LUCIANO, Bruno; BRESSAN, Regiane - A Comunidade Andina No Século XXI
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GT24 - MUNDO EM TRANSIO:
NOVOS VRTICES DE PODER, INSTITUIES E COOPERAO
COORDENAO: KARINA PASQUARIELLO (UNESP)
ROBERTO GOULART MENEZES (UNB)
A COMUNIDADE ANDINA NO SCULO XXI:
ENTRE BOLIVARIANOS E A ALIANA DO
PACFICO.
BRUNO THEODORO LUCIANO Konrad AdenauerFellow em Estudos Europeus
Centro de Relaes Internacionais da Fundao Getlio Vargas - FGV
Professor Colaborador do Instituto de Relaes Internacionais da UnB
Bacharel e Mestre em Relaes Internacionais pela UnB
REGIANE NITSCH BRESSAN Professora Adjunta do Curso de Relaes Internacionais
Escola Paulista de Poltica, Economia e Negcios - EPPEN
Universidade Federal de So Paulo - UNIFESP
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RESUMO
Esse trabalho discute o lugar da Comunidade Andina, fundada em 1969,como Pacto
Andino, no contexto do regionalismo latino-americano do sculo XXI. Aps analisar a
insero da Comunidade Andina a partir da perspectiva do desenvolvimento de um
regionalismo ps-liberal na virada do sculo, apresenta-se o atual estado institucional e
poltico do processo de integrao andino, composto por uma situao de
desconhecimento, descrdito e falta de legitimidade, reflexo da percepo social quanto
integrao. Discute-se se a polarizao ideolgica dos pases-membros da integrao sub-
regional tem incentivado a desestruturao desse processo, em detrimento de outros
esquemas de integrao, priorizando perspectivas de insero regional bolivariana
(Aliana Bolivariana para as Amricas ALBA), liberal (Aliana do Pacfico) ou mesmo projetos de integrao de amplitude sul-americana (Unio de Naes Sul-Americanas -
UNASUL).
Palavras-Chave: Integrao Sul-Americana. Comunidade Andina. Integrao Ps-
liberal. Regionalismo.
INTRODUO
O presente trabalho discute o lugar da Comunidade Andina no contexto do
regionalismo latino-americano do sculo XXI. Aps analisar a insero da Comunidade
Andina a partir da perspectiva do desenvolvimento de um regionalismo ps-liberal na
virada do sculo, apresenta-se o atual estado institucional e poltico do processo de
integrao andino, composto por uma situao de desconhecimento, descrdito e falta de
legitimidade, reflexo da percepo social quanto integrao. Discute-se se a polarizao
ideolgica dos pases-membros da integrao sub-regional tem incentivado a
desestruturao desse processo, em detrimento de outros esquemas de integrao,
priorizando perspectivas de insero regional ps-liberais ou bolivarianas (ALBA),
liberais (Aliana do Pacfico) ou mesmo projetos de integrao de amplitude sul-
americana (UNASUL).
A integrao andina o processo integracionista mais antigo da Amrica do Sul.
Iniciada no ano de 1969, (...),fecha de creacin del Acuerdo de Cartagena, hasta
principios de los 80, se insista en la necesidad de un desarrollo integral y armnico,
centrado en una perspectiva economicista, con muy poca atencin hacia lo poltico
(ARELLANO, 2003, p.79). Durante sua primeira dcada de existncia, a integrao
andina esteve associada fundamentalmente aos objetivos econmico-comerciais, de
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construo de uma rea de Livre Comrcio e de uma Unio Aduaneira a nvel sub-
regional. Nenhum projeto poltico ou social ambicioso foi pensado nesse perodo pelos
Estados andinos, haja vista a existncia de regimes militares nos pases da regio.
Uma das caractersticas mais relevantes da integrao dos pases andinos, que a
difere dos demais projetos de integrao construdos na Amrica Latina, que sua
institucionalidade recorreu significativamente experincia da integrao europeia, ao
analogamente incorporar o papel protagnico das instncias regionais na integrao
(ZEGARRA, 2005). O estabelecimento da Junta do Acordo de Cartagena, rgo
executivo regional de carter supranacional, autnomo aos interesses nacionais, indica
que a integrao andina contou com a institucionalidade mais complexa dos processos de
integrao do continente.
A nfase nas estruturas institucionais regionais autnomas uma caracterstica do
contexto em que esses processos de integrao ocorriam e foi influenciada pela
perspectiva neofuncionalistaelaborada por Ernst Haas (2004) que enfatizava a
importncia dessas instncias supranacionais para a promoo da expanso da integrao
e seu aprofundamento, em uma lgica que este autor chamou de spillover. No entanto,
um aspecto central da supranacionalidade para o neofuncionalismoera que essa nova
institucionalidade estimularia expectativas positivas nos atores em relao integrao
regional e promoveria uma transferncia de lealdades para as instncias comunitrias,
permitindo que interesses coletivos transnacionais pudessem ser considerados sem os
entraves das lgicas nacionalistas dos governos que muitas vezes priorizam interesses de
curto prazo, em detrimento de projetos de longa durao.
Esse fortalecimento institucional e aumento de expectativas positivas em relao
integrao no se verificaram nas experincias integracionistas da Amrica Latina. Nos
primeiros anos de sua criao, o Pacto Andino contava com a participao de Bolvia,
Colmbia, Equador, Peru, Venezuela e Chile. Esses dois ltimos deixaram o processo de
integrao ao longo do tempo. Enquanto a sada do Chile data de 1977, no contexto de
liberalizao comercial do regime do General Augusto Pinochet, a da Venezuela mais
recente (2006), quando deixou a integrao andina e fez, em seguida, seu pedido de
adeso ao Mercado Comum do Sul (Mercosul).
Mesmo durante a onda de democratizao dos anos 1980 e de relanamento da
lgica regionalista, que atingiu toda a Amrica Latina e tambm a sub-regio andina, no
possvel perceber nos processos de integrao da regio um reconhecimento de que
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estruturas comunitrias mais autnomas seriam as instncias adequadas para promover a
cooperao e o desenvolvimento dos pases integrantes da CAN.
A saber, o Parlamento da Comunidade Andina no foi identificado pelas
populaes como uma instncia de promoo de direitos e bem-estar, nem tampouco de
efetiva participao democrticas, embora sua institucionalizao fosse contempornea
aos processos de transio democrtica no Equador (1977 -79), no Peru (1978 - 80) e na
Bolvia (1982), bem como ao aprofundamento da democracia na Colmbia e Venezuela.
A convergncia dos regimes polticos na sub-regio favoreceu a aproximao entre eles,
devido identidade poltica comum e necessidade de promover a consolidao
democrtica em conjunto (PINTO, 2001).
Esse contexto de significativas mudanas econmicas e polticas trouxe um novo
impulso ao projeto de integrao andino. Em 1987, o Protocolo Modificativo de Quito
atualizou o ordenamento jurdico do Pacto Andino, bem como sua estrutura institucional,
com a incluso, na integrao andina, de um Tribunal de Justia, de um Parlamento
Andino e de um Conselho Consultivo Empresarial e Laboral Andino (AVENDAO,
1999). O reforo da institucionalidade da integrao andina veio em conjunto
democratizao dos pases da regio, os quais passaram a demandar a participao social,
tanto por vias representativas (Parlamento) como participativas (Conselho Consultivo),
alm do reforo da segurana jurdica (Tribunal Andino) do processo de integrao.
Apesar do alto grau de complexidade institucional da integrao andina e da
existncia de estruturas supranacionais, anlogas integrao europeia, a integrao
andina apresenta um baixo grau de eficincia (AVENDAO, 1999). A falta de um pas
que se posicione como paymaster da integrao e lidere o processo de impulso poltica
do projeto integracionista tm impedido que os resultados polticos da integrao
acompanhem seu desenvolvimento institucional.
