, porque impossível a matematização desta questão em face

de sua natureza complexa e mutável. Assim é que cada caso submetido ao Estado é merecedor de uma apreciação e ponderação em face de,

no mínimo, duas variáveis necessárias: (a) a variável normativa-constitucional e infraconstitucional, enquanto direito fundamental assegurado à

sociedade brasileira; (b) a variável orçamentária, em face da previsão do gasto público para tanto.

Estas duas variáveis mínimas elencadas não são limitativas umas das outras, mas seqüenciais, eis que a primeira é

condicionante da segunda, e esta, condição não exclusiva (mas importante) da efetividade da medida. Daí porque aferir, primeiro, a natureza

axiológico-constitucional do mandamento normativo sob comento, tendo ciência que ele se dirige à toda a comunidade, e não uma parcela dela

(os mais doentes, ou somente aqueles que possuem enfermidades letais, ou somente os que necessitam de farmacológicos curativos, etc).

Significa dizer que, quando se fala em saúde pública e em mecanismos e instrumentos de atendê-la, mister é que se

visualize a demanda social e universal existente, não somente a contingencial submetida à aferição administrativa ou jurisdicional, isto porque,

atendendo-se somente aqueles que acorrem de pronto ao Poder Público (Executivo ou Judicial), pode-se correr o risco de esvaziar a

possibilidade de atendimento de todos aqueles que ainda não tomaram a iniciativa de procurar o socorro público, por absoluta falta de recursos

para fazê-lo.

479 Desenvolvo este argumento no livro LEAL, Rogério Gesta. Estado, Sociedade e Administração Pública: novos paradigmas. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005. 480 Há uma reflexão bastante interessante sobre as incoerências da operacionalidade do sistema capitalista, notadamente em economias demasiadamente dependentes, em UNGER, Roberto Mangabeira. Democracy Realized. New York: Verso. 1998. 481 Direção em que caminha a melhor doutrina constitucional do país, ex vi o percuciente trabalho de STRECK, Lênio Luis. Jurisdição Constitucional. Rio de Janeiro: Forense, 2004.

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Se a Administração Pública não construiu critérios razoáveis e ponderados para escalonar minimamente o atendimento

cada vez mais massivo de perquirições envolvendo o oferecimento de medicamentos, internações hospitalares, tratamentos médico-

ambulatorias e cirurgias, à população carente, então isto deverá ser feito na esfera da judicialização do debate, pois, caso contrário, a

satisfação de um problema imediato poderá inviabilizar centenas de outros tão importantes e legítimos quanto este, haja vista que os recursos

financeiros e materiais para tanto, é inexorável, são finitos.

Para tal raciocínio, estou a utilizar aqui o que Konrad Hesse chama de princípio da concordância prática ou da

harmonização, o qual impõe ao intérprete do sistema jurídico que os bens constitucionalmente protegidos, em caso de conflito ou concorrência,

devem ser tratados de maneira que a afirmação de um não implique o sacrifício do outro, o que só se alcança na aplicação ou na prática do

texto.482 Tal princípio parte exatamente da noção de que não há diferença hierárquica ou de valor entre os bens constitucionais; destarte, o

resultado do ato interpretativo não pode ser o sacrifício total de uns em detrimento dos outros. Deve-se, na interpretação, procurar uma

harmonização ou concordância prática entre os bens constitucionalmente tutelados.

Numa perspectiva integrada do sistema jurídico, estou a dizer, ainda com Hesse, que na resolução dos problemas jurídico-

constitucionais, deve-se dar prioridade às interpretações ou pontos de vista que favoreçam a integração política e social e possibilitem o

reforço da unidade política, porquanto essas são as finalidades precípuas da Constituição.

A partir de tais considerações é que a matéria vertente precisa ser enfrentada, ponderando os bens jurídicos que estão em

jogo e que demandam abordagem à solução do caso: o bem jurídico vida da parte-autora, envolvendo a moléstia de que está acoimada,

correlato ao dever do Estado para com a saúde pública; o bem jurídico saúde pública de toda a Sociedade para com quem este mesmo Estado

possui o dever de tutela.

Há que se estabelecer, aqui, um juízo de ponderação destes bens, valores e interesses, para se chegar a alguma

conclusão. Para tanto, pretendo me valer de critérios constitucionalmente consagrados para a delimitação dos índices de fundamentalidade

desses direitos, a saber, os que densificam o princípio da proporcionalidade dentre eles.

Na dicção de Robert Alexy, o princípio da proporcionalidade desdobra-se em três aspectos fundamentais: a) adequação; b)

necessidade (ou exigibilidade); c) proporcionalidade em sentido estrito. A adequação significa que o intérprete deve identificar o meio

adequado para a consecução dos objetivos pretendidos. A necessidade (ou exigibilidade) significa que o meio escolhido não deve exceder os

limites indispensáveis à conservação dos fins desejados. A proporcionalidade em sentido estrito significa que o meio escolhido, no caso

específico, deve se mostrar como o mais vantajoso para a promoção do conjunto de valores, bens e interesses em jogo483.

Quanto à necessidade dos fármacos postulados, esta restou comprovada pelos documentos de fls. 18 e 47, tendo sido

provada, de igual sorte, a impossibilidade do autor em adquirir os referidos medicamentos, sem prejuízo do próprio sustento (fl. 09), o que se

afigura suficiente para demonstrar a necessidade do tratamento, pois o princípio constitucional insculpido no artigo 196, busca, na verdade, a

preservação da saúde, e não determinar a intervenção estatal somente em casos terminais.

Na espécie, penso que cabia ao ente público demonstrar que o tratamento não seria necessário, ou então apresentar outro

meio mais adequado para se conseguir atender o problema apresentado pelo demandante, em face da necessidade de se perquirir outras

maneiras e fórmulas de atendimento da demanda, porque milhares de postulações estão acorrendo aos cofres públicos neste momento.

Assim, comprovada a necessidade do tratamento médico, somada à falta de recursos do autor em custeá-lo sem prejuízo

do próprio sustento, o que, registre-se, não foi afastado pelos demandados, cumpre ao Judiciário a acolhida da pretensão.

III. Do dispositivo:

Pelo exposto, voto para rejeitar a preliminar argüida e negar provimento ao apelo do Município de Caxias do Sul,

confirmando a sentença em reexame necessário.

É o voto.

Des. Rogério Gesta Leal

DR. MÁRIO CRESPO BRUM (REVISOR) - De acordo.

482 HESSE, Konrad. A Força Normativa da Constituição. Porto Alegre: Fabris, 2001, p.119. Fala o autor, aqui e na verdade, da tese de que, na interpretação constitucional, deve-se dar primazia às soluções ou pontos de vista que, levando em conta os limites e pressupostos do texto constitucional, possibilitem a atualização de suas normas, garantindo-lhes eficácia e permanência constante. 483 ALEXY, Robert. Teoría de los Derechos Fundamentales. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2000, p.126.

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DES. PAULO DE TARSO VIEIRA SANSEVERINO (PRESIDENTE) - De acordo.

DES. PAULO DE TARSO VIEIRA SANSEVERINO - Presidente - Apelação Reexame Necessário nº 70020870960, Comarca de Caxias do Sul:

"REJEITARAM AS PRELIMINARES, NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO E CONFIRMARAM A SENTENÇA EM REEXAME

NECESSÁRIO. UNÂNIME."

