Mabasso, Eliseu 2012 ...Direito Positivo e Direito Costumeiro Nas Esquadras de Moçambique...
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Rev. Cient. UEM, Ser: Letras e Cincias Sociais, Vol. 1, No 0, pp 40-61, 2012
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Artigo original
Lngua oficial, direito positivo e direito costumeiro nas Esquadras
de Moambique: Um caso para a lingustica forense
Eliseu Mabasso
Faculdade de Letras e Cincias Sociais, Departamento de Lingustica e Literatura
Universidade Eduardo Mondlane, Moambique
RESUMO: O presente artigo resulta de uma investigao levada a cabo no mbito da lingustica
forense, tendo como grupos-alvo os Oficiais de Permanncia nas esquadras da polcia, indiciados,
ofendidos e declarantes. Recorrendo ao plano de investigao descritivo, em linha com a abordagem
etnogrfica, o estudo analisou algumas das estratgias lingustico-discursivas adoptadas pelos intervenientes nas esquadras. Uma das constataes a assinalar no presente artigo tem a ver com o
facto de a polcia, nas suas entrevistas, adoptar mtodos interaccionais fortemente influenciados por
elementos tradicionalmente usados para a resoluo de conflitos referimo-nos ao chamado Direito Costumeiro, que acaba por colocar desafios ao sistema de administrao da justia em geral,
oficialmente baseado em princpios do chamado Direito Positivo. A principal concluso a de que as
interaces entre os diferentes intervenientes nas esquadras da Polcia da Repblica de Moambique, como eventos comunicativos, decorrem em condies que envolvem a ocorrncia de estratgias
lingustico-discursivas muito particulares, como por exemplo, a alternncia de cdigo (code switching)
e a transferncia negativa da lngua materna (interferncia).
Palavras-chave: Estratgias Lingustico-Discursivas, Polcia, Direito Positivo, Direito Costumeiro.
Official language, written and customary laws in Mozambican
Pricincts: A case for forensic linguistic
ABSTRACT: The present article results from a study on forensic linguistics. The target populations were on-duty officers indicted individuals, defendants and witnesses in police stations. The study uses
a descriptive research methodology in line with the ethnographic approach and analyzes some of the
linguistic discourse strategies adopted by the participants in police precincts. One of the main findings shows that when interviewing the police adopts highly and interactionally influenced traditional
methods used to resolve conflicts, i.e. Customary Law. This results in challenges to the justice system
in general, which is officially based upon the principles of the so called Written Law. The main
conclusion of the study is that the interactions between the different participants within a police precinct of the Police Corporation of the Republic of Mozambique do take place in conditions that
involve the occurrence of very peculiar linguistic discourse strategies, such as code switching and
negative transference (interference) of the mother tongue.
Keywords: linguistic and discursive strategies, police officers, written law, customary law
______________________________
Correspondncia para: (correspondence to:) [email protected]
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E Mabasso
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INTRODUO
Moambique um pas multicultural e
com uma elevada diversidade lingustica
mdia, se adoptarmos a classificao
estabelecida por Robinson (1993, p. 52).
De acordo com este autor, a elevada
diversidade lingustica observa-se numa
situao em que [] uma percentagem no superior a 50% da populao fala a
mesma lngua. Esta situao pressupe que o grau de diversidade lingustica
calculado no a partir do nmero total de
lnguas faladas num determinado pas mas
sim em termos da percentagem da
populao que fala a lngua tomada
singularmente (IBIDEM). Assim, de todas
as lnguas bantu faladas no pas (cerca de
20) o Emakhwa (25.6%) e o Xichangana
(11.3%) representam duas das lnguas com
o maior nmero de falantes. Ao ter em
conta estas percentagens, estamos perante
uma situao em que nenhuma das lnguas
moambicanas se aproxima da fasquia dos
50%, percentagem fixada como referncia
por Robinson. O Emakhwa, lngua que
apresenta a maior percentagem de falantes,
coloca Moambique numa posio bem
abaixo do meio da tabela, da que se
considera o pas como de elevada
diversidade lingustica mdia. Isto coloca o
pas no conjunto dos 25 pases que tm a
maior diversidade lingustica no continente
africano.
POLTICA LINGUSTICA EM
MOAMBIQUE
Segundo Lopes (1997a), nem a
Constituio de Moambique, adoptada em
1975, nem a
sua verso revista de 1990 apresentam, nas
suas clusulas, uma referncia poltica de
lngua em Moambique. Na verdade, nem
mesmo a verso actualizada da
Constituio da Repblica publicada em
2004 e resultante
de algumas alteraes decorrentes dos
ltimos desenvolvimentos na vida scio-
econmica e poltica do pas, trouxe algum
dado adicional sobre a poltica de lngua
possvel para Moambique, como se pode
observar no disposto no artigo 9 da
constituio, sobre as lnguas nacionais:
O Estado valoriza as lnguas nacionais
como patrimnio cultural e educacional e promove o desenvolvimento e
utilizao crescente como lnguas
veiculares da nossa identidade (REPBLICA DE MOAMBIQUE.
CONSTITUIO, 2004, p. 7).
e no artigo 10, sobre a Lngua Oficial:
Na Repblica de Moambique a lngua
portuguesa a lngua oficial
(REPBLICA DE MOAMBIQUE. CONSTITUIO, 2004, p. 7).
Ao observar e interpretarmos estes dois
Artigos, deparamos com uma situao, em
que, por um lado, o papel das lnguas bantu
no claramente indicado, remetendo-as
para um domnio mais vago, em que o seu
papel limitava-se a ser veculo de
transmisso dos valores culturais e
educacionais e, por outro, uma indicao
explcita de que a nica lngua oficial o
Portugus.
Face a um tal cenrio, vrias so as
questes passveis de serem levantadas,
principalmente no que toca ao direito dos
moambicanos poderem expressar-se na
sua lngua materna. Estamos perante uma
situao em que o Governo moambicano
recorreu estratgias muito enraizadas a
nvel do continente africano que a
estratgia de evitao. A evitao ,
segundo Bamgbose (1991), uma tcnica
adoptada pela maior parte dos pases
africanos, caracterizada pelo facto de livrar
os governos das consequncias polticas
desagradveis que qualquer
pronunciamento sobre a poltica de lngua
pode provocar em certos segmentos da
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populao. Contudo, a ausncia de uma
declarao no significa ausncia de uma
poltica (IBIDEM). Como sinal disso, na
maior parte dos casos, os pases que
embarcaram nesta estratgia acabam por
implementar a poltica do pas ex-
colonizador. Moambique enquadra-se
perfeitamente nesta categoria, uma vez
que, at o momento, no existe uma
poltica de lngua mais clara, uma poltica
que, mesmo de forma implcita, no
impea o uso das lnguas bantu para fins
oficiais. O facto de, at ao presente
verificar-se uma notvel resistncia por
parte dos detentores do poder poltico de
definir uma poltica de lngua mais clara e
inclusiva faz com que alguns autores,
Lopes (1997b), por exemplo, considerem
que falar do assunto no contexto poltico
moambicano seja um tabu.
Afigura-se-nos pertinente referir que, a
partir do incio dos anos 80, com o
desenvolvimento da Lingustica, em geral,
e da Lingustica Aplicada, em particular,
uma nova rea passou a subsidiar a
Lingustica Aplicada na soluo de
problemas de lngua e no combate ao
crime por meio do uso da linguagem a Lingustica Forense. A Lingustica Forense
definida de formas diferentes. Todavia,
os autores convergem no que se refere
interaco entre a linguagem, a lei e o
crime na construo das suas definies.
A linguagem como base para a
construo da Lei
Desde os tempos remotos, altura em que o
homem se transformou num animal
gregrio, caracterstica que veio diferenci-
lo dos outros animais, este comea a viver
uma nova etapa na sua evoluo, i.e., a
transformao de uma vida nmada para
uma vida sedentria. Porm, esta nova fase
implicou, de entre outros aspectos, a
necessidade de se estabelecerem princpios
e normas de convivncia na sociedade.
Estas normas e princpios tinham como
pressuposto a definio do mal e do bem
dentro do sistema de valores vigente para
cada sociedade. Assim, cada membro da
sociedade passou a viver dentro de um
sistema regido por normas que vo desde
os direitos e deveres s obrigaes perante
os outros membros do grupo.