Nos diagnsticos da dificuldade de avano da integrao andina, mais quatro
elementos so adicionados ao rol de empecilhos ao desenvolvimento do projeto
integracionista: ausncia de um projeto poltico comum; baixssimos nveis de
consolidao democrtica nos pases da regio; aumento do populismo neoliberal; e
baixa participao da sociedade civil na integrao (PINTO, 2001). Alm desses, pode
ser adicionado o fato de que os pases andinos constituem a regio com maior grau de
instabilidade poltica na Amrica Latina (ZEGARRA, 2005), inclusive em virtude das
questes relacionadas ao narcotrfico e presena na regio de grupos paramilitares em
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luta contra os movimentos revolucionrios, em especial as Foras Armadas
Revolucionrias Colombianas (FARC) e o Exrcito de Libertao Nacional (ELN).
Nos anos 1990, em um contexto regional de expanso de projetos de integrao
regional pela Amrica Latina, o Pacto Andino sofreu uma alterao constitutiva. Em
1997, com a entrada em vigor do Protocolo de Trujillo, uma nova institucionalidade foi
construda na integrao andina, na qual, entre outras modificaes, o Pacto Andino foi
substitudo pela Comunidade Andina. O Protocolo de Trujillo instituiu uma Secretaria
Geral da CAN, que substituiu a antiga Junta do Acordo de Cartagena, entidade
supranacional de carter administrativo na integrao.
Um dos destaques identificados no referido Protocolo a consolidao do papel
do Parlamento Andino como rgo deliberante da integrao andina. Composto por cinco
representantes titulares de cada congresso nacional dos Estados-membros (e dez
suplentes), segundo as regulamentaes nacionais e do prprio Parlamento, o Parlandino
tem a responsabilidade de emitir sugestes normativas com o objetivo de facilitar a
harmonizao das legislaes nacionais. Ademais, apresenta a funo de se relacionar
com os legislativos nacionais, garantindo maior contato desses com o processo de
integrao (AVENDAO, 1999).
Ainda que o desenvolvimento da Comunidade Andina apontasse para a
supranacionalidade com a criao do Parlandino, o bloco vem sofrendo retrocessos no
campo da supranacionalizao de normas, evidenciando a caracterstica governamental
no processo decisrio. O desenvolvimento da estrutura institucional provocado pela
alterao ao Pacto Andino aumentou a preocupao de um possvel enfraquecimento da
soberania estatal, levando a maioria dos governos a decidir por uma estrutura de carter
intergovernamental, na qual os governos constituem os principais atores e centralizadores
da tomada de deciso (BUSTAMANTE, 2006).
Ademais, nos ltimos anos identifica-se uma polarizao do posicionamento
externo e regional dos Estados-membros da CAN, que tem acirrado as dificuldades no
andamento do processo de integrao andino. Alguns Estados buscaram ampliar sua
insero economia internacional, atravs de polticas de abertura comercial para bens e
servios e proteo aos investimentos estrangeiros, como Peru e Colmbia. Outros
grupos de Estados firmaram acordos comerciais com os Estados Unidos, como o Tratado
de Livre Comrcio entre Estados Unidos, Amrica Central e Repblica Dominicana. Por
sua vez, perante os obstculos comerciais impostos pelos pases desenvolvidos, como os
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subsdios agrcolas e medidas antidumping, acordos com os pases em desenvolvimento
foram firmados, especialmente pelo Brasil, que assim o fez com a frica do Sul e ndia
(TUSSIE; TRUCCO, 2010). Em 2012, Peru e Colmbia reafirmam sua posio em prol
da expanso de acordos de liberalizao comercial ao aderirem Aliana do Pacfico,
formado por esses pases somados Chile e Mxico.
Como resposta crise da liberalizao comercial, atravs de iniciativas
heterogneas, outros projetos de integrao surgiram como a Unio de Naes Sul-
Americanas (UNASUL) e a Aliana Bolivariana para as Amricas (ALBA), conhecidos
como regionalismo ps-liberal (VEIGA; RIOS, 2007). Esse novo conceito expressa
uma nova ordem de prioridades regionais e uma agenda deslocada esquerda do eixo do
poder poltico.
A principal caracterstica deste novo conceito a crtica ao paradigma liberal, na
qual se basearam tanto as iniciativas de integrao latino-americana nos anos 1990,
quanto as polticas econmicas domsticas dos pases da regio. Segundo seus
precursores, no regionalismo aberto, os processos de integrao ignoraram temas
relacionados s assimetrias estruturais entre os pases-membros, bem como desprezaram
preocupaes com as dimenses produtivas e de desenvolvimento.
1. DESENVOLVIMENTO DO REGIONALISMO PS-LIBERAL E A COMUNIDADE ANDINA
Na dcada de 2000, cresceu o desencanto da sociedade sul-americana com as
reformas neoliberais da dcada de 1990. As crticas s polticas econmicas adotadas na
regio na dcada anterior agravaram-se, sobretudo a partir da sucesso de crises
econmicas na virada do sculo, como a crise da desvalorizao do real no Brasil em
1999, e crise argentina em 2001. Alm disso, a constatao do fraco desempenho das
economias sul-americanas culminou no questionamento s estratgias nacionais e no
papel do Estado na economia. Os maiores pases da regio revisaram suas escolhas
econmicas, e as polticas liberalizantes comerciais, sobretudo com os pases
desenvolvidos, entraram em eroso.
Este cenrio propiciou o surgimento de lideranas de diferentes vieses polticos,
as quais revelaram apoio s polticas centralizadoras e autoritrias, principalmente pela
soluo para questes no resolvidas pelo mago do regime democrtico, e pela
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necessidade de conter movimentos populares que cresceram nas ltimas dcadas. No
plano domstico, esse cenrio propiciou a ascenso de governos considerados, em
diferentes medidas, de esquerda, conhecidos tambm como progressistas. A srie de
vitrias eleitorais desses governos esquerdistas, movimento conhecido tambm como
onda rosa, refletiu a insatisfao ao modelo neoliberal no mbito social. Mesmo que o
neoliberalismo beneficiasse alguns setores da economia desses pases, prevaleceu o
desagrado populacional advindo das ineficincias internas. Assim, a expresso popular
passou a reivindicar maior ateno dos Estados s necessidades das classes mais baixas,
discurso ofertado justamente pelos polticos de esquerda.
Embora tais governos defendessem necessidades imperiosas de transformao
social, apresentaram disparidades entre suas polticas e ideologias, como os governos do
Brasil e da Argentina. Ainda que fossem contrrios ao arranjo neoliberal, algumas
diretrizes desse modelo perpetuaram na regio, marcada por governos com projetos
polticos econmicos heterogneos, que mesclaram prerrogativas sociais, embasadas no
nacionalismo, com polticas econmicas ortodoxas.
Alguns destes governos da vertente esquerdista conformaram nos primrdios do
sculo XXI uma nova forma poltica, o neopopulismo(WEYLAND, 2004). Ainda que
sua definio exata seja bastante controversa e complexa, o neopopulismo considerado
um modelo poltico ps-moderno (TRAINE, 2004). Inspirados no populismo clssico, os
lderes neopopulistas se aproveitaram da insatisfao populacional com as reformas
econmicas liberais e dos governos instveis na regio que no lograram xito nas
promessas de desenvolvimento social. Dessa forma, tais lideranas usufruram desse
descontentamento, sustentando-se como novos representantes do povo (WEYLAND,
2004).
Como representantes deste perfil, os lderes Hugo Chvez, Evo Morales e Rafael
Correa foram frutos dos movimentos sociais crescentes e dos eleitores descontentes que
apoiaram estes governos por suas promessas de derrubar a classe poltica dirigente e
promover polticas de incluso. De diferentes origens tnica, social, profissional e
poltica, estas lideranas proclamaram objetivos similares, ainda que vivenciassem
realidades diferentes enfrentando oposies distintas (SHIFER; JOYCE, 2008).
Portanto, a Amrica do Sul presenciou uma alterao gradativa nas elites e
lideranas, principalmente polticas, no ncleo do poder nacional (STEFANONI, 2012).