Julgador(a) de 1º Grau: CAMILA LUCE MADEIRA Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/consulta/download/exibe_documento.php?ano=2007&codigo=1297449>. Acesso em: nov. 2007.

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ANEXO Z – ÍNTEGRA DECISÃO AI 70020884086 TJ/RS RGL Nº 70020884086 2007/Cível

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFI CADO (DIREITO À SAÚDE). AÇÃO ORDINÁRIA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. 1. A promoção da saúde constitui-se em dever do Estado, em todas as suas esferas de Poder, caracterizando-se a solidariedade entre União, Estados e Municípios. Exegese do artigo 196, da Constituição Federal. Precedentes desta Corte. 2. Inexistindo oportunidade prévia para que fosse demonstrado que a família da paciente tem capacidade econômica para custear o tratamento médico, é de ser mantida, no caso concreto, a ordem judicial para que o Estado forneça os remédios pleiteados pela demandante-agravada. 3. Comprovadas a enfermidade e a necessidade dos medicamentos, bem como a insuficiência financeira da postulante para arcar com tal despesa, sem prejuízo do próprio sustento, é de ser acolhida a pretensão.

AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. AGRAVO DE INSTRUMENTO

TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

Nº 70020884086

COMARCA DE NOVO HAMBURGO

MUNICIPIO DE NOVO HAMBURGO

AGRAVANTE

VALERIA RUBIANA DOS SANTOS

AGRAVADO

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

INTERESSADO

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Magistrados integrantes da Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar

provimento ao agravo de instrumento.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores DES. PAULO DE TARSO VIEIRA

SANSEVERINO (PRESIDENTE) E DR. MÁRIO CRESPO BRUM .

Porto Alegre, 25 de outubro de 2007.

DES. ROGÉRIO GESTA LEAL, Relator.

R E L A T Ó R I O

DES. ROGÉRIO GESTA LEAL (RELATOR)

Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo Município de Novo Hamburgo em face de decisão que concedeu a

antecipação de tutela na ação ordinária ajuizada por Valéria Rubiana dos Santos contra o ora agravante e o Município de Novo Hamburgo, em

que o demandante pretende que os entes públicos forneçam-lhe a alimentação especial e demais produtos de que necessita, exarada nos

seguintes termos:

“Vistos.

(...)

Nessa senda, pois, defiro a liminar ao efeito de determinar que os requeridos concedam gratuitamente à autora os itens descritos no atestado médico da fl. 11, dos quais dependem a vida e a saúde da mesma, devendo o fornecimento se dar

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

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em 72 horas, na consideração de que a Constituição Federal assegura em concreto o direito ora postulado (art. 194 e 195).

(...)

Juiz de Direito” (fl. 61).

Em suas razões (fls. 02-36), o agravante defendeu, em síntese: (a) a ilegitimidade passiva do Município no caso concreto,

visto cumprir ao Estado, de modo exclusivo o fornecimento dos produtos pleiteados pela demandante; (b) o dever da família de custear o

tratamento médico da autora-agravada; (c) que o fornecimento dos produtos pleiteados constitui responsabilidade exclusiva do Estado; (d) a

ausência de previsão orçamentária para realização da despesa; e (e) a irregularidade do direcionamento de recursos públicos para uma

situação particular. Invocou o princípio da reserva do possível, e pediu a concessão de efeito suspensivo e o provimento do recurso. Juntou

documentos (fls. 26-114).

O efeito suspensivo foi indeferido (fls. 117-122,verso).

Foram apresentadas contra-razões (fls. 127-131).

O Sr. Procurador de Justiça, Dr. Antonio Augusto Vergara Cerqueira, lançou parecer pelo desprovimento do recurso (fls.

133-138).

É o relatório.

V O T O S

DES. ROGÉRIO GESTA LEAL (RELATOR)

Avaliados, preliminarmente, os pressupostos processuais subjetivos e objetivos da pretensão deduzida pelo autor, tenho-os como

regularmente constituídos, bem como os atinentes à constituição regular do feito até aqui, conhecendo do recurso em termos de propriedade e tempestividade.

A Sra. Valéria Rubiana dos Santos (absolutamente incapaz, representada por seus pais Doracy David dos Santos e Artidor

dos Santos), narrou ser portadora de patologias inscritas no CID sob os números G 04.2 e G 80.9, com seqüelas motoras e cognitivas,

tratando-se de pessoa totalmente inválida, não possuindo condições econômicas para aquisição dos seguintes produtos e medicamentos,

prescritos por seu médico:

- Neston (lata grande – 03 unidades por mês);

- Nescau (lata – 02 unidades por mês);

- Leite Bom Gosto (30 litros por mês);

- Ritrovil 2 mg (60 comprimidos por mês);

- Tamarine (1 frasco por mês);

- Depakene 500mg (30 comprimidos por mês);

- Marvitin líquido (01 frasco por mês);

- Fraldas descartáveis (tamanho M – 180 unidades por mês).

Não possuindo condições financeiras de arcar com os custos de aquisição, ajuizou ação ordinária pretendendo o

fornecimento dos referidos produtos pelos entes públicos, tendo sido deferida a antecipação de tutela, objeto do presente instrumento.

Destaco que estou revisando meu posicionamento a respeito do dever absoluto e exclusivo do Estado arcar com o

fornecimento de medicamentos à população, pelas razões que passo a alinhar.

Reiteradamente tenho dito que o tema da saúde pública constitucionalmente vem definido como direito de todos e dever do

Estado (aqui entendido em todas as suas dimensões federativas, ou seja, União Federal, Estados Membros, Municípios, etc.) – art.196 –,

devendo ser garantida mediante políticas públicas sociais e econômicas comprometidas à redução do risco de enfermidades e de outros

agravos484.

484 LEAL, Rogério Gesta. A Efetivação do Direito à Saúde – por uma jurisdição Serafim: limites e possibilidades. In Direitos Sociais e Políticas Públicas:desafios contemporâneos. Vol.6. LEAL, Rogério Gesta & REIS, Jorge Renato dos. Santa Cruz do Sul: Edunisc, 2006, p.1525.

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O que está em debate aqui, pelos termos do prisma constitucional, é o que posso chamar de uma das dimensões do

mínimo existencial à dignidade da vida humana: a saúde. Enquanto princípio fundante de todo o sistema jurídico – a iniciar pelo constitucional -

, tenho que a vida humana digna espelha e se vincula ao ideário político, social e jurídico predominante no país, ao mesmo tempo em que, na

condição de princípio fundamental, em face de sua característica de aderência, ele opera sobre os comportamentos estatais ou particulares de

forma cogente e necessária. Por tais razões tenho sustentado que: (a) todas as normas do sistema jurídico devem ser interpretadas no sentido

mais concordante com este princípio; (b) as normas de direito ordinárias desconformes à constituição e seus princípios fundacionais (dentre os

quais destaco o sob comento), não são válidas.485

Justifica-se tal postura em face de que a saúde como condição de possibilidade da dignidade da pessoa humana, em

verdade, passa a constituir o que chamo de indicador constitucional parametrizante do mínimo existencial486, porque se afigura como uma das

condições indispensáveis à construção de uma Sociedade livre, justa e solidária; à garantia do desenvolvimento nacional; à erradicação da

pobreza e da marginalização, bem como à redução das desigualdades sociais e regionais; à promoção do bem de todos, sem preconceitos de

origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Na verdade, estes postulados estão dispersos ao longo de todo o Texto Político, consubstanciando-se nos direitos e

garantias fundamentais, individuais e coletivos, nos direitos sociais, nos direitos à educação, à saúde, à previdência, etc. Por sua vez, os

Poderes Estatais e a própria Sociedade Civil (através da cidadania ou mesmo de representações institucionais dela) estão vinculados a estes

indicadores norteadores da República, eis que eles vinculam todos os atos praticados pelos agentes públicos e pela comunidade, no sentido

de vê-los comprometidos efetivamente com a implementação daquelas garantias.