Uma das consequncias evidentes do
estabelecimento de um sistema de normas
e valores numa dada comunidade a
inevitvel existncia de membros que
podero infringir esses princpios. No
contexto africano existiram (e existem at
aos nossos dias) formas de base tradicional
adoptadas para punir o mal o chamado Direito Costumeiro, sobre o qual falaremos
mais adiante. Gibbons (1994), na
introduo sua obra Language and the
Law, fazendo referncia linguagem como
mecanismo usado para a construo da lei,
diz o seguinte:
Os conceitos bsicos dos direitos e obrigaes de um membro de uma
comunidade esto profundamente
inseridos na estrutura da prpria lngua e
existiram antes de as leis serem codificadas. Alm disso, os conceitos
que actualmente constroem os sistemas
legais tais como culpado e assassino encontram-se ao nosso dispor atravs do
cdigo da lngua. Existe, ento, um
sentido muito importante da forma como
a lngua constri a lei []. (GIBBONS, 1994, p. 3 Traduo Livre1)
A terminologia usada no contexto das
esquadras e tribunais tal como indiciado vs ofendido e arguido vs queixoso -nos familiar porque chegou at ns por via
da lngua, muito embora os seus referentes
sejam de longe anteriores aos lexemas que
os representam. Estas designaes
aparecem como ferramenta para reforar a
lei que foi concebida como tentativa para
controlar o comportamento humano
atravs da aplicao de medidas punitivas
aos infractores (GIBBONS, 1994). O autor
faz referncia a dois aspectos importantes
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no domnio legislativo: o cdigo legal,
designado no para abarcar um aspecto
especfico do comportamento humano,
mas sim um conjunto de comportamentos
relacionados em situaes de mbito
delimitado. Por outro lado, os
procedimentos legais tm a ver com a
testagem da aplicabilidade das
generalizaes encontradas no cdigo legal
para casos particulares. Comentando sobre
o papel da lngua como elemento central
no funcionamento do aparelho judicial,
Gibbons (1994) afirma que:
[] os julgamentos so eventos lingusticos. A lngua o aspecto central para o Direito e este, tal como o
conhecemos, inconcebvel sem a
lngua. Muitos juristas orgulham-se pelo domnio que tm da lngua e encaram-no
como uma habilidade importante para os
profissionais da rea. (GIBBONS, 1994, p. 3 Traduo Livre2).
luz da passagem acima, podemos
depreender que, de facto, todo o processo
que envolve um caso, seja ele de natureza
cvel ou criminal, conduzido atravs da
lngua. Por outras palavras, o processo que
vai desde a produo dos Autos de
Denncia nas esquadras da polcia at
leitura da sentena no tribunal no seria
possvel sem que a lngua fosse o elemento
central. Portanto, no seria possvel falar
na existncia e aplicao de um sistema
legal nos moldes modernos sem que tal
exerccio ocorresse fundamentalmente por
via da lngua. Os prprios actores no
processo judicial tm-se preocupado, em
larga medida, em melhorar as suas
capacidades de saber, o melhor possvel,
interpretar as leis e persuadir os seus
interlocutores atravs do uso de uma
retrica que seja adequada e convincente.
Este exerccio socorre-se sobretudo do
bom uso e domnio adequado da
linguagem.
O sistema legal Romano, Romnico-
Germnico e o Direito Costumeiro
Desenvolvido pelos antigos romanos, o
Sistema Romano constitui base legal para
vrios pases europeus. Por consequncia,
no caso concreto dos pases africanos,
estes acabaram por herdar este sistema por
via do passado colonial. O mesmo
fenmeno extensivo a pases da Amrica
e sia e Esccia. Segundo Gibbons3, no
Japo e na China h uma co-existncia
entre formas mais tradicionais de controlo
social (Direito Costumeiro) - em que a
resoluo de conflitos se baseia na
discusso e compromisso e confisso em
hasta pblica e variantes do Direito Romano.
Um dos aspectos que aproximam, em
grande medida, o Sistema Legal Romano
do Sistema Legal Comum o facto de
haver presuno de inocncia, i.e., o ru ou
arguido inocente at prova em contrrio.
Todavia, os procedimentos no tribunal
diferem dos procedimentos aplicados no
Sistema Legal Comum a vrios nveis de
actuao. No obstante o sistema romnico
apresenta muitas caractersticas que, do
ponto de vista dos procedimentos
lingustico-discursivos, assemelham- se
aos do Sistema Legal Comum.
O Sistema Legal Romano-Germnico teve
o seu surgimento na Europa ocidental, com
o ressurgimento do direito romano entre os
sculos XII e XIII. o sistema vigente em
toda a Europa ocidental, excepo do
Reino Unido, que funciona sob moldes do
chamado Common Law. De modo similar,
o sistema romano- germnico aplicado na
Amrica Latina, e em pases como a
Repblica da frica do Sul e Repblica de
Moambique. A base do seu
funcionamento a predominncia do
direito positivo, i.e., a lei. Por outras
palavras, neste sistema vigora o direito
escrito, em que a lei considerada a fonte
principal e quase exclusiva do direito. Um
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outro aspecto a reter sobre este sistema
legal tem a ver com o facto de o jurista ter
uma tarefa interpretativa, em que tem a
obrigao de descobrir o que a lei pretende
que seja feito.
O Direito Costumeiro constitui base para o
estabelecimento da ordem e sancionamento
de prticas consideradas ilcitas,
principalmente em sociedades de base
tradicional. Tal como fizemos referncia
acima, o Direito Costumeiro apresenta
caractersticas que o distanciam de outros
sistemas legais a vrios nveis da sua
actuao. Gluckman (1966) a esse
respeitocomentando sobre este sistema
legal disse o seguinte:
Ficou estabelecido que o direito
costumeiro africano, semelhana de
qualquer sistema legal, consiste em diferentes tipos de princpios, normas e
regras. Alguns desses princpios e regras
estabelecem princpios gerais e
abrangentes sobre a moralidade e a poltica pblica para constituir um
quadro ideolgico de justia
aparentemente duradoiro. Tais princpios de conotao abrangente,
estabelecidos em termos multivocais e
abrangendo muitos aspectos num vasto leque de aces, so flexveis e
adaptveis a condies e padres
mutveis (GLUCKMAN, 1966, p. 9 Traduo Livre
4).
Os valores morais desempenham um papel
preponderante neste sistema legal e estes
variam de acordo com os princpios
estabelecidos em cada comunidade.
Alguns estudos realizados sobre o Direito
Costumeiro em frica indicam que a
adaptao pode ser fcil em algumas reas
e difcil em outras. Alis, esta
particularidade igualmente caracterstica
dos outros sistemas legais, principalmente
quando os juzes so obrigados a exercer a
sua funo sob constantes necessidades de
ajustamento e adaptaes decorrentes de
mudanas em polticas pblicas e at
mesmo em relao aos valores morais.
No que diz respeito ao procedimento e
produo de provas, o processo judicial no
contexto tradicional africano caracteriza-
se, de entre outros aspectos, pela (i)
simplicidade e ausncia de formalidades;
(ii) confiana em modos no racionais de
produo de prova e tomada de deciso;
(iii) o facto de as partes, de onde se
incluem os prprios juzes, poderem estar
envolvidas em relaes mltiplas e
complexas fora do domnio dos tribunais e
o facto de que tais relaes so anteriores
ao caso e que continuam aps o seu
desfecho poderem influenciar a forma
como o processo de recolha de
depoimentos conduzido; (iv) a existncia
de uma abordagem de resoluo de litgios
com base no senso comum e no
fundamentada do ponto de vista legal; (v)
o desejo subjacente de promover a
reconciliao das partes e no o de fazer
uma deliberao de base legal sobre o
assunto que levou as partes ao tribunal; e
(vi) o papel da religio e crenas em rituais
e prticas na determinao da
responsabilidade criminal (GLUCKMAN,
1996).
Estratgias de Comunicao
O presente trabalho tem como pano de
fundo a identificao e anlise de algumas
estratgias de comunicao, com recurso a
Tarone, Cohen e Dumas (1983). Os
restantes elementos integrantes da cadeia
discursiva so incorporados dentro do
contexto das estratgias de comunicao
analisadas. Algumas das principais
estratgias de comunicao susceptveis de
ocorrer no contexto das relaes inter-
comunicacionais que caracterizam os
tribunais, em geral, e as esquadras da
polcia, em particular, so (i) a
transferncia a partir da lngua materna,
(ii) a sobregeneralizao e padro pr-
fabricado e (iii) a sobre-elaborao.
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Estratgias de Coeso Textual
No que diz respeito s estratgias de
coeso textual adoptamos, por uma lado, a
linha seguida por Halliday e Hasan (1976),
autores que defendem uma perspectiva
mais formal para explicar a relao entre
os elementos textuais e o que autores como
de Beaugrande e Dressler (1981) chamam
textura. Aqui fazemos apelo a estratgias de coeso como a referncia e a conjuno.
Numa outra perspectiva, procuramos
interpretar as relaes de coeso e
coerncia luz dos pressupostos
defendidos por alguns precursores da
psicologia cognitiva tais como Carrell
(1983); Carrell e Eisterhold (1983);
(Widdowson, 1978); 1983), entre outros.
Estes autores defendem uma perspectiva
em que a compreenso de um texto vista
no em funo do texto em si, uma vez que
este no transmite s por si o
conhecimento que se pretende transmitir.