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Ademais, assistiu-se a renovao da participao da sociedade civil; organizaes no-
governamentais e movimentos sociais eclodiram no final dos anos 1990, ganhando novos
espaos de atuao e reivindicao nos anos 2000. Estes novos atores comearam a
conformar mudanas no plano domstico, e no entendimento do que deveriam ser os
processos de integrao regional.
Nas relaes internacionais, aps a estagnao das negociaes multilaterais da
Organizao Mundial do Comrcio na Conferncia de Seattle de 1999, somada s
dificuldades econmicas vividas pelos pases da regio, redefiniu-se a estratgia de
insero internacional dos pases latino-americanos. A convergncia de abertura
comercial regional esmaeceu em detrimento de estratgias diversas adotadas por esses
pases de insero internacional.
No mbito do Mercosul, Argentina e Brasil firmaram o Consenso de Buenos
Aires, em aluso ao Consenso de Washington. A inteno do documento foi balizar as
aes dos dois pases, abrangendo vrios temas de interesse comum. O Consenso de
Buenos Aires apresentou forte nfase poltica e social, reafirmando os princpios da
democracia, da justia e da equidade, em detrimento do tema econmico. Neste pacto,
Brasil e Argentina prometeram coordenar objetivos comuns, reforando a integrao
regional para lograr interesses nacionais e atingir resultados equilibrados nas negociaes
multilaterais (ALMEIDA, 2003).
O cenrio internacional intensificou a crtica do projeto liberal de abertura dos
mercados e desregulamentao econmica, exacerbandonovos rumos latino-americanos,
com a crise econmica de 2008. Estaagravou a sensao dos riscos da interdependncia e
provocou novas tenses e conflitos econmicos, dificultando a cooperao internacional.
Assim, nos pases em desenvolvimento, revigorou o ideal do Estado forte na economia,
com instrumentos de proviso da segurana e coeso social, ameaadas pelas incertezas e
instabilidade econmicas internacionais (VIGEVANI; RAMANZINI JNIOR, 2010;
VEIGA; RIOS, 2011).
Desta forma, um grupo de pases mostrou-se cada vez mais resistente maior
abertura comercial, assumindo, em contrapartida, compromissos de outras naturezas no
mbito dos processos de integrao regional, como Argentina, Bolvia, Equador e
Venezuela (VEIGA; RIOS, 2011). Inclusive, alguns deles provocaram fortes alteraes
em suas polticas econmicas ao enrijecer o protecionismo comercial e expropriarem
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ativos estrangeiros, como aconteceu na Venezuela e Bolvia, alm do posicionamento
intensificado, aps a crise econmica mundial de 2008, quando se iniciou um processo
global de reviso de paradigmas de poltica econmica. Ainda que os objetivos destas
lideranas que promovem o novo socialismo na regio, estejam distantes do conceito
terico do socialismo discutido nos estudos das Cincias Sociais, estes governos
consistem em ruptura dos modelos econmicos adotados nos anos anteriores na regio,
ao impor a interveno do Estado na economia, como a nacionalizao de empresas
estrangeiras que exploram recursos naturais (RODRRGUEZ-LARRETA, 2008).
1.1. A Integrao Sul-Americana na era Ps-liberal
Neste contexto de mudanas no cenrio poltico latino-americano, os projetos de
integrao regional passaram a vivenciar outro momento conhecido como regionalismo
ps-liberal (VEIGA; RIOS, 2007), ps-comercial ou ps-hegemnico (SERBN, 2011).
Segundo seus precursores, no regionalismo aberto, os processos de integrao ignoraram
temas relacionados s assimetrias estruturais entre os pases-membros, bem como
desprezaram preocupaes com as dimenses produtivas e de desenvolvimento. Portanto,
esse fenmeno decorreu do ressurgimento do nacionalismo econmico e politizao das
agendas econmicas externas de vrios pases da regio. Tal fenmeno se insere em um
marco internacional amplo, que favorece o protecionismo e o nacionalismo econmico,
inclusive nos pases desenvolvidos.
O regionalismo ps-liberal composto tanto por uma agenda integrativa de
cunho desenvolvimentista, resistente abertura comercial, quanto por uma agenda
antiliberal, que propicia a formao de coalizes entre pases afins ideologicamente. A
hiptese primordial de que a liberalizao dos fluxos de comrcio e os investimentos
nos acordos comerciais no foram capazes de promover o desenvolvimento no interior do
processo, reduzem o espao para implantao de polticas nacionais desenvolvimentistas
e dificultam a adoo de uma agenda de integrao voltada aos temas de
desenvolvimento e equidade social.
Por conseguinte, a segunda proposta desse paradigma a ampliao temtica da
agenda de integrao, abrangendo assuntos econmicos no comerciais e temas no
econmicos. Os novos temas so selecionados segundo critrios diversificados, mas
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sempre relacionados com os ideais do novo paradigma, como necessidade pelo
desenvolvimento e pela busca da equidade social, superao da pobreza e desigualdade,
bem como a incorporao de grupos sociais que foram excludos dos modelos liberais de
integrao (VEIGA; RIOS, 2007). Os projetos regionais mais emblemticos e criados na
era ps-liberal constituem os projetos da ALBA-TCP, UNASUL alm da CELAC
(CIENFUEGOS;SANAHUJA, 2010; ALTMANN, 2011). Embora os projetos que
despontaram neste perodo revelem diferenas entre suas intenes e estrutura, eles
compartilham traos caractersticos deste perodo que inferem tambm os caminhos
atuais das relaes regionais.
A. Agenda Desenvolvimentista
O retorno da agenda desenvolvimentista, balizada pelo movimento do ps-
liberalismo, afastou a regio dos objetivos do neoliberalismo, do regionalismo aberto, do
Consenso de Washington e de suas frmulas em funo de um impulso neo-
desenvolvimentista, aproximando-os dos temas sociais e polticos. Nestes acordos,
vislumbram-se os impulsos gerados pelos governos progressistas consolidao da
democracia, da defesa dos direitos humanos, da incluso e construo da cidadania,
atravs da maior participao do Estado na economia e esforos eminentes ao
desenvolvimento e reduo de desigualdade. Por conseguinte, as naes da regio
tambm buscam maior autonomia frente ao mercado, no campo da poltica de
desenvolvimento e frente poltica exterior dos Estados Unidos.Alm disso, foi
construdo um vnculo entre os ideais da integrao regional e os esforos sociais, como a
reduo da pobreza e desigualdade, em um contexto poltico em que a justia social
adquiriu um novo e maior peso na agenda poltica da regio (SERBN, 2011).
B. Estado Forte
Um outroponto importante constitui no retorno do Estado forte na poltica, nas
relaes internacionais e no desenvolvimento econmico e social, implicando maior
atuao do Estado frente aos atores privados e foras da economia de mercado. Esta
estratgia visa contrapor os Estados ao fantasma da ameaa e do poder tradicional
hegemnico hemisfrico dos Estados Unidos, pois, na prtica, estes projetos regionais
que se conformam so reativos e defensivos potncia estadunidense (SERBIN, 2011).
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Alm disso, na ideologia ps-liberal, nacionalismo e regionalismo no se
contrapem. O regionalismo se fortaleceu perante discursos e polticas neonacionalistas,
em conformidade com a reavaliao dos princpios de soberania nacional. O
neonacionalismo intenta construir marcos regulatrios e instituies regionais e
multilaterais efetivas, afastando-se do entendimento que processos regionais e
multilaterais serviriam para fomentar a globalizao (SANAHUJA, 2013).
C. Intergovernamentalismo
Ainda que exista a vontade da criao de instituies mais slidas no mbito regional,
no concerto ps-liberal, a soberania nacional legitimada, e o Estado permanece o
principal promotor das iniciativas de integrao. Predominam os acordos
intergovernamentais, os quais no comprometem a autonomia ou independncia dos
Estados.
Contudo, a construo de instituies estritamente intergovernamentais, como
instrumento para a tomada de deciso regional em um contexto altamente politizado,
pode impedir o aprofundamento da arquitetura e de regulamentos regionais mais
institucionalizados (SERBIN, 2011).