Se isto é verdade, quero sustentar que qualquer política pública no Brasil tem como função nuclear a de servir como esfera

de intermediação entre o sistema jurídico constitucional (e infraconstitucional) e o mundo da vida Republicano, Democrático e Social que se

pretende instituir no país. Em outras palavras, é através de ações estatais absolutamente vinculadas/comprometidas com os indicadores

parametrizantes de mínimo existencial previamente delimitados, que vai se tentar diminuir a tensão entre validade e faticidade que envolve o

Estado e a Sociedade Constitucional e o Estado e a Sociedade Real no Brasil.487

Isto me leva a crer na existência daquilo que vou chamar de políticas públicas constitucionais vinculantes, aqui entendidas

como aquelas ações que o Texto Político atribui aos Poderes Estatais e à comunidade como um todo como efetivadoras de direitos e garantias

fundamentais, e todas as decorrentes delas, haja vista os níveis compartidos de responsabilidades entre as entidades federativas brasileiras e

a cidadania envolvendo a matéria. Considerando ainda crer, no particular, não existirem normas constitucionais despossuidas de concreção no

sistema jurídico pátrio488, resulta claro que a responsabilidade de que estamos falando aqui é, diferenciadamente, pró-ativa dos que têm tal

responsabilidade, merecendo imediata implementação.

De outro lado, as ações públicas voltadas à densificação material deste direito de todos (saúde) integram um sistema único

em todo o país (art.198, CF/88), financiado com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos

Municípios, bem como de outras fontes.

No âmbito do dever público para alcançar os meios necessários à preservação da saúde, o que temos de ter em conta, a

uma, são os critérios utilizados para determinar quem efetivamente necessita do auxílio do Estado para prover suas demandas a este título e

quem não precisa, o que de plano se sabe não existir ao menos em numerus clausus, porque impossível a matematização desta questão em

face de sua natureza complexa e mutável. A duas, quem é responsável por tal mister. Assim é que cada caso envolvendo prestação de saúde

pública submetido ao Estado é merecedor de uma apreciação e ponderação em face de, no mínimo, duas variáveis necessárias: (a) a variável

485 Neste sentido ver o texto de HESSE, Konrad. A força normativa da constituição. Porto Alegre: Fabris, 1991, pág.39. 486 Desenvolvo este argumento no livro LEAL, Rogério Gesta. Estado, Sociedade e Administração Pública: novos paradigmas. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005. 487 Há uma reflexão bastante interessante sobre as incoerências da operacionalidade do sistema capitalista, notadamente em economias demasiadamente dependentes, em UNGER, Roberto Mangabeira. Democracy Realized. New York: Verso, 1998. 488 Direção em que caminha a melhor doutrina constitucional do país, ex vi o percuciente trabalho de STRECK, Lênio Luis. Jurisdição Constitucional. Rio de Janeiro: Forense, 2004.

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normativa-constitucional e infraconstitucional, enquanto direito fundamental assegurado à sociedade brasileira; (b) a variável responsabilidade

institucional e familiar dispostas na estrutura normativa constitucional e infraconstitucional brasileira.

Daí porque aferir, primeiro, a natureza axiológico-constitucional do mandamento normativo sob comento, tendo ciência que

ele se dirige a toda a comunidade, e não uma parcela dela (os mais doentes, ou somente aqueles que possuem enfermidades letais, ou

somente os que necessitam de farmacológicos curativos, etc.). Em segundo, de que forma o sistema jurídico atribui responsabilidades

envolvendo esta matéria.

Significa dizer que, quando se fala em saúde pública e em mecanismos e instrumentos de atendê-la, mister é que se

visualize a demanda social e universal existente, não somente a contingencial submetida à aferição administrativa ou jurisdicional, isto porque,

atendendo-se somente aqueles que acorrem de pronto ao Poder Público (Executivo ou Judicial), pode-se correr o risco de esvaziar a

possibilidade de atendimento de todos aqueles que ainda não tomaram a iniciativa de procurar o socorro público, por absoluta falta de recursos

para fazê-lo.489

Se a Administração Pública não construiu critérios razoáveis e ponderados para escalonar minimamente o atendimento

cada vez mais massivo de perquirições envolvendo o oferecimento de medicamentos, internações hospitalares, tratamentos médico-

ambulatorias e cirurgias à população carente, então isto deverá ser feito na esfera da judicialização do debate, ao menos naqueles casos em

que a periclitação da vida é tal que se impõe esta intervenção, pois, caso contrário, a satisfação de um problema imediato poderá inviabilizar

centenas de outros tão importantes e legítimos quanto este, haja vista que os recursos financeiros e materiais para tanto, é inexorável, são

finitos – e ainda sem falar dos demais responsáveis por tal mister.

Para tal raciocínio, estou a utilizar aqui o que Konrad Hesse chama de princípio da concordância prática ou da

harmonização, o qual impõe ao intérprete do sistema jurídico que os bens constitucionalmente protegidos, em caso de conflito ou concorrência,

devem ser tratados de maneira que a afirmação de um não implique o sacrifício do outro, o que só se alcança na aplicação ou na prática do

texto.490 Tal princípio parte exatamente da noção de que não há diferença hierárquica ou de valor entre os bens constitucionais; destarte, o

resultado do ato interpretativo não pode ser o sacrifício total de uns em detrimento dos outros. Deve-se, na interpretação, procurar uma

harmonização ou concordância prática entre os bens constitucionalmente tutelados.

Numa perspectiva integrada do sistema jurídico, estou a dizer, ainda com Hesse, que na resolução dos problemas jurídico-

constitucionais, deve-se dar prioridade às interpretações ou pontos de vista que favoreçam a integração política e social e possibilitem o

reforço da unidade política, porquanto essas são as finalidades precípuas da Constituição.

A partir de tais considerações é que a matéria vertente precisa ser enfrentada, ponderando os bens jurídicos que estão em

jogo e que demandam abordagem à solução do caso: o bem jurídico vida do cidadão, envolvendo a moléstia de que está acoimado, correlato

ao dever do Estado e da família para com a saúde pública; o bem jurídico saúde pública de toda a Sociedade para com quem este mesmo

Estado possui o dever de tutela.

Há que se estabelecer, aqui, um juízo de ponderação destes bens, valores, interesses e competências, para se chegar a

alguma conclusão. Para tanto, pretendo me valer de critérios constitucionalmente consagrados para a delimitação dos índices de

fundamentalidade desses direitos, a saber, os que densificam o princípio da proporcionalidade dentre eles.

