Lusíadas
-
Upload
verbascripta -
Category
Documents
-
view
1.024 -
download
1
Transcript of Lusíadas
Os Lusíadas
Originalidade em relação às epopeias de modelo clássico
Apesar de se subordinar a um conjunto de
regras clássicas, Os Lusíadas não se limitam
a imitar o que os antigos tinham escrito. Os Lusíadas
apresentam traços de originalidade que os faz superar os
seus modelos, a saber:
1. A Veracidade
Os Lusíadas apresentam veracidade. O tema histórico que é cantado por
Camões é real, os factos aconteceram. Camões baseou-se num conjunto
de fontes históricas de grande rigor, para garantir a verdade histórica dos
acontecimentos que canta no seu poema. Isto não acontecia com as
grandes epopeias greco-latinas.
2. O Tipo de Herói
O herói das grandes epopeias clássicas é um indivíduo cujas
características de heroicidade o distinguem dos restantes mortais. O herói
da Ilíada é Aquiles, herói lendário da conquista de Tróia; o herói da
Odisseia é Ulisses, herói lendário grego; o herói da Eneida é Eneias, filho
de Vénus e Anquises. Os Lusíadas têm um herói colectivo: o povo
português, que é também um herói real.
O espírito renascentista do poema
A verdade de Os Lusíadas aparece não apenas no plano histórico. Camões
conhece, das viagens por mar, fenómenos da natureza desconhecidos na época: a
tromba marítima, os fogos de Santelmo, a tempestade; conhece povos, uma flora
e uma fauna diferentes; tem conhecimentos de astronomia e de geografia que não
forma aprendidos em livros. Camões tem “um saber de experiência feito” tão
importante para o homem do Renascimento.
Portanto, em Os Lusíadas, ao lado de
grande conhecimento e saber livresco,
encontramos um conhecimento novo
de carácter experimental, que não está
presente nas epopeias da Antiguidade.
E aí reside também a originalidade e
o carácter inovador do poema.
Uma outra característica renascentista
é o universalismo: Camões pretende
dar a conhecer ao mundo os feitos dos
portugueses, não se limitando a Portugal.
O espírito humanista do poema
O tempo do humanismo foi um tempo de descobertas: duma nova e antiga cultura;
do mundo; do próprio homem. O tema das descobertas é, por natureza, humanista.
Ora n’ Os Lusíadas, a descoberta é também a matéria-prima da epopeia.
Outras características humanistas presentes n’ Os Lusíadas são:
a) a esperança no futuro, no vento de renovação, na fé na capacidade humana de
superar as limitações.
b) a capacidade de realização do homem.
c) a vitória sobre a natureza adversa.
d) o alargamento indefinido dos limites do saber.
e) o direito a aspirar por um amor plenamente feliz.
f) a construção do próprio destino por parte do homem.
O Título: OS LUSÍADAS
O título revela desde logo que não se trata da narrativa dos feitos de um
herói individual, mas sim dos feitos de todo um povo, ainda que
representado simbolicamente por Vasco da Gama. E, embora o objectivo
principal seja o de dar conta da chegada dos portugueses à Índia, toda a
história da Nação portuguesa é narrada nos seus aspectos mais marcantes
pela voz de Vasco da Gama ao rei de Melinde, pelo que se reafirma a ideia
de bravura e coragem deste povo que agora faz esta descoberta. O facto de
o título apontar para um herói colectivo distingue também a epopeia
portuguesa, pois as epopeias greco-latinas exaltavam os feitos heróicos de
uma personagem individual.
Como surgiu o título? Lusíadas é um neologismo inventado por André de
Resende para designar os portugueses, que se imaginavam de acordo com a
erudição humanista, como descendentes de Luso, fundador mitológico do
nosso país. Resende criou-o por imitação de Virgílio que de Eneias formou “
Eneida” . Nada mais natural que Camões o tenha escolhido para título da sua
epopeia, já que o tema geral foi toda a história de Portugal.