Assim, a compreenso do texto, segundo
esses autores, consiste num processo
interactivo entre o conhecimento por via da
experincia da vida (background
knowledge) do ouvinte/leitor e o texto em
si. Esta forma de estruturar o
conhecimento tambm conhecida por
schema. Por definio, os schemata (plural
de schema) so construes cognitivas que
permitem a organizao de informao
numa memria a mdio e longo prazo e
que constituem a base para a previso
humana.
Relao com a Teoria de Lexical
Priming
Trata-se de uma teoria relativamente nova
que vem operar uma reverso na relao
entre as palavras, e entre o lxico e a
gramtica. Tradicionalmente, a relao
entre o lxico e a gramtica foi
normalmente vista como um fenmeno em
que a gramtica surge em primeiro plano e
as palavras so lanadas nos espaos a
criados, ou tambm que a semntica
aparece na parte superior da hierarquia e o
lxico que actualiza a semntica.
Segundo o autor, o lxico est estruturado
de uma forma complexa e sistemtica e a
gramtica resulta dessa estrutura.
Hoey procura explicar a perversidade da
co-ocorrncia lexical como um processo
psicolgico e como justificao plausvel
para explicar o surgimento de co-
ocorrncias lexicais pouco comuns referimo-nos aos casos em que certas
palavras aparecem a fazer combinaes
com outras palavras em ambientes considerados pouco usuais. Este fenmeno,
segundo Hoey, pode ser explicado apenas
se olharmos para a co-ocorrncia lexical
como um processo psicolgico. Para tal, a
melhor designao para a co-ocorrncia
lexical, na ptica do autor, seria a de
priming (marcao psico-lingustica).
Relao com a Estrutura Temtica e de
Informao
Na comunicao quotidiana, em geral, e no
contexto das esquadras da polcia, em
particular, podem ocorrer instncias
discursivas que, no sendo incorrectas do
ponto de vista da gramtica do falante do
PM (Portugus Moambicano), podem ser
formulaes infelizes do ponto de vista da
sua formulao discursiva por parte de
falantes nativos. Para os objectivos do
presente trabalho colocamos o enfoque da
nossa anlise (i) na estrutura de informao
e (ii) na estrutura temtica e sua relao
com a estrutura de informao para
verificarmos o impacto no processamento
global da informao.
Em primeiro lugar, importa recordarmos
aqui as definies das noes de tema e
rema. A definio que se nos afigura mais
adequada a definio proposta pela
Escola Lingustica de Praga por ser a mais
adequada e a que levanta menos confuso
em linha com a posio de Lopes (2004).
A Escola de Praga analisa o fenmeno da
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lngua em termos da sua funo,
preocupando-se em ultrapassar as
fronteiras da descrio e da explicao dos
fenmenos lingusticos, caracterstica
tpica de vrias escolas da altura, como a
Escola Americana. Os precursores desta
Escola preocupam-se no apenas em
descrever as lnguas mas sobretudo em
explicar a razo por que as lnguas se
apresentam tal como se apresentam
(Sampson, 1980). De acordo com Firbas
(1964), citado em Lopes (2004), e que foi
um dos primeiros linguistas checos a fazer
uma descrio sobre a estrutura temtica,
com base na Perspectiva Funcional da
Frase (Functional Sentence Perspective)
(FSP), o tema o elemento que portador de menor grau de Dinamismo
Comunicativo (CD) e o rema o elemento que transmite a parte da
informao mais dinmica. Estas
formulaes pressupem que existem
outras definies para as dicotomias em
apreo, como o caso da que foi apresentada
por Halliday (1985, p. 38), como sendo o elemento que serve de ponto de partida da
mensagem. o elemento com que a orao
se ocupa. O mesmo autor acrescenta ainda que nos casos em que o sujeito
aparece depois do predicado, o tema um elemento textual que precede esse
predicado. Relativamente ao rema, Hoey (2005, p, 52), apresentando uma definio
simples, considera este elemento como
sendo tudo o que ocorre depois do sujeito num enunciado.
METODOLOGIA
Optmos por adoptar uma metodologia
com pouca ou mesmo nenhuma
manipulao dos dados por parte do
investigado, com base no mtodo
etnogrficor. Uma das grandes vantagens
do mtodo etnogrfico reside no facto de
os dados serem recolhidos num ambiente
natural, o que pressupe a existncia de um
grau de explicitude baixo e a formulao
de objectivos heursticos/sintticos.
Um aspecto bastante fundamental a ter em
conta o facto de o nosso estudo incidir
sobre um fenmeno passvel de anlise a
vrios nveis, facto que justifica a
interligao entre os pontos tratados na
discusso dos resultados. Assim, tendo em
conta que o nosso maior enfoque incidia
sobre a identificao de estratgias
lingustico-discursivas, procurmos
delimitar segmentos discursivos que
apresentassem tais estratgias, agrupando-
as de acordo com vrias categorias. Deste
modo, as estratgias surgem como se se
tratasse de um superordenado a nvel do
segmento discursivo e os outros elementos
lingusticos se subordinassem a essas
estratgias.
Recolha de dados
Para a recolha de dados, seleccionmos um
total de quatro (4) esquadras, duas das
quais com caractersticas muito especiais,
pelo facto de se localizarem junto a dois
grandes hospitais da Capital,
nomeadamente a 5. Esquadra da PRM,
situada junto ao Hospital Central de
Maputo (HCM); e a 18. Esquadra,
localizada junto ao Hospital Geral Jos
Macamo (HGJM). Por outro lado,
escolhemos duas esquadras que respondem
pela manuteno da Lei e Ordem em
alguns bairros mais populosos da cidade: a
6 Esquadra, que abrange os bairros da
Malhangelene, parte do Bairro da
Mafalala, Alto-Ma, Xipamanine e Bairro
Central, e a 12. Esquadra, que cobre
algumas zonas pertencentes ao extenso
distrito municipal kaMaxakeni, Polana-
Canio e Mavalane.
As entrevistas que funcionaram como pano
de fundo para a constituio dos dados
foram conduzidas pelo Oficial de
Permanncia destacado e o nico momento
em que o investigador interferia era
quando se tratava de recolher informao
sobre dados scio-culturais e lingustico-
discursivos. Destaca-se o facto de, nalguns
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casos, a audio ter sido feita por mais de
um Agente. As respectivas entrevistas, de
uma forma geral, caracterizavam-se por
momentos em que eram semi-abertas e, em
algumas fases, passavam a ser mais
abertas.
Um aspecto que merece algum realce
sobretudo por ter constitudo grande
dificuldade no processamento dos dados
tem a ver com a fase que se seguiu
recolha dos dados, concretamente, o
chamado verbatim transcript. Uma vez que
o registo de entrevistas apenas podia ser
presencial, vimo-nos na obrigao de
contratar alguns peritos em transcrio
para executarem o trabalho. Um dos
problemas que estes enfrentaram no
exerccio da sua tarefa prendeu-se com a
qualidade de gravao em algumas
cassetes, para alm do fraco domnio da
ortografia das lnguas bantu em uso, uma
vez que a maior parte dos intervenientes,
tinham o Xichangana como sua L1 e que,
vezes sem conta, recorreram alternncia
de cdigo (code switching) como estratgia
lingustica.
Caractersticas Gerais dos Sujeitos
Os nossos sujeitos so indivduos de
ambos os sexos que, de uma forma geral,
apresentam um nvel de proficincia
lingustico-discursiva em lngua
portuguesa baixo. Coincidentemente,
Sujeitos com estas caractersticas
constituem o segmento da populao mais
vulnervel e que se apresenta com
dificuldades notrias do ponto de vista
lingustico e do discurso quando responde
em entrevistas sobre casos de natureza
criminal nas esquadras de Maputo.
De um modo geral, esses Sujeitos so
indivduos com idades compreendidas
entre os 14 e os 44 anos, maioritariamente
pobres e provenientes do meio suburbano.
Na sua maioria, no tm antecedentes
criminais e muito menos experincia sobre
como funcionam as esquadras
relativamente ao procedimento conducente
produo dos Autos. O nvel de
escolarizao vai da 4 classe do sistema
antigo de educao ao nvel superior.
Naturalmente, grande parte dos nossos
interlocutores tem nveis de escolarizao
que se situam ao nvel do ensino primrio
do 1 e 2 graus. O Xichangana a lngua materna predominante, embora apaream
alguns intervenientes a falarem uma
mistura desta lngua e Xironga, sendo que
o Portugus constitui a L2 para a quase
totalidade destes Sujeitos.
Natureza dos casos
Os casos que concorreram para a recolha
dos dados desta investigao tm a
particularidade de serem de carcter
sumrio, e tanto o ofendido como o
indiciado encontravam-se presentes. So
crimes considerados simples, os crimes
cuja moldura penal inferior a dois anos
efectivos (GONALVES, 1972) e que, em
muitos casos, podem ser directamente
encaminhados ao tribunal. Contmos,
tambm, com alguns casos de acidentes de
viao em que as partes envolvidas
fizeram-se presentes esquadra, no
obstante termos a conscincia destes no
serem classificados como ilcitos criminais
de facto e que acabam por ser devidamente
deliberados ao nvel da Polcia de Trnsito.