489 Além disto, é preciso lembrar que the Courts are not well positioned to oversee the tricky process of efficient resource allocation conducted, with more or less skill, by executive agencies, nor are they readily able to rectify past misallocations. Judges do not have the proper training to perform such functions and they necessarily operate with inadequate and biased sources of information. ALEINIKOFF, T. Alexander. Constitutional Law in the Age of Balancing. In Yale Law Journal, nº96, 1987, pp.982.. 490 HESSE, Konrad. A Força Normativa da Constituição. Porto Alegre: Fabris, 2001, p.119. Fala o autor, aqui e na verdade, da tese de que, na interpretação constitucional, deve-se dar primazia às soluções ou pontos de vista que, levando em conta os limites e pressupostos do texto constitucional, possibilitem a atualização de suas normas, garantindo-lhes eficácia e permanência constante.

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Na dicção de Robert Alexy, o princípio da proporcionalidade desdobra-se em três aspectos fundamentais: a) adequação; b)

necessidade (ou exigibilidade); c) proporcionalidade em sentido estrito. A adequação significa que o intérprete deve identificar o meio

adequado para a consecução dos objetivos pretendidos. A necessidade (ou exigibilidade) significa que o meio escolhido não deve exceder os

limites indispensáveis à conservação dos fins desejados. A proporcionalidade em sentido estrito significa que o meio escolhido, no caso

específico, deve se mostrar como o mais vantajoso para a promoção do conjunto de valores, bens e interesses em jogo491.

A partir de tais elementos de interpretação dos possíveis sentidos e significados do direito à saúde no Brasil, mister é que

se perquira se efetivamente é o Estado o único garantidor/concretizante destas prerrogativas.

É preciso, para tanto, chamar à colação aqui a Teoria da Constituição, para que se possa compreender, por óbvio, que a

partir de uma eleita matriz teórica fundante, o que implica reconhecer o Direito à Saúde como direito fundamental no sistema jurídico brasileiro.

Neste ponto quero afirmar, com Alexy, que tal direito se apresenta com posição de tal modo importante que a sua garantia ou não garantia

não pode ser deixada à simples maioria parlamentar contingencial492. Ademais disto, afigura-se também como uma posição jurídico-

prestacional, já que envolve ações concretas para viabilizar o acesso e a concretização de seus comandos normativos.

Todavia, na dicção de Canotilho, é preciso sobre tais direitos nos dar conta de que:

Acresce que o facto de se reconhecer um direito à vida como direito positivo a prestações existenciais mínimas, tendo como destinatário os poderes públicos, não significa impor como o Estado deve, prima facie, densificar este direito. Diferente do que acontece no direito à vida na sua dimensão negativa – não matar -, e na sua dimensão positiva – impedir de matar -, aqui, na segunda dimensão, positiva, existe um relativo espaço de discricionariedade do legislador (dos poderes públicos) quanto à escolha do meio (ou meios) para tornar efectivo o direito à vida na sua dimensão existencial mínima.493

Adverte o autor português, com acerto, que aquele espaço de discricionariedade não é, todavia, total, haja vista que

existem determinantes constitucionais heterônomas que estão a vincular os poderes instituídos (como a dignidade da vida humana, por

exemplo).

De qualquer sorte, quero sustentar que o Direito à Saúde, enquanto direito fundamental constitucionalizado, dever do

Estado, em primeiro plano, que é a todos garantido, configura-se como verdadeiro direito subjetivo, outorgando fundamento para justificar o

direito a prestações, mas que não tem obrigatoriedade como resultado de uma decisão individual494. Diz-se direito subjetivo prima facie pelo

fato de que, conforme ainda Canotilho, não é possível resolvê-lo em termos de tudo ou nada495, e também pelo fato de constituírem, numa

certa medida e na dicção de Dworkin, direitos abstratos, isto porque representam:

491 ALEXY, Robert. Teoría de los Derechos Fundamentales. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2000, p.126. Mais adiante, o autor alemão vai fazer questão de frisar que há algumas circunstâncias fáticas que devem informar as possibilidades das ações estatais prestacionais em nível de direitos sociais, como o da saúde, a saber: quando imprescindíveis ao princípio da liberdade fática (lato senso entendida); quando o princípio da separação dos poderes, bem como outros princípios atinentes aos direitos fundamentais de terceiros forem atingidos de forma relativamente diminuta. Op.cit.,p.469. 492 Idem, p.406 e seguintes. 493 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Estudos sobre Direitos Fundamentais. Coimbra: Coimbra Editora, 2004, p.58. 494 Nossos Tribunais ainda não conseguiram uniformidade sobre tal percepção do direito à saúde, todavia, o Supremo Tribunal Federal já teve oportunidade de afirmar que se trata este direito de direito público subjetivo, não podendo ser reduzido à promessa constitucional inconseqüente – Agravo Regimental no RE nº271.286-8/RS. De igual sorte a decisão do Superior Tribunal de Justiça que asseverou que os direitos fundamentais à vida e à saúde são direitos subjetivos inalienáveis, constitucionalmente consagrados, cujo primado, em um Estado Democrático de Direito como o nosso, que reserva especial proteção à dignidade da pessoa humana, há de superar quaisquer espécies de restrições legais - REsp 836913/RS; Recurso Especial nº2006/0067408-0. 1ª Turma, Relator Min. Luiz Fux, julgado em 08/05/2007, publicado no Diário de Justiça de 31.05.2007 p. 371. 495 Aduz Canotilho que: A questão da reserva do possível (Vorbehalt des Möglichen), da ponderação necessária a efectuar pelos poderes públicos (Abwägung) relativamente ao modo como garantir, com efectividade, esse direito (optimização das capacidades existentes, alargamento da capacidade, subvenções a estabelecimentos alternativos) conduz-nos a um tipo de direito prima facie a que corresponde, por parte dos poderes públicos, um dever prima facie. Op.cit.,p.66. Ver neste sentido a reflexão de SARLET, Ingo. Eficácia dos Direitos Fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, notadamente na p.304, em que o autor sustenta estar esta reserva do possível parametrizada por três variáveis, a saber: (a) dizendo com a efetiva disponibilidade fática dos recursos à efetivação dos direitos fundamentais; (b) dizendo com a disponibilidade jurídica dos recursos materiais e humanos, que guarda íntima conexão à distribuição das receitas e competências federativas

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Finalidades políticas generales cuyo enunciado no indica de qué manera se ha de comparar el peso de esa finalidad general con el de otras finalidades políticas, en determinadas circunstancias, o qué compromisos se han de establecer entre ellas. Los grandes derechos de la retórica política son abstractos en este sentido. Los políticos hablan de derecho a la libertad de expresión, a la dignidad o a la igualdad, sin dar a entender que tales derechos sean absolutos, y sin aludir tampoco a su incidencia sobre determinadas situaciones sociales complejas. 496

E por que não se pode resolver tal matéria em termos de tudo ou nada? Pelo fato de que ela envolve um outro universo de

variáveis múltiplas e complexas, a saber: disponibilidade de recursos financeiros alocados preventivamente, políticas públicas integradas em

planos plurianuais e em diretrizes orçamentárias, medidas legislativas ordenadoras das receitas e despesas públicas, etc. Todas estes

condicionantes, por sua vez, encontram-se dispersos em diferentes atores institucionais, com competências e autonomias reguladas também

pela Constituição.