Os Lusíadas enquadram-se dentro do movimento geral do Renascimento e
surgem da necessidade de fazer renascer o género épico e de contar os feitos
heróicos dos portugueses, principalmente a grandiosidade dos Descobrimentos,
que colocavam Portugal na aurora
de um novo mundo, abrindo
novas realidades e novas
dimensões de grandeza.
Génese da obra
Já em 1516, Garcia de Resende tentara restaurar este género clássico nas suas
poesias de conteúdo histórico existentes no Cancioneiro Geral. Aliás, o próprio
Garcia de Resende chama a atenção para a necessidade de se cultivar a poesia
épica, de modo a celebrar os grandes feitos do nosso povo; contudo, não se
achava capaz de tal proeza.
Também António Ferreira fala da necessidade de incentivar outros à criação de
epopeias.
Caberá a Camões esta árdua tarefa fazer ressurgir o género épico e de cantar o
valor dos portugueses, sentido já como capaz de vencer a fama de Grécia e de
Roma.
Fontes da obra
Fonte é tudo aquilo em que o poeta se inspira para escrever a sua obra.
Podemos considerar duas espécies de fontes:
•fontes literárias;
•fontes históricas.
As literárias:
Nacionais: Trovas à Morte de Inês de Castro, de Garcia de Resende;
Castro, de António Ferreira
Estrangeiras: Ilíada e Odisseia, de Homero;
Eneida, de Virgílio;
Divina Comédia, de Dante;
Orlando Furioso, de Ariosto.
As históricas:
Crónicas de D. Pedro, D. Fernando e D. João, de Fernão Lopes;
Crónicas, de Rui de Pina;
Crónica do Imperador Clarimundo e Décadas da Ásia, de João de Barros;
Crónica da conquista de Ceuta, de Zurara;
Tratado de Sphera, de Pedro Nunes;
(...)
Estrutura externa
Os Lusíadas estão divididos em dez cantos, cada um deles com um número
variável de estrofes que , no total, somam 1102. Essas estrofes são todas
oitavas; cada verso é composto por dez sílabas métricas - versos decassílabos –
com acento rítmico na 6ª e 10ª sílabas - versos heróicos, obedecendo ao
esquema rimático ABABABCC ( rimas cruzadas nos seis primeiros versos, e
emparelhadas nos dois últimos).
As / ar / mas / e os / ba / rões / a / ssi / na / la / dos1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
As armas e os barões assinaladosQue da Ocidental praia Lusitana,Por mares nunca dantes navegadosPassaram ainda além da Taprobana,Em perigos e guerras esforçadosMais do que prometia a força humana,E entre gente remota edificaramNovo reino que tanto sublimaram;
ABABABCC
Estrutura Interna
Os Lusíadas obedecem às regras do género épico, isto é,
constróem-se pela sucessão de quatro partes:
1. Proposição (apresentação do assunto)
Parte obrigatória, é constituída pelas três estrofes iniciais do Canto I. O poeta
expõe, em síntese, o que vai cantar ao longo da sua epopeia:
- os guerreiros e navegadores;
- os reis que dilataram a fé e o império;
- todos aqueles que pelas suas obras se imortalizaram.
2.Invocação (súplica da inspiração)
Camões pede às divindades inspiradoras
que o ajudem a cantar os feitos do povo
português.
Invocação n’ Os LusíadasCanto I, 4-5 Canto III, 1-2 Canto VII, 7-8 Canto X, 8-9
Às Tágides, ou ninfas doTejo, para que o ajudemna organização dopoema.
A Calíope, musa daepopeia e da História,porque estão em causaos mais importantesfeitos lusíadas.
Às ninfas do Tejo e doMondego, queixando-sedos seus infortúnios.
A Calíope.
3.Dedicatória (oferecimento da obra)
Nesta parte, Camões dedica o seu poema ao rei
D. Sebastião, que então governava Portugal, a
quem tece elogios e aconselha a prossecução da
obra de dilatação da fé e do império.