RESULTADOS E DISCUSSO
Estratgias na Perspectiva da Coeso e
Coerncia
Os fragmentos discursivos que a seguir
sero apresentados foram extrados das
nossas entrevistas gravadas nalgumas
esquadras da cidade de Maputo e
transcritas para efeitos do presente estudo.
Trata-se, porm, de formulaes infelizes
do ponto de vista do falante nativo do
Portugus e que mereceram alguma
ateno e despertaram algum interesse por
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nossa parte. Pretendemos, a este nvel,
colocar o enfoque da nossa anlise na (i)
estrutura de informao e (ii) na estrutura
temtica e a sua relao com a estrutura de
informao.
Enfoque na Estrutura Temtica e sua
Relao com a Estrutura de Informao
O pano de fundo da nossa anlise tem a ver
com o pressuposto de que, apesar dos
nossos Sujeitos produzirem enunciados
gramaticalmente correctos do ponto de vista microlingustico, quer como lngua
segunda, quer mesmo como lngua
materna, cometem, no entanto,
infelicidades discursivas do ponto de vista,
no apenas do PM, mas tambm do PE.
(1) Ofendido: Ele pediu dinheiro para comprar material, eu dei, t ver no
? Eu dei um na nana essa bomba que dois milhes, a outra
[ele] foi dado um milho e meio.
(2) Agente: Devia ter informado l. Sabe que esto a falhar? Deviam ter informado l no lar dela. Sim, a
nossa filha, ou a vossa nora est na
minha casa porque teve acidente, no sei de quevo explicar, foi agredida no sei o quet doente uma coisa clara. Ela foi batida, no uma coisa para
esconder!
Os fragmentos acima apresentados so
transcries de entrevistas abertas
conduzidas por um Agente da Lei e
Ordem, envolvendo indiciados e/ou
declarantes. Se, por um lado, verdade que
o nvel de escolaridade, quer dos Agentes
da Lei e Ordem quer dos indiciados , de
uma forma geral, baixo ou mesmo abaixo
de uma mdia que seria considerada
aceitvel, so infelizes do ponto de vista do
falante nativo do PM ou do PE.
No segmento em (1) o elemento
subentendido e que aparece destacado ele
o tema, o elemento portador de menor
grau de Dinamismo Comunicativo (DC) e
o segmento foi dado um milho e meio o
rema, portanto, o elemento que portador
do grau mais elevado de DC. O primeiro
segmento com a funo de SN j tinha sido
anunciado no discurso, o que pressupe
que constitui informao dada, de acordo com a estrutura informacional. Porm,
sendo a principal funo discursiva das construes passivas a de colocar um
elemento dado em posio de enfoque (LOPES, 2004, p. 190), o sujeito
enunciador coloca o referido SN na
primeira posio. Como se pode
depreender, o que torna o segmento infeliz
do ponto de vista discursivo no nos
parece estar relacionado com a
interpretao dos elementos em termos de
estrutura temtica ou de informao, uma
vez que foi dado um milho constitui, de
facto, a informao mais dinmica, no
obstante, existir algum lao coesivo
[valores monetrios pagos pela aquisio
das bombas] entre este e os dois milhes
anteriormente anunciados no discurso.
O que na verdade torna a construo em
anlise infeliz do ponto de vista da norma
europeia do Portugus o facto de as
propriedades de seleco do verbo dar, que
o elemento de transio no segmento
remtico, no permitirem a ocorrncia da
referida passiva. Por outras palavras, uma
construo activa seria, neste caso, mais
adequada: Em relao segunda bomba,
paguei-lhe um milho e meio. Deste modo,
no se perde, de forma nenhuma, o estatuto
de informao mais dinmica e
salvaguarda-se a gramaticalidade do
segmento. Neste caso, em relao
segunda bomba, seria o tema e, por
coincidncia, a informao dada e paguei-
lhe um milho seria o rema, do ponto de
vista da estrutura temtica e a informao
nova do ponto de vista da estrutura
informacional. Alternativamente, uma
sequncia do tipo paguei-lhe um milho e
meio pela segunda bomba resolveria o
problema e tornaria igualmente o
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enunciado feliz, com a insero do item lexical pela no segmento que portador de
menor grau de Dinamismo Comunicativo.
verdade que o segmento que na
sequncia anterior era portador do grau
mais elevado de DC foi deslocado da sua
posio inicial atravs de regras ao nvel
da topicalizao, passando a desempenhar
o papel de tema sem perder tal funo. Este funcionamento da dicotomia
tema/rema em moldes diferentes da
sequncia habitual ocorre com frequncia
em sequncias marcadas (LOPES, 2004).
No tocante sequncia transcrita em (2)
Ela foi batida, no coisa para
esconder, Ela foi batida o tema, mas
tambm nesse contexto a informao nova,
a que portadora do grau mais elevado de
DC. Esta disposio em que o elemento
mais remtico aparece como tema deve-se
ao facto de o sujeito enunciador ter
colocado em posio de enfoque a
informao com o estatuto mais remtico.
Esta informao, segundo o previsto na
frase, efectivamente a mais dinmica
pois, olhando para a sequncia em que ela
se insere no discurso, a que mais
contribui para o desenvolvimento da
mensagem. Ora, numa sequncia no
marcada, se salvaguardarmos os elementos
acima referidos, teremos uma frase
hipottica no coisa para esconder (que)
ela foi batida. Aqui a informao que
portadora do grau mais elevado de DC,
passa a ocupar o lugar reservado para o
elemento com o estatuto mais remtico, o
lugar, portanto, previsto em sequncias no
marcadas. O que torna tanto a primeira
quanto a segunda sequncia infelizes tem a
ver com as propriedades de seleco do
verbo bater. Autores como Gonalves (1990) fizeram um estudo exaustivo sobre
movimentos sintcticos do PM em que se
procurava apresentar uma explicao sobre
os processos que levam transitivizao de um verbo que, pelas propriedades de
seleco, no pode aceder passiva no PE.
Esta caracterstica de muitos verbos no
PM, segundo a autora, tem como principal
porta de entrada a gramtica das lnguas bantu, L1 da maior parte dos falantes do
Portugus moambicano, atravs de regras
de movimento. Tomemos o seguinte
exemplo, que seria o equivalente na
sequncia em anlise em Xichangana, uma
lngua bantu do grupo Tsonga falada no sul
do pas:
(3) Yena abiwile, ayisvilu svakufihliwa
(Lit:Ela foi batida, no coisa para esconder)
Na sequncia marcada acima em
Xichangana, vlida a mesma explicao
apresentada para a verso do PM
relativamente ao funcionamento da
combinao das dicotomias tema/rema e dado/novo. Por outras palavras, yena abiwile de facto o tema, mas, porque transporta o grau mais elevado de
Dinamismo Comunicativo, a informao
nova. O mesmo se pode dizer em relao
ao segmento ayisvilu svakufihla, que o rema e simultaneamente a informao
dada. Todavia, a diferena prende-se com
o facto de no Xichangana no ocorrer
nenhuma infelicidade discursiva, pois a
passiva patente no primeiro segmento seria
feliz nesta lngua.
Finalmente, para o caso da infelicidade no
segmento em Portugus, a estratgia seria
a opo por um verbo transitivo que
pudesse salvaguardar a mensagem que o
sujeito enunciador pretende transmitir. Um
exemplo seria ela foi espancada, no
coisa para esconder ou, no caso do
correspondente no marcado, teramos o
segmento no coisa para esconder (que)
ela foi espancada. Os pressupostos tericos
aqui tratados aplicam-se aos restantes
segmentos acima apresentados, uma vez
que as propriedades de seleco dos verbos
dar e bater apresentam considerveis semelhanas.
Analisando os mesmos segmentos tendo
em conta a teoria de Hoey (2005) sobre os
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priming coligacionais de certos itens,
podemos depreender que certos verbos,
quando associados a certas unidades
lexicais, do ponto de vista semntico,
produzem um priming negativo, pelo
menos luz da norma europeia do
Portugus. O padro a produzido resume-
se da seguinte forma:
Aux [ser]-dar/bater [part. pasd]
Os segmentos que estabelecem associaes
semnticas acima analisados podem ser
destacados da seguinte forma:
(i) a outra [ele] foi dado um milho e meio.
(ii) () Ela foi batida, no uma coisa para esconder!
Cada um dos verbos acima, nomeadamente
dar e bater cria ninhos que os circundam como resultado da propriedade
de criatividade que caracteriza o priming
(HOEY, 2005). Ora, dadas algumas
restries que as associaes semnticas
da resultantes podem sofrer em virtude
dos falantes da variedade europeia do
Portugus terem provavelmente resistido a
estabelecer ligaes susceptveis de
produzir ninhos aceitveis ao longo da histria da lngua, as combinaes em
apreo teriam uma percentagem de
ocorrncia muito abaixo da mdia. Por
outras palavras, se trabalhssemos com
uma base de dados mais representativa,
certamente que teramos uma percentagem
de ocorrncia de tais associaes
semnticas prxima de zero. Como
bvio, tal juzo seria feito em funo do
nvel de proficincia em lngua portuguesa
por parte dos que produzem o respectivo
priming (marcao psico-lingustica).