Decorre daqui a tese de que a garantia de um padrão mínimo de segurança social não pode afetar de forma substancial

outros princípios ou interesses constitucionais igualmente relevantes, assim que, somente quando a garantia material do padrão mínimo em

direito social (previamente delimitada como prioritária em termos de sociedade) estiver efetivamente sendo ameaçada no caso concreto, é que

se poderá levar a cabo uma necessária ponderação de interesses em face da potencial restrição de bens jurídicos – fundamentais ou não –

colidentes com tais demandas ou pretensões. Caso contrário, dever-se-á buscar a plena integração mantenedora da incolumidade normativa e

concretização de todos os bens jurídicos tuteladas pelo sistema jurídico.497

Ocorre que, como referiu o Superior Tribunal de Justiça no Brasil, a realização dos direitos econômicos, sociais e culturais -

além de caracterizar-se pela gradualidade de seu processo de concretização - depende, em grande medida, de um inescapável vínculo

financeiro subordinado às possibilidades orçamentárias do Estado, de tal modo que, comprovada, objetivamente, a incapacidade econômico-

financeira da pessoa estatal, desta não se poderá razoavelmente exigir, considerada a limitação material referida, a imediata efetivação do

comando fundado no texto da Carta Política.498

É por esta razão que doutrinadores como Ingo Sarlet são incisivos ao afirmar que o Estado dispõe apenas de limitada

capacidade de dispor sobre o objeto das prestações reconhecidas pelas normas definidoras de direitos fundamentais sociais, de tal sorte que a

questão da limitação dos recursos constitui um certo limite fático à efetivação desses direitos. De outro lado, o Estado também deve ter a

capacidade de dispor destes recursos para o cumprimento daqueles direitos.499

(tributárias, orçamentárias, legislativas e administrativas); (c) dizendo com a proporcionalidade da prestação, em especial no tocante à sua exigibilidade e razoabilidade. 496 DWORKIN, Ronald. Tomando los derechos en serio. Barcelona: Ariel, 1989, p.162. Denomina o autor de direitos concretos son finalidades políticas definidas con mayor precisión de manera que expresan más claramente el peso que tienen contra otras finalidades en determinadas ocasiones. Num texto mais recente (DWORKIN, Ronald. Justice in Robes. Massachussets: Harvard University Press, 2006), o autor americano ratifica esta sua assertiva. 497 Ver o texto de SARLET, Ingo. Eficácia dos Direitos Fundamentais. Op.cit.,p.371, oportunidade em que adverte acertadamente o autor que, com isso, traçou-se um claro limite ao reconhecimento de direitos originários a prestações sociais, de tal sorte que, mesmo em se tratando da garantia de um padrão mínimo (no qual a perda absoluta da funcionalidade do direito fundamental está em jogo), o sacrifício de outros direitos não parece ser tolerável. 498 É bem verdade que, nesta mesma decisão, manifestou-se o STJ no sentido de reconhecer que não se mostrará lícito, no entanto, ao Poder Público, em tal hipótese - mediante indevida manipulação de sua atividade financeira e/ou político-administrativa – criar obstáculo artificial que revele o ilegítimo, arbitrário e censurável propósito de fraudar, de frustrar e de inviabilizar o estabelecimento e a preservação, em favor da pessoa e dos cidadãos, de condições materiais mínimas de existência. Cumpre advertir, desse modo, que a cláusula da 'reserva do possível' - ressalvada a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível - não pode ser invocada, pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se do cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando, dessa conduta governamental negativa, puder resultar nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade. REsp 811608/RS; Recurso Especial nº2006/0012352-8. 1ª Turma, Relator Min. Luis Fux, julgado em 15/05/2007, publicado no DJ 04.06.2007 p. 314. 499 SARLET, Ingo. Eficácia dos Direitos Fundamentais. Op.cit, p.303. Mais tarde, vai afirmar Ingo que: o que a Constituição assegura é que todos tenham, em princípio, as mesmas condições de acessar o sistema público de saúde, mas não que qualquer pessoa, em qualquer circunstância, tenha um direito subjetivo definitivo a qualquer prestação oferecida pelo Estado ou mesmo a qualquer prestação que envolva a proteção de sua saúde. (p.347 – da mesma forma na p.376). Na mesma direção ver o texto de BOYNTON, Brian. Democracy and distrust after twenty years: Ely's process theory and constitutional law from 1990 to 2000. Stanford: Stanford University Press, 2005, p.51 e seguintes.

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O problema é que, historicamente, no Brasil, até em face das particularidades de exclusão social, miserabilidade e

fragilização de sua cidadania, o Estado fora chamando para si, de forma concentrada, um universo de atribuições com caráter protecionista,

paternalista e assistencialista, promovendo ações públicas de sobrevivência social no âmbito notadamente da saúde, com poucas políticas

preventivas, educativas e de co-gestão com a sociedade dos desafios daqui decorrentes, induzindo a comunidade a uma postura letárgica e de

simples consumidora do que lhe era graciosamente presenteado, sem nenhuma reserva crítica ou constitutiva de alternativas das mazelas

pelas quais passava e ainda vive.

O cenário hoje é, todavia, diferente, a uma, pelos níveis de inclusão social construídos no país nos últimos 15 (quinze)

anos, propiciando cenários materiais e formais de maior participação da cidadania na gestão de seu cotidiano; a duas, em face do processo

descentralizador da governança institucional que nestes últimos tempos vem ocorrendo, ensejando a abertura gradativa dos poderes

instituídos e da administração pública dos interesses coletivos.500

Mesmo em tal quadro, a relação Estado x Sociedade é ainda marcado significativamente por graus de dependência

hierárquica e alienada da segunda para com o primeiro, provocando o que Canotilho chama de introversão estatal da socialidade, ou seja:

1. os direitos sociais implicam o dever de o Estado fornecer as prestações correlativas ao objeto destes direitos; 2. os direitos sociais postulam esquemas de unilateralidade, sendo que o Estado garante e paga determinadas prestações a alguns cidadãos; 3. os direitos sociais eliminam a reciprocidade, ou seja, o esquema de troca entre os cidadãos que pagam e os cidadãos que recebem, pois a mediação estatal dissolve na burocracia prestacional a visibilidade dos actores e a eventual reciprocidade da troca.501

Sustenta o autor, e com ele concordo, que é tempo já de se descobrir os contornos da reciprocidade concreta e do

balanceamento dos direitos sociais, até porque tais direitos envolvem patrimônio de todos quando de sua operacionalidade e concreção, e já

que a todos são dirigidos tais prerrogativas, deve-se perquirir sobre a quota parte de cada um neste mister, sob pena de constituirmos o que o

jurista lusitano denomina de uma aproximação absolutista ao significado jurídico dos direitos sociais, ou seja, confiar na simples interpretação

de normas consagradoras de direitos sociais para, através de procedimentos hermenêuticos, deduzir a afetividade dos mesmos direitos,

produzindo resultados pouco razoáveis e racionais.