4.Narração (desenvolvimento do assunto)
Tem início no Canto I, estrofe 19, e termina no canto X. esta parte
constitui o corpo da epopeia, onde são narrados:
Passados: desde as origens de Portugal até ao reinado de D. Manuel IPresentes: viagem de Vasco da Gama ( acção central do poema)
Acontecimentos da Históriade Portugal
Futuros. Com base em profecias de deuses e sonhos deVasco da Gama e D. Manuel I.
Acções de entidades divinas Maravilhoso
Como era regra dos poemas épicos, a narração da acção central iniciava-se in
medias res, isto é, não desde o início temporal da acção, mas já a meio dos
acontecimentos.
Camões começa a Narração quando os navegadores já se encontravam no
Oceano Índico, e a parte inicial da viagem, entre Belém e Moçambique, é
narrada mais tarde, no Canto V, num processo de analepse.
Planos Narrativos
Os cantos constróem-se através da articulação de quatro planos narrativos:
Plano da Viagem: é o plano principal;
Plano do Maravilhoso: é um plano paralelo ao da viagem devido à
intervenção dos deuses na acção principal;
Plano da História de Portugal: é um plano encaixado no plano da
viagem. A História de Portugal é contada por Vasco da Gama ao rei de
Melinde, por Paulo da Gama ao Catual de Calecut e por entidades divinas
que vaticinavam feitos futuros dos Portugueses;
Plano das intervenções do Poeta: situam-se normalmente nos finais dos
Cantos e são constituídos por lamentações, reflexões e críticas do poeta.
Episódios
Um episódio é uma unidade narrativa menos extensa.
Camões introduz episódios de factos reais ou imaginários para
embelezar e conferir variedade à acção, tornando assim mais
agradável a leitura do poema.
• Episódios bélicos
Batalha de Ourique ( III, 42-54);
Batalha do Salado (III, 107-117);
Batalha de Aljubarrota (IV, 28-44)
•Episódios líricos
Formosíssima Maria (III, 101-106);
Morte de Inês de Castro (III, 118-135)
•Episódios simbólicos
Sonho profético de D. Manuel (IV, 67-75)
Velho do Restelo (IV, 94-104)
Adamastor (V, 37-60)
•Episódios naturalistas
Fogo de Santelmo (V, 18);
Tromba d’água (V, 19-22)
Tempestade (VI, 70-91)
• Episódios mitológicos
Consílio dos deuses no Olimpo (I, 20-41)
Consílio dos Deuses Marinhos (VI,19-35)
Narrador
CamõesNarra a viagem de Vasco da Gama desdeMoçambique até à Índia e toda a viagemde regresso.
Narrador principal
Vasco da GamaNarra a História de Portugal e a viagemdesde a partida do Restelo atéMoçambique.
Narrador secundário Paulo da Gama
Narra, em Calecut, ao Catual, umapequena parte da História de Portugal eexplica o significado das 23 figurasrepresentadas nas bandeiras, (Canto VIII)
* Fernão Veloso, no Canto VI, narra aos seus companheiros de viagem o episódio dos “Doze de Inglaterra”.
O Maravilhoso
N’ Os Lusíadas, temos o maravilhoso pagão e o
cristão.
A acção principal d’ Os Lusíadas é enriquecida
com a presença de deuses pagãos que funcionam
ora como adjuvantes ora como oponentes dos navegadores portugueses.
Enquanto cristãos, Vasco da Gama e a tripulação dirigem as suas súplicas e
preces aos Deus cristão.
Função da Mitologia
Constituir uma parte importante do maravilhoso inerente aos poemas épicos
em geral, obedecendo pois, a uma regra do género;
Assegurar a unidade interna da acção, pela criação de personagens activas e
“humanizadas” que se contrapõem a personagens humanas, monolíticas e, de
certo modo, “desumanizadas” que são os navegadores;
Embelezar, pela participação na intriga, uma narração de viagem que se
arriscava a tornar-se demasiado árida e “prosaica”;
Serem os deuses permanentemente autores de referências engrandecedoras
dos portugueses, nomeadamente na formulação de profecias;
Essencialmente, serem pólo de confronto permanentemente com os homens,
de modo a que seja evidenciada a supremacia destes últimos.