Todavia, o cenrio acima descrito j no se
observa no caso particular do PM, uma vez
que, nesta variedade do Portugus, as
associaes semnticas acima ocorrem
com maior frequncia. Por outras palavras,
para os falantes do PM, os verbos em
anlise estabelecem um priming com os
elementos que os circundam nos
segmentos em que ocorrem, o que vai
explicar a posio de alguns linguistas,
entre eles Gonalves (1990), para quem
estas associaes semnticas, que resultam
em construes estranhas norma europeia do Portugus constituiro, muito
provavelmente, parte integrante da futura
variedade moambicana.
Enfoque da Anlise no mbito dos
Moambicanismos
Os dados recolhidos apresentam um vasto
leque de entradas que podemos integrar no
mbito de um possvel projecto de criao
de um lxico da futura variedade do
Portugus moambicano, na linha do
Lxico de Usos concebido por Lopes,
Sitoe e Nhamuende (2002), segundo os
quais trata-se de traos, caractersticas e
realizaes formais e contextuais que se
observam na escrita e na fala, e que se
inserem num pano de fundo moambicano,
que define e identifica o contexto em que
funciona o Portugus Moambicano (PM).
As formaes PM resultam de um conjunto
de processos lexicais, gramaticais e
discursivos, de entre os quais podemos
destacar alguns processos de mudana,
nomeadamente (i) a extenso (ou
expanso) semntica; (ii) a restrio
semntica; (iii) a combinao de restrio
com a extenso semntica, (iv) a
transferncia semntica, (v) a
generalizao semntica; e (vi) o uso
figurativo. Os seguintes casos
seleccionados dos nossos dados so
ilustrativos:
1. E disse j vendi. Sabe onde voc vendeu? Ele est ai no Mercado de Estrela Vermelha. Ento prontos, samos, viemos aqui na esquadra para
queixar o problema. Samos com a polcia, fomos ai na no Estrela.
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2. () Tirei a bomba, fui lhe entregar quando vou lhe entregar, passou alguns
dias, fui ter com ele, ahvenha amanh s venha amanh s 9. Vou s 9, fico l todo o dia. Ah venha s 15, ah quando acaba o dia venha amanh ou manda o mido. Mando o mido, chega l o mido acaba o dia, aparece-me
logo a tardinha, digo como qu?
3. Amanheceu aqui 7 horas, quando eu ia chegar, sa de novo para casa dele, hoje.
Apanho j que ele est, meu cunhado;
ele comeou j a contar a esse, aqui no
casa de algum que quando enche a barriga vem abusar.
4. Sim, mas tambm no anda, porque a bomba no est boa. Eu j disse a ele que a bomba no est boa, ele disse que
ia l ver de novo, no veio, no foi at
hoje. Isso de dizer que estamos a desconseguir montar no est a falar
verdade. Ele mentiroso.
Relativamente formao em (4) queixar o problema, estamos perante uma entrada por via da traduo do Xichangana
kumangala mhaka. O mesmo pode-se dizer
em relao formao em (5) acaba o dia do Xichangana kuheta siku. Formaes por
via da traduo tendo como ponto de
partida uma lngua bantu, so frequentes
no PM e este fenmeno se explica pelo
facto destas lnguas serem uma L1 para a
maior parte dos falantes da variedade
moambicana do Portugus. O mesmo
pode-se dizer da formao em (6)
amanhecer que provm do Xichangana kuxisa, o mesmo que [] ficar, permanecer em certo lugar at o romper da
manh (LOPES, SITOE e NHAMUENDE 2002, p. 21).
No que se refere formao em (7)
desconseguir que no PE tem como equivalente no conseguir, trata-se, segundo Lopes, Sitoe e Nhamuende
(2002), de um processo chamado de
sobregeneralizao lingustica, fenmeno
que se caracteriza pela introduo do
prefixo des mesmo em palavras cujas bases
apresentam limitaes para o efeito na
norma europeia do Portugus.
O uso destas formaes tpicas do PM por
parte dos indiciados justificvel no
somente pelo facto destes indiciados
possurem um nvel de escolarizao que
no muito elevado mas, sobretudo, pelo
facto de a nova variedade do PM, que se
encontra em fase avanada da sua
formao, no se dissociar da estrutura das
lnguas bantu (seja a nvel sintctico como
a nvel lexical), L1 da maior parte dos
falantes do PM em Moambique (veja-se
Gonalves, 1990). De igual modo, a
construo destas formaes PM est
associada de forma intrnseca ao contexto
scio-cultural, econmico e poltico em
que se vai afirmando esta variedade
naturalizada do Portugus (LOPES, 1997a).
Tratamento de Alguns Mecanismos de
Coeso Textual e Coerncia Discursiva
Do ponto de vista da teoria avanada por
Halliday e Hasan (1976) e Koch (2003)
sobre os mecanismos de coeso, as
construes que so objecto da nossa
anlise apresentam algumas passagens que
merecem a nossa ateno, muito em
particular no tocante aos mecanismos em
que se desencadeiam tais laos coesivos.
Como na anlise da coeso e coerncia
fundamental tratar a dimenso cognitiva do
discurso, vamos tentar analisar estes
mecanismos de coeso e coerncia
igualmente luz da teoria dos schemata
defendida por alguns precursores da
psicologia cognitiva j referidos neste
trabalho (CARRELL, 1983;
WIDDOWSON, 1983). Tomemos as
seguintes passagens retiradas do nosso
corpus:
(8) Pai da ofendida [declarante]:
Amanheceu aqui sete horas, quando eu
ia chegar, sa de novo para casa dele, hoje. Apanho j que ele est, meu
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cunhado, ele, comeou j a contar a
esse, aqui no casa de algum que
quando enche a barriga vem abusar. Aqui na minha casa. Vamos buscar
aquelas pessoas ento? Eu estou a
buscar esses aqui para a mesma casa.
OK! Porqu no podemos resolver com essa nossa pessoa, que est j com
problemas, doente, ser? Ele disse Sr. eu
no quero saber nada. O que voc acha? Eu acho que vamos tratar a pessoa estar
normal e vamos acompanhar ela no lar
dela, ir falar coma famlia dela. Eh p, a
vossa mulher esteve c em casa, mas eh p, encontrou com problemas, assim,
assim, assim, explicar a famlia do
marido porque o marido est na Africa do Sul. E no se pode ir entrar s
simplesmente assim no lar! Ele nem
quer ouvir nada! OK! O telefone o Sr. paga? Ele diz no pago nada! Dinheiro pelo menos para lhe dar
aquecer gua para lhe tratar, disse no
tenho dinheiro para tratar essas brincadeiras.
(9) Pai da ofendida [declarante]: Eu
quero dinheiro, pelo menos me dar dez contos para comprar carvo parapara ferver gua para tentar lhe lavar com
gua quente e sal, no tem esse dinheiro para fazer essas brincadeiras. Eu desde
Domingo estava nervoso a eles por estar
assim, estou assumir a ela at agora.
Para lhe tirar, lhe deixar no lar dela, donde que vem, eu tenho medo. Como
que ela, minha filha, vai entrar? Eu
tenho que falar com eles para ele, primo, pode haver problema Como devolver a mida no lar dela, na famlia, embora
que o marido no est?
(10) Agente: No lar no lar dela sabem que ela tem esses problemas?
Pai da ofendida: Eu ontem tentei
informar o marido, mas de uma outra maneira. No lhe falei de o tio bateu a
sobrinha. Eu disse a mida est doente,
est na minha casa. Ento, eu ele disse que quer falar com a mulher dele.
Ela atendeu o telefone, ouvi falar, no
sei o qu que falaram, no sei. Ao
resto da famlia l, acho que ainda no
tem conhecimento.
Agente: Tem que tentar maneira de ir explicar a famlia l.
Pai da ofendida: OK.
(11) Agente: Mas do princpio a vossa
combinao, o vosso acordo no foi esse?!
Indiciado: Era para ir reparar, me
entregar para eu ir montar! No falou de
Ofendido: Ele trabalhava com um
colego dele, o colego dele parece que
correu com ele por causa dessedesse coisa de mfia. Eu j peguei as bombas
com colego dele e pego as bombas e vou
montar no carro ndziku hah! melhor, pego nas bombas e vou montar
no carro.
Cada um destes extractos, refere-se a
passagens retiradas das entrevistas
conduzidas por um Agente da Lei e
Ordem, e os outros intervenientes,
semelhana de todos os outros dados, so
indiciados, declarantes ou ofendidos.