D. Renovao da Agenda Regional
O ps-regionalismo resgata o retorno da poltica nas relaes regionais e no
desenvolvimento social, com menos nfase s questes comerciais e de liberalizao
econmica que dominaram as polticas regionais na dcada anterior. Houve uma
reestruturao nas prioridades da agenda regional, agora outorgada a uma srie de novos
temas, que incluem temas como a paz, segurana, defesa, gesto de crises, consolidao
da democracia, defesa dos direitos humanos e coordenao de poltica exterior.
Alm disso, possvel identificar empenho na criao de instituies e poltica
comuns, cooperao nos mbitos no comerciais e maior nfase nas dimenses sociais e
nas assimetrias existentes. Ainda h a incluso de matrias como infraestrutura regional,
energia, finanas, segurana, imputadas to logo no documento de criao da
Comunidade Sul-Americana de Naes (CASA) (SANAHUJA, 2013).
E. Cooperao sul-sul
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Nos ltimos anos, presenciou-se tambm uma crescente ateno cooperao sul-sul,
como estratgia tambm para exercer alguma liderana regional e global, como nos casos
de Venezuela e Brasil. Ambos os pases, iniciaram diversas iniciativas de cooperao
com pases do hemisfrio sul, almejando uma vinculao extrarregional e projeo global
(SERBN, 2011).
F. Agenda Positiva de Integrao
O novo contexto marcado tambm por nfase agenda positiva da integrao,
centrada na criao de instituies e polticas comuns, na cooperao recproca nos
mbitos comerciais e sociais, reforando a agenda ativa de cooperao sul-sul no mago
regional. Esta diretriz tambm fomenta a emergncia de novos mecanismos e agendas de
cooperao em campos como segurana energtica, coordenao macroeconmica, temas
monetrios e finanas para o desenvolvimento. Com isso, possvel perceber a promoo
de uma comunidade poltica regional atravs do dilogo poltico e do acordo, pese s
divergncias e tenses que possam existir em seio meio (SANAHUJA, 2013).
G. Desenvolvimento e Infraestrutura
Concomitante agenda positiva de integrao e s novas temticas somadas aos
projetos regionais, possvel identificar na nova agenda, as crescentes preocupaes com
os gargalos do desenvolvimento que assolam os pases da regio, como a falta de
infraestrutura regional. O empenho e cooperao nesta rea, atravs de projetos como a
Iniciativa para a Integrao da Infraestrutura Regional Sul-americana, IIRSA, objetivam
melhorar a articulao dos mercados regionais e, ao mesmo tempo, facilitar o acesso a
mercados externos.
H. Demanda social
O ltimo item concerne busca de frmulas para promover maior participao de
atores no estatais e legitimao social dos processos integrao. Na ltima dcada foi
possvel identificar novas demandas sociais por maior participao poltica em
decorrncia da prpria evoluo da democracia, estimulando tanto o aprofundamento e
consolidao de estruturas institucionais dos sistemas democrticos. Ademais, tais
movimentos pressionaram pela implementao de polticas adequadas para superar
profundas desigualdades sociais, econmicas e tnicas que caracterizaram a regio, no
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intuito de aprofundar tanto os direitos polticos e civis, como os direitos econmicos,
sociais e culturais.
1.2. A Comunidade Andina no marco ps-liberal
A Comunidade Andina, projeto pioneiro no esquema sub-regional, debilitou-se
diante sada da Venezuela e ao enfraquecimento institucional, com uma possvel
dissoluo do Parlamento Andino, aconselhada pelos seus respectivos chanceleres e pelo
prprio Congresso Nacional da Colmbia. O bloco enfrenta srias divergncias internas
em razo dos diferentes intentos polticos de seus governantes, mormente no marco ps-
liberal da integrao regional, quando alguns pases deste bloco, Bolvia e Equador,
passaram a vislumbrar outros assuntos no cerne deste projeto. Alm disso, a falta de
liderana interna ao bloco dificulta sua orientao e desenvolvimento.
Para alguns analistas, caberia Colmbia, com estrutura industrial mais
desenvolvida e com melhor localizao estratgica, ocupar a liderana da integrao
regional e impulsionar a integrao em termos polticos e econmicos (PUERTAS,
2006). O Peru, sede da Secretaria Geral, tampouco conseguiu atuar de maneira
correspondente a sua responsabilidade institucional, quando assumiu a iniciativa de
financiar a infraestrutura operativa deste organismo. O comrcio intra-bloco representou
uma porcentagem relativamente pequena em relao ao seu comrcio total, ocasionando
por esta razo, menor interesse econmico pela CAN, provocando maior resistncia s
estratgias regionais ligadas rea econmica, poltica e social. Por sua vez, Equador e
Bolvia, que apostam em outro norte para a integrao dentro deste novo conceito,
enfrentam tambm pequenas crises sucessivas de distintas reas, esbarrando em maior
dificuldade para assumirem a vanguarda da integrao.
A realidade mostra que Colmbia e Peru, com o acordo bilateral com os Estados
Unidos, esto mais inclinados Aliana do Pacfico, perseguindo os antigos objetivos de
abertura comercial e estreitamento dos laos com a potncia do norte. Esta relao
tambm favorvel ao governo colombiano no combate aos movimentos revolucionrios e
questes advindas ao narcotrfico. Em oposio, os governos progressistas da Bolvia e
Equador conformam a ALBA e se alinham ao protagonismo venezuelano e aos ideais
bolivarianistas. A rachadura criada no seio do bloco,denota direes distintas em
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quecaminham seus membros, contribuindo fortemente para o enfraquecimento do antigo
projeto andino.
Em termos domsticos, o bloco assiste a mltiplos problemas scio-econmicos,
tnicos e polticos enfrentados pelos pases-membros, os quais se contribuem para um
cenrio de instabilidade para as instituies democrticas domsticas e regionais, alm da
dificuldade constante na proteo dos direitos humanos e no avano de polticas sociais
mais slidas. A persistente instabilidade poltica e scio-econmica padece diante ao
aumento das dinmicas de livre-comrcio, defendidas e incentivadas pelos acordos com
os Estados Unidos.
A estes fatos, somam-se tambm os conflitos atuais entre seus pases membros: o
Equador rompeu relaes diplomticas com a Colmbia aps o bombardeio a um
acampamento guerrilheiro em seu territrio; a Bolvia ameaou processar o Equador em
relao s divergncias com o secretrio-geral da CAN; e ao Peru por este dar asilo a
membros da oposio. Por sua vez, este ltimo tambm foi acusado de interferir em
alguns acordos que tratavam da sada boliviana ao Pacfico pelo territrio chileno
(RAMREZ, 2011).
Este quadro agrava a dificuldade atual em se desenvolver uma cooperao
regional que contribua tambm formulao e implantao de polticas de segurana
para afrontar os problemas regionais ligados ao narcotrfico e trfico de armas, sobretudo
na Colmbia e, em menor medida, no Peru. Tambm no existe um consenso regional
sobre a forma de aproximao e contribuio soluo do conflito colombiano e ao
tratamento da insegurana social e humana em geral.
Portanto, conflitos e obstculos entre seus membros somam-se s divises
consolidadas no marco dos projetos surgidos na era ps-liberal, contribuindo ao
enfraquecimento da integrao andina.
2. ESTADO INSTITUCIONAL E POLTICO DA COMUNIDADE ANDINA
2.1 Do Pacto Andino Comunidade Andina
As polticas de integrao na sub-regio andina iniciam-se a partir da dcada de
1960, no contexto das primeiras iniciativas de integrao econmica da Amrica Latina,
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representados pela Associao Latino-americana de Livre Comrcio (ALALC) de 1960.
Inspirado na integrao das Comunidades Europeias, o Pacto Andino, criado em 1969
pelo Acordo de Cartagena, tinha como objetivo fundamental o desenvolvimento de uma
unio aduaneira e de um mercado comum entre seus Estados-membros. Inserido nos
princpios do regionalismo fechado, a integrao andina naquele momento voltou-se para
a consolidao de um modelo de substituio de importaes em escala regional
(PUERTAS, 2006).