Quero dizer que é preciso levar em conta que todo e qualquer exercício de direito social como a saúde, em tese, custa

dinheiro – e não é pouco em nenhuma parte do mundo. Assim é que Peter Häberle, na primeira metade da década de 1970, já formulava a

idéia da reserva das caixas financeiras para o atendimento de direitos sociais prestacionais, para exatamente evidenciar o fato de que estes

direitos estão também vinculados às reservas financeiras do Estado, na medida em que devessem ser custeados pelo Erário.502

É claro que o simples argumento da escassez de recursos dos cofres públicos não pode autorizar o esvaziamento de

direitos fundamentais, muito menos os relacionados à saúde, eis que diretamente impactantes em face da vida humana e sua dignidade

500 Trato disto em meu livro LEAL, Rogério Gesta. Estado, Administração Pública e Sociedade: novos paradigmas. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. Talvez se possa dizer que, em verdade, é toda uma concepção de Estado que entra em mutação a partir daquele período histórico, caracterizado por seus matizes mais sociais e compromissados com o restabelecimento de equilíbrios necessários em face das diferenças gritantes e desestabilizadoras de uma ordem mínima de civilidade. Isto não implica um único modelo de Estado Social, mas vários, eis que se formam ora com viés mais paternalista e assistencialista (tal qual o modelo de Estado Getulista no Brasil), ora com feições mais curativas e compensatórias (tal qual o Welfare State e o L’État d’Providence), ora com natureza de classe social (tal qual o Estado Soviético). Ver também o texto LEAL, Rogério Gesta. O Estado-Juiz na Democracia Contemporânea: uma perspectiva procedimentalista. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, e também o texto de SANDULLI, Armando Mantinni. Stato di Diritto e Stato Sociale. Napoli: Giappichelli, 2004. 501 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Estudos sobre Direitos Fundamentais. Op.cit.,p.102. 502 HÄBERLE, Peter. Grunderecht im Leistungstaat. In VVDSTRL, 30 (1972). Neste ponto concorda Canotilho, quando assevera que: Parece inequívoco que a realização dos direitos econômicos, sociais e culturais se caracteriza: (1) pela gradualidade da realização; (2) pela dependência financeira relativamente ao orçamento do Estado; (3) pela tendencial liberdade de conformação do legislador quanto às políticas de realização destes direitos; (4) pela insusceptibilidade de controlo jurisdicional dos programas político-legislativos a não ser quando se manifestem em clara contradição com as normas constitucionais, ou transportem dimensões manifestamente desrazoáveis. Reconhecer estes aspectos não significa a aceitação acrítica de alguns dogmas contra os direitos sociais. Op. Cit.,p.108. Ver o texto de GALDINO, Flávio. Introdução à teoria dos Custos dos Direitos: direitos não nascem em árvores. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2005.

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mínima, e por isto estarão sujeitos ao controle jurisdicional para fins de se aferir a razoabilidade dos comportamentos institucionais neste

sentido, devendo inclusive ser aprimorados os parâmetros, variáveis, fundamentos e a própria dossimetria concretizante do direito em xeque.

Não se afigura simples, pois, trazer-se à colação argumentos do tipo princípio da não reversibilidade das prestações

sociais, ou o princípio da proibição da evolução reacionária, como fórmulas retóricas e mágicas para poder garantir, a qualquer preço – que

nem se sabe o qual -, tudo o que for postulado por segmentos da comunidade (indivíduos) em termos de saúde, pelo simples fato de que o

Estado está obrigado a tanto, isto porque o desafio da bancarrota da previdência social, o desemprego duradouro, parecem apontar para a

insustentabilidade do princípio da não reversibilidade social.503

É verdade que este estado de coisas tem como um dos fundamentos o fato de que o catálogo de diretos econômicos,

sociais, e culturais, forjado nos dois pós-guerras do século XX, compromissados com a reconstrução do próprio tecido social, elevou à máxima

exaustão as expectativas de poder e ação dos poderes instituídos em prol de tais demandas, acreditando que poderiam dar concreção a tudo

isto sozinhos, causando o que Arthur chama de vitimização do Estado por seu próprio sucesso.504

Todas estas crises identificadas, ainda no plano do diagnóstico, não me fazem propugnar pela descrença total no Estado

como espaço público de gestão de interesses coletivos, mas, tão-somente, no Estado instituição tradicional, concebido a partir e

exclusivamente de seu locus insulado e tecno-burocrático de fala oficial, unilateral e arbitrariamente imposto a uma cidadania ainda mais

expectadora dos acontecimentos.

Mas então, qual a saída para um cenário como este em que as forças prestacionais do Estado de Bem Estar se

esmorecem em face de crises globais de recursos naturais e econômicos (ora concentrados demasiadamente, ora fragilizados

demasiadamente)?

No momento em que a Constituição Federal de 1988 dispõe, em seu art.196, que a saúde é direito de todos e dever do

Estado, garantindo mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso

universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação, não há como negar que tal dever é relacional e

condicionado a garantia de acesso universal e igualitário (a todos) das ações consectárias nesta direção. Isto significa, salvo melhor juízo, que

qualquer política pública, ou ação preventiva e curativa, necessitam levar em conta a demanda global que envolve tais interesses, sob pena de

atender uns e desatender muitos.

Daí que proponho uma leitura mais integrada deste dever estatal para com o universo que ele alcança, ou seja, direito

social da população como um todo que envolve, inclusive, co-responsabilidades societais importantes (constitucionais e infraconstitucionais).

Estou falando, por exemplo: (a) do dever da família (da Sociedade e do Estado) em assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta

prioridade, o direito à vida, à saúde , à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, a dignidade, ao respeito, à liberdade e

à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda a forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade

e opressão505; (b) os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais

503 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Estudos sobre Direitos Fundamentais. Op.cit.,p.112. Ver no Brasil, uma boa abordagem do tema em DERBLI, Felipe. Proibição de Retrocesso Social: uma proposta de sistematização à luz da Constituição de 1988. In A Reconstrução Democrática do Direito Público no Brasil. Rio de Janeiro: Renovar, 2007, p.433 e seguintes. 504 ARTHUR, John. The unfinished Constitution: philosophy and constitutional practice. Belmont: Wadsworth Publishing Company, 1989, p.118 e seguintes. Com base nesta crítica, adverte o autor que uma cidadania social se conquista não através da estatização da socialidade, mas através da civilização da política (a social citizenship is not conquered through the nationalization of the sociality, but through the civilization of the politics). Ao lado disto, para não conhecer de sua ineficiência ou fracasso, o Estado prefere, em algumas oportunidades, negar a existência de inúmeras tensões sociais que se avolumam sem respostas satisfativas, ou ainda, lançá-las à clandestinidade ou ilicitude, tratando-as como anomalias comportamentais que precisam ser severamente coagidas, tais como os movimentos dos sem-terra, dos sem-teto, a questão dos parcelamentos clandestinos do solo urbano, a violência generalizada, a prostituição, o narcotráfico, etc. . 505 Art. 227, da Constituição Federal de 1988.

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na velhice, carência ou enfermidade 506; (c) a família (a Sociedade e o Estado) tem o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua

participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida 507.