A coerncia decorre de uma multiplicidade
de factores de ordem lingustica,
discursiva, cognitiva, cultural e
interaccional. No tocante a este ltimo,
estamos a falar da interaco entre o
escrevente, o texto e o potencial leitor
(KOCH, 2002). Com isto pretende-se
reiterar a importncia dos elementos
lingusticos e discursivos contidos no texto
e o conhecimento e partilha do mundo
entre o sujeito enunciador e o destinatrio.
Se analisarmos a transcrio em (8)
podemos depreender que os demais
elementos por si apresentados no parecem
mais do que fragmentos colados uns aos
outros sem, aparentemente, nenhuma
lgica. Muito embora, do ponto de vista do
conhecimento lingustico, seja possvel, em
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algumas instncias, encontrar laos
coesivos entre alguns elementos segundo a
linha defendida por autores como Halliday
e Hasan (1976) sobre a coeso textual.
Parece-nos ser imperioso que o
destinatrio partilhe do contexto
situacional em que se insere o fragmento,
por um lado, e do schema correspondente,
por outro. Por outras palavras, a sequncia
de elementos contidos na passagem em
apreo no nos parece, primeira vista,
mais do que um conjunto de proposies
coladas umas a seguir s outras, no
obstante podermos registar um e outro caso
isolado de instncias que estabelecem
relaes de coeso. Vejamos a seguinte
passagem retirada da mesma sequncia:
(12) [] Ele disse Sr. eu no quero saber nada! O que voc acha? Eu acho
que vamos tratar a pessoa estar normal e
vamos acompanhar ela no lar dela, ir
falar com a famlia dela. Eh p, a vossa mulher esteve c em casa, mas eh p,
encontrou com problemas, assim, assim,
assim, explicar a famlia do marido porque o marido est na frica do Sul.
Nesta passagem, os elementos destacados
estabelecem um lao coesivo que contribui
para a compreenso do trecho. O caso em
que se insere o texto relaciona-se com um
acto de ofensas corporais qualificadas de
que foi vtima a queixosa, uma jovem na
sua idade mdia. O autor material deste
caso criminal um suposto tio da ofendida
com quem estivera a assistir a um jogo de
futebol no Estdio da Machava, um campo
de futebol que se localiza nos arredores da
cidade-capital moambicana, Maputo.
Podemos identificar no extracto da
interveno do pai da ofendida o recurso
referncia exofrica estabelecida entre o
sintagma a pessoa e o referente, como um elemento que se localiza fora do
mundo textual, i.e., no mundo real. Por se
referir a um elemento que precede o item
coesivo, a pessoa, ela, dela e a vossa mulher estabelecem uma relao de
referncia catafrica (HALLIDAY e
HASAN, 1976). Em adio, o sintagma
nominal a pessoa, a forma pronominal ela, o pronome possessivo dela e o sintagma nominal a vossa mulher estabelecem, de igual modo, laos
coesivos. Todavia, para este tipo de coeso
lexical, e socorrendo-nos de Koch (2003),
a classificao apresentada por Halliday e
Hasan parece pecar por no apresentar, de
forma mais clara, os limites entre a
referncia e a substituio. Segundo Koch,
existem estudiosos que defendem que toda
a co-referncia ocorre por meio de
substituio. O mesmo autor, define
substituio como sendo a troca de uma expresso lingustica por outra expresso
lingustica dada (KOCH, 2003, p. 23). Por seu turno, Halliday e Hasan (1976),
definem substituio como sendo a colocao de um item, em lugar de outro(s)
elemento(s) do texto ou mesmo de uma
relao inteira. Sendo assim, podemos
considerar que os elementos em anlise
estabelecem laos de coeso lexical por via
da substituio, e em que a referncia
ofendida, no caso em apreo, aparece
substituda pelos elementos acima
indicados.
Conforme fizemos referncia, o segmento
ora analisado parece-nos o nico que
apresenta elementos que estabelecem uma
relao de coeso, segundo a teoria
defendida por Halliday e Hasan (1976).
Nesta linha de ideias, os restantes
segmentos que constituem o extracto do
depoimento do declarante no sero seno
uma srie de ideias coladas umas s outras
e que no final no constituem textura
(IBIDEM). Entretanto, se tomarmos em
considerao a perspectiva defendida por
alguns precursores da psicologia cognitiva,
tais como Carrell (1983), de Beaugrande e
Dressler (1981), que defendem a
necessidade de se tomar em considerao a
interaco que se estabelece entre o
escrevente - o texto e o destinatrio -
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somos levados a reanalisar o fragmento
fazendo apelo teoria do schemata.
Efectivamente, parece-nos claro que a
interpretao da mensagem atravs dos
elementos lingusticos seria difcil por
parte dos destinatrios, no caso vertente, a
ofendida, o indiciado e, fundamentalmente,
o Agente. Porm, dada a forma como os
interlocutores deram continuidade s suas
intervenes, possvel depreender que a
mensagem foi processada e apreendida por
todos os actores. Na verdade, todos os
intervenientes esto cientes do contexto em
que se insere o evento comunicativo em
questo. Por outras palavras, na
interveno em causa, o uso de conectores
discursivos raro seno mesmo
inexistente. Apesar disso, dado o facto de
os elementos lingusticos da coeso no
serem nem necessrios nem suficientes
para que a coerncia seja estabelecida, esta
alcanada atravs de elementos
exteriores ao texto, nomeadamente o
conhecimento do mundo por parte dos
interlocutores, a situao e as normas
sociais, entre outros.
Hoey (2005) apresenta uma viso
inovadora sobre o comportamento dos
itens lexicais vis-a-vis os laos coesivos
que estes so susceptveis de provocar ou
evitar numa superfcie textual. Uma das
reivindicaes evocadas por este autor
sugere que as palavras (ou combinaes em forma de ninho) podem levar um
priming a participar positiva ou
negativamente em cadeias coesivas a colocao textual (HOEY, 2005, p. 116 - traduo nossa). Tomemos a passagem em
(12) acima analisada como ponto de
reflexo. O tema gira em volta de uma
pessoa do sexo feminino que foi vtima de
ofensas corporais qualificadas. Na
sequncia em anlise aparece de forma
subentendida e representada pelo
pronome pessoal ela. Deste modo, plausvel considerarmos que se estabelece
uma cadeia coesiva entre os itens lexicais a
pessoa, ela, dela, a vossa mulher. Esta
cadeia resulta do facto de o tpico da frase
em que ocorre, no caso vertente um nome
prprio de uma cidad de nome X, estabelecer um priming e participar nesta
cadeia coesiva de forma positiva, o que
pressupe desde logo a possibilidade de
outros itens lexicais ou combinaes em
forma de ninho poderem ocorrer de forma
negativa. Poderamos tomar de forma
aleatria a sequncia amanheceu aqui sete horas que aparece a iniciar o fragmento em (8). No referido fragmento, e mesmo
sem termos um texto com magnitude
suficiente que nos possa permitir tirar
concluses com maior segurana, podemos
considerar que a sequncia estabelece um
priming negativo relativamente cadeia
coesiva em que ocorre. Por outras palavras,
e ignorando propositadamente o facto de se
tratar de uma expresso com grande carga
cultural da variedade moambicana do
Portugus (PM), no ocorrem no
fragmento elementos cujo surgimento
possa ter sido provocado pela referida expresso.
Um outro aspecto a ter em conta no que se
refere aos laos coesivos veiculados pelos
elementos em anlise (os do fragmento em
12) tem a ver com o tipo de coeso na sua
relao com o priming. Regista-se uma
variao no que diz respeito ao tipo de
coeso. Isto pressupe que existem
palavras que estabelecem cadeias da
coeso, atravs, por exemplo, da repetio
ou de hipnimos. Segundo a viso do
autor,
[...] nem sempre nos referimos ao texto anterior tal como a literatura sobre a
coeso tende a fazer-nos acreditar. O
que faz com que no nos refiramos ao
texto anterior () o facto de que fazemos uma marcao psico-lingustica
que nos permite prever a coeso de tipos
particulares de textos em palavras particulares e, portanto, prevemos a sua
ocorrncia antes desta se verificar.
(HOEY, 2005, p.122 traduo livre5)
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Dito de outra forma - e socorrendo-nos do
fragmento (12) em anlise - ao tomarmos o
tema do segmento, representado de forma
subentendida por um sujeito X do sexo
feminino, activamos um priming que nos
permite esperar que o mesmo estabelea
laos coesivos (e acabou sendo o caso),
antes da sua realizao prtica no texto.
O exemplo em (9) insere-se na sequncia
do mesmo caso de espancamento de uma
senhora e, de novo, o pai da ofendida
aparece na interveno na qualidade de
declarante. Mais uma vez, a substituio
aparece como estratgia de coeso textual,
o que pressupe que deve haver um grau
considervel de controlo por parte deste
interlocutor. Vejamos a passagem em
baixo retirada desta ltima interveno:
(10) Para lhe tirar, lhe deixar no lar dela, donde que vem, eu tenho medo.