Mimetizando o desenho institucional da integrao europeia, um rgo de
natureza supranacional foi estabelecido no mbito do Pacto Andino, a Junta do Acordo
de Cartagena,responsvel pelo controle e execuo tcnica das atividades da integrao.
Diferentemente do caso europeu, a iniciativa legislativa manteve-se atrelada s estruturas
intergovernamentais da integrao andina, por meio da Comisso de Acordo de
Cartagena.
Composto inicialmente por quatro Estados-membros (Bolvia, Chile, Colmbia,
Peru), o Pacto Andino teve seu nmero de componentes alterado com a entrada da
Venezuela (1973) e coma sada do Chile (1976).Esse perodo foi marcado por uma fase
de sistemticos incumprimentos dos prazos previstos para a liberalizao comercial nos
anos 1970 e 1980 (AVENDAO, 1999). A progressiva internalizao das normas
andinas mostrou-se dependente das foras polticas domsticas de cada Estado-membro
e, principalmente, da reao de setores nacionais sensveis ao avano da integrao
econmica e comercial.
Em 1979, a estrutura institucional da integrao tornou-se mais complexa com o
Protocolo Modificativo de Quito, o qual inseriu novos rgos de natureza representativa
e jurdica integrao: o Parlamento Andino, o Tribunal e os Conselhos Consultivos
Empresarial e Laboral. Nesse momento,destacou-se o desenvolvimento de um direito
comunitrio e supranacional na integrao andina, a partir do princpio de aplicabilidade
imediata das decises andinas (aps a devida publicao na gazeta oficial andina) e a
unificao das interpretaes das normas andinas pelo recm-criado Tribunal Andino
(AVENDAO, 1999).
Da assinatura do acordo de Cartagena at a dcada de 1980, identificou-se a
prevalncia de questes econmico-comerciais no processo de integrao. A partir do
final dos anos 1980 e incio dos 1990, o sistema andino de integrao passou por um
novo processo de reestruturao. A assinatura do protocolo de Trujillo de 1996
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modificou o acordo de Cartagena e criou a Comunidade Andina (CAN) substituindo o
anterior Pacto Andino. Dentre as principais alteraes no processo de integrao,
destacaram-se a dotao de personalidade jurdica internacional da CAN; a criao da
Secretaria Geral (substituiu a antiga Junta) e da figura do secretrio geral da CAN; e a
formalizao do Conselho Presidencial Andino, instncia mxima da integrao,
responsvel pela impulso, avaliao e orientao poltica do projeto. No ano seguinte,
foi aprovada a futura incluso de eleies diretas para escolha dos membrosdo
Parlamento Andino, com a inteno de aumentar a participao social e a politizao da
integrao andina(CERA, 2009).
Embora a estrutura institucional da CAN tenha substantivamente
sedesenvolvidoem relao criada no Acordo de Cartagena de 1969, especialmente no
que diz respeito dotao de instncias supranacionais (Secretaria, Tribunal e
Parlamento), prevaleceu abaixa consolidao e aprofundamento das mesmas, em
detrimento da importncia das decises de alto nvel na integrao andina.A impulso
poltica da integrao decorre das resolues do Conselho Presidencial, e no instituies
supranacionais estabelecidas (PUERTAS, 2006).Um dos grandes questionamentos acerca
da integrao andina se a formalizao de uma mirade de estruturas supranacionais
tem o potencial de alterar os rumos da integrao regional.
2.2 Supranacionalismo na forma, intergovernamentalismo na prtica
Comparada aos demais processos de integrao na Amrica Latina, a CAN conta
com a institucionalidade mais avanada entre os projetos integrativos do continente. A
formalizao de estruturas de natureza supranacional, a incorporao de um direito
comunitrio e a insero de eleies diretas para os parlamentares andinos expressam a
crena de que o grande xito da integrao na Europa foi fruto do papel das instituies
supranacionais (ZEGARRA, 2005). No caso andino, essa complexidade institucional no
resultou, contudo, em um processo de integrao que aprofundasse a interdependncia
econmica entre os Estados-membros e aproximasse as polticas pblicas dos pases em
direo a uma maior integrao social e poltica.
Segundo Bustamante (2006), o sistema institucional criado na CAN pode ser
definido como uma mescla de supranacionalidade e intergovernamentalidade. Existe, no
entanto, um forte desequilbrio em favor dos governos nacionais que mantiveram a
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hegemonia na formulao das decises polticas de maior magnitude na
integrao.Conforme pde ser visto na construo institucional da CAN desde o Acordo
de Cartagena, grupos nacionalistas demandaram a criao de instituies supranacionais
que no poriam em perigo a soberania dos Estados-membros.
A Junta do Pacto Andino, rgo fortemente inspirado na Comisso Europeia, no
gozava de tanta autonomia quanto seu anlogo europeu, aspecto exemplificado pela falta
de competncias de iniciativa legislativa, a qual se manteve atrelada Comisso andina,
instituio dependente das estruturas intergovernamentais. A Junta, posteriormente
denominada Secretaria Geral, constituiu-se como instncia meramente burocrtica e
administrativa da integrao.O Parlamento e o Tribunal, includos na integrao andina a
partir de 1979, permaneceram no histrico da integrao como rgos acessrios,
negligenciados em relao s demais instituies (BUSTAMANTE, 2006). A reduo do
nmero de casos recebido pelo Tribunal Andino ao longo do tempo indica o
esvaziamento e marginalizao dessa instituio (DRI, 2009). A transformao do Pacto
Andino para a CAN no alterou substantivamente o equilbrio do binmio supranacional-
intergovernamental, mantendo os governos nacionais como os principais atores da
integrao. Nesse sentido, as inovaes institucionais da integrao andina, mimetizadas
do projeto europeu, no trouxeram grandes compromissos com um real aprofundamento
da integrao.
Tanta institucionalidade sem o desenvolvimento de maior funcionalidade somente
burocratizaria o processo de integrao (AVENDAO, 1999), reproduzindo um conjunto
de crticas recebidas historicamente pela integrao europeia. Dentre essas, podem ser
citados o distanciamento social das decises comunitrias, compreendidas como tcnicas
e complexas para o entendimento do cidado comum, ea falta de transparncia das
polticas de integrao, pouco acessveis populao. A instituio de foros consultivos
representativos, como o caso do Parlamento Andino, sem sua devida insero no
processo decisrio andino no solucionaria o problema do dficit de democracia
desenvolvido no seio da integrao por conta desse inchao institucional.
O formalismo disfuncional da CAN convive, ademais, com estruturas polticas
latino-americanas baseadas no domnio do poder executivo, em especial das figuras dos
Presidentes, nos temas de poltica externa e integrao regional. O conceito de
interpresidencialismo, cunhado por Malamud (2010) no contexto dos movimentos
polticos do Mercado Comum do Sul (Mercosul), pode, nesse sentido, oferecer alguns
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insights a respeito da relevncia dos executivos no andamento da
integrao.Interpresidencialismoseria uma condio exacerbada do
intergovernamentalismo, em que especificamente os chefes de Estados latino-americanos
teriam competncias fundamentais de impulso poltica e de mudana nos rumos de
integrao.
A transformao do Pacto Andino em Comunidade Andina foi, desse modo,
produto da impulso poltica produzida pelos presidentes dos Estados-membros em um
contexto de grande propagao do regionalismo no mundo (entendido como uma
segunda onda do regionalismo), com destaque para a criao da Unio Europeiaem 1992.
By the end of the 1980s, after years of turbulence and standstill due
partly to domestic factors but also to the failure to foster economic
interdependence, the national presidents decided to relaunch the process
with more modest aspirations and a more frugal institutional design
(MALAMUD; SOUSA, 2007, p. 94).
Essa renovao institucional, conforme ressaltado, no trouxe mais
aprofundamento da integrao, muito menos garantiu maior permeabilidade das
instituies supranacionais no processo decisrio regional, distintamente do caso
europeu. Como ressalta Dri (2009), o opaco desenvolvimento institucional andino
representa a predominncia da forma em relao ao contedo da integrao.