Com tal perspectiva já se pôde asseverar que a prestação alimentar não deva subsistir até os 21 anos, mas estender-se,

com base no princípio da solidariedade familiar, além da maioridade508. Como o Novo Código Civil Brasileiro reduziu para dezoito anos o

começo da maioridade, com maior razão este entendimento se justifica.509

Mesmo no plano da infraconstitucionalidade, temos como deveres familiares (notadamente entre os cônjuges), dentre

outros, a mútua assistência e o sustento dos filhos, sendo que eles são obrigados a concorrer, na proporção de seus bens e dos rendimentos

do trabalho, para o sustento da família e a educação dos filhos, qualquer que seja o regime patrimonial510. Ao lado disto, ainda é de se ressaltar

que podem os parentes, os cônjuges ou companheiros, pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível

com a sua condição social, nos termos do art.1.694, do novo Código Civil Brasileiro511. Veja-se que, quando faltam neste dever, os familiares

podem ser enquadrados inclusive nas disposições do art.244, do Código Penal, que disciplina:

Deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do cônjuge, ou de filho menor de 18 (dezoito) anos ou inapto para o trabalho, ou de ascendente inválido ou maior de 60 (sessenta) anos, não lhes proporcionando os recursos necessários ou faltando ao pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada; deixar, sem justa causa, de socorrer descendente ou ascendente, gravemente enfermo.512

Mesmo nas situações em que as famílias se desconstituem, fenômeno acelerado em nossa época, a legislação infra-

constitucional confirma o disposto no Texto Político de 1988, ao assegurar que o cônjuge responsável pela separação judicial prestará ao

outro, se dela necessitar, a pensão que o juiz fixar, sendo que para manutenção dos filhos, os cônjuges, separados judicialmente, contribuirão

na proporção de seus recursos. Para assegurar o pagamento da pensão alimentícia, o juiz poderá ainda determinar a constituição de garantia

real ou fidejussória, ou mesmo que a pensão consista no usufruto de determinados bens do cônjuge devedor. Ainda, a obrigação de prestar

alimentos transmite-se aos herdeiros do devedor.513

Dentre outras questões que poderiam causar espécie nesta reflexão é a que diz com a ampliação cada vez maior do

conceito de obrigação alimentar e seus liames de responsabilidade parental.

506 Art. 229, da Constituição Federal de 1988. 507 Art. 230, da Constituição Federal de 1988. 508 In RT, 698/156; 727/262. 509 Neste sentido, ver o texto de SANTOS, Luiz Felipe Brasil. Os alimentos no novo Código Civil. In Revista Brasileira de Direito de Família nº 16 - JAN-FEV-MAR/2003, pág. 12. Neste texto, o autor lembra que a extensão e a característica da reciprocidade da obrigação alimentar encontram-se previstas nos arts. 1.696 e 1.697, que repetem, ipsis litteris, o que já dispunham os arts. 397 e 398, do Código de 1916. Assim, a obrigação alimentar, pela ordem, fica limitada, em primeiro lugar, aos ascendentes, depois aos descendentes e, por fim, aos irmãos, assim germanos como unilaterais (art. 1.697). Observe-se que na linha reta, seja ascendente ou descendente, não há limitação de grau, ao passo que na colateral resta limitada ao grau mais próximo (irmão). Em cada linha, sempre os mais próximos em grau devem ser chamados em primeiro lugar, sendo a obrigação alimentar dos parentes mais remotos subsidiária e complementar. Isto é, vem depois da dos mais próximos e limita-se a completar o valor que por estes possa ser prestado. 510 Consoante as disposições dos arts.1566 e 1568, ambos do novo Código Civil Brasileiro. Ver o texto de OLIVEIRA, José Lamartine e MUNIZ, Francisco José Ferreira. Direito de família (direito matrimonial). Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 1990. 511 Uma discussão mais ampla desta perspectiva pode ser encontrada em: VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direito de família. São Paulo: Atlas, 2002, p. 365; RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. São Paulo: Saraiva, v. 6, 2002, p. 427; GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil: direito de família. São Paulo: Saraiva, v. 2, 2002, p. 139. 512 Redação dada pela Lei nº 10.741, de 01.10.2003, DOU de 03.10.2003, com efeitos a partir de 90 dias da publicação. A pena prevista aqui é detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa, de uma a dez vezes o maior salário mínimo vigente no País, consoante a redação dada pela Lei nº 5.478, de 25.07.1968. 513 Consoante disposições dos arts.19, 20, 21 e 23, da Lei nº 6.515/77.

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De certa forma a doutrina e jurisprudência brasileiras têm operado muito bem na direção de demarcar um conceito de

alimentos conforme à Constituição, ou seja, atenta para o fato de que o direito a alimentos deve corresponder não somente ao indispensável

para a subsistência, mas também ao que for necessário para o alimentando viver de modo compatível com sua condição social.514

Mesmo na processualística a definição dos contornos conceituais de alimentos vem sofrendo profunda ampliação,

exatamente para cumprir com que designa a norma civil (art.1.694, e seguintes, do NCCB), no sentido de que sejam fixados na proporção das

necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada, conforme disciplina Talamini: O sentido constitucional de ‘alimentos’,

portanto, vai necessariamente além do direito de família: abrange indenizações, pensões, salários e outras verbas - desde que

esssencialmente destinadas ao sustento do titular do crédito.515

Por esta razão é que o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul já teve oportunidade de asseverar que deve a

obrigação alimentar ser fixada de modo a incluir, também, valores gastos pela alimentada com saúde, não se mostrando possível a escolha do

plano de saúde que será pago pelo alimentante, bem como devendo ser retirada a condenação do alimentante ao pagamento de multa pela

sua não inclusão em referido plano.516

Nos termos da responsabilidade dos avós paternos ou maternos, a jurisprudência é iterativa no sentido de que a obrigação

alimentar (1.696, do CCB), somente se justifica se restar comprovado que os genitores não possuem condições financeiras de suprir as

necessidades do alimentando, dada a natureza subsidiária e complementar de tal obrigação. Vale dizer, o ordenamento jurídico pátrio impõe

aos parentes o encargo alimentar de forma supletiva, uma vez esgotada a possibilidade dos principais obrigados em prestá-los.

Para facilitar o cumprimento de tais obrigações alimentares, o Código Civil Brasileiro de 2002, reitera o princípio da

divisibilidade da obrigação alimentar, carreando a cada devedor, de mesmo grau de parentesco, a responsabilidade pelo pagamento de sua

quota-parte da dívida, que será fixada previamente, segundo as suas possibilidades financeiras (art. 1.698).

Sequer a maioridade do alimentando, repito, tem sido razão de afastamento do dever alimentar, eis que

O instituto dos alimentos entre parentes compreende a prestação do que é necessário à educação independentemente da condição de menoridade, como princípio de solidariedade familiar. Pacificou-se na jurisprudência o princípio de que a cessação da menoridade não é causa excludente do dever alimentar. Com a maioridade, embora cesse o dever de sustento dos pais para com os filhos, pela extinção do poder familiar (art. 1.635, III), persiste a obrigação alimentar se comprovado que os filhos não têm meios próprios de subsistência e necessitam de recursos para a educação.517

Em face disto, se se toma que o dever alimentar não é solidário, mas divisível, em caso de ação judicial para concretizá-lo,

a ação deve, em tese, ser proposta contra todos os co-responsáveis, visando, com isso, a delimitar a parcela de responsabilidade de cada qual

na dívida. Diz a doutrina especializada que, em tese, a ação deverá ser ajuizada contra todos os co-responsáveis pela obrigação alimentar,

porque, do contexto extraído do art. 1.698, este suposto dever é, na realidade, uma faculdade do credor de alimentos.518

Está-se falando, em verdade, também do dever de solidariedade que a Constituição Brasileira de 1988 impõe a estas

relações, chamando à responsabilidade de cada qual para que contribuam na constituição de uma sociedade justa e democrática, condição de

possibilidade de uma República e Estado de Direito.