Como que ela, minha filha, vai entrar? Eu tenho que falar com eles para
ele, primo, pode haver problema. Como
devolver a mida no lar dela, na
famlia, embora que o marido no est?
Se recuperarmos a mesma referncia
exofrica estabelecida pelo pronome
pessoal ela, no extracto em (8), referindo-se ofendida, a substituio
aqui estabelecida pelos sintagmas nominais
minha filha e a mida. Admitindo que cada um dos dois extractos em anlise (12
e 13) apresenta quatro enunciados,
podemos comparar a forma como o
interlocutor estabelece a referida estratgia
de coeso atravs do seguinte quadro de
anlise da coeso (Tabela 1):
TABELA 1: Anlise de mecanismos de coeso adoptados por um declarante.
N do Enunciado Intervenes/enunciado Elemento coesivo
1 Enunciado
1 Interveno: Ele disse Sr. eu no quero saber nada.
2 Interveno: Para lhe tirar, lhe deixar no lar dela, donde que vem, eu tenho medo.
Dela
2 Enunciado
1 Interveno: O que voc acha?
2 Interveno: Como que ela, minha filha, vai entrar? minha filha
3 Enunciado
1 Interveno: Eu acho que vamos tratar a pessoa estar normal
e vamos acompanhar ela no lar dela, ir falar coma famlia dela. a pessoa
2 Interveno: Eu tenho que falar com eles para ele, primo,
pode haver problema.
4 Enunciado
1 Interveno: Eh p, a vossa mulher esteve c em casa, mas
eh pa, encontrou com problemas, assim, assim, assim, explicar a famlia do marido porque o marido est na Africa do Sul.
a vossa mulher
2 Interveno: Como devolver a mida no lar dela, na famlia,
embora que o marido no est? a mida
Se fizermos uma reflexo luz das
reivindicaes avanadas por Hoey sobre o
comportamento das palavras no texto,
temos a considerar que, partindo do
mesmo tpico semelhana do fragmento
em (12) acima, se forma uma cadeia
coesiva, integrando as sequncias, minha filha, a mida e lar dela. Alis, o tpico em causa apresenta um priming
positivo para estabelecer laos coesivos no
fragmento (e no s).
O autor supracitado apresenta uma
segunda reivindicao no contexto da
relao entre a teoria da marcao psico-
lexical (lexical priming) e o texto em geral.
Segundo a teoria, todo o item lexical (ou a
combinao de itens lexicais) pode
apresentar uma preferncia positiva ou
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negativa a ocorrer como parte de um tipo
especfico de relao semntica (HOEY,
2005). Na verdade, estamos aqui perante
uma verso textualizada da noo de associao semntica. Tomemos
novamente o j referenciado extracto em
(9), concretamente na sua parte inicial, e
concentraremos a nossa ateno na palavra
dinheiro.
(14) Pai da ofendida: Eu quero
dinheiro, pelo menos me dar dez contos para comprar carvo parapara ferver gua para tentar lhe lavar com gua quente e sal, no tem esse dinheiro para
fazer essas brincadeiras. Eu desde Domingo estava nervoso a eles por estar assim, estou
assumir a ela at agora. Para lhe tirar, lhe
deixar no lar dela, donde que vem, eu tenho
medo. Como que ela, minha filha, vai
entrar? Eu tenho que falar com eles para ele
primo pode haver problema. Como devolver
a mida no lar dela, na famlia, embora que
o marido no est.
Para qualquer falante da lngua portuguesa,
incluindo o falante de L2, dinheiro
estabelece, certamente, um priming por via
de associao semntica com itens cuja
rea semntica tem a ver com nmeros comprar, pagar, produtos, banco, etc. No caso em apreo, dinheiro aparece como tema e, desde logo, no parece
fugir regra, pois estabelece o priming com a combinao de itens lexicais como
dez contose comprar carvo. Os dois pares de itens lexicais podem ser vistos
como resultado de associaes
psicolgicas que os falantes (pelo menos
do PM) delas fazem. verdades que, para
os falantes do PM, ambos os casos podem
ser explicveis em termos de co-ocorrncia
lexical. Todavia, uma vez que tanto dez contos como comprar carvo podem construir ninhos com outros itens lexicais
como, por exemplo, uns dez contos/mais dez contos/cerca de dez contos, por um lado, e comprar algum carvo/comprar mais carvo/comprar menos carvo, por outro lado, a nica designao que nos parece plausvel a de
priming, mais concretamente em termos de
associao pragmtica.
O elemento em anlise (dinheiro) estabelece um lao coesivo no extracto e
este aparece de forma reiterada.
Certamente que, sem se pretender colocar
em causa o priming que dinheiro construiu, acredita-se que o enunciado, a
ser pronunciado por um falante do PM
com um nvel de proficincia razovel na
lngua portuguesa (independentemente de
ser ou no a variedade moambicana),
indicaria uma situao de priming positivo
para a coeso atravs do uso de uma rede
ou laos coesivos representados por
elementos tais como valor, valor monetrio, mola, taco, ferro, sendo estes trs ltimos parte integrante das
formaes tpicas do PM (LOPES, SITOE
e NHAMUENDE, 2002). O que justifica
isto tem a ver com o facto de sempre que
os intervenientes num litgio fazem
escolhas de itens lexicais nas suas
intervenes tomarem em considerao
que estes estabelecero ou no laos
coesivos nos enunciados em que ocorrem.
Por outras palavras, de acordo com Hoey,
laos ou cadeias coesivas podem
estabelecer relaes de coeso de forma
negativa ou positiva.
A marcao psico-lingustica (priming)
caracteriza-se, fundamentalmente, pela
possibilidade de variar de pessoas para
pessoa, de acordo com as suas experincias
de vida, mas sobretudo por estar tambm
intrinsecamente relacionada com o genre a
que pertence o enunciado, escrito ou
falado. Assim, importa referir que o
priming de certos laos ou cadeias coesivas
pode comportar-se de forma negativa,
quando a sua ocorrncia resulta de
associaes semnticas pouco comuns
entre os falantes da lngua ou variedade de
lngua. Recorrendo ao caso em anlise
dinheiro, este aparece como tema e logo como ponto de partida para o priming.
Falando concretamente do contexto em
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apreo, trata-se de um montante no valor
de dez contos destinados compra de
carvo. Este combustvel usado pela maior
parte dos moambicanos, principalmente
os que habitam nas zonas suburbanas,
custa, na verdade, dez meticais da nova
famlia, moeda actualmente em circulao
no pas. Os falantes do PM, durante algum
perodo, principalmente aps a
independncia, viram-se expostos a
primings cujas associaes semnticas
incluam o uso do lexema conto para se referirem ao montante igual ou superior a
dois mil escudos portugueses, moeda ento
em uso em Moambique. Ora, este
priming, cuja frmula seria algo
semelhante a (valor monetrio 1 +
contos), tem resistido mudana, de tal
forma que, mesmo com a introduo do
Metical da antiga famlia, os falantes da
variedade moambicana do Portugus
mantiveram a sua co-ocorrncia. Por outras
palavras, para os falantes do PM, nem com
a introduo do Metical da antiga famlia,
deixaram de associar contos no priming para valores a partir dos dois mil meticais
em diante. Este comportamento,
permanece at aos nossos dias, mesmo
depois da introduo do Metical da nova
famlia, em que o referido valor seria
convertido de dez contos para dez Meticais. Verifica-se, porm, uma resistncia por parte dos falantes do PM
em fazer o que Hoey (2005) chama de drift
in the priming, (impulso na direco da
marcao psico-lingustica).
Conflito Entre Dois Sistemas?
As estratgias lingustico-discursivas
adoptadas pelos diferentes intervenientes
ao nvel das esquadras da PRM surgem de
um contexto scio-cultural que espelha
uma realidade acentuadamente
caracterizada por valores tradicionais para
a deliberao de crimes. Para exemplificar,
muito frequente os intervenientes
gozarem de liberdade exacerbada de uso da palavra, sem serem interrompidos. Ora,
esta prtica seria pouco susceptvel de
ocorrer em contextos de pases de
civilizao mais ocidentalizada ou na
interpretao mais estrita do chamado
Direito Positivo. Os casos de violncia
domstica so os que tipicamente
espelham o conflito entre a tentativa de
manuteno de laos matrimoniais e a
angstia dos Agentes terem que fazer valer
a legislao aplicvel. Para exemplificar
vrios so os casos em que a mulher, aps
a participao de um caso na esquadra
depois de ter sido vtima de ofensas
corporais por parte do marido e a
consequente notificao deste pela PRM,
v-se no embarao de ter que manifestar o
seu desabafo pelos sucessivos actos de agresso fsica de que tem sido vtima e,
simultaneamente, salvaguardar a
manuteno do vnculo matrimonial. Ao
nosso ver, as passagens que se seguem
servem de clara sustentao do referido
fenmeno:
(15) Ofendida D: Eu disse vamos juntos, ele comeou a me bater desde l
at agora est me bater desde aqui no
cemitrio, desde est me bater eu tenho
dois filhos com ele est me bater desde no estou a mentir, ainda nem lhe
dei nem uma chapada, ele esta a me
bater, wa nyimba [em estado de gravidez] Jorge? Eu, tua mulher? Est a
me bater?