Ademais,esses aspectos no garantem a efetividade e a legitimidade de suas decises
perante governos ou particulares nacionais (DRI, 2009, p. 178).
2.3 A percepo social em relao integrao andina
A partir da anlise do campo da percepo social, acrescem-se diversos desafios
integrao andina. Os dados analisados no Latinobarmetro a respeito do conhecimento e
opinio dos cidados dos pases da CAN em relao a essa iniciativa de integrao
demonstram um apoio retrico e genrico aos processos de integrao, acompanhados de
um profundo desconhecimento em relao aos projetos de integrao j existentes.
Um forte apoio da sociedade integrao regional encontrado entre a populao
dos Estados-membros CAN. Segundo pergunta do Latinobarmetro de 2009, referente
integrao econmica entre os pases da Amrica Latina (Grfico I), mais de 60% dos
entrevistados so favorveis integrao latino-americana, com sociedades mais
favorveis, como a da Bolvia, e outras com menor apoio, como a do Equador. Em um
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primeiro momento, portanto, o quadro identificado de alto apreo integrao regional
pela populao dos pases da CAN.
Grfico I
Integrao Econmica Regional entre os pases da Amrica Latina (em %)
Fonte: Latinobarmetro, 2009.
Tendo em vista que o termo integrao econmica regional latino-americana
bastante amplo e genrico, torna-se fundamental observar o conhecimento dos projetos
de integrao regional existentes por parte da populao desses pases. Nesse sentido, a
Tabela I retrata o grau de familiaridade dos entrevistados com determinadas instituies
multilaterais internacionais e regionais, entre elas projetos de integrao regional como
CAN, Mercosul, ALBA e Unasul.
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Tabela I
Voc conhece estas Instituies? (em %)
Bolvia Colmbia Equador Peru Total
ONU
No Conheo 55,25 52,08 47,92 43,08 48,83
Conheo 47,75 47,92 52,08 56,92 51,17
OEA
No Conheo 55,33 56,50 50,17 45 51,75
Conheo 44,67 43,5 49,83 55 48,25
Mercosul
No Conheo 60,92 73 68,5 72,83 68,81
Conheo 39,08 27 31,5 27,17 31,19
UNASUL
No Conheo 75,75 73,75 72 86,58 77,02
Conheo 24,25 26,25 28 13,42 22,98
CAN
No Conheo 75,92 79,33 73,08 67,83 74,04
Conheo 24,08 20,67 26,92 32,17 25,96
ALBA
No Conheo 76,92 84,67 74,92 78,08 78,65
Conheo 23,08 15,33 25,08 21,92 21,35
CAF
No Conheo 72,4 81,1 58,3 74,2 71,5
Conheo 27,6 18,9 41,6 25,8 28,5
Fonte: Latinobarmetro, 2009, 2010.
A primeira observao sobre os resultadosdessa questo que existe um alto grau
de desconhecimento em relao a todas as instituies questionadas.
Com exceo da Organizao das Naes Unidas (ONU), mais da metade dos
entrevistados desconhecem as organizaes ou projetos perguntados. Dentre esses, os
projetos mais novos (ALBA e UNASUL) so os mais desconhecidos. Em seguida, vem a
prpria CAN, a qual mais desconhecida por parte da populao dos Estados-partes do
que, por exemplo, o Mercosul, projeto do qual esses pases nem sequer so membros
plenos.Constata-se tambm que os colombianos so os que menos tm conhecimento da
CAN, mesmo sediando instituies andinas como o Parlamento Andino.
Esse estado de desconhecimento da CAN tem reforado o descrdito da
populao dos pases-membros em relao integrao andina. A falta de conhecimento
quanto CAN vem aumentando nos ltimos anos, como bem demonstra o histrico do
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Grfico II. Embora de 2001 a 2003 o grau de conhecimento da integrao andina tenha
apresentado trajetrias diferentes entre os pases (aumento de conhecimento no Equador
e no Peru), de 2003 a 2009, o grau de conhecimento decresceu notavelmente em todos os
pases da CAN, demonstrando situao de desconhecimento sistemtico da sociedade de
um dos projetos de integrao mais antigos da Amrica Latina.
Grfico II - Conhece a Comunidade Andina (antigo Pacto Andino)? (em %)
Fonte: Latinobarmetro, 2001, 2003 e 2009.
O forte protagonismo das estruturas intergovernamentais nos rumos da integrao
andina, ainda que existam instncias supranacionais mimetizadas em relao ao modelo
de integrao da Europa, associadas a esse alto grau de desconhecimento da sociedade
em relao integrao andina, tm favorecido a deteriorao do projeto andino em
detrimento de novos esquemas de integrao, de maior grau de amplitude ou de
polarizao, a depender do interesse especfico e ideolgico dos governantes de cada
Estado-membro andino.
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3. POLARIZAO IDEOLGICA DOS ESQUEMAS DE INTEGRAO
REGIONAL E DESESTRUTURAO DA INTEGRAO ANDINA
3.1 Entre bolivarianos e Aliana do Pacfico
A polarizao ideolgica dos pases-membros da CAN nos ltimos anos tem
reforado a crise da integrao andina e a desestruturao da CAN. Pinto (2001) destaca
uma sria de sintomas da crise vivenciada por esse processo de integrao: medidas
unilaterais de determinados Estados-membros, produzindo descompasso e falta de
coerncia entre a atuao internacional dos Estados e o projeto andino; sucessivas crises
e contestaes dos modelos democrticos vigentes na regio; tendncias centrfugas no
mbito da CAN, polarizando as perspectivas a respeito da integrao regional e do
modelo de insero internacional dos pases andinos; e vises opositoras a vontade de se
integrar, fortalecendo interpretaes soberanistas ou nacionalistas dentro de setores
sociais dos pases da sub-regio.
Ao mesmo tempo em que a CAN passou por um momento de reestruturao,
substituindo o Pacto Andino e aumentando o grau de institucionalizao desse modelo de
integrao, determinados Estados-membros seguiram aes unilaterais contrrios ao
aprofundamento da integrao, seguindo motivaes e interesses domsticos. Nesse
sentido, podem ser citados a assinatura de acordo de livre comrcio bilateral entre
Colmbia e Estados Unidos, em 2006, bem como a movimentao da Venezuela em
direo ao Mercosula partir do final dos anos 1990, firmada em 2006."() a decisin de
Colombia, Ecuador y Per de adelantar negociaciones con Estados Unidos para
acordar Tratados de Libre Comercio (TLC)bilaterales ha originado el retiro de
Venezuela del proceso de integracin andina (PUERTAS, 2006, p. 4).
A integrao andina, com o passar dos anos, deixou de ser percebida como um
instrumento eficaz e interessante para insero internacional dos pases andinos. As
estratgias perseguidas pelos governos foram ideologicamente opostas e por vezes
excludentes em relao ao modelo de projeo internacional e aos rumos e utilidades do
processo de integrao andino. A polarizao entre os caminhos buscados pelos pases da
CAN refletiu-se em iniciativas unilaterais externas CAN, indicando a impossibilidade
desse projeto de integrao sub-regional lidar ou encapsular presses e conflitos entre os
Estados-membros. Seguiu-se, desse modo, a assinatura de tratados de livre comrcio com
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os Estados Unidos, pelo lado de pases como Colmbia e Peru, e, por outro, pela sada
formal da CAN e pedido de adeso ao Mercosul por parte da Venezuela a partir de 2006.
Nos ltimos anos, esse processo de polarizao tomou tambm outros contornos
institucionais, com a criao de novos esquemas de integrao, guiados por princpios e
interpretaes a respeito da integrao significativamente distintos. Em 2004 foi criada,
por iniciativa cubana e venezuelana, a Aliana Bolivariana para os Povos de Nossa
Amrica ALBA. Esta iniciativa enfatiza os interesses polticos em seus princpios
acima dos objetivos econmicos e comerciais, os quais compunham os principais logros
dos blocos anteriores. A ALBA sustentada por princpios norteadores como a
solidariedade, cooperao, bem-estar, formao integral e intensiva de capital humano
(RAMOS, 2010). Inicialmente, denominada Alternativa Bolivariana para as Amricas,
foi criada no intuito de constituir um contraponto a proposta de integrao hemisfrica da
ALCA rea de Livre Comrcio das Amricas, liderada pelos Estados Unidos e
impulsionada pelo Banco Mundial e Fundo Monetrio Internacional (FMI) (BORBN,
2009).