Impõe-se, agora, a volta ao tema da natureza constitucional dos deveres da família para com seus pares, em especial no

âmbito da saúde, objeto desta abordagem, em especial no que tange à Constituição Estadual do Rio Grande do Sul de 1989, no seu art.241,

que dispõe sobre a saúde em seu território, a partir, por certo, da dicção da Constituição Federal de 1988, asseverando que:

Art. 241 - A saúde é direito de todos e dever do Estado e do Município, através de sua promoção, proteção e recuperação.

514 TJPE – AgRg 93939-5/01 – Rel. Des. Leopoldo de Arruda Raposo – DJPE 29.10.2003. Na mesma direção os trabalhos clássicos de GONÇALVES, Luiz da Cunha. Princípios de direito civil luso-brasileiro. São Paulo: Max Limonad, 1951, p. 1.287; BORDA, Guilhermo A. Manual de derecho de família. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 2002, p. 403. De igual forma as decisões jurisprudenciais antigas e recentes no país: RE 102877, STF, 2ª T., Rel. Min. DJACI FALCÃO, J. 14.09.1984; REsp 184807/SP, STJ, 4ª T., Rel. Min. BARROS MONTEIRO, J. 24.09.2001. 515 TALAMINI, Eduardo. Prisão Civil e Penal e ‘Execução Indireta’ - A Garantia do Art. 5º, LXVII, da Constituição Federal. In Revista de Processo, São Paulo, 23(92)37-51, out./dez. 1998. Nesta direção reforça SPENGLER, Marion. Fabiana. Alimentos – da ação à execução. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002, que quando se discute a verba alimentar, é sempre imprescindível atentar para o fato de que não se trata de uma obrigação simples, mas uma obrigação com peculiaridades, pois diz respeito à manutenção do ser humano. 516 Apelação Cível Nº 70007665268, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Antônio Carlos Stangler Pereira, Julgado em 20/05/2004. 517 Comentário ao art. 1.694, do Novo Código Civil, feito por TAVARES DA SILVA, Regina Beatriz. In Novo Código Civil Comentado. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 1503. 518 WELTER, Belmiro Pedro. Alimentos no Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 240-241.

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Parágrafo único - O dever do Estado, garantido por adequada política social e econômica, não exclui o do indivíduo, da família e de instituições e empresas que produzam riscos ou danos à saúde do indivíduo ou da coletividade.

O Estado do Rio Grande do Sul introduziu em sua Constituição a participação do indivíduo e de sua família no custeio da

saúde pública, sendo que, com base nestes pressupostos, foi editada a Lei-RS nº 9.908/93, determinando que o Poder Público estadual deve

fornecer medicamentos especiais ou excepcionais aos seus cidadãos, desde que comprovem o seu estado de carência e também de sua

família:

Art. 2º - O beneficiário deverá comprovar a necessidade do uso de medicamentos excepcionais mediante atestado médico.

Parágrafo único - Além do disposto no "caput" deste artigo, o beneficiário deverá comprovar por escrito e de forma documentada, os seus rendimentos, bem como os encargos próprios e de sua família, de forma que atestem sua condição de pobre.

Este parâmetro normativo apresenta-se como condição de possibilidade da prestação de medicamentos excepcionais, mas

pode servir para regulamentar o fornecimento de medicamentos normais? E o que distingue um fármaco normal em face de um excepcional?

Penso que a Constituição Estadual do Rio Grande do Sul precisa ser interpretada conforme à Constituição Federal, no

sentido de ratificar este sentido solidarístico que chama à responsabilidade a família para contribuir na mantença do sistema republicano e

federativo de saúde, dando sua quota-parte, seja ela qual for, na medida de sua possibilidade e diante da necessidade do parente enfermo.

Como se fará isto em nível de demandas judiciais que envolvem a prestação de medicamentos, internações hospitalares,

etc.? Por via simétrica – respeitada sempre a urgência e especificidades da matéria – à forma e prova judiciária que instrumentalizam os feitos

que envolvem a efetivação de obrigações alimentares, oportunizando e reivindicando a demonstração da necessidade do enfermo e a

possibilidade de contribuição para o atendimento da demanda dos seus familiares, tomando aqui como referência os vínculos parentais

estatuídos pelo próprio sistema jurídico, a saber:

A extensão e a característica da reciprocidade da obrigação alimentar encontram-se previstas nos arts. 1.696 e 1.697, que repetem, ipsis litteris, o que já dispunham os arts. 397 e 398, do Código de 1916. Assim, a obrigação alimentar, pela ordem, fica limitada, em primeiro lugar, aos ascendentes, depois aos descendentes e, por fim, aos irmãos, assim germanos como unilaterais (art. 1.697). Observe-se que na linha reta, seja ascendente ou descendente, não há limitação de grau, ao passo que na colateral resta limitada ao grau mais próximo (irmão). Em cada linha, sempre os mais próximos em grau devem ser chamados em primeiro lugar, sendo a obrigação alimentar dos parentes mais remotos subsidiária e complementar. Isto é, vem depois da dos mais próximos e limita-se a completar o valor que por estes possa ser prestado.519

Com Canotilho, tenho que efetivamente é chegada a hora dos constitucionalistas se darem conta dos limites da jurisdição e

reconhecer, com humildade, que a Constituição já não é o lugar do superdiscurso social, levando em conta que a eventual colisão de discursos

reais de aplicação da Constituição terão de ser supervisionados a partir de colisões de valores ideais (a vida, a segurança, a integridade física,

a liberdade, a saúde de todos e não de alguns) que integram o justo de uma comunidade bem- ou mal – ordenada.520

Assim, o direito à saúde não pode se concretizar, ou pelo menos não se concretiza somente através de uma política

constitucional, eis que esta é, prima facie, uma projeção imperativa sobre órgãos constitucionais do Estado das contingências de várias esferas

da sociedade.

Em face de tudo isto, precisa-se urgentemente encontrar uma forma de contemporizar tão diferentes desafios no âmbito do

direito à saúde, partindo do pressuposto de que tal mister incumbe a todos e não somente a alguns.

No entanto, no caso concreto, tenho que o recurso deve ser desprovido, haja vista a ausência de qualquer ordem judicial

anterior nos presentes autos acerca da necessidade de comprovação da capacidade econômica da família da paciente para custear o seu

tratamento médico.

Do exposto, voto para negar provimento ao agravo de instrumento.

É o voto.

Des. Rogério Gesta Leal

DR. MÁRIO CRESPO BRUM - De acordo.

DES. PAULO DE TARSO VIEIRA SANSEVERINO (PRESIDENTE) - De acordo.

519 SANTOS, Luiz Felipe Brasil. Os alimentos no novo Código Civil., op.cit. 520 Idem, p.129. Ver igualmente o excelente texto de BURT, Robert A. The constitution in conflict. Cambridge: Harvard University Press, 2002, p.81 e seguintes.

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DES. PAULO DE TARSO VIEIRA SANSEVERINO - Presidente - Agravo de Instrumento nº 70020884086, Comarca de Novo Hamburgo:

"NEGARAM PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO. UNÂNIME ."

Julgador(a) de 1º Grau: LUIZ FELIPE SEVERO DESESSARDS Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/site_php/consulta/download/exibe_documento.php?ano=2007&codigo=1370721>. Acesso em: nov. 2007.