Neste fragmento, a ofendida descreve
perante o Oficial de Permanncia e de
forma emocional o episdio que resultou
na agresso de que foi vtima. Tratando-se
de uma pessoa em estado de gravidez, o
caso deveria, em princpio, merecer um
tratamento especial, dada a sua delicadeza.
Como resposta, o Agente apela ao bom
senso, como se pode verificar no
fragmento abaixo:
(16) Agente 5: No estamos a discutir aqui mas sim a procura de uma soluo.
Vocs esto a se exaltar de qualquer
maneira. Ela sua esposa e ele seu
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marido. O que acontece que vocs no
sabem brincar, assim que estava sair,
explicava de bom modo e voc tambm no havia razo de se empurrar no sei
qu, mas ests a ver algum que bate
algum em frente esquadra para dizer
que voc no tem nada a ver com a polcia
A partir desta interveno podemos
inteirar-nos do papel de mediador ou conselheiro que o Oficial de Permanncia desempenha na deliberao
de certos casos nas esquadras da PRM. Ao
invs de se restringir sua tarefa de
produzir elementos que possam constar do
Auto de Denncia atravs da auscultao
das partes, o Agente redobra-se em
esforos no sentido de encontrar uma
soluo pacfica, consensual, i.e., fora do contexto judicial. Nos casos em que
este exerccio se demonstrar ineficiente, a
soluo tem passado por uma medida
correctiva que pode ser o encarceramento do indiciado durante
algum tempo nas celas locais.
precisamente nestas circunstncias que a
polcia v-se numa situao de total
embarao, como demonstra a passagem
que se segue:
(17) Ofendida D: Estou a pedir, eu
tenho filho pequeno no prende meu
marido, ele no fez nada eu estava a
mentir; no me tocou eu cai sozinha, no me fez nada eu que cai sozinha meu
marido esse aqui, estou a pedir!
Certamente, esta passagem reflecte uma
situao que, certamente, ocorre com
muita frequncia nas esquadras da polcia,
principalmente quando se trata de casos de
violncia domstica. Os Agentes vem-se
numa situao em que, sempre que tentam
aplicar medidas legais, so as prprias
ofendidas que imploram pela restituio
liberdade incondicional dos respectivos
parceiros. Esta a razo que leva, na maior
parte dos casos, os Oficiais de
Permanncia a no optarem por elaborar,
de imediato, os respectivos Autos. Para
este caso em concreto, o extracto que se
segue foi proferido como desabafo por
parte do Oficial de Permanncia.
Obviamente, este deveria ter sido o
pressuposto inicial para o tratamento do
referido caso:
(18) Agente 5: Senhora, eu e os outros
Agentes vimos e a senhora est dizer que caiu, vimos a lhe darem porrada e
isso um crime pblico mesmo que a
senhora pea e no meta queixa ele vai dormir aqui!
No obstante o enquadramento legal dado
a este caso pelo Agente, a ofendida
implorou intensamente at que acabaram
por libertar o seu marido, dando por
encerrado o caso. Por detrs desta prtica,
podem-se equacionar vrios factores tais
como a dependncia quase total da mulher
em relao ao homem, fonte da
provenincia dos rendimentos financeiros
que garantem a sobrevivncia da famlia na
esfera domstica e possveis represlias
por parte da famlia do marido, na
eventualidade deste ser encarcerado. Por
outras palavras, a famlia do marido
encararia com muita estranheza e de forma
revoltosa uma situao em que a mulher,
sendo propriedade integral do marido, recorresse a uma esquadra para resolver
um problema visto como sendo do frum
familiar (JUNOD, 1944).
As prticas acima descritas, e que na sua
maior parte ocorrem numa situao em que
o homem se encontra sob forte influncia
do lcool, so do conhecimento da polcia.
Os Agentes da Lei e Ordem, na posio de
cidados, partilham do modus vivendi que
caracteriza as comunidades que os
circundam.
Todavia, importa frisar os Agentes da
PRM tem a obrigao de actuar luz da lei
aplicvel e no sob moldes extra-judiciais.
A ttulo de demonstrao, o Cdigo do
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E Mabasso
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Processo Penal, no seu artigo 1 das Disposies Gerais, prescreve o seguinte:
A todo o crime ou contraveno
corresponde a uma aco penal, que ser
exercida nos termos deste cdigo.
nico. Nos casos omissos, quando as
suas disposies no possam aplicar-se
por analogia, observar-se-o as regras do
processo civil que se harmonizam como processo penal e, na falta delas, aplicar-
se-o os princpios gerais do processo
penal. (GONALVES, 1972, p. 13)
Ou:
Quando a lei tornar a aco penal
dependente da querela, acusao ou requerimento particular, necessrio
que o ofendido, [sic] ou as outras
pessoas, a quem a lei confere a faculdade de acusar, promovam o
andamento do processo.
(GONALVES, 1972, p.41)
Portanto, a obrigatoriedade de se dar
encaminhamento a todo o processo que
participado nas esquadras est prevista nos
termos da lei, o que pressupe que toda a
aco no sentido de anular a acusao deve
ser feita mediante requerimento ao
Ministrio Pblico, por parte do ofendido.
Sem pretendermos discutir nuances
subjacentes a este procedimento,
acreditamos que nas esquadras, comum
aparecerem casos considerados sumrios a
no serem tratados mediante a abertura de
um Auto, mas sim por via de uma espcie
de conversa informal. Em muitos casos,
isto acontece quando o ofensor demonstra
algum sentimento de arrependimento
perante o ofendido, da o apelo ao bom senso, no sentido extra-judicial da expresso (MABASSO, 2010). Este
procedimento ilegal que, a nosso ver, constitui marca muito forte das formas
tradicionais de resoluo de certos crimes,
pode constituir um foco de estmulo para
actos de corrupo no seio da corporao.
CONCLUSES
Uma das principais concluses do presente
trabalho que o uso de estratgias
lingustico-discursivas nas esquadras da
PRM, p.ex., a alternncia de cdigo (code
switching) e a transferncia negativa da
lngua materna ou interferncia, est
associado ao fraco domnio que os
intervenientes tm da lngua oficial,
incluindo mesmo os prprios Oficiais de
Permanncia. Por outro lado, verifica-se
que as estruturas retricas e as estratgias
interaccionais so fortemente marcadas por
elementos do Direito Costumeiro, o que
constitui um desafio para a elaborao dos
Autos.
A terminar, importa reiterar que a contnua
excluso do uso das lnguas moambicanas
em contextos oficiais e a adopo do
Portugus como nica lngua oficial obriga
a maior parte dos moambicanos a ter que
apresentar a sua defesa nas esquadras e
tribunais numa lngua que no domina ou
que no domina suficientemente nos
contextos como os que foram tratados.
Esta situao pode pr em causa o esforo
empreendido pelo governo moambicano
no sentido de construir um Estado de
Direito, um estado em que os direitos,
deveres e obrigaes dos cidados so
observados.
AGRADECIMENTOS
Ao Professor Catedrtico Armando Jorge
Lopes; Ao Ministrio do Interior, atravs
do Comando Geral da PRM a nvel da
Cidade de Maputo; Shila e aos meus
filhos Prince e Vinny; ao John Gibbons e
ao Michael Walsh.
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1 The basic concept of the rights and obligations of a member of a community are deeply embedded in the fabric of language itself, and existed before there were codified laws. Furthermore, the concepts which now construct legal
systems such as guilt and murder are available to us only through the medium of language. There is then a very important sense in which language constructs the law (). (GIBBONS, 1994, p. 3).
2 () trials are linguistic events. Language is then central to the law, and law as we know it is unconceivable without language. Many lawyers pride themselves upon their mastery of language, and regard such mastery as a critical skill for legal professionals. (GIBBONS, 1994, p. 3)
3 Esta informao foi retirada de um texto de apoio preparado por John Gibbons para efeitos de leccionao da cadeira Introduction to Language and the Law na Universidade de Sydney, Austrlia, em Julho de 2001.
4 It has been established that African customary law, like any system of law, consists of a variety of different types of
principles, norms, and rules. Some of them state wide and general principles of morality and public policy to constitute an apparently enduring ideological framework for justice. Such principles and of wide connotation, stated in multivocal terms covering many referents of wide range of actions, are flexible and be adapted to changing conditions and standards. (GLUCKMAN, 1966, p. 9)
5 (...) we do not constantly refer back to the previous text, as the literature on cohesion would have us believe. The reason why we do not refer back (...) is that we are primed to expect cohesion of particular type of texts for particular words and therefore anticipate its occurrence in advance of its appearance. (HOEY, 2005, p. 122)