O protagonismo crescente da Venezuela na regio junto aos ganhos derivados da
exportao de petrleo contribuiu para o projeto ganhar fora entre pases
ideologicamente prximos e enfatizar as questes sociais entre seus princpios, como a
luta contra a pobreza e a excluso social. Ademais, preconizam o anti-imperialismo e o
ideal bolivarianista1 entre seus membros: Venezuela, Bolvia, Cuba, Equador, Nicargua,
alm de Antgua e Barbuda, So Vicente e Granadinas, Santa Lucia e Suriname, em
processo de adeso.
A ALBA prope a criao de mecanismos cooperativos no intuito de compensar
desequilbrios entre os pases do hemisfrio, pois alm de levar a cabo iniciativas para
diminuir as assimetrias entre seus membros, enfatiza prioridade na relao com outros
processos de integrao da Amrica Latina. O bloco tambm prope a construo de uma
moeda comum chamada de Sistema de Compensao nico Regional, Sucre.Tambm
1 Ideologia baseada nos princpios defendidos por Simn Bolvar (1783-1830), militar e poltico
venezuelano. Bolvar foi o grande defensor da independncia das naes da Amrica Latina, contribuindo
diretamente para a independncia de vrios pases da regio: Bolvia, Colmbia, Venezuela, Peru, Equador
e Panam. Ele preconizava a integrao latino-americana, repudiava as relaes com os pases
desenvolvidos (metrpoles), lutava por maior justia social, educao gratuita e obrigatria entre outras
questes sociais (RAMOS, 2010).
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pretende ser um instrumento inclusivo, agregando os grupos sociais dos diferentes pases
que compem o bloco e no apenas os grupos predominantes, que tradicionalmente
conduzem os projetos da regio. Concomitante ALBA, foi criada a Petrocaribe por
iniciativa venezuelana em cooperao aos pases da Amrica Central e do Caribe, cujo
principal objetivo contribuir para a segurana energtica da regio. O mecanismo
defende um modelo de cooperao de energia guiada pela solidariedade e tratamento
especial e diferenciado, cuja base a poltica de concesso preos subsidiados da
Venezuela e a construo de empresas mistas para operar no mercado de petrleo. A
Petrocaribe deve ser entendida comoum instrumento de cooperao da ALBA para alm
das questes estritamente energticas, a Petrocaribe prope projetos para o
desenvolvimento do transporte areo e martimo na sub-regiocomo um requisito
indispensvel para a integrao (BORBN, 2009).
A ALBA qualifica-se no marco ps-liberal pela oposio aos Estados Unidos,
pelo questionamento das polticas neoliberais e por abranger novas formas de cooperao
e comrcio diferenciadas, baseados em outros princpios e valores. Portanto, a proposta
bolivariana, capitaneada pela liderana de Chvez e de Castro e financiada pelos recursos
do petrleo venezuelano, segue radicalmente preceitos do regionalismo ps-liberal, com
forte discurso anti-hegemnico e antiamericano.
Por sua vez, recentemente, em 2012, inaugurou-se uma iniciativa de integrao
ideologicamente oposta, a qual retoma no prembulo de seu acordo marco os princpios
do regionalismo aberto. A Aliana do Pacfico, composta por Colmbia, Peru, Chile e
Mxico, aglomera pases com padres de insero internacional muito prximos,
pautados pela liberalizao comercial e a assinatura de tratados de livre comrcio com
pases desenvolvidos e em desenvolvimento.
Entre os principais objetivos desta aliana esto a construo de maneira
participativa e consensual, uma rea de integrao profunda para avanar
progressivamente rumo livre circulao de bens, servios, capitais e pessoas,
caractersticas de um Mercado Comum, mas sem incluir a harmonizao de polticas
macroeconmicas, a priori. Tambm pretende impulsionar maior crescimento,
desenvolvimento e competitividade das economias envolvidas, no intuito de atingir maior
bem-estar e superar as desigualdades econmicas, impulsionando a incluso social de
suas sociedades. Por fim, converter-se em uma plataforma de articulao poltica,
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integrao econmica e comercial, projeo ao mundo, com nfase regio sia-
Pacfico.
Com a criao da Aliana do Pacfico, o quadro dos esquemas de integrao na
Amrica Latina se tornou mais complexo e sobreposto, haja vista a presena de
iniciativas tanto de escalas diferentes (latino-americana, sul-americana, andina), como de
premissas de modelos de integrao distintas. O Quadro I representa, nesse sentido, a
situao da integrao andina em meio a outros projetos de integrao latino-americanos
dos quais seus pases fazem parte.
Quadro I
Fonte: Elaborao prpria, com base em Malamud e Gardini (2012).
Os quatro pases da CAN situam-se divididos entre os projetos de integrao
existentes na regio. Embora faam parte de projetos sub-regional, regional e
macrorregional comuns (CAN, Unasul, CELAC), dividem-se em projetos ideolgicos os
quais tm caminhado opostamente em relao ao entendimento de aspectos como
integrao econmica, insero internacional, papel do Estado e do empresariado na
economia, liberalizao comercial e relao com os Estados Unidos - Equador e Bolvia
membros da ALBA e Colmbia e Peru da Aliana do Pacfico.
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Quanto aos projetos criados no marco ps-liberal, a ALBA avana baseada em
um esboo inovador e ambicioso, mantendo sua postura contra os Estados Unidos e
preceitos neoliberais. Todavia, a prpria fora ideolgica que move este processo, parece
no favorecer a materializao de seus objetivos, o aprofundamento de sua estrutura, bem
como o alargamento do bloco. A retrica de suas cpulas e fruns demonstra limitada
vontade poltica e efetividade em sua implantao
A Unasul avana na tentativa de convergncia do Mercosul e Comunidade
Andina, com adeso de outros pases, como Chile, Guiana e Suriname. O seu destino
perpassa os modelos contrastantes do Mercosul e da ALBA, em torno dos fatores que
articulam diferentes temas: produo industrial e insero no mercado internacional,
como os temas energticos, financeiros e de infraestrutura e cooperao sul-sul.
A dimenso econmica e comercial provoca dvida se a UNASUL e o Mercosul
so processos claramente ps-liberais, dada a manuteno dos acordos comerciais que
configuram a base de convergncia entre CAN e Mercosul, e o desenvolvimento de
mega-projetos orientados a favorecer o intercambio comercial regional e extra-regional
como a IIRSA (SERBN, 2011). Ainda assim, o ncleo duro da integrao sul-americana
parece se concentrar no Mercosul, ainda que hajam deficincias e limitaes
institucionais neste bloco. UNASUL e ALBA ainda devem maturar seus propsitos para
se efetivarem e consolidarem este novo caminho ps-liberal da integrao latino-
americana.
Apesar das divergncias que refletem as propostas da ALBA e da Unasul,
evidente que o regionalismo na Amrica Latina est atravessando uma etapa de transio
baseada em algumas tendncias e traos comuns: a maior interveno do Estado, a re-
politizao das relaes regionais e o neo-desenvolvimentismo.
Por sua vez, a Unasul, ao almejar o comprometimento poltico de toda Amrica
do Sul, permite diferentes graus de adeso das naes regionais, e vrios nveis de aporte
de recursos a suas instituies. Mas, tampouco tem como intuito a construo de
estrutura institucional e de objetivos to amplos como a Comunidade Andina, como
percebem algumas lideranas da integrao andina.
3.2. A desintegrao andina
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A fragmentao dos grupos regionais enfraqueceu de forma ntida os projetos de
integrao j existentes. O caso mais dramtico realmente da integrao andina,
paralisada pelas diferenas entre seus membros, entraves domsticos e regionais,
distintas percepes e entendimento de como deve ser a integrao regional, sobre as
formas distintas de insero regional e global, e as discrepncias que provocaram a
retirada da Venezuela do bloco.
Algumas das dificuldades que acometem o contexto regional andino so de
responsabilidade da Colmbia, segundo Edgar Vieira Posada (2011). O pas por abrigar o
Parlamento Andino e destacar-se pela sua economia e industrializao, deveria atuar de
forma mais incisiva como proponente deste projeto. Para o autor, o pas tambm
responsvel pela sada hostil da Venezuela do bloco, tendo como conseqncia a perda
progressiva de um dos mercados principais para as manufaturas da CAN; o abandono da
etapa de Unio Aduaneira, instrumento importante para as negociaes do bloco com
outras reas; o descrdito s condies de supranacionalidade, dando lugar a um
generalizado intergovernamentalismo a todo o bloco.
A integrao andina j no responde s estruturas institucionais e compromissos
supranacionais, se no ao pensamento e vontade de cada governante, empenhando em
seguir com suas prprias concepes de integrao e desenvolvimento. A estas
dificuldades se soma o alto grau de ideologizao que cerca as diferentes concepes de
desenvolvimento e integrao, que vo desde os defensores do modelo neoliberal, at
aqueles que desejam reincorporar formas de socialismo e Estado intervencionista,
passando por frmulas equidistantes de economia de mercado, supervisionada pelo
Estado.
Contra a instrumentalizao dos compromissos de integrao, h vrias vises e
entendimentos detectados sobre as relaes internacionais dos pases andinos, os quais
tm atuado tambm pela desqualificao do que vem sendo trabalhado pela integrao
econmica e comercial, em razo da integrao poltica e social no marco ps-liberal.
Diante crise na relao entre os membros da integrao andina exposto
anteriormente, o Conselho Andino de Ministros de Relaes Exteriores no foi
consultado para lidar com os problemas; o Parlamento Andino no conseguiu mediaras
dificuldades polticas; o Conselho Presidencial Andino tambm no voltou a se reunir
depois de realizar reunies interruptas durante anos; a Secretaria Geral tampouco
assumiu um papel efetivo de aproximao entre os pases. Um dos processos de
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integrao da Amrica Latina, caracterizado por deter um grau de institucionalidade
bastante avanado, encontra-se inoperante neste quadro.
A tendncia, nos ltimos anos, tem sido a interveno direta dos governos, cujas
lideranas desejam o protagonismo e controle do processo integracionista, debilitando
uma das principais caractersticas da integrao: a busca por consensos, com objetivo de
formar espaos amplos e compartilhados, e no com regresso defesa dos interesses
nacionais.
Entre os anos de 1999 e 2001, os pases membros intentaram definir uma Poltica
Exterior Comum (PEC), com a qual se aspirava atuar como bloco de diferentes relaes
internacionais assumidas naquele momento. Entretanto, as grandes diferenas nas
prioridades das relaes internacionais adotadas por cada um dos pases tornaram
impossvel a adoo da PEC, limitando-se s relaes e acordos bilaterais com pases
extra-bloco, perdendo a oportunidade de aproveitar um dos maiores instrumentos da
integrao: unir as foras do bloco para dispor de maior poder negociador.
A tendncia atual da CAN limitar a agenda a trabalhos de aspectos conflituosos,
dado animosidade existente entre seus membros nos ltimos anos. O perigo convert-
la em um processo superficial para no provocar mais discrdias, ainda que assuntos
como biodiversidade, minorias tnicas, participao da sociedade civil, sejam temas cada
vez mais relevantes agenda de integrao. As orientaes opostas dos governos, a
flexibilizao de uma agenda que no alcana consenso entre seus integrantes, parece
como frmula para evitar avanar em decises de difcil regresso.
A falta de viso, organizao poltica e empreendimento sistmico implica em
que os pases membros avanassem em caminhos diferentes durante a ltima dcada.
Embora este no seja um argumento suficiente para afirmar o esgotamento da CAN de
forma definitiva, como anunciou o governo venezuelano ao retirar-se do bloco, a
estagnao da vontade poltica e a capacidade de efetuar oportunamente correes para
retificar os rumos e consolidar a rota traada dificultam seu avano. O processo de
integrao pode se esgotar quando as ideias, vontades e capacidades de compreender sua
importncia e potencial de cooperao se findam em discursos pouco eloquentes.
As crescentes diferenas ideolgicas entre alguns dos membros, a falta de acordo
sobre a importncia de poltica externa comum e independente, multilateral e, portanto,
interdependente, trazem muitos impactos negativos integrao andina atual. A falta de
liderana em relao integrao econmica e poltica e o papel limitado das instituies
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supranacionais reforam a ineficincia do processo de integrao, reduzida em grande
medida ao campo retrico (MALAMUD, 2009).
CONSIDERAES FINAIS
Na ltima dcada, os governos latino-americanos contestaram as polticas
neoliberais identificadas ao regionalismo aberto e, por conseguinte, os projetos do
Mercosul e Comunidade Andina. O neoliberalismo e a globalizao so entendidos no
discurso de alguns atores de esquerda como sinnimos e coadjuvantes, representando a
ameaa constante do imperialismo e interveno estrangeira, que debilitam o Estado e
sua capacidade de promover o desenvolvimento. No regionalismo ps-liberal, em
termos polticos, existe um evidente distanciamento do Consenso de Washington,
sobretudo pela maior interveno do Estado, do fortalecimento da agenda social e
desenvolvimentista.
Ao mesmo tempo em que se intentou incorporar elementos do regionalismo ps-
liberal na tradicional integrao andina, desenvolveram-se outras iniciativas ps-liberais,
como a ALBA (de cunho mais radical e anti-hegemnico) e a Unasul (carter mais
reformista), alm de projetos que se mantm inspirados pelo regionalismo liberal, como a
Aliana do Pacfico. O surgimento desses novos projetos, de caractersticas ideolgicas
distintas, questiona a manuteno de um processo de integrao andino eficiente e com
alguma perspectiva de avano frente diversidade de modelos de insero internacional
e s novas concepes de integrao na Amrica Latina.
A anlise do desenvolvimento institucional da CAN e a percepo social em
relao a esse projeto de integrao denotam o descrdito funcional e societal da
integrao andina. A falta de um perfil de liderana de um ou de alguns Estados andinos
na integrao sub-regional, o baixo papel decisrio das instituies andinas
supranacionais, a predominncia dos interesses nacionais refletidos nas instncias
intergovernamentais, a dificuldade na articulao de posicionamentos externos e poltica
comercial comum, e o embate quanto ao relacionamento com os Estados Unidos so
alguns dos elementos os quais tm decretado, ao menos na prtica, a desestruturao da
integrao andina sob a gide da CAN ao longo do sculo XXI.
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Reflete-se, nesse sentido, em que medida inicia-se um processo de desintegrao
andina, no qual a CAN formalmente substituda ou, na prtica, entra em desuso (esta
ltima mais provvel) em detrimento de alternativas bolivarianas, sul-americanas ou
voltadas para as dinmicas da sia-Pacfico. Embora essas novas iniciativas estejam
mais preocupadas com os novos desafios no campo da integrao regional, no possvel
descartar plenamente o que foi construdo a partir do projeto da CAN desde o final dos
anos 1960. O desenvolvimento de padres comerciais comuns, de um sistema jurdico
comunitrio complexo e a constituio de um parlamento regional diretamente eleito
pelos cidados de praticamente todos os Estados-membros (somente a Bolvia indica
indiretamente seus parlamentares andinos) so algumas conquistas andinas as quais no
podem ser simplesmente extintas, pois representam verdadeiro avano na integrao
desses Estados e povos. Muitas crticas e dificuldades sofridas pela CAN, como o
questionamento quanto ao dficit de democracia e transparncia das polticas e das
decises regionais, podem ser tambm direcionadas aos projetos regionais ps-liberais ou
Aliana do Pacfico. Os sucessos e fracassos andinos tambm no devem ser
esquecidos no desenvolvimento de novos esquemas e modelos de integrao na regio.
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